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DIREITO PENAL PARTE GERAL ARTS 1 A 120 1 O GEN Grupo Editorial Nacional maior plataforma editorial brasileira no segmento científico técnico e profissional publica conteúdos nas áreas de concursos ciências jurídicas humanas exatas da saúde e sociais aplicadas além de prover serviços direcionados à educação continuada As editoras que integram o GEN das mais respeitadas no mercado editorial construíram catálogos inigualáveis com obras decisivas para a formação acadêmica e o aperfeiçoamento de várias gerações de profissionais e estudantes tendo se tornado sinônimo de qualidade e seriedade A missão do GEN e dos núcleos de conteúdo que o compõem é prover a melhor informação científica e distribuíla de maneira flexível e conveniente a preços justos gerando benefícios e servindo a autores docentes livreiros funcionários colaboradores e acionistas Nosso comportamento ético incondicional e nossa responsabilidade social e ambiental são reforçados pela natureza educacional de nossa atividade e dão sustentabilidade ao crescimento contínuo e à rentabilidade do grupo CLEBER MASSON DIREITO PENAL PARTE GERAL ARTS 1 A 120 1 13ª edição revista atualizada e ampliada De acordo com Prisão domiciliar da mulher gestante Lei 137692018 Política Nacional de Trabalho no âmbito do sistema prisional Decreto 94502018 CLEBER MASSON A EDITORA FORENSE se responsabiliza pelos vícios do produto no que concerne à sua edição impressão e apresentação a fim de possibilitar ao consumidor bem manuseálo e lêlo Nem a editora nem o autor assumem qualquer responsabilidade por eventuais danos ou perdas a pessoa ou bens decorrentes do uso da presente obra Nas obras em que há material suplementar online o acesso a esse material será disponibilizado somente durante a vigência da respectiva edição Não obstante a editora poderá franquear o acesso a ele por mais uma edição Todos os direitos reservados Nos termos da Lei que resguarda os direitos autorais é proibida a reprodução total ou parcial de qualquer forma ou por qualquer meio eletrônico ou mecânico inclusive através de processos xerográficos fotocópia e gravação sem permissão por escrito do autor e do editor Impresso no Brasil Printed in Brazil Direitos exclusivos para o Brasil na língua portuguesa Copyright 2019 by EDITORA FORENSE LTDA Uma editora integrante do GEN Grupo Editorial Nacional Rua Conselheiro Nébias 1384 Campos Elíseos 01203904 São Paulo SP Tel 11 50800770 21 35430770 faleconoscogrupogencombr wwwgrupogencombr O titular cuja obra seja fraudulentamente reproduzida divulgada ou de qualquer forma utilizada poderá requerer a apreensão dos exemplares reproduzidos ou a suspensão da divulgação sem prejuízo da indenização cabível art 102 da Lei n 9610 de 19021998 Quem vender expuser à venda ocultar adquirir distribuir tiver em depósito ou utilizar obra ou fonograma reproduzidos com fraude com a finalidade de vender obter ganho vantagem proveito lucro direto ou indireto para si ou para outrem será solidariamente responsável com o contrafator nos termos dos artigos precedentes respondendo como contrafatores o importador e o distribuidor em caso de reprodução no exterior art 104 da Lei n 961098 Capa Danilo Oliveira Produção digital Geethik Data de fechamento 07012019 CIP BRASIL CATALOGAÇÃO NA FONTE SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS RJ M372d Masson Cleber Direito Penal parte geral arts 1º a 120 vol 1 Cleber Masson 13 ed Rio de Janeiro Forense São Paulo MÉTODO 2019 Inclui bibliografia ISBN 9788530986285 1 Direito penal Brasil 2 Serviço público Brasil Concursos I Título II Série 1854088 CDU 343281 Meri Gleice Rodrigues de Souza Bibliotecária CRB76439 Aos meus pais e à minha irmã Com a sustentação moral e afetiva de uma família maravilhosa encontrei forças para chegar até aqui e ir adiante À Carol companheira de todos os momentos a quem entrego minha vida Às minhas princesas Maria Luísa e Rafaela Vocês roubaram para sempre meu coração mesmo antes de ter escutado o de vocês batendo Filhas vocês são o sentido de tudo O amor que tenho por cada uma de vocês é algo que não se pode descrever com simples palavras e sim pela preocupação constante pelos sorrisos desinteressados pelos olhares apaixonados e por todos os mais lindos sentimentos que vocês despertam em mim Aos meus sobrinhos Maria Eduarda Anna Lara Lorenzo e Chiara pelo carinho e pelos momentos de alegria que me proporcionam Ao Doutor Cássio Juvenal Faria mestre e amigo modelo de retidão e de brilhantismo profissional exemplo de membro do Ministério Público e de professor o qual busco seguir diariamente A todos os estudantes de Direito e em especial aos candidatos de concursos públicos Aos nossos alunos presenciais ou via satélite e aos nossos leitores aos quais empresto meu apoio e minha fé nessa fase tão difícil mas necessária de nossa vida Juntos enfrentaremos e superaremos o árduo caminho que leva à vitória Inúmeras pessoas são importantes durante o desenrolar de nossa vida Enumerálas seria tarefa impossível além de ingrata em face da certeza de que erros graves seriam cometidos Algumas pessoas e também instituições entretanto foram de fundamental importância para a concretização deste trabalho a saber Aloísio Masson mais do que um primo o irmão que não tive Presente em todos os momentos de luta de frustrações de alegrias e de conquistas Professor Doutor Damásio E de Jesus reconhecido como um dos maiores penalistas de todos os tempos e mundialmente respeitado visionário que com seu talento revolucionou o ensino jurídico no País por nos honrar com a oportunidade de ter integrado no período de 2006 a 2011 a seleta equipe de docentes do seu Complexo Jurídico Vauledir Ribeiro Santos por acreditar neste trabalho e Adriano Koenigkam pelo excelente trabalho de revisão que muito enriqueceu a obra Professor Doutor Marco Antonio Marques da Silva desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo e professor titular da Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo pela maestria e pelo zelo com que nos conduziu durante os trabalhos de orientação no curso de mestrado Ministério Público do Estado de São Paulo uma das reservas morais deste País instituição de que me orgulho fazer parte e a qual prometo sempre defender Rede LFG pela confiança depositada em nosso trabalho e principalmente pela generosidade com que fui recebido em seus quadros a partir do mês de novembro de 2011 Curso G7 Jurídico e todos os meus amigos que o integram por lutarem ao meu lado na realização de um sonho Estagiários e servidores do Ministério Público que comigo trabalham ou já trabalharam e especialmente ao Thiago e ao Gustavo Sou grato a todos vocês pela lealdade pela amizade e pelo apoio constante E é claro aos colegas promotores de Justiça e professores com quem convivemos diariamente pelo compromisso ético no desempenho de relevantes funções e por estarem sempre dispostos a compartilhar seus inesgotáveis conhecimentos A todos os que sempre nos ajudaram os meus sinceros agradecimentos Que a vida lhes recompense com muita saúde paz e alegria Muito obrigado O Autor NOTA DO AUTOR À 13a EDIÇÃO Esta 13ª edição do nosso Direito Penal volume 1 Parte Geral encontrase atualizada com a legislação penal lançada ao longo de 2018 notadamente as Leis 13654 alterações nos crimes de furto e roubo 13715 efeitos da condenação 13718 mudanças nos crimes contra a dignidade sexual 13769 substituição da prisão preventiva por prisão domiciliar da mulher gestante ou que for mãe ou responsável por crianças ou pessoas com deficiência e progressão especial de regime prisional para as condenadas na mesma situação 13771 novas causas de aumento de pena no feminicídio e 13772 definição da violência psicológica contra a mulher e criação do crime de registro não autorizado da intimidade sexual Abordamos as novas Súmulas do Superior Tribunal de Justiça e acrescentamos os julgados do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça noticiados nos respectivos Informativos publicados em 2018 atinentes à Parte Geral do Código Penal O livro também passa a contar com novas teorias e propostas doutrinárias surgidas tanto no direito comparado como no direito pátrio bem como com inovações jurisprudenciais a exemplo da posição da Suprema Corte acerca da legitimidade e da competência para execução da pena de multa Dessa forma buscamos proporcionar aos nossos leitores e às nossas leitoras uma obra ainda mais completa e em conformidade com suas finalidades precípuas colaborar na formação dos estudantes e na atuação prática dos operadores do Direito Penal bem como na preparação aos concursos públicos Agradecemos mais uma vez a confiança depositada neste trabalho e esperamos lhe ajudar a alcançar o almejado e merecido sucesso Bons estudos muita paz e felicidade em sua caminhada Um abraço Cleber Masson Quando cursava a faculdade de Direito buscava sempre conciliar a doutrina e a jurisprudência em meus estudos A tarefa era difícil e principalmente dispendiosa Livros custam caro e o acesso aos principais julgados dos Tribunais não é simples Demanda muito tempo a localização de ementas e acórdãos notadamente quando se pretende sistematizar a jurisprudência por assunto Em razão disso não raras vezes esse estudo completo era colocado em segundo plano o que me levava a constatar um sensível vazio acerca das matérias cujo conhecimento era necessário Com a colação de grau sobreveio a preparação para o concurso público A dificuldade outrora existente acentuouse significativamente Era preciso dominar novos assuntos a cada dia que se passava Somavamse a isso a elevada concorrência que aumenta anualmente a pressão própria e das pessoas próximas para a aprovação a ansiedade inerente ao concursando e ainda a luta incansável contra o relógio pois o tempo para os estudos era desproporcional à quantidade de matéria exigida pelo edital Além disso sabia que depois da primeira prova enfrentaria outra e depois mais outra E caso fracassasse precisaria aguardar longo período até o próximo edital o que nem sempre seria possível além de amargar a frustração da derrota Felizmente depois de muita luta a aprovação veio E logo no primeiro concurso No entanto foi intensa a preparação exigiu sacrifício dedicação desmedida e inúmeras privações Mas tudo valeu a pena E como valeu Se precisasse trilhava todo o caminho novamente Não há nada no mundo mais gratificante do que vencer pelo próprio esforço do que alcançar reconhecimento e satisfação com o exercício de um trabalho que se escolheu livremente pelo qual muito se lutou Porém decidi não parar por aí Era necessário repartir com outras pessoas o conhecimento adquirido ajudálas a enfrentar com segurança o tortuoso caminho que leva ao sucesso em concursos públicos Então comecei a lecionar em cursos preparatórios a compartilhar os medos e as angústias dos candidatos a colher com emoção as vitórias a festejar a tão almejada aprovação Depois de insistentes pedidos e de muito incentivo por parte dos alunos surgiu a ideia de escrever um livro Mais um desafio Não é simples atender às expectativas dos estudantes sejam acadêmicos sejam concursandos Revestese de enorme responsabilidade a tarefa de corresponder à confiança depositada na leitura de uma obra pois todos esperam que as palavras lançadas ao papel sejam capazes de auxiliar na conquista de seus objetivos Após certa relutância resolvi encarar mais essa prova da vida Espero sinceramente vencêla O trabalho de meses resultou nesta obra que você ora nos dá o orgulho de ler Tratase de um livro completo que envolve a Parte Geral do Código Penal incluindo toda a Teoria Geral do Direito Penal Escrita em linguagem clara e didática a obra abrange todas as questões relevantes dessa disciplina revelandose como suficiente para a aprovação em qualquer prova exame ou concurso público Além da doutrina clássica da história e da evolução do Direito Penal o livro aborda as mais recentes ideias penais de diversos países e variados doutrinadores Temas de vanguarda foram analisados tais como o funcionalismo penal a coculpabilidade a teoria da imputação objetiva a teoria do domínio do fato no concurso de pessoas a autoria por determinação o direito penal do inimigo as velocidades do direito penal o direito de intervenção entre tantos outros Nas matérias controversas foram expostas as diversas posições da doutrina e da jurisprudência destacandose sempre a mais aceita bem como se indicando a melhor corrente a ser adotada em cada perfil de concurso público Sabese que cada concurso público variando conforme seu perfil espera do candidato um pensamento coerente com a instituição cujo ingresso se pretende E é claro não podia ser olvidada a jurisprudência De elevada incidência em concursos públicos é indicada a posição do Supremo Tribunal Federal e a do Superior Tribunal de Justiça quando existentes em cada um dos tópicos abordados nos 46 capítulos que compõem o nosso Direito penal Parte geral Para facilitar a compreensão da matéria especialmente nos assuntos mais complexos o trabalho foi ilustrado com inúmeros exemplos sem prejuízo de gráficos e esquemas destinados à revisão do que foi lido e à assimilação visual de cada tema Dessa forma o leitor muitas vezes sentirseá em sala de aula como se estivesse lendo no quadro o que foi dito Também estão disponíveis em ambiente virtual questões objetivas de vários concursos públicos Além de simular uma prova esse recurso permite ao concursando atual ou futuro com a análise do número de questões acerca de cada assunto saber quais são os pontos mais cobrados pelas comissões examinadoras Espero colaborar para sua aprovação Estamos unidos em torno de um mesmo ideal sua vitória Agradeço pela confiança com que recebe esta obra e fico demasiadamente honrado com sua aceitação Críticas e sugestões serão muito bemvindas Torço por você Acredite lute com todas as suas forças por seu sonho Você é capaz Um forte abraço e boa sorte O Autor PREFÁCIO Colega de Ministério Público e de magistério Cleber Rogério Masson facultoume o privilégio de ter acesso aos originais de seu Direito penal Parte geral assim como me concedeu a honra de escrever algumas notas sobre o autor e a obra à guisa de prefácio O autor é bacharel em Direito e mestre em Direito Penal pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo Promotor de Justiça por vocação muito cedo despertada ingressou no Ministério Público de São Paulo em 2000 já no primeiro concurso realizado após a colação de grau passando a desempenhar com invulgar brilhantismo as suas funções institucionais para tanto conciliando o seu espírito jovem e aguerrido com uma precoce e ponderada maturidade Estudioso do Direito Penal logo tomou o caminho paralelo do magistério passando a lecionar em cursos preparatórios e a vivenciar as dificuldades e as preocupações de seus alunos candidatos a concursos públicos Hoje empresta o seu nome à magnificência do corpo docente do Complexo Jurídico Damásio de Jesus em São Paulo A leitura dos originais da primeira parte da obra eis que a ela se seguirá a Parte Especial trouxeme a certeza do acerto de sua planificação A obra se destina precipuamente aos concursandos e vem suprir uma lacuna editorial uma vez que oferece de forma consolidada e primando pela clareza de linguagem ao lado dos ensinamentos da doutrina clássica a análise dos temas hodiernos do Direito Penal assim como possibilita a imediata pesquisa da jurisprudência mais atualizada do STF e do STJ assegurando àqueles o estudo completo dessa disciplina fundamental em uma única e acessível fonte de consulta Nada obstante seja essa a destinação precípua da obra a densidade e a atualização de seu conteúdo doutrinário e jurisprudencial fazemna de molde a tornarse valiosa fonte de consulta também para aqueles que não têm a pretensão do concurso mas atuam profissionalmente com o Direito Penal Fica a expectativa de que para proveito de todos concursandos ou não também venha a lume o quanto antes o projetado complemento da Parte Especial São Paulo setembro de 2008 Cássio Juvenal Faria Procurador de Justiça aposentado e Professor no Complexo Jurídico Damásio de Jesus em São Paulo O selo Método desde a sua criação sempre teve como objetivo fornecer o melhor conteúdo aos estudantes e profissionais do Direito Para atingir esse propósito busca os autores mais capacitados e prestigiados do mercado voltados especialmente para a elaboração de conteúdo jurídico Considerando os avanços tecnológicos e os novos meios disponíveis de comunicação o selo Método imbuído de sua missão e compromisso de fornecer o conteúdo mais completo e as ferramentas de aprendizagem lançou videoaulas O conteúdo foi cuidadosamente preparado e adequado para a exposição de aulas ministradas pelo próprio autor da obra impressa Acreditando sempre na melhoria qualitativa e na evolução do processo de ensinoaprendizagem e busca pela informação nesta 13ª edição do Direito Penal Parte Geral Volume I o leitor terá acesso à Sala de Aula Virtual CLEBER MASSON com vídeos para complementar os temas mais relevantes e dicas com as novidades legislativas além de questões de concurso para treino e simulados A ideia da Sala de Aula é aproximar o leitor do autor proporcionando um espaço para interação por meio de webinars sobre temas diversos e fórum de discussão Esperamos que aproveitem ao máximo esses novos recursos Boa leitura e bons estudos Acesse o QR Code e assista ao vídeo do autor sobre a obra httpuqrtodjhz 11 12 13 14 15 16 161 162 163 164 165 17 171 172 173 174 175 176 177 SUMÁRIO PARTE I TEORIA GERAL DO DIREITO PENAL CAPÍTULO 1 DIREITO PENAL NOÇÕES INTRODUTÓRIAS Conceito de Direito Penal Alocação na Teoria Geral do Direito Nomenclatura Características do Direito Penal Criminalização primária e criminalização secundária Seletividade e vulnerabilidade no Direito Penal Relações do Direito Penal com outros ramos do Direito Com o Direito Processual Penal Com o Direito Constitucional Com o Direito Administrativo Com o Direito Civil Com o Direito Internacional Funções do Direito Penal Direito Penal como proteção de bens jurídicos Direito Penal como instrumento de controle social Direito Penal como garantia Função éticosocial do Direito Penal Função simbólica do Direito Penal Função motivadora do Direito Penal Função de redução da violência estatal 178 18 181 182 183 184 19 191 192 193 194 195 196 197 198 199 1910 110 1101 1102 1103 11031 11032 11033 11034 Função promocional do Direito Penal A ciência do Direito Penal Introdução Dogmática penal Política criminal Criminologia Divisões do Direito Penal Direito Penal fundamental ou Direito Penal primário Direito Penal complementar ou Direito Penal secundário Direito Penal comum Direito Penal especial Direito Penal geral Direito Penal local Direito Penal objetivo Direito Penal subjetivo Direito Penal material Direito Penal formal Fontes do Direito Penal Introdução Fontes materiais substanciais ou de produção Fontes formais cognitivas ou de conhecimento Constituição Federal Jurisprudência Doutrina Tratados e convenções internacionais 11035 11036 11037 21 22 221 2211 222 223 2231 2232 2233 2234 2235 2236 2237 2238 2239 224 225 sobre direitos humanos Costumes Princípios gerais do Direito Atos da Administração Pública CAPÍTULO 2 PRINCÍPIOS DO DIREITO PENAL Conceito Princípios em espécie Princípio da reserva legal ou da estrita legalidade Princípio da reserva legal e mandados de criminalização Princípio da anterioridade Princípio da insignificância ou da criminalidade de bagatela Introdução Finalidade Natureza jurídica Requisitos Aplicabilidade Princípio da insignificância e infrações penais de menor potencial ofensivo A questão do furto privilegiado Princípio da insignificância e sua valoração pela autoridade policial Princípio da insignificância imprópria ou da criminalidade de bagatela imprópria Princípio da individualização da pena Princípio da alteridade 226 227 228 2281 2282 229 2210 2211 2212 22121 22122 2213 2214 2215 2216 2217 2218 31 311 312 313 Princípio da confiança Princípio da adequação social Princípio da intervenção mínima Princípio da fragmentariedade ou caráter fragmentário do Direito Penal Princípio da subsidiariedade Princípio da proporcionalidade Princípio da humanidade Princípio da ofensividade ou da lesividade Princípio da exclusiva proteção do bem jurídico Eleição de bens jurídicos e a teoria constitucional do Direito Penal A espiritualização desmaterialização ou liquefação de bens jurídicos no Direito Penal Princípio da imputação pessoal Princípio da responsabilidade pelo fato Princípio da personalidade ou da intranscendência Princípio da responsabilidade penal subjetiva Princípio do ne bis in idem Princípio da isonomia CAPÍTULO 3 A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO DIREITO PENAL O Direito Penal dos povos primitivos Introdução Vingança divina Vingança privada 314 32 321 322 33 331 332 34 341 41 42 43 51 52 53 54 55 61 62 63 64 641 Vingança pública Idade antiga Direito Penal grego e Direito Penal romano Direito Penal grego Direito Penal romano Idade Média Direito Penal germânico Direito Penal canônico Idade Moderna Período humanitário O pensamento de Beccaria CAPÍTULO 4 A HISTÓRIA DO DIREITO PENAL BRASILEIRO Período Colonial Código Criminal do Império Período Republicano CAPÍTULO 5 ESCOLAS PENAIS Escola Clássica Escola Positiva Correcionalismo Penal Tecnicismo JurídicoPenal A defesa social CAPÍTULO 6 A EVOLUÇÃO DOUTRINÁRIA DO DIREITO PENAL Positivismo jurídico Neokantismo penal Garantismo penal Funcionalismo penal Posição de Claus Roxin Escola de Munique 642 65 651 652 653 654 6541 6542 6543 655 656 71 72 73 74 75 751 752 753 754 755 Posição de Günther Jakobs Escola de Bonn Novas propostas doutrinárias Direito Penal e enfrentamento da criminalidade moderna Introdução Direito intervencionista ou de intervenção As velocidades do Direito Penal Direito Penal do inimigo Noções preliminares Conceito de inimigo Efeitos da aplicação da teoria do Direito Penal do inimigo Neopunitivismo a quarta velocidade do Direito Penal Direito Penal como proteção de contextos da vida em sociedade CAPÍTULO 7 LEI PENAL Introdução Classificação Características da lei penal Lei penal em branco Interpretação da lei penal Introdução Quanto ao sujeito autêntica judicial ou doutrinária Quanto aos meios ou métodos gramatical e lógica Quanto ao resultado declaratória extensiva e restritiva Interpretação progressiva 756 76 761 762 77 771 772 7721 7722 7723 7724 7725 773 774 78 781 782 783 784 785 786 787 7871 7872 7873 Interpretação analógica Analogia Introdução Espécies Lei penal no tempo Introdução Direito Penal intertemporal e o conflito de leis penais no tempo Novatio legis incriminadora Lei penal mais grave ou lex gravior Abolitio criminis e lei posterior benéfica Combinação de leis penais lex tertia Lei penal intermediária Lei penal temporária e lei penal excepcional As leis penais em branco e o conflito de leis no tempo Conflito aparente de leis penais Conceito Requisitos Localização no Direito Penal Finalidade Diferença com o concurso de crimes Diferença com o conflito de leis penais no tempo Princípios para solução do conflito Princípio da especialidade Princípio da subsidiariedade Princípio da consunção ou da absorção 7874 788 79 710 7101 7102 71021 71022 7103 71031 71032 71033 71034 71035 711 7111 712 7121 7122 71221 71222 7123 Princípio da alternatividade Ausência de previsão legal Tempo do crime Lei penal no espaço Introdução Princípio da territorialidade Conceito de território Território brasileiro por extensão Outros princípios Princípio da personalidade ou da nacionalidade Princípio do domicílio Princípio da defesa real ou da proteção Princípio da justiça universal Princípio da representação Lugar do crime Não aplicação da teoria da ubiquidade em outras hipóteses Extraterritorialidade Introdução Extraterritorialidade incondicionada Extraterritorialidade incondicionada e o art 8º do Código Penal Proibição do bis in idem Extraterritorialidade incondicionada e a Lei de Tortura Extraterritorialidade condicionada 713 7131 7132 7133 71331 71332 71333 71334 71335 71336 71337 71338 714 7141 7142 7143 7144 7145 81 811 812 8121 Lei penal em relação às pessoas Introdução Imunidades diplomáticas e de chefes de governos estrangeiros Imunidades parlamentares Alocação Introdução Conceito e finalidade Imunidade material ou inviolabilidade Imunidade formal Pessoas abrangidas pela imunidade Suspensão e renúncia da imunidade Imunidades e estado de sítio Disposições finais acerca da aplicação da lei penal Introdução Eficácia da sentença estrangeira Contagem de prazo Frações não computáveis da pena Legislação especial PARTE II TEORIA GERAL DO CRIME CAPÍTULO 8 CRIME NOÇÕES INTRODUTÓRIAS Conceito de crime Critério material ou substancial Critério legal Crime e contravenção penal outras 8122 813 814 82 83 831 8311 832 84 91 911 912 913 914 915 916 917 918 919 9110 distinções Conceito legal de crime e o art 28 da Lei 113432006 Lei de Drogas Critério analítico Critério adotado pelo Código Penal Ilícito penal e outros ilícitos Sujeitos do crime Sujeito ativo A pessoa jurídica como sujeito ativo de crimes Sujeito passivo Objeto do crime CAPÍTULO 9 CLASSIFICAÇÃO DOS CRIMES Introdução Crimes comuns próprios e de mão própria Crimes simples e complexos Crimes materiais formais e de mera conduta Crimes instantâneos permanentes de efeitos permanentes e a prazo Crimes unissubjetivos plurissubjetivos e eventualmente coletivos Crimes de subjetividade passiva única e de dupla subjetividade passiva Crimes de dano e de perigo Crimes unissubsistentes e plurissubsistentes Crimes comissivos omissivos e de conduta mista Crimes de forma livre e de forma vinculada 9111 9112 9113 9114 9115 9116 9117 9118 9119 91191 91192 91193 91194 91195 91196 91197 91198 91199 911910 911911 911912 911913 911914 Crimes monoofensivos e pluriofensivos Crimes principais e acessórios Crimes transeuntes e não transeuntes Crimes à distância plurilocais e em trânsito Crimes independentes e conexos Crimes condicionados e incondicionados Crimes naturais plásticos e vazios Crimes de mínimo de menor de médio de elevado e de máximo potencial ofensivo Outras classificações Crime gratuito Crime de ímpeto Crime exaurido Crime de circulação Crime de atentado ou de empreendimento Crime de opinião ou de palavra Crime multitudinário Crime vago Crime internacional Crime de mera suspeita sem ação ou de mera posição Crime inominado Crime habitual Crime profissional Quasecrime 911915 911916 911917 911918 911919 911920 911921 911922 911923 911924 911925 911926 911927 911928 911929 911930 911931 911932 911933 911934 911935 911936 Crime subsidiário Crime hediondo Crime de expressão Crime de intenção ou de tendência interna transcendente Crime de tendência ou de atitude pessoal Crime mutilado de dois atos ou tipos imperfeitos de dois atos Crime de ação violenta Crime de ação astuciosa Crime falho Crime putativo imaginário ou erroneamente suposto Crime remetido Crimes de responsabilidade Crime obstáculo Crime progressivo Progressão criminosa Crimes de impressão Crimes militares Crimes falimentares Crimes funcionais ou delicta in officio Crimes parcelares Crimes de hermenêutica Crimes de rua crimes do colarinho branco e do colarinho azul 911937 911938 911939 911940 911941 911942 101 102 1021 1022 1023 1024 1025 1026 1027 1028 1029 10210 10211 103 1031 1032 1033 104 Crime liliputiano Crimes de catálogo Crimes de acumulação ou crimes de dano cumulativo Crimes de olvido Crimes aberrantes Crime achado CAPÍTULO 10 FATO TÍPICO Introdução Conduta Teoria clássica naturalística mecanicista ou causal Teoria final ou finalista Teoria cibernética Teoria social Teoria jurídicopenal Teoria da ação significativa Apontamentos gerais sobre a conduta Formas de conduta Teorias acerca da omissão Caracteres da conduta Exclusão da conduta Resultado Conceito Denominação Espécies Relação de causalidade ou nexo causal 1041 1042 1043 1044 1045 10451 1046 10461 10462 1047 10471 10472 10473 10474 10475 1048 1049 10491 10492 10493 10494 10495 105 1051 Denominação Dispositivo legal Conceito Âmbito de aplicação Teorias Teorias adotadas pelo Código Penal Concausas Introdução Causas dependentes e independentes Relevância da omissão Conceito e alcance Teoria adotada Dever de agir critérios existentes para sua definição Poder de agir Hipóteses de dever de agir A questão da dupla causalidade Teoria da imputação objetiva Evolução histórica Introdução Conceito e análise dos pressupostos A imputação objetiva para Jakobs e Roxin Conclusões Tipicidade Conceito 1052 10521 1053 1054 1055 111 112 113 114 1141 1142 1143 1144 1145 115 1151 116 1161 1162 1163 1164 1165 1166 Evolução doutrinária Tipicidade como indício da ilicitude e o art 386 inc VI do Código de Processo Penal Teoria dos elementos negativos do tipo Teoria da tipicidade conglobante Adequação típica conceito e espécies CAPÍTULO 11 TEORIA DO TIPO Conceito Espécies Tipo legal Funções do tipo legal Função de garantia Função fundamentadora Função indiciária da ilicitude Função diferenciadora do erro Função seletiva Estrutura do tipo legal Elementos modais Classificação doutrinária do tipo legal Tipo normal e tipo anormal Tipo fundamental e tipo derivado Tipo fechado e tipo aberto Tipo de autor e tipo de fato Tipo simples e tipo misto Tipo congruente e tipo incongruente 1167 1168 121 122 1221 123 124 125 1251 12511 1252 1253 1254 1255 1256 1257 1258 1259 126 127 131 132 133 Tipo complexo Tipo preventivo CAPÍTULO 12 CRIME DOLOSO Introdução Teorias do dolo Teorias adotadas pelo Código Penal Elementos do dolo Dolo natural e dolo normativo Espécies de dolo Dolo direto e dolo indireto Dolo eventual e os crimes de trânsito Dolus bonus e dolus malus Dolo de propósito e dolo de ímpeto ou repentino Dolo genérico e dolo específico Dolo presumido Dolo de dano e dolo de perigo Dolo de primeiro grau e dolo de segundo grau Dolo geral por erro sucessivo ou dolus generalis Dolo antecedente dolo atual e dolo subsequente O dolo nas contravenções penais Prova do dolo e teoria dos indicadores externos CAPÍTULO 13 CRIME CULPOSO Introdução Fundamento da punibilidade da culpa Conceito de crime culposo 134 1341 1342 13421 13422 1343 1344 1345 1346 1347 135 1351 1352 1353 1354 136 137 138 139 1310 141 142 143 144 Elementos do crime culposo Conduta voluntária Violação do dever objetivo de cuidado Apontamentos gerais Modalidades de culpa Resultado naturalístico involuntário Nexo causal Tipicidade Previsibilidade objetiva Ausência de previsão Espécies de culpa Culpa inconsciente e culpa consciente Culpa própria e culpa imprópria Culpa mediata ou indireta Culpa presumida Graus de culpa Compensação de culpas Concorrência de culpas Caráter excepcional do crime culposo Exclusão da culpa CAPÍTULO 14 CRIME PRETERDOLOSO Conceito Relação entre dolo e culpa Versari in re illicita Crimes qualificados pelo resultado 151 152 153 154 1541 155 156 157 158 159 1591 1510 15101 15102 15103 15104 15105 151051 15106 151061 1511 161 162 CAPÍTULO 15 ERRO DE TIPO Introdução Previsão legal Erro e ignorância distinção e tratamento Conceito Erro de tipo e crimes omissivos impróprios Espécies Efeitos Erro de tipo e crime putativo por erro de tipo Descriminantes putativas Erro determinado por terceiro Erro determinado por terceiro e concurso de pessoas Erro de tipo acidental Erro sobre a pessoa ou error in persona Erro sobre o objeto Erro sobre as qualificadoras Erro sobre o nexo causal ou aberratio causae Erro na execução ou aberratio ictus Espécies de erro na execução Resultado diverso do pretendido aberratio delicti ou aberratio criminis Espécies Gráfico conclusivo CAPÍTULO 16 ITER CRIMINIS Conceito Fase interna cogitação 163 1631 1632 1633 1634 164 171 172 173 174 175 176 177 1771 178 179 1710 17101 17102 17103 17104 1711 Fase externa Preparação Execução Transição dos atos preparatórios para os atos executórios Consumação O exaurimento CAPÍTULO 17 TENTATIVA Dispositivo legal Conceito Denominação Elementos Natureza jurídica Teorias sobre a punibilidade da tentativa Teoria adotada pelo Código Penal Critério para diminuição da pena Tentativa e crimes de competência dos Juizados Especiais Criminais Tentativa e diminuição da pena no Código Penal Militar Espécies de tentativa Tentativa branca ou incruenta Tentativa cruenta ou vermelha Tentativa perfeita acabada ou crime falho Tentativa imperfeita inacabada ou tentativa propriamente dita Tentativa e crimes de ímpeto 1712 1713 1714 181 182 183 184 185 186 187 188 189 1810 1811 1812 1813 1814 191 192 193 194 Tentativa e dolo eventual Inadmissibilidade da tentativa Crimes punidos somente na forma tentada CAPÍTULO 18 DESISTÊNCIA VOLUNTÁRIA E ARREPENDIMENTO EFICAZ Dispositivo legal Distinção com a tentativa Fundamento Natureza jurídica Desistência voluntária Arrependimento eficaz Requisitos Motivos Efeito Incompatibilidade com os crimes culposos Adiamento da prática do crime Comunicabilidade da desistência voluntária e do arrependimento eficaz Tentativa qualificada Desistência voluntária arrependimento eficaz e Lei de Terrorismo CAPÍTULO 19 ARREPENDIMENTO POSTERIOR Conceito Alocação do instituto Natureza jurídica Extensão do benefício 195 196 197 198 199 1910 19101 19102 19103 19104 201 202 203 204 205 206 207 2071 2072 2073 211 212 Fundamentos Requisitos Comunicabilidade do arrependimento posterior no concurso de pessoas Critério para redução da pena Recusa do ofendido em aceitar a reparação do dano ou a restituição da coisa Dispositivos especiais acerca da reparação do dano Peculato culposo Juizados Especiais Criminais Apropriação indébita previdenciária Súmula 554 do Supremo Tribunal Federal CAPÍTULO 20 CRIME IMPOSSÍVEL Conceito Natureza jurídica Teorias sobre o crime impossível Espécies de crime impossível Momento adequado para aferição da inidoneidade absoluta Aspectos processuais inerentes ao crime impossível Crime putativo e crime impossível Conceito de crime putativo Espécies de crime putativo Diferença entre crime impossível e crime putativo CAPÍTULO 21 ILICITUDE Conceito Ilicitude formal e ilicitude material 213 214 215 216 217 218 219 2191 2192 2193 2194 2195 21951 2196 21961 2197 2198 221 222 223 224 225 Concepção unitária Terminologia Ilícito e injusto Ilicitude genérica e ilicitude específica Ilicitude objetiva e ilicitude subjetiva Ilicitude penal e ilicitude extrapenal Causas de exclusão da ilicitude Introdução Nomenclatura Previsão legal Elementos objetivos e subjetivos das causas de exclusão da ilicitude Causas de exclusão da ilicitude e aspectos processuais Prisão provisória e as inovações promovidas pela Lei 124032011 Causas supralegais de exclusão da ilicitude Consentimento do ofendido Descriminante em branco ou excludente da ilicitude em branco Visão geral CAPÍTULO 22 ESTADO DE NECESSIDADE Dispositivo legal Conceito Natureza jurídica Teorias Requisitos 2251 22511 22512 22513 22514 2252 22521 22522 226 227 2271 2272 2273 2274 228 229 2210 2211 2212 2213 231 232 Situação de necessidade Perigo atual Perigo não provocado voluntariamente pelo agente Ameaça a direito próprio ou alheio Ausência do dever legal de enfrentar o perigo Fato necessitado Inevitabilidade do perigo por outro modo Proporcionalidade Causa de diminuição da pena Espécies de estado de necessidade Quanto ao bem sacrificado Quanto à titularidade do bem jurídico preservado Quanto à origem da situação de perigo Quanto ao aspecto subjetivo do agente Estado de necessidade recíproco Casos específicos de estado de necessidade Comunicabilidade do estado de necessidade Estado de necessidade e crimes permanentes e habituais Estado de necessidade e erro na execução Estado de necessidade e dificuldades econômicas CAPÍTULO 23 LEGÍTIMA DEFESA Fundamento Dispositivo legal 233 234 2341 2342 2343 2344 2345 235 236 237 2371 2372 2373 2374 2375 2376 238 239 2310 2311 2312 2313 2314 2315 Natureza jurídica e conceito Requisitos legais Agressão injusta Agressão atual ou iminente Agressão a direito próprio ou alheio Reação com os meios necessários Uso moderado dos meios necessários Legítima defesa e vingança Desafio e legítima defesa Espécies de legítima defesa Quanto à forma de reação Quanto à titularidade do bem jurídico protegido Quanto ao aspecto subjetivo de quem se defende Legítima defesa da honra Legítima defesa presumida Legítima defesa sucessiva Legítima defesa contra a multidão Legítima defesa contra pessoa jurídica Legítima defesa nas relações familiares Legítima defesa e aberratio ictus Legítima defesa de terceiro e consentimento do ofendido Diferença entre estado de necessidade e legítima defesa Existência simultânea de legítima defesa e de estado de necessidade Legítima defesa e relação com outras excludentes admissibilidade 2316 2317 241 242 243 244 245 246 247 248 249 251 252 253 254 255 256 257 258 259 2510 2511 Legítima defesa e relação com outras excludentes inadmissibilidade Legítima defesa e desobediência civil distinção CAPÍTULO 24 ESTRITO CUMPRIMENTO DE DEVER LEGAL Dispositivo legal Natureza jurídica Conceito Fundamento Dever legal Destinatários da excludente Limites da excludente Estrito cumprimento de dever legal e crimes culposos Comunicabilidade da excludente da ilicitude CAPÍTULO 25 EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO Dispositivo legal Natureza jurídica Conceito Limites da excludente Costumes Distinções entre estrito cumprimento de dever legal e exercício regular de direito Lesões em atividades esportivas Intervenções médicas ou cirúrgicas Ofendículas Meios mecânicos predispostos de defesa da propriedade Exercício regular dE direito e utilização de cadáver para estudos 261 262 263 264 2641 2642 265 266 271 272 273 274 275 2751 2752 2753 276 277 278 279 2791 2710 e pesquisas científicas CAPÍTULO 26 EXCESSO Introdução Dispositivo legal e alcance Conceito Espécies Doloso culposo acidental ou exculpante Intensivo e extensivo Legítima defesa e excesso Exemplo de quesitos em crime de competência do Tribunal do Júri incluindo o excesso CAPÍTULO 27 CULPABILIDADE Introdução Conceito Culpabilidade pelo fato Fundamento da culpabilidade Evolução do conceito de culpabilidade Teoria psicológica Teoria normativa ou psicológiconormativa Teoria normativa pura Teoria adotada pelo Código Penal Teoria funcional da culpabilidade Tipo positivo e tipo negativo de culpabilidade Coculpabilidade Coculpabilidade às avessas Culpabilidade formal e culpabilidade material 2711 2712 281 282 283 284 285 286 2861 2862 2863 2864 287 2871 288 289 2810 2811 2812 28121 28122 28123 28124 28125 Graus de culpabilidade Dirimentes CAPÍTULO 28 IMPUTABILIDADE PENAL Introdução Conceito Momento para constatação da imputabilidade Sistemas ou critérios para identificação da inimputabilidade Causas de inimputabilidade Menoridade Menor de 18 anos de idade e a emancipação civil Redução da maioridade penal Crimes permanentes e superveniência da maioridade penal Menoridade penal e crimes militares Inimputabilidade por doença mental Doente mental e intervalos de lucidez Inimputabilidade por desenvolvimento mental incompleto Inimputabilidade por desenvolvimento mental retardado A perícia médica Efeitos da inimputabilidade Imputabilidade diminuída ou restrita Dispositivo legal Nomenclatura Conceito Sistema adotado Natureza jurídica 28126 2813 28131 28132 28133 28134 28135 28136 28137 28138 2814 28141 28142 28143 28144 28145 281451 281452 28146 28147 281471 28148 291 Efeitos Emoção e paixão Apontamento histórico Introdução e critério utilizado pelo Código Penal Emoção e paixão conceitos e distinções Efeitos Emoção e paixão patológicas Espécies Disposições especiais no Código Penal A questão do homicídio passional Embriaguez Conceito Denominação Embriaguez crônica ou patológica ou alcoolismo crônico Períodos fases ou etapas da embriaguez Espécies de embriaguez Quanto à intensidade Quanto à origem Embriaguez acidental completa e medida de segurança Prova da embriaguez Prova da embriaguez e o Código de Trânsito Brasileiro A teoria da actio libera in causa CAPÍTULO 29 POTENCIAL CONSCIÊNCIA DA ILICITUDE Introdução 292 293 294 2941 29411 29412 29413 29414 29415 29416 29417 29418 29419 301 302 3021 3022 303 3031 Evolução Critérios para determinação do objeto da consciência da ilicitude Exclusão Erro de proibição Introdução Desconhecimento da lei ignorantia legis Conceito de erro de proibição Efeitos escusável e inescusável Critérios para identificação da escusabilidade ou inescusabilidade do erro de proibição Espécies de erro de proibição direto indireto e mandamental Erro de proibição e crime putativo por erro de proibição Diferença entre erro de tipo e erro de proibição O erro de tipo que incide sobre a ilicitude do fato CAPÍTULO 30 EXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA Conceito Causas supralegais de exclusão da culpabilidade Origem histórica Situação atual admissibilidade e fundamentos Coação moral irresistível Dispositivo legal e incidência 3032 3033 3034 3035 304 3041 3042 3043 3044 3045 311 312 313 314 3141 3142 3143 3144 3145 315 3151 3152 316 317 Fundamento Requisitos Efeitos Temor reverencial Obediência hierárquica Dispositivo legal Conceito Fundamentos Requisitos Efeitos CAPÍTULO 31 CONCURSO DE PESSOAS Tratamento legislativo Denominação Conceito Requisitos Pluralidade de agentes culpáveis Relevância causal das condutas para a produção do resultado Vínculo subjetivo Unidade de infração penal para todos os agentes Existência de fato punível Autoria Teorias Teoria adotada pelo Código Penal Punibilidade no concurso de pessoas Cooperação dolosamente distinta 318 3181 31811 31812 31813 31814 31815 31816 31817 31818 31819 3182 31821 31822 31823 31824 31825 31826 31827 31828 31829 319 3191 Modalidades de concurso de pessoas coautoria e participação Coautoria Coautoria crimes próprios e crimes de mão própria O executor de reserva Coautoria sucessiva Coautoria em crimes omissivos A autoria mediata Autoria por determinação Autoria de escritório A teoria do domínio da organização Autoria por convicção Participação Espécies Punição do partícipe teorias da acessoriedade Participação de menor importância Participação impunível Participação por omissão Conivência Participação sucessiva Participação em cadeia ou participação da participação Participação em ação alheia Circunstâncias incomunicáveis o art 30 do Código Penal Distinção entre elementares e circunstâncias 3192 3193 3194 3195 3110 3111 31111 31112 31113 3112 31121 3113 31131 31132 321 322 323 324 3241 3242 3243 Espécies de elementares e de circunstâncias Condições de caráter pessoal As regras do art 30 do Código Penal Elementares personalíssimas e a questão do estado puerperal no infanticídio O excesso no mandato criminal Questões diversas Autoria colateral Autoria incerta Autoria desconhecida Concurso de pessoas crimes de autoria coletiva e denúncia genérica Concurso de pessoas e crimes de autoria coletiva Concurso de pessoas e crimes culposos Coautoria e crimes culposos Participação e crimes culposos PARTE III TEORIA GERAL DA PENA CAPÍTULO 32 PENA ASPECTOS GERAIS Sanção penal Conceito Princípios Teorias e finalidades Teoria absoluta e finalidade retributiva Teoria relativa e finalidades preventivas Teoria mista ou unificadora e dupla finalidade 3244 325 326 327 328 3281 3282 3283 329 3210 3211 3212 331 332 333 334 3341 3342 335 336 retribuição e prevenção Teoria agnóstica Função social da pena Fundamentos da pena Cominação das penas Classificação das penas Quanto ao bem jurídico do condenado atingido pela pena Quanto ao critério constitucional Quanto ao critério adotado pelo Código Penal Abolicionismo penal Justiça restaurativa Justiça negociada Teoria das janelas quebradas Broken windows theory CAPÍTULO 33 PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE Conceito Espécies Regimes penitenciários Fixação do regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade Regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade e crimes hediondos ou equiparados Tráfico de drogas privilegiado e Lei dos Crimes Hediondos Competência para execução da pena privativa de liberdade Jurisdicionalização da execução penal 337 338 339 3310 3311 3312 3313 3314 33141 33142 33143 33144 33145 33146 33147 33148 33149 331410 331411 Pena de reclusão Pena de detenção Pena de prisão simples Diferenças entre reclusão e detenção Penabase aplicada no mínimo legal e regime prisional mais rigoroso Impossibilidade de modificação pelo juízo da execução do regime prisional equivocadamente fixado na decisão condenatória Obrigatoriedade de prévia execução das penas mais graves Progressão de regimes Progressão especial para mulher gestante ou que for mãe ou responsável por crianças ou pessoas com deficiência Proibição da progressão por saltos Progressão e crimes contra a Administração Pública Progressão e crimes hediondos ou equiparados Requisito temporal para progressão em caso de execução conjunta por crime hediondo e crime comum Progressão e nova condenação Processamento do pedido de progressão Progressão e prática de falta grave Progressão e habeas corpus Progressão e vinculação com o crime organizado Progressão de regime prisional condenado estrangeiro e processo de expulsão em trâmite 331412 331413 331414 331415 3315 33151 33152 33153 3316 33161 33162 331621 331622 331623 331624 331625 331626 33163 33164 Progressão de regime e prisão em unidade militar Progressão de regime colaboração premiada e Lei do Crime Organizado Progressão de regime e cumprimento da pena em penitenciária federal de segurança máxima Progressão de regime custódia cautelar e termo inicial Regressão Regressão por saltos Regressão a regime mais grave do que o fixado na sentença condenatória Regressão cautelar Execução provisória Execução provisória de réu preso Execução provisória de réu solto Introdução A execução provisória da pena no direito comparado A relatividade da presunção de inocência Presunção de inocência versus efetividade da Justiça penal As vantagens proporcionadas pela execução provisória Análise do art 283 do Código de Processo Penal Execução provisória de pena aplicada em ação penal originária Execução provisória da pena imposta pelo Tribunal do Júri 33165 33166 33167 3317 33171 33172 331721 331722 3318 33181 33182 3319 33191 33192 3320 33201 33202 33203 332031 332032 332033 Execução provisória da pena e desaforamento Execução provisória de penas restritivas de direitos Execução provisória e prisão especial Autorizações de saída Permissão de saída Saída temporária Saída temporária e monitoração eletrônica Saídas temporárias automatizadas Regras do regime fechado Local de cumprimento da pena Regime Disciplinar Diferenciado RDD Regras do regime semiaberto Falta de colônia agrícola ou industrial e cumprimento da pena em estabelecimento adequado Regime semiaberto e recurso da defesa Regras do regime aberto Regime aberto e prestação de serviços à comunidade Legislação local Prisão albergue domiciliar Prisão albergue domiciliar e prisão domiciliar distinção Habeas corpus coletivo gestantes e mães presas preventivamente e substituição por prisão domiciliar Prisão domiciliar e monitoração eletrônica 332034 33204 3321 3322 3323 33231 33232 3324 33241 33242 332421 332422 33243 33244 33245 3325 33251 3326 3327 33271 33272 Monitoração eletrônica e Resolução CNPCP nº 052015 Regime aberto e crimes militares A súmula vinculante 56 aplicabilidade aos regimes semiaberto e aberto Tabela comparativa entre os regimes Regime especial Execução penal mães presas e filhos recémnascidos Proibição ou não de revista íntima Direitos do preso A questão da visita íntima Limitação ao uso de algemas Uso de algemas pela polícia para apresentação do preso à imprensa Proibição de algemas durante o trabalho de parto A separação dos presos nos estabelecimentos penais Obras emergenciais em presídios a reserva do possível e a separação dos Poderes do Estado Superlotação carcerária e responsabilidade civil do Estado Trabalho do preso Política Nacional de Trabalho no sistema prisional Legislação especial Remição Remição pelo trabalho Remição pelo estudo 33273 33274 33275 33276 3328 33281 33282 33283 33284 33285 33286 341 342 343 344 3441 345 346 347 348 Regras comuns à remição Cumulatividade da remição pelo trabalho e pelo estudo Falta grave e perda dos dias remidos Ausência de trabalho ou de estudo por falta de condições no estabelecimento penal Detração penal Competência para aplicação da detração penal e reflexos no regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade Detração penal e penas restritivas de direitos Detração penal e pena de multa Detração penal e suspensão condicional da execução da pena privativa de liberdade sursis Detração penal e prescrição Detração penal e prisão provisória em outro processo CAPÍTULO 34 APLICAÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE Conceito Pressuposto Sistemas ou critérios para aplicação da pena Elementares e circunstâncias Classificação das circunstâncias Agravantes genéricas e causas de aumento da pena Causas de aumento da pena e qualificadoras Atenuantes genéricas e causas de diminuição da pena O critério trifásico 349 3491 3492 3493 3494 3495 3496 3497 3498 3410 34101 341011 341012 341013 341014 341015 341016 341017 341018 341019 3410110 3410111 A primeira fase da dosimetria da pena fixação da penabase Culpabilidade Antecedentes Conduta social Personalidade do agente Motivos do crime Circunstâncias do crime Consequências do crime Comportamento da vítima A segunda fase da dosimetria da pena atenuantes e agravantes Reincidência art 61 I do CP Introdução Conceito Requisitos Natureza jurídica Prova da reincidência Espécies Validade da condenação anterior para fins de reincidência Extinção da punibilidade do crime anterior Terminologias reincidente primário e tecnicamente primário Efeitos da reincidência Crimes militares próprios crimes políticos e a reincidência 3410112 3410113 34102 341021 341022 341023 341024 341025 341026 341027 341028 Reincidência e maus antecedentes Reconhecimento equivocado da reincidência prejuízo ao réu e indenização pelo erro judiciário Ter o agente cometido o crime art 61 II do CP Por motivo fútil ou torpe alínea a Para facilitar ou assegurar a execução a ocultação a impunidade ou a vantagem de outro crime alínea b À traição de emboscada ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificultou ou tornou impossível a defesa do ofendido alínea c Com emprego de veneno fogo explosivo tortura ou outro meio insidioso ou cruel ou de que possa resultar perigo comum alínea d Contra descendente ascendente irmão ou cônjuge alínea e Com abuso de autoridade ou prevalecendose de relações domésticas de coabitação ou de hospitalidade ou com violência contra a mulher na forma da lei específica alínea f Com abuso de poder ou violação de dever inerente a cargo ofício ministério ou profissão alínea g Contra criança maior de 60 sessenta anos enfermo ou mulher grávida alínea h 341029 3410210 3410211 34103 341031 341032 341033 341034 34104 341041 341042 341043 341044 34105 Quando o ofendido estava sob a imediata proteção da autoridade alínea i Em ocasião de incêndio naufrágio inundação ou qualquer calamidade pública ou de desgraça particular do ofendido alínea j Em estado de embriaguez preordenada alínea l Agravantes no concurso de pessoas art 62 do CP Promove ou organiza a cooperação no crime ou dirige a atividade dos demais agentes inciso I Coage ou induz outrem à execução material do crime inciso II Instiga ou determina a cometer o crime alguém sujeito à sua autoridade ou não punível em virtude de condição ou qualidade pessoal inciso III Executa o crime ou nele participa mediante paga ou promessa de recompensa inciso IV Atenuantes genéricas arts 65 e 66 do CP Ser o agente menor de 21 vinte e um na data do fato ou maior de 70 setenta anos na data da sentença inciso I O desconhecimento da lei inciso II Ter o agente inciso III Atenuantes inominadas art 66 do CP Concurso de circunstâncias agravantes e atenuantes 341051 341052 3411 351 352 353 354 355 3551 3552 356 3561 357 358 359 3510 3511 35111 35112 genéricas Concurso entre reincidência e confissão espontânea Concurso entre promessa de recompensa e confissão espontânea A terceira fase da dosimetria da pena causas de diminuição minorantes e de aumento majorantes CAPÍTULO 35 PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS Conceito Espécies Natureza jurídica Duração das penas restritivas de direitos Requisitos Requisitos objetivos Requisitos subjetivos Crimes hediondos e equiparados e penas restritivas de direitos A problemática relacionada ao tráfico de drogas Violência doméstica ou familiar contra a mulher e penas restritivas de direitos Penas restritivas de direitos e crimes militares Momento da substituição Regras da substituição Reconversão obrigatória da pena restritiva de direitos em privativa de liberdade Reconversão da pena restritiva de direitos em privativa de liberdade e princípio da boafé objetiva Impossibilidade de reconversão da pena restritiva de 3512 3513 35131 3514 3515 35151 35152 351521 35153 351531 35154 351541 351542 351543 351544 351545 direitos em privativa de liberdade a pedido do réu Reconversão facultativa da pena restritiva de direitos em privativa de liberdade Início da execução das penas restritivas de direitos Penas restritivas de direitos e execução provisória Política Nacional de Alternativas Penais Penas restritivas de direitos em espécie Classificação Prestação pecuniária Prestação pecuniária e pena de multa distinções Perda de bens e valores Perda de bens e valores e confisco como efeito da condenação distinções Prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas Execução da prestação de serviços à comunidade Prestação de serviços à comunidade e trabalhos forçados Prestação de serviços à comunidade e crimes ambientais Ausência de local adequado para execução da prestação de serviços à comunidade Prestação de serviços à comunidade e crimes previstos no Código de Trânsito Brasileiro 35155 351551 351552 351553 351554 351555 35156 361 362 363 364 365 366 367 368 369 3610 3611 Interdição temporária de direitos Proibição de exercício de cargo função ou atividade pública bem como de mandato eletivo Proibição do exercício de profissão atividade ou ofício que dependam de habilitação especial de licença ou autorização do poder público Suspensão de autorização ou habilitação para dirigir veículo Proibição de frequentar determinados lugares Proibição de inscreverse em concurso avaliação ou exame públicos Limitação de fim de semana CAPÍTULO 36 PENA DE MULTA Conceito Fundo Penitenciário Critério adotado para a pena de multa Aplicação da pena de multa Valor ineficaz da pena de multa Multa excessiva Multa irrisória Pagamento voluntário da multa Execução da pena de multa Causas suspensivas e interruptivas da prescrição da pena de multa Pena de multa e habeas corpus 3612 3613 3614 3615 3616 3617 371 372 373 3731 3732 3733 374 3741 3742 3743 3744 3745 3746 3747 375 3751 Multa e correção monetária Suspensão da execução da multa Multa substitutiva Súmula 171 do Superior Tribunal de Justiça Pena de multa na Lei de Drogas Pena de multa e violência doméstica e familiar contra a mulher CAPÍTULO 37 CONCURSO DE CRIMES Conceito Espécies Sistemas de aplicação da pena no concurso de crimes Sistema do cúmulo material Sistema da exasperação Sistema da absorção Concurso material Conceito e dispositivo legal Espécies Momento adequado para a soma das penas Imposição cumulativa de penas de reclusão e detenção Cumulação de pena privativa de liberdade com restritiva de direitos Cumprimento sucessivo ou simultâneo de penas restritivas de direitos Concurso material e suspensão condicional do processo art 89 da Lei 90991995 Concurso formal Conceito e dispositivo legal 3752 37521 37522 3753 3754 3755 376 3761 3762 3763 3764 37641 37642 37643 37644 37645 37646 37647 3765 3766 3767 3768 3769 37610 377 Espécies Homogêneo e heterogêneo Perfeito e imperfeito Teorias sobre o concurso formal Aplicação da pena no concurso formal Concurso material benéfico Crime continuado Conceito e dispositivo legal Origem histórica Natureza jurídica Requisitos do crime continuado Pluralidade de condutas Pluralidade de crimes da mesma espécie Conexão temporal Conexão espacial Conexão modal Conexão ocasional Crime continuado e unidade de desígnio Espécies de crime continuado e dosimetria da pena Concurso material benéfico Crime continuado e conflito de leis no tempo Crime continuado e prescrição Crime continuado e suspensão condicional do processo Crime continuado e crime habitual diferenças Multa no concurso de crimes 378 3781 3782 3783 3784 381 382 383 384 385 386 391 392 393 394 3941 395 3951 3952 396 397 398 Apontamentos diversos sobre o concurso de crimes Concurso de crimes moderado ou limitado Concurso de concursos de crimes ou concorrência de concursos Concurso de crimes e competência dos Juizados Especiais Criminais Concurso entre crimes e contravenções penais CAPÍTULO 38 LIMITE DAS PENAS Introdução Fundamentos Unificação de penas Competência para unificação das penas Nova condenação e unificação das penas Fuga do réu e cumprimento da pena unificada CAPÍTULO 39 SUSPENSÃO CONDICIONAL DA PENA Origem histórica Sistemas Conceito Natureza jurídica Política Nacional de Alternativas Penais Requisitos Requisitos objetivos Requisitos subjetivos Momento adequado para concessão do sursis Espécies de sursis Condições 399 3910 3911 3912 39121 39122 39123 3913 3914 3915 3916 3917 3918 3919 3920 3921 3922 3923 3924 3925 3926 3927 Sursis incondicionado Período de prova Fiscalização das condições impostas durante o período de prova Revogação Revogação obrigatória Revogação facultativa Revogação do sursis e do livramento condicional Revogação do sursis e prévia oitiva do condenado Revogação obrigatória do sursis pela condenação irrecorrível por crime doloso durante o curso do prazo e término do período de prova Cassação do sursis Sursis sucessivos Sursis simultâneos Prorrogação do período de prova Término do período de prova e possibilidade de sua prorrogação e revogação do benefício Extinção da pena Sursis e crimes hediondos ou equiparados Sursis para estrangeiro Sursis e suspensão dos direitos políticos Sursis e habeas corpus Sursis e detração penal Sursis e indulto Sursis e regime penitenciário CAPÍTULO 40 LIVRAMENTO CONDICIONAL 401 402 403 404 405 406 407 4071 4072 408 409 4010 40101 401011 401012 40102 4011 4012 4013 4014 40141 40142 40143 40144 40145 Evolução histórica Conceito Natureza jurídica Diferenças com o sursis Juízo competente para concessão do livramento condicional Egresso Requisitos Requisitos objetivos Requisitos subjetivos Rito do livramento condicional Condições Revogação do livramento condicional Revogação obrigatória Inciso I Inciso II Revogação facultativa Suspensão do livramento condicional Prorrogação do período de prova Extinção da pena Questões diversas sobre livramento condicional Livramento condicional insubsistente Livramento condicional e habeas corpus Livramento condicional humanitário Livramento condicional cautelar Livramento condicional para estrangeiro 411 412 413 4131 4132 41321 41322 414 4141 4142 4143 4144 4145 4146 4147 4148 415 421 422 423 424 4241 4242 CAPÍTULO 41 EFEITOS DA CONDENAÇÃO Introdução Pressuposto Divisão dos efeitos da condenação Efeitos principais Efeitos secundários Efeitos secundários de natureza penal Efeitos secundários de natureza extrapenal previstos no Código Penal Efeitos da condenação previstos fora do código penal Suspensão dos direitos políticos Rescisão contratual na Justiça do Trabalho Lei de Licitações Lei de Falências Lei de Tortura Lei de Drogas Crimes resultantes de preconceitos de raça e de cor Lavagem de capitais Quadro esquemático CAPÍTULO 42 REABILITAÇÃO Conceito Origem histórica Natureza jurídica Modalidades de reabilitação no Código Penal Sigilo das condenações art 93 caput parte final Efeitos secundários de natureza extrapenal e 42421 42422 42423 425 426 4261 4262 42621 42622 427 428 429 431 432 433 4331 4332 4333 434 435 436 437 específicos da condenação art 93 parágrafo único Perda de cargo função pública ou mandato eletivo Incapacidade para o exercício do pátrio poder da tutela ou da curatela Inabilitação para dirigir veículo Reabilitação e reincidência Pressuposto e requisitos da reabilitação Pressuposto Requisitos Requisitos objetivos Requisitos subjetivos Pedido de reabilitação Revogação da reabilitação Reabilitação e habeas corpus CAPÍTULO 43 MEDIDAS DE SEGURANÇA Conceito Distinções entre pena e medida de segurança Princípios das medidas de segurança Legalidade Anterioridade Jurisdicionalidade Requisitos para aplicação Conceito de periculosidade Espécies de periculosidade Aplicação da medida de segurança 438 439 4310 4311 4312 4313 4314 4315 4316 4317 4318 441 442 443 444 4441 4442 445 4451 44511 44512 44513 44514 4452 Espécies de medidas de segurança Prazo mínimo da medida de segurança Prazo máximo da medida de segurança Execução das medidas de segurança Medida de segurança provisória ou preventiva Conversão do tratamento ambulatorial para internação Desinternação progressiva Conversão da pena em medida de segurança Direitos do internado Medidas de segurança na Lei de Drogas Adolescente infrator e medidas de segurança CAPÍTULO 44 AÇÃO PENAL Introdução Conceito Características Classificação da ação penal Divisão com base na tutela jurisdicional invocada Divisão subjetiva Condições da ação penal Condições genéricas Possibilidade jurídica do pedido Legitimidade ad causam ou legitimidade para agir Interesse processual Justa causa Condições específicas ou condições de 446 4461 4462 4463 44631 44632 447 4471 4472 4473 44731 44732 44733 44734 448 449 4410 451 452 453 procedibilidade Ação penal pública Princípios Ação penal pública incondicionada Ação penal pública condicionada Representação do ofendido e requisição do Ministro da Justiça natureza jurídica Representação do ofendido Ação penal privada Prazo Princípios Espécies Ação penal exclusivamente privada ou ação penal privada propriamente dita Ação penal privada personalíssima Ação penal privada subsidiária da pública Ação penal privada concorrente Ação penal nos crimes complexos Ação penal nos crimes contra a dignidade sexual Ação penal e crime de lesão corporaL praticado com violência doméstica e familiar contra a mulher CAPÍTULO 45 EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE Introdução O art 107 do Código Penal Momento de ocorrência antes ou depois do trânsito em julgado da condenação 454 455 456 4561 4562 45621 45622 45623 4563 4564 45641 45642 45643 4565 45651 45652 4566 4567 4568 4569 45691 45692 45693 Efeitos Extinção da punibilidade nos crimes acessórios complexos e conexos Análise do art 107 do Código Penal Morte do agente inciso I Anistia graça e indulto inciso II Anistia Graça Indulto Abolitio criminis inciso III Prescrição decadência e perempção inciso IV Prescrição Decadência Perempção Renúncia ao direito de queixa ou perdão aceito nos crimes de ação privada inciso V Renúncia ao direito de queixa Perdão aceito Retratação do agente nos casos em que a lei a admite inciso VI Inciso VII Revogado pela Lei 111062005 Inciso VIII Revogado pela Lei 111062005 Perdão judicial inciso IX Introdução Natureza jurídica Aplicabilidade 45694 45695 45696 45697 461 462 463 464 465 466 467 468 469 4691 4692 4610 46101 461011 461012 461013 461014 Incomunicabilidade Natureza jurídica da sentença concessiva do perdão judicial Distinção entre perdão judicial e escusas absolutórias Distinção entre perdão judicial e perdão do ofendido CAPÍTULO 46 PRESCRIÇÃO Introdução Origem histórica Conceito Fundamentos Natureza jurídica Alocação Imprescritibilidade penal Diferenças entre prescrição e decadência Espécies de prescrição Introdução Efeitos da prescrição e competência para sua declaração Prescrição da pena privativa de liberdade Prescrição da pretensão punitiva propriamente dita ou prescrição da ação penal Dispositivo legal Fundamento Cálculo Termo inicial 461015 461016 461017 461018 461019 4610110 4610111 4610112 46102 461021 461022 461023 461024 461025 461026 Termo inicial da prescrição da pretensão punitiva e regra especial da Lei de Falências Causas interruptivas Comunicabilidade das causas interruptivas da prescrição da pretensão punitiva Causa especial de interrupção da prescrição da pretensão punitiva nos crimes falimentares Causas impeditivas Natureza do rol das causas impeditivas e suspensivas previstas no Código Penal Causas impeditivas e suspensivas da prescrição da pretensão punitiva previstas fora do Código Penal Recurso extraordinário com repercussão geral suspensão dos processos pendentes em todo o território nacional e suspensão da prescrição Prescrição superveniente intercorrente ou subsequente Conceito Cálculo Termo inicial Motivos para sua ocorrência Momento adequado para o seu reconhecimento Redução da pena imposta pela sentença 46103 461031 461032 461033 461034 46104 461041 461042 461043 461044 461045 461046 461047 46105 4611 4612 4613 4614 4615 e pendência de recurso da acusação Prescrição retroativa Origem Cálculo Termo inicial Momento adequado para o seu reconhecimento Prescrição da pretensão executória ou prescrição da condenação Conceito Forma de contagem Termo inicial Causas interruptivas Incomunicabilidade das causas interruptivas da prescrição da pretensão executória Causa impeditiva da prescrição da pretensão executória Prescrição da pretensão executória e indulto Prescrição virtual projetada antecipada prognostical ou retroativa em perspectiva Prescrição das penas restritivas de direitos Prescrição e detração penal Prescrição das medidas de segurança Prescrição e absorção de penas Prescrição no concurso de crimes 4616 4617 46171 46172 46173 4618 Prescrição da pena de multa Prescrição na legislação penal especial Lei de Drogas Lei 113432006 Código Penal Militar Decretolei 10011969 Prescrição e Estatuto da Criança e do Adolescente Falta grave na Lei de Execução Penal e prescrição de infração disciplinar BIBLIOGRAFIA PARTE I TEORIA GERAL DO DIREITO PENAL Direito Penal é o conjunto de princípios e regras destinados a combater o crime e a contravenção penal mediante a imposição de sanção penal Na lição de Aníbal Bruno O conjunto das normas jurídicas que regulam a atuação estatal nesse combate contra o crime através de medidas aplicadas aos criminosos é o Direito Penal Nele se definem os fatos puníveis e se cominam as respectivas sanções os dois grupos dos seus componentes essenciais tipos penais e sanções É um Direito que se distingue entre os outros pela gravidade das sanções que impõe e a severidade de sua estrutura bem definida e rigorosamente delimitada1 Cuidase de ramo do Direito Público por ser composto de regras indisponíveis e obrigatoriamente impostas a todas as pessoas Além disso o Estado é o titular exclusivo do direito de punir e figura como sujeito passivo constante nas relações jurídicopenais Discutese em seara doutrinária a terminologia mais adequada Devese falar em Direito Penal ou em Direito Criminal A expressão Direito Penal induz à ideia de pena de um direito inerente exclusivamente à pena Por outro lado Direito Criminal traz à tona um direito relativo ao crime Alegase a insuficiência da denominação Direito Penal uma vez que não abrangeria a medida de segurança uma das espécies de sanção penal Destarte seria mais coerente falar em Direito Criminal mais abrangente porque enfatiza o crime e não diretamente a pena Foi a opção adotada pelo Código Criminal do Império de 1830 Como crime e pena guardam estreita relação ambas as denominações são aceitáveis Contudo é manifesta a preferência por Direito Penal não só no Brasil mas também em outros países2 Atualmente todavia afigurase mais apropriado falar em Direito Penal pois o Decretolei 2848 de 7 de dezembro de 1940 recepcionado pela Constituição Federal de 1988 como lei ordinária instituiu o Código Penal em vigor3 Para Basileu Garcia E forte motivo de ordem prática nos submete ao critério dominante Possuímos um Código Penal não um Código Criminal Deve ser aceito pois para título da matéria o sugerido pela lei positiva4 Se não bastasse a Constituição Federal de 1988 em seu art 22 I adotou também a expressão Direito Penal Sustentava Magalhães Noronha é o Direito Penal ciência cultural normativa valorativa e finalista5 É em primeiro lugar uma ciência Suas regras compõem a dogmática jurídicopenal6 Além disso é cultural pois pertence à classe das ciências do dever ser ao contrário das ciências naturais que cultuam o ser É normativa porque tem como objeto o estudo da lei penal ou seja o Direito positivo Valorativa porque estabelece a sua própria escala de valores a qual varia em conformidade com o fato que lhe dá conteúdo O Direito Penal valoriza hierarquicamente as suas normas Ainda é finalista uma vez que se preocupa com a proteção de bens jurídicos fundamentais Sua missão é prática e não simplesmente teórica ou acadêmica Se não bastasse convém mencionar que o Direito Penal tem natureza constitutiva autônoma autonomista ou originária mas também sancionatória Ou como prefere Zaffaroni é predominantemente sancionador e excepcionalmente constitutivo7 Sancionador porque não cria bens jurídicos mas acrescenta uma proteção penal aos bens jurídicos disciplinados por outras áreas do Direito O Direito Administrativo por exemplo protege os bens públicos mas o Direito Penal cria diversos crimes contra a Administração Pública para reforçar esta tutela Nada obstante pode ser constitutivo ainda que excepcionalmente quando protege interesses não regulados em outras áreas do Direito tais como o uso indevido de drogas indicando a independência do Direito Penal no tocante às demais áreas do Direito Destacase ainda como característica do Direito Penal o seu caráter fragmentário pois não tutela todos os valores ou interesses mas somente os mais importantes para a manutenção e o desenvolvimento do indivíduo e da sociedade A atividade de criminalização desempenhada pelo Estado desenvolvese em duas etapas denominadas respectivamente de criminalização primária e criminalização secundária Criminalização primária é o ato e o efeito de sancionar de uma lei primária material que incrimina ou permite a punição de determinadas pessoas Tratase de ato formal fundamentalmente programático pois quando se estabelece que uma conduta deve ser punida enunciase um programa o qual deve ser cumprido pelos entes estatais polícias Ministério Público Poder Judiciário etc De seu turno criminalização secundária é a ação punitiva exercida sobre pessoas concretas Verificase quando os órgãos estatais detectam um indivíduo a quem se atribui a prática de um ato primariamente criminalizado sobre ele recaindo a persecução penal Para Zaffaroni a criminalização secundária possui duas características seletividade e vulnerabilidade pois há forte tendência de ser o poder punitivo exercido precipuamente sobre pessoas previamente escolhidas em face de suas fraquezas a exemplo dos moradores de rua prostitutas e usuários de drogas8 Este fenômeno guarda íntima relação com o movimento criminológico conhecido como labeling approach teoria da reação social da rotulação social ou do etiquetamento social aqueles que integram a população criminosa são estigmatizados rotulados ou etiquetados como sujeitos contra quem normalmente se dirige o poder punitivo estatal O Direito é uno O ordenamento jurídico com efeito é composto pelo conjunto de normas e princípios em vigor Sua divisão em blocos se dá estritamente para fins didáticos Dessa forma o Direito Penal se relaciona com todos os demais ramos jurídicos Interessamnos contudo somente aqueles mais úteis para o seu estudo técnico e a sua aplicação teórica Vejamos É pelo processo penal que as leis penais se concretizam servindo de suporte para a sua aplicação Praticada uma infração penal cabe ao Estado identificar o seu autor a fim de lhe impor a sanção penal correspondente por meio de regras preestabelecidas as quais compõem o Direito Processual Penal A finalidade precípua do Direito Processual Penal é portanto garantir a efetiva e justa incidência ao caso concreto das leis penais objetivas Com efeito as leis penais mormente as de índole incriminadora somente podem ser aplicadas com respeito ao devido processo legal nulla poena sine judicio CF art 5º LIV Em síntese o processo é o instrumento adequado para o exercício da jurisdição O Direito Penal precisa do direito processual porque este último permite verificar caso a caso se concorrem os requisitos genéricos do fato punível conduta tipicidade antijuricidade culpabilidade e punibilidade assim como os específicos de cada tipo penal9 São tão íntimas as suas relações que o Direito Penal e o Direito Processual Penal disciplinam em conjunto diversas matérias tais como ação penal decadência e reabilitação entre outras Em nosso sistema jurídico os princípios e regras processuais penais estão contidos na Constituição Federal no Código de Processo Penal e na legislação extravagante As regras e princípios constitucionais são os parâmetros de legitimidade das leis penais e delimitam o âmbito de sua aplicação O Direito Penal deve se harmonizar com as liberdades as garantias e os direitos estatuídos pela Constituição Federal pois nela encontram o seu fundamento de validade Dessa forma qualquer lei penal ou não elaborada ou aplicada em descompasso com o texto constitucional não goza de validade Exemplo o art 5º XLVII a da Constituição Federal proíbe em situação de normalidade a pena de morte Consequentemente o Direito Penal não pode criar ou impor a pena capital seja por apelo da população seja a pedido do próprio condenado O Direito Penal desempenha função complementar das normas constitucionais Destarte a tipificação penal do homicídio tem o propósito de resguardar o direito constitucional à vida o crime de calúnia protege a honra e assim por diante Concluise pois que a definição de condutas criminosas é válida apenas quando alberga valores constitucionalmente consagrados É o que se convencionou chamar de teoria constitucionalista do delito Direito Administrativo é o conjunto de normas e princípios que regulam a organização e o funcionamento da Administração Pública bem como as suas relações com os particulares no exercício das atividades de interesse público Os arts 312 a 359 do Código Penal disciplinam os crimes contra a Administração Pública Diversas outras leis também foram editadas para a tutela penal dos interesses da Administração Pública como é o caso da Lei 86661993 Lei de Licitações e da Lei 81371990 Crimes contra a Ordem Tributária O art 327 do Código Penal fornece o conceito de funcionário público para fins penais que não guarda necessária identidade com o conceito apresentado pelo Direito Administrativo Essa relação se evidencia com a tarefa de prevenção e investigação de crimes pelas Polícias bem como com a execução da sanção penal imposta ao condenado em estabelecimentos prisionais missões reservadas à Administração Pública E como lembra Aníbal Bruno Considerese ainda que à proporção que a pena for acentuando a sua finalidade de recuperação social do criminoso mais próximo da ciência da administração irá ficando o Direito Penal10 De outra banda o Direito Administrativo se socorre aos conceitos penais de dolo e culpa nas ocorrências dos ilícitos administrativos Por derradeiro merecem destaque as leis penais em branco heterogêneas em que o preceito primário deve ser complementado por atos administrativos tal como se dá nos crimes previstos na Lei 113432006 Lei de Drogas As leis civis há longa data se relacionam com as leis penais Nas civilizações antigas inclusive confundiamse entre si Separaramse em face da necessidade de especialização na medida em que as sociedades cresceram e se desenvolveram A relação do Direito Penal com o Direito Civil se torna mais nítida quando se trata de crimes contra o patrimônio em que conceitos como propriedade posse detenção e coisa são utilizados pelos dois ramos do Direito Também os crimes contra o casamento dependem de conhecimentos referentes a regras inerentes ao Direito de Família Se não bastasse a diferença entre o Direito Penal e o Direito Civil é de grau e não de essência é dizer se o ato ilícito merecer maior reprimenda por violar interesses indispensáveis ao indivíduo ou à sociedade será cabível a atuação do Direito Penal Se contudo a infração possuir menor gravidade reservase ao Direito Civil a reparação do dano Essa distinção justifica inclusive o princípio da insignificância ou da criminalidade de bagatela Anotese que um mesmo fato pode desencadear a atuação dos dois ramos do Direito Exemplo o crime de dano CP art 163 pode ensejar tanto uma sanção penal como também uma reprimenda civil CC art 186 Falase atualmente em Direito Penal Internacional e em crimes internacionais como corolário do desenvolvimento tecnológico e da globalização fatores modernos que permitem um contato próximo e acelerado entre pessoas que estão espacialmente distantes entre si É o caso do tráfico internacional de armas ou do tráfico internacional de pessoas Essa relação se acentua com o estudo do instituto da extradição pois não raras vezes os criminosos fogem para outro país com a finalidade de evitar a aplicação da lei penal permanecendo na impunidade bem como das imunidades diplomáticas e das penas cumpridas no estrangeiro O Direito Penal não se constitui em disciplina meramente acadêmica Cuidase ao contrário de importante instrumento para a convivência dos homens em sociedade Mas não é só Possui atualmente diversas funções Vejamos as principais O Direito Penal tem como função a proteção de bens jurídicos isto é valores ou interesses reconhecidos pelo Direito e imprescindíveis à satisfação do indivíduo ou da sociedade11 Apenas os interesses mais relevantes são erigidos à categoria de bens jurídicos penais em face do caráter fragmentário e da subsidiariedade do Direito Penal O legislador seleciona em um Estado Democrático de Direito os bens especialmente relevantes para a vida social e por isso mesmo merecedores da tutela penal Dessa forma a noção de bem jurídico acarreta na realização de um juízo de valor positivo acerca de determinado objeto ou situação social e de sua importância para o desenvolvimento do ser humano E para coibir e reprimir as condutas lesivas ou perigosas a bens jurídicos fundamentais a lei penal se utiliza de rigorosas formas de reação quais sejam penas e medidas de segurança A proteção de bens jurídicos é a missão precípua que fundamenta e confere legitimidade ao Direito Penal Em conformidade com a orientação do Superior Tribunal de Justiça O respeito aos bens jurídicos protegidos pela norma penal é primariamente interesse de toda a coletividade sendo manifesta a legitimidade do Poder do Estado para a imposição da resposta penal cuja efetividade atende a uma necessidade social12 Ao Direito Penal é também reservado o controle social ou a preservação da paz pública compreendida como a ordem que deve existir em determinada coletividade Dirigese a todas as pessoas embora nem todas elas se envolvam com a prática de infrações penais Ao contrário apenas a minoria envereda pelo caminho da criminalidade seja por questões morais seja pelo receio de aplicação da lei penal Essa função embora relevante não tem se mostrado plenamente eficaz13 Por mais paradoxal que possa parecer o Direito Penal tem a função de garantia De fato funciona como um escudo aos cidadãos uma vez que só pode haver punição caso sejam praticados os fatos expressamente previstos em lei como infração penal Por esse motivo Franz von Liszt dizia o Código Penal é a Magna Carta do delinquente Também conhecida como função criadora ou configuradora dos costumes tem origem na estreita vinculação existente tradicionalmente entre a matéria penal e os valores éticos fundamentais de uma sociedade Buscase um efeito moralizador almejando assegurar um mínimo ético que deve reinar em toda a comunidade Sua atuação prática é indiscutível É o caso das leis penais sobre crimes fiscais e contra o meio ambiente as quais sem dúvida alguma contribuíram para criar uma conscientização e reprovação moral e social acerca destes comportamentos O Direito Penal desempenha a função educativa em relação aos cidadãos fomentando valores éticosociais mesmo no tocante a bens que ainda não tenham sido assumidos pela sociedade como fundamentais Discutese em doutrina se o Estado tem legitimidade para proceder a tarefas educativas com o emprego do Direito Penal em face do radicalismo da intervenção punitiva Prevalece o entendimento de que o Estado deve educar seus cidadãos mas não com o emprego do Direito Penal pois a maturidade moral se alcança pela interação social e não com estruturas autoritárias de coação A função simbólica é inerente a todas as leis não dizendo respeito somente às de cunho penal Não produz efeitos externos mas somente na mente dos governantes e dos cidadãos Em relação aos primeiros acarreta a sensação de terem feito algo para a proteção da paz pública No tocante aos últimos proporciona a falsa impressão de que o problema da criminalidade se encontra sob o controle das autoridades buscando transmitir à opinião pública a impressão tranquilizadora de um legislador atento e decidido Manifestase comumente no direito penal do terror que se verifica com a inflação legislativa Direito Penal de emergência criandose exageradamente figuras penais desnecessárias ou então com o aumento desproporcional e injustificado das penas para os casos pontuais hipertrofia do Direito Penal A função simbólica deve ser afastada pois em curto prazo cumpre funções educativas e promocionais dos programas de governo tarefa que não pode ser atribuída ao Direito Penal Além disso em longo prazo resulta na perda de credibilidade do ordenamento jurídico bloqueando as suas funções instrumentais Como pontuado por Ney Moura Teles querer combater a criminalidade com o Direito Penal é querer eliminar a infecção com analgésico14 O Direito Penal motiva os indivíduos a não violarem suas normas mediante a ameaça de imposição cogente de sanção na hipótese de ser lesado ou colocado em perigo determinado bem jurídico É como se as leis penais dissessem não matar não roubar não furtar etc O Direito Penal moderno apresenta uma nova finalidade qual seja a de reduzir ao mínimo a própria violência estatal já que a imposição de pena embora legítima representa sempre uma agressão aos cidadãos Destarte devese buscar de forma constante a incriminação de condutas somente nos casos estritamente necessários em homenagem ao direito à liberdade constitucionalmente reservado a todas as pessoas15 Para essa teoria o Direito Penal não deve se preocupar em manter os valores da sociedade em que se insere Ao revés destinase a atuar como instrumento de transformação social Não deve o Direito Penal constituirse em empecilho ao progresso e sim em ferramenta que auxilie a dinamizar a ordem social e promover as mudanças estruturais necessárias para a evolução da comunidade O crime o criminoso e a sanção penal são objeto de estudo de diversas ciências também denominadas enciclopédia de ciências penais16 Não há consenso em doutrina sobre o número e a variedade dessas ciências penais pois se discute o caráter autônomo de cada uma delas Por tal motivo e também por serem as mais importantes para provas e concursos públicos estudaremos a dogmática a criminologia e a política criminal A palavra dogmática deriva de dogma pois para o intérprete os princípios e regras ordenados metodicamente pelo Direito Penal são normas absolutas a que deve se vincular A dogmática penal tem a missão de conhecer o sentido das normas e princípios jurídicopenais positivos e desenvolver de modo sistemático o conteúdo do Direito Penal Tem as normas positivas como ponto de partida para solução dos problemas O direito é parte componente da cultura humana e deve ser interpretado de modo que lhe permita cumprir as tarefas éticas sociais e econômicas da atualidade Nesse sentido a dogmática penal é a interpretação sistematização e aplicação lógicoracional do Direito Penal Não deve entretanto ser confundida com o dogmatismo é dizer aceitação cega e sem críticas de uma verdade absoluta e imutável incompatível com a própria ideia de ciência Cuidase de ciência independente que tem por objeto a apresentação de críticas e propostas para a reforma do Direito Penal em vigor Para Basileu Garcia constitui uma ponte entre a teoria jurídicopenal e a realidade17 Visa a análise crítica e metajurídica do direito positivo no sentido de ajustálo aos ideais jurídicopenais e de justiça Encontrase intimamente relacionada com a dogmática uma vez que na interpretação e aplicação da lei penal interferem critérios de política criminal Baseiase em considerações filosóficas sociológicas e políticas e também de oportunidade em sintonia com a realidade social para propor modificações no sistema penal vigente As leis penais são frutos de uma determinada vontade política manifestada pelos cidadãos por intermédio de seus representantes junto aos Poderes do Estado Na instituição ou adoção de princípios e regras refletidas pelo sistema penal de um povo estão as marcas sensíveis de sua civilização e cultura razão pela qual podese falar em leis que pegam e leis que não pegam como demonstração da afinidade ou do divórcio entre os interesses dos indivíduos e a vontade do Estado A política criminal é o filtro para revelar esses fenômenos Para Franz von Liszt compete à Política Criminal fornecer e avaliar os critérios para se apreciar o valor do Direito vigente e revelar qual deve vigorar Cabe também a ela ensinarnos a compreender o Direito à luz de considerações extraídas dos fins a que ele se dirige e a aplicálo nos casos singulares em atenção a esses fins Em suma essa ciência analisa de forma crítica a dinâmica dos fatos sociais e comparandoa com o sistema penal vigente propõe inclusões exclusões ou mudanças visando atender o ideal de justiça colaborando pois com a Dogmática Penal Para Antonio GarcíaPablos de Molina a criminologia é uma ciência empírica e interdisciplinar que se ocupa do estudo do crime da pessoa do infrator da vítima e do controle social do comportamento delitivo e trata de ministrar uma informação válida e contrastada sobre a gênese dinâmica e variações principais do crime contemplandoo como problema individual e social assim como sobre os programas para sua prevenção especial as técnicas de intervenção positiva no homem delinquente e os diversos modelos ou sistemas de resposta ao delito18 Ocupase das circunstâncias humanas e sociais relacionadas com o surgimento a prática e a maneira de evitar o crime assim como do tratamento dos criminosos Para a maioria dos autores Lombroso foi o fundador da criminologia moderna19 O Direito Penal se dedica ao estudo das consequências jurídicas do delito A Criminologia por seu turno preocupase com os aspectos sintomáticos individuais e sociais do crime e da criminalidade isto é aborda cientificamente os fatores que podem conduzir o homem ao crime Ao fornecer informações sobre o delinquente o delito a vítima e o controle social objetos da Criminologia ela contribui com o estudo das causas do crime O Direito Penal é uma disciplina normativa que declara o que deve ser Por sua vez a Criminologia é uma ciência empírica que estuda o que é Engloba o conjunto de normas e princípios gerais aplicáveis inclusive às leis penais especiais desde que estas não possuam disposição expressa em sentido contrário art 12 do Código Penal É composto pelas normas da Parte Geral do Código Penal e excepcionalmente por algumas de amplo conteúdo previstas na Parte Especial como é o caso do conceito de domicílio art 150 4º e 5º e de funcionário público art 327 Essa denominação amplamente aceita pela doutrina já foi utilizada inclusive pelo Superior Tribunal de Justiça O Direito Penal reúne o Código Penal e as leis especiais O Código por sua vez é a matriz dessa área jurídica denominado por isso de direito penal fundamental válido para todo o Direito Penal a não ser que lei especial disponha diferentemente20 É o conjunto de normas que integram o acervo da legislação penal extravagante Exemplos Lei 94551997 crimes de tortura Lei 81371990 crimes de sonegação fiscal Lei 48981965 crimes de abuso de autoridade Lei 74921986 crimes contra o sistema financeiro nacional entre tantas outras Aplicase indistintamente a todas as pessoas É o caso do Código Penal e também de diversas leis especiais tais como o Decretolei 36881941 Lei das Contravenções Penais a Lei 15211951 Crimes contra a Economia Popular e a Lei 113432006 Drogas etc sujeitos à aplicação pela Justiça Comum Aplicase apenas às pessoas que preenchem certas condições legalmente exigidas Exemplo Código Penal Militar Decretolei 10011969 Lei 10791950 crimes de responsabilidade do Presidente da República Ministros de Estado Ministros do Supremo Tribunal Federal Procurador Geral da República Governadores e Secretários dos Estados e Decretolei 2011967 crimes de responsabilidade de prefeitos Tem incidência em todo o território nacional É o produzido pela União ente federativo com competência legislativa privativa para tanto CF art 22 I Aplicase somente sobre parte delimitada do território nacional É o Direito Penal elaborado pelos Estadosmembros desde que autorizados por lei complementar a legislar sobre questões específicas CF art 22 parágrafo único É o conjunto de leis penais em vigor ou seja todas as já produzidas e ainda não revogadas É o direito de punir o ius puniendi exclusivo do Estado o qual nasce no momento em que é violado o conteúdo da lei penal incriminadora Também conhecido como substantivo por ele se entende a totalidade de leis penais em vigor É o Direito Penal propriamente dito Denominado ainda de adjetivo é o grupo de leis processuais penais em vigor É o Direito Processual Penal a b Fonte representa não só a origem mas também a forma de manifestação do Direito Penal Por tal motivo as fontes são divididas em formais ou materiais São os órgãos constitucionalmente encarregados de elaborar o Direito Penal Essa tarefa é precipuamente da União nos moldes do art 22 I da Constituição Federal Não se pode olvidar ainda que lei complementar da União pode autorizar os Estadosmembros a legislar sobre questões específicas de interesse local CF art 22 parágrafo único São os modos pelos quais o Direito Penal se revela Subdividemse em Fonte formal imediata é a lei regra escrita concretizada pelo Poder Legislativo em consonância com a forma determinada pela Constituição Federal Em obediência ao princípio da reserva legal ou da estrita legalidade CF art 5º XXXIX e CP art 1º constituise na única fonte formal imediata do Direito Penal pois somente ela pode criar crimes e contravenções penais e cominar penas Fontes formais mediatas ou secundárias a Constituição Federal a jurisprudência a doutrina os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos os costumes os princípios gerais do Direito e os atos administrativos são apontados como fontes formais mediatas do Direito Penal Passemos à análise de cada uma dessas hipóteses A Constituição Federal situada no ápice do ordenamento jurídico brasileiro não cria crimes nem comina penas Esta tarefa é por ela acometida à lei ao incluir entre os direitos e garantias fundamentais o princípio da reserva legal ou da estrita legalidade art 5º XXXIX Porém a Lei Suprema contém inúmeras disposições aplicáveis ao Direito Penal a exemplo dos princípios da irretroatividade da lei penal art 5º XL da intransmissibilidade ou da personalidade da pena art 5º XLV e da individualização da pena art 5º XLVI sem prejuízo da previsão de diversos mandados de criminalização21 A Constituição Federal de 1988 com visão democrática e protetiva do ser humano foi especialmente detalhista ao estabelecer um amplo rol de normas destinadas a limitar o poder punitivo do Estado Por esta razão é comum falarse em Constituição Penal expressão utilizada no tocante ao conjunto de princípios e regras de Direito Penal contidas no texto constitucional A jurisprudência revela o entendimento dos tribunais sobre determinado tema jurídico servindo como vetor ao aplicador do Direito Entretanto nem sempre se reveste de natureza cogente razão pela qual não pode ser automaticamente compreendida como fonte do Direito Penal As hipóteses em que a jurisprudência funciona como fonte formal mediata do Direito Penal estão previstas no art 927 do Código de Processo Civil Art 927 Os juízes e os tribunais observarão I as decisões do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade II os enunciados de súmula vinculante22 III os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos IV os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional V a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados A vinculação a tais decisões classificadas como precedentes obrigatórios é indispensável ao bom funcionamento da Justiça Na esfera penal os Tribunais Superiores STF e STJ devem ser compreendidos como centros irradiadores da jurisprudência em âmbito nacional Por sua vez o juiz isoladamente considerado independentemente do seu cargo ou instância é uma peça no sistema de distribuição da justiça Isso não importa em reconhecer o magistrado como um subalterno do Tribunal Superior e sim em visualizar o Poder Judiciário como um sistema no qual os órgãos judiciários têm competências distintas23 Nesse contexto os precedentes obrigatórios tutelam valores fundamentais do ordenamento jurídico destacandose Segurança jurídica um dos principais alicerces do Estado Democrático de Direito confere estabilidade e certeza nas relações jurídicas e proporciona a previsibilidade das consequências jurídicas das condutas praticadas pelos membros da coletividade Igualdade a igualdade de todos perante a lei acarreta na igualdade de todos diante da prestação jurisdicional Não se admite que pessoas em idêntica ou similar situação jurídica recebam tratamentos judiciais diametralmente opostos Unidade e coerência sistêmica é inaceitável que cada magistrado juiz desembargador ou ministro ou tribunal produza de forma arbitrária e desequilibrada seu próprio Direito Penal e Proteção da confiança casos iguais ou semelhantes devem receber tratamento jurídico de igual natureza para não gerar incredulidade da população acerca da imparcialidade e da lisura da prestação jurisdicional Os autores em geral nas variadas áreas do conhecimento jurídico e não somente no Direito Penal elevam a doutrina à categoria de fonte formal mediata do Direito Penal Essa afirmação a nosso ver deve ser encarada com cautela Em primeiro lugar a doutrina por mais abalizada e respeitada que seja representa um estudo científico e não se reveste de obrigatoriedade nada obstante funcione como instrumento útil na interpretação e na aplicação prática do Direito Penal Além disso o bom senso e a lógica não permitem visualizar qualquer escrito artigo ou mesmo livro como fonte inspiradora do Direito Penal Felizmente vivemos em um país que tem o pluralismo político como um dos seus fundamentos CF art 1º inc V e consagra a liberdade de manifestação do pensamento como direito fundamental CF art 5º inc IV Tais predicados indispensáveis à democracia podem abrir espaços para abusos Basta pensar em uma doutrina sustentando preconceituosamente a pena de morte para pessoas de determinada religião ou etnia para promover uma faxina social Evidentemente não se pode conceber uma manifestação desse jaez como fonte do Direito Penal Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos somente podem ser considerados fontes formais mediatas do Direito Penal depois de terem efetivamente ingressado em nosso ordenamento jurídico com respeito a procedimento complexo destinado a esta finalidade Depois de cumpridas as etapas perante os Poderes Legislativo e Executivo terão status constitucional se aprovados em cada Casa do Congresso Nacional em dois turnos por três quintos dos votos dos respectivos membros CF art 5º 3º ou supralegal se aprovados de forma diversa Costume é a reiteração de uma conduta de modo constante e uniforme por força da convicção de sua obrigatoriedade Possui dois elementos um objetivo relativo ao fato reiteração da conduta e outro subjetivo inerente ao agente convicção da obrigatoriedade Ambos devem estar simultaneamente presentes O costume não se confunde com o hábito Deveras o último ainda que praticado reiteradamente não impõe ao agente a convicção da sua obrigatoriedade Dirigir ao volante apenas com uma das mãos pode ser um hábito de diversos motoristas mas jamais um costume Ninguém certamente reputa tal conduta como obrigatória No Direito Penal o costume nunca pode ser empregado para criar delitos ou aumentar penas A lei é a sua única fonte formal imediata Os costumes se dividem em três blocos a secundum legem ou interpretativo auxilia o intérprete a esclarecer o conteúdo de elementos ou circunstâncias do tipo penal No passado pode ser lembrada a expressão mulher honesta a qual era compreendida de diversas formas ao longo do território nacional Exemplo atual é o conceito de ato obsceno previsto no art 233 do Código Penal e mutável de acordo com as condições regionais e culturais de cada sociedade Utilizar um biquíni de pequenas proporções em uma praia é atividade normal mas seria repudiada e até mesmo considerada criminosa caso uma mulher dele se valesse no interior de uma igreja em cidade interiorana extremamente conservadora24 b contra legem ou negativo também conhecido como desuetudo é aquele que contraria a lei mas não tem o condão de revogála É o caso da contravenção penal de jogo do bicho definida pelo art 58 do Decretolei 36881941 Como já decidido pelo Superior Tribunal de Justiça Jogo do bicho Impossibilidade de absolvição em razão do costume O sistema jurídico brasileiro não admite possa uma lei perecer pelo desuso porquanto assentado no princípio da supremacia da lei escrita fonte principal do direito sua obrigatoriedade só termina com sua revogação por outra lei Noutros termos significa que não pode ter existência jurídica o costume contra legem25 Com efeito uma lei somente pode ser revogada por outra lei nos termos do art 2º 1º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro É o que se denomina de princípio da continuidade das leis c praeter legem ou integrativo supre a lacuna da lei e somente pode ser utilizado na seara das normas penais não incriminadoras notadamente para possibilitar o surgimento de causas supralegais de exclusão da ilicitude ou da culpabilidade Mencionase frequentemente a circuncisão empregada como rito religioso pelos israelitas São os valores fundamentais que inspiram a elaboração e a preservação do ordenamento jurídico No campo penal em face do império da lei como fonte formal imediata exclusiva os princípios não podem em hipótese alguma ser utilizados para tipificação de condutas ou cominação de penas Sua atuação se reserva ao âmbito das normas penais não incriminadoras Os atos administrativos no Direito Penal funcionam como complemento de algumas normas penais em branco26 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 BRUNO Aníbal Direito penal parte geral 3 ed Rio de Janeiro Forense 1967 t I p 1112 É o caso de Derecho Penal na Espanha e na Argentina de Droit Pénal na França e de Diritto Penale na Itália O Código Penal é também chamado de pergaminho penal Essa denominação foi utilizada pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina nos autos da Apelação Criminal 20060091054 Rel José Carlos Carstens Köhlher j 20032007 GARCIA Basileu Instituições de direito penal 4 ed 37 tir São Paulo Max Limonad 1975 v 1 t I p 78 NORONHA Edgard Direito penal 33 ed São Paulo Saraiva 1998 v 1 p 5 Dogmática penal encarada como a visão das leis penais em vigor o Direito em vigor É o que ensina CERNICCHIARO Luiz Vicente Estrutura do direito penal 2 ed São Paulo José Bushatsky 1976 p 115 ZAFFARONI Eugenio Raúl Manual de derecho penal 6 ed Buenos Aires Ediar 1991 p 57 ZAFFARONI Eugenio Raúl Derecho penal Parte general 2 ed Buenos Aires Ediar 2002 p 08 GOMES Luiz Flávio PABLOS DE MOLINA Antonio García BIANCHINI Alice Direito penal introdução e princípios fundamentais São Paulo RT 2007 v 1 p 72 BRUNO Aníbal Direito penal parte geral 3 ed Rio de Janeiro Forense 1967 t I p 48 Para uma análise minuciosa do assunto ROXIN Claus A proteção de bens jurídicos como função do direito penal Org e trad André Luís Callegari e Nereu José Giacomolli Porto Alegre Livraria do Advogado 2006 AgRg no REsp 887240MG rel Min Hamilton Carvalhido 6ª Turma j 26042007 REALE Miguel Instituições de direito penal parte geral 2 ed Rio de Janeiro Forense 2004 v 1 p 11 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 TELES Ney Moura Direito penal parte geral São Paulo Atlas 2004 v 1 p 46 Por não ser a abordagem minuciosa de propostas internacionais o objetivo da presente obra indicamos aos interessados a leitura de SILVA SÁNCHEZ JesúsMaría Aproximación al derecho penal contemporáneo Reimpresión Barcelona Bosch 2002 p 241310 CEREZO MIR José Derecho penal parte geral São Paulo RT 2007 p 91 GARCIA Basileu Op cit p 37 PABLOS DE MOLINA Antonio García Criminología una introducción a sus fundamentos teóricos 6 ed Santiago LexisNexis 2008 p 1 ZAFFARONI Eugenio Raúl Criminología Aproximación desde um margen Tercera reimpresión Bogotá Temis 2003 p 99 REsp 71521MG rel Min Luiz Vicente Cernicchiaro 6ª Turma j 19121996 O estudo detalhado dos mandados de criminalização encontrase no Capítulo 2 mais especificamente no item 2211 Art 103A da Constituição Federal O Supremo Tribunal Federal poderá de ofício ou por provocação mediante decisão de dois terços dos seus membros após reiteradas decisões sobre matéria constitucional aprovar súmula que a partir de sua publicação na imprensa oficial terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta nas esferas federal estadual e municipal bem como proceder à sua revisão ou cancelamento na forma estabelecida em lei Um exemplo de aplicação prática dos precedentes obrigatórios ocorreu no cancelamento pelo Superior Tribunal de Justiça da Súmula 512 em razão do entendimento adotado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no julgamento do HC 118533MS no sentido da inaplicabilidade da Lei dos Crimes Hediondos ao tráfico de drogas privilegiado Lei 113432006 art 33 4º A moral vigente não se dissocia do costume vigente Assim quando os costumes mudam avançando contra os preconceitos os conceitos morais também mudam O conceito de obsceno hoje não é mais o mesmo da inspiração do legislador do Código Penal em 1940 STJ HC 7809SP rel Min José Arnaldo da Fonseca rel p acórdão Min Edson Vidigal 5ª 25 26 Turma j 24111998 STJ REsp 1435872MG rel Min Sebastião Reis Júnior rel p acórdão Min Rogério Schietti Cruz 6ª Turma j 03062014 Essa matéria será analisada no Capítulo 7 no item 74 21 22 221 CONCEITO Princípios são os valores fundamentais que inspiram a criação e a manutenção do sistema jurídico Na clássica definição de Celso Antônio Bandeira de Mello Princípio é por definição mandamento nuclear de um sistema verdadeiro alicerce dele disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondolhes o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico É o conhecimento dos princípios que preside a intelecção das diferentes partes componentes do todo unitário que há por nome sistema jurídico positivo1 Os princípios têm a função de orientar o legislador ordinário e também o aplicador do Direito Penal no intuito de limitar o poder punitivo estatal mediante a imposição de garantias aos cidadãos A quantidade e a denominação dos princípios penais variam entre os doutrinadores Vejamos os principais e de forte incidência em provas e concursos públicos PRINCÍPIOS EM ESPÉCIE Princípio da reserva legal ou da estrita legalidade Encontrase previsto no art 5º XXXIX da Constituição Federal bem como no art 1º do Código Penal Tratase de cláusula pétrea Portanto ainda que seja extirpado do Código Penal o princípio da reserva legal continuará atuando como vetor do sistema por força do mandamento constitucional Preceitua basicamente a exclusividade da lei para a criação de delitos e contravenções penais e cominação de penas possuindo indiscutível dimensão democrática pois revela a aceitação pelo povo representado pelo Congresso Nacional da opção legislativa no âmbito criminal De fato não há crime sem lei que o defina nem pena sem cominação legal nullum crimen nulla poena sine lege No Brasil os crimes e também as contravenções penais são instituídos por leis ordinárias Em tese nada impede o desempenho dessa função pela lei complementar Mas como se sabe a Constituição Federal indica expressamente as hipóteses de cabimento de tal espécie legislativa entre as quais não se encaixam a criação de crimes e a cominação de penas É vedada a edição de medidas provisórias sobre matéria relativa a Direito Penal CF art 62 1º I alínea b seja ela prejudicial ou mesmo favorável ao réu Nada obstante o Supremo Tribunal Federal historicamente firmou jurisprudência no sentido de que as medidas provisórias podem ser utilizadas na esfera penal desde que benéficas ao agente2 Seu mais seguro antecedente histórico é a Magna Carta de João sem Terra imposta pelos barões ingleses em 1215 ao estabelecer em seu art 39 que nenhum homem livre poderia ser submetido à pena sem prévia lei em vigor naquela terra Posteriormente o princípio da reserva legal foi desenvolvido nos moldes atuais por Paul Johan Anselm Ritter von Feuerbach com base em sua teoria da coação psicológica Para ele toda imposição de pena pressupõe uma lei penal Somente a ameaça de um mal por meio da lei fundamenta a noção e a possibilidade jurídica da pena3 Aplicase não somente ao crime mas também às contravenções penais Com efeito a palavra crime foi utilizada em sentido genérico tanto pelo Código Penal como pela Constituição Federal E ainda o art 1º do Decreto lei 36881941 Lei das Contravenções Penais diz que se aplicam às contravenções as regras gerais do Código Penal quando não houver disposição em sentido contrário a qual inexiste O princípio da reserva legal possui dois fundamentos um de natureza jurídica e outro de cunho político O fundamento jurídico é a taxatividade certeza ou determinação pois implica por parte do legislador a determinação precisa ainda que mínima4 do conteúdo do tipo penal e da sanção penal a ser aplicada bem como da parte do juiz na máxima vinculação ao mandamento legal inclusive na apreciação de benefícios legais Nesse sentido é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça O princípio da reserva legal atua como expressiva limitação constitucional ao aplicador judicial da lei cuja competência jurisdicional por tal razão não se reveste de idoneidade suficiente para lhe permita a ordem jurídica ao ponto de conceder benefícios proibidos pela norma vigente sob pena de incidir em domínio reservado ao âmbito de atuação do Poder Legislativo5 Como desdobramento lógico da taxatividade o Direito Penal não tolera a analogia in malam partem Se os crimes e as penas devem estar expressamente previstos em lei é vedada a utilização de regra análoga em prejuízo do ser humano nas situações de vácuo legislativo O fundamento político é a proteção do ser humano em face do arbítrio do Estado no exercício do seu poder punitivo Enquadrase destarte entre os direitos fundamentais de 1ª geração ou dimensão A denominação do princípio merece especial cautela nas provas e nos concursos públicos A doutrina consagrou corretamente as expressões reserva legal e estrita legalidade pois somente se admite lei em sentido material matéria constitucionalmente reservada à lei e formal lei editada em consonância com o processo legislativo previsto na Constituição Federal Contudo algumas provas adotam rotineiramente o termo legalidade o que não é correto pois nele se enquadram quaisquer das espécies normativas elencadas pelo art 59 da Constituição Federal e não apenas a lei 2211 De fato se tais denominações fossem sinônimas não existiria razão para o texto constitucional utilizar dois incisos do seu art 5º para se referir ao mesmo princípio Em verdade no inc II encontrase o princípio da legalidade ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei enquanto no inc XXXIX repousa o princípio da reserva legal atribuindo à lei em sentido estrito o monopólio na criação de crimes e na cominação das penas O melhor caminho a seguir é o da coerência Se as alternativas em provas objetivas apontarem somente o princípio da legalidade adote essa nomenclatura até mesmo por exclusão Por outro lado no confronto entre legalidade e reserva legal ou estrita legalidade fique com os últimos Se a prova for dissertativa ou oral argumente sobre o assunto sempre de forma equilibrada até porque geralmente não se conhecem as preferências da banca examinadora Em hipóteses de risco a posição fundada no equilíbrio sempre é a melhor a ser acolhida Princípio da reserva legal e mandados de criminalização A Constituição Federal brasileira seguindo o modelo de algumas constituições europeias como as da Alemanha Espanha Itália França e da própria Comunidade Europeia estabelece mandados expressos ou explícitos e tácitos ou implícitos de criminalização ou penalização Cuidase de hipóteses de obrigatória intervenção do legislador penal Com efeito os mandados de criminalização indicam matérias sobre as quais o legislador ordinário não tem a faculdade de legislar mas a obrigatoriedade de tratar protegendo determinados bens ou interesses de forma adequada e dentro do possível integral Os mandados de criminalização expressos contidos na Constituição Federal são encontrados nos artigos 5 incisos XLII racismo XLIII tortura tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins terrorismo e crimes hediondos e XLIV ação de grupos armados civis ou militares contra a ordem constitucional e o Estado democrático e 3 os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados em 222 cada Casa do Congresso Nacional em dois turnos por três quintos dos votos dos respectivos membros serão equivalentes às emendas constitucionais 7 inciso X retenção dolosa do salário dos trabalhadores 227 4 abuso violência e exploração sexual da criança ou adolescente 225 condutas lesivas ao meio ambiente Para o Supremo Tribunal Federal A Constituição de 1988 contém significativo elenco de normas que em princípio não outorgam direitos mas que antes determinam a criminalização de condutas CF art 5º XLI XLII XLIII XLIV art 7º X art 227 4º Em todas essas é possível identificar um mandado de criminalização expresso tendo em vista os bens e valores envolvidos Os direitos fundamentais não podem ser considerados apenas proibições de intervenção expressando também um postulado de proteção6 Há também mandados tácitos de criminalização podendo ser citado o exemplo do necessário e urgente combate eficaz à corrupção eleitoral Alguns dos mandados de criminalização já foram atendidos pelo legislador ordinário de modo satisfatório a exemplo da Lei 132602016 que regulamentou o art 5º inc XLIII da Constituição Federal para tipificar o terrorismo outros de forma insuficiente vários simplesmente ignorados Princípio da anterioridade Decorre também do art 5º XXXIX da Constituição Federal e do art 1º do Código Penal quando estabelecem que o crime e a pena devem estar definidos em lei prévia ao fato cuja punição se pretende A lei penal produz efeitos a partir da data em que entra em vigor Daí deriva a sua irretroatividade não se aplica a comportamentos pretéritos salvo se beneficiar o réu CF art 5º XL É proibida a aplicação da lei penal inclusive aos fatos praticados durante seu período de vacatio Embora já publicada e formalmente válida a lei ainda não estará em vigor e não alcançará as condutas praticadas em tal período 223 2231 2232 Princípio da insignificância ou da criminalidade de bagatela Introdução O princípio da insignificância surgiu no Direito Romano porém limitado ao direito privado Invocavase o brocardo de minimus non curat praetor ou seja os juízes e tribunais não devem se ocupar de assuntos irrelevantes Este princípio foi incorporado ao Direito Penal somente na década de 1970 pelos estudos de Claus Roxin Também conhecido como criminalidade de bagatela sustenta ser vedada a atuação penal do Estado quando a conduta não é capaz de lesar ou no mínimo de colocar em perigo o bem jurídico tutelado pela norma penal Finalidade O princípio da insignificância fundamentado em valores de política criminal aplicação do Direito Penal em sintonia com os anseios da sociedade destinase a realizar uma interpretação restritiva da lei penal Em outras palavras o tipo penal é amplo e abrangente e o postulado da criminalidade de bagatela serve para limitar sua incidência prática Para o Supremo Tribunal Federal O princípio da insignificância é vetor interpretativo do tipo penal tendo por escopo restringir a qualificação de condutas que se traduzam em ínfima lesão ao bem jurídico nele tipo penal albergado Tal forma de interpretação inserese num quadro de válida medida de política criminal visando para além da descarcerização ao 2233 descongestionamento da Justiça Penal que deve ocuparse apenas das infrações tidas por socialmente mais graves Numa visão humanitária do Direito Penal então é de se prestigiar esse princípio da tolerância que se bem aplicado não chega a estimular a ideia de impunidade Ao tempo que se verificam patentes a necessidade e a utilidade do princípio da insignificância é imprescindível que aplicação se dê de maneira criteriosa contribuindo sempre tendo em conta a realidade brasileira para evitar que a atuação estatal vá além dos limites do razoável na proteção do interesse público7 Exemplificativamente a redação do art 155 caput do Código Penal subtrair para si ou para outrem coisa alheia móvel abarca qualquer objeto material independentemente do seu valor e da importância para seu titular Mas é evidente o Direito Penal não presta a tutelar a subtração de um grampo de cabelo ou de uma folha de papel Não há falar em crime de furto em tais situações Em suma o princípio da insignificância destinase a diminuir a intervenção do Direito Penal não podendo em hipótese alguma ampliála Natureza jurídica O princípio da insignificância é causa de exclusão da tipicidade Sua presença acarreta na atipicidade do fato Com efeito a tipicidade penal é constituída pela união da tipicidade formal com a tipicidade material Na sua incidência operase tão somente a tipicidade formal juízo de adequação entre o fato praticado na vida real e o modelo de crime descrito na norma penal Falta a tipicidade material lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico Em síntese excluise a tipicidade pela ausência da sua vertente material Na linha da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal O princípio da insignificância qualificase como fator de descaracterização material da tipicidade penal O princípio da insignificância que deve ser analisado em conexão com os postulados da fragmentariedade e da intervenção mínima do Estado em matéria penal tem o sentido de excluir ou de afastar a própria tipicidade penal 2234 22341 examinada na perspectiva de seu caráter material8 Como corolário da atipicidade do fato nada impede a concessão de ofício de habeas corpus pelo Poder Judiciário9 quando caracterizado o princípio da insignificância Além disso o trânsito em julgado da condenação não impede seu reconhecimento10 Requisitos O reconhecimento do princípio da insignificância depende de requisitos objetivos relacionados ao fato e de requisitos subjetivos vinculados ao agente e à vítima Por esta razão seu cabimento deve ser analisado no caso concreto de acordo com as suas especificidades e não no plano abstrato11 Requisitos objetivos São quatro os requisitos objetivos exigidos pelo princípio da insignificância a mínima ofensividade da conduta b ausência de periculosidade social da ação c reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e d inexpressividade da lesão jurídica Estes vetores encontramse consolidados na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal Para a incidência do princípio da insignificância devem ser relevados o valor do objeto do crime e os aspectos objetivos do fato tais como a mínima ofensividade da conduta do agente a ausência de periculosidade social da ação o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e a inexpressividade da lesão jurídica causada12 Tais requisitos são muito próximos entre si O Supremo Tribunal Federal não faz distinção entre eles E na verdade é impossível diferenciálos A explicação para esse fenômeno é simples Mais do que um princípio a insignificância penal é um fator de política criminal Portanto é necessário conferir ampla flexibilidade ao operador do Direito para aplicálo ou então para negálo sempre levando em conta as peculiaridades do caso concreto É imprescindível analisar o contexto em que a conduta foi praticada para ao final concluir se é oportuna ou não a incidência do tipo penal Este é o motivo pelo qual a jurisprudência muitas 22342 vezes apresenta resultados diversos para casos aparentemente semelhantes No âmbito dos delitos patrimoniais é fácil notar o reduzido valor do objeto material não se revela como o único parâmetro para a configuração da criminalidade de bagatela Vale a pena conhecer um interessante caso apreciado pelo Superior Tribunal de Justiça Não se aplica o princípio da insignificância ao furto de bem de inexpressivo valor pecuniário de associação sem fins lucrativos com o induzimento de filho menor a participar do ato No caso em análise teria a paciente segundo a denúncia subtraído um cofrinho contendo R 480 quatro reais e oitenta centavos da Associação dos Voluntários de Combate ao Câncer AVCC induzindo seu filho de apenas 09 anos a pegar o objeto e colocálo na sua bolsa Nesse contexto verificase que o princípio da insignificância não se aplica ao caso porquanto as características dos fatos revelam reprovabilidade suficiente para a consumação do delito embora o ínfimo valor da coisa subtraída O referido princípio se aplica a fatos dotados de mínima ofensividade desprovidos de periculosidade social de reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e que a lesão jurídica provocada seja inexpressiva Observase assim que não há falar em mínima ofensividade nem em reduzido grau de reprovabilidade do comportamento porquanto foi subtraído o bem com o induzimento do próprio filho menor da ora paciente a pegálo e lamentavelmente contra uma instituição sem fins lucrativos que dá amparo a crianças com câncer Ainda que irrelevante a lesão pecuniária provocada porque inexpressivo o valor do bem a repulsa social do comportamento é evidente13 Requisitos subjetivos Os requisitos subjetivos não dizem respeito ao fato Ao contrário relacionamse ao agente e à vítima do fato descrito em lei como crime ou contravenção penal Vejamos Condições pessoais do agente Nessa seara três situações merecem análise reincidente criminoso habitual e militar a Reincidente Existem duas posições acerca da possibilidade de aplicação do princípio da insignificância ao reincidente 1ª posição É vedada a incidência do princípio da insignificância ao reincidente Cuidase de instituto de política criminal e nesse contexto não há interesse da sociedade no deferimento do benefício àquele que já foi definitivamente condenado pela prática de uma infração penal Como já decidido pelo Supremo Tribunal Federal No HC 123108MG o paciente fora condenado à pena de um ano de reclusão e dez diasmulta pelo crime de furto simples de chinelo avaliado em R 1600 Embora o bem tenha sido restituído à vítima o tribunal local não substituíra a pena privativa de liberdade por restritiva de direitos em razão da reincidência Nesse caso o Colegiado por decisão majoritária denegou a ordem14 2ª posição Admitese o princípio da insignificância em favor do reincidente Este postulado exclui a tipicidade do fato e a reincidência agravante genérica é utilizada somente na dosimetria da pena Em outras palavras não há relevância penal tanto para o primário como para o reincidente O Superior Tribunal de Justiça tem se pronunciado nesse sentido Adequada a incidência do postulado da insignificância porquanto se trata de bens cervejas e refrigerantes avaliados em R 9025 noventa reais e vinte e cinco centavos sendo portanto mínima a ofensividade da conduta O fato de o agravado ser reincidente por si só não afasta o princípio da insignificância15 A propósito é importante destacar que o Supremo Tribunal Federal já aceitou o princípio da insignificância ao reincidente genérico excluindoo unicamente no tocante à reincidência específica A 2ª Turma concedeu habeas corpus para restabelecer sentença de primeiro grau na parte em que reconhecera a aplicação do princípio da insignificância e absolvera o ora paciente da imputação de furto CP art 155 Na espécie ele fora condenado pela subtração de um engradado com 23 garrafas de cerveja e seis de refrigerante todos vazios avaliados em R 1600 haja vista que o tribunal de justiça local afastara a incidência do princípio da bagatela em virtude de anterior condenação com trânsito em julgado pela prática de lesão corporal CP art 129 Considerou então que seria inegável a presença no caso dos requisitos para aplicação do referido postulado mínima ofensividade da conduta ausência de periculosidade social da ação reduzida reprovabilidade do comportamento e inexpressividade da lesão jurídica Afirmou ademais que considerada a teoria da reiteração não cumulativa de condutas de gêneros distintos a contumácia de infrações penais que não têm o patrimônio como bem jurídico tutelado pela norma penal a exemplo da lesão corporal não poderia ser valorada como fator impeditivo à aplicação do princípio da insignificância porque ausente a séria lesão à propriedade alheia16 b Criminoso habitual Criminoso habitual é aquele que faz da prática de delitos o seu meio de vida A ele não se permite a incidência do princípio da insignificância pois a lei penal seria inócua se tolerada a reiteração do mesmo crime seguidas vezes em frações que isoladamente não superassem um determinado valor tido como irrelevante mas o excedesse em sua totalidade Pensemos em um exemplo A subtrai diariamente R 3000 do caixa do supermercado em que trabalha Ao final de um mês terá subtraído aproximadamente R 90000 Se cada conduta fosse considerada como insignificante o furto jamais se concretizaria mesmo com a dimensão do valor final Se não bastasse o entendimento em sentido contrário representaria um autêntico incentivo ao descumprimento do Direito Penal especialmente para aqueles que fazem da criminalidade um estilo de vida Para o Supremo Tribunal Federal Para se afirmar que a insignificância pode conduzir à atipicidade é indispensável portanto averiguar a adequação da conduta do agente em seu sentido social amplo a fim de apurar se o fato imputado que é formalmente típico tem ou não relevância penal Esse contexto social ampliado certamente comporta também juízo sobre a contumácia da conduta do agente Não se pode considerar atípica por irrelevante a conduta formalmente típica de delito contra o patrimônio praticada por paciente que é costumeiro na prática de crimes da espécie17 O Supremo Tribunal Federal entretanto já acolheu o princípio da insignificância em uma hipótese excepcional de habitualidade criminosa que na verdade contemplava uma situação de furto famélico ou seja praticado para saciar a fome do agente ou de pessoa a ele ligada por laços de parentesco ou de amizade A Segunda Turma deu provimento a agravo regimental para conceder a ordem de habeas corpus a fim de absolver paciente da acusação de furto qualificado CP art 155 4º IV em face da aplicação do princípio da insignificância Para o colegiado como regra a habitualidade delitiva específica é um parâmetro que afasta a análise do valor do bem jurídico tutelado para fins de aplicação do princípio da bagatela Excepcionalmente no entanto as peculiaridades do caso concreto podem justificar a exclusão dessa restrição com base na ideia da proporcionalidade em sentido concreto Essa é justamente a situação dos autos de furto de um galo quatro galinhas caipiras uma galinha garnisé e três quilos de feijão bens avaliados em pouco mais de cem reais O valor dos bens é inexpressivo e não houve emprego de violência Enfim é caso de mínima ofensividade ausência de periculosidade social reduzido grau de reprovabilidade e inexpressividade da lesão jurídica Mesmo que conste em desfavor do paciente outra ação penal instaurada por igual conduta ainda em trâmite a hipótese é de típico crime famélico A excepcionalidade também se justifica por se tratar de hipossuficiente Não é razoável que o Direito Penal e todo o aparelho do Estadopolícia e do Estadojuiz movimentese no sentido de atribuir relevância a estas situações18 c Militares É vedada a utilização do princípio da insignificância nos crimes cometidos por militares em face da elevada reprovabilidade da conduta da autoridade e da hierarquia que regulam a atuação castrense bem como do desprestígio ao Estado responsável pela segurança pública Na visão do Supremo Tribunal Federal A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal ressalvada a posição pessoal do relator não admite a aplicabilidade aos crimes militares do princípio da insignificância mesmo que se trate de crime de posse de substância entorpecente em quantidade ínfima para uso próprio cometido no interior de Organização Militar19 Condições da vítima A configuração do princípio da insignificância também depende das condições do ofendido Há que se conjugar a importância do objeto material para a vítima levandose em consideração a sua condição econômica o valor sentimental do bem como também as circunstâncias e o resultado do crime tudo de modo a determinar subjetivamente se houve relevante lesão Nas lições do Supremo Tribunal Federal Já do ângulo da vítima o exame da relevância ou irrelevância penal deve atentar para o seu peculiarmente reduzido sentimento de perda por efeito da conduta do agente a ponto de não experimentar revoltante sensação de impunidade ante a não incidência da norma penal que a princípio lhe favorecia20 Não há dúvida sobre a existência de uma relação diretamente proporcional para estabelecimento da importância do bem para a vítima entre a sua condição econômica e o valor do objeto material Vejamos um exemplo O agente subtrai uma bicicleta velha e repleta de defeitos quase sem nenhum valor econômico Certamente não se pode falar em lesão patrimonial a uma pessoa dotada de alguma riqueza e será cabível o princípio da insignificância Mas se a vítima é um servente de pedreiro pilar de família e pai de 5 filhos que utiliza a bicicleta para atravessar a cidade e trabalhar diariamente em uma construção estará caracterizado o furto sem espaço para a criminalidade de bagatela21 Portanto a análise da extensão do dano causado ao ofendido é imprescindível para aquilatar a pertinência do princípio da insignificância22 O valor sentimental do bem para a vítima impede a utilização da insignificância ainda que o objeto material do crime não apresente relevante 2235 aspecto econômico A propósito o Supremo Tribunal Federal afastou este princípio na subtração de um Disco de Ouro de músico brasileiro considerando também a infungibilidade da coisa23 Ainda em razão da dimensão do dano não se aplica o princípio da insignificância quando a conduta do agente atingir bem de grande relevância para a população a exemplo do dano em aparelho de telefone público Em situações desse jaez as consequências do ato perpetrado transcendem a esfera patrimonial da concessionária de serviço público em face da privação causada à coletividade especialmente das pessoas mais carentes no plano econômico as quais ficam alijadas do meio público de comunicação24 Aplicabilidade O princípio da insignificância é aplicável a qualquer delito que seja com ele compatível e não somente aos crimes patrimoniais Sua maior incidência prática ocorre no furto CP art 155 caput mas é evidente que a este não se limita25 A propósito é importante destacar que no âmbito dos crimes contra o patrimônio não há um valor máximo teto a limitar a incidência do princípio da insignificância Sua análise há de ser efetuada levandose em conta o contexto em que se deu a prática da conduta especialmente a importância do objeto material a condição econômica da vítima as circunstâncias do fato e o resultado produzido bem como as características pessoais do agente26 Porém há delitos que são logicamente incompatíveis com a criminalidade de bagatela É o que se verifica nos crimes hediondos e equiparados tráfico de drogas tortura e terrorismo no racismo e na ação de grupos armados civis ou militares contra a ordem constitucional e o Estado Democrático Tais crimes de máximo potencial ofensivo receberam um tratamento mais rigoroso do Poder Constituinte Originário CF art 5º XLII XLIII e XLIV Em outras palavras a Lei Suprema teve o cuidado de deixar inequívoca a sua intenção de punir com maior gravidade os responsáveis por delitos desta estirpe circunstância indicativa da relevância penal destes fatos e automaticamente impeditiva do princípio da insignificância Vejamos as principais situações em que se discute a incidência ou a proibição do reconhecimento da criminalidade de bagatela a Roubo e demais crimes cometidos com grave ameaça ou violência à pessoa Não há espaço para o princípio da insignificância pois os reflexos derivados destes crimes não podem ser considerados irrelevantes ainda que o objeto material apresente ínfimo valor econômico Especificamente no tocante ao roubo o Superior Tribunal de Justiça assim se pronunciou Não há como aplicar ao crime de roubo o princípio da insignificância pois tratandose de delito complexo em que há ofensa a bens jurídicos diversos o patrimônio e a integridade da pessoa é inviável a afirmação do desinteresse estatal à sua repressão27 b Crimes contra a Administração Pública Em uma visão tradicional o princípio da insignificância jamais foi admitido nos crimes contra a Administração Pública pois em tais delitos ainda que a lesão econômica seja irrisória há ofensa à moralidade administrativa e à probidade dos agentes públicos Este é o entendimento consagrado na Súmula 599 do Superior Tribunal de Justiça O princípio da insignificância é inaplicável aos crimes contra a Administração Pública O Supremo Tribunal Federal contudo já decidiu em sentido contrário admitindo o princípio da insignificância em hipóteses extremas28 É a posição a que nos filiamos29 Exemplificativamente não há falar em peculato CP art 312 quando o funcionário público se apropria de poucas folhas em branco ou de alguns clips de metal pertencentes a determinado órgão público Não é legítima a utilização do Direito Penal em tais hipóteses Eventuais ilícitos de baixíssima gravidade devem ser enfrentados na instância administrativa c Crimes previstos na Lei 113432006 Lei de Drogas Os crimes tipificados na Lei 113432006 Lei de Drogas são de perigo abstrato ou presumido e tutelam a saúde pública No tráfico de drogas delito constitucionalmente equiparado a hediondo é indiscutível a inadmissibilidade do princípio da insignificância E igual raciocínio deve ser utilizado na posse de droga para consumo pessoal pois entendimento diverso seria equivalente a descriminalizar contra o espírito da lei o porte de pequenas quantidades de drogas30 Na linha da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça Não é possível afastar a tipicidade material do porte de substância entorpecente para consumo próprio com base no princípio da insignificância ainda que ínfima a quantidade de droga apreendida A despeito da subsunção formal de determinada conduta humana a um tipo penal é possível se vislumbrar atipicidade material da referida conduta por diversos motivos entre os quais a ausência de ofensividade penal do comportamento em análise Isso porque além da adequação típica formal deve haver uma atuação seletiva subsidiária e fragmentária do Direito Penal conferindose maior relevância à proteção de valores tidos como indispensáveis à ordem social a exemplo da vida da liberdade da propriedade do patrimônio quando efetivamente ofendidos A par disso frisese que o porte ilegal de drogas é crime de perigo abstrato ou presumido visto que prescinde da comprovação da existência de situação que tenha colocado em risco o bem jurídico tutelado Assim para a caracterização do delito descrito no art 28 da Lei 113432006 não se faz necessária a ocorrência de efetiva lesão ao bem jurídico protegido bastando a realização da conduta proibida para que se presuma o perigo ao bem tutelado Isso porque ao adquirir droga para seu consumo o usuário realimenta o comércio ilícito contribuindo para difusão dos tóxicos Ademais após certo tempo e grau de consumo o usuário de drogas precisa de maiores quantidades para atingir o mesmo efeito obtido quando do início do consumo gerando assim uma compulsão quase incontrolável pela próxima dose Nesse passo não há como negar que o usuário de drogas ao buscar alimentar o seu vício acaba estimulando diretamente o comércio ilegal de drogas e com ele todos os outros crimes relacionados ao narcotráfico homicídio roubo corrupção tráfico de armas etc O consumo de drogas ilícitas é proibido não apenas pelo mal que a substância faz ao usuário mas também pelo perigo que o consumidor dessas gera à sociedade Essa ilação é corroborada pelo expressivo número de relatos de crimes envolvendo violência ou grave ameaça contra pessoa associados aos efeitos do consumo de drogas ou à obtenção de recursos ilícitos para a aquisição de mais substância entorpecente Portanto o objeto jurídico tutelado pela norma em comento é a saúde pública e não apenas a saúde do usuário visto que sua conduta atinge não somente a sua esfera pessoal mas toda a coletividade diante da potencialidade ofensiva do delito de porte de entorpecentes Além disso a reduzida quantidade de drogas integra a própria essência do crime de porte de substância entorpecente para consumo próprio visto que do contrário poderseia estar diante da hipótese do delito de tráfico de drogas previsto no art 33 da Lei 113432006 Vale dizer o tipo previsto no art 28 da Lei 113432006 esgotase simplesmente no fato de o agente trazer consigo para uso próprio qualquer substância entorpecente que possa causar dependência sendo por isso mesmo irrelevante que a quantidade de drogas não produza concretamente danos ao bem jurídico tutelado Por fim não se pode olvidar que o legislador ao editar a Lei 113432006 optou por abrandar as sanções cominadas ao usuário de drogas afastando a possibilidade de aplicação de penas privativas de liberdade e prevendo somente as sanções de advertência de prestação de serviços à comunidade e de medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo conforme os incisos do art 28 do referido diploma legal a fim de possibilitar a sua recuperação Dessa maneira a intenção do legislador foi a de impor ao usuário medidas de caráter educativo objetivando assim alertálo sobre o risco de sua conduta para a sua saúde além de evitar a reiteração do delito Nesse contexto em razão da política criminal adotada pela Lei 113432006 há de se reconhecer a tipicidade material do porte de substância entorpecente para consumo próprio ainda que ínfima a quantidade de droga apreendida31 O Supremo Tribunal Federal todavia já decidiu em sentido diverso acolhendo o princípio da insignificância no crime catalogado no art 28 da Lei 113432006 Ao aplicar o princípio da insignificância a 1ª Turma concedeu habeas corpus para trancar procedimento penal instaurado contra o réu e invalidar todos os atos processuais desde a denúncia até a condenação por ausência de tipicidade material da conduta imputada No caso o paciente fora condenado com fulcro no art 28 caput da Lei 113432006 à pena de 3 meses e 15 dias de prestação de serviços à comunidade por portar 06 g de maconha Destacouse que a incidência do postulado da insignificância de modo a tornar a conduta atípica exigiria o preenchimento concomitante dos seguintes requisitos mínima ofensividade da conduta do agente nenhuma periculosidade social da ação reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e inexpressividade da lesão jurídica provocada Consignouse que o sistema jurídico exigiria considerar a relevantíssima circunstância de que a privação da liberdade e a restrição de direitos do indivíduo somente se justificariam quando estritamente necessárias à própria proteção das pessoas da sociedade e de outros bens jurídicos que lhes fossem essenciais notadamente naqueles casos em que os valores penalmente tutelados se expusessem a dano efetivo ou potencial impregnado de significativa lesividade Deste modo o direito penal não deveria se ocupar de condutas que produzissem resultados cujo desvalor por não importar em lesão significativa a bens jurídicos relevantes não representaria por isso mesmo expressivo prejuízo seja ao titular do bem jurídico tutelado seja à integridade da própria ordem social32 d Descaminho e crimes tributários federais O princípio da insignificância também incide nos crimes federais de natureza tributária especialmente no descaminho CP art 334 quando o tributo devido não ultrapassa o valor de R 2000000 vinte mil reais Essa conclusão baseiase no art 20 da Lei 105222002 atualizado pelas Portarias do Ministério da Fazenda 752012 e 1302012 atinentes à inscrição de débitos na Dívida Ativa da União e ao ajuizamento de execuções fiscais pela ProcuradoriaGeral da Fazenda Nacional Art 2º O Procurador da Fazenda Nacional requererá o arquivamento sem baixa na distribuição das execuções fiscais de débitos com a Fazenda Nacional cujo valor consolidado seja igual ou inferior a R 2000000 vinte mil reais desde que não conste dos autos garantia integral ou parcial útil à satisfação do crédito Portaria MF 752012 com a redação alterada pela Portaria MF 1302012 Os Tribunais Superiores consequentemente firmaram jurisprudência no sentido de que não se admite seja uma conduta irrelevante no âmbito fiscal não cobrança do tributo pela União e simultaneamente típica no Direito Penal pois este somente deve atuar quando extremamente necessário para a tutela do bem jurídico protegido quando falharem os outros meios de proteção e não forem suficientes as tutelas estabelecidas nos demais ramos do Direito Na visão do Supremo Tribunal Federal Aplicase o princípio da insignificância ao crime de descaminho quando o montante do tributo não recolhido for inferior ao limite de R 2000000 valor estipulado pelo art 20 Lei 105222002 atualizado pelas portarias 75 e 1302012 do Ministério da Fazenda Com base nesse entendimento a Segunda Turma concedeu ordem de habeas corpus para declarar a atipicidade da conduta prevista no art 334 do Código Penal e trancar a ação penal No caso o paciente introduziu mercadorias estrangeiras no território nacional sem o recolhimento dos tributos devidos calculados em R 197504133 Entretanto é preciso consignar a existência de decisão do Supremo Tribunal Federal em sentido contrário pela inaplicabilidade do princípio da insignificância ao descaminho com o fundamento de que a legislação relativa à execução fiscal não produz reflexos no âmbito penal A Primeira Turma por maioria indeferiu habeas corpus em que se discutia a aplicação do princípio da insignificância ao crime de descaminho quando o montante do tributo não recolhido for inferior ao limite de R 2000000 valor fixado na Portaria 752012 do Ministério da Fazenda para o ajuizamento de ações fiscais No caso o paciente introduziu mercadorias estrangeiras no território nacional sem o recolhimento dos tributos devidos calculados em R 1436451 A Turma entendeu não incidir o princípio da insignificância Asseverou que a lei que disciplina o executivo fiscal não repercute no campo penal Tal entendimento com maior razão deve ser adotado em relação à portaria do Ministério da Fazenda O art 935 do Código Civil explicita a independência das esferas civil penal e administrativa A repercussão no âmbito penal se dá apenas quando decisão proferida em processocrime declarar a inexistência do fato ou da autoria34 Para quem admite o princípio da insignificância nos crimes tributários mais uma observação deve ser efetuada O limite imposto pela Lei 105222002 atualizado pelas Portarias MF 752012 e 1302012 alcança somente os tributos federais Com efeito para os tributos estaduais e municipais deve existir previsão específica por cada ente federativo no exercício da respectiva competência tributária De fato para a aplicação desse teto aos delitos tributários concernentes a tributos que não sejam da competência da União seria necessária a existência de lei do ente federativo competente porque a arrecadação da Fazenda Nacional não se equipara à dos demais entes federativos Ademais um dos requisitos indispensáveis à aplicação do princípio da insignificância é a inexpressividade da lesão jurídica provocada que pode se alterar de acordo com o sujeito passivo35 É curioso destacar que na apropriação indébita previdenciária CP art 168A a qual nada obstante capitulada entre os crimes contra o patrimônio apresenta indiscutível natureza tributária o Supremo Tribunal Federal já rechaçou o princípio da insignificância com fundamento no valor supraindividual do bem jurídico tutelado o que torna irrelevante o pequeno valor das contribuições sociais desviadas da Previdência Social36 e Contrabando O princípio da insignificância não é aplicável ao delito de contrabando tipificado no art 334A do Código Penal em face da natureza proibida da mercadoria importada ou exportada Este crime não tem natureza tributária Outros bens jurídicos são tutelados a exemplo da saúde da moralidade administrativa e da ordem pública Em síntese não se pode reputar insignificante a entrada ou saída ilícita do território nacional de produto classificado como proibido pelas autoridades brasileiras Para o Supremo Tribunal Federal A 2ª Turma denegou habeas corpus em que se requeria a aplicação do princípio da insignificância em favor de pacientes surpreendidos ao portarem cigarros de origem estrangeira desacompanhados de regular documentação Em seguida asseverouse que a conduta configuraria contrabando uma vez que o objeto material do delito em comento tratarseia de mercadoria proibida No entanto reputouse que não se cuidaria de tão somente sopesar o caráter pecuniário do imposto sonegado mas principalmente de tutelar entre outros bens jurídicos a saúde pública Por fim consignouse não se aplicar à hipótese o princípio da insignificância pois neste tipo penal o desvalor da ação seria maior37 O Superior Tribunal de Justiça contudo já admitiu o princípio na insignificância em situações excepcionais a exemplo da importação proibida de pequena quantidade de medicamento para uso próprio38 f Crimes ambientais Em uma primeira análise o princípio da insignificância soa como incompatível com os delitos ambientais em face da natureza difusa e da relevância do bem jurídico protegido reservado inclusive às futuras gerações39 Em situações excepcionais contudo há espaço para a criminalidade de bagatela Como já decidido pelo Supremo Tribunal Federal A Segunda Turma em conclusão de julgamento reputou improcedente acusação formulada contra deputado federal pela suposta prática do crime previsto no art 34 caput da Lei 96051998 Pescar em período no qual a pesca seja proibida ou em lugares interditados por órgão competente Pena detenção de um ano a três anos ou multa ou ambas as penas cumulativamente No caso de acordo com o relatório de fiscalização a autoridade ambiental abordara o deputado e outras duas pessoas em embarcação fundeada em área marítima pertencente à unidade de conservação federal de proteção integral Em seguida reputou não existir no caso concreto o requisito da justa causa a propiciar o prosseguimento da ação penal especialmente pela mínima ofensividade da conduta do agente pela ausência de periculosidade social da ação pelo reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e pela inexpressividade da lesão jurídica provocada Assim apesar de a conduta do denunciado amoldarse à tipicidade formal e subjetiva não haveria a tipicidade material consistente na relevância penal da conduta e no resultado típico em razão da insignificância da lesão produzida no bem jurídico tutelado A jurisprudência seria no sentido da aplicabilidade do princípio da insignificância aos crimes ambientais tanto com relação aos de perigo concreto em que haveria dano efetivo ao bem jurídico tutelado quanto aos de perigo abstrato como no art 34 caput da Lei 96051998 No processo em exame não se produzira prova material de qualquer dano efetivo ao meio ambiente Ademais mesmo diante de crime de perigo abstrato não seria possível dispensar a verificação in concreto do perigo real ou mesmo potencial da conduta praticada pelo acusado com relação ao bem jurídico tutelado Esse perigo real não se verificaria na espécie vertente Portanto seria imperioso assentar a atipicidade material da conduta pela completa ausência de ofensividade ao bem jurídico tutelado pela norma penal O acusado estaria em pequena embarcação quando teria sido surpreendido em contexto de pesca rústica com vara de pescar linha e anzol Não estaria em barco grande munido de redes arrasto nem com instrumentos de maior potencialidade lesiva ao meio ambiente40 g Crimes contra a fé pública Nos crimes contra a fé pública o bem jurídico tutelado é a credibilidade depositada nos documentos nos sinais e símbolos empregados nas relações indispensáveis à vida em sociedade Em face desta dimensão não há espaço para o princípio da insignificância41 A propósito o Supremo Tribunal Federal assim se manifestou no tocante ao crime de moeda falsa em situação envolvendo dez notas de pequeno valor A aplicação do princípio da insignificância de modo a tornar a conduta atípica depende de que esta seja a tal ponto despicienda que não seja razoável a imposição da sanção Mostrase todavia cabível na espécie a aplicação do disposto no art 289 1º do Código Penal pois a fé pública a que o Título X da Parte Especial do CP se refere foi vulnerada Em relação à credibilidade da moeda e do sistema financeiro o tipo exige apenas que estes bens sejam colocados em risco para a imposição da reprimenda42 h Tráfico internacional de arma de fogo O tráfico internacional de arma de fogo definido no art 18 da Lei 108262003 Estatuto do Desarmamento não comporta o princípio da insignificância pois se trata de crime de perigo abstrato e atentatório à segurança pública Para o Supremo Tribunal Federal A objetividade jurídica da norma penal transcende a mera proteção da incolumidade pessoal para alcançar também a tutela da liberdade individual e do corpo social como um todo asseguradas ambas pelo incremento dos níveis de segurança coletiva que a lei propicia No caso em exame a proibição da conduta pela qual o paciente está sendo processado visa especialmente combater e prevenir o tráfico internacional de armas e munições cuja maior clientela é o crime organizado transnacional que via de regra abastece o seu arsenal por meio do mercado ilegal nacional ou internacional de armas Mostrase irrelevante no caso cogitarse da mínima ofensividade da conduta em face da quantidade apreendida ou também da ausência de periculosidade da ação porque a hipótese é de crime de perigo abstrato para o qual não importa o resultado concreto da ação o que também afasta a possibilidade de aplicação do princípio da insignificância43 i Porte ilegal de munição Não se admite a incidência do princípio da insignificância ao delito de porte ilegal de munição de uso permitido Lei 108262003 Estatuto do Desarmamento art 14 caput independentemente do calibre da arma de fogo e do número de projéteis apreendidos Para o Supremo Tribunal Federal A Primeira Turma denegou a ordem em habeas corpus no qual se pretendia o reconhecimento da atipicidade material da conduta do paciente caracterizada pelo porte ilegal de munição de uso permitido art 14 caput da Lei 108632003 No caso o paciente foi condenado à pena de dois anos e dois meses de reclusão em regime aberto e ao pagamento de 11 diasmulta em razão do porte de projétil de arma de fogo A pena privativa foi substituída por duas restritivas de direito A defesa alegava ser irrelevante a conduta praticada pelo paciente bem como estarem presentes todos os requisitos exigidos pela Corte para a incidência do princípio da bagatela Destacava a existência de precedentes deste Tribunal nos quais assentada a aplicabilidade desse princípio a delitos de perigo abstrato porte de drogas para consumo desenvolvimento de atividade clandestina de telecomunicações pesca irregular e moeda falsa por exemplo Apontava ademais a desproporcionalidade entre a conduta do paciente e a reprimenda imposta Para o Colegiado porém a configuração da conduta tipificada no art 14 caput da Lei 108262003 Art 14 Portar deter adquirir fornecer receber ter em depósito transportar ceder ainda que gratuitamente emprestar remeter empregar manter sob guarda ou ocultar arma de fogo acessório ou munição de uso permitido sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar não depende do tipo ou da quantidade da munição portada pelo agente44 j Rádio pirata O Supremo Tribunal Federal não tem admitido o princípio da insignificância no desenvolvimento de atividade de radiofrequência sem autorização do órgão regulador ainda que sejam de baixa frequência as ondas de radiodifusão emitidas pela rádio clandestina por se tratar de delito formal e de perigo abstrato pois compromete a regularidade do sistema de telecomunicações independentemente da comprovação de qualquer prejuízo45 É também a posição estampada na Súmula 606 do Superior Tribunal de Justiça Não se aplica o princípio da insignificância a casos de transmissão clandestina de sinal de internet via radiofrequência que caracteriza o fato típico previsto no art 183 da Lei 94721997 k Atos infracionais Atos infracionais são os crimes e as contravenções penais cometidos por crianças ou adolescentes É o que se extrai do art 103 da Lei 80691990 Estatuto da Criança e do Adolescente E dependendo da natureza do ato infracional o Supremo Tribunal Federal aceita a incidência do princípio da insignificância46 O raciocínio é simples Se para um indivíduo maior de idade é cabível o reconhecimento da criminalidade de bagatela para um menor de 18 anos também o será l Evasão de divisas No crime de evasão de divisas praticado mediante operação da modalidade dólarcabo tipificado no art 22 parágrafo único 1ª parte da Lei 74921986 Crimes contra o Sistema Financeiro Nacional não se aplica o teto de R 1000000 previsto na Lei 105222002 como parâmetro para incidência do princípio da insignificância Na linha da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça Nos casos de evasão de divisas praticada mediante operação do tipo dólarcabo não é possível utilizar o valor de R 10 mil como parâmetro para fins de aplicação do princípio da insignificância Conforme entendimento adotado pelo STF na AP 470 as transações conhecidas como operações dólarcabo nas quais são efetuados pagamentos em reais no Brasil com o objetivo de disponibilizar por meio de quem recebe tal pagamento o respectivo montante em moeda estrangeira no exterior preenchem os elementos do delito de evasão de divisas na forma do art 22 parágrafo único primeira parte da Lei n 74921986 que tipifica a conduta daquele que a qualquer título promove sem autorização legal a saída de moeda ou divisa para o exterior As regras que disciplinam a transferência internacional de valores e que portanto estabelecem o significado de saída de divisa ou moeda sem autorização legal são diversas em relação à saída física e à saída eletrônica Para bem compreender tais diferenças transcrevese integralmente o art 65 da Lei n 90691995 com a redação vigente à época dos fatos Art 65 O ingresso no País e a saída do País de moeda nacional e estrangeira serão processados exclusivamente através de transferência bancária cabendo ao estabelecimento bancário a perfeita identificação do cliente ou do beneficiário 1º Excetuase do disposto no caput deste artigo o porte em espécie dos valores I quando em moeda nacional até R 1000000 dez mil reais II quando em moeda estrangeira o equivalente a R 1000000 dez mil reais III quando comprovada a sua entrada no País ou sua saída do País na forma prevista na regulamentação pertinente 2º O Conselho Monetário Nacional segundo diretrizes do Presidente da República regulamentará o disposto neste artigo dispondo inclusive sobre os limites e as condições de ingresso no País e saída do País da moeda nacional 3º A não observância do contido neste artigo além das sanções penais previstas na legislação específica e após o devido processo legal acarretará a perda do valor excedente dos limites referidos no 1º deste artigo em favor do Tesouro Nacional O referido dispositivo excetua apenas o porte em espécie do valor de até R 10 mil ou o equivalente em moeda estrangeira além de remeter ao estabelecimento de outras hipóteses na forma prevista na regulamentação pertinente Assim não prospera a tese de que deve ser considerado atípico o envio de moeda ou divisas ao exterior se o volume de cada operação não exceder a R 10 mil Isso porque em primeiro lugar ressalvada a hipótese do porte de valores em espécie o ingresso no país e a saída do país de moeda nacional e estrangeira serão processados exclusivamente através de transferência bancária cabendo ao estabelecimento bancário a perfeita identificação do cliente ou do beneficiário art 65 caput da Lei n 90691995 Ou seja a legislação excepcionou em relação ao valor inferior a R 10 mil ou seu equivalente em moeda estrangeira apenas a saída física de moeda No caso de transferência eletrônica saída meramente escritural da moeda a lei exige de forma exclusiva o processamento através do sistema bancário com perfeita identificação do cliente ou beneficiário Além disso no caso da transferência clandestina internacional por meio de operações do tipo dólarcabo ou equivalente existe uma facilidade muito grande na realização de centenas ou até milhares de operações fragmentadas sequenciais É muito mais simples do que a transposição física por diversas vezes das fronteiras do país com valores inferiores a R 10 mil Admitir a atipicidade das operações do tipo dólarcabo com valores inferiores a R 10 mil é fechar a janela mas deixar a porta aberta para a saída clandestina de divisas47 m Violência doméstica ou familiar contra a mulher Não se aplica o princípio da insignificância em qualquer dos crimes 2236 praticados com violência doméstica ou familiar contra a mulher Para o Supremo Tribunal Federal Inadmissível a aplicação do princípio da insignificância aos delitos praticados em situação de violência doméstica Com base nessa orientação a Segunda Turma negou provimento a recurso ordinário em habeas corpus no qual se pleiteava a incidência de tal princípio ao crime de lesão corporal cometido em âmbito de violência doméstica contra a mulher Lei 113402006 Lei Maria da Penha48 Esse entendimento também se encontra consolidado na Súmula 589 do Superior Tribunal de Justiça É inaplicável o princípio da insignificância nos crimes ou contravenções penais praticados contra a mulher no âmbito das relações domésticas Princípio da insignificância e infrações penais de menor potencial ofensivo Não se pode confundir a criminalidade de bagatela com as infrações penais de menor potencial ofensivo definidas pelo art 61 da Lei 90991995 a saber todas as contravenções penais e os crimes com pena privativa de liberdade em abstrato igual ou inferior a dois anos Nessas últimas não há falar em automática insignificância da conduta notadamente porque a situação foi expressamente prevista no art 98 I da Constituição Federal e regulamentada posteriormente pela legislação ordinária revelando a existência de gravidade suficiente para justificar a intervenção estatal Na dicção do Supremo Tribunal Federal Ao prever por exemplo a categoria de infrações de menor potencial ofensivo inciso I do art 98 a Constituição Federal logicamente nega a significância penal de tudo que ficar aquém desse potencial de logo rotulado de menor ou seja quando a Constituição Federal concebe a categoria das infrações de menor potencial ofensivo parece mesmo que o faz na perspectiva de uma conduta atenuadamente danosa para a vítima e a sociedade é certo mas ainda assim em grau suficiente de lesividade para justificar uma reação estatal punitiva Pelo que estabelece um vínculo operacional direto entre o efetivo dano ao bem jurídico tutelado 2237 2238 por menor que seja e a necessidade de uma resposta punitiva do Estado49 A questão do furto privilegiado No campo do furto é preciso distinguir o princípio da insignificância da figura privilegiada CP art 155 2º Nesta a coisa é de pequeno valor inferior a um salário mínimo enquanto naquele seu valor é irrelevante para o Direito Penal por não colocar em risco o bem jurídico penalmente tutelado Para o Supremo Tribunal Federal É necessário distinguir o furto insignificante daquele referente à subtração de bem de pequeno valor de modo a não estimular a prática de condutas criminosas e obstar a aplicação da figura do furto privilegiado previsto no art 155 2º do Código Penal No caso o valor dos bens subtraídos não pode ser considerado ínfimo de modo a caracterizar a conduta como minimamente ofensiva Conforme destacou o Superior Tribunal de Justiça os bens subtraídos foram avaliados em 22500 duzentos e vinte e cinco reais aproximadamente 65 do valor do salário mínimo vigente à época dos fatos R 35000 não havendo que se falar em irrelevância da conduta Precedentes50 Este raciocínio é igualmente aplicável aos demais delitos contra o patrimônio que admitem o privilégio a exemplo da apropriação indébita CP art 170 do estelionato CP art 171 1º e da receptação CP art 180 5º in fine Princípio da insignificância e sua valoração pela autoridade policial A quem compete valorar a incidência do princípio da insignificância Em outros termos a autoridade policial pode deixar de efetuar a prisão em flagrante por reputar presente a criminalidade de bagatela O Superior Tribunal de Justiça entende que somente o Poder Judiciário é dotado de poderes para efetuar o reconhecimento do princípio da insignificância Destarte a autoridade policial está obrigada a efetuar a prisão em flagrante cabendolhe submeter imediatamente a questão à autoridade 2239 judiciária competente Como já se decidiu no momento em que toma conhecimento de um delito surge para a autoridade policial o dever legal de agir e efetuar o ato prisional O juízo acerca da incidência do princípio da insignificância é realizado apenas em momento posterior pelo Poder Judiciário de acordo com as circunstâncias atinentes ao caso concreto51 Com o devido respeito ousamos discordar desta linha de pensamento por uma simples razão o princípio da insignificância afasta a tipicidade do fato Logo se o fato é atípico para a autoridade judiciária também apresenta igual natureza para a autoridade policial Não se pode conceber exemplificativamente a obrigatoriedade da prisão em flagrante no tocante à conduta de subtrair um único pãozinho avaliado em poucos centavos do balcão de uma padaria sob pena de banalização do Direito Penal e do esquecimento de outros relevantes princípios tais como o da intervenção mínima da subsidiariedade da proporcionalidade e da lesividade Para nós o mais correto é agir com prudência no caso concreto acolhendo o princípio da insignificância quando a situação fática efetivamente comportar sua incidência Princípio da insignificância imprópria ou da criminalidade de bagatela imprópria De acordo com esse princípio também sem previsão legal no Brasil inexiste legitimidade na imposição da pena nas hipóteses em que nada obstante a infração penal esteja indiscutivelmente caracterizada a aplicação da reprimenda desponte como desnecessária e inoportuna Em outras palavras infração crime ou contravenção penal de bagatela imprópria é aquela que surge como relevante para o Direito Penal pois apresenta desvalor da conduta e desvalor do resultado O fato é típico e ilícito o agente é dotado de culpabilidade e o Estado possui o direito de punir punibilidade Mas após a prática do fato a pena revelase incabível no caso concreto pois diversos fatores recomendam seu afastamento tais como sujeito com 224 personalidade ajustada ao convívio social primário e sem antecedentes criminais colaboração com a Justiça reparação do dano causado à vítima reduzida reprovabilidade do comportamento reconhecimento da culpa ônus provocado pelo fato de ter sido processado ou preso provisoriamente etc A análise da pertinência da bagatela imprópria há de ser realizada obrigatoriamente na situação fática e jamais no plano abstrato Nesse contexto o fato real deve ser confrontado com um princípio basilar do Direito Penal qual seja o da necessidade da pena consagrado no art 59 caput do Código Penal O juiz levando em conta as circunstâncias simultâneas e posteriores ao fato típico e ilícito cometido por agente culpável deixa de aplicar a pena pois falta interesse para tanto Exemplo A cometeu o crime furto privilegiado CP art 155 2º Dois anos depois do fato sem ter ainda se verificado a prescrição notase que ele não apresentou nenhum outro deslize em seu comportamento razão pela qual a pena quiçá revelese prescindível para atender às finalidades do Direito Penal Vejase que ao contrário do que se verifica no princípio da insignificância própria o sujeito é regularmente processado A ação penal precisa ser iniciada mas a análise das circunstâncias do fato submetido ao crivo do Poder Judiciário recomenda a exclusão da pena Destarte a bagatela imprópria funciona como causa supralegal de extinção da punibilidade Finalmente é de se observar que a bagatela imprópria tem como pressuposto inafastável a não incidência do princípio da insignificância própria Com efeito se o fato não era merecedor da tutela penal em decorrência da sua atipicidade descabe enveredar pela discussão acerca da necessidade ou não de pena Princípio da individualização da pena Expressamente indicado pelo art 5º XLVI da Constituição Federal repousa no princípio de justiça segundo o qual se deve distribuir a cada indivíduo o que lhe cabe de acordo com as circunstâncias específicas do seu comportamento o que em matéria penal significa a aplicação da pena levando em conta não a norma penal em abstrato mas especialmente os aspectos subjetivos e objetivos do crime52 225 O princípio da individualização da pena desenvolvese em três planos legislativo judicial e administrativo No prisma legislativo é respeitado quando o legislador descreve o tipo penal e estabelece as sanções adequadas indicando precisamente seus limites mínimo e máximo e também as circunstâncias aptas a aumentar ou diminuir as reprimendas cabíveis A individualização judicial ou jurisdicional complementa a legislativa pois esta não pode ser extremamente detalhista nem é capaz de prever todas as situações da vida concreta que possam aumentar ou diminuir a sanção penal É efetivada pelo magistrado mediante a aplicação da pena utilizando se de todos os instrumentais fornecidos pelos autos da ação penal em obediência ao sistema trifásico delineado pelo art 68 do Código Penal pena privativa de liberdade ou ainda ao sistema bifásico inerente à sanção pecuniária CP art 49 Finalmente a individualização administrativa é efetuada durante a execução da pena quando o Estado deve zelar por cada condenado de forma singular mediante tratamento penitenciário ou sistema alternativo no qual se afigure possível a integral realização das finalidades da pena retribuição prevenção geral e especial e ressocialização Princípio da alteridade Criado por Claus Roxin esse princípio proíbe a incriminação de atitude meramente interna do agente bem como do pensamento ou de condutas moralmente censuráveis incapazes de invadir o patrimônio jurídico alheio Em síntese ninguém pode ser punido por causar mal apenas a si próprio pois uma das características inerentes ao Direito Penal moderno repousa na necessidade de intersubjetividade nas relações penalmente relevantes53 Como já advertia Stuart Mill citado por Raúl Cervini Nenhuma lei criminal deve ser usada para obrigar as pessoas a atuar em seu próprio benefício o único propósito para o qual o poder público pode exercitarse com direito sobre qualquer membro da comunidade civilizada contra sua vontade é para prevenir danos a outros Seu 226 próprio bem seja físico ou moral não é uma razão suficiente54 Nesse princípio se fundamenta a impossibilidade de punição da autolesão bem como a atipicidade da conduta de consumir drogas uma vez que o crime tipificado pelo art 28 da Lei 113432006 tem a saúde pública como objetividade jurídica Princípio da confiança Bastante difundido no Direito Penal espanhol tratase de requisito para a existência do fato típico e se baseia na premissa de que todos devem esperar por parte das demais pessoas comportamentos responsáveis e em consonância com o ordenamento jurídico almejando evitar danos a terceiros Devese confiar que o comportamento dos outros se dará de acordo com as regras da experiência levandose em conta um juízo estatístico alicerçado naquilo que normalmente acontece id quod plerumque accidit Foi desenvolvido inicialmente pela jurisprudência para enfrentar os problemas resultantes dos crimes praticados na direção de veículo automotor Atualmente sua utilização é bastante ampla notadamente nos setores em que exista atuação conjunta de indivíduos entendendose por isso as atividades comunitárias ou em divisão de trabalho Para Juarez Tavares Segundo este princípio todo aquele que atende adequadamente ao cuidado objetivamente exigido pode confiar que os demais coparticipantes da mesma atividade também operem cuidadosamente A consequência da aplicação deste pensamento no direito penal será a de excluir a responsabilidade dos agentes em relação a fatos que se estendam para além do dever concreto que lhes é imposto nas circunstâncias e nas condições existentes no momento de realizar a atividade Como seria absolutamente impossível exigirse de cada pessoa uma atenção extraordinária que pudesse ir além daquela que lhe era atribuível segundo juízo concreto de adequação este princípio vigora como limitador do dever de cuidado precisamente no âmbito da atividade concreta55 227 228 Princípio da adequação social Não pode ser confundido com a teoria social da conduta idealizada por Johannes Wessels Capítulo 10 item 1024 De acordo com esse princípio que funciona como causa supralegal de exclusão da tipicidade pela ausência da tipicidade material não pode ser considerado criminoso o comportamento humano que embora tipificado em lei não afrontar o sentimento social de Justiça56 É o caso exemplificativamente dos trotes acadêmicos moderados e da circuncisão realizada pelos judeus Advirtase porém que a autorização legal para o exercício de determinada profissão não implica automaticamente na adequação social dos crimes praticados em seu bojo Já decidiu o Superior Tribunal de Justiça que em crime de descaminho praticado por camelô a existência de lei regulamentando tal atividade não conduz ao reconhecimento de que o descaminho é socialmente aceitável57 Princípio da intervenção mínima No campo penal o princípio da reserva legal não basta para salvaguardar o indivíduo O Estado respeitada a prévia legalidade dos delitos e das penas pode criar tipos penais iníquos e instituir penas vexatórias à dignidade da pessoa humana Para enfrentar esse problema estatuiu a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789 em seu art 8º que a lei somente deve prever as penas estrita e evidentemente necessárias Surgia o princípio da intervenção mínima ou da necessidade afirmando ser legítima a intervenção penal apenas quando a criminalização de um fato se constitui meio indispensável para a proteção de determinado bem ou interesse não podendo ser tutelado por outros ramos do ordenamento jurídico Nesse contexto já decidiu o Superior Tribunal de Justiça A missão do Direito Penal moderno consiste em tutelar os bens jurídicos mais relevantes Em decorrência disso a intervenção penal deve ter o caráter fragmentário protegendo apenas os bens jurídicos mais 2281 importantes e em casos de lesões de maior gravidade58 A intervenção mínima tem como destinatários principais o legislador e o intérprete do Direito Àquele recomenda moderação no momento de eleger as condutas dignas de proteção penal abstendose de incriminar qualquer comportamento Somente deverão ser castigados aqueles que não puderem ser contidos por outros ramos do Direito Como enfatiza Claus Roxin é evidente que nada favorece tanto a criminalidade como a penalização de qualquer bagatela59 Mas não é só Ao operador do Direito exige não proceder à operação de tipicidade quando constatar que a pendência pode ser satisfatoriamente resolvida com a atuação de outros ramos do sistema jurídico em que pese a criação pelo legislador do tipo penal incriminador É utilizado para amparar a corrente do direito penal mínimo Vale ressaltar contudo que a compreensão daquilo que se entende por intervenção mínima varia de acordo com as correntes penais e com a interpretação dos operadores do Direito Confirase o posicionamento do Supremo Tribunal Federal O sistema jurídico há de considerar a relevantíssima circunstância de que a privação da liberdade e a restrição de direitos do indivíduo somente se justificam quando estritamente necessárias à própria proteção das pessoas da sociedade e de outros bens jurídicos que lhes sejam essenciais notadamente naqueles casos em que os valores penalmente tutelados se exponham a dano efetivo ou potencial impregnado de significativa lesividade O direito penal não se deve ocupar de condutas que produzam resultado cujo desvalor por não importar em lesão significativa a bens jurídicos relevantes não represente por isso mesmo prejuízo importante seja ao titular do bem jurídico tutelado seja à integridade da própria ordem social60 Do princípio da intervenção mínima decorrem outros dois fragmentariedade e subsidiariedade Princípio da fragmentariedade ou caráter fragmentário do Direito Penal Estabelece que nem todos os ilícitos configuram infrações penais mas apenas os que atentam contra valores fundamentais para a manutenção e o progresso do ser humano e da sociedade Em resumo todo ilícito penal será também ilícito perante os demais ramos do Direito mas a recíproca não é verdadeira Imaginemos dois círculos e assim poderemos visualizar que um deles representando o Direito Penal de tamanho menor está envolto por outro maior Dessa forma todo conteúdo do ilícito penal estaria absorvido pelo círculo mais amplo representativo do ilícito genérico Entretanto parte da figura maior não teria contato com aquela que aloja o Direito Penal e estaria protegida pela fragmentariedade Tomemos como exemplo o crime de furto Agora raciocinemos levando em conta o gráfico acima apontado É fácil concluir que uma vez praticado o delito contra o patrimônio a conduta do agente também será considerada ilícita nos demais ramos do ordenamento jurídico notadamente perante o Direito Civil De outro lado nem todo ilícito civil como é o caso da violação da posse ou da propriedade sem subtração caracterizará o crime de furto Destarte podese afirmar que em razão de seu caráter fragmentário o Direito Penal é a última etapa de proteção do bem jurídico Esse princípio deve ser utilizado no plano abstrato para o fim de permitir a criação de tipos penais somente quando os demais ramos do Direito tiverem falhado na tarefa de proteção de um bem jurídico61 Referese assim 2282 à atividade legislativa Nas palavras de Luiz Luisi O direito penal como já notara Binding não encerra um sistema exaustivo de proteção e bens jurídicos mas um sistema descontínuo de ilícitos decorrentes da necessidade de criminalizálos por ser este o meio indispensável de tutela jurídica62 Portanto o Direito Penal preocupase unicamente com alguns comportamentos fragmentos contrários ao ordenamento jurídico tutelando somente os bens jurídicos mais importantes à manutenção e ao desenvolvimento do indivíduo e da coletividade Em conclusão a palavra fragmentariedade emana de fragmento no universo da ilicitude somente alguns blocos alguns poucos fragmentos constituemse em ilícitos penais Pensemos em uma visão noturna o céu representaria a ilicitude em geral as estrelas seriam os ilícitos penais Com a evolução da sociedade e a modificação dos seus valores nada impede a fragmentariedade às avessas nas situações em que um comportamento inicialmente típico deixa de interessar ao Direito Penal sem prejuízo da sua tutela pelos demais ramos do Direito Foi o que aconteceu a título ilustrativo com o adultério Esta conduta foi descriminalizada com a revogação do art 240 do Código Penal pela Lei 111062005 mas continua ilícita perante o Direito Civil Princípio da subsidiariedade De acordo com o princípio da subsidiariedade a atuação do Direito Penal é cabível unicamente quando os outros ramos do Direito e os demais meios estatais de controle social tiverem se revelado impotentes para o controle da ordem pública Em outras palavras o Direito Penal funciona como um executor de reserva entrando em cena somente quando outros meios estatais de proteção mais brandos e portanto menos invasivos da liberdade individual não forem suficientes para a proteção do bem jurídico tutelado Caso não seja necessário dele lançar mão ficará de prontidão aguardando ser chamado pelo operador do Direito para aí sim enfrentar uma conduta que coloca em risco a estrutura 229 da sociedade Nas palavras de Santiago Mir Puig O Direito Penal deixa de ser necessário para proteger a sociedade quando isto se pode conseguir por outros meios que serão preferíveis enquanto sejam menos lesivos para os direitos individuais Tratase de uma exigência de economia social coerente com a lógica do Estado social que deve buscar o maior bem social com o menor custo social O princípio da máxima utilidade possível para as possíveis vítimas deve combinarse com o de mínimo sofrimento necessário para os delinquentes Ele conduz a uma fundamentação utilitarista do Direito Penal no tendente à maior prevenção possível senão ao mínimo de prevenção imprescindível Entra em jogo assim o princípio da subsidiariedade segundo o qual o Direito Penal há de ser a ultima ratio o último recurso a utilizar à falta de outros menos lesivos63 Este princípio ao contrário do postulado da fragmentariedade se projeta no plano concreto isto é em sua atuação prática o Direito Penal somente se legitima quando os demais meios disponíveis já tiverem sido empregados sem sucesso para proteção do bem jurídico Guarda relação portanto com a tarefa de aplicação da lei penal Em outras palavras o crime já existe mas no plano da realidade o tipo penal não pode ser utilizado pois nesta hipótese não há legitimidade na atuação do Direito Penal Na ótica do Superior Tribunal de Justiça O paciente foi denunciado porque se constatou em imóvel de sua propriedade suposta subtração de água mediante ligação direta com a rede da concessionária do serviço público Anotese que à época dos fatos ele não residia no imóvel mas quitou o respectivo débito Dessarte é aplicável o princípio da subsidiariedade pelo qual a intervenção penal só é admissível quando os outros ramos do Direito não conseguem bem solucionar os conflitos sociais Daí que na hipótese em que o ilícito toma contornos meramente contratuais e tem equacionamento no plano civil não está justificada a persecução penal64 Princípio da proporcionalidade De acordo com o princípio da proporcionalidade também conhecido como princípio da razoabilidade ou da convivência das liberdades públicas a criação de tipos penais incriminadores deve constituirse em atividade vantajosa para os membros da sociedade eis que impõe um ônus a todos os cidadãos decorrente da ameaça de punição que a eles acarreta Sua origem normativa remonta aos itens 20 e 21 da Magna Carta do Rei João sem Terra de 121565 Nos moldes atuais foi desenvolvido inicialmente na Alemanha sob inspiração de pensamentos jusnaturalistas e iluministas com os quais se afirmaram as ideias de que a limitação da liberdade individual só se justifica para a concretização de interesses coletivos superiores66 O princípio da proporcionalidade funciona como forte barreira impositiva de limites ao legislador Por corolário a lei penal que não protege um bem jurídico é ineficaz por se tratar de intervenção excessiva na vida dos indivíduos em geral Se não bastasse incide também na dosimetria da penabase Como já decidido pelo Superior Tribunal de Justiça Na fixação da penabase além do respeito aos ditames legais e da avaliação criteriosa das circunstâncias judiciais deve ser observado o princípio da proporcionalidade para que a resposta penal seja justa e suficiente para cumprir o papel de reprovação do ilícito67 Em outras palavras o princípio da proporcionalidade possui três destinatários o legislador proporcionalidade abstrata o juiz da ação penal proporcionalidade concreta e os órgãos da execução penal proporcionalidade executória Na proporcionalidade abstrata ou legislativa são eleitas as penas mais apropriadas para cada infração penal seleção qualitativa bem como as respectivas graduações mínimo e máximo seleção quantitativa Na proporcionalidade concreta ou judicial orientase o magistrado no julgamento da ação penal promovendo a individualização da pena adequada ao caso concreto Finalmente na proporcionalidade executória ou administrativa incidem regras inerentes ao cumprimento da pena levandose em conta as condições pessoais e o mérito do condenado Vale destacar que modernamente o princípio da proporcionalidade deve ser analisado sobre uma dupla face Inicialmente constituise em proibição ao excesso pois é vedada a cominação e aplicação de penas em dose exagerada e desnecessária Um exemplo marcante disto encontrase na exagerada reprimenda cominada ao delito tipificado no art 273 do Código Penal falsificação de medicamentos Esta conclusão é compartilhada pelo Superior Tribunal de Justiça que inclusive já aplicou em substituição à sanção atribuída à modalidade contida no 1ºB inc V do citado dispositivo legal a pena prevista ao tráfico de drogas Lei 113432006 art 33 caput É inconstitucional o preceito secundário do art 273 1ºB V do CP reclusão de 10 dez a 15 quinze anos e multa devendose considerar no cálculo da reprimenda a pena prevista no caput do art 33 da Lei 113432006 Lei de Drogas com possibilidade de incidência da causa de diminuição de pena do respectivo 4º De fato é viável a fiscalização judicial da constitucionalidade de preceito legislativo que implique intervenção estatal por meio do Direito Penal examinando se o legislador considerou suficientemente os fatos e prognoses e se utilizou de sua margem de ação de forma adequada para a proteção suficiente dos bens jurídicos fundamentais Nesse sentido a Segunda Turma do STF HC 104410RS DJe 2732012 expôs o entendimento de que os mandatos constitucionais de criminalização impõem ao legislador o dever de observância do princípio da proporcionalidade como proibição de excesso e como proibição de proteção insuficiente A ideia é a de que a intervenção estatal por meio do Direito Penal como ultima ratio deve ser sempre guiada pelo princípio da proporcionalidade Abrese com isso a possibilidade do controle da constitucionalidade da atividade legislativa em matéria penal Sendo assim em atenção ao princípio constitucional da proporcionalidade e razoabilidade das leis restritivas de direitos CF art 5º LIV é imprescindível a atuação do Judiciário para corrigir o exagero e ajustar a pena de reclusão de 10 dez a 15 quinze anos e multa abstratamente cominada à conduta inscrita no art 273 1ºB V do CP referente ao crime de ter em depósito para venda produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais de procedência ignorada Isso porque se esse delito for comparado por exemplo com o crime de tráfico ilícito de drogas notoriamente mais grave e cujo bem jurídico também é a saúde pública percebese a total falta de razoabilidade do preceito secundário do art 273 1ºB do CP sobretudo após a edição da Lei 113432006 Lei de Drogas que apesar de ter aumentado a pena mínima de 3 para 5 anos introduziu a possibilidade de redução da reprimenda quando aplicável o 4º do art 33 de 16 a 23 Com isso em inúmeros casos o esporádico e pequeno traficante pode receber a exígua pena privativa de liberdade de 1 ano e 8 meses E mais é possível ainda sua substituição por restritiva de direitos De mais a mais constatase que a pena mínima cominada ao crime ora em debate excede em mais de três vezes a pena máxima do homicídio culposo corresponde a quase o dobro da pena mínima do homicídio doloso simples é cinco vezes maior que a pena mínima da lesão corporal de natureza grave enfim é mais grave do que a do estupro do estupro de vulnerável da extorsão mediante sequestro situação que gera gritante desproporcionalidade no sistema penal Além disso como se trata de crime de perigo abstrato que independe da prova da ocorrência de efetivo risco para quem quer que seja a dispensabilidade do dano concreto à saúde do pretenso usuário do produto evidencia ainda mais a falta de harmonia entre esse delito e a pena abstratamente cominada pela redação dada pela Lei 96771998 de 10 a 15 anos de reclusão Ademais apenas para seguir apontando a desproporcionalidade devese ressaltar que a conduta de importar medicamento não registrado na ANVISA considerada criminosa e hedionda pelo art 273 1ºB do CP a que se comina pena altíssima pode acarretar mera sanção administrativa de advertência nos termos dos arts 2º 4º 8º IV e 10 IV todos da Lei n 64371977 que define as infrações à legislação sanitária A ausência de relevância penal da conduta a desproporção da pena em ponderação com o dano ou perigo de dano à saúde pública decorrente da ação e a inexistência de consequência calamitosa do agir convergem para que se conclua pela falta de razoabilidade da pena prevista na lei tendo em vista que a 2210 restrição da liberdade individual não pode ser excessiva mas compatível e proporcional à ofensa causada pelo comportamento humano criminoso Quanto à possibilidade de aplicação para o crime em questão da pena abstratamente prevista para o tráfico de drogas reclusão de 5 cinco a 15 quinze anos e pagamento de 500 quinhentos a 1500 mil e quinhentos diasmulta art 33 da Lei de drogas a Sexta Turma do STJ REsp 915442SC DJe 1º022011 dispôs que A Lei 967798 ao alterar a pena prevista para os delitos descritos no artigo 273 do Código Penal mostrouse excessivamente desproporcional cabendo portanto ao Judiciário promover o ajuste principiológico da norma Tratando se de crime hediondo de perigo abstrato que tem como bem jurídico tutelado a saúde pública mostrase razoável a aplicação do preceito secundário do delito de tráfico de drogas ao crime de falsificação corrupção adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais68 Se de um lado o princípio da proporcionalidade impõe a proibição do excesso de outro lado este postulado também impede a proteção insuficiente de bens jurídicos pois não tolera a punição abaixo da medida correta Nas palavras de Paulo Queiroz Convém notar todavia que o princípio da proporcionalidade compreende além da proibição de excesso a proibição de insuficiência da intervenção jurídicopenal Significa dizer que se por um lado deve ser combatida a sanção desproporcional porque excessiva por outro lado cumpre também evitar a resposta penal que fique muito aquém do seu efetivo merecimento dado o seu grau de ofensividade e significação políticocriminal afinal a desproporção tanto pode darse para mais quanto para menos Exemplo disso de insuficiência da resposta penal são os crimes de abuso de autoridade previstos na Lei n 48981965 que comina para as graves infrações que define pena de detenção de dez dias a seis meses art 6º 3º b69 Princípio da humanidade Esse princípio apregoa a inconstitucionalidade da criação de tipos penais 2211 2212 ou a cominação de penas que violam a incolumidade física ou moral de alguém Dele resulta a impossibilidade de a pena passar da pessoa do condenado com exceção de alguns efeitos extrapenais da condenação como a obrigação de reparar o dano na esfera civil CF art 5º XLV Decorre da dignidade da pessoa humana70 consagrada no art 1º III da Constituição Federal como fundamento da República Federativa do Brasil Foi com base nesse princípio entre outros que o Supremo Tribunal Federal declarou inconstitucional o regime integralmente fechado para cumprimento da pena privativa de liberdade nos crimes hediondos e equiparados problema superado com a edição da Lei 114642007 Princípio da ofensividade ou da lesividade Não há infração penal quando a conduta não tiver oferecido ao menos perigo de lesão ao bem jurídico Este princípio atende a manifesta exigência de delimitação do Direito Penal tanto em nível legislativo como no âmbito jurisdicional De acordo com o clássico ensinamento de Francesco Palazzo Em nível legislativo o princípio da lesividade ou ofensividade enquanto dotado de natureza constitucional deve impedir o legislador de configurar tipos penais que já hajam sido construídos in abstracto como fatores indiferentes e preexistentes à norma Do ponto de vista pois do valor e dos interesses sociais já foram consagrados como inofensivos Em nível jurisdicionalaplicativo a integral atuação do princípio da lesividade deve comportar para o juiz o dever de excluir a subsistência do crime quando o fato no mais em tudo se apresenta na conformidade do tipo mas ainda assim concretamente é inofensivo ao bem jurídico específico tutelado pela norma71 Princípio da exclusiva proteção do bem jurídico O Direito Penal moderno é o Direito Penal do bem jurídico Nessa seara o princípio da exclusiva proteção do bem jurídico veda ao Direito Penal a preocupação com as intenções e pensamentos das pessoas do seu modo de 22121 viver ou de pensar ou ainda de suas condutas internas enquanto não exteriorizada a atividade delitiva O Direito Penal se destina à tutela de bens jurídicos não podendo ser utilizado para resguardar questões de ordem moral ética ideológica religiosa política ou semelhantes Com efeito a função primordial do Direito Penal é a proteção de bens jurídicos fundamentais para a preservação e o desenvolvimento do indivíduo e da sociedade Como já decidido pelo Supremo Tribunal Federal Pelo que é possível extrair do ordenamento jurídico brasileiro a premissa de que toda conduta penalmente típica só é penalmente típica porque significante de alguma forma para a sociedade e a própria vítima É falar em tema de política criminal a Constituição Federal pressupõe lesão significante a interesses e valores os chamados bens jurídicos por ela avaliados como dignos de proteção normativa72 O princípio da exclusiva proteção do bem jurídico não se confunde com o princípio da alteridade Neste há um bem jurídico a ser penalmente tutelado mas pertencente exclusivamente ao responsável pela conduta legalmente prevista razão pela qual o Direito Penal não está autorizado a intervir naquele por sua vez não há interesse legítimo a ser protegido pelo Direito Penal Eleição de bens jurídicos e a teoria constitucional do Direito Penal De acordo com a teoria constitucional do Direito Penal a tarefa de criação de crimes e cominação de penas somente se legitima quando são tutelados valores consagrados na Constituição Federal Em outras palavras a eleição dos bens jurídicos dignos de proteção penal deriva dos mandamentos constitucionais Exemplificativamente o fundamento de validade do delito de homicídio é o direito à vida CF art 5º caput assim como o arrimo dos crimes de calúnia difamação e injúria encontrase no art 5º X da Lei Suprema relativo à inviolabilidade da honra Como leciona Claus Roxin O ponto de partida correto consiste em reconhecer que a única restrição 22122 previamente dada para o legislador se encontra nos princípios constitucionais Portanto um conceito de bem jurídico vinculante políticocriminalmente só pode derivar dos valores garantidos na Lei Fundamental do nosso Estado de Direito baseado na liberdade do indivíduo através dos quais são marcados os limites da atividade punitiva do Estado73 A espiritualização desmaterialização ou liquefação de bens jurídicos no Direito Penal A ideia de bem jurídico sempre girou em torno da pessoa humana posteriormente vindo a alcançar também as pessoas jurídicas Nesse contexto somente se configurava uma infração penal quando presente uma lesão dano a interesses individuais das pessoas a exemplo da vida da integridade física do patrimônio da liberdade sexual etc Com a evolução dos tempos e visando a antecipação da tutela penal pois assim mostrouse possível a prevenção de lesões às pessoas o Direito Penal passou a também se preocupar com momentos anteriores ao dano incriminando condutas limitadas à causação do perigo crimes de perigo concreto e abstrato ou seja à exposição de bens jurídicos notadamente de natureza transindividual à probabilidade de dano Exemplificativamente surgiram crimes ambientais pois é sabido que a manutenção do meio ambiente sadio e equilibrado é imprescindível à boa qualidade de vida e do interesse das presentes e futuras gerações nos moldes do art 225 caput da Constituição Federal Para o Supremo Tribunal Federal A criação de crimes de perigo abstrato não representa por si só comportamento inconstitucional por parte do legislador penal A tipificação de condutas que geram perigo em abstrato muitas vezes acaba sendo a melhor alternativa ou a medida mais eficaz para a proteção de bens jurídicopenais supraindividuais ou de caráter coletivo como por exemplo o meio ambiente a saúde etc Portanto pode o legislador dentro de suas amplas margens de avaliação e de decisão definir quais as medidas mais adequadas e necessárias para a efetiva proteção de determinado bem jurídico o que lhe permite escolher 2213 2214 espécies de tipificação próprias de um direito penal preventivo74 A crescente incursão pela seara dos interesses metaindividuais e dos crimes de perigo especialmente os de índole abstrata definidos como os delitos em que a lei presume de forma absoluta a situação de risco ao bem jurídico penalmente tutelado tem sido chamada de espiritualização desmaterialização ou liquefação de bens jurídicos no Direito Penal75 Princípio da imputação pessoal O Direito Penal não pode castigar um fato cometido por agente que atue sem culpabilidade Em outras palavras não se admite a punição quando se tratar de agente inimputável sem potencial consciência da ilicitude ou de quem não se possa exigir conduta diversa O fundamento da responsabilidade penal pessoal é a culpabilidade nulla poena sine culpa Princípio da responsabilidade pelo fato Os tipos penais devem definir fatos associandolhes as penas respectivas e não estereotipar autores em razão de alguma condição específica Não se admite um Direito Penal do autor mas somente um Direito Penal do fato Ninguém pode ser punido exclusivamente por questões pessoais Ao contrário a pena se destina ao agente culpável condenado após o devido processo legal pela prática de um fato típico e ilícito Historicamente pode ser lembrado como Direito Penal do autor o da Alemanha nazista no qual não existiam propriamente crimes mas criminosos Em tempos atuais com ele guarda sintonia o Direito Penal do inimigo idealizado pelo alemão Günther Jakobs estudado mais adiante Capítulo 6 item 654 A tese que sustenta ser a agravante genérica da reincidência resquício de um Direito Penal do autor não pode ser acolhida Com efeito uma vez caracterizada a recidiva a agravação da pena é obrigatória por se constituir em elemento que representa maior reprovação da conduta pelo cometimento de novo crime depois da imposição definitiva de uma pena pela prática de um 2215 2216 1 2 crime anterior revelando que a sanção penal não atingiu suas finalidades de reprovação e prevenção de novos delitos Princípio da personalidade ou da intranscendência Ninguém pode ser responsabilizado por fato cometido por terceira pessoa Consequentemente a pena não pode passar da pessoa do condenado CF art 5º XLV Como reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal O postulado da intranscendência impede que sanções e restrições de ordem jurídica superem a dimensão estritamente pessoal do infrator76 Princípio da responsabilidade penal subjetiva Nenhum resultado penalmente relevante pode ser atribuído a quem não o tenha produzido por dolo ou culpa77 A disposição contida no art 19 do Código Penal Pelo resultado que agrava especialmente a pena só responde o agente que o houver causado ao menos culposamente exclui a responsabilidade penal objetiva O Direito penal moderno é Direito Penal da culpa Não se prescinde do elemento subjetivo É intolerável a responsabilidade pelo fato de outrem À sanção medida políticojurídica de resposta ao delinquente deve ajustarse a conduta delituosa Conduta é fenômeno ocorrente no plano da experiência É fato Fato não se presume Existe ou não existe Para o Supremo Tribunal Federal vige no ordenamento jurídicopenal pátrio o princípio da responsabilidade subjetiva como corolário do Direito Penal do fato adequado ao plexo de garantias vigente no Estado Democrático de Direito Tal sistemática impõe ao órgão acusatório o ônus da prova acerca dos elementos constitutivos do tipo penal incriminador nos termos do art 156 do CPP a ser exercido no seio do contraditório estabelecido em juízo em respeito à cláusula do devido processo legal78 Apontamse vestígios da responsabilidade objetiva em duas situações no Direito Penal brasileiro Seriam as seguintes Rixa qualificada art 137 parágrafo único do Código Penal e Punição das infrações penais praticadas em estado de embriaguez 2217 voluntária ou culposa decorrente da ação da teoria da actio libera in causa art 28 II do CP79 Princípio do ne bis in idem Este princípio derivado da dignidade da pessoa humana e consagrado no art 8º 4 do Pacto de São José da Costa Rica o qual foi ratificado no Brasil pelo Decreto 6781992 proíbe de forma absoluta a dupla punição pelo mesmo fato80 Com base nesse postulado foi editada a Súmula 241 do Superior Tribunal de Justiça A reincidência penal não pode ser considerada como circunstância agravante e simultaneamente como circunstância judicial A reincidência como agravante genérica quando da prática de novo crime contudo não importa em violação desse princípio A regra prevista no art 61 I do Código Penal encontrase em sintonia com o ordenamento jurídico em vigor Na visão do Supremo Tribunal Federal É constitucional a aplicação da reincidência como agravante da pena em processos criminais CP art 61 I Essa a conclusão do Plenário ao desprover recurso extraordinário em que alegado que o instituto configuraria bis in idem bem como ofenderia os princípios da proporcionalidade e da individualização da pena Registrouse que as repercussões legais da reincidência seriam múltiplas não restritas ao agravamento da pena Nesse sentido ela obstaculizaria a cumprimento de pena nos regimes semiaberto e aberto CP art 33 2º b e c b substituição de pena privativa de liberdade por restritiva de direito ou multa CP artigos 44 II e 60 2º c sursis CP art 77 I d diminuição de pena reabilitação e prestação de fiança e e transação e sursis processual em juizados especiais Lei 909995 artigos 76 2º I e 89 Além disso a recidiva seria levada em conta para a deslinde do concurso de agravantes e atenuantes CP art 67 b efeito de lapso temporal quanto ao livramento condicional CP art 83 I e II c interrupção da prescrição CP art 117 VI e d revogação de sursis e livramento condicional a impossibilitar em alguns casos a diminuição da pena a reabilitação e a prestação de fiança CP artigos 155 2º 170 171 1º 95 e CPP art 323 III Consignouse que a reincidência não contrariaria a individualização da pena Ao contrário levarseia em conta justamente o perfil do condenado ao distinguilo daqueles que cometessem a primeira infração penal Nesse sentido lembrouse que a Lei 113432006 preceituaria como causa de diminuição de pena o fato de o agente ser primário e detentor de bons antecedentes art 33 4º Do mesmo modo a recidiva seria considerada no cômputo do requisito objetivo para progressão de regime dos condenados por crime hediondo Nesse aspecto a lei exigiria o implemento de 25 da reprimenda se primário o agente e 35 se reincidente O instituto impediria também o livramento condicional aos condenados por crime hediondo tortura e tráfico ilícito de entorpecentes CP art 83 V Figuraria ainda como agravante da contravenção penal prevista no art 25 do DecretoLei 368841 Influiria na revogação do sursis processual e do livramento condicional assim como na reabilitação CP artigos 81 I e 1º 86 87 e 95 Considerouse que a reincidência comporia consagrado sistema de política criminal de combate à delinquência e que eventual inconstitucionalidade do instituto alcançaria todas as normas acima declinadas Asseverouse que sua aplicação não significaria duplicidade porquanto não alcançaria delito pretérito mas novo ilícito que ocorrera sem que ultrapassado o interregno do art 64 do CP Asseverouse que o julgador deveria ter parâmetros para estabelecer a pena adequada ao caso concreto Nesse contexto a reincidência significaria o cometimento de novo fato antijurídico além do anterior Reputouse razoável o fator de discriminação considerado o perfil do réu merecedor de maior repreensão porque voltara a delinquir a despeito da condenação havida que deveria ter sido tomada como advertência no que tange à necessidade de adoção de postura própria ao homem médio Explicouse que os tipos penais preveriam limites mínimo e máximo de apenação somente alijados se verificada causa de diminuição ou de aumento da reprimenda A definição da pena adequada levaria em conta particularidades da situação inclusive se o agente voltara a claudicar Estaria respaldado então o instituto constitucional da individualização da pena na medida em que se evitaria colocar o reincidente e o agente episódico no mesmo patamar Frisouse que a jurisprudência da Corte filiarseia predominantemente à corrente doutrinária segundo a qual o instituto encontraria fundamento constitucional porquanto atenderia ao princípio da individualização da pena Assinalouse que não se poderia a partir da exacerbação do garantismo penal desmantelar o sistema no ponto consagrador da cabível distinção ao se tratar os desiguais de forma igual A regência da matéria harmônica com a Constituição denotaria razoável política normativa criminal81 Vale ressaltar porém que a existência de duas ou mais ações penais em searas judiciais diversas pela suposta prática de fatos distintos não acarreta violação a esse princípio No trágico acidente envolvendo avião da empresa Gol Linhas Aéreas pronunciouse o Superior Tribunal de Justiça Não ofende o princípio do ne bis in idem o fato de os controladores de voo estarem respondendo a processo na Justiça Militar e na Justiça comum pelo mesmo fato da vida qual seja o acidente aéreo que ocasionou a queda do Boeing 737800 da Gol Linhas Aéreas no Município de Peixoto de Azevedo no Estado do Mato Grosso com a morte de todos os seus ocupantes uma vez que as imputações são distintas Solução que se encontra mutatis mutandis no enunciado da Súmula 90STJ Compete à Justiça Militar processar e julgar o policial militar pela prática do crime militar e à Comum pela prática do crime comum simultâneo àquele82 Na seara deste princípio pode ocorrer uma situação curiosa consistente na existência de duas condenações definitivas proferidas contra o mesmo agente e com base em idêntico fato a primeira lançada por juízo incompetente com pena maior e a segunda editada por juízo competente com pena mais branda Nesse caso a solução adequada é a anulação da primeira decisão judicial com a necessária relativização dos efeitos da coisa julgada Como já decidido pelo Superior Tribunal de Justiça Constatado o trânsito em julgado de duas decisões condenando o agente pela prática de um único crime a primeira proferida por juízo estadual absolutamente incompetente e a segunda proferida pelo juízo federal constitucionalmente competente a condenação anterior deve ser anulada caso se verifique que nela fora imposta pena maior do que a fixada posteriormente Em primeiro lugar fazse necessário asseverar que o STJ já se pronunciou no sentido de que A sentença proferida por juízo absolutamente incompetente impede o exame dos mesmos fatos ainda que pela justiça constitucionalmente competente pois ao contrário estarseia não só diante de vedado bis in idem como também na contramão da necessária segurança jurídica que a imutabilidade da coisa julgada visa garantir RHC 29775PI Quinta Turma DJe 25062013 Com efeito sopesando a garantia do juiz natural em face do princípio do ne bis in idem deve preponderar este último como decorrência do princípio fundamental da dignidade da pessoa humana princípio basilar do Estado Democrático de Direito consoante explicita o inciso III do art 1º da CF Cabe ressaltar a propósito que esse entendimento foi consolidado para dando efetividade ao princípio do favor rei impedir o início ou a continuidade de outro processo que tenha por objetivo discutir os mesmos fatos que já foram objeto de decisão anterior A situação em análise entretanto é peculiar Existem duas condenações transitadas em julgado sendo que a primeira foi proferida por juízo estadual absolutamente incompetente e a segunda pelo juízo constitucionalmente competente tendo este estabelecido inclusive quantum de pena inferior ao definido anteriormente Dessa forma nessa hipótese considerando a situação mais favorável ao réu bem como a existência de trânsito em julgado perante a justiça competente para análise do feito deve ser relativizada a coisa julgada de modo a tornar possível a prevalência do princípio fundamental da dignidade da pessoa humana83 Finalmente a vedação do bis in idem impede a imputação ao agente de um crime e de uma nova ação penal cometido no contexto fático de outro delito o qual era desconhecido na ação penal a este correspondente Para o Superior Tribunal de Justiça O agente que numa primeira ação penal tenha sido condenado pela prática de crime de roubo contra uma instituição bancária não poderá ser numa segunda ação penal condenado por crime de roubo supostamente cometido contra o gerente do banco no mesmo contexto fático considerado na primeira ação penal ainda que a conduta referente a este suposto roubo contra o gerente não tenha sido sequer levada ao conhecimento do juízo da primeira ação penal vindo à tona somente no segundo processo De fato conquanto o suposto roubo contra o gerente do banco não tenha sido sequer levado ao conhecimento do juízo da primeira ação penal ele se encontra sob o âmbito de incidência do princípio ne bis in idem na medida em que praticado no mesmo contexto fático da primeira ação Além disso do contrário ocorreria violação da garantia constitucional da coisa julgada Sobre o tema há entendimento doutrinário no sentido de que Com o trânsito em julgado da sentença condenatória o ato adquire a autoridade de coisa julgada tornandose imutável tanto no processo em que veio a ser proferida a decisão coisa julgada formal quanto em qualquer outro processo onde se pretenda discutir o mesmo fato criminoso objeto da decisão original coisa julgada material No direito brasileiro a sentença condenatória evita se instaure novo processo contra o réu condenado em razão do mesmo fato quer para impingir ao sentenciado acusação mais gravosa quer para aplicar lhe pena mais elevada Portanto não há se falar na hipótese em análise em arquivamento implícito inadmitido pela doutrina e pela jurisprudência tendo em vista que não se cuida de fatos diversos mas sim de um mesmo fato com desdobramentos diversos e apreciáveis ao tempo da instauração da primeira ação penal Ademais a doutrina sustenta que a proibição ne de imposição de mais de uma bis consequência jurídicorepressiva pela prática dos mesmos fatos idem ocorre ainda quando o comportamento definido espaçotemporalmente imputado ao acusado não foi trazido por inteiro para apreciação do juízo Isso porque o objeto do processo é informado pelo princípio da consunção pelo qual tudo aquilo que poderia ter sido imputado ao acusado em referência a dada situação histórica e não o foi jamais poderá vir a sêlo novamente E também se orienta pelos princípios da 2218 unidade e da indivisibilidade devendo o caso penal ser conhecido e julgado na sua totalidade unitária e indivisivelmente e mesmo quando não o tenha sido considerarseá irrepetivelmente decidido Assim em Direito Penal devese reconhecer a prevalência dos princípios do favor rei favor libertatis e ne bis in idem de modo a preservar a segurança jurídica que o ordenamento jurídico demanda HC 173397RS Sexta Turma DJe 1703201184 Princípio da isonomia Consagrouse o princípio da isonomia ou da igualdade como a obrigação de tratar igualmente aos iguais e desigualmente aos desiguais na medida de suas desigualdades Como acentua Celso Antônio Bandeira de Mello O preceito magno da igualdade é norma voltada quer para o aplicador da lei quer para o próprio legislador Deveras não só perante a norma posta se nivelam os indivíduos mas a própria edição dela assujeitase ao dever de dispensar tratamento equânime às pessoas85 No Direito Penal importa em dizer que as pessoas nacionais ou estrangeiras em igual situação devem receber idêntico tratamento jurídico e aquelas que se encontram em posições diferentes merecem um enquadramento diverso tanto por parte do legislador como também pelo juiz86 Exemplificativamente um traficante de drogas primário e com o qual foi apreendida a quantidade de dez gramas de cocaína deve ser apenado mais suavemente do que outro traficante reincidente e preso em flagrante pelo depósito de uma tonelada da mesma droga 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 BANDEIRA DE MELLO Celso Antônio Curso de direito administrativo 14 ed São Paulo Malheiros 2002 p 807808 RHC 117566SP rel Min Luiz Fux 1ª Turma j 24092013 FRAGOSO Heleno Cláudio Lições de direito penal parte geral 15 ed rev e atual por Fernando Fragoso Rio de Janeiro Forense 1994 p 92 Por esse motivo é perfeitamente compatível com as leis penais em branco com os tipos penais abertos e com os crimes culposos A Constituição Federal e o Código Penal não impõem ao tipo penal a definição de todos os elementos da conduta criminosa mas apenas dos mais relevantes podendo os demais ser transferidos a outras leis a atos administrativos ou finalmente à interpretação do magistrado HC 92010ES rel Min Napoleão Nunes Maia Filho 5ª Turma j 21022008 HC 102087MG rel Min Celso de Mello rel p acórdão Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 28022012 HC 104787RJ rel Min Ayres Britto 2ª Turma j 26102010 RHC 122464BA rel Min Celso de Mello 2ª Turma j 10062014 STF HC 97836RS rel Min Celso de Mello 2ª Turma j 19052009 noticiado no Informativo 547 HC 95570SC rel Min Dias Toffoli 1ª Turma j 01062010 noticiado no Informativo 589 STF HC 123108MG rel Min Roberto Barroso Plenário j 03082015 noticiado no Informativo 793 e STJ AgRg no RHC 44461RS rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 27052014 noticiado no Informativo 542 RHC 118972MG rel Min Gilmar Mendes rel p acórdão Min Cármen Lúcia 2ª Turma j 03062014 RHC 93472Ms rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 15032018 noticiado no Informativo 622 HC 123108MG rel Min Roberto Barroso Plenário j 03082015 noticiado no Informativo 793 E também No caso sob exame a conduta do paciente não pode ser considerada minimamente ofensiva pois além 15 16 17 18 19 20 21 22 23 de apresentar elevado grau de reprovabilidade por ser contumaz na prática incriminada verificase que ele é reincidente HC 120489MG rel Min Ricardo Lewandowski 2ª Turma j 10122013 AgRg no AREsp 490599RS rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 23092014 E também HC 299185SP rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 09092014 noticiado no Informativo 548 HC 114723MG rel Min Teori Zavascki 2ª Turma j 26082014 noticiado no Informativo 756 RHC 118014ES rel Min Gilmar Mendes rel p acórdão Min Teori Zavascki 2ª Turma j 12112013 No STJ EREsp 1217514RS rel Min Reynaldo Soares da Fonseca 3ª Seção j 09122015 noticiado no Informativo 575 RHC 31612PB rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 20052014 noticiado no Informativo 541 e HC 241713DF rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 10122013 noticiado no Informativo 534 HC 141440 AgRMG rel Min Dias Toffoli 2ª Turma j 14082018 noticiado no Informativo 911 HC 114194 AgRSP rel Min Celso de Mello 2ª Turma j 06082013 No mesmo sentido HC 118255PR rel Min Ricardo Lewandowski 2ª Turma j 19112013 e HC 114097PA rel Min Teori Zavascki 2ª Turma j 01042014 HC 111017RS rel Min Ayres Britto 2ª Turma j 07022012 Na ótica do STJ Consoante a jurisprudência do STJ a verificação da lesividade mínima da conduta apta a tornála atípica deve levar em consideração não só o valor econômico e a importância do objeto material subtraído mas também a condição econômica da vítima e as circunstâncias e consequências do delito cometido a fim de se determinar se houve ou não relevante lesão ao bem jurídico tutelado STJ HC 247349MS rel Min Assusete Magalhães 6ª Turma j 19022013 HC 96003MS rel Min Ricardo Lewandowski 1ª Turma j 02062009 noticiado no Informativo 549 Não se aplica o princípio da insignificância ao furto de uma máquina de cortar cerâmica avaliada em R 130 que a vítima utilizava usualmente para exercer seu trabalho STJ HC 241713DF rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 10122013 noticiado no Informativo 534 HC 107615MG rel Min Dias Toffoli 1ª Turma j 06092011 24 25 26 27 28 29 30 noticiado no Informativo 639 O Superior Tribunal de Justiça compartilha deste raciocínio HC 190002MG rel Min Og Fernandes 6ª Turma j 03022011 noticiado no Informativo 461 STF HC 115383RS rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 25062013 noticiado no Informativo 712 O STF não admite a incidência do princípio da insignificância no furto qualificado HC 123108MG rel Min Roberto Barroso Plenário j 03082015 noticiado no Informativo 793 STJ REsp 1218765MG rel Min Gilson Dipp 5ª Turma j 01032011 noticiado no Informativo 465 No furto simples o STJ reconheceu a exclusão da tipicidade material pelo princípio da insignificância na subtração de bem móvel de valor equivalente a pouco mais de 23 do salário mínimo vigente no tempo do fato AgRg no HC 254651PE rel Min Jorge Mussi 5ª Turma j 12032013 noticiado no Informativo 516 HC 60185MG rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 03042007 E ainda REsp 1159735MG rel Min Arnaldo Esteves Lima 5ª Turma j 15062010 noticiado no Informativo 439 É também a jurisprudência consolidada no âmbito do STF HC 97190GO rel Min Dias Toffoli 1ª Turma j 1082010 noticiado no Informativo 595 HC 107370SP rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 26042011 noticiado no Informativo 624 O STJ já decidiu nesse sentido admitindo a mitigação da Súmula 599 A despeito do teor do teor do enunciado sumular n 599 no sentido de que O princípio da insignificância é inaplicável aos crimes contra a administração pública as peculiaridades do caso concreto réu primário com 83 anos na época dos fatos e avaria de um cone avaliado em menos de R 2000 ou seja menos de 3 do salário mínimo vigente à época dos fatos justificam a mitigação da referida súmula haja vista que nenhum interesse social existe na onerosa intervenção estatal diante da inexpressiva lesão jurídica provocada RHC 85272RS rel Min Nefi Cordeiro 6ª Turma j 14082018 É pacífica a jurisprudência desta Corte Suprema no sentido de não ser aplicável o princípio da insignificância ou bagatela aos crimes relacionados a entorpecentes seja qual for a qualidade do condenado STF HC 91759MG rel Min Menezes Direito 1ª Turma j 09102007 31 32 33 34 35 36 37 38 39 40 41 RHC 35920DF rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 20052014 noticiado no Informativo 541 HC 110475SC rel Min Dias Toffoli 1ª Turma j 14022012 noticiado no Informativo 655 HC 155374PR rel Min Dias Tóffoli 2ª Turma j 17042018 noticiado no Informativo 898 É também o entendimento do STJ REsp 1688878SP rel Min Sebastião Reis Júnior 3ª Seção j 28022018 noticiado no Informativo 622 HC 128063PR rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 10042018 noticiado no Informativo 897 STJ HC 165003SP rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 20032014 noticiado no Informativo 540 HC 107331RS rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 28052013 e HC 110124SP rel Min Cármen Lúcia 1ª Turma j 14022012 HC 110964SC rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 07022012 noticiado no Informativo 654 É também a posição consolidada no STJ REsp 1427796RS rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 14102014 noticiado no Informativo 551 e AgRg no AREsp 348048RR rel Min Regina Helena Costa 5ª Turma j 18022014 noticiado no Informativo 536 EDcl no AgRg no REsp 1708371PR rel Min Joel Ilan Paciornik 5ª Turma j 24042018 STF HC 122560SC rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 08052018 noticiado no Informativo 901 e RHC 125566PR e HC 127926SC rel Min Dias Toffoli 2ª Turma j 26102016 noticiados no Informativo 845 Inq 3788DF rel Min Cármen Lúcia 2ª Turma j 01032016 noticiado no Informativo 816 Em igual sentido HC 112563SC rel orig Min Ricardo Lewandowski red p o acórdão Min Cezar Peluso 2ª Turma j 21082012 noticiado no Informativo 676 No STJ HC 93859SP rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 13082009 noticiado no Informativo 402 Com conclusão oposta vedando o princípio da insignificância nos crimes ambientais STJ HC 192696SC rel Min Gilson Dipp 5ª Turma j 17032011 noticiado no Informativo 466 STF HC 117638RJ rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 11032014 42 43 44 45 46 47 48 49 50 51 52 53 54 55 56 HC 93251DF rel Min Ricardo Lewandowski 1ª Turma j 05082008 noticiado no Informativo 514 E também HC 96153MG rel Min Cármen Lúcia 1ª Turma j 26052009 noticiado no Informativo 548 O STJ compartilha deste entendimento HC 132614MG rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 01062010 noticiado no Informativo 437 HC 97777MS rel Min Ricardo Lewandowski 1ª Turma j 26102010 noticiado no Informativo 606 HC 131771RJ rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 19102016 noticiado no Informativo 844 HC 131591 AgRAL rel Min Luiz Fux 1ª Turma j 02052017 HC 112400RS rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 22052012 noticiado no Informativo 667 e HC 102655RS rel Min Celso de Mello 2ª Turma j 22062010 noticiado no Informativo 592 REsp 1535956RS rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 01032016 noticiado no Informativo 578 RHC 133043MT rel Min Cármen Lúcia 2ª Turma j 10052016 noticiado no Informativo 825 HC 111017RS rel Min Ayres Britto 2ª Turma j 07022012 HC 120083SC rel Min Teori Zavascki 2ª Turma j 03062014 HC 154949MG rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 03082010 noticiado no Informativo 441 SILVA José Afonso da Comentário contextual à Constituição 4 ed São Paulo Malheiros 2007 p 145 STJ HC 81175SC rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 09112010 noticiado no Informativo 455 CERVINI Raúl Los procesos de descriminalización 2 ed Montevidéu Ed Universidad 1993 p 87 TAVARES Juarez Direito penal da negligência uma contribuição à teoria do crime culposo 2 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 p 294 É incabível a aplicação do princípio da adequação social segundo o qual dada a natureza subsidiária e fragmentária do direito penal não se pode reputar como criminosa uma ação ou uma omissão aceita e tolerada pela sociedade ainda que formalmente subsumida a um tipo legal incriminador STJ RHC 60611DF rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª 57 58 59 60 61 62 63 64 65 66 67 68 69 Turma j 15092015 HC 45153SC rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 30102007 HC 50863PE Rel Min Hélio Quaglia Barbosa 6ª Turma j 04042006 ROXIN Claus Problemas fundamentais de direito penal Trad Ana Paula dos Santos e Luís Natscheradetz 3 ed Lisboa Vega 2004 p 29 HC 92463RS rel Min Celso de Mello 2ª Turma j 16102007 Nesse sentido STF HC 86553SC rel Min Joaquim Barbosa 2ª Turma j 07032006 LUISI Luiz Os princípios constitucionais penais 2 ed Porto Alegre Sergio Fabris 2003 p 40 MIR PUIG Santiago Derecho penal Parte general 5 ed Barcelona Reppertor 1998 p 89 HC 197601RJ rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 28062011 noticiado no Informativo 479 E também AgRg no REsp 928851RS rel Min Jane Silva Desembargadora convocada do TJMG 6ª Turma j 14102008 FELDENS Luciano A Constituição penal a dupla face da proporcionalidade no controle de normas penais Porto Alegre Livraria do Advogado 2005 p 157 FERNANDES Antonio Scarance Processo penal constitucional 4 ed São Paulo RT 2005 p 54 HC 84427RJ rel Min Napoleão Nunes Maia Filho 5ª Turma j 28022008 AI no HC 239363PR rel Min Sebastião Reis Júnior Corte Especial j 26022015 noticiado no Informativo 559 QUEIROZ Paulo Direito penal Parte geral 3 ed São Paulo Saraiva 2006 p 45 Na dicção do STF Os direitos fundamentais não podem ser considerados apenas proibições de intervenção Eingriffsverbote expressando também um postulado de proteção Schutzgebote Podese dizer que os direitos fundamentais expressam não apenas uma proibição do excesso Übermassverbote como também podem ser traduzidos como proibições de proteção insuficiente ou imperativos de tutela Untermassverbote HC 102087MG rel Min Celso de Mello rel p 70 71 72 73 74 75 76 77 78 79 acórdão Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 28022012 A dignidade da pessoa humana deve ser entendida como corolário da natureza humana pois o ser humano deve ser sempre tratado de modo diferenciado em face da sua natureza racional Manifestase em todas as pessoas já que cada um ao respeitar o outro tem a visão do outro A dignidade humana existe em todos os indivíduos e impõe o respeito mútuo entre as pessoas Nesse sentido SILVA Marco Antonio Marques da Acesso à justiça penal e Estado Democrático de Direito São Paulo Juarez de Oliveira 2001 p 1 PALAZZO Francesco C Valores constitucionais e direito penal Trad Gérson Pereira dos Santos Porto Alegre Fabris 1989 p 80 HC 111017RS rel Min Ayres Britto 2ª Turma j 07022012 ROXIN Claus Derecho penal Parte general Fundamentos La estructura de la teoría del delito Trad espanhola DiegoManuel Luzón Peña Miguel Díaz y García Conlledo e Javier de Vicente Remensal Madrid Civitas 2006 t I p 5556 HC 102087MG rel Min Celso de Mello rel p acórdão Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 28022012 Cf ROXIN Claus Derecho penal Parte general Fundamentos La estructura de la teoría del delito Trad espanhola DiegoManuel Luzón Peña Miguel Díaz y García Conlledo e Javier de Vicente Remensal Madrid Civitas 2006 t I p 410 AgrQO 1033DF rel Min Celso de Mello Tribunal Pleno j 25052006 Há doutrinadores que denominam esse postulado de princípio da culpabilidade É o caso de LUISI Luiz Os princípios constitucionais penais 2 ed Porto Alegre Fabris 2003 p 32 Com o devido respeito essa posição não nos parece adequada Culpabilidade dependendo da estrutura do crime e da teoria da conduta que se adotem deve ser entendida como elemento do delito ou pressuposto de aplicação da pena Não se confunde com os elementos subjetivos do delito os quais na teoria clássica da conduta funcionam como requisitos da culpabilidade Inq 4483 AgRsegundoDF e Inq 4327 AgRsegundoDF rel Min Edson Fachin Plenário j 14122017 e 19122017 noticiados no Informativo 888 Falavase também em violação ao princípio em estudo na 80 81 82 83 84 85 86 responsabilidade penal sucessiva ou responsabilidade penal em cascata nos crimes previstos na Lei de Imprensa arts 37 a 39 da Lei 52501967 Esta Lei entretanto não foi recepcionada pela Constituição Federal como restou decidido pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 1307DF ajuizada pelo PDT Partido Democrático Trabalhista STF ADPF 130 7DF rel Min Carlos Britto Plenário j 30042009 O STF fundamentou sua decisão especialmente na incompatibilidade entre os dispositivos da Lei de Imprensa perante os valores do Estado Democrático de Direito acolhidos pela Constituição Federal notadamente a liberdade de expressão e o princípio da isonomia Para um estudo aprofundado do tema vide ANDRADE Manuel da Costa Liberdade de imprensa e inviolabilidade pessoal Coimbra Coimbra Editora 1996 STF HC 112776MS rel Min Teori Zavascki Plenário j 19122013 noticiado no Informativo 733 RE 453000RS rel Min Marco Aurélio Plenário j 04042013 noticiado no Informativo 700 CC 91016MT rel Min Paulo Gallotti 3ª Seção j 27022008 HC 297482CE rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 12052015 noticiado no Informativo 562 HC 285589MG rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 04082015 noticiado no Informativo 569 BANDEIRA DE MELLO Celso Antônio Conteúdo jurídico do princípio da igualdade 3 ed São Paulo Malheiros 1993 p 9 STF HC 103311PR rel Min Luiz Fux 1ª Turma j 07062011 noticiado no Informativo 630 Podese afirmar com segurança que a história da pena e consequentemente do Direito Penal embora não sistematizado se confunde com a história da própria humanidade De fato o ponto de partida da história da pena coincide com o ponto de partida da história da humanidade Em todos os tempos em todas as raças vislumbrase a pena como uma ingerência na esfera do poder e da vontade do indivíduo que ofendeu e porque ofendeu as esferas de poder e da vontade de outrem É correto pois reconhecer a existência da pena como um fato histórico primitivo bem como considerar o Direito Penal a primeira e mais antiga camada da história da evolução do Direito Além disso as diversas fases da evolução da vingança penal deixam evidente que não se trata de uma progressão sistemática com princípios períodos e épocas capazes de distinguir cada um de seus estágios mas algo que foi se desenvolvendo para atender as necessidades de seu tempo Por tal razão pode ser adotada uma tríplice divisão representada pelas seguintes fases 1 vingança divina 2 vingança privada e 3 vingança pública Todas essas etapas foram marcadas por forte sentimento religioso e espiritual Vale ressaltar ser essa divisão meramente didática haja vista uma fase se interligar e conviver com outra durante os tempos primitivos O homem primitivo não regulava sua conduta pelos princípios da causalidade e da consciência em torno de sua essência e circunstância mas sim no temor religioso ou mágico sobretudo em relação com o culto dos antepassados cumpridores das normas e com certas instituições de fundo mágico ou religioso1 Essa visão mágica e contraditória do homem e do mundo era nutrida pelos totens e tabus os quais marcavam presença nas diversas modalidades da pena com nítido e singular caráter expiatório Os totens assumiam as mais variadas formas de animais vegetais ou qualquer outro objeto considerado como ancestral ou símbolo de uma coletividade caracterizandose como seu protetor e objetos de tabus e deveres particulares Para Freud o totem via de regra é um animal comível e inofensivo ou perigoso e temido e mais raramente um vegetal ou um fenômeno natural como a chuva e a água que mantém relação peculiar com todo o clã Em primeiro lugar o totem é o passado comum do clã ao mesmo tempo é o seu espírito guardião e auxiliar que lhe envia oráculos e embora perigoso para os outros reconhece e poupa seus próprios filhos Em compensação os integrantes estão na obrigação sagrada sujeita a sanções automáticas de não matar nem destruir seu totem e evitar comer sua carne ou tirar proveito dele de outras maneiras2 O tabu consistia na proibição dos profanos de se relacionarem com pessoas objetos ou lugares determinados ou dele se aproximarem em virtude do caráter sagrado que possuíam e a sua violação acarretava ao culpado ou ao seu grupo o castigo da divindade Pelo fato de que para esses povos a lei tinha origem divina e como tal sua violação consistia numa ofensa aos deuses puniase o infrator para desagravar a divindade bem como para purgar o seu grupo das impurezas trazidas pelo crime Uma das reações contra o criminoso era a expulsão do grupo desterro medida que se destinava além de eliminar aquele que se tornara um inimigo da comunidade e dos seus deuses e forças mágicas a evitar que a classe social fosse contagiada pela mácula que impregnava o agente bem como as reações vingativas dos seres sobrenaturais a que o grupo estava submetido Destarte o castigo consistia no sacrifício de sua vida Castigavase com rigor com notória crueldade eis que o castigo deveria estar em consonância com a grandeza do deus ofendido a fim de amenizar sua cólera e reconquistar sua benevolência para com o seu povo Destacavase a pena de perda da paz como a paz está sob a proteção dos deuses a vingança tem o seu fundamento no preceito divino Uma vez perdida a paz o delinquente perdia a proteção do clã ficando exposto à sua própria sorte Surge posteriormente à vingança divina a fase da vingança privada em decorrência principalmente do crescimento dos povos e da complexidade social daí resultante Era uma vingança entre os grupos eis que encaravam a infração como uma ofensa não relacionada diretamente à vítima mas sobretudo ao grupo a que pertencia O homem primitivo tinha forte laço com sua comunidade uma vez que fora dela sentiase desprotegido ante sua imaginação mágica Fica nítida a interrelação entre a vingança divina e a privada Desse modo imperava a lei do mais forte a vingança de sangue em que o próprio ofendido ou outra pessoa do seu grupo exercia o direito de voltarse contra o agressor fazendo justiça pelas próprias mãos cometendo na maioria dos casos excessos e demasias o que culminava com a disseminação do ódio e consequentes guerras entre grupos Para demonstrar a intensa ligação do homem primitivo com sua comunidade se uma pessoa de determinado grupo era atingida por um grupo estrangeiro a vingança era coletiva e incidia sobre todo o grupo agressor3 Portanto inexistia qualquer proporção entre o delito praticado e a pena imposta e nesse sentido envolvia desde o indivíduo isoladamente considerado até o seu grupo social com sangrentas batalhas causando muitas vezes a completa eliminação das tribos Tamanha era a desproporção da vingança que um crime praticado por um indivíduo não raras vezes atingia como retribuição crianças e pessoas doentes integrantes do grupo do infrator Recaía inclusive sobre animais ou coisas Com o propósito de evitar a dizimação dos grupos surge a Lei do Talião do latim talis tal qual Pagará a vida com a vida mão com mão pé por pé olho por olho queimadura por queimadura Êxodo XXI versículos 23 a 25 Por mais impressionante que essa afirmação possa se revelar cuidase da pioneira manifestação do princípio da proporcionalidade por representar tratamento igualitário entre autor e vítima Foi a primeira tentativa de humanização da sanção penal apesar de nos dias atuais revelarse como brutal e cruel e restou acolhida pelo Código de Hamurabi Babilônia pelo Êxodo hebreus e na Lei das XII Tábuas romanos A título de exemplificação dispunha o Código de Hamurabi Art 209 Se alguém bate numa mulher livre e a faz abortar deverá pagar dez siclos pelo feto4 E também Art 210 Se essa mulher morre então deverá matar o filho dele No Êxodo dos hebreus Aquele que ferir mortalmente um homem será morto E na Lei das XII Tábuas Se alguém difama outrem com palavras ou cânticos que seja fustigado Ainda Se alguém profere um falso testemunho que seja precipitado da rocha Tarpeia E também Se alguém matou o pai ou a mãe que se lhe envolva a cabeça e seja colocado em um saco costurado e lançado ao rio Com o passar do tempo diante do elevado número de infratores as populações ficavam deformadas motivo pelo qual se evoluiu para o sistema da composição forma de conciliação entre o ofensor e o ofendido ou seus familiares pela prestação pecuniária como forma de reparar o dano dinheiro da paz O ofensor comprava sua liberdade evitando o castigo Por exemplo dispunha a norma das Leis Mosaicas Se um homem furtar um boi ou um carneiro e o matar ou vender pagará cinco bois pelo boi e quatro carneiros pelo carneiro A composição largamente aceita em sua época constitui um dos antecedentes da moderna reparação do dano do Direito Civil e das penas pecuniárias Com a evolução política da sociedade e melhor organização comunitária o Estado avocou o poderdever de manter a ordem e a segurança social conferindo a seus agentes a autoridade para punir em nome de seus súditos A pena assume nítido caráter público Os ofendidos não mais necessitam recorrer às suas próprias forças A finalidade dessa fase era garantir a segurança do soberano por meio da aplicação da sanção penal ainda dominada pela crueldade e desumanidade característica do direito penal então vigente Cabia a uma terceira pessoa no caso o Estado representante da coletividade e em tese sem interesse no conflito existente decidir impessoalmente a questão posta à sua análise ainda que de maneira arbitrária Nessa época as penas ainda eram largamente intimidatórias e cruéis destacandose o esquartejamento a roda a fogueira a decapitação a forca os castigos corporais e amputações entre outras Na Grécia Antiga em seus primórdios o crime e a pena se inspiravam no sentimento religioso Governavase em nome de Zeus A civilização grega produziu filósofos historiadores escritores e grandes pensadores que iniciaram o estudo da ciência política Como expoentes podem ser lembrados Sócrates Platão Aristóteles Ésquilo Sófocles e Eurípedes Com a Ciência Política iniciaramse as grandes discussões sobre política ética liberdade e justiça bem como noções e fundamento do direito de punir e da finalidade da pena influenciando profundamente a Ciência do Direito Em que pesem os estudos democráticos e filosóficos então reinantes os gregos pouco se preocuparam com os direitos fundamentais De fato todas as questões da vida seja no campo social ou político giravam em torno da cidade polis O homem não era concebido em sua individualidade A própria noção de democracia estava ligada à integração do homem ao Estado e por essa razão a escravidão era plenamente justificada Contribuíram ao colocar em pauta discussões relevantes acerca do fundamento do direito de punir e a finalidade da pena que no futuro e até nos dias de hoje atormentam as mentes dos juristas Na justiça ateniense as penas passaram a ser dotadas de certa dose de humanidade Autorizavase exemplificativamente a absolvição do culpado quando a sua eliminação fosse capaz de prejudicar os inocentes dele dependentes para sobreviver Pensavase no caso no desenvolvimento da sociedade e não propriamente no acusado A história do Direito Romano dividese em várias etapas as quais percorreram 22 séculos de 753 aC a 1453 dC de grandes transformações Em matéria penal o poder dos magistrados intitulado coercitio era totalmente discricionário e limitado apenas pela apelação ao povo provocatio ad populum direito exclusivo do cidadão romano Portanto dele não se podiam valer as mulheres os escravos e os estrangeiros Por força da possibilidade de apelação ao povo mesmo não existindo o princípio da reserva legal as decisões passaram a se revestir de fundamentação proporcionando maior segurança jurídica aos cidadãos romanos A elaboração da Lei das XII Tábuas foi fundamental para a evolução do Direito Romano já que disciplinou a utilização da vingança privada Com o passar do tempo a administração da justiça foi transferida do particular para um poder estatal central De igual modo o Direito Romano passou por um período de laicização deixando a lei de ser uma mensagem dos deuses Prescrevia a Lei das XII Tábuas O que os sufrágios do povo ordenaram em último lugar essa é a lei Em toda a sua existência o Império Romano teve como prioridade a busca pelo poder e pela prosperidade Por tal motivo não se ateve à proteção dos direitos fundamentais em face do arbítrio estatal O que se garantia eram os direitos das classes privilegiadas como os imperadores e patrícios Somente com o Cristianismo houve maior percepção da importância pelo respeito aos direitos fundamentais do homem que passou a ser concebido como imagem e semelhança de Deus Em Roma surgiu a distinção entre crimes públicos e crimes privados Crimes públicos envolviam a traição ou a conspiração política contra o Estado e o assassinato enquanto os demais eram crimes privados critério residual O julgamento dos crimes públicos era atribuição do Estado por meio de um magistrado e realizado por tribunais especiais A sanção aplicada era a pena capital Já o julgamento dos crimes privados era confiado ao particular ofendido interferindo o Estado apenas para regular o seu exercício Tais delitos pertenciam ao Direito privado e não passavam de meras fontes de obrigações Na visão de Sêneca àquela época as finalidades atribuídas à pena eram castigo emenda satisfação à vítima prevenção geral pela intimidação e segurança social Ao final da República foram publicadas as leges corneliae e juliae as quais criaram uma verdadeira tipologia de crimes para a época catalogando os comportamentos criminosos Foi a primeira manifestação ainda que tímida do princípio da reserva legal Os romanos também conheceram alguns institutos importantes nexo causal dolo e culpa caso fortuito inimputabilidade menoridade concurso de pessoas legítima defesa penas e sua dosagem Não procuraram definilos Ao contrário os utilizavam casuisticamente sem o apego à criação de uma teoria geral do Direito Penal O Direito Penal da Idade Média compreende principalmente o Direito Penal germânico e o Direito Penal canônico Não tinha leis escritas Caracterizavase como direito consuetudinário concebido como uma ordem de paz Sua transgressão poderia assumir caráter público ou privado se público impunhase a perda da paz consistente na ausência de proteção jurídica podendo o agressor ser perseguido e morto por qualquer pessoa se privado o crime o infrator era entregue à vítima ou a seus familiares para que exercessem o direito de vingança Havia penas de morte corporais mutilação exílio etc Mais tarde por influência do Direito Romano e do Cristianismo foram adotadas a Lei do Talião e a composição demonstrando traços de proporcionalidade no Direito Penal germânico Em decorrência da instituição de um poder público representante da vontade do povo a pena de morte passou a poder ser substituída por um preço da paz semelhante a uma fiança em que o violador da lei pagava uma pecúnia em troca de sua liberdade Como destaca Aníbal Bruno A porção penal das leis germânicas Leges barbarorum da época franca e outras posteriores a essa compilação tornouse na sua maior parte um minucioso tabelamento de taxas penais variáveis segundo a gravidade das lesões e também a categoria do ofendido ou a sua idade ou sexo5 Era o sistema da composição pecuniária Vehgeld que muito bem substituía a vingança privada no qual predominava a responsabilidade penal objetiva Em relação às provas acolhiamse as ordálias ou juízos de deus caracterizadas por superstições e atos cruéis sem chances de defesa para os réus que deveriam por exemplo caminhar sobre o fogo ou mergulhar em água fervente sem suportar ferimentos para que fosse provada a sua inocência razão pela qual quase nunca se livravam das bárbaras punições É o ordenamento jurídico da Igreja Católica Apostólica Romana e a primeira consolidação de suas normas e regras se deu por volta do ano de 1140 por decreto de Graciano Inicialmente teve caráter meramente disciplinar destinandose apenas aos seus membros Aos poucos com a crescente influência da Igreja e enfraquecimento do Estado estendeuse a religiosos e leigos desde que os fatos tivessem conotação religiosa Serviuse do procedimento de inquisição início de ofício utilização de tortura e penas cruéis Nada obstante predominasse à época o caráter retributivo da pena no Direito Penal canônico a pena se dirigia à cura do delinquente à sua recuperação pois se destinavam ao seu arrependimento perante a divindade poenas medicinales Nas palavras de Aníbal Bruno Era natural que nesse Direito a pena tivesse caráter sacral mas embora fosse em princípio de base retribucionista vingança divina vingança zelo justitiae et bono animo e não vingança amore ipsius vindictae dirigiase também à correção do criminoso Apesar da rudeza dos tempos e dos excessos e crueldades dos hereges devese à Igreja ter contribuído para a disciplina da repressão anticriminal e o fortalecimento da autoridade pública pelo combate à prática da vingança privada com a instituição das tréguas de Deus e do asilo religioso Reagiu assim contra o espírito individualista do Direito germânico apressando a marcha do Direito punitivo para a pena pública como única sanção justa e regular6 Diferentemente dos germanos aqui preponderava o elemento subjetivo para a incriminação de alguém A jurisdição eclesiástica era dividida em dois grupos em razão da pessoa a b c ratione personae e em razão da matéria ratione materiae Na primeira o religioso era sempre julgado por um Tribunal da Igreja independentemente do crime praticado Na segunda por seu turno a competência eclesiástica era fixada ainda que o crime fosse cometido por um leigo Os delitos se dividiam em Delicta eclesiastica ofendiam o direito divino eram da competência dos tribunais eclesiásticos e punidos com penitências Delicta mera secularia ofendiam apenas a ordem jurídica laica eram julgados pelos tribunais do Estado e suportavam as penas comuns Eventualmente sofriam punição eclesiástica com as poena medicinales e Delicta mixta violavam as ordens religiosa e laica e eram julgados pelo Tribunal que primeiro tivesse conhecimento da ofensa Pela Igreja eram punidos com as poena vindicativae Contribuiu consideravelmente para o surgimento da prisão moderna principalmente no tocante à reforma do criminoso Do vocábulo penitência derivam os termos penitenciária e penitenciário O cárcere como instrumento espiritual de castigo foi desenvolvido pelo Direito Canônico uma vez que pelo sofrimento e pela solidão a alma do homem se depura e purga o pecado A penitência visava aproximar o criminoso de Deus Como informa João Bernardino Gonzaga De acordo com o pensamento da Igreja a prisão penal não se destinava a castigar o condenado mas a leválo ao isolamento propício à reflexão salvadora bem como servia para impedir que ele continuasse a exercer más influências no rebanho cristão7 Com a doutrina da Igreja a prática das ordálias ou juízos de Deus comum ao povo germânico decaiu significativamente Ainda na Idade Média havia o Direito comum produto da reunião do Direito Romano do Direito germânico e do Direito Canônico com os direitos locais Importante ressaltar que essa época foi palco de grandes injustiças e horrores caracterizada pela arbitrariedade do Judiciário o qual criava e extinguia definições de crimes ao seu belprazer de acordo com seus interesses bem como pela crueldade na execução das penas que aliás eram diferentes para nobres e plebeus muito mais brutais para os últimos Podem ser apontadas como penas desse tempo forca fogueira arrancamento das vísceras enterramento com vida afogamento esquartejamento mutilações pés mãos lábios orelhas e castração entre outras de semelhante natureza Os condenados eram julgados mediante o arbítrio do Estado intimamente vinculado com a ordem cristã sem a possibilidade de defesa ou de um devido processo legal Torturavase para a obtenção de confissões e da verdade mormente em relação às feiticeiras mulheres que detinham conhecimentos medicinais A razão da vingança social ou divina e o objetivo da intimidação e exemplaridade justificavam os excessos amparados pelas leis confusas e indeterminadas normalmente prolixas e interpretadas em conformidade com o arbítrio da Igreja e dos juízes por ela doutrinados Sob o influxo do iluminismo destacase a clássica obra Dos delitos e das penas de Cesare Bonesana Marquês de Beccaria O Absolutismo impunha atos de punição crudelíssimos e arbitrários por meio de graves suplícios A sociedade não mais suportava tal forma de agir do Estado e a filosofia iluminista do século XVIII orientava a evolução da humanidade Preparavase o espírito dos indivíduos para a eclosão da Revolução Francesa De forma impressionante para a época Cesare Bonesana Marquês de Beccaria antecipa as ideias posteriormente consagradas na Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789 pugnando de maneira universal pela abolição da pena de morte Publica em Milão no ano de 1764 a famosa obra Dei delitti e delle pene que abre caminho ao movimento da Escola Clássica8 Baseia seu pensamento no contrato social de Rousseau de forma que o criminoso passa a ser reputado como violador do pacto social sendo então considerado adversário da sociedade A pena perdia seu caráter religioso predominando a razão sobre questões espirituais Surge a questão do livrearbítrio ou seja o homem pratica um crime consciente de sua conduta antissocial Como consequência do controle do indivíduo sobre os seus atos decorre que a pena deve ser sempre legalmente prevista para que todos saibam diferenciar o vedado do permitido e escolher o caminho a trilhar devendo ainda a sanção penal guardar proporcionalidade com o crime praticado na medida exata da retribuição necessária No pensamento de Beccaria a pena deve ser proporcional uma vez que os gritos de horror como consequências das torturas não retiram a realidade da ação já praticada revelando a inutilidade dos tormentos Dessa forma à medida da crueldade dos tormentos enrijecese a alma pelo espetáculo da barbárie e quanto maiores os castigos mais o indivíduo se dispõe a praticar novos crimes para subtrairse da pena que por primeiro mereceu Para ele a pena deveria ser imposta somente para que o condenado não voltasse a cometer crimes servindo de exemplo à sociedade Com efeito no sistema então reinante a prática de infrações penais era um negócio de risco no qual compensava assumir desafios e lucrar com a prática de delitos já que se qualquer um deles viesse a ser descoberto idêntica e desproporcional seria a punição Ademais quanto mais atrozes os tormentos mais graves por consequência serão os crimes praticados e o mal causado pela punição vai sempre além do proveito obtido com a prática delitiva Destarte conclui que outros meios mais eficazes existem para prevenir os crimes Inicialmente as leis devem ser certas claras e precisas uma vez que a incerteza das normas faz crescer a inatividade e a estupidez Com efeito o legislador sábio busca impedir o mal antes de reparálo com a elaboração de leis já que um cidadão de alma sensível constata que protegido por boas leis de simples compreensão perde a iníqua liberdade de praticar o mal e os crimes são prevenidos compensandose a virtude Se não bastasse uma autoridade severa produz obediência hipócrita e passageira e apenas com o aperfeiçoamento da educação estarseiam criando homens menos propensos ao cometimento do mal Somente poderia o magistrado aplicar penas previstas em lei É o princípio da legalidade Finalmente para que cada pena não seja uma violência de um ou de muitos contra um cidadão privado deve ser essencialmente pública rápida necessária a mínima possível nas circunstâncias dadas proporcional aos delitos e ditadas pelas leis 1 2 3 4 5 6 7 8 BRUNO Aníbal Direito penal parte geral 3 ed Rio de Janeiro Forense 1967 t I p 54 FREUD Sigmund Totem e tabu Trad Órizon Carneiro Muniz 2 ed Rio de Janeiro Imago 1995 v 13 p 22 Obras completas de Sigmund Freud MARQUES Oswaldo Henrique Duek Fundamentos da pena São Paulo Juarez de Oliveira 2000 p 3 Siclos é uma antiga moeda dos hebreus de prata cujo peso equivalia a seis gramas BRUNO Aníbal Direito penal parte geral 3 ed Rio de Janeiro Forense 1967 t I p 6970 Idem ibidem t I p 72 GONZAGA João Bernardino A inquisição em seu mundo 4 ed São Paulo Saraiva 1993 p 135 Consultamos a obra BECCARIA Cesare Dos delitos e das penas Trad Lucia Guidicini e Alessandro Berti Contessa São Paulo Martins Fontes 1991 41 PERÍODO COLONIAL Antes do descobrimento do Brasil enquanto dominava a civilização primitiva adotavase a vingança privada sem uniformidade nas reações penais Informam os historiadores que nossos silvícolas não desconheceram o sistema do talião e ainda que empiricamente sem qualquer fonte teórica se depararam com a composição e a expulsão da tribo No tocante às formas punitivas predominavam as penas corporais sem o emprego da tortura Não havia uma autêntica organização jurídicosocial mas apenas regras consuetudinárias tabus comuns ao mínimo convívio social transmitidas verbalmente e quase sempre dominadas pelo misticismo A partir de 1500 com o descobrimento do Brasil passou a vigorar o Direito lusitano aplicandose sucessivamente 1 Ordenações Afonsinas1 Promulgadas em 1446 por D Afonso V vigoraram até 1514 e apresentavam conteúdo do Direito Romano de Justiniano e do Direito Canônico Tinham como traços marcantes a crueldade das penas a inexistência de princípios sagrados como o da legalidade e o da ampla defesa predominando a arbitrariedade dos juízes quando da fixação da pena A prisão tinha caráter preventivo Mantinhase o delinquente preso para evitar sua fuga até ser julgado ou para obrigálo ao pagamento da pena pecuniária 42 2 Ordenações Manuelinas Editadas em 1514 por Dom Manuel o Venturoso Pouco se diferenciavam das Ordenações Afonsinas em que as penas também eram crudelíssimas Correspondiam ainda à fase da vingança pública Como no território pátrio existiam as denominadas capitanias hereditárias o Direito era aplicado pelos respectivos donatários 3 Ordenações Filipinas Datadas de 1603 em razão de medida do Rei Filipe II subsistiram até o ano de 1830 Mantiveram as características das Ordenações anteriores penas cruéis e desproporcionais arbitrariedade dos julgadores inexistência do princípio da legalidade e da defesa etc A matéria penal era regulamentada pelo Livro V e foi sob a égide desse ordenamento que Tiradentes foi executado estendendo as consequências penais de seu comportamento também aos seus descendentes Não se respeitava o princípio da personalidade da pena ficando ao arbítrio do julgador a escolha da sanção penal a ser aplicada bem como sequer tinha o delinquente direito de defesa e predominava a desigualdade de classes em relação ao tratamento punitivo fidalgos cavaleiros escravos etc Marcadas pela fase da vingança pública todas se orientavam no sentido de uma ampla e generalizada criminalização com severas punições as quais objetivavam infundir o temor pela punição Além do predomínio da pena de morte eram usadas outras sanções bárbaras e infamantes como o açoite a amputação de membros o confisco de bens as galés eram aplicadas como comutação da pena de morte ou em grau mínimo para os crimes de perjuro pirataria ou de ofensa física irreparável da qual resultasse aleijão ou deformidade Os punidos pelas galés deviam andar com calceta no pé e corrente de ferro além de serem obrigados a trabalhos públicos e ao degredo consiste na fixação de residência em local determinado pela sentença CÓDIGO CRIMINAL DO IMPÉRIO O art 179 XVIII da Constituição de 1824 determinou a urgente e necessária elaboração de um Código Criminal fundado nas solidas bases da justiça e equidade 43 Em 1827 Bernardo Pereira de Vasconcellos apresentou o seu projeto o qual foi sancionado em 1830 pelo imperador Dom Pedro I destacandose como o primeiro código autônomo da América Latina Com a elaboração desses dois ordenamentos Constituição e Código Criminal do Império o Direito Penal deu nítidos sinais de evolução em prol da humanização Dispunha a Constituição de 1824 em seu art 179 XIX Desde já ficam abolidos os açoites a tortura a marca de ferro quente e todas as mais penas cruéis E no item XX do mesmo dispositivo Nenhuma pena passará da pessoa do delinquente Por tanto não haverá em caso algum confiscação de bens nem a infamia do Réo se transmittirá aos parentes em qualquer gráo que seja Foi a primeira manifestação do princípio da personalidade da pena no Brasil Apesar disso eram permitidas as penas de morte na forca de galés de trabalhos forçados de banimento degredo e desterro Entre as grandes inovações consagrouse no art 55 do Código Criminal do Império o sistema do diamulta Nada obstante as características positivas não foi definida a figura da culpa e imperava a desigualdade principalmente em relação aos escravos que aliás eram equiparados a animais e portanto considerados como bens semoventes PERÍODO REPUBLICANO Com o advento da República João Baptista Pereira foi encarregado de elaborar um projeto de Código Penal que restou aprovado e publicado em 1890 antes portanto da Constituição de 1891 Esse Código criado às pressas desapontou pelas suas inúmeras falhas Ignorou os avanços e tendências mundiais que se faziam sentir em razão do positivismo bem como os exemplos de códigos estrangeiros notadamente o Código Zanardelli Seus equívocos e deficiências acabaram transformandoo em verdadeira colcha de retalhos Era enorme a quantidade de leis extravagantes que finalmente se concentraram na Consolidação das Leis Penais de Vicente Piragibe promulgada em 1932 Durante o Estado Novo em 1937 Alcântara Machado apresentou um projeto de Código Penal brasileiro o qual foi sancionado em 1940 passando a vigorar desde 1942 até os dias atuais alterado por diversas leis contemporâneas tais como a Lei 64141977 atualizando as sanções penais e a Lei 72091984 Reforma da Parte Geral do Código Penal A reforma da Parte Geral humanizou as sanções penais e adotou penas alternativas à prisão além de reintroduzir o sistema de diasmulta Em 1969 foi aprovado o Projeto de Nélson Hungria para criação de um novo Código Penal Entretanto deuse sua revogação quando ainda se encontrava em vacatio legis 1 As Ordenações Afonsinas foram consideradas o primeiro código completo da Europa Destaquese Portugal foi o primeiro país da Europa a possuir um Código completo dispondo sobre quase todas as matérias da administração de um Estado as Ordenações Afonsinas O Código Afonsino é por si só um acontecimento notável na Legislação dos Povos Cristãos Foi um incontestável progresso e revela os adiantamentos que Portugal tinha em Jurisprudência PINHO Ruy Rebello História do direito penal brasileiro Período Colonial São Paulo Bushatsky Editora da Universidade de São Paulo 1973 p 5 1 A nomenclatura Escola Clássica foi desenvolvida pejorativamente pelos positivistas em face da divergência de pensamentos sobre os conceitos estruturais do Direito Penal A Escola Clássica nasceu entre o final do século XVIII e a metade do século XIX como reação ao totalitarismo do Estado Absolutista filiandose ao movimento revolucionário e libertário do Iluminismo Viviase o século das luzes Seus fundamentos tiveram origem nos estudos de Beccaria e foram lapidados e desenvolvidos principalmente pelos italianos Francesco Carrara autor da obra Programa del corso di diritto criminale publicada em 1859 Carmignani que escreveu Elementa juris criminalis publicado em 1847 e Rossi que contribuiu com o Trattato di diritto penale de 1859 Outros famosos representantes da Escola Clássica foram Mittermaier e Birkmeyer na Alemanha Ortolan e Tissot na França e F Pacheco e J Montes na Espanha Todos eles tinham em comum a utilização do método racionalista e dedutivo lógico e eram em regra jusnaturalistas ou seja aceitavam que normas absolutas e naturais prevalecessem sobre as normas do direito posto Basicamente suas notas fundamentais eram entendiam o crime como um conceito meramente jurídico tendo como sustentáculo o direito natural Para Francesco Carrara crime é a infração da lei do Estado promulgada para proteger a segurança dos cidadãos resultante de um ato externo do homem positivo ou 2 3 negativo moralmente imputável e politicamente danoso predominava a concepção do livrearbítrio isto é o homem age segundo a sua própria vontade tem a liberdade de escolha independentemente de motivos alheios autodeterminação Logo por ser possuidor da faculdade de agir o homem é moralmente responsável pelos seus atos e por ser responsável àquele que infringiu a norma penal deve ser imposta uma pena como forma de retribuição pelo crime cometido Se ao contrário o agente não estava em suas perfeitas condições psíquicas ausência da faculdade de agir inimputabilidade não pode ser punido Foi sob a influência dos pensamentos de Kant e Hegel que a concepção retribucionista do Direito Penal se desenvolveu Ou seja a única finalidade da pena consistia na aplicação de um mal ao infrator da lei penal A sanção penal era na verdade um castigo necessário para o restabelecimento do Direito e da justiça Para Moniz Sodré em relação ao condenado a pena Não lhe é imposta somente como um meio eficaz de defesa social senão também e muito principalmente como um castigo devido a todo culpado não é considerada um remédio contra o crime mas uma punição merecida em vista do mal que voluntariamente fez Ela é aplicada não em nome da conservação da sociedade mas para a satisfação da justiça1 Em decorrência do ideal iluminista prevaleceu a tendência de eliminar as penas corporais e os suplícios Além disso outra contribuição dessa escola referese à passagem do caráter de vingança real ou religioso da pena para aquela tida como uma resposta da própria sociedade a fim de manter sua própria segurança A Escola Clássica havia conseguido enfrentar com êxito as barbáries do Absolutismo e o respeito do indivíduo como ser humano já despontava nos países civilizados Entretanto os ambientes político e filosófico em meados do século XIX revelavam grande preocupação com a luta eficiente contra a crescente criminalidade Manifestavase a necessidade de defesa da sociedade e os estudos biológicos e sociológicos assumiam relevante importância principalmente com as doutrinas evolucionistas de Darwin e Lamarck e sociológicas de Comte e Spencer Nasce então a Escola Positiva também denominada Positivismo Criminológico despontando os estudos dos três mosqueteiros2 Cesare Lombroso Enrico Ferri e Rafael Garofalo Chamouse positiva pelo método e não por aceitar a filosofia do positivismo de Augusto Comte Cesare Lombroso médico representou a fase antropológica da Escola Positiva Autor das obras O cretinismo na Lombardia 1859 e O homem delinquente 1876 a ele se imputa o ensinamento de que o homem não é livre em sua vontade Ao contrário sua conduta é determinada por forças inatas Com ele se iniciou de forma científica a aplicação do método experimental no estudo da criminalidade Também ofereceu à comunidade jurídica a teoria do criminoso nato predeterminado à prática de infrações penais por características antropológicas nele presentes de modo atávico Em seguida acrescentou ao atavismo como causas do crime também a loucura moral e a epilepsia larvada e finalmente por influência de Ferri alia às causas antropológicas também os fatores físicos e sociais Enrico Ferri empunha a bandeira da fase sociológica no Positivismo Criminológico destacandose suas obras Sociologia criminal 1892 e Princípios de direito criminal 1926 Com seus estudos contribuiu para a reafirmação e defesa da tese negativa do livrearbítrio determinismo biológicosocial fundamentando a responsabilidade penal na responsabilidade social De suas posições surge a mais nítida concepção da pena como mecanismo de defesa social Em suas palavras Porque a sociedade humana nação pode ser ameaçada e prejudicada no exterior e internamente o Estado tem duas funções supremas de defesa social que são a defesa militar contra as agressões externas e a justiça penal contra as agressões internas quando estas já se verificaram e a polícia de segurança antes que se venham a cometer3 Finalmente Rafael Garofalo é o baluarte da fase jurídica da Escola Positiva Empregou e imortalizou a expressão Criminologia título de sua principal obra publicada em 1885 conferindo aspectos estritamente jurídicos ao movimento Atribuise a ele o conceito de delito natural compreendido como ação prejudicial e que fere ao mesmo tempo alguns desses sentimentos que se convencionou chamar o senso moral de uma agregação humana Influenciado pela teoria da seleção natural sustentava que os criminosos não assimiláveis deveriam ser eliminados pela deportação ou pela morte Na Escola Positiva destacouse o método experimental no qual o crime e o criminoso deveriam ser estudados individualmente inclusive com o auxílio de outras ciências Ganhou relevo o determinismo negandose o livre arbítrio haja vista que a responsabilidade penal se fundamentava na responsabilidade social no papel que cada ser humano desempenhava na coletividade O Correcionalismo Penal também chamado de Escola Correcionalista surgiu na Alemanha em 1839 com a publicação da obra Comentatio na poena malum esse debeat de Karl David August Röeder professor da Universidade de Heidelberg Esse posicionamento surgiu de forma inovadora e revolucionária em relação às tendências da época submetendo a uma detalhada análise as teorias fundamentais sobre o delito e a pena Para Röeder a pena tem a finalidade de corrigir a injusta e perversa vontade do criminoso e dessa forma não pode ser fixa e determinada como na visão da Escola Clássica Ao contrário a sanção penal deve ser indeterminada e passível de cessação de sua execução quando se tornar prescindível Este foi o grande mérito do jurista ter lançado no Direito Penal a semente da sentença indeterminada Com efeito o fim da pena jamais seria a repressão ou a punição afastando destarte as teorias absolutistas Também não seria a prevenção geral mas apenas a prevenção especial Destacase a célebre frase de Concépcion Arenal não há criminosos incorrigíveis e sim incorrigidos Buscase assim a emenda de todos os delinquentes Curioso anotar que o penalista alemão não ganhou asseclas em seu país Contudo sua teoria disseminouse pela Europa principalmente na Espanha com importantes cultores destacandose Pedro Dorado Montero El derecho protector de los criminales El derecho y sus sacerdotes Concepción Arenal El visitador del pobre Estudios penintenciarios entre outros Alfredo Calderón Giner de los Rios Romero y Girón e Rafael Salillas Dorado Montero pugnou pela implementação de métodos corretivos e tutelares que sem a índole de castigo redimissem o criminoso tido como um ser incapaz para o Direito e a pena como um meio para a realização do bem social Daí a razão de sustentar que o criminoso tem o direito de exigir a execução da pena e não o dever de cumprila Somente assim acentua a função penal de hoje perderá o caráter odioso que inevitavelmente a acompanha De repressiva tornarseá preventiva de punitiva passará a ser correicional educativa e protetora de certos indivíduos a quem se dá o nome de delinquentes4 Deveras a Escola Correcionalista sustenta que o direito de reprimir os delitos deve ser utilizado pela sociedade com fim terapêutico isto é reprimir curando Não se deve pretender castigar punir infligir o mal mas apenas regenerar o criminoso Nas palavras de Basileu Garcia O Direito Penal visa converter o criminoso em homem de bem É preciso subtraílo à esfera das causas perversoras que o rodeiam e o conduzem à prática do mal Devem serlhe aplicados os meios ressocializadores adequados às suas tendências às falhas da sua personalidade Ao Estado cabe amparálo tal qual faz com outros deficientes porquanto dá curador ao louco e tutor ao menor a que falta a assistência dos pais5 Toda esta orientação da Escola Correcionalista encontrase inserida no ideário humanista reinante nas civilizações modernas Cumpre consignar que o natimorto Código Penal de 1969 estabeleceu a pena relativamente indeterminada para os criminosos habituais e por tendência6 Modernamente podese dizer que o correcionalismo idealizado por Röeder transfundido e divulgado nas obras de Dorado Montero e Concépcion Arenal teve em Luis Jiménez de Asúa seu maior entusiasta e o mais eficiente dos expositores ao defender a ressocialização como finalidade precípua da sanção penal7 O Tecnicismo Jurídico iniciouse na Itália quando em aula histórica sobre Il problema e il metodo della scienza del diritto penalle proferida na Universidade de Sassari em 15 de janeiro de 1910 Arturo Rocco delimitou o método de estudo do Direito Penal como o positivo restrito às leis vigentes dele abstraindo o conteúdo causalexplicativo inerente à antropologia sociologia e filosofia O mérito do movimento atualmente dominante na Itália e abraçado pela maioria das nações foi excluir do Direito Penal toda carga de investigação filosófica limitandoo aos ditames legais Com efeito o jurista deve valerse da exegese para concentrarse no estudo do direito positivo As preocupações causaisexplicativas pertencem a outros campos filosóficos sociológicos e antropológicos que se valem do método experimental Por sua vez o Direito Penal tem conteúdo dogmático razão pela qual seu intérprete deve utilizar apenas o método técnicojurídico cujo objeto é o estudo da norma jurídica em vigor Em sua origem o tecnicismo jurídico liderado por Arturo Rocco Vicenzo Manzini Massari e Delitala entre outros todos eles inspirados nos estudos de dogmática jurídicopenal elaborados por Karl Binding negava a abordagem do livrearbítrio bem como a existência do direito natural sustentando ser a sanção penal mero meio de defesa do Estado contra a periculosidade do agente Tais razões levaram Aníbal Bruno a concluir que o tecnicismo jurídico é uma forma de classicismo grandemente influenciada pela doutrina alemã sobretudo depois de Binding8 Todavia em uma segunda etapa mais moderna capitaneada por Maggiore Giuseppe Bettiol Petrocelli e Giulio Battaglini o tecnicismo jurídico acabou acolhendo a existência do direito natural admitindo o livre arbítrio como fundamento do direito punitivo voltando a pena a assumir sua índole retributiva No estudo do Direito Penal há três ordens de pesquisa e investigação A primeira delas é a exegese na opinião de Rocco utilizada sempre de forma restrita e limitada ao aspecto gramatical ao passo que se deveriam buscar o alcance e a vontade da lei A segunda é a dogmática que responsável pela exposição dos princípios fundamentais do direito positivo oferece critérios para a integração e criação do Direito pela sistematização dos princípios Constituise na conjunção sistemática das normas jurídicas postas em relações recíprocas abstraindo conceitos até o mais geral retornando em seguida ao particular Por último a terceira ordem de pesquisa e investigação apontada é a crítica que estuda o Direito como ele deveria ser buscando a sua construção e apresentando propostas de reforma Atua em dois âmbitos quais sejam direito penal positivo vigente e política criminal com os contornos da filosofia do Direito Para Arturo Rocco o tecnicismo jurídico seria o equilíbrio resultante do embate entre a lenta evolução da Escola Clássica e a violenta reação da Escola Positiva O tecnicismo jurídico representou um movimento de restauração metodológica sobre o estudo do Direito Penal Dessa forma não constituiu uma nova Escola Penal haja vista que não se preocupou com as questões inerentes à etiologia do delito à natureza da criminalidade e ao fundamento da responsabilidade penal nem com o conceito acerca da pessoa do delinquente Cumpre ressaltar que essa corrente posicionase da mesma forma que os clássicos diante dos principais problemas do Direito Penal é dizer o conceito do crime a persistência da ideia de responsabilidade moral com a diferenciação entre imputáveis e inimputáveis além da pena com índole retributiva e expiatória A verdadeira ideia de defesa social surgiu no início do século XX em decorrência dos pensamentos da Escola Positiva do Direito Penal Em outras palavras não é possível conceber uma teoria da defesa social sem considerar a revolta positivista Todavia a defesa social não se confunde com a doutrina positivista e como teoria autônoma não se inclui nos ensinamentos do Positivismo Em verdade surge como uma reação anticlássica reforçada pelas ideias delineadas pelos representantes do Positivismo Lombroso Ferri e Garofalo Era uma doutrina preocupada unicamente com a proteção da sociedade contra o crime Nesse sentido os positivistas falam em movimento da defesa social Essa função de defesa social deveria ser garantida da forma mais eficaz e integral possível repudiando a imposição de penas insuficientes rotineiramente abrandadas pela indulgência dos tribunais O combate à periculosidade tornarase a principal finalidade do Direito Penal Deveras surgiu apenas no século XX com a União Internacional de Direito Penal fundada por Von Liszt Van Hamel e Adolphe Prins este último seu maior estudioso tendo seus ideais posteriormente sido consolidados por Fillipo Gramatica e Marc Ancel O primeiro estatuto da União Internacional desprezava os postulados tradicionais sustentando ser a missão do Direito Penal a luta contra a criminalidade vista como fenômeno social Desejava com os esforços de seus membros que a ciência penal e a legislação da época acolhessem os resultados dos estudos antropológicos e sociológicos O fim único da justiça penal é garantir da melhor maneira possível a proteção da pessoa da vida do patrimônio e da honra dos cidadãos Para tanto faziase imprescindível a substituição da noção da responsabilidade moral pelo critério da periculosidade do delinquente Aplicamse com frequência os institutos das medidas de segurança e das penas indeterminadas as quais devem subsistir enquanto durar a periculosidade possibilitando a proteção eficaz e refletida da sociedade finalidade precípua mesmo sabendose que com elas poderá ser tolhido o interesse individual do condenado9 Como ideia principal extraise a reclamação de segregação dos delinquentes perigosos com intuito de submetêlos a um regime de rigor Ao mesmo tempo buscavase uma medida de neutralização de tais pessoas privandoas da eliminação radical com o emprego da pena capital considerando que o ser antissocial apesar de tudo continua sendo um homem merecendo tratamento coerente com uma política criminal humanista e racional Já no período compreendido entre as duas grandes Guerras Mundiais desenvolveuse a profilaxia criminal baseada na assistência educativa e na organização de uma prevenção calcada no estudo completo da personalidade do delinquente não se esquecendo do respeito pela pessoa humana Entretanto regimes autoritários que eclodiram na Europa começaram a imprimir ao Direito Penal nova dinâmica marcada pelo retorno ofensivo e brutal das ideias de castigo e intimidação Iniciase então uma nova fase da defesa social que ante os horrores dos regimes autoritários impõe importantes manifestações a prevenção do crime e o tratamento do menor delinquente bem como a reforma penitenciária Começava assim a aproximarse das ciências criminológicas e penitenciárias buscando uma política criminal alicerçada na dignidade da pessoa humana Para Gramatica grande expoente da Escola a defesa social tinha por principal objetivo o aprimoramento da sociedade mais inclusive do que a sua defesa e tal aprimoramento somente seria obtido por um progresso por uma adaptação do indivíduo Nesses termos a sociedade não passava de uma necessidade de fato de forma que as suas regras da vida não eram mais do que convenções o que demonstrava a relatividade das leis e impunha limites ao Estado no estabelecimento de uma ordem jurídica No seu pensamento um direito de defesa social deveria substituir o Direito Penal então existente pois a finalidade daquele era a adaptação do indivíduo à ordem social e não a sanção de seus atos ilícitos Delineavamse os dois critérios essenciais para Gramatica subjetivação e antissocialidade Sua teoria de defesa social encerra as seguintes conclusões o Estado não deve punir pois sua função é melhorar o indivíduo A causa da antissocialidade está na organização social Contra ela o Estado deve operar preventivamente e não somente pela repressão Os cárceres são inúteis e prejudiciais devendo ser abolidos As penas devem ser substituídas por medidas educativas e curativas O violador da lei não perigoso pode ser perdoado não necessitando sanção A pena como medida de defesa social deve ser fixa ou dosada não na base do dano mas segundo a personalidade do agente Gramatica diz não uma pena para todo crime um provimento para cada pessoa A noção objetiva do crime é substituída pela noção subjetiva da antissocialidade pessoal Deve ser portanto aprofundado o estudo da personalidade humana Os direitos fundamentais da pessoa devem ser sempre respeitados10 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 SODRÉ Moniz As três escolas penais 5 ed Rio de Janeiro Freitas Bastos 1952 p 262 ANCEL Marc A nova defesa social um movimento de política criminal humanista Trad Osvaldo Melo Rio de Janeiro Forense 1979 p 84 FERRI Enrico Princípios de direito criminal Trad Paolo Capitanio 2 ed Campinas Bookseller 1999 p 123 DORADO MONTERO Pedro Bases para um nuevo derecho penal Buenos Aires Depalma 1973 p 12 GARCIA Basileu Instituições de direito penal 4 ed 37 tir São Paulo Max Limonad 1975 v 1 t I p 72 Cf Itens 26 27 e 28 da Exposição de Motivos do Decretolei 1004 de 21 de outubro de 1969 JIMENEZ DE ASÚA Luis Tratado de derecho penal 5 ed Buenos Aires Losada 1992 t II p 5660 BRUNO Aníbal Direito penal cit p 116 PRINS Adolphe Ciência penal e direito positivo Trad de Henrique de Carvalho Lisboa Livraria Clássica 1915 p 753 LYRA Roberto Novíssimas escolas penais Rio de Janeiro Borsoi 1956 p 7677 61 POSITIVISMO JURÍDICO Encontra sua origem na Alemanha com os estudos de Binding em sua obra Die Normen und ihre Ubertretung maior expoente do positivismo jurídico que triunfou na década de 70 do século XIX O positivismo jurídico tinha nítida preferência pela cientificidade excluindo os juízos de valor e limitando seu objeto ao direito positivo Devese a esta doutrina que não se confunde com a Escola Positiva o conceito clássico de delito afastado de qualquer contribuição filosófica psicológica ou sociológica Conferiu tratamento exageradamente formal ao comportamento humano definido como delituoso de forma que a conduta seria um mero movimento corporal que produz uma modificação no mundo exterior A conduta portanto era meramente objetiva vinculada ao resultado pela relação de causalidade Pretendeu aplicar ao direito os mesmos métodos de observação e investigação que eram utilizados nas ciências experimentais o que rapidamente se percebeu inaplicável no tocante a algo tão circunstancial como a norma jurídica Para Luiz Flávio Gomes Antonio GarcíaPablos de Molina e Alice Bianchini O Direito positivo estudase em si mesmo separado do resto da realidade isolado desta como se fosse uma realidade independente Com o que acaba por se transformar em um formalismo normativista 62 que se ocupa exclusivamente da norma afastandose o jurista completamente do social e do valorativo Em um mimetismo fiel aos métodos próprios das ciências da natureza procurase apenas a ligação formal dos conceitos jurídicopositivos com base neles por indução constróise o sistema depois podem ser extraídos novos conceitos e se obter as lógicas consequências por via dedutiva fechandose assim o ciclo induçãodedução que caracteriza todos os métodos das ciências experimentais1 Constituíase em posição extremamente normativista e formal assim justificada por seus partidários por respeitar excessivamente o princípio da legalidade e a segurança jurídica NEOKANTISMO PENAL Esse sistema tem bases idênticas às do Positivismo surgindo no fim do século XIX Teve como principais representantes Rudolf Stammler e Gustav Radbruch Entretanto os positivistas atribuíam prioridade ao ser do direito ao passo que os neokantistas propunham um conceito que supervaloriza o dever ser mediante a introdução de considerações axiológicas e materiais Desta forma o neokantismo substitui o método puramente jurídicoformal do positivismo acolhendo como objetivo fundamental a compreensão do conteúdo dos fenômenos e categorias jurídicas muito além de sua simples definição formal ou explicação causal A Ciência do Direito ao contrário da ciência natural preocupase com os fins e não com as causas por isso há uma independência entre elas Assim ao lado das ciências naturais mas separadamente delas o Direito deve promover e construir uma ciência de fins humanos Consequentemente esta teoria permitiu graduar o injusto de acordo com a gravidade da lesão produzida A conduta passou a ter um significado social e já não mais era considerada como mero movimento corporal Permitiu ainda a introdução de elementos normativos e subjetivos nos 63 tipos penais A ilicitude passou a ter uma concepção material sendo aceita como lesividade social com o auxílio do conceito de bem jurídico Por sua vez adotouse a teoria psicológiconormativa revestindo a culpabilidade com o juízo de reprovabilidade Como bem destaca JesúsMaría Silva Sánchez acerca do neokantismo penal No marco estrito da teoria do delito permite fundamentar a introdução de elementos valorativos na causalidade antes física de elementos subjetivos no tipo antes objetivo de considerações materiais na ilicitude antes basicamente formal e normativa na culpabilidade antes entendida como relação de causalidade psicológica Uma teoria dogmática que conseguiu elaborar os princípios materiais regulatórios da ilicitude no Direito Penal e deles extrair a fundamentação de possíveis causas supralegais de justificação uma teoria que construiu o princípio da inexigibilidade no âmbito da culpabilidade constitui provavelmente algo mais que um mero complemento do positivismo2 GARANTISMO PENAL A doutrina do garantismo penal tem em Luigi Ferrajoli a figura do seu principal entusiasta Surge com a obra Direito e razão considerada por muitos a bíblia dos estudos garantistas Tratase de modelo universal e por essa razão se transforma em uma meta a ser alcançada pelos operadores do Direito destinado a contribuir com a moderna crise que assola os sistemas penais desde o nascedouro da lei até o final do cumprimento da sanção penal atingindo inclusive particularidades inerentes ao acusado depois da execução penal Engloba assim diversas fases criação da lei penal com eleição dos bens jurídicos tutelados validade das normas e princípios do direito e do processo penal respeito pelas regras e garantias inerentes à atividade jurisdicional a regular função dos sujeitos processuais as peculiaridades da execução penal etc Ferrajoli assenta seu sistema garantista também chamado de cognitivo ou de legalidade estrita em dez axiomas ou princípios axiológicos 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 fundamentais a saber Nulla poena sine crimine princípio da retributividade ou da consequencialidade da pena em relação ao delito Nullum crimen sine lege princípio da reserva legal Nulla lex poenalis sine necessitate princípio da necessidade ou da economia do direito penal Nulla necessitas sine injuria princípio da lesividade ou da ofensividade do resultado Nulla injuria sine actione princípio da materialidade ou da exterioridade da ação Nulla actio sine culpa princípio da culpabilidade ou da responsabilidade pessoal Nulla culpa sine judicio princípio da jurisdicionalidade Nullum judicium sine accusatione princípio acusatório ou da separação entre juiz e acusação Nulla accusatio sine probatione princípio do ônus da prova ou da verificação e Nulla probatio sine defensione princípio do contraditório ou da defesa ou da falseabilidade Esses princípios de índole penal e processual penal compõem um modelolimite apenas tendencialmente e jamais perfeitamente capazes de atender todos os direitos e garantias do ser humano Irradiam reflexos em todo o sistema alterando as regras do jogo fundamental do Direito Penal3 A doutrina moderna divide o garantismo penal em monocular e binocular ou integral O primeiro preocupase unicamente com os interesses do acusado Em situações extremas caracterizadas pelo favorecimento exagerado aos anseios do agente é rotulado como hiperbólico monocular O segundo binocular ou integral volta sua atenção igualmente às pretensões do acusado e da sociedade 64 FUNCIONALISMO PENAL Iniciouse na Alemanha a partir dos idos de 1970 uma forte revolução entre os penalistas com o intuito de submeter a dogmática penal aos fins específicos do Direito Penal Como esse movimento é posterior ao finalismo e aproveitou muitos dos seus fundamentos é também chamado de pós finalismo Pretendiase abandonar o tecnicismo jurídico no enfoque da adequação típica possibilitando ao tipo penal desempenhar sua efetiva função de mantenedor da paz social e aplicador da política criminal Essa é a razão do nome desse sistema funcional O funcionalismo penal questiona a validade do conceito de conduta desenvolvido pelos sistemas clássico e finalista E ao conceber o Direito como regulador da sociedade delimita o âmbito das expectativas normativas de conduta vinculandose à teoria da imputação objetiva Buscase o desempenho pelo Direito Penal de sua tarefa primordial qual seja possibilitar o adequado funcionamento da sociedade Isso é mais importante do que seguir à risca a letra fria da lei sem desconsiderála totalmente sob pena de autorizar o arbítrio da atuação jurisdicional O intérprete deve almejar a real vontade da lei e empregála de forma máxima a fim de desempenhar com esmero o papel que lhe foi atribuído pelo ordenamento jurídico No entanto essa mitigação do texto legal encontra limites e neste ponto o funcionalismo apresenta duas concepções 1 funcionalismo moderado dualista ou de política criminal capitaneado por Claus Roxin Escola de Munique e 2 funcionalismo radical monista ou sistêmico liderado por Günther Jakobs Escola de Bonn Com efeito o funcionalismo de Roxin preocupase com os fins do Direito Penal ao passo que a concepção de Jakobs se satisfaz com os fins da pena ou seja a vertente de Roxin norteiase por finalidades políticocriminais priorizando valores e princípios garantistas enquanto a orientação de Jakobs leva em consideração apenas necessidades sistêmicas e o Direito Penal é que deve se ajustar a elas Em suma sustenta o funcionalismo que a dogmática penal deve ser direcionada à finalidade precípua do Direito Penal ou seja à política criminal Essa finalidade seria a reafirmação da autoridade do Direito que não encontra limites externos mas somente internos Günther Jakobs ou então a proteção de bens jurídicos indispensáveis ao desenvolvimento do indivíduo e da sociedade respeitando os limites impostos pelo ordenamento jurídico Claus Roxin E justamente nesse ponto o funcionalismo recebe sua maior crítica consistente na opção de conferir elevado destaque à política criminal resultando em sua fusão com a dogmática penal e por corolário confundindo a missão do legislador com a do aplicador da lei Com essa introdução básica é válido discorrer um pouco mais acerca dessa moderna orientação penal cada vez mais aceita e difundida em âmbito doutrinário Dividiremos o tema entre as duas vertentes levando em conta o pensamento de seus autores Claus Roxin e Günther Jakobs Suas ideias alcançaram amplo destaque a partir da publicação em 1970 da monografia intitulada Política criminal e sistema de direito penal que parte de um ponto de vista teleológico do Direito Penal almejando superar as visões ontológicas do causalismo e do finalismo bem como a análise puramente sistemática da teoria do delito introduzindo como critério norteador para uma melhor solução dos problemas dogmáticos a política criminal A formação do sistema jurídicopenal não pode vincularse a realidades ontológicas prévias devendo guiarse única e exclusivamente pelas finalidades do Direito Penal4 Desenvolveu novas posições sobre a teoria da pena e a sua concepção preventiva geral positiva prevenção de integração e especialmente acerca do âmbito da relação entre o fato e o seu autor como ao reintroduzir o conceito de imputação objetiva no campo da tipicidade Na seara da autoria sistematizou e desenvolveu a teoria do domínio do fato Contudo a principal contribuição de Roxin reside na circunstância de ter a b c chamado a atenção sobre a necessidade que a construção dogmática está a serviço da resolução dos problemas que apresentam a realidade da vida social tarefa que parecia já olvidada em favor da mera elucubração teórica Para ele o tipo objetivo não pode ser reduzido à conexão de condições entre comportamentos e resultados senão que os resultados conforme as regras políticocriminais teriam que ser imputados ao autor como sua obra Claus Roxin elaborou sua teoria calcada na política criminal vinculando aos elementos do delito individualmente diversos valores predominantes5 Para a tipicidade associase a determinação da lei penal em conformidade com o princípio da reserva legal Aqui se realiza uma das mais significativas contribuições da tendência doutrinária liderada por Roxin que se reflete no redescobrimento e dotação funcional da teoria da imputação objetiva no marco da tipicidade Com efeito enquanto para as doutrinas clássica neoclássica e finalista os problemas de relação nos delitos de resultado entre este e a ação se reduziriam na maioria dos casos a uma questão de relação de causalidade a nova tendência utiliza como critério decisivo de imputação do resultado no tipo objetivo a regra em virtude da qual se examina a criação por meio da ação de um risco não permitido dentro do fim de proteção da norma Para a ilicitude se assinala o âmbito de soluções sociais dos conflitos Roxin concebe a ilicitude como uma espécie de elemento negativo do tipo Para a culpabilidade associase a necessidade de pena com uma finalidade predominantemente preventiva Claus Roxin privilegia um conceito bipartido do delito em que se consideram seus elementos fundamentais dois juízos de valor o injusto penal fato típico ilicitude e a responsabilidade que inclui a culpabilidade A Günther Jakobs se atribui a responsabilidade de ter adaptado o Direito 65 Penal à teoria dos sistemas sociais de Luhmann com a sua teoria da imputação normativa Para ele o Direito Penal está determinado pela função que cumpre no sistema social e inclusive o próprio Direito Penal é considerado um sistema autônomo autorreferente e autopoiético dentro do sistema mais amplo da sociedade Tem suas regras próprias e a elas se submete Jakobs reconhece estar correto o que fora afirmado por Hans Welzel seu mestre no sentido de que o Direito Penal tem como função assegurar os valores éticos e sociais da ação Todavia separase da doutrina do pai do finalismo penal com uma mudança no enfoque metodológico que parte da missão do Direito Penal e não da essência dos objetos da dogmática levando aos extremos de uma renormatização dos conceitos perante o naturalismo psicológico de Welzel Para ele um sujeito não é aquele que pode ocasionar ou impedir um sucesso senão aquele que pode ser responsável por este Os dois pilares básicos de sua perspectiva normativista estão constituídos pela função preventiva geral positiva atribuída à pena e pelas normas jurídicopenais como objeto de proteção Destarte quando descumpre sua função na sociedade o sujeito deve ser eficazmente punido inclusive porque a autoridade da lei penal somente é obtida com sua rígida e constante aplicação6 Em suma a função do Direito Penal é aplicar o comando contido na norma penal pois somente sua reiterada incidência lhe confere o merecido respeito Como consectário de seu funcionalismo sistêmico Günther Jakobs desenvolveu a teoria do direito penal do inimigo NOVAS PROPOSTAS DOUTRINÁRIAS DIREITO PENAL E ENFRENTAMENTO DA CRIMINALIDADE MODERNA As modificações introduzidas na humanidade ao longo dos últimos anos com fenômenos como a globalização a massificação dos problemas e principalmente a configuração de uma sociedade de risco implicaram em profundas alterações no Direito Penal Criouse um direito penal do risco Nas palavras de Luis Gracia Martín O direito penal moderno é próprio e característico da sociedade de risco O controle a prevenção e a gestão de riscos gerais são tarefas que o Estado deve assumir e assume efetivamente de modo relevante Para a realização de tais objetivos o legislador recorre ao tipo penal de perigo abstrato como instrumento técnico adequado por excelência Por ele o direito penal moderno ou ao menos uma parte considerável dele se denomina como direito penal do risco7 Nesse contexto a sociedade moderna destacase por ser uma sociedade de massas o que no contexto atual significa que se tem de administrar comportamentos de massa distintos mas também uniformes dos cidadãos O comportamento uniforme acarreta especiais dificuldades8 Com efeito o fato de o Direito Penal ser frequentemente convocado a controlar os novos problemas sociais acarretou mudanças na sua estrutura clássica deturpandose inclusive conceitos arraigados ao longo da história O poder por ele transmitido mostrase necessário para enfrentar os novos riscos da sociedade na qual desponta a sensação de insegurança profundamente institucionalizada o delineamento de uma classe de sujeitos passivos dos recentes problemas a identificação da maioria dos membros da comunidade com a vítima do delito e o descrédito de outras instâncias de proteção Daí resultou de modo quase natural a expansão do Direito Penal9 entrando essa disciplina em profundo dilema Como enfrentar todas essas novas complicações Com intervenção máxima incriminando o maior número possível de condutas mesmo sabendo ser seu arsenal insuficiente para tanto Ou deveria limitarse somente aos casos extremos de afronta a bens jurídicos individuais relegando para outros ramos do Direito a proteção de interesses diversos Em suma deveria o Direito Penal manter seu perfil clássico ou então seria mais coerente adaptarse aos novos tempos com todas as alterações exigidas para alcançar esse patamar É óbvio que em qualquer das hipóteses não se pode olvidar a subsidiariedade do Direito Penal muito menos o seu caráter fragmentário destinandose exclusivamente à proteção de bens jurídicos Como se sabe o caráter subsidiário do Direito Penal resulta também da função limitadora instituída pelo Estado Democrático de Direito ao ordenamento penal qual seja a proteção de bens jurídicos fundamentais à coexistência em sociedade promovendo o livre desenvolvimento da personalidade humana Além disso referese também à necessidade da tutela penal pois sua fundamentação teórica remete ao conceito de Estado que na acepção sob a qual foi instituído pela Constituição obriga a intervenção punitiva a ter a menor intensidade possível eis que impregnada de elevado índice de restrição e violação de direitos De fato deve o Poder Público interferir o mínimo possível na vida do cidadão garantindolhe a máxima liberdade Intrinsecamente relacionado à subsidiariedade desponta o caráter fragmentário do Direito Penal ou seja nem toda categoria de ilícitos constituise em infração penal mas todo crime ou contravenção necessariamente representa um ato ilícito perante o ordenamento jurídico Dessa forma o Direito Penal somente se legitima quando todos os demais ramos se mostrarem impotentes uma vez que nele está contida a mais forte agressão estatal contra os direitos do cidadão Como ensina JesúsMaría Silva Sánchez Há pois ataques contra bens jurídicos penais que não dão lugar à punibilidade da conduta correspondente A ele se refere o princípio da fragmentariedade na proteção dos bens jurídicos penais segundo o qual apenas podem constituir fatos penalmente relevantes as modalidades de ataques mais graves contra tais bens jurídicos penais10 A análise da legislação moderna indica que o Direito Penal tem preferido um meiotermo buscando a sua adaptação aos novos tempos sem entretanto relegar a outros ramos do Direito a relevante missão de combate à criminalidade e garantia da paz pública Possivelmente como afirma Paulo da Silva Fernandes em razão da badalada fuga para o direito penal fruto do aumento da insegurança e do medo Aquele é tido por muitos dada a natureza e o âmbito da panóplia de sanções ao seu dispor como o garante par excelénce do repor da segurança11 Daí surgem inexoravelmente alguns problemas Devemse evitar a funcionalização e a desformalização do Direito Penal A expansão incontrolável pode provocar o esquecimento de sua função precípua qual seja a proteção exclusiva de bens jurídicos indispensáveis para o desenvolvimento do indivíduo e da sociedade em face de sua administrativização e consequentemente com a criação de leis penais meramente simbólicas e de tipos penais de perigo abstrato em prejuízo de crimes de dano e de perigo concreto12 Essa desmedida funcionalização acarretaria ainda na opção constante ao recurso às leis penais em branco a conceitos indeterminados e a cláusulas gerais flexibilizando ou até mesmo eliminando conceitos sólidos acerca da tentativa em face da antecipação da tutela penal do dolo e da culpa permitindo em alguns casos a responsabilidade objetiva além das definições de autoria e participação Como destaca Manuel da Costa Andrade almejase dessa forma conferir à sociedade o efeito analgésico ou tranquilizante13 do Direito Penal Para solucionar esse impasse e todos os problemas daí decorrentes a doutrina estrangeira apresenta algumas formas de solução para o mergulho do Direito Penal nas turbulentas águas do risco14 o direito intervencionista as velocidades do Direito Penal o Direito Penal do inimigo e o Direito Penal como proteção de contextos da vida em sociedade Passemos à análise de cada uma das teorias Ao contrário do que a mera análise gramatical da expressão quer indicar o direito intervencionista ou de intervenção não se contrapõe ao princípio da intervenção mínima consagrado pelas legislações modernas desde que foi previsto originariamente no art 8º da Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão datada de 1789 O direito intervencionista respeita o princípio da intervenção mínima mais inclusive do que o Direito Penal clássico Nem poderia ser diferente por força da finalidade a que se propõe Seu criador e principal defensor é o alemão Winfried Hassemer Para ele o Direito Penal não oferece resposta satisfatória para a criminalidade oriunda das sociedades modernas Além disso o poder punitivo estatal deveria limitarse ao núcleo do Direito Penal isto é à estrutura clássica dessa disciplina sendo os problemas resultantes dos riscos da modernidade resolvidos pelo direito de intervenção única solução apta a enfrentar a atual criminalidade15 E o direito de intervenção consiste na eliminação de uma parte da atual modernidade do Direito Penal mediante a busca de uma dupla tarefa Inicialmente reduzindoo ao Direito Penal básico fazendo parte deste cerne somente as lesões de bens jurídicos individuais e sua colocação concreta em perigo Em segundo plano concedendo aos bens jurídicos universais objetos dos maiores riscos e ameaças da atualidade de natureza difusa e relativamente controláveis um tratamento jurídico diverso do conferido aos bens individuais Abrase espaço para o discurso da resistência à tutela penal de bens jurídicos difusos e coletivos Deveras Hassemer afirma que deve ser almejada a criação de um direito intervencionista que possibilite tratar adequadamente os problemas que apenas de modo forçado podem ser tratados no âmbito do Direito Penal clássico já que este não tem vocação para lidar com as questões inerentes à modernidade Assim cabe aos aplicadores optar pela sequência na modernização do Direito Penal ou então por libertálo das modernas exigências Em sua opinião a primeira opção importa no aumento de custos esvaziando as instituições centrais do Direito Penal que passaria a ter função meramente simbólica Destarte para não o sobrecarregar com o peso da modernização deveriam ser regulamentados os problemas por ela causados com um direito de intervenção situado entre o Direito Penal e o Contravencional entre o Direito Civil e o Direito Público dotado de garantias menos amplas das que regem o Direito Penal clássico com a consequente imposição de sanções menos drásticas Ademais como observado por Alberto Silva Franco essa nova faceta se situaria fora do âmbito do Direito Penal nas vizinhanças do direito administrativo sancionador16 Em síntese portanto o direito de intervenção na forma proposta por Winfried Hassemer consiste na manutenção no âmbito do Direito Penal somente das condutas lesivas aos bens jurídicos individuais e também daquelas que causam perigo concreto As demais de índole difusa ou coletiva e causadoras de perigo abstrato por serem apenadas de maneira mais branda seriam reguladas por um sistema jurídico diverso com garantias materiais e processuais mais flexíveis possibilitando um tratamento mais célere e amplo dessas questões sob pena de tornar o Direito Penal inócuo e simbólico Além disso não seria tarefa do Poder Judiciário aplicálas e sim da Administração Pública Cumpre consignar que o direito de intervenção para ser efetivo teria de contemplar preceitos que atualmente encontramse no Direito Penal como os ilícitos econômicos e ambientais Não se destina a ampliar a intervenção punitiva do Estado mas a diminuíla Exemplificativamente seria muito melhor a retirada do Direito Penal das condutas que hoje constituem crimes ambientais transportandoas para o direito de intervenção em que os ilícitos seriam combatidos com sanções diversas mais céleres tais como a multa a suspensão e a interdição de atividades etc Como afirma o penalista germânico os limites do Direito de Intervenção ainda não estão muito detalhados e a sua própria aplicação revelase por ora um tanto quanto temerária São suas palavras a não intervenção pressupõe o aperfeiçoamento e a complementação do saber criminológico com isso ela torna em prática o interesse preventivoindividual a relação com os problemas concretos do caso Dificilmente se pode aceitar que essas alternativas à execução da pena privativa de liberdade se tornem possíveis para os delitos e os delinquentes em um tempo previsível Portanto para isso depende de que se reúnam o mais rápido possível experiências seguras sobre os meios não interventivos face a determinadas situações17 Sua proposta contudo recebe fortes críticas A propósito Jorge de Figueiredo Dias assim se refere a essa construção doutrinária Outra coisa em minha opinião inexacta é pensar que o sancionamento das ofensas hoc sensu inadmissíveis possa ser atribuído a sanções administrativas ainda que intensificadas Não falta quem a propósito lembre a velha crítica da burla de etiquetas com razão até a um ponto em que eu me atreveria a falar de nada menos que de um pôr o princípio jurídicopenal da subsidiariedade de pernas para o ar ao subtrair à tutela penal precisamente as condutas socialmente tão gravosas que põem simultaneamente em causa a vida planetária a dignidade das pessoas e a solidariedade com as outras pessoas as que existem e as que hãose de vir18 Para Figueiredo Dias o direito de intervenção seria uma inversão temerária dos princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade uma vez que relegaria a seara mais suave do ordenamento jurídico justamente as infrações que colocam em maior risco a estrutura da sociedade ao mesmo tempo em que para elas de grave repercussão difusa estariam previstas sanções muito brandas e insuficientes para a punição e ressocialização de seus autores Em primeira análise de maneira parecida com o direito intervencionista mas bastante diversa quando estudada em sua essência JesúsMaría Silva Sánchez professor catedrático da Universidade Pompeu Fabra apresenta a teoria das velocidades do Direito Penal revelando uma nítida preocupação com a consolidação de um único Direito Penal moderno ou seja busca evitar a modernização generalizada caracterizada pela expansão e flexibilização dos princípios políticocriminais e regras de imputação inerentes às penas privativas de liberdade Parte do pressuposto de que o Direito Penal no interior de sua unidade substancial contém dois grandes blocos distintos de ilícitos o primeiro das infrações penais às quais são cominadas penas de prisão direito penal nuclear e o segundo daquelas que se vinculam aos gêneros diversos de sanções penais direito penal periférico Aquele é o modelo padrão vigente no âmbito cultural da grande maioria das nações Ademais a pena privativa de liberdade não pode em um Estado que é e precisa manterse democrático e de direito ser imposta pela Administração Pública Consequentemente Seria razoável que em um Direito Penal mais distante do núcleo do criminal e no qual se impusessem penas mais próximas das sanções administrativas privativas de direitos multas sanções que recaem sobre pessoas jurídicas se flexibilizassem os critérios de imputação e as garantias políticocriminais A característica essencial de tal setor continuaria sendo a judicialização e a consequente imparcialidade máxima da mesma forma que a manutenção do significado penal dos ilícitos e das sanções sem que estas contudo tivessem a repercussão pessoal da pena de prisão19 Dessa forma haveria manifesta distinção entre um Direito Penal amplo e flexível e um Direito Penal mínimo e rígido Somente essa separação seria apta a impedir que a modernização acabe apoderandose ainda que paulatinamente de todos os espaços do Direito Penal clássico Notese que ao contrário da doutrina apregoada por Winfried Hassemer todos os ilícitos guardam natureza penal e devem ser processados e julgados pelo Poder Judiciário Não se fala portanto em retirada de infrações penais para serem cuidadas pelo chamado direito administrativo sancionador E quais seriam especificamente as duas velocidades do Direito Penal Invoquemos uma vez mais os ensinamentos de Jesús María Silva Sánchez Uma primeira velocidade representada pelo Direito Penal da prisão na qual haverseiam de manter rigidamente os princípios político criminais clássicos as regras de imputação e os princípios processuais e uma segunda velocidade para os casos em que por não se tratar já de prisão senão de penas de privação de direitos ou pecuniárias aqueles princípios e regras poderiam experimentar uma flexibilização proporcional à menor intensidade da sanção20 Em outras palavras exigese um procedimento amplo e garantista para os crimes nos quais possa resultar a imposição de pena privativa de liberdade Por outro turno quando a sanção penal possível de ser aplicada no caso concreto se limitar às restrições de direitos ou à multa a ação penal pode ser mais ágil eis que a disputa entre o acusado e o Estado não envolve tão relevante bem jurídico a liberdade do ser humano A teoria do Direito Penal do inimigo foi desenvolvida por Günther Jakobs professor catedrático de Direito Penal e Filosofia do Direito na Universidade de Bonn Alemanha reconhecido mundialmente como um dos maiores criminalistas da atualidade A ele é também atribuída a criação de uma nova teoria da ação jurídico penal o funcionalismo radical monista ou sistêmico ou seja o pensamento que reserva elevado valor à norma jurídica como fator de proteção social Para ele apenas a aplicação constante da norma penal é que imprime à sociedade as condutas aceitas e os comportamentos indesejados Na década de 1980 Jakobs traçou os primeiros lineamentos da teoria em análise voltando ao seu estudo no final dos anos 1990 mas em 2003 de maneira corajosa assumiu postura inequívoca na defesa da adoção do Direito Penal do inimigo justificando com toda uma obra doutrinária21 a necessidade de revolucionar conceitos clássicos arraigados na mente dos doutrinadores Seu pensamento coloca em discussão a real efetividade do Direito Penal existente pugnando pela flexibilização ou mesmo supressão de diversas garantias materiais e processuais até então reputadas em uníssono como absolutas e intocáveis Em seu aspecto léxico extraise o seguinte significado INIMIGO adj Do lat inimicus 1 Não amigo hostil adverso contrário 2 Malquistado indisposto 3 De ou pertencente a partido facção ou grupo oposto sm 1 Aquele que tem inimizade ódio a alguém 2 Aquele com o qual se entra em guerra 3 O que é prejudicial oposto contrário 4 Aquele que experimenta aversão antipatia por certas coisas Inimigo alugado pessoa a quem se mata por mandado de outrem Inimigo declarado jurado pessoa que jurou agir contra alguém ou alguma coisa Inimigo público indivíduo nocivo à sociedade22 Constatase em qualquer das hipóteses acima mencionadas que o termo inimigo representa aquele que em situação de confronto deve ser enfrentado e a qualquer custo vencido Sempre que se pretende um duelo uma disputa ou de modo geral iniciar um movimento de inquietação devese escolher alguém ou alguma entidade para mostrar inconformismo com a situação que se pretende modificar No pensamento de Jakobs não é diferente Inimigo para ele é o indivíduo que afronta a estrutura do Estado pretendendo desestabilizar a ordem nele reinante ou quiçá destruílo É a pessoa que revela um modo de vida contrário às normas jurídicas não aceitando as regras impostas pelo Direito para a manutenção da coletividade Agindo assim demonstra não ser um cidadão e por consequência todas as garantias inerentes às pessoas de bem não podem ser a ele aplicadas Em síntese tratase de um indivíduo que não apenas de maneira incidental em seu comportamento ou em sua ocupação profissional ou principalmente por meio de vinculação a uma organização criminosa vale dizer em qualquer caso de forma presumivelmente permanente abandonou o direito e por conseguinte não garante o mínimo de segurança cognitiva do comportamento pessoal e o manifesta por meio de sua conduta Para Silva Sánchez a transição do cidadão ao inimigo seria produzida mediante a reincidência a habitualidade a delinquência profissional e finalmente a integração em organizações delitivas estruturadas23 Günther Jakobs fundamenta filosoficamente sua teoria nas ideias de Jean Jacques Rousseau já que o inimigo ao desrespeitar o contrato social guerreando com o Estado deixa de ser um de seus membros e também em Johann Gottlieb Fichte teoria do contrato cidadão Ademais abeberando se em Immanuel Kant sustenta que uma pessoa ameaçadora contumaz da comunidade e do Estado que não acolhe o Estado comunitáriolegal deve ser tratada como inimiga Como exemplos de pessoas identificadas como inimigas após citar o ataque às torres gêmeas de Nova York em 11 de setembro de 2001 como conduta inequívoca de indivíduos de tal estirpe aponta os integrantes de organizações criminosas delinquentes econômicos terroristas autores de crimes contra a liberdade sexual e residualmente os responsáveis pela prática de infrações penais graves e perigosas24 Vêse claramente portanto que na contramão das ideias penais hodiernamente reinantes nas mais diversas partes do mundo Jakobs abraça um Direito Penal do autor rotulando indivíduos em oposição a um Direito Penal do fato preocupado com a ofensividade de ações e omissões relevantes Inicialmente o Estado não deve reconhecer os direitos do inimigo por ele não se enquadrar no conceito de cidadão Consequentemente não pode ser tratado como pessoa pois entendimento diverso colocaria em risco o direito à segurança da comunidade O inimigo assim não pode gozar de direitos processuais como o da ampla defesa e o de constituir defensor haja vista que sendo uma ameaça à ordem pública desconsiderase sua posição de sujeito na relação jurídico processual Possível inclusive a sua incomunicabilidade Em uma guerra o importante é vencer ainda que para isso haja deslealdade com o adversário Como representa grande perigo à sociedade deixase de lado o juízo de culpabilidade para a fixação da reprimenda imposta ao inimigo privilegiandose sua periculosidade Em síntese as penas são substituídas por medidas de segurança De fato a pena teria duração determinada ao contrário da medida de segurança possibilitando sua retirada do convívio público por todo o tempo em que persistir sua situação de perigo compreendida como a probabilidade de tornar a cometer infrações penais Dessa forma tratase de um Direito Penal prospectivo com visão para o futuro encontrando amparo no positivismo criminológico de Cesare Lombroso Enrico Ferri e Rafael Garofalo que clamava por um sistema penal em consonância com a real necessidade de defesa social mormente quando estava assombrado por criminosos revestidos de indissociáveis aspectos endógenos Deve ainda o Direito Penal do inimigo antecipar a esfera de proteção da norma jurídica adiantando a tutela penal para atingir inclusive atos preparatórios sem redução quantitativa da punição25 Ora se o inimigo é um ser manifestamente voltado para os crimes e se a sua condição pessoal revela a ilicitude de sua atuação não se pode esperar que ele pratique infrações penais para posteriormente cobrarse repressão pelo Estado como se dá com cidadãos comuns Ao contrário para a manutenção da ordem deve ser combatida a sua periculosidade impondose uma medida de segurança com a mera demonstração da futura e eventual prática de um crime Essa antecipação não se importa com a quantidade da sanção penal a ser aplicada pois o que se tem em mente é a garantia da sociedade O inimigo não tem direitos e assim seu sacrifício se impõe para a proteção do interesse público No caso do fatídico atentado de 11 de setembro de 2001 inúmeras vidas seriam salvas se a atuação inimiga tivesse sido interceptada previamente Para viabilizar esse adiantamento deve o Estado valerse abundantemente da ação controlada para retardar a prisão em flagrante ao momento em que possa ser capturado o maior número de inimigos Compete providenciar também a infiltração de agentes policiais nas organizações criminosas para eficaz desbaratamento Medidas preventivas e cautelares têm seu campo de incidência alargado autorizandose mais facilmente interceptações telefônicas e quebras de sigilos bancário e fiscal Se não bastasse na investigação dos inimigos o Estado está legitimado a aplicar medidas processuais e penais às pessoas que exercem atividades lícitas em razão de alguns membros da classe guardarem íntima relação com organizações criminosas grupos de traficantes e responsáveis por lavagem de dinheiro como se dá com bancos joalheiros e leiloeiros Cuidase de meios de defesa contra agressões futuras Dele decorre também a mitigação do princípio da reserva legal ou estrita legalidade pois a periculosidade do inimigo impede a previsão de todos os atos que possam ser por ele praticados Reclamase assim uma narrativa vaga e pouco precisa dos crimes e das penas que devem variar no caso concreto dependendo da ameaça representada pelo combatente da guerra Mesmo nos crimes minuciosamente tipificados as penas devem ser severamente majoradas com o intuito de intimidar o inimigo mantendo em estado latente todo o perigo que pode ser por ele causado Autorizase também a criação artificial de delitos inflacionando a legislação penal ainda que os bens juridicamente tutelados não sejam muito claros e até mesmo não reconhecidos pela sociedade Como corolário deve ser mais rigorosa a execução penal na tentativa de emendar o inimigo e evitar a proliferação de outros que deverão sentir a força e o poder do Estado legalizado Possível assim a eliminação de direitos e garantias individuais uma vez que não paira necessidade de obediência ao devido processo legal mas a um procedimento de guerra de intolerância e repúdio ao inimigo A propósito é cabível inclusive a utilização da tortura como meio de prova e também para desbaratar as atividades ilícitas do criminoso e dos seus comparsas26 O inimigo arrependido disposto a auxiliar o Estado no combate de seus antigos companheiros contudo deve receber benefícios desde que os delate permitindo o desmantelamento de quadrilhas prisões em massa e recuperação dos produtos e proveitos dos crimes Nitidamente enxergase na concepção de Jakobs a convivência de dois direitos em um mesmo ordenamento jurídico Em primeiro lugar um direito penal do cidadão amplo e dotado de todas as garantias constitucionais processuais e penais típico de um Estado Democrático de Direito Sem prejuízo em parcela menor e restrita a grupos determinados com ele coexiste o Direito Penal do inimigo no qual o seu sujeito deve ser enfrentado como fonte de perigo e portanto a sua eliminação da sociedade é o fim último do Estado E nesse contexto o Direito Penal do inimigo seria definido por Silva Sánchez como a terceira velocidade do Direito Penal privação da liberdade e suavização ou eliminação de direitos e garantias penais e processuais27 Como não poderia ser diferente essa proposta recebe inúmeras críticas fundadas principalmente na violação de direitos e garantias constitucionais e legais28 Na sequência da teoria das velocidades do Direito Penal apresentada por Jesús María Silva Sánchez item 653 e do Direito Penal do Inimigo rotulado como a terceira velocidade do Direito Penal de Günther Jakobs item 654 o argentino Daniel Pastor desenvolve o neopunitivismo também conhecido como a quarta velocidade do Direito Penal29 O neopunitivismo relacionase ao Direito Penal Internacional caracterizado pelo alto nível de incidência política e pela seletividade escolha dos criminosos e do tratamento dispensado com elevado desrespeito às regras básicas do poder punitivo a exemplo dos princípios da reserva legal do juiz natural e da irretroatividade da lei penal No conflito entre países os vencedores são os julgadores dos Estados derrotados como aconteceu nos tribunais internacionais ad hoc para Ruanda e para a antiga Iugoslávia Nessa linha de raciocínio o neopunitivismo se destaca como um movimento do panpenalismo que busca a todo custo o aumento do arsenal punitivo do Estado inclusive de forma mais arbitrária e abusiva do que o Direito Penal do Inimigo Criase em outras palavras um direito penal absoluto De fato o panpenalismo promove a diminuição ou eliminação de garantias penais e processuais o aumento desordenado das forças policiais e a inflação legislativa mediante o aumento das penas com finalidades altamente retributivas e intimidatórias Para quem se filia a esta concepção doutrinária a defesa social legitima o Direito Penal visualizando o delito como uma problemática vinculada exclusivamente ao Direito Penal Cuidase de proposta formulada por Günter Stratenwerth e com a finalidade de garantir o futuro da sociedade deixa em segundo plano a proteção dos interesses individuais para salvaguardar imediatamente os bens jurídicos inerentes a toda a coletividade Ao contrário portanto da teoria proposta por Winfried Hassemer busca de modo precípuo a proteção dos bens jurídicos difusos pois considera mais importante a salvaguarda do todo social para secundariamente assegurar o patrimônio jurídico de cada indivíduo isoladamente considerado Como explica Paulo Silva Fernandes pronunciandose contra um direito penal que segundo esse autor demasiado arraigado a uma protecção de bens jurídicos de natureza essencialmente antropocêntrica deveria caminhar no sentido de uma chamada protecção de relações ou contextos da vida enquanto tais sem que fosse necessário reconduzir a necessidade de protecção a interesses pessoais de qualquer dos participantes num dado contexto nomeadamente nos domínios do ambiente ou da genética Por isso propõe proteger jurídicopenalmente normas de conduta referidas ao futuro sem retroreferência a interesses individuais podendose segundo o autor chegar a bons resultados30 Corolário desse entendimento operase uma antecipação das fronteiras da tutela penal com rápida transição do modelo tradicional de criação de infrações penais proteção de bens individuais contra lesões efetivas para o de crimes de perigo abstrato para bens jurídicos transindividuais passando por todas as modalidades intermediárias Interesses até há pouco desconhecidos são imediatamente consagrados ao status de penalmente protegidos como se verifica no tocante aos crimes ambientais e econômicos Após ser estabelecido um perfil de gestão dos interesses difusos e coletivos a ser seguido protegese o contexto que passa a legitimar a intervenção do Direito Penal quando determinado modelo de comportamento é desrespeitado Antecipase de maneira sensível a tutela penal ainda que sirva apenas para a proteção do ambiente desejado pelo legislador Nas palavras de Jesús María Silva Sánchez De fato essa orientação à proteção de contextos cada vez mais genéricos no espaço e no tempo da fruição dos bens jurídicos clássicos leva o Direito Penal a relacionarse com fenômenos de dimensões estruturais globais ou sistêmicas no que as aportações individuais autonomamente contempladas são ao contrário de intensidade baixa Com isso tem se produzido certamente a culminação do processo o Direito Penal que reagia a posteriori contra um fato lesivo individualmente delimitado quanto ao sujeito ativo e ao passivo se converte em um direito de gestão punitiva de riscos gerais e nessa medida está administrativizado31 Desse modo imaginando a aplicação da referida teoria ao Direito Penal pátrio poderíamos concluir ser mais relevante a proteção do meio ambiente contra a poluição na forma prevista na Lei 96051998 do que a simples punição de um crime de ameaça pois a sociedade estaria garantida imediatamente com a preservação do meio ambiente ao passo que com a segunda incriminação somente um indivíduo teria seu bem jurídico liberdade individual resguardado o que coletivamente não seria de elevada importância Sem dúvida cuidase de proposta audaciosa que ganhará importância ao longo do século XXI para o enfrentamento dos riscos da sociedade moderna Como afirma Claus Roxin conduzirá a uma certa relativização e não a um abandono da ideia de bem jurídico32 sempre considerado ao longo da história principalmente em face do patrimônio jurídico de cada indivíduo isoladamente 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 GOMES Luiz Flávio GARCÍAPABLOS DE MOLINA Antonio BIANCHINI Alice Direito penal introdução e princípios fundamentais São Paulo RT 2007 v 1 p 131 SILVA SÁNCHEZ JesúsMaría Aproximación al derecho penal contemporáneo Reimpresión Barcelona JM Bosch 2002 p 57 FERRAJOLI Luigi Direito e razão teoria do garantismo penal Trad Ana Paula Zomer Sica Fauzi Hassan Choukr Juarez Tavarez e Luiz Flávio Gomes 2 ed São Paulo RT 2006 p 91 ROXIN Claus Derecho penal Parte geral Fundamentos La estructura de la teoria del delito Trad espanhola DiegoManuel Luzón Peña Miguel Díaz y García Conlledo e Javier de Vicente Remensal Madrid Civitas 2006 t I p 203 ROXIN Claus Política criminal e sistema jurídicopenal Trad Luís Greco Rio de Janeiro Renovar 2002 p 32 e ss JAKOBS Günther Derecho penal Parte general Fundamentos y teoría de la imputación Trad espanhola Joaquin Cuello Contreras e Jose Luis Serrano Gonzales de Murillo 2 ed Madrid Marcial Pons 1997 p 167 e ss GRACIA MARTÍN Luis Modernización del derecho penal y derecho penal del enemigo Lima IDEMSA 2007 p 45 JAKOBS Günther Ciência do direito e ciência do direito penal Trad Maurício Antonio Ribeiro Lopes Barueri Manole 2003 p 44 SILVA SÁNCHEZ JesúsMaría A expansão do direito penal aspectos da política criminal nas sociedades pósindustriais Trad Luiz Otávio de Oliveira Rocha São Paulo RT 2002 SILVA SÁNCHEZ JesúsMaría Aproximación al derecho penal contemporáneo Reimpresión Barcelona Bosch 2002 p 290 FERNANDES Paulo Silva Globalização sociedade de risco e o futuro do direito penal Coimbra Almedina 2001 p 75 SILVA SÁNCHEZ JesúsMaría A expansão do direito penal aspectos da política criminal nas sociedades pósindustriais Trad Luiz Otávio de Oliveira Rocha São Paulo RT 2002 p 127 ANDRADE Manuel da Costa Liberdade de imprensa e inviolabilidade 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 pessoal Uma perspectiva jurídicocriminal Coimbra Coimbra Editora 1996 p 37 FERNANDES Paulo Silva Globalização sociedade de risco e o futuro do direito penal Coimbra Almedina 2001 p 70 HASSEMER Winfried Persona mundo y responsabilidad penal Bases para una teoría de la imputación en derecho penal Trad Francisco Munõz Conde e Maria del Mar Díaz Pita Valencia Tirant lo Blanch 1999 p 67 73 FRANCO Alberto Silva Globalização e criminalidade dos poderosos Revista Portuguesa de Ciência Criminal Coimbra ano 10 fascículo 2 p 224 abrjun 2000 HASSEMER Winfried Introdução aos fundamentos do direito penal Trad Pablo Rodrigo Alflen da Silva Porto Alegre Fabris 2005 p 398 DIAS Jorge de Figueiredo Direito penal Coimbra João Abrantes 1975 p 15 SILVA SÁNCHEZ JesúsMaría A expansão do direito penal aspectos da política criminal nas sociedades pósindustriais Trad Luiz Otávio de Oliveira Rocha São Paulo RT 2002 p 145 Idem ibidem p 148 JAKOBS Günther Derecho penal del enemigo Trad Manuel Cancio Meliá Madrid Civitas 2003 LAROUSSE Cultural Grande dicionário da língua portuguesa São Paulo Nova Cultural 1999 p 526 SILVA SÁNCHEZ JesúsMaría A expansão do direito penal aspectos da política criminal nas sociedades pósindustriais Trad Luiz Otávio de Oliveira Rocha São Paulo RT 2002 p 149 JAKOBS Günther Derecho penal del enemigo Trad Manuel Cancio Meliá Madrid Civitas 2003 p 39 A Lei 132602016 Lei de Terrorismo contém em seu art 5º um tipo incriminador que guarda alguma relação com essa característica do Direito Penal do inimigo uma vez que admite a punição de atos preparatórios de terrorismo porém com diminuição da pena Art 5º Realizar atos preparatórios de terrorismo com o propósito inequívoco de consumar tal delito Pena a correspondente ao delito consumado diminuída de um quarto até a metade 26 27 28 29 30 31 32 Nos Estados Unidos da América desenvolveuse a teoria do cenário da bomba relógio com a finalidade de justificar o uso da tortura em situações excepcionais em que não exista outra maneira eficaz de conter uma atividade terrorista O raciocínio é o seguinte uma ameaça de grandes proporções está na iminência de ser concretizada a bomba vai explodir e somente a tortura contra um prisioneiro constituise em meio idôneo para preservar a vida ou outro bem jurídico de pessoas de bem SILVA SÁNCHEZ Jesús María A expansão do direito penal aspectos da política criminal nas sociedades pósindustriais Trad Luiz Otávio de Oliveira Rocha São Paulo RT 2002 p 55 Conferir a propósito MASSON Cleber Rogério O direito penal do inimigo In SILVA Marco Antonio Marques da Coord Processo penal e garantias constitucionais São Paulo Quartier Latin 2006 e ZAFFARONI Eugenio Raúl O inimigo no direito penal Trad Sérgio Lamarão Rio de Janeiro Revan 2007 Para o estudo aprofundado do tema PASTOR Daniel R Neopunitivismo y neoinquisición un análisis de políticas y práticas penales violatorias de los derechos fundamentales del imputado Buenos Aires AdHoc 2008 FERNANDES Paulo Silva Globalização sociedade de risco e o futuro do direito penal Coimbra Almedina 2001 p 81 SILVA SÁNCHEZ Jesús María A expansão do direito penal aspectos da política criminal nas sociedades pósindustriais Trad Luiz Otávio de Oliveira Rocha São Paulo RT 2002 p 114 ROXIN Claus Problemas fundamentais de direito penal Trad Ana Paula dos Santos Luís Natscheradetz 3 ed Lisboa Vega 2004 p 62 É a fonte formal imediata do Direito Penal uma vez que por expressa determinação constitucional tem a si reservado exclusivamente o papel de criar infrações penais e cominarlhes as penas respectivas Sua estrutura apresenta dois preceitos um primário conduta e outro secundário pena No crime de homicídio simples tipificado pelo art 121 do Código Penal o preceito primário é matar alguém enquanto a pena de reclusão de 6 a 20 anos desempenha a função de preceito secundário Devese observar que a lei penal não é proibitiva mas descritiva Não proíbe a conduta de matar alguém e sim descreve tal comportamento como criminoso impondo a pena a ser aplicada caso seja ele praticado A legislação penal brasileira não contém como outrora mandamentos diretos a exemplo de não furtar não roubar etc Optou pela proibição indireta descrevendo o fato como pressuposto da sanção Essa técnica legislativa foi desenvolvida por Karl Binding por ele chamada de teoria das normas segundo a qual é necessária a distinção entre norma e lei penal A norma cria o ilícito a lei cria o delito A conduta criminosa viola a norma mas não a lei pois o agente realiza exatamente a a b b1 b2 b3 b4 ação que esta descreve As leis penais apresentam diversas divisões Podem ser incriminadoras são as que criam crimes e cominam penas Estão contidas na Parte Especial do Código Penal e na legislação penal especial não incriminadoras são as que não criam crimes nem cominam penas Subdividemse em permissivas autorizam a prática de condutas típicas ou seja são as causas de exclusão da ilicitude Em regra estão previstas na Parte Geral CP art 23 mas algumas são também encontradas na Parte Especial tal como ocorre nos arts 128 aborto legal e 142 exclusão da ilicitude nos crimes contra a honra do Código Penal exculpantes estabelecem a não culpabilidade do agente ou ainda a impunidade de determinados delitos Exemplos doença mental menoridade prescrição e perdão judicial Encontramse comumente na Parte Geral mas também podem ser identificadas na Parte Especial do Código Penal tais como nos arts 312 3º 1ª parte reparação do dano antes da sentença no crime de peculato e art 342 2º retratação antes da sentença no processo em que ocorreu o ilícito no crime de falso testemunho ou falsa perícia interpretativas esclarecem o conteúdo e o significado de outras leis penais Exemplos arts 150 4º conceito de domicílio e 327 conceito de funcionário público para fins penais do Código Penal de aplicação finais ou complementares delimitam o campo de validade das leis incriminadoras Exemplos arts 2º e 5º do Código Penal b5 b6 c d a b c diretivas são as que estabelecem os princípios de determinada matéria Exemplo princípio da reserva legal CP art 1º integrativas ou de extensão são as que complementam a tipicidade no tocante ao nexo causal nos crimes omissivos impróprios à tentativa e à participação CP arts 13 2º 14 II e 29 caput respectivamente completas ou perfeitas apresentam todos os elementos da conduta criminosa É o caso do art 157 caput do Código Penal incompletas ou imperfeitas reservam a complementação da definição da conduta criminosa a uma outra lei a um ato da Administração Pública ou ao julgador São as leis penais em branco nos dois primeiros casos e os tipos penais abertos no último Exclusividade só a lei pode criar delitos e penas CF art 5º XXXIX e CP art 1º Imperatividade o seu descumprimento acarreta a imposição de pena ou de medida de segurança tornando obrigatório o seu respeito Generalidade dirigese indistintamente a todas as pessoas inclusive aos inimputáveis Destinase a todas as pessoas que vivem sob a jurisdição do Brasil estejam no território nacional ou no exterior Justificase pelo caráter de coercibilidade que devem ter todas as leis em vigor com efeito imediato e geral Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro art 6º d e Impessoalidade projeta os seus efeitos abstratamente a fatos futuros para qualquer pessoa que venha a praticálos Há duas exceções relativas às leis que preveem anistia e abolitio criminis as quais alcançam fatos concretos Anterioridade as leis penais incriminadoras apenas podem ser aplicadas se estavam em vigor quando da prática da infração penal salvo no caso da retroatividade da lei benéfica Para Franz von Liszt leis penais em branco são como corpos errantes em busca de alma Existem fisicamente no universo jurídico mas não podem ser aplicadas em razão de sua incompletude A lei penal em branco é também denominada de cega ou aberta e pode ser definida como a espécie de lei penal cuja definição da conduta criminosa reclama complementação seja por outra lei seja por ato da Administração Pública1 O seu preceito secundário é completo o que não se verifica no tocante ao primário carente de implementação Dividese em a Lei penal em branco em sentido lato ou homogênea o complemento tem a mesma natureza jurídica e provém do mesmo órgão que elaborou a lei penal incriminadora Vejase o art 169 parágrafo único I do Código Penal complementado pelo Código Civil pois lá está a definição de tesouro art 1264 Além disso tanto a lei civil como a penal têm como fonte de produção o Poder Legislativo federal CF art 22 inc I Pode ser homovitelina quando a lei incriminadora e seu complemento outra lei encontramse no mesmo diploma legislativo ou heterovitelina se estiverem alocadas em diplomas diversos b Lei penal em branco em sentido estrito ou heterogênea o complemento tem natureza jurídica diversa e emana de órgão distinto daquele que elaborou a lei penal incriminadora É o caso dos crimes previstos na Lei 113432006 Lei de Drogas editada pelo Poder Legislativo federal mas complementada por portaria da Agência Nacional de Vigilância Sanitária Portaria SVSMS 3441998 pertencente ao Poder Executivo pois nela está a relação das drogas Vejase também o julgado do Superior Tribunal de Justiça O art 1º I da Lei 817691 ao proibir o comércio de combustíveis em desacordo com as normas estabelecidas na forma da lei é norma penal em branco em sentido estrito porque não exige a complementação mediante lei formal podendo sêlo por normas administrativas infralegais estas sim estabelecidas na forma da lei2 c Lei penal em branco inversa ou ao avesso o preceito primário é completo mas o secundário reclama complementação Nesse caso o complemento deve ser obrigatoriamente uma lei sob pena de violação ao princípio da reserva legal Exemplos dessa espécie de lei penal em branco são encontrados nos artigos 1 a 3 da Lei 28891956 relativos ao crime de genocídio d Lei penal em branco de fundo constitucional o complemento do preceito primário constituise em norma constitucional É o que se verifica no crime de abandono intelectual definido no art 246 do Código Penal pois o conceito de instrução primária encontrase no art 208 inc I da Constituição Federal e também no homicídio praticado contra integrantes dos órgãos de segurança pública uma vez que o art 121 2º inc VII do Código Penal é complementado pelos arts 142 e 144 da Lei Suprema e Lei penal em branco ao quadrado é aquela cujo complemento também depende de complementação Em síntese o tipo penal é duplamente complementado Um exemplo marcante encontrase no art 38 da Lei 96051998 Crimes Ambientais cuja redação é a seguinte Destruir ou danificar floresta considerada de preservação permanente mesmo que em formação ou utilizála com infringência das normas de proteção Este dispositivo é complementado pelo art 6º da Lei 126512012 Código 751 752 Florestal que apresenta uma relação de áreas de preservação permanente e reclama nova complementação por ato do chefe do Poder Executivo Introdução Interpretação é a tarefa mental que procura estabelecer a vontade da lei ou seja o seu conteúdo e significado Na insuperável lição de Carlos Maximiliano Interpretar é explicar esclarecer dar o significado de vocábulo atitude ou gesto reproduzir por outras palavras um pensamento exteriorizado mostrar o sentido verdadeiro de uma expressão extrair de frase sentença ou norma tudo o que na mesma se contém3 Deve buscar a vontade da lei mens legis isto é o sentido normativo nela contido e não de quem a fez mens legislatoris4 A ciência que disciplina este estudo é a hermenêutica jurídica A atividade prática de interpretação da lei é chamada de exegese A interpretação sempre é necessária ainda que a lei se mostre inicialmente inteiramente clara pois podem surgir dúvidas quanto ao seu efetivo alcance O que ela abrange de modo imediato eventualmente não é tudo quanto pode incidir no seu campo de atuação Pode a interpretação ser classificada levandose em conta o sujeito responsável pela sua realização os meios de que se serve o intérprete e por último os resultados obtidos Quanto ao sujeito autêntica judicial ou doutrinária Cuidase do sujeito ou órgão que realiza a interpretação classificandose em autêntica judicial e doutrinária Autêntica também chamada de legislativa é aquela de que se incumbe o próprio legislador quando edita uma lei com o propósito de esclarecer o alcance e o significado de outra É chamada de interpretativa e tem natureza 753 cogente obrigatória dela não podendo se afastar o intérprete É o caso do conceito de causa fornecido pelo art 13 caput do Código Penal e também do conceito legal de funcionário público para fins penais previsto no art 327 do citado diploma legislativo Por se limitar à interpretação tem eficácia retroativa ex tunc ainda que seja mais gravosa ao réu Em respeito à força e à autoridade da coisa julgada por óbvio não atinge os casos já definitivamente julgados Pode ser contextual quando se situa no próprio corpo da lei a ser interpretada ou posterior quando surge ulteriormente Doutrinária ou científica é a interpretação exercida pelos doutrinadores escritores e articulistas enfim comentadores do texto legal Não tem força obrigatória e vinculante em hipótese alguma A Exposição de Motivos do Código Penal deve ser encarada como interpretação doutrinária e não autêntica por não fazer parte da estrutura da lei Judicial ou jurisprudencial é interpretação executada pelos membros do Poder Judiciário na decisão dos litígios que lhes são submetidos Sua reiteração constitui a jurisprudência Em regra não tem força obrigatória salvo em três casos a na situação concreta em virtude da formação da coisa julgada material b quando constituir súmula vinculante CF art 103 A e c nas demais hipóteses previstas no art 927 do Código de Processo Civil5 Quanto aos meios ou métodos gramatical e lógica Cuidase do meio de que se serve o intérprete para descobrir o significado da lei penal Classificase em gramatical e lógica Gramatical também denominada literal ou sintática é a que flui da acepção literal das palavras contidas na lei Despreza quaisquer outros elementos que não os visíveis na singela leitura do texto legal É a mais precária em face da ausência de técnica científica Lógica ou teleológica é aquela realizada com a finalidade de desvendar a genuína vontade manifestada na lei nos moldes do art 5º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro É mais profunda e 754 consequentemente merecedora de maior grau de confiabilidade Servese o intérprete de todos os elementos que tem à sua disposição quais sejam histórico evolução histórica da lei e do objeto nela tratado sistemático análise da lei em compasso com o sistema em que se insere direito comparado tratamento do assunto em outros países e inclusive de elementos extrajurídicos quando o significado de determinados institutos se encontra fora do âmbito do Direito exemplo conceito de veneno relacionado à química Quanto ao resultado declaratória extensiva e restritiva Referese à conclusão extraída pelo intérprete classificandose em declaratória extensiva e restritiva Declaratória declarativa ou estrita é aquela que resulta da perfeita sintonia entre o texto da lei e a sua vontade Nada resta a ser retirado ou acrescentado Extensiva é a que se destina a corrigir uma fórmula legal excessivamente estreita A lei disse menos do que desejava minus dixit quam voluit Amplia se o texto da lei para amoldálo à sua efetiva vontade Por se tratar de mera atividade interpretativa buscando o efetivo alcance da lei é possível a sua utilização até mesmo em relação àquelas de natureza incriminadora Exemplo disso é o art 159 do Código Penal legalmente definido como extorsão mediante sequestro que também abrange a extorsão mediante cárcere privado É a posição consagrada em sede doutrinária Deve ser utilizada em concursos que esperam do candidato uma posição mais rigorosa tais como do Ministério Público Polícia Civil e Polícia Federal Em concursos de tendência mais liberal como é o caso da Defensoria Pública razoável empregar uma posição favorável ao réu Nesse contexto já decidiu o Supremo Tribunal Federal O princípio da legalidade estrita de observância cogente em matéria penal impede a interpretação extensiva ou analógica das normas penais6 755 756 761 Restritiva é a que consiste na diminuição do alcance da lei concluindose que a sua vontade manifestada de forma ampla não permite seja atribuído à sua letra todo o sentido que em tese poderia ter A lei disse mais do que desejava plus dixit quam voluit Interpretação progressiva Interpretação progressiva adaptativa ou evolutiva é a que busca amoldar a lei à realidade atual Evita a constante reforma legislativa e se destina a acompanhar as mudanças da sociedade É o caso do conceito de ato obsceno diferente atualmente do que era há algumas décadas Interpretação analógica Interpretação analógica ou intra legem é a que se verifica quando a lei contém em seu bojo uma fórmula casuística seguida de uma fórmula genérica É necessária para possibilitar a aplicação da lei aos inúmeros e imprevisíveis casos que as situações práticas podem apresentar Imaginese na fase oral de um concurso público e toda a natural e inevitável tensão que a acompanha O examinador faz a primeira pergunta Doutor Doutora apresente um exemplo de motivo torpe como qualificadora do crime de homicídio Nessa hora a memória pode falhar a ansiedade e o nervosismo podem atrapalhar por mais preparado ou preparada que você esteja Lembrese então da interpretação analógica Abra o Código Penal que estará à sua frente e leia o art 121 2º I respondendo em seguida Excelência o homicídio praticado mediante paga ou promessa de recompensa7 É isso Paga e promessa de recompensa são motivos torpes que não excluem outros Introdução Não se trata de interpretação da lei penal De fato sequer há lei a ser interpretada Cuidase portanto de integração ou colmatação do 762 ordenamento jurídico A lei pode ter lacunas mas não o ordenamento jurídico Também conhecida como integração analógica ou suplemento analógico é a aplicação ao caso não previsto em lei de lei reguladora de caso semelhante No Direito Penal somente pode ser utilizada em relação às leis não incriminadoras em respeito ao princípio da reserva legal Seu fundamento repousa na exigência de igual tratamento aos casos semelhantes Por razões de justiça fatos similares devem ser tratados da mesma maneira ubi eadem ratio ibi eadem iuris dispositio Espécies A analogia se apresenta pelas seguintes espécies a Analogia in malam partem é aquela pela qual aplicase ao caso omisso uma lei maléfica ao réu disciplinadora de caso semelhante Não é admitida no Direito Penal em homenagem ao princípio da reserva legal Consoante a posição do Supremo Tribunal Federal Não se pode pretender a aplicação da analogia para abarcar hipótese não mencionada no dispositivo legal analogia in malam partem Devese adotar o fundamento constitucional do princípio da estrita legalidade na esfera penal Por mais reprovável que seja a lamentável prática da cola eletrônica a persecução penal não pode ser legitimamente instaurada sem o atendimento mínimo dos direitos e garantias constitucionais vigentes em nosso Estado Democrático de Direito8 b Analogia in bonam partem é aquela pela qual se aplica ao caso omisso uma lei favorável ao réu reguladora de caso semelhante É possível no Direito Penal exceto no que diz respeito às leis excepcionais que não admitem analogia justamente por seu caráter extraordinário Imagine uma adolescente de 13 anos de idade vítima de estupro de vulnerável CP art 217A caput com a redação conferida pela Lei 121052009 crime do qual resultou sua gravidez Questionase Seria 771 possível o aborto A lei nada diz Entretanto o art 128 II do Código Penal autoriza a interrupção da gravidez resultante de estupro aborto sentimental sem mencionar o estupro de vulnerável crime inexistente à época em que foi redigido o art 128 do Código Penal Ora a situação é semelhante a gravidez é indesejada pois originária de um delito contra a dignidade sexual Ademais o fundamento da autorização legal do aborto é evitar que a presença do filho traga à mãe recordações de um ato covarde contra ela praticado Perfeitamente cabível assim a analogia c Analogia legal ou legis é aquela em que se aplica ao caso omisso uma lei que trata de caso semelhante d Analogia jurídica ou juris é aquela em que se aplica ao caso omisso um princípio geral do direito Introdução Depois de cumprir todas as fases do processo legislativo previsto na Constituição Federal a lei penal ingressa no ordenamento jurídico e assim como as demais leis em geral vigora até ser revogada por outro ato normativo de igual natureza É o que se convencionou chamar de princípio da continuidade das leis A revogação é a retirada da vigência de uma lei Essa é a regra geral uma lei somente é revogada por outra lei Há exceções no Direito Penal As leis temporárias e excepcionais são autorrevogáveis ou seja não precisam ser revogadas por outra lei Toda e qualquer lei por mais relevante e conhecida que seja pode ser revogada A atividade legislativa como decorrência da soberania popular é irrenunciável Os costumes por mais consagrados que sejam em dada sociedade não revogam leis Dessa forma a contravenção penal do jogo do bicho continua em vigor embora muitas vezes indevidamente tolerada pela sociedade e pior pelos órgãos estatais responsáveis pela segurança pública 772 Da mesma forma uma lei jamais é revogada por decisão judicial ainda que oriunda do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade Como se sabe a declaração de inconstitucionalidade limitase a retirar a eficácia da lei em contrariedade com o texto constitucional sem revogála função exclusiva do Poder Legislativo A revogação da lei dependendo do seu alcance pode ser absoluta ou total conhecida como abrogação abrogação absoluta ou parcial denominada derrogação No tocante ao modo pelo qual se verifica a revogação pode ser expressa tácita ou global a Expressa ocorre quando uma lei indica em seu corpo os dispositivos legais revogados O art 75 da Lei 113432006 revogou expressamente as Leis 63681976 e 114092002 de modo que o tratamento legal da repressão ao uso e tráfico de drogas passou a ser por ela regulado b Tácita ocorre no caso em que a lei nova se revela incompatível com a anterior apesar de não haver menção expressa à revogação e c Global ocorre quando a nova lei regula inteiramente a matéria disciplinada pela lei anterior que passa a ser ultrapassada e desnecessária Em obediência às regras de hermenêutica e observando o campo de incidência das leis a lei de natureza geral não revoga a especial da mesma forma pela qual a especial também não revoga a geral Não se trata de hierarquia e sim de matérias diversas e diferentes âmbitos de atuação uma não influindo sobre a outra Direito Penal intertemporal e o conflito de leis penais no tempo Como a lei pode ser revogada instauramse situações de conflito Nesse sentido verificase o conflito de leis no tempo quando uma lei nova entra em vigor revogando a anterior De fato situações problemáticas inevitavelmente surgirão eis que a lei nova sempre tem conteúdo ao menos relativamente diverso da sua antecessora mesmo porque se fossem idênticas não haveria razão lógica para a sua edição a b c d e 7721 As regras e princípios que buscam solucionar o conflito de leis penais no tempo constituem o direito penal intertemporal A análise do art 5º XL da Constituição Federal e dos arts 2º e 3º do Código Penal permite a conclusão de que uma vez criada a eficácia da lei penal no tempo deve obedecer a uma regra geral e a várias exceções A regra geral é a da prevalência da lei que se encontrava em vigor quando da prática do fato vale dizer aplicase a lei vigente quando da prática da conduta tempus regit actum Dessa forma resguardase a reserva legal bem como a anterioridade da lei penal em cumprimento às diretrizes do texto constitucional As exceções se verificam por outro lado na hipótese de sucessão de leis penais que disciplinem total ou parcialmente a mesma matéria E se o fato tiver sido praticado durante a vigência da lei anterior cinco situações podem ocorrer a lei cria uma nova figura penal novatio legis incriminadora a lei posterior se mostra mais rígida em comparação com a lei anterior lex gravior a lei posterior extingue o crime abolitio criminis a lei posterior é benigna em relação à sanção penal ou à forma de seu cumprimento lex mitior ou a lei posterior contém alguns preceitos mais rígidos e outros mais brandos Vejamos cada uma delas Novatio legis incriminadora É a lei que tipifica como infrações penais comportamentos até então considerados irrelevantes A neocriminalização somente pode atingir situações consumadas após sua entrada em vigor Não poderá retroagir em hipótese alguma conforme determina o art 5º XL da Constituição Federal 7722 7723 A novatio legis incriminadora portanto somente tem eficácia para o futuro Jamais para o passado Lei penal mais grave ou lex gravior Lei penal mais grave é a que de qualquer modo implicar tratamento mais rigoroso às condutas já classificadas como infrações penais A expressão de qualquer modo deve ser considerada de forma ampla para atingir todo tipo de situação prejudicial ao réu Exemplos aumento de pena criação de qualificadora agravante genérica ou causa de aumento da pena imposição de regime prisional mais rígido aumento do prazo prescricional supressão de atenuante genérica ou causa de diminuição da pena etc Se mais grave a lei terá aplicação apenas a fatos posteriores à sua entrada em vigor Jamais retroagirá conforme expressa determinação constitucional Essa regra tem incidência sobre todas as leis com conteúdo material estejam alocadas tanto no Código Penal Parte Geral ou Parte Especial ou na legislação penal extravagante sejam incriminadoras ou reguladoras da imputabilidade das causas excludentes da ilicitude da aplicação da pena ou de qualquer outra classe jurídica atentatória do poder punitivo Abolitio criminis e lei posterior benéfica Abolitio criminis é a nova lei que exclui do âmbito do Direito Penal um fato até então considerado criminoso Encontra previsão legal no art 2º caput do Código Penal e tem natureza jurídica de causa de extinção da punibilidade art 107 III9 Alcança a execução e os efeitos penais da sentença condenatória não servindo como pressuposto da reincidência e também não configura maus antecedentes Sobrevivem entretanto os efeitos civis de eventual condenação quais sejam a obrigação de reparar o dano provocado pela infração penal e constituição de título executivo judicial A configuração da abolitio criminis reclama revogação total do preceito penal e não somente de uma norma singular referente a um fato que sem ela se contém numa incriminação penal Com efeito são necessários dois requisitos para a caracterização da abolitio criminis a revogação formal do tipo penal e b supressão material do fato criminoso Em outras palavras não basta a simples revogação do tipo penal É necessário que o fato outrora incriminado tornese irrelevante perante o ordenamento jurídico a exemplo do que aconteceu com o antigo crime de adultério cuja definição encontrava se no art 240 do Código Penal De fato não há falar em abolitio criminis nas hipóteses em que nada obstante a revogação formal do tipo penal o fato criminoso passa a ser disciplinado perante dispositivo legal diverso Nesses casos verificase a incidência do princípio da continuidade normativa ou da continuidade típiconormativa10 operandose simplesmente a alteração geográfica ou topográfica da conduta ilícita Esse fenômeno foi constatado no campo do atentado violento ao pudor pois o art 214 do Código Penal foi revogado pela Lei 120152009 mas o fato passou a ser alcançado pelo art 213 do Estatuto Repressivo agora sob o rótulo estupro Na visão do Superior Tribunal de Justiça Cabe registrar que diante do princípio da continuidade normativa não há falar em abolitio criminis quanto ao crime de atentado violento ao pudor cometido antes da alteração legislativa conferida pela Lei 120152009 A referida norma não descriminalizou a conduta prevista na antiga redação do art 214 do CP que tipificava a conduta de atentado violento ao pudor mas apenas a deslocou para o art 213 do CP formando um tipo penal misto com condutas alternativas estupro e atentado violento ao pudor11 Nada impede por opção política do legislador que um fato alcançado pela abolitio criminis venha a ser no futuro novamente incriminado É evidente que essa lei somente será aplicável aos fatos cometidos após a sua entrada em vigor em obediência ao princípio da anterioridade um dos vetores do Direito Penal moderno e democrático É cabível o reconhecimento da abolitio criminis temporária nas situações em que a lei prevê a descriminalização transitória de uma conduta Esse fenômeno foi constatado nos arts 30 a 32 da Lei 108262003 Estatuto 1ª 2ª 3ª do Desarmamento ao autorizar a extinção da punibilidade no tocante aos responsáveis pelos crimes de posse e de porte ilegal de arma de fogo que efetuaram voluntariamente a entrega de armas de fogo de uso permitido dentro dos prazos neles estabelecidos12 Lei penal benéfica também conhecida como lex mitior ou novatio legis in mellius é a que se verifica quando ocorrendo sucessão de leis penais no tempo o fato previsto como crime ou contravenção penal tenha sido praticado na vigência da lei anterior e o novel instrumento legislativo seja mais vantajoso ao agente favorecendoo de qualquer modo A lei mais favorável deve ser obtida no caso concreto aplicandose a que produzir o resultado mais vantajoso ao agente teoria da ponderação concreta13 Aqui também a expressão de qualquer modo deve ser compreendida na acepção mais ampla possível Nos termos do art 5º XL da Constituição Federal a abolitio criminis e a novatio legis in mellius devem retroagir por configurar nítido benefício ao réu A retroatividade é automática dispensa cláusula expressa e alcança inclusive os fatos já definitivamente julgados14 E qual é o juízo competente para aplicar a abolitio criminis e a nova lei mais favorável A resposta é simples Guarde o seguinte raciocínio a lei será sempre aplicada pelo órgão do Poder Judiciário em que a ação penal ou inquérito policial estiver em trâmite Extraemse as seguintes ilações Tratandose de inquérito policial ou de ação penal que se encontre em 1º grau de jurisdição ao juiz natural compete a aplicação da lei mais favorável Exemplo crime praticado na comarca de São Paulo com inquérito policial distribuído e ação penal ajuizada na 10ª Vara Criminal O juiz de Direito responsável por esta Vara deverá aplicar a lei mais favorável No caso de ação penal em grau de recurso ou ainda na hipótese de crime de competência originária dos Tribunais tal mister será tarefa do Tribunal respectivo Se a condenação já tiver sido alcançada pelo trânsito em julgado a competência será do juízo da Vara das Execuções Criminais É o 77231 que se extrai do art 66 I da Lei de Execução Penal e da Súmula 611 do Supremo Tribunal Federal15 Atenção para um detalhe vimos que a lei mais favorável é retroativa Portanto somente se pode falar em retroatividade quando a lei posterior for mais benéfica ao agente em comparação àquela que estava em vigor quando o crime foi praticado Pode ocorrer ainda ultratividade da lei mais benéfica Tal se verifica quando o crime foi praticado durante a vigência de uma lei posteriormente revogada por outra prejudicial ao agente Subsistem no caso os efeitos da lei anterior mais favorável Isso porque como já abordado a lei penal mais grave jamais retroagirá16 Lei penal posterior e vacatio legis 7724 Durante o período de vacatio legis a lei penal não pode ser aplicada mesmo que ela seja mais favorável ao réu Com efeito se a lei já foi publicada mas ainda não entrou em vigor ela ainda não tem eficácia sendo impossível sua incidência no caso prático É preciso manter coerência Se a lei em período de vacância não pode ser utilizada para prejudicar o réu porque ainda não está apta a produzir seus regulares efeitos também não pode beneficiálo A propósito basta recordar do Código Penal de 1969 Decretolei 10041969 que possuía diversas disposições mais favoráveis ao réu se comparado à época com o Código Penal de 1940 O Código Penal de 1969 originário do Anteprojeto Nélson Hungria é notoriamente apontado como exemplo do período de mais longa vacatio legis já existente no ordenamento jurídico pátrio Seu texto final foi publicado em 1963 e posteriormente sancionado em 21 de outubro de 1969 pelo Governo Militar Comando Supremo da Revolução com fulcro no art 3º do Ato Institucional 161969 combinado com o 1º do art 2º do Ato Institucional 051968 Nada obstante o Código Penal de 1969 nunca entrou em vigor Originariamente o Código Penal de 1969 deveria ter entrado em vigor no dia 1º081970 Seu texto entretanto foi revisto pela Lei 60161973 Após sucessivos prolongamentos das datas estipuladas para o início da sua aplicabilidade cf Lei 60631974 e suas alterações o diploma concebido por Nélson Hungria acabou revogado pela Lei 65781978 quando ainda estava em período de vacatio razão pela qual nenhuma de suas disposições favoráveis ou prejudiciais ao réu foi aplicada no lugar no Código Penal de 1940 ainda em vigor Combinação de leis penais lex tertia Pode ocorrer o conflito entre duas leis penais sucessivas no tempo cada qual com partes favoráveis e desfavoráveis ao réu Exemplo A Lei X comina a certo crime as penas de reclusão de um a quatro anos e multa Posteriormente tal lei é revogada por outra Y a qual prevê ao mesmo delito a pena de reclusão de dois a seis anos sem multa A discussão reside na possibilidade ou não de o juiz na determinação da lei penal mais branda acolher os preceitos favoráveis da primitiva e ao mesmo tempo os da posterior combinandoos para utilizálos no caso concreto de modo a extrair o máximo benefício resultante da aplicação conjunta dos aspectos mais interessantes ao réu O cerne da discussão reside em definir se cabe ou não ao Poder Judiciário a formação de uma lex tertia ou seja de uma lei híbrida Em nosso exemplo poderia o magistrado combinar as leis X e Y da forma mais favorável ao réu daí resultando a pena de um a quatro anos da primeira sem multa da segunda A doutrina se divide acerca do assunto Nélson Hungria revelava sua incredulidade nessa possibilidade de o membro do Poder Judiciário se arvorar em legislador sob pena de violação da regra constitucional da separação dos Poderes17 Compartilham desse entendimento Heleno Cláudio Fragoso e Aníbal Bruno Com opinião diametralmente oposta José Frederico Marques pugnava pela admissibilidade da combinação de leis São suas as palavras Dizer que o juiz está fazendo lei nova ultrapassando assim suas funções constitucionais é argumento sem consistência pois o julgador em obediência a princípios de equidade consagrados pela própria Constituição está apenas movimentandose dentro dos quadros legais para uma tarefa de integração perfeitamente legítima O órgão judiciário não está tirando ex nihilo a regulamentação eclética que deve imperar hic et nunc A norma do caso concreto é construída em função de um princípio constitucional com o próprio material fornecido pelo legislador Se ele pode escolher para aplicar o mandamento da Lei Magna entre duas séries de disposições legais a que lhe pareça mais benigna não vemos porque se lhe vede a combinação de ambas para assim aplicar mais retamente a Constituição Se lhe está afeto escolher o todo para que o réu tenha o tratamento mais favorável e benigno nada há que lhe obste selecionar parte de um todo e parte de outro para cumprir uma regra constitucional que deve sobrepairar a pruridos de lógica formal18 Historicamente o Supremo Tribunal Federal sempre se posicionou pela impossibilidade de combinação de leis penais com o argumento de que extrair alguns dispositivos de forma isolada de um diploma legal e outro preceito de outro diploma legal implica alterar por completo o seu espírito normativo criando um conteúdo diverso do previamente estabelecido pelo legislador19 Entretanto em alguns julgados o Supremo Tribunal Federal rompeu com seu posicionamento clássico e decidiu pelo cabimento a autor de crime de tráfico de drogas cometido sob a égide da Lei 63681976 do benefício introduzido pelo artigo 33 4º da nova Lei de Drogas Lei 113432006 Concluiu que aplicar a causa de diminuição não significa baralhar e confundir normas uma vez que o juiz ao assim proceder não cria lei nova mas apenas se movimenta dentro dos quadros legais para uma tarefa de integração perfeitamente possível Enfatizouse também que a vedação de junção de dispositivos de leis diversas é apenas produto de interpretação da doutrina e da jurisprudência sem apoio direto em texto constitucional20 Destarte o Supremo Tribunal Federal abandonou a teoria da ponderação unitária ou global a lei na sua totalidade na globalidade das suas disposições deve ser aplicada e filiouse à teoria da ponderação diferenciada pela qual considerada a complexidade de cada uma das leis em conflito no tempo e a relativa autonomia de cada uma das disposições é preciso procederse ao confronto de cada uma das disposições de cada lei podendo portanto acabar por se aplicar ao caso sub iudice disposições de ambas as leis21 Entretanto a inovação jurisprudencial não foi unânime pois o Supremo Tribunal Federal rapidamente retomou sua posição tradicional voltando a acolher a teoria da ponderação unitária ou global de modo a repelir a combinação de leis penais em homenagem aos princípios da reserva legal e da separação dos Poderes do Estado sob o argumento de ser vedada ao Poder Judiciário a criação de uma terceira pena Este é o entendimento atualmente adotado pela Corte Suprema contrário à combinação de leis penais É vedada a incidência da causa de diminuição do art 33 4º da Lei 7725 113432006 4º Nos delitos definidos no caput e no 1º deste artigo as penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços desde que o agente seja primário de bons antecedentes não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa combinada com as penas previstas na Lei 636876 no tocante a crimes praticados durante a vigência desta norma Essa a conclusão do Plenário que por maioria proveu parcialmente recurso extraordinário para determinar o retorno dos autos à origem instância na qual deverá ser realizada a dosimetria de acordo com cada uma das leis para aplicarse na íntegra a legislação mais favorável ao réu Prevaleceu o voto do Ministro Ricardo Lewandowski relator Inicialmente o relator frisou que o núcleo teleológico do princípio da retroatividade da lei penal mais benigna consistiria na estrita prevalência da lex mitior de observância obrigatória para aplicação em casos pretéritos Afirmou que se trataria de garantia fundamental prevista no art 5º XL da CF e que estaria albergada pelo Pacto de São José da Costa Rica art 9º Frisou que a Constituição disporia apenas que a lei penal deveria retroagir para beneficiar o réu mas não faria menção sobre a incidência do postulado para autorizar que algumas partes de diversas leis pudessem ser aplicadas separadamente para favorecer o acusado22 Com igual orientação o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula 501 É cabível a aplicação retroativa da Lei n 113432006 desde que o resultado da incidência das suas disposições na íntegra seja mais favorável ao réu do que o advindo da aplicação da Lei n 63681976 sendo vedada a combinação de leis Finalmente o Código Penal Militar Decretolei 10011969 em seu art 2º 2º proíbe expressamente a combinação de leis Lei penal intermediária É possível em caso de sucessão de leis penais a aplicação de uma lei intermediária mais favorável ao réu ainda que não seja a lei em vigor quando da prática da infração penal ou a lei vigente à época do julgamento Exemplo Ao tempo da conduta estava em vigor a lei A sucedida pela lei B 773 encontrandose em vigor ao tempo da sentença a lei C Nada impede a aplicação da lei B desde que se trate entre todas da mais favorável ao agente23 Essa é a posição consagrada no Supremo Tribunal Federal Lei penal no tempo incidência da norma intermediária mais favorável Dada a garantia constitucional de retroatividade da lei penal mais benéfica ao réu é consensual na doutrina que prevalece a norma mais favorável que tenha tido vigência entre a data do fato e a da sentença o contrário implicaria retroação da lei nova mais severa de modo a afastar a incidência da lei intermediária cuja prevalência sobre a do tempo do fato o princípio da retroatividade in mellius já determinara24 Em síntese a lei penal intermediária é simultaneamente dotada de retroatividade e de ultratividade Lei penal temporária e lei penal excepcional Lei penal temporária é aquela que tem a sua vigência predeterminada no tempo isto é o seu termo final é explicitamente previsto em data certa do calendário É o caso da Lei 126632012 conhecida como Lei Geral da Copa do Mundo de Futebol de 2014 cujo art 36 contém a seguinte redação Os tipos penais previstos neste Capítulo terão vigência até o dia 31 de dezembro de 2014 Lei penal excepcional por outro lado é a que se verifica quando a sua duração está relacionada a situações de anormalidade Exemplo É editada uma lei que diz ser crime punido com reclusão de seis meses a dois anos tomar banho com mais de dez minutos de duração durante o período de racionamento de energia Essas leis são autorrevogáveis Não precisam de outra lei que as revogue Basta a superveniência do dia nela previsto lei temporária ou o fim da situação de anormalidade lei excepcional para que deixem automaticamente de produzir efeitos jurídicos Por esse motivo são classificadas como leis intermitentes Se não bastasse possuem ultratividade pois se aplicam ao fato praticado 774 durante sua vigência embora decorrido o período de sua duração temporária ou cessadas as circunstâncias que a determinaram excepcional É o que consta do art 3º do Código Penal25 Em outras palavras ultratividade significa a aplicação da lei mesmo depois de revogada Imagine no exemplo mencionado que alguém tomou banho por mais de dez minutos durante o período de racionamento de energia Configurouse o crime tipificado pela lei excepcional A pena será aplicada mesmo após ser superada a situação de economia de força elétrica O fundamento da ultratividade é simples e foi suficientemente explicado pelo item 8 da Exposição de Motivos da antiga Parte Geral do Código Penal26 É especialmente decidida a hipótese da lei excepcional ou temporária reconhecendose a sua ultraatividade Esta ressalva visa impedir que tratandose de leis previamente limitadas no tempo possam ser frustradas as suas sanções por expedientes astuciosos no sentido do retardamento dos processos penais Buscase com a ultratividade impedir injustiças Sem essa característica da lei penal alguns réus seriam inevitavelmente condenados e outros não Seriam punidos somente aqueles que tivessem praticado crimes em período muito anterior ao fim de sua vigência As leis penais em branco e o conflito de leis no tempo Lei penal em branco é aquela cujo preceito secundário é completo mas o preceito primário necessita de complementação Há previsão precisa da sanção mas a narrativa da conduta criminosa é incompleta O complemento pode constituirse em outra lei ou ainda em ato da Administração Pública O problema relativo ao assunto consiste em saber se uma vez alterado o complemento da lei penal em branco posteriormente à realização da conduta criminosa ou seja com a infração penal já consumada e beneficiando o agente deve operarse a retroatividade A descrição do tipo penal continua a mesma mas a conduta praticada pelo agente não mais encontra adequação típica em face de não mais se enquadrar no complemento a que anteriormente se sujeitava Não há consenso entre os estudiosos do Direito Penal Basileu Garcia era favorável à retroatividade em oposição a Magalhães Noronha e José Frederico Marques entre outros Em que pese a acirrada discussão a questão é simples Para sua compreensão basta encarála em sintonia com o art 3º do Código Penal Com efeito o complemento da lei penal em branco pode assumir duas faces distintas normalidade e anormalidade Quando o complemento se revestir de situação de normalidade a sua modificação favorável ao réu revela a alteração do tratamento penal dispensado ao caso Em outras palavras a situação que se buscava incriminar passa a ser irrelevante Nesse caso a retroatividade é obrigatória Vejamos um exemplo Suponhamos que alguém seja preso em flagrante por ter sido encontrada em seu poder relevante quantidade de determinada droga O crime de tráfico tipificado pelo art 33 caput da Lei 113432006 constituise em lei penal em branco pois a sua descrição fala somente em droga e a classificação de determinada substância nessa categoria depende de enquadramento em relação constante de Portaria editada pelo Poder Executivo Federal Se ao tempo em que a conduta foi praticada a droga apreendida com o agente era definida como ilícita e se após o oferecimento de denúncia pelo Ministério Público ou mesmo depois de proferida a condenação inclusive com trânsito em julgado a Portaria é modificada e de seu rol deixa de constar a substância com que estava o agente deve operarse a retroatividade uma vez que não havia situação de anormalidade O que era crime deixou de ser Aplicase ao caso portanto a regra delineada pelo art 5º XL da Constituição Federal Por seu turno quando o complemento se inserir em um contexto de anormalidade de excepcionalidade a sua modificação ainda que benéfica ao réu não pode retroagir Fundamentase essa posição na ultratividade das leis penais excepcionais alicerçada no art 3º do Código Penal Se no momento em que estava em vigor o complemento havia algo de anormal ou seja se se tratava de situação que naquele momento e não necessariamente no futuro deveria ser reprimida a modificação do complemento não pode produzir efeitos aos casos anteriormente praticados ou seja cometidos em período de anormalidade Como exemplo podemos recordar a famosa passagem de tabelamento de preços de produtos e mercadorias em geral O art 2º VI da Lei 15211951 preceitua ser crime contra a economia popular transgredir tabelas oficiais de gêneros e mercadorias Imagine que em razão de problemas nas plantações de trigo e visando controlar acentuada inflação seja editada tabela pela qual o quilo do pão francês não possa ser vendido por valor superior a cinco reais enquanto não for normalizada a situação Nesse período um comerciante ávido por lucros vende pães por sete reais o quilo Sua conduta é descoberta e ele vem a ser condenado Em seguida a situação é normalizada e deixa de existir o preço tabelado liberandose os valores por parte dos comerciantes Nada obstante a pena deverá ser cumprida A modificação não poderá retroagir Ao contrário será ultrativa isto é produzirá efeitos mesmo depois de cessada a situação de excepcionalidade Essa é a posição do Supremo Tribunal Federal lançada na análise de caso relativo ao art 269 do Código Penal por ter ocorrido alteração na relação de doenças de notificação compulsória pelo médico 781 Em princípio o art 3º do Código Penal se aplica à norma penal em branco na hipótese de o ato normativo que a integra ser revogado ou substituído por outro mais benéfico ao infrator não se dando portanto a retroatividade Essa aplicação só não se faz quando a norma que complementa o preceito penal em branco importa real modificação da figura abstrata nele prevista ou se assenta em motivo permanente insusceptível de modificarse por circunstâncias temporárias ou excepcionais como sucede quando do elenco de doenças contagiosas se retira uma por se haver demonstrado que não tem ela tal característica27 Finalmente nas leis penais em branco ao avesso aquelas em que o preceito primário é completo mas o preceito secundário depende de complementação a revogação do complemento inviabiliza a punibilidade Embora a conduta criminosa tenha perfeita descrição normativa não será possível a imposição de pena diante da lacuna legislativa a seu respeito Conceito Dáse o conflito aparente de leis penais quando a um único fato se revela possível em tese a aplicação de dois ou mais tipos legais ambos instituídos por leis de igual hierarquia e originárias da mesma fonte de produção e também em vigor ao tempo da prática da infração penal Na clássica lição de Oscar Stevenson Tratase da sistemática dos princípios mercê dos quais determinada norma repressiva tem exclusividade de aplicação diante de outras que também definem como delito o mesmo fato correspondente ao comportamento no todo ou em parte O conflito de preceitos penais se resolve na unicidade de delito pela aplicação de uma só norma28 Percebese assim a existência de um único fato punível Ao contrário despontam diversos tipos legais aptos a serem aplicados ao caso concreto Mas tratandose de conduta singular afigurase injusta e desproporcional a incidência de mais de uma sanção penal razão pela qual deve ser escolhido o dispositivo legal que na vida real apresenta melhor adequação típica 782 783 784 O conflito é aparente pois desaparece com a correta interpretação da lei penal que se dá com a utilização de princípios adequados Requisitos São três 1 unidade de fato 2 pluralidade de leis penais e 3 vigência simultânea de todas elas29 Localização no Direito Penal O ponto de estudo do conflito aparente de leis penais é variável Enquanto alguns autores preferem analisálo com o concurso de crimes30 outros o situam perante a teoria da lei penal31 passando inclusive pelo poder de punir do Estado em face da proibição do bis in idem32 Mais acertado contudo é o seu enquadramento na interpretação da lei penal33 Não sem motivo Beling conceituou o instituto como a relação que medeia entre duas leis penais pela qual enquanto uma é excluída a outra é aplicada34 De fato cuidase de problema ligado à interpretação da lei solucionável com o emprego dos princípios apresentados pela dogmática penal A antinomia subsiste até o verdadeiro descobrimento da finalidade da lei penal o que se dá com a correta análise do seu alcance e conteúdo Finalidade A solução do conflito aparente de leis penais dedicase a manter a coerência sistemática do ordenamento jurídico bem como a preservar a inaceitabilidade do bis in idem Para Nélson Hungria Não é admissível que duas ou mais leis penais ou dois ou mais dispositivos da mesma lei penal se disputem com igual autoridade exclusiva aplicação ao mesmo fato Para evitar a perplexidade ou a intolerável solução pelo bis in idem o direito penal como o direito em geral dispõe de regras explícitas ou implícitas que previnem a possibilidade de competição em seu seio35 Inicialmente portanto o conflito aparente de leis penais prestase a evitar 785 1 2 o repudiável bis in idem implicitamente vedado pelo sistema jurídico como exigência de justiça Ora se um de seus requisitos é a unidade de fato em relação aos quais duas ou mais leis podem ser aplicadas resta clara a inadmissibilidade de sua dupla punição Não pode uma conduta ser duplamente castigada Em síntese não se admite pelo mesmo fato mais de uma punição Se não bastasse busca o instituto a manutenção da unidade e da coerência do ordenamento jurídico Não se olvida que no sistema penal afloram leis incompatíveis entre si tanto em face da imprecisão técnica do legislador como em virtude da variedade de situações que podem surgir na vida real impossibilitando a previsão antecipada de todos os casos merecedores de regulamentação expressa Entretanto se existem leis incompatíveis o sistema deve apresentar uma solução para que tal incompatibilidade desapareça A incompatibilidade entre elas deve ser tolhida mediante a exclusão de uma delas pelo Poder Judiciário Em síntese o Direito não tolera antinomias36 Diferença com o concurso de crimes Concurso de crimes é a situação que ocorre quando mediante uma ou mais condutas o agente pratica dois ou mais crimes idênticos ou não Está disciplinado pelos arts 69 a 72 do Código Penal São duas as diferenças fundamentais entre os institutos O conflito aparente não possui regramento legislativo tratandose atualmente de construção doutrinária e jurisprudencial ao passo que o concurso de crimes foi regulamentado à risca pelo Código Penal No concurso de crimes todas as leis violadas serão aplicadas no caso concreto implicando a soma ou majoração das penas previstas para cada uma delas Em suma tudo o que foi praticado será imputado ao agente Ao contrário no conflito aparente de leis a incidência de uma delas impede a aplicabilidade da outra Como um de seus requisitos é a unidade de fato restaria configurado o bis in 786 787 7871 idem se houvesse mais de uma punição A um fato corresponde igualmente uma pena As diversas leis buscam espaço concorrem mas ao final superado o processo exegético apenas uma será utilizada acarretando a incidência da sanção penal a ela destinada Diferença com o conflito de leis penais no tempo No conflito de leis penais no tempo regulado pelo direito intertemporal duas ou mais leis disputam a aplicação a um fato típico e ilícito praticado por agente culpável Somente uma delas poderá ser empregada já que a outra não mais existe não goza de vigência não produz efeitos válidos no mundo fenomênico Dessa forma e não se olvidando que um dos elementos do conflito aparente é a vigência simultânea de duas ou mais disposições inicialmente aplicáveis a um único fato a diferença entre os institutos é flagrante Enquanto no conflito de leis no tempo somente uma delas existe e está em vigor no conflito aparente ambas vigoram mas apenas a adequada surtirá efeitos no caso real sob pena de configuração do bis in idem sem prejuízo da quebra de unidade lógica do sistema jurídicopenal Princípios para solução do conflito A doutrina indica em geral quatro princípios para solucionar o conflito aparente de leis penais São eles 1 especialidade 2 subsidiariedade 3 consunção e 4 alternatividade Princípio da especialidade Com origem no Direito Romano é aceito de forma unânime Não se questiona que a lei especial prevalece sobre a lei geral lex specialis derogat generali semper specialia generalibus insunt generi per speciem derogatur A lei especial também chamada de específica possui sentido diferenciado particularizado Cuidase daquela cuja previsão reproduz de modo expresso ou elíptico a da lei geral tornandoa especial pelo acréscimo de outros elementos Em outras palavras lei especial é a que contém todos os dados típicos de uma lei geral e também outros denominados especializantes A primeira prevê o crime genérico ao passo que a última traz em seu bojo o crime específico Exemplo O crime de infanticídio previsto no art 123 do Código Penal tem núcleo idêntico ao do crime de homicídio tipificado pelo art 121 caput qual seja matar alguém Tornase entretanto figura especial ao exigir elementos especiais diferenciadores a autora deve ser a genitora e a vítima deve ser o seu próprio filho nascente ou neonato cometendose o delito durante o parto ou logo após sob a influência do estado puerperal É o que também se verifica entre as mais diversas infrações penais em suas formas simples quando comparadas com as modalidades derivadas sejam estas qualificadoras ou instituidoras de figuras privilegiadas Visualizase na especialidade uma relação lógica de dependência própria de uma situação de subordinação legislativa37 eis que toda conduta que atende ao tipo especial realiza também necessariamente e de forma simultânea o crime previsto na lei geral o que não ocorre em sentido diverso Em suma quem pratica o crime específico também o faz perante o crime genérico mas quem executa este não obrigatoriamente realiza aquele Há entre as leis relação de gênero e espécie ou seja todos os elementos descritos pela lei geral são reproduzidos pela lei especial Por tal razão a primeira é excluída quando comparada com a última De fato as diversas disposições têm por objeto o mesmo fato mas a aplicação de uma delas diferenciada específica e mais adequada além de ser dotada de elementos qualitativos ilide a incidência da outra de natureza residual e genérica Devese atentar contudo que entra em cena o critério da especialidade não só quando um crime se encontra expressamente compreendido em outro tal como acontece entre infanticídio e homicídio mas também nas situações em que a cuidadosa interpretação revela que um tipo penal acarreta em uma descrição mais próxima ou minuciosa para determinado fato punível38 É o que se verifica entre os crimes de calúnia e difamação tipificados respectivamente pelos arts 138 e 139 do Código Penal ambos atentam contra honra objetiva e exigem a imputação de fato determinado consumandose no instante em que terceira pessoa toma conhecimento do teor da ofensa No primeiro todavia a imputação referese ao cometimento de um crime que o agente sabe não ter sido praticado pela vítima seja porque outra pessoa foi seu autor seja porque jamais existiu Por sua vez na difamação a imputação diz respeito a um fato desabonador de índole criminosa ou não pouco importando seja verdadeiro ou falso Cumpre frisar que o princípio da especialidade impõe sejam os delitos genérico e específico praticados em absoluta contemporaneidade isto é no mesmo contexto fático Com efeito deve tratarse de fato único isolado e não de reiteração criminosa Exemplificativamente temos a situação da mãe que tenta matar o próprio filho durante o próprio parto sob a influência do estado puerperal mas não obtém êxito por circunstâncias alheias à sua vontade e depois vem a matálo em outro momento já com o desaparecimento do puerpério caso em que responderá pelos dois crimes em concurso material tentativa de infanticídio e homicídio doloso consumado As disposições genérica e específica podem ser integrantes de um mesmo diploma legal como se dá entre os crimes previstos no Código Penal ou ainda constar de leis distintas podendo ser lembrada a relação existente entre os crimes previstos no art 334A do Código Penal contrabando e pelo art 33 caput da Lei 113432006 tráfico de drogas aquele que importa clandestinamente qualquer produto incidirá na regra geral prevista no Código Penal de sua vez se o produto importado for alguma droga o crime será o de tráfico internacional de drogas tipificado na lei extravagante Ademais as leis podem ter sido promulgadas ao mesmo tempo ou em épocas diversas e nesse caso tanto pode ser posterior a lei geral como a especial Nesse contexto decidiu o Supremo Tribunal Federal que as novas disposições da Lei 113432006 Lei de Drogas não alteraram o art 290 do Código Penal Militar39 Vejamos O art 290 do Código Penal Militar não sofreu alteração pela superveniência da Lei n 1134306 por não ser o critério adotado na espécie o da retroatividade da lei penal mais benéfica mas sim o da especialidade O fundamento constitucional do crime militar é o art 124 parágrafo único da Constituição da República tratamento diferenciado do crime militar de posse de entorpecente definido no art 290 do Código Penal Militar Jurisprudência predominante do Supremo Tribunal Federal reverencia a especialidade da legislação penal militar e da justiça castrense sem a submissão à legislação penal comum do crime militar devidamente caracterizado40 O conflito aparente de leis penais tem como requisito inafastável portanto a existência de duas leis penais concorrentes sobre o mesmo fato e uma delas está contida na outra parcialmente da qual é diferenciada por um ou mais elementos especializantes Uma vez configurada a especialidade a sua utilização é peremptória De fato se fosse aplicada sempre a lei genérica não haveria sentido na atuação do legislador ao contemplar mais especificamente um preceito penal perante outro qualquer Sua aferição se estabelece em abstrato ou seja para saber qual lei é geral e qual é especial prescindese da análise do fato praticado É suficiente a comparação em tese das condutas definidas nos tipos penais Destarte para determinar a configuração da especialidade deve o intérprete formular um juízo hipotético negativo no qual se suprime mentalmente a existência do delito específico Caso todo o fato sem exceções dos ali contemplados seja suscetível de ser qualificado perante o crime genérico há de afirmarse a sua presença41 Se não bastasse pouco importa a quantidade de sanção penal reservada para as infrações penais A comparação entre as leis não se faz da mais grave para a menos grave pois a lei específica pode narrar um ilícito penal mais rigoroso ou mais brando Em síntese o critério da especialidade reclama duas leis penais em concurso caracterizadas pela relação de gênero e espécie na qual esta prefere àquela excluindo a sua aplicação para fins de tipicidade A lei específica deve abrigar todos os elementos da genérica apresentando ainda outras particulares características que podem ser denominadas elementos especializantes constituindo uma subespécie agravada ou atenuada daquela 7872 Em virtude de tais elementos a lei especial abarca um âmbito de aplicação mais restrito captando um menor número de condutas típicas e ilícitas Pode então ser efetuada a comparação entre os tipos penais como dois círculos concêntricos de diferentes raios sendo maior o especial mais elementares e menor o geral menos elementares razão pela qual quando o tipo especial não restar caracterizado pela ausência dos elementos especializantes que formam a sua peculiar estrutura abstrata a conduta poderá ser subsumida no tipo genérico de natureza residual Princípio da subsidiariedade Estabelece que a lei primária tem prevalência sobre a lei subsidiária lex primaria derogat legi subsidiarie Esta é a que define como crime um fato incluído por aquela na previsão de delito mais grave como qualificadora agravante causa de aumento de pena ou inclusive modo de execução Portanto há subsidiariedade entre duas leis penais quando se trata de estágios ou graus diversos de ofensa a um mesmo bem jurídico de forma que a ofensa mais ampla e dotada de maior gravidade descrita pela lei primária engloba a menos ampla contida na subsidiária ficando a aplicabilidade desta condicionada à não incidência da outra42 O crime tipificado pela lei subsidiária além de menos grave do que o narrado pela lei primária dele também difere quanto à forma de execução já que corresponde a uma parte deste Em outras palavras a figura subsidiária está inserida na principal O roubo por exemplo contém em seu arquétipo os crimes de furto e de ameaça ou lesão corporal Não por outra razão a lei subsidiária exerce função complementar diante da principal De fato somente se aplica quando esta última lei principal não puder incidir no tocante ao fato punível Corolário disso ao contrário do que se opera na especialidade aqui o fato tem de ser apreciado em concreto para aferir qual a disposição legal em que se enquadra Para Oscar Stevenson A aplicabilidade da norma subsidiária e a inaplicabilidade da principal não resultam da relação lógica e abstrata de uma com a outra mas do juízo de valor do fato em face delas43 Além disso na subsidiariedade não existem elementos especializantes mas descrição típica de fato mais abrangente e mais grave Na hipótese de restar configurada a lei primária instituidora de fato apenado mais gravemente jamais terá incidência a lei subsidiária com conduta sancionada mais levemente Esta somente será utilizada na impossibilidade daquela atuando como verdadeiro soldado de reserva44 Em suma as diferenças entre os princípios da especialidade e da subsidiariedade são manifestas No princípio da especialidade a lei especial é aplicada mesmo se for mais branda do que a lei geral No caso do princípio da subsidiariedade ao contrário a lei subsidiária menos grave sempre será excluída pela lei principal mais grave Ainda no princípio da especialidade a aferição do caráter geral ou especial das leis se estabelece em abstrato ou seja prescinde da análise do caso concreto enquanto no princípio da subsidiariedade a comparação sempre deve ser efetuada no caso concreto buscando a aplicação da lei mais grave Finalmente no princípio da especialidade ocorre relação de gênero e espécie entre as leis em conflito ao passo que no da subsidiariedade a lei subsidiária não deriva da principal A subsidiariedade pode ser expressa ou tácita Verificase a subsidiariedade expressa ou explícita nas situações em que é declarada formalmente na lei mediante o emprego de locuções como se as circunstâncias evidenciam que o agente não quis o resultado nem assumiu o risco de produzilo CP art 129 3º se o fato não constitui crime mais grave CP art 132 se o fato não constitui elemento de outro crime CP 7873 art 249 entre outras análogas De outro lado dáse a subsidiariedade tácita ou implícita quando a lei residual não condiciona taxativamente a sua aplicação em caso de impossibilidade de incidência da primária Possível assim a sua presença sem o apelo expresso do legislador deduzindose da finalidade almejada e dos meios que se relacionam entre as diversas disposições ou seja concluise pela sua existência diante da circunstância de encontrarse o fato implicado na lei primária como elemento constitutivo qualificadora causa de aumento da pena agravante genérica ou meio de execução Exemplo Constrangimento ilegal CP art 146 subsidiário diante do estupro CP art 213 Princípio da consunção ou da absorção De acordo com o princípio da consunção ou da absorção o fato mais amplo e grave consome absorve os demais fatos menos amplos e graves os quais atuam como meio normal de preparação ou execução daquele ou ainda como seu mero exaurimento Por tal razão aplicase somente a lei que o tipifica lex consumens derogat legi consumptae A lei consuntiva prefere a lei consumida Como prefere Magalhães Noronha na consunção o crime consuntivo é como que o vértice da montanha que se alcança passando pela encosta do crime consumido Pressupõe entre as leis penais em conflito relação de magis para minus ou seja de continente para conteúdo de forma que a lei instituidora de fato de mais longo espectro consome as demais45 Como decorrência da sanção penal prevista para a violação do bem jurídico mais extenso tornase prescindível e inaceitável a pena atribuída à violação do bem jurídico mais restrito evitandose a configuração do bis in idem daí decorrendo a sua indiscutível finalidade prática Seus fundamentos são claros o bem jurídico resguardado pela lei penal menos vasta já está protegido pela lei penal mais ampla e a prática do ilícito por aquela definido é indispensável para a violação desta última Como ressalta Jiménez de Asúa46 A maior amplitude da lei ou da disposição legal pode derivar do bem jurídico tutelado que compreende também o tutelado por outra lei ou da natureza dos meios adotados ou dos efeitos produzidos ou bem de que aquela assuma como elemento constitutivo ou circunstância qualificadora de algum fato previsto por outra lei tradução livre Ao contrário do que se dá no princípio da especialidade aqui não se reclama a comparação abstrata entre as leis penais Comparamse os fatos inferindose que o mais grave consome os demais sobrando apenas a lei penal que o disciplina O cotejo se dá entre fatos concretos de modo que o mais completo o inteiro prevalece sobre a fração Não há um único fato buscando se abrigar em uma ou outra lei penal caracterizada por notas especializantes mas uma sucessão de fatos todos penalmente tipificados na qual o mais amplo consome o menos amplo evitandose seja este duplamente punido como parte de um todo e como crime autônomo Não por outro motivo o crime consumado absorve o crime tentado ocorrendo idêntico fenômeno entre os delitos de dano e os delitos de perigo A distinção com o princípio da subsidiariedade também é evidente Na regra da subsidiariedade em função do fato concreto praticado comparamse as leis para saber qual é a aplicável Por seu turno na consunção sem buscar auxílio nas leis comparamse os fatos apurandose que o mais amplo completo e grave consome os demais O fato principal absorve o acessório sobrando apenas a lei que o disciplina Em oposição ao que se visualiza nos princípios da especialidade e da subsidiariedade na consunção não há um fato único buscando amoldarse em uma ou outra lei mas uma sucessão de fatos em que o mais amplo e mais grave absorve os menos amplos e menos graves Afastase assim o bis in idem já que o fato menos amplo e menos grave seria duplamente punido como parte do todo e como crime autônomo A consunção pode ter sua origem tanto em virtude da expressa declaração da lei47 como também na sua zelosa interpretação utilizandose para tanto de elementos de ordem gramatical lógica histórica e sistemática na apreciação jurídica do caso concreto 78731 787311 Hipóteses em que se aplica o princípio da consunção O princípio da consunção se concretiza em quatro situações crime complexo crime progressivo progressão criminosa e atos impuníveis Crime complexo Também conhecido como crime composto é a modalidade que resulta da fusão de dois ou mais crimes que passam a desempenhar a função de elementares ou circunstâncias daquele tal como se dá no roubo originário da união entre os delitos de furto e ameaça ou lesão corporal dependendo do meio de execução empregado pelo agente Para Jorge de Figueiredo Dias48 Se na maior parte dos tipos de crime tipos simples está em causa a proteção de apenas um bem jurídico vg a vida no art 131º a honra no art 180º nos tipos complexos pretendese alcançar a protecção de vários bens jurídicos Por exemplo no roubo art 210º é tutelada não só a propriedade mas também a integridade física e a liberdade individual de decisão e acção O relevo normativoprático desta distinção reside em que ela pode mostrarse essencial para uma correcta interpretação e aplicação do tipo Indicado por relevante parcela doutrinária como hipótese da consunção49 parecenos não ser esta a melhor escolha Em apertada síntese alegam seus defensores que o crime complexo absorve os delitos autônomos que compõem a sua estrutura típica razão pela qual prevalece a lei responsável pela sua definição Na verdade o crime complexo constitui verdadeiro concurso de crimes ainda que pela escolha técnicolegislativa exista a opção de castigar a atuação do agente pela figura final que deverá prevalecer por estabelecer uma valoração conjunta dos fatos em concurso Destarte não se desnatura o concurso de crimes existente no complexo delitivo convertendoo em conflito aparente de leis penais É óbvio contudo que o conflito aparente se realizará entre a figura complexa de um lado e as figuras simples do outro Além disso é fundamental que no conflito aparente todas as leis penais 787312 787313 devem qualificar os mesmos fatos atentatórios do mesmo bem jurídico permitindose a aplicação da mais pertinente entre elas coisa que aqui não sucede Crime progressivo É o que se opera quando o agente almejando desde o início alcançar o resultado mais grave pratica mediante a reiteração de atos crescentes violações ao bem jurídico50 Pressupõe necessariamente a existência de um crime plurissubsistente isto é uma única conduta orientada por um só propósito mas fracionável em diversos atos O ato final gerador do evento originariamente desejado consome os anteriores que produziram violações mais brandas ao bem jurídico finalmente atacado denominados de crimes de ação de passagem51 Possui como requisitos portanto a unidade de elemento subjetivo e de conduta composta de vários atos e a progressividade no dano ao bem jurídico Desde o início de sua empreitada o crime mais grave é desejado pelo sujeito que vem a praticar uma única conduta decomposta em vários executórios lesando gradativamente o bem jurídico que se propôs a lesionar Imaginese a hipótese em que alguém desejando eliminar um desafeto começa a golpeálo em várias regiões do corpo iniciando o processo de matá lo vindo finalmente a atingilo na cabeça ceifando sua vida As diversas lesões corporais necessárias para a execução do homicídio ficam por este absorvidas Progressão criminosa Dáse quando o agente pretende inicialmente produzir um resultado e depois de alcançálo opta por prosseguir na prática ilícita e reinicia outra conduta produzindo um evento mais grave52 Exemplo O agente que após praticar vias de fato opta por produzir lesões corporais na vítima e ainda não satisfeito acaba por matála responde exclusivamente pelo homicídio O sujeito é guiado por uma pluralidade de desígnios havendo alteração em seu dolo razão pela qual executa uma diversidade de fatos mais de um 787314 crime cada um correspondente a uma vontade destacandose a crescente lesão ao bem jurídico Por tal motivo a resposta penal se dará somente para o fato final mais grave ficando absorvidos os demais Com a punição do crime final o Estado também sanciona os anteriores efetuados no mesmo contexto fático A penalização autônoma constituiria indisfarçável bis in idem tendo em vista que seriam castigados como parte do resultado final e também de maneira independente Fatos impuníveis São divididos em três grupos53 anteriores simultâneos e posteriores todos previstos como crimes ou contravenções penais por outras leis as quais o agente realiza em virtude da mesma e única finalidade qual seja praticar o fato principal ou então como consequência deste o seu exaurimento por força do id quod plerumque accidit isto é de acordo com o que normalmente acontece aquilatandose a sua conduta com as máximas da experiência cotidiana Atos anteriores prévios ou preliminares impuníveis são os que funcionam como meios de execução do tipo principal ficando por este absorvidos No caso do roubo da bolsa da vítima que se encontra no interior de um automóvel eventual destruição do vidro não acarreta na imputação ao agente do crime contido no art 163 caput do Código Penal54 Em conformidade com a definição do princípio da consunção o fato anterior componente dos atos preparatórios ou de execução apenas será absorvido quando apresentar menor ou igual gravidade quando comparado ao principal para que este goze de força suficiente para consumir os demais englobandoos em seu raio de atuação Nesse contexto é manifesto o equívoco técnico da Súmula 17 do Superior Tribunal de Justiça Quando o falso se exaure no estelionato sem mais potencialidade lesiva é por este absorvido O enunciado jurisprudencial destinase precipuamente às hipóteses em que o sujeito com o escopo de praticar estelionato falsifica materialmente uma cártula de cheque documento particular equiparado a documento público por expressa determinação legal nos termos do art 297 2º do Código Penal Ora tal crime é punido com reclusão de dois a seis anos e multa Sendo o fato mais amplo e grave não pode ser consumido pelo estelionato sancionado de forma mais branda Mas não para por aí Os delitos apontados atingem bens jurídicos diversos Enquanto o estelionato constitui crime contra o patrimônio o falso agride a fé pública Não há falar tecnicamente em conflito aparente de leis mas em autêntico concurso material de delitos55 Portanto se no rigor científico a súmula deve ser rejeitada resta acreditar que a sua criação e manutenção se devem exclusivamente a motivos de política criminal tornando a conduta cada vez mais próxima do âmbito civil à medida que a pena pode ser inclusive reduzida pelo arrependimento posterior benefício vedado ao crime de falso É importante ressaltar que o ante factum impunível e o crime progressivo não se confundem No último há incursão obrigatória pela infração penal menos grave não se podendo exemplificativamente matar sem antes ferir O primeiro todavia pode ser cometido sem violação da lei penal menos grave Na hipótese aventada não se discute que a bolsa da vítima pode ser roubada sem a destruição do vidro do veículo Já os atos concomitantes ou simultâneos não puníveis são aqueles praticados no instante em que se executa o fato principal É o caso dos ferimentos leves suportados pela mulher violentada sexualmente os quais restam consumidos pelo crime de estupro Finalmente os fatos posteriores não puníveis são visualizados quando depois de realizada a conduta o sujeito pratica nova ofensa contra o mesmo bem jurídico buscando alguma vantagem com o crime anterior56 O exaurimento deve ser aferido em consonância com a lógica do razoável pois não há dúvida de que exemplificativamente o larápio usualmente vende os bens subtraídos visando lucro financeiro Se o furto ou roubo se deu por força de ânimo de lucro não seria correto punilo mais uma vez por ter lucrado57 Cuidase de previsível exaurimento ficando consumidos os atos posteriores 7873141 Fatos anteriores e posteriores impuníveis e o crime conexo A palavra conexão é utilizada para dirigirse ao elo objetivo ou subjetivo entre duas ou mais infrações penais Definese então o crime conexo como aquele ligado a outro delito A conexão pode ser teleológica quando o crime é praticado para assegurar a execução de outro ou consequencial se visar garantir a ocultação impunidade ou vantagem de delito anterior Funciona como qualificadora no homicídio e agravante genérica nos demais casos como se infere dos arts 121 2º V e 61 II alínea b respectivamente ambos do Código Penal Entre os crimes há autêntico concurso material Assim quem mata o segurança de um empresário e priva este último da liberdade para obter vantagem como condição ou preço do resgate responde por homicídio e extorsão mediante sequestro somandose as penas Se o último delito todavia não se produz nem na forma tentada por ele não responde o agente mas o crime contra a vida subsiste na forma qualificada Levase em conta o tempo do crime considerandose a teoria da atividade encampada pelo art 4º do Código Penal Há assim certa semelhança entre o crime conexo e os fatos anteriores e posteriores não puníveis os primeiros relacionados com a conexão teleológica e os últimos com a consequencial Mas a diferença é nítida Na conexão a prática do crimemeio e do crimefim não é o que normalmente acontece na vida cotidiana ao passo que no ante factum e no post factum impuníveis o crime principal e os demais são consequências naturais no sentido de que o desrespeito de uma lei tem por resultado normal a posterior violação da outra Nesses termos o agente que mata alguém e depois destrói o cadáver deve suportar a responsabilização do crime de homicídio em concurso com o de destruição de cadáver tipificado no art 211 do Código Penal Cuidase de conexão consequencial e não de post factum impunível haja vista não ser a violação do mencionado tipo penal consequência normal da prática do crime 7874 contra a vida Por seu turno o sujeito que falsifica documento público e depois dele faz uso somente responde pelo crime de falso material pois o delito tipificado no art 304 do Código Penal é corolário lógico do previsto no art 297 do citado diploma legal Não se deve portanto equiparar as situações A forma de interpretação é bastante diversa justificando a distinção no tocante ao tratamento penal dispensado Princípio da alternatividade Seu conceito em consonância com as posições fornecidas pela doutrina deve levar em conta dois pontos de partida distintos Inicialmente a alternatividade é definida como a situação em que duas ou mais disposições legais se repetem diante do mesmo fato Para Luis Jiménez de Asúa Há alternatividade quando os dois artigos ou leis se comportam como dois círculos secantes O que interessa é definir qual deles deve ser eleito para a subsunção Os autores se pronunciam pelo preceito que contém penas mais severas fórmula que aceitamos porque mede a maior importância do bem jurídico protegido mas se forem iguais as sanções impostas apenas por via interpretativa segundo disse Fontecilla pode descobrirse o maior valor do bem jurídico tutelado58 tradução livre Oscar Stevenson compartilha desse entendimento Pelo princípio da alternatividade a aplicação de uma norma a um fato exclui a aplicabilidade de outra que também o prevê como delito59 Exemplo Se no caso concreto restar reconhecido que a conjunção carnal se enquadra na figura da violação sexual mediante fraude CP art 215 descabe atribuir ao agente o crime de estupro CP art 213 De outro campo notamse também autores que entendem configurada a alternatividade na hipótese em que o tipo penal contém em seu corpo vários fatos alternativamente como modalidades de uma mesma infração penal Assim praticados pelo mesmo sujeito um ou mais núcleos sucessivamente restará configurado crime único60 São os chamados tipos mistos alternativos de ação múltipla ou de conteúdo variado identificados assim quanto à conduta ex Lei 113432006 art 33 caput ao modo de execução ex CP art 121 2º inc IV ao resultado naturalístico ex CP art 129 2º inc III ao objeto material ex CP art 234 aos meios de execução ex CP art 121 2º inc III às circunstâncias de tempo ex CP art 123 às circunstâncias de lugar ex CP art 233 ou ainda perante outras situações apontadas pelo legislador O princípio da alternatividade não é aceito por relevante parcela da doutrina como útil para a solução do conflito aparente de leis penais61 Isto porque teria a sua função esvaziada pelo princípio da consunção Deveras a variante inicial denominada alternatividade imprópria a qual se verifica quando o legislador disciplina o mesmo fato mediante o emprego de duas ou mais leis penais deve ser rechaçada de plano Com efeito nada mais é do que hipótese de inadmissível equívoco legislativo solucionável pela abrogação tácita pois uma lei posterior estaria versando integralmente acerca de matéria tratada por lei anterior de igual natureza e hierarquia Por seu turno a outra variante conhecida como alternatividade própria existente entre dois ou mais tipos penais protetores de único bem jurídico contra diversas ofensas não tem espaço por questão de lógica é dizer a ausência de um dos requisitos basilares do instituto Inexiste propriamente conflito entre leis penais mas sim conflito interno na própria lei penal Ademais o critério da consunção resolve com vantagens os problemas acaso surgidos nos tipos mistos alternativos Vejase a hipótese em que o indivíduo exemplificativamente importa transporta guarda expõe à venda e finalmente vende a mesma droga Estará configurado um único crime tipificado pelo art 33 caput da Lei 113432006 não por aplicação do princípio da alternatividade mas da consunção 788 Contudo se o mesmo sujeito importa cocaína transporta ópio e vende heroína responderá por três crimes distintos em concurso material na forma prevista no art 69 do Código Penal somandose as penas Destarte entendemos ser a alternatividade a consunção que se instrumentaliza no interior de um mesmo tipo penal entre condutas integrantes de leis de conteúdo variado Em síntese nada mais é do que a consunção que resolve o conflito entre condutas previstas na mesma lei penal Por tal razão o princípio da alternatividade não é tolerado pela doutrina dominante como válido para solução do conflito aparente de leis penais Ausência de previsão legal O conflito aparente de leis penais não tem previsão legal O Código Penal não disciplinou expressamente o assunto Em que pesem alguns entendimentos em contrário nem mesmo o princípio da especialidade foi tratado pelo Código Penal De fato o art 12 cuida na verdade do princípio da convivência das esferas autônomas relacionase à solução do conflito entre as regras previstas na Parte Geral do Código Penal e a legislação penal extravagante o que não se confunde com o instituto em apreço Exemplificativamente o art 12 do Código Penal soluciona conflitos entre as regras inerentes à prescrição diferenciando a sua aplicação entre os crimes previstos no Código Penal e outros delitos consagrados pela legislação especial que possuam um sistema prescricional diferenciado Não se presta todavia para cuidar da especialidade entre crimes de homicídio e de infanticídio por exemplo ou entre outros delitos delineados pelo Código Penal Repitase o art 12 do Código Penal fala em regras gerais deste Código motivo pelo qual não é apto a tratar da especialidade entre os diversos crimes os quais se encontram tipificados na Parte Especial Seria oportuno contudo fosse o tema disciplinado expressamente pelo Código Penal com o propósito de apresentar regras sistemáticas e a b principalmente possibilitar segurança jurídica em um assunto tão tormentoso nos âmbitos doutrinário e jurisprudencial Mas infelizmente o legislador ainda não conferiu ao instituto a merecida atenção É necessária a identificação do momento em que se considera praticado o crime para que se opere a aplicação da lei penal ao seu responsável Três teorias buscam explicar o momento em que o crime é cometido Pela teoria da atividade considerase praticado o crime no momento da conduta ação ou omissão pouco importando o momento do resultado A teoria do resultado ou do evento reputa praticado o crime no momento em que ocorre a consumação É irrelevante a ocasião da conduta Por fim a teoria mista ou da ubiquidade busca conciliar as anteriores Para ela momento do crime tanto é o da conduta como também o do resultado O art 4º do Código Penal acolheu a teoria da atividade Considerase praticado o crime no momento da ação ou da omissão ainda que outro seja o momento do resultado62 Dessa forma a identificação do tempo do crime leva em conta a prática da conduta Exemplo A com a idade de 17 anos 11 meses e 20 dias efetua disparos de arma de fogo contra B nele provocando diversos ferimentos A vítima vem a ser socorrida e internada em hospital falecendo 15 dias depois Não se aplicará ao autor o Código Penal em face de sua inimputabilidade ao tempo do crime mas sim as disposições do Estatuto da Criança e do Adolescente Lei 80691990 A adoção da teoria da atividade apresenta relevantes consequências tais como aplicase a lei em vigor ao tempo da conduta exceto se a do tempo do resultado for mais benéfica a imputabilidade é apurada ao tempo da conduta c d e 7101 no crime permanente em que a conduta tenha se iniciado durante a vigência de uma lei e prossiga durante o império de outra aplicase a lei nova ainda que mais severa Fundamentase o raciocínio na reiteração de ofensa ao bem jurídico já que a conduta criminosa continua a ser praticada depois da entrada em vigor da lei nova mais gravosa63 no crime continuado em que os fatos anteriores eram punidos por uma lei operandose o aumento da pena por lei nova aplicase esta última a toda a unidade delitiva desde que sob a sua vigência continue a ser praticada O crime continuado em que pese ser constituído de vários delitos parcelares é considerado crime único para fins de aplicação da pena teoria da ficção jurídica No tocante a estes dois casos dispõe a Súmula 711 do Supremo Tribunal Federal A lei penal mais grave aplicase ao crime continuado ou ao crime permanente se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da permanência no crime habitual em que haja sucessão de leis deve ser aplicada a nova ainda que mais severa se o agente insistir em reiterar a conduta criminosa Cuidado Em matéria de prescrição o art 111 I do Código Penal preferiu a teoria do resultado uma vez que a causa extintiva da punibilidade tem por termo inicial a data da consumação da infração penal Introdução 7102 71021 O Código Penal brasileiro limita o campo de validade da lei penal com observância de dois vetores fundamentais a territorialidade art 5º e a extraterritorialidade art 7º Com base neles se estabelecem princípios que buscam solucionar os conflitos de leis penais no espaço A territorialidade é a regra64 Excepcionalmente admitemse outros princípios para o caso de extraterritorialidade que são os da personalidade do domicílio da defesa da justiça universal e da representação A matéria se relaciona ao Direito Penal Internacional ramo do Direito Internacional Público que estabelece as regras de determinação da lei penal aplicável na hipótese de a conduta criminosa violar o sistema jurídico de mais de um país Princípio da territorialidade Cuidase da principal forma de delimitação do espaço geopolítico de validade da lei penal nas relações entre Estados soberanos A soberania do Estado nota característica do princípio da igualdade soberana de todos os membros da comunidade internacional art 2º 1º da Carta da ONU fundamenta o exercício de todas as competências sobre crimes praticados em seu território Nesse sentido dispõe o art 5º do Código Penal Aplicase a lei brasileira sem prejuízo de convenções tratados e regras de direito internacional ao crime cometido no território nacional Essa é a regra geral Aplicase a lei brasileira aos crimes cometidos no território nacional Há exceções que ocorrem quando brasileiro pratica crime no exterior ou um estrangeiro comete delito no Brasil Falase assim que o Código Penal adotou o princípio da territorialidade temperada ou mitigada Conceito de território Em termos jurídicos território é o espaço em que o Estado exerce sua soberania política O território brasileiro compreende a b c d e f g o espaço territorial delimitado pelas fronteiras sem solução de continuidade inclusive rios lagos mares interiores e ilhas bem como o respectivo subsolo o mar territorial ou marginal que corre ao longo da costa como parte integrante do território brasileiro e que tem uma faixa de doze milhas marítimas de largura medidas a partir da baixamar do litoral continental e insular brasileiro na forma definida pela Lei 86171993 A soberania brasileira alcança também o leito e o subsolo do mar territorial O conceito de território não obsta contudo o direito de passagem inocente isto é a prerrogativa de navios mercantes ou militares de qualquer Estado de transitarem livremente pelo mar territorial embora sujeitos ao poder de polícia do Brasil65 a plataforma continental medindo 200 milhas marítimas a partir do litoral brasileiro ou 188 milhas deduzidas as 12 milhas do mar territorial como zona econômica exclusiva instituída pela Lei 86171993 que incorporou a Convenção da ONU de 1982 sobre o direito do mar o espaço aéreo compreendido como a dimensão estatal da altitude Em relação ao domínio aéreo adotouse a teoria da absoluta soberania do país subjacente pela qual o Brasil exerce completa e exclusiva soberania sobre o espaço aéreo acima de seu território e mar territorial art 11 da Lei 75651986 os navios e aeronaves de natureza particular em altomar ou no espaço aéreo correspondente ao altomar os navios e aeronaves de natureza pública onde quer que se encontrem os rios e lagos internacionais que são aqueles que atravessam mais de um Estado Se forem sucessivos ou seja passarem por dois ou mais países mas sem separálos considerase o trecho que atravessa o Brasil Caso sejam simultâneos ou fronteiriços isto é separarem os territórios de dois ou mais países a delimitação da 71022 7103 71031 parte pertencente ao Brasil é fixada por tratados ou convenções internacionais entre os Estados interessados Território brasileiro por extensão Na forma definida pelo art 5º 1º do CP consideramse como extensão do território nacional as embarcações e aeronaves brasileiras de natureza pública ou a serviço do governo brasileiro onde quer que se encontrem bem como as aeronaves e embarcações brasileiras mercantes ou de propriedade privada que se achem respectivamente no espaço aéreo correspondente ou em altomar Outros princípios Estudamos há pouco que o Código Penal adotou como regra geral o princípio da territorialidade Há entretanto exceções motivo pelo qual se fala em territorialidade temperada ou mitigada66 Vejamos quais são elas Princípio da personalidade ou da nacionalidade Esse princípio autoriza a submissão à lei brasileira dos crimes praticados no estrangeiro por autor brasileiro ativa ou contra vítima brasileira passiva De acordo com a personalidade ativa o agente é punido de acordo com a lei brasileira independentemente da nacionalidade do sujeito passivo e do bem jurídico ofendido É previsto no art 7º I alínea d quando o agente for brasileiro e também pelo inciso II alínea b do Código Penal Seu fundamento constitucional é a relativa proibição de extradição de brasileiros art 5º LI da Constituição Federal evitando a impunidade de nacionais que após praticarem crimes no exterior fogem para o Brasil A propósito confirase o seguinte julgado do Supremo Tribunal Federal envolvendo o assunto Se a extradição não puder ser concedida por inadmissível em face de a pessoa reclamada ostentar a condição de brasileira nata legitimarseá a possibilidade de o Estado brasileiro mediante aplicação extraterritorial de sua própria lei penal CP art 7º II b e respectivo 2º fazer 71032 71033 a b c 71034 instaurar perante órgão judiciário nacional competente CPP art 88 a concernente persecutio criminis em ordem a impedir por razões de caráter éticojurídico que práticas delituosas supostamente cometidas no exterior por brasileiros natos ou naturalizados fiquem impunes67 Por sua vez aplicase o princípio da personalidade passiva nos casos em que a vítima é brasileira O autor do delito que se encontrar em território brasileiro embora seja estrangeiro deverá ser julgado de acordo com a nossa lei penal É adotado pelo art 7º 3º do Código Penal Princípio do domicílio De acordo com esse princípio o autor do crime deve ser julgado em consonância com a lei do país em que for domiciliado pouco importando sua nacionalidade Previsto no art 7º I alínea d domiciliado no Brasil do Código Penal no tocante ao crime de genocídio no qual o agente não é brasileiro mas apenas domiciliado no Brasil Princípio da defesa real ou da proteção Permite submeter à lei penal brasileira os crimes praticados no estrangeiro que ofendam bens jurídicos pertencentes ao Brasil qualquer que seja a nacionalidade do agente e o local do delito Adotado pelo Código Penal em seu art 7º I alíneas a b e c compreendendo os crimes contra a vida ou a liberdade do Presidente da República o patrimônio ou a fé pública da União do Distrito Federal de Estado de Território de Município de empresa pública sociedade de economia mista autarquia ou fundação instituída pelo Poder Público e a administração pública por quem está a seu serviço Princípio da justiça universal Conhecido também como princípio da justiça cosmopolita da 71035 competência universal da jurisdição universal da jurisdição mundial da repressão mundial ou da universalidade do direito de punir é característico da cooperação penal internacional porque todos os Estados da comunidade internacional podem punir os autores de determinados crimes que se encontrem em seu território de acordo com as convenções ou tratados internacionais pouco importando a nacionalidade do agente o local do crime ou o bem jurídico atingido Fundamentase no dever de solidariedade na repressão de certos delitos cuja punição interessa a todos os povos Exemplos tráfico de drogas comércio de seres humanos genocídio etc É adotado no art 7º II a do Código Penal os crimes que por tratado ou convenção o Brasil se obrigou a reprimir Princípio da representação Também denominado princípio do pavilhão da bandeira subsidiário ou da substituição Segundo esse princípio deve ser aplicada a lei penal brasileira aos crimes cometidos em aeronaves ou embarcações brasileiras mercantes ou de propriedade privada quando estiverem em território estrangeiro e aí não sejam julgados É adotado pelo art 7º II c do Código Penal E se a aeronave ou embarcação brasileira for pública ou estiver a serviço do governo brasileiro Essa questão simples mas capciosa já foi formulada em diversos concursos federais Não incide no caso o princípio da representação mas sim o da territorialidade Lembrese aeronaves e embarcações brasileiras públicas ou a serviço do governo brasileiro constituem extensão do território nacional art 5º 1º do Código Penal A aplicação do princípio da territorialidade da lei penal no espaço depende da identificação do lugar do crime Nesse diapasão várias teorias buscam estabelecer o lugar do crime Destacamse três 1ª Teoria da atividade ou da ação Lugar do crime é aquele em que foi praticada a conduta ação ou omissão 2ª Teoria do resultado ou do evento Lugar do crime é aquele em que se produziu ou deveria produzirse o resultado pouco importando o local da prática da conduta e 3ª Teoria mista ou da ubiquidade Lugar do crime é tanto aquele em que foi praticada a conduta ação ou omissão quanto aquele em que se produziu ou deveria produzirse o resultado Foi adotada pelo Código Penal em seu art 6º Considerase praticado o crime no lugar em que ocorreu a ação ou omissão no todo ou em parte bem como onde se produziu ou deveria produzirse o resultado68 A discussão acerca do local do crime tem pertinência somente em relação aos crimes a distância também conhecidos como crimes de espaço máximo isto é aqueles em que a conduta é praticada em um país e o resultado vem a ser produzido em outro Não se trata assim de comarcas distintas Exigese a pluralidade de países69 Como exemplo imagine que o agente efetue disparos de arma de fogo contra a vítima em solo brasileiro com a intenção de matála mas esta consegue fugir e morre depois de atravessar a fronteira com o Paraguai A adoção da teoria da ubiquidade permite a conclusão de que o lugar do crime tanto pode ser o Brasil como o Paraguai Não poderia ser diferente em obediência às soberanias dos países envolvidos Para a incidência da lei brasileira é suficiente que um único ato executório atinja o território nacional ou então que o resultado ocorra no Brasil A teoria não se importa contudo com os atos preparatórios nem com os atos realizados pelo agente após a consumação Em relação à tentativa o lugar do crime abrange aquele em que se desenvolveram os atos executórios bem como aquele em que deveria 7111 a b produzirse o resultado No tocante ao coautor e ao partícipe operandose o concurso de pessoas no território brasileiro aplicase a lei penal nacional ainda que o crime tenha sido integralmente executado no exterior Não aplicação da teoria da ubiquidade em outras hipóteses A teoria da ubiquidade não se aplica nos seguintes casos Crimes conexos São aqueles que de algum modo estão relacionados entre si Não se aplica a teoria da ubiquidade eis que os diversos crimes não constituem unidade jurídica Deve cada um deles portanto ser processado e julgado no país em que foi cometido Crimes plurilocais São aqueles em que a conduta e o resultado ocorrem em comarcas diversas mas no mesmo país Exemplo A em determinada cidade e com a intenção de produzir lesões corporais de natureza grave efetua disparos de arma de fogo contra B o qual se encontra do lado oposto de uma ponte que faz a divisa com outra cidade Aplicase a regra delineada pelo art 70 caput do Código de Processo Penal ou seja a competência será determinada pelo lugar em que se consumar a infração ou no caso de tentativa pelo local em que for praticado o último ato de execução Na hipótese de crimes dolosos contra a vida aplicase a teoria da atividade segundo pacífica jurisprudência em razão da conveniência para a instrução criminal em juízo possibilitando a descoberta da verdade real De fato é mais fácil e seguro produzir provas no local em que o crime se realizou Além disso não é possível obrigar as testemunhas do fato a comparecerem ao plenário do Júri em outra comarca Se não bastasse um dos pilares que fundamenta o Tribunal do Júri é permitir a pacificação da sociedade perturbada pelo crime mediante o julgamento pelos seus membros Nesse sentido A competência para julgar 7121 7122 os crimes dolosos contra a vida e os que lhe são conexos é em princípio do Conselho de Sentença da comarca em que os fatos criminosos ocorreram salvo excepcional motivação70 c Infrações penais de menor potencial ofensivo O art 63 da Lei 90991995 adotou a teoria da atividade A competência do Juizado será determinada pelo lugar em que foi praticada a infração penal d Crimes falimentares Será competente o foro do local em que foi decretada a falência concedida a recuperação judicial ou homologado o plano de recuperação extrajudicial art 183 da Lei 111012005 e Atos infracionais Para os crimes ou contravenções penais praticados por crianças e adolescentes será competente a autoridade do lugar da ação ou da omissão Lei 80691990 ECA art 147 1º Introdução Extraterritorialidade é a aplicação da legislação penal brasileira aos crimes cometidos no exterior Justificase pelo fato de o Brasil ter adotado relativamente à lei penal no espaço o princípio da territorialidade temperada ou mitigada CP art 5º o que autoriza excepcionalmente a incidência da lei penal brasileira a crimes praticados fora do território nacional A extraterritorialidade pode ser incondicionada ou condicionada Não se admite a aplicação da lei penal brasileira às contravenções penais praticadas no estrangeiro de acordo com a regra estabelecida pelo art 2º do Decretolei 36881941 Lei das Contravenções Penais Extraterritorialidade incondicionada Não está sujeita a nenhuma condição A mera prática do crime em território estrangeiro autoriza a incidência da lei penal brasileira independentemente de qualquer outro requisito 71221 71222 As hipóteses de extraterritorialidade incondicionada encontram previsão no art 7º I do Código Penal e no tocante a esses crimes o agente é punido segundo a lei brasileira ainda que absolvido ou condenado no estrangeiro art 7º 1º A lei brasileira é extraterritorial em relação aos crimes Extraterritorialidade incondicionada e o art 8º do Código Penal Proibição do bis in idem Em face da detração penal determinada pelo art 8º do Código Penal no caso de extraterritorialidade incondicionada a pena cumprida no estrangeiro atenua a pena imposta no Brasil pelo mesmo crime quando diversas ou nela é computada quando idênticas Se o agente praticou um crime contra a vida do Presidente da República do Brasil em solo argentino e lá foi condenado à pena de dez anos de reclusão dos quais já cumpriu oito anos e posteriormente fugiu para o Brasil vindo aqui a ser condenado a doze anos de reclusão não precisará cumprir toda a pena imposta em nosso país Faltará o cumprimento de outros quatro anos em consonância com a regra prevista no art 8º do Código Penal Extraterritorialidade incondicionada e a Lei de Tortura Sem prejuízo dos casos previstos no Código Penal o art 2º da Lei 94551997 estatuiu mais uma situação de extraterritorialidade incondicionada nos seguintes termos O disposto nesta Lei aplicase ainda quando o crime não tenha sido cometido em território nacional sendo a vítima brasileira ou encontrandose o agente em local sob jurisdição brasileira 7123 Extraterritorialidade condicionada Relacionase aos crimes indicados pelo art 7º II e 3º do Código Penal A aplicação da lei penal brasileira aos crimes cometidos no exterior se sujeita às condições descritas pelo art 7º 2º alíneas a b c d e e e 3º do Código Penal Tratandose de extraterritorialidade condicionada a lei penal brasileira é subsidiária em relação aos crimes praticados fora do território nacional elencados pelo art 7º II e 3º do Código Penal No que diz respeito aos crimes previstos no art 7º II e 3º do Código Penal a aplicação da lei brasileira depende das seguintes condições cumulativas De outro lado no caso de crime cometido por estrangeiro contra brasileiro fora do Brasil exigemse outras duas condições além das anteriormente indicadas quais sejam a b 7131 7132 não ter sido pedida ou ter sido negada a extradição e ter havido requisição do Ministro da Justiça Introdução O princípio da territorialidade adotado pelo Brasil não é absoluto A territorialidade é temperada ou mitigada O art 5º caput do Código Penal é claro ao determinar que aplicase a lei brasileira sem prejuízo de convenções tratados e regras de direito internacional ao crime cometido no território nacional A parte final sem prejuízo de convenções tratados e regras de direito internacional autoriza a criação das imunidades diplomáticas e de chefes de governos estrangeiros Por sua vez as regras constitucionais instituem as imunidades parlamentares Imunidades diplomáticas e de chefes de governos estrangeiros O deferimento de tratamento especial a representantes diplomáticos e a chefes de governos estrangeiros no tocante a atos ilícitos por eles praticados é medida aceita desde longa data pelo direito internacional em respeito ao Estado representado e também pela necessidade de garantir meios suficientes para o perfeito desempenho de seus misteres por tais pessoas As imunidades se fundam no princípio da reciprocidade ou seja o Brasil concede imunidade aos agentes dos países que também conferem iguais privilégios aos nossos representantes Não há violação ao princípio da isonomia eis que a imunidade não é pessoal mas funcional Levase em conta a relevância da função pública exercida pelo representante estrangeiro teoria do interesse da função A Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas incorporada ao direito pátrio pelo Decreto 564351965 assegura ao diplomata imunidade de jurisdição penal sujeitandoo à jurisdição do Estado que representa71 Abrange toda e qualquer espécie de delito A imunidade de jurisdição em sentido amplo subdividese em imunidade de jurisdição cognitiva isto é imunidade ao processo de conhecimento e imunidade à jurisdição executiva referente ao cumprimento da pena72 A garantia se estende aos agentes diplomáticos e funcionários das organizações internacionais quando em serviço incluindo seus familiares A essas pessoas é assegurada inviolabilidade pessoal já que não podem ser presas nem submetidas a qualquer procedimento sem autorização de seu país Por óbvio aos chefes de governos estrangeiros e aos ministros das Relações Exteriores asseguramse idênticas imunidades concedidas aos agentes diplomáticos A imunidade é irrenunciável por parte do seu destinatário Nada impede por outro lado a renúncia por meio do Estado acreditante com fundamento no art 32 da Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas 1961 e art 45 da Convenção de Viena sobre Relações Consulares 196373 Nesse contexto já decidiu o Supremo Tribunal Federal de acordo com a Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas do qual o Brasil é signatário os agentes diplomáticos estrangeiros estão imunes à jurisdição penal do Estado perante o qual estão acreditados Assim o chefe da missão diplomática e os membros do pessoal diplomático gozam nos termos dos arts 29 a 42 da Convenção de Viena de 1961 dos direitos da inviolabilidade pessoal e de sua residência da totalidade das imunidades de jurisdição penal etc Tais privilégios e imunidades podem ser renunciados pelo Estado acreditante a quem tais direitos pertencem mediante declarações especiais e em cada caso particular ajuizado perante autoridades judiciais do Estado acreditado ie o Brasil74 As imunidades não se aplicam aos empregados particulares dos diplomatas ainda que oriundos do Estado representado 7133 71331 71332 Os cônsules por seu turno são funcionários públicos de carreira ou honorários e indicados para a realização de determinadas funções em outros países com imunidades e privilégios inferiores aos dos diplomatas A imunidade penal é limitada aos atos de ofício podendo ser processados e condenados por outros crimes75 De acordo com a Convenção de Viena as sedes diplomáticas não admitem busca e apreensão requisição embargo ou qualquer tipo de medida de execução de natureza penal Malgrado opiniões em contrário cada vez em maior declínio podese afirmar que as sedes das embaixadas não são extensões de territórios estrangeiros no Brasil De fato localizamse em território nacional e se alguém que não goza da imunidade praticar algum crime em seu âmbito inevitavelmente será processado nos termos da legislação penal brasileira Imunidades parlamentares Alocação Essa disciplina encontra seu nascedouro na Constituição Federal razão pela qual seu estudo é aprofundado nas obras de Direito Constitucional Contudo sua sistemática produz inúmeros reflexos na aplicação da lei penal justificando a cobrança frequente do tema em concursos públicos nas provas de Direito Penal motivo que nos autoriza a abordálo no presente trabalho Introdução O Poder Legislativo constituído no âmbito da União pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal tem suas funções típicas tratadas nos arts 44 e seguintes da Constituição Federal consistindo precipuamente na atividade legislativa e na função fiscalizadora do Poder Executivo No exercício desses misteres os representantes do povo e dos Estados necessitam de uma série de regras específicas que estabeleçam os seus direitos deveres e notadamente prerrogativas Consagrouse denominar de estatuto dos congressistas o conjunto de 71333 a b 71334 normas constitucionais que estatui o regime jurídico dos membros do Congresso Nacional prevendo suas prerrogativas e direitos seus deveres e incompatibilidades76 Entre as prerrogativas previstas na Constituição de 1988 estão a inviolabilidade e a imunidade de natureza penal e também o privilégio de foro e a isenção do serviço militar previstas nas constituições anteriores bem como a limitação ao dever de testemunhar todas de caráter processual Abordaremos somente as imunidades parlamentares por produzirem relevantes consequências na aplicação da lei penal Conceito e finalidade As imunidades parlamentares são prerrogativas ou garantias inerentes ao exercício do mandato parlamentar preservandose a instituição de ingerências externas A Constituição Federal prevê duas espécies de imunidades imunidade absoluta material real substantiva ou inviolabilidade art 53 caput e imunidade processual formal adjetiva ou imunidade propriamente dita art 53 1º a 5º A imunidade formal por sua vez pode referirse à prisão do parlamentar ou ao ajuizamento da ação penal Imunidade material ou inviolabilidade De acordo com o art 53 caput da Constituição Federal com a redação determinada pela Emenda Constitucional 352001 os Deputados e Senadores são invioláveis civil e penalmente por quaisquer de suas opiniões palavras e votos A imunidade material protege o parlamentar em suas opiniões palavras e votos desde que relacionadas às suas funções não abrangendo manifestações desarrazoadas e desprovidas de conexão com os seus deveres constitucionais77 Funciona portanto como um complemento constitucional à liberdade de expressão reservada a todas as pessoas Não se faz necessário contudo que o parlamentar se manifeste no recinto do Congresso Nacional para a incidência da inviolabilidade Nesse sentido já decidiu o Supremo Tribunal Federal A imunidade parlamentar é uma proteção adicional ao direito fundamental de todas as pessoas à liberdade de expressão previsto no art 5º IV e IX da Constituição Assim mesmo quando desbordem e se enquadrem em tipos penais as palavras dos congressistas desde que guardem alguma pertinência com suas funções parlamentares estarão cobertas pela imunidade material do art 53 caput da Constituição Art 53 Os Deputados e Senadores são invioláveis civil e penalmente por quaisquer de suas opiniões palavras e votos Com base nessa orientação a Primeira Turma em julgamento conjunto e por maioria rejeitou a queixacrime oferecida em face de senador a quem fora imputado a prática dos delitos de calúnia injúria e difamação Na espécie parlamentar teria postado na rede social Facebook que ex Presidente da República teria cometido crimes e ainda teria impetrado habeas corpus preventivo relativo a atos de corrupção ocorrido no âmbito da Petrobrás De início a Turma assentou o caráter reprovável e lamentável com o qual as críticas à suposta conduta de um exPresidente da República teriam sido feitas Na sequência ressaltou que a imunidade material conferida aos parlamentares não seria uma prerrogativa absoluta Restringirseia a opiniões e palavras externadas dentro ou fora do recinto do Congresso Nacional mas no exercício do mandato ou em razão dele Prevaleceria portanto a compreensão de que a imunidade parlamentar não se estenderia para opiniões ou palavras que pudessem malferir a honra de alguém quando essa manifestação estivesse dissociada do exercício do mandato Para o Colegiado a Constituição teria garantido uma tolerância com o uso que normalmente fosse considerado abusivo do direito de expressar livremente suas opiniões quando proveniente de parlamentar no exercício de seus respectivos mandatos Essa condescendência se justificaria para assegurar um bem maior a própria democracia Entre um parlamentar acuado pelo eventual receio de um processo criminal e um parlamentar livre para 713341 expor as suspeitas que pairassem sobre outros homens públicos mesmo que de forma que pudesse ser considerada abusiva e portanto criminosa o caminho trilhado pela Constituição seria o de conferir liberdade ao congressista Assim a regra da imunidade deveria prevalecer nas situações limítrofes em que não fosse delineada a conexão entre a atividade parlamentar e as ofensas irrogadas a pretexto de exercêla mas que igualmente não se pudesse de plano dizer que exorbitassem do exercício do mandato78 O Supremo Tribunal Federal reforçando esse entendimento assim se pronunciou no polêmico caso em que um Deputado Federal afirmou que sua colega de parlamento não merecia ser estuprada A Turma assinalou que a garantia constitucional da imunidade material protege o parlamentar qualquer que seja o âmbito espacial em que exerça a liberdade de opinião sempre que suas manifestações guardem conexão com o desempenho da função legislativa ou tenham sido proferidas em razão dela Para que as afirmações feitas pelo parlamentar possam ser relacionadas ao exercício do mandato devem revelar teor minimamente político referido a fatos que estejam sob debate público sob investigação em CPI ou em órgãos de persecução penal ou ainda sobre qualquer tema que seja de interesse de setores da sociedade do eleitorado de organizações ou quaisquer grupos representados no parlamento ou com pretensão à representação democrática Consequentemente não há como relacionar ao desempenho da função legislativa ou de atos praticados em razão do exercício de mandato parlamentar as palavras e opiniões meramente pessoais sem relação com o debate democrático de fatos ou ideias e portanto sem vínculo com o exercício das funções cometidas a um parlamentar Na hipótese tratase de declarações que não guardam relação com o exercício do mandato79 Natureza jurídica da imunidade material Há grande controvérsia doutrinária e jurisprudencial acerca da natureza jurídica da inviolabilidade Destacamse os seguintes entendimentos a b c d e f 71335 713351 causa de atipicidade Celso Ribeiro Bastos80 causa excludente de crime Nélson Hungria José Afonso da Silva81 e Pontes de Miranda causa que se opõe à formação do crime Basileu Garcia causa pessoal e funcional de isenção de pena Aníbal Bruno causa de irresponsabilidade Heleno Cláudio Fragoso e causa de incapacidade penal por razões políticas José Frederico Marques O Supremo Tribunal Federal tem considerado a manifestação parlamentar nas hipóteses abrangidas pela inviolabilidade como fato atípico As declarações proferidas pelo querelado na qualidade de Presidente da Comissão de Direitos Humanos do Senado Federal alusivas a denúncias de tortura sob investigação do Ministério Público são palavras absolutamente ligadas ao exercício do mandato donde estarem cobertas pela imunidade parlamentar material Não é cabível indagar sobre nenhuma qualificação penal do fato objetivo se ele está compreendido na área da inviolabilidade parlamentar Inq 2282DF rel Min Sepúlveda Pertence j 30062006 Informativo 43382 Qualquer que seja o posicionamento adotado a inviolabilidade acarretará sempre a irresponsabilidade do agente por suas opiniões palavras e votos se presentes os demais elementos do instituto Imunidade formal A imunidade formal processual adjetiva ou imunidade propriamente dita envolve a disciplina da prisão e do processo contra Deputados Federais e Senadores e tem previsão no art 53 1º a 5º da Constituição Federal O instituto foi bastante alterado com o advento da Emenda Constitucional 352001 que buscou evitar o desvirtuamento da prerrogativa tal qual estabelecida pela sua redação originária Imunidade formal para a prisão Dispõe o art 53 2º da Constituição Federal com a redação dada pela Emenda Constitucional 352001 Desde a expedição do diploma os membros do Congresso Nacional não poderão ser presos salvo em flagrante de crime inafiançável Nesse caso os autos serão remetidos dentro de vinte e quatro horas à Casa respectiva para que pelo voto da maioria de seus membros resolva sobre a prisão Assim extraise a regra geral de que os parlamentares não poderão ser presos A regra abrange tanto a prisão provisória de cunho penal em qualquer de suas modalidades e também a prisão civil uma vez que o texto constitucional não faz qualquer distinção Essa imunidade foi denominada de relativa incoercibilidade pessoal dos congressistas freedom from arrest pelo Supremo Tribunal Federal Inquérito 510DF j 01022001 Tribunal Pleno e evidentemente não engloba a prisão definitiva ou seja decorrente de decisão judicial condenatória com trânsito em julgado Em princípio a única exceção admitida pela Constituição Federal é a hipótese de prisão em flagrante pela prática de crime inafiançável Mas a Corte Suprema no famoso caso Delcídio do Amaral decretou a prisão preventiva de Senador da República no exercício do mandato Vale a pena acompanhar um trecho do julgado a decisão ora referendada teria como um de seus principais fundamentos a garantia da instrução criminal das investigações aliado à higidez de eventuais ações penais vindouras tendo em vista a concreta ocorrência e a possibilidade de interferência no depoimento de testemunhas e na produção de provas circunstâncias que autorizariam a decretação da custódia cautelar nos termos da jurisprudência da Corte Assim a necessidade de resguardar a ordem pública seja pelos constantes atos praticados pelo grupo cooptação de colaborador tentativa de obtenção de decisões judiciais favoráveis obtenção de documentos judiciais sigilosos pela fundada suspeita de reiteração delitiva pela atualidade dos delitos reuniões ocorridas no corrente mês ou ainda pela gravidade em concreto dos crimes que atentariam diretamente contra os poderes constitucionalmente estabelecidos da República não haveria outra medida cautelar suficiente para inibir a continuidade das práticas criminosas que não a prisão preventiva83 Na hipótese de prisão em flagrante de Deputado Federal ou Senador por crime inafiançável os autos deverão ser remetidos à Casa Parlamentar respectiva no prazo de vinte e quatro horas para que pelo voto da maioria absoluta de seus membros resolva sobre a prisão CF art 53 2º A votação será aberta Nos casos em que for verificada a impossibilidade de apreciação da custódia cautelar pela Casa respectiva a prisão será mantida independentemente desta manifestação Vejase a seguinte situação de excepcional gravidade já apreciada pelo Supremo Tribunal Federal Os elementos contidos nos autos impõem interpretação que considere mais que a regra proibitiva da prisão de parlamentar isoladamente como previsto no art 53 2º da Constituição da República Há de se buscar interpretação que conduza à aplicação efetiva e eficaz do sistema constitucional como um todo A norma constitucional que cuida da imunidade parlamentar e da proibição de prisão do membro de órgão legislativo não pode ser tomada em sua literalidade menos ainda como regra isolada do sistema constitucional Os princípios determinam a interpretação e aplicação corretas da norma sempre se considerando os fins a que ela se destina A Assembleia Legislativa do Estado de Rondônia composta de vinte e quatro deputados dos quais vinte e três estão indiciados em diversos inquéritos afirma situação excepcional e por isso não se há de aplicar a regra constitucional do art 53 2º da Constituição da República de forma isolada e insujeita aos princípios fundamentais do sistema jurídico vigente84 Apesar de a decisão referirse à esfera estadual o entendimento é válido para os deputados federais e senadores uma vez que a imunidade em ambos os casos possui idêntica disciplina Por outro lado José Afonso da Silva afirma que convém ponderar sobre a questão da afiançabilidade do crime diante do disposto no art 5º LXVI da Constituição Federal pois se o crime for daqueles que admitem liberdade 713352 provisória o tratamento a ser dado ao congressista teria de ser idêntico aos dos crimes afiançáveis ou seja vedada a prisão85 A imunidade persiste desde a diplomação até o encerramento definitivo do mandato independentemente do motivo incluindo a não reeleição Imunidade formal para o processo A disciplina da imunidade formal para o processo foi substancialmente alterada pela Emenda Constitucional 352001 que retirou a necessidade de prévia licença da Casa para a instauração da ação penal contra o parlamentar De acordo com a nova regra prevista no art 53 3º do Código Político Recebida a denúncia contra o Senador ou Deputado por crime ocorrido após a diplomação o Supremo Tribunal Federal dará ciência à Casa respectiva que por iniciativa de partido político nela representado e pelo voto da maioria de seus membros poderá até a decisão final sustar o andamento da ação Destarte uma vez oferecida a denúncia contra o parlamentar por crime ocorrido após a diplomação o Ministro do Supremo Tribunal Federal poderá recebêla independentemente de prévia licença Nesse caso o Tribunal dará ciência à Casa respectiva que por iniciativa de partido político nela representado e pelo voto da maioria absoluta de seus membros poderá até a decisão final sustar o andamento da ação penal O pedido de sustação será apreciado pela Casa respectiva no prazo improrrogável de 45 dias do seu recebimento pela Mesa diretora e a sustação do processo suspende a prescrição enquanto durar o mandato CF art 53 3º a 5º O pedido de sustação poderá ser feito contudo até a decisão final da ação penal movida contra o parlamentar86 E atenção pela nova regra não haverá necessidade de o Supremo Tribunal Federal dar ciência à respectiva Casa em caso de ação penal por crime praticado antes da diplomação87 Nessas hipóteses não é possível pelo mesmo motivo a suspensão da ação penal por iniciativa do partido político Nos crimes praticados após a diplomação se houver sustação da ação penal e o crime tiver sido praticado em concurso com agente não 71336 71337 congressista o processo deve ser desmembrado em razão do regime de prescrição diferenciado que só alcança o parlamentar88 Pessoas abrangidas pela imunidade As imunidades acima abordadas abrangem os Deputados Federais e Senadores Não são extensíveis aos suplentes embora a Constituição de 1934 tenha incluído o primeiro suplente na garantia89 De acordo com o art 27 1º da Constituição Federal aos deputados estaduais serão aplicadas as mesmas regras sobre sistema eleitoral inviolabilidade imunidades remuneração perda de mandato licença impedimentos e incorporação às forças armadas aplicáveis aos deputados federais e senadores Ademais é assegurada a imunidade material dos deputados estaduais que são invioláveis civil e penalmente por quaisquer de suas opiniões palavras e votos No tocante ao Poder Legislativo Municipal dispõe o art 29 VIII da Constituição Federal que os municípios serão regidos por lei orgânica que deverá obedecer entre outras regras a da inviolabilidade dos vereadores por suas opiniões palavras e votos no exercício do mandato e na circunscrição do Município Destarte a Constituição Federal não consagra a imunidade formal ou processual para vereadores ou de foro por prerrogativa de função não podendo a legislação local prever tais garantias90 Suspensão e renúncia da imunidade Os parlamentares afastados para o exercício de cargo de Ministro da República Secretário de Estado ou de Município não mantêm as imunidades Como esclarece Michel Temer citado por Luiz Alberto David Araújo e Vidal Serrano Nunes Júnior Temse discutido se continua inviolável o parlamentar que se licencia para exercer cargo executivo Secretário de Estado Ministro de Estado Se continua ou não exercendo mandato O Supremo Tribunal Federal 71338 decidiu que o licenciado não está no exercício do mandato e por isso dispensase a licença aqui referida Parecenos que o art 56 da CF responde a essa indagação ao prescrever que não perderá o mandato o deputado ou senador investido na função de Ministro de Estado Governador do Distrito Federal Governador de Território Secretário de Estado etc Não perderá o mandato Significa quando cessarem suas funções executivas o parlamentar que não perdeu o mandato pode voltar a exercêlo O que demonstra que quando afastado não se encontra no exercício do mandato Harmonizase com a prescrição da impossibilidade de exercício simultâneo em poderes diversos91 De outro lado por ser inerente ao cargo parlamentar e não ao congressista propriamente não é possível a renúncia a tais prerrogativas92 Imunidades e estado de sítio As imunidades de Deputados e Senadores subsistirão durante o estado de sítio somente podendo ser suspensas pelo voto de dois terços dos membros da Casa respectiva nos casos de atos praticados fora do recinto do Congresso Nacional que sejam incompatíveis com a execução da medida CF art 53 8º Vale dizer se os atos forem praticados no recinto do Congresso Nacional a imunidade é absoluta não comportando a suspensão pela Casa respectiva É uma garantia importante porque se harmoniza com o disposto no art 139 parágrafo único da Lei Suprema e porque afasta qualquer pretensão de aplicar a parlamentares as restrições previstas nos incisos desse artigo93 Quadro geral das imunidades 7141 7142 Introdução Os arts 9º 10 e 11 do Código Penal apresentam as disposições finais do Título I do Código Penal relativas à eficácia da sentença estrangeira à contagem do prazo de natureza penal às frações não computáveis da pena e à aplicação da legislação penal especial Eficácia da sentença estrangeira A sentença judicial emanada de Poder Constituído do Estado é ato representativo de sua soberania Para uma real valoração da sua autoridade contudo deve ser executada E essa execução deveria ser feita sempre no país em que foi proferida Todavia para enfrentar com maior eficiência no âmbito de seus limites a prática de infrações penais o Estado se vale excepcionalmente de atos de soberania de outras nações aos quais atribui efeitos certos e determinados Para atingir essa finalidade homologa a sentença penal estrangeira mediante o procedimento constitucionalmente previsto a fim de constituíla em título executivo com validade em território nacional94 Na tradição brasileira sempre se entendeu que a homologação da sentença estrangeira dependia de prova do trânsito em julgado95 Atualmente entretanto o art 963 inc III do Código de Processo Civil reclama somente a eficácia da sentença no país em que foi proferida não exigindo seu trânsito em julgado96 Nos termos do art 9º do Código Penal Art 9º A sentença estrangeira quando a aplicação da lei brasileira produz na espécie as mesmas consequências pode ser homologada no Brasil para I obrigar o condenado à reparação do dano a restituições e a outros efeitos civis II sujeitálo a medida de segurança Parágrafo único A homologação depende a para os efeitos previstos no inciso I de pedido da parte interessada b para os outros efeitos da existência de tratado de extradição com o país de cuja autoridade judiciária emanou a sentença ou na falta de tratado de requisição do Ministro da Justiça Vejase que a análise conjunta desse dispositivo com o art 63 do Código Penal revela que não há necessidade de homologação da sentença estrangeira condenatória para caracterização da reincidência no Brasil Basta sua existência 7143 A teor do art 105 I alínea i da Constituição Federal compete ao Superior Tribunal de Justiça a homologação de sentenças estrangeiras e a concessão de exequatur às cartas rogatórias Convém ainda apontar que a sentença estrangeira homologada pelo Superior Tribunal de Justiça constituise em título executivo judicial na forma definida pelo art 515 VIII do Código de Processo Civil Contagem de prazo Dispõe o art 10 do Código Penal O dia do começo incluise no cômputo do prazo Contamse os dias os meses e os anos pelo calendário comum O dispositivo legal apresenta duas partes 1ª parte O dia do começo incluise no cômputo do prazo Prazo é o intervalo de tempo dentro do qual se estabelece a prática de determinado ato Deve ser calculado entre dois termos o inicial a quo e o final ad quem No Direito Penal incluise no cômputo do prazo o dia do começo Assim o dia em que tiver início a prática de determinado ato deve ser descontado do período total Exemplo Um sujeito reincidente é condenado à pena de um mês de reclusão em regime fechado O mandado de prisão é cumprido no dia 10 de outubro às 23 horas Sua pena estará extinta no dia 9 de novembro Qualquer que seja a fração do dia do começo deve ser computada integralmente como um dia inteiro Isso porque como diz o Código Penal o dia do começo incluise no cômputo do prazo Para facilitar os cálculos em provas é importante observar a seguinte regra deve ser considerada na operação sempre a diminuição de um dia em razão de ser computado o dia do começo Dessa forma se a pena é de um ano e teve início em 10 de outubro de determinado ano estará integralmente cumprida no dia 9 de outubro do ano seguinte Os prazos de natureza penal são improrrogáveis mesmo que terminem em sábados domingos ou feriados Assim se o prazo decadencial para o oferecimento de queixacrime encerrar em um domingo o titular do direito de queixa ou de representação deverá exercêlo até a sextafeira anterior O fato de serem improrrogáveis não impede contudo a suspensão ou a interrupção dos prazos penais Exemplos marcantes são as causas suspensivas e interruptivas da prescrição No Direito Processual Penal por outro lado a contagem dos prazos obedece fórmula diversa Estabelece o art 798 1º do Código de Processo Penal que não se computará no prazo o dia do começo incluindose porém o do vencimento Percebese assim ser o prazo processual penal mais amplo do que o penal Exemplo o prazo para interposição de apelação no processo penal comum é de cinco dias Se o condenado for intimado na sextafeira de carnaval o prazo terá início somente na quartafeira de cinzas uma vez que não se inclui o dia do começo fluindo a partir do primeiro dia útil posterior à intimação para o exercício do ato processual Incide a Súmula 310 do Supremo Tribunal Federal Quando a intimação tiver lugar na sextafeira ou a publicação com efeito de intimação for feita nesse dia o prazo judicial terá início na segundafeira imediata salvo se não houver expediente caso em que começará no primeiro dia útil que se seguir O fundamento da distinção é manifesto beneficiar o réu e possibilitar a ele o efetivo exercício da ampla defesa No Direito Processual Penal o prazo favorecerá o réu quando maior for a sua duração ou tiver mais retardado o seu início Ao contrário no Direito Penal o prazo se relaciona diretamente com o poder punitivo do Estado razão pela qual quanto mais curto mais favorável será ao réu Vale lembrar que o prazo sempre terá natureza penal quando guardar pertinência com o ius puniendi ainda que esteja previsto no Código de Processo Penal Portanto embora tenha a norma caráter híbrido ou misto prevalecerá a sua face penal É o caso da decadência prevista no art 38 do Código de Processo Penal Como a sua ocorrência importa na extinção da punibilidade retirando do Estado o direito de punir obedece às regras do Código Penal 7144 2ª parte Contamse os dias os meses e os anos pelo calendário comum Calendário comum também denominado gregoriano é aquele em que se entende por dia o hiato temporal entre a meianoite e a meianoite Os meses são calculados em consonância com o número correspondente a cada um deles e não como o período de 30 dias Exemplo Se o réu foi condenado à pena de um mês com início no dia 10 de fevereiro o seu cumprimento integral ocorrerá no dia 9 de março seguinte Pouco importa o número de dias do mês de fevereiro Tenha o mês 28 29 30 ou 31 dias será sempre considerado como um mês O mês é calculado até a véspera do mesmo dia do mês subsequente encerrando o prazo às 24 horas Por seu turno o ano é contado até o mesmo mês do ano seguinte terminando o prazo às 24 horas da véspera do dia idêntico ao do início Na prática o critério acolhido pelo Código Penal provoca injustiças tratando diversamente pessoas que se encontram em igual situação jurídica Exemplo A e B são condenados a um mês de reclusão A é capturado no dia 10 de dezembro e sua pena se encerra em 9 de janeiro B foge sendo capturado somente em 20 de fevereiro do ano seguinte Sua pena estará cumprida em 19 de março É evidente que nessa situação B teve privada sua liberdade por período inferior ao de A O inconveniente contudo é preferível à confusão e até mesmo à impossibilidade física que a adoção de um critério diverso provocaria Basta imaginar uma pena de 30 anos de reclusão na qual precisasse ser contado cada dia isoladamente levando em consideração as peculiaridades de todos os meses e anos Frações não computáveis da pena 7145 Preceitua o art 11 do Código Penal Desprezamse nas penas privativas de liberdade e nas restritivas de direitos as frações de dia e na pena de multa as frações de cruzeiro Para fins didáticos o dispositivo deve ser analisado em partes distintas pois contém duas regras 1ª Desprezamse nas penas privativas de liberdade e nas restritivas de direitos as frações de dia Frações de dia são as horas as quais devem ser descontadas da pena final Exemplo Pena de 10 dias 13 13 dias As horas restantes são desprezadas A expressão e nas restritivas de direitos é desnecessária Com efeito as penas restritivas de direitos possuem a nota da substitutividade isto é primeiro o juiz fixa a privativa de liberdade e depois se presentes os requisitos legais procede à substituição pela restritiva de direitos Destarte as frações de dia são desprezadas no momento de aplicação da pena privativa de liberdade 2ª Desprezamse na pena de multa as frações de cruzeiro A palavra cruzeiro deve ser atualmente substituída por real e sua fração é composta pelos centavos os quais são desprezados na liquidação da sanção patrimonial Exemplo Não há pena de multa com o valor de R 9056 noventa reais e cinquenta e seis centavos mas sim de R 9000 noventa reais E como anota Damásio E de Jesus Na fixação da pena pecuniária deve ser desprezada a fração do diamulta Assim uma pena de dez diasmulta acrescida de um terço perfaz treze diasmulta e não 1333 diasmulta97 Legislação especial É a redação do art 12 do Código Penal As regras gerais deste Código aplicamse aos fatos incriminados por lei especial se esta não dispuser de modo diverso Regras gerais são as normas não incriminadoras previstas no Código Penal Estão previstas na Parte Geral mas também há hipóteses que se encontram na Parte Especial É o caso do conceito de funcionário público art 327 Acolheuse o princípio da convivência das esferas autônomas segundo o qual as regras gerais do Código Penal convivem em sintonia com as previstas na legislação especial Todavia caso a lei especial contenha algum preceito geral também disciplinado pelo Código Penal prevalece a orientação da legislação especial em face do seu específico campo de atuação Exemplo A Lei 96051998 não prevê regras especiais para a prescrição no tocante aos crimes ambientais nela previstos Aplicamse consequentemente as disposições do Código Penal Por outro lado o Código Penal Militar tem regras especiais para a prescrição nos crimes que tipifica É aplicado e não incide o Código Penal 1 2 3 4 5 6 7 8 9 Utilizase a expressão lei penal em preto para se referir à lei penal completa ou seja aquela que não depende de nenhum tipo de complementação RHC 21624 rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 07022008 MAXIMILIANO Carlos Hermenêutica e aplicação do direito 19 ed Rio de Janeiro Forense 2004 p 7 LARENZ Karl Metodologia da ciência do direito 3 ed Lisboa Fundação Calouste Gulbenkian 1997 p 445 Art 927 Os juízes e os tribunais observarão I as decisões do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade II os enunciados de súmula vinculante III os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos IV os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional V a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados RHC 852173SP rel Min Eros Grau 1ª Turma j 02082005 Paga e promessa de recompensa caracterizam a cupidez O crime que tem essa motivação é chamado de mercenário ou por mandato remunerado Inq 1145PB rel Min Maurício Corrêa Tribunal Pleno j 19122006 É também o entendimento do Superior Tribunal de Justiça Não cabe ao Julgador aplicar uma norma por assemelhação em substituição a outra validamente existente simplesmente por entender que o legislador deveria ter regulado a situação de forma diversa da que adotou não se pode por analogia criar sanção que o sistema legal não haja determinado sob pena de violação do princípio da reserva legal REsp 956876RS rel Min Napoleão Nunes Maia Filho 5ª Turma j 23082007 Em igual sentido REsp 1244377PR rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 03042014 e REsp 1201880RS rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 07052013 Na verdade a abolitio criminis funciona como causa de exclusão da tipicidade pois o crime deixa de existir O legislador contudo preferiu alocála entre as causas extintivas da punibilidade 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 HC 101035RJ rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 26102010 noticiado no Informativo 606 HC 213305DF rel Min Marilza Maynard Desembargadora Convocada do TJSE 6ª Turma j 24042014 noticiado no Informativo 543 STF HC 120077RS rel Min Rosa Weber 1ª Turma j 13052014 TAIPA DE CARVALHO Américo A Sucessão de leis penais 3 ed Coimbra Coimbra Editora 2008 p 246 STJ AgRg no REsp 199687MS rel Min Jorge Mussi 5ª Turma j 04022014 Transitada em julgado a sentença condenatória compete ao Juízo das execuções a aplicação de lei mais benigna Na seara da lei penal no tempo retroatividade e ultratividade são espécies do gênero extratividade consistente em sua aptidão de mesmo depois de revogada ser aplicável aos fatos praticados quando estava em vigor ultratividade ou então de voltar no tempo para alcançar fatos cometidos antes da sua entrada em vigor retroatividade HUNGRIA Nélson Comentários ao Código Penal Rio de Janeiro Forense 1949 v 1 p 110 MARQUES José Frederico Tratado de direito penal Campinas Bookseller 1997 v 2 p 256257 Compartilham desse entendimento entre outros Basileu Garcia E Magalhães Noronha e Damásio E de Jesus HC 68416DF rel Min Paulo Brossard 2ª Turma j 08091992 E também HC 86459RJ rel Min Joaquim Barbosa 2ª Turma j 05122006 HC 95435RS rel orig Min Ellen Gracie rel p o acórdão Min Cezar Peluso 2ª Turma j 21102008 noticiado no Informativo 525 Na mesma direção HC 101511MG rel Min Eros Grau 2ª Turma j 09022010 noticiado no Informativo 574 TAIPA DE CARVALHO Américo A Sucessão de leis penais 3 ed Coimbra Coimbra Editora 2008 p 248 RE 600817MS rel Min Ricardo Lewandowski Plenário j 07112013 noticiado no Informativo 727 Em igual sentido HC 104193RS rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 09082011 noticiado no Informativo 635 e HC 97221SP rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 19102010 23 24 25 26 27 28 29 30 31 noticiado no Informativo 605 É também o entendimento de MIRABETE Julio Fabbrini Manual de direito penal Parte geral 24 ed São Paulo Atlas 2007 v 1 p 50 STF RE 418876MT rel Min Sepúlveda Pertence 1ª Turma j 30032004 Lei excepcional ou temporária não tem retroatividade Tem ultratividade em face da regra do art 3º do Código Penal STF RE 768494GO rel Min Luiz Fux Plenário j 19092013 O texto do art 3º do Código Penal de 1940 anteriormente à Reforma da Parte Geral pela Lei 72091984 era idêntico ao atual A lei excepcional ou temporária embora decorrido o período de sua duração ou cessadas as circunstâncias que a determinaram aplicase ao fato praticado durante sua vigência E como a Exposição de Motivos funciona como interpretação doutrinária do Código Penal os fundamentos então indicados permanecem válidos e adequados para a compreensão do assunto HC 731686SP rel Min Moreira Alves 1ª Turma j 21111995 É também a orientação do STJ RHC 16172SP rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 23082005 e REsp 474989RS rel Min Gilson Dipp 5ª Turma j 10062003 STEVENSON Oscar Concurso aparente de normas penais Estudos de direito e processo penal em homenagem a Nélson Hungria Rio de Janeiro Forense 1962 p 28 Salientese que o conflito aparente de normas ocorre quando há a incidência de mais de uma norma repressiva numa única conduta delituosa sendo que tais normas possuem entre si relação de hierarquia ou dependência de forma que somente uma é aplicável STJ REsp 1639723PR rel Min Nefi Cordeiro 6ª Turma j 07022017 noticiado no Informativo 597 É o caso de CARNELUTTI Francesco Leciones de derecho penal El delito Buenos Aires 1952 p 241 e de STRATENWERTH Günter Derecho penal Parte general El hecho punible Trad espanhola Gladys Romero Madrid Edersa 1976 p 343 Nesse sentido ANTOLISEI Francesco Manual de derecho penal Parte general Trad espanhola Juan Del Rosal e Ángel Tório Buenos Aires Uteha 1960 p 113 e MORILLAS CUEVA Luís Curso de derecho penal español Parte general Madrid Marcial Pons 1996 p 98 32 33 34 35 36 37 38 39 40 41 42 43 44 HUNGRIA Nélson Comentários ao Código Penal Rio de Janeiro Forense 1949 v 1 p 118 Compartilham desse entendimento BRUNO Aníbal Op cit p 260 e CORREIA Eduardo Henriques da Silva A teoria do concurso em direito criminal Coimbra Almedina 1996 p 34 BELING Ernst von Esquema de derecho penal La doctrina del delito tipo Trad Sebastian Soler Buenos Aires Depalma 1944 p 135 Comentários ao Código Penal p 118 BOBBIO Norberto Teoria do ordenamento jurídico Trad Maria Celeste Cordeiro Leite dos Santos 10 ed Brasília Editora Universidade de Brasília 1999 p 81 Para o autor para que possa ocorrer antinomia são necessárias duas condições que embora óbvias devem ser explicitadas 1 As duas normas devem pertencer ao mesmo ordenamento 2 As duas normas devem ter o mesmo âmbito de validade Distinguemse quatro âmbitos de validade de uma norma temporal espacial pessoal e material Expressão empregada por JESCHECK HansHeinrich Tratado de derecho penal Parte general 5 ed Trad espanhola Miguel Olmedo Cardenete Granada Comares 2002 p 790 Cf SOLER Sebastian Derecho penal argentino Buenos Aires La Ley 1945 t II p 190191 Art 290 Receber preparar produzir vender fornecer ainda que gratuitamente ter em depósito transportar trazer consigo ainda que para uso próprio guardar ministrar ou entregar de qualquer forma a consumo substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica em lugar sujeito à administração militar sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar Pena reclusão até cinco anos HC 92462RS rel Min Cármen Lúcia 1ª Turma j 23102007 Cf GARCÍA ALBERO Ramón Non bis in idem material y concurso de leyes penales Barcelona Marcial Pons 1995 p 321 JIMÉNEZ DE ASÚA Luis Tratado de derecho penal Filosofia y ley penal 5 ed Buenos Aires Losada 1992 t II p 550 Concurso aparente de normas penais p 39 Expressão de HUNGRIA Nélson Comentários ao Código Penal p 121 45 46 47 48 49 50 51 52 53 Crime tipificado no Código Penal não pode ser absorvido por infração descrita na Lei de Contravenções Penais STF HC 121652SC rel Min Dias Toffoli 2ª Turma j 22042014 noticiado no Informativo 743 JIMÉNEZ DE ASÚA Luis La ley y el delito Principios de derecho penal 13 ed Buenos Aires Sudamericana 1984 p 147 É o que ocorre no art 61 do Código Penal São circunstâncias que sempre agravam a pena quando não constituem ou qualificam o crime DIAS Jorge de Figueiredo Direito penal Parte geral Questões fundamentais A doutrina geral do crime Coimbra Coimbra Editora 2004 t I p 294 Os dispositivos citados pelo autor referemse ao Código Penal português Podem ser lembrados STEVENSON Oscar Concurso aparente de normas penais p 40 JIMÉNEZ DE ASÚA Luis Tratado de derecho penal p 561565 e CASTELLÓ NICÁS Nuria El concurso de normas penales Granada Comares 2000 p 168 Na definição de Nélson Hungria Ocorre quando da conduta inicial que realiza um tipo de crime o agente passa a ulterior atividade realizando outro tipo de crime de que aquele é elemento constitutivo reconhecida a unidade jurídica segundo a regra do ubi major minor cessat Comentários ao Código Penal p 232233 Expressão originária do Direito Penal italiano referida por SABINO JÚNIOR Vicente Direito penal São Paulo Sugestões Literárias 1967 v 1 p 188 A única diferença conceitual que se pode estabelecer entre ambos os institutos situase no aspecto mutativo existente na progressão criminosa no tocante ao elemento subjetivo e não presente no crime progressivo De fato no crime progressivo o agente desde o início desejava o resultado mais grave Na progressão criminosa o agente de início pretendia apenas o crime menos grave alterando porém a sua intenção no desenrolar dos fatos até decidir produzir o resultado mais grave No crime progressivo o dolo do agente é um só do começo ao fim na progressão criminosa o dolo passa por uma série de mutações Cf BARBOSA Marcelo Fortes Concurso de normas penais São Paulo RT 1976 p 100 Maggiore admite apenas a consunção do fato anterior referindose ao posterior como um indiferente para a lei penal ou então como concurso real de crimes Cf MAGGIORE Giuseppe Derecho penal Bogotá Temis 1971 v 1 p 186 54 55 56 57 58 59 60 61 62 É também o que se verifica no porte ilegal de arma de fogo voltado à prática de homicídio STJ HC 104455ES rel Min Og Fernandes 6ª Turma j 21102010 noticiado no Informativo 452 Em sintonia com a posição consagrada no Supremo Tribunal Federal É pacífica de resto a jurisprudência desta Corte no sentido de não ser admissível a absorção do crime de uso de documento falso pelo de estelionato HC 98526RS rel Min Ricardo Lewandowski 1ª Turma j 29062010 O crime de sonegação fiscal absorve o de falsidade ideológica e o de uso de documento falso praticados posteriormente àquele unicamente para assegurar a evasão fiscal STJ EREsp 1154361MG rel Min Laurita Vaz 3ª Seção j 26022014 noticiado no Informativo 535 Com igual orientação STJ HC 309939SP rel Min Newton Trisotto Desembargador convocado do TJSC 5ª Turma j 28042015 noticiado no Informativo 562 BETTIOL Giuseppe Direito penal Trad Paulo José da Costa Jr e Alberto Silva Franco São Paulo RT 1971 v 2 p 568 Existe fato posterior não punível quando um comportamento que realiza uma tipicidade prevista por determinada norma penal deve considerarse como implicitamente apreciado e valorado para todos seus fins pela norma que prevê pena para um comportamento precedente como na hipótese em que o segundo fato sem lesionar um novo bem jurídico consiste na realização do fim em virtude do qual em correspondência com a tipicidade legal devia estar dominada a primeira ação JIMÉNEZ DE ASÚA Luis Tratado de derecho penal p 541 STEVENSON Oscar Concurso aparente de normas penais p 43 É o caso de DOTTI René Ariel Curso de direito penal Parte geral 2 ed Rio de Janeiro Forense 2004 p 290 Podem ser citados entre aqueles que não o recepcionam MERKEL Adolf Derecho penal Parte general Trad espanhola Pedro Dorado Montero Buenos Aires Julio César Faria 2004 p 280 e ss JESCHECK HansHeinrich Tratado de derecho penal p 791 HUNGRIA Nélson Comentários ao Código Penal p 119 SIQUEIRA Galdino Tratado de direito penal Parte geral Rio de Janeiro José Konfino 1947 t I p 151 BRUNO Aníbal Direito penal p 161 Esta teoria interessa somente aos crimes materiais ou causais pois a consumação depende da produção do resultado naturalístico Nos crimes 63 64 65 66 67 68 formais de consumação antecipada ou de resultado cortado e também nos crimes de mera conduta ou de simples atividade a consumação se verifica no momento da prática da conduta STJ HC 202048RN rel originário Min Sebastião Reis rel para o acórdão Min Og Fernandes 6ª Turma j 15052012 noticiado no Informativo 497 STF Ext 1354DF rel orig Min Teori Zavascki red p o acórdão Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 30062015 noticiado no Informativo 792 É o que se extrai do art 3º da Lei 86171993 Art 3º É reconhecido aos navios de todas as nacionalidades o direito de passagem inocente no mar territorial brasileiro 1º A passagem será considerada inocente desde que não seja prejudicial à paz à boa ordem ou à segurança do Brasil devendo ser contínua e rápida 2º A passagem inocente poderá compreender o parar e o fundear mas apenas na medida em que tais procedimentos constituam incidentes comuns de navegação ou sejam impostos por motivos de força ou por dificuldade grave ou tenham por fim prestar auxílio a pessoas a navios ou aeronaves em perigo ou em dificuldade grave 3º Os navios estrangeiros no mar territorial brasileiro estarão sujeitos aos regulamentos estabelecidos pelo Governo brasileiro A extraterritorialidade da lei penal não constitui fenômeno estranho aos diversos sistemas jurídicos existentes nos Estados nacionais pois o direito comparado com apoio em princípios como o da nacionalidade ou da personalidade ativa eou passiva o da proteção o da universalidade e o da representação ou da bandeira reconhece legítima a possibilidade de incidência em territórios estrangeiros do ordenamento penal de outros Estados STF ExtEUA 1151 rel Min Celso de Mello Plenário j 17032011 HCQO 83113DF rel Min Celso de Mello Pleno j 26062003 No mesmo sentido STF HC 83113DF rel Min Celso de Mello decisão monocrática j 21052003 É comum a formulação de questões em provas objetivas e orais sobre as teorias adotadas pelo Código Penal em relação ao lugar e ao tempo do crime Não há dificuldade no assunto mas podem ocorrer os terríveis brancos na memória que tanto assustam e atrapalham os candidatos Lembrese então da palavra LUTA Veja Lugar Ubiquidade Tempo Atividade Se a aprovação no tão sonhado concurso é uma luta certamente há meios para facilitar nossa missão 69 70 71 72 73 74 75 76 77 78 79 80 81 82 Por sua vez crimes de espaço mínimo são aqueles em que conduta e resultado ocorrem na mesma comarca Exemplo A furta um determinado bem na cidade de Niterói local em que também se concretiza a consumação do delito STJ HC 73451PE rel Min Jane Silva Desembargadora convocada do TJMG 5ª Turma j 04102007 E também REsp 1195265MT rel Min Gilson Dipp 5ª Turma j 06092011 noticiado no Informativo 482 Como destaca o item 4 do art 31 a imunidade de jurisdição de um agente diplomático no Estado acreditado não o isenta da jurisdição do Estado acreditante STJ RHC 87825ES rel Min Nefi Cordeiro 6ª Turma j 05122017 noticiado no Informativo 618 STJ HC 149481DF rel Min Haroldo Rodrigues Desembargador convocado do TJCE 6ª Turma j 19102010 noticiado no Informativo 452 Pet 3698PR rel Min Cármen Lúcia decisão monocrática j 05102006 MELLO Celso D Albuquerque Curso de direito internacional público Rio de Janeiro Forense 2001 p 13371340 SILVA José Afonso da Curso de direito constitucional positivo 26 ed São Paulo Malheiros 2006 p 534 STF AP 926AC rel Min Rosa Weber 1ª Turma j 06092016 noticiado no Informativo 838 Inq 4088DF rel Min Edson Fachin 1ª Turma j 01122015 noticiado no Informativo 810 Em igual sentido AI 473092AC rel Min Celso de Mello Plenário j 07032005 e Inq 2297DF rel Min Carmen Lúcia Plenário j 20092007 Inq 3932DF e Pet 5243DF rel Min Luiz Fux 1ª Turma j 21062016 noticiados no Informativo 831 BASTOS Celso Ribeiro Dicionário de direito constitucional São Paulo Saraiva 1994 p 82 SILVA José Afonso da Curso de direito constitucional positivo São Paulo Malheiros 2006 p 534535 Inq 2297DF rel Min Cármen Lúcia j 20092007 considerando os deputados federais e senadores isentos de enquadramento penal por suas 83 84 85 86 87 88 89 90 91 92 opiniões palavras e votos Em igual sentido Inq 2674DF rel Min Carlos Britto Plenário j 26112009 AC 4036 ReferendoMCDF rel Min Teori Zavascki 2ª Turma j 25112015 noticiado no Informativo 509 A natureza desta decisão causou celeuma doutrinária pois o STF criou uma figura híbrida ao decretar a prisão preventiva fazendo referência à situação de flagrância do crime permanente tipificado no art 2º da Lei 128502013 Crime Organizado HC 89417RO rel Min Cármen Lúcia 1ª Turma j 22082006 SILVA José Afonso da Curso de direito constitucional positivo São Paulo Malheiros 2006 p 535 SILVA José Afonso da Curso de direito constitucional positivo São Paulo Malheiros 2006 p 533 STF AI 769798RO rel Min Cármen Lúcia 1ª Turma j 01022011 Cf STF Inq 961SP rel Min Celso de Mello j 16081995 Nesse sentido STF Inq AgRg 2453MS rel Min Ricardo Lewandowski j 17052007 Não se cuida de prerrogativa intuitu personae vinculandose ao cargo ainda que ocupado interinamente razão pela qual se admite a sua perda ante o retorno do titular ao exercício daquele A diplomação do suplente não lhe estende automaticamente o regime políticojurídico dos congressistas por constituir mera formalidade anterior e essencial a possibilitar à posse interina ou definitiva no cargo na hipótese de licença do titular ou vacância permanente Agravo desprovido STF ADIn 371SE rel Min Maurício Côrrea j 05092002 No mesmo sentido HC 74201MG rel Min Celso de Mello j 12111996 ARAÚJO Luiz Alberto David NUNES JÚNIOR Vidal Serrano Curso de direito constitucional São Paulo Saraiva 1999 p 269 O instituto da imunidade parlamentar atua no contexto normativo delineado por nossa Constituição como condição e garantia de independência do Poder Legislativo seu real destinatário em face dos outros poderes do Estado Estendese ao congressista embora não constitua uma prerrogativa de ordem subjetiva deste Tratase de prerrogativa de caráter institucional inerente ao Poder Legislativo que só é conferida ao parlamentar ratione muneris em função do cargo e do mandato que exerce É por essa razão que não se reconhece ao 93 94 95 96 97 congressista em tema de imunidade parlamentar a faculdade de a ela renunciar Tratase de garantia institucional deferida ao Congresso Nacional O congressista isoladamente considerado não tem sobre ela qualquer poder de disposição O exercício do mandato parlamentar recebeu expressiva tutela jurídica da ordem normativa STF Inq 510DF rel Min Celso de Mello Pleno j 01021991 SILVA José Afonso da Curso de direito constitucional positivo p 536 STF Ext 1223DF rel Min Celso de Mello 2ª Turma j 22112011 O Supremo Tribunal Federal chegou inclusive a editar a Súmula 420 Não se homologa sentença proferida no estrangeiro sem prova do trânsito em julgado STJ SEC 14812EX Rel Min Nancy Andrighi Corte Especial j 16052018 noticiado no Informativo 626 JESUS Damásio E de Direito penal Parte geral 28 ed 2 tir São Paulo Saraiva 2006 p 145 PARTE II TEORIA GERAL DO CRIME 81 CONCEITO DE CRIME O conceito de crime é o ponto de partida para a compreensão dos principais institutos do Direito Penal Embora aparentemente simples a sua definição completa e pormenorizada apresenta questões complexas que acarretam várias consequências ao estudo dos pontos mais exigidos em provas e concursos públicos Qualquer operador do Direito iniciante ou avançado ainda que não muito versado na área penal se considera apto a fornecer o conceito de crime Diz se frequentemente Crime é o fato típico ilícito sem maior preocupação científica Assim não deve ser Quando lhe for indagado o conceito de crime uma resposta mais técnica e minuciosa deve ser apresentada De fato o crime pode ser conceituado levando em conta três aspectos material legal e formal ou analítico De acordo com esse critério crime é toda ação ou omissão humana que lesa ou expõe a perigo de lesão bens jurídicos penalmente tutelados Essa fórmula leva em conta a relevância do mal produzido aos interesses e valores selecionados pelo legislador como merecedores da tutela penal Destinase a orientar a formulação de políticas criminais funcionando como vetor ao legislador incumbindolhe a tipificação como infrações penais exclusivamente das condutas que causarem danos ou ao menos colocarem em perigo bens jurídicos penalmente relevantes assim reconhecidos pelo ordenamento jurídico Com efeito esse conceito de crime serve como fator de legitimação do Direito Penal em um Estado Democrático de Direito O mero atendimento do princípio da reserva legal se mostra insuficiente Não basta uma lei para qualquer conduta ser considerada penalmente ilícita Imagine um tipo penal com o seguinte conteúdo Sorrir por mais de 10 minutos ininterruptamente Pena reclusão de 2 a 8 anos e multa Nesta situação o princípio da reserva legal ou estrita legalidade seria obedecido Contudo somente se legitima o crime quando a conduta proibida apresentar relevância jurídicopenal mediante a provocação de dano ou ao menos exposição à situação de perigo em relação a bens jurídicos penalmente relevantes Segundo esse critério o conceito de crime é o fornecido pelo legislador Em que pese o Código Penal não conter nenhum dispositivo estabelecendo o que se entende por crime tal tarefa ficou a cargo do art 1º da Lei de Introdução ao Código Penal Decretolei 3914 de 9 de dezembro de 1941 assim redigido Considerase crime a infração penal a que a lei comina pena de reclusão ou de detenção quer isoladamente quer alternativa ou cumulativamente com a pena de multa contravenção a infração penal a que a lei comina isoladamente pena de prisão simples ou de multa ou ambas alternativa ou cumulativamente A diferenciação portanto é nítida Quando o preceito secundário cominar pena de reclusão ou detenção teremos um crime Tais modalidades de pena podem estar previstas isoladamente ou ainda alternativa ou cumulativamente com a pena pecuniária Em resumo se constarem as palavras reclusão ou detenção será crime pouco importa a lei em que estiver inserida a figura penal Ainda que de forma incorreta nada impediria a inserção de um crime na Lei das Contravenções Penais caso a conduta criminosa fosse apenada com reclusão ou detenção Por outro lado se o preceito secundário não apresentar as palavras reclusão ou detenção estará se referindo a uma contravenção penal uma vez que a lei a ela comina pena de prisão simples ou de multa isoladas alternativa ou cumulativamente Da mesma forma uma contravenção penal pode ser inserida em qualquer lei até mesmo no Código Penal embora essa medida seja esdrúxula e desprovida de técnica Destarte a distinção entre crime e contravenção penal é de grau quantitativa quantidade da pena e também qualitativa qualidade da pena e não ontológica Daí não nos parece correto denominar esta última de crimeanão inclusive pela ausência de critérios para tanto Se tal terminologia fosse correta não seria equivocado considerar que o homicídio é um superdelito e a injúria é um crime pequenino Cuidase em essência de espécies do gênero infração penal diferenciandose quanto à gravidade da sanção penal mediante valores escolhidos pelo legislador Notese que tais valores decisivos para a distinção não são absolutos e pacificamente aceitos Exemplo A conduta de praticar ato obsceno em local público constitui crime Por sua vez o jogo do bicho configura contravenção penal E certamente caminhar nu em via pública ato obsceno revestese de menor lesividade quando comparada com a conduta de chefiar bancas do jogo do bicho em uma comunidade jogo do bicho com todas as mazelas daí decorrentes E o valor eleito pelo legislador para tipificar uma conduta como crime ou contravenção penal pode variar ao longo do tempo Foi o que aconteceu com o porte ilegal de arma de fogo Até 19 de fevereiro de 1997 a conduta era definida como contravenção penal art 19 do Decretolei 36881941 qualquer que fosse a natureza da arma de fogo Do dia 20 de fevereiro de 1997 até o dia 21 de dezembro de 2003 foi tipificada como crime pelo art 10 da Lei 94371997 sujeito às penas de detenção de um a dois anos e multa A partir do dia 23 de dezembro de 2003 entrou em vigor o Estatuto do Desarmamento Lei 108262003 punindo de forma ainda mais rigorosa o porte ilegal podendo a sanção penal ser aumentada em razão da natureza e da qualidade da arma de fogo Ainda nesse ponto o Direito Penal brasileiro acolheu um sistema dicotômico ao fracionar o gênero infração penal em duas espécies crime ou delito e contravenção penal Os termos crime e delito se equivalem embora em algumas situações a Constituição Federal e a legislação ordinária utilizem a palavra delito impropriamente como sinônima de infração penal tal como se verifica no art 5º XI da Lei Suprema e nos arts 301 e 302 do Código de Processo Penal Crime ou delito Contravenção penal Pena de reclusão ou de detenção isolada alternativa ou cumulativamente com a pena de multa Pena de prisão simples ou multa isolada alternativa ou cumulativamente Outros países como Alemanha e França adotaram um sistema tricotômico crimes seriam as infrações mais graves delitos as intermediárias e por último as contravenções penais albergariam as de menor gravidade Sem prejuízo da distinção quantitativa e qualitativa entre crime e contravenção penal estas espécies de infração também apresentam outras distinções previstas no Código Penal e na Lei das Contravenções Penais1 Vejamos Crimes Contravenções Aplicação da lei penal a lei penal brasileira é aplicável via de regra aos crimes cometidos no território nacional CP art 5º a lei brasileira somente incide no tocante às contravenções penais praticadas no território nacional LCP art 2º Tentativa é punível a tentativa de crimes CP art 14 II não se pune a tentativa de contravenção LCP art 4º Elemento subjetivo os crimes podem ser dolosos culposos ou preterdolosos CP arts 18 e 19 basta para as contravenções penais a ação ou omissão voluntária LCP art 3º Culpabilidade os crimes são compatíveis com o erro de tipo CP art 20 e com o erro de proibição CP art 21 as contravenções penais admitem unicamente a ignorância ou a errada compreensão da lei se escusáveis LCP art 8º Tempo de cumprimento das penas nos crimes o tempo de cumprimento das penas privativas de liberdade não pode ser superior a 30 trinta anos CP art 75 nas contravenções penais a duração da pena de prisão simples não pode em caso algum ser superior a 5 cinco anos Período de prova do nos crimes o período de prova do varia entre dois a quatro anos e excepcionalmente de quatro a seis anos CP art 77 e 2º nas contravenções penais o período de prova do é de um a três anos LCP art 11 Prazo mínimo das medidas de segurança nos crimes o prazo mínimo das medidas de segurança é de um a três nas contravenções penais o prazo mínimo é de seis meses LCP art a b c anos CP art 97 1º 16 Ação penal2 nos crimes a ação penal pode ser pública incondicionada ou condicionada ou de iniciativa privada CP art 100 nas contravenções penais a ação penal é pública incondicionada LCP art 17 O art 28 da Lei 113432006 define o crime de posse de droga para consumo pessoal a ele cominando as penas de advertência sobre os efeitos das drogas prestação de serviços à comunidade e medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo Com isso surgiram algumas discussões A primeira delas atinente à natureza jurídica do ato no sentido de ser crime ou não Há posicionamento no sentido de que como não foram previstas penas de reclusão ou de detenção não se trata de crime e estando ausentes as penas de prisão simples ou multa também não configura contravenção penal com fundamento no art 1º da Lei de Introdução ao Código Penal Seria residualmente um ilícito penal sui generis3 Uma segunda corrente que nos parece acertada sustenta a manutenção do caráter criminoso da conduta com a cominação das penas previstas em lei Cuidase da posição amplamente dominante e a ela nos filiamos4 Essa vertente apresenta diversos argumentos para justificar a existência de crime no art 28 da Lei de Drogas quais sejam A lei ao tratar do tema classificou a conduta como crime O processo e julgamento devem observar o rito do Juizado Especial Criminal Lei 90991995 reservado para as infrações penais de menor potencial ofensivo No tocante à prescrição o art 30 da Lei de Drogas determina a d e f aplicação das regras estabelecidas pelos arts 107 e seguintes do Código Penal reservadas às infrações penais A finalidade do art 1º da Lei de Introdução ao Código Penal era apenas diferenciar os crimes das contravenções penais uma vez que tais diplomas legais passaram a vigorar simultaneamente em 1º de janeiro de 1942 A Lei de Introdução ao Código Penal pode ser modificada por outra lei ordinária como aconteceu com a Lei de Drogas e Não existiam penas alternativas quando foi editada a Lei de Introdução ao Código Penal Nesse contexto o Supremo Tribunal Federal com argumentos semelhantes aos que acolhemos decidiu não ter havido descriminalização da conduta existe crime e sim despenalização em face da supressão da pena privativa de liberdade Posse de droga para consumo pessoal art 28 da Lei 113432006 Nova Lei de Drogas natureza jurídica de crime O art 1º da LICP que se limita a estabelecer um critério que permite distinguir quando se está diante de um crime ou de uma contravenção não obsta a que lei ordinária superveniente adote outros critérios gerais de distinção ou estabeleça para determinado crime como o fez o art 28 da Lei 113432006 pena diversa da privação ou restrição da liberdade a qual constitui somente uma das opções constitucionais passíveis de adoção pela lei incriminadora CF1988 art 5º XLVI e XLVII Não se pode na interpretação da Lei 113432006 partir de um pressuposto desapreço do legislador pelo rigor técnico que o teria levado inadvertidamente a incluir as infrações relativas ao usuário de drogas em um capítulo denominado Dos Crimes e das Penas só a ele referentes Lei 113432006 Título III Capítulo III arts 2730 Ao uso da expressão reincidência também não se pode emprestar um sentido popular especialmente porque em linha de princípio somente disposição expressa em contrário na Lei 113432006 afastaria a regra geral do C Penal C Penal art 12 Somase a tudo a previsão como regra geral ao processo de infrações atribuídas ao usuário de drogas do rito estabelecido para os crimes de menor potencial ofensivo possibilitando até mesmo a proposta de aplicação imediata da pena de que trata o art 76 da Lei 90991995 art 48 1º e 5º bem como a disciplina da prescrição segundo as regras dos arts 107 e seguintes do C Penal Lei 113432006 art 30 Ocorrência pois de despenalização entendida como exclusão para o tipo das penas privativas de liberdade5 Concluise que a Lei de Introdução ao Código Penal fornece um conceito genérico de crime aplicável sempre que não existir disposição especial em sentido contrário Além disso a sua finalidade precípua não é dizer sempre o que se entende por crime mas diferenciálo da contravenção penal O art 1º da Lei de Introdução ao Código Penal permite assim a definição de conceito diverso de crime por leis extravagantes reservandose a sua aplicação para casos omissos Destarte o conceito geral ou genérico de crime sob o aspecto legal continua a ser aquele constante do art 1º da Lei de Introdução ao Código Penal ao passo que o art 28 da Lei 113432006 criou nova definição exclusivamente para o crime de posse de droga para consumo pessoal conceito específico Em relação aos demais delitos tráfico associação para o tráfico financiamento ao tráfico etc a Lei de Drogas segue o conceito geral apresentado pela Lei de Introdução ao Código Penal Esse critério também chamado de formal ou dogmático se funda nos elementos que compõem a estrutura do crime Basileu Garcia sustentava ser o crime composto por quatro elementos fato típico ilicitude culpabilidade e punibilidade6 Essa posição quadripartida é claramente minoritária e deve ser afastada pois a punibilidade não é elemento do crime mas consequência da sua prática Não é porque se operou a prescrição de determinado crime por exemplo que ele desapareceu do mundo fático Portanto o crime existe independentemente da punibilidade Outros autores adotam uma posição tripartida pela qual seriam elementos do crime fato típico ilicitude e culpabilidade Perfilham desse entendimento entre outros Nélson Hungria Aníbal Bruno E Magalhães Noronha Francisco de Assis Toledo Cezar Roberto Bitencourt e Luiz Regis Prado Muito cuidado nesse ponto Diversas pessoas inadvertidamente alegam que o acolhimento de um conceito tripartido de crime importa obrigatoriamente na adoção da teoria clássica ou causal da conduta Não é verdade Quem aceita um conceito tripartido de crime tanto pode ser clássico como finalista De fato Hans Welzel criador do finalismo penal definia o crime como o fato típico ilícito e culpável O conceito de culpabilidade acrescenta ao de ação antijurídica tratandose de uma ação dolosa ou não dolosa um novo elemento que a transforma em delito7 A distinção entre os perfis clássico e finalista reside principalmente na alocação do dolo e da culpa e não em um sistema bipartido ou tripartido relativamente à estrutura do delito como veremos na análise da conduta Por fim há autores que entendem o crime como fato típico e ilícito Constam desse rol René Ariel Dotti Damásio E de Jesus e Julio Fabbrini Mirabete entre outros Para os seguidores dessa teoria bipartida a culpabilidade deve ser excluída da composição do crime uma vez que se trata de pressuposto de aplicação da pena Destarte para a configuração do delito bastam o fato típico e a ilicitude ao passo que a presença ou não da culpabilidade importará na possibilidade ou não de a pena ser imposta A teoria bipartida relacionase intimamente com a teoria finalista da conduta Como já abordado nada impede a adoção de um conceito tripartido de crime por uma pessoa vinculada ao finalismo penal Todavia ao se adotar a teoria bipartida do crime necessariamente será aceito o conceito finalista de conduta Isso porque na teoria clássica o dolo e a culpa situamse na culpabilidade E se fosse possível um sistema clássico e bipartido consagrarseia a responsabilidade objetiva É usual a seguinte pergunta Em uma visão analítica qual foi o conceito de crime adotado pelo Código Penal Não há resposta segura para esta questão O Código Penal de 1940 em sua redação original acolhia um conceito tripartido de crime relacionado com o sistema clássico Eram portanto elementos do crime o fato típico a ilicitude e a culpabilidade A situação mudou com a edição da Lei 72091984 responsável pela redação da nova Parte Geral do Código Penal A partir de então fica a impressão de ter sido adotado um conceito bipartido de crime ligado obrigatoriamente à teoria finalista da conduta Vejamos quais são os indicativos dessa posição Em primeiro lugar no Título II da Parte Geral o Código Penal trata Do Crime enquanto logo em seguida no Título III cuida Da Imputabilidade Penal Dessa forma crime é o fato típico e ilícito independentemente da culpabilidade que tem a imputabilidade penal como um dos seus elementos O crime existe sem a culpabilidade bastando seja o fato típico e revestido de 82 ilicitude Em igual sentido ao tratar das causas de exclusão da ilicitude determina o Código Penal em seu art 23 que não há crime Ao contrário ao relacionarse às causas de exclusão da culpabilidade arts 26 caput e 28 1º por exemplo diz que o autor é isento de pena Assim sendo é necessário que o fato típico seja ilícito para a existência do crime Ausente a ilicitude não há crime Por outro lado subsiste o crime com a ausência da culpabilidade Sim o fato é típico e ilícito mas o agente é isento de pena Em suma há crime sem a imposição de pena O crime se refere ao fato típico e ilícito enquanto a culpabilidade guarda relação com o agente merecedor ou não de pena Mas não é só O art 180 4º do Código Penal preceitua A receptação é punível ainda que desconhecido ou isento de pena o autor do crime de que proveio a coisa Concluise que nada obstante a isenção de pena do agente e portanto da falta de culpabilidade isenção da pena exclusão da culpabilidade ainda assim existe o crime do qual proveio a coisa Em outras palavras diz o Código Penal tratarse o crime de fato típico e ilícito pois subsiste mesmo com a isenção da pena em relação ao autor do crime anterior Em que pesem tais argumentos há respeitados penalistas que adotam posições contrárias no sentido de ter o Código Penal se filiado a um sistema tripartido motivo que justifica o conhecimento de todos os enfoques por parte dos candidatos a concursos públicos ILÍCITO PENAL E OUTROS ILÍCITOS Ilicitude é a relação de contrariedade entre o fato praticado por alguém e o ordenamento jurídico como um todo Há nesse contexto ilícitos de natureza penal civil tributária administrativa ambiental etc não existindo diferença entre eles quanto à origem O ilícito penal se separa dos demais em relação à sua gravidade por força 83 da relevância da conduta praticada e da importância do bem jurídico tutelado E o critério para essa distinção é meramente político O que hoje se entende por ilícito tributário no futuro poderá ser compreendido como ilícito penal dependendo da vontade do legislador e da conveniência para o interesse público pois o Direito Penal somente deve se preocupar com os interesses e valores mais importantes para o desenvolvimento e manutenção do indivíduo e da sociedade deixando os demais a cargo dos outros ramos do Direito princípio da fragmentariedade E por corolário o ilícito penal se distingue de todos quanto à consequência Enquanto se reserva a ele uma pena até mesmo privativa de liberdade as outras disciplinas jurídicas preveem sanções mais brandas SUJEITOS DO CRIME Sujeitos do crime são as pessoas ou entes relacionados à prática e aos efeitos da empreitada criminosa Dividemse em sujeito ativo e sujeito passivo Sujeito ativo é a pessoa que realiza direta ou indiretamente a conduta criminosa seja isoladamente seja em concurso Autor e coautor realizam o crime de forma direta ao passo que o partícipe e o autor mediato o fazem indiretamente O sujeito ativo pode receber variadas denominações dependendo do momento processual e do critério posto em exame tais como agente geral indiciado no inquérito policial acusado com o oferecimento da denúncia ou queixa réu após o recebimento da inicial acusatória sentenciado com a prolação da sentença condenado após o trânsito em julgado da condenação reeducando durante a execução penal egresso após o cumprimento da pena criminoso e delinquente objeto de estudo das ciências penais como na criminologia A regra é a de que apenas o ser humano pode ser sujeito ativo de infrações penais mas também se discute a possibilidade de responsabilidade penal da pessoa jurídica Em que pesem as reminiscências históricas8 os animais podem funcionar como instrumento do crime como no caso do cão bravio que cumpre ordem de ataque emanada de seu dono mas jamais serão sujeito ativo de uma infração penal Discutese se a pessoa jurídica pode ser considerada sujeito ativo de crimes Para melhor compreensão do assunto é necessário inicialmente abordar a natureza jurídica de tais entes Para a teoria da ficção jurídica idealizada por Savigny a pessoa jurídica não tem existência real não tem vontade própria Apenas o homem possui aptidão de ser sujeito de direitos Essa teoria não pode subsistir Com efeito se a pessoa jurídica é uma ficção o Direito também o é porque provém do Estado pessoa jurídica de direito público interno Para os adeptos dessa corrente é impossível a prática de crimes por pessoas jurídicas Não há como imaginar uma infração penal cometida por um ente fictício De outro lado a teoria da realidade orgânica organicista ou da personalidade real de Otto Gierke sustenta ser a pessoa jurídica um ente autônomo e distinto de seus membros dotado de vontade própria É assim sujeito de direitos e obrigações tais como uma pessoa física É a teoria mais aceita no Direito Pode ser extraída até aqui uma primeira conclusão Essas teorias guardam estreita relação com o Direito Civil e se for adotada a da ficção jurídica é impossível a prática de crimes por pessoas jurídicas Entretanto com a preferência pela teoria orgânica passase ao debate acerca da sujeição criminal ativa da pessoa jurídica Nesse ponto há duas correntes A primeira no sentido da impossibilidade de a pessoa jurídica ser sujeito ativo de infrações penais Destacamse seus argumentos 1 2 3 4 5 6 7 1 2 3 4 Desde o Direito Romano já se sustentava o postulado societas delinquere non potest isto é a sociedade não pode delinquir A pessoa jurídica não tem vontade própria e portanto não pode praticar condutas A pessoa jurídica não é dotada de consciência própria para compreender o caráter intimidativo da pena A pessoa jurídica não é imputável pois somente o ser humano adquire capacidade de entender o caráter ilícito de um fato e de determinarse de acordo com esse entendimento A pessoa jurídica tem a sua atuação vinculada aos atos relacionados com o seu estatuto social aí não se incluindo a prática de crimes A punição da pessoa jurídica alcançaria ainda que indiretamente seus integrantes ofendendo o princípio constitucional da personalidade da pena e Não se pode aplicar pena privativa de liberdade característica indissociável do Direito Penal à pessoa jurídica A segunda corrente pugna pela possibilidade de a pessoa jurídica figurar como sujeito ativo de crimes com os seguintes fundamentos A pessoa jurídica constituise em ente autônomo dotado de consciência e vontade razão pela qual pode realizar condutas e assimilar a natureza intimidatória da pena A pessoa jurídica deve responder por seus atos adaptandose o juízo de culpabilidade às suas características A pessoa jurídica possui vontade própria razão pela qual o Direito Penal a ela reserva tratamento isonômico ao dispensado à pessoa física É óbvio que o estatuto social de uma pessoa jurídica não prevê a prática de crimes como uma de suas finalidades Da mesma forma não contém em seu bojo a realização de atos ilícitos o que não os impede de serem realizados inadimplência por exemplo 5 6 A punição da pessoa jurídica não viola o princípio da personalidade da pena Devese distinguir a pena dos efeitos da condenação os quais também se verificam com a punição da pessoa física e O Direito Penal não se limita à pena de prisão Ao contrário cada vez mais a pena privativa de liberdade deve ser entendida como medida excepcional ultima ratio preferindose a aplicação de penas alternativas Com a opção pela segunda corrente podese dizer que a Constituição Federal admitiu a responsabilidade penal da pessoa jurídica nos crimes contra a ordem econômica e financeira contra a economia popular e contra o meio ambiente autorizando o legislador ordinário a cominar penas compatíveis com sua natureza independentemente da responsabilidade individual dos seus dirigentes CF arts 173 5º e 225 3º Já foi editada a Lei 96051998 no tocante aos crimes contra o meio ambiente e o seu art 3º parágrafo único dispõe expressamente sobre a responsabilização penal da pessoa jurídica O posicionamento atual do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça é pela admissibilidade da responsabilidade penal da pessoa jurídica em todos os crimes ambientais dolosos ou culposos9 Em relação aos crimes contra a economia popular e a ordem econômica e financeira ainda não sobreveio lei definidora dos crimes da pessoa jurídica10 Destarte mesmo para quem admite a responsabilidade penal da pessoa jurídica deve ser ressaltado que somente podem ser praticados os crimes previstos na Constituição Federal desde que regulamentados por lei ordinária a qual deverá instituir expressamente sua responsabilidade penal É esse o entendimento atualmente dominante no sentido de que a pessoa jurídica pode ser responsabilizada penalmente pela prática de crimes ambientais posição que tende cada vez mais a se consolidar seja por interpretação do texto constitucional seja por opção de política criminal capaz de proporcionar eficiente resultado prático em tema tão em evidência Nas palavras de Fernando Galvão a sanção de natureza penal oferece um contraestímulo muito mais eficiente na proteção do meio ambiente justamente por trabalhar em harmonia com a lógica do mercado capitalista A pena criminal possui efeito estigmatizante que para a pessoa física sempre foi considerado um ponto negativo A pessoa física tem maiores dificuldades para a reinserção após receber a marcação oficial de criminoso No caso da pessoa jurídica a marca da responsabilidade criminal dificulta os negócios da pessoa jurídica e na defesa de seus interesses econômicos os dirigentes da pessoa jurídica são estimulados a evitar o processo penal11 Salientese que mesmo com o texto constitucional há entendimentos no sentido de que não foi prevista a responsabilidade penal da pessoa jurídica Os defensores desta linha de pensamento interpretam o art 225 3º da Constituição Federal12 da seguinte maneira pessoas físicas suportam sanções penais ao passo que pessoas jurídicas suportam sanções administrativas Agora ao se aceitar a responsabilidade penal da pessoa jurídica deve destacarse que esse reconhecimento não exclui a responsabilidade da pessoa física coautora ou partícipe do delito É o que se denomina de sistema paralelo de imputação teoria da dupla imputação previsto no art 3º parágrafo único da Lei 96051998 e com amparo nos arts 13 caput e 29 caput ambos do Código Penal É de se observar entretanto que a condenação da pessoa jurídica não acarreta automaticamente em igual medida no tocante à pessoa física pelo mesmo crime Exigemse provas seguras da autoria e da materialidade do fato delituoso relativamente a todos os envolvidos na infração penal De fato nada impede a absolvição das pessoas físicas às quais se imputou a responsabilidade pelo crime ambiental simultaneamente à condenação da pessoa jurídica beneficiada pelo delito Na linha da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal É admissível a condenação de pessoa jurídica pela prática de crime ambiental ainda que absolvidas as pessoas físicas ocupantes de cargo de presidência ou de direção do órgão responsável pela prática criminosa Com base nesse entendimento a 1ª Turma por maioria conheceu em parte de recurso extraordinário e nessa parte deulhe provimento para a cassar o acórdão recorrido Neste a imputação aos dirigentes responsáveis pelas condutas incriminadas Lei 960598 art 54 teria sido excluída e por isso trancada a ação penal relativamente à pessoa jurídica Sublinhouse que ao se condicionar a imputabilidade da pessoa jurídica à da pessoa humana estarseia quase que a subordinar a responsabilização jurídicocriminal do ente moral à efetiva condenação da pessoa física Ressaltouse que ainda que se concluísse que o legislador ordinário não estabelecera por completo os critérios de imputação da pessoa jurídica por crimes ambientais não haveria como pretender transpor o paradigma de imputação das pessoas físicas aos entes coletivos13 O Superior Tribunal de Justiça compartilha deste entendimento É possível a responsabilização penal da pessoa jurídica por delitos ambientais independentemente da responsabilização concomitante da pessoa física que agia em seu nome Conforme orientação da Primeira Turma do STF O art 225 3º da Constituição Federal não condiciona a responsabilização penal da pessoa jurídica por crimes ambientais à simultânea persecução penal da pessoa física em tese responsável no âmbito da empresa A norma constitucional não impõe a necessária dupla imputação RE 548181 Primeira Turma DJe 29102014 Diante dessa interpretação o STJ modificou sua anterior orientação de modo a entender que é possível a responsabilização penal da pessoa jurídica por delitos ambientais independentemente da responsabilização concomitante da pessoa física que agia em seu nome14 Para os defensores da tese da pessoa jurídica como sujeito ativo de crimes surge uma nova indagação É possível a responsabilidade penal da pessoa jurídica de direito público Existem duas posições sobre o assunto Sim é possível pois a Constituição Federal e a Lei 96051998 Crimes Ambientais não fazem distinção entre a pessoa jurídica de direito privado e a pessoa jurídica de direito público e b Não é possível pois a sanção penal acabaria prejudicando a própria coletividade seja em face da lesão ao patrimônio público pena de multa seja com a suspensão ou extinção de serviço de interesse público nas demais penas É o titular do bem jurídico protegido pela lei penal violada por meio da conduta criminosa Pode ser denominado de vítima ou de ofendido e divide se em duas espécies 1 Sujeito passivo constante mediato formal geral genérico ou indireto é o Estado pois a ele pertence o direito público subjetivo de exigir o cumprimento da legislação penal Figura como sujeito passivo de todos os crimes pois qualquer violação da lei penal transgride interesse a ele reservado pelo ordenamento jurídico Exemplo em um crime de homicídio ainda que a vítima direta seja a pessoa privada da sua vida o Estado também foi ofendido haja vista que a ele convém não sejam praticados crimes 2 Sujeito passivo eventual imediato material particular acidental ou direto é o titular do bem jurídico especificamente tutelado pela lei penal Exemplo o proprietário do carro subtraído no crime de furto O Estado sempre figura como sujeito passivo constante Além disso pode ser sujeito passivo eventual tal como ocorre nos crimes contra a Administração Pública A pessoa jurídica pode ser vítima de diversos delitos desde que compatíveis com a sua natureza Da mesma forma há diversos crimes que podem ser praticados contra incapazes e inclusive contra o nascituro como é o caso do aborto É também possível a existência de sujeito passivo indeterminado É o que ocorre nos crimes vagos aqueles que têm como vítima um ente destituído de personalidade jurídica Os mortos e os animais não podem ser sujeitos passivos de crimes 84 Perguntase E o crime previsto no art 138 2º do Código Penal E os crimes contra a fauna tipificados pelos arts 29 a 37 da Lei 96051998 No caso da figura definida pelo art 138 2º do Código Penal não é o morto o sujeito passivo do crime Os ofendidos são os seus familiares preocupados em zelar pelo respeito reservado às suas recordações Daí falar Damásio E de Jesus em calúnia contra a memória dos mortos15 Em relação aos crimes contra a fauna é a coletividade que figura como vítima De fato ela é a titular do interesse de ver preservado todo o patrimônio ambiental Anotese ainda que ninguém pode praticar um crime contra si próprio Em consonância com o princípio da alteridade do Direito Penal inexiste delito na conduta maléfica somente a quem a praticou Exemplos No crime previsto no art 171 2º V do Código Penal fraude para recebimento de indenização ou valor de seguro a vítima é a seguradora que se pretende ludibriar Na hipótese da autoacusação falsa art 341 do Código Penal a vítima é o Estado ofendido em sua função de administrar a Justiça Por último não se deve confundir o sujeito passivo com o prejudicado pelo crime Ainda que muitas vezes tais características se reúnam na mesma pessoa as situações são diversas Sujeito passivo como já analisado é o titular do bem jurídico protegido pela lei penal violada Prejudicado pelo crime por outro lado é qualquer pessoa a quem o crime traga danos patrimoniais ou não Exemplo sujeito passivo do homicídio é o ser humano de quem foi tirada a vida ao passo que prejudicado pelo crime é a esposa da vítima OBJETO DO CRIME É o bem ou objeto contra o qual se dirige a conduta criminosa Pode ser jurídico ou material Objeto jurídico é o bem jurídico isto é o interesse ou valor protegido pela norma penal No art 121 do Código Penal a título ilustrativo a objetividade jurídica recai na vida humana Objeto material de seu turno é a pessoa ou a coisa que suporta a conduta criminosa No homicídio exemplificativamente é o ser humano que teve sua vida ceifada pelo comportamento do agente 1 2 3 4 5 6 7 8 9 Existem outras diferenças disciplinadas em leis especiais exemplo sursis em crimes ambientais art 16 da Lei 96051998 as quais serão abordadas ao longo desta obra Nada obstante firmouse na doutrina e na jurisprudência o entendimento no sentido de que a contravenção penal de vias de fato LCP art 21 é de ação penal pública condicionada utilizandose analogicamente as regras inerentes à lesão corporal de natureza leve art 129 caput do Código Penal cc art 88 da Lei 90991995 É o que sustentam GOMES Luiz Flávio BIANCHINI Alice CUNHA Rogério Sanches OLIVEIRA William Terra de Nova Lei de Drogas comentada São Paulo RT 2006 p 126 No mesmo sentido GRECO FILHO Vicente RASSI João Daniel Lei de Drogas anotada São Paulo Saraiva 2007 p 43 RE 430105 QORJ rel Min Sepúlveda Pertence 1ª Turma j 13022007 É também o entendimento consolidado no STJ HC 65242MG rel Min Nefi Cordeiro 6ª Turma j 07082014 Com idêntica posição BATTAGLINI Giulio Direito penal Parte geral Trad Paulo José da Costa Jr e Arminda Bergamini Miotto São Paulo Saraiva Ed Universidade de São Paulo 1973 v 1 p 339 WELZEL Hans O novo sistema jurídicopenal Uma introdução à doutrina da ação finalista Tradução de Luiz Regis Prado São Paulo RT 2001 p 87 Citase o caso do elefante Charlie que foi absolvido por legítima defesa é notável o exemplo de um galo condenado à morte por haver bicado os olhos de uma criança recordase também o processo instaurado contra o papagaio que dava vivas ao rei infringindo assim as novas concepções revolucionárias assinalamse exemplos por igual de cavalos homicidas veados infanticidas e de cachorros acusados de crimen bestialitatis LINHARES Marcello Jardim Legítima defesa 4 ed São PauloRio de Janeiro SaraivaForense 1994 p 167 STF HCMC 91591MG rel Min Marco Aurélio Pleno j 21062007 e HC 92921BA rel Min Ricardo Lewandowski 1ª Turma j 19082008 No STJ REsp 889528SC rel Felix Fischer 5ª Turma j 17042007 e HC 92822SP rel originário Min Arnaldo Esteves Lima rel para acórdão Min Napoleão Nunes Maia Filho 5ª Turma j 10 11 12 13 14 15 17062008 noticiado no Informativo 360 As Leis 15211951 crimes contra a economia popular 74921986 crimes contra o sistema financeiro nacional e 81761991 crimes contra a ordem econômica cuidaram apenas da responsabilidade penal das pessoas físicas GALVÃO Fernando Responsabilidade penal da pessoa jurídica 2 ed Belo Horizonte Del Rey 2003 p 16 As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores pessoas físicas ou jurídicas a sanções penais e administrativas independentemente da obrigação de reparar os danos causados RE 548181PR rel Min Rosa Weber 1ª Turma j 06082013 noticiado no Informativo 714 E ainda É possível a condenação de pessoa jurídica pela prática de crime ambiental ainda que haja absolvição da pessoa física relativamente ao mesmo delito Com base nesse entendimento a 1ª Turma manteve decisão de turma recursal criminal que absolvera gerente administrativo financeiro diante de sua falta de ingerência da imputação da prática do crime de licenciamento de instalação de antena por pessoa jurídica sem autorização dos órgãos ambientais Reputouse que a Constituição respaldaria a cisão da responsabilidade das pessoas física e jurídica para efeito penal RE 628582 AgRRS rel Min Dias Toffoli 1ª Turma j 06092011 noticiado no Informativo 639 RMS 39173BA rel Min Reynaldo Soares da Fonseca 5ª Turma j 06082015 noticiado no Informativo 566 JESUS Damásio E de Direito penal Parte especial 27 ed São Paulo Saraiva 2005 v 2 p 216 911 A classificação dos crimes pode ser legal ou doutrinária Classificação legal é a qualificação ou seja o nome atribuído ao delito pela lei penal A conduta de matar alguém é denominada pelo art 121 do Código Penal de homicídio Na Parte Especial do Código Penal em regra os crimes são acompanhados por sua denominação legal nomen iuris também chamada de rubrica marginal Classificação doutrinária é o nome dado pelos estudiosos do Direito Penal às infrações penais Será doravante objeto do nosso estudo Crimes comuns próprios e de mão própria Essa divisão se baseia na qualidade do sujeito ativo Crimes comuns ou gerais são aqueles que podem ser praticados por qualquer pessoa O tipo penal não exige em relação ao sujeito ativo nenhuma condição especial Exemplos homicídio furto extorsão mediante sequestro crimes contra a honra etc Falase também em crimes bicomuns compreendidos como aqueles que podem ser cometidos por qualquer pessoa e contra qualquer pessoa isto é não se reclama nenhuma situação especial seja em relação ao sujeito ativo seja no tocante ao sujeito passivo É o caso da lesão corporal e do estelionato entre tantos outros delitos Crimes próprios ou especiais são aqueles em que o tipo penal exige uma situação fática ou jurídica diferenciada por parte do sujeito ativo Exemplos peculato só pode ser praticado por funcionário público e receptação qualificada pelo exercício de atividade comercial ou industrial delito previsto no art 180 1º do Código Penal somente pode ser praticado pelo comerciante ou industrial Admitem coautoria e participação1 Os crimes próprios dividemse em puros e impuros Naqueles a ausência da condição imposta pelo tipo penal leva à atipicidade do fato exemplo prevaricação pois excluída a elementar funcionário público não subsiste crime algum enquanto que nestes a exclusão da especial posição do sujeito ativo acarreta na desclassificação para outro delito exemplo peculato doloso pois afastandose a elementar funcionário público o fato passará a constituir crime de furto ou apropriação indébita conforme o caso Falase ainda em crimes próprios com estrutura inversa classificação relativa aos crimes praticados por funcionários públicos contra a Administração em geral crimes funcionais Como lecionam Antonio Pagliaro e Paulo José da Costa Junior Os delitos funcionais dispõem entretanto entre os crimes próprios de uma característica de todo particular Neles a qualificação subjetiva não precede o fato mas deriva do sujeito por uma atividade que ele exercita no momento do fato Em outras palavras o prius lógico dos crimes funcionais é que o sujeito na situação concreta esteja exercitando uma função pública Desse dado de fato deriva a qualificação de funcionário público necessária à configuração dos crimes Logo os delitos funcionais podem ser classificados como delitos próprios com estrutura inversa no sentido de que é necessário indagar sobre o fato antes de concluir que a qualificação subjetiva de funcionário público subsista realmente2 Existem também os chamados crimes bipróprios é dizer delitos que exigem uma peculiar condição fática ou jurídica no tocante ao sujeito ativo e ao sujeito passivo É o caso do infanticídio que somente pode ser praticado pela mãe contra o próprio filho nascente ou recémnascido3 Crimes de mão própria de atuação pessoal ou de conduta infungível 912 913 são aqueles que somente podem ser praticados pela pessoa expressamente indicada no tipo penal É o caso do falso testemunho CP art 342 Tais crimes não admitem coautoria mas somente participação eis que a lei não permite delegar a execução do crime a terceira pessoa No caso do falso testemunho o advogado do réu pode por exemplo induzir instigar ou auxiliar a testemunha a faltar com a verdade mas jamais poderá em juízo mentir em seu lugar ou juntamente com ela4 Crimes simples e complexos A classificação se refere à estrutura da conduta delineada pelo tipo penal Crime simples é aquele que se amolda em um único tipo penal É o caso do furto CP art 155 Crime complexo é aquele que resulta da união de dois ou mais tipos penais Falase nesse caso em crime complexo em sentido estrito O crime de roubo CP art 157 por exemplo é oriundo da fusão entre furto e ameaça no caso de ser praticado com emprego de grave ameaça CP art 147 ou furto e lesão corporal se praticado mediante violência contra a pessoa CP art 129 Denominamse famulativos os delitos que compõem a estrutura unitária do crime complexo5 De seu turno crime complexo em sentido amplo é o que deriva da fusão de um crime com um comportamento por si só penalmente irrelevante a exemplo da denunciação caluniosa CP art 339 originária da união da calúnia CP art 138 com a conduta lícita de noticiar à autoridade pública a prática de uma infração penal e sua respectiva autoria Crimes materiais formais e de mera conduta A divisão diz respeito à relação entre a conduta e o resultado naturalístico compreendido como a modificação do mundo exterior provocada pela conduta do agente Crimes materiais ou causais são aqueles em que o tipo penal aloja em seu interior uma conduta e um resultado naturalístico sendo a ocorrência deste último necessária para a consumação É o caso do homicídio CP art 914 121 A conduta é matar alguém e o resultado naturalístico ocorre com o falecimento da vítima operandose com ele a consumação Crimes formais de consumação antecipada ou de resultado cortado são aqueles nos quais o tipo penal contém em seu bojo uma conduta e um resultado naturalístico mas este último é desnecessário para a consumação Em síntese malgrado possa se produzir o resultado naturalístico o crime estará consumado com a mera prática da conduta Na extorsão mediante sequestro CP art 159 basta a privação da liberdade da vítima com o escopo de obter futura vantagem patrimonial indevida como condição ou preço do resgate Ainda que a vantagem não seja obtida pelo agente o crime estará consumado com a realização da conduta No caso da ameaça CP art 147 a vítima pode até sentirse amedrontada com a promessa de mal injusto e grave mas isso não é necessário para a consumação do crime Na injúria CP art 140 a pessoa contra quem foi dirigida a ofensa pode considerarse menosprezada Não se exige contudo que isso ocorra Basta que as palavras proferidas tenham potencialidade para violar a honra subjetiva isto é a dignidade e o decoro que a pessoa tem no tocante a si própria Outro exemplo é o crime de extorsão CP art 158 Nos moldes da Súmula 96 do Superior Tribunal de Justiça O crime de extorsão consumase independentemente da obtenção da vantagem indevida Crimes de mera conduta ou de simples atividade são aqueles em que o tipo penal se limita a descrever uma conduta ou seja não contém resultado naturalístico razão pela qual ele jamais poderá ser verificado É o caso do ato obsceno CP art 233 e do porte de munição de uso permitido Lei 108262003 Estatuto do Desarmamento art 146 Na definição de Manoel Pedro Pimentel Crime de mera conduta é aquele em que a ação ou a omissão bastam para constituir o elemento material objetivo da figura típica penal7 Crimes instantâneos permanentes de efeitos a b permanentes e a prazo A classificação se refere ao momento em que o crime se consuma Crimes instantâneos ou de estado são aqueles cuja consumação se verifica em um momento determinado sem continuidade no tempo É o caso do furto CP art 155 Crimes permanentes são aqueles cuja consumação se prolonga no tempo por vontade do agente O ordenamento jurídico é agredido reiteradamente razão pela qual a prisão em flagrante é cabível a qualquer momento enquanto perdurar a situação de ilicitude Como decidido pelo Superior Tribunal de Justiça Os tipos penais previstos nos arts 12 e 16 da Lei nº 108262003 Estatuto do Desarmamento são crimes permanentes e de acordo com o art 303 do CPP o estado de flagrância nesse tipo de crime persiste enquanto não cessada a permanência8 Os crimes permanentes se subdividem em necessariamente permanentes para a consumação é imprescindível a manutenção da situação contrária ao Direito por tempo juridicamente relevante É o caso do sequestro CP art 148 eventualmente permanentes em regra são instantâneos mas no caso concreto a situação de ilicitude pode ser prorrogada no tempo pela vontade do agente Como exemplo pode ser indicado o furto de energia elétrica CP art 155 3º Crimes instantâneos de efeitos permanentes são aqueles cujos efeitos subsistem após a consumação independentemente da vontade do agente tal como ocorre na bigamia CP art 235 e no estelionato previdenciário CP art 171 caput quando praticado por terceiro não beneficiário9 Crimes a prazo são aqueles cuja consumação exige a fluência de determinado período É o caso da lesão corporal de natureza grave em decorrência da incapacidade para as ocupações habituais por mais de 30 dias CP art 129 1º I e do sequestro em que a privação da liberdade dura mais de 15 dias CP art 148 1º III 915 a b b1 b2 Crimes unissubjetivos plurissubjetivos e eventualmente coletivos Diz respeito ao número de agentes envolvidos com a conduta criminosa Crimes unissubjetivos unilaterais monossubjetivos ou de concurso eventual são praticados por um único agente Admitem entretanto o concurso de pessoas É o caso do homicídio CP art 121 Crimes plurissubjetivos plurilaterais ou de concurso necessário são aqueles em que o tipo penal reclama a pluralidade de agentes que podem ser coautores ou partícipes imputáveis ou não conhecidos ou desconhecidos e inclusive pessoas em relação às quais já foi extinta a punibilidade Subdividemse em crimes bilaterais ou de encontro o tipo penal exige dois agentes cujas condutas tendem a se encontrar É o caso da bigamia CP art 235 crimes coletivos ou de convergência o tipo penal reclama a existência de três ou mais agentes Podem ser de condutas contrapostas os agentes devem atuar uns contra os outros É o caso da rixa CP art 137 de condutas paralelas os agentes se auxiliam mutuamente com o objetivo de produzirem o mesmo resultado É o caso da associação criminosa CP art 288 Não se devem confundir todavia os crimes plurissubjetivos com os de participação necessária Estes podem ser praticados por uma única pessoa nada obstante o tipo penal reclame a participação necessária de outra pessoa que atua como sujeito passivo e por esse motivo não é punido ex rufianismo CP art 230 Crimes eventualmente coletivos são aqueles em que não obstante o seu caráter unilateral a diversidade de agentes atua como causa de majoração da pena tal como se dá no furto qualificado CP art 155 4º IV e no roubo circunstanciado CP art 157 2º II 916 917 a b Crimes de subjetividade passiva única e de dupla subjetividade passiva A classificação se relaciona com o número de vítimas Crimes de subjetividade passiva única são aqueles em que consta no tipo penal uma única vítima É o caso da lesão corporal CP art 129 Crimes de dupla subjetividade passiva são aqueles em que o tipo penal prevê a existência de duas ou mais vítimas tal como se dá no aborto sem o consentimento da gestante em que se ofendem a gestante e o feto CP art 125 e na violação de correspondência na qual são vítimas o remetente e o destinatário CP art 151 Crimes de dano e de perigo Essa classificação se refere ao grau de intensidade do resultado almejado pelo agente como consequência da prática da conduta Crimes de dano ou de lesão são aqueles cuja consumação somente se produz com a efetiva lesão do bem jurídico Como exemplos podem ser lembrados os crimes de homicídio CP art 121 lesões corporais CP art 129 e dano CP art 163 Crimes de perigo são aqueles que se consumam com a mera exposição do bem jurídico penalmente tutelado a uma situação de perigo ou seja basta a probabilidade de dano Subdividemse em crimes de perigo abstrato presumido ou de simples desobediência consumamse com a prática da conduta automaticamente Não se exige a comprovação da produção da situação de perigo Ao contrário há presunção absoluta iuris et de iure de que determinadas condutas acarretam perigo a bens jurídicos É o caso do tráfico de drogas Lei 113432006 art 33 caput Esses crimes estão em sintonia com a Constituição Federal mas devem ser instituídos pelo legislador com parcimônia evitandose a desnecessária inflação legislativa10 crimes de perigo concreto consumamse com a efetiva comprovação no caso concreto da ocorrência da situação de c d e f g 918 perigo É o caso do crime de perigo para a vida ou saúde de outrem CP art 132 crimes de perigo individual atingem uma pessoa ou um número determinado de pessoas tal como no perigo de contágio venéreo CP art 130 crimes de perigo comum ou coletivo atingem um número indeterminado de pessoas como no caso da explosão criminosa CP art 251 crimes de perigo atual o perigo está ocorrendo como no abandono de incapaz CP art 133 crimes de perigo iminente o perigo está prestes a ocorrer crimes de perigo futuro ou mediato a situação de perigo decorrente da conduta se projeta para o futuro como no porte ilegal de arma de fogo de uso permitido ou restrito Lei 108262003 arts 14 e 16 autorizando a criação de tipos penais preventivos Crimes unissubsistentes e plurissubsistentes Dizem respeito ao número de atos executórios que integram a conduta criminosa Crimes unissubsistentes são aqueles cuja conduta se revela mediante um único ato de execução capaz de por si só produzir a consumação tal como nos crimes contra a honra praticados com o emprego da palavra Não admitem a tentativa pois a conduta não pode ser fracionada e uma vez realizada acarreta automaticamente na consumação Crimes plurissubsistentes são aqueles cuja conduta se exterioriza por meio de dois ou mais atos os quais devem somarse para produzir a consumação É o caso do crime de homicídio praticado por diversos golpes de faca É possível a tentativa justamente em virtude da pluralidade de atos executórios 919 1 2 Crimes comissivos omissivos e de conduta mista A divisão se relaciona com a forma pela qual é praticada a conduta criminosa Crimes comissivos ou de ação são os praticados mediante uma conduta positiva um fazer tal como se dá no roubo CP art 157 Nessa categoria se enquadra a ampla maioria dos crimes Crimes omissivos ou de omissão são os cometidos por meio de uma conduta negativa de uma inação de um não fazer Subdividemse em a Crimes omissivos próprios ou puros a omissão está contida no tipo penal ou seja a descrição da conduta prevê a realização do crime por meio de uma conduta negativa Não há previsão legal do dever jurídico de agir de forma que o crime pode ser praticado por qualquer pessoa que se encontre na posição indicada pelo tipo penal Nesses casos o omitente não responde pelo resultado naturalístico eventualmente produzido mas somente pela sua omissão Exemplo típico é o crime de omissão de socorro definido pelo art 135 do Código Penal Deixar de prestar assistência quando possível fazêlo sem risco pessoal à criança abandonada ou extraviada ou à pessoa inválida ou ferida ao desamparo ou em grave e iminente perigo ou não pedir nesses casos o socorro da autoridade pública A leitura do tipo penal permite algumas conclusões A conduta omissiva está descrita na lei seja na modalidade deixar de prestar seja na variante não pedir O agente responde penalmente pela sua inação pois deixou de fazer algo determinado por lei Qualquer pessoa pode praticar o crime de omissão de socorro Basta se omitir quando presente a possibilidade de prestar assistência sem risco pessoal à criança abandonada ou extraviada ou à pessoa inválida ou ferida ao desamparo ou em grave e iminente perigo E mediatamente qualquer indivíduo pode se 3 4 5 omitir quando não for possível prestar assistência sem risco pessoal deixando de pedir o socorro da autoridade pública Os crimes omissivos próprios são unissubsistentes isto é a conduta é composta de um único ato Dessa forma ou o agente presta assistência e não há crime ou deixa de prestála e o crime estará consumado Enquadramse via de regra no rol dos crimes de mera conduta11 Como decorrência da conclusão anterior os crimes omissivos próprios ou puros não admitem a forma tentada e Os delitos omissivos próprios normalmente são dolosos mas existem infrações desta natureza punidas a título de culpa a exemplo das figuras típicas contidas no art 63 2º da Lei 80781990 Código de Defesa do Consumidor e no art 13 caput da Lei 108262003 Estatuto do Desarmamento b Crimes omissivos impróprios espúrios ou comissivos por omissão o tipo penal aloja em sua descrição uma ação uma conduta positiva mas a omissão do agente que descumpre seu dever jurídico de agir acarreta a produção do resultado naturalístico e a sua consequente responsabilização penal As hipóteses do dever de agir12 foram previstas no art 13 2º do Código Penal a dever legal b posição de garantidor e c ingerência O crime de homicídio foi tipificado por uma conduta positiva Matar alguém Questionase É possível praticar homicídio por omissão Depende Se presente o dever de agir a resposta é positiva Não se admite a responsabilização do agente pelo delito contra a vida contudo se ele não se encontrar em tal posição jurídica A título ilustrativo uma mãe pode matar o próprio filho de tenra idade seja ministrandolhe veneno seja deixando dolosamente de alimentálo ceifandolhe a vida Notese que tais crimes entram também na categoria dos próprios uma vez que somente podem ser cometidos por quem possui o dever jurídico de agir São ainda crimes materiais pois o advento do resultado naturalístico é imprescindível à consumação do delito Ademais estes delitos admitem a tentativa No exemplo citado a genitora poderia abandonar a casa e fugir lá deixando o filho esfomeado Entretanto o choro da criança poderia ser notado por um vizinho o qual arrombaria a porta do imóvel e prestaria socorro à criança alimentandoa e a ela dispensando os cuidados necessários O resultado teria deixado de ocorrer por circunstâncias alheias à vontade da mãe configurando a tentativa de homicídio Finalmente os crimes omissivos impróprios são compatíveis com o dolo e também com a culpa c Crimes omissivos por comissão nestes crimes há uma ação provocadora da omissão Exemplo o funcionário público responsável por uma repartição impede que uma funcionária subalterna com problemas de saúde seja socorrida e ela vem a falecer Essa categoria não é reconhecida por grande parte da doutrina d Crimes omissivos quase impróprios esta classificação ignorada pelo direito penal brasileiro diz respeito aos crimes em que a omissão não produz uma lesão ao bem jurídico como nos crimes omissivos próprios mas apenas um perigo que pode ser abstrato ou concreto Nas hipóteses de perigo concreto tutelase um bem jurídico naturalístico exemplo a vida humana ao passo que nos casos de perigo abstrato buscase a proteção de um bem jurídico normativo exemplo uma obrigação jurídica Alberto Cadoppi citado por Fabio Roberto DAvila assim se pronuncia ao discorrer sobre tais bens jurídicos Bens esses que em termos de ofensividade detêm uma diferença substancial a vida como um bem negativo ou absoluto somente pode ser ofendida através da produção de um evento danoso e nesta medida por um crime comissivo ou omissivo impróprio enquanto a obrigação creditícia como um bem positivo ou relativo somente pode ser ofendida pela ausência de produção de um evento vantajoso e 9110 9111 desta forma por um crime omissivo próprio Os crimes omissivos quase impróprios são nessa medida nada mais que crimes omissivos próprios postos na tutela de um interesse absoluto estando por isso limitados às hipóteses de perigo abstrato ou concreto13 Crimes de conduta mista são aqueles em que o tipo penal é composto de duas fases distintas uma inicial e positiva outra final e omissiva É o exemplo do crime de apropriação de coisa achada definido pelo art 169 parágrafo único II do Código Penal quem acha coisa alheia perdida e dela se apropria total ou parcialmente deixando de restituíla ao dono ou legítimo possuidor ou de entregála à autoridade competente dentro no prazo de 15 dias Inicialmente o agente encontra uma coisa perdida e dela se apropria conduta positiva Depois deixa de restituíla a quem de direito ou de entregála à autoridade competente no prazo de 15 dias conduta negativa Crimes de forma livre e de forma vinculada Essa divisão se relaciona ao modo de execução admitido pelo crime Crimes de forma livre são aqueles que admitem qualquer meio de execução É o caso da ameaça CP art 147 que pode ser cometida com emprego de gestos palavras escritos símbolos etc Crimes de forma vinculada são aqueles que apenas podem ser executados pelos meios indicados no tipo penal É o caso do crime de perigo de contágio venéreo CP art 130 que somente admite a prática mediante relações sexuais ou atos libidinosos Crimes monoofensivos e pluriofensivos Essa divisão é atinente ao número de bens jurídicos atingidos pela conduta criminosa e guarda íntima relação com a estrutura do crime crimes simples ou complexos Crimes monoofensivos são aqueles que ofendem um único bem jurídico É o caso do furto CP art 155 que viola o patrimônio 9112 9113 9114 Crimes pluriofensivos são aqueles que atingem dois ou mais bens jurídicos tal como no latrocínio CP art 157 3º inc II que afronta a vida e o patrimônio Crimes principais e acessórios Referese à existência autônoma ou não do crime Crimes principais são os que possuem existência autônoma isto é independem da prática de um crime anterior É o caso do estupro CP art 213 Crimes acessórios de fusão ou parasitários dependem da prática de um crime anterior tal como na receptação CP art 180 nos crimes de favorecimento pessoal e real CP arts 348 e 349 e na lavagem de dinheiro Lei 96131998 art 1º Nos termos do art 108 do Código Penal a extinção da punibilidade do crime principal não se estende ao crime acessório Crimes transeuntes e não transeuntes Essa divisão se relaciona à necessidade ou não da elaboração de exame de corpo de delito para atuar como prova da existência do crime Crimes transeuntes ou de fato transitório são aqueles que não deixam vestígios materiais como no caso dos crimes praticados verbalmente ameaça desacato injúria calúnia difamação etc Crimes não transeuntes ou de fato permanente são aqueles que deixam vestígios materiais tais como o homicídio CP art 121 e as lesões corporais CP art 129 Nos crimes não transeuntes a falta de exame de corpo de delito leva à nulidade da ação penal salvo quando impossível a sua realização exemplo cadáver não encontrado no delito de homicídio14 enquanto nos delitos transeuntes não se realiza a perícia CPP arts 158 e 564 III b Crimes à distância plurilocais e em trânsito 9115 a b Coadunase com o local em que se produz o resultado Crimes à distância também conhecidos como crimes de espaço máximo são aqueles cuja conduta e resultado ocorrem em países diversos Como analisado na parte relativa ao lugar do crime o art 6º do Código Penal acolheu a teoria mista ou da ubiquidade Crimes plurilocais são aqueles cuja conduta e resultado se desenvolvem em comarcas diversas sediadas no mesmo país No tocante às regras de competência o art 70 do Código de Processo Penal dispõe que nesse caso será competente para o processo e julgamento do crime o juízo do local em que se operou a consumação Há contudo exceções Crimes em trânsito são aqueles em que somente uma parte da conduta ocorre em um país sem lesionar ou expor a situação de perigo bens jurídicos de pessoas que nele vivem Exemplo A da Argentina envia para os Estados Unidos uma missiva com ofensas a B e essa carta passa pelo território brasileiro Crimes independentes e conexos A classificação se importa com o vínculo existente entre dois ou mais crimes Crimes independentes são aqueles que não apresentam nenhuma ligação com outros delitos Crimes conexos são os que estão interligados entre si Essa conexão pode ser penal ou processual penal A conexão material ou penal que nos interessa dividese em teleológica ou ideológica o crime é praticado para assegurar a execução de outro delito É o caso de matar o segurança para sequestrar o empresário consequencial ou causal o crime é cometido para assegurar a ocultação impunidade ou vantagem de outro delito Exemplos matar uma testemunha para manter impune o delito e assassinar o comparsa para ficar com todo o produto do crime c 9116 9117 Essas duas espécies de conexão têm previsão legal Funcionam como qualificadoras no crime de homicídio CP art 121 2º V e como agravantes genéricas nos demais crimes CP art 61 II alínea b ocasional o crime é praticado como consequência da ocasião da oportunidade proporcionada por outro delito Exemplo um ladrão após praticar o roubo decide estuprar a vítima que estava no interior da loja assaltada O agente responde por ambos os crimes em concurso material Tratase de criação doutrinária e jurisprudencial sem amparo legal Crimes condicionados e incondicionados O critério reside na liberdade ou não para iniciar a persecução penal contra o responsável pela prática de um crime Crimes condicionados são aqueles em que a inauguração da persecução penal depende de uma condição objetiva de procedibilidade É o caso do crime de ameaça de ação penal pública condicionada à representação do ofendido ou de seu representante legal CP art 147 Anotese que a legislação penal indica expressamente a condição de procedibilidade quando necessária pois a ausência de menção direta acarreta a conclusão de tratarse de crime de ação penal pública incondicionada Crimes incondicionados são aqueles em que a instauração da persecução penal é livre Constituem a ampla maioria de delitos no Brasil O Estado pode iniciála sem nenhuma autorização como ocorre no crime de homicídio de ação penal pública incondicionada Crimes naturais plásticos e vazios15 Crimes naturais ou mala per se são aqueles que violam valores éticos absolutos e universais a exemplo do homicídio o qual atenta contra a vida humana Plásticos ou mala prohibita de seu turno são os delitos que embora previstos em leis penais não ofendem valores universais éticos e absolutos É o que se dá com os crimes contra a Administração Pública e contra a ordem 9118 tributária criados como meios de defesa do Estado contra o cidadão em oposição à lógica do Direito Penal Finalmente crimes vazios são modalidades específicas de delitos plásticos porém caracterizados pela ausência de proteção a qualquer bem jurídico Para os adeptos desta categoria que não admitimos um exemplo seria o delito de embriaguez ao volante Lei 95031997 Código de Trânsito Brasileiro art 306 notadamente nas hipóteses em que o condutor do veículo automotor encontrase em via pública deserta sem colocar em risco nenhuma outra pessoa além dele próprio Crimes de mínimo de menor de médio de elevado e de máximo potencial ofensivo Crimes de mínimo potencial ofensivo são os que não comportam a pena privativa de liberdade No Brasil enquadrase nesse grupo a posse de droga para consumo pessoal tipificada no art 28 da Lei 113432006 ao qual são cominadas as penas de advertência sobre os efeitos das drogas prestação de serviços à comunidade e medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo Crimes de menor potencial ofensivo por sua vez são aqueles cuja pena privativa de liberdade em abstrato não ultrapassa dois anos cumulada ou não com multa São assim definidos pelo art 61 da Lei 90991995 e ingressam na competência do Juizado Especial Criminal obedecendo ao rito sumaríssimo e admitindo a transação penal e a composição dos danos civis O art 98 I da Constituição Federal faz menção às infrações penais de menor potencial ofensivo expressão que também abrange todas as contravenções penais Crimes de médio potencial ofensivo de seu turno são aqueles cuja pena mínima não ultrapassa um ano independentemente do máximo da pena privativa de liberdade cominada Tais delitos admitem a suspensão condicional do processo na forma delineada pelo art 89 da Lei 90991995 Crimes de elevado potencial ofensivo são os que apresentam pena mínima superior a um ano ou seja pelo menos de dois anos e consequentemente pena máxima acima de dois anos Tais delitos não se 9119 91191 91192 91193 compatibilizam com quaisquer dos benefícios elencados pela Lei 90991995 Finalmente classificamse como crimes de máximo potencial ofensivo os que recebem tratamento diferenciado pela Constituição Federal São os hediondos e equiparados tráfico de drogas tortura e o terrorismo CF art 5º XLIII bem como os delitos cujas penas não se submetem à prescrição quais sejam racismo CF art 5º XLII e ação de grupos armados civis ou militares contra a ordem constitucional e o Estado Democrático CF art 5º XLIV16 Outras classificações Crime gratuito É o praticado sem motivo conhecido porque todo crime tem uma motivação Não se confunde com o motivo fútil definido como aquele de menor importância desproporcional ao resultado provocado pelo crime Com efeito a ausência de motivo conhecido não deve ser equiparada ao motivo fútil Destarte o desconhecimento acerca do móvel do agente não deve ser colocado no mesmo nível do motivo de somenos importância Há todavia adeptos de posição contrária os quais alegam que se um motivo ínfimo justifica a elevação da pena com maior razão deve ser punida mais gravemente a infração penal imotivada Crime de ímpeto É o cometido sem premeditação como decorrência de reação emocional repentina tal como no homicídio privilegiado cometido pelo agente sob o domínio de violenta emoção logo em seguida a injusta provocação da vítima CP art 121 1º Esses crimes são normalmente passionais movidos pela paixão Crime exaurido É aquele em que o agente depois de já alcançada a consumação insiste na agressão ao bem jurídico Não caracteriza novo crime constituindose em desdobramento de uma conduta perfeita e acabada 91194 91195 91196 91197 91198 Em outras palavras é o crime que depois de consumado alcança suas consequências finais as quais podem configurar um indiferente penal como no falso testemunho CP art 342 que se torna exaurido com o encerramento do julgamento relativo a este crime ou então condição de maior punibilidade como ocorre na resistência CP art 329 em que a não execução do ato dá ensejo à forma qualificada do crime Crime de circulação É o praticado com o emprego de veículo automotor a título de dolo ou de culpa com a incidência do Código Penal ou do Código de Trânsito Brasileiro Lei 95031997 Crime de atentado ou de empreendimento É aquele em que a lei pune de forma idêntica o crime consumado e a forma tentada isto é não há diminuição da pena em face da tentativa É o caso do crime de evasão mediante violência contra a pessoa CP art 352 Evadirse ou tentar evadirse o preso ou o indivíduo submetido a medida de segurança detentiva usando de violência contra a pessoa Crime de opinião ou de palavra É o cometido pelo excesso abusivo na manifestação do pensamento seja pela forma escrita seja pela forma verbal tal como ocorre na injúria CP art 140 Crime multitudinário É aquele praticado pela multidão em tumulto A lei não diz o que se entende por multidão razão pela qual sua configuração deve ser examinada no caso concreto Exemplo agressões praticadas em um estádio por torcedores de um time de futebol No Direito Canônico da Idade Média exigiamse ao menos 40 pessoas Crime vago 91199 911910 911911 911912 É aquele em que figura como sujeito passivo uma entidade destituída de personalidade jurídica como a família ou a sociedade Exemplo tráfico de drogas Lei 113432006 art 33 caput no qual o sujeito passivo é a coletividade Crime internacional É aquele que por tratado ou convenção devidamente incorporado ao ordenamento jurídico pátrio o Brasil se comprometeu a evitar e punir tal como o tráfico internacional de pessoa CP art 149A Crime de mera suspeita sem ação ou de mera posição O agente não realiza conduta penalmente relevante Ao contrário ele é punido em razão da suspeita despertada pelo seu modo de agir Essa modalidade idealizada na Itália por Vicenzo Manzini não encontrou amparo seguro na doutrina No Brasil pode ser apresentada como exemplo a contravenção penal tipificada pelo art 25 do Decretolei 36881941 Lei das Contravenções Penais posse não justificada de instrumento de emprego usual na prática de furto17 Crime inominado Delineado pelo uruguaio Salvagno Campos é o que ofende regra ética ou cultural consagrada pelo Direito Penal embora não definido em lei como infração penal Não pode ser aceito haja vista que o princípio da reserva legal veda a analogia in malam partem em âmbito criminal Crime habitual Crime habitual próprio é o que somente se consuma com a prática reiterada e uniforme de vários atos que revelam um criminoso estilo de vida do agente Cada ato isoladamente considerado é atípico Com efeito se cada ato fosse típico restaria configurado o crime continuado Exemplos exercício ilegal da medicina e curandeirismo CP arts 282 e 284 respectivamente 911913 911914 911915 911916 911917 911918 De seu turno crime habitual impróprio é aquele em que uma só ação tem relevância para configurar o tipo ainda que a sua reiteração não configure pluralidade de crimes a exemplo do que se verifica no delito de gestão fraudulenta previsto no art 4º caput da Lei 74921986 Crimes contra o Sistema Financeiro Nacional18 Crime profissional É o crime habitual quando cometido com finalidade lucrativa Exemplo rufianismo CP art 230 Quasecrime É o nome doutrinário atribuído ao crime impossível CP art 17 e à participação impunível CP art 31 Na verdade inexiste crime Crime subsidiário É o que somente se verifica se o fato não constitui crime mais grave É o caso do dano CP art 163 subsidiário em relação ao crime de incêndio CP art 250 Para Nélson Hungria o crime subsidiário funciona como soldado de reserva Crime hediondo É todo aquele que se enquadra no rol do artigo 1º da Lei 80721990 na forma consumada ou tentada Adotouse um critério legal crime hediondo é aquele que a lei define como hediondo19 Crime de expressão É o que se caracteriza pela existência de um processo intelectivo interno do autor Exemplo falso testemunho CP art 342 no qual a conduta tipificada não se funda na veracidade ou na falsidade objetiva da informação mas na desconformidade entre a informação e a convicção pessoal do seu autor Crime de intenção ou de tendência interna transcendente 911919 911920 911921 911922 É aquele em que o agente quer e persegue um resultado que não necessita ser alcançado para a consumação como se dá na extorsão mediante sequestro CP art 159 Crime de tendência ou de atitude pessoal É aquele em que a tendência afetiva do autor delimita a ação típica ou seja a tipicidade pode ou não ocorrer em razão da atitude pessoal e interna do agente Exemplos toque do ginecologista na realização do diagnóstico que pode configurar mero agir profissional ou então algum crime de natureza sexual dependendo da tendência libidinosa ou não bem como as palavras dirigidas contra alguém que podem ou não caracterizar o crime de injúria em razão da intenção de ofender a honra ou de apenas criticar ou brincar Crime mutilado de dois atos ou tipos imperfeitos de dois atos É aquele em que o sujeito pratica um delito com a finalidade de obter um benefício posterior Ex falsidade documental para cometer estelionato Nas palavras de Juarez Cirino dos Santos O resultado pretendido exige uma ação complementar a falsificação do documento e a circulação do documento no tráfego jurídico A intenção como característica psíquica especial do tipo aparece geralmente nas conjunções subordinativas finais para a fim de com o fim de etc indicativas de finalidades transcendentes do tipo como ocorre com a maioria dos crimes patrimoniais20 Crime de ação violenta É o cometido mediante o emprego de violência contra a pessoa ou grave ameaça como no caso do roubo CP art 157 Crime de ação astuciosa É o praticado por meio de fraude engodo tal como no estelionato CP art 171 911923 911924 911925 911926 Crime falho É a denominação doutrinária atribuída à tentativa perfeita ou acabada ou seja aquela em que o agente esgota os meios executórios que tinha à sua disposição e mesmo assim o crime não se consuma por circunstâncias alheias à sua vontade Exemplo A desfere os seis tiros do revólver contra B que mesmo ferido consegue fugir e vem a ser eficazmente socorrido Crime putativo imaginário ou erroneamente suposto É aquele em que o agente acredita realmente ter praticado um crime quando na verdade cometeu um indiferente penal Exemplo A vende um pó branco acreditando tratarse de cocaína Na verdade era talco Tratase de um não crime que se divide em três espécies a crime putativo por erro de tipo b crime putativo por erro de proibição também conhecido como delito de alucinação ou crime de loucura e c crime putativo por obra do agente provocador Crime remetido É o que se verifica quando sua definição típica se reporta a outro crime que passa a integrálo como no uso de documento falso fazer uso de qualquer dos papéis falsificados ou alterados a que se referem os arts 297 a 302 CP art 304 Crimes de responsabilidade Dividemse em próprios são na verdade crimes comuns e impróprios infrações políticoadministrativas Esses últimos são apreciados pelo Poder Legislativo e a sua prática redunda na imposição de sanções políticas 911927 911928 911929 911930 a b Crime obstáculo É aquele que retrata atos preparatórios tipificados como crime autônomo pelo legislador É o caso da associação criminosa CP art 288 e dos petrechos para falsificação de moeda CP art 291 Crime progressivo É aquele que para ser cometido deve o agente violar obrigatoriamente outra lei penal a qual tipifica crime menos grave chamado de crime de ação de passagem Em síntese o agente pretendendo desde o início produzir o resultado mais grave pratica sucessivas violações ao bem jurídico Com a adoção do princípio da consunção para solução do conflito aparente de leis penais o crime mais grave absorve o menos grave Exemplo relação entre homicídio e lesão corporal Progressão criminosa Verificase quando ocorre mutação no dolo do agente que inicialmente realiza um crime menos grave e após quando já alcançada a consumação decide praticar outro delito de maior gravidade Há dois crimes mas o agente responde por apenas um deles o mais grave em face do princípio da consunção Exemplo A decide lesionar B com chutes e pontapés Em seguida com B já bastante ferido vem a matálo Responde apenas pelo homicídio pois uma vez punido pelo todo morte será também punido pela parte lesões corporais Crimes de impressão Nos dizeres de Mário O Folchi são aqueles que provocam determinado estado de ânimo na vítima Dividemse em crimes de inteligência são praticados mediante o engano do sujeito passivo como o estelionato CP art 171 crimes de vontade recaem na vontade da vítima no tocante à sua esfera de autodeterminação a exemplo do sequestro ou cárcere c 911931 privado CP art 148 e crimes de sentimento são os que incidem nas faculdades emocionais do ofendido tal como a injúria CP art 14021 Crimes militares O Decretolei 10011969 Código Penal Militar prevê crimes militares em tempo de paz e em tempo de guerra Os crimes militares em tempo de paz estão definidos no art 9º Consideramse crimes militares em tempo de paz I os crimes de que trata este Código quando definidos de modo diverso na lei penal comum ou nela não previstos qualquer que seja o agente salvo disposição especial II os crimes previstos neste Código e os previstos na legislação penal quando praticados a por militar em situação de atividade ou assemelhado contra militar na mesma situação ou assemelhado b por militar em situação de atividade ou assemelhado em lugar sujeito à administração militar contra militar da reserva ou reformado ou assemelhado ou civil c por militar em serviço ou atuando em razão da função em comissão de natureza militar ou em formatura ainda que fora do lugar sujeito à administração militar contra militar da reserva ou reformado ou civil d por militar durante o período de manobras ou exercício contra militar da reserva ou reformado ou assemelhado ou civil e por militar em situação de atividade ou assemelhado contra o patrimônio sob a administração militar ou a ordem administrativa militar III os crimes praticados por militar da reserva ou reformado ou por civil contra as instituições militares considerandose como tais não só os compreendidos no inciso I como os do inciso II nos seguintes casos a contra o patrimônio sob a administração militar ou contra a ordem administrativa militar b em lugar sujeito à administração militar contra militar em situação de atividade ou assemelhado ou contra funcionário de Ministério militar ou da Justiça Militar no exercício de função inerente ao seu cargo c contra militar em formatura ou durante o período de prontidão vigilância observação exploração exercício acampamento acantonamento ou manobras d ainda que fora do lugar sujeito à administração militar contra militar em função de natureza militar ou no desempenho de serviço de vigilância garantia e preservação da ordem pública administrativa ou judiciária quando legalmente requisitado para aquele fim ou em obediência a determinação legal superior De seu turno os crimes militares em tempo de guerra encontramse no art 10 Consideramse crimes militares em tempo de guerra I os especialmente previstos neste Código para o tempo de guerra II os crimes militares previstos para o tempo de paz III os crimes previstos neste Código embora também o sejam com igual definição na lei penal comum ou especial quando praticados qualquer que seja o agente a em território nacional ou estrangeiro militarmente ocupado b em qualquer lugar se comprometem ou podem comprometer a preparação a eficiência ou as operações militares ou de qualquer outra forma atentam contra a segurança externa do País ou podem expôla a perigo IV os crimes definidos na lei penal comum ou especial embora não previstos neste Código quando praticados em zona de efetivas operações militares ou em território estrangeiro militarmente ocupado Além disso os crimes militares também se subdividem em próprios e 911932 911933 911934 impróprios Crimes militares próprios ou puramente militares são os definidos exclusivamente pelo Código Penal Militar pois ofendem apenas as instituições e valores militares22 Exemplos deserção CPM art 187 e amotinamento CPM art 182 Por outro lado crimes militares impróprios são os que encontram previsão legislativa tanto no Código Penal Militar como também na legislação comum a exemplo do furto do roubo do estupro e do homicídio Crimes falimentares São os tipificados pela Lei de Falências Lei 111012005 Podem ser ante ou pósfalimentares conforme sejam praticados antes ou depois da sentença declaratória da falência ou ainda próprios ou impróprios se forem cometidos pelo falido ou por outra pessoa exemplo administrador judicial contador etc Crimes funcionais ou delicta in officio São aqueles cujo tipo penal exige seja o autor funcionário público23 Dividemse em próprios e impróprios Crimes funcionais próprios são aqueles em que a condição de funcionário público no tocante ao sujeito ativo é indispensável à tipicidade do fato A ausência desta condição conduz à atipicidade absoluta tal como ocorre na corrupção passiva e na prevaricação CP arts 317 e 319 respectivamente Nos crimes funcionais impróprios ou mistos se ausente a qualidade funcional operase a desclassificação para outro delito Exemplo no peculatofurto CP art 312 1º se desaparecer a condição de funcionário público no tocante ao autor subsiste o crime de furto CP art 155 Crimes parcelares São os crimes da mesma espécie que compõem a série da continuidade delitiva desde que presentes os demais requisitos exigidos pelo art 71 caput 911935 911936 do Código Penal Com efeito o ordenamento penal brasileiro filiouse no campo do crime continuado à teoria da ficção jurídica razão pela qual os diversos delitos parcelares são considerados para fins de aplicação da pena como um único crime Crimes de hermenêutica São os que resultam unicamente da interpretação dos operadores do Direito pois na situação concreta não existem provas nem sequer indícios consistentes da prática de um fato legalmente descrito como criminoso24 Esta expressão crimes de hermenêutica foi idealizada por Rui Barbosa Crimes de rua crimes do colarinho branco e do colarinho azul Crimes de rua são os praticados pelas pessoas de classes sociais desfavorecidas a exemplo dos furtos executados por miseráveis andarilhos e mendigos Esses delitos são cometidos aos olhos da sociedade em locais supervisionados pelo Estado praças parques favelas etc e por essa razão são frequentemente objeto das instâncias de proteção Polícia Ministério Público e Poder Judiciário Quando ficam alheios ao conhecimento do Poder Público integram as cifras negras do Direito Penal25 Os crimes de rua se contrapõem aos crimes do colarinho branco white collar crime26 cometidos por aqueles que gozam e abusam da elevada condição econômica e do poder daí decorrente como é o caso dos delitos contra o sistema financeiro nacional Lei 74921986 de lavagem de capitais Lei 96131998 e contra a ordem econômica Lei 81761991 entre tantos outros Nesses crimes socioeconômicos surgem as cifras douradas do Direito Penal indicativas da diferença apresentada entre a criminalidade real e a criminalidade conhecida e enfrentada pelo Estado Raramente existem registros envolvendo delitos dessa natureza inviabilizando a persecução penal e acarretando a impunidade das pessoas privilegiadas no âmbito econômico De fato em tais crimes o Poder Público pouco interfere pois são praticados em locais privados escritórios restaurantes de luxo casas 911937 911938 911939 apartamentos etc resultando no desconhecimento pelo Estado e consequentemente na ausência do correspondente registro para viabilizar a persecução penal Se os crimes econômicos são etiquetados como crimes do colarinho branco os crimes de rua são rotulados como crimes do colarinho azul27 aqueles fazem alusão às finas camisas utilizadas pelos executivos das grandes empresas enquanto estes se referem à cor dos macacões utilizados pelos operários norteamericanos da década de 1940 Crime liliputiano Crime liliputiano também chamado de crime anão ou crime vagabundo é o nome doutrinário reservado às contravenções penais28 Esta terminologia tem origem no livro Viagens de Gulliver do inglês Jonathan Swift no qual o personagem principal viaja por um mundo imaginário e em sua primeira jornada vai a Liliput terra em que os habitantes medem apenas 15 quinze centímetros de altura Na verdade não há crime ou delito em face da regra contida no art 1º do Decretolei 39141941 Lei de Introdução ao Código Penal Considera se crime a infração penal que a lei comina pena de reclusão ou de detenção quer isoladamente quer alternativa ou cumulativamente com a pena de multa contravenção a infração penal a que a lei comina isoladamente pena de prisão simples ou de multa ou ambas alternativa ou cumulativamente Crimes de catálogo Esta classificação surgiu em Portugal e diz respeito aos delitos compatíveis com a interceptação telefônica disciplinada pela Lei 92961996 como meio de investigação ou de produção de provas durante a instrução em juízo29 Crimes de acumulação ou crimes de dano cumulativo Esta classificação tem origem na Dinamarca kumulations delikte e parte da seguinte premissa determinadas condutas são incapazes isoladamente de ofender o valor ou interesse protegido pela norma penal 911940 911941 911942 Contudo a repetição delas cumulativamente consideradas constitui crime em face da lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico Exemplo Embora o comportamento seja imoral e ilícito quem joga lixo uma única vez e em quantidade pequena às margens de um riacho não comete o crime de poluição Contudo se esta conduta for reiterada surgirá o delito tipificado no art 54 da Lei 96051998 Lei dos Crimes Ambientais Crimes de olvido A palavra olvido deriva de olvidar ou seja esquecer Por esta razão os delitos de olvido são também conhecidos como delitos de esquecimento Cuidase de modalidade de crime omissivo impróprio espúrio ou comissivo por omissão caracterizado pela natureza culposa mais especificamente pela culpa inconsciente ou sem previsão Em outras palavras a omissão culposa do agente acarreta no descumprimento do seu dever de agir CP art 13 2º daí decorrendo a produção do resultado naturalístico Exemplo O pai estaciona seu automóvel em via pública em um dia de muito calor e dirigese ao supermercado porém esquece seu filho de tenra idade no interior do veículo Como o genitor demora a retornar a criança acaba falecendo em consequência da insolação e da asfixia a que foi submetida Não há falar em responsabilidade penal objetiva em face da presença da culpa inconsciente Crimes aberrantes Nessa classificação ingressam a aberratio causae erro sobre o nexo causal a aberratio ictus erro na execução e a aberratio delicti resultado diverso do pretendido modalidades de erro de tipo acidental Crime achado Essa classificação guarda íntima relação com o encontro fortuito de provas no processo penal princípio da serendipidade Para o Supremo Tribunal Federal crime achado é aquele desconhecido e não investigado até o momento em que vem a ser descoberto em face da apuração de outro delito a exemplo do que se verifica quando no bojo de uma interceptação telefônica voltada a investigar a prática de tráfico de drogas acaba por se revelar a autoria de um crime de homicídio30 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 STJ REsp 975962CE rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 19022009 PAGLIARO Antonio e COSTA JÚNIOR Paulo José da Dos crimes contra a administração pública 4 ed São Paulo Atlas 2009 p 24 Atentese para um dado interessante o estupro na redação original do Código Penal era crime bipróprio pois somente podia ser praticado por homem contra mulher entretanto após a entrada em vigor da Lei 120152009 passou a ser delito bicomum pois qualquer pessoa homem ou mulher pode figurar como seu sujeito ativo ou passivo Há somente uma exceção a esta regra consistente no crime de falsa perícia CP art 342 praticado em concurso por dois peritos contadores tradutores ou intérpretes Tratase de crime de mão própria cometido em coautoria Entretanto para a teoria do domínio do fato os crimes de mão própria admitem coautoria o sujeito pode ser autor do delito sem realizar o núcleo do tipo Basta que tenha o controle final do fato STF HC 71069SP rel Min Celso de Mello 1ª Turma j 10051994 STJ AgRg no REsp 1398837SC rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 05082014 PIMENTEL Manoel Pedro Crimes de mera conduta 3 ed São Paulo RT 1975 p 64 HC 244016ES rel Min Jorge Mussi 5ª Turma j 16102012 noticiado no Informativo 506 STJ AgRg no Resp 1347082RS rel Min Moura Ribeiro 5ª Turma j 21082014 STF HC 102087MG rel Min Celso de Mello rel p acórdão Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 28022013 O Supremo Tribunal Federal contudo já decidiu que a apropriação indébita previdenciária CP art 168A é delito omissivo próprio e material Inq 2537 AgRGO rel Min Marco Aurélio Plenário j 10032008 noticiado no Informativo 528 A matéria será minuciosamente estudada por ocasião da análise da relação de causalidade DAVILA Fabio Roberto Ofensividade e crimes omissivos próprios Coimbra Coimbra Editora 2005 p 291292 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 STJ HC 72661PE rel Min Og Fernandes rel p acórdão Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 24042012 Esta classificação é apresentada por FÜHRER Maximiliano Roberto Ernesto História do Direito Penal crime material e crime de plástico São Paulo Malheiros 2005 p 114115 STF HC 111017RS rel Min Ayres Britto 2ª Turma j 07022012 Para o STF esta contravenção penal não foi recepcionada pela Constituição Federal RE 583523RS rel Min Gilmar Mendes Plenário j 03102013 noticiado no Informativo 722 STJ HC 39908PR rel Min Arnaldo Esteves Lima 5ª Turma j 06122005 O fato de não ter sido consumado o crime não afasta a hediondez do delito STJ HC 220978RJ rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 16102012 noticiado no Informativo 506 SANTOS Juarez Cirino dos Direito penal parte geral 2 ed Curitiba ICPC Lumen Juris 2007 p 163 FOLCHI Mário O La importancia de la tipicidade en derecho penal Buenos Aires Depalma 1960 p 87 Há posição específica da Justiça castrense que coloca em destaque um critério processual Nesse sentido crime militar próprio é aquele cuja ação penal possa ser proposta somente em face de um militar NEVES Cícero Robson Coimbra STREIFINGER Marcelo Apontamentos de direito penal militar Parte geral São Paulo Saraiva 2005 v 1 p 50 Lembrese que aos processos relativos a crimes funcionais afiançáveis aplicase a regra prevista no art 514 do Código de Processo Penal E com a entrada em vigor da Lei 124032011 todos os crimes funcionais são afiançáveis a teor da regra disciplinada no art 323 do Código de Processo Penal STF Inq 2424RJ rel Min Cezar Peluso Plenário j 20112008 noticiado no Informativo 529 Acerca das cifras negras e do abolicionismo penal recomendase a leitura do Capítulo 32 item 329 Essa expressão foi idealizada em 1939 pelo sociólogo americano Edwin Sutherland Essa nomenclatura foi utilizada no STF pelo Min Luiz Fux no 28 29 30 julgamento do Mensalão Ap 470DF rel Min Joaquim Barbosa Plenário j 27082012 É da competência da Justiça estadual o julgamento de contravenções penais mesmo que conexas com delitos de competência da Justiça Federal A Constituição Federal expressamente excluiu em seu art 109 IV a competência da Justiça Federal para o julgamento das contravenções penais ainda que praticadas em detrimento de bens serviços ou interesse da União Tal orientação está consolidada na Súm n 38STJ STJ CC 120406RJ rel Min Alderita Ramos de Oliveira Desembargadora convocada do TJPE 3ª Seção j 12122012 noticiado no Informativo 511 STF HC 100524PR rel Min Joaquim Barbosa 2ª Turma j 27032012 HC 129678 rel orig Min Marco Aurélio red p o ac Min Alexandre de Moraes 1ª Turma j 13062017 noticiado no Informativo 869 101 INTRODUÇÃO Fato típico é o fato humano1 que se enquadra com perfeição aos elementos descritos pelo tipo penal A conduta de subtrair dolosamente para si coisa alheia móvel caracteriza o crime de furto uma vez que se amolda ao modelo delineado pelo art 155 caput do Código Penal Em sentido contrário fato atípico é a conduta que não encontra correspondência em nenhum tipo penal Por exemplo a ação do pai consistente em manter relação sexual consentida com sua filha maior de idade e plenamente capaz é atípica pois o incesto ainda que imoral não é crime São quatro os elementos do fato típico conduta resultado naturalístico relação de causalidade nexo causal e tipicidade Tais elementos estarão presentes simultaneamente nos crimes materiais consumados Com efeito se o crime material é aquele em que o tipo penal aloja em seu interior uma conduta e um resultado naturalístico modificação do mundo exterior provocada pelo comportamento do agente exigindo a produção deste último para a consumação os quatro elementos estarão presentes 102 quando consumado o delito De fato a conduta produz o resultado naturalístico ligados entre si pela relação de causalidade E finalmente para ter relevância penal deve operarse o juízo de tipicidade isto é subsunção entre a ação ou omissão do agente e o modelo previsto no tipo penal Em caso de tentativa suprimemse o resultado naturalístico não produzido por circunstâncias alheias à vontade do agente e o nexo causal limitandose o fato típico aos elementos conduta e tipicidade Nos crimes formais e de mera conduta os componentes do fato típico também são a conduta e a tipicidade Vale recordar que nos crimes de mera conduta jamais haverá resultado naturalístico razão pela qual se subtrai a relação de causalidade enquanto nos crimes formais o resultado naturalístico pode até ocorrer mas não é necessário para a consumação Passemos à análise de cada um dos elementos do fato típico CONDUTA Na delimitação do conceito de conduta reside uma das maiores discussões do Direito Penal Não é exagerado afirmar que a forma como atualmente se encontra desenvolvida a teoria geral do crime se deve à evolução do conceito doutrinário de conduta Várias teorias buscam definila e a adoção de cada uma delas importa em modificações estruturais na forma de encarar o Direito Penal Vejamos as mais importantes Conduta é o comportamento humano voluntário que produz modificação no mundo exterior Essa teoria foi idealizada no século XIX por Liszt Beling e Radbruch e foi recepcionada no Brasil por diversos penalistas de destaque tais como Aníbal Bruno Costa e Silva E Magalhães Noronha José Frederico Marques Basileu Garcia Manoel Pedro Pimentel e Nélson Hungria Submete o Direito Penal às regras inerentes às ciências naturais orientadas pelas leis da causalidade A vontade humana engloba duas partes diversas uma externa objetiva correspondente ao processo causal isto é ao movimento corpóreo do ser humano e outra interna subjetiva relacionada ao conteúdo final da ação Em síntese a vontade é a causa da conduta e a conduta é a causa do resultado Não há vontade no tocante à produção do resultado O elemento volitivo interno acarreta em um movimento corporal do agente o qual objetivamente produz o resultado A caracterização da conduta criminosa depende somente da circunstância de o agente produzir fisicamente um resultado previsto em lei como infração penal independentemente de dolo ou culpa Em outras palavras para a configuração da conduta basta apenas uma fotografia do resultado Imaginese o seguinte exemplo A trafega cautelosamente com seu carro em via pública a 40 kmh O limite da pista é de 60 kmh e o veículo reúne perfeitas condições de uso De repente uma criança se solta dos braços da mãe passa por trás de um ônibus que estava estacionado em local permitido e impedia a visibilidade de A e inesperadamente lançase na direção do automóvel chocandose contra ele A criança morre O agente não tinha dolo nem culpa Qual é a fotografia do evento Resposta A na direção do seu veículo automotor uma criança morta à sua frente e o parachoque do carro amassado Para a teoria clássica A teria praticado uma conduta penalmente relevante Com efeito a sua ação dirigir o automóvel ensejou um resultado no mundo exterior morte da criança Tratase de mera relação de causa e efeito Daí o nome teoria causal ou mecanicista Presentes assim conduta e resultado naturalístico bem como o nexo causal eis que a criança morreu em consequência do suposto atropelamento Além disso há tipicidade pois a conduta de matar alguém encontra correspondência no art 121 do Código Penal Configurado portanto o fato típico do crime de homicídio Em decorrência questionase A teoria clássica consagra a responsabilidade penal objetiva A resposta é negativa Porém o examinador vai insistir Mas como fica o elemento subjetivo dolo ou culpa E respondemos Na teoria clássica dolo e culpa se alojam no interior da culpabilidade momento em que se procede à análise do querer interno do agente Por essa razão já dissemos ao abordar o conceito analítico de crime que para os adeptos da teoria clássica crime é necessariamente o fato típico e ilícito praticado por agente culpável sob pena de restar caracterizada a responsabilidade penal objetiva No exemplo citado não haveria crime por ausência de culpabilidade O fato seria típico e ilícito pois não se encontra presente nenhuma causa de exclusão da ilicitude mas não existiria a culpabilidade pela falta de um dos seus elementos dolo ou culpa O principal defeito dessa teoria é separar a conduta praticada no mundo exterior movimento corporal objetivo da relação psíquica do agente conteúdo volitivo deixando de analisar a sua vontade Fica claro portanto que a teoria clássica não distingue a conduta dolosa da conduta culposa pois ambas são analisadas objetivamente uma vez que não se faz nenhuma indagação sobre a relação psíquica do agente para com o resultado Da mesma forma não explica de modo idôneo os crimes omissivos próprios nem os formais nem os de mera conduta Ainda não convence no que diz respeito aos crimes tentados pois em todos eles não há resultado naturalístico apto a possibilitar a fotografia do delito Bastante consagrada em décadas passadas essa teoria foi ao longo do tempo cada vez mais abandonada encontrando atualmente poucos seguidores Foi criada por Hans Welzel jusfilósofo e penalista alemão no início da década de 30 do século passado Posteriormente teve grande acolhida no Brasil compartilhando de seus ideais ilustres penalistas como Heleno Cláudio Fragoso René Ariel Dotti Damásio E de Jesus Julio Fabbrini Mirabete e Miguel Reale Júnior Tem como ponto de partida a concepção do homem como ser livre e responsável pelos seus atos Consequentemente as regras do Direito não podem ordenar ou proibir meros processos causais mas apenas atos dirigidos finalisticamente ou então a omissão de tais atos2 Para essa teoria conduta é o comportamento humano consciente e voluntário dirigido a um fim Daí o seu nome finalista levando em conta a finalidade do agente Não desprezou todos os postulados da teoria clássica Ao contrário preservouos a eles acrescentando a nota da finalidade Uma conduta pode ser contrária ou conforme ao Direito dependendo do elemento subjetivo do agente Destarte dolo e culpa que na teoria clássica residiam na culpabilidade foram deslocados para o interior da conduta e portanto para o fato típico Formouse assim uma culpabilidade vazia desprovida do dolo e da culpa Desta forma o partidário do finalismo penal pode adotar um conceito analítico de crime tripartido ou bipartido conforme repute a culpabilidade como elemento do crime ou pressuposto de aplicação da pena Welzel sustentava que a causalidade exterior é cega pois não analisa o querer interno do agente Por seu turno a finalidade por ser guiada é vidente No exemplo adotado em relação à teoria clássica a resposta seria diversa no tocante à teoria finalista Com efeito o comportamento de A não poderia ser considerado conduta penalmente relevante em face da ausência de dolo ou culpa Não haveria crime desde já pela inexistência do fato típico matar alguém O Código Penal em vigor com a Reforma da Parte Geral pela Lei 72091984 parece ter manifestado preferência pelo finalismo penal Uma forte evidência se encontra no art 20 caput O erro sobre o elemento constitutivo do tipo legal de crime exclui o dolo mas permite a punição por crime culposo se previsto em lei Ora se a ausência de dolo acarreta na exclusão do fato típico ainda que somente na forma dolosa é porque o dolo está na conduta do agente que deixa de ser dolosa para ser culposa A teoria finalista foi bastante criticada no tocante aos crimes culposos pois não se sustentava a finalidade da ação concernente ao resultado naturalístico involuntário Alegase todavia que no crime culposo também há vontade dirigida a um fim Mas esse fim será conforme ou não ao Direito de maneira que a reprovação nos crimes culposos não incide na finalidade do agente mas nos meios por ele escolhidos para atingir a finalidade desejada indicativos da imprudência da negligência ou da imperícia Entretanto parece que nem mesmo Welzel conseguiu adequar com precisão a teoria finalista aos crimes culposos Na última etapa de seus estudos vislumbrou ainda que superficialmente substituir a teoria finalista por uma outra teoria denominada cibernética Essa teoria também conhecida como ação biociberneticamente antecipada3 leva em conta o controle da vontade presente tanto nos crimes dolosos como nos crimes culposos Como já mencionado busca compatibilizar o finalismo penal com os crimes culposos Na explicação de Everardo da Cunha Luna Welzel informa que ao tomar do campo da filosofia de Nicolai Hartmann pela primeira vez e em 1935 o termo finalidade outra expressão não existia que se adequasse ao seu pensamento sobre a ação humana Ao surgir porém em 1948 com Norbert Wiener o termo cibernética seria melhor talvez preferilo ao termo finalidade para designar a ação como fato dirigido e orientado pela vontade Como porém o termo cibernética tem uma significação precisa no campo da matemática deve ser mantido o uso linguístico jurídicopenal finalidade sabendose desde já que ocasiona malentendidos ao ser interpretado de uma maneira estreita e literal Se não fora o inconveniente indicado a ação cibernética compreenderia com clareza o dolo e a culpa abrangendo em ambos o que existe de juridicamente relevante ou seja a direção4 Destarte pelo fato de ter sido consagrada no âmbito jurídico e mostrarse mais pertinente ao estudo do Direito Penal mantevese a denominação finalismo penal Para essa teoria os ideais clássico e finalista são insuficientes para disciplinar a conduta porque desconsiderariam uma nota essencial do comportamento humano o seu aspecto social Nesse contexto Johannes Wessels na tentativa de equacionar esse problema criou a teoria social da ação HansHeinrich Jescheck partidário dessa teoria define a conduta como o comportamento humano com transcendência social5 Por comportamento devese entender a resposta do homem a exigências situacionais mediante a concretização da possibilidade de reação que lhe é autorizada pela sua liberdade Assim socialmente relevante seria a conduta capaz de afetar o relacionamento do agente com o meio social em que se insere Essa teoria não exclui os conceitos causal e final de ação Deles se vale acrescentandolhes o caráter da relevância social Para os seus defensores a vantagem dessa teoria consiste no fato de o elemento sociológico cumprir a missão de permitir ao Poder Judiciário a supressão do vácuo criado pelo tempo entre a realidade jurídica e a realidade social Um fato não pode ser tipificado pela lei como infração penal e simultaneamente ser tolerado pela sociedade caso em que estaria ausente um elemento implícito do tipo penal presente em todo modelo descritivo legal consistente na repercussão social da conduta Por corolário para que o agente pratique uma infração penal é necessário que além de realizar todos os elementos previstos no tipo penal tenha também a intenção de produzir um resultado socialmente relevante A principal crítica que se faz a essa teoria repousa na extensão do conceito de transcendência ou relevância social que se presta a tudo inclusive a fenômenos acidentais e da natureza A morte de uma pessoa provocada por uma enchente por exemplo possui relevância social na medida em que enseja o nascimento modificação e extinção de direitos e obrigações Com efeito ao mesmo tempo em que não se pode negar relevância social a b c d e ao delito também se deve recordar que tal qualidade é inerente a todos os fatos jurídicos e não apenas aos pertencentes ao Direito Penal É a teoria sustentada por Francisco de Assis Toledo para superar os entraves travados entre as vertentes clássica finalista e social Em suas palavras essa definição almeja conciliar os pontos positivos extraídos de cada uma delas Nesse sentido Ação é o comportamento humano dominado ou dominável pela vontade dirigido para a lesão ou para a exposição a perigo de um bem jurídico ou ainda para a causação de uma previsível lesão a um bem jurídico6 Deve ser lembrado que a palavra ação é empregada por Assis Toledo em sentido amplo como sinônimo de conduta englobando assim a ação propriamente dita e a omissão Essa teoria coloca em destaque segundo seu autor o comportamento humano englobando a ação e a omissão a vontade exclusiva do ser humano o poder de outromodo poder agir de outro modo que permite ao homem o domínio da vontade o aspecto causalteleológico do comportamento e a lesão ou perigo a um bem jurídico Com base nas lições filosóficas de Ludwig Wittgenstein e Jürgen Habermas o penalista espanhol Tomás Salvador Vives Antón desenvolveu a teoria da ação significativa ou conceito significativo de ação com substrato normativo apresentando uma nova definição de conduta penalmente relevante Essa proposta doutrinária tem como pilares fundamentais os conceitos de ação e norma unidos pela ideia central de liberdade de ação compreendida como aquela que permite identificar a ação como obra do agente e não do acaso Vives Antón questiona o entendimento da ação no Direito Penal como consequência de uma concepção meramente cartesiana ou seja compreendida como um fato composto de um aspecto físico movimento corporal e de um aspecto mental vontade o qual possibilita tão somente distinguir os fatos humanos dos fatos naturais e dos fatos dos animais A ação deve ser visualizada de forma diversa não como o que as pessoas fazem mas como o significado do que fazem As ações não são meros acontecimentos têm um sentido significado e por isso não basta descrevê las é necessário entendêlas interpretálas Diante dos fatos que podem explicarse segundo as leis físicas químicas biológicas ou matemáticas as ações humanas devem ser interpretadas de acordo com as regras ou normas Como destaca Paulo César Busato As ações não sendo meros acontecimentos exigem interpretação Vale dizer não basta mais que as ações sejam meramente descritas senão que é necessário que elas sejam interpretadas e compreendidas Enquanto os meros fatos da vida podem ser explicados por regras imutáveis como as leis da física da química ou da biologia conquanto ainda nessas ciências o componente da indeterminação já foi identificado as ações humanas têm a característica diferenciadora de que somente podem ser identificadas classificadas e interpretadas conforme regras ou normas Por exemplo não se pode afirmar que um tapa no rosto seja uma lesão corporal uma injúria um comportamento rude ou até mesmo um ato reflexo sem uma análise das circunstâncias em que ocorre para verificação de como deve ser interpretado e compreendido referido tapa até mesmo para a definição de se pode mesmo ser considerado um tapa7 Portanto não existe um conceito universal e ontológico de ação Não há um modelo matemático ou uma fórmula lógica que permita oferecer um conceito de ação humana válido para todas as diferentes espécies de ações que o ser humano pode realizar Em outras palavras as ações não existem previamente às regras que as definem Nesse contexto falase na ação de matar porque antes existe uma norma art 121 do Código Penal definindo essa conduta O conceito de ação resumese à ideia de conduta típica Logo não há um conceito geral de ação mas tantos conceitos de ação como espécies de condutas relevantes para o Direito Penal segundo as diversas características com as que são descritas normativamente Nesse contexto somente se pode perguntar se houve ação humana relevante para o Direito Penal quando se puder relacionála a determinado tipo penal homicídio furto estupro etc Apenas se houver a reunião dos elementos exigidos pela norma tipificadora teremos o significado jurídico do que denominamos crime de homicídio furto estupro etc Destarte a teoria significativa da ação sustenta que os fatos humanos somente podem ser compreendidos por meio das normas ou seja o seu significado existe somente em virtude das normas as quais lhes são preexistentes O tipo incriminador passa a ser entendido como tipo de ação um dos grandes marcos dessa proposta doutrinária Adotamos uma posição finalista indiscutivelmente a mais aceita em provas e concursos públicos Desse modo conduta é a ação ou omissão humana consciente e voluntária dirigida a um fim consistente em produzir um resultado tipificado em lei como crime ou contravenção penal Não há crime sem conduta pois o Direito Penal ao contrário do sugerido por Vicenzo Manzini não aceita os crimes de mera suspeita isto é aqueles em que o agente não é punido por sua conduta e sim pela suspeita despertada pelo seu modo de agir Nesse contexto a contravenção penal prevista no art 25 do Decretolei 36881941 Lei das Contravenções Penais Ter alguém em seu poder depois de condenado por crime de furto ou roubo ou enquanto sujeito à liberdade vigiada ou quando conhecido como vadio ou mendigo gazuas chaves falsas ou alteradas ou instrumentos empregados usualmente na prática de crime de furto desde que não prove destinação legítima não foi recepcionada pela Constituição Federal de 1988 Constituise em resquício do direito penal do autor pois o agente é punido em virtude da sua condição pessoal independentemente da prática de um fato concreto capaz de lesar ou expor a perigo de lesão um bem jurídico penalmente tutelado Na ótica do Supremo Tribunal Federal O art 25 da Lei de Contravenções Penais LCP Decretolei 368841 Art 25 Ter alguém em seu poder depois de condenado por crime de furto ou roubo ou enquanto sujeito à liberdade vigiada ou quando conhecido como vadio ou mendigo gazuas chaves falsas ou alteradas ou instrumentos empregados usualmente na prática de crime de furto desde que não prove destinação legítima Pena prisão simples de dois meses a um ano e multa de duzentos mil réis a dois contos de réis não é compatível com a Constituição de 1988 por violar os princípios da dignidade da pessoa humana CF art 1º III e da isonomia CF art 5º caput e I Essa a conclusão do Plenário que deu provimento a recursos extraordinários julgados em conjunto e absolveu os recorrentes nos termos do art 386 III do CPP Discutiase a temática relativa à recepção do mencionado art 25 da LCP pelo novo ordenamento constitucional No caso os recorrentes foram condenados pela posse injustificada de instrumento de emprego usual na prática de furto tendo em conta condenação anterior pelo aludido crime CP art 155 4º No mérito destacouse que o princípio da ofensividade deveria orientar a aplicação da lei penal de modo a permitir a aferição do grau de potencial ou efetiva lesão ao bem jurídico protegido pela norma Observouse que não obstante a contravenção impugnada ser de mera conduta exigiria para a sua configuração que o agente tivesse sido condenado anteriormente por furto ou roubo ou que estivesse em liberdade vigiada ou que fosse conhecido como vadio ou mendigo Assim salientouse que o legislador teria se antecipado a possíveis e prováveis resultados lesivos o que caracterizaria a presente contravenção como uma infração de perigo abstrato Frisouse que a LCP fora concebida durante o regime ditatorial e por isso o anacronismo do tipo contravencional Asseverou se que a condição especial ser conhecido como vadio ou mendigo atribuível ao sujeito ativo criminalizaria em verdade qualidade pessoal e econômica do agente e não fatos objetivos que causassem relevante lesão a bens jurídicos importantes ao meio social Consignouse no ponto a inadmissão pelo sistema penal brasileiro do direito penal do autor em detrimento do direito penal do fato No que diz respeito à consideração da vida pregressa do agente como elementar do tipo afirmouse o não cabimento da presunção de que determinados sujeitos teriam maior potencialidade de cometer novas infrações penais Por fim registrouse que sob o enfoque do princípio da proporcionalidade a norma em questão não se mostraria adequada e necessária bem como afrontaria o subprincípio da proporcionalidade em sentido estrito8 Quando pratica uma infração penal o ser humano viola o preceito proibitivo crimes comissivos ou preceptivo crimes omissivos contido na lei penal a qual pode ser proibitiva ou preceptiva Leis penais proibitivas são as que proíbem determinados comportamentos e correspondem aos crimes comissivos Quando o tipo penal descreve uma ação a lei penal contém um preceito proibitivo No art 121 do Código Penal o preceito proibitivo é não matar Por seu turno leis penais preceptivas são as que impõem a realização de uma ação isto é reclamam um comportamento positivo Quando o tipo penal descreve uma omissão a lei penal contém um preceito preceptivo e o seu descumprimento se verifica com a omissão de um comportamento devido por lei No art 135 do CP o mandamento é prestar assistência A conduta pode se exteriorizar por ação ou por omissão A ação consiste em um movimento corporal exterior Reclama do ser humano uma postura positiva um fazer Relacionase com a maioria dos delitos por meio de uma norma proibitiva Por outro lado a omissão não se constitui em um mero comportamento estático É sim a conduta de não fazer aquilo que podia e devia ser feito em termos jurídicos e se refere às normas preceptivas A omissão pode ser vislumbrada tanto quando o agente nada faz bem 1 como quando faz algo diferente daquilo que lhe impunha o dever jurídico de agir Exemplo pratica o crime de omissão de socorro definido pelo art 135 do Código Penal o agente que permanece inerte diante da pessoa necessitada assim como aquele que se afasta do local sem prestarlhe assistência A teoria naturalística sustenta ser a omissão um fenômeno causal que pode ser constatado no mundo fático pois em vez de ser considerada uma inatividade caracterizase como verdadeira espécie de ação Portanto quem se omite efetivamente faz alguma coisa Já para a teoria normativa a omissão é um indiferente penal pois o nada não produz efeitos jurídicos Destarte o omitente não responde pelo resultado pois não o provocou Essa teoria contudo aceita a responsabilização do omitente pela produção do resultado desde que seja a ele atribuído por uma norma o dever jurídico de agir Essa é a razão de sua denominação normativa norma A omissão é assim não fazer o que a lei determinava que se fizesse Foi a teoria acolhida pelo Código Penal9 Em verdade nos crimes omissivos próprios ou puros a norma impõe o dever de agir no próprio tipo penal preceito preceptivo Já nos crimes omissivos impróprios espúrios ou comissivos por omissão o tipo penal descreve uma ação preceito proibitivo mas a omissão do agente que descumpre o dever jurídico de agir definido pelo art 13 2º do Código Penal acarreta a sua responsabilidade penal pela produção do resultado naturalístico A conduta se reveste das seguintes características O ser humano e apenas ele pode praticar condutas penalmente relevantes Os acontecimentos naturais e os atos dos seres irracionais produzidos sem a interferência do homem não interessam ao Direito Penal É possível também para quem se filia 2 3 4 a essa posição a prática de condutas por pessoas jurídicas relativamente aos crimes ambientais Somente a conduta voluntária interessa ao Direito Penal A vontade qualquer que seja a teoria adotada é elemento constitutivo da conduta O Direito Penal se alicerça na evitabilidade razão pela qual só são pertinentes as condutas que poderiam ser evitadas Apenas os atos lançados ao mundo exterior ingressam no conceito de conduta O simples querer interno do agente cogitação é desprezado pelo Direito Penal pois ainda não há sequer perigo de lesão ao bem jurídico protegido pela norma Enquanto a vontade não for libertada do claustro psíquico não produz efeitos jurídicos10 A conduta é composta de dois elementos um ato de vontade dirigido a um fim e a manifestação da vontade no mundo exterior por meio de uma ação ou omissão dominada ou dominável pela vontade Esse é o elemento mecânico que concretiza no mundo fático o querer interno do agente Apontamse as seguintes hipóteses como de exclusão da conduta 1 Caso fortuito e força maior são os acontecimentos imprevisíveis e inevitáveis que fogem do domínio da vontade do ser humano E se não há vontade não há dolo nem culpa Consequentemente como dolo e culpa integram a conduta não se configura esse elemento do fato típico Em que pese a ampla divergência doutrinária podese entender o caso fortuito como o acontecimento imprevisível e inevitável provocado pelo homem ex greve de ônibus e por força maior o evento com iguais predicados mas decorrente da natureza ex inundação provocada por uma tempestade 2 Atos ou movimentos reflexos consistem em reação motora ou secretora em consequência de uma excitação dos sentidos O movimento corpóreo não se deve ao elemento volitivo mas sim ao fisiológico Ausente a vontade estará ausente também a conduta É o caso do ortopedista que bate o martelinho contra o joelho do paciente Se em razão do reflexo seu chute atingir o médico não se poderá falar em lesões corporais ou na contravenção de vias de fato Não houve vontade penalmente relevante mas resposta fisiológica à provocação médica Os atos reflexos entretanto não se confundem com as ações em curto circuito derivadas dos atos impulsivos fundamentados em emoções ou paixões violentas Nesses casos há o elemento volitivo que estimula a conduta criminosa Exemplo A passa na direção de B e dele zomba motivandoo a repentinamente desferir socos no provocador Há vontade e por corolário conduta penalmente relevante Os movimentos reflexos devem ser diferenciados ainda dos atos habituais mecânicos ou automáticos que consistem na reiteração de um comportamento É o caso de conduzir veículo automotor com apenas uma das mãos ao volante Caso o agente atropele e mate alguém responderá pelo crime tipificado pelo art 302 da Lei 95031997 Código de Trânsito Brasileiro pois tal hábito era dominável pela vontade 3 Coação física irresistível também chamada de vis absoluta ocorre quando o coagido não tem liberdade para agir Não lhe resta nenhuma outra opção a não ser praticar um ato em conformidade com a vontade do coator Imagine a situação em que um homem muito forte obriga fisicamente outra pessoa bastante franzina a apertar o gatilho de um revólver municiado na direção de seu desafeto Em suma pressiona o dedo do coagido contra o gatilho A vítima é atingida e morre O coagido serviu como instrumento do crime Não agiu de forma voluntária excluindose sua conduta Nesse caso não se pode falar em hipótese alguma em concurso de agentes por falta do elemento subjetivo convergência de vontades exigível para tanto Por outro lado na coação moral irresistível ou vis compulsiva o coagido pode escolher o caminho a ser seguido obedecer ou não a ordem do coator Como a sua vontade existe porém de forma viciada excluise a culpabilidade em face da inexigibilidade de conduta diversa 103 Em suma enquanto a coação física irresistível exclui a conduta e portanto o fato típico a coação moral irresistível funciona como causa excludente da culpabilidade em face da inexigibilidade de conduta diversa 4 Sonambulismo e hipnose também não há conduta por falta de vontade nos comportamentos praticados em completo estado de inconsciência Anotese que a embriaguez voluntária ou culposa embora completa não exclui a conduta Subsiste a imputabilidade e consequentemente a culpabilidade CP art 28 II RESULTADO Resultado é a consequência provocada pela conduta do agente Nada obstante algumas poucas divergências as palavras resultado e evento podem ser utilizadas como sinônimas Anotese porém existir no Brasil a preferência por resultado Essa distinção terminológica é irrelevante Importa considerar somente o que ambas significam11 Em Direito Penal o resultado pode ser jurídico ou naturalístico Resultado jurídico ou normativo é a lesão ou exposição a perigo de lesão do bem jurídico protegido pela lei penal É simplesmente a violação da lei penal mediante a agressão do valor ou interesse por ela tutelado 104 Resultado naturalístico ou material é a modificação do mundo exterior provocada pela conduta do agente É comum a seguinte indagação Existe crime sem resultado E a resposta mais uma vez é Depende Não há crime sem resultado jurídico pois todo delito agride bens jurídicos protegidos pelo Direito Penal Recordese do conceito material de crime segundo o qual não há crime quando a ação ou omissão humana não lesa ou expõe a perigo de lesão bens jurídicos penalmente tutelados Entretanto é possível um crime sem resultado naturalístico O resultado naturalístico estará presente somente nos crimes materiais consumados Se tentado o crime ainda que material não haverá resultado naturalístico Nos crimes formais ainda que possível sua ocorrência é dispensável o resultado naturalístico E finalmente nos crimes de mera conduta ou de simples atividade jamais se produzirá tal espécie de resultado Em síntese todo crime tem resultado jurídico embora não se possa apresentar igual afirmativa em relação ao resultado naturalístico RELAÇÃO DE CAUSALIDADE OU NEXO CAUSAL Empregase comumente a expressão nexo causal para referirse à ligação entre a conduta e o resultado O art 13 do Código Penal todavia preferiu falar em relação de causalidade Essa portanto é a denominação legal Estabelece o art 13 do Código Penal Art 13 O resultado de que depende a existência do crime somente é imputável a quem lhe deu causa Considerase causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido 1º A superveniência de causa relativamente independente exclui a imputação quando por si só produziu o resultado os fatos anteriores entretanto imputamse a quem os praticou 2º A omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para evitar o resultado O dever de agir incumbe a quem a tenha por lei obrigação de cuidado proteção ou vigilância b de outra forma assumiu a responsabilidade de impedir o resultado c com seu comportamento anterior criou o risco da ocorrência do resultado Relação de causalidade é o vínculo formado entre a conduta praticada por seu autor e o resultado por ele produzido É por meio dela que se conclui se o resultado foi ou não provocado pela conduta autorizando se presente a tipicidade a configuração do fato típico Prevalece na doutrina brasileira o entendimento de que a expressão o resultado constante no início do art 13 caput do Código Penal alcança somente o resultado naturalístico isto é a modificação externa provocada pela conduta praticada por alguém Destarte o estudo da relação de causalidade tem pertinência apenas aos crimes materiais Nesses delitos o tipo penal descreve uma conduta e um resultado naturalístico exigindo a produção desse último para a consumação É aí que entra em cena o nexo causal para ligar a conduta do agente ao resultado material Nos crimes de atividade o resultado naturalístico pode ocorrer formais ou não de mera conduta De qualquer forma é dispensável pois se consumam com a simples prática da conduta ilícita Destacamse três teorias na busca de definir a relação de causalidade 1ª teoria Equivalência dos antecedentes também chamada de teoria da equivalência das condições teoria da condição simples teoria da condição generalizadora ou finalmente teoria da conditio sine qua non foi criada por Glaser12 e posteriormente desenvolvida por Von Buri e Stuart Mill em 1873 Para essa teoria causa é todo fato humano sem o qual o resultado não teria ocorrido quando ocorreu e como ocorreu 2ª teoria Teoria da causalidade adequada também chamada de teoria da condição qualificada ou teoria individualizadora originouse dos estudos de Von Kries um fisiólogo e não jurista Causa nesse contexto é o antecedente não só necessário mas adequado à produção do resultado Para que se possa atribuir um resultado à determinada pessoa é necessário que ela além de praticar um antecedente indispensável realize uma atividade adequada à sua concretização Considerase a conduta adequada quando é idônea a gerar o efeito A idoneidade baseiase na regularidade estatística Descarte concluise que a conduta adequada humana e concreta fundase no id quod plerumque accidit excluindo os acontecimentos extraordinários fortuitos excepcionais anormais Não são levadas em conta todas as circunstâncias necessárias mas somente aquelas que além de indispensáveis sejam idôneas à produção do resultado13 Portanto a causa adequada é aferida de acordo com o juízo do homem médio e com a experiência comum Não basta contribuir de qualquer modo para o resultado a contribuição deve ser eficaz 3ª teoria Teoria da imputação objetiva será estudada em tópico separado Acolheuse como regra a teoria da equivalência dos antecedentes É o que se extrai do art 13 caput in fine Considerase causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido Causa pois é todo o comportamento humano comissivo ou omissivo que de qualquer modo concorreu para a produção do resultado naturalístico Pouco importa o grau de contribuição Basta que tenha contribuído para o resultado material na forma e quando ocorreu Não há diferença entre causa condição fator que autoriza à causa a produção de seu efeito ou ocasião circunstância acidental que estimula favoravelmente a produção da causa E para se constatar se algum acontecimento inserese ou não no conceito de causa empregase o processo hipotético de eliminação desenvolvido em 1894 pelo sueco Thyrén Suprimese mentalmente determinado fato que compõe o histórico do crime se desaparecer o resultado naturalístico é porque era também sua causa todavia se com a sua eliminação permanecer íntegro o resultado material não se pode falar que aquele acontecimento atuou como sua causa Confirase o famoso exemplo de Damásio E de Jesus Suponhase que A tenha matado B A conduta típica do homicídio possui uma série de fatos alguns antecedentes dentre os quais podemos sugerir os seguintes 1º a produção do revólver pela indústria 2º aquisição da arma pelo comerciante 3º compra do revólver pelo agente 4º refeição tomada pelo homicida 5º emboscada 6º disparo de projéteis na vítima 7º resultado morte Dentro dessa cadeia de fatos excluindose os fatos sob nos números 1º a 3º 5º e 6º o resultado não teria ocorrido Logo são considerados causa Excluindose o fato sob o número 4º refeição ainda assim o evento teria acontecido Logo a refeição tomada pelo sujeito não é considerada causa14 Contra essa teoria foram endereçadas algumas críticas A principal delas consistiria na circunstância de ser uma teoria cega porque possibilitaria a regressão ao infinito regressus ad infinitum Como causa é todo acontecimento que de qualquer modo contribui para o resultado poderia operarse o retorno ao início dos tempos A matou B Consequentemente poderiam ser seus pais responsabilizados pois sem a concepção do filho a vítima não teria morrido E assim sucessivamente até o primeiro dos seus antepassados Essa crítica contudo é despropositada Para que um acontecimento ingresse na relação de causalidade não basta a mera dependência física Exigese ainda a causalidade psíquica imputatio delicti é dizer reclamase a presença do dolo ou da culpa por parte do agente em relação ao resultado De fato a falta do dolo ou da culpa afasta a conduta a qual por seu turno obsta a configuração do nexo causal A título ilustrativo a venda lícita de uma arma de fogo por si só não ingressa no nexo causal de um homicídio com ela praticado Entretanto se o vendedor sabia da intenção do comprador e desejando a morte do ofendido facilitou de qualquer modo a alienação do produto sua conduta será considerada causa do crime posteriormente cometido Excepcionalmente o Código Penal adota no 1º do art 13 a teoria da causalidade adequada Em síntese o art 13 do Código Penal acolheu como regra a teoria da equivalência dos antecedentes caput in fine e excepcionalmente a teoria da causalidade adequada 1º o que nos remete ao estudo das concausas A palavra concausa diz respeito à concorrência de causas ou seja há mais de uma causa contribuindo para o resultado final Em outras palavras concausa é a convergência de uma causa externa à vontade do autor da conduta e que influi na produção do resultado naturalístico por ele desejado Causa dependente é a que precisa da conduta do agente para provocar o resultado ou seja não é capaz de produzilo por si própria razão pela qual não exclui a relação de causalidade Exemplo A tem a intenção de matar B Após espancálo coloca uma corda em seu pescoço amarrandoa ao seu carro Em seguida dirige o automóvel arrastando a vítima ao longo da estrada circunstância que provoca a sua morte A estrada a corda e o carro não são capazes de matar a vítima se isoladamente consideradas De fato tais acontecimentos somente levaram ao óbito porque o agente havia previamente espancado a vítima e depois a amarrou com uma corda ao carro e arrastou o corpo pela via pública Causa independente por sua vez é aquela capaz de produzir por si só o resultado15 Pode ser de natureza absoluta ou relativa dependendo da sua origem São aquelas que não se originam da conduta do agente isto é são absolutamente desvinculadas da sua ação ou omissão ilícita E por serem independentes produzem por si sós o resultado naturalístico Constituem a chamada causalidade antecipadora16 pois rompem o nexo causal Dividemse em preexistentes ou estado anterior concomitantes e supervenientes É aquela que existe anteriormente à prática da conduta O resultado naturalístico teria ocorrido da mesma forma mesmo sem o comportamento ilícito do agente Exemplo A efetua disparos de arma de fogo contra B atingindoo em regiões vitais O exame necroscópico todavia conclui ter sido a morte provocada pelo envenenamento anterior efetuado por C É a que incide simultaneamente à prática da conduta Surge no mesmo instante em que o agente realiza seu comportamento criminoso Exemplo A efetua disparos de arma de fogo contra B no momento em que o teto da casa deste último desaba sobre sua cabeça É a que se concretiza posteriormente à conduta praticada pelo agente Exemplo A subministra dose letal de veneno a B mas antes que se produzisse o efeito almejado surge C antigo desafeto de B que nele efetua inúmeros disparos de arma de fogo por todo o corpo matandoo Em todas as modalidades preexistentes concomitantes e supervenientes o resultado naturalístico ocorre independentemente da conduta do agente As causas surgem de forma autônoma isto é não se ligam ao comportamento criminoso do agente E por serem independentes produzem por si sós o resultado material17 Por corolário devem ser imputados ao agente somente os atos praticados e não o resultado naturalístico em face da quebra da relação de causalidade De fato suprimindo mentalmente sua conduta ainda assim o resultado teria ocorrido como ocorreu Respeitase a teoria da equivalência dos antecedentes ou conditio sine qua non adotada pelo art 13 caput in fine do Código Penal Nos exemplos mencionados o agente responde somente por tentativa de homicídio e não por homicídio consumado Originamse da própria conduta efetuada pelo agente Daí serem relativas pois não existiriam sem a atuação criminosa Como entretanto tais causas são independentes têm idoneidade para produzir por si sós o resultado já que não se situam no normal trâmite do desenvolvimento causal Classificamse em preexistentes ou estado anterior concomitantes e supervenientes Existe previamente à prática da conduta do agente Antes de seu agir ela já estava presente Exemplo A com ânimo homicida efetua disparos de arma de fogo contra B atingindoa de raspão Os ferimentos contudo são agravados pela diabete da vítima que vem a falecer É a que ocorre simultaneamente à prática da conduta Exemplo A aponta uma arma de fogo contra B o qual assustado corre em direção a movimentada via pública No momento em que é alvejado pelos disparos é atropelado por um caminhão morrendo Em obediência à teoria da equivalência dos antecedentes ou conditio sine qua non adotada pelo art 13 caput in fine do Código Penal nas duas hipóteses o agente responde pelo resultado naturalístico Com efeito suprimindose mentalmente a sua conduta o resultado material que nos exemplos acima seria a morte da vítima não teria ocorrido quando e como ocorreu Em face da regra prevista no art 13 1º do Código Penal as causas supervenientes relativamente independentes podem ser divididas em dois grupos 1 as que produzem por si sós o resultado e 2 as que não produzem por si sós o resultado Incide a teoria da equivalência dos antecedentes ou da conditio sine qua non adotada como regra geral no tocante à relação de causalidade CP art 13 caput in fine O agente responde pelo resultado naturalístico pois suprimindose mentalmente a sua conduta o resultado não teria ocorrido como e quando ocorreu Exemplo A com a intenção de matar efetua disparos de arma de fogo contra B Por má pontaria atingeo em uma das pernas não oferecendo risco de vida Contudo B é conduzido a um hospital e por imperícia médica vem a morrer Nesse caso B não teria morrido ainda que por imperícia médica sem a conduta inicial de A De fato somente pode falecer por falta de qualidade do profissional da medicina aquele que foi submetido ao seu exame no exemplo justamente pela conduta homicida que redundou no encaminhamento da vítima ao hospital A imperícia médica por si só não é capaz de matar qualquer pessoa mas somente aquela que necessita de cuidados médicos Nesse sentido é a orientação do Superior Tribunal de Justiça O fato de a vítima ter falecido no hospital em decorrência das lesões sofridas ainda que se alegue eventual omissão no atendimento médico encontrase inserido no desdobramento físico do ato de atentar contra a vida da vítima não caracterizando constrangimento ilegal a responsabilização criminal por homicídio consumado em respeito à teoria da equivalência dos antecedentes causais adotada no Código Penal e diante da comprovação do animus necandi do agente18 É a situação tratada pelo 1º do art 13 do Código Penal A superveniência de causa relativamente independente exclui a imputação quando por si só produziu o resultado os fatos anteriores entretanto imputamse a quem os praticou grifamos Nesse dispositivo foi acolhida a teoria da causalidade adequada Logo causa não é mais o acontecimento que de qualquer modo concorre para o resultado Muito pelo contrário passa a ser causa apenas a conduta idônea com base em um juízo estatístico e nas regras de experiência id quod plerumque accidit a provocar a produção do resultado naturalístico Não basta qualquer contribuição Exigese uma contribuição adequada Os exemplos famosos são 1 pessoa atingida por disparos de arma de fogo que internada em um hospital falece não em razão dos ferimentos e sim queimada por um incêndio que destrói toda a área dos enfermos e 2 ferido que morre durante o trajeto para o hospital em face de acidente de tráfego que atinge a ambulância que o transportava Em ambos os casos a incidência da teoria da equivalência dos antecedentes acarretaria a imputação do resultado naturalístico ao responsável pelos ferimentos pois eliminandose em abstrato sua conduta certamente a morte não teria ocorrido quando e como ocorreu Todavia repitase não foi em vão a redação do 1º do art 13 do Código Penal pelo legislador Essa regra foi ali expressamente colocada por força da preferência nesse caso pela teoria da causalidade adequada A expressão por si só revela a autonomia da causa superveniente que embora relativa não se encontra no mesmo curso do desenvolvimento causal da conduta praticada pelo autor Em outras palavras depois do rompimento da relação de causalidade a concausa manifesta a sua verdadeira eficácia produzindo o resultado por sua própria força ou seja invoca para si a tarefa de concretizar o resultado naturalístico Nos exemplos acima mencionados concluise que qualquer pessoa que estivesse na área da enfermaria do hospital ou no interior da ambulância poderia morrer em razão do acontecimento inesperado e imprevisível e não somente a ferida pela conduta praticada pelo agente Portanto a simples concorrência de qualquer modo não é suficiente para a imputação do resultado material produzido anotese por uma causa idônea e adequada por si só para fazêlo O art 13 1º cuidou exclusivamente das causas supervenientes relativamente independentes que produzem por si sós o resultado Não falou das preexistentes nem das concomitantes o que é alvo de crítica por parte da doutrina especializada A propósito aduz Paulo José da Costa Júnior Não vemos motivo para que se levante uma barreira tão rígida entre causas que apresentam estrutura idêntica e eficiência equivalente Consequentemente teria sido preferível que a nova lei penal houvesse contemplado no 1º do art 13 a par da superveniência a preexistência ou a intercorrência de causa relativamente independente É com base em uma aplicação analógica que se pode coerentemente fazer semelhante extensão Desde que o dispositivo em foco se destina a favorecer a posição do agente tratandose de uma analogia in bonam partem é ela admissível em direito penal19 O gráfico abaixo bem sintetiza tudo o que foi dito A omissão penalmente relevante encontrase disciplinada pelo art 13 2º do Código Penal A omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para evitar o resultado O dispositivo é aplicável somente aos crimes omissivos impróprios espúrios ou comissivos por omissão isto é aqueles em que o tipo penal descreve uma ação mas a inércia do agente que podia e devia agir para impedir o resultado naturalístico conduz à sua produção São crimes materiais como é o caso do homicídio cometido em regra por ação mas passível também de ser praticado por inação desde que o agente ostente o poder e o dever de agir De fato os crimes omissivos próprios ou puros não alojam em seu bojo um resultado naturalístico A omissão é descrita pelo próprio tipo penal e o crime se consuma com a simples inércia do agente Não são assim compatíveis com a figura da tentativa É o que se dá na omissão de socorro CP art 135 ou o sujeito presta assistência ao necessitado e não há crime ou omitese consumando automaticamente o delito Esse é o significado da expressão penalmente relevante a omissão que não é típica por não estar descrita pelo tipo penal somente se torna penalmente relevante quando presente o dever de agir Nos crimes omissivos impróprios a omissão pode com o dever de agir ser penalmente relevante Por outro lado nos crimes omissivos próprios a omissão sempre é penalmente relevante pois se encontra descrita pelo tipo penal tal como nos arts 135 e 269 do Código Penal O art 13 2º do Código Penal no tocante à natureza jurídica da omissão acolheu a teoria normativa pela qual a omissão é um nada e do nada nada surge Não é punível de forma independente ou seja não se pune alguém pelo simples fato de ter se omitido Só tem importância jurídicopenal quando presente o dever de agir Daí a preferência pela teoria normativa A omissão somente interessa ao Direito Penal quando diante da inércia do agente o ordenamento jurídico lhe impunha uma ação um fazer Há dois critérios acerca da fixação do dever de agir legal e judicial Para o critério legal é a lei que deve arrolar taxativamente as hipóteses do dever de agir Cuidase de critério mais seguro por afastar incertezas e impedir variantes indesejadas que poderiam surgir na interpretação da situação submetida à análise do Poder Judiciário Por ele optou o legislador pátrio ao indicar nas alíneas a b e c do 2º do art 13 do Código Penal as pessoas a quem incumbe o dever de agir Além disso esse ônus precisa ser especificamente dirigido a pessoa ou pessoas determinadas e não genericamente a todos os indivíduos Na linha do entendimento do Superior Tribunal de Justiça Nos termos do art 13 2º do Código Penal a omissão é penalmente relevante quando o agente devia e podia agir para evitar o resultado o que não é a hipótese dos autos A obrigação genérica atribuída a todos os cidadãos de preservar o meio ambiente para as gerações futuras consoante o art 225 da Constituição Federal não se amolda ao dever imposto por lei de cuidar proteger eou vigiar exigido na hipótese de crime omissivo impróprio20 Por sua vez o critério judicial permite ao magistrado no caso concreto decidir pela presença ou não do dever de agir É defendido por Alberto Silva Franco e Rui Stoco para quem É evidente que a inserção do dever ético resultante da solidariedade social como fonte geradora do dever de atuar ao lado da lei do contrato e da ingerência torna cada vez mais amplo o tipo comissivo por omissão aumentando a área de manobra do juiz na definição de quem deva ocupar a posição de garante do bem jurídico tutelado Diante da alternativa ou enumerar em artigo de lei as fontes geradoras do dever de atuar ou compor figuras típicas de omissão imprópria não há dúvida de que a opção que melhor atende ao direito de liberdade do cidadão é a segunda21 O art 13 2º do Código Penal é cristalino não é suficiente o dever de agir Exigese mais A omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para evitar o resultado Quem tem o dever de agir não pratica automaticamente uma conduta penalmente reprovável É necessário que tenha se omitido quando devia e podia agir de forma a impedir o resultado Por essa razão a possibilidade de agir tem sido considerada elemento ou pressuposto do conceito de omissão que surge como a não realização de conduta possível e esperada22 Poder de agir é a possibilidade real e efetiva de alguém na situação concreta e em conformidade com o padrão do homem médio evitar o resultado penalmente relevante Exemplo Um bombeiro tem o dever de impedir o afogamento de uma criança em uma praia Não pode agir contudo se acidentalmente quebra suas duas pernas ao pisar em um buraco cavado por crianças quando corria em direção à infante que afundava Estão disciplinadas pelas alíneas a a c do 2º do art 13 do Código Penal23 pelo qual o dever de agir incumbe a quem a Tenha por lei obrigação de cuidado proteção ou vigilância Tratase do dever legal relativo às pessoas que por lei têm a obrigação de impedir o resultado É o que se dá com os pais em relação aos filhos menores bem como com os policiais no tocante aos indivíduos em geral O Código Penal utilizou a palavra lei em sentido amplo valendose da teoria das fontes Engloba os deveres impostos pela ordem jurídica considerada em sua totalidade Nas palavras de Luiz Luisi Neste dispositivo o nosso legislador se referiu não apenas à lei mas especificou os deveres de cuidado proteção e de vigilância e adotando essa redação não se limitou à chamada teoria formal mas acolheu a teoria das fontes Tratase de deveres que são impostos pela ordem jurídica lato sensu Não são apenas obrigações decorrentes de lei em sentido estrito mas de qualquer disposição que tenha eficácia de forma a poder constituir um vínculo jurídico É o caso dos decretos dos regulamentos das portarias e mesmo das sentenças judiciais e provimentos judiciários em geral e até de ordem legítima de autoridade hierarquicamente superior Podem tais deveres outrossim derivar de norma penal como de norma extrapenal tanto de direito público como de direito privado24 b De outra forma assumiu a responsabilidade de impedir o resultado A expressão de outra forma significa qualquer obrigação de impedir o resultado que não seja decorrente da lei versada pela alínea a É o que se convencionou chamar de garante ou dever de garantidor da não produção do resultado naturalístico Antes da Reforma da Parte Geral do Código Penal pela Lei 72091984 apontavase em sede doutrinária a relação contratual como fonte do dever de agir Alargouse posteriormente à modificação legislativa o conceito de garantidor visando abranger além dos negócios jurídicos em geral as relações advindas da vida cotidiana independentemente de vinculação jurídica entre os envolvidos Cuidase de conceito a ser extensivamente compreendido Nesse sentido incumbe o dever de agir tanto ao professor de natação contratado para ensinar uma pessoa a nadar negócio jurídico como ao nadador experiente que convida um amigo iniciante a atravessar um canal de águas correntes e geladas situação concreta da vida Nos dois casos se o principiante enfrentar problemas o garantidor se possível fazêlo deverá impedir o resultado sob pena de têlo a si imputado Com igual entendimento sustenta Francisco de Assis Toledo O Código todavia não definiu o modo ou os casos em que o obrigado assume a posição de garante Nem se deve restringir esta hipótese às obrigações de índole puramente contratual de sorte a permitirse o transplante para a área penal de infindáveis discussões sobre questões prejudiciais em torno da validade ou da eficácia do contrato gerador da obrigação a posição de garante surge para todo aquele que por ato voluntário promessas veiculação publicitária ou mesmo contratualmente capta a confiança dos possíveis afetados por resultados perigosos assumindo com estes a título oneroso ou não a responsabilidade de intervir quando necessário para impedir o resultado lesivo25 A responsabilidade do garantidor subsiste enquanto ele estiver no local em que tem a obrigação de impedir o resultado Durante o tempo em que lá permanecer estará vinculado ao dever de agir porque dele ainda não se desvencilhou Exemplo a enfermeira contratada para cuidar da pessoa idosa e doente mesmo com encerramento da sua jornada é obrigada a cuidar da sua paciente enquanto não tiver deixado o local de trabalho transmitindo legitimamente a outra pessoa o nobre encargo No campo processual é preciso destacar que a omissão penalmente relevante precisa ser expressamente descrita na inicial acusatória sob pena de inépcia da denúncia ou da queixacrime Para o Superior Tribunal de Justiça É inepta denúncia que impute a prática de homicídio na forma omissiva imprópria quando não há descrição clara e precisa de como a acusada médica cirurgiã de sobreaviso poderia ter impedido o resultado morte sendo insuficiente a simples menção do não comparecimento da denunciada à unidade hospitalar quando lhe foi solicitada a presença para prestar imediato atendimento a paciente que foi a óbito Com efeito o legislador estabeleceu alguns requisitos essenciais para a formalização da acusação a fim de que seja assegurado ao acusado o escorreito exercício do contraditório e da ampla defesa pois a higidez da denúncia é uma garantia do denunciado Neste contexto quando se imputa a alguém crime comissivo por omissão art 13 2º b do CP é necessário que se demonstre o nexo normativo entre a conduta omissiva e o resultado normativo porque só se tem por constituída a relação de causalidade se baseado em elementos empíricos for possível concluir com alto grau de probabilidade que o resultado não ocorreria se a ação devida fosse efetivamente realizada26 c Com seu comportamento anterior criou o risco da ocorrência do resultado Cuidase da ingerência ou situação precedente Em suma aquele que com o seu comportamento anterior criou uma situação de perigo tem o dever de agir para impedir o resultado lesivo ao bem jurídico Exemplo O marinheiro que lança ao mar um tripulante do navio tem o dever de salválo da morte Se não o fizer responde pelo homicídio A dupla causalidade é de difícil ocorrência prática o que não impede a sua formulação no plano teórico Cuidase da situação em que duas ou mais condutas independentes entre si e praticadas por pessoas diversas que não se encontram subjetivamente ligadas produzem simultaneamente o resultado naturalístico por elas desejado Exemplo A ministra veneno na comida de B enquanto almoçavam em um restaurante Ao mesmo tempo C que também estava sentado à mesa coloca veneno na comida de B A e C não têm ciência do propósito criminoso alheio As doses subministradas produzem por si sós efeito imediato matando B Questionase Qual crime deve ser imputado aos agentes Poderseia alegar que suprimindo mentalmente a conduta de A mesmo assim B teria morrido Da mesma forma eliminada hipoteticamente a ação de C subsistiria a morte da vítima Seria então correto falar que nem A nem C mataram B Se sim quem matou Inclinase a doutrina pela punição de ambos os autores por homicídio consumado No Brasil o crime seria inclusive qualificado pelo emprego de meio insidioso veneno A resposta seria diversa se o veneno ministrado por algum deles tivesse ainda que por pouco tempo apressado a morte porque a conduta do outro poderia ser suprimida que ainda assim ocorreria o resultado naturalístico27 Em 1927 Karl Larenz introduz no Direito o conceito de imputação na obra intitulada A teoria da imputação de Hegel e o conceito de imputação objetiva com a finalidade de distinguir as consequências de atos que podem ser atribuídos ao acaso e atos que são obras do ser humano Richard Honig em 1930 no livro Causalidade e imputação objetiva traz para o Direito Penal as ideias de Larenz buscando delinear um critério seguro para a atribuição de um resultado ilícito a alguém Finalmente Claus Roxin em 1970 no ensaio Reflexões sobre a problemática da imputação no direito penal desenvolve a moderna teoria da imputação objetiva Em uma perspectiva clássica o tipo penal apresentava apenas aspectos objetivos representados na relação de causalidade Consideravase realizado o tipo toda vez que alguém causava o resultado nele previsto de acordo com a teoria da equivalência dos antecedentes A causalidade gerava assim o problema do regressus ad infinitum cuja restrição só podia ser efetuada no âmbito da ilicitude ou na maior parte das vezes da culpabilidade que englobava o dolo e a culpa Para resolver esse problema o sistema finalista conferiu ao tipo penal também uma feição subjetiva com a inclusão na conduta do dolo e da culpa Exemplo Se A fabricante de armas de fogo produz aquela que posteriormente foi adquirida por B para matar C não poderá ser penalmente responsabilizado Para a teoria clássica por ausência de culpabilidade para a teoria finalista porque o fato é atípico uma vez ausente o dolo ou a culpa Para os adeptos da teoria da imputação objetiva contudo o sistema finalista ao limitar o tipo objetivo à relação de causalidade de acordo com a teoria da equivalência dos antecedentes não resolve todos os problemas inerentes à imputação Vejamos o exemplo apresentado por Claus Roxin Imaginemos que A venda heroína a B Os dois sabem que a injeção de certa quantidade de tóxico gera perigo de vida mas assumem o risco de que a morte ocorra A o faz porque o que lhe interessa é principalmente o dinheiro e B por considerar sua vida já estragada e só suportável sob estado de entorpecimento Deve A ser punido por homicídio cometido com dolo eventual na hipótese de B realmente injetar em si o tóxico e em decorrência disso morrer A causalidade de A para a morte de B bem como seu dolo eventual encontramse fora de dúvida Se considerarmos a causalidade suficiente para a realização do tipo objetivo teremos que concluir pela punição28 Assim para resolver o caso narrado entre outros sem solução possível pelo sistema finalista a teoria da imputação objetiva insere duas novas elementares29 no tipo objetivo que deixa de ser só causalidade Logo com a adoção da teoria da imputação objetiva a relação de causalidade somente estaria caracterizada quando ultrapassadas três etapas Ao contrário do que seu nome parece em princípio indicar não se confunde com a responsabilidade penal objetiva Sua função é completamente diversa limitar a responsabilidade penal pois a atribuição de um resultado a uma pessoa não é determinada pela relação de causalidade mas é necessário outro nexo de modo que esteja presente a realização de um risco proibido pela norma30 Seria mais apropriado portanto falar em teoria da não imputação objetiva pois a sua missão precípua é evitar a atribuição indevida e objetiva de um resultado típico a alguém Essa teoria é aplicável exclusivamente aos crimes materiais nos quais pode ser produzido um resultado naturalístico cuja imputação deve ser cautelosamente atribuída ao agente Não tem cabimento nos crimes formais e de mera conduta já que neles inexiste resultado naturalístico ligado à conduta Portanto sequer é necessária a utilização da teoria da equivalência dos antecedentes Para Luís Greco a imputação objetiva enuncia o conjunto de pressupostos genéricos que fazem da causação uma causação objetivamente típica e estes pressupostos são a criação de um risco juridicamente desaprovado e a realização deste risco no resultado31 Assim de acordo com a teoria não basta a relação de causalidade para imputação do resultado devendo estar presentes 1 A criação ou o aumento de um risco a b Em face da sua função de proteção de bens jurídicos o Direito Penal deveria limitarse a proibir ações perigosas que coloquem em risco esses mesmos bens No entanto o que é risco Podem ser consideradas como risco aquelas ações que por meio de uma prognose póstuma objetiva geram uma possibilidade de lesão ao bem jurídico Prognose pois se refere à situação do agente no momento da ação póstuma porque será feita pelo magistrado depois da prática do fato e objetiva pois parte do conhecimento de um homem prudente homo medius na mesma hipótese analisada Como no exemplo clássico em que um sobrinho manda um tio em uma viagem de avião com a intenção de que o avião caia e o tio morra não haveria responsabilidade do sobrinho se a sua intenção se concretizasse pois viajar de avião não gera real possibilidade de dano No entanto a situação será diferente se o sobrinho tiver conhecimento de que haverá um ataque terrorista naquele determinado voo Em síntese será perigosa a ação que aos olhos de um observador objetivo dotado dos conhecimentos especiais do autor situado no momento da prática da ação gere real possibilidade de dano para um determinado bem32 Por outro lado afirmase não haver ação perigosa quando o risco for juridicamente irrelevante a ação não gera uma possibilidade real de dano ou há diminuição do risco avaliado antes da ação pelo agente como no exemplo de Roxin quem convence o ladrão a furtar não 1000 mas somente 100 marcos alemães não é punível por participação no furto pois sua conduta não elevou mas diminuiu o risco de lesão33 2 O risco criado deve ser proibido pelo Direito Nem toda ação perigosa é proibida pelo Direito Devese fazer uma ponderação entre a necessidade de proteção de determinado bem jurídico e o interesse geral de liberdade Exemplificativamente embora dirigir um veículo automotor possa eventualmente causar acidentes permitese tal conduta Da mesma forma são regulamentados alguns esportes como o automobilismo e o boxe que podem causar lesões aos seus praticantes Vejase que pela teoria finalista na lesão provocada em uma luta de boxe haveria uma causa de justificação exclusão da ilicitude enquanto para a imputação objetiva o fato é atípico por se tratar de um risco permitido Como esclarece Günther Jakobs Um comportamento que gera um risco permitido é considerado socialmente normal não porque no caso concreto esteja tolerado em virtude do contexto em que se encontra mas porque nessa configuração é aceito de modo natural Portanto os comportamentos que criam riscos permitidos não são comportamentos que devam ser justificados mas que não realizam tipo algum34 Dentro do conceito de risco permitido se insere o princípio da confiança De acordo com esse princípio não pratica conduta típica quem agindo de acordo com as regras legais envolvese em situação em que terceiro descumprindo com o seu dever de cuidado permite a produção do resultado Por exemplo se estamos dirigindo e vemos à distância um cidadão aguardando um momento oportuno para cruzar a rua confiamos que ele não vai tentar a travessia na frente do veículo em movimento Da mesma forma se entregamos nosso automóvel para o conserto dos freios que apresentam deficiência ao sair da oficina acreditamos que o defeito esteja sanado Assim o risco de certos comportamentos não depende somente de nós mas também dos outros cidadãos35 Destarte há confiança de que a conduta de terceiros realizada na sequência bem como a conduta anterior será conforme ao Direito de forma que se essa expectativa não se realizar será atípica a conduta daquele que age corretamente Há algumas decisões do Superior Tribunal de Justiça adotando a teoria da imputação objetiva a b c De acordo com a Teoria Geral da Imputação Objetiva o resultado não pode ser imputado ao agente quando decorrer da prática de um risco permitido ou de uma ação que visa a diminuir um risco não permitido o risco permitido não realize o resultado concreto e o resultado se encontre fora da esfera de proteção da norma O risco permitido deve ser verificado dentro das regras do ordenamento social para o qual existe uma carga de tolerância genérica É o risco inerente ao convívio social e portanto tolerável Hipótese em que o agente agiu em desconformidade com as regras de trânsito criou um risco não permitido causando resultado jurídico abrangido pelo fim de proteção da norma de cuidado morte da vítima atraindo a incidência da imputabilidade objetiva36 Ainda que se admita a existência de relação de causalidade entre a conduta dos acusados e a morte da vítima à luz da teoria da imputação objetiva necessária é a demonstração da criação pelos agentes de uma situação de risco não permitido não ocorrente na hipótese porquanto é inviável exigir de uma Comissão de Formatura um rigor na fiscalização das substâncias ingeridas por todos os participantes de uma festa Associada à teoria da imputação objetiva sustenta a doutrina que vigora o princípio da confiança as pessoas se comportarão em conformidade com o direito o que não ocorreu in casu pois a vítima veio a afogarse segundo a denúncia em virtude de ter ingerido substâncias psicotrópicas comportandose portanto de forma contrária aos padrões esperados afastando assim a responsabilidade dos pacientes diante da inexistência de previsibilidade do resultado acarretando a atipicidade da conduta37 A doutrina aponta ainda como causas de exclusão do risco proibido o comportamento exclusivo da vítima que se coloca em perigo autocolocação da vítima em situação de perigo as contribuições socialmente neutras como no exemplo de Jakobs em que o padeiro vende o pão ao autor consciente de que este o usará para envenenar alguém os comportamentos socialmente adequados princípio da adequação social e d a b c a proibição de regresso Pela proibição de regresso não haveria criação de um risco proibido nos casos em que a ação não dolosa de alguém precedesse a ação dolosa de um terceiro Assim aquele que esquece a sua arma que vem a ser encontrada por outrem posteriormente e utilizada para a prática de um crime de homicídio não seria responsabilizado Quanto aos últimos dois aspectos comportamentos socialmente adequados e proibição de regresso não há consenso doutrinário acerca de serem causas de exclusão do risco de forma que qualquer afirmação nesse sentido deve ser feita com redobrada cautela38 3 O risco foi realizado no resultado A norma de proibição visa evitar que um certo bem jurídico seja afetado de uma determinada maneira Assim só haverá realização do risco se a proibição da conduta for justificada para evitar a lesão de determinado bem jurídico por meio de determinado curso causal os quais venham efetivamente a ocorrer39 É o fim de proteção da norma a que aludem os doutrinadores modernos Com o mesmo fundamento apontase ainda a hipótese do aumento do risco pelo comportamento proibido em comparação com o comportamento hipotético correto Tanto na realização do risco como no seu aumento há exclusão da imputação na lesão ou curso causal sem relação com o risco proibido nos danos tardios relacionados à lesão anterior causada ao bem jurídico ex a vítima de lesões corporais alguns anos depois perde o equilíbrio em razão da lesão nunca completamente curada e cai sofrendo várias fraturas nos danos causados a outrem resultantes de choque causado pelo fato criminoso praticado ex mãe cardíaca falece ao saber do assassinato do filho d e nas ações perigosas de salvamento ex A ateia fogo na casa de B na ausência deste mas B reentra para salvar sua coleção de CDs de playstation 2 não piratas falecendo e no comportamento indevido posterior de um terceiro ex vítima de lesões que necessitando de uma cirurgia vem a falecer em razão de erro médico grosseiro40 As ideias até aqui expostas podem ser resumidas pelo seguinte quadro Apresentadas as linhas mestras da teoria da imputação objetiva mister se faz analisar as variantes de seus maiores defensores na atualidade Claus Roxin e Günther Jakobs Claus Roxin visa com o desenvolvimento da teoria determinar um critério de imputação capaz de concretizar a finalidade da norma penal41 Para ele um resultado só deve ser imputado como sua obra e preenche o tipo objetivo unicamente quando 1 o comportamento do autor cria um risco não permitido para o objeto da ação 2 o risco se realiza no resultado concreto e 3 este resultado se encontra dentro do alcance do tipo42 Günther Jakobs acrescenta ao conceito de imputação o elemento da imputação objetiva do comportamento Nessa linha de raciocínio 1 Os seres humanos encontramse em um mundo social na condição de portadores de um papel isto é como pessoas que devem administrar um determinado segmento do acontecer social conforme um determinado padrão 2 Entre autor vítima e terceiros segundo os papéis que desempenhem deve determinarse a quem compete por si só ou junto com outros o acontecer relevante é dizer quem por ter violado seu papel administrandoo de modo deficiente responde jurídico penalmente ou se foi a vítima quem violou seu papel deve assumir o dano por si mesma Se todos se comportam conforme o papel só fica a possibilidade de explicar o ocorrido como fatalidade ou acidente 3 Isto vale tanto para os fatos dolosos como para os fatos culposos só que no âmbito dos fatos dolosos frequentemente a violação do papel é tão evidente que não necessita maior explicação a qual é menos habitual nos fatos culposos43 O penalista alemão entende pela ausência de imputação em quatro hipóteses 1 risco permitido 2 princípio da confiança 3 proibição do regresso e 4 competência ou capacidade da vítima Sustenta a permanência da causalidade natural na aferição da responsabilidade criminal funcionando a imputação como critério de restrição do nexo causal a b c d e 105 Concluise que a proposta dos defensores da teoria da imputação objetiva é a inclusão de novas elementares no tipo objetivo criandose o conceito de causalidade normativa em oposição à causalidade natural presente na teoria finalista Consequentemente algumas vozes sustentam a íntima relação no campo da causalidade da teoria da imputação objetiva com as regras da física quântica Não basta a mera relação de causa e efeito causalidade física entre conduta e resultado naturalístico Falase por essa razão em direito penal quântico caracterizado pela presença da relação de causalidade normativa e da tipicidade material44 A inclusão de tais elementos visa resolver no âmbito do fato típico certos casos que para as demais teorias seriam solucionados em outros aspectos como a ilicitude e a culpabilidade Rogério Greco faz uma compilação de conclusões acerca da teoria em análise que podem ser aproveitadas no presente estudo a imputação objetiva é uma análise que antecede à imputação subjetiva a imputação objetiva pode dizer respeito ao resultado ou ao comportamento do agente a expressão mais apropriada seria teoria da não imputação uma vez que a teoria visa com as suas vertentes evitar a imputação objetiva do resultado ou do comportamento do tipo penal a alguém a teoria da imputação foi criada inicialmente para se contrapor aos dogmas da teoria da equivalência erigindo uma relação de causalidade jurídica ou normativa ao lado daquela outra de natureza material uma vez concluída pela não imputação objetiva afastase o fato típico45 TIPICIDADE A tipicidade elemento do fato típico dividese em formal e material Tipicidade formal é o juízo de subsunção entre a conduta praticada pelo agente no mundo real e o modelo descrito pelo tipo penal adequação ao catálogo46 É a operação pela qual se analisa se o fato praticado pelo agente encontra correspondência em uma conduta prevista em lei como crime ou contravenção penal A conduta de matar alguém tem amparo no art 121 do Código Penal Há portanto tipicidade entre tal conduta e a lei penal De seu turno tipicidade material ou substancial é a lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico penalmente tutelado em razão da prática da conduta legalmente descrita A tipicidade material relacionase intimamente com o princípio da ofensividade ou lesividade do Direito Penal pois nem todas as condutas que se encaixam nos modelos abstratos e sintéticos de crimes tipicidade formal acarretam dano ou perigo ao bem jurídico É o que se dá a título ilustrativo nas hipóteses de incidência do princípio da insignificância nas quais nada obstante a tipicidade formal não se verifica a tipicidade material A presença simultânea da tipicidade formal e da tipicidade material caracteriza a tipicidade penal A definição atual da tipicidade deriva das ideias do alemão Ernst von Beling datadas de 1906 Abandonouse o corpus delicti denominado em alemão de Tatbestand o qual subsistia desde o Direito Romano com origem processual para abarcar todas as características e elementos do delito abrangendo a materialidade do fato delituoso a ilicitude e a culpabilidade para se criar a concepção objetiva do tipo penal operandose a distinção entre a tipicidade e a ilicitude Na Alemanha atualmente ainda se fala em Tatbestand hipótese de fato termo traduzido para o italiano como fattispecie e para o português como tipo Antes de 1906 contudo não era destinado à palavra qualquer conteúdo sistemático semelhante ao atual Antes de Beling pois o crime se dividia em dois blocos ilicitude de ordem objetiva e culpabilidade de natureza subjetiva Não se falava em tipicidade Posteriormente à criação de Beling o delito passou a possuir três partes tipicidade e ilicitude ambas objetivas e culpabilidade de ordem subjetiva Assim o tipo englobava apenas os aspectos exteriores da conduta dispensando os elementos internos do agente Beling definiu a tipicidade como mero processo de adequação do fato concreto ao tipo penal Iniciavase assim a fase da independência do tipo desvinculandose completamente a tipicidade da ilicitude com função meramente descritiva sem nenhum conteúdo valorativo Essa fase intimamente relacionada com a teoria mecanicista clássica naturalista ou causal da conduta perdeu espaço com o surgimento da teoria finalista da conduta e com o descobrimento dos elementos subjetivos do tipo Em 1915 Max Ernst Mayer retomando os estudos de Beling publica seu Tratado de Direito Penal e nele revela seu objetivo de aprimorar a teoria da tipicidade conferindo a ela a função de indício da ilicitude teoria indiciária ou da ratio cognoscendi A tipicidade autoriza a presunção relativa de ilicitude a qual cede diante de prova em sentido contrário com a comprovação da ocorrência de alguma eximente Nascia a fase da tipicidade como indício da ilicitude Além disso Mayer também contribuiu ao Direito Penal com a introdução de elementos normativos no tipo penal contrariando a proposta de Beling que não admitia na tipicidade qualquer elemento relativo à ilicitude ou à culpabilidade É desde então a teoria mais aceita no Direito Penal Consagrase um sistema tripartido dependendo a análise do crime de três fases distintas e sucessivas tipicidade ilicitude e culpabilidade47 Sua utilidade prática repousa na inversão do ônus da prova no tocante às causas de exclusão da ilicitude Em outras palavras à acusação basta demonstrar a tipicidade do fato pois desponta como a sua ilicitude Em síntese o fato típico presumese igualmente ilícito Mas esta presunção é relativa e se a defesa invocar uma descriminante estado de necessidade legítima defesa etc a ela competirá o ônus de provar a sua tese Em 1931 porém Edmund Mezger apresenta novos conceitos iniciando a fase da tipicidade como essência da ilicitude teoria da ratio essendi ou da identidade O tipo penal é transformado em tipo de injusto ou seja o tipo passa a ser conceituado como a ilicitude tipificada Destarte tipo e ilicitude fundiramse de modo indissociável embora seus conceitos não se confundam Essa teoria foi alvo de inúmeras críticas eis que veda a correta separação entre os juízos da tipicidade e da ilicitude Como estabelece o art 386 inc VI do Código de Processo Penal com a redação conferida pela Lei 116902008 Art 386 O juiz absolverá o réu mencionando a causa na parte dispositiva desde que reconheça VI existirem circunstâncias que excluam o crime ou isentem o réu de pena arts 20 21 22 23 26 e 1º do art 28 todos do Código Penal ou mesmo se houver fundada dúvida sobre sua existência A parte final do dispositivo legal ou mesmo se houver fundada dúvida sobre sua existência encontrase em sintonia com a teoria da tipicidade como indício da ilicitude De fato a tipicidade do fato funciona como presunção da ilicitude uma vez que a absolvição reclama fundada dúvida acerca da causa excludente da ilicitude Cuidase na verdade de manifestação do princípio in dubio pro reo a dúvida favorece o réu pois o ônus da prova da imputação é da acusação há muito consagrado nos ordenamentos jurídicos dos povos civilizados Preconizada pelo alemão Hellmuth von Weber propõe o tipo total de injusto por meio do qual os pressupostos das causas de exclusão da ilicitude compõem o tipo penal como seus elementos negativos Tipicidade e ilicitude integram o tipo penal tipo total Consequentemente se presente a tipicidade automaticamente também estará delineada a ilicitude Ao reverso ausente a ilicitude o fato será atípico Não há distinção entre os juízos da tipicidade e da ilicitude Crime assim não é o fato típico e ilícito e sim um tipo total de injusto em uma única análise Operase um sistema bipartido com duas fases para aferição do crime tipo total tipicidade ilicitude e culpabilidade Portanto identificada a tipicidade resultará identificada a ilicitude Por outro lado afastada a tipicidade restará também afastada a ilicitude Se fosse adotada a referida teoria o art 121 caput do Código Penal ficaria assim redigido Matar alguém salvo em legítima defesa estado de necessidade exercício regular do direito ou estrito cumprimento de dever legal Não foi acolhida pelo nosso sistema penal que distinguiu explicitamente os tipos incriminadores Parte Especial do Código Penal e legislação especial dos tipos permissivos ou causas de exclusão da ilicitude em regra na Parte Geral do Código Penal mais precisamente em seu art 23 Criada pelo penalista argentino Eugenio Raúl Zaffaroni essa teoria sustenta que todo fato típico se reveste de antinormatividade pois muito embora o agente atue em consonância com o que está descrito no tipo incriminador na verdade contraria a norma entendida como o conteúdo do tipo legal O nome conglobante deriva da necessidade de que a conduta seja contrária ao ordenamento jurídico em geral conglobado e não apenas ao Direito Penal Não basta a violação da lei penal Exigese a ofensa a todo o ordenamento jurídico Em suma para a aferição da tipicidade reclamase a presença da antinormatividade Assim ou o fato praticado pelo agente contrário à lei penal desrespeita todo o ordenamento normativo e há tipicidade ou ainda que em desconformidade com a lei penal esteja em consonância com a ordem normativa e ausente estará a tipicidade Para essa teoria a tipicidade penal resulta da junção da tipicidade legal com a tipicidade conglobante tipicidade penal tipicidade legal tipicidade conglobante Tipicidade legal adequação à fórmula legal do tipo é a individualização que a lei faz da conduta mediante o conjunto dos elementos objetivos e normativos de que se vale o tipo penal Já a tipicidade conglobante antinormatividade é a comprovação de que a conduta legalmente típica está também proibida pela norma o que se afere separando o alcance da norma proibitiva conglobada com as demais normas do sistema jurídico Finalmente a tipicidade penal adequação penal antinormatividade é a fusão da tipicidade legal com a tipicidade conglobante Não basta pois a mera tipicidade legal isto é a contrariedade do fato à lei penal É necessário mais A conduta do agente contrária à lei penal deve violar todo o sistema normativo Em suma deve ser antinormativa Vale a pena citar a explicação de Zaffaroni e de Pierangeli bastante elucidativa acerca do assunto Suponhamos que somos juízes e que é levada a nosso conhecimento a conduta de uma pessoa que na qualidade de oficial de justiça recebeu uma ordem emanada por juiz competente de penhora e sequestro de um quadro de propriedade de um devedor a quem se executa em processo regular por seu legítimo credor para a cobrança de um crédito vencido e que em cumprimento desta ordem judicial e das funções que por lei lhe competem solicita o auxílio da força pública e com todas as formalidades requeridas efetivamente sequestra a obra colocandoa à disposição do Juízo O mais elementar senso comum indica que esta conduta não pode ter qualquer relevância penal que de modo algum pode ser delito mas por quê Receberemos a resposta de que essa conduta enquadrase nas previsões do art 23 III do CP Não há crime quando o agente pratica o fato em estrito cumprimento de dever legal É indiscutível que ela aí se enquadra mas que caráter do delito desaparece quando um sujeito age em cumprimento de um dever Para boa parte da doutrina o oficial de justiça teria atuado ao amparo de uma causa de justificação isto é que faltaria a antijuridicidade da conduta mas que ela seria típica Para nós esta resposta é inadmissível porque tipicidade implica antinormatividade contrariedade à norma e não podemos admitir que na ordem normativa uma norma ordena o que a outra proíbe Uma ordem normativa na qual uma norma possa ordenar o que a outra pode proibir deixa de ser ordem e de ser normativa e tornase uma desordem arbitrária As normas jurídicas não vivem isoladas mas num entrelaçamento em que umas limitam as outras e não podem ignorarse mutuamente48 Esta teoria embora ainda se apresente como uma proposta doutrinária com resistência no Brasil já foi acolhida pelo Superior Tribunal de Justiça Queixacrime oferecida por Juíza contra Desembargador que durante processo de promoção por merecimento de magistrado proferiu voto com expressões tidas por difamatórias pela querelante O querelado em sessão pública proferiu seu voto consoante previsto na Resolução 1062010 do CNJ não se extraindo da sua manifestação conduta que se amolde na figura típica do art 139 do Código Penal Ausência de animus diffamandi O querelado agiu no estrito cumprimento do dever legal de fundamentação do voto restando afastada a tipicidade conglobante do crime de difamação nos termos do art 142 III do Código Penal e do art 41 da LC 351979 LOMAN Queixacrime rejeitada49 Adequação típica é o procedimento pelo qual se enquadra uma conduta individual e concreta na descrição genérica e abstrata da lei penal É o meio pelo qual se constata se existe ou não tipicidade entre a conduta praticada na vida real e o modelo definido pela lei penal A adequação típica pode se apresentar sob duas espécies subordinação imediata e subordinação mediata Na adequação típica de subordinação imediata a conduta humana se enquadra diretamente na lei penal incriminadora sem necessidade de interposição de qualquer outro dispositivo legal A ação ou omissão se transforma em fato típico com o encaixe adequado de todos os elementos do fato externo no modelo contido no preceito primário da lei incriminadora A conduta de subtrair coisa alheia móvel para si mediante emprego de violência contra a pessoa encontra correspondência direta no art 157 caput do Código Penal Verificase na hipótese adequação típica de subordinação imediata Por sua vez na adequação típica de subordinação mediata ampliada ou por extensão a conduta humana não se enquadra prontamente na lei penal incriminadora reclamandose para complementar a tipicidade a interposição de um dispositivo contido na Parte Geral do Código Penal É o que se dá na tentativa na participação e nos crimes omissivos impróprios Na tentativa operase uma ampliação temporal da figura típica pois com a utilização da regra prevista no art 14 II do Código Penal o alcance do tipo penal não se limita ao momento da consumação do crime mas também aos períodos que o antecedem Antecipase a tutela penal para abarcar os atos executórios prévios à consumação Na participação há uma ampliação espacial e pessoal do tipo penal que em consequência do disposto pelo art 29 caput do Código Penal passa a alcançar não só o sujeito que praticou os atos executórios do crime como também outras pessoas que de qualquer modo concorreram para a realização do delito sem contudo executálo50 Finalmente nos crimes omissivos impróprios espúrios ou comissivos por omissão ocorre uma ampliação da conduta criminosa a qual com o emprego do art 13 2º do Código Penal passa a englobar também a omissão daquele que indevidamente não cumpriu o seu dever jurídico de agir Esses dispositivos legais arts 13 2º 14 II e 29 caput do Código Penal são denominados de normas integrativas de extensão ou complementares da tipicidade 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Ou também o fato praticado por pessoa jurídica em relação aos crimes ambientais definidos pela Lei 96051998 para quem admite essa possibilidade Reportamonos porém ao fato humano por corresponder a pessoa física como sujeito ativo da quase totalidade das infrações penais O ser humano é o ser que atua Não está fixado isto é continua sendo para si mesmo um compromisso é também em outras palavras o ser que toma postura Os atos de tomada de postura em direção externa chamamos de ações e precisamente na medida em que continua sendo um compromisso para si mesmo toma postura diante de si mesmo e convertese em algo O ser humano é previsor Necessita do que está distante do que não está presente no espaço e tempo vive ao contrário do animal no futuro e não no presente Esta determinação faz parte das circunstâncias de uma existência na qual se atua e o que no ser humano é consciência humana em sentido próprio deve ser entendido sob esta perspectiva JAKOBS Günther Fundamentos de direito penal Trad André Luís Callegari São Paulo RT 2003 p 5354 ZAFFARONI Eugenio Raúl Derecho penal Parte general 2 ed Buenos Aires Ediar 2002 p 407 LUNA Everardo da Cunha Capítulos de direito penal Parte geral São Paulo Saraiva 1985 p 108 JESCHECK HansHeinrich Tratado de derecho penal Parte general Trad espanhola Miguel Olmedo Cardenete 5 ed Granada Comares 2002 p 239 TOLEDO Francisco de Assis Princípios básicos de direito penal 5 ed 13 tir São Paulo Saraiva 2007 p 109 BUSATO Paulo César Direito Penal parte geral 2 ed São Paulo Atlas 2015 p 273 RE 583523RS rel Min Gilmar Mendes Plenário j 03102013 noticiado no Informativo 722 STJ HC 68871PR rel Min Maria Thereza de Assis Moura rel p acórdão Min Og Fernandes 6ª Turma j 06082009 Surge nesse ponto o direito à perversão as pessoas ao menos em seus pensamentos podem ser más perversas idealizando mentalmente 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 diversos ilícitos penais sem que haja qualquer tipo de represália da parte do Estado Para um estudo aprofundado PIMENTEL Manoel Pedro Crimes de mera conduta 3 ed São Paulo RT 1975 p 2426 É comum olvidarse de Glaser mencionando Von Buri e Stuart Mill como os idealizadores dessa teoria COSTA JR Paulo José Nexo causal 2 ed São Paulo Malheiros 1996 p 88 JESUS Damásio E de Direito penal Parte geral 28 ed 2 tir São Paulo Saraiva 2006 v 1 p 248 Toda causa independente tem força suficiente para produzir por conta própria o resultado A diferença entre a qualidade de absoluta ou relativa referese exclusivamente à sua origem BAUMANN Jürgen Derecho penal conceptos fundamentales y sistema Trad espanhola Conrado A Finzi Buenos Aires Depalma 1973 p 126 BATTAGLINI Giulio A interrupção do nexo causal Trad Ricardo Rodrigues Gama Campinas LZN 2003 p 102104 HC 42559PE rel Min Arnaldo Esteves Lima 5ª Turma j 04042006 E também AgRg no AREsp 173804MG rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 19092013 COSTA JR Paulo José Nexo causal 2 ed São Paulo Malheiros 1996 p 108109 REsp 897426SP rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 27032008 FRANCO Alberto Silva STOCO Rui Código Penal e sua interpretação jurisprudencial parte geral 7 ed São Paulo RT 2001 v 1 p 228 FRAGOSO Heleno Cláudio Conduta punível São Paulo José Bushatsky 1961 p 5455 O art 2º da Lei 96051998 prevê na esfera dos crimes ambientais uma outra hipótese de dever de agir Quem de qualquer forma concorre para a prática dos crimes previstos nesta Lei incide nas penas a estes cominadas na medida da sua culpabilidade bem como o diretor o administrador o membro de conselho e de órgão técnico o auditor o gerente o preposto ou mandatário de pessoa jurídica que sabendo da conduta criminosa de outrem deixar de impedir a sua prática quando podia agir para evitála 24 25 26 27 28 29 30 31 32 33 34 35 36 37 38 LUISI Luiz Os princípios constitucionais penais 2 ed Porto Alegre Fabris 2003 p 143 TOLEDO Francisco de Assis Princípios básicos de direito penal 5 ed 13 tir São Paulo Saraiva 2007 p 117118 RHC 39627RJ rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 08042014 noticiado no Informativo 538 Cf BAUMANN Jürgen Derecho penal conceptos fundamentales y sistema Trad espanhola de Conrado A Finzi Buenos Aires Depalma 1973 p 127 ROXIN Claus Estudos de direito penal Trad Luís Greco Rio de Janeiro Renovar 2006 p 103 A análise das duas elementares traduzse no que a doutrina denomina de causalidade normativa em oposição à causalidade natural CAMARGO Antonio Luís Chaves Imputação objetiva e direito penal brasileiro São Paulo Cultural Paulista 2002 p 70 GRECO Luís Um panorama da teoria da imputação objetiva Rio de Janeiro Lumen Juris 2007 p 59 GRECO Luís Um panorama da teoria da imputação objetiva Rio de Janeiro Lumen Juris 2007 p 2527 ROXIN Claus Estudos de direito penal Trad Luís Greco Rio de Janeiro Renovar 2006 p 109110 JAKOBS Günther A imputação objetiva no direito penal São Paulo RT 2000 p 38 JESUS Damásio E de Jesus A imputação objetiva 2 ed São Paulo Saraiva 2002 p 4647 REsp 822517DF rel Min Gilson Dipp 5ª Turma j 12062007 HC 46525MT rel Min Arnaldo Esteves Lima 5ª Turma j 21032006 No mesmo sentido HC 68871PR rel Min Maria Thereza de Assis Moura rel p acórdão Min Og Fernandes 6ª Turma j 06082009 Jakobs por exemplo critica a adequação social por ser muito ampla não permitindo a concretização do risco permitido JAKOBS Günther A imputação objetiva no direito penal São Paulo RT 2000 p 117118 Contra a aplicação da proibição de regresso como excludente GRECO Luís Um panorama da teoria da imputação objetiva Rio de Janeiro 39 40 41 42 43 44 45 46 47 Lumen Juris 2007 p 7577 GRECO Luís Um panorama da teoria da imputação objetiva Rio de Janeiro Lumen Juris 2007 p 95 Os exemplos são de GRECO Luís Um panorama da teoria da imputação objetiva Rio de Janeiro Lumen Juris 2007 p 109125 Vide a discussão sobre o funcionalismo tratada quando do estudo sobre a evolução doutrinária do Direito Penal ROXIN Claus Estudos de direito penal Trad Luís Greco Rio de Janeiro Renovar 2006 p 104 Ainda o autor em igual sentido Em consequência o primeiro empenho da imputação no tipo objetivo é indicar quais as circunstâncias que fazem de uma causação como limite extremo da possível imputação uma ação típica ou seja p ex de uma causação de morte uma ação homicida relevante Na doutrina científica cada vez mais se impõe a concepção de que a imputação do tipo objetivo se produz conforme dois princípios sucessivamente estruturados a um resultado causado por um agente somente se pode imputar ao tipo objetivo se a conduta do autor houver criado um perigo para o bem jurídico não coberto por um risco permitido e esse perigo tenha se realizado no resultado concreto b se o resultado se apresenta como realização de um perigo criado pelo autor pela regra geral é imputado de modo que se cumpre o tipo objetivo Derecho penal Parte geral Fundamentos La estructura de la teoria del delito Trad espanhola de DiegoManuel Luzón Peña Miguel Díaz y García Conlledo e Javier de Vicente Remensal Madrid Civitas 2006 t I p 363364 JAKOBS Günther A imputação objetiva no direito penal São Paulo RT 2000 p 22 Para um estudo aprofundado do assunto GONDIM Reno Feitosa Epistemologia Quântica Direito Penal Fundamentos para uma Teoria da Imputação Objetiva do Direito Penal Curitiba Juruá 2005 GRECO Rogério Curso de direito penal parte geral 10 ed Rio de Janeiro Impetus 2008 p 246 BELING Ernst von Esquema de derecho penal La doctrina del delito tipo Trad de Sebástian Soler Buenos Aires Depalma 1944 p 59 Isso não impede entretanto a definição analítica do crime como fato típico e ilícito A teoria de Mayer remonta ao início do século XX e naquele contexto deve ser analisada O conceito bipartido de delito como 48 49 50 se sabe surgiu no Brasil após a Reforma da Parte Geral do Código Penal efetuada pela Lei 72091984 ZAFFARONI Eugenio Raúl PIERANGELI José Henrique Manual de direito penal brasileiro Parte geral 7 ed São Paulo RT 2007 v 1 p 395 AP 683AP rel Min Eliana Calmon Corte Especial j 21112012 REsp 944676RS rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 21062011 noticiado no Informativo 478 Tipo penal é o modelo genérico e abstrato formulado pela lei penal descritivo da conduta criminosa ou da conduta permitida Portanto não é somente o conjunto dos elementos da infração penal descrito pela lei mas também a indicação legal das hipóteses em que se autoriza a prática de um fato típico Tipo e tipicidade não se confundem Como explica Zaffaroni tipo é uma figura que resulta da imaginação do legislador enquanto o juízo de tipicidade é a averiguação que sobre uma conduta se efetua para saber se apresenta os caracteres imaginados pelo legislador1 O tipo penal apresenta duas categorias incriminadores e permissivos Tipos incriminadores ou legais são os tipos penais propriamente ditos consistentes na síntese legal da definição da conduta criminosa Tipos permissivos ou justificadores são os que contêm a descrição legal da conduta permitida isto é as situações em que a lei considera lícito o cometimento de um fato típico São as causas de exclusão da ilicitude também denominadas eximentes ou justificativas Os tipos legais ou incriminadores estão definidos na Parte Especial do Código Penal e na legislação penal especial Não há tipo incriminador na Parte Geral do Código Penal 1141 1142 Tipo legal é o modelo sintético genérico e abstrato da conduta definida em lei como crime ou contravenção penal O tipo legal não se destina simplesmente a criar infrações penais Ao contrário possui outras relevantes funções Função de garantia Como decorrência da previsão constitucional do princípio da reserva legal ou da estrita legalidade somente a lei em sentido material e formal pode criar um tipo incriminador Nesse sentido o tipo penal funciona como garantia do indivíduo2 De fato ao conhecer as condutas reputadas ilícitas pelo Direito Penal o ser humano pode praticar livremente todas as demais não incriminadas Sobralhe liberdade para gerir sua vida ficando vedada somente a atuação em desconformidade com a lei penal já que os casos de incriminação são taxativos princípio da taxatividade Cuidase destarte de direito fundamental de 1ª geração na medida em que limita o poder punitivo estatal Não por outro motivo proclamava Franz von Liszt ser o Código Penal a Magna Carta do delinquente Função fundamentadora A previsão de uma conduta criminosa por um tipo penal fundamenta o direito de punir do Estado quando o indivíduo viola a lei penal 1143 1144 A existência de uma lei penal incriminadora é o fundamento da persecução penal exercida pelo Estado Para Rogério Greco Se por um lado o tipo exerce essa função garantista também é certo afirmar que o Estado por intermédio do tipo penal fundamenta suas decisões fazendo valer o seu ius puniendi A relação entre essas funções do tipo garantista e fundamentadora é como se fosse duas faces da mesma moeda Numa das faces está o tipo garantista vedando qualquer responsabilização penal que não seja por ele expressamente prevista na outra a função fundamentadora por ele exercida abrindose a possibilidade ao Estado de exercitar o seu direito de punir sempre que o seu tipo penal for violado3 Função indiciária da ilicitude O tipo penal delimita a conduta penalmente ilícita Por corolário a circunstância de uma ação ou omissão ser típica autoriza a presunção de ser também ilícita contrária ao ordenamento jurídico Essa presunção é relativa iuris tantum pois admite prova em sentido contrário Dessa forma caso o agente sustente em juízo como tese defensiva a licitude do fato deverá provar a existência de uma das excludentes indicadas pelo art 23 do Código Penal Operase a inversão do ônus da prova Todo fato típico se presume ilícito até prova em contrário a ser apresentada e confirmada pelo responsável pela infração penal Exemplificativamente se A efetuou disparos de arma de fogo contra B eliminando sua vida presumese automaticamente a ilicitude do fato Se entretanto A alegar sua inocência por ter agido acobertado pela legítima defesa deverá provar sua ocorrência pois caso contrário será condenado Função diferenciadora do erro O dolo do agente deve alcançar todas as elementares do tipo legal razão pela qual o autor de um fato típico somente poderá ser responsabilizado pela prática de um crime doloso quando conhecer todas as circunstâncias de fato 1145 que o compõem Eventual ignorância acerca de alguma elementar do tipo penal configura erro de tipo afastando o dolo nos termos do art 20 do Código Penal Assim delineado o tipo penal com a presença do dolo não há falar em erro Ao contrário sem o fato típico por ausência de dolo restará caracterizado o erro de tipo Função seletiva Cabe ao tipo penal a tarefa de selecionar as condutas que deverão ser proibidas crimes comissivos ou ordenadas crimes omissivos pela lei penal levando em conta os princípios vetores do Direito Penal em um Estado Democrático de Direito O tipo penal qualquer que seja ele é composto por um núcleo e elementos Nas figuras qualificadas e privilegiadas são acrescentadas circunstâncias Esta é a fórmula do tipo incriminador O núcleo representado pelo verbo é a primeira etapa para a construção de um tipo incriminador No furto é subtrair no estupro constranger e assim por diante Toda infração penal contém um núcleo No art 121 caput do Código Penal em que se define o crime de homicídio simples fórmula incriminadora mais sintética da legislação penal brasileira há um núcleo matar e apenas um elemento alguém Em torno do núcleo se agregam elementos ou elementares que visam proporcionar a perfeita descrição da conduta criminosa Esses elementos podem ser de três espécies distintas objetivos subjetivos e normativos Elementos objetivos ou descritivos são os dados da conduta criminosa que não pertencem ao mundo anímico do agente Possuem validade exterior que não se limita ao sujeito que o pratica Ao contrário podem ser constatados por qualquer pessoa uma vez que exprimem um juízo de certeza Na identificação desses elementos se prescinde de valoração cultural ou jurídica É o caso de alguém nos crimes de homicídio CP art 121 e estupro CP art 213 entre tantos outros Elementos normativos por seu turno são aqueles para cuja compreensão não pode o sujeito se limitar a uma mera atividade cognitiva Reclamam para perfeita aferição uma interpretação valorativa isto é necessitam de um juízo de valor acerca da situação de fato por parte do destinatário da lei penal Na definição de Luís Luisi Não são portanto elementos que se limitam a descrever o natural mas que dão à ação ao seu objeto ou mesmo às circunstâncias uma significação um valor As expressões honesto indevidamente sem justa causa e mesmo cruel insidioso para qualificar os meios são exemplos de elementos típicos normativos4 Os elementos normativos podem ser jurídicos ou culturais Elementos normativos jurídicos são os que traduzem conceitos próprios do Direito relativos à ilicitude indevidamente e sem justa causa por exemplo ou então atinentes a termos ou expressões jurídicas tais como documento funcionário público e duplicata Os elementos normativos que dizem respeito a termos ou expressões jurídicas são também denominados elementos normativos impróprios Por sua vez elementos normativos culturais morais ou extrajurídicos são os que envolvem conceitos próprios de outras disciplinas do 1151 conhecimento artísticas literais científicas ou técnicas São seus exemplos ato obsceno ato libidinoso arte etc Elementos subjetivos são os que dizem respeito à esfera anímica do agente isto é à sua especial finalidade de agir e às demais tendências e intenções Sempre que o tipo penal alojar em seu bojo um elemento subjetivo será necessário que o agente além do dolo de realizar o núcleo da conduta possua ainda a finalidade especial indicada expressamente pela descrição típica No crime de furto CP art 155 não basta a subtração da coisa alheia móvel esta deve ser realizada pelo agente para si ou para outrem ou seja exigese o ânimo de assenhoreamento definitivo animus rem sibi habendi Diversos estudiosos do Direito Penal utilizam a expressão elementos subjetivos do injusto Na pureza da técnica essa terminologia normalmente empregada como sinônima de elementos subjetivos do tipo deve ser reservada somente àqueles que sustentam a identidade entre a tipicidade e a ilicitude no sentido de que uma não existe sem a outra Como bem explica Damásio E de Jesus Na verdade as expressões se equivalem A adoção de uma ou de outra depende da doutrina que se adote em relação à teoria do tipo e da antijuridicidade Para aqueles que como Mezger acreditam numa ilicitude tipificada isto é afirmar que a antijuridicidade se encontra no tipo a expressão é elementos subjetivos do injusto elementos subjetivos da antijuridicidade Significa que a antijuridicidade o injusto concretizada no tipo possui um elemento subjetivo que condiciona a sua existência Para os que adotam o princípio de que a tipicidade constitui mero indício da antijuridicidade como Mayer separando a tipicidade da ilicitude a expressão é elementos subjetivos do tipo Significa que o tipo possui um elemento subjetivo referente à situação anímica do sujeito que condiciona a tipicidade do fato5 Elementos modais Ao lado dos elementos objetivos normativos e subjetivos aceitos por 1161 1162 toda a doutrina alguns autores ainda apontam um quarto grupo relativo aos elementos modais Elementos modais seriam os que expressam no tipo penal condições específicas de tempo local ou modo de execução indispensáveis para a caracterização do crime Apontase como exemplo o crime de infanticídio CP art 123 em que a mãe deve matar o próprio filho nascente ou recémnascido sob a influência do estado puerperal durante o parto ou logo após Há portanto a exigência de que o delito seja praticado em condições de tempo previamente fixadas pelo legislador É o que também ocorre no crime de violação de domicílio CP art 150 no qual o agente deve entrar ou permanecer clandestina ou astuciosamente ou contra a vontade expressa ou tácita de quem de direito em casa alheia ou em suas dependências Nesse caso a lei se refere a condições de locais indispensáveis para o aperfeiçoamento do ilícito penal Tipo normal e tipo anormal Tipo normal é o que prevê apenas elementos de ordem objetiva Fala se no caso em tipicidade normal6 Tipo anormal é o que prevê além de elementos objetivos também elementos subjetivos eou normativos acarretando na tipicidade anormal Vale ressaltar que para os adeptos do finalismo penal todo tipo é anormal De fato dolo elemento subjetivo e culpa elemento normativo compõem a estrutura da conduta a qual integra o fato típico e consequentemente o tipo penal Tipo fundamental e tipo derivado Tipo fundamental ou básico é aquele que retrata a forma mais simples da conduta criminosa É denominado crime simples e em regra está situado no caput do dispositivo legal Exemplo homicídio simples CP art 121 1163 1164 1165 caput Há uma exceção no Código Penal o crime de excesso de exação se encontra no 1º do art 316 do Código Penal Tratase da modalidade simples básica e fundamental do crime sem estar no caput Tipo derivado é aquele que se estrutura com base no tipo fundamental a ele se somando circunstâncias que aumentam ou diminuem a pena Dividem se em tipos qualificados qualificadoras ou circunstanciados causas de aumento da pena e privilegiados também chamados de exceptum causas de diminuição da pena Exemplos homicídio privilegiado CP art 121 1º e homicídio qualificado CP art 121 2º Tipo fechado e tipo aberto Tipo fechado ou cerrado é o que possui descrição minuciosa da conduta criminosa É o caso do furto Tipo aberto é o que não possui descrição minuciosa da conduta criminosa Cabe ao Poder Judiciário na análise do caso concreto complementar a tipicidade mediante um juízo de valor É o caso da rixa CP art 137 pois somente na situação prática poderá se dizer se alguém participou da rixa ou nela ingressou para separar os contendores No Código Penal os crimes culposos estão previstos em tipos penais abertos salvo no caso da receptação em que o art 180 3º apresenta detalhadamente a descrição típica Tipo de autor e tipo de fato Tipo de autor é o que se relaciona ao Direito Penal do autor É aquele felizmente cada vez mais extirpado do Direito Penal em que não se pune uma conduta e sim uma determinada pessoa em razão de suas condições pessoais Tipo de fato é o que tem por objeto a incriminação de uma conduta criminosa Representa as infrações penais do ordenamento jurídico brasileiro em vigor Tipo simples e tipo misto 1166 Tipo simples é o que abriga em seu interior um único núcleo Define assim uma única conduta típica caracterizando os crimes de ação única É o caso do roubo CP art 157 em que existe apenas o núcleo subtrair Tipo misto é o que tem na sua descrição típica dois ou mais núcleos representando os crimes de ação múltipla ou de conteúdo variado Subdivide se em duas espécies tipo misto alternativo e tipo misto cumulativo No tipo misto alternativo a lei penal descreve duas ou mais condutas como hipóteses de realização de um mesmo crime de maneira que a prática sucessiva dos diversos núcleos caracteriza um único delito São os chamados crimes de ação múltipla de condutas variáveis ou fungíveis Na receptação simples CP art 180 caput por exemplo pratica crime único o agente que adquire um veículo roubado e ciente dessa origem ilícita depois o conduz para sua casa local em que finalmente vem a ocultálo No tipo misto cumulativo a prática de mais de uma conduta leva ao concurso material respondendo o agente por todos os delitos praticados tal como se dá no de abandono material CP art 244 É importante não confundir os tipos mistos cumulativos com os crimes de condutas conjugadas ou seja delitos em que o tipo penal prevê somente um núcleo associado com diversas condutas e se o sujeito realizar mais de uma delas responderá por vários crimes em concurso material ou formal impróprio ou imperfeito dependendo do caso concreto É o que se dá no crime de abandono moral tipificado no art 247 do Código Penal Tipo congruente e tipo incongruente Tipo congruente é aquele em que há perfeita coincidência entre a vontade do autor e o fato descrito na lei penal O agente realiza aquilo que efetivamente desejava É o que ocorre nos crimes dolosos consumados Tipo incongruente é aquele em que não há coincidência entre a vontade do autor e o fato descrito na lei penal ou seja a conduta do agente provoca algo diverso do que era por ele desejado tal como se dá na tentativa nos crimes culposos e nos crimes preterdolosos 1167 1168 Tipo complexo O tipo penal possui uma parte objetiva consistente na descrição da conduta criminosa Para a teoria clássica da conduta é o que basta uma vez que o dolo e a culpa estão alojados no interior da culpabilidade Em uma visão finalista entretanto os elementos anímicos foram transferidos da culpabilidade para a conduta O tipo penal passa então a conter elementos de dois grupos objetivos modelo típico e subjetivos dolo e culpa Falase assim que para os finalistas o tipo penal é complexo o que se justifica pela fusão dos elementos objetivos situados no mundo exterior com os elementos subjetivos situados internamente no psiquismo do agente7 Tipo preventivo O tipo penal preventivo inerente aos crimesobstáculo é aquele de que se vale o legislador para antecipar a tutela do Direito Penal no tocante a determinados bens jurídicos incriminando de forma autônoma atos que por si sós representariam a preparação de outros delitos Como já se pronunciou o Superior Tribunal de Justiça A Turma acompanhando recente assentada quando do julgamento por maioria do REsp 1193805SP manteve o entendimento de que o porte ilegal de arma de fogo é crime de perigo abstrato cuja consumação se caracteriza pelo simples ato de alguém levar consigo arma de fogo sem autorização ou em desacordo com determinação legal sendo irrelevante a demonstração de efetivo caráter ofensivo Isso porque nos termos do disposto no art 16 parágrafo único IV da Lei n 108262003 o legislador teve como objetivo proteger a incolumidade pública transcendendo a mera proteção à incolumidade pessoal bastando assim para a configuração do delito em discussão a probabilidade de dano e não sua ocorrência Segundo se observou a lei antecipa a punição para o ato de portar arma de fogo é portanto um tipo penal preventivo que busca minimizar o risco de comportamentos que vêm produzindo efeitos danosos à sociedade na tentativa de garantir aos cidadãos o exercício do direito à segurança e à própria vida Concluise assim ser irrelevante aferir a eficácia da arma para a configuração do tipo penal que é misto alternativo em que se consubstanciam justamente as condutas que o legislador entendeu por bem prevenir seja ela o simples porte de munição ou mesmo o porte de arma desmuniciada8 1 2 3 4 5 6 7 8 ZAFFARONI Eugenio Raúl Tratado de derecho penal Parte general Buenos Aires Ediar 1982 v 2 p 172 STF Inq 1145PB rel Min Maurício Corrêa Tribunal Pleno j 19122006 GRECO Rogério Curso de direito penal Parte geral 10 ed Rio de Janeiro Impetus 2008 p 181 LUISI Luís O tipo penal a teoria finalista e a nova legislação penal Porto Alegre Fabris 1987 p 57 É importante observar que atualmente a única hipótese em que o Código Penal emprega a palavra honesto está no art 83 III atinente ao livramento condicional Todas as demais outrora existentes foram revogadas pela Lei 111062005 JESUS Damásio E de Direito penal Parte geral 28 ed 2 tir São Paulo Saraiva 2006 v 1 p 275 O tipo normal é também conhecido como neutro acromático ou avalorado em razão de não guardar nenhuma vinculação com a ilicitude ZAFFARONI Eugenio Raúl Derecho penal Parte general 2 ed Buenos Aires Ediar 2002 p 433 HC 211823SP rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 22032012 noticiado no Informativo 493 121 122 INTRODUÇÃO O dolo no sistema finalista integra a conduta e consequentemente o fato típico Cuidase do elemento psicológico do tipo penal implícito e inerente a todo crime doloso Dentro de uma concepção causal por outro lado o dolo funciona como elemento da culpabilidade Em consonância com a orientação finalista por nós adotada o dolo consiste na vontade e consciência de realizar os elementos do tipo incriminador TEORIAS DO DOLO Existem três teorias acerca do dolo a Teoria da representação Para essa teoria a configuração do dolo exige apenas a previsão do resultado Privilegia o lado intelectual não se preocupando com o aspecto volitivo pois pouco importa se o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzilo Basta que o resultado tenha sido antevisto pelo sujeito Em nosso sistema penal tal teoria deve ser afastada por confundir o dolo com a culpa consciente b Teoria da vontade Essa teoria se vale da teoria da representação ao exigir a previsão do resultado Contudo vai mais longe Além da representação reclama ainda a vontade de produzir o resultado 123 c Teoria do assentimento Também chamada de teoria do consentimento ou da anuência complementa a teoria da vontade recepcionando sua premissa Para essa teoria há dolo não somente quando o agente quer o resultado mas também quando realiza a conduta assumindo o risco de produzilo Dispõe o art 18 inciso I do Código Penal Art 18 Dizse o crime I doloso quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzilo O dispositivo legal revela que foram duas as teorias adotadas pelo Código Penal a da vontade ao dizer quis o resultado e a do assentimento no tocante à expressão assumiu o risco de produzilo Dolo é sobretudo vontade de produzir o resultado Mas não é só Também há dolo na conduta de quem após prever e estar ciente de que pode provocar o resultado assume o risco de produzilo ELEMENTOS DO DOLO O dolo é composto por consciência e vontade A consciência é seu elemento cognitivo ou intelectual ao passo que a vontade desponta como seu elemento volitivo Como já se pronunciou o Superior Tribunal de Justiça A doutrina penal brasileira instrui que o dolo conquanto constitua elemento subjetivo do tipo deve ser compreendido sob dois aspectos o cognitivo que traduz o conhecimento dos elementos objetivos do tipo e o volitivo configurado pela vontade de realizar a conduta típica O elemento cognitivo consiste no efetivo conhecimento de que o resultado poderá ocorrer isto é o efetivo conhecimento dos elementos integrantes do tipo penal objetivo A mera possibilidade de conhecimento o chamado conhecimento potencial não basta para caracterizar o elemento cognitivo do dolo No elemento volitivo por seu turno o 124 agente quer a produção do resultado de forma direta dolo direto ou admite a possibilidade de que o resultado sobrevenha dolo eventual1 Tais elementos se relacionam em três momentos distintos e sucessivos Em primeiro lugar operase a consciência da conduta e do resultado Depois o sujeito manifesta sua consciência sobre o nexo de causalidade entre a conduta a ser praticada e o resultado que em decorrência dela será produzido Por fim o agente exterioriza a vontade de realizar a conduta e produzir o resultado Basta para a verificação do dolo que o resultado se produza em conformidade com a vontade esboçada pelo agente no momento da conduta Exemplo A queria matar B Efetua contra ele disparos de arma de fogo Erra os tiros mas B durante a fuga despenca de um barranco bate a cabeça ao solo e morre em decorrência de traumatismo craniano A queria matar e matou Nessa situação A responderá pelo resultado Destarte no tocante ao nexo causal não é preciso que o iter criminis transcorra na forma idealizada pelo agente Subsiste o dolo se o objetivo almejado for alcançado ainda que de modo diverso O dolo deve englobar todas as elementares e circunstâncias do tipo penal Se restar constatada a sua ausência acerca de qualquer parte do crime entra em cena o instituto do erro de tipo Assim no crime de homicídio é necessário que o agente possua consciência de que com sua conduta mata alguém e tenha vontade de fazêlo Como sustentava Hans Welzel para o seu aperfeiçoamento o dolo precisa abranger o objetivo que o agente deseja alcançar os meios que emprega para tanto bem como as consequências secundárias necessariamente vinculadas com o emprego dos meios2 DOLO NATURAL E DOLO NORMATIVO A divisão do dolo em natural e normativo relacionase ao sistema penal clássico ou finalista e à teoria adotada para definição da conduta No sistema clássico em que imperava a teoria causalista ou 125 mecanicista da conduta o dolo e a culpa estava alojado no interior da culpabilidade a qual era composta por três elementos imputabilidade dolo ou culpa e exigibilidade de conduta diversa O dolo ainda abrigava em seu bojo a consciência da ilicitude do fato Esse dolo revestido da consciência da ilicitude do fato era chamado de dolo normativo também conhecido como dolo colorido ou valorado Com o surgimento do sistema finalista no qual vigora a teoria finalista da conduta o dolo foi transferido da culpabilidade para a conduta Passou portanto a integrar o fato típico A culpabilidade continuou a ser composta de três elementos porém distintos imputabilidade potencial consciência da ilicitude e exigibilidade de conduta diversa O dolo abandonou a culpabilidade para residir no fato típico A consciência da ilicitude que era atual passou a ser potencial e deixou de habitar o interior do dolo para ter existência autônoma como elemento da culpabilidade Tal dolo livre da consciência da ilicitude é chamado de dolo natural incolor ou avalorado3 Em síntese o dolo normativo está umbilicalmente ligado ao sistema penal clássico ao passo que o dolo natural se vincula ao sistema finalista ESPÉCIES DE DOLO Dolo direto também denominado dolo determinado intencional imediato ou ainda dolo incondicionado é aquele em que a vontade do agente é voltada a determinado resultado Ele dirige sua conduta a uma finalidade precisa É o caso do assassino profissional que desejando a morte da vítima dispara contra ela um único tiro certeiro e fatal Dolo indireto ou indeterminado por sua vez é aquele em que o agente não tem a vontade dirigida a um resultado determinado Subdividese em dolo alternativo e em dolo eventual Dolo alternativo é o que se verifica quando o agente deseja indistintamente um ou outro resultado Sua intenção se destina com igual intensidade a produzir um entre vários resultados previstos como possíveis É o caso do sujeito que atira contra o seu desafeto com o propósito de matar ou ferir Se matar responderá por homicídio Mas e se ferir responderá por tentativa de homicídio ou por lesões corporais Em caso de dolo alternativo o agente sempre responderá pelo resultado mais grave Justificase esse raciocínio pelo fato de o Código Penal ter adotado em seu art 18 I a teoria da vontade E assim sendo se teve a vontade de praticar um crime mais grave por ele deve responder ainda que na forma tentada Dolo eventual é a modalidade em que o agente não quer o resultado por ele previsto mas assume o risco de produzilo É possível a sua existência em decorrência do acolhimento pelo Código Penal da teoria do assentimento na expressão assumiu o risco de produzilo contida no art 18 I do Código Penal Imagine o exemplo de um fazendeiro colecionador de armas de fogo que treina tiro ao alvo em sua propriedade rural Certo dia ele decide atirar com um fuzil de longo alcance Sabe que os projéteis têm capacidade para chegar até uma estrada próxima com pequeno fluxo de transeuntes Prevê que assim agindo pode matar alguém Nada obstante assume o risco de produzir o resultado e insiste em sua conduta Acaba atingindo um pedestre que vem a falecer Responde por homicídio doloso pois presente se encontra o dolo eventual Devese ao alemão Reinhart Frank a formulação de um princípio rotulado de teoria positiva do conhecimento4 que é útil como critério prático para identificar o dolo eventual Para esse postulado há dolo eventual quando o agente diz a si mesmo seja assim ou de outra maneira suceda isto ou aquilo em qualquer caso agirei revelando a sua indiferença em relação resultado Na esteira do entendimento do Supremo Tribunal Federal Salientouse que no Direito Penal contemporâneo além do dolo direto em que o agente quer o resultado como fim de sua ação e o considera unido a esta última há o dolo eventual em que o sujeito não deseja diretamente a realização do tipo penal mas a aceita como possível ou provável CP art 18 I in fine Relativamente a este ponto aduziuse que dentre as várias teorias que buscam justificar o dolo eventual destacase a do assentimento ou da assunção consoante a qual o dolo exige que o agente aquiesça em causar o resultado além de reputálo como possível Assim esclareceuse que na espécie a questão principal diz respeito à distinção entre dolo eventual e culpa consciente ambas apresentando em comum a previsão do resultado ilícito Observouse que para a configuração do dolo eventual não é necessário o consentimento explícito do agente nem sua consciência reflexiva em relação às circunstâncias do evento sendo imprescindível isso sim que delas circunstâncias se extraia o dolo eventual e não da mente do autor5 O dolo eventual é admitido em todo e qualquer crime que seja com ele compatível e deve ser detalhadamente descrito na inicial acusatória denúncia ou queixacrime6 Há casos entretanto em que o tipo penal exige expressamente o dolo direto afastando o cabimento do dolo eventual É o que se verifica no crime de receptação dolosa no qual o art 180 caput do Código Penal utiliza a expressão coisa que sabe ser produto de crime indicativa de dolo direto Da mesma forma o crime de denunciação caluniosa CP art 339 exige a imputação de crime de que o sabe inocente Alguns autores criticam o dolo eventual dizendo ser inócuo pois a sua prova residiria exclusivamente na mente do autor Não procedem tais alegações pois o dolo eventual assim como o dolo direto não tem a sua comprovação limitada ao psiquismo interno do agente Extraise ao contrário das circunstâncias do caso concreto tais como os meios empregados a apreciação da situação precedente o comportamento do agente posteriormente ao crime e sua personalidade entre tantos outros que somente a vida real pode esgotar Como já decidido pelo Superior Tribunal de Justiça O dolo eventual na prática não é extraído da mente do autor mas isto sim das circunstâncias Nele não se exige que o resultado seja aceito como tal o que seria adequado ao dolo direto mas isto sim que a aceitação se mostre no plano do possível provável7 O dolo eventual não tem por si só reprovabilidade inferior ao dolo direto O Código Penal os colocou em idêntica posição jurídica A penabase será fixada levandose em conta as circunstâncias judiciais previstas no art 59 não se incluindo nesse rol a modalidade do dolo A jurisprudência posicionase no sentido de existir dolo eventual na conduta do agente responsável por graves crimes praticados na direção de veículo automotor Esta escolha fundamentase nas diversas campanhas educativas realizadas nas últimas décadas demonstrando os inúmeros riscos da direção ousada e perigosa como se dá no racha e no excesso de velocidade em via pública Tais advertências são suficientes para esclarecer os motoristas da vedação legal de tais comportamentos bem como dos resultados danosos que em razão delas são rotineiramente produzidos E se mesmo assim continua o condutor de veículo automotor a agir de forma imprudente revela inequivocamente sua indiferença com a vida e a integridade corporal alheia devendo responder pelo crime doloso a que der causa Na visão do Supremo Tribunal Federal O réu ao lançarse em prática de altíssima periculosidade em via pública e mediante alta velocidade teria consentido com que o resultado se produzisse de sorte a incidir em dolo eventual CP art 18 I Dizse o crime I doloso quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzilo No ponto assentouse que o Supremo firmara jurisprudência no sentido de que o homicídio cometido na direção de veículo automotor em virtude de pega seria doloso8 No tocante ao homicídio cometido na direção de veículo automotor encontrandose o condutor em estado de embriaguez a análise da situação concreta é fundamental para a tipificação da conduta Exemplificativamente pode ser reconhecida a culpa consciente na atividade daquele que atropelou e matou um pedestre por ter perdido levemente o controle do automóvel após a ingestão de uma taça de vinho durante o almoço em família mas certamente estará presente o dolo eventual no comportamento de quem atropela e mata alguém ao invadir uma calçada com seu veículo automotor em excesso de velocidade depois de ter bebido um litro de vodka em uma festa durante a madrugada Na linha da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal A Primeira Turma por maioria denegou a ordem de habeas corpus em que se pleiteava a reforma da decisão que reconheceu a ocorrência de dolo eventual em relação a homicídio cometido por motorista embriagado na direção de veículo automotor firmada a competência do tribunal do júri O impetrante apontava equívoco no enquadramento legal realizado na origem Pleiteava a desclassificação da conduta para o crime previsto no art 302 do Código de Trânsito Brasileiro O Colegiado considerou legítima a tipificação da conduta como crime doloso de competência do tribunal do júri ante o reconhecimento da evolução jurisprudencial na análise do que vem a ser dolo eventual e culpa consciente No caso verificase a existência de dolo eventual no ato de dirigir veículo automotor sob a influência de álcool além de fazêlo na contramão Esse é portanto um caso específico que evidencia a diferença entre a culpa consciente e o dolo eventual O condutor assumiu o risco ou no mínimo não se preocupou com o risco de eventualmente causar lesões ou mesmo a morte de outrem9 Com efeito a conclusão pelo dolo direto ou eventual acarreta na incidência do crime definido no art 121 do Código Penal de competência do Tribunal do Júri ao passo que a presença da culpa resulta no delito previsto no art 302 da Lei 95031997 Código de Trânsito Brasileiro cujo processo e julgamento é reservado ao juízo singular10 Essa divisão diz respeito aos motivos do crime que podem aumentar a pena como no caso do motivo torpe ou diminuíla tal como se dá no motivo de relevante valor social ou moral É mencionada pela doutrina mas guarda maior intimidade com o Direito Civil Dolo de propósito ou refletido é o que emana da reflexão do agente ainda que pequena acerca da prática da conduta criminosa Verificase nos crimes premeditados Dolo de ímpeto ou repentino é o que se caracteriza quando o autor pratica o crime motivado por paixão violenta ou excessiva perturbação de ânimo Não há intervalo entre a cogitação do crime e a execução da conduta penalmente ilícita Ocorre geralmente nos crimes passionais Essa classificação ganhou destaque na teoria clássica da conduta Falavase em dolo genérico quando a vontade do agente se limitava à prática da conduta típica sem nenhuma finalidade específica tal como no crime de homicídio em que é suficiente a intenção de matar alguém pouco importando o motivo para a configuração da modalidade básica do crime Por outro lado o dolo específico existia nos crimes em que a referida vontade era acrescida de uma finalidade especial No caso da injúria por exemplo não basta a atribuição à vítima de uma qualidade negativa Exigese também tenha a conduta a finalidade de macular a honra subjetiva da pessoa ofendida Atualmente com a superveniência da teoria finalista utilizase o termo dolo para referirse ao antigo dolo genérico A expressão dolo específico por sua vez foi substituída por elemento subjetivo do tipo ou ainda elemento subjetivo do injusto Dolo presumido ou dolo in re ipsa seria a espécie que dispensa comprovação no caso concreto Não pode ser admitido no Direito Penal moderno que não aceita a responsabilidade penal objetiva11 Com efeito vigora em nosso ordenamento jurídicopenal o princípio da responsabilidade subjetiva como corolário do Direito Penal do fato adequado ao plexo de garantias vigente no Estado Democrático de Direito Tal sistemática impõe ao órgão acusatório o ônus da prova acerca dos elementos constitutivos do tipo penal incriminador inclusive do dolo e também na culpa nos termos do art 156 do Código de Processo Penal a ser exercido no seio do contraditório estabelecido em juízo em respeito à clausula do devido processo legal12 Dolo de dano ou de lesão é o que se dá quando o agente quer ou assume o risco de lesionar um bem jurídico penalmente tutelado É exigido para a prática de um crime de dano Na lesão corporal por exemplo exigemse a consciência e a vontade de ofender a saúde ou a integridade corporal de outrem Dolo de perigo é o que ocorre quando o agente quer ou assume o risco de expor a perigo de lesão um bem jurídico penalmente tutelado No crime tipificado pelo art 130 do Código Penal exemplificativamente o dolo do agente se circunscreve à exposição de alguém por meio de relações sexuais ou de ato libidinoso a contágio de moléstia venérea de que sabe ou deve saber que está contaminado O dolo de primeiro grau consiste na vontade do agente direcionada a determinado resultado efetivamente perseguido englobando os meios necessários para tanto Há a intenção de atingir um único bem jurídico Exemplo o matador de aluguel que persegue e mata com golpes de faca a vítima indicada pelo mandante Dolo de segundo grau ou de consequências necessárias é a vontade do agente dirigida a determinado resultado efetivamente desejado em que a utilização dos meios para alcançálo inclui obrigatoriamente efeitos colaterais de verificação praticamente certa O agente não deseja imediatamente os efeitos colaterais mas tem por certa a sua superveniência caso se concretize o resultado pretendido Citase o exemplo do assassino que desejando eliminar a vida de determinada pessoa que se encontra em lugar público instala ali uma bomba a qual quando detonada certamente matará outras pessoas ao seu redor Mesmo que não queira atingir essas outras vítimas tem por evidente o resultado se a bomba explodir como planejado13 Não nos parece correto falar em dolo de terceiro grau o qual funcionaria como consequência inevitável do dolo de segundo grau No exemplo mencionado se uma das pessoas mortas pela explosão da bomba fosse uma mulher grávida o assassino também deveria responder pelo aborto em face do seu dolo de terceiro grau Em nossa opinião eventual responsabilização penal pelo aborto decorre do dolo de segundo grau pois todo e qualquer crime praticado naquele contexto figura como consequência necessária da conduta do agente voltada ao resultado determinado qual seja a explosão da bomba para matar a pessoa por ele diretamente visada É o erro no tocante ao meio de execução do crime relativamente à forma pela qual se produz o resultado inicialmente desejado pelo agente Ocorre quando o sujeito acreditando já ter alcançado o resultado almejado pratica uma nova conduta com finalidade diversa e ao final se constata que foi esta última que produziu o que se buscava desde o início Esse erro é irrelevante no Direito Penal de natureza acidental pois o que importa é que o agente queria um resultado e o alcançou O dolo é geral e envolve todo o desenrolar da ação típica do início da execução até a consumação do delito Vejamos um exemplo A encontra seu desafeto B em uma ponte Após conversa enganosa oferecelhe uma bebida misturada com veneno B inocente ingere o líquido Em seguida cai ao solo e o autor acredita estar ele morto Com o propósito de ocultar o cadáver A coloca o corpo de B em um saco plástico e o lança ao mar Dias depois o cadáver é encontrado em uma praia e submetido a exame necroscópico concluise ter a morte ocorrido por força de asfixia provocada por afogamento Nesse caso o autor deve responder por homicídio consumado Queria a morte de B e a ela deu causa Há perfeita congruência entre sua vontade e o resultado naturalístico produzido Há polêmica no tocante à incidência da qualificadora Para uma primeira corrente deve ser considerado o meio de execução que o agente desejava empregar para a consumação em nosso exemplo o veneno e não aquele que acidentalmente permitiu a eclosão do resultado naturalístico asfixia provocada pelo afogamento Entretanto para uma segunda corrente é preciso levar em conta o meio que efetivamente levou à consumação do crime asfixia e não aquele visado pelo agente veneno14 Dolo antecedente também conhecido como inicial ou preordenado é o que existe desde o início da execução do crime É suficiente para fixar a responsabilidade penal do agente Com efeito não é necessário que o dolo subsista durante o integral desenvolvimento dos atos executórios Há quem não concorde com essa espécie de dolo A propósito discorre Guilherme de Souza Nucci Tratase de elemento subjetivo inadequado para a teoria do crime O autor deve agir sempre com dolo atual isto é concomitante à conduta desenvolvese a sua intenção de realização do tipo penal15 Dolo atual ou concomitante é aquele em que persiste a vontade do agente durante todo o desenvolvimento dos atos executórios Dolo subsequente ou sucessivo finalmente é o que se verifica quando o agente depois de iniciar uma ação com boafé passa a agir de forma ilícita e por corolário pratica um crime ou ainda quando conhece posteriormente a ilicitude de sua conduta e ciente disso não procura evitar suas consequências 126 A diferença entre dolo antecedente e dolo subsequente é relevante para a distinção dos crimes de apropriação indébita CP art 168 e estelionato CP art 171 Na apropriação indébita o agente comportase como proprietário de uma coisa da qual tinha a posse ou detenção Recebeu o bem licitamente de boa fé mas posteriormente surge o dolo e ele não mais restitui a coisa como se seu dono fosse O dolo é subsequente Exemplo A vai a uma locadora da qual é filiado e toma emprestado um DVD de forma correta Após assistir ao filme do qual gosta muito e aproveitandose que está se mudando de país decide ficar com o bem para si e não mais o devolve dolosamente Já no estelionato o agente desde o início tem a intenção de obter ilicitamente para si o bem utilizandose de meio fraudulento para induzir a vítima a erro alcançando vantagem pessoal em prejuízo alheio O dolo é inicial Exemplo B vai à mesma locadora da qual não é sócio Apresenta documentos falsos e cria uma ficha para locação Pega um DVD levao embora e não mais retorna para devolvêlo O DOLO NAS CONTRAVENÇÕES PENAIS O art 3º do Decretolei 36881941 Lei das Contravenções Penais com a rubrica Voluntariedade Dolo e culpa estabelece Para a existência da contravenção basta a ação ou omissão voluntária Devese todavia ter em conta o dolo ou a culpa se a lei faz depender de um ou de outra qualquer efeito jurídico A primeira parte do dispositivo dizendo que para a existência da contravenção penal basta a ação ou omissão voluntária revela a íntima ligação entre a Lei das Contravenções Penais com a teoria clássica ou causal da conduta De fato o diploma legal foi promulgado na década de 40 do século passado mesma época em que entrou em vigor o Código Penal Entretanto a Lei 72091984 modificou substancialmente a Parte Geral do Código Penal a ele conferindo uma sensível orientação finalista A Lei das Contravenções Penais por sua vez foi mantida e com ela a concepção 127 clássica então reinante Por tal motivo consta do texto de lei ser suficiente para a existência da contravenção a ação ou omissão voluntária Como se sabe na teoria clássica o dolo e a culpa figuravam como elementos da culpabilidade Por corolário para a conduta seria suficiente a ação ou omissão Mas a regra deve ser interpretada levandose em conta que as contravenções penais são geralmente infrações penais de mera conduta sem produção de resultado naturalístico Assim basta efetivamente a ação ou omissão voluntária pois o dolo em consonância com o art 18 do Código Penal ocorre quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzilo E diz a segunda parte do dispositivo devese ter em conta o dolo ou a culpa se a lei faz depender de um ou de outra qualquer efeito jurídico Destarte quando a contravenção penal não se enquadrar como de mera conduta aí sim a lei exige expressamente o dolo e a culpa Concluise assim que o dispositivo não consagra a responsabilidade penal objetiva Quando se fala em ação ou omissão voluntária referese à vontade elemento da conduta e também do dolo Não há assim diferença entre o tipo subjetivo do crime e o tipo subjetivo da contravenção penal Nos dois casos exigese o dolo ainda que sem apontálo expressamente mas chamandoo apenas de ação ou omissão voluntária consistente na vontade de realizar os elementos do tipo colocandose o sujeito consciente e deliberadamente em situação ilícita PROVA DO DOLO E TEORIA DOS INDICADORES EXTERNOS O dolo seja qual for a sua espécie é um fenômeno interno do agente Mas isso não impossibilita seja provado no caso concreto Para essa finalidade Winfried Hassemer desenvolveu a teoria dos indicadores externos caracterizada pela união dos aspectos material e processual do dolo Para essa teoria é necessário analisar todas as circunstâncias ligadas à atuação do agente em três etapas distintas e sucessivas a demonstração do perigo ao bem jurídico b visão do agente acerca desse perigo e c decisão do agente sobre a realização do perigo atacando o bem jurídico16 Em síntese o dolo é um fenômeno interno do agente mas para sua afirmação reclama prova de indicadores externos Em última instância o dolo nada mais é do que a sua própria demonstração concreta 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 AgRg no REsp 1043279PR rel Min Jane Silva Desembargadora convocada do TJMG 6ª Turma j 14102008 WELZEL Hans La teoría de la acción finalista Buenos Aires Depalma 1951 p 21 ZAFFARONI Eugenio Raúl Derecho penal Parte general 2 ed Buenos Aires Ediar 2002 p 731 Seja como for dê no que der em qualquer caso não deixo de agir HC 91159MG rel Min Ellen Gracie 2ª Turma j 02092008 noticiado no Informativo 518 É inepta a denúncia que ao descrever a conduta do acusado como sendo dolosa o faz de forma genérica a ponto de ser possível enquadrála tanto como culpa consciente quanto como dolo eventual Com efeito o elemento psíquico que caracteriza o injusto penal em sua forma dolosa ou culposa deve estar bem caracterizado desde a denúncia pois é tênue a linha entre o dolo eventual e a culpa consciente STJ RHC 39267RJ rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 08042014 noticiado no Informativo 538 REsp 247263MG rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 05042001 E também AgRg no REsp 1043279PR rel Min Jane Silva Desembargadora convocada do TJMG 6ª Turma j 14102008 HC 101698RJ rel Min Luiz Fux 1ª Turma j 18102011 noticiado no Informativo 645 HC 124687MS rel Min Marco Aurélio red p o ac Min Roberto Barroso 1ª Turma j 29052018 noticiado no Informativo 904 O STJ compartilha deste entendimento REsp 1689173SC rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 21112017 noticiado no Informativo 623 Para o Superior Tribunal de Justiça na primeira fase do Tribunal do Júri ao juiz togado cabe apreciar a existência de dolo eventual ou culpa consciente do condutor do veículo que após a ingestão de bebida alcoólica ocasiona acidente de trânsito com resultado morte O legislador criou um procedimento bifásico para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida em que a primeira fase se encerra com uma avaliação técnica empreendida por um juiz togado o qual se socorre da dogmática penal e da prova dos autos e mediante devida fundamentação 11 12 13 14 15 16 portanto não se pode desprezar esse filtro de proteção para o acusado e submetêlo ao julgamento popular sem que se façam presentes as condições necessárias e suficientes para tanto REsp 1689173SC rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 21112017 noticiado no Informativo 623 o prefeito foi incluído entre os acusados unicamente em razão da função pública hierarquicamente superior à dos demais envolvidos sem indicação mínima de sua participação em prática ilícita o que evidencia por conseguinte violação à responsabilidade penal subjetiva em contraposição à objetiva cuja demonstração repele a responsabilidade presumida STF AP 912PB rel Min Luiz Fux 1ª Turma j 07032017 noticiado no Informativo 856 Inq 4483 AgRsegundoDF e Inq 4327 AgRsegundoDF rel Min Edson Fachin Plenário j 14122017 e 19122017 noticiados no Informativo 888 ROXIN Claus Derecho penal Parte general Fundamentos La estructura de la teoria del delito Trad espanhola DiegoManuel Luzón Peña Miguel Díaz y García Conlledo e Javier de Vicente Remensal Madrid Civitas 2006 p 423424 É a posição de COSTA JR Paulo José da O crime aberrante Belo Horizonte Del Rey 1996 p 7879 NUCCI Guilherme de Souza Código Penal comentado 6 ed São Paulo RT 2006 p 191 HASSEMER Winfried Los elementos característicos del dolo In Anuario de Derecho Penal y Ciencias penales Tradução de María del Mar Diaz Pita Centro de Publicaciones del Ministerio de Justicia 1990 p 931 Dentro de uma concepção finalista culpa é o elemento normativo da conduta pois a sua aferição depende da valoração do caso concreto Somente após minucioso juízo de valor poderá o intérprete afirmar se ela ocorreu ou não Os crimes culposos em regra são previstos por tipos penais abertos pois a lei não diz expressamente no que consiste o comportamento culposo reservando tal missão ao magistrado na apreciação da lide posta à sua análise Geralmente o tipo penal descreve a modalidade dolosa e quando a ele também atribui variante culposa menciona expressamente a fórmula se o crime é culposo Nada impede entretanto a definição de um crime culposo em um tipo penal fechado tal como ocorre na receptação culposa CP art 180 3º na qual o legislador aponta expressamente as formas pelas quais a culpa pode se manifestar 1 natureza ou desproporção entre o valor e o preço da coisa adquirida ou recebida pelo agente 2 condição de quem a oferece ou 3 no caso de se tratar de coisa que deve presumirse obtida por meio criminoso A opção legislativa pela descrição de crimes culposos por meio de tipos fechados seria indiscutivelmente mais segura e precisa De outro lado essa escolha logo se revelaria insuficiente pois seria impossível à lei prever antecipadamente todas as situações culposas que podem ocorrer na vida cotidiana No passado diversos autores se manifestaram pela inutilidade da aplicação da pena ao crime culposo Na Itália Puglia e Vanini sustentavam que essa modalidade de delito não provém de um impulso contrário ao Direito e consequentemente a pena se mostraria ineficaz já que a sua função seria a de afastar temporariamente do convívio social os indivíduos que revelam periculosidade fator inexistente no sujeito que praticou uma lesão por não a ter previsto quando a deveria prever Com o advento da Escola Positiva a punição da culpa passou a ser reclamada por necessidade social por ser a sanção penal uma reação constante e independente da vontade O homem seria responsável tanto pelo crime culposo como pelo crime doloso porque vive em sociedade Atualmente encontrase encerrada a discussão acerca da obrigatoriedade de punição do crime culposo O interesse público impõe consequências penais àqueles que agem culposamente visando a preservação de bens indispensáveis ou relevantes à vida em sociedade Oportuna a lição de E Magalhães Noronha ainda mais forte na modernidade em que ora vivemos com exemplos constantes de acidentes aéreos desabamentos de construções e estádios de futebol crateras de metrôs que tiram a vida de inúmeras pessoas e tantos outros casos que infelizmente vêm se tornando cada vez mais rotineiros É indiscutível pois a necessidade da repressão e prevenção do delito culposo Este é sobretudo o delito dos tempos atuais do progresso e da civilização Com o desenvolvimento da indústria com o advento da era da máquina multiplicaramse os crimes culposos Basta confrontarse o Código Penal vigente com o do Império para se verificar o chocante contraste entre eles em matéria de culpa A consciência social hoje não mais suportaria o olvido do delito culposo Os grandes sinistros desastres ferroviários aéreos marítimos incêndios de arranhacéus etc produzindo numerosas vítimas e danos patrimoniais vultosos exigem sempre a apuração da causa que não é tolerável quando se demonstra ter sido gerada pela imprudência negligência ou imperícia de uma ou outra pessoa Em situações tais confrangenos a ideia de que nunca tantos pagaram por tão poucos1 Em respeito ao menor desvalor da conduta porém os crimes culposos são apenados de modo mais brando do que os dolosos Lembremos a propósito do crime de homicídio culposo na direção de veículo automotor CTB art 302 no qual mesmo com a eliminação da vida humana por força da falta de atenção no emprego de meio de transporte indispensável nos dias em que vivemos a pena máxima é de detenção por quatro anos de rara aplicação prática Em outro polo um crime de furto praticado em concurso de pessoas ainda que o bem subtraído seja de pequeno valor pode ter a pena máxima de oito anos de reclusão sem prejuízo da multa Para possibilitar a integral assimilação do crime culposo apresentaremos um conceito posteriormente fracionado em diversos elementos Com seus elementos e também com o exame das espécies de crimes culposos será mais didática a compreensão do assunto frequente em concursos públicos e alvo de inúmeras provas dissertativas Crime culposo é o que se verifica quando o agente deixando de observar o dever objetivo de cuidado por imprudência negligência ou imperícia realiza voluntariamente uma conduta que produz resultado naturalístico não previsto nem querido mas objetivamente previsível e excepcionalmente previsto e querido que podia com a devida atenção ter evitado O crime culposo possui em regra os seguintes elementos assim representados 1341 Conduta voluntária No crime culposo a vontade do agente se limita à prática de uma conduta perigosa por ele aceita e desejada2 É importante destacar que a vontade do agente circunscrevese à realização da conduta e não à produção do resultado naturalístico Caso contrário ou seja desejando concretizar o resultado a hipótese é de crime doloso Ninguém duvida por exemplo que o motorista que conduz o seu automóvel a 180 quilômetros por hora em via pública movimentada e atropela um pedestre matandoo quis dirigir seu veículo em excesso de velocidade O crime culposo pode ser praticado por ação ou omissão Há culpa tanto quando a mãe coloca a criança para ser aquecida próxima ao fogo vindo a ser queimada ação como quando a mãe desidiosa dorme em excesso e não ministra ao bebê medicamentos no horário adequado prejudicando a sua saúde omissão A conduta todavia é penalmente lícita ou quando ilícita não se destina à produção do resultado naturalístico integrante do crime culposo É o caso da pessoa que trafega em velocidade incompatível com a segurança na proximidade de uma escola Ainda que se subsuma ao modelo típico previsto no art 311 da Lei 95031997 Código de Trânsito Brasileiro não se relaciona ao homicídio culposo na direção de veículo automotor CTB art 302 enquanto não for retirada a vida de alguém 1342 13421 13422 134221 Violação do dever objetivo de cuidado Apontamentos gerais A vida em sociedade retira do homem o direito de fazer tudo o que desejar quando e onde o desejar Os interesses de terceiras pessoas e da própria comunidade lhe impõem barreiras instransponíveis Nesse diapasão o dever objetivo de cuidado é o comportamento imposto pelo ordenamento jurídico a todas as pessoas visando o regular e pacífico convívio social No crime culposo tal dever é desrespeitado pelo agente com a prática de uma conduta descuidada a qual fundada em injustificável falta de atenção emana de sua imprudência negligência ou imperícia Em razão de existir em todo delito culposo essa violação ao dever objetivo de cuidado alguns doutrinadores referemse a ele como o objeto central do estudo do Direito Penal da Negligência o gênero que teria como espécies a imprudência a negligência propriamente dita e a imperícia3 Modalidades de culpa Imprudência negligência e imperícia são modalidades e não espécies de culpa É por meio delas que o crime culposo se manifesta por tais modos ele se realiza no mundo exterior Imprudência É a forma positiva da culpa in agendo consistente na atuação do agente sem observância das cautelas necessárias É a ação intempestiva e irrefletida Tem forma ativa Desenvolvese sempre de modo paralelo à ação ou seja surge e se manifesta enquanto o seu autor pratica a conduta No caso em que o motorista dirige seu veículo automotor enquanto ele respeitar as leis de trânsito a sua conduta é correta A partir do momento em que passa por exemplo a dirigir em excesso de velocidade surge a imprudência E quanto mais ele insistir e agravar essa conduta mais duradoura e perceptível será essa modalidade de 134222 134223 culpa Negligência É a inação a modalidade negativa da culpa in omitendo consistente na omissão em relação à conduta que se devia praticar Negligenciar é omitir a ação cuidadosa que as circunstâncias exigem Ocorre previamente ao início da conduta É o caso do agente que deixa a arma de fogo municiada em local acessível a menor de idade inabilitado para manuseála que dela se apodera vindo a matar alguém O responsável foi negligente e depois da sua omissão e em razão dela a conduta criminosa foi praticada Imperícia É também chamada de culpa profissional pois somente pode ser praticada no exercício de arte profissão ou ofício Sempre ocorre no âmbito de uma função na qual o agente em que pese esteja autorizado a desempenhá la não possui conhecimentos práticos ou teóricos para fazêla a contento Toda profissão arte ou ofício são regidas por princípios e regras que devem ser do conhecimento e do domínio de todos que a elas se dedicam Se tais pessoas ultrapassarem os seus limites conscientes ou inconscientes de sua incapacidade violam a lei e respondem pelas consequências A imperícia somente pode acontecer no exercício de arte profissão ou ofício Pode até ocorrer fora destas mas sob o ponto de vista jurídico deverá então ser tratada como imprudência ou negligência Assim por exemplo se um médico realizando um parto causa a morte da gestante será imperito Entretanto se a morte for provocada pelo parto mal efetuado por um curandeiro não há falar em imperícia mas em imprudência E ainda os erros cometidos no desempenho de arte profissão ou ofício não serão sempre frutos da imperícia pois podem ser ordenados por negligência ou imprudência Negligente seria por exemplo o médico que ao receitar trocasse o nome do medicamento provocando a morte do doente Por seu turno imprudente 134224 seria exemplificativamente o cirurgião que podendo realizar a operação por um método simples e conhecido decide utilizar por vaidade profissional outro mais complexo e difícil daí resultando a morte do paciente Anotese porém que nem toda falha no exercício de arte profissão ou ofício constituise em imperícia A lei ao determinar os requisitos necessários ao exercício de determinada atividade não pode exigir de todas as pessoas o mesmo talento igual cultura ou idêntica habilidade Nesse passo a imperícia não se confunde com o erro profissional Erro profissional é o que resulta da falibilidade das regras científicas O agente conhece e observa as regras da sua atividade as quais todavia por estarem em constante evolução mostramse imperfeitas e defasadas para a solução do caso concreto Exemplo Um paciente com câncer no cérebro é internado em hospital especializado e seu tratamento fica a cargo de determinado médico Todos os procedimentos para combate e eliminação da doença são realizados da melhor forma possível Nada obstante o paciente morre Questionase Nesse caso há imperícia por parte do médico É claro que não pois ele realizou com zelo todos os procedimentos e protocolos que tinha à sua disposição A culpa não é dele mas da própria ciência da medicina que não se mostra capacitada para enfrentar com sucesso o problema que lhe foi apresentado Destarte o erro profissional exclui a culpa uma vez que o resultado ocorre não em razão da conduta do agente e sim pelas deficiências da própria ciência Modalidades de culpa e descrição fática Qualquer das modalidades da culpa imprudência negligência ou 1343 imperícia deve ser detalhadamente descrita na inicial acusatória denúncia ou queixacrime sob pena de inépcia em face da violação do direito à ampla defesa e da caracterização da responsabilidade penal objetiva Na lúcida visão do Superior Tribunal de Justiça É inepta a denúncia que imputa a prática de homicídio culposo na direção de veículo automotor art 302 da Lei 95031997 sem descrever de forma clara e precisa a conduta negligente imperita ou imprudente que teria gerado o resultado morte sendo insuficiente a simples menção de que o suposto autor estava na direção do veículo no momento do acidente Isso porque é ilegítima a persecução criminal quando comparandose o tipo penal apontado na denúncia com a conduta atribuída ao denunciado não se verificar o preenchimento dos requisitos do art 41 do CPP necessários ao exercício do contraditório e da ampla defesa De fato não se pode olvidar que o homicídio culposo se perfaz com a ação imprudente negligente ou imperita do agente modalidades de culpa que devem ser descritas na inicial acusatória sob pena de se punir a mera conduta de envolverse em acidente de trânsito algo irrelevante para o Direito Penal A imputação sem a observância dessas formalidades representa a imposição de indevido ônus do processo ao suposto autor ante a ausência da descrição de todos os elementos necessários à responsabilização penal decorrente da morte da vítima Configura ademais responsabilização penal objetiva derivada da mera morte de alguém em razão de acidente causado na direção de veículo automotor4 Resultado naturalístico involuntário No crime culposo o resultado naturalístico modificação do mundo exterior provocada pela conduta do agente funciona como elementar do tipo penal Em consequência todo crime culposo integra o grupo dos crimes materiais O sistema penal brasileiro não admite crimes culposos de mera conduta ao contrário do que ocorre em outros países como na Itália5 O resultado naturalístico é obrigatoriamente involuntário salvo na culpa 1344 1345 1346 imprópria adiante analisada Concluise assim ser o crime culposo incompatível com a tentativa É óbvio que não se pode aceitar o início da execução de um crime que não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente na hipótese em que o resultado não é desejado Portanto ou o resultado se produz e o crime está consumado ou da conduta perigosa não sobrevém o resultado e o fato é um irrelevante penal ao menos para a tipificação do crime culposo6 Nexo causal Por se tratar de crime material a perfeição do crime culposo depende da produção do resultado naturalístico E como ocorre nos demais crimes materiais exigese o nexo causal isto é a relação de causa e efeito entre a conduta voluntária perigosa e o resultado involuntário Em consonância com a teoria da conditio sine qua non adotada pelo art 13 caput do Código Penal deve ser provado por exemplo que a morte da vítima foi produzida pela conduta do agente No âmbito jurídico a afirmação da causalidade deve estar respaldada em elementos empíricos demonstrativos que o resultado não ocorreria com um grau de probabilidade nos limites da certeza se a ação devida fosse efetivamente evitada ou realizada tal como o contexto o determinava Caso essa relação não seja empiricamente comprovada é de se negar a causalidade7 Tipicidade A tipicidade é elemento do fato típico em todos os crimes Dessa forma precisa estar presente para a configuração do crime culposo Reclamase o juízo de subsunção de adequação entre a conduta praticada pelo agente no mundo real e a descrição típica contida na lei penal para o aperfeiçoamento do delito culposo Previsibilidade objetiva É a possibilidade de uma pessoa comum com inteligência mediana prever o resultado Esse indivíduo comum de atenção diligência e perspicácia normais à generalidade das pessoas é o que se convencionou chamar de homem médio homo medius Não se trata de pessoa brilhante e genial nem de um ser humano indolente e desleixado É uma pessoa normal de comportamento padrão quando comparado aos indivíduos em geral Falase também em homem standard Existe a previsibilidade do resultado quando mediante um juízo de valor se conclui que o homem médio nas condições em que se encontrava o agente teria antevisto o resultado produzido Nas lições de Nélson Hungria Existe previsibilidade quando o agente nas circunstâncias em que se encontrou podia segundo a experiência geral terse representado como possíveis as consequências do seu ato Previsível é o fato cuja possível superveniência não escapa à perspicácia comum Por outras palavras é previsível o fato sob o prisma penal quando a previsão do seu advento no caso concreto podia ser exigida do homem normal do homo medius do tipo comum de sensibilidade éticosocial8 Em suma por ser a culpa o elemento normativo do tipo penal o magistrado deve valorar a situação inserindo hipoteticamente o homem médio no lugar do agente no caso concreto Se concluir que o resultado era previsível àquele estará configurada a previsibilidade a este Daí falarse em previsibilidade objetiva por levar em conta o fato concreto e um elemento padrão para a sua aferição e não o agente9 Embora existam valiosos entendimentos nesse sentido deve ser refutada a proposta de apreciar a previsibilidade de forma subjetiva isto é sob o prisma subjetivo do autor do fato a qual leva em consideração os dotes intelectuais sociais econômicos e culturais do agente O Direito Penal não pode ficar submisso aos interesses de pessoas incautas e despreparadas para o convívio social Ademais a previsibilidade subjetiva fomentaria a impunidade pois por se cuidar de questão que habita o aspecto interno do homem jamais poderia ser fielmente provada a compreensão do agente acerca do resultado que a sua conduta era capaz de produzir 1347 Lembrese de uma regra que irá ajudar no estudo de toda a teoria do crime O estudo do crime qualquer que seja o conceito analítico que se adote se divide em três grandes grupos 1 fato típico 2 ilicitude e 3 culpabilidade O fato é típico e ilícito O agente é culpável Em outras palavras a tipicidade e a ilicitude pertencem ao fato e a culpabilidade ao agente Disso se infere que sempre que se estudam o fato típico e a ilicitude leva se em conta a figura do homem médio um paradigma utilizado para análise do caso concreto Por outro lado quando se aborda a culpabilidade levase em conta o perfil subjetivo do agente Peço desculpa por ser repetitivo mas o que vale é a sua compreensão Lembrese o fato é típico e ilícito logo como o que interessa é o fato desprezamse as condições do agente pois valem somente as circunstâncias do fato O agente todavia é culpável Na análise da culpabilidade portanto levase em conta sempre o perfil subjetivo do agente Em compasso com a questão em epígrafe concluise que na constatação da previsibilidade do resultado naturalístico no crime culposo a análise é objetiva fundada no homem médio O perfil subjetivo do agente não é desprezado pois sua análise fica reservada ao juízo da culpabilidade dentro de um de seus elementos a potencial consciência da ilicitude E nesse caso a falta de previsibilidade subjetiva importa no afastamento da potencial consciência da ilicitude elemento da culpabilidade e consequentemente na exclusão da própria culpabilidade Ausência de previsão Em regra o agente não prevê o resultado objetivamente previsível Não enxerga aquilo que o homem médio conseguiria ver 1351 Excepcionalmente todavia há previsão do resultado culpa consciente Culpa inconsciente e culpa consciente Essa divisão tem como fator distintivo a previsão do agente acerca do resultado naturalístico provocado pela sua conduta Culpa inconsciente sem previsão ou ex ignorantia é aquela em que o agente não prevê o resultado objetivamente previsível Culpa consciente com previsão ou ex lascivia é a que ocorre quando o agente após prever o resultado objetivamente previsível realiza a conduta acreditando sinceramente que ele não ocorrerá Representa o estágio mais avançado da culpa pois se aproxima do dolo eventual Dele todavia se diferencia Na culpa consciente o sujeito não quer o resultado nem assume o risco de produzilo Apesar de sabêlo possível acredita sinceramente ser capaz de evitálo o que apenas não acontece por erro de cálculo ou por erro na execução No dolo eventual o agente não somente prevê o resultado naturalístico como também apesar de tudo o aceita como uma das alternativas possíveis Examinemos a seguinte situação A sai atrasado de casa em uma motocicleta e se dirige para uma entrevista que provavelmente lhe garantirá um bom emprego No caminho fica parado em um congestionamento Ao perceber que a hora combinada se aproxima e se continuar ali inerte não chegará em tempo decide trafegar um quarteirão pela calçada com o propósito de em seguida rumar por uma via alternativa descongestionada Na calçada deparase com inúmeros pedestres mas mesmo assim insiste em sua escolha Certamente lhe é previsível que assim agindo pode atropelar pessoas e consequentemente ferilas e inclusive matálas Mas vai em frente e acaba por colidir com uma senhora de idade matandoa Questionase tratase de homicídio culposo na direção de veículo 1352 automotor CTB art 302 ou de homicídio doloso CP art 121 Se A após prever o resultado acreditar honestamente que ele não irá ocorrer até mesmo porque fará de tudo para evitálo estará desenhada a culpa consciente Contudo se após a previsão do resultado assumir o risco de produzilo responderá pelo dolo eventual A distinção é tênue e somente pode ser feita no caso concreto mediante a análise das provas exteriores ao fato Na visão do Supremo Tribunal Federal A diferença entre o dolo eventual e a culpa consciente encontrase no elemento volitivo que ante a impossibilidade de penetrarse na psique do agente exige a observação de todas as circunstâncias objetivas do caso concreto sendo certo que em ambas as situações ocorre a representação do resultado pelo agente Deveras tratandose de culpa consciente o agente pratica o fato ciente de que o resultado lesivo embora previsto por ele não ocorrerá A cognição empreendida nas instâncias originárias demonstrou que o paciente ao lançarse em práticas de expressiva periculosidade em via pública mediante alta velocidade consentiu em que o resultado se produzisse incidindo no dolo eventual previsto no art 18 inciso I segunda parte verbis Dizse o crime I doloso quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi lo10 O Código Penal dispensa igual tratamento à culpa consciente e à culpa inconsciente A previsão do resultado por si só não representa maior grau de reprovabilidade da conduta Culpa própria e culpa imprópria Essa classificação se baseia na intenção de produzir o resultado naturalístico Culpa própria é a que se verifica quando o agente não quer o resultado nem assume o risco de produzilo É por assim dizer a culpa propriamente dita De sua parte culpa imprópria também denominada culpa por extensão por equiparação ou por assimilação é aquela em que o sujeito após prever o resultado e desejar sua produção realiza a conduta por erro inescusável quanto à ilicitude do fato O resultado vem então a ser concretizado O agente incide em erro inescusável inaceitável injustificável quanto à ilicitude do fato Supõe uma situação fática que se existisse tornaria a sua ação legítima Como entretanto esse erro poderia ter sido evitado pelo emprego da prudência inerente ao homem médio responde a título de culpa Cuidase em verdade de dolo eis que o agente quer a produção do resultado Por motivos de política criminal no entanto o Código Penal aplica a um crime doloso a punição correspondente a um crime culposo O erro quanto à ilicitude do fato embora inescusável proporciona esse tratamento diferenciado E diante do caráter misto ou híbrido da culpa imprópria dolo tratado como culpa revelase como a única modalidade de crime culposo que comporta a tentativa Vejamos um exemplo que bem elucida toda a problemática atinente à culpa imprópria Uma garota de 15 anos de idade e pertencente a uma família conservadora é proibida pelos pais de namorar Ela desobediente namora um rapaz Os pais para evitar os encontros trancam todas as portas e janelas da casa e escondem as chaves O único meio de sair do imóvel é pela janela do quarto do casal Depois de constatar que os pais estavam em sono profundo a garota entra no dormitório dos genitores pula a janela que dá acesso ao quintal habitado por dois cães bravios sobe no muro e o ultrapassa encontrando seu precoce amado Saem de carro sem que sejam notados e horas depois durante a madrugada a jovem retorna à sua casa já saciada em seu amor Pula o muro passa pelos ferozes cães que sequer latem e ingressa no quarto dos pais pela janela Já no interior do dormitório seu pai um militar reformado nota a presença de um vulto com corpo franzino e cabelos compridos e ordena sua parada Como a sua determinação não é cumprida persegue o vulto e contra ele efetua seis certeiros disparos de arma de fogo O corpo cai ao solo Ao acender a luz nota que sua filha foi alvejada mas 1353 1354 está viva A descrição retrata um típico caso de culpa imprópria O agente efetuou disparos com arma de fogo com intenção de matar animus necandi ou animus occidendi Tinha dolo direto Agiu contudo com erro inescusável quanto à ilicitude do fato pois foi imprudente Poderia ter sido mais cauteloso já que o vulto não lhe trazia qualquer ameaça e com o silêncio dos cachorros somente poderia ser pessoa da casa Responde assim por homicídio culposo com fundamento no art 20 1º do Código Penal E mais na forma tentada em que pese se tratar de crime culposo Culpa mediata ou indireta Cuidase da espécie que se verifica quando o agente produz o resultado naturalístico indiretamente a título de culpa É o caso por exemplo da vítima que acabara de ser torturada no interior de um veículo parado no acostamento de movimentada via pública Quando conseguiu fugir ela buscou atravessar a pista foi atropelada e morreu O agente responde pela tortura e também pelo resultado morte provocado indiretamente por sua atuação culposa pois lhe era objetivamente previsível a fuga da pessoa torturada na direção da via pública É preciso destacar que a culpa mediata punível consiste em fato com relação estreita e realmente eficiente no tocante à causação do resultado naturalístico não se podendo confundila com a mera condição ou ocasião do ocorrido Culpa presumida Também denominada de culpa in re ipsa tratavase de espécie de culpa admitida pela legislação penal existente no Brasil antes da entrada em vigor do Código Penal de 1940 e consistia na simples inobservância de uma disposição regulamentar Foi abolida do sistema penal pátrio por constituirse em verdadeira responsabilidade penal objetiva retrocesso a tempos pretéritos em que o homem pagava pelo que fizera sem nenhuma preocupação com o elemento subjetivo Não se presume a culpa Ao contrário sempre deve ser provada por quem alega sua ocorrência pois a responsabilidade penal é de caráter subjetivo11 No passado buscouse distinguir a culpa quanto à sua intensidade em grave leve e levíssima A culpa grave ou lata ocorreria quando qualquer pessoa fosse capaz de prever o resultado Por sua vez a culpa leve estaria presente somente nos casos em que um homem de inteligência mediana pudesse antever o resultado Finalmente a culpa levíssima seria aquela em que o resultado se afigurasse perceptível somente às pessoas de excepcional cautela e inteligência aproximandose bastante do caso fortuito O Direito Penal brasileiro refuta a divisão da culpa em graus Ou há culpa e está configurada a responsabilidade do agente ou não existe culpa e o fato é penalmente irrelevante De fato o art 59 caput do Código Penal não elenca os graus de culpa como circunstâncias judiciais que influem na dosimetria da pena Diante do que foi abordado é importante destacar as diferenças entre modalidades espécies e graus de culpa que podem ser ilustradas no seguinte gráfico Não se admite a compensação de culpas no Direito Penal uma vez que prevalece o caráter público da sanção penal como fundamento para a sua proibição Nesses termos a culpa do agente não é anulada pela culpa da vítima Se A ultrapassou com seu carro o semáforo no sinal vermelho vindo a colidir com o automóvel de B que trafegava na contramão da direção daí resultando lesões corporais em ambos cada qual responde pelo resultado a que deu causa A compensação de culpas tem incidência apenas no direito privado com a função de reduzir ou excluir o valor da indenização pelo ilícito praticado No âmbito penal vale ressaltar que a culpa da vítima embora não afaste a culpa do agente funciona como circunstância judicial favorável ao acusado a ser sopesada pelo magistrado por ocasião da dosimetria da penabase É o que se extrai do art 59 caput do Código Penal Por último se é correto afirmar que não há compensação de culpas no Direito Penal também é certo dizer que a culpa exclusiva da vítima exclui a culpa do agente Basta a mera interpretação literal da expressão em destaque para concluir que se a culpa é exclusiva da vítima certamente o agente atuou de forma correta é dizer livre de imprudência negligência ou imperícia É o que se verifica quando duas ou mais pessoas concorrem contribuem culposamente para a produção de um resultado naturalístico Todos os envolvidos que tiveram atuação culposa respondem pelo resultado produzido Fundamentase essa posição na teoria da conditio sine qua non acolhida pelo art 13 caput do Código Penal o resultado de que depende a existência do crime somente é imputável a quem lhe deu causa E como é fácil perceber se o resultado foi provocado pela pluralidade de condutas culposas por ele respondem aqueles que as realizaram Vejamos um exemplo No cruzamento entre duas ruas o veículo de A ultrapassa o semáforo quando o sinal vermelho determinava sua parada momento em que vem a colidir com o automóvel de B o qual além de trafegar em velocidade acima da permitida também havia desrespeitado o sinal de trânsito que estava com passagem livre para pedestres Entre os carros surge um transeunte que desavisado atravessou a via pública e foi atropelado não resistindo aos ferimentos No caso mencionado tanto A como B agiram de forma culposa Concorreram para a produção do resultado naturalístico e por ele deverão responder Mas não há concurso de pessoas coautoria ou participação em face da ausência de vínculo subjetivo entre os envolvidos Preceitua corretamente o art 18 parágrafo único do Código Penal consagrando o princípio da excepcionalidade do crime culposo Salvo nos casos expressos em lei ninguém pode ser punido por fato previsto como crime senão quando o pratica dolosamente A modalidade culposa de um crime deve ser expressamente declarada pela lei No silêncio desta quanto ao elemento subjetivo sua punição apenas se verifica a título de dolo Como destaca Magalhães Noronha É excepcional a punibilidade da culpa Geralmente a norma penal pressupõe no destinatário uma vontade diretamente contrária ao preceito ou seja vontade dirigida ao evento proibido ou a um resultado imposto e obrigatório A derrogação há de ser expressamente indicada isto é devem ser declarados taxativamente os casos em que a vontade seja punível conquanto não dirigida nem ao evento interditado nem ao imposto Noutros termos assentada a normalidade do dolo resulta a excepcionalidade da culpa donde a necessidade de declaração expressa12 No campo dos crimes contra o patrimônio tipificados pelo Código Penal anotese que o único delito punido a título de culpa é a receptação CP art 180 3 O dano culposo é fato atípico embora encontre previsão no Código Penal Militar Excluise a culpa nos seguintes casos 1 Caso fortuito e força maior São acontecimentos imprevistos imprevisíveis e inevitáveis que escapam do controle da vontade do homem Se não há previsibilidade e também não existe vontade elemento indispensável à conduta não há falar em culpa nos resultados que deles se originam 2 Erro profissional A culpa pelo resultado naturalístico não é do agente mas da ciência que se mostra inapta para enfrentar determinadas situações Não se confunde com a imperícia uma vez que nesta a falha é do próprio agente que deixa de observar as regras recomendadas pela profissão arte ou ofício 3 Risco tolerado Karl Binding ao estudar o crime culposo dizia que quanto mais imprescindível for um tipo de comportamento humano maior será o risco que em relação a ele se deverá enfrentar sem que disso possa resultar qualquer espécie de reprovação jurídica Delimitase dessa forma a linha divisória entre o crime culposo e os fatos impuníveis resultantes do risco juridicamente tolerado O médico que opera um doente em estado grave em condições precárias sabe que poderá causarlhe a morte E ainda que o resultado venha a ocorrer não terá agido com culpa pois a sua intervenção cirúrgica na situação em que foi realizada era indispensável como a única forma para tentar salvar a vida do paciente A modernidade fomenta ainda mais o risco tolerado como exclusão da culpa Por diversas maneiras necessárias para a evolução do homem e da própria humanidade podem ser efetuadas atividades que proporcionam riscos calculados para bens jurídicos penalmente protegidos O piloto que testa pela primeira vez uma aeronave certamente é colocado em risco de vida mas a possibilidade de morte é tolerada e aceita para colaborar com o progresso da ciência aeronáutica indispensável na sociedade atual 4 Princípio da confiança Como o dever objetivo de cuidado se dirige a todas as pessoas podese esperar que cada um se comporte de forma prudente e razoável necessária para a coexistência pacífica em sociedade E por se presumir a boafé de todo indivíduo aquele que cumpre as regras jurídicas impostas pelo Direito pode confiar que o seu semelhante também agirá de forma acertada Assim agindo não terá culpa nos crimes eventualmente produzidos pela conduta ilícita praticada por outrem Exemplo Aquele que conduz seu carro dentro dos limites de velocidade e de forma correta pode confiar que ao cruzar o sinal verde terá o trânsito livre de modo que se um motociclista desrespeitar o semáforo e colidir com o seu carro não responderá pelas lesões eventualmente produzidas13 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 MAGALHÃES NORONHA E Do crime culposo 2 ed São Paulo Saraiva 1966 p 147148 Toda a culpa é culpa da vontade Só aquilo contra o que o homem pode do ponto de vista da vontade alguma coisa lhe pode ser censurado como culpa DIAS Jorge de Figueiredo Liberdade Culpa Direito Penal 3 ed Coimbra Coimbra Editora 1995 p 5758 Nesse sentido TAVARES Juarez Direito penal da negligência Uma contribuição à teoria do crime culposo 2 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 HC 305194PB rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 11112014 noticiado no Informativo 533 O art 527 do Código Penal italiano prevê a modalidade culposa do crime de ato obsceno Pode até concretizarse um crime mas sempre diferente do culposo que restaria caracterizado com a produção do resultado naturalístico Exemplo Aquele que dirige veículo automotor embriagado expondo a perigo a incolumidade de outrem responde pelo crime tipificado pelo art 306 do Código de Trânsito Brasileiro Se em razão da imprudência ao volante o agente matar alguém estará tipificado o crime delineado pelo art 302 do CTB homicídio culposo na direção do veículo automotor que absorve o de embriaguez ao volante STJ RHC 35883PE rel Min Og Fernandes 6ª Turma j 01102013 HUNGRIA Nélson Comentários ao Código Penal Rio de Janeiro Forense 1949 v 1 p 357 A par disso frisese que segundo a doutrina no momento de se determinar se a conduta do autor se ajusta ao tipo de injusto culposo é necessário indagar sob a perspectiva ex ante se no momento da ação ou da omissão era possível para qualquer pessoa no lugar do autor identificar o risco proibido e ajustar a conduta ao cuidado devido cognoscibilidade ou conhecimento do risco proibido e previsibilidade da produção do resultado típico STJ REsp 1388440ES rel Min Nefi Cordeiro 6ª Turma j 05032015 noticiado no Informativo 557 STF HC 101698RJ rel Min Luiz Fux 1ª Turma j 18102011 STF Inq 4483 AgRsegundoDF e Inq 4327 AgRsegundoDF rel Min 12 13 Edson Fachin Plenário j 14122017 e 19122017 noticiados no Informativo 888 MAGALHÃES NORONHA E Do crime culposo 2 ed São Paulo Saraiva 1966 p 101 A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e a do Supremo Tribunal Federal convergem em relação à aceitação do princípio da confiança para excluir a tipicidade penal STJ REsp 1115641MG rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 27032012 DJe 09052012 141 142 CONCEITO Preterdolo emana do latim praeter dolum ou seja além do dolo Destarte crime preterdoloso ou preterintencional é o que se verifica quando a conduta dolosa acarreta a produção de um resultado mais grave do que o desejado pelo agente O propósito do autor era praticar um crime doloso mas por culpa sobreveio resultado mais gravoso O crime preterdoloso é uma figura híbrida Há dolo do antecedente minus delictum e culpa no consequente majus delictum Não se trata de um terceiro elemento anímico nem de nova espécie de dolo ou de culpa Como define Manoel Pedro Pimentel É somente a combinação de dois elementos dolo e culpa que se apresentam sucessivamente no decurso do fato delituoso a conduta inicial é dolosa enquanto o resultado final dela advindo é culposo1 Nesse tipo de delito o agente produz resultado diverso do pretendido Há pois divergência entre a sua vontade e o resultado maior produzido Exemplo típico é apresentado pelo art 129 3º do Código Penal lesão corporal seguida de morte no qual o legislador após definir o crime de lesão corporal no caput lhe adiciona um resultado agravador a morte da vítima produzida a título de culpa O dolo em relação ao resultado agravador direto ou eventual afasta o caráter preterdoloso do crime RELAÇÃO ENTRE DOLO E CULPA 143 144 Em decorrência do misto de dolo e culpa o preterdolo é classificado como elemento subjetivonormativo do tipo penal Com efeito o dolo é o elemento subjetivo do tipo enquanto a culpa é entendida como elemento normativo pois a sua constatação depende de um prévio juízo de valor Em face da proibição da responsabilidade penal objetiva pelo resultado que agrava especialmente a pena só responde o agente que o houver causado ao menos culposamente conforme dispõe o art 19 do Código Penal Destarte o resultado mais grave deve ser objetivamente previsível ou seja previsível ao homem médio No tocante à recidiva deve o reincidente em crime preterdoloso receber idêntico tratamento destinado ao reincidente em crime doloso pois antes de sobrevir o resultado culposo mais grave já havia se aperfeiçoado um delito menos grave de natureza dolosa2 VERSARI IN RE ILLICITA A culpa que agrava especialmente o resultado deve ser provada Não se presume seja de forma absoluta iuris et de iure seja de forma relativa iuris tantum cabendo o ônus da prova a quem alega sua ocorrência Não se admite a figura da versari in re illicita originária do direito canônico e que serviu como ponto de transição entre a responsabilidade penal objetiva e a responsabilidade penal subjetiva Proclamava o brocardo Qui in re illicita versatur tenetur etiam pro casu isto é quem se envolve com coisa ilícita é responsável também pelo resultado fortuito Na hipótese de lesão corporal seguida de morte não é porque o agente desejou produzir ferimentos na vítima que automaticamente deve responder por sua morte O resultado mais grave precisa ser derivado de culpa a ser demonstrada no caso concreto CRIMES QUALIFICADOS PELO RESULTADO Crime qualificado pelo resultado é aquele que possui uma conduta básica a b c definida e apenada como delito de forma autônoma nada obstante ainda ostente um resultado que o qualifica majorandolhe a pena por força de sua gravidade objetiva desde que exista entre eles relação causal física e subjetiva Física por guardar vínculo de causa e efeito com a primeira e subjetiva por referirse ao mesmo agente Todo crime qualificado pelo resultado representa um único crime e complexo pois resulta da junção de dois ou mais delitos O crime preterdoloso é qualificado pelo resultado Mas nem todo crime qualificado pelo resultado é preterdoloso Esse é espécie daquele seu gênero Além do crime preterdoloso existem três outras espécies de crimes qualificados pelo resultado quais sejam Dolo na conduta antecedente e dolo no resultado agravador dolo no antecedente e dolo no consequente o crimebase é doloso bem como o resultado agravador Como exemplo pode ser indicado o crime de latrocínio CP art 157 3º inc II em que o roubo é doloso e a morte pode sobrevir a título de dolo mas também culposamente Culpa na conduta antecedente e culpa no resultado agravador culpa no antecedente e culpa no consequente a conduta básica e o resultado mais gravoso são legalmente previstos na forma culposa É o caso dos crimes culposos de perigo comum resultando lesão corporal grave ou morte CP art 258 in fine Culpa na conduta antecedente e dolo no resultado agravador culpa no antecedente e dolo no consequente o fato original é tipificado culposamente ao contrário do resultado agravador doloso Vejase o crime tipificado pelo art 303 parágrafo único da Lei 95031997 Código de Trânsito Brasileiro na hipótese em que o motorista de um veículo automotor em excesso de velocidade atropela um pedestre ferindoo culposamente e em seguida dolosamente deixa de prestar socorro à vítima do acidente quando era possível fazêlo sem risco pessoal Cezar Roberto Bitencourt também distingue os crimes preterdolosos dos qualificados pelo resultado mas com fundamento diverso e deveras sucinto São suas palavras Têmse utilizado a nosso juízo equivocadamente as expressões crime preterdoloso e crime qualificado pelo resultado como sinônimas No entanto segundo a melhor corrente especialmente na Itália no crime qualificado pelo resultado ao contrário do preterdoloso o resultado ulterior mais grave derivado involuntariamente da conduta criminosa lesa um bem jurídico que por sua natureza não contém o bem jurídico precedentemente lesado Assim enquanto a lesão corporal seguida de morte art 129 3º seria preterintencional o aborto seguido da morte da gestante arts 125 e 126 combinados com o 127 in fine seria crime qualificado pelo resultado O raciocínio é simples nunca se conseguirá matar alguém sem ofender sua saúde ou integridade corporal enquanto para matar alguém não se terá necessariamente de fazêlo abortar3 1 2 3 PIMENTEL Manoel Pedro O crime e a pena na atualidade São Paulo RT 1983 p 87 STJ REsp 1254749SC rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 06052014 BITENCOURT Cezar Roberto Tratado de direito penal Parte geral 11 ed São Paulo Saraiva 2007 v 1 p 290 Na redação original do Código Penal de 1940 o art 17 caput cuidava do erro de fato É isento de pena quem comete o crime por erro quanto ao fato que o constitui ou quem por erro plenamente justificado pelas circunstâncias supõe situação de fato que se existisse tornaria a ação legítima Esse dispositivo era muito menos abrangente pois se referia unicamente aos elementos objetivos do tipo penal Com a reforma da Parte Geral pela Lei 72091984 o erro de fato foi substituído pelo erro de tipo que além dos elementos objetivos engloba também os elementos subjetivos e normativos eventualmente descritos na conduta criminosa Com a rubrica erro sobre elementos do tipo dispõe o art 20 caput do Código Penal O erro sobre elemento constitutivo do tipo legal de crime exclui o dolo mas permite a punição por crime culposo se previsto em lei A expressão tipo legal de crime deixa claro que o legislador somente se preocupou com o tipo penal incriminador isto é aquele que define uma conduta criminosa cominandolhe a pena respectiva Erro é a falsa percepção da realidade ou o falso conhecimento de determinado objeto Exemplo O sujeito erra ao confundir um cavalo com um jumento Por seu turno ignorância é o completo desconhecimento da realidade ou de algum objeto Exemplo O sujeito nascido em uma casa urbana e trancado no interior de um quarto até os 18 anos de idade não tem a mínima ideia do que seja um cavalo O Código Penal trata de forma idêntica o erro e a ignorância Ambos podem ensejar a aplicação do instituto do erro de tipo Destarte quando fala em erro utiliza essa palavra em sentido amplo compreendendo o erro propriamente dito e a ignorância Erro de tipo é a falsa percepção da realidade acerca dos elementos constitutivos do tipo penal Extraise essa conclusão do art 20 caput do Código Penal que somente menciona as elementares É o chamado erro de tipo essencial Exemplo A no estacionamento de um shopping center aperta um botão inserido na chave do seu automóvel com a finalidade de desativar o alarme Escuta o barulho abre a porta do carro coloca a chave na ignição ligao e vai para casa Percebe posteriormente que o carro não lhe pertencia mas foi confundido com outro de propriedade de terceira pessoa Nesse caso A não praticou o crime de furto assim definido Subtrair para si ou para outrem coisa alheia móvel Reputava sua a coisa móvel pertencente a outrem Errou portanto sobre a elementar alheia pois o instituto impede o agente de compreender o aspecto ilícito do fato por ele praticado Para Damásio E de Jesus contudo erro de tipo é o que incide sobre elementares e circunstâncias da figura típica tais como qualificadoras e agravantes genéricas1 Em sua ótica também estaria configurado o erro de tipo quando por exemplo o sujeito desconhecendo a relação de parentesco induz a própria filha a satisfazer a lascívia de outrem Responderia no caso pela forma típica fundamental do art 227 do Código Penal sem a qualificadora do 1º Consequentemente para essa posição o erro de tipo não se limita a impedir o agente de compreender o caráter ilícito do fato praticado mas também das circunstâncias que com o fato se relacionam Nos crimes omissivos impróprios também chamados de crimes omissivos espúrios ou comissivos por omissão o dever de agir disciplinado no art 13 2º do Código Penal funciona como elemento constitutivo do tipo Destarte nada impede a incidência do erro de tipo em relação ao dever de agir para evitar o resultado levandose em conta a relação de normalidade ou perigo do caso concreto Em síntese é cabível o erro de tipo na seara dos crimes omissivos impróprios Exemplo O salvavidas avista um banhista se debatendo em águas rasas de uma praia e imaginando que ele não estava se afogando e sim dançando brincando com outra pessoa etc nada faz Posteriormente tal banhista é retirado do mar sem vida por terceiros Nessa hipótese é possível o reconhecimento do instituto previsto no art 20 caput do Código Penal aplicandose os efeitos que lhe são inerentes O erro de tipo essencial pode ser escusável ou inescusável 1 Escusável inevitável invencível ou desculpável é a modalidade de erro que não deriva de culpa do agente ou seja mesmo que ele tivesse agido com a cautela e a prudência de um homem médio ainda assim não poderia evitar a falsa percepção da realidade sobre os elementos constitutivos do tipo penal 2 Inescusável evitável vencível ou indesculpável é a espécie de erro que provém da culpa do agente é dizer se ele empregasse a cautela e a prudência do homem médio poderia evitálo uma vez que seria capaz de compreender o caráter criminoso do fato A natureza do erro escusável ou inescusável deve ser aferida na análise do caso concreto levandose em consideração as condições em que o fato foi praticado O erro de tipo seja escusável ou inescusável sempre exclui o dolo De fato como o dolo deve abranger todas as elementares do tipo penal resta afastado pelo erro de tipo pois o sujeito não possui a necessária vontade de praticar integralmente a conduta tipificada em lei como crime ou contravenção penal Por essa razão Zaffaroni denomina o erro de tipo de cara negativa do dolo2 Nada obstante os efeitos variam conforme a espécie do erro de tipo O escusável exclui o dolo e a culpa acarretando na impunidade total do fato enquanto o inescusável exclui o dolo mas permite a punição por crime culposo se previsto em lei excepcionalidade do crime culposo Nesse último o agente age de forma imprudente negligente ou imperita ao contrário do que faz no primeiro Excepcionalmente todavia pode acontecer de o erro de tipo ainda que escusável não excluir a criminalidade do fato Esse fenômeno ocorre quando se opera a desclassificação para outro crime O exemplo típico é o do particular que ofende um indivíduo desconhecendo a sua condição de funcionário público Em face da ausência de dolo quanto a essa elementar afastase o crime de desacato CP art 331 mas subsiste o de injúria CP art 140 pois a honra do particular também é tutelada pela lei penal Em que pese a proximidade terminológica os institutos não se confundem No erro de tipo o indivíduo desconhecendo um ou vários elementos constitutivos não sabe que pratica um fato descrito em lei como infração penal quando na verdade o faz Já o crime putativo por erro de tipo ou delito putativo por erro de tipo é o imaginário ou erroneamente suposto que existe exclusivamente na mente do agente Ele quer praticar um crime mas por erro acaba por cometer um fato penalmente irrelevante Exemplo A deseja praticar o crime de tráfico de drogas Lei 113432006 art 33 caput mas por desconhecimento comercializa talco Descriminante é a causa que exclui o crime retirando o caráter ilícito do fato típico praticado por alguém Essa palavra é sinônima portanto de causa de exclusão da ilicitude Putativa provém de parecer aparentar É algo imaginário erroneamente suposto É tudo aquilo que parece mas não é o que aparenta ser Destarte descriminante putativa é a causa de exclusão da ilicitude que não existe concretamente mas apenas na mente do autor de um fato típico É também chamada de descriminante erroneamente suposta ou descriminante imaginária O art 23 do Código Penal prevê as causas de exclusão da ilicitude e em todas elas é possível que o agente por erro as considere presentes estado de necessidade putativo legítima defesa putativa estrito cumprimento de dever legal putativo e exercício regular do direito putativo Basta que incidindo em erro o agente suponha situação que se realmente existisse tornaria a sua ação legítima Em síntese o sujeito reputa encontrar se em razão dos fatos que o cercam no contexto de uma causa de exclusão da ilicitude Imaginase em legítima defesa ou em estado de necessidade quando na verdade os requisitos legais de tais institutos não estão presentes As descriminantes putativas relacionamse intrinsecamente com a figura a b c do erro e podem ser de três espécies erro relativo aos pressupostos de fato de uma causa de exclusão da ilicitude É o caso daquele que ao encontrar seu desafeto e notando que tal pessoa coloca a mão no bolso saca seu revólver e o mata Descobre depois que a vítima fora acometida por cegueira por ele desconhecida e não poderia sequer ter visto o seu agressor Ausente portanto um dos requisitos da legítima defesa qual seja a agressão injusta erro relativo à existência de uma causa de exclusão da ilicitude Imaginese o sujeito que depois de encontrar sua mulher com o amante em flagrante adultério mata a ambos por crer que assim possa agir acobertado pela legítima defesa da honra Nessa situação o agente errou quanto à existência desta descriminante não acolhida pelo ordenamento jurídico em vigor erro relativo aos limites de uma causa de exclusão da ilicitude Temos como exemplo o fazendeiro que reputa adequado matar todo e qualquer posseiro que invada a sua propriedade Cuidase da figura do excesso pois a defesa da propriedade não permite esse tipo de reação desproporcional A grande celeuma repousa na natureza jurídica das descriminantes putativas No tocante às duas últimas hipóteses erro relativo à existência de uma causa de exclusão da ilicitude e erro relativo aos limites de uma causa de exclusão da ilicitude é pacífico o entendimento de que se trata de uma modalidade de erro de proibição Cuidase do denominado erro de proibição indireto Falase então em descriminante putativa por erro de proibição Subsiste o dolo e também a culpa excluindose a culpabilidade se o erro for inevitável ou escusável Caso o erro seja evitável ou inescusável não se afasta a culpabilidade e o agente responde por crime doloso diminuindose a pena de 16 um sexto a 13 um terço na forma definida pelo art 21 caput do Código Penal Com efeito no sistema finalista o dolo é natural ou seja não aloja em seu bojo a consciência da ilicitude funcionando esta última como elemento da culpabilidade E em relação à primeira hipótese erro relativo aos pressupostos de fato de uma causa de exclusão da ilicitude a natureza jurídica da descriminante putativa depende da teoria da culpabilidade adotada3 Para a teoria normativa pura em sua vertente limitada constituise em erro de tipo permissivo Surgem então as descriminantes putativas por erro de tipo No exemplo acima indicado item a se escusável o erro excluise o dolo e a culpa acarretando na atipicidade do fato pois no finalismo o dolo e a culpa compõem a estrutura da conduta Sem eles não há conduta e sem conduta o fato é atípico Mas se inescusável o erro afastase o dolo subsistindo a responsabilidade por crime culposo se previsto em lei CP art 20 1º Filiamse a essa posição entre outros Damásio E de Jesus4 e Francisco de Assis Toledo5 A Lei 72091984 acolheu essa teoria como se extrai do item 19 da Exposição de Motivos da Nova Parte Geral do Código Penal Repete o Projeto as normas do Código de 1940 pertinentes às denominadas descriminantes putativas Ajustase assim o Projeto à teoria limitada da culpabilidade que distingue o erro incidente sobre os pressupostos fáticos de uma causa de justificação do que incide sobre a norma permissiva grifamos De outro lado para a teoria normativa pura em sua variante extremada extrema ou estrita tratase também de hipótese de erro de proibição Logo constitui descriminante putativa por erro de proibição com todos os seus efeitos subsiste o dolo e também a culpa excluindose a culpabilidade se o erro for inevitável ou escusável Se evitável ou inescusável o erro não se afasta a culpabilidade e o agente responde por crime doloso diminuindose a pena de 16 um sexto a 13 um terço nos moldes do art 21 caput do Código Penal Partilham desse entendimento que consagra em sede de descriminantes putativas a teoria unitária do erro Cezar Roberto Bitencourt6 e Guilherme de Souza Nucci7 entre outros Enfim a natureza jurídica das descriminantes putativas varia conforme a teoria da culpabilidade adotada Em uma visão esquemática Estabelece o art 20 2º do Código Penal Responde pelo crime o terceiro que determina o erro Cuidase da hipótese na qual quem pratica a conduta tem uma falsa percepção da realidade no que diz respeito aos elementos constitutivos do tipo penal em decorrência da atuação de terceira pessoa chamada de agente provocador O agente não erra por conta própria erro espontâneo mas de forma provocada isto é determinada por outrem O erro provocado pode ser doloso ou culposo dependendo do elemento subjetivo do agente provocador Quando o provocador atua dolosamente a ele deve ser imputado na forma dolosa o crime cometido pelo provocado Exemplo A apressado para não perder o ônibus pede na saída da aula para B lhe arremessar seu aparelho de telefone celular que esquecera na mesa B dolosamente entrega o telefone pertencente a C seu desafeto O provocado que no caso seria A nesse caso ficará impune sendo escusável seu erro Mas se o seu erro for inescusável responderá por crime culposo se previsto em lei No exemplo acima escusável ou inescusável o erro nenhum crime seria imputado a A em face da inexistência do crime de furto culposo Pode ainda o provocador agir culposamente por imprudência negligência ou imperícia situação na qual a ele será imputado o crime culposo praticado pelo provocado se previsto em lei Exemplo Sem tomar maiores cautelas o vendedor entrega para teste um veículo sem freios que ainda estava na oficina mecânica da concessionária O pretenso comprador ao dirigir o automóvel atropela e mata um transeunte Nessa situação o provocado também poderá responder pelo crime culposo desde que o seu erro seja inescusável Ao contrário tratandose de erro escusável permanecerá impune É possível que o agente provocador e o provocado pelo erro atuem dolosamente quanto à produção do resultado Imaginese o seguinte exemplo A pede emprestado a B um pouco de açúcar para adoçar excessivamente o café de C Entretanto B desafeto de C entrega veneno no lugar do açúcar com a intenção de matálo A famoso químico percebe a manobra de B e mesmo assim coloca veneno no café de C que o ingere e morre em seguida Ambos respondem por homicídio qualificado CP art 121 2º inc III A como autor e B na condição de partícipe E se no exemplo anterior A age dolosamente e B culposamente Não há erro provocado pois A atuou dolosamente E também não há participação culposa por parte de B pois inexiste participação culposa em crime doloso Enfim não há concurso de pessoas A responde por homicídio doloso e B por homicídio culposo Como apontava Basileu Garcia a norma atinente ao erro determinado por terceiro permite situações curiosas Exemplificativamente vejase o caso do indivíduo que induza ao casamento pessoa casada convencendoa com artifícios da cessação do impedimento O autor das manobras iludentes sem ter contraído matrimônio será responsabilizado por bigamia a cuja acusação se subtrairá o nubente Em suma o terceiro não casado responde por bigamia o que não se verifica com a pessoa casada que contrai novo matrimônio8 Erro de tipo acidental é o que recai sobre dados diversos dos elementos constitutivos do tipo penal ou seja sobre as circunstâncias qualificadoras agravantes genéricas e causas de aumento da pena e fatores irrelevantes da figura típica A infração penal subsiste íntegra e esse erro não afasta a responsabilidade penal Pode ocorrer nas seguintes situações 1 erro sobre a pessoa 2 erro sobre o objeto 3 erro quanto às qualificadoras 4 erro sobre o nexo causal 5 erro na execução e 6 resultado diverso do pretendido Esses três últimos são denominados de crimes aberrantes É o que se verifica quando o agente confunde a pessoa visada contra a qual desejava praticar a conduta criminosa com pessoa diversa Exemplo A com a intenção de matar B efetua disparos de arma de fogo contra C irmão gêmeo de B confundindoo com aquele que efetivamente queria matar Esse erro é irrelevante em face da teoria da equivalência do bem jurídico atingido Nesse contexto o art 121 do Código Penal protege a vida humana independentemente de se tratar de B ou de C O crime consiste em matar alguém e no exemplo mencionado a conduta de A eliminou a vida de uma pessoa A propósito estabelece o art 20 3º do Código Penal O erro quanto à pessoa contra a qual o crime é praticado não isenta de pena Não se consideram neste caso as condições ou qualidades da vítima senão as da pessoa contra quem o agente queria praticar o crime A regra portanto consiste em levar em conta para a aplicação da pena as condições da vítima virtual isto é aquela que o sujeito pretendia atingir mas que no caso concreto não sofreu perigo algum e não a vítima real que foi efetivamente atingida Nesses termos se no exemplo acima A queria matar seu pai mas acabou causando a morte de seu tio incide a agravante genérica relativa ao crime praticado contra ascendente CP art 61 inc II alínea e embora não tenha sido cometido o parricídio Nessa espécie de erro de tipo acidental o sujeito crê que a sua conduta recai sobre um determinado objeto mas na verdade incide sobre coisa diversa Exemplo A acredita que subtrai um relógio Rolex avaliado em R 3000000 quando realmente furta uma réplica de tal bem a qual custa R 50000 Esse erro é irrelevante de natureza acidental e não interfere na tipicidade penal O art 155 caput do Código Penal tipifica a conduta de subtrair para si ou para outrem coisa alheia móvel e no exemplo houve a subtração do patrimônio alheio pouco importando o seu efetivo valor A coisa alheia móvel saiu da esfera de vigilância da vítima para ingressar no patrimônio do ladrão A análise do caso concreto entretanto pode autorizar a incidência do princípio da insignificância excluindo a tipicidade do fato quando todos os seus requisitos objetivos e subjetivos estiverem presentes É o que se dá a título ilustrativo na hipótese em que o agente primário e sem antecedentes criminais subtrai de uma grande joalheira uma imitação de um relógio de alto valor porém avaliada em somente R 1000 O sujeito age com falsa percepção da realidade no que diz respeito a uma qualificadora do crime Exemplo O agente furta um carro depois de conseguir por meio de fraude a chave verdadeira do automóvel Acredita praticar o crime de furto qualificado pelo emprego de chave falsa CP art 155 4º inc III quando na verdade não incide o tipo derivado por se tratar de chave verdadeira Esse erro não afasta o dolo nem a culpa relativamente à modalidade básica do delito9 Desaparece a qualificadora por falta de dolo mas se mantém intacto o tipo fundamental ou seja subsiste o crime efetivamente praticado o qual deve ser imputado ao seu responsável10 É o engano relacionado à causa do crime o resultado buscado pelo agente ocorreu em razão de um acontecimento diverso daquele que ele inicialmente idealizou Não há erro quanto às elementares do tipo bem como no tocante à ilicitude do fato Com efeito esse erro é penalmente irrelevante de natureza acidental pois o sujeito queria um resultado naturalístico e o alcançou O dolo abrange todo o desenrolar da ação típica do início da execução até a consumação Exemplo A no alto de uma ponte empurra B que não sabia nadar ao mar para matálo afogado A vítima falece não por força da asfixia derivada do afogamento e sim por traumatismo crânioencefálico pois se chocou em uma pedra antes de ter contato com a água O agente deve responder pelo delito em sua modalidade consumada Ele queria a morte de B e efetivamente a produziu Há perfeita congruência entre a sua vontade e o resultado naturalístico produzido No âmbito da qualificadora há duas posições a deve ser considerado o meio de execução que o agente desejava empregar para a consumação asfixia e não aquele que acidentalmente permitiu a eclosão do resultado naturalístico e b é preciso levar em conta o meio de execução que efetivamente provocou o resultado e não aquele idealizado pelo agente Por fim surge uma indagação Qual é a diferença entre o erro sobre o nexo causal aberratio causae e o dolo geral ou por erro sucessivo A resposta é simples Naquele há um único ato no exemplo acima empurrar a vítima do alto da ponte neste por sua vez há dois atos distintos exemplo A atira em B que cai ao solo Como ele acredita na morte da vítima lança o corpo ao mar para ocultar o cadáver mas posteriormente se constata que a morte foi produzida pelo afogamento e não pelo disparo de arma de fogo Encontra previsão no art 73 do Código Penal Art 73 Quando por acidente ou erro no uso dos meios de execução o agente ao invés de atingir a pessoa que pretendia ofender atinge pessoa diversa responde como se tivesse praticado o crime contra aquela atendendose ao disposto no 3º do art 20 deste Código No caso de ser também atingida pessoa que o agente pretendia ofender aplicase a regra do art 70 deste Código Erro na execução é a aberração no ataque em relação à pessoa a ser atingida pela conduta criminosa O agente não se engana quanto à pessoa que desejava atacar mas age de modo desastrado errando o seu alvo e acertando pessoa diversa Queria praticar um crime determinado e o fez Errou quanto à pessoa queria atingir uma mas acaba ofendendo outra A 1ª parte do art 73 do Código Penal é taxativa a relação no erro na execução é de pessoa x pessoa e não crime x crime Exemplo A nota que B seu inimigo está parado em um ponto de ônibus Saca sua arma mirao e efetua o disparo para matálo mas por falha na pontaria acerta C que também aguardava o coletivo matandoo O crime que queria praticar e o crime que praticou são idênticos mas a pessoa morta é diversa da visada Além disso determina o dispositivo legal que no erro na execução deve atenderse ao disposto pelo art 20 3º do Código Penal isto é observamse as regras inerentes ao erro sobre a pessoa Assim levamse em conta as condições da vítima que o agente desejava atingir vítima virtual desprezandose as condições pessoais da vítima efetivamente ofendida vítima real Entretanto erro na execução e erro sobre a pessoa são institutos diversos No erro sobre a pessoa o agente confunde a pessoa que queria atingir com pessoa diversa Existem portanto somente duas pessoas envolvidas agente e vítima real Exemplo O sujeito queria matar seu pai mas mata seu tio irmão gêmeo acreditando tratarse do seu genitor Além disso a vítima virtual não sofre perigo pois a conduta é direcionada à vítima real na confusão entre pai e tio o primeiro sequer estava no local dos fatos ao alcance do homicida Por outro lado no erro na execução o agente não confunde a pessoa que desejava atingir com outra mas por aberração no ataque acaba por acertar pessoa diversa Há três pessoas envolvidas agente vítima virtual e vítima real No exemplo do ponto ônibus A sabia que era seu desafeto que ali estava e o mirou mas matou pessoa diversa que se encontrava nas proximidades E ainda a vítima virtual é exposta à situação de perigo poderia ter sido alvejada o que somente não ocorreu por falha na pontaria O erro na execução pode ser de duas espécies com unidade simples ou com unidade complexa 1 Com unidade simples ou com resultado único é a situação descrita pelo art 73 1ª parte do Código Penal na qual o agente atinge unicamente a pessoa diversa da desejada A vítima virtual não suporta qualquer tipo de lesão No exemplo do ponto de ônibus o sujeito deveria responder por tentativa de homicídio contra B em concurso formal com homicídio culposo contra C Mas em consonância com a regra legal responde de forma idêntica ao que se dá no erro sobre a pessoa A lei faz de conta que a vítima real era a vítima virtual Logo tratase de erro de tipo acidental e irrelevante 2 Com unidade complexa ou com resultado duplo é a situação descrita pelo art 73 in fine do Código Penal na qual o sujeito além de atingir a pessoa inicialmente desejada ofende também pessoa ou pessoas diversas Sua conduta enseja dois resultados o originariamente pretendido e o involuntário É como se no exemplo acima indicado A matasse B dolosamente e também C a título de culpa como na hipótese em que o projétil perfura o corpo de uma vítima para alojarse no corpo da outra vítima Nessa hipótese determina o Código Penal a aplicação da regra do concurso formal próprio ou perfeito CP art 70 caput 1ª parte o magistrado utiliza a pena do crime mais grave aumentandoa de um 16 um sexto até a 12 metade O percentual de aumento varia de acordo com o número de crimes produzidos a título de culpa Cuidado admitese o erro na execução com unidade complexa apenas quando as demais pessoas forem atingidas culposamente Nesse caso aplica se o sistema do concurso formal próprio ou perfeito sistema da exasperação com a imposição da pena de um dos crimes aumentada de 16 um sexto até 12 metade Se houver dolo eventual no tocante às demais pessoas ofendidas não há falar propriamente em erro na execução e incide a regra do concurso formal impróprio ou imperfeito sistema do cúmulo material Somamse as penas pois a pluralidade de resultados deriva de desígnios autônomos ou seja dolos diversos para a produção dos resultados naturalísticos11 Encontrase previsto no art 74 do Código Penal Fora dos casos do artigo anterior quando por acidente ou erro na execução do crime sobrevém resultado diverso do pretendido o agente responde por culpa se o fato é previsto como crime culposo se ocorre também o resultado pretendido aplicase a regra do art 70 deste Código O referido dispositivo disciplina a situação em que por acidente ou erro na execução do crime sobrevém resultado diverso do pretendido Em outras palavras o agente desejava cometer um crime mas por erro na execução acaba por cometer crime diverso Ao contrário do erro na execução no resultado diverso do pretendido a relação é crime x crime Daí o nome resultado crime diverso do pretendido Não por outro motivo o dispositivo legal é peremptório ao dizer que essa regra se aplica fora dos casos do artigo anterior isto é nas situações que não envolvam o erro na execução relativo à pessoa x pessoa O clássico exemplo formulado por Giuseppe Maggiore é o do sujeito que atira uma pedra para quebrar uma vidraça CP art 163 dano mas por erro na execução atinge uma pessoa que passava pela rua lesionandoa CP art 129 lesões corporais O resultado diverso do pretendido pode revelarse sob duas espécies com unidade simples ou com unidade complexa 1 Com unidade simples ou com resultado único prevista no art 74 1ª parte do Código Penal Nessa situação o agente atinge somente bem jurídico diverso do pretendido É o que se dá no exemplo acima mencionado O dispositivo legal é claro o agente responde por culpa se o fato é previsto como crime culposo Assim será imputado apenas o crime de lesão corporal culposa 2 Com unidade complexa ou resultado duplo prevista no art 74 2ª parte do Código Penal Nessa situação a conduta do agente atinge o bem jurídico desejado e também bem jurídico diverso culposamente No exemplo o sujeito quebra a vidraça e também fere a pessoa Utilizase a regra do concurso formal aplicandose a pena do crime mais grave aumentada de 16 um sexto até 12 metade variando o aumento de acordo com o número de crimes produzidos a título de culpa Mas atenção se o resultado previsto como crime culposo for menos grave ou se o crime não admitir a modalidade culposa devese desprezar a regra contida no art 74 do Código Penal Exemplificativamente se A efetua disparos de arma de fogo contra B para matálo mas não o acerta e quebra uma vidraça a sistemática do resultado diverso do pretendido implicaria a absorção da tentativa branca ou incruenta de homicídio pelo dano culposo Como no Código Penal o dano não admite a modalidade culposa a conduta seria atípica E ainda que o legislador tivesse incriminado o dano culposo tal delito não seria capaz de absorver o homicídio tentado Deve ser imputada ao agente a tentativa de homicídio Em face do que foi analisado e buscando sintetizar o instituto do erro de tipo afigurase pertinente apresentar o seguinte gráfico 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 JESUS Damásio E de Direito penal Parte geral 28 ed 2 tir São Paulo Saraiva 2006 v 1 p 309 ZAFFARONI Eugenio Raúl Derecho penal Parte general 2 ed Buenos Aires Ediar 2002 p 532 DIAS Jorge de Figueiredo O problema da consciência da ilicitude em direito penal 5 ed Coimbra Coimbra Editora 2000 p 416 JESUS Damásio E de Direito penal Parte geral 28 ed 2 tir São Paulo Saraiva 2006 v 1 p 316317 TOLEDO Francisco de Assis Princípios básicos de direito penal 5 ed 13 tir São Paulo Saraiva 2007 p 272277 BITENCOURT Cezar Roberto Erro de tipo e erro de proibição Uma análise comparativa 4 ed São Paulo Saraiva 2007 p 101 NUCCI Guilherme de Souza Código Penal comentado 6 ed São Paulo RT 2006 p 205206 GARCIA Basileu Instituições de direito penal 4 ed 37 tir São Paulo Max Limonad 1975 v 1 t I p 281 PEÑARANDA RAMOS Enrique Concurso de leyes error y participación en el delito Madrid Civitas 1991 p 78 Recordese que alguns autores como Damásio E de Jesus consideram o erro sobre as qualificadoras como erro de tipo essencial STJ REsp 1250950DF rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 19062012 161 162 CONCEITO O iter criminis ou caminho do crime corresponde às etapas percorridas pelo agente para a prática de um fato previsto em lei como infração penal Compreende duas fases uma interna e outra externa A fase interna é representada pela cogitação Por sua vez a fase externa se divide em outras três preparação execução e consumação O exaurimento não integra o iter criminis O gráfico abaixo bem representa o que foi dito FASE INTERNA COGITAÇÃO A cogitação repousa na mente do agente nela se formando a ideia de enveredar pela empreitada criminosa Seu propósito ilícito encontrase preso em um claustro psíquico É sempre interna não se revelando em atos externos Por se tratar de mera ideia sem qualquer possibilidade de ofensa ao bem jurídico não pode ser alcançada pelo Direito Penal Não é punível inexiste 1 2 3 163 1631 crime ainda que na forma tentada De fato conduta penalmente relevante é somente aquela praticada por seres humanos e projetada no mundo exterior1 Já no Direito Romano proclamava Ulpiano cogitationis poenam nemo patitur isto é ninguém pode ser punido exclusivamente pelos seus pensamentos É possível a divisão da cogitação em três momentos distintos Idealização o sujeito tem a ideia de cometer uma infração penal Deliberação o agente sopesa as vantagens e desvantagens de seu eventual comportamento contrário ao Direito Penal e Resolução o sujeito se decide pelo cometimento da infração penal2 FASE EXTERNA Preparação A etapa da preparação ou dos atos preparatórios corresponde aos atos indispensáveis à prática da infração penal municiandose o agente dos elementos necessários para a concretização da sua conduta ilícita É o caso por exemplo da aquisição de um revólver para a prática de um homicídio ou da construção de um cativeiro para a ocultação da vítima de uma extorsão mediante sequestro Ato preparatório é em verdade a forma de atuar que cria as condições prévias adequadas para a realização de um delito planejado Precisa ir além do simples projeto interno mínimo sem que se deva contudo iniciar a imediata realização tipicamente relevante da vontade delitiva máximo3 Os atos preparatórios geralmente não são puníveis nem na forma tentada uma vez que não se iniciou a realização do núcleo do tipo penal De fato o art 14 inc II do Código Penal vinculou a tentativa à prática de atos executórios Em casos excepcionais é possível a punição de atos preparatórios nas hipóteses em que a lei optou por incriminálos de forma autônoma São os 1632 chamados crimesobstáculo Nesses casos o legislador transforma o ato preparatório de um determinado delito em crime diverso e independente ou seja passa a tratálo como ato de execução a exemplo do que se dá com os delitos de fabrico fornecimento aquisição posse ou transporte de explosivos ou gás tóxico ou asfixiante CP art 253 incitação ao crime CP art 286 associação criminosa CP art 288 e petrechos para a falsificação de moeda CP art 291 Uma exceção a esta regra encontrase no art 5º da Lei 132602016 que antecipou a tutela do Direito Penal para efetivamente punir meros atos preparatórios de terrorismo Não se exige a prática de nenhum ato de execução Basta a realização de um ato preparatório para autorizar a punição do responsável pela violação da norma penal4 Execução A fase da execução ou dos atos executórios é aquela em que se inicia a agressão ao bem jurídico por meio da realização do núcleo do tipo penal O agente começa a realizar o verbo núcleo do tipo constante da definição legal tornando o fato punível É o caso da conduta de efetuar disparos de arma de fogo contra uma pessoa Há incidência do Direito Penal configurando no mínimo um crime tentado Com efeito o art 14 II do Código Penal vinculou a tentativa ao início da execução do crime ou seja à prática de atos executórios O ato de execução deve ser idôneo e inequívoco Ato idôneo é o que se reveste de capacidade suficiente para lesar o bem jurídico penalmente tutelado Essa idoneidade deve ser constatada no caso concreto e não em abstrato Exemplo um tiro de revólver é idôneo para praticar um homicídio ao contrário de um tiro de festim Por sua vez ato inequívoco é o que se direciona ao ataque do bem jurídico almejando a consumação da infração penal e fornecendo certeza acerca da vontade ilícita Exemplo um disparo de arma de fogo efetuado na direção da vítima é unívoco para a prática de um homicídio diferente de um disparo efetuado para o alto 1633 Concluise pois que um ato de execução deve obrigatoriamente possuir essas características simultaneamente Não basta apenas uma delas Também não é suficiente em face da rejeição da teoria subjetiva notadamente pela insegurança por ela proporcionada a vontade firme e consciente de cometer uma infração penal quando não exteriorizado um ato idôneo e inequívoco A propósito confirase o elucidativo exemplo de Nélson Hungria Tício tendo recebido uma bofetada de Caio corre a um armeiro adquire um revólver carregao com seis balas e volta ato seguido à procura do seu adversário que entretanto por cautela ou casualmente já não se acha no local da contenda Tício porém não desistindo de encontrar Caio vai postarse dissimulado atrás de uma moita junto ao caminho onde ele habitualmente passa rumo de casa e ali espera em vão pelo seu inimigo que desconfiado tomou direção diversa Não se pode conceber uma série de atos mais inequivocadamente reveladores da intenção de matar embora todos eles sejam meramente preparatórios5 Transição dos atos preparatórios para os atos executórios Um dos mais árduos problemas do Direito Penal é diferenciar com precisão um ato preparatório de um ato executório Não é simples estabelecer o momento exato em que se opera a transição de uma fase para outra do iter criminis em face do caráter fronteiriço de tais atos E como ainda não se construiu um método infalível para distinguir entre uns e outros nos casos de irredutível dúvida sobre se o ato constitui um ataque ao bem jurídico ou apenas uma predisposição para esse ataque o magistrado deverá pronunciar o non liquet a falta de provas negando a existência da tentativa Inúmeras teorias apresentam propostas para a solução do impasse Dividemse inicialmente em subjetiva e objetiva Esta última se ramifica em diversas outras Vejamos as mais importantes 1 Teoria subjetiva não há transição dos atos preparatórios para os atos executórios O que interessa é o plano interno do autor a vontade criminosa existente em quaisquer dos atos que compõem o iter criminis Logo tanto a fase da preparação como a fase da execução importam na punição do agente 2 Teoria objetiva os atos executórios dependem do início de realização do tipo penal O agente não pode ser punido pelo seu mero querer interno É imprescindível a exteriorização de atos idôneos e inequívocos para a produção do resultado lesivo Essa teoria todavia se divide em outras 21 Teoria da hostilidade ao bem jurídico atos executórios são aqueles que atacam o bem jurídico enquanto os atos preparatórios não caracterizam afronta ao bem jurídico mantendo inalterado o estado de paz Foi idealizada por Max Ernst Mayer e tem como principais partidários Nélson Hungria e José Frederico Marques 22 Teoria objetivoformal ou lógicoformal ato executório é aquele em que se inicia a realização do verbo contido na conduta criminosa Exige tenha o autor concretizado efetivamente uma parte da conduta típica penetrando no núcleo do tipo Exemplo em um homicídio o sujeito com golpes de punhal inicia a conduta de matar alguém Surgiu dos estudos de Franz von Liszt É a preferida pela doutrina pátria6 23 Teoria objetivomaterial atos executórios são aqueles em que se começa a prática do núcleo do tipo e também os imediatamente anteriores ao início da conduta típica de acordo com a visão de terceira pessoa alheia aos fatos O juiz deve se valer do critério do terceiro observador para impor a pena Exemplo aquele que está no alto de uma escada portando um pé de cabra pronto para pular um muro e ingressar em uma residência na visão de um terceiro observador iniciou a execução de um crime de furto Essa teoria foi criada por Reinhart Frank e adotada pelo art 22 do Código Penal Português 24 Teoria objetivoindividual atos executórios são os relacionados ao início da conduta típica e também os que lhe são imediatamente anteriores em conformidade com o plano concreto do autor Portanto diferenciase da anterior por não se preocupar com o terceiro observador mas sim com a prova do plano concreto do autor independentemente de análise externa Exemplo A com uma faca em punho aguarda atrás de uma moita a 1634 passagem de B seu desafeto para matálo desejo já anunciado para diversas pessoas Quando este se encontra a 200 metros de distância A fica de pé segura firme a arma branca e aguarda em posição de ataque seu adversário Surge a polícia e o aborda Para essa teoria poderia haver a prisão em flagrante em face da caracterização da tentativa de homicídio o que não se dá na teoria objetivoformal Essa teoria que remonta a Hans Welzel tem como principais defensores Eugenio Raúl Zaffaroni e José Henrique Pierangeli Consumação Dáse a consumação também chamada de crime consumado crime pleno7 ou summatum opus quando nele se reúnem todos os elementos de sua definição legal CP art 14 I É por isso um crime completo ou perfeito pois a conduta criminosa se realiza integralmente Verificase quando o autor concretiza todas as elementares descritas pelo preceito primário de uma lei penal incriminadora No homicídio em que a conduta é matar alguém a consumação ocorre com a morte de um ser humano provocada por outra pessoa8 Nos crimes materiais ou causais aí se inserindo os culposos e omissivos impróprios espúrios ou comissivos por omissão aperfeiçoase a consumação com a superveniência do resultado naturalístico De seu turno nos crimes formais de resultado cortado ou de consumação antecipada e nos crimes de mera conduta ou de simples atividade a consumação ocorre com a mera prática da conduta Nos crimes qualificados pelo resultado incluindo os preterdolosos a 164 consumação se verifica com a produção do resultado agravador doloso ou culposo Exemplo o crime tipificado pelo art 129 3º do Código Penal se consuma com a morte do ofendido Os crimes de perigo concreto se consumam com a efetiva exposição do bem jurídico a uma probabilidade de dano Exemplo o crime de direção de veículo automotor sem habilitação Lei 95031997 art 309 se aperfeiçoa com a exposição a dano potencial da incolumidade de outrem Já os crimes de perigo abstrato ou presumido se consumam com a mera prática da conduta definida pela lei como perigosa Exemplo o porte ilegal de arma de fogo de uso permitido Lei 108262003 art 14 se consuma com o simples ato de portar arma de fogo de uso permitido sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar independentemente da efetiva comprovação da situação de perigo Em relação aos crimes permanentes a consumação se arrasta no tempo com a manutenção da situação contrária ao Direito autorizando a prisão em flagrante a qualquer momento enquanto não encerrada a permanência Por outro lado nos crimes habituais a consumação se dá com a reiteração de atos que revelam o estilo de vida do agente pois cada um deles isoladamente considerado representa um indiferente penal O EXAURIMENTO Também chamado de crime exaurido ou crime esgotado é o delito em que posteriormente à consumação subsistem efeitos lesivos derivados da conduta do autor É o caso do recebimento do resgate no crime de extorsão mediante sequestro desnecessário para fins de tipicidade eis que se consuma com a privação da liberdade destinada a ser trocada por indevida vantagem econômica Por guardar estreita relação com os crimes formais é chamado por Zaffaroni e Pierangelli de consumação material9 No terreno da tipicidade o exaurimento não compõe o iter criminis que se encerra com a consumação Influi contudo na dosimetria da pena notadamente na aplicação da pena base pois o art 59 caput do Código Penal erigiu as consequências do crime à condição de circunstância judicial Em alguns casos o exaurimento pode funcionar como qualificadora como se dá na resistência CP art 329 1º ou como causa de aumento da pena tal como na corrupção passiva CP art 317 1º 1 2 3 4 5 6 7 8 9 É o que se convencionou chamar de direito à perversão as pessoas ao menos em seus pensamentos podem ser más perversas ou seja têm liberdade para arquitetar mentalmente diversos ilícitos penais sem que haja qualquer tipo de sanção penal FRIAS CABALLERO Jorge El processo ejecutivo del delito 2 ed Buenos Aires Bibliográfica Argentina 1956 p 18 MAURACH Reinhart Tratado de Derecho Penal Trad espanhola Juan Córdoba Roda Barcelona Ariel 1962 v 2 p 168 Art 5º Realizar atos preparatórios de terrorismo com o propósito inequívoco de consumar tal delito Pena a correspondente ao delito consumado diminuída de um quarto até a metade HUNGRIA Nélson Comentários ao código penal Rio de Janeiro Forense 1949 v I p 252 STJ HC 112639RS rel Min Og Fernandes 6ª Turma j 25082009 noticiado no Informativo 404 STJ HC 297551MG rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 05032015 noticiado no Informativo 557 Com a edição da Lei 94341997 podese afirmar que a consumação do homicídio se produz com a morte encefálica art 3 caput ZAFFARONI Eugenio Raúl PIERANGELI José Henrique Da tentativa 4 ed São Paulo RT 1995 p 26 Proclama o art 14 II do Código Penal Art 14 Dizse o crime II tentado quando iniciada a execução não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente Parágrafo único Salvo disposição em contrário punese a tentativa com a pena correspondente ao crime consumado diminuída de 1 um a 23 dois terços Como bem define o art 14 II do Código Penal tentativa é o início de execução de um crime que somente não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente Destarte o ato de tentativa é necessariamente um ato de execução Exigese tenha o sujeito praticado atos executórios daí não sobrevindo a consumação por forças estranhas ao seu propósito o que acarreta em tipicidade não finalizada sem conclusão A tentativa é também conhecida por outros rótulos conatus crime imperfeito crime manco1 ou na preferência de Zaffaroni crime incompleto2 em oposição ao crime consumado reconhecido como completo ou perfeito Três elementos compõem a estrutura da tentativa 1 início da execução do crime 2 ausência de consumação por circunstâncias alheias à vontade do agente e 3 dolo de consumação O dolo da tentativa é igual ao dolo da consumação O Código Penal foi peremptório nesse sentido ao dizer que o crime somente não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente tinha a intenção de alcançar a consumação mas por circunstâncias alheias à sua vontade não conseguiu atingir seu objetivo A resolução do indivíduo é idêntica no crime consumado e no crime tentado Este último em verdade é perfeito na esfera subjetiva do agente embora imperfeito no campo objetivo relacionado ao resultado que deveria ser produzido com a conduta criminosa3 O art 14 II do Código Penal não goza de autonomia pois não existe a tentativa por si só isoladamente Sua aplicação reclama a realização de um tipo incriminador previsto na Parte Especial do Código Penal ou pela legislação penal especial O Código Penal e a legislação extravagante não preveem para cada crime a figura da tentativa nada obstante a maioria deles seja com ela compatível Exemplificativamente a tentativa de furto simples não encontra correspondência imediata no art 155 do Código Penal Utilizase a definição do crime consumado em conjunto com a regra prevista no art 14 II A tentativa de furto nesses termos é a combinação de subtrair para si ou para outrem coisa alheia móvel com iniciada a execução não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente Portanto furto tentado é art 155 caput cc o art 14 II ambos do Código Penal A adequação típica de um crime tentado é de subordinação mediata ampliada ou por extensão já que a conduta humana não se enquadra prontamente na lei penal incriminadora reclamandose para complementar a tipicidade a interposição do dispositivo contido no art 14 II do Código Penal Logo a norma definidora da tentativa é uma norma de extensão ou de ampliação da conduta Operase uma ampliação temporal da figura típica pois com a utilização da regra prevista no art 14 II do Código Penal o alcance do tipo penal não se limita apenas ao momento da consumação do crime mas também a períodos anteriores Antecipase a tutela penal para abarcar os atos executórios prévios à consumação Dentre as diversas teorias que buscam fundamentar a punibilidade da tentativa quatro se destacam 1ª Teoria subjetiva voluntarística ou monista ocupase exclusivamente da vontade criminosa que pode se revelar tanto na fase dos atos preparatórios como também durante a execução O sujeito é punido por sua intenção pois o que importa é o desvalor da ação sendo irrelevante o desvalor do resultado 2ª Teoria sintomática idealizada pela Escola Positiva de Ferri Lombroso e Garofalo sustenta a punição em razão da periculosidade subjetiva isto é do perigo revelado pelo agente Possibilita a punição de atos preparatórios pois a mera manifestação de periculosidade já pode ser enquadrada como tentativa em consonância com a finalidade preventiva da pena4 3ª Teoria objetiva realística ou dualista a tentativa é punida em face do perigo proporcionado ao bem jurídico tutelado pela lei penal Sopesamse o desvalor da ação e o desvalor do resultado a tentativa deve receber punição inferior à do crime consumado pois o bem jurídico não foi atingido integralmente 4ª Teoria da impressão ou objetivosubjetiva representa um limite à teoria subjetiva evitando o alcance desordenado dos atos preparatórios A punibilidade da tentativa só é admissível quando a atuação da vontade ilícita do agente seja adequada para comover a confiança na vigência do ordenamento normativo e o sentimento de segurança jurídica dos que tenham conhecimento da conduta criminosa5 A punibilidade da tentativa é disciplinada pelo art 14 parágrafo único E nesse campo o Código Penal acolheu como regra a teoria objetiva realística ou dualista ao determinar que a pena da tentativa deve ser correspondente à pena do crime consumado diminuída de 1 um a 23 dois terços Como o desvalor do resultado é menor quando comparado ao do crime consumado o conatus deve suportar uma punição mais branda Excepcionalmente entretanto é aceita a teoria subjetiva voluntarística ou monista consagrada pela expressão salvo disposição em contrário Há casos restritos em que o crime consumado e o crime tentado comportam igual punição são os delitos de atentado ou de empreendimento Podem ser citados como exemplos 1 evasão mediante violência contra a pessoa CP art 352 em que o preso ou indivíduo submetido a medida de segurança detentiva usando de violência contra a pessoa recebe igual punição quando se evade ou tenta evadirse do estabelecimento em que se encontra privado de sua liberdade e 2 Lei 47371965 Código Eleitoral art 309 no qual se sujeita a igual pena o eleitor que vota ou tenta votar mais de uma vez ou em lugar de outrem A tentativa constituise em causa obrigatória de diminuição da pena Incide na terceira fase de aplicação da pena privativa de liberdade e sempre a reduz A liberdade do magistrado repousa unicamente no quantum da diminuição balizandose entre os limites legais de 1 um a 23 dois terços Deve reduzila podendo somente escolher o montante da diminuição E para navegar entre tais parâmetros o critério decisivo é a maior ou menor proximidade da consumação é dizer a distância percorrida do iter criminis Para o Supremo Tribunal Federal A quantificação da causa de diminuição de pena relativa à tentativa art 14 II CP há de ser realizada conforme o iter criminis percorrido pelo agente a redução será inversamente proporcional à maior proximidade do resultado almejado6 Exemplo em uma tentativa de homicídio na qual a vítima foi atingida por diversos disparos de arma de fogo resultando em sua internação por vários dias em hospital a redução da pena deve operarse no patamar mínimo Ao contrário se os tiros sequer a atingiram afigurase razoável a diminuição da pena no máximo legal Não interfere na diminuição da pena a maior ou menor gravidade do crime bem como os meios empregados para sua execução ou ainda as condições pessoais do agente tais como antecedentes criminais e a circunstância de ser primário ou reincidente Em caso de crime tentado para analisar se o seu responsável deve ou não ser processado e julgado no Juizado Especial Criminal isto é para verificar o enquadramento ou não no conceito de infração penal de menor potencial ofensivo a causa de diminuição de pena deve ser aplicada em sua fração mínima sobre a pena máxima cominada Se o resultado daí advindo for superior a dois anos o Juizado não é o competente para o julgamento da causa7 O Código Castrense orientase também no tocante à punibilidade da tentativa pela teoria objetiva Admite todavia uma exceção ao critério da obrigatória diminuição da pena do crime tentado ao dispor em seu art 30 parágrafo único Punese a tentativa com a pena correspondente ao crime diminuída de um a dois terços podendo o juiz no caso de excepcional gravidade aplicar a pena do crime consumado grifamos A tentativa comporta a seguinte divisão branca ou incruenta vermelha ou cruenta perfeita ou acabada ou crime falho e imperfeita ou inacabada Nesta espécie de tentativa o objeto material não é atingido pela conduta criminosa8 Exemplo A efetua disparos de arma de fogo contra B sem acertálo Recebe essa denominação ao relacionarse com a tentativa de homicídio em que não se produzem ferimentos na vítima não acarretando no derramamento de sangue Nesta espécie de tentativa o objeto material é alcançado pela atuação do agente Exemplo A com intenção de matar atira em B provocandolhe ferimentos Porém a vítima é socorrida prontamente e sobrevive Na tentativa perfeita o agente esgota todos os meios executórios que estavam à sua disposição e mesmo assim não sobrevém a consumação por circunstâncias alheias à sua vontade Pode ser cruenta ou incruenta Exemplo A dispara contra B todos os seis cartuchos do tambor do seu revólver com a intenção de matálo A vítima gravemente ferida é socorrida por policiais e sobrevive Na tentativa imperfeita o agente inicia a execução sem contudo utilizar todos os meios que tinha ao seu alcance e o crime não se consuma por circunstâncias alheias à sua vontade Exemplo A com o propósito de matar B sai à sua procura portando um revólver municiado com 6 seis cartuchos intactos Ao encontrálo efetua três disparos atingindoo Quando contudo iria efetuar outros disparos é surpreendido pela Polícia Militar e foge A vítima é socorrida pelos milicianos e sobrevive Crimes de ímpeto são os cometidos sem premeditação como decorrência de reação emocional repentina Há argumentos no sentido de que o ímpeto do agente afasta a viabilidade de análise do iter criminis pois a sua atuação repentina impossibilita o fracionamento dos atos executórios O acesso excessivo de emoção ou paixão não seria compatível com o propósito de praticar determinado crime Vejase o exemplo do homem que ao chegar a sua casa encontra sua esposa mantendo relações sexuais com terceira pessoa Revoltado saca sua arma de fogo e efetua disparos contra a adúltera não a acertando embora desejasse matála Para aqueles que não aceitam o conatus nos crimes de ímpeto seria impossível estabelecer no plano concreto se o traído não matou sua mulher por erro na pontaria ou pelo fato de não desejar alvejála efetivamente Nélson Hungria com sua peculiar competência repele essa posição Não se deve levar para a doutrina do dolo e da tentativa o que apenas representa a solução de uma dificuldade prática no terreno da prova A tentativa tanto existe nos crimes de ímpeto quanto nos crimes refletidos É tudo uma questão de prova posto que a indagação do animus não pode deixar de ser feita ab externo diante das circunstâncias objetivas A maior dificuldade de tal prova nos crimes de ímpeto nada tem a ver com a possibilidade conceitual da tentativa9 E arremata Se se verifica em face das circunstâncias que nada obstante a instantaneidade da resolução o agente empregando os meios que empregou ou por sua atitude teve a consciência de que com a sua ação podia atingir o evento típico do crime não há outra solução na hipótese de não superveniência de tal evento senão a de imputarlhe o fato a título de tentativa10 Prevalece no Brasil o entendimento favorável ao cabimento da tentativa nos crimes cometidos com dolo eventual equiparado pelo art 18 I do Código Penal no tocante ao seu tratamento ao dolo direto11 A dificuldade de prova do início da execução de um crime que não se consuma por circunstâncias alheias ao consentimento do agente é questão de natureza processual em nada interferindo na tipicidade do fato Invoquemos uma vez mais as lições de Nélson Hungria Se o agente aquiesce no advento do resultado específico do crime previsto como possível é claro que este entra na órbita de sua volição logo se por circunstâncias fortuitas tal resultado não ocorre é inegável que o agente deve responder por tentativa É verdade que na prática será difícil identificarse a tentativa no caso de dolo eventual notadamente quando resulta totalmente improfícua tentativa branca Mas repitase a dificuldade de prova não pode influir na conceituação da tentativa12 Todavia existem posições pela inadmissibilidade da tentativa nos crimes praticados com dolo eventual com fundamento na redação do art 14 II do Código Penal se o legislador definiu o crime tentado como aquele em que iniciada a execução não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente limitou o instituto ao dolo direto para o qual adotou a teoria da vontade art 18 I 1ª parte excluindoa do alcance do dolo eventual em que se acolheu a teoria do consentimento ou do assentimento art 18 I in fine13 Em geral os crimes dolosos são compatíveis com a tentativa pouco importando sejam materiais formais ou de mera conduta De fato a admissibilidade ou não da tentativa tem a ver com o caráter plurissubsistente do delito isto é com a composição da conduta em diversos atos executórios podendo consequentemente ser fracionada Crimes formais e de mera conduta comportam o conatus desde que sejam plurissubsistentes Na seara dos crimes formais tomemos como exemplo uma extorsão mediante sequestro CP art 159 na qual o agente aponta uma arma de fogo para a vítima dizendo para ela se render porque seria privada de sua liberdade para futura troca por vantagem econômica indevida junto aos seus familiares A vítima contudo consegue fugir e é perseguida Aciona a Polícia que aborda o criminoso e efetua sua prisão em flagrante antes da privação da liberdade da pessoa visada Tratase de tentativa de extorsão mediante sequestro exemplo clássico de crime formal de consumação antecipada ou de resultado cortado Em relação aos crimes de mera conduta ou de simples atividade ilustremos com o ato obsceno CP art 233 um casal em praça pública anuncia que realizará dentro de instantes um show de sexo explícito Quando começam a se despir são presos em flagrante por policiais que ali se encontravam As condutas se enquadram como tentativas de crimes de ato obsceno Concluise assim que a possibilidade de tentativa se relaciona com a ausência de aperfeiçoamento de todos os elementos do tipo penal e não com a falta de superveniência do resultado naturalístico obrigatório apenas para a consumação dos crimes materiais A regra portanto é a compatibilidade dos crimes com o conatus 1 2 3 4 5 Algumas espécies de infrações penais todavia não admitem a tentativa Vejamos quais são Crimes culposos nestes crimes o resultado naturalístico é involuntário contrário à intenção do agente Por corolário seria no mínimo contraditório admitirse em um crime não desejado pelo seu autor o início da execução de um delito que somente não se consuma por circunstâncias alheias à sua vontade Essa regra se excepciona no que diz respeito à culpa imprópria compatível com a tentativa pois nela há a intenção de se produzir o resultado Cuidase em verdade de dolo punido por razões de política criminal a título de culpa em face de ser a conduta realizada pelo agente com amparo em erro inescusável quanto à ilicitude do fato Crimes preterdolosos nestes crimes o resultado agravador é culposo não desejado pelo agente Por esse motivo não se compactuam com a tentativa Exemplo só se configura o crime de lesão corporal seguida de morte quando se produz o resultado agravador pois caso contrário o agente responde unicamente pelas lesões corporais dolosamente praticadas Crimes unissubsistentes são aqueles em que a conduta é exteriorizada mediante um único ato suficiente para alcançar a consumação Não é possível a divisão do iter criminis razão pela qual é incabível a tentativa Exemplo desacato CP art 331 cometido verbalmente proferida a palavra apta a menosprezar a função pública exercida por determinada pessoa consumado estará o crime Crimes omissivos próprios ou puros ingressam no grupo dos crimes unissubsistentes Em uma omissão de socorro CP art 135 o sujeito tem duas opções ou presta assistência ao necessitado e não há crime ou deixa de prestála e o crime estará consumado Os crimes omissivos impróprios espúrios ou comissivos por omissão de seu turno admitem a tentativa Crimes de perigo abstrato também se enquadram no bloco dos 6 7 8 9 10 crimes unissubsistentes No porte ilegal de arma de fogo ou o agente porta a arma de fogo em situação irregular e o crime estará consumado ou não o faz e o fato será atípico Os crimes de perigo concreto por sua vez comportam a tentativa Contravenções penais embora no plano fático seja em tese possível a tentativa de contravenção penal é juridicamente irrelevante em face da regra contida no art 4º do Decretolei 36881941 Lei das Contravenções Penais Não é punível a tentativa de contravenção Crimes condicionados são aqueles cuja punibilidade está sujeita à produção de um resultado legalmente exigido tal qual a participação em suicídio CP art 122 em que só há punição se resultar morte ou lesão corporal de natureza grave Crimes subordinados a condição objetiva de punibilidade tal como ocorre em relação aos falimentares Lei 111012005 Lei de Falências art 180 pois se o próprio delito completo não é punível se não houver aquela condição muito menos o será a sua tentativa14 Crimes de atentado ou de empreendimento não há tentativa uma vez que a figura tentada recebe igual pena destinada ao crime consumado É o que se dá por exemplo no delito tipificado pelo art 352 do Código Penal evadirse ou tentar evadirse Crimes com tipo penal composto de condutas amplamente abrangentes em relação a estes crimes no caso concreto é impossível dissociar a tentativa da consumação Vejase o exemplo do crime de parcelamento ou desmembramento irregular do solo para fins urbanos tipificado pelo art 50 I da Lei 67661979 Dar início de qualquer modo ou efetuar loteamento ou desmembramento do solo para fins urbanos sem autorização do órgão público competente ou em desacordo com as disposições desta Lei ou das normas pertinentes do Distrito Federal Estados e Municípios grifamos A expressão de qualquer modo na 11 12 prática inviabiliza a tentativa pois qualquer que seja a conduta adotada pelo agente implicará na consumação Crimes habituais são aqueles compostos pela reiteração de atos que demonstram um estilo de vida do agente Cada ato isoladamente considerado representa um indiferente penal É o caso do curandeirismo CP art 284 I em que o ato de prescrever uma única vez qualquer substância é conduta atípica pois a lei reclama a habitualidade Mirabete faz uma adequada ressalva suscitando divergência há tentativa do crime previsto no art 282 do Código Penal na conduta do sujeito que sem ser médico instala um consultório e é detido quando de sua primeira consulta15 Não se devem confundir crimes habituais entretanto com crimes permanentes nos quais a tentativa é perfeitamente cabível Exemplo tentativa de sequestro CP art 148 na qual o autor tenta de modo forçado prender uma pessoa no quarto de uma casa mas esta reage e foge Crimesobstáculo são os que retratam atos preparatórios tipificados de forma autônoma pelo legislador a exemplo do crime de substância destinada à falsificação CP art 277 De fato não há sentido em punir a preparação de um crime que normalmente não é punível como delito autônomo prevendose para este também a figura do conatus Haveria incompatibilidade lógica de punir a tentativa de preparação de um crime que somente é objeto de punição porque excepcionalmente o legislador construiu um tipo penal específico Exemplificativamente ter em depósito substância destinada à falsificação de um produto medicinal não fosse a figura típica do art 277 representaria conduta penalmente irrelevante não podendo ser considerada ato executório do crime previsto no art 273 pois tratase de mera fase preparatória Como se sabe o intérprete não pode ampliar a exceção criada pelo legislador A regra vigente no sistema penal brasileiro é a punição dos crimes nas modalidades consumada e tentada Mas em algumas situações não se admite o conatus seja pela natureza da infração penal seja em obediência a determinado mandamento legal razão pela qual apenas é possível a imposição de sanção penal para a forma consumada do delito ou da contravenção penal É o que se verifica a título ilustrativo nos crimes culposos salvo na culpa imprópria e nos crimes unissubsistentes Entretanto em hipóteses raríssimas somente é cabível a punição de determinados delitos na forma tentada pois nesse sentido orientouse a previsão legislativa quando da elaboração do tipo penal Exemplos disso encontramse nos arts 9º e 11 da Lei 71701983 Crimes contra a Segurança Nacional Art 9º Tentar submeter o território nacional ou parte dele ao domínio ou à soberania de outro país Pena reclusão de 4 a 20 anos Parágrafo único Se do fato resulta lesão corporal grave a pena aumenta se até um terço se resulta morte aumentase até a metade Art 11 Tentar desmembrar parte do território nacional para constituir país independente Pena reclusão de 4 a 12 anos 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 FRANCO Alberto Silva STOCO Rui Código penal e sua interpretação jurisprudencial Parte geral 7 ed São Paulo RT 2001 p 152 v1 ZAFFARONI Eugenio Raúl Manual de derecho penal Parte general 2 ed Buenos Aires Ediar 2002 p 809 a tentativa não é uma figura autônoma pois a vontade contrária ao direito existente na tentativa é igual à do delito consumado STJ HC 297551MG rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 05032015 noticiado no Informativo 557 PUGLIA Fernando Da tentativa Trad Octavio Mendes 2 ed Lisboa Clássica 1907 p 116 ZAFFARONI Eugenio Raúl Manual de derecho penal Parte general 2 ed Buenos Aires Ediar 2002 p 814 STF HC 118203MT rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 15102013 No STJ HC 190214DF rel Min Gilson Dipp 5ª Turma j 15022011 STJ HC 94927SP rel Min Jane Silva desembargadora convocada do TJMG 6ª Turma j 01042008 Considerase tentativa branca aquela na qual o bem tutelado pelo tipo penal não sofre qualquer dano STJ HC 265189RJ rel Min Regina Helena Costa 5ª Turma j em 17122013 HUNGRIA Nélson Comentários ao Código Penal Rio de Janeiro Forense 1949 v I p 261 Idem ibidem p 262 Esta Corte Superior de Justiça já se posicionou no sentido da compatibilidade entre o dolo eventual e o crime tentado STJ AgRg no REsp 1199947DF rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 11122012 HUNGRIA Nélson Comentários ao código penal Rio de Janeiro Forense 1949 v I p 262 No mesmo sentido MUNHOZ NETTO Alcides Da tentativa no código penal brasileiro Curitiba Lítero Técnica 1958 p 58 É dentre outros o entendimento de GRECO Rogério Curso de direito penal Parte geral 10 ed Rio de Janeiro Impetus 2008 p 263267 NORONHA E Magalhães Questões acerca da tentativa Estudos de 15 direito e processo penal em homenagem a Nélson Hungria Rio de Janeiro Forense 1962 p 247 MIRABETE Julio Fabbrini Manual de direito penal Parte geral 24 ed São Paulo Atlas 2007 v 1 p 153 181 182 183 DISPOSITIVO LEGAL Estabelece o art 15 do Código Penal O agente que voluntariamente desiste de prosseguir na execução ou impede que o resultado se produza só responde pelos atos já praticados DISTINÇÃO COM A TENTATIVA Desistência voluntária e arrependimento eficaz são formas de tentativa abandonada1 assim rotulados porque a consumação do crime não ocorre em razão da vontade do agente que não chega ao resultado inicialmente desejado por interromper o processo executório do delito ou esgotada a execução emprega diligências eficazes para impedir o resultado Diferemse portanto da tentativa ou conatus em que iniciada a execução de um delito a consumação não ocorre por circunstâncias alheias à vontade do agente2 FUNDAMENTO 184 1 2 3 O fundamento políticocriminal da desistência voluntária e do arrependimento eficaz é o estímulo ao agente para evitar a produção do resultado de um crime cuja execução já se iniciou em relação ao qual lhe é perfeitamente possível alcançar a consumação Por esse motivo Franz von Liszt a eles se referia como a ponte de ouro3 do Direito Penal isto é a forma capaz de se valer o agente para retornar à seara da licitude De fato os institutos têm origem no direito premial pelo qual o Estado concede ao criminoso um tratamento penal mais favorável em face da voluntária não produção do resultado Em suas palavras No momento em que o agente transpõe a linha divisória entre os atos preparatórios impunes e o começo da execução punível incorre na pena cominada contra a tentativa Semelhante fato não pode mais ser alterado suprimido ou anulado retroativamente Pode porém a lei por considerações de política criminal construir uma ponte de ouro para a retirada do agente que já se tornara passível de pena4 NATUREZA JURÍDICA Há três correntes sobre a natureza jurídica da desistência voluntária e do arrependimento eficaz Causa pessoal de extinção da punibilidade embora não prevista no art 107 do Código Penal a desistência voluntária e o arrependimento eficaz retiram o ius puniendi estatal no tocante ao crime inicialmente desejado pelo agente É a posição de Nélson Hungria E Magalhães Noronha Aníbal Bruno e Eugenio Raúl Zaffaroni entre outros Causa de exclusão da culpabilidade se o agente não produziu voluntariamente o resultado inicialmente desejado afastase em relação a este o juízo de reprovabilidade Responde entretanto pelo crime cometido mais brando Comungam desse entendimento Hans Welzel e Claus Roxin Causa de exclusão da tipicidade para essa vertente afastase a tipicidade do crime inicialmente desejado pelo agente subsistindo 185 apenas a tipicidade dos atos já praticados A ela se filiaram José Frederico Marques Heleno Cláudio Fragoso Basileu Garcia e Damásio E de Jesus É a posição dominante na jurisprudência5 DESISTÊNCIA VOLUNTÁRIA Na desistência voluntária o agente por ato voluntário interrompe o processo executório do crime abandonando a prática dos demais atos necessários e que estavam à sua disposição para a consumação Assemelha se mas não se confunde com a tentativa imperfeita ou inacabada compreendida como aquela em que não se esgotaram os meios de execução que o autor tinha ao seu alcance Conforme a clássica fórmula de Frank a desistência voluntária se caracteriza quando o responsável pela conduta diz a si próprio posso prosseguir mas não quero Estaremos diante da tentativa entretanto se o raciocínio for outro quero prosseguir mas não posso Em regra caracterizase por uma conduta negativa pois o agente desiste da execução do crime deixando de realizar outros atos que estavam sob o seu domínio Exemplo A dispara um projétil de arma de fogo contra B Com a vítima já caída ao solo em local ermo e com mais cinco cartuchos no tambor de seu revólver A desiste de efetuar outros tiros quando podia fazêlo para ceifar a vida de B Nos crimes omissivos impróprios todavia a desistência voluntária reclama uma atuação positiva um fazer pelo qual o autor de um delito impede a produção do resultado Exemplo a mãe desejando eliminar o pequeno filho deixa de alimentálo por alguns dias Quando o infante está à beira da morte a genitora muda de ideia e passa a nutrilo recuperando a sua saúde A desistência voluntária não é admitida nos crimes unissubsistentes pois se a conduta não pode ser fracionada exteriorizandose por um único ato é impossível desistir da sua execução que já se aperfeiçoou com a atuação do agente 186 187 ARREPENDIMENTO EFICAZ No arrependimento eficaz ou resipiscência6 depois de já praticados todos os atos executórios suficientes à consumação do crime o agente adota providências aptas a impedir a produção do resultado Exemplo depois de ministrar veneno à vítima que o ingeriu ao beber o café preparado pelo agente este lhe oferece o antídoto impedindo a eficácia causal de sua conduta inicial Fica claro que o arrependimento eficaz apresenta um ponto em comum com a tentativa perfeita ou acabada pois o agente esgota todos os meios de execução que se encontravam à sua disposição O art 15 do Código Penal revela ser o arrependimento eficaz possível somente no tocante aos crimes materiais pela análise da expressão impede que o resultado se produza Esse resultado naturalístico é exigido somente para a consumação dos crimes materiais consumados Além disso nos crimes formais a realização da conduta implica na automática consumação do delito aperfeiçoandose a tipicidade do fato muito embora no caso concreto seja possível porém dispensável para a consumação a produção do resultado naturalístico Nos crimes de mera conduta por sua vez jamais ocorrerá o resultado naturalístico motivo pelo qual não se admite a sua interrupção Além disso com a simples atividade o delito já estará consumado com a tipicidade concluída e imutável REQUISITOS São comuns os requisitos da desistência voluntária e do arrependimento eficaz voluntariedade e eficácia Devem ser voluntários isto é livres de coação física ou moral pouco importando sejam espontâneos ou não A iniciativa pode emanar de terceira pessoa ou mesmo da própria vítima bastando o pensamento posso prosseguir mas não quero Com efeito a espontaneidade reclama tenha sido a ideia originada da 188 189 1810 mente do agente como fruto de sua mais honesta vontade Exigese ainda a eficácia ou seja é necessário que a atuação do agente seja capaz de evitar a produção do resultado Se embora o agente tenha buscado impedir sua ocorrência ainda assim o resultado se verificou subsiste a sua responsabilidade pelo crime consumado Incide todavia a atenuante genérica prevista no art 65 III alínea b 1ª parte do Código Penal MOTIVOS São irrelevantes os motivos que levaram o agente a optar pela desistência voluntária ou pelo arrependimento eficaz Não precisam ser éticos piedosos valorativos ou admiráveis Podem decorrer de questões religiosas por conselho do advogado ou mesmo pelo receio de suportar a sanção penal O Código Penal se contenta com a voluntariedade e a eficácia para a exclusão da tipicidade EFEITO Na desistência voluntária e no arrependimento eficaz o efeito é o mesmo o agente não responde pela forma tentada do crime inicialmente desejado mas somente pelos atos já praticados Assim nos exemplos indicados disparos de arma de fogo e inoculação de veneno não há tentativa mas somente lesões corporais com grau definido em razão do prejuízo proporcionado à vítima INCOMPATIBILIDADE COM OS CRIMES CULPOSOS A desistência voluntária e o arrependimento eficaz são incompatíveis com os crimes culposos salvo na culpa imprópria O motivo é simples nessa modalidade de delito o resultado naturalístico é involuntário não sendo lógico imaginar portanto um resultado que o agente desejava produzir para em seguida abandonar a execução que a ele conduziria ou impedir a sua 1811 1812 1ª 2ª produção ADIAMENTO DA PRÁTICA DO CRIME Prevalece o entendimento de que há desistência voluntária no adiamento da empreitada criminosa com o propósito de repetila em ocasião mais adequada Exemplo A famoso homicida de uma pequena cidade por sempre utilizar armas brancas com ponta ou gume trajando capuz para não ser reconhecido e somente com uma faca à sua disposição depois de efetuar um golpe na vítima atingindoa de raspão decide interromper a execução do homicídio para no futuro sem despertar suspeitas atingila com disparos de arma de fogo Não existe desistência voluntária porém na hipótese de execução retomada em que a pessoa deseja dar sequência no futuro à atividade criminosa que precisou adiar utilizandose dos atos anteriormente praticados Exemplo a vítima privada de sua liberdade é torturada pelo agente que assim age para matála Como nasce o filho do criminoso e ele se ausenta para visitálo desiste de matar o ofendido naquele dia deixando para fazêlo no futuro mediante novas torturas sem libertálo COMUNICABILIDADE DA DESISTÊNCIA VOLUNTÁRIA E DO ARREPENDIMENTO EFICAZ Imagine a seguinte situação A contrata B para matar C Na data ajustada e depois de amarrála a uma árvore B desiste de matála mantendoa incólume contra a vontade de A Com base nessa situação questionase os efeitos da desistência voluntária e do arrependimento eficaz são comunicáveis no concurso de pessoas A doutrina não é unânime dividindose em duas correntes corrente Heleno Cláudio Fragoso e Costa e Silva sustentando o caráter subjetivo dos institutos defendem a manutenção da responsabilidade do partícipe no tocante à tentativa abandonada pelo autor corrente Nélson Hungria apregoa o caráter misto objetivo e 1813 a b subjetivo da desistência voluntária e do arrependimento eficaz com a consequente aplicação da regra prevista no art 30 do Código Penal excluindo a responsabilidade penal do partícipe Essa última posição é dominante pois a conduta do partícipe é acessória dependendo sua punição da prática de um crime consumado ou tentado pelo autor responsável pela conduta principal E se este não comete nenhum crime impossível a punição do partícipe Na hipótese de o partícipe A no exemplo acima desistir da empreitada criminosa sua atuação embora voluntária será inútil se ele não conseguir impedir a consumação do delito Exigese assim que o partícipe convença o autor a não consumar a infração penal pois em caso contrário responderá pelo delito em face da ineficácia de sua desistência TENTATIVA QUALIFICADA A tentativa é chamada de qualificada quando contém em seu bojo outro delito de menor gravidade já consumado Na desistência voluntária e no arrependimento eficaz operase a exclusão da tipicidade do crime inicialmente desejado pelo agente Resta contudo a responsabilidade penal pelos atos já praticados os quais configuram um crime autônomo e já consumado Daí falarse em tentativa qualificada Vejamos alguns exemplos aquele que deseja matar e para tanto efetua disparo de arma de fogo contra a vítima sem atingila abandonando em seguida o propósito criminoso responde apenas pelo crime autônomo de disparo de arma de fogo Lei 108262003 art 15 e aquele que no interior de uma residência que ingressou para furtar desiste voluntariamente da execução do delito responde somente pelo crime de violação de domicílio CP art 150 Nos dois casos excluiuse a tipicidade do delito inicial restando um crime menos grave e já consumado É possível ainda que os atos já praticados pelo agente não configurem 1814 crime autônomo É o caso do indivíduo que desiste do furto de uma motocicleta da qual se apoderou em um estacionamento sem danificála Em situações desse nível ficará impune DESISTÊNCIA VOLUNTÁRIA ARREPENDIMENTO EFICAZ E LEI DE TERRORISMO Na sistemática do Código Penal é imprescindível o ingresso na fase de execução do crime para ensejar o reconhecimento da desistência voluntária e do arrependimento eficaz De fato o agente deve interromper o processo executório do crime desistência voluntária ou depois do encerramento deste adotar alguma providência impeditiva da consumação arrependimento eficaz O art 10 da Lei 132602016 Lei de Terrorismo contudo apresenta uma regra diversa Mesmo antes de iniciada a execução do crime de terrorismo na hipótese do art 5º desta Lei aplicamse as disposições do art 15 do DecretoLei nº 2848 de 7 de dezembro de 1940 Código Penal Esse dispositivo encontrase em sintonia com o art 5º do citado diploma legal7 Com efeito se a Lei 132602016 pune de forma independente os atos preparatórios de terrorismo é preciso adaptar a desistência voluntária e o arrependimento eficaz à fase de preparação do delito inclusive com a finalidade de seduzir o terrorista a evitar seu propósito ilícito e preservar os bens jurídicos ameaçados pela conduta criminosa 1 2 3 4 5 6 7 Daí falarse na configuração do dolo abandonado nesses dois institutos A resposta afirmativa dos jurados à indagação sobre a ocorrência de tentativa afasta automaticamente a hipótese de desistência voluntária Esclareceuse que o conselho de sentença após responder positivamente ao primeiro quesito inerente à autoria também o fizera de forma assertiva quanto ao segundo a fim de reconhecer a prática de homicídio tentado Reputouse que assim fora rejeitada a tese de desistência voluntária STF HC 112197SP rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 05062012 noticiado no Informativo 669 Alguns autores em alusão a esta expressão também têm utilizado outras terminologias a ponte de prata para se referir ao arrependimento posterior CP art 16 pois acarreta somente na diminuição da pena b ponte de bronze seria a atenuante da confissão espontânea CP art 65 inc III d e c ponte de diamante em correspondência à colaboração premiada quando o Ministério Público deixa de oferecer denúncia Lei 128502013 art 4º 4º LISZT Franz von Tratado de direito penal alemão Trad José Hygino Duarte Pereira Rio de Janeiro F Briguiet 1889 t I p 342 Embora a criação da expressão ponte de ouro seja atribuída a von Liszt sua origem remonta aos estudos de Feuerbach e à sua teoria políticocriminal JESCHECK HansHeinrich Tratado de derecho penal Parte general 5 ed Trad espanhola Miguel Olmedo Cardenete Granada Comares 2002 p 578 STJ HC 110504RJ rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 07022012 JESUS Damásio E de Direito penal Parte geral 28 ed 2 tir São Paulo Saraiva 2006 v 1 p 344 Art 5º Realizar atos preparatórios de terrorismo com o propósito inequívoco de consumar tal delito Pena a correspondente ao delito consumado diminuída de um quarto até a metade Arrependimento posterior é a causa obrigatória de diminuição da pena que ocorre quando o responsável pelo crime praticado sem violência à pessoa ou grave ameaça voluntariamente e até o recebimento da denúncia ou queixa restitui a coisa ou repara o dano provocado por sua conduta Conforme dispõe o art 16 do Código Penal Nos crimes cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa reparado o dano ou restituída a coisa até o recebimento da denúncia ou da queixa por ato voluntário do agente a pena será reduzida de 1 um a 23 dois terços Com o propósito de distinguir o arrependimento posterior do arrependimento eficaz disciplinado pelo art 15 do Código Penal o legislador foi infeliz ao tratar do instituto no âmbito da teoria do crime De fato o assunto deveria ter sido disciplinado na seara da teoria da pena por influir na sua dosagem em nada alterando a adequação típica do fato concreto ao contrário do que se dá no arrependimento eficaz Tratase de causa obrigatória de diminuição da pena Tem incidência portanto na terceira fase de aplicação da pena privativa de liberdade O arrependimento posterior alcança qualquer crime que com ele seja compatível e não apenas os delitos contra o patrimônio Raciocínio diverso levaria à conclusão de que essa figura penal deveria estar prevista no título dos crimes contra o patrimônio e não na Parte Geral do Código Penal Basta em termos genéricos que exista um dano causado em razão da conduta penalmente ilícita É o caso por exemplo do crime de peculato doloso em suas diversas modalidades CP art 312 Cuidase de crime contra a Administração Pública que admite o arrependimento posterior Embora com alguma controvérsia prevalece o entendimento de que a reparação do dano moral enseja a aplicação do arrependimento posterior Nos crimes contra a honra a título ilustrativo a indenização pelos prejuízos causados autorizaria a diminuição da pena8 Evidentemente este instituto é inaplicável nos delitos em que não há dano a ser reparado ou coisa a ser restituída Em outras palavras o arrependimento posterior é cabível nos crimes patrimoniais e também em delitos diversos desde que apresentem efeitos de índole patrimonial Para o Superior Tribunal de Justiça Em homicídio culposo na direção de veículo automotor art 302 do CTB ainda que realizada composição civil entre o autor do crime e a família da vítima é inaplicável o arrependimento posterior art 16 do CP O STJ possui entendimento de que para que seja possível aplicar a causa de diminuição de pena prevista no art 16 do Código Penal fazse necessário que o crime praticado seja patrimonial ou possua efeitos patrimoniais HC 47922PR Quinta Turma DJ 10122007 e REsp 1242294PR Sexta Turma DJe 322015 Na hipótese em análise a tutela penal abrange o bem jurídico o direito fundamental mais importante do ordenamento jurídico a vida que uma vez ceifada jamais poderá ser restituída reparada Não se pode assim falar que o delito do art 302 do CTB é um crime patrimonial ou de efeito patrimonial Além disso não se pode reconhecer o arrependimento posterior pela impossibilidade de reparação do dano cometido contra o bem jurídico vida e por conseguinte pela impossibilidade de aproveitamento pela vítima da composição financeira entre a agente e a sua família Sendo assim inviável o reconhecimento do arrependimento posterior na hipótese de homicídio culposo na direção de veículo automotor9 O arrependimento posterior tem raízes em questões de política criminal fundadas em duplo aspecto 1 proteção da vítima que deve ser amparada em relação aos danos sofridos e 2 fomento do arrependimento por parte do agente que se mostra mais preocupado com as consequências de seu ato reduzindo as chances de reincidência A leitura do art 16 do Código Penal fornece os requisitos do arrependimento posterior a Natureza do crime O crime deve ter sido praticado sem violência ou grave ameaça à pessoa Destarte em se tratando de crime com violência ou grave ameaça à pessoa pouco importa a quantidade e a natureza da pena bem como o regime prisional fixado é impossível a aplicação do arrependimento posterior A violência contra a coisa não exclui o benefício Em caso de violência culposa é cabível o arrependimento posterior Não houve violência na conduta mas sim no resultado É o que se dá por exemplo na lesão corporal culposa crime de ação penal pública condicionada em que a reparação do dano pode inclusive acarretar na renúncia ao direito 1 2 de representação se celebrada a composição civil na forma do art 74 e parágrafo único da Lei 90991995 No tocante aos crimes perpetrados com violência imprópria duas posições se destacam é possível o arrependimento posterior pois a lei só o excluiu no que diz respeito à violência própria Se quisesse afastálo o teria feito expressamente tal como no art 157 caput do Código Penal e não se admite o benefício Violência imprópria é violência dolosa e nela a vítima é reduzida à impossibilidade de resistência A situação é tão grave que a subtração de coisa alheia móvel assim praticada deixa de ser furto e se torna roubo crime muito mais grave b Reparação do dano ou restituição da coisa Deve ser voluntária pessoal e integral Voluntária no sentido de ser realizada sem coação física ou moral Pode se dar assim em razão de orientação de familiares do advogado ou mesmo por receio de suportar rigorosa sanção penal Não se exige contudo espontaneidade É prescindível tenha surgido a ideia livremente na mente do agente Pessoal salvo na hipótese de comprovada impossibilidade como quando o agente se encontra preso ou internado em hospital e terceira pessoa representandoo procede à reparação do dano ou restituição da coisa Não pode advir de terceiros exceto em situações que justifiquem a impossibilidade de ser feita diretamente pelo autor do crime Por óbvio também não pode ser resultante da atuação policial ao apreender o produto do crime pois essa circunstância excluiria a voluntariedade Integral pois a reparação ou restituição de modo parcial não se encaixa no conceito apresentado pelo art 16 do Código Penal A completude entretanto deve ser analisada no caso concreto ficando ao encargo da vítima principalmente a sua constatação O Supremo Tribunal Federal todavia já admitiu o arrependimento posterior na reparação parcial do dano Nessa linha de raciocínio o percentual de diminuição da pena um a dois terços existe para ser sopesado em razão da extensão da reparação ou do ressarcimento e da presteza com que ela ocorre10 c Limite temporal A reparação do dano ou restituição da coisa voluntária pessoal e integral nos crimes cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa deve ser efetuada até o recebimento da denúncia ou da queixa É irrelevante destarte o momento do oferecimento da denúncia ou da queixa A barreira temporal que viabiliza o benefício é o juízo de admissibilidade da petição inicial Se a reparação do dano for concretizada após o recebimento da denúncia ou da queixa mas antes do julgamento aplicase a atenuante genérica prevista no art 65 III b parte final do Código Penal11 A reparação do dano ou restituição da coisa tem natureza objetiva Consequentemente comunicase aos demais coautores e partícipes do crime na forma definida pelo art 30 do Código Penal Como destacado pelo Superior Tribunal de Justiça Uma vez reparado o dano integralmente por um dos autores do delito a causa de diminuição de pena do arrependimento posterior prevista no art 16 do CP estendese aos demais coautores cabendo ao julgador avaliar a fração de redução a ser aplicada conforme a atuação de cada agente em relação à reparação efetivada De fato tratase de circunstância comunicável em razão de sua natureza objetiva Devese observar portanto o disposto no art 30 do CP segundo o qual não se comunicam as circunstâncias e as condições de caráter pessoal salvo quando elementares do crime12 Nas infrações penais em que a reparação do dano ou restituição da coisa por um dos agentes inviabiliza igual atuação por parte dos demais a todos se estende o benefício Na receptação CP art 180 a propósito entendimento diverso prejudicaria o autor do crime antecedente que estaria impossibilitado de reparar um dano já satisfeito A redução da pena dentro dos parâmetros legais um a dois terços deve ser calculada com base na celeridade e na voluntariedade da reparação do dano ou da restituição da coisa Quanto mais rápida e mais verdadeira maior será a diminuição da pena 23 quanto mais lenta desde que até o recebimento da denúncia ou queixa e menos sincera menor a diminuição 13 Contudo ao admitir a reparação parcial do dano ou a restituição parcial da coisa o Supremo Tribunal Federal firmou entendimento no sentido de que a diminuição da pena leva em conta a extensão do ato reparador do agente Nesse contexto se a reparação do dano ou a restituição da coisa for total a pena será reduzida de 23 se parcial a diminuição incidirá em menor percentual13 Seja qual for o motivo que leve a vítima a agir dessa forma o agente não pode ser privado da diminuição da pena se preencher os requisitos legalmente previstos para a concessão do benefício Pertinente assim a entrega da coisa à autoridade policial que deverá lavrar auto de apreensão para a remessa ao juízo competente e posterior entrega ao ofendido ou ainda em casos extremos o depósito em juízo determinado em ação de consignação em pagamento Estabelece o art 312 3º do Código Penal que no peculato culposo a reparação do dano se anterior à sentença irrecorrível extingue a punibilidade e se lhe for posterior reduz de metade a pena imposta Essa regra de caráter especial afasta a incidência do art 16 do Código Penal em relação ao peculato culposo A composição dos danos civis entre o autor do fato e o ofendido em se tratando de crimes de ação penal privada ou ação penal pública condicionada à representação acarreta na renúncia ao direito de queixa ou de representação com a consequente extinção da punibilidade Lei 90991995 art 74 parágrafo único No crime tipificado pelo art 168A do Código Penal dispõe seu 2º É extinta a punibilidade se o agente espontaneamente declara confessa e efetua o pagamento das contribuições importâncias ou valores e presta as informações devidas à previdência social na forma definida em lei ou regulamento antes do início da ação fiscal Estatui o verbete sumular O pagamento de cheque emitido sem provisão de fundos após o recebimento da denúncia não obsta ao prosseguimento da ação penal Sua interpretação autoriza a ilação a contrario sensu que o pagamento de cheque sem provisão de fundos até o recebimento da denúncia impede o prosseguimento da ação penal Em termos técnicos essa súmula criada anteriormente à Lei 72091984 para o crime de fraude no pagamento por meio de cheque CP art 171 2º VI perdeu eficácia com a redação conferida ao art 16 pela Reforma da Parte Geral do Código Penal A jurisprudência todavia é dominante no sentido de considerar válida a súmula em apreço com a justificativa de não se referir ao arrependimento posterior e sim à falta de justa causa para a denúncia por ausência de fraude É o atual entendimento do Superior Tribunal de Justiça que limita a sua aplicação exclusivamente ao crime de estelionato na modalidade emissão de cheque sem fundos CP art 171 2º VI Esta Corte Superior de Justiça já sufragou o entendimento de que o agente que realiza pagamento através da emissão de cheque sem fundos de terceiro que chegou ilicitamente a seu poder incide na figura prevista no caput do art 171 do Código Penal não em seu 2º inciso IV Tipificada a conduta da paciente como estelionato na sua forma fundamental o fato de ter ressarcido o do prejuízo à vítima antes do recebimento da denúncia não impede a ação penal não havendo falar pois em incidência do disposto no Enunciado 554 da Súmula do Supremo Tribunal Federal que se restringe ao estelionato na modalidade de emissão de cheques sem suficiente provisão de fundo prevista no art 171 2º VI CP Se no curso da ação penal restar devidamente comprovado ressarcimento integral do dano à vítima antes do recebimento da peça de acusação tal fato pode servir como causa de diminuição de pena nos termos do disposto no art 16 do Estatuto Repressivo14 Confundese com o argumento de se tratar de política criminal um crime de natureza pública e indisponível com questões civilistas de cunho privado 8 9 10 11 12 13 14 conferindo ao Direito Penal função de cobrança que não lhe pertence Confirase a propósito o trabalho de GARCIA Waléria Garcelan Loma Arrependimento posterior Belo Horizonte Del Rey 1997 p 81 e ss REsp 1561276BA rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 28062016 noticiado no Informativo 590 Em igual sentido REsp 1242294PR rel originário Min Sebastião Reis Júnior rel para acórdão Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 18112014 noticiado no Informativo 554 HC 98658PR rel orig Min Cármen Lúcia rel p o acórdão Min Marco Aurélio 1ª Turma j 09112010 noticiado no Informativo 608 STF HC 99803RJ rel Min Ellen Gracie 2ª Turma j 22062010 REsp 1187976SP rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 07112013 noticiado no Informativo 531 HC 98658PR rel Min Cármen Lúcia rel p acórdão Min Marco Aurélio 1ª Turma j 09112010 HC 280089SP rel Min Jorge Mussi 5ª Turma j 18022014 noticiado no Informativo 537 201 202 CONCEITO Crime impossível nos termos do art 17 do Código Penal é o que se verifica quando por ineficácia absoluta do meio ou por absoluta impropriedade do objeto jamais ocorrerá a consumação NATUREZA JURÍDICA O crime impossível guarda afinidade com o instituto da tentativa Em ambos o agente inicia em seu plano interno a execução da conduta criminosa que não alcança a consumação As diferenças entretanto são nítidas Na tentativa é possível atingir a consumação pois os meios empregados pelo agente são idôneos e o objeto material contra o qual se dirige a conduta é um bem jurídico suscetível de sofrer lesão ou perigo de lesão Há portanto exposição do bem a dano ou perigo No crime impossível também conhecido como crime oco o emprego de meios ineficazes ou o ataque a objetos impróprios inviabilizam a produção do resultado inexistindo situação de perigo ao bem jurídico penalmente tutelado Em suma na tentativa é em tese possível a consumação a qual somente não ocorre por circunstâncias alheias à vontade do agente enquanto no crime impossível a consumação nunca pode ocorrer seja em razão da ineficácia absoluta do meio seja por força da impropriedade absoluta do objeto Nada obstante a redação do art 17 do Código Penal causa confusão acerca da natureza jurídica do crime impossível 203 Com efeito consta do dispositivo que não se pune a tentativa transmitindo a impressão equivocada de tratarse de causa de isenção de pena no crime tentado Na verdade o crime impossível é causa de exclusão da tipicidade eis que o fato praticado pelo agente não se enquadra em nenhum tipo penal Entretanto em razão da aparente similaridade entre os institutos a doutrina convencionou também chamálo de tentativa inadequada tentativa inidônea1 tentativa impossível tentativa irreal ou tentativa supersticiosa No regime da Parte Geral do Código Penal de 1940 antes da reforma pela Lei 72091984 falavase em quase crime pois os arts 76 parágrafo único e 94 III impunham ao autor do crime impossível a medida de segurança de liberdade vigiada No atual sistema convém não mais usar essa expressão como sinônima de crime impossível embora parcela doutrinária ainda o faça TEORIAS SOBRE O CRIME IMPOSSÍVEL 1 Teoria objetiva Apregoa que a responsabilização de alguém pela prática de determinada conduta depende de elementos objetivos e subjetivos dolo e culpa Elemento objetivo é no mínimo o perigo de lesão para bens jurídicos penalmente tutelados E quando a conduta não tem potencialidade para lesar o bem jurídico seja em razão do meio empregado pelo agente seja pelas condições do objeto material não se configura a tentativa É o que se chama de inidoneidade que conforme o seu grau pode ser de natureza absoluta ou relativa Inidoneidade absoluta é aquela em que o crime jamais poderia chegar à consumação relativa por seu turno aquela em que a conduta poderia ter consumado o delito o que somente não ocorreu em razão de circunstâncias estranhas à vontade do agente Essa teoria se subdivide em outras duas objetiva pura e objetiva temperada 11 Teoria objetiva pura Para essa vertente o Direito Penal somente pode proibir condutas lesivas a bens jurídicos devendo apenas se preocupar com os resultados produzidos no mundo fenomênico Portanto quando a conduta é incapaz por qualquer razão de provocar a lesão o fato há de permanecer impune Essa impunidade ocorrerá independentemente do grau da inidoneidade da ação pois nenhum bem jurídico foi lesado ou exposto a perigo de lesão Assim seja a inidoneidade do meio ou do objeto absoluta ou relativa em nenhum caso estará caracterizada a tentativa 12 Teoria objetiva temperada ou intermediária Para a configuração do crime impossível e por corolário para o afastamento da tentativa os meios empregados e o objeto do crime devem ser absolutamente inidôneos a produzir o resultado idealizado pelo agente Se a inidoneidade for relativa haverá tentativa Foi a teoria consagrada pelo art 17 do Código Penal 2 Teoria subjetiva Leva em conta a intenção do agente manifestada por sua conduta pouco importando se os meios por ele empregados ou o objeto do crime eram ou não idôneos para a produção do resultado Assim seja a inidoneidade absoluta ou relativa em qualquer hipótese haverá tentativa pois o que vale é a vontade do agente seu aspecto psíquico 3 Teoria sintomática Preocupase com a periculosidade do autor e não com o fato praticado A tentativa e o crime impossível são manifestações exteriores de uma personalidade temerária do agente incapaz de obedecer às regras jurídicas a todos impostas Destarte justificase em qualquer caso a aplicação de medida de segurança 204 ESPÉCIES DE CRIME IMPOSSÍVEL A leitura do art 17 do Código Penal revela a existência de duas espécies de crime impossível por ineficácia absoluta do meio e por impropriedade absoluta do objeto 1 Crime impossível por ineficácia absoluta do meio A palavra meio se refere ao meio de execução do crime Dáse a ineficácia absoluta quando o meio de execução utilizado pelo agente é por sua natureza ou essência incapaz de produzir o resultado por mais reiterado que seja seu emprego É o caso daquele que decide matar seu desafeto com uma arma de brinquedo ou então com munição de festim A inidoneidade do meio deve ser analisada no caso concreto e jamais em abstrato O emprego de açúcar no lugar de veneno para matar alguém pode constituirse em meio absolutamente ineficaz em relação à ampla maioria das pessoas É capaz todavia de eliminar a vida de um diabético ainda quando ministrado em pequena dose Se a ineficácia for relativa estará caracterizada a tentativa Exemplo A desejando matar seu desafeto nele efetua disparos de arma de fogo O resultado naturalístico morte somente não se produz porque a vítima trajava um colete de proteção eficaz 2 Crime impossível por impropriedade absoluta do objeto Objeto para o Código Penal é o objeto material compreendido como a pessoa ou a coisa sobre a qual recai a conduta do agente O objeto material é absolutamente impróprio quando inexistente antes do início da prática da conduta ou ainda quando nas circunstâncias em que se encontra torna impossível a sua consumação como nas situações em que se 205 tenta matar pessoa já falecida ou se procura abortar o feto de mulher que não está grávida A mera existência do objeto material é suficiente por si só para configurar a tentativa O conatus estará ainda presente no caso de impropriedade relativa do objeto Exemplo o larápio mediante destreza coloca a mão no bolso direito da calça da vítima com o propósito de furtar o aparelho de telefonia celular Não obtém êxito uma vez que o bem estava no bolso esquerdo Em caso de roubo assim já entendeu o Superior Tribunal de Justiça O Código Penal adotou em seu art 17 a teoria objetivatemperada para fins de reconhecimento do crime impossível Necessário para fins de reconhecimento da impropriedade absoluta do objeto que o bem jurídico não exista ou pelas circunstâncias do caso seja impossível ser atingido A existência de qualquer bem com a vítima impede o reconhecimento da impropriedade absoluta do objeto Nos termos da jurisprudência desta Corte ainda que não exista nenhum bem com a vítima o crime de roubo por ser delito complexo tem iniciada sua execução quando o agente visando a subtração de coisa alheia móvel realiza o núcleo da conduta meio constrangimento ilegallesão corporal ou vias de fato ainda que não consiga atingir o crime fim subtração da coisa almejada2 MOMENTO ADEQUADO PARA AFERIÇÃO DA INIDONEIDADE ABSOLUTA A ineficácia absoluta do meio e a impropriedade absoluta do objeto devem ser analisadas depois da prática da conduta com a qual se deseja consumar o crime Uma vez realizada a conduta e só então deve ser diferenciada a situação em que tal conduta caracteriza tentativa punível ou crime impossível A regra não pode ser estabelecida em abstrato previamente e sim no caso concreto após a realização da conduta Nas palavras de Marcelo Semer Devese privilegiar a aferição ex post desde que se pretenda a incorporação na aferição da idoneidade dos meios ou do objeto das 206 circunstâncias que concretamente atuaram no desenrolar dos fatos o que aliás é mais consentâneo com a própria noção de tipicidade Bem ainda analisarse a idoneidade dos meios ou objeto de acordo com o plano concreto do agente vale dizer em relação ao propósito a que se lançara na empreitada delituosa3 Se o agente está em um supermercado repleto de instrumentos eletrônicos de filmagem com diversos seguranças monitorando seus passos e depois de colocar suas compras em um carrinho esconde uma garrafa de vinho sob suas vestes para passar pelo caixa sem pagar por ela podese desde já falarse em crime impossível É evidente que não De fato é possível que ele consiga fugir dos seguranças ou entregar o bem disfarçadamente para outra pessoa leválo embora ou então se valer de qualquer outro meio capaz de consumar o furto Só depois do momento em que o agente estiver efetivamente preso portanto seria autorizado discutir a caracterização ou não do crime impossível Como estabelece a Súmula 567 do Superior Tribunal de Justiça Sistema de vigilância realizado por monitoramento eletrônico ou por existência de segurança no interior de estabelecimento comercial por si só não torna impossível a configuração do crime de furto É também o entendimento do Supremo Tribunal Federal A existência de sistema de vigilância em estabelecimento comercial não constitui óbice para a tipificação do crime de furto4 ASPECTOS PROCESSUAIS INERENTES AO CRIME IMPOSSÍVEL A comprovação do crime impossível acarreta na ausência de tipicidade do fato Em verdade não há crime Consequentemente o Ministério Público deve requerer o arquivamento do inquérito policial Se não o fizer oferecendo denúncia deve esta ser rejeitada com fulcro no art 395 III do Código de Processo Penal com a redação alterada pela Lei 117192008 pois o fato evidentemente não constitui crime faltando condição para o exercício da ação penal Se a denúncia for recebida com a instauração do processo penal o juiz 207 2071 2072 deve ao final absolver o réu nos termos do art 386 III do Código de Processo Penal pelo motivo de o fato não constituir infração penal Em se tratando de crime da competência do Tribunal do Júri ao final da primeira fase judicium accusationis deverá o acusado ser absolvido sumariamente em conformidade com o art 415 inciso III do Código de Processo Penal com a redação alterada pela Lei 116892008 em face de o fato não constituir infração penal O habeas corpus não é instrumento adequado para trancamento de ação penal que tenha como objeto um crime impossível pois nessa ação constitucional não é cabível a produção de provas para demonstrar a ineficácia absoluta do meio ou a impropriedade absoluta do objeto Excetuase essa regra em hipóteses teratológicas Exemplo denúncia de homicídio pelo fato de alguém ter matado um macaco CRIME PUTATIVO E CRIME IMPOSSÍVEL Conceito de crime putativo Putativo deriva do latim putativus isto é imaginário Tratase de algo que aparenta ser real mas que na verdade não existe Crime putativo também chamado de imaginário ou erroneamente suposto é o que existe apenas na mente do agente que acredita violar a lei penal quando na verdade o fato por ele concretizado não possui adequação típica ou seja não encontra correspondência em um tipo penal Espécies de crime putativo São três as espécies de crime putativo 1 por erro de tipo 2 por erro de proibição delito de alucinação ou crime de loucura e 3 por obra do agente provocador 1 Crime putativo por erro de tipo É o crime imaginário que se verifica quando o autor acredita ofender uma lei penal incriminadora efetivamente existente mas à sua conduta faltam elementos da definição típica Exemplo A acredita praticar tráfico de drogas art 33 caput da Lei 113432006 ao vender um pó branco que reputa ser cocaína mas na verdade é farinha 2 Crime putativo por erro de proibição delito de alucinação ou crime de loucura A equivocada crença do agente recai sobre a ilicitude do fato pois supõe violar uma lei penal que não existe Exemplo B cidadão comum perde o controle de seu automóvel vindo a se chocar com outro veículo automotor que estava estacionado em via pública Foge em seguida com receio de ser preso em flagrante pela prática de dano culposo não tipificado como infração penal pela legislação comum5 3 Crime putativo por obra do agente provocador Também denominado de crime de ensaio crime de experiência ou flagrante provocado verificase quando alguém insidiosamente induz outra pessoa a cometer uma conduta criminosa e simultaneamente adota medidas para impedir a consumação A consumação deve ser absolutamente impossível sob pena de configuração da tentativa Compõese pois de dois atos um de indução pois o agente é provocado por outrem a cometer o delito e outro de impedimento eis que a pretensa vítima adota providências aptas a obstar a consumação Como exemplo podemos ilustrar com a situação da patroa que desconfiada de furtos supostamente praticados por sua empregada doméstica simula sua saída de casa e o esquecimento de cédulas de dinheiro sobre um móvel atraindo a suspeita a subtraílos Ao mesmo tempo instala uma câmera de filmagem no local e solicita a presença de policiais militares para acompanharem a atuação da serviçal Quando ela se apodera do dinheiro e o coloca em sua bolsa os milicianos prontamente ingressam na residência e efetuam a prisão em flagrante Na clássica lição de Nélson Hungria Somente na aparência é que ocorre um crime exteriormente perfeito Na realidade o seu autor é apenas o protagonista inconsciente de uma comédia O elemento subjetivo do crime existe é certo em violação toda a sua plenitude mas sob o aspecto objetivo não há violação da lei penal senão uma inciente cooperação para a ardilosa averiguação da autoria dos crimes anteriores ou uma simulação embora ignorada do agente da exterioridade de um crime O desprevenido sujeito ativo opera dentro de uma pura ilusão pois ab initio a vigilância da autoridade policial ou do suposto paciente torna impraticável a real consumação do crime Um crime que além de astuciosamente sugerido e ensejado ao agente tem suas consequências frustradas por medidas tomadas de antemão não passa de um crime imaginário Não há lesão nem efetiva exposição a perigo de qualquer interesse público ou privado6 grifamos Caracterizado o crime putativo por obra do agente provocador o fato resta impune pois o seu autor por nada responde nem mesmo pela tentativa Aplicase analogicamente a regra prevista no art 17 do Código Penal pois a situação em muito se assemelha ao crime impossível Sobre o assunto o Supremo Tribunal Federal editou a Súmula 145 Não há crime quando a preparação do flagrante pela polícia torna impossível a sua consumação Deve ser feita a distinção todavia entre essa modalidade de crime putativo também conhecido como flagrante preparado e o flagrante esperado No flagrante preparado a iniciativa do delito é do agente provocador A vontade do provocado é viciada o que contamina de nulidade toda a conduta Nesta situação sequer existe tentativa No flagrante esperado por sua vez a deflagração do processo executório do crime é responsabilidade do agente razão pela qual é lícito É válido quando a polícia informada sobre a possibilidade de ocorrer um delito dirigese ao local aguardando a sua execução Iniciada esta a pronta intervenção dos agentes policiais prendendo o autor configura o flagrante7 É regular por exemplo a atuação da polícia que resulta na prisão de pessoas além da apreensão de drogas e armas depois de aguardar o pouso de uma aeronave utilizada para a prática de crimes objeto de prévia denúncia 2073 anônima Em relação ao tráfico de drogas já decidiu o Superior Tribunal de Justiça O flagrante preparado apresentase quando existe a figura do provocador da ação dita por criminosa que se realiza a partir da indução do fato e não quando já estando o sujeito compreendido na descrição típica a conduta se desenvolve para o fim de efetuar o flagrante Na espécie inexiste patente violação da lei pois o crime de tráfico de drogas estava consumado desde a realização dos verbos nucleares ter em depósito guardar ou transportar entorpecentes condutas que não foram estimuladas pelos policiais sendo despicienda eventual indução da mercancia pelos agentes8 No tocante aos crimes em geral o Supremo Tribunal Federal assim se pronunciou Não configura situação de flagrante preparado o contexto em que a Polícia tendo conhecimento prévio do fato delituoso vem a surpreender em sua prática o agente que espontaneamente iniciara o processo de execução do iter criminis A ausência por parte dos organismos policiais de qualquer medida que traduza direta ou indiretamente induzimento ou instigação à prática criminosa executada pelo agente descaracteriza a alegação de flagrante preparado não obstante sobrevenha a intervenção ulterior da Polícia lícita e necessária destinada a impedir a consumação do delito9 Diferença entre crime impossível e crime putativo Diante do que foi abordado fica clara a distinção entre as figuras do crime impossível e do crime putativo Crime impossível é a situação em que o autor com a intenção de cometer o delito não consegue fazêlo por ter se utilizado de meio de execução absolutamente ineficaz impotente para lesar o bem jurídico ou então em decorrência de ter direcionado a sua conduta a objeto material absolutamente impróprio inexistente antes do início da execução ou no caso concreto inadequado à consumação Portanto o erro do agente recai sobre a idoneidade do meio ou do objeto material De seu turno crime putativo é aquele em que o agente embora acredite praticar um fato típico realiza um indiferente penal seja pelo fato de a conduta não encontrar previsão legal crime putativo por erro de proibição seja pela ausência de um ou mais elementos da figura típica crime putativo por erro de tipo ou ainda por ter sido induzido à prática do crime ao mesmo tempo em que foram adotadas providências eficazes para impedir sua consumação crime putativo por obra do agente provocador 1 2 3 4 5 6 7 8 9 SAUER GUILLERMO Derecho Penal Parte General Trad de Juan del Rosal Barcelona Bosch Casa Editorial 1956 p 173 REsp 1340747RJ rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 13052014 SEMER Marcelo Crime impossível e a proteção de bens jurídicos São Paulo Malheiros 2002 p 89 STF HC 111278MG rel orig Min Marco Aurélio red p o ac Min Luís Roberto Barroso 1ª Turma j 10042018 noticiado no Informativo 897 O dano culposo é crime perante o Código Penal Militar Decretolei 10011969 art 259 cc o art 266 HUNGRIA Nélson Comentários ao código penal Rio de Janeiro Forense 1949 v I p 279 BONFIM Edilson Mougenot Curso de processo penal São Paulo Saraiva 2006 p 374 HC 214235SP rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 15052014 HC 70076SP rel Min Celso de Mello 1 Turma j 30031993 Ilicitude é a contrariedade entre o fato típico praticado por alguém e o ordenamento jurídico capaz de lesionar ou expor a perigo de lesão bens jurídicos penalmente tutelados O juízo de ilicitude é posterior e dependente do juízo de tipicidade de forma que todo fato penalmente ilícito também é necessariamente típico Ilicitude formal é a mera contradição entre o fato praticado pelo agente e o sistema jurídico em vigor É a característica da conduta que se coloca em oposição ao Direito Ilicitude material ou substancial é o conteúdo material do injusto a substância da ilicitude que reside no caráter antissocial do comportamento na sua contradição com os fins colimados pelo Direito na ofensa aos valores necessários à ordem e à paz no desenvolvimento da vida social1 Em sede doutrinária prevalece o entendimento de que a ilicitude é formal pois consiste no exame da presença ou ausência das suas causas de exclusão Nesses termos o aspecto material se reserva ao terreno da tipicidade Cumpre ressaltar porém que somente a concepção material autoriza a criação de causas supralegais de exclusão da ilicitude De fato em tais casos há relação de contrariedade entre o fato típico e o ordenamento jurídico sem contudo revelar o caráter antissocial da conduta Com o escopo de encerrar a discussão acerca do caráter formal ou material da ilicitude surgiu uma concepção unitária inicialmente na Alemanha que depois se irradiou para fora dela apregoando ser a ilicitude uma só Nesse diapasão um comportamento humano que se coloca em relação de antagonismo com o sistema jurídico não pode deixar de ofender ou expor a perigo de lesão bens jurídicos protegidos por esse mesmo sistema jurídico Na lição de Francisco de Assis Toledo Pensarse em uma antijuridicidade puramente formal desobediência à norma e em outra material lesão ao bem jurídico tutelado por essa mesma norma só teria sentido se a primeira subsistisse sem a segunda Correta pois a afirmação de BETTIOL de que a contraposição dos conceitos em exame antijuridicidade formal e material não tem razão de ser mantida viva porque só é antijurídico aquele fato que possa ser considerado lesivo a um bem jurídico Fora disso a antijuridicidade não existe2 Em geral utilizamse como sinônimos os termos ilicitude e antijuridicidade Isso é correto Parecenos que não com o devido respeito aos entendimentos em contrário Com efeito no universo da teoria geral do direito a infração penal crime e contravenção penal constituise em um fato jurídico já que a sua ocorrência provoca efeitos no campo jurídico Logo é incoerente imaginar que um crime fato jurídico seja revestido de antijuridicidade A contradição é óbvia um fato jurídico seria ao mesmo tempo antijurídico Por tal razão mais acertado falarse em ilícito e em ilicitude em vez de antijurídico e antijuridicidade Foi a opção preferida pelo legislador pátrio O Código Penal no art 23 valeuse da rubrica marginal exclusão de ilicitude e em momento algum se referiu à antijuridicidade Nada obstante muitos autores ainda utilizam ambos os termos como sinônimos O gráfico a seguir bem ilustra a distinção O ilícito é a oposição entre um fato típico e o ordenamento jurídico A relação é lógica e de mera constatação não comportando graus Logo um crime de injúria revestese de ilicitude tal como um delito de extorsão mediante sequestro com resultado morte Ambos são ilícitos sem qualquer distinção De seu turno injusto é o antagonismo entre o fato típico e a compreensão social acerca da justiça Por corolário um fato típico pode ser ilícito mas considerado justo e quiçá admitido pela sociedade como se dá na receptação relativa à aquisição de discos musicais derivados de pirataria com violação de direitos autorais CP art 184 Se não bastasse o injusto se reveste de graus vinculados à intensidade de reprovação social causada pelo comportamento penalmente ilícito É comum a confusão entre tais vocábulos muitas vezes considerados sinônimos Confirase entretanto a lúcida explicação de Luiz Regis Prado amparado em Hans Welzel Quadra aqui distinguir entre as noções de ilicitude e injusto a primeira é uma relação de oposição da conduta do autor com a norma jurídica É um predicado uma qualidade um estímulo de determinadas formas de açãoomissão O injusto por sua vez é a própria ação valorada como ilícita Tem cunho substantivo quer dizer algo substancial O conceito de injusto engloba a ação típica e ilícita Tão somente o injusto é mensurável em qualidade e quantidade ex homicídio e lesão corporal O injusto penal é específico como o injusto civil ao passo que a ilicitude é unitária diz respeito ao ordenamento jurídico como um todo3 Ilicitude genérica é a que se posiciona externamente ao tipo penal incriminador O fato típico se encontra em contradição com o ordenamento jurídico No homicídio por exemplo é típica a conduta de matar alguém não autorizada pelo Direito salvo se presente uma causa de justificação A ilicitude se situa fora do tipo penal De fato em um sistema finalista o dolo é natural isto é para sua caracterização bastam consciência e vontade independentemente do caráter ilícito do fato Na ilicitude específica por sua vez o tipo penal aloja em seu interior elementos atinentes ao caráter ilícito do comportamento do agente É o que se dá exemplificativamente nos crimes de violação de correspondência CP art 151 indevidamente divulgação de segredo e violação do segredo profissional CP arts 153 e 154 sem justa causa e exercício arbitrário das próprias razões CP art 345 salvo quando a lei o permite Em tais hipóteses unemse em um mesmo juízo a tipicidade e a ilicitude pois esta última situase no corpo do tipo penal funcionando como elemento normativo do tipo cujo significado pode ser obtido por um procedimento de valoração do intérprete da lei penal Consequentemente as causas de exclusão da ilicitude afastam a tipicidade Em sentido contrário Cezar Roberto Bitencourt emprega as expressões antijuridicidade genérica e antijuridicidade específica para distinguir a ilicitude penal da ilicitude extrapenal4 Essa classificação diz respeito ao caráter da ilicitude Para a ilicitude subjetiva a proibição ou o mandamento da lei penal dirigese apenas às pessoas imputáveis eis que somente elas têm capacidade mental para compreender as vedações e as ordens emitidas pelo legislador Essa teoria peca ao confundir ilicitude e culpabilidade basta a prática de um fato típico e ilícito para a configuração de uma infração penal reservandose à culpabilidade o juízo de reprovabilidade para a imposição de uma pena Para a ilicitude objetiva é suficiente a contrariedade entre o fato típico praticado pelo autor da conduta e o ordenamento jurídico apto a causar dano ou expor a perigo bens jurídicos penalmente protegidos As notas pessoais do agente especialmente sua imputabilidade ou não em nada afetam a ilicitude a qual se mantém independentemente da culpabilidade analisada em momento posterior Em nosso sistema penal a ilicitude é claramente objetiva os inimputáveis qualquer que seja a causa da ausência de culpabilidade praticam condutas ilícitas Exemplo um deficiente mental que mata outra pessoa realiza um comportamento ilícito contrário ao Direito muito embora não possa ser a ele imposta uma pena em face de sua inculpabilidade Essa divisão se relaciona intimamente com o caráter fragmentário do Direito Penal pelo qual todo ilícito penal também é um ato ilícito perante os demais ramos do Direito mas nem todo ato ilícito também guarda esta natureza no campo penal Exemplificativamente a sonegação fiscal calcada em fraude para exclusão do tributo é crime definido pela Lei 81371990 e também ato ilícito perante o Direito Tributário Contudo o mero inadimplemento de um tributo não admitido perante o direito fiscal é um fato atípico perante o Direito Penal Vejamos a explicação de Francisco de Assis Toledo ao diferenciar a ilicitude penal da ilicitude extrapenal Poderíamos representar graficamente essa distinção através de dois círculos concêntricos o menor o do injusto penal mais concentrado de exigências o maior o do injusto extrapenal civil administrativo etc com exigências mais reduzidas para sua configuração O fato ilícito situado dentro do círculo menor não pode deixar de estar situado também dentro do maior por localizarse em uma área comum a ambos os círculos que possuem o mesmo centro Já o mesmo não ocorre com os fatos ilícitos situados fora de tipificação penal o círculo menor mas dentro do círculo maior na sua faixa periférica e exclusiva Assim um ilícito civil ou administrativo pode não ser um ilícito penal mas a recíproca não é verdadeira5 Em face do acolhimento da teoria da tipicidade como indício da ilicitude uma vez praticado o fato típico isto é o comportamento humano previsto em lei como crime ou contravenção penal presumese o seu caráter ilícito A tipicidade não constitui a ilicitude apenas a revela indiciariamente6 Essa presunção é relativa iuris tantum pois um fato típico pode ser lícito desde que o seu autor demonstre ter agido acobertado por uma causa de exclusão da ilicitude Presente uma excludente da ilicitude estará excluída a infração penal Crime e contravenção penal deixam de existir pois o fato típico não é contrário ao Direito Ao contrário a ele se amolda Várias são as denominações empregadas pela doutrina para se referir às causas de exclusão da ilicitude destacandose causas de justificação justificativas descriminantes tipos penais permissivos e eximentes Cuidado a palavra dirimente nada tem a ver com a área da ilicitude Em verdade significa causa de exclusão da culpabilidade Para a identificação de uma causa de exclusão da ilicitude o art 23 do Código Penal utiliza a expressão não há crime enquanto para se reportar a uma causa de exclusão da culpabilidade o legislador se vale de expressões como não é punível é isento de pena e outras semelhantes7 Essa regra é tranquila na Parte Geral alterada pela Lei 72091994 Todavia há na Parte Especial situações em que se utiliza a expressão isento de pena ou análoga para fazer menção à exclusão do crime É o que se verifica exemplificativamente nos arts 128 e 142 do Código Penal O Código Penal possui em sua íntegra causas genéricas e específicas de exclusão da ilicitude Causas genéricas ou gerais são as previstas na Parte Geral do Código Penal Aplicamse a qualquer espécie de infração penal e encontramse no art 23 e seus incisos estado de necessidade legítima defesa estrito cumprimento do dever legal e exercício regular do direito Causas específicas ou especiais podem ser definidas como as previstas na Parte Especial do Código Penal e na legislação especial com aplicação unicamente a determinados crimes ou seja somente àqueles delitos a que expressamente se referem a exemplo dos arts 128 aborto 142 injúria e difamação8 146 3º I e II constrangimento ilegal 150 3º I e II violação de domicílio e 156 2º furto de coisa comum todos do Estatuto Repressivo Há também excludentes da ilicitude contidas fora do Código Penal tais como a b c art 10 da Lei 65381978 exercício regular de direito consistente na possibilidade de o serviço postal abrir carta com conteúdo suspeito art 1210 1º do Código Civil legítima defesa do domínio pois o proprietário pode retomar o imóvel esbulhado logo em seguida à invasão e art 37 I da Lei 96051998 estado de necessidade mediante o abatimento de um animal protegido por lei para saciar a fome do agente ou de sua família Essa relação legal contudo não impede a formulação de causas supralegais de exclusão da ilicitude adiante analisadas Discutese em doutrina se o reconhecimento de uma causa de exclusão da ilicitude depende somente dos requisitos legalmente previstos relacionados ao aspecto exterior do fato ou se está condicionado também a um requisito subjetivo atinente ao psiquismo interno do agente que deve ter consciência de que atua sob a proteção da justificativa Pensemos na seguinte situação hipotética A efetua disparos de arma de fogo contra B seu desafeto com o propósito de eliminar sua vida por vingança Descobrese posteriormente que naquele exato instante B iria acionar uma bomba e lançála em direção à casa de C para matálo Vejamos agora cada uma das propostas doutrinárias com a respectiva solução para o caso apresentado A concepção objetiva mais antiga alega não exigir o direito positivo a presença do requisito subjetivo A esse entendimento aderiram dentre outros José Frederico Marques e E Magalhães Noronha Na explanação de Enrique Cury Urzúa À lei só interessa que a finalidade atual do agente seja conforme à norma jurídica A formação da vontade com sua rica gama de afetos tendências sentimentos convicções etc permanece à margem da valoração O Direito aspira unicamente a que o agente se comporte conforme as suas prescrições não lhe interessa por que o faz Por isso para que atue uma causa de justificação basta que o agente tenha conhecido e querido a situação de fato em que esta consiste os motivos que acompanhavam a vontade de concreção adequada à norma permanecem irrelevantes9 Logo no caso acima narrado estaria configurada a legítima defesa de terceiro com a exclusão do crime de A Essa posição entretanto foi aos poucos perdendo espaço para uma concepção subjetiva pela qual o reconhecimento de uma causa de exclusão da ilicitude reclama o conhecimento da situação justificante pelo agente Filiamse a ela dentre outros Heleno Cláudio Fragoso Julio Fabbrini Mirabete Francisco de Assis Toledo e Damásio E de Jesus Um dos pioneiros a representar esse entendimento foi Aníbal Bruno que assim se manifestou sobre a legítima defesa Apesar do caráter objetivo da legítima defesa é necessário que exista em quem reage a vontade de defenderse O ato do agente deve ser um gesto de defesa uma reação contra ato agressivo de outrem e esse caráter de reação deve existir nos dois momentos da sua situação o subjetivo e o objetivo O gesto de quem defende precisa ser determinado pela consciência e vontade de defenderse10 Sob essa ótica no caso apresentado estaria excluída a legítima defesa de terceiro e A responderia pelo homicídio praticado contra B Se restar suficientemente comprovada a presença de uma causa de exclusão da ilicitude estará ausente uma condição da ação penal e o Ministério Público deverá requerer o arquivamento dos autos do inquérito policial Se não o fizer no tocante aos crimes diversos dos dolosos contra a vida o magistrado poderá rejeitar a denúncia com fundamento no art 395 II do Código de Processo Penal O fato narrado evidentemente não constitui infração penal e por consequência falta uma condição para o exercício da ação penal Na hipótese de a denúncia ter sido recebida o juiz poderá após a apresentação da resposta escrita absolver sumariamente o acusado em face da existência manifesta da causa de exclusão da ilicitude do fato nos moldes do art 397 I do Código de Processo Penal Mas assim não agindo restará por ocasião da sentença absolvêlo com fulcro no art 386 VI do Código de Processo Penal Por outro lado nos crimes de competência do Tribunal do Júri dolosos contra a vida consumados ou tentados e os que sejam a ele conexos o magistrado não poderá pronunciar o réu Deverá em verdade absolvêlo sumariamente com fulcro no art 415 IV do Código de Processo Penal diante da existência de circunstância que exclui o crime A Lei 124032011 responsável pela alteração de diversos dispositivos do Código de Processo Penal no tocante à prisão provisória fiança liberdade provisória e demais medidas cautelares gerou reflexos no tocante às causas de exclusão da ilicitude A primeira questão a ser analisada diz respeito ao art 310 parágrafo único do Código de Processo Penal cuja redação é a seguinte Art 310 Ao receber o auto de prisão em flagrante o juiz deverá fundamentadamente Parágrafo único Se o juiz verificar pelo auto de prisão em flagrante que o agente praticou o fato nas condições constantes dos incisos I a III do caput do art 23 do DecretoLei nº 2848 de 7 de dezembro de 1940 Código Penal poderá fundamentadamente conceder ao acusado liberdade provisória mediante termo de comparecimento a todos os atos processuais sob pena de revogação Em resumo o apontado dispositivo legal impõe ao juiz a obrigação de tão a b logo receba o auto de prisão em flagrante conceder liberdade provisória ao agente que praticou o fato típico em estado de necessidade legítima defesa estrito cumprimento do dever legal ou exercício regular do direito Este dispositivo há de ser interpretado com cautela Sua incidência limita se às situações em que o magistrado compulsando o auto de prisão em flagrante concluir pela fundada suspeita probabilidade da prática do fato típico sob o manto de alguma causa excludente da ilicitude Nesses casos como medida de cautela é prudente a concessão da liberdade provisória visando uma dupla finalidade a o agente responde em liberdade à ação penal e b abrese espaço para apuração a fundo durante a instrução criminal da presença ou não da eximente11 Com efeito se o juiz se deparar com um quadro fático de certeza acerca da prática do fato amparado por uma causa de exclusão da ilicitude exemplo A matou B porque este gratuitamente partiu em sua direção portando um machado para golpeálo em região vital deverá relaxar a prisão em flagrante em face da sua ilegalidade com fulcro no art 5º LXV da Constituição Federal e no art 310 I do Código de Processo Penal Sem dúvida alguma a ilegalidade da prisão em flagrante repousa na ausência de crime E se nada obstante a presença manifesta de uma causa excludente da ilicitude o Ministério Público ou querelante oferecer a inicial acusatória o juiz deverá rejeitar a denúncia ou queixa em razão da falta de justa causa para o exercício da ação penal a teor da regra inserida no art 395 III do Código de Processo Penal Entretanto se malgrado a presença inequívoca da causa excludente da ilicitude a denúncia ou queixa tenha sido recebida pelo Poder Judiciário surgem duas novas alternativas nos crimes em geral procedimento comum após a citação do acusado e apresentação da resposta escrita o juiz deverá absolvêlo sumariamente na forma do art 397 inc I do Código de Processo Penal e nos crimes de competência do Tribunal do Júri após a citação do acusado com a consequente apresentação de resposta escrita e o regular processamento da ação penal CPP arts 406 a 411 o juiz também deverá ao final da audiência de instrução debates e julgamento absolvêlo sumariamente nos termos do art 415 IV in fine do Código de Processo Penal em face da presença de causa de exclusão do crime Igual raciocínio deve ser empregado na interpretação do art 314 do Código de Processo Penal relacionado à prisão preventiva e assim redigido Art 314 A prisão preventiva em nenhum caso será decretada se o juiz verificar pelas provas constantes dos autos ter o agente praticado o fato nas condições previstas nos incisos I II e III do caput do art 23 do DecretoLei nº 2848 de 7 de dezembro de 1940 Código Penal De fato a prudência determina a manutenção em liberdade do agente sem decretação da prisão preventiva nas hipóteses de fundada suspeita da prática do fato em situação caracterizadora de qualquer das causas de exclusão da ilicitude Por outro lado se estiver cabalmente demonstrada a presença de alguma eximente não há falar em crime e muito menos na admissibilidade desta modalidade de prisão provisória O Brasil não seguiu a sistemática do Código Penal Português que dispõe em seu art 31 1 O facto não é criminalmente punível quando a sua ilicitude for excluída pela ordem jurídica considerada na sua totalidade Mas embora tenha se omitido prevalece na doutrina e na jurisprudência o entendimento de que as causas de exclusão da ilicitude não se limitam às hipóteses previstas em lei Abrangem tais situações é evidente mas se estendem também àquelas que necessariamente resultam do direito em vigor e de suas fontes Nas lições de Mezger Nenhuma lei esgota a totalidade do direito A teoria do caráter lógico cerrado do ordenamento jurídico legal é somente uma sedutora fábula Em realidade tal caráter cerrado não existe O mero positivismo legal deixa sem resposta inumeráveis questões da vida prática do direito12 Com efeito seria impossível exigir do legislador a regulamentação expressa e exaustiva de todas as causas de justificação seja porque algumas delas resultam de novas construções doutrinárias seja porque derivam de valores éticosociais cujas modificações constantes podem acarretar no desenho de novas causas ainda não previstas em lei mas que em determinada sociedade se revelam imprescindíveis à adequada e justa aplicação da lei penal E como essas eximentes não fundamentam nem agravam o poder punitivo estatal operando exatamente em sentido contrário a criação de causas supralegais não ofende o princípio da reserva legal inseparável do Direito Penal moderno Para quem admite essa possibilidade a causa supralegal de exclusão da ilicitude por todos aceita é o consentimento do ofendido13 Anotese porém ser vedado o reconhecimento de causas supralegais para os partidários do caráter formal da ilicitude se esta é compreendida como a mera contrariedade entre o fato praticado e o ordenamento jurídico posição legalista somente esse mesmo ordenamento jurídico pode taxativamente afastar a ilicitude legalmente configurada Nélson Hungria anota ter a Comissão Revisora do Projeto que se transformou no Código Penal de 1940 excluído do texto aprovado qualquer referência ao consentimento do ofendido como causa de exclusão da ilicitude por reputar um dispositivo deste naipe evidentemente supérfluo14 O consentimento do ofendido entendido como a anuência do titular do bem jurídico ao fato típico praticado por alguém é atualmente aceito como supralegal de exclusão da ilicitude Três teorias buscam fundamentar o consentimento do ofendido como causa supralegal de exclusão da ilicitude a b c Ausência de interesse não há interesse do Estado quando o próprio titular do bem jurídico de cunho disponível não tem vontade na aplicação do Direito Penal Essa teoria é criticada por não se poder outorgar o poder de decisão a uma pessoa que pode se equivocar acerca do seu real interesse Renúncia à proteção do Direito Penal em algumas situações excepcionais o sujeito passivo de uma infração penal pode renunciar em favor do sujeito ativo a proteção do Direito Penal Essa teoria entra em manifesto conflito com o caráter público desse ramo do ordenamento jurídico Ponderação de valores tratase da teoria mais aceita no direito comparado O consentimento funciona como causa de justificação quando o Direito concede prioridade ao valor da liberdade de atuação da vontade frente ao desvalor da conduta e do resultado causado pelo delito que atinge bem jurídico disponível O consentimento do ofendido como tipo penal permissivo tem aplicabilidade restrita aos delitos em que o único titular do bem ou interesse juridicamente protegido é a pessoa que aquiesce acordo ou consentimento e que pode livremente dele dispor De uma maneira geral estes delitos podem ser incluídos em quatro grupos diversos a delitos contra bens patrimoniais b delitos contra a integridade física c delitos contra a honra e d delitos contra a liberdade individual15 Nos crimes contra o patrimônio por óbvio somente se aceita a disponibilidade se não houver o emprego de violência à pessoa ou grave ameaça durante a execução do delito E nos crimes contra a integridade física nas hipóteses em que a lei condiciona a persecução penal à iniciativa do ofendido ou de quem o represente seja com o oferecimento de representação seja com o ajuizamento de queixacrime Em síntese é cabível unicamente em relação a bens jurídicos disponíveis Se indisponível o bem jurídico há interesse privativo do Estado e o particular dele não pode renunciar Para diferenciar um bem disponível de 1 2 3 a b c d outro indisponível Pierangeli apresenta três etapas há que se percorrer não só um ramo do Direito mas todos os princípios que formam a base do ordenamento jurídico estatal na realização desse trabalho o intérprete deve reportarse a todas as fontes imediatas e mediatas e a partir daí examinar os decretos atos administrativos regulamentos portarias e pesquisar o direito consuetudinário e o critério adotado pelo legislador para a fixação da natureza da ação penal é arbitrário e por consequência inseguro mas sempre servirá ao intérprete desde que não seja usado com exclusividade16 Ademais é correto afirmar que o consentimento do ofendido somente pode afastar a ilicitude nos delitos em que o titular do bem jurídico tutelado pela lei penal é uma pessoa física ou jurídica Não tem o condão de excluir o crime quando se protegem bens jurídicos metaindividuais ou então pertencentes à sociedade ou ao Estado Para ser eficaz o consentimento do ofendido há de preencher os seguintes requisitos17 deve ser expresso ou real pouco importando sua forma oral ou por escrito solene ou não Entretanto também tem sido admitido o consentimento presumido ou ficto nas hipóteses em que se possa com razoabilidade concluir que o agente atuou supondo que o titular do bem jurídico teria consentido se conhecesse as circunstâncias em que a conduta foi praticada não pode ter sido concedido em razão de coação ou ameaça nem de paga ou promessa de recompensa Em suma há de ser livre é necessário ser moral e respeitar os bons costumes deve ser manifestado previamente à consumação da infração penal A anuência posterior à consumação do crime não afasta a ilicitude e e o ofendido deve ser plenamente capaz para consentir ou seja deve ter completado 18 anos de idade e não padecer de nenhuma anomalia suficiente para retirar sua capacidade de entendimento e autodeterminação No campo dos crimes contra a dignidade sexual especificamente no tocante aos delitos previstos nos arts 217A 218 218A e 218B todos do Código Penal a situação de vulnerabilidade funciona como instrumento legal de proteção à liberdade sexual da pessoa menor de 14 quatorze anos de idade em face de sua incapacidade volitiva sendo irrelevante o consentimento do vulnerável para a formação do crime sexual Não produz efeitos o consentimento prestado pelo representante legal de um menor de idade ou incapaz Não há obstáculo à exclusão da ilicitude nos crimes culposos como decorrência do consentimento do ofendido Evidentemente assim como nos crimes dolosos o bem jurídico deve ser disponível Ademais o consentimento referese não ao resultado naturalístico por ser involuntário mas à conduta imprudente negligente ou imperita No crime de lesão corporal culposa na direção de veículo automotor Lei 95031997 art 303 por exemplo afastase a ilicitude quando a vítima aquiesce ao excesso de velocidade do motorista daí resultando um acidente e a produção dos ferimentos A doutrina alemã aceita paralelamente ao consentimento expresso o consentimento presumido nos casos urgentes em que o ofendido ou seu representante legal não possam prestar a anuência mas poderia se esperar que se possível agiriam dessa forma Apontamse os exemplos do aborto necessário para salvar a vida da gestante bem como a amputação de um membro de um ferido de guerra desacordado para preservar partes relevantes de seu corpo e até mesmo livrá a lo da morte O Código Penal português em seu art 39º também disciplina expressamente o consentimento presumido 1 Ao consentimento efectivo é equiparado o consentimento presumido 2 Há consentimento presumido quando a situação em que o agente actua permitir razoavelmente supor que o titular do interesse juridicamente protegido teria eficazmente consentido no facto se conhecesse as circunstâncias em que este é praticado Essa posição favorável ao consentimento presumido tem sido adotada no Brasil Na hipótese de bem jurídico disponível é possível que o consentimento do ofendido afaste a tipicidade da conduta relativamente aos tipos penais em que se revela como requisito expresso ou tácito que o comportamento humano se realize contra ou sem a vontade do sujeito passivo É o que ocorre nos crimes de sequestro ou cárcere privado CP art 148 violação de domicílio CP art 150 e estupro CP art 213 entre outros É a modalidade de causa de exclusão da ilicitude em que o conteúdo depende de complementação a ser encontrada em outra lei em um ato administrativo ou até mesmo no enunciado de Súmula Vinculante Vejamos dois exemplos Um cidadão comum ao presenciar a prática de um roubo efetua a prisão em flagrante do ladrão imobilizandoo até a chegada da Polícia Militar Sua conduta é lícita em face da regra contida no art 301 do Código de Processo Penal Qualquer do povo poderá e as autoridades policiais e seus agentes deverão prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito Não há como se imputar a ele b o crime de constrangimento ilegal pois sua atuação encontrase acobertada pelo exercício regular de direito expressamente assegurado pelo art 301 do Código de Processo Penal e Um policial civil dirigese à casa de condenado pela Justiça para efetuar o cumprimento de mandado de prisão Lá chegando é recebido a socos e pontapés razão pela qual decide algemar o agressor Nesse caso não se pode falar na configuração do crime de abuso de autoridade uma vez que o funcionário público encontrase no estrito cumprimento de dever legal e a Súmula Vinculante 11 claramente autoriza o uso de algemas em casos de resistência Em face do que foi dito as causas de exclusão da ilicitude podem ser representadas pelo gráfico a seguir 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 QUEIROZ FILHO Antonio Lições de direito penal São Paulo RT 1966 p 157 TOLEDO Francisco de Assis Ilicitude penal e causas de sua exclusão Rio de Janeiro Forense 1984 p 11 PRADO Luiz Regis Curso de direito penal brasileiro parte geral 2 ed São Paulo RT 2000 p 242 BITENCOURT Cezar Roberto Tratado de direito penal Parte geral 11 ed São Paulo Saraiva 2007 v 1 p 296 TOLEDO Francisco de Assis Ilicitude penal e causas de sua exclusão Rio de Janeiro Forense 1984 p 14 REALE JÚNIOR Miguel Antijuridicidade concreta São Paulo José Bushatsky 1974 p 36 Confirase a propósito o teor dos arts 21 caput 22 26 caput e 28 1 todos do Código Penal STF HC 104385SP rel orig Min Marco Aurélio red p o acórdão Min Ricardo Lewandowski 1ª Turma j 28062011 noticiado no Informativo 633 CURY URZÚA Enrique Derecho penal Parte general Santiago Juridica de Chile 1982 t I p 315316 BRUNO Aníbal Direito penal Parte geral 3 ed Rio de Janeiro Forense 1967 t I p 366367 Nos crimes de competência do Tribunal do Júri a dúvida acerca da presença ou não das causas excludentes da ilicitude deve ser submetida ao Conselho de Sentença juízo natural para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida em sintonia com o mandamento veiculado pelo art 5º XXXVIII d da Constituição Federal MEZGER Edmund Tratado de derecho penal Trad espanhola José Arturo Rodrigues Muñoz Madrid Revista de Derecho Privado 1955 t I p 405 BARROS Flávio Augusto Monteiro de Op cit p 310312 apresenta outras causas supralegais 1 Princípio da adequação social ação realizada dentro do âmbito da normalidade admitida pelas regras de cultura Essa posição é isolada pois tal princípio funciona como causa de 14 15 16 17 exclusão da tipicidade 2 Princípio do balanço dos bens exclusão da ilicitude quando o sacrifício de um bem tem por fim preservar outro mais valioso Assemelhase ao estado de necessidade mas dele se diferencia por não exigir principalmente a atualidade do perigo e 3 Princípio da insignificância ou da bagatela atualmente compreendido de forma unânime como excludente da tipicidade inclusive pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal HUNGRIA Nélson Comentários ao código penal Rio de Janeiro Forense 1949 v I p 433 PIERANGELI José Henrique O consentimento do ofendido na teoria do delito 3 ed São Paulo RT 2001 p 98 PIERANGELI José Henrique O consentimento do ofendido na teoria do delito 3 ed São Paulo RT 2001 p 121 A propósito dispõe o art 38º do Código Penal Português disciplinando o consentimento 1 Além dos casos especialmente previstos na lei o consentimento exclui a ilicitude do facto quando se referir a interesses jurídicos livremente disponíveis e o facto não ofender os bons costumes 2 O consentimento pode ser expresso por qualquer meio que traduza uma vontade séria livre e esclarecida do titular do interesse juridicamente protegido e pode ser livremente revogado até à execução do facto 3 O consentimento só é eficaz se for prestado por quem tiver mais de 14 anos e possuir o discernimento necessário para avaliar o seu sentido e alcance no momento em que o presta 4 Se o consentimento não for conhecido do agente este é punível com a pena aplicável à tentativa 221 222 223 DISPOSITIVO LEGAL Em consonância com o art 24 do Código Penal Art 24 Considerase em estado de necessidade quem pratica o fato para salvar de perigo atual que não provocou por sua vontade nem podia de outro modo evitar direito próprio ou alheio cujo sacrifício nas circunstâncias não era razoável exigirse 1º Não pode alegar estado de necessidade quem tinha o dever legal de enfrentar o perigo 2º Embora seja razoável exigirse o sacrifício do direito ameaçado a pena poderá ser reduzida de 1 um a 23 dois terços CONCEITO Estado de necessidade é a causa de exclusão da ilicitude que depende de uma situação de perigo caracterizada pelo conflito de interesses lícitos ou seja uma colisão entre bens jurídicos pertencentes a pessoas diversas que se soluciona com a autorização conferida pelo ordenamento jurídico para o sacrifício de um deles para a preservação do outro NATUREZA JURÍDICA O art 23 I do Código Penal deixa claro tratarse de causa de exclusão da ilicitude Com efeito não há crime quando o agente pratica o fato típico em estado de necessidade A doutrina diverge contudo acerca da essência do estado de necessidade direito ou faculdade 224 Para Nélson Hungria cuidase de faculdade Com o conflito entre bens ou interesses que merecem igualmente a proteção jurídica é concedida a faculdade da própria ação violenta para preservar qualquer deles São suas palavras Faculdade e não propriamente direito porque a este deve corresponder necessariamente uma obrigação jus et obligatio sunt correlata e no caso nenhum dos titulares dos bens ou interesses em colisão está obrigado a suportar o sacrifício do seu A lei aqui assume uma atitude de neutralidade e declara sem crime o vencedor seja este o mais forte ou o mais feliz1 De outro lado Aníbal Bruno entende tratarse de um direito a ser exercido não contra aquele que suporta o fato necessitado mas frente ao Estado que tem o dever de reconhecer a exclusão da ilicitude e por corolário o afastamento do crime Não se pode impor como dever jurídico uma atitude de renúncia que muitas vezes precisaria tornarse heroica Seria um direito alheio às realidades da vida o que tentasse ignorar tais fatos ou deixar de prevêlos com a solução humana e justa Esta solução é a que exclui da hipótese o caráter de ilícito2 Com o devido respeito a questão deve ser encarada por outro prisma frente ao qual a doutrina é pacífica O estado de necessidade constituise em faculdade entre os titulares dos bens jurídicos em colisão uma vez que um deles não está obrigado a suportar a ação alheia e simultaneamente em direito diante do Estado que deve reconhecer os efeitos descritos em lei Mais do que um mero direito portanto consiste em direito subjetivo do réu pois o juiz não tem discricionariedade para concedêlo Presentes os requisitos legais tem o magistrado a obrigação de decretar a exclusão da ilicitude TEORIAS Sobre a natureza jurídica do estado de necessidade existem as seguintes teorias 1 Teoria unitária o estado de necessidade é causa de exclusão de ilicitude desde que o bem jurídico sacrificado seja de igual valor ou de valor inferior ao bem jurídico preservado Exige apenas a razoabilidade na conduta do agente Foi a teoria adotada pelo Código Penal como se extrai da expressão prevista no art 24 caput cujo sacrifício nas circunstâncias não era razoável exigirse Além disso o 2º do art 24 foi peremptório ao estatuir Embora seja razoável exigirse o sacrifício do direito ameaçado a pena poderá ser reduzida de um a dois terços A análise conjunta dos dispositivos autoriza um raciocínio bastante simples se o bem em perigo é igual ou superior a outro sacrificase este e restará consagrada a licitude do fato Nesse caso há razoabilidade na conduta do agente o qual para preservar interesse próprio ou de terceiro pode sacrificar interesse alheio desde que igual ou menos valioso do que o preservado CP art 24 caput Não há crime Todavia se o interesse sacrificado for superior ao preservado sendo razoável exigirse o sacrifício do direito ameaçado CP art 24 2º subsiste o crime autorizandose a diminuição da pena de um a dois terços Em síntese essa teoria admite somente o estado de necessidade justificante excludente da ilicitude quando o bem jurídico sacrificado apresenta valor igual ou inferior ao bem jurídico preservado Se contudo o bem jurídico sacrificado revestese de valor superior ao bem jurídico preservado não se caracteriza o estado de necessidade há crime admitindo se a redução da pena de um a dois terços 2 Teoria diferenciadora derivada do direito penal alemão e alicerçada no princípio da ponderação de bens e deveres diferencia o estado de necessidade justificante excludente da ilicitude do estado de necessidade exculpante excludente da culpabilidade Para essa teoria há estado de necessidade justificante no sacrifício de bem jurídico de valor igual ou inferior ao do bem jurídico preservado Por sua vez configurase o estado de necessidade exculpante nas hipóteses em que o bem jurídico sacrificado for de valor superior ao do bem jurídico protegido 225 Não se caracteriza a excludente da ilicitude e sim uma causa de exclusão da culpabilidade em face da inexigibilidade de conduta diversa É o caso da mãe que perdeu seu único filho e tem como recordação somente uma fotografia com um incêndio acidental em sua residência e impedida de lá entrar por um bombeiro matao para resgatar sua preciosa lembrança Não há exclusão da ilicitude pois um objeto em hipótese alguma pode prevalecer sobre a vida humana No caso concreto entretanto o desespero da mãe lhe retirou a possibilidade de cotejar adequadamente os bens em conflito e em relação a ela era inexigível conduta diversa No Brasil essa teoria não foi acolhida pelo Código Penal mas encontra amparo no Decretolei 10011969 Código Penal Militar em seu art 39 o que não obsta ainda a previsão castrense do estado de necessidade como excludente da ilicitude art 43 Em outras palavras o Código Penal Militar admite tanto o estado de necessidade justificante excludente da ilicitude como também o estado de necessidade exculpante excludente da culpabilidade 3 Teoria da equidade originária de Immanuel Kant prega a manutenção da ilicitude e da culpabilidade A ação realizada em estado de necessidade não é juridicamente correta mas não pode ser castigada por questões de equidade calcadas na coação psicológica que move o sujeito3 4 Teoria da escola positiva alicerçada nos pensamentos de Ferri e Florián pugna também pela manutenção da ilicitude Todavia o ato extremamente necessário e sem móvel antissocial deve permanecer impune por ausência de perigo social e de temibilidade do agente4 REQUISITOS O art 24 caput e seu 1º do Código Penal elencam requisitos cumulativos para a configuração do estado de necessidade como causa legal de exclusão da ilicitude A análise dos dispositivos revela a existência de dois momentos distintos para a verificação da excludente 1 situação de necessidade a qual depende de a perigo atual b perigo não provocado voluntariamente pelo agente c 2251 22511 ameaça a direito próprio ou alheio e d ausência do dever legal de enfrentar o perigo e 2 fato necessitado é dizer fato típico praticado pelo agente em face do perigo ao bem jurídico que tem como requisitos a inevitabilidade do perigo por outro modo e b proporcionalidade Vejamos detalhadamente cada um deles Situação de necessidade Perigo atual Perigo é a exposição do bem jurídico a uma situação de probabilidade de dano Sua origem pode vir de um fato da natureza ex uma inundação subtraindo o agente um barco para sobreviver de seres irracionais ex ataque de um cão bravio ou mesmo de uma atividade humana ex motorista que dirige em excesso de velocidade e atropela um transeunte com o objetivo de chegar rapidamente a um hospital e socorrer um enfermo que se encontra no interior do veículo Deve ser efetivo ou real a sua existência deve ter sido comprovada no caso concreto O Código Penal exige seja o perigo atual deve estar ocorrendo no momento em que o fato é praticado Sua presença é imprescindível Em relação ao perigo iminente aquele prestes a se iniciar há controvérsia Prevalece o entendimento de que equivale ao perigo atual excluindo o crime Há posições porém no sentido de que o perigo iminente não autoriza o estado de necessidade pois se fosse esta a vontade da lei o teria incluído expressamente no art 24 caput do Código Penal tal como fez em seu art 25 relativamente à legítima defesa 22512 O perigo remoto ou futuro normalmente imaginário ou seja aquele que pode ocorrer em momento ulterior ao da prática do fato típico bem como o perigo pretérito ou passado que já se verificou e encontrase superado não caracterizam o estado de necessidade Perigo não provocado voluntariamente pelo agente Foi mencionado que a situação de perigo pode se originar de uma atividade humana lícita ou não O Código Penal contudo é claro ao negar o estado de necessidade àquele que voluntariamente provocou o perigo A discussão reside na extensão da palavra voluntariamente Qual é o seu alcance Abrange apenas o perigo provocado dolosamente Ou também engloba o perigo causado pelo agente a título de culpa O panorama é tranquilo sobre o perigo dolosamente provocado não é possível invocar a causa de justificação em apreço Em relação ao perigo culposamente criado pelo agente entretanto a doutrina revela divergências Aníbal Bruno Basileu Garcia Bento de Faria Damásio E de Jesus e Heleno Cláudio Fragoso aduzem ser a palavra vontade um sinal indicativo de dolo Logo aquele que culposamente provoca uma situação de perigo pode se valer do estado de necessidade para excluir a ilicitude do fato típico praticado Na Alemanha Claus Roxin informa ser unânime o entendimento no sentido de que a provocação culposa do perigo não afasta a possibilidade de invocar o estado de necessidade5 Por outro lado E Magalhães Noronha Francisco de Assis Toledo José Frederico Marques e Nélson Hungria sustentam que a atuação culposa também é voluntária em sua origem a imprudência a negligência e a imperícia derivam da vontade do autor da conduta Consequentemente não pode suscitar o estado de necessidade a pessoa que culposamente produziu a situação perigosa É também o entendimento de Guilherme de Souza Nucci A letra da lei fala em perigo não provocado por vontade do agente não nos parecendo tenha aí o significado de dolo ou seja causar um perigo intencionalmente O sujeito que provoca um incêndio culposo criou um perigo que jamais poderá deixar de ser considerado fruto da sua vontade o contrário seria admitir que nos delitos culposos não há voluntariedade na conduta6 Essa segunda posição nos parece a mais adequada Com efeito além de a culpa também ser voluntária em sua origem involuntário é somente o resultado naturalístico o Direito não pode ser piedoso com os incautos e imprudentes autorizando o sacrifício de bens jurídicos alheios em regra de terceiros inocentes para acobertar com o manto da impunidade fatos típicos praticados por quem deu causa a uma situação de perigo Se não bastasse o Código Penal deve ser interpretado sistematicamente E nesse ponto entra em cena o art 13 2º c Art 13 O resultado de que depende a existência do crime somente é imputável a quem lhe deu causa Considerase causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido 2º A omissão é penalmente relevante quando o omitente podia e devia agir para evitar o resultado O dever de agir incumbe a quem c com seu comportamento anterior criou o risco da ocorrência do resultado A conclusão é simples se quem cria a situação de perigo dolosa ou culposamente tem o dever jurídico de impedir o resultado igual raciocínio deve ser utilizado no tocante ao estado de necessidade é dizer quem cria o perigo dolosa ou culposamente não pode invocar a causa de justificação Seria incoerente por exemplo incriminar o nadador profissional que convida um amigo iniciante no esporte a atravessar a nado um rio e durante 22513 22514 o trajeto este vem a morrer e simultaneamente reconhecer o estado de necessidade com a automática exclusão do crime àquele que culposamente incendeia uma lancha e para se salvar afoga o seu companheiro para ficar com a única boia que se encontrava na embarcação Ameaça a direito próprio ou alheio O perigo deve ser direcionado a bem jurídico pertencente ao autor do fato típico ou ainda a terceira pessoa No Brasil qualquer bem jurídico próprio ou de terceiro pode ser protegido quando enfrentar um perigo capaz de configurar o estado de necessidade extraindose essa conclusão do art 24 caput do Código Penal direito próprio ou alheio Exigese todavia a legitimidade do bem que deve ser reconhecido e protegido pelo ordenamento jurídico Exemplificativamente o preso não pode matar o carcereiro sob o pretexto de exercício do seu direito à liberdade É o que se dá também no art 34 do Código Penal alemão Ao contrário o Código Penal italiano reconhece a excludente somente quando o bem em disputa for a vida humana ou o corpo humano Para a proteção de bem jurídico de terceiro a lei não reclama a existência de uma relação de parentesco ou intimidade pois a eximente se funda na solidariedade que deve reinar entre os indivíduos em geral Destarte é possível o estado de necessidade para a defesa de bens jurídicos pertencentes a pessoas desconhecidas e inclusive de pessoas jurídicas que também são titulares de direitos Ausência do dever legal de enfrentar o perigo Nos termos do art 24 1º do Código Penal Não pode alegar estado de necessidade quem tinha o dever legal de enfrentar o perigo O fundamento da norma é evitar que pessoas que têm o dever legal de enfrentar situações perigosas se esquivem de fazêlo injustificadamente Aquele que por mandamento legal tem o dever de se submeter a situações de perigo não está autorizado a sacrificar bem jurídico de terceiro ainda que para salvar outro bem jurídico devendo suportar os riscos inerentes à sua função Exemplificativamente não pode um bombeiro para salvar um morador de uma casa em chamas destruir a residência vizinha quando possível fazêlo de forma menos lesiva ainda que mais arriscada à sua pessoa Essa regra evidentemente deve ser interpretada com bom senso não se pode exigir do titular do dever legal de enfrentar o perigo friamente atitudes heroicas ou sacrifício de direitos básicos de sua condição humana Nesse sentido a lei não tem o condão por exemplo de obrigar um bombeiro a entrar no mar em pleno tsunami para salvar um surfista que lá se encontra Há celeuma doutrinária em relação ao significado da expressão dever legal de enfrentar o perigo Para uma primeira corrente a expressão deve ser interpretada restritivamente Portanto dever legal abrange somente o dever decorrente da lei em sentido amplo lei medida provisória decreto regulamento portaria etc É o entendimento de Nélson Hungria Tratase de dever imposto pela lei O texto do Código não permite extensão ao dever resultante simplesmente de contrato Ora onde o Código fala apenas em lei não se pode ler também contrato O dever de que aqui se cogita é tão somente o que se apresenta diretamente imposto ex lege Dever legal é somente aquele que o Estado impõe normativamente em matéria de serviço de utilidade pública ou na defesa de interesse da comunhão social7 Uma segunda corrente por sua vez afirma que a expressão há de ser interpretada extensivamente compreendendo além do dever legal qualquer espécie de dever jurídico tal como o dever contratual É entre outros o entendimento de Bento de Faria Costa e Silva e Galdino Siqueira que assim se manifesta Esse dever jurídico pode também resultar de uma relação contratual como a do enfermeiro que se obriga a cuidar de um demente e que não pode para escapar do perigo de seus acessos praticar fato em prejuízo de terceiro8 2252 22521 Essa última posição nos parece mais acertada De fato não pode invocar o estado de necessidade quem tem o dever jurídico de enfrentar o perigo E uma vez mais nos socorremos do art 13 2º do Código Penal Em verdade se quem tem o dever jurídico de agir responde pelo crime quando se omite com maior razão não pode invocar estado de necessidade diante de sua inércia É o caso do salvavidas de um clube proibido de alegar a causa excludente quando sem ação assiste a uma criança morrer afogada na piscina sob a alegação de que a água estava muito gelada e podia contrair pneumonia Se não bastasse o dever resultante de contrato e outros mais como o decorrente da posição de garantidor e da situação de ingerência foram previstos expressamente no art 13 2º do Código Penal merecendo ser tratados como deveres legais Finalmente a Exposição de Motivos da Parte Geral do Código Penal de 1940 não alterada pela Reforma da Parte Geral em 1984 como se extrai do item 21 da atual Exposição preceitua A abnegação em face do perigo só é exigível quando corresponde a um especial dever jurídico Fato necessitado Preenchidos os requisitos já abordados restando configurada a situação de necessidade o agente pode praticar o fato necessitado isto é a conduta lesiva a outro bem jurídico Esse fato contudo deve obedecer a dois outros requisitos inevitabilidade do perigo por outro modo e proporcionalidade Inevitabilidade do perigo por outro modo O fato necessitado deve ser absolutamente imprescindível para evitar a lesão ao bem jurídico Se o caso concreto permitir o afastamento do perigo por qualquer outro meio commodus discessus a ser aferido de acordo com o juízo do homem médio e diverso da prática do fato típico por ele deve optar o agente Exemplo se para fugir do ataque de um boi bravio o agente pode facilmente pular uma cerca não estará autorizado a matar o animal Em suma o estado de necessidade apresenta nítido caráter subsidiário 22522 226 quando possível a fuga por ela deve optar o agente que também deve sempre proporcionar a qualquer bem jurídico o menor dano possível Proporcionalidade Também conhecido como razoabilidade referese ao cotejo de valores ou seja à relação de importância entre o bem jurídico sacrificado e o bem jurídico preservado no caso concreto Não se pode previamente estabelecer um quadro de valores salvo em casos excepcionais ex a vida humana evidentemente vale mais do que o patrimônio Deve o magistrado decidir na situação real que lhe for apresentada utilizando como vetor o juízo do homem médio Em face da teoria unitária adotada pelo art 24 do Código Penal o bem preservado no estado de necessidade deve ser de valor igual ou superior ao bem jurídico sacrificado CAUSA DE DIMINUIÇÃO DA PENA Estabelece o art 24 2º do Código Penal Embora seja razoável exigirse o sacrifício do direito ameaçado a pena poderá ser reduzida de um a dois terços Cuidase de causa de diminuição da pena que ocorre quando o agente visando proteger bem jurídico próprio ou de terceiro sacrifica outro bem jurídico de maior valor Não há exclusão do crime É mantida a tipicidade mas é possível a diminuição da pena dependendo das condições concretas em que o fato foi praticado Essa norma só se aplica nos casos de estado de necessidade exculpante desde que não tenha restado configurada uma situação de inexigibilidade de conduta diversa excludente da culpabilidade Em suma foi sacrificado um bem de maior relevância e o agente poderia ter agido de forma diversa Nada obstante considerase a sua conduta menos reprovável de forma a ser agraciado com a diminuição da pena 227 2271 a b 2272 a b 2273 a b ESPÉCIES DE ESTADO DE NECESSIDADE A divisão do estado de necessidade leva em conta diversos critérios Quanto ao bem sacrificado No que tange ao valor do bem sacrificado o estado de necessidade pode ser Justificante o bem sacrificado é de valor igual ou inferior ao preservado Exclui a ilicitude Exculpante o bem sacrificado é de valor superior ao preservado A ilicitude é mantida mas no caso concreto pode afastar a culpabilidade em face da inexigibilidade de conduta diversa9 Quanto à titularidade do bem jurídico preservado Em relação ao titular do bem jurídico preservado pela lei penal o estado de necessidade pode ser Próprio protegese bem jurídico pertencente ao autor do fato necessitado De terceiro o autor do fato necessitado tutela bem jurídico alheio Quanto à origem da situação de perigo Quanto à pessoa que suporta o fato típico o estado de necessidade pode ser Agressivo é aquele em que o agente para preservar bem jurídico próprio ou de terceira pessoa pratica o fato necessitado contra bem jurídico pertencente a terceiro inocente ou seja pessoa que não provocou a situação de perigo O autor do fato necessitado embora não seja responsável pelo perigo deve indenizar o dano suportado pelo terceiro CC art 929 reservandolhe porém ação regressiva contra o causador do perigo CC art 930 caput Defensivo é aquele em que o agente visando a proteção de bem jurídico próprio ou de terceiro pratica o fato necessitado contra 2274 a b 228 bem jurídico pertencente àquele que provocou o perigo Obviamente não há obrigação de ressarcir os danos causados como se extrai da análise a contrario sensu do art 929 do Código Civil Quanto ao aspecto subjetivo do agente Essa classificação diz respeito à ciência ao conhecimento da situação de perigo por parte do autor do fato necessitado O estado de necessidade se divide em Real a situação de perigo efetivamente existe e dela o agente tem conhecimento Exclui a ilicitude Putativo não existe a situação de necessidade mas o autor do fato típico a considera presente O agente por erro isto é falsa percepção da realidade que o cerca supõe situação de fato que se existisse tornaria sua ação legítima É mantida a ilicitude e seus efeitos variam conforme a teoria adotada no tocante às descriminantes putativas Capítulo 15 item 158 ESTADO DE NECESSIDADE RECÍPROCO É perfeitamente admissível que duas ou mais pessoas estejam simultaneamente em estado de necessidade umas contra as outras É o que se convencionou chamar de estado de necessidade recíproco hipótese em que deve ser afastada a ilicitude do fato sem a interferência do Estado que ausente permanece neutro nesse conflito A literatura é farta ao indicar acontecimentos em que fática ou hipoteticamente se concretizou essa espécie de estado de necessidade destacandose a famosa obra O caso dos exploradores de cavernas Confira se ainda o clássico exemplo de Basileu Garcia tábua de salvação Dois náufragos disputam uma tábua que só servirá a um homem É preciso que um deles pereça Apresentase mais tarde ao tribunal o sobrevivente invocando a justificativa do estado de necessidade Não será punido O Estado não teria razão para tomar partido em favor de um ou de outro indivíduo cujos interesses igualmente legítimos se acharam 229 2210 em antagonismo Estáse diante de um fato consumado e irremediável não cabendo castigar o que ofendeu o direito alheio em favor do próprio direito desde que tenham ocorrido os requisitos legais10 CASOS ESPECÍFICOS DE ESTADO DE NECESSIDADE Além da regra geral delineada pelo art 24 o Código Penal em sua Parte Especial prevê outros casos de estado de necessidade É o que se dá no art 128 I permitindo o aborto necessário ou terapêutico praticado por médico quando não há outro meio para salvar a vida da gestante De igual modo o art 146 3º preceitua em seus incisos não configurar constrangimento ilegal a intervenção médica ou cirúrgica sem o consentimento do paciente ou de seu representante legal se justificada por iminente perigo de vida bem como a coação exercida para impedir suicídio Em relação ao crime de violação de domicílio é possível o estado de necessidade quando algum crime em seu interior está sendo praticado ou na iminência de o ser e também na hipótese de desastre ou para socorrer alguém CP art 150 3º II e CF art 5º XI Apontase ainda o estado de necessidade implicitamente nos crimes de violação de correspondência divulgação de segredo e violação de segredo profissional CP arts 151 153 e 154 nas situações em que alguém pratica o fato típico para proteger direito próprio ou alheio Exemplo A réu em ação penal abre uma carta endereçada a B cujo conteúdo prova sua inocência no tocante ao crime contra si imputado COMUNICABILIDADE DO ESTADO DE NECESSIDADE O estado de necessidade justificante exclui a ilicitude do fato típico afastando consequentemente a infração penal E desaparecendo o crime ou a contravenção penal em relação a algum 2211 2212 2213 dos envolvidos o estado de necessidade se comunica a todos os coautores e partícipes da infração penal pois no tocante a eles o fato também será lícito ESTADO DE NECESSIDADE E CRIMES PERMANENTES E HABITUAIS Em regra não se aplica a justificativa no campo dos crimes permanentes e habituais uma vez que no fato que os integra não há os requisitos da atualidade do perigo e da inevitabilidade do fato necessitado A jurisprudência já reconheceu o estado de necessidade contudo no crime habitual de exercício ilegal de arte dentária CP art 282 em caso atinente à zona rural longínqua e carente de profissional habilitado11 ESTADO DE NECESSIDADE E ERRO NA EXECUÇÃO O estado de necessidade é compatível com a aberratio ictus CP art 73 na qual o agente por acidente ou erro no uso dos meios de execução atinge pessoa ou objeto diverso do desejado com o propósito de afastar a situação de perigo a bem jurídico próprio ou de terceiro Exemplificativamente configurase o estado de necessidade no caso em que alguém no momento em que vai ser atacado por um cão bravio efetua disparos de arma de fogo contra o animal e por erro na execução atinge pessoa que passava nas proximidades do local ferindoa Não poderá ser responsabilizado pelas lesões corporais produzidas em face da exclusão da ilicitude ESTADO DE NECESSIDADE E DIFICULDADES ECONÔMICAS Deve ser diferenciado o estado de necessidade como causa de exclusão da ilicitude da dificuldade econômica relacionada à debilidade da capacidade aquisitiva No estado de necessidade o agente é compelido a praticar o fato típico para afastar a situação de perigo atual ou iminente involuntário e inevitável capaz de afetar bem jurídico próprio ou de terceiro cujo sacrifício é inexigível Por sua vez na dificuldade econômica supõese ou que o indivíduo deva conformarse com a privação porque não se cuida do suprimento de necessidade vital ou primária ou ainda que disso se trate que lhe seja possível satisfazer a carência por meio de atividade lícita Em uma ou outra hipótese não se justifica a lesão ao interesse de outrem Destarte a dificuldade econômica inclusive com a miserabilidade do agente não constitui estado de necessidade Em casos excepcionais admitese a prática de um fato típico como medida inevitável ou seja para satisfação de necessidade estritamente vital que a pessoa nada obstante seu empenho não conseguiu superar de forma lícita a exemplo do furto famélico12 em que o agente subtrai alimentos básicos para saciar sua fome ou de pessoa a ele ligada por laços de parentesco ou de amizade Mas repitase se o sujeito podia laborar honestamente ou então quando se apodera de bens supérfluos ou em quantidade exagerada afastase a justificativa 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 HUNGRIA Nélson Comentários ao código penal Rio de Janeiro Forense 1949 v I p 436 BRUNO Aníbal Direito penal Parte geral 3 ed Rio de Janeiro Forense 1967 t I p 380 GARCIA SOTO Maria Paulina El estado de necesidad en materia penal Santiago Jurídica Conosur 1999 p 76 GARCIA SOTO Maria Paulina Op cit p 77 ROXIN Claus Derecho penal Parte general Fundamentos La estructura de la teoría del delito Trad espanhola DiegoManuel Luzón Peña Miguel Díaz y García Conlledo e Javier de Vicente Remensal Madrid Civitas 2006 t I p 698 NUCCI Guilherme de Souza Código penal comentado 6 ed São Paulo RT 2006 p 237238 HUNGRIA Nélson Comentários ao código penal Rio de Janeiro Forense 1949 v I p 442 SIQUEIRA Galdino Tratado de direito penal Parte geral Rio de Janeiro José Konfino 1947 t I p 358 O estado de necessidade exculpante é compatível apenas com a teoria diferenciadora que não foi adotada pelo Código Penal mas encontra amparo no art 39 do Código Penal Militar GARCIA Basileu Instituições de direito penal 4 ed 37 tir São Paulo Max Limonad 1975 t I v I JESUS Damásio E de Código Penal anotado 15 ed São Paulo Saraiva 2004 p 112 STJ HC 267447MG rel Min Jorge Mussi 5ª Turma j 25062013 O instituto da legítima defesa é inerente à condição humana Acompanha o homem desde o seu nascimento subsistindo durante toda a sua vida por lhe ser natural o comportamento de defesa quando injustamente agredido por outra pessoa Como argumenta Galdino Siqueira Tão visceralmente ligada à pessoa se manifesta a defesa isto é a faculdade de repelir pela força o ataque no momento em que se produz que CÍCERO na sua oração Pro Milone a reputa como um direito natural derivado da necessidade non scripta sed nata lex proposição verdadeira se considerarmos o substratum fisiológico e psicológico da defesa como reação do instinto de conservação que brota e se desenvolve independente de qualquer regulamentação1 Em razão da sua compreensão como direito natural a legítima defesa sempre foi aceita por praticamente todos os sistemas jurídicos ainda que muitas vezes não prevista expressamente em lei constituindose dentre todas na causa de exclusão da ilicitude mais remota ao longo da história das civilizações De fato o Estado avocou para si a função jurisdicional proibindo as pessoas de exercerem a autotutela impedindoas de fazerem justiça pelas próprias mãos Seus agentes não podem contudo estar presentes simultaneamente em todos os lugares razão pela qual o Estado autoriza os indivíduos a defenderem direitos em sua ausência pois não seria correto deles exigir a instantânea submissão a um ato injusto para somente depois buscar a reparação do dano perante o Poder Judiciário Nos termos do art 25 do Código Penal Entendese em legítima defesa quem usando moderadamente dos meios necessários repele injusta agressão atual ou iminente a direito seu ou de outrem Como se extrai do art 23 II do Código Penal a legítima defesa é causa de exclusão da ilicitude Destarte o fato típico praticado em legítima defesa é lícito Não configura crime O conceito decorre do art 25 do Código Penal tratase da causa de justificação consistente em repelir injusta agressão atual ou iminente a direito próprio ou alheio usando moderadamente dos meios necessários A análise do art 25 do Código Penal revela a dependência da legítima defesa aos seguintes requisitos cumulativos 1 agressão injusta 2 atual ou iminente 3 contra direito próprio ou alheio 4 reação com os meios necessários e 5 uso moderado dos meios necessários Esses requisitos podem ser divididos em dois blocos Agressão é toda ação ou omissão humana consciente e voluntária que lesa ou expõe a perigo de lesão um bem ou interesse consagrado pelo ordenamento jurídico Tratase de atividade exclusiva do ser humano Não pode ser efetuada por um animal ou por uma coisa por faltarlhes a consciência e a voluntariedade ínsitas ao ato de agredir Portanto animais que atacam e coisas que oferecem riscos às pessoas podem ser sacrificados ou danificados com fundamento no estado de necessidade e não na legítima defesa reservada a agressões emanadas do homem Nada impede entretanto a utilização de animais como instrumentos do crime como nos casos em que são ordenados por alguém ao ataque de determinada pessoa Funcionam como verdadeiras armas autorizando a legítima defesa Exemplo A determina ao seu cão bravio o ataque contra B Esse último poderá matar o animal acobertado pela legítima defesa A agressão pode emanar de um inimputável O inimputável pratica conduta consciente e voluntária apta a configurar a agressão O fato previsto em uma lei incriminadora por ele cometido é típico e ilícito Faltalhe apenas a culpabilidade A agressão é tomada em sentido meramente objetivo não guardando vínculo nenhum com o subjetivismo da culpabilidade É pacífico na doutrina entretanto que a condição de inimputável do agressor se conhecida do agredido impõe a este maior diligência no evitar e maior moderação no repelir o ataque Assim não haveria desonra na fuga e a esta se possível e capaz de afastar a agressão deve recorrer o agredido2 Há posições em sentido contrário É o caso de Nélson Hungria que equiparava os inimputáveis aos seres irracionais A defesa contra o ataque deles originado consequentemente não caracterizava legítima defesa mas estado de necessidade Em regra a agressão é praticada por meio de uma ação mas nada impede a sua veiculação por omissão quando esta se apresenta idônea a causar danos e o omitente tinha no caso concreto o dever jurídico de agir Mezger fornece o exemplo do carcereiro que tem o dever de liberar o recluso cuja pena já foi integralmente cumprida Com a sua omissão ilícita inevitavelmente agride um bem jurídico do preso autorizando a reação em legítima defesa3 Além disso a agressão deve ser injusta Agressão injusta é a de natureza ilícita isto é contrária ao Direito Pode ser dolosa ou culposa É obtida com uma análise objetiva consistindo na mera contradição com o ordenamento jurídico Não se exige para ser injusta que a agressão seja prevista como infração penal Basta que o agredido não esteja obrigado a suportála Exemplo pode agir em legítima defesa o proprietário do bem atingido por um furto de uso A agressão injusta deve ser atual ou iminente Ao contrário do estado de necessidade em que o legislador previu expressamente somente o perigo atual na legítima defesa admitese seja a agressão atual ou iminente Não pode o homem de bem ser obrigado a ceder ao injusto Seria equivocado exigir fosse ele agredido efetivamente para somente depois defenderse Exemplificativamente não está ele obrigado a ser atingido por um disparo de arma de fogo para após defenderse matando o seu agressor Ao contrário com a iminência da agressão é permitida a reação imediata contra o agressor desde que presente o justo receio quanto ao ataque a ser contra ele perpetrado Atual é a agressão presente isto é já se iniciou e ainda não se encerrou a lesão ao bem jurídico Exemplo a vítima é atacada com golpes de faca Iminente é a agressão prestes a acontecer ou seja aquela que se torna atual em um futuro imediato Exemplo o agressor anuncia à vítima a intenção de matála vindo à sua direção com uma faca em uma das mãos A agressão futura ou remota e a agressão passada ou pretérita não abrem espaço para a legítima defesa O medo e a vingança não autorizam a reação mas apenas a necessidade de defesa urgente e efetiva do interesse ameaçado Com efeito admitirse a legítima defesa contra agressão futura seria um verdadeiro convite para o duelo desestimulando a pessoa de recorrer à autoridade pública para a tutela de seus direitos E a agressão pretérita caracterizaria nítida vingança A agressão injusta atual ou iminente deve ameaçar bem jurídico próprio ou de terceiro Qualquer bem jurídico pode ser protegido pela legítima defesa pertencente àquele que se defende ou a terceira pessoa Em compasso com o auxílio mútuo que deve reinar entre os indivíduos o Código Penal admite expressamente a legítima defesa de bens jurídicos alheios com amparo no princípio da solidariedade humana E na legítima defesa de terceiro a reação pode atingir inclusive o titular do bem jurídico protegido O terceiro funciona como agredido e defendido simultaneamente Exemplo A percebendo que B se droga compulsivamente e não aceita conselhos para parar decide agredilo para que desmaie e assim deixe de ingerir mais cocaína que o levaria à morte Não mais existem as limitações antigas que autorizavam a legítima defesa apenas em relação à vida ou ao corpo Vige atualmente a mais larga amplitude de defesa dos bens jurídicos pois o Direito não pode distinguilos em mais ou menos valiosos amparando os primeiros e relegando os últimos ao abandono Em suma é todo o patrimônio jurídico do indivíduo que se deve ter por inviolável e no qual ninguém poderá penetrar pela força sem o risco de se ver repelido com a força necessária4 É possível o emprego da excludente para a tutela de bens pertencentes às pessoas jurídicas inclusive do Estado pois atuam por meio de seus representantes e não podem defenderse sozinhas Vejase o exemplo da pessoa que percebendo uma empresa ser furtada luta com o ladrão e o imobiliza até a chegada da força policial Admitese também a legítima defesa do feto Deveras o art 2º do Código Civil resguarda os direitos do nascituro que podem ser defendidos por terceiros É o caso do agente que percebendo estar a gestante na iminência de praticar um autoaborto a impede internandoa posteriormente em um hospital para que o parto transcorra normalmente Embora com alguma controvérsia podese ainda falar em legítima defesa do cadáver Nada obstante não seja titular de direitos a utilização da causa justificativa encontra amparo no reconhecimento que o Estado lhe confere em respeito à sociedade e aos seus familiares criando inclusive crimes destinados a esse desiderato como se dá com a destruição subtração ou ocultação e também com o vilipêndio a cadáver CP arts 211 e 2125 Meios necessários são aqueles que o agente tem à sua disposição para repelir a agressão injusta atual ou iminente a direito seu ou de outrem no momento em que é praticada A legítima defesa não é desforço desnecessário mas medida que se destina à proteção de bens jurídicos Não tem por fim punir razão pela qual deve ser concretizada da forma menos lesiva possível O calor do momento da agressão todavia impede sejam calculados os meios necessários de forma rígida e matemática Seu cabimento deve ser analisado de modo flexível e não em doses milimétricas A escolha dos meios deve obedecer aos reclamos da situação concreta de perigo não se podendo exigir uma proporção mecânica entre os bens em conflito6 O meio necessário desde que seja o único disponível ao agente para repelir a agressão pode ser desproporcional em relação a ela se empregado moderadamente Imaginese um agente que ao ser atacado com uma barra de ferro por um desconhecido utiliza uma arma de fogo meio de defesa que estava ao seu alcance Estará caracterizada a excludente Acerca desse tema curial a leitura de Bento de Faria O homem que é subitamente agredido não pode na perturbação e na impetuosidade da sua defesa proceder a operação de medir a sangue frio e com exatidão se há algum outro recurso para o qual possa apelar que não o de infligir um mal ao seu agressor se há algum meio menos violento a empregar na defesa se o mal que inflige excede ou não o que seria necessário à mesma defesa É preciso considerar os fatos como eles ordinariamente se apresentam e reconhecer as fraquezas inerentes à natureza humana não se exigindo dela o que ela não pode dar reconhecer mesmo as exigências sociais que podem justificar o emprego de certos meios de defesa suposto não seja absoluta a necessidade desse emprego7 Se o meio empregado for desnecessário estará configurado o excesso doloso culposo ou exculpante sem dolo ou culpa dependendo das condições em que ocorrer Ao contrário do que ocorre no estado de necessidade a possibilidade de fuga ou o socorro pela autoridade pública não impedem a legítima defesa Não se impõe o commodus discessus isto é o agredido não está obrigado a procurar a saída mais cômoda e menos lesiva para escapar do ataque injusto O Direito não pode se curvar a uma situação ilícita Ademais lhe é vedado obrigar que alguém seja pusilânime ou covarde fugindo de um ataque injusto quando pode legitimamente se defender Há situações entretanto em que a fuga do local se mostra a medida mais coerente não acarretando vergonha ou humilhação Exemplo o agente agredido injustamente por sua mãe que deseja ferilo em um acesso inesperado de fúria provocado por fatores até então ignorados age corretamente ao fugir quando em tese poderia até mesmo lesionála para fazer cessar o ataque8 Caracterizase pelo emprego dos meios necessários na medida suficiente para afastar a agressão injusta Utilizase o perfil do homem médio ou seja para aferir a moderação dos meios necessários o magistrado compara o comportamento do agredido com aquele que em situação semelhante seria adotado por um ser humano de inteligência e prudência comuns à maioria da sociedade Essa análise não é rígida baseada em critérios matemáticos ou científicos Comporta ponderação a ser aferida no caso concreto levando em conta a natureza e a gravidade da agressão a relevância do bem ameaçado o perfil de cada um dos envolvidos e as características dos meios empreendidos para a defesa O art 25 do Código Penal não a exige expressamente mas firmaramse doutrina e jurisprudência no sentido de que assim como no estado de necessidade a legítima defesa reclama também proporcionalidade entre os bens jurídicos em conflito9 O bem jurídico preservado deve ser de valor igual ou superior ao sacrificado sob pena de configuração do excesso Exemplo não pode invocar legítima defesa aquele que mata uma pessoa pelo simples fato de ter sido por ela ofendido verbalmente Nada obstante o caráter objetivo da legítima defesa exigese a existência naquele que reage da vontade de defenderse Seu ato deve ser uma resposta à agressão de outrem e esse caráter de reação precisa estar presente nos dois momentos de sua atuação o objetivo e o subjetivo Entretanto não exclui a legítima defesa a circunstância de o agente unir ao fim de defenderse uma finalidade diversa tal como a vingança desde que objetivamente não exceda os requisitos da necessidade uso dos meios necessários e da moderação emprego moderado de tais meios Exemplo A com o desejo antigo de matar B em razão de brigas pretéritas aproveitase do ataque injustificado de seu desafeto para eliminar a sua vida Não há legítima defesa no desafio no duelo no convite para a luta Os contendores respondem pelos crimes praticados A divisão da legítima defesa tem como parâmetros a forma de reação a a b a b titularidade do bem jurídico protegido e o aspecto subjetivo daquele que se defende Adotandose como parâmetro a forma de reação a legítima defesa pode ser a Agressiva ou ativa é aquela em que a reação contra a agressão injusta configura um fato previsto em lei como infração penal Exemplo provocar lesões corporais no agressor b Defensiva ou passiva é a legítima defesa na qual aquele que reage limitase a impedir os atos agressivos sem praticar um fato típico Exemplo segurar os braços do agressor para que ele não desfira socos Na hipótese em que o parâmetro for a titularidade do bem jurídico protegido a legítima defesa pode ser própria e de terceiro Própria é aquela em que o agente defende bens jurídicos de sua titularidade De terceiro é aquela em que o agente protege bens jurídicos alheios No que tange ao aspecto subjetivo daquele que se defende a legítima defesa pode ser Real é a espécie de legítima defesa em que se encontram todos os requisitos previstos no art 25 do Código Penal Exclui a ilicitude do fato CP art 23 II Putativa ou imaginária é aquela em que o agente por erro acredita existir uma agressão injusta atual ou iminente a direito seu ou de outrem Exemplo A foi jurado de morte por B Em determinada noite em uma rua escura encontramse B coloca a c mão no bolso e A acreditando que ele iria pegar uma arma matao Descobrese posteriormente que B tinha a intenção de oferecerlhe um charuto para selar a paz O fato típico praticado permanece revestido de ilicitude e seus efeitos variam em conformidade com a teoria adotada no tocante às descriminantes putativas Capítulo 15 item 158 Subjetiva ou excessiva é aquela em que o agente por erro de tipo escusável excede os limites da legítima defesa É também denominada de excesso acidental Exemplo A de porte físico avantajado parte para cima de B para agredilo Este entretanto consegue acertar um golpe violento fazendo seu inimigo desmaiar Não percebe contudo que A estava inconsciente e com medo de ser agredido continua a desferir socos desnecessários Não responde pelo excesso em face de sua natureza acidental Embora diminuída ainda subsiste polêmica acerca da admissibilidade da legítima defesa da honra A honra direito fundamental do homem é inviolável por expressa disposição constitucional art 5º X E como o art 25 do Código Penal não faz distinção entre os bens jurídicos também pode ser alcançada pela legítima defesa Mas a honra não pode ser isoladamente considerada Deve ser analisada em determinado contexto pois pode ser dividida em três aspectos distintos respeito pessoal liberdade sexual e infidelidade conjugal O respeito pessoal que engloba a dignidade e o decoro é ofendido pelos crimes contra a honra calúnia difamação e injúria Para a sua tutela admite se o emprego de força física necessária e moderada visando impedir a reiteração das ofensas E a propósito no campo da injúria a retorsão imediata que consiste em outra injúria é passível de perdão judicial CP art 140 1º No âmbito da liberdade sexual livre disposição do corpo para fins sexuais também se autoriza a legítima defesa É o caso da pessoa que pode ferir ou até mesmo matar quem tenta lhe estuprar Há finalmente a infidelidade conjugal Aí reside a maior celeuma relativa à legítima defesa da honra na órbita do adultério No passado admitiase a exclusão da culpabilidade para os crimes passionais motivados pelo adultério Atualmente depois de muita discussão e notadamente com a evolução da sociedade e com o respeito aos direitos da mulher prevalece o entendimento de que a traição conjugal não humilha o cônjuge traído mas sim o próprio traidor que não se mostra preparado para o convívio familiar Além disso respeitase o caráter fragmentário e a subsidiariedade do Direito Penal que não deve ser chamado para resolver o impasse pois o ordenamento jurídico prevê outras formas menos gravosas para essa finalidade Com efeito admitese a separação e também o divórcio litigioso fundados na violação dos deveres do matrimônio E ainda no campo civil temse aceitado até mesmo a indenização por danos morais ao cônjuge prejudicado pela traição Essa posição se reforça com a descriminação do crime de adultério revogado pela Lei 111062005 Deveras se não se admite sequer a responsabilidade penal de quem trai o seu cônjuge com maior razão inferese que o Direito Penal não autoriza a legítima defesa da honra principalmente com o derramamento de sangue do traidor A tipicidade funciona como indício da ilicitude Portanto todo fato típico presumese ilícito Invertese o ônus da prova quem alega qualquer excludente da ilicitude aí se inserindo a legítima defesa deve provar a sua ocorrência Por esse motivo não se admite a legítima defesa presumida No Êxodo XXII 23 constava Se um ladrão for encontrado forçando a porta ou escavando a parede da casa e sendo ferido morrer aquele que o feriu não será réu de morte Se porém fez isto depois de ter nascido o sol cometeu um homicídio e ele mesmo morrerá No direito romano falavase expressamente em legítima defesa presumida Como lembra Jorge Alberto Romeiro A noite autorizava ainda para os romanos a presunção de legítima defesa em favor daquele que matasse um ladrão quando surpreendido furtando pelo justo receio do ataque10 Constituise na espécie de legítima defesa em que alguém reage contra o excesso de legítima defesa Exemplo A profere palavras de baixo calão contra B o qual para calálo desferelhe um soco Em seguida com A já em silêncio B continua a agredilo fisicamente autorizando o emprego de força física pelo primeiro para defenderse É possível essa legítima defesa pois o excesso sempre representa uma agressão injusta Prevalece o entendimento pela sua admissibilidade pois o instituto da legítima defesa reclama tão somente uma agressão injusta atual ou iminente a direito próprio ou alheio emanada de seres humanos pouco importando sejam eles individualizados ou não11 Em sentido contrário a opinião de Vincenzo La Medica para quem o comportamento de defesa contra a multidão configura estado de necessidade12 É possível a legítima defesa contra pessoa jurídica uma vez que esta exterioriza a sua vontade por meio da conduta de seres humanos permitindo a prática de agressões injustas13 Exemplo o funcionário de uma empresa escuta pelo sistema de som ofensas à sua honra Para impedir a reiteração da conduta pode destruir o altofalante que transmite as palavras inadequadas Duas situações distintas podem ser visualizadas 1 agressões dos pais contra os filhos e 2 agressões entre os cônjuges Na relação entre pais e filhos os castigos moderados inseremse no campo do exercício regular de direito impedindo a intervenção de terceiras pessoas Se entretanto os castigos forem imoderados e excessivos caracterizam agressão injusta autorizando a legítima defesa pelo descendente por outro familiar ou mesmo por pessoa estranha14 No tocante às relações entre os cônjuges não tem qualquer deles mando ou hierarquia sobre o outro em face da regra contida no art 226 5º da Constituição Federal Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher Nesses termos se o marido agredir injustamente a mulher ou viceversa será cabível a legítima defesa por qualquer deles ou mesmo por outro familiar ou terceira pessoa15 Se repelindo uma agressão injusta atual ou iminente a direito seu ou de outrem o agente atinge pessoa inocente por erro no emprego dos meios de execução subsiste em seu favor a legítima defesa Exemplo A se defende de tiros de B revidando disparos de arma de fogo em sua direção Acerta todavia C que nada tinha a ver com o incidente matandoo Incidirá ainda a justificativa se o agente atingir a pessoa almejada e também pessoa inocente No exemplo acima A mataria B e C De fato o art 73 do Código Penal é peremptório ao estabelecer que o crime considerase praticado contra a pessoa visada permitindo a conclusão de que essa regra aplicase inclusive para efeito de exclusão da ilicitude A questão que se coloca é para o exercício da legítima defesa de terceiro é necessário o seu consentimento para ser protegido de uma agressão injusta A resposta pode ser negativa ou positiva dependendo da natureza do bem jurídico atacado Em se tratando de bem jurídico indisponível será prescindível o consentimento do ofendido Exemplo um homem agride cruelmente sua esposa com o propósito de matála Aquele que presenciar o ataque poderá sem a anuência da mulher protegêla ainda que para isso tenha que lesionar ou mesmo eliminar a vida do covarde marido Diversa será a conclusão quando tratarse de bem jurídico disponível Nessa hipótese impõese o consentimento do ofendido se for possível a sua obtenção Exemplo um homem ofende com impropérios a honra de sua mulher Por mais inconformado que um terceiro possa ficar com a situação não poderá protegêla sem o seu assentimento Não se olvide porém que mesmo no caso de bem jurídico disponível estará caracterizada a legítima defesa putativa quando o terceiro atuar sem o consentimento do ofendido Estado de necessidade e legítima defesa são causas legais de exclusão da ilicitude CP art 23 I e II Além disso ambos têm em comum o perigo a um bem jurídico próprio ou de terceiro Mas diferenciamse claramente Na legítima defesa o perigo provém de uma agressão ilícita do homem e a reação se dirige contra seu autor Por outro lado no estado de necessidade agressivo o perigo é originário da natureza de seres irracionais ou mesmo de um ser humano mas para dele se safar o agente sacrifica bem jurídico pertencente a quem não provocou a situação de perigo Exemplo A para salvarse de uma enchente subtrai o barco de B No estado de necessidade defensivo o agente sacrifica bem jurídico de titularidade de quem causou a situação de perigo Exemplo A mata um touro bravio de seu vizinho que não consertou a cerca da fazenda e por esse motivo estava o animal pronto a atacar crianças que nadavam em um pequeno riacho A reação dirigese contra a coisa da qual resulta o perigo e não contra a pessoa que provocou a situação perigosa Em alguns casos contudo a situação de perigo ao bem jurídico é provocada por uma agressão lícita do ser humano que atua em estado de necessidade Como o ataque é lícito eventual reação caracterizará estado de necessidade e não legítima defesa Exemplo A e B estão perdidos no deserto e a água que carregam somente saciará a sede de um deles A em estado de necessidade furta a água de B o qual para salvarse mata em estado de necessidade seu companheiro É possível que uma mesma pessoa atue simultaneamente acobertada pela legítima defesa e pelo estado de necessidade quando para repelir uma agressão injusta praticar um fato típico visando afastar uma situação de perigo contra bem jurídico próprio ou alheio Exemplo A para defenderse de B que injustamente desejava matálo subtrai uma arma de fogo pertencente a C estado de necessidade utilizandoa para matar o seu agressor legítima defesa Os requisitos previstos no art 25 do Código Penal revelam a admissibilidade da legítima defesa nos seguintes casos a Legítima defesa real contra legítima defesa putativa A legítima defesa real pressupõe uma agressão injusta E essa agressão injusta estará presente na legítima defesa putativa pois aquele que assim atua atacando terceira pessoa o faz de maneira ilícita permitindo a reação defensiva Exemplo A caminha em área perigosa De repente visualiza B colocando a mão no interior de sua blusa e acreditando que seria assaltado A saca uma arma de fogo para matar B Este último entretanto que iria apenas pegar um cigarro consegue se esquivar dos tiros e em seguida mata A para se defender A legítima defesa real é o revide contra agressão efetivamente injusta enquanto a legítima defesa putativa é a reação imaginária erroneamente suposta pois existe apenas na mente de quem a realiza No exemplo mencionado A agiu em legítima defesa putativa ensejando a legítima defesa real por parte de B Esse raciocínio é também aplicável a todas as demais excludentes da ilicitude putativas estado de necessidade exercício regular de direito e estrito cumprimento de dever legal b Legítima defesa putativa recíproca legítima defesa putativa contra legítima defesa putativa Ocorre na hipótese em que dois ou mais agentes acreditam erroneamente que um irá praticar contra o outro uma agressão injusta quando na verdade o ataque ilícito não existe Exemplo A e B velhos desafetos encontramse em local ermo Ambos colocam as mãos nos bolsos ao mesmo tempo e em razão disso partem um para cima do outro lutando até o momento em que desmaiam Posteriormente apurase que A iria oferecer a B um cigarro enquanto este que havia perdido a fala em um acidente entregaria àquele um pedido escrito de desculpas pelos desentendimentos pretéritos c Legítima defesa real contra legítima defesa subjetiva Legítima defesa subjetiva ou excessiva é aquela em que o indivíduo por erro escusável ultrapassa os limites da legítima defesa Daí ser também chamada de excesso acidental No momento em que se configura o excesso a outra pessoa que de agressor passou a ser agredido pode agir em legítima defesa real uma vez que foi praticada contra ele uma agressão injusta Veja o exemplo A de porte físico avantajado parte para cima de B para agredi lo Este entretanto consegue acertar um golpe violento fazendo seu inimigo desistir da contenda B não nota todavia que A já estava imóvel e continua a atacálo desnecessariamente A partir daí essa agressão se torna injusta e A poderá agir em legítima defesa real contra o excesso de B d Legítima defesa real contra legítima defesa culposa Tal situação é possível pois para a legítima defesa importa somente o caráter injusto da agressão objetivamente considerado independente do elemento subjetivo do agente Exemplo A sem adotar maior cautela confunde B com uma pessoa que havia prometido matálo tão logo o encontrasse e passa a efetuar disparos de arma de fogo para atingilo B poderá contra essa agressão injusta culposamente perpetrada agir acobertado pela legítima defesa real e Legítima defesa contra conduta amparada por causa de exclusão da culpabilidade Será sempre cabível a legítima defesa contra uma agressão que embora injusta esteja acobertada por qualquer causa de exclusão da culpabilidade Exemplo A chega ao Brasil vindo de um país em que não há proteção sobre a propriedade de bens móveis Não possui pois conhecimento acerca do caráter ilícito da conduta de furtar erro de proibição Dirigese à residência de B para subtrair diversos de seus pertences Assim agindo autoriza B a repelir a agressão injusta em legítima defesa do seu patrimônio a Legítima defesa real recíproca legítima defesa real contra legítima defesa real Não é cabível pois o pressuposto da legítima defesa é a existência de uma agressão injusta E se a agressão de um dos envolvidos é injusta automaticamente a reação do outro será justa pois constituirá uma simples atitude de defesa Consequentemente apenas este último estará protegido pela causa de exclusão da ilicitude b Legítima defesa real contra outra excludente real Por idênticos motivos aos ligados à não aceitação da legítima defesa real recíproca é inadmissível a relação da legítima defesa real com o estado de necessidade real com o exercício regular de direito real e finalmente com o estrito cumprimento de dever legal real O fundamento vale ressaltar é simples se a outra excludente é real não haverá a agressão injusta da qual depende a legítima defesa real Desobediência civil é a resistência do cidadão à atividade estatal em razão de reputála abusiva e contrária ao interesse público16 No campo penal consiste na prática de um fato típico contra bem jurídico pertencente ao Poder Público como no exemplo daquele que destrói uma porta para transitar em prédio municipal fechado em razão de greve no setor público Nos ensinamentos de Günther Jakobs Se o sacrifício do bem consiste em lesão de um bem jurídico penalmente típica que se executa como protesto contra determinado comportamento estatal reconhecendo sem embargo a legitimidade deste Estado e do Direito que se vulnera este modo de proceder se denomina desobediência civil quando a infração do Direito não deixa de ser moderada e somente afeta a bens de natureza pública17 Em nossa opinião a desobediência civil não importa na configuração da legítima defesa De fato a todos é assegurado o direito de não se conformar com as posturas estatais mas de forma pacífica e ordenada A lesão a bens jurídicos mediante a prática de condutas penalmente típicas não pode ser tolerada sob pena de acarretar em anarquia e desordem pública 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 SIQUEIRA Galdino Tratado de direito penal Parte geral Rio de Janeiro José Konfino 1947 t I p 314 BRUNO Aníbal Direito penal Parte geral 3 ed Rio de Janeiro Forense 1967 t I p 362 MEZGER Edmund Tratado de derecho penal Trad espanhola José Arturo Rodrigues Muñoz Madrid Revista de Derecho Privado 1955 t I p 453 BRUNO Aníbal Direito penal Parte geral 3 ed Rio de Janeiro Forense 1967 t I p 365 É a posição de MANZINI Vicenzo Trattato di diritto penale italiano 5 ed Torino Torinese 1981 v II p 388 Nesse sentido LINHARES Marcello Jardim Legítima defesa 4 ed São Paulo Saraiva 1994 p 344 FARIA Bento Código penal brasileiro comentado Rio de Janeiro Distribuidora Record 1961 v II p 192 É também o entendimento de GARCIA Basileu Instituições de direito penal 4 ed 37ª tiragem São Paulo Max Limonad 1975 t I v I p 306 STJ RE 1459909MS rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 14082014 ROMEIRO Jorge Alberto A noite no direito e no processo penal Estudos de direito e processo penal em homenagem a Nélson Hungria Rio de Janeiro Forense 1962 p 183 LINHARES Marcello Jardim Legítima defesa 4 ed São Paulo Saraiva 1994 p 166 LA MEDICA Vincenzo O direito de defesa Trad Fernando de Miranda São Paulo Saraiva 1942 p 4849 MARSICO Alfredo de Diritto penale Parte generale Napoli Jovene 1937 p 105 A Lei 130102014 também conhecida como lei da palmada ou lei menino Bernardo modificou a Lei 80691990 Estatuto da Criança e do Adolescente com a finalidade de proibir expressamente qualquer tipo de 15 16 17 castigo físico ou tratamento cruel ou degradante como forma de correção Assim também LA MEDICA Vincenzo O direito de defesa Trad Fernando de Miranda São Paulo Saraiva 1942 p 116119 Para um estudo aprofundado do assunto GARCIA Maria Desobediência civil direito fundamental 2 ed São Paulo Editora Revista dos Tribunais 2004 JAKOBS Günther Derecho penal Parte general Fundamentos y teoría de la imputación 2 ed Trad espanhola Joaquin Cuello Contreras e Jose Luis Serrano Gonzales de Murillo Madrid Marcial Pons 1997 241 242 243 244 DISPOSITIVO LEGAL Dispõe o art 23 III 1ª parte do Código Penal Não há crime quando o agente pratica o fato em estrito cumprimento de dever legal NATUREZA JURÍDICA Cuidase de causa de exclusão da ilicitude o que se extrai tanto pela rubrica marginal do art 23 do Código Penal exclusão de ilicitude como também pela redação do dispositivo legal não há crime CONCEITO Ao contrário do que fez em relação ao estado de necessidade e à legítima defesa o Código Penal não apresentou o conceito de estrito cumprimento de dever legal nem seus elementos característicos Podese definilo contudo como a causa de exclusão da ilicitude que consiste na prática de um fato típico em razão de cumprir o agente uma obrigação imposta por lei de natureza penal ou não FUNDAMENTO Seria despropositado a lei impor a determinadas pessoas a prática de um ato e ao mesmo tempo sujeitála em face de seu cumprimento a uma sanção penal em razão de consistir o seu mandamento em um fato descrito em lei como crime ou contravenção penal Se no Brasil por exemplo fosse rotineira 245 a aplicação da pena de morte não poderia ser o executor responsabilizado pelos homicídios eventualmente praticados Com efeito na eximente em apreço a lei não determina apenas a faculdade a escolha do agente em obedecer ou não a regra por ela estabelecida Há em verdade o dever legal de agir É o caso por exemplo do cumprimento de mandado de busca domiciliar em que o morador ou quem o represente desobedeça à ordem de ingresso na residência autorizando o arrombamento da porta e a entrada forçada CPP art 245 2º Em decorrência do estrito cumprimento do dever legal o funcionário público responsável pelo cumprimento da ordem judicial não responde pelo crime de dano e sequer pela violação de domicílio1 O Superior Tribunal de Justiça nos fornece outro exemplo na seara dos crimes contra a honra Queixacrime oferecida por Juiz contra Desembargadora que durante processo de promoção por merecimento de magistrados proferiu voto com expressões tidas por caluniosas difamatórias e injuriosas pelo querelante A querelada em sessão pública proferiu seu voto em cumprimento ao previsto na Resolução 1062010 do CNJ com considerações que entendeu pertinentes não se extraindo da sua manifestação atividade delituosa que se amolde às figuras típicas dos arts 138 139 e 140 cc o art 141 II do Código Penal visto que ausente o elemento subjetivo dos tipos penais a inexistência de animus caluniandi diffamandi vel injuriandi Manifestação da querelada no estrito cumprimento do dever legal de fundamentação do voto relatando informações que possuía não se configurando a tipicidade dos crimes a ela imputados pelo querelante nos termos do art 142 III do Código Penal e do art 41 da LC 351979 LOMAN Queixacrime rejeitada2 DEVER LEGAL O dever legal engloba qualquer obrigação direta ou indiretamente resultante de lei em sentido genérico isto é preceito obrigatório e derivado da autoridade pública competente para emitilo Compreende assim decretos regulamentos e também decisões judiciais as quais se limitam a aplicar a 246 247 letra da lei ao caso concreto submetido ao exame do Poder Judiciário O dever legal pode também originarse de atos administrativos desde que de caráter geral pois se tiverem caráter específico o agente não estará agindo sob o manto da excludente do estrito cumprimento de dever legal mas sim protegido pela obediência hierárquica causa de exclusão da culpabilidade se presentes os requisitos exigidos pelo art 22 do Código Penal Destarte o cumprimento de dever social moral ou religioso ainda que estrito não autoriza a aplicação dessa excludente da ilicitude Exemplo comete crime de violação de domicílio o padre ou pastor que a pretexto de espantar os maus espíritos que lá se encontram ingressa sem permissão na residência de alguém DESTINATÁRIOS DA EXCLUDENTE Para Julio Fabbrini Mirabete a excludente pressupõe no executor um funcionário público ou agente público que age por ordem da lei não se excluindo o particular que exerça função pública jurado perito mesário da Justiça Eleitoral etc3 Prevalece contudo o entendimento de que o estrito cumprimento de dever legal como causa de exclusão da ilicitude também se estende ao particular quando atua no cumprimento de um dever imposto por lei Nesse sentido não há crime de falso testemunho na conduta do advogado que se recusa a depor sobre fatos que tomou conhecimento no exercício da sua função acobertados pelo sigilo profissional Lei 89061994 Estatuto da OAB arts 2º 3º e 7º XIX LIMITES DA EXCLUDENTE O cumprimento deve ser estritamente dentro da lei ou seja deve obedecer à risca os limites a que está subordinado De fato todo direito apresenta duas características fundamentais é limitado e disciplinado em sua execução Fora dos limites traçados pela lei surge o excesso ou o abuso de autoridade O fato tornase ilícito e além de livrar do cumprimento aquele a quem se dirigia a ordem abrelhe ainda espaço para a utilização da legítima 248 249 defesa ESTRITO CUMPRIMENTO DE DEVER LEGAL E CRIMES CULPOSOS A excludente é incompatível com os crimes culposos pois a lei não obriga ninguém funcionário público ou não a agir com imprudência negligência ou imperícia A situação geralmente é resolvida pelo estado de necessidade Exemplo o bombeiro que dirige a viatura em excesso de velocidade para salvar uma pessoa queimada em incêndio e em razão disso atropela alguém matandoo não responde pelo homicídio culposo na direção de veículo automotor em face da exclusão do crime pelo estado de necessidade de terceiro COMUNICABILIDADE DA EXCLUDENTE DA ILICITUDE Em caso de concurso de pessoas o estrito cumprimento de dever legal configurado em relação a um dos agentes estendese aos demais envolvidos no fato típico sejam eles coautores ou partícipes É evidente que um fato típico não pode ser lícito para um dos agentes e simultaneamente ilícito para os demais Exemplo o policial militar auxiliado por um particular arromba a porta de uma residência durante o cumprimento de mandado de busca e apreensão Inexistem crimes de dano e de violação de domicílio para ambos os sujeitos policial militar e particular 1 2 3 Outro exemplo de estrito cumprimento de dever legal encontrase no art 190C da Lei 80691990 Estatuto da Criança e do Adolescente Não comete crime o policial que oculta a sua identidade para por meio da internet colher indícios de autoria e materialidade dos crimes previstos nos arts 240 241 241A 241B 241C e 241D desta Lei e nos arts 154A 217A 218 218A e 218B do DecretoLei nº 2848 de 7 de dezembro de 1940 Código Penal AP 720BA rel Min Sidnei Beneti Corte Especial j 07082013 MIRABETE Julio Fabbrini Manual de direito penal Parte geral 24 ed São Paulo Atlas 2007 v 1 p 185 Dispõe o art 23 III parte final do Código Penal Não há crime quando o agente pratica o fato no exercício regular de direito Tratase de causa de exclusão da ilicitude o que se extrai tanto pela rubrica marginal do art 23 do Código Penal exclusão de ilicitude como também pela redação do dispositivo legal não há crime O direito é um só e a sua repartição em diversos ramos tem fins essencialmente didáticos Dessa forma um ato lícito para qualquer área do direito não pode ser ilícito perante o Direito Penal e viceversa evitandose a contradição e a falta de unidade sistemática do ordenamento jurídico Para Graf zu Dohna Uma ação juridicamente permitida não pode ser ao mesmo tempo proibida pelo direito Ou em outras palavras o exercício de um direito nunca é antijurídico1 Assim sendo a palavra direito é utilizada em sentido amplo pelo art 23 III do Código Penal Quem está autorizado a praticar um ato reputado pela ordem jurídica como o exercício de um direito age licitamente Exemplificativamente ao particular que diante da prática de uma infração penal corajosamente efetua a prisão em flagrante de seu autor não pode ser imputado o crime de constrangimento ilegal em razão da permissão contida no art 301 do Código de Processo Penal Na esteira do raciocínio de Nélson Hungria O direito é um complexo harmônico de normas não sendo admissível um real conflito entre estas Assim se uma norma penal incrimina tal ou qual fato que entretanto em determinados casos outra norma jurídica penal ou extrapenal permite ou impõe não há reconhecer em tais casos a existência de crime Esta ilação é inquestionável ainda quando a norma de excepcional licitude seja de direito privado2 Essa causa de exclusão da ilicitude assim como todas as demais deve obedecer aos limites legais Quem tem um direito dele não pode abusar O excesso ou abuso enseja além do afastamento da excludente a utilização da legítima defesa por parte do prejudicado pelo exercício irregular e abusivo do direito Além disso pode ocorrer até mesmo a prática de um crime De fato os arts 1566 IV e 1634 I do Código Civil preceituam ser dever dos pais a educação dos filhos facultandolhes o uso de meios moderados para correção e disciplina quando necessário O abuso ou excesso desse direito entretanto tipificará o crime de maustratos delineado pelo art 136 do Código Penal Na hipótese em que o advogado constituído se apropria de valores pertencentes ao cliente para o pagamento de seus honorários quando o contrato de prestação de serviços não contém cláusula com essa finalidade entendese configurado o crime de apropriação indébita em face da inexistência da excludente do exercício regular de direito Anotese ainda que quando o exercício regular de um direito tem seu nascedouro no Direito Penal o fato pode ser ilícito na seara extrapenal nada obstante não configure infração penal É o caso do advogado que durante debates em audiência judicial ofende um colega em razão de suas funções Não há injúria por força do art 7º 2º da Lei 89061994 Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil o que não obsta a sua punição administrativa pela violação da ética profissional Deve respeitar todavia os limites legais sob pena de configuração do excesso3 Costume é a reiteração uniforme de uma conduta em face da convicção de sua obrigatoriedade Não se trata de direito assegurado em lei mas de prática consagrada em determinada coletividade por ser considerada cogente Predomina o entendimento de que o direito cujo exercício regular autoriza a exclusão da ilicitude deve estar previsto em lei José Frederico Marques contudo sustenta a possibilidade de o fato típico ser justificado pelo direito consuetudinário São suas palavras O costume legitima também certas ações ou fatos típicos É disto um exemplo o trote acadêmico em que as violências injúrias e constrangimentos que os veteranos praticam contra os noviços não se consideram atos antijurídicos em face do direito penal porque longo e reiterado costume consagra o trote como instituição legítima4 Em que pese serem causas legais de exclusão da ilicitude as diferenças são nítidas e podem ser assim apresentadas A prática de determinadas atividades esportivas pode resultar em lesões corporais e excepcionalmente até mesmo na morte de seus praticantes É o que ocorre em vários esportes tais como futebol boxe artes marciais etc O fato típico decorrente da realização de um esporte desde que respeitadas as regras regulamentares emanadas de associações legalmente constituídas e autorizadas a emitir provisões internas configura exercício regular de direito afastando a ilicitude porque o esporte é uma atividade que o Estado não somente permite mas incentiva a sua prática Todavia se o fato típico cometido pelo agente resultar da violação das regras esportivas notadamente por ultrapassar seus limites o excesso implicará na responsabilidade pelo crime doloso ou culposo Exemplo o jogador de futebol que depois de sofrer uma falta do adversário passa a agredilo com inúmeros socos e pontapés matandoo deve suportar ação penal por homicídio doloso A atividade médica ou cirúrgica é indispensável para a sociedade e por esse motivo regulamentada pelo Poder Público exigindose habilitação técnica atestada por órgãos oficiais para o seu adequado exercício Exemplificativamente o médico que efetua uma cirurgia plástica está acobertado pelo exercício regular de direito Contudo para caracterização da excludente é indispensável o consentimento do paciente ou quando incapaz ou impossibilitado de fazêlo de quem tenha qualidade para representálo pois em caso contrário estará delineado o crime de constrangimento ilegal CP art 146 No caso de cirurgia para salvar o paciente de iminente risco de vida estará o médico resguardado tanto pelo exercício regular de direito como pelo estado de necessidade dispensandose nesse último caso o consentimento da pessoa submetida ao serviço cirúrgico Flávio Augusto Monteiro de Barros explica que a intervenção médica ou cirúrgica caracteriza estado de necessidade em duas hipóteses 1 quando o leigo na ausência absoluta do médico realiza ato de medicina para salvar a vida ou saúde de outrem de perigo atual e inevitável e 2 quando o médico executa a medicina contra a vontade do paciente ou de seu representante legal para salválo de iminente perigo de vida art 146 3º I do CP5 No tocante às pessoas que se filiam à religião testemunhas de Jeová e analisando a questão sob o prisma estritamente jurídico é legítima a atuação do médico que independentemente de autorização judicial efetua a transfusão de sangue para salvar a vida do paciente ainda que sem a sua autorização se consciente e plenamente capaz ou contra a vontade de seus familiares se inconsciente ou incapaz Com efeito o direito à vida deve sobreporse às posições religiosas A propósito dispõe a deliberação do Conselho Regional de Medicina de São Paulo de 1974 a se paciente grave inconsciente e desacompanhado de familiares precisar de transfusão de sangue ela deve ser feita sem demora b se paciente grave inconsciente e acompanhado de parente que impeça a transfusão o médico deve esclarecêlo de sua necessidade e havendo relutância recorrer à autoridade policial e judicial e c se paciente lúcido se negar à transfusão deve assinar termo de responsabilidade perante autoridade policial ou judicial e o médico deve tentar tratamento alternativo Nesse caso portanto coexiste o estado de necessidade de terceiro proteção da vida humana o exercício regular de direito desempenho de profissão autorizada e incentivada pelo Estado e o estrito cumprimento de dever legal o médico precisa cumprir a deliberação emanada do Conselho a que pertence Também chamadas de ofendículos ou ofensáculas têm origem nos práticos do Direito que utilizaram a palavra para indicar a prevenção de qualquer ordem apta para ofender Apontamse comumente alguns engenhos mecânicos como o arame farpado a cerca elétrica e cacos de vidro sobre muros Cuidase de meios defensivos utilizados para a proteção da propriedade e de outros bens jurídicos tais como a segurança familiar e a inviolabilidade do domicílio O titular do bem jurídico prepara previamente o meio de defesa quando o perigo ainda é remoto e incerto e o seu funcionamento somente se dá em face de uma agressão atual ou iminente Devem ser visíveis funcionam como meio de advertência e não como forma oculta para ofender terceiras pessoas Há duas posições em doutrina acerca da espécie de excludente configurada pelas ofendículas 1 Sebastián Soler Vicenzo Manzini Giuseppe Bettiol e Aníbal Bruno se filiam à tese que sustenta tratarse de exercício regular de direito Nesse sentido é importante destacar o art 1210 1º do Código Civil O possuidor turbado ou esbulhado poderá manterse ou restituirse por sua própria força contanto que o faça logo os atos de defesa ou de desforço não podem ir além do indispensável à manutenção ou restituição da posse 2 José Frederico Marques Magalhães Noronha e Costa e Silva situam o assunto como legítima defesa preordenada alegando o último que se o aparelho está disposto de modo que só funcione no momento necessário e com a proporcionalidade a que o proprietário era pessoalmente obrigado nada impede a aplicação da legítima defesa6 São assim compreendidos os aparelhos ocultos que possuem a mesma finalidade das ofendículas Exemplo espingarda com barbante ligando seu gatilho à fechadura de uma porta a qual se aberta acarreta no disparo da arma de fogo Por serem escondidos normalmente acarretam em excesso punível doloso ou culposo A Lei 85011992 permite a utilização de cadáver não reclamado junto às autoridades públicas para estudos e pesquisas científicas desde que respeitados os requisitos por ela previstos deve ter transcorrido o prazo mínimo de 30 dias entre a data da morte e a do pedido de uso a utilização do cadáver deve ser realizada por escolas de medicina o cadáver não pode resultar de ação criminosa e o cadáver não pode ter qualquer tipo de documentação ou quando identificado não existirem informações sobre parentes ou responsáveis legais Nesse caso estará afastado eventual crime de vilipêndio ou destruição de cadáver por parte dos responsáveis pelas escolas de medicina bem como dos estudiosos em razão do exercício regular de direito 1 2 3 4 5 6 DOHNA Alexander Graf zu La estructura de la teoría del delito Trad espanhola Carlos Fontán Balestra Buenos Aires AbeledoPerrot 1958 p 47 HUNGRIA Nélson Comentários ao Código Penal Rio de Janeiro Forense 1949 v I p 469 STJ REsp 1306443SP rel Min Maria Isabel Gallotti 4ª Turma j 19112013 MARQUES José Frederico Tratado de direito penal Campinas Bookseller 1997 v II p 179 BARROS Flávio Augusto Monteiro de Direito penal Parte geral 5 ed São Paulo Saraiva 2006 p 343 COSTA E SILVA A J da Código penal anotado São Paulo RT 1943 v I p 171172 261 262 INTRODUÇÃO O Código Penal atendendo a princípios de bomsenso e de justiça estabelece em seu art 23 causas gerais de exclusão da ilicitude colocando em relação a cada uma delas os seus exatos limites Quando porém o agente ultrapassar as barreiras necessárias na prática do fato típico cuja ilicitude a eximente apaga há excesso seja no tocante à situação de necessidade à agressão repelida ao dever legal ou ainda ao exercício do direito DISPOSITIVO LEGAL E ALCANCE Depois de apresentar as causas de exclusão da ilicitude estatui o art 23 do Código Penal em seu parágrafo único O agente em qualquer das hipóteses deste artigo responderá pelo excesso doloso ou culposo A expressão em qualquer das hipóteses deste artigo indica a penalização do excesso doloso ou culposo em todas as causas legais genéricas de exclusão da ilicitude No estado de necessidade o excesso recai na expressão nem podia de outro modo evitar CP art 24 age com excesso aquele que para afastar a situação de perigo utiliza meios dispensáveis e sacrifica bem jurídico alheio Exemplo A para fugir do ataque de um cão que o persegue destrói o vidro de um veículo para nele se abrigar quando podia simplesmente homiziarse em uma casa que tinha à sua disposição Na legítima defesa o excesso se consubstancia no emprego de meios desnecessários para repelir a injusta agressão atual ou iminente ou quando 263 264 necessários os emprega imoderadamente No estrito cumprimento do dever legal o excesso resulta da não observância pelo agente dos limites determinados pela lei que lhe impõe a conduta consistente em um fato típico Exemplo o policial que cumpre um mandado de prisão pode se valer da força física para conter o sujeito procurado pela Justiça Age em excesso contudo quando agride quem já se encontra preso e não mais representa perigo à sua atuação No exercício regular de direito finalmente o excesso decorre do exercício abusivo do direito consagrado pelo ordenamento jurídico Exemplo o pai tem o direito de corrigir o comportamento do filho menor de idade inclusive com castigos moderados Se ultrapassar os limites legais responde pelo excesso nas lesões causadas à criança ou ao adolescente Antes da Reforma da Parte Geral pela Lei 72091984 o Código Penal no antigo art 21 parágrafo único admitia somente o excesso culposo na legítima defesa CONCEITO Excesso é a desnecessária intensificação de um fato típico inicialmente amparado por uma causa de justificação Pressupõe portanto uma excludente da ilicitude a qual desaparece em face de o agente desrespeitar os seus limites legalmente previstos suportando a punição pelas abusivas e inúteis lesões provocadas ao bem jurídico penalmente tutelado Exemplo a pessoa que agredida fisicamente sem risco de vida defendese moderadamente provocando lesões no ofensor age em legítima defesa e fica livre da atuação do Direito Penal Se todavia matar o seu agressor desnecessariamente por não usar moderadamente os meios necessários para a defesa responde por homicídio excesso ESPÉCIES Doloso ou consciente é o excesso voluntário e proposital O agente quer ultrapassar os parâmetros legais sabendo que assim agindo praticará um delito de natureza dolosa e por ele responderá como crime autônomo Culposo ou inconsciente é o excesso resultante de imprudência negligência ou imperícia modalidades de culpa O agente responde pelo crime culposo praticado Acidental ou fortuito é a modalidade que se origina de caso fortuito ou força maior eventos imprevisíveis e inevitáveis Cuidase de excesso penalmente irrelevante1 Exculpante é o excesso decorrente da profunda alteração de ânimo do agente isto é medo ou susto provocado pela situação em que se encontra Exemplo depois de tomar conhecimento de que está jurado de morte em sua faculdade A começa a andar armado visando se defender em caso de eventual agressão injusta Em determinada ocasião é abordado em local ermo e escuro por duas pessoas desconhecidas e assustado contra elas efetua repentinamente disparos de arma de fogo matandoas Essa espécie de excesso encontra certa dose de rejeição pela doutrina e pela jurisprudência Os concursos para ingresso no Ministério Público em geral não reconhecem essa tese sob a alegação de que não possui amparo legal e por ser vaga levaria muitas vezes à impunidade Há entendimentos contudo no sentido de que o excesso exculpante exclui a culpabilidade em razão da inexigibilidade de conduta diversa A propósito com a rubrica excesso escusável dispõe o art 45 parágrafo único do Decretolei 10011969 Código Penal Militar Não é punível o excesso quando resulta de escusável surpresa ou perturbação de ânimo em face da situação Vejase também que o art 20 6º do Código Penal Espanhol eleva o medo dependendo da situação à condição de causa de exclusão da culpabilidade Excesso intensivo ou próprio é o que se verifica quando ainda estão presentes os pressupostos das causas de exclusão da ilicitude É o caso do agente que no contexto de uma agressão injusta defendese de forma desproporcional Há superação dos limites traçados pela lei para a justificativa e o excesso assume um perfil ilícito São desse posicionamento a título ilustrativo Francisco de Assis Toledo Nélson Hungria e Alberto Silva Franco para quem citando Mir Puig Assim enquanto no excesso intensivo há um excesso em sua virtualidade lesiva ou melhor um excesso no qual o agente sobrepassa os limites impostos pela necessariedade ou pela proporcionalidade no excesso extensivo há um excesso na duração da defesa isto é a defesa se prolonga por mais tempo do que o da duração da atualidade da agressão reagese frente a uma agressão que a rigor deixou de existir2 Para os adeptos desse posicionamento o excesso extensivo é em verdade um crime autônomo situado fora do contexto fático da excludente da ilicitude A situação pode ser dividida em duas etapas 1 aquela em que estavam presentes os pressupostos da justificativa e 2 uma posterior na qual a excludente já estava encerrada em que o agente pratica outro delito desvencilhado da situação anterior Excesso extensivo ou impróprio ao contrário é aquele em que não estão mais presentes os pressupostos das causas de exclusão da ilicitude não mais existe a agressão ilícita encerrouse a situação de perigo o dever legal foi cumprido e o direito foi regularmente exercido Em seguida o agente ofende bem jurídico alheio respondendo pelo resultado dolosa ou culposamente produzido Filiamse a essa vertente dentre outros E Magalhães Noronha e Celso Delmanto que exemplifica Ao defenderse de injusta agressão o sujeito põe seu contendor desacordado e gravemente ferido após este estar caído ao solo ainda lhe causa mais uma lesão leve Embora a lesão grave esteja acobertada pela justificativa a posterior lesão leve foi excessiva e será punida por dolo caso a intenção tenha sido provocála ou por culpa se decorrente da falta de cuidado do agente3 265 1 2 3 266 1 2 3 LEGÍTIMA DEFESA E EXCESSO Nada obstante seja admitido em relação a todas as causas genéricas de exclusão da ilicitude CP art 23 parágrafo único é mais comum a configuração do excesso na legítima defesa E nessa eximente com a adoção do excesso intensivo ou próprio a intensificação desnecessária da conduta inicialmente justificada pode ocorrer em três hipóteses a teor do previsto no art 25 do Código Penal o agente usa meio desnecessário o agente usa imoderadamente o meio necessário ou o agente usa imoderadamente meios desnecessários EXEMPLO DE QUESITOS EM CRIME DE COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO JÚRI INCLUINDO O EXCESSO No julgamento dos crimes de competência do Tribunal do Júri e aqui tomaremos como exemplo um homicídio simples CP art 121 caput em que se alega como tese absolutória a legítima defesa os quesitos serão formulados da seguinte forma4 Os ferimentos descritos no exame necroscópico de fls 30 foram a causa da morte de José Carlos da Silva O acusado Pedro dos Santos no dia 10 de janeiro de 2011 por volta das 22 horas na Rua 15 de novembro n 18 Centro na cidade e comarca de São Paulo efetuou disparos de arma de fogo contra a vítima provocandolhe esses ferimentos O jurado absolve o acusado O primeiro quesito relacionase com a materialidade do fato e o segundo diz respeito à autoria ou participação no crime CPP art 483 I e II A resposta negativa de mais de 3 três jurados a qualquer desses quesitos encerra a votação e implica a absolvição do acusado CPP art 483 1º Respondidos afirmativamente por mais de 3 três jurados os dois primeiros quesitos será formulado um terceiro com a seguinte redação O jurado absolve o acusado CPP art 483 2º Destarte todas as teses defensivas pertinentes à absolvição exceto as relativas à materialidade do fato e à autoria ou participação devem ser sopesadas pelos jurados quando da votação do terceiro quesito aí se incluindo as causas de exclusão da ilicitude tal como a legítima defesa Portanto se os jurados desejarem reconhecer a excludente é necessária a resposta sim absolvendo o réu Nesse caso ao contrário do que ocorria anteriormente à reforma do rito do Tribunal do Júri pela Lei 116892008 somente será permitida a quesitação do excesso culposo e desde que requerido expressamente pela defesa Com efeito atualmente os jurados se limitam a absolver o acusado terceiro quesito não se sabendo por qual motivo isto é se pelas razões alegadas pela defesa ou por outro fundamento qualquer exemplo absolvição por piedade ou por não acreditar na ressocialização pelo sistema prisional E se responderem afirmativamente ao terceiro quesito o réu estará definitivamente absolvido Em outras palavras decidiram os jurados que o acusado deve ficar livre da punição estatal não se podendo falar em excesso doloso Logo o excesso doloso não poderá ser objeto de um quarto quesito Se foi absolvido é porque não houve excesso Além disso estatui o art 483 3º do Código de Processo Penal com a redação dada pela Lei 116892008 Decidindo os jurados pela condenação o julgamento prossegue Fica claro portanto que se os jurados decidirem pela condenação será possível a indagação do excesso culposo Como diz a lei o julgamento prossegue Em síntese o Conselho de Sentença acolheu a tese sustentada pela acusação inclusive o excesso doloso que jamais será alegado pela defesa Por outro lado se os jurados decidirem pela absolvição a votação estará encerrada isto é a eles não poderá ser endereçado mais nenhum outro quesito nem mesmo no tocante ao excesso doloso De fato a interpretação do dispositivo legal permite a conclusão de que nessa hipótese o julgamento não prossegue O réu está absolvido e nada mais há a discutir Na linha da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça Suscitada a legítima defesa como única tese defensiva perante o Conselho de Sentença caso mais de três jurados respondam afirmativamente ao terceiro quesito O jurado absolve o acusado o Juiz Presidente do Tribunal do Júri deve encerrar o julgamento e concluir pela absolvição do réu não podendo submeter à votação quesito sobre eventual excesso doloso alegado pela acusação Na atual sistemática do Tribunal do Júri o CPP não prevê quesito específico sobre a legítima defesa Após a Lei 116892008 foram unificadas teses defensivas em um único quesito obrigatório art 483 inciso III do CPP Ao concentrar diversas teses absolutórias nesta questão O jurado absolve o acusado o legislador buscou impedir que os jurados fossem indagados sobre aspectos técnicos Nessa perspectiva declarada a absolvição pelo Conselho de Sentença prosseguir no julgamento para verificar se houve excesso doloso constituiu constrangimento manifestamente ilegal ao direito ambulatorial do acusado Caracteriza ademais ofensa à garantia da plenitude de defesa pois o novo sistema permite justamente que o jurado possa absolver o réu baseado unicamente em sua livre convicção e de forma independente das teses defensivas5 Se porém a defesa sustentar a legítima defesa como tese principal e subsidiariamente o excesso culposo e o réu for condenado no terceiro quesito isto é restar rejeitada a legítima defesa o juiz deverá continuar a votação para que o júri decida se houve ou não excesso culposo o julgamento prossegue Essa indagação deverá ser feita logo após o terceiro quesito uma vez que o acolhimento da referida tese importa desclassificação para crime culposo Exemplo 4 Ao efetuar os disparos de arma de fogo quando a vítima já se encontrava caída o acusado excedeu culposamente os limites da legítima defesa Negada pelos jurados a ocorrência de excesso culposo será o caso de condenação por crime doloso passandose à votação dos demais quesitos se for o caso na forma prevista no art 483 3º do Código de Processo Penal De fato se os jurados não absolveram o acusado quando alegada a legítima defesa e também afastaram o excesso culposo é porque entenderam tratarse de crime praticado a título de dolo 1 2 3 4 5 FRANCO Alberto Silva STOCO Rui MARREY Adriano Teoria e prática do júri 6 ed São Paulo RT 1997 p 489 FRANCO Alberto Silva STOCO Rui Código penal e sua interpretação jurisprudencial Parte geral 7 ed São Paulo RT 2001 v 1 p 372 DELMANTO Celso Código penal comentado 3 ed 8ª tiragem Rio de Janeiro Renovar 1994 p 45 A sistemática do Tribunal do Júri incluindo todo o seu procedimento foi substancialmente alterada pela Lei 116892008 HC 190264PB rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 26082014 noticiado no Informativo 545 1 Em uma concepção clássica causalista causal ou mecanicista da conduta dolo e culpa se alojam no interior da culpabilidade Destarte com a finalidade de evitar a responsabilidade penal objetiva a culpabilidade é elemento do crime Portanto em um sistema causalista o conceito analítico do crime é necessariamente tripartido Em suma crime na visão clássica da conduta é obrigatoriamente Fato típico e ilícito praticado por agente culpável Em uma ótica finalista por outro lado o dolo e a culpa foram retirados da culpabilidade culpabilidade vazia e transferidos para o interior da conduta Esse fenômeno possibilitou analisar o crime no campo analítico por dois critérios distintos tripartido e bipartido No conceito tripartido crime é também o fato típico e ilícito praticado por agente culpável A culpabilidade continua a constituirse em elemento do crime Diferese todavia da visão clássica porque agora o dolo e a culpa vale repetir encontramse na conduta e não mais na culpabilidade Por sua vez de acordo com o conceito bipartido crime é o fato típico e ilícito A culpabilidade deixa de funcionar como elemento constitutivo do crime e passa a ser compreendida como pressuposto de aplicação da pena Logo no sistema finalista o crime pode ser definido como Conceito tripartido fato típico e ilícito praticado por agente culpável sendo a culpabilidade elemento do crime ou 2 Conceito bipartido fato típico e ilícito a culpabilidade não integra o crime mas funciona como pressuposto para aplicação da pena Fica claro pois que somente para a teoria finalista da conduta o conceito analítico de crime pode ser tripartido ou bipartido Para os seguidores do sistema clássico ou causal o crime deve ser analisado obrigatoriamente em um conceito tripartido sob pena de configuração da responsabilidade penal objetiva Culpabilidade é o juízo de censura o juízo de reprovabilidade que incide sobre a formação e a exteriorização da vontade do responsável por um fato típico e ilícito com o propósito de aferir a necessidade de imposição de pena A culpabilidade pode ser encarada como elemento do crime tanto para um simpatizante do sistema clássico como também para um partidário do sistema finalista desde que se adote um conceito tripartido de crime Para os adeptos do finalismo bipartido contudo a culpabilidade funciona como pressuposto de aplicação da pena e não como elemento do crime Em um Estado Democrático de Direito deve imperar um direito penal do fato e jamais um direito penal do autor conforme mencionamos no capítulo 2 item 2216 desta obra Com efeito o Direito Penal deve se preocupar com a punição de autores de fatos típicos e ilícitos e não em rotular pessoas Assim sendo o juízo de culpabilidade recai sobre o autor para analisar se ele deve ou não suportar uma pena em razão do fato cometido isto é como decorrência da prática de uma infração penal O agente é punido em razão do comportamento que realizou ou deixou de realizar e não pela condição de ser quem ele é 2751 É a culpabilidade que diferencia a conduta do ser humano normal e apto ao convívio social dotado de conhecimento do caráter ilícito do fato típico livremente cometido do comportamento realizado por portadores de doenças mentais bem como de pessoas com desenvolvimento mental incompleto ou retardado e também dos atos de seres irracionais ou de pessoas que não possuem consciência do caráter ilícito do fato típico praticado ou não têm como agir de forma diversa Aqueles devem ser punidos pois tinham a possibilidade de respeitar o sistema jurídico e evitar resultados ilícitos estes não Consequentemente a análise da presença ou não da culpabilidade leva em conta o perfil subjetivo do agente e não a figura do homem médio reservado ao fato típico e à ilicitude O Código Penal não apresenta e jamais apresentou o conceito de culpabilidade Essa tarefa é da doutrina que ao longo dos tempos formulou diversas teorias Vejamos Teoria psicológica Para essa teoria idealizada por Franz von Liszt e Ernst von Beling e intimamente relacionada ao desenvolvimento da teoria clássica da conduta o pressuposto fundamental da culpabilidade é a imputabilidade compreendida como a capacidade do ser humano de entender o caráter ilícito do fato e de determinarse de acordo com esse entendimento A culpabilidade que tem como pressuposto a imputabilidade é definida como o vínculo psicológico entre o sujeito e o fato típico e ilícito por ele praticado Esse vínculo pode ser representado tanto pelo dolo como pela culpa Dolo e culpa são espécies da culpabilidade pois são as formas concretas pelas quais pode se revelar o vínculo psicológico entre o autor e a conduta praticada Além disso o dolo é normativo ou seja guarda em seu interior a 1 2 consciência da ilicitude ver capítulo 12 item 124 E se a imputabilidade é pressuposto da culpabilidade somente se analisa a presença do dolo ou da culpa se o agente for imputável isto é maior de 18 anos de idade e mentalmente sadio Essa teoria somente é aplicável no campo da teoria clássica da conduta em que o dolo e a culpa integram a culpabilidade Dentre as principais críticas a ela endereçadas podem ser destacadas a impossibilidade em resolver as situações de inexigibilidade de conduta diversa notadamente a coação moral irresistível e a obediência hierárquica à ordem não manifestamente ilegal Nesses casos o sujeito age com dolo mas o crime não pode ser a ele imputado pois somente é punido o autor da coação ou da ordem CP art 22 Também não consegue explicar a culpa inconsciente sem previsão pois aqui não existe nenhum vínculo psicológico entre o autor e o fato por ele praticado que sequer foi previsto Essa teoria não é atualmente aceita pois a culpabilidade não pode ser um mero e frágil vínculo psicológico Existem outros fatores que devem ser utilizados para a sua constatação o que não se admite no contexto da teoria psicológica Confiramse dois clássicos exemplos fornecidos por Reinhart Frank1 Um carteiro assolado pela custosa enfermidade de sua esposa reforçada pelas necessidades vitais insatisfeitas de sua numerosa prole apropriase de valores alheios e O caixa de um banco se apropria de igual numerário com o objetivo de agradar suas amantes consumistas já habituadas a receber presentes luxuosos Com a aplicação da teoria psicológica seria forçoso reconhecer que ambos são imputáveis e atuaram dolosamente E configurada a culpabilidade ao carteiro e ao caixa bancário devem ser impostas iguais penas conclusão que imediatamente deve ser rechaçada por postulados de equidade e de justiça pois enquanto o último agiu por mero luxo e prazer do primeiro era 2752 inexigível conduta diversa São elementos do crime na órbita da teoria psicológica da culpabilidade Teoria normativa ou psicológiconormativa Surge em 1907 com a proposta de Reinhart Frank a teoria normativa relacionando a culpabilidade com a exigibilidade de conduta diversa A culpabilidade deixa de ser um fenômeno puramente natural de cunho psicológico pois a ela se atribui um novo elemento estritamente normativo inicialmente chamado de normalidade das circunstâncias concomitantes e posteriormente de motivação normal atualmente definido como exigibilidade de conduta diversa O conceito de culpabilidade assume um perfil complexo constituído por elementos naturalísticos vínculo psicológico representado pelo dolo ou pela culpa e normativos normalidade das circunstâncias concomitantes ou motivação normal Sua estrutura passa a ser composta por três elementos imputabilidade dolo ou culpa e exigibilidade de conduta diversa A imputabilidade deixa de ser pressuposto da culpabilidade para funcionar como seu elemento Em resumo somente é culpável o agente maior de 18 anos de idade e mentalmente sadio imputabilidade que age com dolo ou com culpa e que no caso concreto podia comportarse em conformidade com o Direito é dizer praticou o crime quando tinha a faculdade de agir licitamente Afastase a culpabilidade quando não se podia exigir do sujeito um comportamento conforme o ordenamento jurídico Nesse sentido a culpabilidade pode ser definida como o juízo de 2753 reprovabilidade que recai sobre o autor de um fato típico e ilícito que poderia ter sido evitado Essa teoria não eliminou da culpabilidade o vínculo psicológico dolo ou culpa que une o autor imputável ao fato por ele praticado Mas a reforçou com a exigibilidade de conduta diversa O dolo permanece normativo aloja em seu bojo a consciência da ilicitude isto é o conhecimento acerca do caráter ilícito do fato Essa teoria representou à época um grande avanço frente à teoria psicológica Soçobrou com a superveniência da teoria finalista que a fulminou por duas razões principais 1 manutenção do dolo e da culpa como elementos da culpabilidade e 2 tratamento do dolo normativo possuindo em seu interior a consciência atual da ilicitude Sua aplicação é restrita ao âmbito da teoria causal causalista ou mecanicista da conduta pois nela o dolo e a culpa compõem a culpabilidade Mas como houve uma profunda alteração na estrutura da culpabilidade e consequentemente do conceito analítico de crime alguns autores sustentam que a teoria normativa ou psicológiconormativa inaugurou o sistema neoclássico no Direito Penal substituindo o sistema clássico caracterizado principalmente pela teoria psicológica da culpabilidade2 Para essa teoria a estrutura do crime é a seguinte Teoria normativa pura Essa teoria surge nos idos de 1930 com o finalismo penal de Hans Welzel e dele é inseparável Em outras palavras a adoção da teoria normativa pura da culpabilidade somente é possível em um sistema finalista É chamada de normativa pura porque os elementos psicológicos dolo e culpa que existiam nas teorias psicológica e psicológiconormativa da culpabilidade foram transferidos pelo finalismo penal para o fato típico alojandose no interior da conduta Dessa forma a culpabilidade se transforma em um simples juízo de reprovabilidade que incide sobre o responsável pela prática de um fato típico e ilícito O dolo passa a ser natural isto é sem a consciência da ilicitude Com efeito o dolo é levado para a conduta deixando a consciência da ilicitude na culpabilidade Aquele vai para o fato típico esta permanece no local em que estava Além disso a consciência da ilicitude que no sistema clássico era atual isto é deveria estar efetivamente presente no caso concreto passa a ser potencial ou seja bastava tivesse o agente na situação real a possibilidade de conhecer o caráter ilícito do fato praticado com base em um juízo comum Portanto com o acolhimento da teoria normativa pura possível somente em um sistema finalista o conceito analítico de crime passa a ser composto pelos seguintes elementos Esses elementos constitutivos da culpabilidade estão ordenados hierarquicamente de tal modo que o segundo pressupõe o primeiro e o terceiro depende dos anteriores De fato se o indivíduo é inimputável não pode ter a potencial consciência da ilicitude E se não tem a potencial consciência da ilicitude não lhe pode ser exigível conduta diversa A teoria normativa pura da culpabilidade subdividese em outras duas a saber a extremada extrema ou estrita e b limitada Em ambas as vertentes a estrutura da culpabilidade é idêntica ou seja seus elementos são a imputabilidade a potencial consciência da ilicitude e a exigibilidade de conduta diversa A distinção entre elas repousa unicamente no tratamento dispensado às descriminantes putativas Nas descriminantes putativas o agente incidindo em erro supõe situação fática ou jurídica que se existisse tornaria sua ação legítima Para a teoria normativa pura em sua variante extremada extrema ou estrita as descriminantes putativas sempre caracterizam erro de proibição Por sua vez para a teoria normativa pura em sua faceta limitada as descriminantes putativas podem caracterizar erro de proibição ou erro de tipo a depender das peculiaridades do caso concreto3 Em que pese ferrenha discussão doutrinária acerca do assunto é possível afirmar que o Código Penal em vigor acolheu a teoria normativa pura em sua vertente limitada É o que se extrai do tratamento do erro arts 20 e 214 Confirase a propósito o item 19 da Exposição de Motivos da Nova Parte Geral do Código Penal Repete o Projeto as normas do Código de 1940 pertinentes às denominadas descriminantes putativas Ajustase assim o Projeto à teoria limitada da culpabilidade que distingue o erro incidente sobre os pressupostos fáticos de uma causa de justificação do que incide sobre a norma permissiva grifamos Uma corrente doutrinária capitaneada por Günther Jakobs sustenta um conceito funcional de culpabilidade Tratase de proposta consistente em substituir a culpabilidade fundada em um juízo de reprovabilidade por necessidades reais ou supostas de prevenção5 Pretendese que em vez de questionar se o autor do fato podia atuar de outro modo perguntese em face das finalidades da pena é necessário ou não tornálo responsável pela violação do ordenamento jurídico Essa teoria portanto retira o elevado valor atribuído ao livre arbítrio do ser humano e busca vincular o conceito de culpabilidade ao fim de prevenção geral da pena e também à política criminal do Estado A culpabilidade representa uma falta de fidelidade do sujeito no tocante ao ordenamento jurídico que deve ser a qualquer custo respeitado Sua autoridade somente se atinge com a reiterada aplicação da norma penal necessária para alcançar a finalidade de prevenção geral do Direito Penal Nas palavras de Jakobs Punese para manter a confiança geral na norma para exercitar o reconhecimento geral da norma Com relação a este fim da pena o conceito de culpabilidade não deve ser orientado tendo em vista o futuro mas sim o presente na medida em que o Direito Penal funciona é dizer contribui para estabilizar o ordenamento6 São terminologias também criadas por Günther Jakobs com o escopo de justificar um tipo total de culpabilidade em sintonia com o seu conceito funcional Para ele a culpabilidade pressupõe o injusto fato típico e ilícito e seu autor só é responsável pelo déficit de motivação jurídica se ao tempo do fato era imputável É o que chama de tipo positivo de culpabilidade7 Por sua vez o tipo negativo de culpabilidade referese à inexigibilidade do comportamento Assim ao fato típico e ilícito praticado apenas será atribuída a culpabilidade ao agente quando não tiver atuado com ânimo exculpante ou então em um contexto exculpante Para o penalista alemão a obediência à norma é inexigível quando a motivação ilícita do autor imputável e que não respeita o fundamento de validade da norma se pode explicar por uma situação que para o autor constituise em uma desgraça e que também em geral se pode definir como desgraça ou então se pode imputála a terceira pessoa8 Todo ser humano atua em sociedade em circunstâncias determinadas e com limites de comportamento também determinados Como há desigualdades sociais a personalidade do agente é moldada em consonância com as oportunidades oferecidas a cada indivíduo para orientar se ou não em sintonia com o ordenamento jurídico Entra em cena a chamada coculpabilidade assim definida por Zaffaroni e Pierangeli Todo sujeito age numa circunstância determinada e com um âmbito de autodeterminação também determinado Em sua própria personalidade há uma contribuição para esse âmbito de autodeterminação posto que a sociedade por melhor organizada que seja nunca tem a possibilidade de brindar a todos os homens com as mesmas oportunidades Em consequência há sujeitos que têm um menor âmbito de autodeterminação condicionado desta maneira por causas sociais Não será possível atribuir estas causas sociais ao sujeito e sobrecarregálo com elas no momento de reprovação de culpabilidade Costumase dizer que há aqui uma coculpabilidade com a qual a própria sociedade deve arcar9 Para esses autores essa carga de valores sociais negativos deve ser considerada em prol do réu uma atenuante inominada na forma prevista no art 66 do Código Penal Com efeito a teoria da coculpabilidade aponta a parcela de responsabilidade social do Estado pela não inserção social e portanto devendo também suportar o ônus do comportamento desviante do padrão normativo por parte dos atores sociais sem cidadania plena que possuem uma menor autodeterminação diante das concausas socioeconômicas da criminalidade urbana e rural O art 66 do Código Penal brasileiro dá ao juiz uma ferramenta para atenuar a resposta penal à desigualdade social de oportunidades a pena poderá ser ainda atenuada em razão de circunstância relevante anterior ou posterior ao crime embora não prevista expressamente em lei10 O Superior Tribunal de Justiça não tem admitido a aplicação da teoria da coculpabilidade A teoria da coculpabilidade invocada pelo impetrante no lugar de explicitar a responsabilidade moral a reprovação da conduta ilícita e o louvor à honestidade fornece uma justificativa àqueles que apresentam inclinação para a vida delituosa estimulandoos a afastar da consciência 2791 mesmo que em parte a culpa por seus atos11 Coculpabilidade às avessas Na sequência da teoria da coculpabilidade surgiu a coculpabilidade às avessas desenvolvida em duas perspectivas fundamentais12 Vejamos Em primeiro lugar esta linha de pensamento diz respeito à identificação crítica da seletividade do sistema penal e à incriminação da própria vulnerabilidade Em outras palavras o Direito Penal direciona seu arsenal punitivo contra os indivíduos mais frágeis normalmente excluídos da vida em sociedade e das atividades do Estado Por esta razão estas pessoas se tornam as protagonistas da aplicação da lei penal a maioria dos acusados em ações penais são homens e mulheres que não tiveram acesso ao lazer à cultura à educação eles também compõem com intensa densidade o ambiente dos estabelecimentos penais No entanto não é só A coculpabilidade às avessas também envolve a reprovação penal mais severa no tocante aos crimes praticados por pessoas dotadas de elevado poder econômico e que abusam desta vantagem para a execução de delitos tributários econômicos financeiros contra a Administração Pública etc em regra prevalecendose das facilidades proporcionadas pelo livre trânsito nas redes de controle político e econômico Cuidase da face inversa da coculpabilidade se os pobres excluídos e marginalizados merecem um tratamento penal mais brando porque o caminho da ilicitude lhes era mais atrativo os ricos e poderosos não têm razão nenhuma para o cometimento de crimes São movidos pela vaidade por desvios de caráter e pela ambição desmedida justificando a imposição da pena de modo severo Contudo é importante destacar que se de um lado a coculpabilidade poderia ao menos em tese ser admitida como atenuante genérica inominada com fundamento no art 66 do Código Penal a coculpabililidade às avessas não pode ser compreendida como agravante genérica por duas razões a falta de previsão legal e b em se tratando de matéria prejudicial ao acusado não há espaço para a analogia in malam partem Destarte a punição mais rígida deverá ser alicerçada unicamente na pena base levando em conta as circunstâncias judiciais desfavoráveis conduta social personalidade do agente motivos circunstâncias e consequências do crime com fulcro no art 59 caput do Código Penal Culpabilidade formal é a definida em abstrato ou seja o juízo de reprovabilidade realizado em relação ao provável autor de um fato típico e ilícito se presentes os elementos da culpabilidade no momento em que o legislador incrimina uma conduta Serve pois para o legislador cominar os limites mínimo e máximo da pena atribuída a determinada infração penal Assim quando criados dois tipos incriminadores um crime contra a honra e um crime doloso contra a vida por exemplo o legislador considera formalmente duas culpabilidades uma maior para o crime mais grave doloso contra a vida e outra mais branda para o crime contra a honra Já a culpabilidade material é estabelecida em concreto dirigida a um agente culpável que cometeu um fato típico e ilícito Destinase portanto ao magistrado colaborando com a aplicação concreta da pena A maior ou menor culpabilidade do autor da infração penal constituise em circunstância judicial destinada à dosimetria da pena em compasso com as regras estatuídas pelo art 59 caput do Código Penal Influem portanto na quantidade da pena a ser concretamente aplicada São assim chamadas as causas de exclusão da culpabilidade Podem ser sintetizadas pelo gráfico a seguir Excludentes dos elementos da culpabilidade Imputabilidade Potencial consciência da ilicitude Exigibilidade de conduta diversa Doença mental Desenvolvimento mental retardado Desenvolvimento mental incompleto Embriaguez acidental completa Erro de proibição inevitável ou escusável Coação moral irresistível Obediência hierárquica à ordem não manifestamente ilegal 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 FRANK Reinhart Sobre la estructura del concepto de culpabilidad Buenos Aires B de F 2004 p 28 Embora esse período tenha se iniciado com os estudos de Reinhart Frank em 1907 também se atribui grande importância aos trabalhos de Max Ernst Mayer e Edmund Mezger A propósito este último penalista alemão é apontado como o grande nome do sistema neoclássico em face da publicação do seu Tratado de Direito Penal Nesse sentido Derecho penal Parte general Fundamentos La estructura de la teoría del delito Trad espanhola DiegoManuel Luzón Peña Miguel Díaz y García Conlledo e Javier de Vicente Remensal Madrid Civitas 2006 t I 9198 Essa matéria encontrase detalhadamente abordada no item 158 TOLEDO Francisco de Assis Princípios básicos de direito penal 5 ed 13 tir São Paulo Saraiva 2007 p 230 STRATENWERTH Günter Derecho penal Parte general I El hecho punible Trad Manuel Cancio Meliá e Marcelo A Sancinetti Buenos Aires 2005 p 275 JAKOBS Günther Derecho penal Parte general Fundamentos y teoría de la imputación Trad espanhola de Joaquin Cuello Contreras e Jose Luis Serrano Gonzales de Murillo 2 ed Madrid Marcial Pons 1997 p 581 Idem ibidem p 598 Idem p 601 ZAFFARONI Eugenio Raúl PIERANGELI José Henrique Manual de direito penal brasileiro Parte geral 7 ed São Paulo RT 2007 v 1 p 525 COSTA Álvaro Mayrink da Direito penal volume 1 parte geral 8 ed Rio de Janeiro Forense 2009 p 12051206 HC 172505MG rel Min Gilson Dipp 5ª Turma j 31052011 Em igual sentido HC 187132MG rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 05022013 Para o estudo aprofundado do tema é recomendável a leitura de MOURA Grégore Moreira de Do princípio da coculpabilidade no direito penal Niterói Impetus 2006 281 282 INTRODUÇÃO A Parte Geral do Código Penal de 1940 antes da entrada em vigor da Lei 72091984 cuidava dessa disciplina dentro do título Da responsabilidade Essa opção sempre foi muito criticada pois a responsabilidade penal não é elemento da culpabilidade e sim sua consequência ou seja um sujeito culpável envolvido em um fato típico e ilícito deve ser punido pelo Estado Atualmente o Título III da Parte Geral do Código Penal cuida nos arts 26 a 28 da imputabilidade penal CONCEITO A imputabilidade penal é um dos elementos da culpabilidade Mas qual é o seu conceito O Código Penal acompanhou a tendência da maioria das legislações modernas e optou por não definila Limitouse a apontar as hipóteses em que a imputabilidade está ausente ou seja os casos de inimputabilidade penal art 26 caput art 27 e art 28 1º Contudo as notas características da inimputabilidade fornecem ainda que indiretamente o conceito de imputabilidade é a capacidade mental inerente ao ser humano de ao tempo da ação ou da omissão entender o caráter ilícito do fato e de determinarse de acordo com esse entendimento Dessa forma a imputabilidade penal depende de dois elementos 1 intelectivo é a integridade biopsíquica consistente na perfeita saúde mental que permite ao indivíduo o entendimento do caráter ilícito do fato e 2 volitivo é o domínio da vontade é dizer o agente controla e comanda seus 283 284 1 impulsos relativos à compreensão do caráter ilícito do fato determinandose de acordo com esse entendimento Esses elementos devem estar simultaneamente presentes pois na falta de um deles o sujeito será tratado como inimputável O Brasil adotou um critério cronológico Toda pessoa a partir do início do dia em que completa 18 anos de idade presumese imputável MOMENTO PARA CONSTATAÇÃO DA IMPUTABILIDADE O art 26 caput do Código Penal é claro a imputabilidade deve ser analisada ao tempo da ação ou da omissão Considerase portanto a prática da conduta Qualquer alteração posterior nela não interfere produzindo apenas efeitos processuais1 Esta imposição constituise em desdobramento lógico da teoria da atividade adotada pelo art 4º do Código Penal no tocante ao tempo do crime Consequentemente se ao tempo da conduta o réu era imputável a superveniência de doença mental não altera esse quadro O réu deve ser tratado como imputável limitandose a nova causa a suspender o processo até o seu restabelecimento É o que dispõe o art 152 caput do Código de Processo Penal SISTEMAS OU CRITÉRIOS PARA IDENTIFICAÇÃO DA INIMPUTABILIDADE Como já mencionado ao completar 18 anos de idade todo ser humano presumese imputável Essa presunção todavia é relativa iuris tantum pois admite prova em contrário E para a aferição da inimputabilidade existem três sistemas ou critérios Biológico basta para a inimputabilidade a presença de um problema mental representado por uma doença mental ou então por desenvolvimento mental incompleto ou retardado É irrelevante tenha o sujeito no caso concreto se mostrado lúcido ao tempo da prática da infração penal para entender o caráter ilícito do fato e determinarse de 2 3 acordo com esse entendimento O decisivo é o fator biológico a formação e o desenvolvimento mental do ser humano Esse sistema atribui demasiado valor ao laudo pericial pois se o auxiliar da Justiça apontasse um problema mental o magistrado nada poderia fazer Seria presumida a inimputabilidade de forma absoluta iuris et de iure Psicológico para esse sistema pouco importa se o indivíduo apresenta ou não alguma deficiência mental Será inimputável ao se mostrar incapacitado de entender o caráter ilícito do fato ou de determinarse de acordo com esse entendimento Seu inconveniente é abrir espaço para o desmedido arbítrio do julgador pois competiria exclusivamente ao magistrado decidir sobre a imputabilidade do réu Biopsicológico resulta da fusão dos dois anteriores é inimputável quem ao tempo da conduta apresenta um problema mental e em razão disso não possui capacidade para entender o caráter ilícito do fato ou determinarse de acordo com esse entendimento Esse sistema conjuga as atuações do magistrado e do perito Este perito trata da questão biológica aquele juiz da psicológica A presunção de imputabilidade é relativa iuris tantum após os 18 anos todos são imputáveis salvo prova pericial em sentido contrário revelando a presença de causa mental deficiente bem como o reconhecimento de que por tal motivo o agente não tinha ao tempo da conduta capacidade para entender o caráter ilícito do fato ou de determinarse de acordo com esse entendimento O Código Penal em seu art 26 caput acolheu como regra o sistema biopsicológico ao estabelecer que Art 26 É isento de pena o agente que por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado era ao tempo da ação ou da omissão inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinarse de acordo com esse entendimento Excepcionalmente entretanto foi adotado o sistema biológico no tocante aos menores de 18 anos CF art 228 e CP art 27 bem como o sistema psicológico em relação à embriaguez completa proveniente de caso fortuito 285 286 ou força maior CP art 28 1º CAUSAS DE INIMPUTABILIDADE O Código Penal apresenta como causas de inimputabilidade menoridade art 27 doença mental art 26 caput desenvolvimento mental incompleto arts 26 caput e 27 desenvolvimento mental retardado art 26 caput e embriaguez completa proveniente de caso fortuito ou força maior art 28 1º MENORIDADE Em relação aos menores de 18 anos de idade adotouse o sistema biológico para a constatação da inimputabilidade Tais pessoas independentemente da inteligência da perspicácia e do desenvolvimento mental são tratadas como inimputáveis Podem inclusive ter concluído uma faculdade ou já trabalharem com anotação em carteira de trabalho e previdência social A presunção de inimputabilidade é absoluta iuris et de iure decorrente do art 228 da Constituição Federal2 e do art 27 do Código Penal3 e não admite prova em sentido contrário Nos termos da Súmula 74 do Superior Tribunal de Justiça a prova da menoridade deve ser feita por documento hábil Esse documento pode mas não deve ser necessariamente a certidão de nascimento Serve qualquer documento de identidade certidão de batismo carteira escolar etc4 O menor de 18 anos civilmente emancipado continua no campo penal inimputável A capacidade ou incapacidade civil não se confunde com a imputabilidade penal5 1 2 Muito se discute sobre a possibilidade da diminuição da maioridade penal e qual seria o instrumento necessário para tanto visando considerar imputáveis as pessoas a partir de idade inferior a 18 anos Recordese que os menores de 18 anos são inimputáveis por expressa determinação constitucional art 228 Sobre o assunto há duas posições A redução da maioridade penal somente seria possível com o advento de uma nova Constituição Federal fruto do Poder Constituinte Originário A maioridade penal constituise em cláusula pétrea implícita referente ao direito fundamental de todo menor de 18 anos de não ser processado julgado e condenado pela Justiça comum É suficiente uma emenda constitucional por não se tratar de cláusula pétrea mas de norma constitucional inserida no capítulo inerente à família à criança ao adolescente e ao idoso A propósito já foram apresentadas diversas propostas de Emenda Constitucional nesse sentido mas até agora nenhuma delas foi aprovada Crimes permanentes são aqueles em que a consumação se prolonga no tempo por vontade do agente Nesses casos é possível seja uma conduta iniciada quando a pessoa ainda é menor de 18 anos de idade e somente se encerre quando atingida a maioridade penal Exemplo A com 17 anos de idade pratica extorsão mediante sequestro contra B mantendoo em cativeiro por diversos meses período no qual completa 18 anos de idade6 O agente poderá ser responsabilizado criminalmente pelos atos praticados após o início da sua imputabilidade penal Se o adolescente entretanto praticou um ato infracional equiparado a delito de natureza instantânea a superveniência da maioridade não autoriza sua responsabilização na esfera penal Nada obstante admitese a imposição 287 de medida socioeducativa pela justiça especializada Vara da Infância e da Juventude Como estabelece a Súmula 605 do STJ A superveniência da maioridade penal não interfere na apuração de ato infracional nem na aplicabilidade de medida socioeducativa em curso inclusive na liberdade assistida enquanto não atingida a idade de 21 anos Dispõe o art 50 do Código Penal Militar Art 50 O menor de 18 dezoito anos é inimputável salvo se já tendo completado 16 dezesseis anos revela suficiente desenvolvimento psíquico para entender o caráter ilícito do fato e determinarse de acordo com esse entendimento Neste caso a pena aplicável é diminuída de 13 um terço até a 12 metade A ressalva relativa aos maiores de 16 anos não foi recepcionada pela Constituição Federal a teor do seu art 228 INIMPUTABILIDADE POR DOENÇA MENTAL A expressão doença mental deve ser interpretada em sentido amplo englobando os problemas patológicos e também os de origem toxicológica Ingressam nesse rol doença mental todas as alterações mentais ou psíquicas que suprimem do ser humano a capacidade de entender o caráter ilícito do fato e de determinarse de acordo com esse entendimento A doença mental pode ser permanente ou transitória como é o caso do delírio febril Deve contudo existir ao tempo da prática da conduta para acarretar no afastamento da imputabilidade Além disso não é necessário que emane de enfermidade mental pois há enfermidades físicas que atingem o aspecto psicológico do indivíduo São exemplos disso os surtos dos tifoides e os delírios decorrentes de graves pneumonias A inimputabilidade penal é aferida com base em um critério 288 a b c 289 biopsicológico Não basta a presença de um problema mental Exigese ainda que em razão dele o sujeito seja incapaz ao tempo da conduta de entender o caráter ilícito do fato ou de determinarse de acordo com esse entendimento Logo se ao tempo da conduta o indivíduo nada obstante seja portador de problema mental apresentar lucidez será tratado como imputável Concluise pois que os doentes mentais durante os intervalos de lucidez são penalmente imputáveis INIMPUTABILIDADE POR DESENVOLVIMENTO MENTAL INCOMPLETO O desenvolvimento mental incompleto abrange os menores de 18 anos e os indígenas Para os menores de 18 anos de idade a regra é inócua pois deles já cuidam o art 228 da Constituição Federal e o art 27 do Código Penal Os índios por outro lado nem sempre serão inimputáveis Essa situação depende do grau de assimilação dos valores sociais a ser revelado pelo exame pericial Destarte dependendo da conclusão da perícia o indígena pode ser imputável se integrado à vida em sociedade semiimputável no caso de estar dividido entre o convívio na tribo e na sociedade e inimputável quando completamente incapaz de viver em sociedade desconhecendo as regras que lhe são inerentes INIMPUTABILIDADE POR DESENVOLVIMENTO MENTAL RETARDADO Desenvolvimento mental retardado é o que não se compatibiliza com a fase da vida em que se encontra determinado indivíduo resultante de alguma condição que lhe seja peculiar A pessoa não se mostra em sintonia com os demais indivíduos que possuem sua idade cronológica De fato o retardo mental é uma condição de desenvolvimento a b c 2810 interrompido ou incompleto da mente especialmente caracterizada por um comprometimento de habilidades manifestadas durante o período de desenvolvimento as quais contribuem para o nível global da inteligência isto é aptidões cognitivas de linguagem motoras e sociais7 A expressão desenvolvimento mental retardado compreende as oligofrenias em suas mais variadas manifestações idiotice imbecilidade e debilidade mental propriamente dita bem como as pessoas que por ausência ou deficiência dos sentidos possuem deficiência psíquica como se dá com o surdomudo O surdomudo não é automaticamente inimputável Pelo contrário pois completados 18 anos de idade todos se presumem imputáveis Compete à perícia indicar o grau de prejuízo a ele causado por essa falha biológica Podem ocorrer três situações distintas se ao tempo da ação ou da omissão era capaz de entender o caráter ilícito do fato e de determinarse de acordo com esse entendimento será considerado imputável se ao tempo da ação ou da omissão não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinarse de acordo com esse entendimento será considerado semiimputável CP art 26 parágrafo único e se ao tempo da ação ou da omissão era inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinarse de acordo com esse entendimento será considerado inimputável CP art 26 parágrafo único A PERÍCIA MÉDICA Salvo no tocante aos menores de 18 anos critério biológico o Direito Penal brasileiro acolheu o sistema biopsicológico para verificação da inimputabilidade o juiz afere a parte psicológica reservandose à perícia o exame biológico existência de problema ou anomalia mental Há uma junção de tarefas de forma que o magistrado não pode decidir sobre a imputabilidade ou inimputabilidade do acusado sem a colaboração técnica do perito Exigese o laudo médico para a comprovação da doença mental do desenvolvimento mental incompleto ou do desenvolvimento mental retardado Cuidase de meio legal de prova da inimputabilidade imprescindível que sequer pode ser substituído pela inspeção judicial pois o julgador não possui conhecimentos médicos para identificar deficiências na saúde psíquica do réu Portanto a perícia é fundamental para a aferição da inimputabilidade Mas obviamente o juiz não pode ser subserviente à conclusão médica ou seja não fica vinculado aos peritos O magistrado é o peritum peritorum é dizer o perito dos peritos como destaca o art 182 do CPP O juiz não ficará adstrito ao laudo podendo aceitálo ou rejeitálo no todo ou em parte Surge então a questão O que deve fazer o magistrado quando discordar da conclusão do laudo pericial Pode decidir em sentido contrário do médico Embora não esteja adstrito ao laudo o juiz não pode substituir o perito Cabe a ele rejeitar a conclusão técnica ordenando em seguida a realização de novo exame pericial Não lhe é facultado todavia atuar como se médico fosse pois a ele a lei impõe a valoração da parte psicológica assegurando a biológica às pessoas com formação técnica específica Para a instauração do incidente de insanidade mental não basta a alegação defensiva no sentido da presença da anomalia ou enfermidade mental Com efeito o exame a que se refere o art 149 do Código de Processo Penal é imprescindível apenas quando houver dúvida fundada a respeito da higidez mental do acusado em face da presença de indícios plausíveis de que ao tempo do fato era incapaz de entender o caráter ilícito da conduta ou de determinarse de acordo com esse entendimento8 O incidente de insanidade mental tramita em autos apartados CPP art 153 e suspende o processo CPP art 149 2º mas não suspende a prescrição9 Como a imputabilidade é presumida a partir do dia em que o agente completa 18 anos de idade o réu não pode ser submetido à perícia médica contra a sua vontade uma vez que se trata de prova que se destina 2811 exclusivamente a favorecêlo Como já decidido pelo Supremo Tribunal Federal O incidente de insanidade mental é prova pericial constituída em favor da defesa Logo não é possível determinálo compulsoriamente na hipótese em que a defesa se oponha à sua realização Essa é a conclusão da Segunda Turma ao conceder a ordem em habeas corpus que discutiu a legitimidade de decisão judicial que deferira pedido formulado pelo Ministério Público Militar determinando a instauração de incidente de insanidade mental com fundamento no art 156 do Código de Processo Penal Militar CPPM a ser realizado por peritos médicos de hospital castrense A Segunda Turma afirmou que o Código Penal Militar CPM e o Código Penal CP teriam adotado o critério biopsicológico para a análise da inimputabilidade do acusado Assim a circunstância de o agente ter doença mental provisória ou definitiva ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado critério biológico não seria suficiente para ele ser considerado penalmente inimputável sem análise específica dessa condição para aplicação da legislação penal Havendo dúvida sobre a imputabilidade seria indispensável que por meio de procedimento médico se verificasse que ao tempo da ação ou da omissão o agente era totalmente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinarse de acordo com esse entendimento critério psicológico Contudo no caso em comento a defesa não solicitara a realização do mencionado exame Tendo isso em conta o Colegiado asseverou que o paciente não estaria obrigado a se submeter a esse exame10 EFEITOS DA INIMPUTABILIDADE Os menores de 18 anos sujeitamse à legislação especial CF art 228 Lei 80691990 Estatuto da Criança e do Adolescente Os demais inimputáveis submetemse à justiça penal São processados e julgados como qualquer outra pessoa mas não podem ser condenados Com efeito a culpabilidade é pressuposto de aplicação da pena Sem a imputabilidade elemento da culpabilidade não pode ser imposta uma pena 2812 Assim os inimputáveis embora demonstrado o envolvimento em um fato típico e ilícito são absolvidos Tratase da chamada sentença de absolvição imprópria pois o réu é absolvido mas contra ele é aplicada uma medida de segurança na forma definida pelo art 386 parágrafo único III do Código de Processo Penal Isso se justifica pelo fato de em relação aos inimputáveis o juízo de culpabilidade necessário para a pena ser substituído pelo juízo de periculosidade necessário para a medida de segurança Além disso o art 97 caput do Código Penal presume de forma absoluta a periculosidade dos inimputáveis ordenando a imposição de medida de segurança IMPUTABILIDADE DIMINUÍDA OU RESTRITA Nos termos do art 26 parágrafo único do Código Penal Parágrafo único A pena pode ser reduzida de 1 um a 23 dois terços se o agente em virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinarse de acordo com esse entendimento O Código Penal não rotulou o instituto Preferiu falar somente em redução da pena Em sede doutrinária e jurisprudencial foram consagradas como sinônimas diversas terminologias destacandose imputabilidade diminuída imputabilidade reduzida imputabilidade restrita e semiimputabilidade11 Vale registrar contudo a posição de Cezar Roberto Bitencourt que utiliza a expressão culpabilidade diminuída As expressões comumente utilizadas pela doutrina imputabilidade diminuída ou semiimputabilidade são absolutamente impróprias pois na verdade soam mais ou menos com algo parecido como semivirgem semigrávida ou então como uma pessoa de cor semibranca Em realidade a pessoa nessas circunstâncias tem diminuída sua capacidade de censura de valoração consequentemente a censurabilidade de sua conduta antijurídica deve sofrer redução Enfim nas hipóteses de inimputabilidade o agente é inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinarse de acordo com esse entendimento Ao passo que nas hipóteses de culpabilidade diminuída em que o Código fala em redução de pena o agente não possui a plena capacidade de entender a ilicitude do fato ou de determinarse de acordo com esse entendimento12 É de se destacar entretanto a utilização do termo semiimputável derivado de semiimputabilidade pelo art 319 inc VII do Código de Processo Penal com a redação conferida pela Lei 124032011 O art 26 parágrafo único do Código Penal fala em perturbação da saúde mental A perturbação da saúde mental também é uma doença mental embora mais suave Não elimina totalmente mas reduz por parte do agente a capacidade de entender o caráter ilícito do fato e de determinarse de acordo com esse entendimento o que igualmente ocorre em relação ao desenvolvimento mental incompleto e ao desenvolvimento mental retardado A diferença em relação à inimputabilidade pois é de grau O agente tem diminuída a sua capacidade de entendimento e de autodeterminação a qual permanece presente embora em grau menor Por esse motivo subsiste a imputabilidade e por corolário a culpabilidade13 Como entretanto o sujeito encontrase em posição biológica e psicológica inferior a um imputável a reprovabilidade da conduta é menor determinando a lei a redução da pena de 1 um a 23 dois terços Assim como na inimputabilidade nesse ponto o Código Penal também 1 2 acolheu o sistema biopsicológico Há dois fenômenos decisivos para aferição da semiimputabilidade biológico é a causa consistente em perturbação da saúde mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado e psicológico é o efeito pois em razão da anomalia mental o agente não era ao tempo da conduta inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinarse de acordo com esse entendimento A imputabilidade diminuída ou semiimputabilidade constituise em causa obrigatória de diminuição da pena Demonstrado pericialmente nos autos que o réu é fronteiriço isto é limítrofe entre a imputabilidade e a inimputabilidade o magistrado na terceira fase de aplicação da pena deve obrigatoriamente reduzila de 1 um a 23 dois terços A diminuição é obrigatória reservandose ao juiz discricionariedade unicamente em relação ao seu percentual dentro dos limites legais O montante da redução maior ou menor há de levar em conta o grau de diminuição da capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinarse de acordo com esse entendimento Para o Superior Tribunal de Justiça A diminuição da pena nessa situação deve ser avaliada de acordo com o grau de deficiência intelectiva do réu vale dizer de sua capacidade de autodeterminação Nesse contexto a ausência da justificativa para aplicação do redutor em seu grau mínimo viola o princípio do livre convencimento motivado malferindo o disposto no art 93 IX da CF14 Assim se o fronteiriço estiver mais próximo da imputabilidade a redução é menor 13 mas se estiver mais próximo dos limites da inimputabilidade a diminuição deve alcançar o patamar máximo 23 1 2 3 2813 Vimos que na inimputabilidade o responsável pelo cometimento de um fato típico e ilícito é absolvido em face da ausência de culpabilidade Porém a absolvição é imprópria pois é imposta medida de segurança em face da sua periculosidade presumida Na semiimputabilidade contudo subsiste a culpabilidade O réu deve ser condenado mas por se tratar de pessoa com menor grau de censurabilidade a pena há de ser obrigatoriamente reduzida de 1 um a 23 dois terços O semiimputável por outro lado pode necessitar de especial tratamento curativo por ser dotado de periculosidade Nesse caso se o exame pericial assim recomendar e concordando o magistrado a pena pode ser substituída por medida de segurança nos moldes do art 98 do Código Penal Cuidado a sentença endereçada ao semiimputável responsável pela prática de um fato típico e ilícito sempre é condenatória A operação é realizada em três etapas juiz condena em seguida diminui a pena de 1 um a 23 dois terços e finalmente se o réu necessitar de especial tratamento curativo o magistrado substitui a pena diminuída por medida de segurança Em síntese o semiimputável cumpre pena diminuída ou medida de segurança Com a Reforma da Parte Geral do Código Penal Lei 72091984 adotouse o sistema vicariante ou unitário pelo qual o réu somente cumpre uma das sanções penais as quais é importante repetir não são cumuláveis A primitiva Parte Geral do Código Penal consagrava o sistema do duplo binário também chamado de dois trilhos dualista ou de dupla via o semi imputável cumpria a pena e depois se ainda necessitasse de especial tratamento curativo era submetido à medida de segurança EMOÇÃO E PAIXÃO No Código Penal de 1890 a perturbação dos sentidos e da inteligência afastava a culpabilidade Por esse motivo era bastante comum a absolvição de autores de crimes passionais notadamente de homicídios sob a alegação de legítima defesa da honra o que ora não mais se admite O Código Penal dispõe em seu art 28 I que a emoção ou a paixão não excluem a imputabilidade penal Utilizouse pois de um critério legal ao estatuir taxativamente que tais estados de ânimo não elidem o apontado elemento da culpabilidade Essa escolha entretanto não é isenta de críticas Bise penalista suíço observou que se devia deixar ao magistrado critério judicial nessa matéria certa liberdade pois podia acontecer que emoções violentas muitas vezes instantâneas fizessem com que o réu perdesse momentaneamente o domínio de si mesmo e o arrastassem a cometer por efeito da cólera levada ao paroxismo do sentimento de honra ultrajada da dignidade ferida ou de qualquer provocação um ato que não teria cometido se estivesse de sangue frio15 Emoção e paixão são perturbações da psique humana Emoção é o estado afetivo que acarreta na perturbação transitória do equilíbrio psíquico tal como na ira medo alegria cólera ansiedade prazer erótico surpresa e vergonha Paixão é a emoção mais intensa ou seja a perturbação duradoura do equilíbrio psíquico Dela são exemplos entre outros o amor a inveja a avareza o ciúme a vingança o ódio o fanatismo e a ambição Enrico Altavilla sob a ótica da psicologia judiciária diz que é o estudo das emoções e das paixões que principalmente nos convence de que bem poucos homens podem afirmar terem sido durante toda a sua existência completamente normais E em seguida invoca as palavras de Kant para quem A emoção é a água que rompe com violência o dique e se espalha rapidamente a paixão é a torrente que escava o seu leito e nele se incrusta A emoção é uma embriaguez a paixão é uma doença16 Para Nélson Hungria Pode dizerse que a paixão é a emoção que se protrai no tempo incubandose introvertendose criando um estado contínuo e duradouro de perturbação afetiva em torno de uma ideia fixa de um pensamento obsidente A emoção dá e passa a paixão permanece alimentandose de si própria Mas a paixão é como o borralho que a um sopro mais forte pode chamejar de novo voltando a ser fogo crepitante retornando a ser estado emocional agudo17 Portanto a diferença entre a emoção e a paixão repousa fundamentalmente na duração Aquela é um sentimento transitório enquanto a paixão é duradoura uma emoção em câmera lenta Ainda que sejam de elevada intensidade a emoção e a paixão como visto não excluem a imputabilidade penal Porém o Código Penal implicitamente permite duas exceções a essa regra coação moral irresistível em face da inexigibilidade de conduta diversa a ser estudada um pouco adiante e estado patológico no qual se constituem autênticas formas de doença mental Em seu art 28 I o Código Penal referese à condição de normalidade isto é emoção ou paixão incapaz de retirar do agente a capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinarse de acordo com esse entendimento Quando contudo a emoção ou paixão configurar um estado mórbido ou a b patológico deverá ser compreendida como uma verdadeira psicose indicativa de doença mental Logo se comprovada pericialmente a situação encontrará respaldo no art 26 caput inimputabilidade ou em seu parágrafo único imputabilidade restrita ou semiimputabilidade A emoção e a paixão podem ser sociais como é o caso do amor ou antissociais tendo como exemplo o ódio funcionado como circunstância judicial na aplicação da penabase em conformidade com o art 59 caput do Código Penal Falase ainda em emoções astênicas são as resultantes daquele que sofre de debilidade orgânica gerando situações de medo desespero pavor e estênicas são aquelas decorrentes da pessoa que é vigorosa forte e ativa provocando situações de cólera irritação destempero e ira18 O art 65 III c parte final diz que se o crime foi cometido sob a influência de violenta emoção provocada por ato injusto da vítima a pena será atenuada Estará presente destarte uma atenuante genérica funcionando na segunda fase de aplicação da pena Por sua vez os arts 121 1º e 129 4º preveem no tocante ao homicídio e à lesão corporal respectivamente a figura do privilégio causa especial de diminuição da pena quando o crime é cometido sob o domínio de violenta emoção e logo em seguida a injusta provocação da vítima O Código Penal Republicano de 1890 dispunha em seu art 27 4º Não são criminosos os que se acharem em estado de completa privação de sentidos e de inteligência no ato de cometer o crime19 Com base nesse dispositivo legal os criminosos passionais eram 2814 comumente absolvidos sob o pretexto de que ao encontrarem o cônjuge em flagrante adultério ou movidos por elevado ciúme restavam privados da inteligência e dos sentidos Com a regra ora prevista no art 28 I do Código Penal essa interpretação não pode ser admitida Emoção e paixão não excluem a imputabilidade penal mormente quando o crime foi motivado por um suposto amor Roberto Lyra com a autoridade de quem foi apelidado de o príncipe dos promotores pelo fato de ter sido um dos maiores tribunos do júri combatia veementemente a impunidade dos passionais assim se pronunciando O verdadeiro passional não mata O amor é por natureza e por finalidade criador fecundo solidário generoso Ele é cliente das pretorias das maternidades dos lares e não dos necrotérios dos cemitérios dos manicômios O amor o amor mesmo jamais desceu ao banco dos réus Para os fins da responsabilidade a lei considera apenas o momento do crime E nele o que atua é o ódio O amor não figura nas cifras da mortalidade e sim nas da natalidade não tira põe gente no mundo Está nos berços e não nos túmulos20 Nada obstante vez ou outra se constata a absolvição de homicidas passionais confessos Isso se dá notadamente pela circunstância de serem julgados pelo Tribunal do Júri composto por juízes leigos e que decidem pela íntima convicção sem fundamentação dos seus votos muitas vezes movidos pela piedade pela farsa proporcionada pelo acusado ou mesmo por se identificarem com a figura do réu EMBRIAGUEZ É a intoxicação aguda produzida no corpo humano pelo álcool ou por substância de efeitos análogos apta a provocar a exclusão da capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinarse de acordo com esse entendimento Como exemplos de substâncias de efeitos análogos podem ser apontados o éter a morfina o clorofórmio e quaisquer outras substâncias entorpecentes ainda que não previstas na Portaria do Ministério da Saúde responsável por essa tarefa dependendo nesse caso de perícia A embriaguez acima definida que não exclui a imputabilidade penal CP art 28 II é chamada de embriaguez aguda embriaguez simples ou embriaguez fisiológica Cuidase da embriaguez que compromete total ou parcialmente a imputabilidade penal e caracterizase pela desproporcional intensidade ou duração dos efeitos inerentes à intoxicação alcoólica O efeito da embriaguez no organismo humano é contínuo e as consequências do álcool ou da substância de efeitos análogos subsistem no sistema nervoso depois de sua eliminação Por esse motivo a embriaguez patológica é equiparada às doenças mentais Logo aplicase o art 26 caput e seu parágrafo único do Código Penal e não o art 28 II O ébrio é considerado inimputável ou semiimputável em conformidade com a conclusão do laudo pericial São cientificamente reconhecidas três fases da embriaguez21 1ª fase Eufórica as funções intelectuais mostramse excitadas e o indivíduo particularmente eufórico A vontade e a autocrítica afiguramse rebaixadas A capacidade de julgamento se compromete Há certo grau de erotismo O ébrio fala acima do normal apresenta desinibição e comportase de forma cômica e indecorosa É conhecida como fase do macaco 2ª fase Agitada caracterizase por perturbações psicossensoriais profundas Alteramse as funções intelectuais o juízo crítico a atenção e a memória Os propósitos são desordenados ou absurdos Há abolição da crítica Os delitos normalmente são praticados com agressões ou contra a liberdade sexual o que não impede crimes de outras espécies Há perda do equilíbrio e a pessoa marcha de forma desordenada ou se desequilibra Ocorrem perturbações visuais O sujeito fica agitado e agressivo razão pela qual é chamada de fase do leão Nessas duas fases eufórica e agitada é possível a prática de crimes comissivos e omissivos 3ª fase Comatosa do coma inicialmente há sono e o coma se instala progressivamente Daí ser chamada de fase do porco O estado comatoso pode até se tornar irreversível com a morte do ébrio o que pode ser facilitado com a exposição ao frio Nessa terceira fase comatosa o ébrio somente pode praticar crimes omissivos próprios ou impróprios comissivos por omissão A embriaguez aguda simples ou fisiológica classificase quanto à intensidade e quanto à origem Pode ser completa ou incompleta Completa total ou plena é a embriaguez que chegou à segunda agitada ou à terceira fase comatosa Incompleta parcial ou semiplena é a embriaguez que se limitou à primeira fase eufórica Pode ser voluntária culposa preordenada ou acidental Voluntária ou intencional é aquela em que o indivíduo ingere bebidas alcoólicas com a intenção de embriagarse Não quer praticar infrações penais Sua vontade restringese a exceder aos limites permitidos para a ingestão do álcool ou substância de efeitos análogos Culposa é a espécie de embriaguez em que a vontade do agente é somente beber e não embriagarse Por exagero no consumo do álcool todavia acaba embriagado Essas duas espécies de embriaguez voluntária e culposa não excluem a imputabilidade penal CP art 28 II sejam completas ou incompletas Preordenada ou dolosa é aquela em que o sujeito propositadamente se embriaga para cometer uma infração penal A embriaguez funciona como fator de encorajamento para a prática do crime ou da contravenção penal A embriaguez preordenada além de não excluir a imputabilidade penal funciona como agravante genérica CP art 61 II l incidindo na segunda fase do critério trifásico para o fim de exasperar a pena Acidental ou fortuita é a embriaguez que resulta de caso fortuito ou força maior No caso fortuito o indivíduo não percebe ser atingido pelo álcool ou substância de efeitos análogos ou desconhece uma condição fisiológica que o torna submisso às consequências da ingestão do álcool Exemplos 1 o sujeito mora ao lado de uma destilaria de aguardente e aos poucos acaba embriagado pelos vapores da bebida que inala sem perceber e 2 o agente faz tratamento com algum tipo de remédio o qual potencializa os efeitos do álcool Na força maior o sujeito é obrigado a beber ou então por questões profissionais necessita permanecer em recinto cercado pelo álcool ou substância de efeitos análogos Exemplos 1 o agente é amarrado e injetam em seu sangue elevada quantidade de álcool e 2 o indivíduo trabalha na manutenção de uma destilaria de aguardente e em determinado dia cai em um tonel cheio da bebida a b A embriaguez acidental ou fortuita se completa capaz de ao tempo da conduta tornar o agente inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinarse de acordo com esse entendimento exclui a imputabilidade penal CP art 28 1º Por outro lado a embriaguez acidental ou fortuita incompleta isto é aquela que ao tempo da conduta retira do agente parte da capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinarse de acordo com esse entendimento autoriza a diminuição da pena de 1 um a 23 dois terços Equivale portanto à semiimputabilidade CP art 28 2º Nada obstante acarrete ao agente a isenção da pena nos mesmos moldes da inimputabilidade penal a embriaguez acidental ou fortuita e completa não autoriza a aplicação de medida de segurança por um motivo muito simples O sujeito é imputável e não inimputável Não é portador de doença mental nem apresenta desenvolvimento mental incompleto ou retardado na forma exigida pelo art 26 caput do Código Penal Além disso o tratamento curativo inerente à medida de segurança seria totalmente inócuo e desnecessário A embriaguez admite qualquer meio probatório mormente em face do sistema da livre apreciação da prova da persuasão racional ou do livre convencimento motivado adotado pelo art 155 caput do Código de Processo Penal Destacamse contudo três formas probatórias para a comprovação da embriaguez exame laboratorial é o que revela a quantidade de álcool no sangue de alguém O agente não é obrigado a ele se submeter pois ninguém é obrigado a produzir prova contra si mesmo nemo tenetur se detegere exame clínico é a análise pessoal do indivíduo evidenciandose c dados característicos da embriaguez tais como o hálito o controle emocional o equilíbrio físico a fala etc prova testemunhal pessoas que relatem deponham acerca da alteração de comportamento de quem se submeteu ao álcool ou substância de efeitos análogos A conduta de dirigir sob a influência de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência física com qualquer concentração de álcool por litro de sangue ou por litro de ar alveolar constitui infração de trânsito gravíssima sujeita a multa e suspensão do direito de dirigir por 12 meses sem prejuízo da medida de recolhimento do documento de habilitação e retenção do veículo a teor das regras contidas nos arts 165 e 276 da Lei 95031997 Código de Trânsito Brasileiro E estabelece o seu art 277 Art 277 O condutor de veículo automotor envolvido em acidente de trânsito ou que for alvo de fiscalização de trânsito poderá ser submetido a teste exame clínico perícia ou outro procedimento que por meios técnicos ou científicos na forma disciplinada pelo Contran permita certificar influência de álcool ou outra substância psicoativa que determine dependência 1º Revogado 2º A infração prevista no art 165 também poderá ser caracterizada mediante imagem vídeo constatação de sinais que indiquem na forma disciplinada pelo Contran alteração da capacidade psicomotora ou produção de quaisquer outras provas em direito admitidas 3º Serão aplicadas as penalidades e medidas administrativas estabelecidas no art 165 deste Código ao condutor que se recusar a se submeter a qualquer dos procedimentos previstos no caput deste artigo Portanto ao motorista abordado pela autoridade pública é facultado recusarse ao exame de sangue ou ao teste do etilômetro bafômetro nada obstante seu estado de embriaguez possa ser aferido por outros meios de prova22 Essa recusa no entanto importará em consequências jurídicas Buscase justificar a legitimidade desse dispositivo com o argumento de tratarse de infração administrativa Destarte se o Estado autoriza alguém a conduzir veículos automotores tem o direito de imporlhe as condições necessárias para a manutenção dessa prerrogativa destacandose entre elas a submissão aos exames para comprovação de eventual uso de álcool ou substância de efeitos análogos Logo àquele que não se submeter aos testes será aplicada a infração administrativa prevista no art 165A do Código de Trânsito Brasileiro com a redação conferida pela Lei 132812016 Art 165A Recusarse a ser submetido a teste exame clínico perícia ou outro procedimento que permita certificar influência de álcool ou outra substância psicoativa na forma estabelecida pelo art 277 Infração gravíssima Penalidade multa dez vezes e suspensão do direito de dirigir por 12 doze meses Medida administrativa recolhimento do documento de habilitação e retenção do veículo observado o disposto no 4º do art 270 Parágrafo único Aplicase em dobro a multa prevista no caput em caso de reincidência no período de até 12 doze meses Contudo sempre existiram vozes sustentando a inaceitabilidade desta regra pois o motorista seria obrigado a produzir prova contra si mesmo uma vez que serão provocados reflexos na seara criminal relativamente ao delito tipificado pelo art 306 da Lei 95031997 Código de Trânsito Brasileiro Art 306 Conduzir veículo automotor com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência Penas detenção de seis meses a três anos multa e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor 1º As condutas previstas no caput serão constatadas por I concentração igual ou superior a 6 decigramas de álcool por litro de sangue ou igual ou superior a 03 miligrama de álcool por litro de ar alveolar ou II sinais que indiquem na forma disciplinada pelo Contran alteração da capacidade psicomotora 2º A verificação do disposto neste artigo poderá ser obtida mediante teste de alcoolemia ou toxicológico exame clínico perícia vídeo prova testemunhal ou outros meios de prova em direito admitidos observado o direito à contraprova 3º O Contran disporá sobre a equivalência entre os distintos testes de alcoolemia ou toxicológicos para efeito de caracterização do crime tipificado neste artigo Este delito inserese no rol dos crimes de perigo abstrato e sua descrição legal não atenta contra princípios constitucionais porque é científica e estatisticamente comprovado que a condução de veículo automotor por quem ingeriu álcool ou substâncias psicoativas em determinado patamar coloca em risco a incolumidade física e a vida de terceiros dada a diminuição dos reflexos da percepção sensorial e da habilidade motora23 Antes das Leis 127602012 e 129712014 todavia a configuração do delito dependia de prova pericial exame de sangue ou método equivalente etilômetro ou teste em aparelho de ar alveolar popularmente conhecido como bafômetro Em síntese a prova da materialidade do crime tipificado no art 306 do Código de Trânsito Brasileiro restringiase a estes dois meios não admitindo outra forma qualquer pois eram os únicos recursos idôneos a indicar cientificamente a alcoolemia uma vez que o legislador havia incluído o nível de dosagem alcoólica como elemento do tipo penal incriminador Consequentemente um motorista embriagado não poderia ser condenado sem submeterse voluntariamente a tais exames pois ninguém é obrigado a produzir prova contra si mesmo nemo tenetur se detegere No entanto era possível aplicarlhe as sanções administrativas pertinentes Este cenário foi profundamente alterado pelas Leis 127602012 e 129712014 Atualmente o tipo penal não se reporta à quantidade de álcool por litro de sangue O legislador preferiu utilizar uma fórmula mais ampla consistente em capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência E nesse ponto surge uma importante indagação Como se prova a alteração da capacidade psicomotora em decorrência do consumo do álcool ou de substância psicoativa Por duas formas distintas Vejamos Em primeiro lugar a alteração da capacidade psicomotora será demonstrada pela concentração igual ou superior a 6 decigramas de álcool por litro de sangue ou igual ou superior a 03 miligrama de álcool por litro de ar alveolar CTB art 306 1º I24 Nesse caso o exame pericial exame de sangue ou teste do etilômetro continua imprescindível pois a comprovação da embriaguez reclama a precisa dosagem de álcool no sangue Mas a grande novidade recai no inc II do 1º do art 306 do Código de Trânsito Brasileiro A alteração da capacidade psicomotora em face da influência do álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência pode ser constatada por sinais que indiquem na forma disciplinada pelo Contran alteração da capacidade psicomotora É de se observar que a presença destes sinais deve produzir efeitos equivalentes à concentração igual ou superior a 6 decigramas de álcool por litro de sangue ou igual ou superior a 03 miligrama de álcool por litro de ar alveolar raciocínio facilmente extraído da análise do 3º do art 306 do Código de Trânsito Brasileiro O Contran disporá sobre a equivalência entre os distintos testes de alcoolemia ou toxicológicos para efeito de caracterização do crime tipificado neste artigo Para reforçar esta sistemática o 2º do art 306 do Código de Trânsito Brasileiro preconiza que a verificação do disposto neste artigo poderá ser obtida mediante teste de alcoolemia ou toxicológico exame clínico perícia vídeo prova testemunhal ou outros meios de prova em direito admitidos observado o direito à contraprova Embora o dispositivo dependa de regulamentação pelo Conselho Nacional de Trânsito efetivada pela Resolução 4322013 fica nítida a opção pelo sistema da liberdade da prova no tocante ao crime de embriaguez ao volante Em outras palavras se o condutor de veículo automotor envolverse a b em acidente de trânsito ou for alvo de fiscalização de trânsito e o agente público de trânsito suspeitar de eventual alteração de sua capacidade psicomotora em razão da influência do álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência duas situações podem ocorrer se o motorista concordar será submetido a teste de alcoolemia ou toxicológico mediante exame de sangue ou etilômetro se ele não concordar a alteração da sua capacidade psicomotora poderá ser comprovada por sinais indicativos obtidos por diversos meios a exemplo do exame clínico da perícia de vídeo e da prova testemunhal entre outros Exemplo O motorista capota seu automóvel na estrada e abordado pelo policial rodoviário este vem a constatar o estado de embriaguez do condutor evidenciado pelo hálito de álcool pelo pronunciamento confuso das palavras bem como pelos depoimentos de testemunhas no sentido de que o motorista acabara de consumir um litro de aguardente A nova sistemática confere maiores poderes aos agentes de trânsito Com efeito se o condutor do veículo recusarse ao teste de alcoolemia ou toxicológico o funcionário público poderá valerse de outros meios inclusive das suas próprias palavras para concluir pela materialidade do crime tipificado no art 306 da Lei 95031997 Código de Trânsito Brasileiro Evidentemente o motorista não ficará submisso à convicção do agente público De fato caso venha a se posicionar pela alteração da capacidade psicomotora do condutor este terá à sua disposição o direito à contraprova ou seja poderá valerse do teste de alcoolemia ou toxicológico para demonstrar a ausência de concentração igual ou superior a 6 decigramas de álcool por litro de sangue ou igual ou superior a 03 miligrama de álcool por litro de ar alveolar ou ainda de outra substância psicoativa que determina dependência Em síntese o motorista não está obrigado a submeterse à perícia o que não afasta a conclusão pela alteração da sua capacidade psicomotora diante do consumo do álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência Mas se o agente de trânsito concluir com base em sinais diversos pela embriaguez do condutor a este será assegurado o direito de passar pela perícia com a finalidade de comprovar a integridade da sua capacidade psicomotora no âmbito penal O Código Penal dispõe em seu art 28 II que a embriaguez voluntária ou culposa não exclui a imputabilidade penal Já em relação à embriaguez preordenada estatui em seu art 61 II l ser essa circunstância uma agravante genérica Destarte além de subsistir a imputabilidade funciona como exasperação da pena Colocase então a seguinte indagação Como é possível a punição do agente em caso de embriaguez não acidental No momento em que ele pratica o crime embriagado não estaria privado da capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinarse de acordo com esse entendimento Para responder essa questão entra em cena a teoria da actio libera in causa Em claro e bom português teoria da ação livre em sua causa Fundamentase no princípio segundo o qual a causa da causa também é a causa do que foi causado isto é para aferirse a imputabilidade penal no caso da embriaguez desprezase o tempo em que o crime foi praticado De fato nesse momento o sujeito estava privado da capacidade de entendimento e de autodeterminação por vontade própria pois bebeu e embriagouse livre de qualquer coação Por esse motivo considerase como marco da imputabilidade penal o período anterior à embriaguez em que o agente espontaneamente decidiu consumir bebida alcoólica ou de efeitos análogos Nas palavras de Sebastian Soler A imputação do fato realizado durante o tempo de inimputabilidade retroage ao estado anterior e conforme seja o conteúdo subjetivo desse ato será imputado a título de dolo ou de culpa Se um sujeito se embriaga até a inconsciência para não temer e atreverse contra determinada pessoa que quer matar é plenamente imputável quanto ao homicídio ainda quando o crime tenha sido cometido no estado atual de inconsciência25 E de acordo com o item 21 da Exposição de Motivos do Código Penal de 1940 preservada nesse ponto pela Lei 72091984 Ao resolver o problema da embriaguez pelo álcool ou substância de efeitos análogos do ponto de vista da responsabilidade penal o projeto aceitou em toda a sua plenitude a teoria da actio libera in causa ad libertatem relata que modernamente não se limita ao estado de inconsciência preordenado mas se estende a todos os casos em que o agente se deixou arrastar ao estado de inconsciência Invocase essa teoria portanto para justificar a punição do sujeito que ao tempo da conduta encontravase em estado de inconsciência Possibilitase a análise do dolo ou da culpa revelados no momento em que se embriagou São os casos em que alguém no estado de não imputabilidade é causador por ação ou omissão de algum resultado punível tendo se colocado naquele estado ou propositadamente com a intenção de produzir o evento lesivo ou sem essa intenção mas tendo previsto a possibilidade do resultado ou ainda quando a podia ou devia prever26 Essa teoria foi desenvolvida para a embriaguez preordenada e para ela se encaixa perfeitamente O agente embriagase com a intenção de cometer um crime em estado de inconsciência e assim o faz O dolo estava presente quando arquitetou o crime e por esse elemento subjetivo deve ser punido Vale lembrar o clássico exemplo do guardachaves que se embriaga com a intenção de não acionar as chaves à chegada do trem produzindo a catástrofe No momento de beber era ele imputável mas já não o era no momento do desastre27 Na embriaguez preordenada o fundamento da punição é a causalidade mediata O agente atua como mandante na fase anterior da imputabilidade e faz executar o mandato criminoso por si mesmo como instrumento em estado de inimputabilidade28 Posteriormente entretanto a aplicabilidade da teoria da actio libera in causa estendeuse à embriaguez voluntária e à embriaguez culposa bem como aos demais estados de inconsciência Nessa última hipótese pode ser citado o exemplo da mãe que conhecedora dos sonhos noturnos que lhe deixam agitada e a fazem rolar na cama esquece de levar o filho recém nascido ao berço e o deixa dormir ao seu lado vindo a sonhar e ao rolar na cama acaba por esmagar e matar a criança29 E nesses casos o sujeito ao colocarse em estado de inconsciência não possuía dolo ou culpa para a prática do crime Surge assim a crítica no sentido de que o Código Penal teria consagrado a responsabilidade objetiva pois por motivo de política criminal acolheu do direito italiano uma ficção para construir a figura do crime praticado em situação de embriaguez não fortuita relativamente ao tratamento do ébrio voluntário ou culposo como imputável30 Para Paulo José da Costa Júnior que critica veementemente o acolhimento da teoria da actio libera in causa para as situações de embriaguez voluntária ou culposa O legislador penal ao considerar imputável aquele que em realidade não o era fez uso de uma ficção jurídica Ou melhor adotou a responsabilidade objetiva sem querer confessálo No direito penal português confessouse que embora a ingestão de bebidas alcoólicas ou substâncias tóxicas possa criar em muitos casos um verdadeiro estado de inimputabilidade por outro as necessidades de política criminal não consentem na impunidade do delinquente O legislador pátrio não teve igual coragem Preferiu tapar o sol com a peneira adotando a responsabilidade anômala Seria preferível ter confessado que com base na defesa social fora compelido a adotar nesse passo a responsabilidade objetiva para evitar que criminosos fossem buscar no álcool a escusa absolutória31 Existem porém posições diversas sustentando a não caracterização da responsabilidade penal objetiva no tocante à incidência da teoria da actio libera in causa na embriaguez voluntária e na embriaguez culposa Vicenzo Manzini na Itália há muito falava em vontade residual é dizer ainda que embriagado o sujeito mantém em seu íntimo um resquício de consciência e de autodeterminação suficiente para legitimar a imputabilidade penal Nessa linha de raciocínio Giulio Battaglini rebate as críticas à teoria da actio libera in causa sustentando que uma solução legislativa não pode basearse rigorosamente em deduções lógicas o que é necessário é que forneça a melhor tutela dos valores morais e nacionais de que trata Em seguida arremata o ébrio com inteligência suprimida e vontade inexistente é uma criação da fantasia ninguém jamais o viu no banco dos réus32 Nélson Hungria também defende a adoção da teoria da actio libera in causa Para ele a ameaça penal constituise em motivo inibitório a mais no sentido de prevenir a embriaguez com os seus eventuais efeitos maléficos Além disso afirma que a embriaguez quase sempre revela o indivíduo na sua verdadeira personalidade e precisamente o objetivo da teoria da culpabilidade é tornar responsável o indivíduo pelos atos que são expressão de sua personalidade E para sustentar que um ébrio voluntário ou culposo não pode de forma alguma ser equiparado ao inimputável portador de doença mental busca ainda na doutrina alemã a seguinte lição Cumpre notar além disso que segundo a lição da experiência a vontade do ébrio não é tão profundamente conturbada que exclua por completo o poder de inibição como acontece nas perturbações psíquicas de fundo patológico É o que justamente acentua MEZGER A experiência ensina que na embriaguez é possível e pode ser exigido um grau mais alto de autocontrole do que por exemplo nas alterações da consciência de índole orgânica As perturbações por intoxicação de álcool acrescente se et similia sempre ficam em maior ou menor medida na superfície33 Cumpre destacar que no tocante à embriaguez acidental ou fortuita não se aplica a teoria da actio libera in causa porque o indivíduo não tinha a opção de ingerir ou não o álcool ou substância de efeitos análogos Espécies de embriaguez Não acidental Voluntária Completa ou incompleta não exclui a imputabilidade Culposa Completa Exclui a imputabilidade Incompleta Não exclui a imputabilidade mas diminui a pena de 13 a 23 equivale a semiimputabilidade Acidental ou fortuita Patológica Equiparase à doença mental e o agente pode ser considerado inimputável ou semiimputável conforme conclusão do laudo pericial Preordenada Não exclui a imputabilidade e ainda agrava a pena art 61 II I do CP 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 SILVEIRA V César da Tratado da responsabilidade criminal São Paulo Saraiva 1955 v I p 126 São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos sujeitos às normas da legislação especial Os menores de 18 dezoito anos são penalmente inimputáveis ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação especial O documento hábil ao qual a Súmula 74STJ faz referência não se restringe à certidão de nascimento ou seja outros documentos dotados de fé pública portanto igualmente hábeis para comprovar a menoridade também podem atestar a referida situação jurídica como por exemplo a identificação realizada pela polícia civil AgRg no REsp 1396837MG rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 27062014 E também STJ AgRg no REsp 1423997SC rel Min Moura Ribeiro 5ª Turma j 20022014 STF HC 101930MG rel Min Cármen Lúcia 1ª Turma j 27042010 noticiado no Informativo 584 Os crimes descritos no art 159 1º e art 288 parágrafo único do Código Penal são permanentes Em consequência se o menor atingir a idade de 18 dezoito anos enquanto os delitos se encontrarem em plena consumação será por eles responsabilizado STJ HC 169510SP rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 07022012 MARANHÃO Odon Ramos Curso básico de medicina legal 8 ed 5 tir São Paulo Malheiros 2000 p 349 HC 60977ES rel Min Og Fernandes 6ª Turma j 25102011 noticiado no Informativo 486 As causas suspensivas da prescrição prejudiciais ao acusado devem estar expressamente previstas em lei pois dificultam a extinção da punibilidade E nesse ponto o legislador ficou silente HC 133078RJ rel Min Cármen Lúcia 2ª Turma j 06092016 noticiado no Informativo 838 Essas denominações são normalmente aceitas em provas e concursos públicos BITENCOURT Cezar Roberto Tratado de direito penal Parte geral 11 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 ed São Paulo Saraiva 2007 v 1 p 355356 Contra este argumento vale destacar que o art 319 VII do Código de Processo Penal com a redação conferida pela Lei 124032011 utiliza expressamente a palavra semiimputável Evidentemente o semiimputável já atingiu a maioridade penal Os menores de 18 anos de idade são inimputáveis CF art 228 e CP art 27 HC 167376SP rel Min Gurgel de Faria 5ª Turma j 23092014 noticiado no Informativo 547 COSTA E SILVA A J da Código penal anotado São Paulo RT 1943 v I p 189190 ALTAVILLA Enrico Psicologia judiciária O processo psicológico e a verdade judicial Tradução de Fernando Miranda Coimbra Armênio Amado Editor 1981 v I p 104105 HUNGRIA Nélson Comentários ao código penal Rio de Janeiro Forense 1949 v I p 523 NUCCI Guilherme de Souza Código penal comentado 6 ed São Paulo RT 2006 p 261 PIERANGELI José Henrique Códigos penais do Brasil evolução histórica Bauru Jalovi 1980 p 271 LYRA Roberto Como julgar como defender como acusar Rio de Janeiro José Konfino 1975 p 97 Adotamos os conceitos apresentados por MARANHÃO Odon Ramos Curso básico de medicina legal 8 ed 5ª tiragem São Paulo Malheiros 2000 p 390393 É a posição do Superior Tribunal de Justiça REsp 1308779CE rel Min Humberto Martins 2ª Turma j 25032014 Na visão do Supremo Tribunal Federal seria irrelevante indagar se o comportamento do agente atingira ou não algum bem juridicamente tutelado Consignouse ainda legítima a opção legislativa por objetivar a proteção da segurança da própria coletividade HC 109269MG rel Min Ricardo Lewandowski 2ª Turma j 27092011 noticiado no Informativo 642 Para o Superior Tribunal de Justiça O crime do art 306 do Código de Trânsito Brasileiro é de perigo abstrato pois o tipo penal em questão apenas descreve a conduta de dirigir veículo sob a influência de álcool acima do limite permitido legalmente sendo 24 25 26 27 28 29 30 31 32 33 desnecessária a demonstração da efetiva potencialidade lesiva do condutor HC 175385MG rel Min Laurita Vaz 6ª Turma j 17032011 noticiado no Informativo 466 O conceito de ar alveolar é fornecido pelo Anexo I do Código de Trânsito Brasileiro Ar expirado pela boca de um indivíduo originário dos alvéolos pulmonares Este teste é realizado com a utilização do etilômetro aparelho destinado à medição do teor alcoólico no ar aveolar SOLER Sebastian Derecho penal argentino Buenos Aires La Ley 1945 t II p 46 QUEIROZ Narcelio de Teoria da actio libera in causa Rio de Janeiro Livraria Jacintho 1936 p 40 SILVEIRA V César da Tratado da responsabilidade criminal São Paulo Saraiva 1955 v I p 401 BRUNO Aníbal Direito penal Parte geral Rio de Janeiro Forense 1967 t 2 p 151 SOLER Sebastian Derecho penal argentino Buenos Aires La Ley 1945 t II p 47 BRUNO Aníbal Direito penal Parte geral Rio de Janeiro Forense 1967 t 2 p 154 COSTA JR Paulo José da Direito penal curso completo 6 ed São Paulo Saraiva 1999 p 100 BATTAGLINI Giulio Direito penal Parte geral Tradução de Paulo José da Costa Jr e Arminda Bergamini Miotto São Paulo Saraiva Editora da Universidade de São Paulo 1973 v 1 p 263265 HUNGRIA Nélson Comentários ao Código Penal Rio de Janeiro Forense 1949 v I p 528 A aplicação da pena ao autor de uma infração penal somente é justa e legítima quando ele no momento da conduta era dotado ao menos da possibilidade de compreender o caráter ilícito do fato praticado Exigese pois tivesse o autor o conhecimento ou no mínimo a potencialidade de entender o aspecto criminoso do seu comportamento isto é os aspectos relativos ao tipo penal e à ilicitude O sistema clássico ou causal alocava o dolo na culpabilidade e considerava a consciência da ilicitude como integrante do dolo que era normativo No sistema finalista porém o dolo e também a culpa foi transferido para a conduta passando a compor a estrutura do fato típico Mas o dolo é natural isto é desprovido da consciência da ilicitude que permanece na culpabilidade Além disso o finalismo penal transforma a consciência da ilicitude então real em potencial Não mais reclama o efetivo conhecimento do agente acerca do caráter ilícito do fato típico cometido É suficiente tenha ele a possibilidade a potencialidade de compreender o caráter ilícito do fato Sistema Clássico Sistema Finalista 1 2 situada na culpabilidade no interior do dolo de cunho normativo inserida na culpabilidade mas separada do dolo o qual foi transferido para a conduta fato típico e passou a ser a natural isto é sem a consciência da ilicitude No sistema clássico a falta de consciência da ilicitude excluía o dolo normativo Por outro lado no sistema finalista a ausência da potencial consciência da ilicitude preserva íntegro o dolo natural e afasta a culpabilidade É o que se dá no erro de proibição escusável entendimento que foi expressamente acolhido pelo art 21 do Código Penal Art 21 O desconhecimento da lei é inescusável O erro sobre a ilicitude do fato se inevitável isenta de pena se evitável poderá diminuíla de um sexto a um terço Parágrafo único Considerase evitável o erro se o agente atua ou se omite sem a consciência da ilicitude do fato quando lhe era possível nas circunstâncias ter ou atingir essa consciência grifamos Juan Córdoba Roda em trabalho específico sobre o assunto1 aponta três critérios para determinação do objeto da consciência da ilicitude Critério formal desenvolvido por Binding Beling e von Liszt proclama ser necessário o conhecimento do agente sobre a violação de alguma norma penal Critério material defendido por Max Ernst Mayer e Kaufmann baseiase em uma concepção material do injusto a qual exige o conhecimento da antissocialidade da injustiça e imoralidade de uma conduta ou da violação de um interesse e 3 2941 29411 Critério intermediário originário dos estudos de Hans Welzel sustenta que o conhecimento da ilicitude não importa em conhecimento da punibilidade da conduta nem em conhecimento do dispositivo legal que contém a proibição do seu comportamento O sujeito embora não seja obrigado a proceder a uma valoração de ordem técnicojurídica deve conhecer ou poder conhecer com o esforço devido de sua consciência com um juízo geral de sua própria esfera de pensamentos o caráter ilícito do seu modo de agir Basta portanto a valoração paralela da esfera do profano2 O critério formal não encontrou acolhimento pois somente os juristas os técnicos em Direito Penal poderiam cometer crimes ou contravenções penais O critério material bem mais rebuscado esbarra na existência de infrações penais de pura criação legislativa que não correspondem ao conceito de injusto material e inversamente em condutas reconhecidamente danosas embora não tipificadas pelo Direito Penal Por esses motivos o critério de maior aceitação é o intermediário É suficiente um juízo geral acerca do caráter ilícito do fato e também a possibilidade de se atingir esse juízo mediante um simples e exigível esforço da consciência Em suma basta o esforço normal da inteligência do agente para aferição da potencial consciência da ilicitude A potencial consciência da ilicitude é afastada pelo erro de proibição escusável CP art 21 caput Erro de proibição Introdução Falavase no Direito Romano em erro de direito para se referir à ignorância ou falsa interpretação da lei Essa opção foi acolhida pela redação original do Código Penal de 1940 que sob a rubrica ignorância ou erro de direito dispunha A ignorância 29412 ou a errada compreensão da lei não eximem de pena Com a Reforma da Parte Geral do Código Penal pela Lei 72091984 o panorama mudou o erro de direito então tratado pelo art 16 cedeu espaço ao erro sobre a ilicitude do fato disciplinado pelo art 21 e denominado erro de proibição mais técnico e diverso da mera ignorância ou errada compreensão da lei Desconhecimento da lei ignorantia legis É peremptório o art 21 caput 1ª parte do Código Penal O desconhecimento da lei é inescusável Em igual sentido estabelece o art 3º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro Ninguém se escusa de cumprir a lei alegando que não a conhece Em princípio o desconhecimento da lei é irrelevante no Direito Penal Com efeito para possibilitar a convivência de todos em sociedade com obediência ao ordenamento jurídico impõese uma ficção a presunção legal absoluta acerca do conhecimento da lei Considerase ser a lei de conhecimento geral com a sua publicação no Diário Oficial Mas a ciência da existência da lei é diferente do conhecimento do seu conteúdo Aquela se obtém com a publicação da norma escrita este inerente ao conteúdo lícito ou ilícito da lei somente se adquire com a vida em sociedade E é justamente nesse ponto conhecimento do conteúdo da lei do seu caráter ilícito que entra em cena o instituto do erro de proibição Há duas situações diversas desconhecimento da lei inaceitável e desconhecimento do caráter ilícito do fato capaz de afastar a culpabilidade isentando o agente de pena Como define Cezar Roberto Bitencourt A ignorantia legis é matéria de aplicação da lei que por ficção jurídica se presume conhecida por todos enquanto o erro de proibição é matéria de culpabilidade num aspecto inteiramente diverso Não se trata de derrogar ou não os efeitos da lei em função de alguém conhecêla ou desconhecêla A incidência é exatamente esta a relação que existe entre a lei em abstrato e o conhecimento que alguém possa ter de que seu a b 29413 comportamento esteja contrariando a norma legal E é exatamente nessa relação de um lado a norma em abstrato plenamente eficaz e válida para todos e de outro lado o comportamento concreto e individualizado que se estabelecerá ou não a consciência da ilicitude que é matéria de culpabilidade e nada tem que ver com os princípios que informam a estabilidade do ordenamento jurídico3 Embora estabeleça o art 21 caput do Código Penal ser inescusável o desconhecimento da lei o elevado número de complexas normas que compõem o sistema jurídico permite a sua eficácia em duas hipóteses no campo penal atenuante genérica seja escusável ou inescusável o desconhecimento da lei CP art 65 II e autoriza o perdão judicial nas contravenções penais desde que escusável Lei das Contravenções Penais Decretolei 36881941 art 8º Conceito de erro de proibição O erro de proibição foi disciplinado pelo art 21 caput do Código Penal que o chama de erro sobre a ilicitude do fato Varia a natureza jurídica do instituto em razão da sua admissibilidade funciona como causa de exclusão da culpabilidade quando escusável ou como causa de diminuição da pena quando inescusável O erro de proibição pode ser definido como a falsa percepção do agente acerca do caráter ilícito do fato típico por ele praticado de acordo com um juízo profano isto é possível de ser alcançado mediante um procedimento de simples esforço de sua consciência O sujeito conhece a existência da lei penal presunção legal absoluta mas desconhece ou interpreta mal seu conteúdo ou seja não compreende adequadamente seu caráter ilícito A simples omissão ou mesmo conivência do Poder Público no que diz respeito ao combate da criminalidade não autoriza o reconhecimento do erro de proibição Como já decidido pelo Superior Tribunal de Justiça 29414 A simples manutenção de espaço destinado à prática de prostituição traduzse em conduta penalmente reprovável sendo que a possível condescendência dos órgãos públicos e a localização da casa comercial não autorizam por si só a aplicação da figura do erro de proibição com vistas a absolver o réu4 Efeitos escusável e inescusável Na redação original da Parte Geral do Código Penal o erro de direito era considerado pelo art 48 III uma mera atenuante genérica Atualmente porém o erro de proibição relacionase com a culpabilidade podendo ou não excluíla se for escusável ou inescusável Erro de proibição escusável inevitável ou invencível o sujeito ainda que no caso concreto tivesse se esforçado não poderia evitálo O agente nada obstante o emprego das diligências ordinárias inerentes à sua condição pessoal não tem condições de compreender o caráter ilícito do fato Nesse caso excluise a culpabilidade em face da ausência de um dos seus elementos a potencial consciência da ilicitude Nos termos do art 21 caput O erro sobre a ilicitude do fato se inevitável isenta de pena Erro de proibição inescusável evitável ou vencível poderia ser evitado com o normal esforço de consciência por parte do agente Se empregasse as diligências normais seria possível a compreensão acerca do caráter ilícito do fato Subsiste a culpabilidade mas a pena deve ser diminuída de um sexto a um terço em face da menor censurabilidade da conduta O grau de reprovabilidade do comportamento do agente é o vetor para a maior ou menor diminuição E embora o art 21 caput disponha que o juiz poderá diminuir a pena a redução é obrigatória pois não se pode reconhecer a menor censurabilidade e não diminuir a sanção5 O critério para decidir se o erro de proibição é escusável ou inescusável é o perfil subjetivo do agente e não a figura do homem médio De fato em se tratando de matéria inerente à culpabilidade levamse em 29415 conta as condições particulares do responsável pelo fato típico e ilícito cultura localidade em que reside inteligência e prudência etc com a finalidade de se alcançar sua responsabilidade individual que não guarda relação com um standard de comportamento desejado pelo Direito Penal Lembrese quando se fala em fato típico e ilicitude e em todos os institutos a eles relacionados considerase a posição do homem médio pois se analisa o fato típico ou atípico ilícito ou lícito Questionase O fato é típico O fato é ilícito O que vale é o fato pouco importando a pessoa do agente Por outro lado o tema culpabilidade e todas as matérias a ele ligadas considera a figura concreta do responsável pelo fato típico e ilícito para o fim de aferir se ele com base em suas condições pessoais é ou não merecedor de uma pena Questionase O agente é culpável Deve suportar uma pena Critérios para identificação da escusabilidade ou inescusabilidade do erro de proibição O caráter escusável ou inescusável do erro de proibição deve ser calculado com base na pessoa do agente6 O parágrafo único do art 21 do Código Penal consagra esse entendimento ao estabelecer que considerase evitável o erro se o agente atua ou se omite sem a consciência da ilicitude do fato quando lhe era possível nas circunstâncias ter ou atingir essa consciência Esse é o erro de proibição inescusável A contrario sensu concluise que o erro de proibição escusável em consonância com o legislador é aquele em que o agente atua ou se omite sem a consciência da ilicitude do fato quando não lhe era possível nas circunstâncias ter ou atingir essa consciência Porém ainda é pouco Podemos então indagar Há critérios mais seguros e específicos para a identificação do erro de proibição inescusável vencível ou evitável Sim existem critérios precisos fornecidos por Francisco de Assis Toledo7 que nos permitem a elaboração de um quadro esquemático 1 2 3 4 29416 1 2 ERRO DE PROIBIÇÃO INESCUSÁVEL VENCÍVEL OU EVITÁVEL O agente atua com uma consciência profana acerca do caráter ilícito do fato O agente atua sem a mencionada consciência profana quando lhe era fácil atingila nas circunstâncias em que se encontrava isto é com o próprio esforço de inteligência e com os conhecimentos hauridos da vida comunitária de seu próprio meio O agente atua sem a consciência profana sobre o caráter ilícito do fato por ter na dúvida deixado propositadamente de informarse para não ter que evitar uma possível conduta proibida O agente atua sem essa consciência por não ter procurado informarse convenientemente mesmo sem má intenção para o exercício de atividades regulamentadas Espécies de erro de proibição direto indireto e mandamental O erro de proibição pode ser direto indireto e mandamental No erro de proibição direto o agente desconhece o conteúdo de uma lei penal proibitiva ou se o conhece interpretao de forma equivocada Exemplos O credor ao ser avisado que seu devedor está de mudança para outro país ingressa clandestinamente em sua residência e subtrai bens no valor da dívida acreditando ser lícito fazer justiça pelas próprias mãos e O pescador que intencionalmente em águas jurisdicionais brasileiras molesta um cetáceo baleia por exemplo não sabe que comete o crime tipificado pelo art 1º da Lei 76431987 sujeito à pena de reclusão de 2 a 5 anos e multa Por sua vez no erro de proibição indireto também chamado de 29417 29418 descriminante putativa por erro de proibição o agente conhece o caráter ilícito do fato mas no caso concreto acredita erroneamente estar presente uma causa de exclusão da ilicitude ou se equivoca quanto aos limites de uma causa de exclusão da ilicitude efetivamente presente Exemplo A voltando antecipadamente de viagem e sem prévio aviso encontra a esposa em flagrante adultério Saca seu revólver e mata a mulher acreditando estar autorizado a assim agir pela legítima defesa da honra Finalmente no erro de proibição mandamental o agente envolvido em uma situação de perigo a determinado bem jurídico erroneamente acredita estar autorizado a livrarse do dever de agir para impedir o resultado nas hipóteses previstas no art 13 2º do Código Penal Só é possível nos crimes omissivos impróprios Exemplo o pai de família válido para o trabalho mas em situação de pobreza abandona o filho de pouca idade à sua própria sorte matandoo por acreditar que nesse caso não tem a obrigação de por ele zelar Em todas essas modalidades incidem os efeitos previstos no art 21 caput do Código Penal se inevitável o erro de proibição isenta de pena se evitável autoriza a sua diminuição de um sexto a um terço Erro de proibição e crime putativo por erro de proibição Erro de proibição e crime putativo por erro de proibição não se confundem No erro de proibição o sujeito age acreditando na licitude do seu comportamento quando na verdade pratica uma infração penal por não compreender o caráter ilícito do fato Já no crime putativo por erro de proibição delito de alucinação ou crime de loucura o agente atua acreditando que seu comportamento constitui crime ou contravenção penal mas na realidade é penalmente irrelevante Exemplo o pai mantém relações sexuais consentidas com a filha maior de 18 anos de idade e plenamente capaz acreditando cometer o crime de incesto fato atípico no Direito Penal pátrio Diferença entre erro de tipo e erro de proibição 29419 No erro de tipo disciplinado pelo art 20 do Código Penal o sujeito desconhece a situação fática que o cerca não constatando em sua conduta a presença das elementares de um tipo penal Exemplo A leva para casa por engano um livro de B seu colega de faculdade Por acreditar que o bem lhe pertencia desconhecendo a elementar coisa alheia móvel não comete o crime de furto CP art 155 O erro de tipo escusável ou inescusável exclui o dolo Mas se inescusável subsiste a punição por crime culposo se previsto em lei No erro de proibição o sujeito conhece perfeitamente a situação fática em que se encontra mas desconhece a ilicitude do seu comportamento Consequentemente não afeta o dolo natural Quanto aos seus efeitos o erro de proibição se escusável exclui a culpabilidade diante da ausência da potencial consciência da ilicitude um dos seus elementos E se inescusável subsiste o crime e também a culpabilidade incidindo uma causa de diminuição da pena de um sexto a um terço CP art 21 caput Erro de tipo Erro de proibição Causa O agente desconhece a situação fática o que lhe impede o conhecimento de um ou mais elementos do tipo penal Não sabe o que faz O agente conhece a realidade fática mas não compreende o caráter ilícito da sua conduta Sabe o que faz mas não sabe que viola a lei penal Efeitos Escusável exclui o dolo e a culpa e Inescusável exclui o dolo mas permite a punição por crime culposo se previsto em lei Escusável exclui a culpabilidade e Inescusável não afasta a culpabilidade mas permite a diminuição da pena de 16 a 13 O erro de tipo que incide sobre a ilicitude do fato O erro sobre a ilicitude do fato caracteriza erro de proibição relacionandose com o terreno da culpabilidade Essa é a regra adotada pelo Código Penal Excepcionalmente todavia o preceito primário de um tipo penal inclui na descrição da conduta criminosa elementos normativos de índole jurídica ou mesmo palavras ou expressões atinentes à ilicitude É o que se dá exemplificativamente nos crimes de violação de correspondência CP art 151 indevidamente divulgação de segredo violação do segredo profissional abandono material e abandono intelectual CP arts 153 caput e 2º 154 244 caput e 246 sem justa causa Em tais hipóteses o erro sobre a ilicitude do fato caracteriza erro de tipo com todos os seus efeitos e não erro de proibição porque a ilicitude funciona como elemento do tipo penal O erro portanto incide sobre os elementos do tipo 1 2 3 4 5 6 7 CÓRDOBA RODA Juan El conocimiento de la antijuridicidad en la teoría del delito Barcelona Bosch 1962 p 89 e ss DIAS Jorge de Figueiredo O problema da consciência da ilicitude em direito penal 5 ed Coimbra Coimbra Editora 2000p 469 BITENCOURT Cezar Roberto Erro de tipo e erro de proibição Uma análise comparativa 4 ed São Paulo Saraiva 2007 p 9293 REsp 870055SC rel Min Gilson Dipp 5ª Turma j 27022007 MIRABETE Julio Fabbrini Manual de direito penal Parte geral 24 ed São Paulo Atlas 2007 v 1 p 201 STF AP 481PA rel Min Dias Toffoli Plenário j 08092011 TOLEDO Francisco de Assis O erro no direito penal São Paulo Saraiva 1977 p 97 301 302 CONCEITO A exigibilidade de conduta diversa é o elemento da culpabilidade consistente na expectativa da sociedade acerca da prática de uma conduta diversa daquela que foi deliberadamente adotada pelo autor de um fato típico e ilícito Em síntese é necessário tenha o crime sido cometido em circunstâncias normais isto é o agente podia comportarse em conformidade com o Direito mas preferiu violar a lei penal Destarte quando o caso concreto indicar a prática da infração penal em decorrência de inexigibilidade de conduta diversa estará excluída a culpabilidade pela ausência de um dos seus elementos Atribuise a Reinhart Frank a inserção da exigibilidade de conduta conforme ao Direito no juízo da culpabilidade ao desenvolver em 1907 sua teoria da normalidade das circunstâncias concomitantes1 criando a teoria psicológiconormativa da culpabilidade No Código Penal de 1940 com a Parte Geral alterada pela Lei 72091984 o tratamento normativo da culpabilidade restou manifesto nos institutos da coação moral irresistível e da obediência hierárquica art 22 causas legais de exclusão da culpabilidade motivadas pela inexigibilidade de conduta diversa CAUSAS SUPRALEGAIS DE EXCLUSÃO DA CULPABILIDADE a b Os pioneiros acontecimentos que resultaram no reconhecimento da inexigibilidade de conduta diversa como dirimente se deram na Alemanha no início do século XX 1 cavalo bravio e 2 parteira dos filhos de mineradores Como narra Odin Americano2 Cavalo bravio O proprietário de um cavalo indócil ordenou ao cocheiro que o montasse e saísse a serviço O cocheiro prevendo a possibilidade de um acidente se o animal disparasse quis resistir à ordem O dono o ameaçou de dispensa caso não cumprisse o mandado O cocheiro então obedeceu e uma vez na rua o animal tomoulhe às rédeas e causou lesões em um transeunte O Tribunal alemão absolveu o cocheiro sob o fundamento de que se houve previsibilidade do evento não seria justo todavia exigirse outro proceder do agente Sua recusa em sair com o animal importaria a perda do emprego logo a prática da ação perigosa não foi culposa mercê da inexigibilidade de outro comportamento Parteira dos filhos de mineradores A empresa exploradora de uma mina acordou com os seus empregados que no dia do parto da esposa de um operário este ficaria dispensado do serviço sem prejuízo de seus salários Os operários solicitaram da parteira encarregada dos partos que no caso de nascimento verificado em domingo declarasse no Registro Civil que o parto se verificara em dia de serviço ameaçandoa de não procurar seu mister se não os atendesse Temerosa de ficar sem trabalho a parteira acabou em situação difícil por atender à exigência e tornouse autora de uma série de declarações falsas no Registro de Nascimento Foi absolvida por inexigibilidade de conduta diversa Modernamente tem sido sustentada a possibilidade de formulação de causas excludentes da culpabilidade não previstas em lei ou seja supralegais e distintas da coação moral irresistível e da obediência hierárquica Essas causas supralegais se fundamentam em dois pontos 1 2 a exigibilidade de conduta diversa constituise em princípio geral da culpabilidade que dela não pode se desvencilhar Em verdade não se admite a responsabilização penal de comportamentos inevitáveis e a aceitação se coaduna com a regra nullum crimen sine culpa acolhida pelo art 19 do Código Penal Na precisa lição de Francisco de Assis Toledo A inexigibilidade de outra conduta é pois a primeira e mais importante causa de exclusão da culpabilidade E constitui um verdadeiro princípio de direito penal Quando aflora em preceitos legislados é uma causa legal de exclusão Se não deve ser reputada causa supralegal erigindo se em princípio fundamental que está intimamente ligado com o problema da responsabilidade pessoal e que portanto dispensa a existência de normas expressas a respeito3 São cabíveis nos crimes culposos e também nos dolosos nada obstante sejam mais frequentes nos primeiros Exemplificativamente a mãe viúva que deixa em casa sozinho o filho de pouca idade para trabalhar pois não tem pessoas de confiança para cuidar do menino e não pode contar com o serviço público de creche que se encontra em greve sabe que a criança fatalmente subirá em móveis abrirá armários e praticará outras atividades perigosas sendo previsível que em virtude da sua ausência venha a se machucar Ainda que se fira gravemente não deverá a mãe ser responsabilizada pela lesão corporal culposa em face da inexigibilidade de conduta diversa Com efeito seria inadequado impor a ela comportamento diverso pois em tal caso poderiam faltar os recursos mínimos necessários para o sustento e a sobrevivência própria e de sua prole Essa conclusão também é alicerçada no entendimento do Superior Tribunal de Justiça acerca do assunto A exigibilidade de conduta diversa apesar de apresentar muita polêmica é no entendimento predominante elemento da culpabilidade Por via de consequência sem adentrar na questão dos seus limites a tese da inexigibilidade de conduta diversa pode ser apresentada como causa de exclusão da culpabilidade4 303 COAÇÃO MORAL IRRESISTÍVEL Estabelece o art 22 do Código Penal Se o fato é cometido sob coação irresistível só é punível o autor da coação Esse dispositivo legal nada obstante mencione somente coação irresistível referese exclusivamente à coação moral irresistível Com efeito estabelece em sua parte final ser punível só o autor da coação Em outras palavras diz que o coagido está isento de pena expressão que se coaduna com as dirimentes ou seja causas de exclusão da culpabilidade Na coação moral o coator para alcançar o resultado ilícito desejado ameaça o coagido e este por medo realiza a conduta criminosa Essa intimidação recai sobre sua vontade viciandoa de modo a retirar a exigência legal de agir de maneira diferente Excluise a culpabilidade em face da inexigibilidade de conduta diversa5 Por sua vez na coação física irresistível eliminase por completo a vontade do coagido Seu aspecto volitivo não é meramente viciado mas suprimido e ele passa a atuar como instrumento do crime a serviço do coator Excluise a conduta e consequentemente o próprio fato típico praticado pelo coagido A lei não pode impor às pessoas o dever de atuar de modo heroico Destarte se presente uma ameaça séria grave e irresistível não é razoável exigir o cumprimento literal pelo coagido do direito positivo sob pena de suportar riscos que o Direito não será hábil a reparar A coação moral irresistível depende dos seguintes requisitos 1 Ameaça do coator ou seja promessa de mal grave e iminente o qual o coagido não é obrigado a suportar se o mal é atual com maior razão estará excluída a culpabilidade Essa ameaça deve ser direcionada à pessoa do coagido ou ainda a indivíduos com ele intimamente relacionados Se for dirigida a pessoa estranha pode até ser excluída a culpabilidade em face de causa supralegal fundada na inexigibilidade de conduta diversa Se não bastasse essa ameaça precisa ser séria e ligada a ofensa certa Em suma deve ser passível de realização pouco importando se o coator realmente deseja ou não concretizála 2 Inevitabilidade do perigo na posição em que se encontra o coagido se o perigo puder por outro meio ser evitado seja pela atuação do próprio coagido seja pela força policial não há falar na dirimente 3 Caráter irresistível da ameaça além de grave o mal prometido deve ser irresistível A gravidade e a irresistibilidade da ameaça devem ser aferidas no caso concreto levando em conta as condições pessoais do coagido Tratase em verdade de instituto relacionado com a culpabilidade razão pela qual não se considera a figura imaginária do homem médio voltada ao fato típico e ilícito mas o perfil subjetivo do agente que será então considerado culpável ou não Nada obstante há entendimentos no sentido de que a gravidade e a irresistibilidade da coação devem ser calculadas com base nas características do homo medius 4 Presença de ao menos três pessoas envolvidas devem estar presentes o coator o coagido e a vítima do crime por este praticado No caso do diretor de uma empresa que é obrigado por criminosos a entregar todos os valores que se encontram guardados em um cofre que apenas ele pode abrir sob a ameaça de seu filho em poder de outra pessoa ligada aos assaltantes ser morto os envolvidos são os delinquentes coatores o diretor da empresa coagido e a própria empresa lesada em seu patrimônio vítima Admitese contudo a configuração da dirimente em análise com apenas duas pessoas envolvidas coator e coagido Nesse caso o coator funcionaria também como vítima Exemplo em razão de tão grave e irresistível ameaça para praticar crime no futuro o coagido premido pelo medo e sem outra forma de agir mata o próprio coator Essa situação não se confunde com a legítima defesa De fato estaria afastada a excludente da ilicitude em face da inexistência de agressão atual ou iminente A coação moral irresistível afasta a culpabilidade do coagido autor de um fato típico e ilícito Não há contudo impunidade pelo crime responde somente o coator Tratase de manifestação da autoria mediata pois o coator valeuse de uma pessoa sem culpabilidade inexigibilidade de conduta diversa para realizar uma infração penal Não se pode olvidar ainda que o coator responde além do crime praticado pelo coagido pelo crime de tortura definido pelo art 1º I b da Lei 945519976 em concurso material Inexiste concurso de pessoas entre coator e coagido em face da ausência de vínculo subjetivo Não há por parte do coagido a intenção de contribuir para o crime praticado pelo coator Se entretanto a coação moral for resistível remanesce a culpabilidade do coagido operandose autêntico concurso de agentes entre ele e o coator Frisese todavia que na coação moral resistível enquanto a pena do coator será agravada CP art 62 II a do coagido será atenuada CP art 65 III c 1ª parte 304 É o fundado receio de decepcionar pessoa a quem se deve elevado respeito Exemplo filho que falsifica as notas lançadas no boletim da faculdade com o propósito de esconder as avaliações negativas do conhecimento dos pais que arduamente custeiam seus estudos Não se equipara à coação moral Não há ameaça mas apenas receio Além disso na seara do Direito Civil o temor reverencial sequer permite a anulação dos negócios jurídicos não podendo no campo criminal elidir a culpabilidade OBEDIÊNCIA HIERÁRQUICA Estabelece o art 22 do Código Penal Se o fato é cometido em estrita obediência a ordem não manifestamente ilegal de superior hierárquico só é punível o autor da ordem Obediência hierárquica é a causa de exclusão da culpabilidade fundada na inexigibilidade de conduta diversa que ocorre quando um funcionário público subalterno pratica uma infração penal em decorrência do cumprimento de ordem não manifestamente ilegal emitida pelo superior hierárquico Essa regra se fundamenta em dois pilares 1 impossibilidade no caso concreto de conhecer a ilegalidade da ordem e 2 inexigibilidade de conduta diversa A caracterização da dirimente em apreço depende da verificação dos seguintes requisitos 1 Ordem não manifestamente ilegal é a de aparente legalidade em face da crença de licitude que tem um funcionário público subalterno ao obedecer ao mandamento de superior hierárquico colocado nessa posição em razão de possuir maiores conhecimentos técnicos ou por encontrarse há mais tempo no serviço público Daí falarse que a obediência hierárquica representa uma fusão do erro de proibição acarreta no desconhecimento do caráter ilícito do fato com a inexigibilidade de conduta diversa não se pode exigir do subordinado comportamento diferente Se a ordem for legal não há crime seja por parte do superior hierárquico seja por parte do subalterno Em verdade a atuação deste último estará acobertada pelo estrito cumprimento do dever legal causa de exclusão da ilicitude prevista no art 23 III do Código Penal 2 Ordem originária de autoridade competente o mandamento emana de funcionário público legalmente competente para fazêlo O cumprimento de ordem advinda de autoridade incompetente pode no caso concreto resultar no reconhecimento de erro de proibição invencível ou escusável 3 Relação de Direito Público a posição de hierarquia que autoriza o reconhecimento da excludente da culpabilidade somente existe no Direito Público Não é admitida no campo privado por falta de suporte para punição severa e injustificada àquele que descumpre ordem não manifestamente ilegal emanada de seu superior Essa hierarquia exclusiva da área pública é mais frequente entre os militares O descumprimento de ordem do superior na seara castrense caracteriza motivo legítimo para prisão disciplinar ou até mesmo crime tipificado pelo art 163 do Código Penal Militar 4 Presença de pelo menos três pessoas envolve o mandante da ordem superior hierárquico seu executor subalterno e a vítima do crime por este praticado 5 Cumprimento estrito da ordem o executor não pode ultrapassar por conta própria os limites da ordem que lhe foi endereçada sob pena de afastamento da excludente A propósito dispõe o art 38 2º do Código Penal Militar Se a ordem do superior tem por objeto a prática de ato manifestamente criminoso ou há excesso nos atos ou na forma de execução é punível também o inferior O estrito cumprimento de ordem não manifestamente ilegal de superior hierárquico exclui a culpabilidade do executor subalterno com fulcro na inexigibilidade de conduta diversa O fato contudo não permanece impune pois por ele responde o autor da ordem Imagine a hipótese de um Delegado de Polícia com larga experiência em sua atividade que determina a um investigador de Polícia de sua equipe recém ingressado na instituição a prisão em flagrante de um desafeto autor de um crime de roubo ocorrido há mais de uma semana em relação ao qual não houve perseguição fato desconhecido pelo subordinado O subalterno no caso seja em face do restrito conhecimento do caso concreto seja em respeito ao superior hierárquico em quem muito confia não pode ser responsabilizado devendo o crime ser atribuído exclusivamente ao autor da ordem Inexiste na obediência hierárquica concurso de pessoas entre o mandante e o executor da ordem não manifestamente ilegal por falta da unidade de elemento subjetivo relativamente à produção do resultado Se entretanto a ordem for manifestamente ilegal mandante e executor respondem pela infração penal pois se caracteriza o concurso de agentes Ambos sabem do caráter ilícito da conduta e contribuem para o resultado Para o superior hierárquico incide a agravante genérica descrita pelo art 62 III 1ª parte do Código Penal E no tocante ao subalterno aplicase a atenuante genérica delineada pelo art 65 III c em cumprimento de ordem de autoridade superior do Código Penal Na análise da legalidade ou ilegalidade da ordem deve ser considerado o perfil subjetivo do executor e não os dados comuns ao homem médio porque se trata de questão afeta à culpabilidade na qual sempre se consideram as condições pessoais do agente para se concluir se é ou não culpável 1 2 3 4 5 6 FRANK Reinhart Sobre la estructura del concepto de culpabilidad Buenos Aires B de F 2004 p 28 e ss AMERICANO Odin Da culpabilidade normativa Estudos de direito e processo penal em homenagem a Nélson Hungria Rio de Janeiro Forense 1962 p 348349 TOLEDO Francisco de Assis Princípios básicos de direito penal 5 ed 13 tir São Paulo Saraiva 2007 p 328 HC 16865PE rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 09102001 a inexigibilidade de conduta diversa somente funciona como causa de exclusão da culpabilidade quando proceder de forma contrária à lei se mostrar como única alternativa possível diante de determinada situação Se há outros meios de solução do impasse a exculpante não se caracteriza STJ REsp 1456633RS rel Min Reynaldo Soares da Fonseca 5ª Turma j 05042016 noticiado no Informativo 581 Art 1º Constitui crime de tortura I constranger alguém com emprego de violência ou grave ameaça causandolhe sofrimento físico ou mental b para provocar ação ou omissão de natureza criminosa grifamos As regras inerentes ao concurso de pessoas encontramse disciplinadas pelos arts 29 a 31 do Código Penal Na redação original da Parte Geral do Código Penal isto é anteriormente à entrada em vigor da Lei 72091984 o instituto era denominado simplesmente de coautoria de forma pouco abrangente e imprecisa por desprezar a figura da participação Atualmente o Código Penal fala em concurso de pessoas Várias outras nomenclaturas são também encontradas na doutrina concurso de agentes codelinquência concurso de delinquentes cumplicidade bem como coautoria e participação ambas em sentido lato É a colaboração empreendida por duas ou mais pessoas para a realização de um crime ou de uma contravenção penal O concurso de pessoas depende de cinco requisitos 3141 Pluralidade de agentes culpáveis O concurso de pessoas depende de pelo menos duas pessoas e consequentemente de ao menos duas condutas penalmente relevantes Essas condutas podem ser principais no caso da coautoria ou então uma principal e outra acessória praticadas pelo autor e pelo partícipe respectivamente Os coautores ou partícipes entretanto devem ser culpáveis ou seja dotados de culpabilidade Com efeito a teoria do concurso de pessoas desenvolveuse para solucionar os problemas envolvendo os crimes unissubjetivos ou de concurso eventual que são aqueles em regra cometidos por uma única pessoa mas que admitem o concurso de agentes Nesses delitos a culpabilidade dos envolvidos é fundamental sob pena de caracterização da autoria mediata Como veremos em seguida outro requisito do concurso de pessoas é o vínculo subjetivo entre os agentes exigindo assim que sejam todos culpáveis pois quem não goza desse juízo não tem capacidade para aderir à conduta alheia Exemplificativamente se um maior de 18 anos penalmente capaz encomenda a morte de sua sogra a um menor de idade não há por que falar em concurso de pessoas mas em autoria mediata Nos ensinamentos de Esther de Figueiredo Ferraz a teoria do concurso de pessoas tem por objeto o concurso eventual ou contingente que representa no dizer de ANTOLISEI a hipótese comum ou seja a dos crimes que abstratamente considerados podem ser praticados indiferentemente por um só ou por vários indivíduos Nessa hipótese que corresponde à regra geral se enquadra a maioria dos crimes definidos nas leis penais7 Vale recordar que no tocante aos crimes plurissubjetivos plurilaterais ou de concurso necessário é dizer aqueles em que o tipo penal exige a realização da conduta por dois ou mais agentes a culpabilidade de todos os coautores ou partícipes é prescindível Admitese a presença de um único agente culpável podendo os demais enquadrarse em categoria diversa De fato não se faz necessária a utilização da norma de extensão prevista no art 29 caput do Código Penal uma vez que a presença de duas ou mais pessoas é garantida pelo próprio tipo penal Nessas espécies de crimes não se diz quem de qualquer modo concorre para o crime incide nas penas a este cominadas na medida de sua culpabilidade pois é a própria lei penal incriminadora que por si só reclama a pluralidade de pessoas É o que se dá por exemplo nos crimes de rixa CP art 137 e associação criminosa CP art 288 nos quais o crime estará perfeitamente caracterizado quando existir entre os rixosos ou quadrilheiros pessoas sem culpabilidade desde que algum dos envolvidos seja culpável Da mesma forma nos crimes eventualmente plurissubjetivos aqueles geralmente praticados por uma única pessoa mas que têm a pena aumentada quando praticados em concurso a capacidade de culpa de um dos envolvidos é dispensável Nesses termos incide relativamente ao furto praticado por um maior de idade na companhia de um adolescente a qualificadora prevista no art 155 4º IV do Código Penal Nesses crimes necessariamente plurissubjetivos ou eventualmente plurissubjetivos há portanto um pseudoconcurso concurso impróprio ou concurso aparente de pessoas É o que se extrai da lição de Manzini Não se pode juridicamente falar em participação criminosa se pelo menos dois dentre os concorrentes não forem capazes em termos de direito penal e imputáveis Quando o fato tenha sido cometido por duas pessoas uma das quais não sejam imputável esta não será copartícipe daquela mas um simples instrumento da primeira non agid sed agitur a qual responde sozinha pelo delito cometido8 Concluise pois que para o concurso de pessoas não basta a mera pluralidade de agentes Exigese sejam todos culpáveis 3142 3143 Relevância causal das condutas para a produção do resultado Concorrer para a infração penal importa em dizer que cada uma das pessoas deve fazer algo para que a empreitada tenha vida no âmbito da realidade Em outras palavras a conduta deve ser relevante pois sem ela a infração penal não teria ocorrido como e quando ocorreu O art 29 caput do Código Penal fala em de qualquer modo expressão que precisa ser compreendida como uma contribuição pessoal física ou moral direta ou indireta comissiva ou omissiva anterior ou simultânea à execução Deve a conduta individual influir efetivamente no resultado9 Destarte não pode ser considerado coautor ou partícipe quem assume em relação à infração penal uma atitude meramente negativa quem não dá causa ao crime quem não realiza qualquer conduta sem a qual o resultado não teria se verificado De fato a participação inócua que em nada concorre para a realização do crime é irrelevante para o Direito Penal Anotese que esse requisito relevância causal depende de uma contribuição prévia ou concomitante à execução isto é anterior à consumação A concorrência posterior à consumação configura crime autônomo receptação favorecimento real ou pessoal por exemplo mas não concurso de pessoas Em tema de concurso de pessoas a contribuição pode até ser concretizada após a consumação desde que tenha sido ajustada anteriormente Exemplo A se compromete perante B a auxiliálo a fugir e a escondêlo depois de matar C Será partícipe do homicídio Contudo se somente depois da morte de C se dispuser a ajudálo a subtrairse da ação da autoridade pública não será partícipe do homicídio mas autor do crime de favorecimento pessoal CP art 348 Vínculo subjetivo Esse requisito também chamado de concurso de vontades impõe estejam todos os agentes ligados entre si por um vínculo de ordem subjetiva um nexo psicológico pois caso contrário não haverá um crime praticado em concurso mas vários crimes simultâneos De fato na ausência desta condição estará caracterizada a autoria colateral10 Os agentes devem revelar vontade homogênea visando a produção do mesmo resultado É o que se convencionou chamar de princípio da convergência Logo não é possível a contribuição dolosa para um crime culposo nem a concorrência culposa para um delito doloso O vínculo subjetivo não depende contudo do prévio ajuste entre os envolvidos pactum sceleris Basta a ciência por parte de um agente no tocante ao fato de concorrer para a conduta de outrem scientia sceleris ou scientia maleficii chamada pela doutrina de consciente e voluntária cooperação vontade de participar vontade de coparticipar adesão à vontade de outrem ou concorrência de vontades11 Imagine o seguinte exemplo A fala pelo telefone celular a um amigo que na saída do trabalho irá matar B com golpes de faca C desafeto de B escuta a conversa No final do expediente B percebe que será atacado por A e mais rápido consegue fugir A todavia o persegue e consegue alcançálo provocando sua morte graças à ajuda de C que derrubou B dolosamente circunstância ignorada por A Nesse caso C será partícipe do crime de homicídio praticado por A Fica claro que para a caracterização do vínculo subjetivo é suficiente a atuação consciente do partícipe no sentido de contribuir para a conduta do autor ainda que esta desconheça a colaboração Não se reclama o prévio ajuste muito menos estabilidade na união o que acarretaria a caracterização da associação criminosa CP art 288 se presentes pelo menos três pessoas e o fim específico de cometer crimes Nessa linha decidiu o Supremo Tribunal Federal no famoso caso do mensalão Não procede a alegação da defesa no sentido de que teria havido mero concurso de agentes para a prática em tese dos demais crimes narrados na denúncia lavagem de dinheiro e em alguns casos corrupção passiva Os fatos como narrados pelo ProcuradorGeral da República 3144 a b demonstram a existência de uma associação prévia consolidada ao longo tempo reunindo os requisitos estabilidade e finalidade voltada para a prática de crimes além da união de desígnios entre os acusados12 Unidade de infração penal para todos os agentes Estabelece o art 29 caput do Código Penal Quem de qualquer modo concorre para o crime incide nas penas a este cominadas na medida de sua culpabilidade grifamos Para a caracterização do concurso de pessoas adotouse como regra a teoria unitária monística ou monista quem concorre para um crime por ele responde13 Todos os coautores e partícipes se sujeitam a um único tipo penal há um único crime com diversos agentes Assim se 10 dez pessoas com unidade de desígnios esfaqueiam alguém temse um crime de homicídio nada obstante existam 10 dez coautores A propósito consta do item 25 da Exposição de Motivos da Parte Geral do Código Penal O Código de 1940 rompeu a tradição originária do Código Criminal do Império e adotou neste particular a teoria unitária ou monística do Código italiano como corolário da teoria da equivalência das causas Excepcionalmente contudo o Código Penal abre espaço para a teoria pluralista pluralística da cumplicidade do crime distinto ou autonomia da cumplicidade pela qual se separam as condutas com a criação de tipos penais diversos para os agentes que buscam um mesmo resultado É o que se dá por exemplo nos seguintes crimes aborto provocado por terceiro com o consentimento da gestante ao terceiro executor imputase o crime tipificado no art 126 enquanto para a gestante incide o crime previsto no art 124 in fine bigamia quem já é casado pratica a conduta narrada no art 235 caput ao passo que aquele que não sendo casado contrai casamento com pessoa casada conhecendo essa circunstância incide na figura típica prevista no 1º do citado dispositivo legal c d 3145 3151 corrupção passiva e ativa o funcionário público pratica corrupção passiva art 317 e o particular corrupção ativa art 333 e falso testemunho ou falsa perícia testemunha perito contador tradutor ou intérprete que faz afirmação falsa nega ou cala a verdade em processo judicial ou administrativo inquérito policial ou em juízo arbitral pratica o crime delineado pelo art 342 caput e quem dá oferece ou promete dinheiro ou qualquer outra vantagem a tais pessoas almejando aquela finalidade incide no art 343 caput Em sede doutrinária ainda despontam outras duas teorias dualista e mista Para a teoria dualista idealizada por Vicenzo Manzini no caso de pluralidade de agentes e de condutas diversas provocando um mesmo resultado há dois crimes distintos um para os coautores e outro para os partícipes Por fim para a teoria mista proposta por Francesco Carnelutti O delito concursal é uma soma de delitos singulares cada um dos quais pode ser chamado delito em concurso Entre o delito em concurso e o concursal há a mesma diferença que existe entre a parte e o todo E o traço característico do primeiro reside em que ele não constitui uma entidade autônoma mas elemento de um delito complexo que é o concursal14 Existência de fato punível O concurso de pessoas depende da punibilidade de um crime a qual requer em seu limite mínimo o início da execução Tal circunstância constitui o princípio da exterioridade Nessa linha de raciocínio dispõe o art 31 do Código Penal O ajuste a determinação ou instigação e o auxílio salvo disposição expressa em contrário não são puníveis se o crime não chega pelo menos a ser tentado Teorias Existem diversas teorias que buscam fornecer o conceito de autor a teoria subjetiva ou unitária não diferencia o autor do partícipe Autor é aquele que de qualquer modo contribuir para a produção de um resultado penalmente relevante Seu fundamento repousa na teoria da equivalência dos antecedentes ou conditio sine qua non pois qualquer colaboração para o resultado independente do seu grau a ele deu causa Essa teoria foi adotada pelo Código Penal em sua redação primitiva datada de 1940 Uma evidência dessa posição ainda existe no art 349 do Código Penal não alterado pela Lei 72091984 Prestar a criminoso fora dos casos de coautoria ou de receptação auxílio destinado a tornar seguro o proveito do crime grifamos b teoria extensiva também se fundamenta na teoria da equivalência dos antecedentes não distinguindo o autor do partícipe É todavia mais suave porque admite causas de diminuição da pena para estabelecer diversos graus de autoria Aparece nesse âmbito a figura do cúmplice autor que concorre de modo menos importante para o resultado c teoria objetiva ou dualista opera nítida distinção entre autor e partícipe Foi adotada pela Lei 72091984 Reforma da Parte Geral do Código Penal como se extrai do item 25 da Exposição de Motivos Sem completo retorno à experiência passada curvase contudo o Projeto aos críticos desta teoria ao optar na parte final do art 29 e em seus dois parágrafos por regras precisas que distinguem a autoria da participação Distinção aliás reclamada com eloquência pela doutrina em face de decisões reconhecidamente injustas Essa teoria subdividese em outras três c1 teoria objetivoformal autor é quem realiza o núcleo verbo do tipo penal ou seja a conduta criminosa descrita pelo preceito primário da norma incriminadora Por sua vez partícipe é quem de qualquer modo concorre para o crime sem praticar o núcleo do tipo Exemplo quem efetua disparos de revólver em alguém matandoo é autor do crime de homicídio Por sua vez aquele que empresta a arma de fogo para essa finalidade é partícipe de tal crime Destarte a atuação do partícipe seria impune no exemplo fornecido a conduta de auxiliar a matar não encontra correspondência imediata no crime de homicídio se não existisse a norma de extensão pessoal prevista no art 29 caput do Código Penal A adequação típica na participação é de subordinação mediata Nesse contexto o autor intelectual é dizer aquele que planeja mentalmente a conduta criminosa é partícipe e não autor eis que não executa o núcleo do tipo penal Essa teoria é a preferida pela doutrina nacional e tem o mérito de diferenciar precisamente a autoria da participação Falha todavia ao deixar em aberto o instituto da autoria mediata Autoria mediata é a modalidade de autoria em que o autor realiza indiretamente o núcleo do tipo valendose de pessoa sem culpabilidade ou que age sem dolo ou culpa c2 teoria objetivomaterial autor é quem presta a contribuição objetiva mais importante para a produção do resultado e não necessariamente aquele que realiza no núcleo do tipo penal De seu turno partícipe é quem concorre de forma menos relevante ainda que mediante a realização do núcleo do tipo c3 teoria do domínio do fato criada em 1939 por Hans Welzel com o propósito de ocupar posição intermediária entre as teorias objetiva e subjetiva Para essa concepção autor é quem possui controle sobre o domínio final do fato domina finalisticamente o trâmite do crime e decide acerca da sua prática suspensão interrupção e condições De fato autor é aquele que tem a capacidade de fazer continuar e de impedir a conduta penalmente ilícita15 Nas lições do pai do finalismo penal Senhor do fato é aquele que o realiza em forma final em razão de sua decisão volitiva A conformação do fato mediante a vontade de realização que dirige em forma planificada é o que transforma o autor em senhor do fato16 a b c d A teoria do domínio do fato amplia o conceito de autor definindoo como aquele que tem o controle final do fato ainda que não realize o núcleo do tipo penal Por corolário o conceito de autor compreende o autor propriamente dito é aquele que pratica o núcleo do tipo penal o autor intelectual é aquele que planeja mentalmente a empreitada criminosa É autor e não partícipe pois tem poderes para controlar a prática do fato punível Exemplo o líder de uma organização criminosa pode do interior de um presídio determinar a prática de um crime por seus seguidores Se e quando quiser pode interromper a execução do delito e retomála quando melhor lhe aprouver o autor mediato é aquele que se vale de um inculpável ou de pessoa que atua sem dolo ou culpa para cometer a conduta criminosa e os coautores a coautoria ocorre nas hipóteses em que o núcleo do tipo penal é realizado por dois ou mais agentes Coautor portanto é aquele que age em colaboração recíproca e voluntária com o outro ou os outros para a realização da conduta principal o verbo do tipo penal Essa teoria também admite a figura do partícipe Partícipe no campo da teoria do domínio do fato é quem de qualquer modo concorre para o crime desde que não realize o núcleo do tipo penal nem possua o controle final do fato Dentro de uma repartição estratificada de tarefas o partícipe seria um simples concorrente acessório Em suma o partícipe só possui o domínio da vontade da própria conduta tratandose de um colaborador uma figura lateral não tendo o domínio finalista do crime O delito não lhe pertence ele colabora no crime alheio17 Em face de sua finalidade a teoria do domínio do fato somente tem aplicação nos crimes dolosos Com efeito essa teoria não se encaixa no perfil dos crimes culposos pois 3152 não se pode conceber o controle final de um fato não desejado pelo autor da conduta18 A teoria do domínio do fato portanto é acometida da mesma deficiência da teoria finalista da conduta criticada por não se encaixar nesses delitos Como destaca José Cerezo Mir Mas tropeça com dificuldades nos delitos imprudentes porque neles não se pode falar de domínio do fato já que o resultado se produz de modo cego causal não finalista Por este motivo Welzel se viu obrigado a desdobrar o conceito de autor Nos delitos imprudentes é autor todo aquele que contribui para a produção do resultado com uma conduta que não responde ao cuidado objetivamente devido Nos delitos dolosos é autor quem tem o domínio finalístico do fato19 É preciso destacar para afastar a responsabilidade penal objetiva que a teoria do domínio do fato não preceitua que a mera posição de um agente na escala hierárquica sirva para demonstrar ou reforçar seu dolo e também não permite a condenação de quem quer que seja com base em meras conjecturas desprovidas de suporte probatório É indispensável a individualização da conduta de todos os envolvidos na empreitada criminosa inclusive com a demonstração do dolo de cada um deles20 Teoria adotada pelo Código Penal O art 29 caput do Código Penal acolheu a teoria restritiva no prisma objetivoformal Em verdade diferencia autor e partícipe Aquele é quem realiza o núcleo do tipo penal este é quem de qualquer modo concorre para o crime sem executar a conduta criminosa A teoria deve todavia ser complementada pela teoria da autoria mediata21 Contudo é preciso destacar que no julgamento da Ação Penal 470 o famoso caso do mensalão alguns ministros do STF se filiaram à teoria do domínio do fato Essa teoria também ganhou força com a edição da Lei 128502013 Lei do Crime Organizado mais especificamente em seu art 2º 3º A pena é agravada para quem exerce o comando individual ou coletivo da organização criminosa ainda que não pratique pessoalmente atos de execução O art 29 caput do Código Penal filiouse à teoria unitária ou monista Todos os que concorrem para um crime por ele respondem Há pluralidade de agentes e unidade de crime Assim sendo todos os envolvidos em uma infração penal por ela são responsáveis Exemplo quatro indivíduos cometeram em concurso um crime de homicídio simples CP art 121 caput Sujeitarseão às penas de 6 seis a 20 vinte anos de reclusão A identidade de crime contudo não importa automaticamente em identidade de penas O art 29 caput do Código Penal curvouse ao princípio da culpabilidade ao empregar em sua parte final a expressão na medida de sua culpabilidade Nesses termos as penas devem ser individualizadas no caso concreto levandose em conta o sistema trifásico delineado pelo art 68 do Código Penal Exemplificativamente um reincidente e portador de péssimos antecedentes deve suportar uma reprimenda mais elevada do que a imposta a um réu primário e sem antecedentes criminais Para o Supremo Tribunal Federal A circunstância judicial culpabilidade disposta no art 59 do CP atende ao critério constitucional da individualização da pena Com base nessa orientação o Plenário indeferiu habeas corpus em que se pleiteava o afastamento da mencionada circunstância judicial Consignouse que a previsão do aludido dispositivo legal atinente à culpabilidade mostrarse ia afinada com o princípio maior da individualização porquanto a análise judicial das circunstâncias pessoais do réu seria indispensável à adequação temporal da pena em especial nos crimes perpetrados em concurso de pessoas nos quais se exigiria que cada um respondesse tão somente na medida de sua culpabilidade CP art 29 Afirmouse que o dimensionamento desta quando cotejada com as demais circunstâncias descritas no art 59 do CP revelaria ao magistrado o grau de censura pessoal do réu na prática do ato delitivo Aduziuse que ao contrário do que sustentado a ponderação acerca das circunstâncias judiciais do crime atenderia ao princípio da proporcionalidade e representaria verdadeira limitação da discricionariedade judicial na tarefa individualizadora da penabase22 Ademais é importante destacar que um autor ou coautor não necessariamente deverá ser punido mais gravemente do que um partícipe O fator decisivo para tanto é o caso concreto levandose em conta a culpabilidade de cada agente Nesse sentido um autor intelectual partícipe normalmente deve ser punido de forma mais severa do que o autor do delito pois sem a sua vontade sem a sua ideia o crime não ocorreria O próprio Código Penal revela filiarse a esse entendimento no tocante ao autor intelectual ao dispor no art 62 I A pena será ainda agravada em relação ao agente que promove ou organiza a cooperação no crime ou dirige a atividade dos demais agentes Em suma o autor intelectual além de responder pelo mesmo crime imputado ao autor tem contra si por mandamento legal uma agravante genérica Também chamada de desvios subjetivos entre os agentes ou participação em crime menos grave está descrita pelo art 29 2º do Código Penal Se algum dos concorrentes quis participar de crime menos grave serlheá aplicada a pena deste essa pena será aumentada até a 12 metade na hipótese de ter sido previsível o resultado mais grave Esse dispositivo pode ser fracionado em duas partes 1ª parte Se algum dos concorrentes quis participar de crime menos grave serlheá aplicada a pena deste Essa regra constituise em corolário lógico da teoria unitária ou monista adotada pelo art 29 caput do Código Penal Destinase ainda a afastar a responsabilidade objetiva no concurso de pessoas A interpretação a ser dada é a seguinte dois ou mais agentes cometeram dois ou mais crimes Em relação a algum deles o mais grave entretanto não estavam ligados pelo vínculo subjetivo isto é não tinham unidade de propósitos quanto à produção do resultado Vejamos um exemplo A e B combinam a prática do furto de um automóvel que estava estacionado em via pública Chegam ao local e quando tentavam abrir a porta do veículo surge seu proprietário A foge mas B que trazia consigo um revólver circunstância que não havia comunicado ao seu comparsa atira na vítima matandoa Nesse caso A deve responder por tentativa de furto CP art 155 cc o art 14 II e B por latrocínio consumado CP art 157 3º II Se um dos concorrentes quis participar de crime menos grave diz a lei penal é porque em relação a ele não há concurso de pessoas O vínculo subjetivo existia somente no tocante ao crime menos grave Vedase destarte a responsabilidade penal objetiva pois não se permite a punição de um agente por crime praticado exclusivamente por outrem frente ao qual não agiu com dolo ou culpa Finalmente o Código Penal empregou a palavra concorrente de forma genérica com o escopo de englobar tanto o autor como o partícipe ou seja a pessoa que de qualquer modo concorra para o crime 2ª parte Essa pena será aumentada até a 12 metade na hipótese de ter sido previsível o resultado mais grave Diz o Código Penal que o crime mais grave não pode ser imputado em hipótese alguma àquele que apenas quis participar de um crime menos grave Esse mandamento legal deve ser interpretado em sintonia com o anterior Quando o crime mais grave não era previsível a algum dos concorrentes ele responde somente pelo crime menos grave sem qualquer majoração da pena É o que ocorre no exemplo já mencionado Agora ainda que fosse o crime mais grave previsível àquele que concorreu exclusivamente ao crime menos grave subsistirá apenas em relação a este a responsabilidade penal Por se tratar contudo de conduta mais reprovável a pena do crime menos grave poderá ser aumentada até a 12 metade Muita atenção o agente continua a responder somente pelo crime menos grave embora com a pena aumentada até a metade A ele não pode ser imputado o crime mais grave pois em relação a este delito não estava ligado com a terceira pessoa pelo vínculo subjetivo Imaginemos que no exemplo indicado A tivesse agido da mesma forma isto é queria cometer um furto e evadiuse com a chegada da vítima Era objetivamente previsível contudo o resultado mais grave latrocínio pois tinha ciência de que B andava armado com frequência e já tinha matado diversas pessoas Se não concorreu para o resultado mais grave pois não quis dele participar responde pela tentativa de furto com a pena aumentada da metade em face da previsibilidade do latrocínio Vale a pena acompanhar uma situação real enfrentada pelo Superior Tribunal de Justiça Se a intenção do agravante era a de praticar o crime de furto sendo que o emprego de grave ameaça por um dos corréus ocorreu fora do âmbito de sua atuação na prática criminosa uma vez que estava em local diverso quando houve a aludida ameaça não lhe pode ser estendida esta elementar mas deve responder na medida da sua culpabilidade segundo a cooperação dolosamente distinta prevista no art 29 2º do Código Penal Situação concreta em que segundo expresso no acórdão recorrido a intenção dos coautores entre eles o agravante era a de praticar um crime de furto Quando da execução do crime o agravante não entrou no local de onde foram subtraídos os bens mas ficou aguardando numa motocicleta para que pudessem empreender fuga No curso da ação criminosa perpetrada diretamente pelos outros dois corréus um deles ao se deparar com a caseira no interior da propriedade utilizouse de grave ameaça para garantir a detenção das coisas subtraídas Hipótese em que deve incidir a causa de aumento prevista no referido dispositivo tendo em vista a afirmação contida no julgado combatido de que em razão da presença de uma pessoa na propriedade onde estavam os bens a serem subtraídos era previsível a possibilidade de ocorrência de resultado mais grave23 3181 Essa previsibilidade deve ser aferida de acordo com o juízo do homem médio ou seja o resultado mais grave será previsível quando a sua visão prévia era possível a um ser humano dotado de prudência razoável e inteligência comum Coautoria É a forma de concurso de pessoas que se caracteriza pela existência de dois ou mais autores unidos entre si pela busca do mesmo resultado Exemplo A e B por motivo torpe efetuam disparos de arma de fogo contra C causando a morte deste São coautores do crime tipificado pelo art 121 2º I do Código Penal A coautoria pode ser parcial ou direta Coautoria parcial ou funcional é aquela em que os diversos agentes praticam atos diversos os quais somados produzem o resultado almejado Exemplo A segura a vítima enquanto B a esfaqueia acarretando na sua morte Por sua vez na coautoria direta ou material os agentes realizam atos iguais visando a produção do resultado previsto em lei Exemplo A e B golpeiam C com uma faca matandoo Crimes próprios ou especiais são aqueles em que o tipo penal exige uma situação de fato ou de direito diferenciada por parte do sujeito ativo Apenas quem reúne as condições especiais previstas na lei pode praticálo É o caso do peculato CP art 312 cujo sujeito ativo deve ser funcionário público e também do infanticídio CP art 123 que precisa ser praticado pela mãe durante o parto ou logo após sob a influência do estado puerperal Crimes de mão própria de atuação pessoal ou de conduta infungível de outro lado são os que somente podem ser praticados pelo sujeito expressamente indicado pelo tipo penal Podese apontar o exemplo do falso testemunho CP art 342 Os crimes próprios podem ser praticados em coautoria É possível que duas ou mais pessoas dotadas das condições especiais reclamadas pela lei executem conjuntamente o núcleo do tipo É o caso de dois funcionários públicos que juntos subtraem bens pertencentes à Administração Pública Mas não é só Nada impede seja um crime próprio cometido por uma pessoa que preencha a situação fática ou jurídica exigida pela lei em concurso com terceira pessoa sem essa qualidade Exemplo A funcionário público convida B particular para lhe ajudar a subtrair um computador que se encontra no gabinete da repartição pública em que trabalha B ciente da condição de funcionário público de A ajudao a ingressar no local e a transportar o bem até a sua casa Ambos respondem por peculato Essa conclusão se coaduna com a regra traçada pelo art 30 do Código Penal por ser a condição de funcionário público elementar do peculato comunicase a quem participa do crime desde que dela tenha conhecimento Os crimes de mão própria por sua vez são incompatíveis com a coautoria Com efeito podem ser praticados exclusivamente pela pessoa taxativamente indicada pelo tipo penal Por corolário ninguém mais pode com ela executar o núcleo do tipo Em um falso testemunho proferido em ação penal a título ilustrativo o advogado ou membro do Ministério Público não têm como negar ou calar a verdade juntamente com a testemunha Apenas ela poderá fazêlo Existe somente uma exceção a esta regra relativa ao crime de falsa perícia CP art 342 praticado em concurso por dois ou mais peritos contadores tradutores ou intérpretes como na hipótese em que dois peritos subscrevem dolosamente o mesmo laudo falso Tratase de crime de mão própria cometido em coautoria24 Executor de reserva é o agente que acompanha presencialmente a execução da conduta típica ficando à disposição se necessário para nela intervir Se intervier será tratado como coautor e em caso negativo como partícipe Exemplo A munido de uma faca e B com um revólver aguardam em tocaia a passagem de C Quando este passa pela emboscada A parte em sua direção para matálo enquanto B de arma em punho aguarda eventual e necessária atuação Se agir será coautor se não partícipe É a espécie de coautoria que ocorre quando a conduta iniciada em autoria única se consuma com a colaboração de outra pessoa com forças concentradas mas sem prévio e determinado ajuste Marcello Jardim Linhares apresenta o seguinte exemplo Se um dos agentes em situação de imoderação dolosa golpeou a vítima com socos e pontapés na cabeça jogandoa ao chão e mais adiante seu companheiro também em estado de excesso doloso atingea outra vez na cabeça com a coronha de uma espingarda respondem ambos em coautoria sucessiva pelo resultado de lesões corporais graves25 Esse assunto também não é pacífico Há duas posições 1ª posição É possível a coautoria em crimes omissivos sejam eles próprios ou puros ou ainda impróprios espúrios ou comissivos por omissão Para o aperfeiçoamento da coautoria basta que dois ou mais agentes vinculados pela unidade de propósitos prestem contribuições relevantes para a produção do resultado realizando atos de execução previstos na lei penal Filiamse a essa corrente dentre outros Cezar Roberto Bitencourt26 e Guilherme de Souza Nucci que exemplifica Duas pessoas podem caminhando pela rua depararse com outra ferida em busca de ajuda Associadas uma conhecendo a conduta da outra e até havendo incentivo recíproco resolvem ir embora São coautoras do crime de omissão de socorro art 135 CP27 2ª posição Não se admite a coautoria em crimes omissivos qualquer que seja a sua natureza De acordo com essa posição a coautoria não é possível nos crimes omissivos porque cada um dos sujeitos detém o seu dever de agir imposto pela lei a todos nos próprios ou pertencente a pessoas determinadas CP art 13 2º nos impróprios ou comissivos por omissão de modo individual indivisível e indelegável Nilo Batista defende com veemência esse entendimento O dever de atuar a que está adstrito o autor do delito omissivo é indecomponível Por outro lado como diz Bacigalupo a falta de ação priva de sentido o pressuposto fundamental da coautoria que é a divisão do trabalho assim no es concebible que alguien omita una parte mientras otros omiten el resto Quando dois médicos omitem ainda que de comum acordo denunciar moléstia de notificação compulsória de que tiveram ciência art 269 CP temos dois autores diretos individualmente consideráveis A inexistência do acordo que de resto não possui qualquer relevância típica deslocaria para uma autoria colateral sem alteração substancial na hipótese No famoso exemplo de Kaufmann dos cinquenta nadadores que assistem passivamente ao afogamento do menino temos cinquenta autores diretos da omissão de socorro A solução não se altera se se transferem os casos para a omissão imprópria pai e mãe que deixam o pequeno filho morrer à míngua de alimentação são autores diretos do homicídio a omissão de um não completa a omissão do outro o dever de assistência não é violado em 50 por cada qual28 O Código Penal em vigor não disciplinou expressamente a autoria mediata Cuidase assim de construção doutrinária Tratase da espécie de autoria em que alguém o sujeito de trás29 se utiliza para a execução da infração penal de uma pessoa inculpável ou que atua sem dolo ou culpa Há dois sujeitos nessa relação 1 autor mediato quem ordena a prática do crime e 2 autor imediato aquele que executa a a b c d e conduta criminosa Exemplo A desejando matar sua esposa entrega uma arma de fogo municiada a B criança de pouca idade dizendolhe que se apertar o gatilho na cabeça da mulher esta lhe dará balas Quando se fala em pessoa sem culpabilidade aí se insere qualquer um dos seus elementos imputabilidade potencial consciência da ilicitude e exigibilidade de conduta diversa Ausente um deles ausente a culpabilidade A pessoa que atua sem discernimento seja por ausência de culpabilidade seja pela falta de dolo ou culpa funciona como mero instrumento do crime Inexiste vínculo subjetivo requisito indispensável para a configuração do concurso de agentes Não há portanto concurso de pessoas Somente ao autor mediato pode ser atribuída a propriedade do crime30 Em suma o autor imediato não é punível A infração penal deve ser imputada apenas ao autor mediato Nada impede todavia a coautoria mediata e participação na autoria mediata Exemplos A e B pedem a C inimputável que mate alguém coautoria mediata ou então A induz B ambos imputáveis a pedir a C menor de idade a morte de outra pessoa participação na autoria mediata O Código Penal possui cinco situações em que pode ocorrer a autoria mediata inimputabilidade penal do executor por menoridade penal embriaguez ou doença mental CP art 62 III coação moral irresistível CP art 22 obediência hierárquica CP art 22 erro de tipo escusável provocado por terceiro CP art 20 2º e erro de proibição escusável provocado por terceiro CP art 21 caput E além delas outros casos podem ocorrer nas hipóteses em que o agente atua sem dolo ou culpa tais como na coação física irresistível no sonambulismo e na hipnose 318151 318152 Autoria mediata e crimes culposos A autoria mediata é incompatível com os crimes culposos por uma razão bastante simples nesses crimes o resultado naturalístico é involuntariamente produzido pelo agente Consequentemente não se pode conceber a utilização de um inculpável ou de pessoa sem dolo ou culpa para funcionar como instrumento de um crime cujo resultado o agente não quer nem assume o risco de produzir É da essência da autoria mediata portanto a prática de um crime doloso31 Autoria mediata crimes próprios e de mão própria Crimes próprios ou especiais são aqueles em que o tipo penal exige uma situação fática ou jurídica específica por parte do sujeito ativo Somente quem reúne condições diferenciadas pode praticálo É o caso do peculato CP art 312 cujo sujeito ativo deve ser funcionário público e também do infanticídio CP art 123 que precisa ser praticado pela mãe Por outro lado crimes de mão própria de atuação pessoal ou de conduta infungível são aqueles que somente podem ser praticados pelo sujeito expressamente indicado pelo tipo penal Podese apontar o exemplo do falso testemunho CP art 342 que deve ser executado apenas pela testemunha Entendese pela admissibilidade da autoria mediata nos crimes próprios desde que o autor mediato detenha todas as qualidades ou condições pessoais reclamadas pelo tipo penal Nesse sentido um funcionário público pode se valer de um subalterno sem culpabilidade em decorrência da obediência hierárquica para praticar um peculato subtraindo bens que se encontram sob a custódia da Administração Pública Todavia prevalece o entendimento de que a autoria mediata é incompatível com os crimes de mão própria porque a conduta somente pode ser praticada pela pessoa diretamente indicada pelo tipo penal A infração penal não pode ter a sua execução delegada a outrem No exemplo do falso testemunho uma testemunha não poderia colocar terceira pessoa para negar a verdade em seu lugar Essa regra contudo comporta exceções que podem surgir no caso concreto Confirase o raciocínio de Rogério Greco imaginese a hipótese em que a testemunha seja coagida irresistivelmente a prestar um depoimento falso para beneficiar o autor da coação Nesse caso de acordo com a norma constante do art 22 do Código Penal somente será punido o autor da coação sendo este portanto um caso de autoria mediata32 É assim definida por Zaffaroni É autor por determinação o sujeito que determina outro ao fato mas que conserva seu domínio posto que se o perde como no caso em que o determinado comete um delito já não é autor mas instigador33 Esse conceito foi mais precisamente definido pelo penalista argentino na obra publicada no Brasil em conjunto com José Henrique Pierangeli Zaffaroni e Pierangeli não admitem a figura da autoria mediata nos crimes próprios e de mão própria E apresentam o seguinte exemplo para elucidar o instituto da autoria por determinação Por tratarse de delicta propria tampouco pode ser autor aquele que sem ser funcionário valese de um funcionário público para cometer um delito de corrupção passiva quando o funcionário age em erro de tipo porque crê que aquilo que lhe é entregue não tem valor econômico por exemplo Mas também não pode ser punido como instigador porque o funcionário age atipicamente e portanto falta o injusto de que a instigação deve ser acessória No caso acima narrado as regras inerentes à autoria ou à participação implicariam na impunidade do particular Os ilustres penalistas então questionam O agente não concorre de qualquer modo para o delito Respondem afirmativamente concluindo que o particular não é autor nem partícipe do delito mas sim autor da determinação para o crime e essa autoria de determinação é uma forma de concorrer para o crime Em seguida encerram o raciocínio da seguinte maneira Deve ficar claro que não se trata de autoria do delito mas de um tipo especial de concorrência em que o autor só pode ser apenado como autor da determinação em si e não do delito a que tenha determinado o sujeito não é apenado como autor de corrupção passiva mas como autor da determinação à corrupção passiva34 Autor por determinação é portanto quem se vale de outro que não realiza conduta punível por ausência de dolo em um crime de mão própria ou ainda o sujeito que não reúne as condições legalmente exigidas para a prática de um crime próprio quando se utiliza de quem possui tais qualidades e se comporta de forma atípica ou acobertado por uma causa de exclusão da ilicitude ou da culpabilidade Deve ser imputado ao autor de determinação o resultado produzido pois a ele de qualquer modo concorreu em consonância com a regra prevista no art 29 caput do Código Penal Cuidase de categoria oriunda da doutrina alemã e intimamente relacionada com a teoria do domínio do fato constituindose em autoria mediata particular ou autoria mediata especial Nessa linha de raciocínio é autor de escritório o agente que transmite a ordem a ser executada por outro autor direto dotado de culpabilidade e passível de ser substituído a qualquer momento por outra pessoa no âmbito de uma organização ilícita de poder Exemplo o líder do PCC Primeiro Comando da Capital em São Paulo ou do CV Comando Vermelho no Rio de Janeiro dá as ordens a serem seguidas por seus comandados É ele o autor de escritório com poder hierárquico sobre seus soldados essa modalidade de autoria também é muito comum nos grupos terroristas Assim se manifestam Zaffaroni e Pierangeli sobre a autoria de escritório Esta forma de autoria mediata pressupõe uma máquina de poder que pode ocorrer tanto num Estado em que se rompeu com toda a legalidade como numa organização paraestatal um Estado dentro do Estado ou como uma máquina de poder autônoma mafiosa por exemplo Não se trata de qualquer associação para delinquir e sim de uma organização caracterizada pelo aparato de seu poder hierarquizado e pela fungibilidade de seus membros se a pessoa determinada não cumpre a ordem outro a cumprirá o próprio determinador faz parte da organização35 Esta teoria é apresentada por Claus Roxin e funciona como a base do conceito de autoria de escritório fornecido por Eugenio Raúl Zaffaroni para solucionar as questões inerentes ao concurso de pessoas nas estruturas organizadas de poder compreendidas como aparatos à margem da legalidade Nas organizações criminosas não raras vezes é difícil punir os detentores do comando situados no ápice da pirâmide hierárquica pois tais pessoas não executam as condutas típicas Ao contrário utilizamse de indivíduos dotados de culpabilidade para a prática dos crimes Nesse contexto o penalista alemão tem como ponto de partida a teoria do domínio do fato e amplia o alcance da autoria mediata para legitimar a responsabilização do autor direto do crime bem como do seu mandante quando presente uma relação de subordinação entre eles no âmbito de uma estrutura organizada de poder ilícito situada às margens do Estado São suas palavras Aqui se vai a tratar inicialmente de outra manifestação do domínio mediato do fato que até agora não tem sido nem sequer mencionada pela doutrina e pela jurisprudência o domínio da vontade em virtude de estruturas organizadas de poder Assim se alude às hipóteses em que o sujeito de trás autor mediato tem à sua disposição uma indústria de pessoas e com cuja ajuda pode cometer seus crimes sem ter que delegar sua realização à decisão autônoma do executor Cabe afirmar pois que quem é empregado em uma indústria organizada em qualquer lugar de uma maneira tal que pode impor ordens aos seus subordinados é autor mediato em virtude do domínio da vontade que lhe 3182 corresponde se utiliza suas competências para que se cometam delitos É irrelevante se o faz por sua própria iniciativa ou no interesse de instâncias superiores pois à sua autoria o ponto decisivo é a circunstância de que pode dirigir a parte da organização que lhe é conferida sem ter que deixar a critério de outros indivíduos a realização do crime36 Verificase quando o agente tem conhecimento da norma penal mas decide transgredila por questões de consciência política religiosa filosófica ou de qualquer outra natureza É o que se dá na hipótese em que a mãe de uma criança de pouca idade por motivos religiosos impede a transfusão de sangue capaz de salvar a vida do seu filho acarretando sua responsabilização pelo crime de homicídio em face da omissão penalmente relevante CP art 13 2º alínea a Participação É a modalidade de concurso de pessoas em que o sujeito não realiza diretamente o núcleo do tipo penal mas de qualquer modo concorre para o crime É portanto qualquer tipo de colaboração desde que não relacionada à prática do verbo contido na descrição da conduta criminosa Exemplo é partícipe de um homicídio aquele que ciente do propósito criminoso do autor e disposto a com ele colaborar empresta uma arma de fogo municiada para ser utilizada na execução do delito Portanto a participação reclama dois requisitos 1 propósito de colaborar para a conduta do autor principal e 2 colaboração efetiva por meio de um comportamento acessório que concorra para a conduta principal Inicialmente a participação pode ser moral ou material Participação moral é aquela em que a conduta do agente restringese a induzir ou instigar terceira pessoa a cometer uma infração penal Não há colaboração com meios materiais mas apenas com ideias de natureza penalmente ilícitas Induzir é fazer surgir na mente de outrem a vontade criminosa até então inexistente Exemplo A narra a B sua inimizade com C criada em razão de uma rivalidade esportiva antiga B o induz a matar seu desafeto dizendo ser o único meio adequado para se livrar desse problema Instigar é reforçar a vontade criminosa que já existe na mente de outrem No exemplo citado A diz a B que deseja matar C sendo por ele estimulado a prosseguir em seu intento O induzimento e a instigação devem ser relacionados à prática de crime determinado e direcionados a pessoa ou pessoas determinadas Em suma o partícipe deve criar ou reforçar frente a um indivíduo determinado o cometimento de uma infração penal também determinada Assim sendo se alguém induzir ou instigar pessoas indeterminadas à realização de um crime necessariamente determinado não será tratado como partícipe mas como autor de incitação ao crime figura delineada pelo art 286 do Código Penal Além disso como o induzimento e a instigação se limitam ao aspecto moral da pessoa normalmente ocorrem na fase da cogitação Nada impede entretanto sejam efetivados durante os atos preparatórios E relativamente à instigação é possível a sua verificação até mesmo durante a execução principalmente para impedir a desistência voluntária e o arrependimento eficaz Exemplo A atinge B em uma de suas pernas com um tiro Para e reflete se prossegue ou não na execução do crime Nesse instante surge C para reforçar o propósito criminoso já existente encorajando o autor a consumar o delito Frisese ser o induzimento incompatível com os atos executórios Com efeito se o autor já iniciou a execução é porque já tinha em mente a ideia criminosa Por sua vez na participação material a conduta do sujeito consiste em prestar auxílio ao autor da infração penal a b Auxiliar consiste em facilitar viabilizar materialmente a execução da infração penal sem realizar a conduta descrita pelo núcleo do tipo Exemplo levar o autor ao local da emboscada com a finalidade de assegurar a prática de um crime de homicídio O partícipe que presta auxílio é chamado de cúmplice O auxílio pode ser efetuado durante os atos preparatórios ou executórios mas nunca após a consumação salvo se ajustado previamente Deveras o auxílio posterior à consumação mas objeto de ajusto prévio entre os agentes caracteriza participação De seu turno o auxílio posterior à consumação porém não ajustado antecipadamente não configura participação e sim o crime autônomo de favorecimento pessoal definido no art 348 do Código Penal Vejamos dois exemplos João e Maria convencionam a morte de Pedro No horário e local acertados aquele atira contra a vítima e sua comparsa o encontra de carro instantes após a execução do crime e fogem juntos para outra cidade João é autor do homicídio no qual Maria figura como partícipe e Paulo mata Antonio Fernanda que não estava ciente do crime encontra o homicida logo após a prática do fato e o leva para outra cidade com a finalidade de evitar a sua prisão João é autor do homicídio e Maria responde pelo delito de favorecimento pessoal A conduta do partícipe tem natureza acessória pois sua existência pressupõe a conduta do autor de natureza principal Sem a conduta principal praticada pelo autor a atuação do partícipe em regra é penalmente irrelevante Exemplificativamente não há crime na simples conduta de mandar matar alguém se a ordem não for cumprida pelo seu destinatário Nesses termos a conduta acessória do partícipe somente adquire eficácia penal quando adere à conduta principal do autor A adequação típica tem subordinação mediata por força da norma de extensão pessoal prevista no art 29 caput do Código Penal37 A acessoriedade da conduta do partícipe é consagrada pelo art 31 do Código Penal O ajuste a determinação ou instigação e o auxílio salvo disposição expressa em contrário não são puníveis se o crime não chega pelo menos a ser tentado grifamos Para a punição do partícipe portanto deve ser iniciada a execução do crime pelo autor Exigese pelo menos a figura da tentativa Há diversas teorias acerca da acessoriedade formuladas com base em seus graus a acessoriedade mínima para a punibilidade da participação é suficiente tenha o autor praticado um fato típico Exemplo A contrata B para matar C Depois do acerto B caminha em via pública e gratuitamente é atacado por C vindo por esse motivo a matálo em legítima defesa Para essa teoria A deveria ser punido como partícipe Essa concepção deve ser afastada por implicar na equivocada punição do partícipe quando o autor agiu acobertado por uma causa de exclusão da ilicitude ou seja quando não praticou uma infração penal b acessoriedade limitada é suficiente para a punição do partícipe tenha o autor praticado um fato típico e ilícito Exemplo A contrata B inimputável para matar C O contratado cumpre sua missão Estaria presente o concurso de pessoas figurando B como autor e A como partícipe do homicídio Como se percebe essa posição não resolve os problemas inerentes à autoria mediata No exemplo inexiste concurso entre A e B inimputável em face da ausência de vínculo subjetivo Conforme explica Flávio Augusto Monteiro de Barros sobre a teoria da acessoriedade limitada Sua dificuldade é a compatibilização com a autoria mediata Realmente são incompatíveis Na autoria mediata a execução do crime é feita por pessoa que atua sem culpabilidade Aquele que induziu instigou ou auxiliou não é partícipe e sim autor mediato A teoria da acessoriedade limitada só tem cabimento entre os que repudiam a autoria mediata 318221 considerandoa uma modalidade de participação38 c acessoriedade máxima ou extrema reclama para a punição do partícipe tenha sido o fato típico e ilícito praticado por um agente culpável Exemplo A contrata B imputável para dar cabo à vida de C o que vem a ser fielmente concretizado B é autor do crime de homicídio e A partícipe Para Beatriz Vargas Ramos O grau de acessoriedade da participação é portanto o grau máximo é preciso que a conduta principal seja típica ilícita e também culpável Sempre que faltar um desses atributos na ação empreendida pelo agente imediato desaparecerá a participação surgindo a figura do autor mediato39 d hiperacessoriedade para a punição do partícipe é necessário que o autor revestido de culpabilidade pratique um fato típico e ilícito e seja efetivamente punido no caso concreto Destarte se A contratou B para matar C no que foi atendido mas o executor logo após o crime suicidouse não há falar em participação em decorrência da aplicação da causa de extinção da punibilidade contida no art 107 I do Código Penal Essa teoria faz exigência descabida permitindo em diversas hipóteses a impunidade do partícipe embora o autor com ele vinculado pela unidade de elemento subjetivo tenha praticado uma infração penal Teoria adotada O Código Penal não adotou expressamente nenhuma dessas teorias De acordo com a sua sistemática porém devem ser afastadas a acessoriedade mínima e a hiperacessoriedade O intérprete deve optar entre a acessoriedade limitada e a acessoriedade máxima dependendo do tratamento dispensado ao instituto da autoria mediata E vai aí um conselho a doutrina nacional tradicionalmente se inclinava pela acessoriedade limitada normalmente esquecendose de confrontála com a autoria mediata Todavia em provas e concursos públicos a acessoriedade máxima afigurase como a mais coerente por ser a autoria mediata aceita de forma praticamente unânime entre os penalistas brasileiros Estabelece o art 29 1º do Código Penal Se a participação for de menor importância a pena pode ser diminuída de 16 um sexto a 13 um terço Cuidase de causa de diminuição da pena É aplicável pois na terceira fase da fixação da pena Em que pesem posições em contrário tratase de direito subjetivo do réu Assim se provada sua participação de menor importância o magistrado deve diminuir a pena Sua discricionariedade reservase apenas no que diz respeito ao montante da redução dentro dos limites legais Participação de menor importância ou mínima é a de reduzida eficiência causal Contribui para a produção do resultado mas de forma menos decisiva razão pela qual deve ser aferida exclusivamente no caso concreto Nessa linha de raciocínio o melhor critério para constatar a participação de menor importância é uma vez mais o da equivalência dos antecedentes ou conditio sine qua non Anotese que a diminuição da pena se relaciona à participação isto é ao comportamento adotado pelo sujeito e não à sua pessoa Portanto suas condições pessoais primário ou reincidente perigoso ou não não impedem a redução da reprimenda se tiver contribuído minimamente para a produção do resultado Como a lei fala em participação não é possível a diminuição da pena ao coautor A propósito não há como se conceber uma coautoria de menor importância ou seja a prática de atos de execução de pouca relevância O coautor sempre tem papel decisivo no deslinde da infração penal40 Além disso prevalece na doutrina o entendimento de que o dispositivo legal não se aplica ao autor intelectual embora seja partícipe pois se arquitetou o crime evidentemente a sua participação não se compreende como de menor importância Não se deve confundir participação de menor importância com participação inócua Participação inócua é aquela que em nada contribuiu para o resultado É penalmente irrelevante pois se não deu causa ao crime é porque a ele não concorreu Exemplo A empresta uma faca para B matar C Precavido contudo B compra uma arma de fogo e no dia do crime sequer leva consigo a faca emprestada por A cuja participação foi assim inócua Preceitua o art 31 do Código Penal O ajuste a determinação ou instigação e o auxílio salvo disposição expressa em contrário não são puníveis se o crime não chega pelo menos a ser tentado A impunibilidade prevista no dispositivo legal não deve ser atribuída ao agente mas ao fato Cuidase de causa de atipicidade da conduta do partícipe e não de causa de isenção da pena Ajuste é o acordo traçado entre duas ou mais pessoas Determinação é o que foi decidido por alguém almejando uma finalidade específica Instigação é o reforço para a realização de algo a que uma pessoa já estava determinada a fazer E por fim auxílio é a colaboração material prestada a alguém para atingir um objetivo O ajuste a determinação a instigação e o auxílio devem se dirigir a pessoa ou pessoas determinadas visando a prática de um crime ou de crimes também determinados Essa regra decorre do caráter acessório da participação o comportamento do partícipe só adquire relevância penal se o autor conduta principal iniciar a execução do crime princípio da executividade da participação E para fazêlo deve ingressar na esfera da tentativa pois o art 14 II do Código Penal a ela condicionou a punição dos atos praticados pelo agente Destarte não é punível exemplificativamente o simples ato de contratar um pistoleiro profissional para matar alguém A conduta do partícipe encomendar a morte somente será punível se o contratado praticar atos de execução do homicídio pois caso contrário estará configurado o quase crime Antes da Reforma da Parte Geral do Código Penal na Lei 72091984 era prevista a aplicação de medida de segurança ao partícipe ligado ao quase crime Atualmente nenhuma sanção penal pode ser imposta Acertou o legislador por se tratar de causa de atipicidade do fato Destacase porém a locução salvo disposição expressa em contrário O Código Penal assim agiu para ressaltar que em situações taxativamente previstas em lei é possível a punição do ajuste da determinação da instigação e do auxílio como crime autônomo Reclama evidentemente expressa previsão legal É o que se dá nos delitos de incitação ao crime CP art 286 e de associação criminosa CP art 288 Na associação criminosa por exemplo a lei tipificou de forma independente a conduta de associaremse três ou mais pessoas para o fim específico de cometer crimes Existe o delito com a associação estável e permanente ainda que os agentes não venham efetivamente a praticar nenhum delito E não fosse a exceção apontada pelo art 31 do Código Penal seria vedado punir o ato associativo enquanto não se praticasse um crime para o qual o agrupamento fora idealizado A participação por omissão é possível desde que o omitente além de poder agir no caso concreto tivesse ainda o dever de agir para evitar o resultado por se enquadrar em alguma das hipóteses delineadas pelo art 13 2º do Código Penal Exemplo é partícipe do furto o policial militar que presencia a subtração de bens de uma pessoa e nada faz porque estava fumando um cigarro e não queria apagálo Também chamada de participação negativa crime silente ou concurso absolutamente negativo é a participação que ocorre nas situações em que o sujeito não está vinculado à conduta criminosa e não possui o dever de agir para impedir o resultado Exemplo um transeunte assiste ao roubo de uma pessoa desconhecida e nada faz Não é partícipe Portanto o mero conhecimento de um fato criminoso não confere ao indivíduo a posição de partícipe por força de sua omissão salvo se presente o dever de agir para impedir a produção do resultado A participação sucessiva é possível nos casos em que um mesmo sujeito é instigado induzido ou auxiliado por duas ou mais pessoas cada qual desconhecendo o comportamento alheio para executar uma infração penal Exemplo A sugere a B a prática de um roubo para quitar suas dívidas bancárias Depois de refletir sobre a ideia e sem contar a sua origem consulta C o qual o estimula a assim agir B pratica o roubo A e C são partícipes do crime pois para ele concorreram A participação sucessiva deve ter sido capaz de influir no propósito criminoso pois se a ideia já estava perfeitamente sedimentada na mente do agente será inócua a participação posterior impedindo a punição do seu responsável A participação em cadeia é possível e punível pelas regras estabelecidas pelo Código Penal Verificase nos casos em que alguém induz ou instiga uma pessoa para que esta posteriormente induza instigue ou auxilie outro indivíduo a cometer um crime determinado Exemplo A induz B a instigar C a emprestar uma arma de fogo auxiliar a D para que este mate E devedor e desafeto de todos A B e C respondem pelo homicídio na condição de partícipes pois concorreram para o crime que teve D como seu autor Vimos que o partícipe deve necessariamente estar subjetivamente vinculado à conduta do autor Exigese a homogeneidade de elemento subjetivo pois se todos os que concorrem para um crime por ele respondem como decorrência da teoria unitária ou monista acolhida pelo art 29 caput do Código Penal não se admite a participação culposa em crime doloso nem a participação dolosa em crime culposo Mas é possível o envolvimento em ação alheia de terceira pessoa com elemento subjetivo distinto quando a lei cria para a situação dois crimes diferentes mas ligados um ao outro Aquele que colabora culposamente para a conduta alheia responde por delito culposo enquanto ao autor que age com consciência e vontade deve ser imputado um crime doloso Repitase são dois crimes autônomos embora dependentes entre si É o que ocorre em relação ao crime tipificado pelo art 312 2º do Código Penal Imaginemos que um funcionário público estadual ao término de seu expediente esqueça aberta a janela do seu gabinete Aproveitandose dessa facilidade um particular que passava pela via pública ingressa na repartição pública e de lá subtrai um computador pertencente ao Estado O funcionário público desidioso responde por peculato culposo e o particular por furto Não há concurso de pessoas em face da ausência do liame subjetivo Circunstâncias incomunicáveis são as que não se estendem isto é não se transmitem aos coautores ou partícipes de uma infração penal pois se referem exclusivamente a determinado agente incidindo apenas em relação a 3191 ele Nesse sentido estabelece o art 30 do Código Penal Não se comunicam as circunstâncias e as condições de caráter pessoal salvo quando elementares do crime A compreensão desse dispositivo depende inicialmente da diferenciação entre elementares e circunstâncias Distinção entre elementares e circunstâncias Elementares são os dados fundamentais de uma conduta criminosa São os fatores que integram a definição básica de uma infração penal No homicídio simples CP art 121 caput por exemplo as elementares são matar e alguém Circunstâncias por sua vez são os fatores que se agregam ao tipo fundamental para o fim de aumentar ou diminuir a pena Exemplificativamente no homicídio que tem como elementares matar e alguém são circunstâncias o relevante valor moral 1º o motivo torpe 2º I e o motivo fútil 2º II dentre outras O critério que melhor possibilita a distinção é o da exclusão ou da eliminação Com efeito excluindose uma elementar o fato se torna atípico ou então se opera a desclassificação para outra infração penal Assim é atípica sem correspondência em um tipo penal a conduta de matar um objeto e não alguém E tomando como ponto de partida um desacato CP art 331 a eliminação da elementar funcionário público desclassifica a conduta para o crime de injúria CP art 140 Por outro lado a exclusão de uma circunstância tem o condão de apenas aumentar ou diminuir a pena de uma infração penal Não lhe altera a denominação jurídica incidindo somente na quantidade da reprimenda a ser aplicada O crime ou contravenção penal contudo são mantidos Por exemplo a eliminação do motivo torpe diminui a pena do homicídio que de qualificado passa a ser simples mas de qualquer modo subsiste o crime definido pelo art 121 do Código Penal 3192 3193 3194 Em suma as elementares compõem a definição da conduta típica enquanto as circunstâncias são exteriores ao tipo fundamental funcionando como qualificadoras ou causas de aumento ou de diminuição da pena Espécies de elementares e de circunstâncias O art 30 do Código Penal é claro há elementares e circunstâncias de caráter pessoal ou subjetivo Consequentemente também existem elementares e circunstâncias de caráter real ou objetivo Subjetivas ou de caráter pessoal são as que se relacionam à pessoa do agente e não ao fato por ele praticado Exemplos a condição de funcionário público no peculato é uma elementar de caráter pessoal CP art 312 E os motivos do crime são circunstâncias de igual natureza no tocante ao homicídio CP art 121 1º e 2º I II e V Objetivas ou de caráter real são as elementares e circunstâncias que dizem respeito ao fato à infração penal cometida e não ao agente Exemplos o emprego de violência contra a pessoa no roubo é uma elementar objetiva CP art 157 caput e desse naipe é também o meio cruel como circunstância para a execução do homicídio CP art 121 2º III Condições de caráter pessoal Paralelamente às elementares e circunstâncias o art 30 do Código Penal trata ainda das condições de caráter pessoal Condições pessoais são as qualidades os aspectos subjetivos inerentes a determinado indivíduo que o acompanham em qualquer situação isto é independem da prática da infração penal É o caso da reincidência e da condição de menor de 21 anos As regras do art 30 do Código Penal Com base nos conceitos e espécies de elementares circunstâncias e condições acima analisados é possível extrair três regras do art 30 do Código Penal 1ª As circunstâncias e condições de caráter pessoal ou subjetivas não se comunicam pouco importa se tais dados ingressaram ou não na esfera de conhecimento dos demais agentes Exemplo A ao chegar à sua casa constata que sua filha foi estuprada por B Imbuído por motivo de relevante valor moral contrata C pistoleiro profissional para matar o estuprador O serviço é regularmente executado Nesse caso A responde por homicídio privilegiado CP art 121 1º enquanto a C é imputado o crime de homicídio qualificado pelo motivo torpe CP art 121 2º I O relevante valor moral é circunstância pessoal exclusiva de A e jamais se transfere a C por mais que este não concorde com o estupro 2ª Comunicamse as circunstâncias de caráter real ou objetivas é necessário porém que tenham ingressado na esfera de conhecimento dos demais agentes para evitar a responsabilidade penal objetiva Exemplo A contrata B para matar C seu inimigo B informa a A que fará uso de meio cruel e este último concorda com essa circunstância Ambos respondem pelo crime tipificado pelo art 121 2º III do Código Penal Tratase de circunstância objetiva que a todos se estende Se todavia B fizesse uso de meio cruel sem a ciência de A somente a ele seria imputada a qualificadora sob pena de caracterização da responsabilidade penal objetiva 3ª Comunicamse as elementares sejam objetivas ou subjetivas mais uma vez exigese que as elementares tenham entrado no âmbito de conhecimento de todos os agentes para afastar a responsabilidade penal objetiva Exemplo A funcionário público convida B seu amigo para em concurso subtraírem um computador que se encontra na repartição pública em que trabalha valendose das facilidades proporcionadas pelo seu cargo Ambos respondem por peculatofurto ou peculato impróprio CP art 312 1º pois a elementar funcionário público transmitese a B Entretanto se B não conhecesse a condição funcional de A responderia por furto evitando a responsabilidade penal objetiva 3195 Elementares personalíssimas e a questão do estado puerperal no infanticídio Nélson Hungria sustentou após a entrada em vigor do Código Penal de 1940 a existência de elementares personalíssimas que não se confundiam com as pessoais Estas seriam transmissíveis aquelas não Em síntese seriam fatores que embora integrassem a descrição fundamental de uma infração penal jamais se transmitiriam aos demais coautores ou partícipes Confira se Devese notar porém que a ressalva do art 2641 não abrange as condições personalíssimas que informam os chamados delicta excepta Importam elas um privilegium em favor da pessoa a quem concernem São conceitualmente inextensíveis e impedem quando haja cooperação com o beneficiário a unidade do título do crime Assim a influência do estado puerperal no infanticídio e a causa honoris no crime do art 134 embora elementares não se comunicam aos cooperadores que responderão pelo tipo comum do crime42 Para ele na hipótese em que o pai ou qualquer outra pessoa auxiliasse a mãe abalada pelo estado puerperal a matar o próprio filho durante o parto ou logo após não seria justo nem correto que o terceiro fosse beneficiado pelo crime de infanticídio pois o puerpério não lhe atinge Portanto somente a mãe responderia pelo crime previsto no art 123 do Código Penal imputandose ao terceiro coautor ou partícipe a figura do homicídio43 Humilde porém Nélson Hungria posteriormente constatou seu equívoco e alterou o seu entendimento levando em consideração a redação do Código Penal salvo quando elementares do crime Concluiu então que todos os terceiros que concorrem para um infanticídio por ele também respondem44 Destarte justa ou não a situação a lei fala em elementares e seja qual for sua natureza é necessário que se estendam a todos os coautores e partícipes Essa é a posição atualmente pacífica que somente será modificada com eventual alteração legislativa 31111 O mandato guarda íntima relação com a figura do autor intelectual em que alguém partícipe delibera sobre a prática de uma infração penal e transmite a outrem autor a tarefa de executálo Nesse contexto pode ocorrer falta de coincidência entre a vontade do partícipe e o comportamento do autor O art 19 do Código Penal de 1890 assim dispunha Aquelle que mandar ou provocar alguem a commeter crime é responsável como autor 1º Por qualquer outro crime que o executor commeter para executar o de que se encarregou 2º Por qualquer outro crime que daquelle resultar45 Essa regra que na prática permitia a responsabilidade penal objetiva foi repelida pela sistemática em vigor Atualmente a questão deve ser solucionada com base nas regras inerentes à cooperação dolosamente distinta e à comunicabilidade das elementares e circunstâncias desde que tenham ingressado na esfera de conhecimento de todos os agentes CP arts 29 2º e 30 Autoria colateral Também chamada de coautoria imprópria ou autoria parelha ocorre quando duas ou mais pessoas intervêm na execução de um crime buscando igual resultado embora cada uma delas ignore a conduta alheia Exemplo A portando um revólver e B uma espingarda escondemse atrás de árvores um do lado direito e outro do lado esquerdo de uma mesma rua Quando C inimigo de ambos por ali passa ambos os agentes contra ele efetuam disparos de armas de fogo C morre revelando o exame necroscópico terem sido os ferimentos letais produzidos pelos disparos originários da arma de A Não há concurso de pessoas pois estava ausente o vínculo subjetivo entre A e B Portanto cada um dos agentes responde pelo crime a que deu causa A por homicídio consumado e B por tentativa de homicídio Se ficasse demonstrado que os tiros de B atingiram o corpo de C 31112 quando já estava morto A responderia pelo homicídio enquanto B ficaria impune por força da caracterização do crime impossível impropriedade absoluta do objeto CP art 17 Autoria incerta Surge no campo da autoria colateral quando mais de uma pessoa é indicada como autora do crime mas não se apura com precisão qual foi a conduta que efetivamente produziu o resultado Conhecemse os possíveis autores mas não se conclui em juízo de certeza qual comportamento deu causa ao resultado Suponhase que A e B com armas de fogo e munições idênticas escondamse atrás de árvores para eliminar a vida de C Quando este passa pelo local contra ele atiram e C morre O exame pericial aponta ferimentos produzidos por um único disparo de arma de fogo como causa mortis Os demais tiros não atingiram a vítima e o laudo não afirma categoricamente quem foi o autor do disparo fatal Há no caso dois crimes praticados por A e B um homicídio consumado e uma tentativa de homicídio Qual é a solução Como não se apurou quem produziu a morte não se pode imputar o resultado naturalístico para A e B Um deles matou mas o outro não E como não há concurso de pessoas ambos devem responder por tentativa de homicídio Com efeito ambos praticaram atos de execução de um homicídio Tentaram matar mas somente um deles incerto o fez Para eles será imputada a tentativa pois a ela deram causa Quanto a isso não há dúvida E por não se saber quem de fato provocou a morte da vítima não se pode responsabilizar qualquer deles pelo homicídio consumado aplicandose o princípio in dubio pro reo Há casos todavia que causam estranheza ainda maior Imaginese que João casado com Maria seja amante de Tereza Todas as manhãs juntamente com a esposa toma café em casa Em seguida antes de ingressar no trabalho passa na residência da amante que não sabe 31113 ser ele casado para com ela também fazer o desjejum Em determinado dia a esposa e a amante descobrem sobre a existência de outra mulher na vida de João Revoltadas compram venenos para matálo Na manhã seguinte o adúltero bebe uma xícara de café envenenado em sua casa Parte para a residência da amante e também bebe uma xícara de café com veneno Morre algumas horas depois Realizase perícia e o laudo conclui pela existência de duas substâncias no sangue de João veneno de rato e talco Maria e Tereza orgulhosas confessam ter colocado veneno no café do falecido traidor A situação é a seguinte uma das mulheres praticou homicídio e a outra crime impossível por ineficácia absoluta do meio CP art 17 As provas colhidas durante o inquérito policial não apontam qual foi a conduta de cada uma delas O que deve fazer o representante do Ministério Público ao receber o inquérito policial relatado Deve denunciálas A única solução é o arquivamento do inquérito policial Há um homicídio João está morto mas às vingativas mulheres aplicase o crime impossível Uma matou mas a outra nada fez Como não há concurso de pessoas por ausência do vínculo subjetivo ambas devem ser beneficiadas pela dúvida Em resumo se no bojo de uma autoria incerta todos os envolvidos praticaram atos de execução devem responder pela tentativa do crime Mas se um deles incidiu em crime impossível a causa de atipicidade a todos se estende Autoria desconhecida Cuidase de instituto ligado ao processo penal que ocorre quando um crime foi cometido mas não se sabe quem foi seu autor Exemplo A foi vítima de furto pois todos os bens de sua residência foram subtraídos enquanto viajava Não há provas todavia do responsável pelo delito É nesse ponto que se diferencia da autoria incerta de interesse do Direito Penal pois nela conhecemse os envolvidos em um crime mas não se pode com precisão afirmar quem a ele realmente deu causa A relação entre o concurso de pessoas e os crimes de autoria coletiva especialmente quando praticados pelas multidões ganha força a cada dia pois este fenômeno encontrase presente em diversos casos inerentes à vida moderna tais como a violência comumente praticada pelas torcidas organizadas nos estádios de futebol rebeliões em presídios e invasões de propriedades rurais por movimentos criados para esta finalidade Em situações deste nível o concurso de pessoas inexoravelmente se reveste de maior gravidade pois o resultado criminoso além de ser facilmente alcançado assume maiores proporções por ser a incitação à violência transmitida velozmente entre os indivíduos situados à sua volta Como pontua René Ariel Dotti Falase então do fenômeno conhecido como a multidão criminosa que constitui uma espécie de alma nova dos movimentos de massa que em momentos de grande excitação anulam ou restringem sensivelmente o autocontrole e a capacidade individual de se governar segundo padrões éticos ou sociais46 O Código Penal atento a essas peculiaridades cuidou de regular o assunto quem provoca o tumulto tem a pena agravada enquanto quem age sob o influxo da multidão se não a iniciou merece o abrandamento da punição Com efeito dispôs em seu art 65 III e que a pena será atenuada em relação ao agente que cometeu o crime sob a influência da multidão em tumulto se não o provocou Por outro lado estabeleceu no art 62 I uma agravante genérica para o sujeito que promove ou organiza a cooperação no crime ou dirige a atividade dos demais agentes Mas a doutrina discorda sobre um ponto qual seja se a integração a uma multidão criminosa é por si só suficiente para demonstrar o vínculo subjetivo entre os agentes caracterizando o concurso de pessoas 31121 Para Mirabete todos respondem pelo resultado produzido47 É também a posição de Cezar Roberto Bitencourt A prática coletiva de delito nessas circunstâncias apesar de ocorrer em situação normalmente traumática não afasta a existência de vínculos psicológicos entre os integrantes da multidão caracterizadores do concurso de pessoas Nos crimes praticados por multidão delinquente é desnecessário que se descreva minuciosamente a participação de cada um dos intervenientes sob pena de inviabilizar a aplicação da lei48 De outro lado sustenta Rogério Greco que os crimes multitudinários dependem para a configuração do concurso de pessoas da comprovação efetiva da contribuição causal de cada envolvido no tumulto São suas palavras somos da opinião de que nos crimes multitudinários não podemos presumir o vínculo psicológico entre os agentes Tal liame deverá ser demonstrado no caso concreto a fim de que todos possam responder pelo resultado advindo da soma das condutas49 Denúncia geral processo penal kafikiano criptoimputação Temse entendido que nos crimes de autoria coletiva embora a vestibular acusatória não possa ser de todo genérica é válida quando apesar de não descrever minuciosamente as atuações individuais dos acusados demonstra um liame entre o seu agir e a suposta prática delituosa estabelecendo a plausibilidade da imputação e possibilitando o exercício da ampla defesa50 Nesse contexto não é inepta a denúncia geral que apresenta narrativa fática congruente de modo a permitir o devido processo legal descrevendo conduta típica que atentando aos ditames do art 41 do CPP qualifica os acusados descreve o fato criminoso e suas circunstâncias O fato por si só de o Ministério Público ter imputado ao recorrente a mesma conduta dos demais denunciados não torna a denúncia genérica indeterminada ou imprecisa51 É imprescindível distinguir a denúncia genérica da denúncia geral A denúncia genérica é aquela cuja imputação é gravemente contaminada por situação de deficiência na narração do fato imputado quando não contém os elementos mínimos de sua identificação como crime como às vezes ocorre com a simples alusão aos elementos do tipo penal abstrato52 A denúncia genérica sofre com a pecha da criptoimputação53 imputação truncada criptografada por consagrar um sistema processual kafkiano por meio do qual o denunciado não tem ideia do que se defende54 De seu turno a denúncia geral é largamente admitida na jurisprudência porquanto nessa modalidade há a descrição dos fatos e da atuação ainda que de maneira geral de cada um dos imputados Como já decidido pelo Superior Tribunal de Justiça Nos chamados crimes de autoria coletiva defrontase o órgão acusatório no momento de oferecer a denúncia com uma pluralidade de acusados envolvidos na prática delituosa Nessa situação a narrativa minudente de cada uma das condutas atribuídas aos vários agentes é tarefa bastante dificultosa muitas vezes impraticável sobretudo diante de organizações numerosas Nesse contexto a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça vem admitindo excepcionalmente em crimes de autoria coletiva possa o titular da ação penal descrever os fatos de forma geral tendo em vista a incapacidade de se mensurar com precisão em detalhes o modo de participação de cada um dos acusados na empreitada criminosa Portanto será regular a peça acusatória quando a despeito de não delinear as condutas individuais dos corréus anunciar o liame entre a atuação do denunciado e a prática delituosa demonstrando a plausibilidade da imputação e garantindo o pleno exercício do direito de defesa55 Crime culposo é o que se verifica quando o agente deixando de observar o dever objetivo de cuidado por imprudência negligência ou imperícia realiza voluntariamente uma conduta que produz um resultado naturalístico indesejado não previsto nem querido mas objetivamente previsível e excepcionalmente previsto e querido que podia com a devida atenção ter evitado Para facilitar o estudo do assunto é razoável abordar o cabimento do 31131 31132 concurso de pessoas nessa categoria de delitos com amparo em suas duas modalidades coautoria e participação Coautoria e crimes culposos A doutrina nacional é tranquila ao admitir a coautoria em crimes culposos quando duas ou mais pessoas conjuntamente agindo por imprudência negligência ou imperícia violam o dever objetivo de cuidado a todos imposto produzindo um resultado naturalístico56 Imaginese o exemplo em que dois indivíduos em treinamento efetuam disparos de arma de fogo em uma propriedade rural situada próxima a uma estrada de terra pouco movimentada Atiram simultaneamente atingindo um pedestre que passava pela via pública o qual vem a morrer pelos ferimentos provocados pelas diversas munições Há coautoria em um homicídio culposo Vejase a propósito o clássico exemplo de E Magalhães Noronha Suponhase o caso de dois pedreiros que numa construção tomam uma trave e a atiram à rua alcançando um transeunte Não há falar em autor principal e secundário em realização e instigação em ação e auxílio etc Oficiais do mesmo ofício incumbialhes aquela tarefa só realizável pela conjugação das suas forças Donde a ação única apanhar e lançar o madeiro e o resultado lesões ou morte da vítima também uno foram praticados por duas pessoas que uniram seus esforços e vontades resultando assim coautoria Para ambos houve vontade atuante e ausência de previsão57 Participação e crimes culposos Firmouse a doutrina pátria no sentido de rejeitar a possibilidade de participação em crimes culposos Com efeito o crime culposo é normalmente definido por um tipo penal aberto e nele se encaixa todo o comportamento que viola o dever objetivo de cuidado Por corolário é autor todo aquele que desrespeitando esse dever contribui para a produção do resultado naturalístico Nos ensinamentos de Damásio E de Jesus 7 8 9 10 11 12 13 Todo grau de causação a respeito do resultado típico produzido não dolosamente mediante uma ação que não observa o cuidado requerido no âmbito de relação fundamenta a autoria do respectivo delito culposo Por essa razão não existe diferença entre autores e partícipes nos crimes culposos Toda classe de causação do resultado típico culposo é autoria58 Frisese por oportuno que a unidade de elemento subjetivo exigida para a caracterização do concurso de pessoas impede a participação dolosa em crime culposo Na hipótese em que alguém dolosamente concorre para que outrem produza um resultado naturalístico culposo há dois crimes um doloso e outro culposo Exemplo A com a intenção de matar B convence C a acelerar seu carro em uma curva pois sabe que naquele instante B por ali passará de bicicleta O motorista atinge velocidade excessiva e atropela o ciclista matandoo A responde por homicídio doloso CP art 121 e C por homicídio culposo na direção de veículo automotor Lei 95031997 CTB art 302 FERRAZ Esther de Figueiredo A codelinquência no direito penal brasileiro São Paulo José Bushatsky 1976 p 1819 MANZINI Vicenzo Instituzoni di diritto penale italiano parte generale Padova Cedam 1946 v I p 148 No entanto uma vez demonstrada a efetiva colaboração no caso concreto não se reclama a identificação de todos os envolvidos na empreitada criminosa Exemplo A vítima da tentativa de homicídio afirma que dois homens de comum acordo efetuaram disparos de arma de fogo em sua direção para matála mas somente reconhece um deles Está caracterizado o concurso de pessoas STJ REsp 1306731RJ rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 22102013 FERRAZ Esther de Figueiredo A codelinquência no direito penal brasileiro São Paulo José Bushatsky 1976 p 25 Inq 2245MG rel Min Joaquim Barbosa Tribunal Pleno j 28082007 É também o entendimento do STJ HC 85883SP rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 07022008 STF HC 104314PR rel Min Ellen Gracie 2ª Turma j 16112010 noticiado no Informativo 609 e HC 97652RS rel Min Joaquim 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 Barbosa 2ª Turma j 04082009 noticiado no Informativo 554 No STJ REsp 1306731RJ rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 22102013 Apud FERRAZ Esther de Figueiredo A codelinquência no direito penal brasileiro São Paulo José Bushatsky 1976 p 31 ROXIN Claus Autoria y domínio del hecho en derecho penal 7 ed Madrid Marcial Pons 1999 p 342 WELZEL Hans Derecho penal alemán Tradução de Juan Busto Ramirez e Sergio Yañes Peréz Santiago Editorial Jurídica del Chile 1987 p 120 JESUS Damásio E de Teoria do domínio do fato no concurso de pessoas 3 ed São Paulo Saraiva 2002 p 26 STF HC 138637SP rel Min Celso de Mello 2ª Turma j 18052017 noticiado no Informativo 864 CEREZO MIR José Derecho penal Parte geral São Paulo RT 2007 p 1080 STF AP 975AL rel Min Edson Fachin 2ª Turma j 03102017 noticiado no Informativo 880 No Brasil em 1940 quando foi elaborado o Código Penal e mesmo no ano de 1984 na ocasião em que a Parte Geral foi reformada pela Lei 72091984 sequer se falava na teoria do domínio do fato Esse assunto na verdade era praticamente desconhecido pela nossa doutrina e pela nossa jurisprudência HC 105674RS rel Min Marco Aurélio Plenário j 17102013 noticiado no Informativo 724 STJ AgRg no REsp 1245570SP rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 20032014 Para a teoria do domínio do fato os crimes de mão própria admitem a coautoria o sujeito pode ser autor do delito sem realizar o núcleo do tipo Basta que tenha o controle final do fato LINHARES Marcello Jardim Coautoria Rio de Janeiro Aide 1987 p 104 BITENCOURT Cezar Roberto Tratado de direito penal Parte geral 11 ed São Paulo Saraiva 2007 v 1 p 426 27 28 29 30 31 32 33 34 35 36 37 38 NUCCI Guilherme de Souza Código Penal comentado 6 ed São Paulo RT 2006 p 275 BATISTA Nilo Concurso de agentes uma investigação sobre os problemas da autoria e da participação no direito penal brasileiro 2 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2004 p 65 SILVA Germano Marques da Direito penal português Parte geral Lisboa Verbo 1998 v II p 285 MIR PUIG Santiago Derecho penal Parte general 5 ed Barcelona Reppertor 1998 p 401 Nesse sentido WESSELS Johannes Derecho penal Parte general Buenos Aires Depalma 1980 p 159 GRECO Rogério Curso de direito penal Parte geral 10 ed Rio de Janeiro Impetus 2008 p 442 ZAFFARONI Eugenio Raúl Derecho penal Parte general 2 ed Buenos Aires Ediar 2002 p 780 ZAFFARONI E Raúl PIERANGELI José Henrique Manual de direito penal brasileiro Parte geral 7 ed São Paulo RT 2007 v 1 p 579581 ZAFFARONI E Raúl PIERANGELI José Henrique Manual de direito penal brasileiro Parte geral 7 ed São Paulo RT 2007 v 1 p 582583 ROXIN Claus Autoria y dominio del hecho em derecho penal 7 ed Madrid Marcial Pons 1999 p 270 e 275276 Convém recordar o teor do art 2º 3º da Lei 128502013 Lei do Crime Organizado A pena é agravada para quem exerce o comando individual ou coletivo da organização criminosa ainda que não pratique pessoalmente atos de execução Por esse motivo o art 29 caput do Código Penal deve ser inserido no pedido de uma denúncia ou de uma queixacrime exclusivamente nos casos de participação Exemplo homicídio qualificado pelo motivo torpe executado por um pistoleiro profissional a mando de outrem art 121 2 I cc o art 29 caput do Código Penal Em se tratando de coautoria todos os agentes praticam o núcleo do tipo No caso do homicídio por exemplo todos matam dispensando a incidência da norma de extensão pessoal BARROS Flávio Augusto Monteiro de Direito penal Parte geral 5 ed São Paulo Saraiva 2006 p 420 39 40 41 42 43 44 45 46 47 48 49 50 51 52 53 54 RAMOS Beatriz Vargas Do concurso de pessoas Belo Horizonte Del Rey 1996 p 42 STF HC 72893SP rel Min Sydney Sanches 1ª Turma j 24101995 Atual art 30 após a reforma da Parte Geral do Código Penal pela Lei 72091984 HUNGRIA Nélson Comentários ao Código Penal Rio de Janeiro Forense 1949 v I p 574 Essa posição foi à época seguida por diversos autores destacandose Aníbal Bruno Bento de Faria Heleno Cláudio Fragoso e Vicente Sabino HUNGRIA Nélson Comentários ao Código Penal 5 ed Rio de Janeiro Forense 1979 v 5 p 226 GARCIA Basileu Instituições de direito penal 4 ed 37 tir São Paulo Max Limonad 1975 t I v I p 370 DOTTI René Ariel Curso de direito penal Parte geral 2 ed Rio de Janeiro Forense 2004 p 363 MIRABETE Julio Fabbrini Manual de direito penal Parte Geral 24 ed São Paulo Atlas 2007 v 1 p 242 BITENCOURT Cezar Roberto Tratado de direito penal Parte geral 11 ed São Paulo Saraiva 2007 v 1 p 428 GRECO Rogério Curso de direito penal parte geral 10 ed Rio de Janeiro Impetus 2008 p 472 STJ RHC 68903RJ rel Min Jorge Mussi 5ª Turma j 20052016 STJ HC 311571SP rel Min Gurgel de Faria 5ª Turma j 15122015 FERNANDES Antonio Scarance A reação defensiva à imputação São Paulo RT 2002 p 184 No exemplo de Hugo Nigro Mazzilli ocorre a criptoimputação quando o Ministério Público atribui ao réu uma conduta culposa por ter sido imprudente porque não teve cautela Mas qual precisamente a cautela que o réu omitiu É como se a denúncia dissesse que o réu teve culpa porque foi imprudente foi imprudente porque não teve cautela e porque não teve cautela teve culpa Um círculo vicioso MAZZILLI Hugo Nigro A descrição do fato típico na acusação penal Disponível em httpwwwmazzillicombr Acesso em 01112016 O ordenamento positivo brasileiro repudia as imputações criminais 55 56 57 58 genéricas e não tolera porque ineptas as acusações que não individualizam nem especificam de maneira concreta a conduta penal atribuída ao denunciado A pessoa sob investigação tem o direito de não ser acusada com base em denúncia inepta STF HC 80084PE rel Celso de Mello 2ª Turma j 11122012 RHC 68848RN rel Min Antonio Saldanha Palheiro 6ª Turma j 13102016 Para o STF Não há abuso de acusação na denúncia que ao tratar de crimes de autoria coletiva deixa por absoluta impossibilidade de esgotar as minúcias do suposto cometimento do crime Há diferença entre denúncia genérica e geral Enquanto naquela genérica se aponta fato incerto e imprecisamente descrito na última geral há acusação da prática de fato específico atribuído a diversas pessoas ligadas por circunstâncias comuns mas sem a indicação minudente da responsabilidade interna e individual dos imputados não há que se falar em inépcia quando a acusação descreve minimamente o fato tido como criminoso HC 118891SP rel Min Edson Fachin 1ª Turma j 20102015 A doutrina majoritária admite a coautoria em crime culposo Para tanto devem ser preenchidos os requisitos do concurso de agentes a pluralidade de agentes b relevância causal das várias condutas c liame subjetivo entre os agentes e d identidade de infração penal STJ HC 235827SP rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 03092013 NORONHA E Magalhães Do crime culposo 2 ed São Paulo Saraiva 1966 p 103 JESUS Damásio E de Direito penal Parte geral 28 ed 2ª tiragem São Paulo Saraiva 2006 v 1 p 422 PARTE III TEORIA GERAL DA PENA 321 322 SANÇÃO PENAL Sanção penal é a resposta estatal no exercício do ius puniendi e após o devido processo legal ao responsável pela prática de um crime ou de uma contravenção penal Dividese em duas espécies penas e medidas de segurança As penas reclamam a culpabilidade do agente e destinamse aos imputáveis e aos semiimputáveis sem periculosidade Já as medidas de segurança têm como pressuposto a periculosidade e dirigemse aos inimputáveis e aos semiimputáveis dotados de periculosidade pois necessitam no lugar da punição de especial tratamento curativo Destarte o Direito Penal é um sistema de dupla via pois admite as penas 1ª via e as medidas de segurança 2ª via como respostas estatais aos violadores das suas regras1 Falase também na terceira via do Direito Penal consubstanciada nas situações em que embora tenha sido cometida uma infração penal não se impõe pena ou medida de segurança pois a punibilidade estatal cede espaço à reparação do dano causado à vítima a exemplo do que se verifica na composição dos danos civis nos crimes de menor potencial ofensivo de ação penal privada e de ação pública condicionada à representação do ofendido na forma delineada pelo art 74 parágrafo único da Lei 90991995 CONCEITO Pena é a reação que uma comunidade politicamente organizada opõe a um fato que viola uma das normas fundamentais da sua estrutura e assim é 323 a b definido na lei como crime Como reação contra o crime isto é contra uma grave transgressão das normas de convivência ela aparece com os primeiros agregados humanos Violenta e impulsiva nos primeiros tempos exprimindo o sentimento natural de vingança do ofendido ou a revolta de toda a comunidade social ela se vai disciplinando com o progresso das relações humanas abandonando os seus apoios extrajurídicos e tomando o sentido de uma instituição de Direito posta nas mãos do poder público para a manutenção da ordem e segurança social2 Destarte pena é a espécie de sanção penal consistente na privação ou restrição de determinados bens jurídicos do condenado aplicada pelo Estado em decorrência do cometimento de uma infração penal com as finalidades de castigar seu responsável readaptálo ao convívio em comunidade e mediante a intimidação endereçada à sociedade evitar a prática de novos crimes ou contravenções penais O bem jurídico de que o condenado pode ser privado ou sofrer limitação varia liberdade pena privativa de liberdade patrimônio multa prestação pecuniária e perda de bens e valores vida pena de morte na excepcional hipótese prevista no art 5º XLVII a da CF ou outro direito qualquer em conformidade com a legislação em vigor penas restritivas de direitos PRINCÍPIOS Aplicamse às penas os seguintes princípios Princípio da reserva legal ou da estrita legalidade emana do brocardo nulla poena sine lege ou seja somente a lei pode cominar a pena Foi previsto como cláusula pétrea no art 5º XXXIX da Constituição Federal e também encontra amparo no art 1º do Código Penal Princípio da anterioridade a lei que comina a pena deve ser anterior ao fato que se pretende punir Não basta assim o nulla poena sine lege Exigese um reforço a lei deve ser prévia ao fato praticado nulla poena sine praevia lege CF art 5º XXXIX e CP art 1º c d e f g Princípio da personalidade intransmissibilidade intranscendência ou responsabilidade pessoal a pena não pode em hipótese alguma ultrapassar a pessoa do condenado CF art 5º XLV É vedado alcançar portanto familiares do acusado ou pessoas alheias à infração penal Em síntese esse postulado impede que sanções e restrições de ordem jurídica superem a dimensão estritamente pessoal do infrator3 É possível porém que a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens compreendidos como efeitos da condenação sejam nos termos da lei estendidas aos sucessores e contra eles executadas até o limite do valor do patrimônio transferido CF art 5º XLV A pena de multa não poderá ser cobrada dos sucessores do condenado Princípio da inderrogabilidade ou inevitabilidade esse princípio é consectário lógico da reserva legal e sustenta que a pena se presentes os requisitos necessários para a condenação não pode deixar de ser aplicada e integralmente cumprida É contudo mitigado por alguns institutos penais dos quais são exemplos a prescrição o perdão judicial o sursis o livramento condicional etc Princípio da intervenção mínima a pena é legítima unicamente nos casos estritamente necessários para a tutela de um bem jurídico penalmente reconhecido Dele resultam dois outros princípios fragmentariedade ou caráter fragmentário do Direito Penal e subsidiariedade ver Capítulo 2 itens 228 229 e 2210 Princípio da humanidade ou humanização das penas a pena deve respeitar os direitos fundamentais do condenado enquanto ser humano Não pode assim violar a sua integridade física ou moral CF art 5º XLIX Da mesma forma o Estado não pode dispensar nenhum tipo de tratamento cruel desumano ou degradante ao preso Com esse propósito o art 5º XLVII da Constituição Federal proíbe as penas de morte de trabalhos forçados de banimento e cruéis bem como a prisão perpétua Princípio da proporcionalidade a resposta penal deve ser justa e suficiente para cumprir o papel de reprovação do ilícito bem como h para prevenir novas infrações penais Concretizase na atividade legislativa funcionando como barreira ao legislador e também ao magistrado orientandoo na dosimetria da pena De fato tanto na cominação como na aplicação da pena deve existir correspondência entre o ilícito cometido e o grau da sanção penal imposta levando se ainda em conta o aspecto subjetivo do condenado CF art 5º XLVI Princípio da individualização foi inicialmente previsto pelo Código Criminal do Império de 1830 A individualização da pena tem o significado de eleger a justa e adequada sanção penal quanto ao montante ao perfil e aos efeitos pendentes sobre o sentenciado tornandoo único e distinto dos demais infratores ainda que coautores ou partícipes do delito Sua finalidade e importância residem na fuga da padronização da pena da mecanizada ou computadorizada aplicação da sanção penal que prescinda da figura do juiz como ser pensante adotandose em seu lugar qualquer programa ou método que leve à pena preestabelecida segundo um modelo unificado empobrecido e sem dúvida injusto4 Esse princípio que foi expressamente indicado pelo art 5º XLVI da Constituição Federal repousa no ideal de justiça segundo o qual se deve distribuir a cada indivíduo o que lhe cabe de acordo com as circunstâncias específicas do seu comportamento o que em matéria penal significa a aplicação da pena levando em conta não a norma penal em abstrato mas especialmente os aspectos subjetivos e objetivos do crime5 Na célebre definição de Nélson Hungria A fórmula unitária foi assim fixada retribuir o mal concreto do crime com o mal concreto da pena na concreta personalidade do criminoso Ao ser cominada in abstracto a pena é individualizada objetivamente mas ao ser aplicada in concreto não prescinde da sua individualização subjetiva Após a individualização convencional da lei a individualização experimental do juiz ao mesmo tempo objetiva e subjetiva É conservada a prefixação de minima e maxima especiais 324 mas suprimida a escala legal de graus intermédios o juiz pode moverse livremente entre aqueles para realizar a justiça do caso concreto6 Desenvolvese em três planos legislativo judicial e administrativo No prisma legislativo o princípio é respeitado quando o legislador descreve o tipo penal e estabelece as sanções adequadas indicando precisamente os seus limites mínimo e máximo e também as circunstâncias aptas a aumentar ou diminuir as reprimendas cabíveis A individualização judicial complementa a legislativa pois esta não pode ser extremamente detalhista nem é capaz de prever todas as situações da vida concreta que possam aumentar ou diminuir a sanção penal É efetivada pelo juiz quando aplica a pena utilizandose de todos os instrumentais fornecidos pelos autos da ação penal em obediência ao sistema trifásico delineado pelo art 68 do Código Penal pena privativa de liberdade ou ainda ao sistema bifásico inerente à sanção pecuniária CP art 49 Finalmente a individualização administrativa é efetuada durante a execução da pena quando o Estado deve zelar por cada condenado de forma singular mediante tratamento penitenciário ou sistema alternativo no qual se afigure possível a integral realização das finalidades da pena TEORIAS E FINALIDADES O estudo das teorias relacionase intimamente com as finalidades da pena Podemos ir ainda mais longe Na verdade as teorias inerentes aos fins da pena relacionamse com a própria origem do Direito Penal Nas palavras de Jorge de Figueiredo Dias O problema do fins rectius das finalidades da pena criminal é tão velho quanto a própria história do direito penal e no decurso desta já longa história ele tem sido discutido vivamente e sem soluções de continuidade pela filosofia tanto pela filosofia geral como pela filosofia do direito pela doutrina do Estado e pela ciência global do direito penal A razão de um tal interesse e da sua persistência ao longo dos tempos está em que à sombra dos problemas dos fins das penas é no fundo toda a teoria do direito penal que se discute e com particular incidência as questões fulcrais da legitimação fundamentação justificação e função da intervenção penal estatal Por isso se pode dizer sem exagero que a questão dos fins da pena constitui no fundo a questão do destino do direito penal e na plena acepção do termo do seu paradigma7 Para a teoria absoluta a finalidade da pena é retributiva Por sua vez para a teoria relativa os fins da pena são estritamente preventivos E finalmente para a teoria mista ou unificadora a pena tem dupla finalidade retributiva e preventiva A pena desponta como a retribuição estatal justa ao mal injusto provocado pelo condenado consistente na prática de um crime ou de uma contravenção penal punitur quia peccatum est É chamada de absoluta porque esgotase em si mesma ou seja a pena independe de qualquer finalidade prática não se vincula a nenhum fim pois não se preocupa com a readaptação social do infrator da lei penal Pune se simplesmente como retribuição à prática do ilícito penal Em outras palavras a pena funciona meramente como um castigo assumindo nítido caráter expiatório A pena atua como instrumento de vingança do Estado contra o criminoso com a finalidade única de castigálo fator esse que proporciona a justificação moral do condenado e o restabelecimento da ordem jurídica8 A teoria absoluta e a finalidade retributiva da pena ganharam destaque com os estudos de Georg Wilhelm Friedrich Hegel e de Emmanuel Kant que exemplificava O que se deve acrescer é que se a sociedade civil chega a dissolverse por consentimento de todos os seus membros como se por exemplo um povo que habitasse uma ilha se decidisse a abandonála e se dispersar o último assassino preso deveria ser morto antes da dissolução a fim de que cada um sofresse a pena de seu crime e para que o crime de homicídio não recaísse sobre o povo que descuidasse da imposição dessa punição porque então poderia ser considerada como cúmplice de tal violação pública da Justiça9 Para essa variante a finalidade da pena consiste em prevenir isto é evitar a prática de novas infrações penais punitur ne peccetur É irrelevante a imposição de castigo ao condenado Adotase uma posição absolutamente contrária à teoria absoluta Destarte a pena não está destinada à realização da justiça sobre a terra servindo apenas para a proteção da sociedade A pena não se esgota em si mesma despontando como meio cuja finalidade é evitar futuras ações puníveis10 A prevenção de novas infrações penais atende a um aspecto dúplice geral e especial A prevenção geral é destinada ao controle da violência na medida em que busca diminuíla e evitála Pode ser negativa ou positiva A prevenção geral negativa idealizada por J P Anselm Feuerbach com arrimo em sua teoria da coação psicológica tem o propósito de criar no espírito dos potenciais criminosos um contraestímulo suficientemente forte para afastálos da prática do crime11 Busca intimidar os membros da coletividade acerca da gravidade e da imperatividade da pena retirandolhes eventual incentivo quanto à prática de infrações penais Demonstrase que o crime não compensa pois ao seu responsável será inevitavelmente imposta uma pena assim como aconteceu em relação ao condenado punido Nas palavras de Anabela Miranda Rodrigues Os motivos pelos quais a pena deve ser aplicada quia peccatum est são pois em Feuerbach de duas ordens de razões da exigência de tornar séria isto é portadoras de consequências efetivas a ameaça contida na lei penal de tornar operante a coação psicológica que deve ser o efeito daquela ameaça e da exigência de garantir a legalidade e a certeza do direito12 Atualmente a finalidade de prevenção geral negativa manifestase rotineiramente pelo direito penal do terror Instrumentalizase o condenado na medida em que serve ele de exemplo para coagir outras pessoas do corpo social com a ameaça de uma pena grave implacável e da qual não se pode escapar Em verdade o ponto de partida da prevenção geral possui normalmente uma tendência para o terror estatal Quem pretende intimidar mediante a pena tenderá a reforçar esse efeito castigando tão duramente quanto possível13 Prevenção geral positiva de outro lado consiste em demonstrar e reafirmar a existência a validade e a eficiência do Direito Penal Almejase demonstrar a vigência da lei penal O efeito buscado com a pena é romper com a ideia de vigência de uma lei particular que permite a prática criminosa demonstrando que a lei geral que impede tal prática e a compreende como conduta indesejada está em vigor14 Em suma o aspecto positivo da prevenção geral repousa na conservação e no reforço da confiança na firmeza e poder de execução do ordenamento jurídico A pena tem a missão de demonstrar a inviolabilidade do Direito diante da comunidade jurídica e reforçar a confiança jurídica do povo15 Mas não para por aí A pena ainda é dotada de prevenção especial direcionada exclusivamente à pessoa do condenado Subdividese também a prevenção especial em negativa e positiva Para a prevenção especial negativa o importante é intimidar o condenado para que ele não torne a ofender a lei penal Busca portanto evitar a reincidência Finalmente a prevenção especial positiva preocupase com a ressocialização do condenado para que no futuro possa ele com o integral cumprimento da pena ou se presentes os requisitos legais com a obtenção do livramento condicional retornar ao convívio social preparado para respeitar as regras a todos impostas pelo Direito A pena é legítima somente quando é capaz de promover a ressocialização do criminoso16 E como tem se sustentado atualmente antes de ser socializadora a execução da pena de prisão deve ser não dessocializadora Isto num duplo sentido por um lado não se deve amputar o recluso dos direitos que a sua qualidade de cidadão lhe assegura por outro lado devese reduzir ao mínimo a marginalização de fato que a reclusão implica e os efeitos criminógenos que lhe estão associados Só a incorporação da não dessocialização no conceito de socialização permitirá cumprir a Constituição e dissolver o paradoxo de se pretender preparar a reinserção social em um contexto por definição antissocial17 A pena deve simultaneamente castigar o condenado pelo mal praticado e evitar a prática de novos crimes tanto em relação ao criminoso como no tocante à sociedade Em síntese fundemse as teorias e finalidades anteriores A pena assume um tríplice aspecto retribuição prevenção geral e prevenção especial Foi a teoria acolhida pelo art 59 caput do Código Penal quando dispõe que a pena será estabelecida pelo juiz conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime É também chamada de teoria da união eclética intermediária conciliatória ou unitária E se não bastasse o direito penal brasileiro aponta em diversos dispositivos a sua opção pela teoria mista ou unificadora De fato o Código Penal aponta o acolhimento da finalidade retributiva nos arts 121 5º e 129 8º quando institui o perdão judicial para os crimes de homicídio culposo e lesões corporais culposas Nesses casos é possível a extinção da punibilidade quando as consequências da infração atingirem o próprio agente de forma tão grave que a sanção penal se torne desnecessária Fica claro pois ser cabível o perdão judicial quando o agente já foi punido quando já foi castigado pelas consequências do crime por ele praticado Já houve portanto a retribuição Por sua vez em diversos dispositivos a Lei 72101984 Lei de Execução Penal dá ênfase à finalidade preventiva da pena em suas duas vertentes geral e especial Nesse sentido estabelece o seu art 10 caput A assistência ao preso e ao internado é dever do Estado objetivando prevenir o crime e orientar o retorno à convivência em sociedade E ainda o art 22 A assistência social tem por finalidade amparar o preso e o internado e preparálos para o retorno à liberdade O trabalho do preso tem finalidade educativa art 28 E finalmente a Convenção Americana de Direitos Humanos de 1969 conhecida como Pacto de San José da Costa Rica incorporada ao direito pátrio pelo Decreto 6781992 estatui em seu art 5º item 6 no tocante ao direito à integridade pessoal que as penas privativas de liberdade devem ter por finalidade essencial a reforma e a readaptação social dos condenados No sistema penal brasileiro as finalidades da pena devem ser buscadas pelo condenado e pelo Estado com igual ênfase à retribuição e à prevenção Na linha da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal Se é assim vale dizer se a Constituição mesma parece conferir à execução das penalidades em foco uma paralela função de reabilitação individual na perspectiva de um saneado retorno do apenado à vida societária esse mister reeducativo é de ser desempenhado pelo esforço conjunto da pessoa encarcerada e do Estadocarcereiro Esforço conjunto que há de se dar segundo pautas adrede fixadas naquilo que é o próprio cerne do regime que a lei designa como de execuções penais Um regime necessariamente concebido para fazer da efetiva constrição da liberdade topográfica de ir e vir um mecanismo tão eficiente no plano do castigo mesmo quanto no aspecto regenerador que a ela é consubstancial18 325 A teoria agnóstica também chamada de teoria negativa coloca em destaque a descrença nas finalidades da pena e no poder punitivo do Estado notadamente na ressocialização prevenção especial positiva a qual jamais pode ser efetivamente alcançada em nosso sistema penal Essa teoria portanto sustenta que a única função efetivamente desempenhada pela pena seria a neutralização do condenado especialmente quando a prisão acarreta em seu afastamento da sociedade19 FUNÇÃO SOCIAL DA PENA Falase atualmente em função social da pena e consequentemente em função social do Direito Penal direcionada eficazmente à sociedade a qual se destina pois no tocante a ela a pena tem as tarefas de protegêla e pacificar seus membros após a prática de uma infração penal 326 a b Não basta a retribuição pura e simples pois nada obstante a finalidade mista acolhida pelo sistema penal brasileiro a crise do sistema prisional transforma a pena em castigo e nada mais A pena deve atender aos anseios da sociedade consistentes na tutela dos bens jurídicos indispensáveis para a manutenção e o desenvolvimento do indivíduo e da coletividade pois só assim será legítima e aceita por todos em um Estado Democrático de Direito combatendo a impunidade e recuperando os condenados para o convívio social Em sua aplicação prática a pena necessita passar pelo crivo da racionalidade contemporânea impedindo se torne o delinquente instrumento de sentimentos ancestrais de represália e castigo Só assim o Direito Penal poderá cumprir a sua função preventiva e socializadora com resultados mais produtivos para a ordem social e para o próprio transgressor20 FUNDAMENTOS DA PENA Fundamentos da pena não se confundem com finalidades da pena Aqueles se relacionam com os motivos que justificam a existência e a imposição de uma pena estas dizem respeito ao objetivo que se busca alcançar com sua aplicação Apontamse seis principais fundamentos da pena retribuição reparação denúncia incapacitação reabilitação e dissuasão Retribuição conferese ao condenado uma pena proporcional e correspondente à infração penal na qual ele se envolveu É a forma justa e humana que tem a sociedade para punir os criminosos com proporção entre o ilícito penal e o castigo O mal que a pena transmite ao condenado deve ser equivalente ao mal produzido por ele à coletividade O crime deve ter a pena que merece desvalor do criminoso semelhante ao desvalor social da conduta Reparação consiste em conferir algum tipo de recompensa à vítima do delito Relacionase com a vitimologia notadamente com a assistência à vítima e à reparação do dano como forma de recompor o mal social causado pela infração penal c d e f 327 Denúncia é a reprovação social à prática do crime ou da contravenção penal A necessidade de aplicação da pena justificase para exercer a prevenção geral por meio da intimidação coletiva e não para desfazer o desequilíbrio causado pelo crime Incapacitação privase a liberdade do condenado retirandoo do convívio social para a proteção das pessoas de bem Para Garofalo a pena é um mal necessário à reparação do dano provocado pela conduta criminosa E embora na aparência o fim da pena seja a vingança social ou o desejo de fazer sofrer ao culpado um mal análogo ao que ele produziu na realidade o que se deseja é isto em primeiro lugar excluir do meio coletivo os delinquentes inassimiláveis depois constranger o autor de um mal a reparálo tanto quanto possível21 Reabilitação deve recuperarse o penalmente condenado A pena precisa restaurar o criminoso tornandoo útil à sociedade Funciona como meio educativo de reinserção social e não punitivo Dissuasão busca convencer as pessoas em geral e também o condenado de que o crime é uma tarefa desvantajosa e inadequada A pena inserese como atividade destinada a impedir o culpado de tornarse nocivo à sociedade bem como instrumento para afastar os demais indivíduos de práticas ilícitas perante o Direito Penal COMINAÇÃO DAS PENAS Nos moldes do art 53 do Código Penal As penas privativas de liberdade têm seus limites estabelecidos na sanção correspondente a cada tipo legal de crime Esse dispositivo é desnecessário no tocante às penas privativas de liberdade pois já são cominadas por cada tipo legal de crime ou contravenção penal nos limites mínimo e máximo Exemplificativamente o art 155 do Código Penal prevê para o furto simples o limite mínimo de 1 um e máximo de 4 quatro anos de reclusão Entretanto a função substitutiva atribuída às penas restritivas de direitos e a b c d 328 a a cominação indeterminada das penas de multa explicam a introdução no Código Penal dessas regras de cominação evitando uma cansativa e indevida repetição em cada tipo legal22 Em nosso sistema penal as penas podem ser cominadas previstas em abstrato por diversas modalidades isoladamente cuidase da cominação única de uma pena prevista com exclusividade pelo preceito secundário do tipo incriminador Exemplo art 121 caput do Código Penal com pena de reclusão cumulativamente o tipo penal prevê em conjunto duas espécies de penas Exemplo art 157 caput do Código Penal com penas de reclusão e multa paralelamente cominamse alternativamente duas modalidades da mesma pena Exemplo art 235 1º do Código Penal com penas de reclusão ou detenção pois ambas são privativas de liberdade alternativamente a lei coloca à disposição do magistrado a aplicação única de duas espécies de penas Há duas opções mas o julgador somente pode aplicar uma delas Exemplo art 140 caput do Código Penal com penas de detenção ou multa CLASSIFICAÇÃO DAS PENAS As penas podem ser classificadas com base em variados critérios quanto ao bem jurídico do condenado atingido pela reação estatal pena quanto ao critério constitucional e quanto ao critério adotado pelo Código Penal A pena pode ser dividida em cinco espécies Pena privativa de liberdade retira do condenado o seu direito de locomoção em razão da prisão por tempo determinado Não se admite a privação perpétua da liberdade CF art 5º XLVII b b c d e mas somente a de natureza temporária pelo período máximo de 30 trinta anos para crimes CP art 75 ou de 5 cinco anos para contravenções penais LCP art 10 Pena restritiva de direitos limita um ou mais direitos do condenado em substituição à pena privativa de liberdade Está prevista no art 43 do Código Penal e por alguns dispositivos da legislação extravagante Pena de multa incide sobre o patrimônio do condenado Pena restritiva da liberdade restringe o direito de locomoção do condenado sem priválo da liberdade isto é sem submetêlo à prisão É o caso da pena de banimento consistente na expulsão de brasileiro do território nacional vedada pelo art 5º XLVII d da Constituição Federal É possível a instituição por lei de pena restritiva da liberdade em face de autorização constitucional art 5º XLVI a Exemplo proibir o condenado por crime sexual de aproximarse da residência da vítima A deportação a expulsão e a extradição de estrangeiros são admissíveis uma vez que têm natureza administrativa e não penal e encontramse previstas nos arts 50 a 60 e 81 a 99 da Lei 134452017 Lei de Migração Pena corporal viola a integridade física do condenado tal como ocorre nas penas de açoite de mutilações e de marcas de ferro quente Essas penas são vedadas pelo art 5º XLVII e da Constituição Federal em face da crueldade de que se revestem Admitese excepcionalmente a pena de morte em caso de guerra declarada contra agressão estrangeira CF art 5º XLVII a nas hipóteses previstas no Decretolei 10011969 Código Penal Militar Essa classificação das penas encontrase no art 5º XLVI e XLVII da Constituição Federal No inc XLVI o art 5º contempla as penas permitidas O rol é 329 exemplificativo pois se admitem entre outras as penas de privação ou restrição da liberdade perda de bens multa prestação social alternativa e suspensão ou interdição de direitos Por outro lado o inc XLVII do art 5º enumera as penas proibidas a saber de morte salvo em caso de guerra declarada de caráter perpétuo23 de trabalhos forçados de banimento e cruéis As penas previstas no Código Penal em seu art 32 são privativas de liberdade restritivas de direitos e multa ABOLICIONISMO PENAL O movimento abolicionista encontra sua origem na Holanda nos estudos de Louk Hulsman e na Noruega nos pensamentos de Nils Christie e Thomas Mathiesen Consiste em uma nova forma de pensar o Direito Penal mediante o debate crítico do fundamento das penas e das instituições responsáveis pela aplicação desse ramo do Direito Para enfrentar a crise penitenciária que cresce a cada dia nos mais variados cantos do mundo propõese a descriminalização de determinadas condutas o crime deixa de existir e a despenalização de outros comportamentos subsiste o crime mas desaparece a pena Em casos residuais atenuamse consideravelmente as sanções penais dirigidas às condutas ilícitas de maior gravidade O abolicionismo penal parte da seguinte reflexão a forma atual de punição escolhida pelo Direito Penal é falha pois a reincidência aumenta diariamente Além disso a sociedade não sucumbe à prática de infrações penais mormente se forem consideradas as cifras negras da justiça penal ou seja os crimes efetivamente praticados porém ignorados pelos operadores do Direito24 E dentre os apurados somente alguns resultam em condenações e mesmo no grupo dos condenados poucos indivíduos cumprem integralmente a pena imposta Portanto a sociedade ao contrário do que comumente se sustenta tem capacidade para suportar a maioria das infrações penais sem submeterse a prejuízos irreparáveis Para os defensores desse movimento é o que já ocorre nos dias atuais embora informalmente Assim sendo o problema penal poderia ser adequadamente solucionado por outros meios notadamente com o atendimento prioritário à vítima pois seria mais eficaz empregar os valores utilizados com a construção de prisões e manutenção de detentos para reparar os danos a ela proporcionados Defendese ainda a legalização das drogas e a mudança do tratamento do criminoso que não pode ser marginalizado e encarado diversamente das demais pessoas É importante ressaltar que o abolicionismo penal possui variantes entre seus partidários Louk Hulsman apregoa um abolicionismo fenomenológico e ampara suas ideias no entendimento de que o sistema penal constituise como um 3210 problema em si mesmo Cuidase de uma inutilidade incapaz de resolver os problemas que se propõe a solucionar Destarte sustenta a sua abolição total por tratarse de um sistema que causa sofrimentos desnecessários e mais ainda acarreta em uma distribuição de justiça socialmente injusta pois produz inúmeros efeitos negativos nas pessoas a ele submetidas apresentando completa ausência de controle por parte do Estado O penalista holandês prega então a abolição imediata do sistema penal afastando o Poder Público de todo e qualquer conflito solucionandose os problemas sociais por instâncias intermediárias sem natureza penal25 Além disso propõe a eliminação de nomenclaturas utilizadas na justiça penal eliminando dentre outros os termos crime e criminoso Trata o fenômeno crime como um problema social o que enseja a pacificação dos conflitos em um ambiente diverso do atualmente existente Já Thomas Mathiesen e Nils Christie compartilham de um abolicionismo fenomenológicohistoricista Vinculam o sistema penal à estrutura do sistema capitalista razão pela qual além da sua eliminação defendem o fim de todo e qualquer método de repressão existente na sociedade Destarte a luta pelo direito deve se concentrar num esforço de limitação da dor26 Em face de sua proposta central eliminar o sistema penal descriminalizar condutas e acabar com penas o abolicionismo penal é considerado uma utopia até mesmo pelos representantes do direito penal mínimo e do garantismo penal27 Nada obstante esse movimento recebeu na América Latina a simpatia de Eugenio Raúl Zaffaroni levandoo inclusive a escrever toda uma obra sobre o assunto28 JUSTIÇA RESTAURATIVA Desde sua origem o Direito Penal sempre se pautou pelo castigo da conduta criminosa praticada por alguém com a imposição de uma pena Buscouse e buscase incansavelmente a retribuição do mal praticado com a aplicação concreta de outro mal embora legítimo representado pela pena Daí falarse que o Direito Penal enseja a configuração de uma justiça retributiva Atualmente entretanto surge uma nova proposta consistente na justiça restaurativa fundada basicamente na restauração do mal provocado pela infração penal Essa vertente parte da seguinte premissa o crime e a contravenção penal não necessariamente lesam interesses do Estado difusos e indisponíveis Tutelase com maior intensidade a figura da vítima historicamente relegada a um segundo plano no Direito Penal Dessa forma relativizamse os interesses advindos com a prática da infração penal que de difusos passam a ser tratados como individuais e consequentemente disponíveis A partir daí o litígio antes entre a justiça pública e o responsável pelo ilícito penal passa a ter como protagonistas o ofensor e o ofendido e a punição deixa de ser o objetivo imediato da atuação do Direito Penal Surge a possibilidade de conciliação entre os envolvidos autor coautor ou partícipe e vítima mitigandose a persecução penal uma vez que não é mais obrigatório o exercício da ação penal A justiça restaurativa tem como principal finalidade portanto não a imposição da pena mas o reequilíbrio das relações entre agressor e agredido contando para tanto com o auxílio da comunidade inicialmente atacada mas posteriormente desempenhando papel decisivo na restauração da paz social Nesse contexto vislumbrase a justiça com ênfase na reparação do mal proporcionado pelo crime compreendido como uma violação às pessoas e aos relacionamentos coletivos e não como uma ruptura com o Estado Em verdade o crime deixa de constituirse em ato contra o Estado para ser ato contra a comunidade contra a vítima e ainda contra o seu próprio autor pois ele também é agredido com a violação do ordenamento jurídico E se na justiça retributiva há interesse público na atuação do Direito Penal na justiça restaurativa tal interesse pertence às pessoas envolvidas no episódio criminoso29 Não mais se imputa a responsabilidade pelo crime pessoalmente ao seu autor coautor ou partícipe Ao contrário todos os membros da sociedade são 1 responsáveis pelo fato praticado já que falharam na missão de viverem pacificamente em grupo Os procedimentos formais e rígidos da justiça retributiva cedem espaço na justiça restaurativa a meios informais e flexíveis prevalecendo a disponibilidade da ação penal Proporciona coragem ao agressor para responsabilizarse pela conduta danosa refletindo sobre as causas e os efeitos do seu comportamento em relação aos seus pares para então modificar o seu modo de agir e ser posteriormente aceito de volta na comunidade Como resultado a justiça restaurativa pode acarretar em perdão recíproco entre os envolvidos bem como em reparação à vítima em dinheiro ou até mesmo com prestação de serviços em geral a ela ou à sociedade Esse método tende a criar um ambiente seguro no qual o ofendido pode aproximarse do autor da conduta ilícita Além disso a justiça restaurativa oferece à comunidade uma oportunidade de articular seus valores e expectativas acerca do entendimento das causas subjacentes do crime e determinar o que pode ser feito para reparar o mal provocado e restabelecer a tranquilidade outrora existente Assim agindo contribui para o bem coletivo e colabora potencialmente para a diminuição do índice de criminalidade E se a todos incumbe a restauração da paz pública as penas privativas de liberdade abrem passagem para a reparação do dano e para as medidas substitutivas da pena privativa de liberdade como decorrência da incessante atividade conciliatória característica da justiça restaurativa Seu foco principal é a assistência à vítima Um primeiro passo no Brasil para a implantação da justiça restaurativa operouse com a Lei 90991995 notadamente quando se dispõe a evitar a aplicação da pena privativa de liberdade seja com a composição dos danos civis seja com o instituto da transação penal Mas os seus partidários desejam ampliar seu raio de incidência e a amoldam a alguns princípios básicos e regras procedimentais de segurança quais sejam A participação da vítima e do agressor na justiça restaurativa depende do consentimento válido de ambas as partes devendo cada uma delas receber explicações claras acerca da natureza do procedimento e de 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 suas consequências Em qualquer momento os envolvidos podem desistir da participação na justiça restaurativa A vítima e o agressor precisam aceitar como verdadeiro o episódio criminoso e o agressor deve reconhecer sua responsabilidade pela prática do fato debatido As partes têm o direito de aconselharemse juridicamente em todas as etapas do procedimento O encaminhamento de um caso iniciado na justiça retributiva à justiça restaurativa pode ocorrer em qualquer momento desde a investigação criminal até o trânsito em julgado da condenação O trâmite do procedimento deve considerar as diferenças eventualmente existentes entre a vítima e o agressor causadas por motivos de idade de maturidade de capacidade intelectual situação econômica etc Todas as discussões salvo as eminentemente públicas devem ser confidenciais exceto se as partes convencionarem de outro modo ou se a publicidade para os agentes públicos responsáveis pela persecução penal for exigida por lei ou se as discussões revelarem ameaça potencial ou real à segurança ou à vida de qualquer dos envolvidos A aceitação da responsabilidade penal pelo agressor não pode ser utilizada como prova contra ele em futuro e possível processo judicial Todos os acordos devem ser voluntários e livres de qualquer tipo de coação e precisam conter apenas termos claros e facilmente compreensíveis por qualquer pessoa de inteligência mediana O descumprimento de um acordo alcançado na justiça restaurativa não pode ser usado em ação penal em juízo seja para reconhecimento de culpa seja para fundamentar punição mais severa ao ofensor O procedimento deve ser conduzido por pessoa preparada aceita pela coletividade e revestida de imparcialidade Todo programa de justiça restaurativa deve ser constantemente 3211 3212 avaliado e aperfeiçoado visando satisfazer aos interesses sociais de restabelecimento do mal causado pelo crime e proporcionar o reequilíbrio da paz pública JUSTIÇA NEGOCIADA Com origem no direito anglosaxão notadamente no sistema norte americano da plea bargaining esse modelo de justiça penal diferenciase da tradicional justiça retributiva na qual se busca a imposição da pena a quem violou a norma penal sem qualquer espaço para transação entre as partes Na justiça negociada por sua vez o sujeito que ofendeu a norma penal e o órgão acusatório celebram acordo envolvendo as consequências jurídicas da conduta criminosa com a imprescindível admissão de culpa Essa negociação pode recair tanto sobre a imputação formulada contra o réu como também sobre a pena a ser aplicada e os demais efeitos jurídicos do delito a exemplo do perdimento de bens e da reparação dos danos causados pela conduta criminosa ou ainda sobre ambas Uma importante manifestação desse modelo de justiça penal encontrase no instituto da colaboração premiada na forma definida pelos arts 4º e seguintes da Lei 128502013 Lei do Crime Organizado e também no acordo de não persecução penal instituído no âmbito do Ministério Público pelo art 18 da Resolução CNMP Conselho Nacional do Ministério Público 1812017 TEORIA DAS JANELAS QUEBRADAS BROKEN WINDOWS THEORY Em 1969 na Universidade de Stanford nos Estados Unidos da América Phillip Zimbardo acompanhado de sua equipe realizou uma experiência inédita no campo da psicologia social Seu estudo consistiu em abandonar dois automóveis idênticos em vias públicas um no Bronx zona pobre e problemática de New York e outra em Palo Alto local rico e tranquilo da Califórnia Carros iguais mas populações culturas e realidades sociais diversas O automóvel abandonado no Bronx foi rapidamente destruído pela ação de vândalos e subtraíramse vários dos seus componentes Por sua vez o carro deixado em Palo Alto permaneceu intacto Concluiuse em análise inicial ser a pobreza um fator determinante da criminalidade Os pesquisadores então decidiram quebrar uma das janelas do automóvel que se encontrava íntegro Rapidamente instalouse idêntico processo ao ocorrido no Bronx com a completa destruição do veículo Logo percebeuse não ser a pobreza por si só a causa fomentadora de infrações penais e sim a sensação de impunidade De fato uma janela quebrada em um automóvel transmite o sentimento de desinteresse de deterioração de despreocupação com as regras de convivência com a ausência do Estado E cada novo ataque reafirma e multiplica essa ideia até que a prática de atos ilícitos se torna incontrolável No ano de 1982 James Q Wilson e George L Kelling desenvolveram agora no terreno da criminologia a teoria das janelas quebradas broken windows theory30 sustentando a maior incidência de crimes e contravenções penais nos locais em que o descuido e a desordem são mais acentuados Com efeito quando se quebra a janela de uma casa e nada se faz implicitamente se estimula a destruição do imóvel como um todo De igual modo se uma comunidade demonstra sinais de deterioração e isto parece não importar a ninguém ali a criminalidade irá se instalar Nesse sentido se são cometidos pequenos delitos lesões corporais leves furtos etc sem a imposição de sanções adequadas pelo Estado abrese espaço para o cometimento de crimes mais graves tais como homicídios roubos latrocínios e tráfico de drogas A teoria das janelas quebradas foi inicialmente aplicada na década de 1980 no metrô de New York que havia se convertido no ponto mais perigoso da cidade mediante o combate às pequenas infrações a exemplo das pichações deteriorando as paredes e os vagões sujeira nas estações consumo de álcool pelos usuários e não pagamento de passagens A estratégia foi certeira e eficaz e em pouco tempo constatouse profunda melhora convertendose o metrô em local limpo e seguro Em 1994 Rudolph Giuliani então prefeito de New York acolhendo as premissas da teoria das janelas quebradas e a experiência do metrô implantou a política de tolerância zero com a finalidade de vedar qualquer violação da lei independentemente do seu grau Os adeptos dessa linha de pensamento destacam que não se trata de tolerância zero no tocante à pessoa do responsável pelo delito mas em relação ao próprio delito Na criminologia é frequente a relação da teoria das janelas quebradas com a teoria dos testículos quebrados ou despedaçados breaking balls theory Essa linha de raciocínio originase da experiência policial e parte da premissa de que os responsáveis pelos delitos de pouca gravidade quando perseguidos com eficácia pela polícia normalmente se dão por vencidos e fogem para locais distantes para que possam violar a lei penal sem serem frequentemente molestados pelos agentes do Estado 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 ROXIN Claus Derecho penal Parte general Fundamentos La estructura de la teoría del delito Trad espanhola DiegoManuel Luzón Peña Miguel Díaz y García Conlledo e Javier de Vicente Remensal Madrid Civitas 2006 t I p 43 e JESCHECK HansHeinrich Tratado de derecho penal Parte general 5 ed Trad espanhola Miguel Olmedo Cardenete Granada Comares 2002 p 89 BRUNO Aníbal Das penas Rio de Janeiro Editora Rio 1976 p 10 STF AgRQO 1033DF rel Min Celso de Mello Plenário j 25052006 NUCCI Guilherme de Souza Individualização da pena 2 ed São Paulo RT 2007 p 30 SILVA José Afonso da Comentário contextual à Constituição 4 ed São Paulo Malheiros 2007 p 145 HUNGRIA Nélson Comentários ao Código Penal Rio de Janeiro Forense 1949 v I p 86 DIAS Jorge de Figueiredo Temas básicos da doutrina penal Coimbra Coimbra Editora 2001 p 6566 Dizem uns que a justiça penal não podendo desinteressarse da falta moral deve aplicar a todo delinquente com capacidade para compreender as disposições da lei uma pena aflitiva isto é um castigo que importe em retribuição proporcional à falta moral A consciência pública sente a sua necessidade e o legislador não pode deixar de levar em conta esse estado de alma coletivo LYRA Roberto Comentários ao Código Penal Rio de Janeiro Forense 1942 v II p 43 KANT Emmanuel Doutrina do direito Trad Edson Bini São Paulo Ícone 1993 p 178179 JESCHECK HansHeinrich Tratado de derecho penal Parte general 5 ed Trad espanhola Miguel Olmedo Cardenete Granada Comares 2002 p 77 DIAS Jorge de Figueiredo Questões fundamentais de direito penal revisitadas São Paulo RT 1999 p 99 RODRIGUES Anabela Miranda A determinação da pena privativa de liberdade Coimbra Coimbra Editora 1995 p 170 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 ZAFFARONI Eugenio Raúl Derecho penal Parte general 2 ed Buenos Aires Ediar 2002 p 5859 JUNQUEIRA Gustavo Octaviano Diniz Finalidades da pena BarueriSP Manole 2004 p 69 ROXIN Claus Derecho penal Parte geral Fundamentos La estructura de la teoría del delito Tradução para o espanhol de DiegoManuel Luzón Peña Miguel Díaz y García Conlledo e Javier de Vicente Remensal Madrid Civitas 2006 t I p 91 HASSEMER Winfried Direito penal libertário Trad Regina Greve Belo Horizonte Del Rey 2007 p 104 RODRIGUES Anabela Miranda Novo olhar sobre a questão penitenciária 2 ed Coimbra Coimbra Editora 2002 p 52 HC 91874RS decisão monocrática do Min Carlos Britto j 31082007 ZAFFARONI Eugenio Raúl Derecho penal Parte general 2 ed Buenos Aires Ediar 2002 p 44 MARQUES Oswaldo Henrique Duek Fundamentos da pena São Paulo Juarez de Oliveira 2000 p 110 GAROFALO Raffaele Criminologia estudo sobre o delicto e a repressão penal São Paulo Teixeira e Irmão 1893 p 114 SANTOS Juarez Cirino dos Direito penal Parte geral 2 ed Curitiba ICPC Lumen Juris 2007 p 549 Nos Estados Unidos da América em alusão às regras do beisebol existem defensores do modelo three strikes and youre out a terceira condenação definitiva leva à exclusão social do indivíduo mediante a imposição da pena de prisão perpétua Falase também no direito penal subterrâneo composto pelos crimes decorrentes do exercício arbitrário do direito de punir por determinados agentes públicos a exemplo de torturas e homicídios cometidos por policiais Este fenômeno surge e ganha corpo notadamente em face da ineficácia dos órgãos estatais Polícias Ministério Público Poder Judiciário etc HULSMAN Louk Sistema penal y seguridad ciudadana hacia una alternativa Trad espanhola Sergio Politoff Barcelona Ariel 1984 p 31 SHECAIRA Sérgio Salomão CORRÊA JUNIOR Alceu Teoria da pena finalidades direito positivo jurisprudência e outros estudos de ciência 27 28 29 30 criminal São Paulo RT 2002 p 140 Cf FERRAJOLI Luigi Direito e razão teoria do garantismo penal 2 ed Trad Ana Paula Zomer Sica Fauzi Hassan Choukr Juarez Tavarez e Luiz Flávio Gomes São Paulo RT 2006 p 317318 ZAFFARONI Eugenio Raúl Em busca das penas perdidas 5 ed Rio de Janeiro Revan 2001 Daí falase que na justiça restaurativa operase uma privatização do Direito Penal WILSON James Q e KELLING George L Broken windows The police and neighborhood safety Atlantic Monthly Magazine Washington DC março de 1982 a b c Pena privativa de liberdade é a modalidade de sanção penal que retira do condenado seu direito de locomoção em razão da prisão por tempo determinado O direito penal brasileiro admite três espécies de penas privativas de liberdade reclusão e detenção relativas a crimes CP art 33 caput e prisão simples inerente às contravenções penais LCP art 5º I Regime ou sistema penitenciário é o meio pelo qual se efetiva o cumprimento da pena privativa de liberdade O art 33 1º do Código Penal elenca três regimes fechado a pena privativa de liberdade é executada em estabelecimento de segurança máxima ou média semiaberto a pena privativa de liberdade é executada em colônia agrícola industrial ou estabelecimento similar e aberto a pena privativa de liberdade é executada em casa de albergado ou estabelecimento adequado 3341 A leitura do art 33 2º e 3º do Código Penal revela que três fatores são decisivos na escolha do regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade reincidência quantidade da pena e circunstâncias judiciais Na visão do Superior Tribunal de Justiça O regime inicial de cumprimento da pena deve considerar a quantidade de pena imposta e a análise das circunstâncias judiciais assim como eventual reincidência A gravidade abstrata do crime por si só não pode levar à determinação do regime fechado inicialmente pois esta já foi considerada na escala penal a ele cominada1 É o juiz sentenciante quem fixa o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade CP art 59 III E na hipótese de concurso de crimes levase em conta o total das penas impostas somadas concurso material e concurso formal imperfeito ou exasperadas de determinado percentual concurso formal perfeito e crime continuado Mas se durante a execução penal surgirem outras condenações criminais transitadas em julgado o juízo da execução deverá somar o restante da pena objeto da execução com as novas penas estabelecendo em seguida o regime de cumprimento para o total das reprimendas Regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade e crimes hediondos ou equiparados Nos crimes hediondos previstos taxativamente no art 1º da Lei 80721990 e nos delitos a estes equiparados pela determinação expressa contida no art 5º XLIII da Constituição Federal tráfico de drogas tortura e terrorismo o art 2º 1º do citado diploma legislativo determina seja a pena privativa de liberdade cumprida em regime inicialmente fechado independentemente da sua quantidade e do perfil subjetivo do réu primariedade ou reincidência e circunstâncias judiciais favoráveis ou desfavoráveis2 Em outras palavras a Lei dos Crimes Hediondos não reserva ao magistrado discricionariedade no tocante à fixação do regime prisional O Supremo Tribunal Federal entretanto declarou a inconstitucionalidade desta regra por violação aos princípios da individualização da pena e da proporcionalidade É inconstitucional o 1º do art 2º da Lei 80721990 Art 2º Os crimes hediondos a prática da tortura o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e o terrorismo são insuscetíveis de 1º A pena por crime previsto neste artigo será cumprida inicialmente em regime fechado Com base nesse entendimento o Plenário por maioria deferiu habeas corpus com a finalidade de alterar para semiaberto o regime inicial de pena do paciente o qual fora condenado por tráfico de drogas com reprimenda inferior a 8 anos de reclusão e regime inicialmente fechado por força da Lei 114642007 que instituíra a obrigatoriedade de imposição desse regime a crimes hediondos e assemelhados v Informativo 670 Destacouse que a fixação do regime inicial fechado se dera exclusivamente com fundamento na lei em vigor Observouse que não se teriam constatado requisitos subjetivos desfavoráveis ao paciente considerado tecnicamente primário Ressaltouse que assim como no caso da vedação legal à substituição de pena privativa de liberdade por restritiva de direitos em condenação pelo delito de tráfico já declarada inconstitucional pelo STF a definição de regime deveria sempre ser analisada independentemente da natureza da infração Ademais seria imperioso aferir os critérios de forma concreta por se tratar de direito subjetivo garantido constitucionalmente ao indivíduo Consignouse que a Constituição contemplaria as restrições a serem impostas aos incursos em dispositivos da Lei 80721990 e dentre elas não se encontraria a obrigatoriedade de imposição de regime extremo para início de cumprimento de pena Salientouse que o art 5º XLIII da CF afastaria somente a fiança a graça e a anistia para no inciso XLVI assegurar de forma abrangente a individualização da pena3 Nessa linha de raciocínio o Supremo Tribunal Federal já aplicou os regimes semiaberto e aberto a réus condenados pelo crime de tráfico de drogas levando em conta as penas aplicadas e as circunstâncias judiciais reveladas em cada caso concreto4 De forma curiosa todavia a Corte Suprema reconheceu a constitucionalidade do art 1º 7º da Lei 94551997 o qual impõe o regime inicial fechado para o condenado pelo crime de tortura O condenado por crime de tortura iniciará o cumprimento da pena em regime fechado nos termos do disposto no 7º do art 1º da Lei 94551997 Lei de Tortura Com base nessa orientação a Primeira Turma denegou pedido formulado em habeas corpus no qual se pretendia o reconhecimento de constrangimento ilegal consubstanciado na fixação em sentença penal transitada em julgado do cumprimento das penas impostas aos pacientes em regime inicialmente fechado Alegavam os impetrantes a ocorrência de violação ao princípio da individualização da pena uma vez que desrespeitados os artigos 33 3º e 59 do CP Apontavam a existência de similitude entre o disposto no artigo 1º 7º da Lei de Tortura e o previsto no art 2º 1º da Lei de Crimes Hediondos dispositivo legal que já teria sido declarado inconstitucional pelo STF no julgamento do HC 111840ES DJe de 17122013 Salientavam por fim afronta ao Enunciado 719 da Súmula do STF O Ministro Marco Aurélio relator denegou a ordem Considerou que no caso a dosimetria e o regime inicial de cumprimento das penas fixadas atenderiam aos ditames legais Asseverou não caber articular com a Lei de Crimes Hediondos pois a regência específica Lei 94551997 prevê expressamente que o condenado por crime de tortura iniciará o cumprimento da pena em regime fechado o que não se confundiria com a imposição de regime de cumprimento da pena integralmente fechado Assinalou que o legislador ordinário em consonância com a CF1988 teria feito uma opção válida ao prever que considerada a gravidade do crime de tortura a execução da pena ainda que fixada no mínimo legal deveria ser cumprida inicialmente em regime fechado sem prejuízo de posterior progressão5 O Supremo Tribunal Federal criou uma situação inusitada ao conferir valores diversos a crimes que receberam igual tratamento pelo art 5º inc 3342 XLIII da Constituição Federal Em síntese a Corte classifica como inconstitucional o regime inicial fechado nos delitos hediondos no tráfico de drogas e no terrorismo e simultaneamente o reputa constitucional no crime de tortura Tráfico de drogas privilegiado e Lei dos Crimes Hediondos O tráfico de drogas privilegiado encontrase tipificado no art 33 4º da Lei 113432006 A diminuição da pena de 16 um sexto a 23 dois terços aplicase aos crimes definidos no caput e no 1º do art 33 do citado diploma legal desde que estejam presentes 4 quatro requisitos cumulativos relacionados ao agente a primariedade b bons antecedentes c não se dedicar a atividades criminosas e d não integrar organizações criminosas É fácil notar que tal delito nada mais é do que um tráfico de drogas sobre o qual incide uma causa de diminuição da pena Em outras palavras tratase de um crime constitucionalmente equiparado a hediondo porém acompanhado de uma minorante O Supremo Tribunal Federal entretanto decidiu que o tráfico privilegiado não se submete às disposições da Lei dos Crimes Hediondos pois não é assemelhado aos delitos desta estirpe O crime de tráfico privilegiado de drogas não tem natureza hedionda Por conseguinte não são exigíveis requisitos mais severos para o livramento condicional Lei 113432006 art 44 parágrafo único e tampouco incide a vedação à progressão de regime Lei 80721990 art 2º 2º para os casos em que aplicada a causa de diminuição prevista no art 33 4 Lei 113432006 Com base nessa orientação o Plenário por maioria concedeu a ordem de habeas corpus para afastar a natureza hedionda de tal delito No caso os pacientes foram condenados pela prática de tráfico privilegiado e a sentença de 1º grau afastara a natureza hedionda do delito Posteriormente o STJ entendera caracterizada a hediondez o que impediria a concessão dos referidos benefícios O Tribunal superou a jurisprudência que se firmara no sentido da hediondez do tráfico privilegiado Sublinhou que a previsão legal seria indispensável para qualificar um crime como hediondo ou equiparado Assim a partir da leitura dos preceitos legais pertinentes apenas as modalidades de tráfico de entorpecentes definidas no art 33 caput e 1º da Lei 113432006 seriam equiparadas a crimes hediondos Entendeu que para alguns delitos e seus autores ainda que se tratasse de tipos mais gravemente apenados deveriam ser reservadas algumas alternativas aos critérios gerais de punição A legislação alusiva ao tráfico de drogas por exemplo prevê a possibilidade de redução da pena desde que o agente seja primário e de bons antecedentes não se dedique a atividades criminosas e nem integre organização criminosa Essa previsão legal permitiria maior flexibilidade na gestão da política de drogas pois autorizaria o juiz a avançar sobre a realidade pessoal de cada autor Além disso teria inegável importância do ponto de vista das decisões de política criminal A Corte observou que no caso do tráfico privilegiado a decisão do legislador fora no sentido de que o agente deveria receber tratamento distinto daqueles sobre os quais recairia o alto juízo de censura e de punição pelo tráfico de drogas As circunstâncias legais do privilégio demonstrariam o menor juízo de reprovação e em consequência de punição dessas pessoas Não se poderia portanto chancelarse a hediondez a essas condutas por exemplo Assim a imposição de pena não deveria estar sempre tão atrelada ao grau de censura constante da cominação abstrata dos tipos penais O juiz deveria ter a possibilidade de exame quanto à adequação da sanção imposta e o respectivo regime de cumprimento a partir do exame das características específicas na execução de determinados fatos cujo contexto em que praticados apresentasse variantes socialmente relevantes em relação ao juízo abstrato de censura cominada na regra geral De outro lado o art 33 4º da Lei 113432006 mereceria crítica na medida em que proíbe a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito Assentou ainda que a etiologia do crime privilegiado seria incompatível com a natureza hedionda Além disso os Decretos 67062008 e 70492009 beneficiaram com indulto os condenados pelo tráfico de entorpecentes privilegiado a demonstrar inclinação no sentido de que esse delito não seria hediondo Demais disso cumpre assinalar que o crime de associação para o tráfico que reclama liame subjetivo estável e habitual direcionado à consecução da traficância não seria equiparado a hediondo Dessa forma afirmar que o tráfico minorado fosse considerado hediondo significaria que a lei ordinária conferiria ao traficante ocasional tratamento penal mais severo que o dispensado ao agente que se associa de forma estável para exercer a traficância de modo habitual a escancarar que tal inferência consubstanciaria violação aos limites que regem a edição legislativa penal6 Em um primeiro momento o Superior Tribunal de Justiça acolheu entendimento diverso e editou a Súmula 512 A aplicação da causa de diminuição de pena prevista no art 33 4º da Lei 113432006 não afasta a hediondez do crime de tráfico de drogas Com a superveniência da posição adotada pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal todavia essa súmula foi cancelada no dia 23 de novembro de 2016 É do juízo das execuções penais LEP art 1º Nos termos da Súmula 192 do Superior Tribunal de Justiça Compete ao Juízo das Execuções Penais do Estado a execução das penas impostas a sentenciados pela Justiça Federal Militar ou Eleitoral quando recolhidos a estabelecimentos sujeitos à administração estadual A execução da pena privativa de liberdade tem índole jurisdicional Não se pode esquecer porém que também guarda em diversos momentos um aspecto administrativo Em face da sua cada vez mais crescente jurisdicionalização as decisões proferidas pelo juízo da execução comportam o recurso de agravo normalmente sem efeito suspensivo previsto no art 197 da Lei 72101984 Lei de Execução Penal Esse agravo segue o rito do recurso em sentido estrito disciplinado no art a b c d 581 e seguintes do Código de Processo Penal notadamente pela identidade de prazos para a interposição de ambos Como preceitua a Súmula 700 do Supremo Tribunal Federal É de 5 cinco dias o prazo para interposição de agravo contra decisão do juiz da execução penal A pena de reclusão deve ser cumprida inicialmente em regime fechado semiaberto ou aberto CP art 33 caput 1ª parte Os critérios para a determinação do regime são os seguintes a teor das alíneas a b e c do 2º do art 33 do Código Penal o reincidente inicia o cumprimento da pena privativa de liberdade no regime fechado independentemente da quantidade da pena aplicada Para amenizar essa regra o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula 269 É admissível a adoção do regime prisional semiaberto aos reincidentes condenados a pena igual ou inferior a 4 quatro anos se favoráveis as circunstâncias judiciais o primário cuja pena seja superior a 8 oito anos deverá começar a cumprila no regime fechado7 o primário cuja pena seja superior a 4 quatro anos e não exceda a 8 oito poderá desde o princípio cumprila em regime semiaberto e o primário cuja pena seja igual ou inferior a 4 quatro anos poderá desde o início cumprila em regime aberto É possível todavia seja imposto em relação ao condenado primário um regime inicial mais rigoroso do que o permitido exclusivamente pela quantidade da pena aplicada8 Com efeito dispõe o art 33 3º do Código Penal A determinação do regime inicial de cumprimento da pena farseá com observância dos critérios previstos no art 59 deste Código Destarte nada impede exemplificativamente a fixação do regime fechado a condenado primário condenado a 5 cinco anos de reclusão se as circunstâncias judiciais do art 59 caput do Código Penal lhe forem desfavoráveis9 Não basta para tanto o julgador reportarse apenas à gravidade abstrata do crime pois como estatui a Súmula 718 do Supremo Tribunal Federal A opinião do julgador sobre a gravidade em abstrato do crime não constitui motivação idônea para a imposição de regime mais severo do que o permitido segundo a pena aplicada Para aplicar o regime mais severo portanto o magistrado necessita fundamentar exaustivamente sua escolha com base em elementos sólidos e amparados pelo ordenamento jurídico Como preceitua a Súmula 719 do Supremo Tribunal Federal A imposição de regime de cumprimento mais severo do que a pena aplicada permitir exige motivação idônea Confirase a propósito o seguinte julgado do Supremo Tribunal Federal Inexistência de direito subjetivo a regime de cumprimento penal mais brando Possibilidade de imposição de regime mais gravoso Réu primário e de bons antecedentes condenado a pena não superior a 08 oito anos CP art 33 2º b Estipulação do cumprimento da pena em regime inicialmente fechado Fundamentação baseada apenas nos aspectos inerentes ao tipo penal no reconhecimento da gravidade objetiva do delito e na formulação de juízo negativo em torno da reprovabilidade da conduta delituosa Revelase inadmissível na hipótese de condenação a pena não superior a 08 oito anos de reclusão impor ao sentenciado em caráter inicial o regime penal fechado com base unicamente na gravidade objetiva do delito cometido especialmente se se tratar de réu que ostente bons antecedentes e que seja comprovadamente primário O discurso judicial que se apoia exclusivamente no reconhecimento da gravidade objetiva do crime e que se cinge para efeito de exacerbação punitiva a tópicos sentenciais meramente retóricos eivados de pura generalidade destituídos de qualquer fundamentação substancial e reveladores de linguagem típica dos partidários do direito penal simbólico ou até mesmo do direito penal do inimigo culmina por infringir os princípios liberais consagrados pela ordem democrática na qual se estrutura o Estado de Direito expondo com esse comportamento em tudo colidente com os parâmetros delineados na Súmula 719STF uma visão autoritária e a b c nulificadora do regime das liberdades públicas em nosso país10 A pena de detenção deve ser cumprida inicialmente em regime semiaberto ou aberto CP art 33 caput in fine Não se admite o início de cumprimento da pena privativa de liberdade no fechado nada obstante seja possível a regressão a esse regime Os critérios para fixação do regime inicial de cumprimento da pena de detenção são os seguintes o condenado reincidente inicia o cumprimento da pena privativa de liberdade no regime semiaberto seja qual for a quantidade da pena aplicada o primário cuja pena seja superior a 4 quatro anos deverá cumprila no regime semiaberto e o primário cuja pena seja igual ou inferior a 4 quatro anos poderá desde o início cumprila no regime aberto11 No mais aplicase o que foi dito no item anterior relativamente à possibilidade de determinação do regime semiaberto quando a pena imposta for igual ou inferior a 4 quatro anos A pena de prisão simples cabível unicamente para as contravenções penais deve ser cumprida sem rigor penitenciário em estabelecimento especial ou seção especial de prisão comum em regime semiaberto ou aberto O condenado à prisão simples fica sempre separado dos condenados à pena de reclusão ou de detenção LCP art 6º caput e 1º Não há regime fechado seja inicialmente seja em decorrência de regressão Além disso o trabalho é facultativo se a pena aplicada não excede a 15 quinze dias nos termos do art 6º 2º do Decretolei 36881941 Lei das Contravenções Penais No Código Penal extraemse quatro diferenças fundamentais entre as penas de reclusão e as de detenção Inicialmente a reclusão pode ser cumprida nos regimes fechado semiaberto ou aberto Já a detenção somente nos regimes semiaberto e aberto Em segundo lugar no caso de aplicação cumulativa de penas de reclusão e de detenção executase aquela por primeiro CP art 69 caput in fine Posteriormente isto é depois de executada integralmente a pena de reclusão será cumprida a pena de detenção Em terceiro lugar a reclusão pode ter como efeito da condenação a incapacidade para o exercício do poder familiar da tutela ou da curatela nos crimes dolosos cometidos contra outrem igualmente titular do mesmo poder familiar contra filho filha ou outro descendente ou contra o tutelado ou curatelado CP art 92 II Esse efeito não é possível na pena de detenção Finalmente a reclusão acarreta na internação em caso de imposição de medida de segurança enquanto na detenção o juiz pode aplicar o tratamento ambulatorial CP art 97 caput Além disso cumpre destacar a regra veiculada pelo art 2º III da Lei 92961996 autorizando a interceptação de comunicações telefônicas de qualquer natureza como meio de prova somente nos crimes punidos com reclusão Colocase a seguinte indagação Quando a penabase for fixada no mínimo legal é possível a aplicação de regime prisional inicial mais severo do que o admitido pela quantidade da pena Vimos que a determinação do regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade além da reincidência e da quantidade da pena aplicada também depende das circunstâncias judiciais que incidem no cálculo da pena base É o que consta do art 33 3º do Código Penal Qual é então a resposta adequada Formaramse duas posições sobre o assunto 1ª posição se a penabase foi aplicada no mínimo legal por serem favoráveis as circunstâncias judiciais previstas no art 59 caput do Código Penal não pode ser aplicado regime prisional mais gravoso Situação contrária seria ilógica e incoerente Tratase de posição amplamente dominante e inclusive consagrada na Súmula 440 do Superior Tribunal de Justiça Fixada a penabase no mínimo legal é vedado o estabelecimento de regime prisional mais gravoso do que o cabível em razão da sanção imposta com base apenas na gravidade abstrata do delito12 2ª posição o cálculo da penabase no piso legal não induz obrigatoriamente à fixação do regime prisional mais suave uma vez que as circunstâncias judiciais previstas no art 59 caput do Código Penal devem ser analisadas em dois momentos distintos inicialmente para a dosimetria da pena e em seguida para determinação do regime prisional Justificase esta proibição pelo respeito à coisa julgada e pela inadmissibilidade de revisão criminal contra o réu mormente ex officio Se exemplificativamente o juízo da condenação fixar ao autor de latrocínio condenado a 20 anos de reclusão o regime prisional aberto embora seja correto o regime fechado em decorrência da pena imposta e esta decisão transitar em julgado o juízo da execução nada poderá fazer13 A execução penal tem início com a expedição de guia de recolhimento incumbência conferida ao juiz em relação ao réu que estiver ou vier a ser preso após o trânsito em julgado da sentença que aplicar pena privativa de liberdade LEP art 105 Mas independentemente da ordem de expedição das guias de recolhimento e também da data da chegada de cada uma delas ao juízo da execução as penas mais graves devem ser executadas previamente às penas menos graves Nesse contexto se o réu possui mais de uma condenação e se uma delas for consequência da prática de crime hediondo ou equiparado deve ser a pena resultante dessa condenação executada em primeiro lugar por ser mais grave o que se extrai da natureza do delito e dos prazos mais dilatados para a progressão de regime e para a concessão de livramento condicional Existem três sistemas clássicos que disciplinam a progressão de regime de cumprimento da pena privativa de liberdade Pelo sistema da Filadélfia o preso fica isolado em sua cela sem dela sair salvo esporadicamente para passeios em pátios fechados Para o sistema de Auburn por sua vez o condenado em silêncio trabalha durante o dia com outros presos e submetese a isolamento no período noturno Finalmente o sistema inglês ou progressivo baseiase no isolamento do condenado no início do cumprimento da pena privativa de liberdade mas em um segundo momento é autorizado a trabalhar na companhia de outros presos E na última etapa é colocado em liberdade condicional No Brasil o Código Penal e a Lei de Execução Penal adotaram o sistema progressivo ou inglês De fato o art 33 2º do Código Penal diz que as penas privativas de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva E o art 112 da Lei de Execução Penal preceitua que a pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso14 Mas esse sistema não foi integralmente acolhido pois a legislação brasileira lhe impôs algumas modificações Com efeito no regime fechado o condenado fica sujeito a trabalho no período diurno e a isolamento durante o repouso noturno O trabalho será em comum dentro do estabelecimento na conformidade das aptidões ou ocupações anteriores do condenado desde que compatíveis com a execução da pena CP art 34 1º e 2º Em seguida se cumpridos os requisitos legais passa ao regime semiaberto com trabalho em comum durante o período diurno em colônia agrícola industrial ou estabelecimento similar CP art 35 1º É possível o alojamento do condenado em compartimento coletivo LEP art 92 caput Por fim e se novamente satisfeitos os requisitos legais o condenado é transferido ao regime aberto fundado na autodisciplina e no senso de responsabilidade no qual deverá fora do estabelecimento e sem vigilância trabalhar frequentar curso ou exercer outra atividade autorizada permanecendo recolhido durante o período noturno e nos dias de folga CP art 36 caput e 1º A progressão de regime prisional integra a individualização da pena em sua fase executória e destinase ao cumprimento de sua finalidade de prevenção especial mediante a busca da preparação do condenado para a sua reinserção na sociedade Esse benefício depende de dois requisitos cumulativos um objetivo e outro subjetivo previstos no art 112 caput da Lei de Execução Penal O requisito objetivo é o cumprimento de ao menos 16 da pena no regime anterior15 Exemplo A condenado a 12 doze anos de reclusão no regime inicial fechado pode depois de preso por 2 dois anos pleitear a progressão para o regime semiaberto Se a execução da pena foi iniciada no regime fechado para a segunda progressão do regime semiaberto para o aberto deve ser cumprido ao menos 16 do restante da pena pois pena cumprida é pena extinta16 ou seja o percentual já pago ao Estado não pode mais servir como parâmetro para o cálculo do período legalmente exigido Como já decidido pelo Supremo Tribunal Federal a nova progressão no regime de cumprimento da pena se fará ante o critério considerado o percentual de um sexto a incidir sobre os anos que restam a cumprir e não sobre a totalidade resultante do somatório das penas das diversas condenações impostas ao paciente17 O termo inicial para a segunda progressão de regime prisional é a data em que o condenado efetivamente preencheu os requisitos do art 112 da Lei de Execução Penal e não a data em que ele ingressou no regime anterior Para o Superior Tribunal de Justiça A database para subsequente progressão de regime é aquela em que o reeducando preencheu os requisitos do art 112 da Lei de Execução Penal Ambas as Turmas que compõem a Terceira Seção do STJ eram firmes em assinalar que o termo inicial para obtenção de nova progressão pelo apenado era a data do seu efetivo ingresso no regime anterior e não a data da decisão judicial concessiva do benefício ou aquela em que houve o preenchimento dos requisitos do art 112 da LEP No entanto a Quinta Turma recentemente modificou o entendimento sobre o tema e alinhandose à posição adotada pelo Supremo Tribunal Federal passou a considerar como database para concessão de nova progressão aquela em que o apenado preencheu os requisitos do art 112 da LEP O STJ em casos de punição disciplinar determina que a database para nova progressão de regime será contada a partir do dia da falta grave e não do dia em que for publicada decisão que a reconhece judicialmente Na situação de progressão de regime a regra deverá ser a mesma O sistema progressivo da execução penal não pode ser erigido em detrimento do apenado em casos específicos de mora judiciária A teor de julgados do Supremo Tribunal Federal a decisão do Juízo das Execuções que defere a progressão de regime é meramente declaratória e não constitutiva Primeiramente o reeducando preenche os requisitos objetivo e subjetivo e depois pronunciamento judicial reconhece seu direito ao benefício Embora a análise célere do pedido seja o ideal é cediço que a providência jurisdicional não ocorre dessa forma e por vezes pode demorar meses ou anos para ser implementada Por tais motivos o período de permanência no regime mais gravoso por mora do Judiciário em analisar requerimento de progressão ao modo intermediário de cumprimento da pena deverá ser considerado para o cálculo de futuro benefício sob pena de ofensa ao princípio da dignidade do apenado como pessoa humana art 1º III CF e prejuízo ao seu direito de locomoção Assim o entendimento da Sexta Turma alinhase à jurisprudência do Supremo Tribunal Federal para estabelecer como marco para a subsequente progressão a data em que o reeducando preencheu os requisitos legais do art 112 da LEP18 Nas condenações superiores a 30 trinta anos o montante de 16 deve ser calculado sobre o total da pena imposta pois esse limite destinase exclusivamente ao efetivo cumprimento da pena privativa de liberdade Nos termos da Súmula 715 do Supremo Tribunal Federal A pena unificada para atender ao limite de 30 trinta anos de cumprimento determinado pelo art 75 do Código Penal não é considerada para a concessão de outros benefícios como o livramento condicional ou regime mais favorável de execução Assim se alguém foi condenado a 60 sessenta anos de reclusão a progressão somente será possível depois do cumprimento de pelo menos 10 dez anos no regime fechado19 Já o requisito subjetivo é o mérito presente quando o condenado ostentar bom comportamento carcerário LEP art 112 caput Esse requisito deve ser demonstrado pelo condenado no curso da execução para merecer a progressão O mérito nos termos do item 29 da Exposição de Motivos da Lei de Execução Penal é o critério que comanda a execução progressiva É necessário que se reconheça a capacidade provável do condenado de adaptarse ao regime menos rigoroso Nesse contexto o comportamento mau ou sofrível indica normalmente uma inaptidão para o regime mais suave Não deve ser concedida a progressão quando se verificar que o apenado não apresenta condições para se ajustar ao novo regime20 Se foram aplicadas ao condenado cumulativamente penas privativas de liberdade e de multa o inadimplemento voluntário desta impede a progressão de regime prisional em face da ausência do requisito subjetivo legalmente exigido mérito Na dicção do Supremo Tribunal Federal O inadimplemento deliberado da pena de multa cumulativamente aplicada ao sentenciado impede a progressão no regime prisional Essa regra somente é excepcionada pela comprovação da absoluta impossibilidade econômica do apenado em pagar o valor ainda que parceladamente Essa a conclusão do Plenário que por maioria negou provimento a agravo regimental interposto em face de decisão monocrática que indeferira o pedido de progressão de regime prisional tendo em vista o inadimplemento da multa imposta de condenado nos autos da AP 470MG à pena de seis anos e seis meses de reclusão em regime inicial semiaberto bem assim à sanção pecuniária de 330 dias multa pela prática de corrupção passiva e lavagem de dinheiro Alegava se que o prévio pagamento da pena de multa não seria requisito legal para a progressão de regime porquanto inexistente prisão por dívida CF art 5º LXVII bem assim que o art 51 do CP proibiria a conversão da multa em detenção O não recolhimento da multa por condenado que tivesse condições econômicas de pagála sem sacrifício dos recursos indispensáveis ao sustento próprio e de sua família constituiria deliberado descumprimento de decisão judicial e deveria impedir a progressão de regime Além disso admitirse o não pagamento da multa configuraria tratamento privilegiado em relação ao sentenciado que espontaneamente pagasse a sanção pecuniária Ademais a passagem para o regime aberto exigiria do sentenciado autodisciplina e senso de responsabilidade LEP art 114 II a pressupor o cumprimento das decisões judiciais aplicadas a ele Essa interpretação seria reforçada pelo art 36 2º do CP e pelo art 118 1º da LEP que estabelecem a regressão de regime para o condenado que não pagar podendo a multa cumulativamente imposta Assim o deliberado inadimplemento da multa sequer poderia ser comparado à vedada prisão por dívida CF art 5º LXVII configurando apenas óbice à progressão no regime prisional Ressalvou que a exceção admissível ao dever de pagar a multa seria a impossibilidade econômica absoluta de fazêlo Seria cabível a progressão se o sentenciado veraz e comprovadamente demonstrasse sua total insolvabilidade a ponto de impossibilitar até mesmo o pagamento parcelado da quantia devida como autorizado pelo art 50 do CP Ressaltou que o acórdão exequendo fixara o quantum da sanção pecuniária especialmente em função da situação econômica do réu CP art 60 de modo que a relativização dessa resposta penal dependeria de prova robusta por parte do sentenciado No caso entretanto não houvera 33141 mínima comprovação de insolvabilidade incabível portanto a exceção admissível ao dever de pagar a multa21 Progressão especial para mulher gestante ou que for mãe ou responsável por crianças ou pessoas com deficiência O art 112 3º da Lei de Execução Penal incluído pela Lei 137692018 contempla uma modalidade especial de progressão de regime prisional para a mulher gestante e também para a mulher que for mãe ou responsável por crianças22 ou pessoas com deficiência23 A gravidez qualquer que seja seu estágio deve ser provada por exame pericial ultrassonografia ou meio equivalente e diante do silêncio da lei pode ser anterior ou posterior ao início de cumprimento da pena Destarte nada impede que a mulher já presa em virtude de condenação definitiva venha propositalmente a engravidar durante uma visita íntima com a finalidade de ser beneficiada pela progressão especial Por sua vez a comprovação da filiação e da idade do filho é realizada pela certidão de nascimento ou documento similar da criança enquanto a condição de pessoa com deficiência há de ser provada por laudo médico ou outro documento idôneo a exemplo de sentença de interdição civil Se a mulher não for mãe da criança ou da pessoa com deficiência a situação de responsável deve ser interpretada ampliativamente abrangendo a guarda a tutela e a curatela bem como situações informais em que a condenada era a única pessoa que cuidava da criança ou da pessoa com deficiência exemplo vizinha que assumiu os cuidados de criança cujos pais foram assassinados Evidentemente a condenada não terá direito à progressão especial se tiver sido judicialmente decretada sua suspensão ou destituição do poder familiar por qualquer motivo diverso do cumprimento da pena Nada obstante o dispositivo fale impropriamente em crianças ou pessoas com deficiência é evidente que o benefício não depende da maternidade ou responsabilidade plural Basta um filho ou pessoa sob os cuidados da mulher menor de 12 anos ou com deficiência Esta progressão especial depende de requisitos cumulativos objetivos e subjetivos São requisitos objetivos não ter cometido o crime com violência ou grave ameaça a pessoa inc I não ter cometido o crime contra seu filho ou dependente inc II e ter cumprido ao menos 18 um oitavo da pena no regime anterior inc III Os requisitos subjetivos de seu turno consistem em ser primária e ter bom comportamento carcerário comprovado pelo diretor do estabelecimento inc IV e não ter integrado organização criminosa inc V Em relação ao último requisito de natureza subjetiva a lei não impõe limite temporal Destarte se existir prova segura de que a condenada já integrou organização criminosa na forma definida pelo art 1º 1º da Lei 12850201324 ainda que antes ou depois do crime pelo qual está cumprindo a pena privativa de liberdade será incabível a progressão especial O benefício será revogado se a condenada praticar novo crime doloso ou falta grave LEP art 112 4º Tal revogação depende de decisão judicial com respeito à ampla defesa e não exclui a regressão a qualquer dos regimes mais rigorosos com fundamento no art 118 inc I da Lei de Execução Penal A Lei 137692018 em seu propósito de conferir tratamento diferenciado às condenadas gestantes ou mães ou responsáveis por crianças ou pessoas com deficiência estendeu a progressão especial inclusive aos crimes hediondos e equiparados Com efeito em tais casos a progressão de regime será possível com o cumprimento de apenas 18 um oitavo da pena privativa de liberdade no regime anterior e não de 25 da pena se primária ou de 35 se reincidente É o que se extrai do art 2º 2º da Lei 80721990 A progressão de regime no caso dos condenados pelos crimes previstos neste artigo darseá após o cumprimento de 25 dois quintos da pena se o apenado for primário e de 35 três quintos se reincidente observado o disposto nos 3º e 4º do art 112 da Lei nº 7210 de 11 de julho de 1984 33142 33143 Lei de Execução Penal Proibição da progressão por saltos O sistema progressivo acolhido pelo direito brasileiro é incompatível com a progressão por saltos consistente na passagem direta do regime fechado para o aberto Não se pode pular o estágio no regime semiaberto em atenção à necessidade de recuperação gradativa do condenado para retorno à sociedade Como bem acentua o item 120 da Exposição de Motivos da Lei de Execução Penal Se o condenado estiver no regime fechado não poderá ser transferido diretamente para o regime aberto Esta progressão depende do cumprimento mínimo de um sexto da pena no regime semiaberto além da demonstração do mérito compreendido tal vocábulo como aptidão capacidade e merecimento demonstrados no curso da execução25 Para afastar qualquer controvérsia acerca do assunto o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula 491 É inadmissível a chamada progressão per saltum de regime prisional Somente se admite essa passagem direta em hipóteses teratológicas tais como quando o condenado depois de já ter cumprido 16 da pena no regime fechado e conseguido progressão para o regime semiaberto não obtém vaga nesse regime permanecendo mais 16 no regime fechado Será possível então por ineficiência do Estado o salto para o regime aberto Progressão e crimes contra a Administração Pública Nos crimes contra a Administração Pública a progressão está condicionada além do cumprimento de 16 da pena no regime anterior e do mérito do condenado a um requisito específico consistente na reparação do dano causado ou na devolução do produto do ilícito praticado com os acréscimos legais É o que consta do art 33 4º do Código Penal Este dispositivo é constitucional e não se constitui em prisão civil por dívida Além disso destinase a atuar como instrumento eficaz para a prevenção de novos delitos envolvendo a apropriação de bens públicos Na 33144 ótica do Supremo Tribunal Federal É constitucional o 4º do art 33 do CP que condiciona a progressão de regime de cumprimento da pena de condenado por crime contra a administração pública à reparação do dano que causou ou à devolução do produto do ilícito praticado facultado o parcelamento da dívida Com base nessa orientação o Plenário por maioria negou provimento a agravo regimental interposto em face de decisão que indeferira pedido de progressão de regime a condenado nos autos da AP 470MG DJe de 2242013 pela prática dos crimes de peculato e corrupção passiva Quanto à alegada inconstitucionalidade do referido dispositivo legal a Corte destacou que em matéria de crimes contra a administração pública como também nos crimes de colarinho branco em geral a parte verdadeiramente severa da pena a ser executada com rigor haveria de ser a de natureza pecuniária Esta sim teria o poder de funcionar como real fator de prevenção capaz de inibir a prática de crimes que envolvessem apropriação de recursos públicos Por outro lado a imposição da devolução do produto do crime não constituiria sanção adicional mas apenas a devolução daquilo que fora indevidamente apropriado ou desviado Ademais não seria o direito fundamental à liberdade do condenado que estaria em questão mas tão somente se a pena privativa de liberdade a ser cumprida deveria se dar em regime mais favorável ou não o que afastaria a alegação quanto à suposta ocorrência no caso de prisão por dívida Outrossim a norma em comento não seria a única prevista na legislação penal a ter na reparação do dano uma importante medida de política criminal Ao contrário bastaria uma rápida leitura dos principais diplomas penais brasileiros para constatar que a falta de reparação do dano a pode ser causa de revogação obrigatória do sursis b impede a extinção da punibilidade ou mesmo a redução da pena em determinadas hipóteses c pode acarretar o indeferimento do livramento condicional e do indulto d afasta a atenuante genérica do art 65 III b do CP entre outros26 Progressão e crimes hediondos ou equiparados Na redação original da Lei 80721990 Lei dos Crimes Hediondos o seu art 2º 1º dispunha que a pena privativa de liberdade imposta pela prática de qualquer crime hediondo ou equiparado tráfico de drogas tortura e terrorismo deveria ser cumprida em regime integralmente fechado Tratava se portanto de exceção legal ao sistema progressivo pois o condenado iniciava e encerrava o cumprimento da pena privativa de liberdade no regime fechado sem possibilidade de passagem para regime mais brando Muito se discutiu sobre eventual inconstitucionalidade desse dispositivo E com a edição da Lei 94551997 definindo os crimes de tortura acentuou se o debate em razão de estatuir o seu art 1º 7º que o condenado por crime nela previsto iniciará o cumprimento da pena em regime fechado Efetuouse uma clara distinção A pena privativa de liberdade obrigatoriamente deveria ser executada inicialmente no regime fechado mas era possível a progressão Reforçouse o argumento da inconstitucionalidade da proibição de progressão nos crimes hediondos no tráfico de drogas e no terrorismo pois se a todos esses crimes incluindose a tortura a Constituição Federal determinou igual tratamento art 5º XLIII o legislador ordinário não poderia estabelecer distinção O Supremo Tribunal Federal então encerrou o conflito editando a Súmula 698 Não se estende aos demais crimes hediondos a admissibilidade de progressão no regime de execução da pena aplicada ao crime de tortura Fundamentou essa posição no princípio da especialidade o crime de tortura gozava de regra específica progressão e aos crimes hediondos ao tráfico de drogas e ao terrorismo incidia a regra geral regime integralmente fechado Mas no dia 20 de março de 2006 no julgamento do HC 82959SP rel Min Marco Aurélio o Supremo Tribunal Federal alterou o seu entendimento e declarou a inconstitucionalidade da regra então prevista no art 2º 1º da Lei 80721990 que ao instituir um regimepadrão violava o princípio constitucional da individualização da pena Criouse destarte um impasse Com efeito se o regime integralmente fechado para crimes hediondos e equiparados era inconstitucional os condenados por tais delitos teriam direito à progressão desde que respeitados os requisitos exigidos pelo art 112 caput da Lei de Execução Penal cumprimento de ao menos 16 da pena no regime anterior e mérito Mas então o que tais crimes teriam de hediondos se estavam na mesma vala dos crimes comuns De fato a Constituição Federal estabeleceu nitidamente dois polos distintos De um lado no art 98 I determinou aos entes federativos a criação de juizados especiais competentes para a conciliação o julgamento e a execução de infrações penais de menor potencial ofensivo mediante os procedimentos oral e sumaríssimo permitidos nas hipóteses previstas em lei a transação e o julgamento de recursos por turmas de juízes de primeiro grau no polo oposto o art 5º XLIII previu os crimes hediondos e equiparados inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia Em suma em um extremo a Lei Suprema dispensou tratamento amplamente favorável ao réu buscando impedir a aplicação da pena privativa de liberdade nos moldes da Lei 90991995 Já no extremo oposto a Constituição Federal exigiu tratamento mais rigoroso aos condenados por crimes hediondos e equiparados O que restar entre esses extremos encaixase na criminalidade comum E aí estava o problema O regime integralmente fechado foi declarado inconstitucional e consequentemente inaplicável Restava pois dispensar aos crimes hediondos e assemelhados o tratamento reservado aos crimes comuns o que era inaceitável por contrariar o espírito da Constituição Federal Felizmente o legislador agiu com celeridade e em 29 de março de 2007 entrou em vigor a Lei 114642007 alterando a redação do art 2º 1º da Lei 80721990 para estabelecer que a pena por crime hediondo ou equiparado será cumprida inicialmente em regime fechado Desapareceu o regime integralmente fechado entrando em seu lugar o regime inicialmente fechado é dizer a pena privativa de liberdade começa obrigatoriamente no regime fechado mas é possível a progressão ao semiaberto e posteriormente ao aberto E em seguida dispôs o seu 2º que a progressão darseá após o cumprimento de 25 dois quintos da pena se o apenado for primário e de 35 três quintos se reincidente qualquer que seja a modalidade da recidiva genérica ou específica27 O requisito objetivo de natureza temporal é diferente e mais severo do que o previsto na Lei de Execução Penal em atenção à sistemática instituída pela Constituição Federal Não dispensa todavia o requisito subjetivo mérito do condenado28 Importante destacar entretanto que essa nova regra aparentemente benéfica ao condenado foi considerada mais gravosa pela jurisprudência Nada obstante a decisão do Supremo Tribunal Federal tenha sido proferida em sede de controle difuso de constitucionalidade com eficácia inter partes é pacífico atualmente o entendimento de que a progressão com 25 ou 35 da pena tem aplicação unicamente aos crimes hediondos ou equiparados cometidos a partir do dia 29 de março de 2007 data da entrada em vigor da Lei 114642007 Para os delitos anteriores a progressão obedece ao requisito temporal de cumprimento de 16 da pena com fulcro no art 112 caput da Lei de Execução Penal Justificase essa posição com o seguinte raciocínio o art 2º 1º da Lei 80721990 em sua redação original foi declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal Logo como não havia outra regra para disciplinar a progressão os crimes anteriores à vigência da Lei 114642007 seguem a sistemática da Lei de Execução Penal bastando o cumprimento de 16 da pena e o mérito do condenado Como decidido pelo Supremo Tribunal Federal Asseverouse que o reconhecimento da inconstitucionalidade do óbice à progressão de regime contido na redação original do 1º do art 2º da Lei 80721990 impediria que esse dispositivo legal fosse utilizado como parâmetro de comparação para o exame da norma penal aplicável ao caso Assim afirmouse que essa verificação deveria ocorrer a partir da apreciação das demais normas validamente existentes no ordenamento jurídico e que tiveram vigência desde a prática do fato pelo qual o paciente fora condenado a saber a LEP e a Lei 114642007 que entrou em vigor posteriormente em 29032007 Aduziuse entretanto que esta última no ponto em que disciplinou a progressão de regime estabeleceu lapsos temporais mais gravosos do que os anteriormente fixados na LEP constituindose pois verdadeira novatio legis in pejus Concluiuse nesse sentido que se o fato ocorreu antes de 29032007 como na espécie incidem as regras previstas na LEP exigindose para a progressão o cumprimento de ao menos 16 da pena LEP art 11229 Com o propósito de afastar qualquer embate doutrinário ou jurisprudencial sobre o assunto o Supremo Tribunal Federal editou a Súmula Vinculante 26 cuja redação é a seguinte Para efeito de progressão de regime no cumprimento de pena por crime hediondo ou equiparado o juízo da execução observará a inconstitucionalidade do art 2º da Lei n 8072 de 25 de julho de 1990 sem prejuízo de avaliar se o condenado preenche ou não os requisitos objetivos e subjetivos do benefício podendo determinar para tal fim de modo fundamentado a realização de exame criminológico Igual raciocínio encontrase estampado na Súmula 471 do Superior Tribunal de Justiça Os condenados por crimes hediondos ou assemelhados cometidos antes da vigência da Lei n 114642007 sujeitamse ao disposto no art 112 da Lei n 72101984 Lei de Execução Penal para a progressão de regime prisional Finalmente é importante destacar que no julgamento do HC 111840ES o Plenário do Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade do art 2º 1º da Lei 80721990 por ofensa ao princípio da individualização da pena CF art 5º XLVI Em síntese o regime inicialmente fechado para o cumprimento da pena privativa de liberdade nos crimes hediondos e equiparados foi reputado inconstitucional razão pela qual o magistrado tem 33145 liberdade para estabelecer no caso concreto o regime prisional adequado levando em conta os dados do agente e do fato criminoso Requisito temporal para progressão em caso de execução conjunta por crime hediondo e crime comum Em face dos requisitos temporais diversos 25 ou 35 da pena para crimes hediondos ou equiparados e 16 da pena para crimes comuns a progressão de regime prisional em execução conjunta de penas impostas pela prática de crime hediondo ou equiparado e crime comum obedece a uma sistemática específica Para possibilitar a progressão é preciso calcular no tocante ao delito hediondo ou equiparado os 25 para primários ou 35 para reincidentes para somandose ao restante da pena imposta aferir se já foi cumprido 16 do total A conta é simples deve ter sido cumprido 25 primário ou 35 reincidente no tocante ao crime hediondo ou equiparado e 16 do total da pena relativamente ao delito comum Exemplo A primário foi condenado a 12 doze anos de reclusão por um homicídio qualificado hediondo e a mais 6 seis anos por um roubo totalizando a pena de 18 dezoito anos Depois de 5 cinco anos de prisão pleiteia a progressão que será possível se comprovado o mérito pois terá cumprido mais de 25 da pena do crime hediondo e mais de 16 da pena total 33146 A decisão será sempre motivada e procedida de manifestação do Ministério Público e do defensor art 112 1º da LEP Progressão e nova condenação A superveniência de condenação criminal impede a progressão de regime prisional ainda que já deferida pelo juízo da execução quando a nova pena tiver que ser cumprida em regime mais rigoroso Exemplificativamente se ao condenado já havia sido concedida a transferência para o regime semiaberto mas surgiu nova pena a ser cumprida no regime fechado estará inviabilizada a progressão Na linha da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal A unificação de penas decorrente de condenação transitada em julgado durante o cumprimento de reprimenda atinente a outro crime altera a database para a obtenção de benefícios executórios e progressão de regime a qual passa a ser contada a partir da soma da nova condenação e tem por parâmetro o restante de pena a ser cumprido30 Entretanto é preciso destacar o entendimento do Superior Tribunal de Justiça acerca da inadmissibilidade por falta de previsão legal de alteração da database para a concessão de benefícios durante a execução penal inclusive a progressão de regime prisional em face da superveniência do trânsito em julgado de sentença condenatória A alteração da database para concessão de novos benefícios executórios em razão da unificação das penas não encontra respaldo legal As Turmas que compõem a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça em consonância com a compreensão do Supremo Tribunal Federal acerca do tema possuíam o entendimento pacificado de que sobrevindo condenação definitiva ao apenado por fato anterior ou posterior ao início da execução penal a contagem do prazo para concessão de futuros benefícios seria interrompida de modo que o novo cálculo realizado com base no somatório das penas teria como termo a quo a data do trânsito em julgado da última sentença condenatória Entretanto da leitura dos artigos 111 parágrafo único e 118 II da Lei de Execução Penal invocados para sustentar o posicionamento mencionado apenas se conclui que diante da superveniência do trânsito em julgado de sentença condenatória caso o quantum de pena obtido após o somatório não permita a preservação do regime atual de cumprimento da pena o novo regime será então determinado por meio do resultado da soma de forma que estará o sentenciado sujeito à regressão Assim sequer a regressão de regime é consectário necessário da unificação das penas porquanto será forçosa a regressão de regime somente quando a pena da nova execução somada à reprimenda ainda não cumprida torne incabível o 33147 regime atualmente imposto Portanto da leitura dos artigos supra não se infere que efetuada a soma das reprimendas impostas ao sentenciado é mister a alteração da database para concessão de novos benefícios Por conseguinte deduzse que a alteração do termo a quo referente à concessão de novos benefícios no bojo da execução da pena constitui afronta ao princípio da legalidade e ofensa à individualização da pena motivo pelo qual se faz necessária a preservação do marco interruptivo anterior à unificação das penas31 Processamento do pedido de progressão O pedido de progressão é endereçado ao juízo da Vara das Execuções Penais E consoante o art 112 1º da Lei de Execução Penal a decisão será sempre motivada e precedida de manifestação do Ministério Público e do defensor Entretanto a questão a ser enfrentada é a seguinte Se a progressão depende além do cumprimento de determinado percentual da pena também do mérito do condenado esse procedimento é suficiente para a comprovação do requisito subjetivo De acordo com o art 112 caput da Lei de Execução Penal com redação dada pela Lei 107922003 o mérito é constatado pelo diretor do estabelecimento Sua prova é feita por simples atestado de boa conduta carcerária emitido pelo diretor do estabelecimento prisional Essa alteração legislativa porém é alvo de diversas críticas Vejamos A Lei 107922003 em vigor desde o dia 2 de dezembro de 2003 foi editada com o propósito de aperfeiçoar a execução penal mediante a criação do Regime Disciplinar Diferenciado para combater o crime organizado e tolher sua atuação no interior dos estabelecimentos prisionais bem como para restringir a participação da Comissão Técnica de Classificação na progressão de regimes Essa última parte é a que ora nos interessa De fato antes da entrada em vigor da Lei 107922003 estabelecia o art 112 parágrafo único da Lei de Execução Penal A decisão será motivada e precedida de parecer da Comissão Técnica de Classificação e do exame criminológico quando necessário E o art 6º da LEP atribui à Comissão Técnica de Classificação a tarefa de elaborar o programa individualizador da pena privativa de liberdade adequada ao condenado ou preso provisório Nítida portanto a diferença antes da entrada em vigor da Lei 107922003 exigiase a elaboração de parecer da Comissão Técnica de Classificação e quando necessário exame criminológico para a demonstração do mérito Agora basta a comprovação do mérito pelo diretor do estabelecimento e decisão motivada do juiz da execução depois da manifestação do Ministério Público e do defensor O Ministério Público deve necessariamente manifestarse acerca da progressão sob pena de nulidade por ser sua função a fiscalização da execução da pena A maior falha da Lei 107922003 foi transferir a prova do mérito ao diretor do estabelecimento prisional pois em diversas ocasiões especialmente em crimes de elevada gravidade o atestado de boa conduta carcerária é insuficiente para assegurar o preparo do condenado para ingressar em regime mais brando Por esse motivo firmouse o entendimento no sentido de que nada obstante a atual redação do art 112 1º da Lei de Execução Penal não mais reclame o exame criminológico para a progressão pode ser ele realizado por 33148 33149 determinação judicial quando for considerado necessário pelo magistrado em razão das peculiaridades do caso concreto Para espancar qualquer controvérsia foi editada pelo Superior Tribunal de Justiça a Súmula 439 Admitese o exame criminológico pelas peculiaridades do caso desde que em decisão motivada32 Porém se o exame criminológico for realizado sua conclusão não vincula o juízo da execução que pode livremente decidir em sentido contrário desde que fundamentadamente É o que se extrai relativamente às perícias em geral da simples leitura do art 182 do Código de Processo Penal O juiz não ficará adstrito ao laudo podendo aceitálo ou rejeitálo no todo ou em parte Progressão e prática de falta grave A contagem do tempo para progressão de regime prisional é zerada se o preso comete falta grave ou seja deve reiniciarse novo prazo para a contagem do benefício da progressão do regime prisional uma vez que exclui o mérito legalmente exigido para a passagem ao regime mais brando33 Destarte o condenado precisa cumprir no mínimo mais 16 crime comum ou ao menos mais 25 ou 35 da pena imposta crime hediondo ou equiparado dependendo da condição de primário ou de reincidente iniciandose o prazo a partir da falta grave pois seu cometimento interrompe o prazo anterior É o que consta da Súmula 534 do Superior Tribunal de Justiça A prática de falta grave interrompe a contagem do prazo para a progressão de regime de cumprimento de pena o qual se reinicia a partir do cometimento dessa infração Contudo a contagem do novo período aquisitivo do requisito objetivo quantidade da pena a ser cumprida deverá incidir sobre o remanescente da pena e não sobre a totalidade dela34 Progressão e Em face da necessidade de produção de provas para aferição do requisito subjetivo mérito do condenado não é possível postular a progressão de regime prisional por meio da via célere e estreita do habeas corpus 331410 331411 331412 Progressão e vinculação com o crime organizado Não é possível a progressão por ausência do requisito subjetivo mérito quando existentes fundadas suspeitas consubstanciadas em relato da autoridade policial dando conta que o condenado comanda organização criminosa do interior do estabelecimento penal35 Progressão de regime prisional condenado estrangeiro e processo de expulsão em trâmite É possível a progressão de regime prisional para cumprimento de pena privativa de liberdade imposta a estrangeiro que responde a processo de expulsão do território nacional pela prática de crime comum em face da regra contida no art 54 3º da Lei 134452017 Lei de Migração Art 54 A expulsão consiste em medida administrativa de retirada compulsória de migrante ou visitante do território nacional conjugada com o impedimento de reingresso por prazo determinado 3º O processamento da expulsão em caso de crime comum não prejudicará a progressão de regime o cumprimento da pena a suspensão condicional do processo a comutação da pena ou a concessão de pena alternativa de indulto coletivo ou individual de anistia ou de quaisquer benefícios concedidos em igualdade de condições ao nacional brasileiro Progressão de regime e prisão em unidade militar O benefício da progressão de regime prisional é aplicável aos militares independentemente do local de cumprimento da pena privativa de liberdade Cuidase na verdade de manifestação do princípio da individualização da pena direito fundamental assegurado a todas as pessoas pelo art 5º XLVI da Constituição Federal como já decidido pelo Supremo Tribunal Federal Em conclusão a 2ª Turma deferiu em parte habeas corpus para assegurar a militar progressão de regime para o semiaberto em igualdade de condições com os civis Aduziuse que o princípio ou a garantia da individualização da pena seria um direito fundamental uma 331413 331414 situação jurídica subjetiva do indivíduo militar ou civil e que ante a omissão ou falta de previsão da lei castrense seriam aplicáveis a LEP e o CP que conjugadamente dispõem à saciedade sobre o regime de progressão de pena36 Progressão de regime colaboração premiada e Lei do Crime Organizado Na hipótese de colaboração premiada posterior à sentença condenatória com trânsito em julgado o art 4º 5º da Lei 128502013 Lei do Crime Organizado autoriza a progressão de regime prisional mesmo se ausente o requisito objetivo ou seja ainda que o condenado não tenha efetuado o cumprimento de parte da pena legalmente exigido 16 para os crimes em geral ou então 25 ou 35 na hipótese de crimes hediondos ou equiparados O requisito subjetivo consistente no mérito do condenado não é dispensado embora muitas vezes esta circunstância reste evidenciada pela própria colaboração Progressão de regime e cumprimento da pena em penitenciária federal de segurança máxima O cumprimento da pena em penitenciária federal de segurança máxima obsta a progressão de regime prisional em face da ausência do requisito subjetivo mérito legalmente exigido notadamente quando o condenado integra alguma organização criminosa Para o Supremo Tribunal Federal O cumprimento de pena em penitenciária federal de segurança máxima por motivo de segurança pública não é compatível com a progressão de regime prisional Com base nesse entendimento a Segunda Turma por maioria não conheceu de habeas corpus em que se discutia a possibilidade da concessão do benefício em face de seu deferimento por juiz federal sem que houvesse a impugnação da decisão pela via recursal No caso o juízo da execução penal suscitou conflito de competência ao ser comunicado de que a benesse da progressão de regime fora concedida ao paciente O Superior Tribunal de Justiça STJ ao resolver o conflito cassou a progressão A Segunda Turma afirmou que a 331415 transferência do apenado para o sistema federal tem em regra como fundamento razões que atestam que naquele momento o condenado não tem mérito para progredir de regime Observou que a transferência seria cabível no interesse da segurança pública ou do próprio preso Lei 116712008 art 3º Frisou que o paciente seria líder de organização criminosa Ademais mesmo sem cometer infrações disciplinares o preso que pertencesse à associação criminosa não satisfaria aos requisitos subjetivos para a progressão de regime A pertinência à sociedade criminosa seria crime e também circunstância reveladora da falta de condições de progredir a regime prisional mais brando A Segunda Turma ainda registrou que a manutenção do condenado em regime fechado com base na falta de mérito do apenado não seria incompatível com a jurisprudência do STF37 Progressão de regime custódia cautelar e termo inicial Na hipótese de custódia cautelar ou seja se o acusado foi preso preventivamente e nessa condição respondeu à ação penal o termo inicial para contagem do percentual de cumprimento da pena necessário para progressão de regime prisional 16 nos crimes comuns e 25 ou 35 nos delitos hediondos e equiparados é a data do cumprimento do mandado de prisão preventiva e não a data da publicação da sentença condenatória Na linha da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal A Primeira Turma deu provimento a recurso ordinário em habeas corpus em que discutido o marco inicial para fins de obtenção de progressão de regime No caso o recorrente foi preso cautelarmente por força de mandado de prisão preventiva mas foi fixada como termo inicial para a obtenção do benefício da progressão a data da publicação da sentença condenatória A Turma entendeu que a custódia cautelar necessariamente deve ser computada para fins de obtenção de progressão de regime e demais benefícios executórios desde que não ocorra condenação posterior apta a configurar falta grave Partindose da premissa de que diante da execução de uma única condenação o legislador não impôs qualquer requisito adicional impende considerar a data da prisão preventiva como marco inicial para a obtenção de benefícios em sede de execução penal38 É a transferência do condenado para regime prisional mais severo do que aquele em que se encontra É o que se dá exemplificativamente quando o preso estava no regime semiaberto e é removido para o regime fechado As hipóteses em que se autoriza a regressão constam do art 118 I e II e 1º da Lei de Execução Penal Passemos à análise de cada uma delas a Prática de fato definido como crime doloso ou falta grave art 118 I A relação de faltas graves inerentes à pena privativa de liberdade está prevista no art 50 caput da Lei de Execução Penal em rol taxativo incompatível com a interpretação extensiva39 Art 50 Comete falta grave o condenado à pena privativa de liberdade que I incitar ou participar de movimento para subverter a ordem ou a disciplina II fugir40 III possuir indevidamente instrumento capaz de ofender a integridade física de outrem IV provocar acidente de trabalho V descumprir no regime aberto as condições impostas VI inobservar os deveres previstos nos incisos II e V do art 39 desta Lei41 VII tiver em sua posse utilizar ou fornecer aparelho telefônico de rádio ou similar que permita a comunicação com outros presos ou com o ambiente externo Praticada a falta grave deverá ser instaurado o procedimento para sua apuração conforme o regulamento do estabelecimento prisional assegurado o direito de defesa nele inserida a prévia oitiva do condenado Como dispõe a Súmula 533 do Superior Tribunal de Justiça Para o reconhecimento da prática de falta disciplinar no âmbito da execução penal é imprescindível a instauração de procedimento administrativo pelo diretor do estabelecimento prisional assegurado o direito de defesa a ser realizado por advogado constituído ou defensor público nomeado42 E será motivada a decisão do responsável pelo local em que é cumprida a pena LEP arts 59 e 118 2º No que concerne ao crime doloso basta a sua prática para autorizarse a regressão não se reclamando a existência de condenação definitiva Aliás a prática de crime doloso constitui por si só falta grave LEP art 52 caput Esta também é a orientação consagrada na Súmula 526 do Superior Tribunal de Justiça O reconhecimento de falta grave decorrente do cometimento de fato definido como crime doloso no cumprimento da pena prescinde do trânsito em julgado de sentença penal condenatória no processo penal instaurado para apuração do fato43 Em respeito à ampla defesa constitucionalmente assegurada deve ser ouvido o condenado previamente à decisão judicial LEP art 118 2º Nessas duas hipóteses prática de fato definida como crime doloso e falta grave é importante destacar exigese a instauração de procedimento administrativo disciplinar a ser acompanhado por defensor para aferir a necessidade de regressão do condenado para regime prisional mais gravoso em homenagem aos princípios constitucionais do devido processo legal do contraditório e da ampla defesa CF art 5º LIV e LV Com efeito não incide a Súmula Vinculante 5 do Supremo Tribunal Federal aplicável somente aos procedimentos de natureza extrapenal Como já se decidiu Asseverouse que não obstante a aprovação do texto da Súmula Vinculante 5 A falta de defesa técnica por advogado no processo administrativo disciplinar não ofende a Constituição tal verbete seria aplicável apenas em procedimentos de natureza cível e não em procedimento administrativo disciplinar promovido para averiguar o cometimento de falta grave tendo em vista estar em jogo a liberdade de ir e vir Assim neste caso asseverouse que o princípio do contraditório deve ser observado amplamente com a presença de advogado constituído ou defensor público nomeado impondo serlhe apresentada defesa em obediência às regras específicas contidas na Lei de Execução Penal no Código de Processo Penal e na Constituição44 Em face da vedação de analogia in malam partem no Direito Penal o cometimento de crime culposo ou de contravenção penal não permite a regressão de regime prisional b Sofrer condenação por crime anterior cuja pena somada ao restante da pena em execução torne incabível o regime art 118 II Esse dispositivo resulta do teor do art 111 parágrafo único da Lei de Execução Penal Sobrevindo condenação no curso da execução somarseá a pena ao restante da que está sendo cumprida para determinação do regime Imaginese um réu que condenado a 6 seis anos de reclusão iniciou o cumprimento da pena no regime semiaberto e logo em seguida a ele sobreveio em razão de outro crime condenação a nova pena de 4 quatro anos de reclusão Em face do total da pena resultante da soma 10 anos será obrigatória a regressão para o regime fechado Nessa situação a regressão independe da prévia oitiva do condenado pois nada de útil poderia ele apresentar em sua defesa Com efeito já foi condenado por sentença transitada em julgado fruto de ação penal em que se respeitou o devido processo legal e lhe foram asseguradas a ampla defesa e o contraditório Não poderia agora pois alterar a coisa julgada c O condenado será transferido do regime aberto se além das hipóteses referidas nos incisos anteriores frustrar os fins da execução ou não pagar podendo a multa cumulativamente imposta art 118 1º Extraise rapidamente uma importante conclusão os incisos I e II do art 118 da Lei de Execução Penal são aplicáveis às penas privativas de liberdade cumpridas em qualquer regime fechado semiaberto ou aberto enquanto o seu 1º tem incidência exclusivamente ao regime aberto Em primeiro lugar é possível a regressão quando o condenado frustrar os fins da execução O condenado assume conduta indicativa de sua incompatibilidade com o regime aberto calcado na autodisciplina e no senso de responsabilidade CP art 36 caput Exemplo condenado que abandona 33151 33152 injustificadamente seu trabalho Permitese ainda a regressão quando o condenado não pagar podendo a multa cumulativamente imposta Essa hipótese somente é possível quando foi aplicada pena pecuniária simultaneamente com a pena privativa de liberdade É imprescindível comprovar a solvência do condenado compreendida como a capacidade para quitar de uma só vez ou mediante parcelas a pena de multa sem privarse dos recursos indispensáveis ao sustento do condenado e de sua família CP art 50 2º Existem entretanto vozes que alegam ter sido revogada tacitamente essa parte do dispositivo pela Lei 92681996 que ao alterar o art 51 do Código Penal vedou a conversão da pena de multa para pena privativa de liberdade motivo pelo qual a sua inadimplência também não poderia ensejar restrições à liberdade do condenado Em qualquer desses casos exigese previamente à regressão a oitiva do condenado LEP art 118 2º Para o Supremo Tribunal Federal se a progressão de regime foi condicionada ao pagamento da pena de multa e para obter esse direito o condenado parcelou o valor devido mas posteriormente não honrou o acordo celebrado o inadimplemento injustificado das parcelas atinentes à sanção pecuniária autoriza a regressão de regime prisional45 Regressão por saltos É possível a regressão por saltos isto é a passagem direta do regime aberto para o fechado uma vez que o art 118 caput da Lei de Execução Penal referese à transferência para qualquer dos regimes mais rigorosos Regressão a regime mais grave do que o fixado na sentença condenatória A sentença condenatória no âmbito penal transita em julgado com a cláusula rebus sic stantibus Logo a mudança da situação de fato no curso da execução comparativamente ao substrato fático existente no início impõe ao juiz da execução a adoção de medidas necessárias de modo a adaptar a decisão à nova realidade 33153 Entendese portanto que nos termos do art 33 caput do Código Penal A pena de reclusão deve ser cumprida em regime fechado semiaberto ou aberto A de detenção em regime semiaberto ou aberto salvo necessidade de transferência a regime fechado se em matéria de condenação e execução da pena de detenção revelase possível a regressão para o regime fechado esse raciocínio com maior razão deve ser seguido nas hipóteses de condenação e execução de pena de reclusão Dessa forma a regra do art 118 I da Lei de Execução Penal A execução da pena privativa de liberdade ficará sujeita à forma regressiva com a transferência para qualquer dos regimes mais rigorosos quando o condenado I praticar fato definido como crime doloso ou falta grave não é obstáculo à alteração do regime de cumprimento de pena privativa de liberdade para regime mais gravoso do que aquele fixado na sentença condenatória desde que verificado algum dos pressupostos lá previstos46 Regressão cautelar Nada obstante a omissão legislativa acerca do assunto desponta como possível a regressão cautelar isto é a suspensão judicial do regime semiaberto ou aberto até que em obediência ao art 118 2º da Lei de Execução Penal o condenado seja ouvido e possa defenderse acerca do descumprimento das condições do regime Esta suspensão cautelar acarreta no recolhimento do condenado ao regime fechado até decisão judicial definitiva Se as suas explicações forem idôneas o magistrado restabelecerá o regime prisional anterior em caso contrário a regressão será convertida em definitiva47 Execução provisória ou antecipada é o cumprimento da pena antes do trânsito em julgado da condenação Não há pena definitiva Na história do direito penal brasileiro sempre foram diferenciadas duas situações a execução provisória de réu preso e b a execução provisória de réu solto Vejamos cada uma delas separadamente 33161 Execução provisória de réu preso Se o acusado foi condenado em 1ª instância ou pelo Tribunal e encontra se preso preventivamente admitese a execução antecipada da pena Esse instituto é benéfico ao réu pois lhe permite pleitear a progressão de regime prisional e outros benefícios antes do trânsito em julgado da decisão judicial proferida em seu desfavor A execução provisória tem como pressuposto inafastável o trânsito em julgado para a acusação em relação à pena aplicada Com efeito pode ocorrer de o Ministério Público ou o querelante ter interposto recurso contra parte da sentença condenatória diversa da pena imposta regime prisional substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos ou concessão de sursis etc Também é cabível quando a pena tiver sido fixada no patamar máximo legalmente previsto Nesses casos a pena determinada na decisão contra a qual a defesa recorreu não poderá ser aumentada seja em face da proibição da reformatio in pejus CPP art 617 seja pelo fato de já ter sido aplicada no limite máximo cominado Portanto a situação do réu não poderá ser agravada no julgamento do recurso será ele favorecido ou na pior das hipóteses sua posição processual ficará como já estava Vejamos um exemplo A foi preso em flagrante pela prática de roubo em concurso de pessoas CP art 157 2º II e nessa situação permaneceu durante a ação penal Depois de um ano foi proferida sentença resultando em sua condenação à pena de 6 seis anos de reclusão em regime inicialmente fechado O Ministério Público intimado da sentença não recorreu enquanto a defesa interpôs apelação postulando a absolvição Anotese A já está preso há um ano isto é já cumpriu 16 da pena imposta CP art 42 Está presente portanto o requisito objetivo da progressão Se comprovado o seu mérito poderá progredir desde já para o regime semiaberto sendo desnecessário aguardar para essa finalidade o trânsito em julgado da condenação Por outro lado se a acusação tiver recorrido postulando a majoração da reprimenda será inviável a execução provisória pois a pena poderá ser aumentada no julgamento do seu recurso Essa medida é extremamente favorável ao réu pois ressaltese se for absolvido em grau recursal não terá sofrido prejuízo algum Pelo contrário uma vez que já estará no regime semiaberto ou quiçá no aberto ao passo que para os que refutam a execução provisória teria ele aguardado o deslinde do recurso em posição mais gravosa no tocante à privação de sua liberdade E se for negado provimento ao recurso já terá deixado para trás a parte mais severa do cumprimento da pena privativa de liberdade Aqueles que não admitem a execução provisória buscam amparo no princípio da presunção de não culpabilidade CF art 5º LVII alegando que se o acusado deve ser tratado como inocente até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória não se poderia executar previamente a pena Essa posição entretanto é contraditória e insustentável pois utiliza um direito fundamental justamente para prejudicar o réu e não para protegêlo da atuação estatal O juízo da execução é competente para a execução provisória como se extrai dos arts 2º e seu parágrafo único 65 e 66 da Lei de Execução Penal Destarte após a condenação e desde que presente o trânsito em julgado para a acusação ou se a pena tiver sido fixada no máximo legal o juiz da ação penal expede guia de recolhimento provisório encaminhandoa à vara das execuções penais48 Além da doutrina e da jurisprudência que se posicionam majoritariamente em direção favorável à execução provisória o ordenamento jurídico também lhe fornece suficiente embasamento De fato o art 2º parágrafo único da Lei de Execução Penal dispõe serem as suas disposições aplicáveis ao preso provisório Nesse sentido uma das regras da LEP é a progressão Se é aplicável ao preso provisório a figura da progressão desponta como correto falarse em execução provisória Em igual sentido o Supremo Tribunal Federal criou a Súmula 716 Admitese a progressão de regime de cumprimento da pena ou a aplicação imediata de regime menos severo nela determinada antes do trânsito em julgado da sentença condenatória Se não bastasse o Conselho Nacional de Justiça editou a Resolução 33162 331621 1132010 cujo art 8º admite expressamente a execução provisória Tratandose de réu preso por sentença condenatória recorrível será expedida guia de recolhimento provisória da pena privativa de liberdade ainda que pendente recurso sem efeito suspensivo devendo nesse caso o juízo da execução definir o agendamento dos benefícios cabíveis Execução provisória de réu solto No plano histórico a execução provisória ou antecipada da pena imposta a réu solto sempre foi admitida no direito brasileiro inclusive após a vigência da Constituição Federal de 1988 Esse entendimento foi alterado no dia 5 de fevereiro de 2009 com o julgamento proferido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no HC 84078MG relatado pelo então Ministro Eros Grau Mas no dia 17 de fevereiro de 2016 o Plenário da Suprema Corte nos autos do HC 126292SP relatado pelo Min Teori Zavascki optou por restabelecer a antiga jurisprudência em acórdão com a seguinte ementa A execução provisória de acórdão penal condenatório proferido em grau de apelação ainda que sujeito a recurso especial ou extraordinário não compromete o princípio constitucional da presunção de inocência afirmado pelo artigo 5º inciso LVII da Constituição Federal49 Nada obstante existam respeitadas vozes em sentido contrário compartilhamos do atual entendimento do Excelso Pretório Em nossa opinião a nova orientação jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal confere racionalidade e coerência ao sistema penal que não pode se autodestruir em decorrência da sua inércia e da inutilidade causada por condenações que nunca são efetivamente cumpridas A discussão sobre eventual inconstitucionalidade da execução antecipada da pena não existe em nenhum outro país Não há regime democrático que repute tal instituto como incompatível com qualquer direito fundamental a b notadamente a presunção de inocência ou de não culpabilidade A propósito no julgamento pelo STF do HC 85866RJ a então Ministra Ellen Gracie incisivamente destacou Em país nenhum do mundo depois de observado o duplo grau de jurisdição a execução de uma condenação fica suspensa aguardando o referendo da Corte Suprema Aqui não pode ser diferente A presunção de inocência ou de não culpabilidade encontrase consagrada no art 5º LVII da Constituição Federal Seu caráter relativo é indiscutível por duas razões nenhum direito fundamental é absoluto De fato uma das características mais marcantes de todo e qualquer direito fundamental é a relatividade Portanto na hipótese de colisão um direito fundamental deve necessariamente conformarse com outro direito de igual natureza cuidase de princípio e não de regra Destarte a presunção de inocência comporta variações é dizer pode e deve ser aplicada com maior ou menor intensidade quando confrontada com outros princípios igualmente constitucionais Se a presunção de inocência fosse absoluta é preciso destacar sequer poderia ser ajuizada uma ação penal contra quem ofendeu a lei penal Mais do que isso jamais seria decretada qualquer medida restritiva da liberdade a exemplo da prisão preventiva e da prisão temporária antes do trânsito em julgado da condenação Na verdade nunca existiria uma sentença condenatória definitiva pois seria inviável a persecução penal Não se pode enveredar por extremos ou concepções ideológicas exageradas A Constituição Federal acertadamente consagrou o princípio da presunção de inocência Isso contudo não resulta em presunção absoluta de desconfiança no tocante às decisões provenientes das instâncias ordinárias Os juízos de 1º grau e os Tribunais de Justiça e Regionais Federais não podem ser menosprezados à categoria de meras instâncias de passagem Nessa linha de raciocínio em todos os países democráticos a inocência do ser humano é presumida até o momento em que a culpa é provada de acordo com o direito A Declaração Universal dos Direitos Humanos editada pela Organização das Nações Unidas em 1948 preceitua em seu artigo XI 1 Todo ser humano acusado de um ato delituoso tem o direito de ser presumido inocente até que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei em julgamento público no qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa Na Convenção Americana de Direito Humanos Pacto de San José da Costa Rica incorporada ao direito pátrio pelo Decreto 6781992 a presunção de inocência encontrase prevista em seu art 8 2 Toda pessoa acusada de um delito tem direito a que se presuma sua inocência enquanto não for legalmente comprovada a sua culpa De seu turno a Convenção Europeia dos Direitos do Homem estatui em seu art 6º 2 Qualquer pessoa acusada de uma infração presumese inocente enquanto a sua culpabilidade não tiver sido legalmente provada A Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789 contempla disposição semelhante em seu art 9º Em síntese todos os diplomas escolhem como limite para o término da presunção de inocência o momento em que se dá a comprovação da culpa Não há necessidade de trânsito em julgado da condenação A questão central está em apurar no Brasil o momento em que isso ocorre versus A presunção de inocência não pode ser analisada isoladamente Faltalhe caráter absoluto É preciso confrontála com outros valores constitucionais notadamente a efetividade da Justiça penal CF art 5º XXXV indispensável para a segurança de todas as pessoas inclusive daquela investigada ou acusada pela prática de uma infração penal Com efeito a segurança individual também é direito fundamental CF art 5º caput A segurança pública por sua vez representa dever do Estado direito e responsabilidade de todos e é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio CF art 144 caput Há muito tempo o princípio da proporcionalidade um dos vetores do Direito Penal democrático vem sendo encarado por uma dupla face De um lado representa a proibição do excesso pois não se pode punir mais do que o necessário para a proteção do bem jurídico garantismo negativo Mas de outro lado a proporcionalidade revela a proibição da proteção insuficiente de bens jurídicos pois não se tolera o tratamento penal impotente ou meramente simbólico garantismo positivo Há de se buscar um garantismo integral capaz de atender com equilíbrio tanto as necessidades do acusado como também os reclamos da sociedade Quando um acusado vem a ser condenado em segundo grau de jurisdição ou seja a imputação contra ele lançada foi comprovada perante um juízo colegiado integrado por magistrados em estágios avançados das suas carreiras com respeito ao devido processo legal e ao duplo grau de jurisdição fica evidente a demonstração concreta da sua responsabilidade penal A acusação ganha consistência e se inicialmente indicava uma dúvida acerca da materialidade do fato e da sua respectiva autoria passa a aproximarse do juízo de certeza A partir desse momento a presunção de inocência deve ser flexibilizada diante do interesse público na efetividade da lei penal Essa conclusão compatibiliza o respeito ao direito fundamental consagrado no art 5º LVII da Lei Suprema com a eficácia da Justiça penal sem prejuízo do respeito ao nosso complexo sistema processual penal Em síntese é inerente à presunção de não culpabilidade a evolução em conformidade com o estágio da ação penal Quanto mais a persecução em juízo avança mais gravoso deve ser o tratamento dispensado ao réu Essa conclusão decorre da lógica do sistema jurídico e é permitida pela Constituição Federal que em nenhum momento impõe o mesmo tratamento ao réu durante todo o processo Cabe aqui uma rápida incursão envolvendo o desenvolvimento do processo penal em suas variadas etapas Depois de iniciada a ação penal a condenação em 1º grau representa um juízo de culpa embora em tese provisório pois submetese à apelação à instância superior50 Com o julgamento do recurso e a condenação em 2ª instância esgotase o exame fático e probatório da demanda51 Além disso atendese ao duplo grau de jurisdição com o reexame integral da decisão singular com ampla devolutividade da matéria versada na ação penal pouco importando se ela foi ou não apreciada pelo juízo de origem Ao réu fica normalmente assegurado o direito de acesso ao Tribunal em liberdade salvo se decretada a sua prisão cautelar Com exceção da via estreita da revisão criminal portanto é nas instâncias ordinárias que se encerra a análise dos fatos e das provas e consequentemente a definição da responsabilidade penal do acusado Como se sabe os recursos especial e extraordinário não têm efeito devolutivo pois não se destinam ao reexame da matéria fática e probatória A finalidade desses instrumentos consiste na uniformização da jurisprudência e na correta interpretação da lei federal recurso especial ou da Constituição Federal recurso extraordinário Em outros termos com o julgamento efetuado pelo Tribunal de apelação Tribunal de Justiça ou Tribunal Regional Federal operase uma autêntica preclusão da matéria inerente aos fatos submetidos ao Poder Judiciário Dessa forma é fácil perceber que a execução da pena na pendência de recursos de natureza extraordinária não viola o núcleo fundamental da presunção de inocência concentrado especialmente no campo probatório Como corolário da sua natureza jurídica direito fundamental processual de âmbito negativo ligado ao ônus da prova o réu deve ser tratado como inocente durante toda a fase ordinária do processo criminal com os direitos e garantias que lhe são inerentes com respeito às regras probatórias e ao sistema acusatório Com a condenação pelo Tribunal em grau de apelação e na pendência de recurso de natureza extraordinária ainda que não se possa falar em réu definitivamente culpado é inegável a existência de justa causa para legitimar o início do cumprimento da pena Como destacado pelo Supremo Tribunal Federal A finalidade que a Constituição persegue não é outorgar uma terceira ou quarta chance para a revisão de um pronunciamento jurisdicional com o qual o sucumbente não se conforma e considera injusto O acesso individual às instâncias extraordinárias visa a propiciar ao STF e ao STJ o exercício de seus papéis de estabilizadores uniformizadores e pacificadores da interpretação das normas constitucionais e do direito infraconstitucional Por isso o art 102 3º da Constituição Federal exige demonstração de repercussão geral das questões constitucionais debatidas no recurso extraordinário Portanto ao recorrente cabe demonstrar que no julgamento de seu caso concreto malferiuse um preceito constitucional e que há necessariamente a transcendência e relevância da tese jurídica a ser afirmada pela Suprema Corte É a Constituição que alça o STF primordialmente a serviço da ordem jurídica constitucional e igualmente eleva o STJ a serviço da ordem jurídica Isso está claro no art 105 III da CF quando se observam as hipóteses de cabimento do recurso especial todas direta ou indiretamente vinculadas à tutela da ordem jurídica infraconstitucional Nem mesmo o excessivo apego à literalidade da regra do art 5º LVII da CF a qual nessa concepção imporia sempre o trânsito em julgado seria capaz de conduzir à solução diversa52 Em verdade há nítida diferença entre a posição de definitivamente culpado a qual somente se concretiza após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória e a de condenado apta a ensejar a execução antecipada da pena que se verifica com a prolação de acórdão condenatório com obediência ao duplo grau de jurisdição Nesse contexto é imperioso destacar que a Constituição Federal não condiciona a prisão ao trânsito em julgado da condenação e sim à ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente a teor do mandamento contido em seu art 5º LXI Logo basta ao Poder Judiciário emitir uma ordem escrita e fundamentada para iniciar a título provisório o cumprimento da pena O embasamento dessa ordem recai nos elementos constantes do acórdão condenatório Com efeito se nosso ordenamento jurídico admite a prisão cautelar antes de qualquer édito condenatório com maior razão há de admiti la quando já existe um título executivo proveniente de juízo colegiado reconhecendo a responsabilidade penal do acusado A execução provisória da pena privativa de liberdade não se constitui em prisão de natureza cautelar Ao contrário exige a formação de juízo de culpabilidade embasado em título judicial condenatório proferido em respeito ao duplo grau de jurisdição Para o Supremo Tribunal Federal O Colegiado pontuou que a execução em debate diz respeito a acórdão penal condenatório proferido em segundo grau Dessa forma seguindo a orientação jurisprudencial do STF ainda que não transitada em julgado a condenação do agravante a prisão não mais se reveste de natureza cautelar mas sim das características de prisãopena a qual exige a formulação de juízo de culpabilidade em título judicial condenatório53 É inegável que podem ocorrer equívocos nos juízos condenatórios proferidos pelas instâncias ordinárias54 Isso decorre da falibilidade humana inclusive nas instâncias extraordinárias Mas para tais infelicidades sempre está reservado o habeas corpus ou então as medidas cautelares voltadas à obtenção de efeito suspensivo no recurso especial ou no recurso extraordinário Em resumo o acusado jamais estará abandonado da tutela jurisdicional frente a decisões teratológicas e nitidamente violadoras dos seus direitos E mais a última causa interruptiva da prescrição da pretensão punitiva é a publicação da sentença ou acórdão condenatórios recorríveis CP art 117 IV Essa opção do legislador deixa claro que além de os recursos às cortes superiores não se destinarem ao exame de fatos e provas também não interrompem o prazo prescricional Como desdobramento dessa escolha legislativa na prática tais recursos antes de representarem instrumentos de proteção da presunção de inocência constituemse em verdadeiros mecanismos contrários à efetividade da jurisdição penal A execução antecipada da pena atende aos anseios da coletividade que não mais suporta a prestação jurisdicional tardia e muitas vezes inútil bem como a impunidade causada pelos infindáveis casos de prescrição inclusive em crimes de elevada gravidade O instituto almeja colocar em prática na esfera penal o direito à razoável duração do processo CF art 5o inc LXXVIII o qual interessa a todas as pessoas e principalmente aos acusados de boafé e dotados de lealdade processual que não se valem de expedientes protelatórios para tumultuar o andamento da ação penal e atrasar a prestação jurisdicional banalizando a atuação do Poder Judiciário e aniquilando a credibilidade da sociedade na sua eficácia A prática judiciária não raras vezes confunde a ampla defesa direito fundamental e conquistado a duras penas com defesa fácil baseada notadamente na morosidade da Justiça penal e nas facilidades de que se aproveitam alguns acusados dotados de elevado poder econômico para arrastar no tempo suas ações penais aproveitandose das falhas do sistema e do invencível volume de serviço que acomete os órgãos do Poder Judiciário Esse expediente indevido favorece a seletividade negativa e discriminatória do Direito Penal pois proporciona a fuga da pena aos réus dotados de recursos suficientes para enfrentar as lacunas da Justiça criminal Igual sorte não assiste aos economicamente mais frágeis muitas vezes amparados pela Defensoria Pública instituição que em face do gigantesco volume de serviço e da falta de estrutura humana não consegue conferir igual tratamento àqueles que a procuram Se não bastasse a lentidão da Justiça penal estimula a prática de delitos econômicos pois a quem tem recursos financeiros e almeja o enriquecimento ilícito o baixo risco de punição realmente compensa As cifras douradas do Direito Penal ganham corpo com o cometimento de crimes do colarinho branco contra a ordem tributária contra a Administração Pública e de lavagem de capitais entre tantos outros que escapam da justa retribuição A finalidade preventiva da pena geral e especial igualmente deixa de ser alcançada É triste constatar que no sistema recursal brasileiro o trânsito em julgado da condenação depende em algum momento da inércia ou da anuência da parte derrotada Sempre existe um recurso agravos embargos etc oponível contra uma decisão ainda que sem nenhum fundamento válido e os instrumentos legais para coibir tais comportamentos são insuficientes Não raras vezes portanto a condenação definitiva somente ocorre quando o réu se conforma com seu destino e então deixa de valerse de algum recurso Em outras palavras nosso sistema jurídico lamentavelmente condiciona o fim do processo à anuência do acusado e o poder punitivo do Estado fica à mercê dos malabarismos defensivos que são apresentados no caso concreto Quem não admite a execução provisória de réu solto invoca o art 283 do Código de Processo Penal cuja redação é a seguinte Art 283 Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou no curso da investigação ou do processo em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva Esse dispositivo legal preceitua que com exceção da custódia cautelar prisão em flagrante prisão temporária ou preventiva somente será possível a prisão por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado Exigese portanto o trânsito em julgado da condenação Surge aqui uma indagação o art 283 do CPP funciona como fator impeditivo da execução provisória quando o acusado nada obstante a existência de acórdão condenatório em que foi respeitado o duplo grau de jurisdição não teve contra si decretada a prisão preventiva55 A resposta evidentemente é negativa Com efeito o Código de Processo Penal tem status de lei ordinária Suas normas devem guardar compatibilidade vertical com a Constituição Federal e não o contrário E como se sabe a Lei 33163 Suprema admite a execução provisória em face da relatividade da presunção de inocência ou de não culpabilidade e da sua conformação com a efetividade da prestação jurisdicional e com a razoável duração do processo O Superior Tribunal de Justiça já decidiu nesse sentido Atentase ainda à previsão contida no art 283 do CPP Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou no curso da investigação ou do processo em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva cuja redação dada pela Lei 124032011 veio encampar a jurisprudência até então consolidada do STF no sentido de que toda prisão antes do trânsito em julgado teria natureza cautelar Ora é fato que a redação desse artigo encontra sua essência no princípio constitucional da presunção de não culpabilidade Logo se o próprio Pretório Excelso ao interpretar esse princípio constitucional entendeu pela possibilidade de execução provisória da pena após a prolação de acórdão condenatório não se verifica como uma interpretação da regra infraconstitucional possa contraditar o alcance de sentido que foi emprestado ao princípio que dá sustentação a essa própria regra infraconstitucional porquanto sob a perspectiva kelseniana as normas inscritas na Carta Maior se encontram no topo da pirâmide normativa à qual todo o sistema jurídico deve se conformar Diante disso não há como pretender que sejam sobrepostas a interpretação e o alcance do art 283 do CPP à espécie de modo a afastar o entendimento manifestado pelo STF porquanto ao fim e ao cabo as normas infraconstitucionais é que devem se harmonizar com a Constituição e não o contrário56 Execução provisória de pena aplicada em ação penal originária Se a pena foi aplicada em decorrência da prática de crime de competência originária de Tribunal não é possível a imediata execução provisória Exemplo A juiz de direito pratica um determinado crime e vem a ser condenado diretamente pelo Tribunal de Justiça do seu estado 33164 Essa conclusão decorre da interpretação da atual jurisprudência do Supremo Tribunal Federal De fato não basta o acórdão condenatório para legitimar o cumprimento antecipado da pena Exigese mais um requisito consistente no respeito ao princípio do duplo grau de jurisdição57 Execução provisória da pena imposta pelo Tribunal do Júri Se a pena privativa de liberdade foi aplicada pelo Tribunal de Júri em resposta à prática de crime doloso contra a vida ou delito que lhe seja conexo a execução provisória independe do julgamento de recurso em segundo grau de jurisdição em face da soberania dos veredictos assegurada pelo art 5º XXXVIII c da Constituição Federal Na dicção do Supremo Tribunal Federal Nas condenações pelo tribunal do júri não é necessário aguardar julgamento de recurso em segundo grau de jurisdição para a execução da pena Com base nesse entendimento a Primeira Turma por maioria não conheceu da impetração de habeas corpus e revogou liminar que suspendia a execução da pena privativa de liberdade O paciente foi condenado pelo tribunal do júri a doze anos cinco meses e dez dias de reclusão em regime inicial fechado pela tentativa de homicídio qualificado O Conselho de Sentença porém o absolveu da imputação do delito de homicídio consumado Em sede de apelação o tribunal de justiça afastou a redução de 23 da pena e estabeleceu o patamar de 13 para cada uma das condenações fixando a pena definitiva em dezenove anos cinco meses e dez dias de reclusão Determinou a realização de novo júri no tocante à absolvição do crime de homicídio bem como o início da execução provisória da pena reportandose ao decidido pelo Supremo no exame do HC 126292 A defesa argumentou que a execução da pena dependeria de novo julgamento pelo tribunal do júri e que fundamentar a decisão exclusivamente no entendimento firmado no HC 126292 ofenderia o princípio da fundamentação das decisões jurídicas previsto no art 93 IX da CF A Turma asseverou que as decisões do tribunal do júri são soberanas Por isso o tribunal de justiça pode eventualmente anulálas mas não pode substituílas58 33165 Contra essa posição entretanto milita um forte argumento embora a condenação emane de órgão colegiado Conselho de Sentença não houve obediência ao duplo grau de jurisdição Execução provisória da pena e desaforamento Na hipótese em que houve desaforamento no trâmite de ação penal atinente a crime de competência do Tribunal do Júri com posterior condenação pelo Conselho de Sentença a qual vem a ser confirmada pela instância superior em grau de recurso a execução provisória da pena será promovida pelo juízo da comarca em que o feito foi desaforado O deslocamento de foro operase tão somente para a realização do julgamento popular Na visão do Superior Tribunal de Justiça A execução provisória da decisão proferida pelo Tribunal do Júri oriunda de julgamento desaforado nos termos do art 427 do CPP compete ao Juízo originário da causa e não ao sentenciante Entre outras insurgências aventadas no habeas corpus importa analisar a competência para execução provisória de pena estabelecida em decisão proferida pelo Tribunal do Júri se do Juízo sentenciante ou do Juízo em que o processo foi desaforado no intuito de garantir a imparcialidade do Conselho de Sentença Sobre o tema sabese que de acordo com o teor dos arts 70 e 69 I ambos do CPP via de regra a competência darseá pelo local da infração pois presumese que no lugar dos fatos isto é no distrito da culpa o acervo probatório será construído com maior robustez adotandose nesse campo a expressão latina do forum delicti comissi que prepondera ainda mais no procedimento dos crimes dolosos contra a vida submetidos ao Tribunal do Júri haja vista que os jurados do local dos fatos frisese leigos sob a ótica jurídica decidirão com base em razões pessoais influenciadas pela cultura circunscrita àquela localidade Contudo excepcionando a regra supracitada o art 427 do CPP estabelece que nas hipóteses em que o interesse da ordem pública o reclamar ou houver dúvidas sobre a imparcialidade do júri ou a segurança pessoal do acusado poderá ser determinado o desaforamento do feito para comarca distinta da mesma região onde não existam 33166 aqueles motivos preferindose as mais próximas Cabe salientar sob a ótica hermenêutica e da aplicação do Direito no Tribunal do Júri o seguinte destaque da doutrina cuidase o desaforamento portanto de decisão jurisdicional que altera a competência inicialmente fixada pelos critérios constantes do art 70 do CPP com aplicação estrita à sessão de julgamento propriamente dita De igual modo não se verifica violação ao artigo 668 do CPP tendo em vista tratarse de norma afeta aos julgamentos originariamente designados ao Júri o que não se revela quando da ocorrência do instituto do desaforamento Diante de tais elucidações concluise que o art 427 do CPP não comporta interpretação ampliativa de modo que o deslocamento de competência darseá tão somente quanto ao Tribunal Popular ao passo que uma vez realizado esgotase a competência da comarca destinatária inexistindo no caso violação quanto à execução provisória determinada pelo juízo originário da causa em observância à exegese do art 70 do mesmo diploma legal59 Execução provisória de penas restritivas de direitos O Supremo Tribunal Federal em pronunciamento anterior ao decidido pelo Plenário no julgamento do HC 126292SP já admitiu a execução provisória de penas restritivas de direitos nas hipóteses excepcionais em que seja comprovado o intuito meramente protelatório do réu ou do seu defensor no exercício do direito recursal buscando o retardamento do trânsito em julgado da condenação60 Essa posição é acertada Não há razão legítima para admitirse a execução provisória da pena privativa de liberdade cujo cumprimento é mais gravoso ao acusado e negarse tal instituto nas penas restritivas de direitos O Superior Tribunal de Justiça entretanto tem se posicionado pela impossibilidade de execução provisória no âmbito das penas restritivas de direitos seja pela falta de pronunciamento recente do Supremo Tribunal sobre o assunto seja pela interpretação literal do art 147 da Lei de Execução Penal Não é possível a execução da pena restritiva de direitos antes do trânsito em julgado da condenação A divergência tratada nos embargos envolve 33167 a possibilidade de se executar provisoriamente penas restritivas de direito O acórdão embargado da Quinta Turma decidiu que nos termos do art 147 da Lei de Execução Penal as penas restritivas de direitos só podem ser executadas após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória A tese paradigma foi apresentada com base no entendimento firmado no AgRg no REsp 1627367SP segundo o qual É cabível a determinação de execução provisória de pena privativa de liberdade convertida em restritivas de direitos Sobre o tema o STF já se manifestara expressamente a respeito da impossibilidade da execução das reprimendas restritivas de direitos antes do trânsito em julgado por força na norma prevista no art 147 da LEP Recentemente o Supremo Tribunal Federal por meio do HC n 126292SP não considerou a possibilidade de se executar provisoriamente a pena restritiva de direitos mas restringiuse à reprimenda privativa de liberdade na medida em que dispôs tão somente sobre a prisão do acusado condenado em segundo grau antes do trânsito em julgado Em vista da ausência de apreciação pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal quanto à possibilidade de executar a reprimenda restritiva de direitos antes do trânsito em julgado da condenação somado ao texto expresso do art 147 da Lei de Execução Penal deve prevalecer o entendimento firmado no acórdão embargado61 Execução provisória e prisão especial Não é impeditiva da execução provisória a circunstância de ter sido o acusado recolhido em prisão especial durante a prisão provisória Como estatui a Súmula 717 do Supremo Tribunal Federal Não impede a progressão de regime de execução da pena fixada em sentença não transitada em julgado o fato de o réu se encontrar em prisão especial A Lei de Execução Penal ao disciplinar a execução das penas privativas de liberdade prevê as autorizações de saída do estabelecimento prisional consistentes em benefícios aplicáveis aos condenados inseridos nos regimes 33171 33172 fechado ou semiaberto62 Dividemse em permissão de saída com fulcro na dignidade do condenado e saída temporária endereçada à reinserção social do preso Permissão de saída Nos termos do art 120 da Lei de Execução Penal cuidase de benefício destinado aos condenados que cumprem pena em regime fechado ou semiaberto e também aos presos provisórios A saída do estabelecimento se dará sempre mediante escolta quando ocorrer um dos seguintes fatos I falecimento ou doença grave do cônjuge companheira ascendente descendente ou irmão e II necessidade de tratamento médico nos casos em que o estabelecimento penal não estiver aparelhado para prover a assistência médica necessária A permissão de saída será concedida pelo diretor do estabelecimento onde se encontra o preso LEP art 120 parágrafo único É possível a sua concessão pelo juízo da execução se o pedido for recusado injustificadamente pela autoridade administrativa Saída temporária É cabível aos condenados que cumprem pena em regime semiaberto para saída do estabelecimento penal sem vigilância direta nos seguintes casos I visita à família II frequência a curso supletivo profissionalizante bem como de instrução do segundo grau ou superior na comarca do Juízo da Execução e III participação em atividades que concorram para o retorno ao convívio social LEP art 12263 Nos termos do art 122 parágrafo único da Lei de Execução Penal a ausência de vigilância direta não impede a utilização de equipamento de monitoração eletrônica pelo condenado quando assim determinar o juiz da execução O benefício da saída temporária não pode ser aplicado ao preso provisório por dois motivos a não é condenado e b não cumpre pena privativa de liberdade em regime semiaberto Será concedida por ato motivado do juiz da execução64 ouvidos o Ministério Público e a administração penitenciária e dependerá da satisfação dos seguintes requisitos cumulativos I comportamento adequado II cumprimento mínimo de 16 um sexto da pena se o condenado for primário e 14 um quarto se reincidente e III compatibilidade do benefício com os objetivos da pena LEP art 123 No tocante ao percentual de cumprimento da pena 16 ou 14 o período já descontado no regime fechado se era o regime inicial da pena privativa de liberdade será computado para fins de saída temporária É o que estabelece a Súmula 40 do Superior Tribunal de Justiça Para obtenção dos benefícios de saída temporária e trabalho externo considerase o tempo de cumprimento da pena no regime fechado A autorização será concedida por prazo não superior a 7 sete dias podendo ser renovada por mais quatro vezes durante o ano E quando se tratar de frequência a curso supletivo ou profissionalizante de instrução de nível médio ou superior o tempo de saída será o necessário para o cumprimento das atividades discentes LEP art 124 2º Nos demais casos visita à família e participação em atividades que concorram para o retorno ao convívio social as autorizações de saída somente poderão ser concedidas com prazo mínimo de 45 quarenta e cinco dias de intervalo entre uma e outra LEP art 124 3º E como estatui o art 124 1º da Lei de Execução Penal Ao conceder a saída temporária o juiz imporá ao beneficiário as seguintes condições entre outras que entender compatíveis com as circunstâncias do caso e a situação pessoal do condenado I fornecimento do endereço onde reside a família a ser visitada ou onde poderá ser encontrado durante o gozo do benefício II recolhimento à residência visitada no período noturno e III proibição de frequentar bares casas noturnas e estabelecimentos congêneres O benefício será automaticamente revogado quando o condenado praticar fato definido como crime doloso for punido por falta grave desatender as condições impostas na autorização ou revelar baixo grau de aproveitamento do curso Se revogado a recuperação do direito à saída temporária dependerá da absolvição no processo penal do cancelamento da punição disciplinar ou da demonstração do merecimento do condenado LEP art 125 e parágrafo único O art 146B inc II da Lei 72101984 Lei de Execução Penal autorizou o juiz a definir a fiscalização do condenado mediante monitoração eletrônica quando autorizar a saída temporária no regime semiaberto Tratase de recurso excepcional não podendo ser utilizado como regra O juiz deverá fundamentar sua decisão e baseála sobretudo em questões de necessidade adequação e proporcionalidade da medida pois a regra é a saída temporária sem vigilância direta LEP art 122 caput Nesse caso o condenado será instruído acerca dos cuidados que deverá adotar com o equipamento eletrônico e dos seguintes deveres I receber visitas do servidor responsável pela monitoração eletrônica responder aos seus contatos e cumprir suas orientações II absterse de remover de violar de modificar de danificar de qualquer forma o dispositivo de monitoração eletrônica ou de permitir que outrem o faça LEP art 146C incs I e II A violação comprovada de tais deveres poderá acarretar a critério do juiz da execução ouvidos o Ministério Público e a defesa a a regressão do regime b a revogação da autorização de saída temporária ou c advertência por escrito se o juiz decidir não aplicar qualquer das sanções anteriores LEP art 146C parágrafo único incs I II e VII Exigese portanto respeito à ampla defesa para imposição da sanção cabível A monitoração eletrônica poderá ser revogada quando se tornar desnecessária ou inadequada ou se o condenado violar os deveres a que estiver sujeito durante sua vigência ou cometer falta grave LEP art 146D sem prejuízo nessa última hipótese da imposição das sanções disciplinares previstas no art 53 da Lei de Execução Penal O Supremo Tribunal Federal admite as saídas temporárias automatizadas nas situações em que o juízo da execução elabora um calendário anual para a concessão do benefício ao condenado dispensandose a repetição do procedimento em cada oportunidade É legítima a decisão judicial que estabelece calendário anual de saídas temporárias para que o preso possa visitar a família Esse o entendimento da Primeira Turma que concedeu a ordem em habeas corpus para restabelecer ato do Juízo das Execuções Penais do Estado do Rio de Janeiro que concedera autorização de saída temporária para visita periódica à família do paciente Essa decisão mantida em grau de recurso fora no entanto reformada pelo STJ que assentara o descabimento da concessão de saídas automatizadas Segundo aquela Corte seria necessária a manifestação motivada do juízo da execução com intervenção do Ministério Público em cada saída temporária A Turma afirmou que a saída temporária autorizada repercutiria sobre outras saídas desde que não houvesse cometimento de falta grave pelo custodiado65 a b c d O Superior Tribunal de Justiça que inicialmente era contrário às saídas temporárias automatizadas modificou sua jurisprudência e passou a adotar as seguintes diretrizes É recomendável que cada autorização de saída temporária do preso seja precedida de decisão judicial motivada Entretanto se a apreciação individual do pedido estiver por deficiência exclusiva do aparato estatal a interferir no direito subjetivo do apenado e no escopo ressocializador da pena deve ser reconhecida excepcionalmente a possibilidade de fixação de calendário anual de saídas temporárias por ato judicial único observadas as hipóteses de revogação automática do art 125 da Lei 72101984 Lei de Execução Penal O calendário prévio das saídas temporárias deverá ser fixado obrigatoriamente pelo juízo das execuções não se lhe permitindo delegar à autoridade prisional a escolha das datas específicas nas quais o apenado irá usufruir os benefícios A propósito estatui a Súmula 520 do Superior Tribunal de Justiça O benefício de saída temporária no âmbito da execução penal é ato jurisdicional insuscetível de delegação à autoridade administrativa do estabelecimento prisional Respeitado o limite anual de 35 dias estabelecido pelo art 124 da Lei de Execução Penal é cabível a concessão de maior número de autorizações de curta duração pois o fracionamento do benefício é coerente com o processo reeducativo e com a reinserção gradativa do apenado ao convívio social As autorizações de saída temporária para visita à família e para participação em atividades que concorram para o retorno ao convívio social se limitadas a cinco vezes durante o ano deverão observar o prazo mínimo de 45 dias de intervalo entre uma e outra Na hipótese de maior número de saídas temporárias de curta duração já intercaladas durante os doze meses do ano e muitas vezes sem pernoite não se exige o intervalo previsto no art 124 3 da Lei de Execução Penal qual seja 45 dias entre cada uma das saídas66 O local adequado para o cumprimento da pena privativa de liberdade em regime fechado é a Penitenciária LEP art 87 Pelo sistema legislativo o condenado deve ser alojado em cela individual que conterá dormitório aparelho sanitário e lavatório Cada unidade celular depende dos seguintes requisitos básicos a salubridade do ambiente pela concorrência dos fatores de aeração insolação e condicionamento térmico adequado à existência humana e b área mínima de seis metros quadrados LEP art 88 A Penitenciária de homens será construída em local afastado do centro urbano à distância que não restrinja a visitação LEP art 90 Embora na realidade ocorra fenômeno diverso a Cadeia Pública destinase exclusivamente ao recolhimento de presos provisórios LEP art 102 Esta também é a determinação contida no art 300 caput do Código de Processo com a redação determinada pela Lei 124032011 As pessoas presas provisoriamente ficarão separadas das que já estiverem definitivamente condenadas nos termos da lei de execução penal No início do cumprimento da pena o condenado será obrigatoriamente submetido a exame criminológico de classificação para individualização da execução CP art 34 caput e LEP art 8º caput Esse exame é realizado pela Comissão Técnica de Classificação com vistas a definir o programa individualizador da pena privativa de liberdade adequada ao condenado LEP art 6º O condenado fica sujeito a trabalho no período diurno e a isolamento durante o repouso noturno É o que se convencionou chamar de período de silêncio67 O trabalho será em comum dentro do estabelecimento na conformidade das aptidões ou ocupações anteriores do condenado desde que compatíveis com a execução da pena CP art 34 1º e 2º Esse trabalho é obrigatório LEP art 31 caput Ressaltese que na atribuição do trabalho deverão ser levadas em conta a habilitação a condição pessoal e as necessidades futuras do preso bem como as oportunidades oferecidas pelo mercado Deverá ser limitado tanto quanto possível o artesanato sem expressão econômica salvo nas regiões de turismo Os maiores de 60 sessenta anos poderão solicitar ocupação adequada à sua idade e os doentes ou deficientes físicos somente exercerão atividades apropriadas ao seu estado LEP art 32 e 1º a 3º O Código Penal somente admite o trabalho externo em serviços ou obras públicas art 34 3º Porém o art 36 caput da Lei de Execução Penal é mais amplo abrindo espaço ao labor extramuros também em entidades particulares O trabalho externo será admissível para os presos em regime fechado somente em serviço ou obras públicas realizadas por órgãos da Administração Direta ou Indireta ou entidades privadas desde que tomadas as cautelas contra a fuga e em favor da disciplina Devem ser observadas algumas regras quanto ao trabalho externo a o limite máximo do número de presos será de 10 dez por cento do total de empregados na obra b caberá ao órgão da administração à entidade ou à empresa empreiteira a remuneração desse trabalho e c a prestação de trabalho a entidade privada depende do consentimento expresso do preso LEP art 36 1º a 3º Além disso a prestação de trabalho externo a ser autorizada pela direção do estabelecimento dependerá de aptidão disciplina e responsabilidade além do cumprimento mínimo de 16 um sexto da pena E será revogada a autorização de trabalho externo ao preso que vier a praticar fato definido como crime for punido por falta grave ou faltar com aptidão disciplina ou responsabilidade LEP art 37 caput e parágrafo único É admissível o trabalho externo do condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado pois não há restrições legais Logo por cumprir parte da pena em regime fechado aplicamse as regras a ele inerentes Deve ser tomada porém redobrada cautela no tocante à vigilância68 O trabalho externo em entidades privadas desde que cumpridos todos os requisitos legais pode ser prestado inclusive em empresa pertencente à família do condenado A boafé tanto da empregadora quanto também do preso é presumida e eventuais abusos devem ser comprovados no caso concreto Na dicção do Superior Tribunal de Justiça O fato de o irmão do apenado ser um dos sócios da empresa empregadora não constitui óbice à concessão do benefício do trabalho externo ainda que se argumente sobre o risco de ineficácia da realização do trabalho externo devido à fragilidade na fiscalização Com efeito a execução criminal visa ao retorno do condenado ao convívio em sociedade com o escopo de reeducálo e ressocializálo sendo que o trabalho é essencial para esse processo Nesse contexto é importante considerar que os riscos de ineficácia da realização de trabalho externo em empresa familiar sob o argumento de fragilidade na fiscalização não podem ser óbice à concessão do referido benefício Em primeiro lugar porque é muito difícil para o apenado conseguir emprego Impedir que o preso seja contratado por parente é medida que reduz ainda mais a possibilidade de vir a conseguir uma ocupação lícita e em consequência sua perspectiva de reinserção na sociedade Em segundo lugar porque o Estado deve envidar todos os esforços possíveis no sentido de ressocializar os transgressores do Direito Penal a fim de evitar novas agressões aos bens jurídicos da coletividade Ademais o Estado possui a atribuição de fiscalizar o efetivo cumprimento do trabalho extramuros estando autorizado a revogar a benesse nas hipóteses elencadas no parágrafo único do art 37 da LEP Além disso não há qualquer vedação na LEP quanto à concessão de trabalho externo em empresa da família do sentenciado69 A jornada normal de trabalho não será inferior a 6 seis nem superior a 8 oito horas com descanso nos domingos e feriados Aos presos designados para os serviços de conservação e manutenção do estabelecimento penal poderá ser atribuído horário especial de trabalho LEP art 33 O preso que desempenha atividade laborativa tem direito à remuneração que não pode ser inferior a 34 do salário mínimo CP art 39 e LEP art 29 caput Assistelhe ainda direito aos benefícios da Previdência Social CP art 39 e LEP art 41 III A recusa injustificada do preso à execução do trabalho caracteriza falta 33181 grave LEP arts 31 39 V e 50 VI acarretando na impossibilidade de obter a progressão de regime prisional ou o livramento condicional Entretanto o trabalho não é obrigatório ao preso provisório e ao preso político LEP arts 31 parágrafo único e 200 No tocante às contravenções penais o trabalho é facultativo se a pena de prisão simples aplicada não exceder a 15 quinze dias Decretolei 36881941 LCP art 6º 2º Local de cumprimento da pena O condenado à pena privativa de liberdade não tem o direito de cumprila na sua comarca até porque nela não existe obrigatoriamente estabelecimento prisional70 Com efeito é preferível que a pessoa processada ou condenada fique custodiada em presídio no local em que reside inclusive para facilitar o exercício de seu direito à assistência familiar e promover sua ressocialização71 Porém se a permanência do apenado em presídio local evidenciase impraticável ou inconveniente por qualquer motivo tal como em razão do seu comportamento ou das suas desavenças com os demais detentos é mister pôr em ressalto a preponderância ao interesse social da segurança e da própria eficácia da segregação individual Em regra a execução da pena deve ocorrer na mesma comarca em que se consumou o crime Entretanto o art 86 da Lei de Execução Penal admite exceções a essa regra ou seja a transferência de condenado para sistema penitenciário de outra unidade federativa em estabelecimento local ou da União desde que fundamentada a decisão pelo juiz por motivação idônea e válida para justificála Destarte ainda que seus parentes e as pessoas do seu convívio social residam em outra comarca ou mesmo em outro Estado o condenado não tem direito à remoção do estabelecimento prisional quando preso em local diverso especialmente quando ligado a organizações criminosas hipótese em que a supremacia do interesse público indica ser o Estado em que se deu a condenação o menos apropriado para cumprimento da pena72 Destaquese ainda que a União está autorizada a construir estabelecimento penal em local distante da condenação para recolher os condenados quando a medida se justifique no interesse da segurança pública ou do próprio condenado LEP art 86 1º E cabe ao juiz competente a requerimento da autoridade administrativa definir o estabelecimento prisional adequado para abrigar o preso provisório ou condenado em atenção ao regime e aos requisitos estabelecidos LEP art 86 3º A transferência de condenado para estabelecimento prisional da União depende de decisão prévia fundamentada da Justiça Federal nos termos da Lei 116712008 Nesse caso encontrandose o preso em estabelecimento prisional pertencente à União a execução das penas é da competência do juízo federal em que se encontram os apenados transferidos ou seja o juízo do lugar onde a pena está sendo cumprida de acordo com o disposto no art 1º 1º da Res n 5572007 do Conselho da Justiça Federal que tem redação similar ao art 4º 1º da Lei n 116712008 o que está de acordo com o art 66 da LEP73 Se comprovada uma situação de emergência essa transferência prescinde da prévia oitiva do preso Como destacado pelo Supremo Tribunal Federal A transferência de preso para presídio federal de segurança máxima sem a sua prévia oitiva desde que fundamentada em fatos caracterizadores de situação emergencial não configura ofensa aos princípios do devido processo legal da ampla defesa da individualização da pena e da dignidade da pessoa humana Com base nesse entendimento a 1ª Turma denegou habeas corpus em que se pleiteava a anulação de transferência de preso recolhido em penitenciária estadual para estabelecimento federal por suposta inobservância de requisitos legais Aludiuse ao que contido no 6º do art 5º da Lei 116712008 que dispõe sobre a transferência e inclusão de presos em estabelecimentos penais federais de segurança máxima e dá outras providências 6º Havendo extrema necessidade o juiz federal poderá autorizar a imediata transferência do preso e após a instrução dos autos na forma do 2º deste artigo decidir pela manutenção ou revogação da medida adotada Consignouse a possibilidade de postergação da oitiva dos agentes envolvidos no 33182 processo de transferência cuja formalidade estaria prevista no 2º do mesmo preceito Instruídos os autos do processo de transferência serão ouvidos no prazo de 5 cinco dias cada quando não requerentes a autoridade administrativa o Ministério Público e a defesa bem com o Departamento Penitenciário Nacional DEPEN a quem é facultado indicar o estabelecimento penal mais adequado Aduziuse que no caso estariam demonstrados os fatos ensejadores da situação emergencial a rebeliões ocorridas em determinado período com a morte de vários detentos b julgamento pela Corte Interamericana de Direitos Humanos do Brasil e do estadomembro em que localizada a penitenciária na qual inicialmente recluso o paciente c interdição do presídio e d periculosidade do paciente Ressaltouse ademais a inexistência de direito subjetivo do reeducando de cumprir a pena em penitenciária específica74 A renovação do prazo de permanência do condenado em presídio federal de segurança máxima é possível se persistirem os motivos que fundamentaram a sua transferência ainda que não tenha ocorrido fato novo Com efeito a Lei nº 116712008 dispõe que o período de permanência é renovável excepcionalmente quando solicitado motivadamente pelo juízo de origem prescindindo de novos argumentos Nessa hipótese não cabe ao juízo federal discutir as razões do juízo estadual ao solicitar a transferência ou renovação do prazo em presídio federal pois este é o único habilitado a declarar a excepcionalidade da medida75 Finalmente é legítima a transferência de presos em face do superpovoamento e de problemas estruturais no estabelecimento prisional em atenção à dignidade da pessoa humana e ao princípio da humanidade da pena bem como aos direitos dos presos expressamente assegurados no art 5º XLIX da Constituição Federal é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral76 Regime Disciplinar Diferenciado RDD O Regime Disciplinar Diferenciado foi inserido no art 52 da Lei de Execução Penal pela Lei 107922003 É aplicável ao preso provisório e ao 1 2 3 a b c d condenado nacionais ou estrangeiros e tem cabimento em três hipóteses com a prática de fato previsto como crime doloso que constitui falta grave desde que ocasione subversão da ordem ou disciplina internas sem prejuízo da sanção penal correspondente LEP art 52 caput quando o preso apresentar alto risco para a ordem e a segurança do estabelecimento penal ou da sociedade LEP art 52 1º e quando existirem fundadas suspeitas de envolvimento ou participação do preso provisório ou condenado a qualquer título em organizações criminosas quadrilha ou bando77 LEP art 52 2º Suas características são as seguintes LEP art 52 I a IV duração máxima de 360 trezentos e sessenta dias sem prejuízo da repetição da sanção por nova falta grave de mesma espécie até o limite de 16 da pena aplicada recolhimento em cela individual visitas semanais de duas pessoas sem contar as crianças com duração de 2 duas horas e direito do preso de sair da cela por 2 duas horas diárias para banho de sol A inserção do preso no regime disciplinar diferenciado depende de prévio e fundamentado despacho do juiz da execução competente mediante requerimento circunstanciado elaborado pelo diretor do estabelecimento ou outra autoridade administrativa exemplo Secretário de Estado da Administração Penitenciária A decisão judicial sobre a inclusão de preso em regime disciplinar será precedida de manifestação do Ministério Público e da defesa e prolatada no prazo máximo de 15 quinze dias LEP art 54 e 1º e 2º Destarte para que haja a colocação do preso no Regime Disciplinar Diferenciado RDD é necessário ocorrer ao menos uma das hipóteses previstas no art 52 da Lei de Execução Penal caput 1º ou 2º Ademais a decisão judicial sobre a inclusão do preso no regime disciplinar diferenciado depende de requerimento minucioso do diretor do estabelecimento ou outra autoridade administrativa Deverá ser fundamentada pelo juiz das execuções criminais e determinada no processo de execução penal bem como precedida de manifestação do Ministério Público e da defesa78 Nos termos do art 60 da Lei de Execução Penal a autoridade administrativa poderá decretar o isolamento preventivo do faltoso pelo prazo de até 10 dez dias Tratase de medida antecedente à inclusão do preso no RDD e esse período será abatido do total do período de inserção do preso no regime disciplinar diferenciado Como mencionado o regime disciplinar diferenciado foi introduzido na Lei de Execução Penal pela Lei 107922003 que ainda determina em seu art 4º que os estabelecimentos penitenciários especialmente os destinados ao regime disciplinar diferenciado disporão dentre outros equipamentos de segurança de bloqueadores de telecomunicação para telefones celulares radiotransmissores e outros meios Ainda o art 3º da Lei 107922003 com o objetivo de combater cerradamente a criminalidade organizada estatui que os estabelecimentos penitenciários disporão de aparelho detector de metais aos quais devem se submeter todos que queiram ter acesso ao referido estabelecimento ainda que exerçam qualquer cargo ou função pública O Regime Disciplinar Diferenciado tem sido alvo de críticas alegandose sua inconstitucionalidade notadamente por suposta violação à dignidade da pessoa humana e por se tratar de pena cruel Essa posição tende a ser adotada em concursos públicos da Defensoria Pública por ser mais favorável ao réu Entretanto não nos parece seja esse o caminho correto O regime é severo rígido eficaz ao combate do crime organizado mas nunca desumano Muito ao contrário a determinação de isolamento em cela individual antes de ofender assegura a integridade física e moral do preso evitando contra ele violências ameaças promiscuidade sexual e outros males que assolam o sistema penitenciário O tratamento legal mais rigoroso está em sintonia com a maior periculosidade social do seu destinatário Quem busca destruir o Estado criando governos paralelos tendentes ao controle da sociedade deve ser enfrentado de modo mais contundente Não se pode tratar de igual maneira um preso comum e um preso ligado a organizações criminosas Além disso o interesse público exige a proteção das pessoas de bem mediante a efetiva segregação de indivíduos destemidos e incrédulos com a força dos poderes constituídos pelo Estado O preso não tem direito à fuga O Regime Disciplinar Diferenciado tem se mostrado seguro sem rebeliões e sem evasões e justamente por esse motivo se apregoa a sua justiça A Constituição Federal assegura a todos o direito à segurança art 5º caput e o legislador andou acertadamente ao instituir um regime capaz de efetivar esse direito inerente a todas as pessoas Embora longo é válido citar julgado do Superior Tribunal de Justiça que de modo exauriente rebateu os argumentos da inconstitucionalidade do regime disciplinar diferenciado Considerandose que os princípios fundamentais consagrados na Carta Magna não são ilimitados princípio da relatividade ou convivência das liberdades públicas vislumbrase que o legislador ao instituir o regime disciplinar diferenciado atendeu ao princípio da proporcionalidade Legítima a atuação estatal tendo em vista que a Lei 107922003 que alterou a redação do art 52 da Lei de Execuções Penais busca dar efetividade à crescente necessidade de segurança nos estabelecimentos penais bem como resguardar a ordem pública que vem sendo ameaçada por criminosos que mesmo encarcerados continuam comandando ou integrando facções criminosas que atuam no interior do sistema prisional liderando rebeliões que não raro culminam com fugas e mortes de reféns agentes penitenciários eou outros detentos e também no meio social Assim não há falar em violação ao princípio da dignidade da pessoa humana art 1º III da CF à proibição da submissão à tortura a tratamento desumano e degradante art 5º III da CF e ao princípio da humanidade das penas art 5º XLVIII da CF na medida em que é certo que a inclusão no RDD agrava o cerceamento à liberdade de locomoção já restrita pelas próprias circunstâncias em que se encontra o custodiado contudo não representa per si a submissão do encarcerado a padecimentos físicos e psíquicos impostos de modo vexatório o que somente restaria caracterizado nas hipóteses em que houvesse por exemplo em celas insalubres escuras ou sem ventilação Ademais o sistema penitenciário em nome da ordem e da disciplina bem como da regular execução das penas há que se valer de medidas disciplinadoras e o regime em questão atende ao primado da proporcionalidade entre a gravidade da falta e a severidade da sanção Outrossim a inclusão no RDD não traz qualquer mácula à coisa julgada ou ao princípio da segurança jurídica como quer fazer crer o impetrante uma vez que transitada em julgado a sentença condenatória surge entre o condenado e o Estado na execução da pena uma nova relação jurídica e consoante consignado o regime instituído pela Lei 107922003 visa propiciar a manutenção da ordem interna dos presídios não representando portanto uma quarta modalidade de regime de cumprimento de pena em acréscimo àqueles previstos no Código Penal art 33 do CP Pelo mesmo fundamento a possibilidade de inclusão do preso provisório no RDD não representa qualquer ofensa ao princípio da presunção de inocência tendo em vista que nos termos do que estabelece o parágrafo único do art 44 da Lei de Execução Penal estão sujeitos à disciplina o condenado à pena privativa de liberdade e o preso provisório79 A pena privativa de liberdade em regime prisional semiaberto deve ser cumprida em colônia agrícola industrial ou estabelecimento similar LEP art 91 O condenado poderá ser alojado em compartimento coletivo com salubridade do ambiente pela concorrência dos fatores de aeração insolação e condicionamento térmico adequado à existência humana Além disso as dependências coletivas devem ser dotadas dos seguintes requisitos básicos a seleção adequada dos presos e b o limite de capacidade máxima que atenda os objetivos de individualização da pena LEP art 92 e parágrafo único 33191 De acordo com o art 35 caput do Código Penal o exame criminológico a exemplo do que ocorre no regime fechado é obrigatório no início do cumprimento da pena no semiaberto Prevalece contudo o entendimento de que esse exame é facultativo nada obstante a posição contrária permita uma mais adequada individualização da pena em face da regra prevista no art 8º parágrafo único da Lei de Execução Penal princípio da especialidade Ao exame de que trata este artigo poderá ser submetido o condenado ao cumprimento da pena privativa de liberdade em regime semiaberto destacamos O condenado fica sujeito a trabalho em comum durante o período diurno É admissível o trabalho externo bem como a frequência a cursos supletivos profissionalizantes de instrução de segundo grau ou superior CP art 35 1º e 2º Assim como no regime fechado o trabalho externo deve ser efetuado sob vigilância porém não depende do prévio cumprimento de no mínimo 16 da pena80 Falta de colônia agrícola ou industrial e cumprimento da pena em estabelecimento adequado Se o condenado ao regime semiaberto em face da ausência de vaga em colônia agrícola ou industrial cumpre a pena em estabelecimento adequado em local destinado exclusivamente aos presos do regime intermediário e com direito a todos os benefícios a este inerentes não há falar em constrangimento ilegal e inserção do reeducando no regime aberto ou em prisão domiciliar Esse raciocínio é igualmente válido para a ausência de vagas em casas de albergado destinadas a condenados ao regime aberto Na dicção do Supremo Tribunal Federal A Segunda Turma julgou improcedente reclamação ajuizada para garantir a observância pela instância de origem da Súmula Vinculante 56 O reclamante cumpre pena em regime semiaberto Em razão de não estar recolhido em colônia penal pleiteou lhe fosse concedida prisão domiciliar ou antecipação do regime aberto o que foi negado O Colegiado ressaltou o direito de o apenado cumprir a reprimenda em estabelecimento adequado ao regime imposto Ponderou que a concessão 33192 de prisão domiciliar ou regime aberto é inviável diante do regramento previsto na Lei de Execução Penal Informou que o reclamante cumpre pena em ala de penitenciária destinada exclusivamente a internos do regime semiaberto e que todos os benefícios inerentes ao regime lhe são assegurados A Turma deliberou no sentido de serem aceitáveis estabelecimentos não qualificados como colônia agrícola ou industrial regime semiaberto ou casa de albergado ou estabelecimento adequado regime aberto Entretanto não é permitido o alojamento conjunto de presos dos regimes semiaberto e aberto com presos do regime fechado81 Regime semiaberto e recurso da defesa Se a sentença fixou o regime semiaberto para início de cumprimento da pena privativa de liberdade mas a defesa apelou e não há vaga na colônia agrícola industrial ou estabelecimento similar o réu deve aguardar em liberdade o julgamento do recurso mesmo se tiver sido decretada a prisão preventiva ou então optado o magistrado pela sua manutenção Para o Superior Tribunal de Justiça O acusado tem direito de aguardar o julgamento do recurso de apelação em liberdade na hipótese em que fixado o regime inicial semiaberto para o cumprimento da pena ainda que a sentença condenatória tenha fundamentado a necessidade de manutenção da prisão preventiva O acusado não pode aguardar o julgamento do recurso em regime mais gravoso do que aquele estabelecido na sentença condenatória82 O regime aberto baseiase na autodisciplina e senso de responsabilidade do condenado CP art 36 caput Com o trânsito em julgado da sentença penal o juízo expede mandado de prisão para encaminhar o condenado ao regime aberto A pena é cumprida na Casa do Albergado cujo prédio necessita situarse em centro urbano separado dos demais estabelecimentos e caracterizarse pela ausência de obstáculos físicos contra a fuga Em cada região haverá pelo 1 2 menos uma Casa do Albergado a qual deverá conter além dos aposentos para acomodar os presos local adequado para cursos e palestras O estabelecimento terá instalações para os serviços de fiscalização e orientação dos condenados LEP arts 93 a 95 O condenado deverá fora do estabelecimento e sem vigilância trabalhar frequentar curso ou exercer outra atividade autorizada permanecendo recolhido durante o período noturno e nos dias de folga CP art 36 1º O ingresso do condenado em regime aberto supõe a aceitação de seu programa e das condições impostas pelo juiz Somente poderá ingressar no regime aberto o condenado que estiver trabalhando ou comprovar a possibilidade de fazêlo imediatamente e apresentar pelos seus antecedentes ou pelo resultado dos exames a que foi submetido fundados indícios de que irá ajustarse com autodisciplina e senso de responsabilidade ao novo regime LEP arts 113 e 11483 Algumas pessoas em virtude de sua condição especial podem ser dispensadas do trabalho maiores de 70 setenta anos de idade portadores de doença grave aqueles que possuam filho menor ou portador de deficiência física ou mental e gestante LEP art 114 parágrafo único O regime aberto depende da obediência de condições divididas em dois blocos gerais ou legais previstas no art 115 da Lei de Execução Penal São elas a permanecer no local em que for designado durante o repouso e nos dias de folga b sair para o trabalho e retornar nos horários fixados c não se ausentar da cidade onde reside sem autorização judicial e d comparecer a juízo para informar e justificar suas atividades quando for determinado especiais ou judiciais são as que podem ser estabelecidas discricionariamente pelo juízo da execução sem prejuízo das condições gerais O juiz poderá modificar as condições estabelecidas para o regime aberto de ofício a requerimento do Ministério Público da autoridade administrativa ou do condenado desde que as circunstâncias assim o recomendem LEP art 33201 33202 33203 116 Regime aberto e prestação de serviços à comunidade A prestação de serviços à comunidade bem como qualquer outra pena restritiva de direitos não pode ser imposta como condição para cumprimento da pena privativa de liberdade no regime aberto Este é o teor da Súmula 493 do Superior Tribunal de Justiça É inadmissível a fixação de pena substitutiva art 44 do CP como condição especial ao regime aberto Como se sabe as penas restritivas de direitos aplicamse alternativamente às privativas de liberdade mas não podem ser cumuladas com elas pois sequer há previsão legal nesse sentido A intenção do legislador ao facultar a estipulação de condições especiais para o cumprimento do regime aberto foi englobar circunstâncias inerentes ao próprio regime que não constavam das condições obrigatórias previstas no art 115 da Lei de Execução Penal e não fixar outra pena o que resultaria em dupla punição pelo mesmo fato bis in idem84 Legislação local Em se tratando o direito penitenciário de matéria de competência concorrente entre a União os Estados e o Distrito Federal CF art 24 I estatui o art 119 da Lei de Execução Penal que a legislação local poderá estabelecer normas complementares para o cumprimento da pena privativa de liberdade em regime aberto Prisão albergue domiciliar O art 117 da Lei 72101984 Lei de Execução Penal é peremptório ao admitir o recolhimento do condenado à pena privativa de liberdade no regime aberto85 em residência particular exclusivamente nas hipóteses ali previstas em rol taxativo86 Art 117 Somente se admitirá o recolhimento do beneficiário de regime aberto em residência particular quando se tratar de I condenado maior de 70 setenta anos II condenado acometido de doença grave III condenada com filho menor ou deficiente físico ou mental IV condenada gestante No inciso I a idade deve ser aferida ao tempo da execução da pena privativa de liberdade independentemente do momento da infração penal ou mesmo da condenação Portanto nada impede o início do cumprimento da pena em casa do albergado e ultrapassados os 70 setenta anos de idade seja concedida a prisão domiciliar Assim como em outras hipóteses exemplo CP arts 65 I 77 2º e 115 o legislador concede tratamento mais brando à pessoa que alcançou a senilidade tendo em vista sua menor periculosidade e sua menor resistência em suportar os efeitos da pena O Estatuto do Idoso em nada alterou essa regra No tocante ao inciso II do art 117 entendese por doença grave a moléstia de difícil cura dependente de longo tratamento ou que coloca em risco a vida do doente como o câncer e a AIDS Entretanto não basta a simples constatação da doença Para a incidência da benesse legal é imprescindível não possa ser o condenado devidamente assistido pelo serviço médico da rede pública no estabelecimento prisional além de se encontrar no estágio terminal da doença87 Em relação ao inciso III é possível aplicálo analogicamente ao homem se possuir filho menor ou portador de deficiência física ou mental Esse benefício é deferido em prol da criança ou da pessoa portadora de deficiência que precisam do amparo da mãe ou do pai Finalmente a prisão domiciliar à gestante inc IV serve ao propósito de a ela proporcionar condições mais dignas saudáveis e adequadas durante a gestação O Superior Tribunal de Justiça alargando a incidência do dispositivo legal já reconheceu o benefício a uma condenada para fins de proteção do seu filho de tenra idade e desamparado A Turma prosseguindo o julgamento por maioria excepcionando por analogia a aplicação do art 117 da Lei n 72101984 concedeu prisão 332031 domiciliar para exercício da maternidade embora a paciente responda a vários processos em curso e já tenha sido superada a fase de amamentação Malgrado não possa ser solucionada a questão social dada a peculiaridade do caso o writ foi concedido mormente devido à impossibilidade de transferência da ré para a comarca mais próxima de onde reside o filho de tenra idade a exigir a proteção materna por falta de parentes para cuidarem da criança o avô faleceu e a avó estaria impossibilitada de ficar com a criança88 A prisão albergue domiciliar prevista no art 117 da Lei 72101984 Lei de Execução Penal representa uma forma especial de cumprimento da pena privativa de liberdade Destarte não se confunde com a prisão domiciliar inserida no Código de Processo Penal pela Lei 124032011 e ampliada pela Lei 132572016 Marco Legal da Primeira Infância De fato a prisão domiciliar constituise em medida cautelar e consiste no recolhimento do indiciado ou acusado em sua residência só podendo dela ausentarse com autorização judicial CPP art 317 Tratase de modalidade de prisão provisória definida como medida substitutiva da prisão preventiva e como determina o art 318 do Código de Processo Penal o juiz somente poderá aplicála quando o agente for I maior de 80 oitenta anos II extremamente debilitado por motivo de doença grave89 III imprescindível aos cuidados especiais de pessoa menor de 6 seis anos de idade ou com deficiência IV gestante V mulher com filho de até 12 doze anos de idade incompletos90 ou VI homem caso seja o único responsável pelos cuidados do filho de até 12 doze anos de idade incompletos91 Habeas corpus De forma inovadora e polêmica o Supremo Tribunal Federal concedeu habeas corpus coletivo para determinar a substituição da prisão preventiva pela prisão domiciliar sem prejuízo da aplicação concomitante das medidas a b alternativas previstas no art 319 do Código de Processo Penal em favor de todas as mulheres presas gestantes puérperas ou mães de crianças e deficientes sob sua guarda nos termos do art 2º da Lei 80691990 Estatuto da Criança e do Adolescente e da Convenção sobre Direitos das Pessoas com Deficiência abrangendo o Decreto Legislativo 1862008 e o Estatuto da Pessoa com Deficiência enquanto perdurar tal condição excetuados os casos de crimes praticados por elas mediante violência ou grave ameaça contra seus descendentes ou ainda em situações excepcionalíssimas as quais deverão ser devidamente fundamentadas pelos juízes que denegarem o benefício A ordem foi estendida às adolescentes sujeitas a medidas socioeducativas em idêntica situação no território nacional Na hipótese de reincidência da presa o juiz deverá analisar as circunstâncias do caso concreto sempre levando em conta os princípios e as regras acima enunciadas bem como o caráter excepcional da prisão Se o magistrado concluir que a prisão domiciliar se mostra inviável ou inadequada em determinadas situações poderá substituíla pelas medidas cautelares contidas no art 319 do Código de Processo Penal Para apurar a situação de guardiã dos filhos da mulher presa deverseá dar credibilidade à palavra da mãe Também se faculta ao juiz a requisição de laudo social para eventual reanálise do benefício A ordem não será aplicável se constatada a suspensão ou destituição do poder familiar por motivos diversos da prisão a exemplo dos maustratos contra a criança ou filho portador de deficiência Para chegar a esta conclusão a Corte Suprema baseouse nos seguintes fundamentos existe grave deficiência estrutural no sistema carcerário que faz com que mulheres grávidas e mães de crianças bem como as próprias crianças sejam submetidas a situações degradantes resultantes da privação de cuidados prénatal e pósparto e da carência de berçários e creches somente o Supremo Tribunal Federal é capaz de superar os c d e bloqueios políticos e institucionais que vêm impedindo o avanço de soluções o que significa cumprir à Corte o papel de retirar os demais Poderes da inércia catalisar os debates e novas políticas públicas coordenar ações e monitorar os resultados impera no Brasil a cultura do encarceramento que se revela pela imposição exagerada de prisões provisórias a mulheres pobres e vulneráveis resultando em situações que ferem a dignidade de gestantes e mães com prejuízos para as respectivas crianças nosso país não tem conseguido garantir sequer o bemestar de gestantes e mães que não estão inseridas no sistema prisional e as crianças em especial sofrem as consequências desse quadro em flagrante violação aos arts 227 e 5º inc XLV da Constituição Federal acarretando em impactos ao seu bemestar físico e psíquico e em danos ao seu desenvolvimento92 Na carona da decisão do Supremo Tribunal Federal a Lei 137692018 acrescentou ao Código de Processo Penal os arts 318A e 318B Art 318A A prisão preventiva imposta à mulher gestante ou que for mãe ou responsável por crianças ou pessoas com deficiência será substituída por prisão domiciliar desde que I não tenha cometido crime com violência ou grave ameaça a pessoa II não tenha cometido o crime contra seu filho ou dependente Art 318B A substituição de que tratam os arts 318 e 318A poderá ser efetuada sem prejuízo da aplicação concomitante das medidas alternativas previstas no art 319 deste Código É importante destacar a aplicabilidade da prisão domiciliar somente em substituição à prisão preventiva ou seja sua incidência é vedada às mulheres privadas da liberdade em decorrência de condenação transitada em julgado Durante a execução penal contudo é cabível a progressão especial de regime prisional disciplinada pelo art 112 3º e 4º da Lei 72101984 Lei de Execução Penal 33204 O art 146B IV da Lei de Execução Penal admite a fiscalização por meio da monitoração eletrônica quando o juiz determinar a prisão domiciliar E como o art 146D II da Lei de Execução Penal autoriza a revogação da monitoração eletrônica quando o acusado violar os deveres a que estiver sujeito durante a sua vigência ou cometer falta grave abriuse espaço a esta forma de vigilância indireta no tocante aos presos provisórios É de se observar por oportuno ser cabível a revogação da prisão domiciliar na hipótese de violação comprovada nos deveres inerentes à monitoração eletrônica LEP art 146C I e II e parágrafo único VI93 A Resolução nº 5 de 10 de novembro de 2017 editada pelo Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária dispõe sobre a política de implantação de monitoração eletrônica no âmbito de medidas protetivas de urgência procedimentos investigatórios processo penal de conhecimento e de execução penal Como estabelece seu art 2º Considerase monitoração eletrônica a vigilância telemática posicional à distância de pessoas submetidas a medida cautelar condenadas por sentença transitada em julgado ou em medidas protetivas Por sua vez o art 20 dessa Resolução estatui que O uso do monitoramento eletrônico no âmbito da execução penal deve privilegiar os casos de progressão antecipada livramento condicional antecipado ou prisão domiciliar deferida em substituição à pena privativa de liberdade na hipótese de ausência de vagas no regime semiaberto ou fechado bem assim quando se estabeleça na modalidade de regime semiaberto porquanto na condição de alocação similar nos termos do art 91 da Lei 721084 Regime aberto e crimes militares A pena aplicada em razão da condenação por crime militar será cumprida em estabelecimento militar adequado Além disso a hierarquia e a disciplina inerentes às instituições militares impõem tratamento diferenciado e por esse motivo as disposições da Lei de Execução Penal serão aplicáveis apenas subsidiariamente aos condenados por crimes militares ou seja exclusivamente nas situações em que a legislação for omissa acerca de determinado assunto94 No dia 29 de junho de 2016 o Plenário do Supremo Tribunal Federal aprovou a Súmula Vinculante 56 A falta de estabelecimento penal adequado não autoriza a manutenção do condenado em regime prisional mais gravoso devendose observar nessa hipótese os parâmetros fixados no RE 641320RS O enunciado vinculante foi criado com a finalidade de evitar o cumprimento da pena privativa de liberdade em regime prisional mais gravoso do que o determinado na sentença ou no acórdão ou do que o autorizado por lei em face da ausência de vagas ou de condições específicas que o possibilitem As reconhecidas deficiências estruturais do sistema penitenciário e a incapacidade do Estado de prover recursos materiais que viabilizem a implementação de determinações impostas pela Lei de Execução Penal que constitui exclusiva obrigação do Poder Público não podem frustrar o exercício pelo condenado de direitos subjetivos que lhe foram conferidos pelo ordenamento positivo sob risco de se caracterizar o excesso de execução vedado pelo art 185 da Lei 72101984 Lei de Execução Penal Com efeito a realidade do sistema prisional brasileiro revela a violação do sistema progressivo pois os regimes semiaberto e em especial o aberto foram praticamente abandonados no âmbito da execução penal e não raras vezes a reprimenda é cumprida em sua integralidade no regime fechado misturandose os detentos que corretamente nele se encontram com aqueles que já deveriam e mereciam estar em regimes menos gravosos Essa situação fática afronta os princípios constitucionais da a b c individualização da pena que também abrange o cumprimento da pena e da legalidade uma vez que a pena é cumprida em regime diverso daquele previsto em lei O precedente jurisprudencial expressamente citado no enunciado da súmula vinculante foi o Recurso Extraordinário 641320 no qual a Corte Suprema fixou os seguintes parâmetros a falta de estabelecimento penal adequado não autoriza a manutenção do condenado em regime prisional mais gravoso os juízes da execução penal podem avaliar os estabelecimentos destinados aos regimes semiaberto e aberto para qualificação como adequados a tais regimes São aceitáveis estabelecimentos que não se qualificassem como colônia agrícola ou industrial regime semiaberto ou casa de albergado ou estabelecimento adequado regime aberto art 33 1º b e c havendo déficit de vagas deve ser determinada 1 a saída antecipada de sentenciado no regime com falta de vagas 2 a liberdade eletronicamente monitorada ao sentenciado que saia antecipadamente ou seja posto em prisão domiciliar por falta de vagas 3 o cumprimento de penas restritivas de direito eou estudo ao sentenciado que obtenha a progressão ao regime aberto95 É de se observar que no regime semiaberto a pena não precisa obrigatoriamente ser cumprida em colônia agrícola ou industrial e no regime aberto também não se afigura indispensável a execução da pena em casa de albergado De fato o art 33 1º b e c do Código Penal admite o cumprimento da pena em estabelecimento similar ou em estabelecimento adequado e essa posição foi reforçada pelo Supremo Tribunal Federal ao deixar claro que os magistrados da execução penal podem avaliar os estabelecimentos penais sob sua jurisdição para concluir se existe ou não o enquadramento na abertura permitida pelo Código Penal Finalmente há de se fazer uma importante observação A inexistência de estabelecimento penal adequado ao regime prisional determinado para o cumprimento da pena não autoriza a concessão imediata do benefício da prisão domiciliar porquanto nos termos da Súmula Vinculante 56 é imprescindível que a adoção de tal medida seja precedida das providências estabelecidas no julgamento do RE 641320RS quais sejam 1 saída antecipada de outro sentenciado no regime com falta de vagas abrindose assim vagas para os reeducandos que acabaram de progredir 2 a liberdade eletronicamente monitorada ao sentenciado que sai antecipadamente ou é posto em prisão domiciliar por falta de vagas e 3 cumprimento de penas restritivas de direitos eou estudo aos sentenciados em regime aberto96 As mulheres cumprem pena em estabelecimento próprio observandose os deveres e direitos inerentes à sua condição pessoal CP art 37 Os estabelecimentos penais destinados a mulheres deverão possuir exclusivamente agentes do sexo feminino na segurança de suas dependências internas LEP art 83 3º com a redação dada pela Lei 121212009 Essa regra coadunase com o art 5º XLVIII da Constituição Federal pela qual a pena será cumprida em estabelecimentos distintos de acordo com a natureza do delito a idade e o sexo do apenado Na mesma direção estabelece o art 82 1º da Lei de Execução Penal que a mulher e o maior 33231 a b c d de 60 sessenta anos separadamente serão recolhidos a estabelecimento próprio e adequado à sua condição pessoal A Lei Suprema também determina em seu art 5º L que às presidiárias serão asseguradas condições para que possam permanecer com seus filhos durante o período de amamentação E diz o art 89 caput da Lei de Execução Penal a penitenciária de mulheres será dotada de seção para gestante e parturiente e de creche para abrigar crianças maiores de 6 seis meses e menores de 7 sete anos com a finalidade de assistir a criança desamparada cuja responsável estiver presa Execução penal mães presas e filhos recémnascidos A Lei 119422009 em compasso com as determinações contidas no art 5º XLVIII e L da Constituição Federal introduziu diversas modificações na Lei 72101984 Lei de Execução Penal com a finalidade de assegurar às mães presas e aos recémnascidos condições mínimas de assistência Destacamse entre tais alterações as seguintes será assegurado acompanhamento médico à mulher principalmente no prénatal e no pósparto extensivo ao recémnascido LEP art 14 3º os estabelecimentos penais destinados a mulheres serão dotados de berçário onde as condenadas possam cuidar de seus filhos inclusive amamentálos no mínimo até 6 seis meses de idade LEP art 83 2º a penitenciária de mulheres será dotada de seção para gestante e parturiente e de creche para abrigar crianças maiores de 6 seis meses e menores de 7 sete anos com a finalidade de assistir criança desamparada cuja responsável estiver presa LEP art 89 caput e a seção e a creche mencionadas devem possuir como requisitos básicos I atendimento por pessoal qualificado de acordo com as diretrizes adotadas pela legislação educacional e em unidades autônomas e II horário de funcionamento que garanta a melhor 33232 assistência à criança e à sua responsável LEP art 89 parágrafo único Proibição ou não de revista íntima A Lei 132712016 foi editada com a finalidade de proibir a revista íntima em mulheres Seu art 1º contém a seguinte redação Art 1º As empresas privadas os órgãos e entidades da administração pública direta e indireta ficam proibidos de adotar qualquer prática de revista íntima de suas funcionárias e de clientes do sexo feminino O art 2º por sua vez impõe multa para quem descumprir a vedação legal sem prejuízo da indenização por danos morais e materiais e sanções de ordem penal A questão que surge diz respeito à proibição ou não da revista íntima em presas e nas demais mulheres que ingressam nos estabelecimentos penais tais como as esposas companheiras namoradas mães filhas ou irmãs dos detentos ou detentas De fato o art 1º da Lei 132712016 estende a vedação da revista íntima aos órgãos e entidades da Administração Pública mas restringe sua proteção às funcionárias e clientes do sexo feminino Esse foi o problema criado pelo legislador As presas e as demais mulheres que comparecem a qualquer título ao sistema prisional não são funcionárias muito menos clientes dos órgãos e entidades da Administração Pública O art 3º da Lei 132712016 foi vetado pela Presidência da República Seu texto era o seguinte Nos casos previstos em lei para revistas em ambientes prisionais e sob investigação policial a revista será unicamente realizada por funcionários servidores femininos Em primeira análise fica a impressão de que a proibição legal não alcança os ambientes prisionais e policiais Mas nas razões do veto a Presidência da República assim se pronunciou A redação do dispositivo possibilitaria interpretação no sentido de ser permitida a revista íntima nos estabelecimentos prisionais Além disso permitiria interpretação de que quaisquer revistas seriam realizadas unicamente por servidores femininos tanto em pessoas do sexo masculino quanto do feminino Em outras palavras o veto foi lançado justamente para evitar qualquer interpretação no sentido do cabimento da revista íntima em mulheres ou seja a finalidade da Lei 132712016 consistiu exatamente em proibir de forma absoluta o questionado procedimento Ousamos discordar da opção legislativa e também da Presidência da República A proibição da revista íntima pode e deve ser a regra no Brasil especialmente quando abusiva e desnecessária mas precisa comportar exceções Com efeito o direito da mulher de se opor à revista íntima há de ser analisado em cada caso de forma individualizada e cotejado com o princípio da proporcionalidade Na colisão de direitos fundamentais é preciso conformar o direito à privacidade da mulher com o direito da coletividade e também da própria mulher à segurança pública expressamente consagrado nos arts 5º caput e 144 caput da Constituição Federal Como se sabe a segurança pública além de figurar como dever do Estado é direito e responsabilidade de todos indistintamente Não se pode utilizar da fórmula legal para permitir a impunidade de quem optou por violar as normas penais e também não é razoável abrir uma brecha para a prática de crimes e para a facilitação de outros delitos a exemplo do que se dá quando mulheres escondem drogas aparelhos de telefonia celular e até mesmo armas lâminas canivetes etc em suas regiões íntimas para levá las ao interior de estabelecimentos penais A Lei 132712016 como qualquer outro diploma normativo busca proteger as mulheres contra atuações inoportunas e excessivas e nesse ponto merece ser louvada Entretanto deve ser interpretada com bom senso e coerência harmonizandose com as regras e princípios que norteiam nosso ordenamento jurídico Nos termos do art 38 do Código Penal O preso conserva todos os direitos não atingidos pela perda da liberdade impondose a todas as 33241 autoridades o respeito à sua integridade física e moral Esse dispositivo encontrase em sintonia com o art 5º XLIX da Constituição Federal é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral Os arts 40 e 41 da Lei de Execução Penal arrolam diversos direitos dos presos tais como alimentação suficiente e vestuário atribuição de trabalho e sua remuneração assistência material jurídica educacional social religiosa e à saúde entrevista direta com o advogado chamamento nominal avistarse com o diretor do presídio contato com o mundo exterior por meio de correspondência escrita da leitura e de outros meios de informação que não comprometam a moral e os bons costumes atestado de pena a cumprir emitido anualmente etc Nos termos do art 83 5º da Lei de Execução Penal com redação atribuída pela Lei 123132010 nos estabelecimentos penais existirá obrigatoriamente instalação destinada à Defensoria Pública instituição que entre outras atribuições velará pela regular execução da pena e da medida de segurança oficiando no processo executivo e nos incidentes da execução para a defesa dos necessitados em todos os graus e instâncias de forma individual e coletiva LEP art 81A A Resolução Conjunta 01 de 15 de abril de 2014 editada pelo CNPCP Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária e pelo CNCDLGBT Conselho Nacional de Combate à Discriminação estabelece os parâmetros de acolhimento da população LGBT lésbicas gays bissexuais travestis e transexuais em privação de liberdade no Brasil A questão da visita íntima O art 41 X da Lei de Execução Penal assegura ao preso o direito de visita do cônjuge da companheira de parentes e amigos em dias determinados Cuidase de medida destinada a preparar o retorno do condenado ao convívio social bem como a manter seus laços de matrimônio parentesco e amizade Todavia a Lei de Execução Penal não previu o direito à visita íntima isto 33242 é o encontro reservado no interior do estabelecimento penal com o cônjuge companheira ou namorada para a realização de atos sexuais Esta prática contudo é habitual nos presídios e tem sido autorizada pela direção dos estabelecimentos com a finalidade de controlar as sevícias sexuais entre os internos bem como a preservar os laços de relacionamento afetivo entre casais separados pelo cumprimento da pena97 No tocante aos presídios federais o Decreto 60492007 art 95 caput e parágrafo único previu expressamente o direito à visita íntima Com a finalidade de regulamentar esse decreto a Portaria 718 de 28 de agosto de 2017 do Ministério da Justiça e Segurança Pública disciplina a visita íntima no interior das Penitenciárias Federais Por sua vez a Resolução 4 de 29 de junho de 2011 editada pelo Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária órgão do Ministério da Justiça recomenda aos departamentos penitenciários estaduais ou órgãos congêneres seja assegurado o direito à visita íntima a pessoa presa recolhida nos estabelecimentos prisionais no tocante às relações heteroafetivas ou homoafetivas Limitação ao uso de algemas Nos termos da Súmula Vinculante 11 do Supremo Tribunal Federal Só é lícito o uso de algemas em caso de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia por parte do preso ou de terceiros justificada a excepcionalidade por escrito sob pena de responsabilidade disciplinar civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado98 Para a Corte Suprema o uso de algemas como regra encontrase em confronto com a ordem jurídicoconstitucional O princípio da presunção de não culpabilidade impõe aos acusados em geral o tratamento devido aos seres humanos aos que vivem em um Estado Democrático de Direito Além disso o art 1º III da Constituição Federal aponta como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil a dignidade da pessoa humana e da leitura do rol das garantias constitucionais previstas no art 5º incs XIX LXI XLIX LXI LXIII LXIV LXV LXVI XLVIII depreendese a preocupação em se resguardar a figura do preso repousando tais preceitos no inafastável tratamento humanitário do cidadão na imprescindibilidade de lhe ser preservada a dignidade E nos palcos forenses a manutenção do acusado algemado implicaria em colocar a defesa antecipadamente em patamar inferior especialmente no Tribunal do Júri composto por pessoas leigas que tiram ilações diversas acerca do contexto indicativo da periculosidade do réu Para fundamentar a Súmula Vinculante o Supremo Tribunal Federal registrou que a proibição do uso de algemas e do uso da força já era prevista nos tempos do Império Decreto de 2351821 e Código de Processo Criminal do Império de 29111832 art 180 e que houve manutenção dessas normas no ordenamento jurídico brasileiro subsequente Lei 2611841 Lei 20331871 regulamentada pelo Decreto 48241871 Código de Processo Penal de 1941 arts 284 e 292 Lei de Execução Penal LEP 72101984 art 159 Código de Processo Penal Militar arts 234 1º e 242 Citouse ademais o disposto no item 3 das regras da Organização das Nações Unidas ONU para o tratamento de prisioneiros no sentido de que o emprego de algemas jamais poderá se dar como medida de punição Destarte concluiuse ser excepcional o uso de algemas o qual somente pode ocorrer nos casos em que realmente se mostre indispensável para impedir ou evitar a fuga do preso ou quando se cuidar comprovadamente de perigoso prisioneiro circunstâncias que devem ser objeto de decisão judicial fundamentada99 Além disso o Supremo Tribunal Federal mencionou que a Lei 116892008 ao promover profundas reformas no Código de Processo Penal tornou estreme de dúvidas a excepcionalidade do uso de algemas Art 474 3º Não se permitirá o uso de algemas no acusado durante o período em que permanecer no plenário do júri salvo se absolutamente necessário à ordem dos trabalhos à segurança das testemunhas ou à garantia da integridade física dos presentes A propósito a Corte Suprema já rejeitou pedido de cancelamento da Súmula Vinculante 11 com a seguinte fundamentação O Plenário rejeitou proposta de cancelamento do Enunciado 11 da Súmula Vinculante Só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia por parte do preso ou de terceiros justificada a excepcionalidade por escrito sob pena de responsabilidade disciplinar civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado No caso a proponente Confederação Brasileira dos Trabalhadores Policiais Civis Cobrapol afirmava que a edição do enunciado em questão teria usurpado a função do Poder Legislativo Ressaltava ademais o quanto disposto no art 199 da Lei de Execução Penal O emprego de algemas será disciplinado por decreto federal apontando então que se ainda não há decreto federal que regulamente a utilização de algemas caberia aos interessados ajuizar mandado de injunção A Corte asseverou que para admitirse a revisão ou o cancelamento de súmula vinculante seria necessário demonstrar a a evidente superação da jurisprudência do STF no trato da matéria b a alteração legislativa quanto ao tema ou ainda c a modificação substantiva de contexto político econômico ou social A proponente porém não teria comprovado a existência dos aludidos pressupostos assim como não teria se desincumbido do ônus de apresentar decisões reiteradas do STF que demonstrassem a desnecessidade de vigência do enunciado em questão o que impossibilitaria o exame da presente proposta de cancelamento Por fim cumpriria destacar que o mero descontentamento ou eventual divergência quanto ao conteúdo de verbete vinculante não autorizariam a rediscussão da matéria100 No dia 26 de setembro de 2016 foi editado o Decreto 8858 com a finalidade de regulamentar o art 199 da Lei 72101984 Lei de Execução cuja redação é a seguinte Art 199 O emprego de algemas será disciplinado por decreto federal A partir de então o emprego de algemas deve observar as seguintes diretrizes I art 1º inc III e o art 5º inc III ambos da Constituição Federal que dispõem sobre a dignidade da pessoa humana e a proibição de tratamento desumano ou degradante II a Resolução 20102016 da Organização das Nações Unidas sobre o tratamento de mulheres presas e medidas não privativas de liberdade para mulheres infratoras Regras de Bangkok e III o Pacto de San José da Costa Rica incorporado ao direito brasileiro pelo Decreto 6781992 que determina o tratamento humanitário dos presos e em especial das mulheres em condição de vulnerabilidade Além disso o Decreto 88582016 acompanhou a sistemática da Súmula Vinculante 11 e no seu art 2º admitiu o uso de algemas apenas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia causado pelo preso ou por terceiros justificada a sua excepcionalidade por escrito Finalmente o art 3º do Decreto 88582016 veda o emprego de algemas em mulheres presas em qualquer unidade do sistema penitenciário nacional durante o trabalho de parto no trajeto da parturiente entre a unidade prisional e a unidade hospitalar e após o parto durante o período em que se encontrar hospitalizada A análise conjunta da Súmula Vinculante 11 e do Decreto 88582016 autoriza as seguintes conclusões O Supremo Tribunal Federal já decidiu pela inaplicabilidade da Súmula Vinculante 11 à situação em que a autoridade policial apresentou um preso algemado à imprensa no dia seguinte à prisão Como corolário da não incidência do enunciado vinculante a eventual responsabilização do Estado ou dos agentes públicos envolvidos no ato deve ser buscada pelas vias adequadas A apresentação do custodiado algemado à imprensa pelas autoridades policiais não afronta o Enunciado 11 da Súmula Vinculante Só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia por parte do preso ou de terceiros justificada a excepcionalidade por escrito sob pena de responsabilidade disciplinar civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado Com base nessa orientação a Primeira Turma julgou improcedente reclamação ajuizada por custodiado que preso preventivamente por ordem judicial fora apresentado algemado à imprensa por policiais civis estaduais A Turma asseverou que a decisão judicial que determinara a segregação do reclamante não determinara o uso de algemas Destacou que embora evidenciado o emprego injustificado do referido artefato seu manuseio decorrera de ato administrativo da autoridade policial situação não abarcada pelo verbete que se refere à prática de ato processual As algemas teriam sido utilizadas um dia após a prisão quando o reclamante já se encontrava na delegacia de polícia tão somente no momento da exibição dos presos à imprensa Assim eventual responsabilização do Estado ou dos agentes envolvidos decorrente dos fatos noticiados na inicial deve ser buscada na via apropriada101 A Corte Suprema todavia possui entendimento diverso no sentido da nulidade do ato processual e da responsabilidade disciplinar civil e penal do agente ou autoridade quando a utilização indevida de algemas ocorre em atividade relacionada à persecução penal Por fim a Turma ressaltou que durante o transporte o paciente foi exibido às câmeras de televisão algemado por pés e mãos a despeito de sua aparente passividade em afronta ao Enunciado 11 da Súmula Vinculante O uso infundado de algemas é causa suficiente para invalidar o ato processual Considerou ainda que o abuso no uso de algemas também enseja a responsabilidade disciplinar civil e penal do agente ou da autoridade102 33243 O parágrafo único do art 292 do Código de Processo Penal com a redação dada pela Lei 134342017 estatui ser vedado o uso de algemas em mulheres grávidas durante os atos médicohospitalares preparatórios para a realização do parto e durante o trabalho de parto bem como em mulheres durante o período de puerpério imediato A bem da verdade essa regra sequer precisaria estar prevista no Código de Processo Penal ou em outra lei qualquer Tratase de imposição humanista em sintonia com o especial e sagrado momento do nascimento de um novo ser A separação dos presos nos estabelecimentos penais A Lei 131672015 efetuou mudanças na Lei de Execução Penal com o propósito de estabelecer critérios para a separação de presos nos estabelecimentos penais Inicialmente os presos provisórios ou seja aqueles indivíduos sujeitos à privação da liberdade antes do trânsito em julgado da condenação em virtude de prisão em flagrante prisão temporária ou prisão preventiva devem ficar separados dos presos definitivamente condenados Porém isso não basta É necessária a distinção entre os presos provisórios e também entre os presos definitivos De fato os presos provisórios ficarão separados de acordo com os seguintes critérios I os acusados pela prática de crimes hediondos ou equiparados tráfico de drogas tortura e terrorismo II os acusados pela prática de delitos cometidos com violência à pessoa ou grave ameaça e III os acusados pela prática de crimes diversos ou de contravenções penais LEP art 84 1º Por sua vez os presos definitivamente condenados serão separados levando em conta os seguintes parâmetros I condenados pela prática de crimes hediondos ou equiparados pouco importa se primários ou reincidentes II reincidentes condenados pela prática de delitos cometidos com violência à pessoa ou grave ameaça III primários condenados pela prática de crimes cometidos com violência à pessoa ou grave ameaça e IV 33244 demais condenados pela prática de outros crimes ou contravenções penais LEP art 84 3º De seu turno o preso que ao tempo do fato era funcionário da Administração da Justiça Criminal a exemplo dos carcereiros agentes penitenciários e diretores de presídios ficará em dependência separada LEP art 84 2º Finalmente o preso que tiver sua integridade física moral ou psicológica ameaçada pela convivência com os demais presos ficará segregado em local próprio ou seja isolado dos demais detentos LEP art 84 4º Obras emergenciais em presídios a reserva do possível e a separação dos Poderes do Estado O sistema prisional brasileiro enfrenta um verdadeiro caos estrutural Isso é notório e está fora de qualquer discussão jurídica Falase inclusive na configuração de um estado de coisas inconstitucional103 expressão utilizada pela Corte Constitucional da Colômbia para se referir ao quadro problemático dotado das seguintes características a violação generalizada e sistêmica de direitos fundamentais b inércia ou incapacidade reiterada e persistente das autoridades públicas em modificar a conjuntura e c transgressões a exigir a atuação não apenas de um órgão e sim de uma pluralidade de autoridades Nesse contexto o Poder Judiciário pode e deve determinar à Administração Pública a adoção de providências eficazes para promover medidas ou efetuar obras emergenciais em estabelecimentos prisionais visando o respeito à dignidade da pessoa humana e à integridade física e moral dos presos na forma determinada pela Constituição Federal de modo a evitar a inaceitável coisificação dos detentos os quais jamais podem ser tratados como meros objetos em decorrência da simples e indestrutível condição de seres humanos Esta postura ativa do Poder Judiciário não afronta o princípio da separação dos Poderes CF art 2º e não pode ser limitada pela cláusula da reserva do possível pela qual a Administração Pública deve cumprir suas obrigações na medida das suas possibilidades Vale a pena acompanhar um lúcido julgado do Supremo Tribunal Federal sobre o tema É lícito ao Poder Judiciário impor à Administração Pública obrigação de fazer consistente na promoção de medidas ou na execução de obras emergenciais em estabelecimentos prisionais para dar efetividade ao postulado da dignidade da pessoa humana e assegurar aos detentos o respeito à sua integridade física e moral nos termos do que preceitua o art 5º XLIX da CF não sendo oponível à decisão o argumento da reserva do possível nem o princípio da separação dos poderes Essa a conclusão do Plenário que proveu recurso extraordinário em que discutida a possibilidade de o Poder Judiciário determinar ao Poder Executivo estadual obrigação de fazer consistente na execução de obras em estabelecimentos prisionais a fim de garantir a observância dos direitos fundamentais dos presos O Colegiado assentou tratarse na espécie de estabelecimento prisional cujas condições estruturais seriam efetivamente atentatórias à integridade física e moral dos detentos Pontuou que a pena deveria ter caráter de ressocialização e que impor ao condenado condições subhumanas atentaria contra esse objetivo Entretanto o panorama nacional indicaria que o sistema carcerário como um todo estaria em quadro de total falência tendo em vista a grande precariedade das instalações bem assim episódios recorrentes de sevícias torturas execuções sumárias revoltas superlotação condições precárias de higiene entre outros problemas crônicos Esse evidente caos institucional comprometeria a efetividade do sistema como instrumento de reabilitação social Além disso a questão afetaria também estabelecimentos destinados à internação de menores O quadro revelaria desrespeito total ao postulado da dignidade da pessoa humana em que haveria um processo de coisificação de presos a indicar retrocesso relativamente à lógica jurídica atual A sujeição de presos a penas a ultrapassar mera privação de liberdade prevista na lei e na sentença seria um ato ilegal do Estado e retiraria da sanção qualquer potencial de ressocialização A temática envolveria a violação de normas constitucionais infraconstitucionais e internacionais Dessa forma caberia ao Judiciário intervir para que o conteúdo do sistema constitucional fosse assegurado a qualquer jurisdicionado de acordo com o postulado da inafastabilidade da jurisdição Os juízes seriam 33245 assegurados do poder geral de cautela mediante o qual lhes seria permitido conceder medidas atípicas sempre que se mostrassem necessárias para assegurar a efetividade do direito buscado No caso os direitos fundamentais em discussão não seriam normas meramente programáticas sequer se trataria de hipótese em que o Judiciário estaria ingressando indevidamente em campo reservado à Administração Não haveria falar em indevida implementação de políticas públicas na seara carcerária à luz da separação dos poderes Ressalvou que não seria dado ao Judiciário intervir de ofício em todas as situações em que direitos fundamentais fossem ameaçados Outrossim não caberia ao magistrado agir sem que fosse provocado transmudandose em administrador público O juiz só poderia intervir nas situações em que se evidenciasse um não fazer comissivo ou omissivo por parte das autoridades estatais que colocasse em risco de maneira grave e iminente os direitos dos jurisdicionados104 Superlotação carcerária e responsabilidade civil do Estado A superlotação carcerária no Brasil é inegável e caracterizada principalmente pela falta de investimentos do Poder Público para proporcionar o atendimento dos mandamentos impostos pela Lei 72101984 Lei de Execução Penal Para o Supremo Tribunal Federal o Estado tem o dever de indenizar os detentos pelos danos materiais e morais suportados e não se aplica para elidir sua responsabilidade civil a cláusula da reserva do possível O julgado nada obstante longo é de leitura obrigatória Considerando que é dever do Estado imposto pelo sistema normativo manter em seus presídios os padrões mínimos de humanidade previstos no ordenamento jurídico é de sua responsabilidade nos termos do art 37 6º da Constituição a obrigação de ressarcir os danos inclusive morais comprovadamente causados aos detentos em decorrência da falta ou insuficiência das condições legais de encarceramento Consoante o acórdão restabelecido estaria caracterizado o dano moral porque após laudo de vigilância sanitária no presídio e decorrido lapso temporal não teriam sido sanados os problemas de superlotação e de falta de condições mínimas de saúde e de higiene do estabelecimento penal Além disso não sendo assegurado o mínimo existencial seria inaplicável a teoria da reserva do possível Registrou de início a inexistência de controvérsia a respeito dos fatos da causa e da configuração do dano moral haja vista o reconhecimento pelo próprio acórdão recorrido da precariedade do sistema penitenciário estadual que lesou direitos fundamentais do recorrente quanto à dignidade intimidade higidez física e integridade psíquica Portanto sendo incontroversos os fatos da causa e a ocorrência do dano afirmou que a questão jurídica desenvolvida no recurso ficou restrita à reparabilidade ou seja à existência ou não da obrigação do Estado de ressarcir os danos morais verificados nas circunstâncias enunciadas Em seguida consignou que a matéria jurídica está no âmbito da responsabilidade civil do Estado de responder pelos danos até mesmo morais causados por ação ou omissão de seus agentes nos termos do art 37 6º da CF preceito normativo autoaplicável que não se sujeita a intermediação legislativa ou a providência administrativa de qualquer espécie Ocorrido o dano e estabelecido o seu nexo causal com a atuação da Administração ou dos seus agentes nasce a responsabilidade civil do Estado Sendo assim e tendo em conta que no caso a configuração do dano é matéria incontroversa não há como acolher os argumentos que invocam para negar o dever estatal de indenizar o princípio da reserva do possível na dimensão reducionista de significar a insuficiência de recursos financeiros Frisou que o Estado é responsável pela guarda e segurança das pessoas submetidas a encarceramento enquanto ali permanecerem detidas e que é seu dever mantêlas em condições carcerárias com mínimos padrões de humanidade estabelecidos em lei bem como se for o caso ressarcir os danos que daí decorrerem Ademais asseverou que as violações a direitos fundamentais causadoras de danos pessoais a detentos em estabelecimentos carcerários não poderiam ser relevadas ao argumento de que a indenização não teria o alcance para eliminar o grave problema prisional globalmente considerado dependente da definição e da implantação de políticas públicas específicas providências de atribuição legislativa e administrativa não de provimentos judiciais Sustentou que admitir essa assertiva significaria justificar a perpetuação da desumana situação constatada em presídios como aquele onde cumprida a pena do recorrente Relembrou que a garantia mínima de segurança pessoal física e psíquica dos detentos constitui dever estatal que tem amplo lastro não apenas no ordenamento nacional CF art 5º XLVII e XLVIII XLIX Lei 72101984 LEP arts 10 11 12 40 85 87 88 Lei 94551997 crime de tortura Lei 128742013 Sistema Nacional de Prevenção e Combate à Tortura como também em fontes normativas internacionais adotadas pelo Brasil Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos das Nações Unidas Convenção Americana de Direitos Humanos Princípios e Boas Práticas para a Proteção de Pessoas Privadas de Liberdade nas Américas contida na Resolução 12008 aprovada pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos Convenção da Organização das Nações Unidas contra Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis Desumanos ou Degradantes Regras Mínimas para o Tratamento de Prisioneiros adotadas no 1º Congresso das Nações Unidas para a Prevenção ao Crime e Tratamento de Delinquentes A criação de subterfúgios teóricos como a separação dos Poderes a reserva do possível e a natureza coletiva dos danos sofridos para afastar a responsabilidade estatal pelas calamitosas condições da carceragem afronta não apenas o sentido do art 37 6º da CF mas também determina o esvaziamento das inúmeras cláusulas constitucionais e convencionais citadas O descumprimento reiterado dessas cláusulas se transforma em mero e inconsequente ato de fatalidade o que não pode ser tolerado105 O trabalho do preso será sempre remunerado sendolhe garantidos os benefícios da Previdência Social CP art 39 O trabalho do preso além de remunerado é obrigatório Sua negativa 33251 injustificada caracteriza falta grave LEP art 51 III cc o art 39 V e impede a progressão de regime prisional e o livramento condicional Revela se como uma das principais formas de ressocialização do condenado retirandolhe do ócio e motivandoo à reinserção social mediante atividade honesta O fato de ser obrigatório todavia não equivale a dizer que o trabalho é forçado Trabalho forçado terminantemente proibido pelo art 5º XLVII c da Constituição Federal é o não remunerado e obtido do preso com o uso de castigos físicos Como destacado pelo Superior Tribunal de Justiça Constitui falta grave na execução penal a recusa injustificada do condenado ao exercício de trabalho interno O art 31 da Lei 72101984 LEP determina a obrigatoriedade do trabalho ao apenado condenado à pena privativa de liberdade na medida de suas aptidões e capacidades sendo sua execução nos termos do art 39 V da referida Lei um dever do apenado O art 50 VI da LEP por sua vez classifica como falta grave a inobservância do dever de execução do trabalho Ressaltese a propósito que a pena de trabalho forçado vedada no art 5º XLVIII c da CF não se confunde com o dever de trabalho imposto ao apenado ante o disposto no art 6º 3 da Convenção Americana de Direitos Humanos Pacto San José da Costa Rica segundo o qual os trabalhos ou serviços normalmente exigidos de pessoa reclusa em cumprimento de sentença ou resolução formal expedida pela autoridade judiciária competente não constituem trabalhos forçados ou obrigatórios vedados pela Convenção106 Política Nacional de Trabalho no sistema prisional O Decreto 94502018 instituiu a Política Nacional de Trabalho no âmbito do sistema prisional voltada à ampliação e qualificação da oferta de vagas de trabalho ao empreendedorismo e à formação profissional das pessoas presas e egressas do sistema prisional De acordo com o art 40 do Código Penal a legislação especial regulará 33271 a matéria prevista nos arts 38 e 39 deste Código bem como especificará os deveres e direitos do preso os critérios para revogação e transferência dos regimes e estabelecerá as infrações disciplinares e correspondentes sanções Essa lei especial é a Lei 72101984 Lei de Execução Penal A remição é o benefício de competência do juízo da execução consistente no abatimento de parte da pena privativa de liberdade pelo trabalho ou pelo estudo Na tradição brasileira da execução penal a remição sempre foi atrelada ao trabalho do preso Com a evolução dos tempos e almejando especialmente a ressocialização do condenado doutrina e jurisprudência passaram a inclinarse pelo seu reconhecimento também nas hipóteses do estudo posição que ganhou força com a edição da Súmula 341 do Superior Tribunal de Justiça A frequência a curso de ensino formal é causa de remição de parte do tempo de execução de pena sob regime fechado ou semiaberto Esta linha de pensamento se consolidou agora no plano normativo com a entrada em vigor da Lei 124332011 responsável pela alteração da Lei 72101984 Lei de Execução Penal conferindo nova disciplina jurídica ao instituto Por razões didáticas analisaremos separadamente a remição pelo trabalho e a remição pelo estudo Remição pelo trabalho Em relação ao trabalho a remição consiste no desconto de 1 um dia de pena a cada 3 três dias de trabalho exclusivamente em favor do preso que cumpre pena no regime fechado ou semiaberto LEP art 126 1º inc II A atividade laborativa do condenado pode ser realizada no estabelecimento penal em que a pena é cumprida ou então em local externo É o que se extrai da Súmula 562 do Superior Tribunal de Justiça É possível a remição de parte do tempo de execução da pena quando o condenado em regime fechado ou semiaberto desempenha atividade laborativa ainda que extramuros Esse entendimento fundamentase em duas razões a a Lei de Execução Penal não faz distinção entre os trabalhos intra ou extramuros e b nos dois casos operase a ressocialização do condenado O instituto não pode ser aplicado ao condenado que cumpre pena no regime aberto Com efeito além de ter o art 126 caput da Lei de Execução Penal limitado seu campo de abrangência aos regimes fechado e semiaberto o regime aberto pressupõe o trabalho do preso e sua recusa autoriza até mesmo a regressão de regime prisional CP art 36 1º e 2º Em verdade o condenado deverá fora do estabelecimento carcerário e sem vigilância trabalhar frequentar curso ou exercer outra atividade autorizada permanecendo preso durante o período noturno e nos dias de folga Destarte atuando como seu pressuposto não pode lhe proporcionar benefícios Na linha da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal O apenado que cumpre pena em regime aberto não tem jus à remição pelo trabalho nos termos do art 126 da Lei de Execução Penal Asseverouse que a racionalidade disso estaria no art 36 1º do CP que aduz ser necessário que o apenado que cumpre pena em regime aberto trabalhe frequente curso ou exerça outra atividade autorizada Evidenciouse destarte que a realização de atividade laboral nesse regime de cumprimento de pena não seria como nos demais estímulo para que o condenado trabalhando tivesse direito à remição da pena na medida em que nesse regime o labor não seria senão pressuposto da nova condição de cumprimento de pena107 Somente pode ser considerada para fins de remição a jornada completa de trabalho ou seja quem laborar menos de 6 seis horas em um dia não terá direito ao abatimento E não é possível ao condenado aproveitar o excedente às 8 oito horas de trabalho na mesma data De fato estabelece o art 33 da Lei de Execução Penal que a jornada normal de trabalho não será inferior a 6 seis nem superior a 8 oito horas com descanso nos domingos e feriados Como já decidido pelo Supremo Tribunal Federal O cálculo da remição da pena será efetuado pelos dias trabalhados pelo condenado e não pelas horas nos termos da Lei de Execução Penal Lei 721084 Com base nesse entendimento a 2ª Turma denegou habeas corpus em que se discutia a possibilidade de se adotar o critério de dezoito horas para um dia remido com o mínimo de seis horas como correspondente a uma jornada de trabalho Enfatizouse que nos termos dos artigos 33 e 126 da LEP a contagem é feita pelos dias trabalhados pelo apenado à razão de 1 um dia de pena a cada 3 três dias de trabalho LEP art 126 1º II108 A Suprema Corte contudo já autorizou a remição na hipótese de jornada de trabalho diária inferior a seis horas quando isso ocorreu em virtude de cumprimento de determinação da administração do estabelecimento prisional A Segunda Turma deu provimento a recurso ordinário em habeas corpus e concedeu a ordem para que seja considerado para fins de remição da pena o total de horas trabalhadas em jornada diária inferior a seis horas O Colegiado anotou que o condenado cumpria jornada de quatro horas diárias de trabalho por determinação da administração do presídio Ponderou que nos termos da Lei de Execução Penal LEP a jornada diária não deve ser inferior a seis nem superior a oito horas Afirmou que para computar os dias de remição a administração penitenciária somou as horas trabalhadas e as dividiu por seis A Turma concluiu que ao fazer a conversão matemática do cálculo da remição a administração penitenciária agiu dentro dos limites previstos na LEP Asseverou que o condenado não poderia ser apenado por um limite de horas imposto pelo próprio estabelecimento penitenciário na execução de sua pena Por fim deliberou que a obrigatoriedade do cômputo de tempo de trabalho deve ser aplicada às hipóteses em que o sentenciado por determinação da administração cumpra jornada inferior ao mínimo de seis horas ou seja em que a jornada de trabalho não derive de ato voluntário nem de indisciplina ou insubmissão do preso109 No cálculo da remição devem ser considerados os dias efetivamente trabalhados ainda que nos domingos e feriados e sem autorização do juízo da execução ou da direção do estabelecimento prisional O que importa é a busca pela ressocialização a qual fica mais próxima com o desempenho da 33272 atividade laborativa Como destacado pelo Superior Tribunal de Justiça Se o preso ainda que sem autorização do juízo ou da direção do estabelecimento prisional efetivamente trabalhar nos domingos e feriados esses dias deverão ser considerados no cálculo da remição da pena A remição da pena pelo trabalho se perfaz à razão de 1 dia de pena a cada 3 dias de trabalho conforme o regramento do art 126 1º II da LEP E nos termos do art 33 do mesmo estatuto considerase dia trabalhado aquele em que cumprida jornada não inferior a 6 nem superior a 8 horas Assim a remição da pena pelo trabalho nos termos do art 33 cc o art 126 1º é realizada à razão de um dia de pena a cada três dias de trabalho cuja jornada diária não seja inferior a 6 nem superior a 8 horas o que impõe para fins de cálculo a consideração dos dias efetivamente trabalhados110 Poderá ser atribuído horário especial de trabalho aos presos designados para os serviços de conservação e manutenção do estabelecimento penal LEP art 33 parágrafo único O trabalho do preso deve ser descrito em relatório detalhado indicando as atividades desempenhadas e seus respectivos horários LEP art 129 caput Remição pelo estudo No tocante ao estudo111 a remição representa o abatimento de 1 um dia de pena a cada 12 doze horas de frequência escolar divididas em no mínimo 3 três dias em atividade de ensino fundamental médio inclusive profissionalizante ou superior ou ainda de requalificação profissional LEP art 126 1º I O limite máximo para o estudo do preso é de 4 quatro horas diárias As atividades superiores a esta quantidade não podem ser reconhecidas para fins de remição mas nada impede o acúmulo de 12 doze horas de estudo em período mais dilatado a exemplo daquele que estuda duas horas diárias ao longo de seis dias Portanto embora inovando com o estudo a Lei 124332011 manteve a tradição de permitir o desconto de um dia de pena para no mínimo três de aprendizado E há uma regra importante a ser destacada estimulante e representativa de autêntico prêmio ao sujeito dedicado que conduziu com seriedade as atividades que lhe foram atribuídas O tempo a remir em função das horas de estudo será acrescido de 13 um terço no caso de conclusão do ensino fundamental médio ou superior durante o cumprimento da pena desde que certificada pelo órgão competente do sistema de educação LEP art 126 5º112 É fácil notar pela leitura da lei que este plus somente terá cabimento para a conclusão verificada durante a execução da pena e não incide na seara das atividades profissionalizantes e de requalificação profissional A propósito o Superior Tribunal de Justiça reconheceu o cabimento desse prêmio na hipótese de aprovação no ENEM diante do aproveitamento do estudo realizado durante a execução da pena 2 Esta Corte possui orientação no sentido de que a norma do art 126 da LEP ao possibilitar a abreviação da pena tem por objetivo a ressocialização do condenado sendo possível o uso da analogia in bonam partem que admita o benefício em comento em razão de atividades que não estejam expressas no texto legal REsp n 744032SP Ministro Felix Fischer Quinta Turma DJe 562006 3 No caso a aprovação da paciente no ENEM Exame Nacional do Ensino Médio configura aproveitamento dos estudos realizados durante a execução da pena conforme o art 126 da LEP e Recomendação nº 442013 do CNJ 4 Essa particular forma de parametrar a interpretação da lei no caso a LEP é a que mais se aproxima da Constituição Federal que faz da cidadania e da dignidade da pessoa humana dois de seus fundamentos incisos II e III do art 1º Mais Constituição que tem por objetivos fundamentais erradicar a marginalização e construir uma sociedade livre justa e solidária incisos I e III do art 3º Tudo na perspectiva da construção do tipo ideal de sociedade que o preâmbulo de nossa Constituição caracteriza como fraterna HC 94163 Relatora Min Carlos Britto Primeira Turma julgado em 02122008 5 Com efeito a interpretação dada ao art 126 da LEP pelo Superior Tribunal de Justiça decorre indiscutivelmente desse resgate constitucional do princípio da fraternidade113 Na linha da evolução tecnológica dos sistemas de educação as atividades de estudo poderão ser desenvolvidas de forma presencial ou por metodologia de ensino a distância no interior do estabelecimento penal ou fora dele Em qualquer hipótese deverão ser certificadas pelas autoridades educacionais competentes dos cursos frequentados LEP art 126 2º Se a instituição de ensino se situar fora dos limites do recinto penal o preso deverá obter autorização do diretor do estabelecimento para comparecer às aulas Nesse caso o reeducando terá que comprovar mensalmente por meio de declaração da respectiva unidade de ensino a frequência e o aproveitamento escolar LEP art 129 1º A Lei 124332011 além de assegurar a remição da pena privativa de liberdade pelo estudo aos presos alocados nos regimes fechado e semiaberto inovou ao permitir o benefício aos condenados que cumprem pena no regime aberto bem como àqueles que se encontram no período de prova do livramento condicional pela frequência a curso de ensino regular ou de educação profissional LEP art 126 6º No regime aberto e no livramento condicional é importante frisar a admissibilidade da remição unicamente pelo estudo Como se sabe em tais situações o trabalho é obrigatório CP arts 36 1º e 83 III Em síntese o condenado deve trabalhar para permanecer no regime aberto ou no livramento condicional e se desejar abreviar sua pena ou período de prova poderá estudar na razão de 12 doze horas de frequência escolar divididas em no mínimo 3 três dias para cada dia da sanção penal ou do período de prova Na esfera da União a Portaria Conjunta 2762012 do Conselho da Justiça Federal CJF e da DiretoriaGeral do Departamento Penitenciário Nacional DEPEN do Ministério da Justiça disciplinou a remição pela leitura para os presos de regime fechado custodiados em penitenciárias federais de segurança máxima Na seara do Poder Judiciário a Resolução CNJ 442013 dispõe sobre atividades educacionais complementares para fins de remição da pena pelo estudo e estabelece critérios para a admissão pela leitura Com fundamento na sua íntima relação com o estudo e também em sua capacidade de colaborar para a ressocialização do apenado a remição pela leitura tem sido admitida pelo Superior Tribunal de Justiça A atividade de leitura pode ser considerada para fins de remição de parte do tempo de execução da pena O art 126 da LEP redação dada pela Lei 124332011 estabelece que o condenado que cumpre a pena em regime fechado ou semiaberto poderá remir por trabalho ou por estudo parte do tempo de execução da pena De fato a norma não prevê expressamente a leitura como forma de remição No entanto antes mesmo da alteração do art 126 da LEP que incluiu o estudo como forma de remir a pena o STJ em diversos julgados já previa a possibilidade Em certa oportunidade salientou que a norma do art 126 da LEP ao possibilitar a abreviação da pena tem por objetivo a ressocialização do condenado sendo possível o uso da analogia in bonam partem que admita o benefício em comento em razão de atividades que não estejam expressas no texto legal REsp 744032SP Quinta Turma DJe 562006 O estudo está estreitamente ligado à leitura e à produção de textos atividades que exigem dos indivíduos a participação efetiva enquanto sujeitos ativos desse processo levandoos à construção do conhecimento A leitura em si tem a função de propiciar a cultura e possui caráter ressocializador até mesmo por contribuir na restauração da autoestima Além disso a leitura diminui consideravelmente a ociosidade dos presos e reduz a reincidência criminal Sendo um dos objetivos da LEP ao instituir a remição incentivar o bom comportamento do sentenciado e sua readaptação ao convívio social impõese a interpretação extensiva do mencionado dispositivo o que revela inclusive a crença do Poder Judiciário na leitura como método factível para o alcance da harmônica reintegração à vida em sociedade Além do mais em 2062012 a Justiça Federal e o Departamento Penitenciário Nacional do Ministério da Justiça Depen já haviam assinado a Portaria Conjunta 276 a qual disciplina o Projeto da Remição pela Leitura no Sistema Penitenciário Federal E em 26112013 o CNJ considerando diversas disposições normativas inclusive os arts 126 a 129 da LEP com a redação dada pela Lei 124332011 a Súmula 341 do STJ e a referida portaria conjunta editou a Recomendação 44 tratando das atividades educacionais complementares para fins de remição da pena pelo estudo e estabelecendo critérios para a admissão pela leitura114 Nesse contexto o Superior Tribunal de Justiça tem admitido a remição pelo estudo baseada na leitura e resenha de livros mesmo quando o estabelecimento penal permite o acesso a atividades laborativas e à educação formal nesses casos a leitura será computada a título de remição de forma concomitante e complementar De fato também nessa hipótese existe a recuperação para a vida em sociedade como meta a ser atingida pelo apenado O fato de o estabelecimento penal assegurar acesso a atividades laborais e a educação formal não impede a remição por leitura e resenha de livros Inicialmente consignese que a jurisprudência do STJ tem admitido que a norma do art 126 da LEP ao possibilitar a abreviação da pena tem por objetivo a ressocialização do condenado sendo possível o uso da analogia in bonam partem que admita o benefício em comento em razão de atividades que não estejam expressas no texto legal como no caso a leitura e resenha de livros nos termos da Recomendação n 442013 do CNJ Ademais o fato de o estabelecimento penal onde se encontra o paciente assegurar acesso a atividades laborais e a educação formal não impede que se obtenha também a remição pela leitura que é atividade complementar mas não subsidiária podendo ocorrer concomitantemente Assim as horas dedicadas à leitura e resenha de livros como forma da remição pelo estudo são perfeitamente compatíveis com a participação em atividades laborativas fornecidas pelo estabelecimento penal nos termos do art 126 3º da LEP uma vez que a leitura pode ser feita a qualquer momento do dia e em qualquer local diferentemente da maior parte das ofertas de trabalho e estudo formal115 O art 83 4º da Lei de Execução Penal impõe ao Estado o dever de instalar nos estabelecimentos penais salas de aulas destinadas a cursos do ensino básico e profissionalizante Finalmente a Lei 131632015 incluiu na Lei de Execução Penal os arts 18A e 21A com a finalidade de instituir nos presídios o ensino médio regular ou supletivo com formação geral ou educação profissional de nível médio bem como de acrescentar no censo penitenciário a apuração do nível de escolaridade dos presos e das presas além de verificar a implementação de cursos profissionais em nível de iniciação ou aperfeiçoamento técnico e o número de presos e presas atendidas a existência de bibliotecas e as condições de seu acervo e outros dados relevantes para o aprimoramento educacional de presos e presas O Superior Tribunal de Justiça tem gradativamente alargado o alcance da remição de modo a autorizar o benefício sempre que a atividade do preso puder ser rotulada como trabalho ou estudo sob o fundamento da ressocialização do condenado Nesse sentido já se autorizou o desconto da pena privativa de liberdade mediante a atividade musical realizada em coral O reeducando tem direito à remição de sua pena pela atividade musical realizada em coral O ponto nodal da discussão consiste em analisar se o canto em coral pode ser considerado como trabalho ou estudo para fins de remição da pena Inicialmente consignase que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça como resultado de uma interpretação analógica in bonam partem da norma prevista no art 126 da LEP firmou o entendimento de que é possível remir a pena com base em atividades que não estejam expressas no texto legal Concluiuse portanto que o rol do art 126 da Lei de Execução Penal não é taxativo pois não descreve todas as atividades que poderão auxiliar no abreviamento da reprimenda Aliás o caput do citado artigo possui uma redação aberta referindose apenas ao estudo e ao trabalho ficando a cargo do inciso I do primeiro parágrafo a regulação somente no que se refere ao estudo atividade de ensino fundamental médio inclusive profissionalizante ou superior ou ainda de requalificação profissional Na mesma linha consignase que a intenção do legislador ao permitir a remição pelo trabalho ou pelo estudo é incentivar o aprimoramento do reeducando afastandoo assim do ócio e da prática de novos delitos e por outro lado proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado art 1º da LEP Ao fomentar o estudo e o trabalho pretendese a inserção do reeducando ao mercado de trabalho a fim de que ele obtenha o seu próprio sustento de forma lícita após o 33273 cumprimento de sua pena Nessa toada observase que o meio musical satisfaz todos esses requisitos uma vez que além do aprimoramento cultural proporcionado ao apenado ele promove sua formação profissional nos âmbitos cultural e artístico A atividade musical realizada pelo reeducando profissionaliza qualifica e capacita o réu afastandoo do crime e reintegrandoo na sociedade No mais apesar de se encaixar perfeitamente à hipótese de estudo vêse também que a música já foi regulamentada como profissão pela Lei n 38571960116 Regras comuns à remição Não há limite para a remição Quanto mais o condenado trabalhar ou estudar maior será o desconto da pena ou do período de prova do livramento condicional no tocante ao estudo Se não bastasse este benefício é passível de aplicação a todas as modalidades de crimes inclusive aos hediondos e equiparados pois inexiste qualquer restrição legal A remição também é cabível para os presos provisórios nas situações decorrentes da imposição de prisão cautelar ou seja antes do trânsito em julgado da condenação LEP art 126 7º Cuidase de corolário da regra contida no art 2º parágrafo único da Lei de Execução Penal Esta Lei aplicarseá igualmente ao preso provisório em harmonia com a execução provisória da pena privativa de liberdade117 De fato seria equivocado permitir o cumprimento da sanção penal antes do trânsito em julgado da condenação para fins de progressão de regime e simultaneamente impedir o trabalho ou estudo do preso como forma de diminuir a duração da reprimenda Aliás o art 31 parágrafo único da Lei de Execução Penal admite o trabalho do preso provisório desde que no interior do estabelecimento Ora se é possível seu trabalho causa não há como ser negada a remição efeito Se o preso estava laborando ou estudando e ficou impossibilitado por acidente de prosseguir nos trabalhos ou nos estudos continuará a beneficiarse com a remição LEP art 126 4º Vejamos um exemplo A cumprindo pena no regime fechado foi autorizado a trabalhar fora do presídio na construção de uma ponte Em determinado dia no desempenho 33274 das suas atividades foi acometido por grave acidente que o deixou tetraplégico impossibilitando seu labor Durante o restante da pena deverá ser computada a remição como se continuasse trabalhando ininterruptamente118 A autoridade administrativa diretor do estabelecimento penal ou responsável pela fiscalização da pena encaminhará mensalmente ao juízo da execução cópia do registro de todos os condenados que estejam trabalhando ou estudando com informação dos dias de trabalho ou das horas de frequência escolar ou de atividades de ensino de cada um deles LEP art 129 caput E também é dever da autoridade administrativa dar ao condenado a relação dos seus dias remidos LEP art 129 2º Cuidase de direito subjetivo do apenado reforçado pela regra prevista no art 41 inc XVI da Lei de Execução Penal Art 41 Constituem direitos do preso XVI atestado de pena a cumprir emitido anualmente sob pena da responsabilidade da autoridade judiciária competente Em face da sua natureza jurídica relacionada ao cumprimento e à extinção da pena a remição será declarada pelo juiz da execução ouvidos o Ministério Público fiscal da execução penal e a defesa LEP art 126 8º em homenagem aos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa Finalmente o tempo remido será computado como pena cumprida para todos os efeitos LEP art 128 a exemplo do percentual exigido de pena privativa de liberdade cumprida para progressão de regime prisional e obtenção de livramento condicional119 Consagrouse o princípio do Direito Penal segundo o qual pena cumprida é pena extinta Cumulatividade da remição pelo trabalho e pelo estudo Como estatui o art 126 3º da Lei de Execução Penal Para fins de cumulação dos casos de remição as horas diárias de trabalho e de estudo serão definidas de forma a se compatibilizarem Admitese portanto a cumulatividade da remição pelo trabalho e pelo 33275 estudo desde que compatíveis entre si como medida apta a abreviar ainda mais o período de cumprimento da pena Esta compatibilidade significa a ausência de prejuízo a qualquer das atividades é dizer o estudo não pode inviabilizar o trabalho e viceversa Nada impede o preso de exemplificativamente trabalhar durante o dia durante 6 seis a 8 horas e estudar no período noturno pelo prazo de 4 quatro horas Ao final de 3 três dias ele terá direito ao desconto de 2 dois dias da pena um pelo trabalho e outro pelo estudo Esta cumulatividade vale ressaltar somente será cabível nos regimes fechado e semiaberto pois no regime aberto e no livramento condicional o trabalho do condenado é obrigatório Falta grave e perda dos dias remidos120 Na sistemática original da Lei de Execução Penal assim dispunha o antigo art 127 O condenado que for punido por falta grave perderá o direito ao tempo remido começando o novo período a partir da data da infração disciplinar Esse dispositivo durante muito tempo foi alvo de intensa discussão doutrinária e jurisprudencial Muitos sustentavam sua inconstitucionalidade pois a perda dos dias já remidos em razão da prática de falta grave violaria o princípio da proporcionalidade além de desconsiderar o direito adquirido e a coisa julgada CF art 5º XXXVI Para espancar esta controvérsia no dia 12 de junho de 2008 o Supremo Tribunal Federal aprovou a Súmula Vinculante 9 a primeira medida dessa natureza em matéria penal com a seguinte redação O disposto no artigo 127 da Lei 72101984 Lei de Execução Penal foi recebido pela ordem constitucional vigente e não se lhe aplica o limite temporal previsto no caput do artigo 58 Em resumo o Excelso Pretório reconheceu a constitucionalidade da perda de todos os dias remidos em decorrência da punição pela prática de falta grave Mas o próprio Supremo Tribunal Federal rapidamente suavizou a extensão da súmula decidindo que a decretação da perda dos dias remidos deveria observar o princípio da proporcionalidade entre a infração do condenado e a decisão a esta correspondente121 Este panorama jurídico foi alterado com a entrada em vigor da Lei 124332011 Com efeito estabelece o atual art 127 da Lei de Execução Penal Em caso de falta grave o juiz poderá revogar até 13 um terço do tempo remido observado o disposto no art 57 recomeçando a contagem a partir da data da infração disciplinar Destarte o limite máximo para a perda dos dias remidos na hipótese de falta grave é de 13 um terço Note que a lei não fala em um terço e sim em até 13 um terço Consequentemente o percentual da perda dos dias remidos pode ser inclusive inferior mas é vedado ao juízo da execução ultrapassar este patamar Como destacado pelo Superior Tribunal de Justiça A prática de falta grave impõe a decretação da perda de até 13 dos dias remidos devendo a expressão poderá contida no art 127 da Lei 72101984 com a redação que lhe foi conferida pela Lei 124322011 ser interpretada como verdadeiro poderdever do magistrado ficando no juízo de discricionariedade do julgador apenas a fração da perda que terá como limite máximo 13 dos dias remidos122 Para encontrar o quantum correto o magistrado deve se basear em decisão fundamentada nos vetores elencados pelo art 57 caput da Lei de Execução Penal a natureza os motivos as circunstâncias e as consequências do fato bem como a pessoa do faltoso e seu tempo de prisão123 Com a entrada em vigor da Lei 124332011 a Súmula Vinculante 9 do Supremo Tribunal Federal perdeu eficácia Não pode mais ser aplicada pois o dispositivo legal que lhe fundamentava deixou de existir Incide na hipótese o fenômeno da superação sumular normativa também conhecido como overruling124 Portanto agora o condenado perde parte dos dias remidos até 13 recomeçando a contagem a partir da data da infração disciplinar E nada impede a partir desta nova contagem isto é de novo período de trabalho ou estudo para fins de remição seja decretada mais uma vez a perda de até 13 um terço dos dias remidos A perda dos dias remidos pode incidir sobre dias de trabalho anteriores à falta grave se ainda não foram declarados pelo juízo da execução no cálculo da remição Nunca poderá recair contudo sobre dias de labor posteriores à infração disciplinar Como destacado pelo Superior Tribunal de Justiça Reconhecida falta grave a perda de até 13 do tempo remido art 127 da LEP pode alcançar dias de trabalho anteriores à infração disciplinar e que ainda não tenham sido declarados pelo juízo da execução no cômputo da remição A remição na execução da pena constitui benefício submetido à cláusula rebus sic stantibus Assim o condenado possui apenas a expectativa do direito de abater os dias trabalhados do restante da pena a cumprir desde que não venha a ser punido com falta grave Nesse sentido quanto aos dias de trabalho a serem considerados na compensação se por um lado é certo que a perda dos dias remidos não pode alcançar os dias trabalhados após o cometimento da falta grave sob pena de criar uma espécie de contacorrente contra o condenado desestimulando o trabalho do preso por outro lado não se deve deixar de computar os dias trabalhados antes do cometimento da falta grave ainda que não tenham sido declarados pelo juízo da execução sob pena de subverter os fins da pena culminando por premiar a indisciplina carcerária125 O condenado não tem direito pleno à remição de todos os dias de trabalho ou estudo mas somente uma expectativa de direito a qual será concretizada se cumpridos integralmente os requisitos legais A remição é um benefício contabilizado à medida que o apenado trabalha ou estuda Essa contabilização deve operar no subjetivismo dele apenado como um estímulo para persistir enquadrado em boa conduta É dizer à medida que visualiza os dias que lhe são contabilizados favoravelmente o condenado vai se convencendo de que não interessa transgredir as regras inerentes à execução da pena sob o risco de perder parte daquilo que já acumulou O reconhecimento total da remição da pena constitui expectativa de direito condicionada ao preenchimento dos requisitos legais Em poucas palavras a concessão da remição no tocante a todos os dias de trabalho ou estudo se sujeita à cláusula rebus sic stantibus Assim sendo ocorrendo a falta grave o condenado perde até 13 um terço do tempo já remido E atenção Para a perda de até 13 um terço dos dias remidos não basta a prática da falta grave É imprescindível a efetiva punição pela falta grave imposta ao final de sindicância instaurada no âmbito do estabelecimento penal como forma de assegurar ao condenado o exercício da ampla defesa Como estabelece a Súmula 533 do Superior Tribunal de Justiça Para o reconhecimento da prática de falta disciplinar no âmbito da execução penal é imprescindível a instauração de procedimento administrativo pelo diretor do estabelecimento prisional assegurado o direito de defesa a ser realizado por advogado constituído ou defensor público nomeado E mais Na sindicância apurase a prática da falta grave Mas é somente o juízo da execução que declara a perda dos dias remidos126 De acordo com a jurisprudência consolidada no Supremo Tribunal Federal é necessária a oitiva da defesa técnica em juízo antes da decretação da perda dos dias remidos mesmo com a conclusão da sindicância em desfavor do reeducando Vale a pena conferir Entendeuse que o procedimento administrativo não seria suficiente para desencadear uma sanção penal e que o fato de o paciente ter sido ouvido na instância administrativa não dispensaria a manifestação da defesa no processo de execução Assim enfatizouse que em que pese ser prescindível a inquirição em juízo do próprio assistido a manifestação de sua defesa no processo de execução após o procedimento administrativo é indispensável o que não ocorrera na espécie tendo em conta o caráter penal e processual da perda dos dias remidos127 Aliás embora a sindicância tenha caráter administrativo seus reflexos penais afastam a incidência da Súmula Vinculante n 5 do Supremo Tribunal Federal A falta de defesa técnica por advogado no processo administrativo disciplinar não ofende a Constituição Na linha da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça Foi instaurada sindicância para apuração do cometimento de falta grave imputada ao paciente em sede de execução penal ao final reconheceuse o cometimento da falta grave posse de aparelho celular dentro do presídio contudo sem a presença do defensor quando da oitiva do acusado A Turma entendeu não aplicável a Súmula vinculante n 5 do STF pois os precedentes que a embasam estão vinculados ao Direito Administrativo Não se está a tratar de um mero procedimento administrativo disciplinar em que um sujeito sobre o qual recai a suspeita de uma falta pode investido de plenos poderes exercer seus direitos e prerrogativas e demonstrar sua inocência Diante das condições a que submetidos os detentos qualquer tentativa de equiparação com os sujeitos que do lado de cá das grades podem per si fazer valer a dignidade da pessoa humana soa descontextualizado Daí a Turma concedeu a ordem para cassando o acórdão atacado anular a sindicância128 É preciso observar que a Lei 124332011 limita a 13 um terço a perda dos dias remidos como corolário da falta grave Subsiste contudo a possibilidade de regressão de regime prisional com fulcro no art 118 I da Lei de Execução Penal Finalmente esta limitação não interfere em outros benefícios prisionais vinculados à contagem do tempo tais como o livramento condicional e a comutação de pena Na dicção do Supremo Tribunal Federal A 2ª Turma denegou habeas corpus em que se pleiteava fosse declarado que a prática de falta grave estaria limitada ao máximo de 13 do lapso temporal no desconto da pena para todos os benefícios da execução da reprimenda que exigissem a contagem de tempo Na situação dos autos o STJ concedera parcialmente a ordem postulada para afastar o reinício da contagem do prazo decorrente do cometimento de falta grave necessário à aferição do requisito objetivo quanto aos benefícios de livramento condicional e comutação de pena Enfatizouse que o art 127 da LEP com a redação conferida pela Lei 124332011 imporia ao juízo da execução ao decretar a perda dos dias remidos que se ativesse ao limite de 13 do tempo remido e levasse em conta na aplicação dessa sanção a natureza os motivos as circunstâncias e as consequências do fato bem como a pessoa do faltoso e seu tempo de prisão LEP Art 127 Em caso de falta grave o juiz poderá revogar até 13 um terço do 33276 tempo remido observado o disposto no art 57 recomeçando a contagem a partir da data da infração disciplinar Na sequência observouse que embora a impetrante postulasse a incidência da referida norma à espécie verificarseia que o juízo da execução não decretara a perda do tempo remido a impedir a concessão da ordem para esse fim Assinalouse que da leitura do dispositivo legal inferirseia que o legislador pretendera restringir somente a revogação dos dias remidos ao patamar de 13 motivo pelo qual não mereceria acolhida pretensão de estender o referido limite aos demais benefícios da execução129 Ausência de trabalho ou de estudo por falta de condições no estabelecimento penal Se não há condições adequadas para o desempenho de atividade laborativa ou de ensino no estabelecimento penal não se pode conceder ao condenado a remição pois a Lei de Execução Penal condiciona o benefício ao efetivo e concreto trabalho ou estudo para abatimento da pena privativa de liberdade Não se admite portanto a remição ficta ou virtual Para o Supremo Tribunal Federal A Primeira Turma em conclusão de julgamento e por maioria denegou a ordem de habeas corpus em que se discutia a possibilidade de remição ficta da pena na hipótese em que o Estado não proporciona atividade laboral ou educacional aos internos do sistema penitenciário a fim de obterem a remição da pena O Colegiado enfatizou que embora o Estado tenha o dever de prover trabalho aos internos que desejem laborar reconhecer a remição ficta da pena nesse caso faria com que todas as pessoas do sistema prisional obtivessem o benefício fato que causaria substancial mudança na política pública do sistema carcerário além de invadir a esfera do Poder Executivo Destacou que o instituto da remição exige necessariamente a prática de atividade laboral ou educacional Tratase de reconhecimento pelo Estado do direito à diminuição da pena em virtude de trabalho efetuado pelo detento Na espécie não foi realizado trabalho estudo ou leitura em razão de o paciente estar submetido ao Regime Disciplinar Diferenciado Portanto não há que se falar em direito à remição130 33281 Como determina o art 42 do Código Penal Computamse na pena privativa de liberdade e na medida de segurança o tempo de prisão provisória no Brasil ou no estrangeiro o de prisão administrativa e o de internação em qualquer dos estabelecimentos referidos no artigo anterior Detração penal é o desconto na pena privativa de liberdade ou na medida de segurança do tempo de prisão provisória ou de internação já cumprido pelo condenado Evitase o bis in idem na execução da pena privativa de liberdade Exemplificativamente se alguém foi preso em flagrante pela prática de estupro e permaneceu segredado por 2 dois anos até o trânsito em julgado da sentença condenatória que lhe impôs pena de 8 oito anos restará a ele cumprir mais 6 seis anos em face da regra prevista no art 42 do Código Penal Na expressão prisão provisória compreendese toda e qualquer prisão cautelar e processual prisão em flagrante prisão temporária e prisão preventiva ou seja não decorrente de pena consistente na privação da liberdade antes do trânsito em julgado da condenação Na medida de segurança o tempo de prisão processual ou de internação provisória CPP art 319 VII deve ser subtraído do prazo mínimo da internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico ou do tratamento ambulatorial que varia de um a três anos como se extrai do art 97 1º do Código Penal Exemplo A depois de ser preso em flagrante foi internado provisoriamente e mantido nessa situação por um ano Durante a instrução criminal restou comprovada sua inimputabilidade motivo pelo qual o magistrado o absolveu e impôs medida de segurança de internação pelo prazo mínimo de três anos Com a aplicação do instituto da detração penal a perícia médica de cessação da periculosidade será realizada depois de dois anos da internação do agente no hospital de custódia e tratamento psiquiátrico Competência para aplicação da detração penal e reflexos no regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade Na sistemática da Lei de Execução Penal especialmente da regra contida 33282 em seu art 66 III c a detração era reconhecida exclusivamente pelo juízo da execução Consequentemente este instituto não produzia qualquer efeito na fixação do regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade Destarte se a título ilustrativo um réu primário havia permanecido preso por 2 dois anos antes da condenação definitiva e ao final fora aplicada pena de 5 cinco anos de reclusão deveria em tese começar a cumprila no regime semiaberto e não em regime aberto por força da inaplicabilidade do instituto previsto no art 42 do Código Penal Além disso os momentos de tais acontecimentos eram completamente distintos Enquanto o regime inicial de cumprimento da pena sempre foi estipulado pelo juiz da ação penal processo de conhecimento a detração penal era matéria de competência do juiz da execução e deveria ser apreciada somente após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória processo de execução Mas este panorama foi profundamente alterado pela Lei 127362012 responsável pela inclusão do 2º do art 387 do Código de Processo Penal com a seguinte redação 2º O tempo de prisão provisória de prisão administrativa ou de internação no Brasil ou no estrangeiro será computado para fins de determinação do regime inicial de pena privativa de liberdade Agora a detração penal é matéria de competência do juiz de 1ª instância ou do Tribunal a ser reconhecida na fase de conhecimento e não somente na esfera da execução Exemplificativamente se o acusado permaneceu preso preventivamente por 1 um ano e ao final do processo foi condenado à pena de 9 nove anos de reclusão o magistrado deverá aplicar a detração na própria sentença fixando o regime inicial semiaberto para início de cumprimento da pena privativa de liberdade correspondente ao restante da pena 8 anos e não o regime fechado relativo ao total da pena imposta O legislador consagrou explicitamente o princípio segundo o qual pena cumprida é pena extinta Detração penal e penas restritivas de direitos É possível a incidência da detração penal nas penas restritivas de direitos de prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas interdição 33283 33284 33285 temporária de direitos e limitação de fim de semana pois são aplicáveis em substituição às penas privativas de liberdade pelo mesmo tempo de sua duração CP art 55 Detração penal e pena de multa Não se admite a detração penal no campo da pena de multa diante da vedação legal da conversão desta última em pena privativa de liberdade Ademais o art 42 do Código Penal excluiu a incidência do instituto para a sanção pecuniária Finalmente a pena privativa de liberdade e a pena pecuniária têm finalidades diferentes e não há um critério legal capaz de expressar em diasmulta o tempo de prisão provisória131 Detração penal e suspensão condicional da execução da pena privativa de liberdade Não tem cabimento a detração penal no período de prova do sursis que em regra varia de 2 dois a 4 quatro anos Assim se a pena privativa de liberdade de 2 dois foi suspensa condicionalmente por outros 2 dois anos a circunstância de ter o condenado permanecido preso provisoriamente por 1 um ano por exemplo em nada interferirá no período de prova que subsistirá pelo tempo de 2 dois anos A propósito esse prazo poderia ser fixado ainda que fosse menor a sanção imposta Mas será aplicável esse instituto na hipótese de ser revogado o sursis pois aí restará ao condenado a obrigação de cumprir integralmente a pena que lhe foi imposta No exemplo acima faltaria somente 1 um ano para a satisfação total da pena privativa de liberdade Detração penal e prescrição Discutese se a detração penal influencia ou não no cálculo do prazo prescricional Para quem admite essa possibilidade amparada na aplicação analógica do art 113 do Código Penal a prescrição deveria ser computada com base no tempo restante da pena ou seja somente com o tempo ainda não cumprido pelo condenado Exemplo A foi condenado a seis anos Provisoriamente 33286 antes do trânsito em julgado contudo ficou preso por três anos Logo a prescrição deveria ser calculada sobre a pena faltante isto é três anos e não sobre a pena total O Supremo Tribunal Federal fundado no princípio da estrita legalidade de observância cogente em matéria penal tem posição diversa O art 113 do Código Penal tem aplicação vinculada às hipóteses de evasão do condenado ou de revogação do livramento condicional não se referindo ao tempo de prisão cautelar para efeito do cálculo da prescrição CP Art 113 No caso de evadirse o condenado ou de revogarse o livramento condicional a prescrição é regulada pelo tempo que resta da pena132 Detração penal e prisão provisória em outro processo A questão que se coloca é a seguinte Quando a prisão provisória operase em um processo no qual o réu é absolvido é possível utilizar esse período para fins de detração penal em outro processo em que foi condenado A doutrina não é pacífica sobre o assunto Ora se exige a conexão ou continência entre a infração penal a prisão provisória e a pena imposta ora esse requisito afigurase como dispensável Em qualquer caso porém é necessário tenha sido praticada a infração penal pela qual o agente foi condenado anteriormente à infração penal em que houve a prisão provisória e posterior absolvição Para o Supremo Tribunal Federal Não é possível creditarse ao réu para fins de detração tempo de encarceramento anterior à prática do crime que deu origem à condenação atual Com base nessa jurisprudência a Turma indeferiu habeas corpus em que se pretendia abater da pena aplicada ao paciente período em que este estivera anteriormente custodiado Asseverouse que se acolhida a tese da defesa considerando esse período como crédito em relação ao Estado estarseia concedendo ao paciente um bill de indenidade133 O Superior Tribunal de Justiça também adota esta posição A detração por sua vez é decorrência do princípio constitucional da não culpabilidade A CF estabelece que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória Ocorre que mesmo antes do trânsito em julgado em algumas situações fazse necessária a constrição provisória do acusado Essa no entanto é uma prisão cautelar E por vezes ao final do julgamento pode ocorrer a absolvição do agente ou a prescrição da pretensão punitiva Dessa forma a detração visa impedir que o Estado abuse do poderdever de punir impondo ao agente uma fração desnecessária da pena quando houver a perda da liberdade ou a internação em momento anterior à sentença condenatória Nessa linha intelectiva a detração é uma operação matemática em que se subtrai da pena privativa de liberdade ou medida de segurança aplicada ao réu ao final do processo o tempo de prisão provisória prisão administrativa ou internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico que o sentenciado já cumpriu anteriormente Frisese que em razão da equidade admitese a detração inclusive em processos que não guardem relação entre si desde que a segregação indevida seja posterior ao crime em que se requer a incidência do instituto Nestes casos embora a prisão processual fosse necessária no momento em que foi realizada ao final do julgamento do processo a conduta do agente não resultou em uma punição efetiva Dessa forma é possível utilizar esse período para descontar a pena referente a crime praticado em data anterior134 Essa conclusão além de sintonizarse com o art 111 da Lei de Execução Penal impede a ocorrência da chamada conta corrente penal isto é a constituição de saldo credor em favor do condenado que lhe daria um cheque em branco para cometer crimes e contravenções penais e abrigarse sob o manto da impunidade 1 2 3 4 5 6 7 8 HC 97656SP rel Min Jane Silva Desembargadora convocada do TJMG 6ª Turma j 03042008 Vale a pena mencionar o art 394A do Código de Processo Penal com a redação conferida pela Lei 132852016 Os processos que apurem a prática de crime hediondo terão prioridade de tramitação em todas as instâncias Embora o dispositivo legal mencione apenas os crimes hediondos é indiscutível que tal regra também se aplica aos delitos equiparados a hediondos tráfico de drogas tortura e terrorismo em face da igualdade de tratamento jurídico imposta pelo art 5º inc XLIII da Constituição Federal HC 111840ES rel Min Dias Toffoli Plenário j 27062012 noticiado no Informativo 672 E também HC 107107SP rel Min Roberto Barroso 1ª Turma j 19082014 No STJ HC 286925RR rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 13052014 noticiado no Informativo 540 HC 133308SP rel Min Cármen Lúcia 2ª Turma j 29032016 noticiado no Informativo 819 e HC 129714SP rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 11102016 noticiado no Informativo 843 HC 123316SE rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 09062015 noticiado no Informativo 789 HC 118533MS rel Min Cármen Lúcia Plenário j 23062016 noticiado no Informativo 831 O Código Penal presume de forma absoluta a incompatibilidade de execução de pena privativa de liberdade superior a 8 oito anos com os regimes semiaberto e aberto independentemente da gravidade do crime e das condições pessoais do condenado Inexiste ilegalidade na escolha do regime inicial fechado quando apontados dados fáticos suficientes a indicar a gravidade concreta do crime o emprego de arma de fogo a restrição de liberdade da vítima e o concurso de agentes com periculosidade e destemor exacerbados ainda que o agente seja primário e o quantum da pena 5 anos e 8 meses de reclusão seja inferior a oito anos art 33 3º do CP STJ HC 282211SP rel Min Rogério Schietti Cruz 6ª Turma j 18032014 Em igual sentido STF HC 124876SP rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 24022015 noticiado no Informativo 775 e STJ HC 294803SP rel Min Newton Trisotto Desembargador convocado do TJSC 5ª Turma 9 10 11 12 13 14 15 16 17 j 18092014 noticiado no Informativo 548 Diversos penalistas sustentam que o reincidente condenado a pena de reclusão igual ou inferior a 4 quatro anos pode iniciar o seu cumprimento no regime aberto desde que a condenação anterior tenha sido exclusivamente à pena de multa Aplicase analogicamente o art 77 1º do Código Penal se a condenação anterior à pena de multa não impede o sursis também não pode vedar o regime inicial aberto HC 85531SP rel Min Celso de Mello 2ª Turma j 14112007 noticiado no Informativo 488 A jurisprudência do STJ caminha na mesma direção A gravidade genérica do delito por si só é insuficiente para justificar a imposição do regime inicial fechado para o cumprimento da pena É indispensável a criteriosa observação dos preceitos inscritos nos arts 33 2º b e 3º do CP HC 131655SP rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 09032010 noticiado no Informativo 426 Já decidiu o Supremo Tribunal Federal entretanto que não existe direito subjetivo ao cumprimento da pena no regime aberto HC 84306PR rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 06032007 O STF compartilha deste entendimento RHC 135298SP rel Min Ricardo Lewandowski red p o ac Min Teori Zavascki 2ª Turma j 18102016 noticiado no Informativo 844 STJ HC 176320AL rel originário Min Napoleão Nunes Maia Filho rel para acórdão Min Jorge Mussi 5ª Turma j 17052011 noticiado no Informativo 473 Existe uma hipótese na qual jamais será possível a progressão quando for aplicado o regime inicial aberto e não for decretada a regressão durante a execução da pena Como veremos adiante o percentual de cumprimento da pena privativa de liberdade é distinto no caso de condenada gestante ou que for mãe ou responsável por crianças ou pessoas com deficiência e também em relação aos condenados por crimes hediondos ou equiparados MIRABETE Julio Fabbrini Execução penal 8 ed São Paulo Atlas 1997 p 262 RHC 89031RS rel orig Min Marco Aurélio rel p o acórdão Min Carlos Britto 1ª Turma j 28112006 noticiado no Informativo 450 Em igual sentido HC 100499RJ rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 26102010 noticiado no Informativo 606 18 19 20 21 22 23 24 STJ HC 369774RS rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 22112016 noticiado no Informativo 595 A defesa do impetrante condenado a pena unificada de 79 anos e 6 meses de reclusão em regime inicial fechado alegou que no cômputo para concessão de benefícios na execução deve ser levado em conta o limite de 30 anos versado no artigo 75 do Código Penal Articulou que considerar no cálculo do benefício da progressão de regime pena unificada maior que o teto estabelecido pelo CP violaria o princípio da individualização da pena e a vedação constitucional à aplicação de sanções perpétuas O Colegiado em consonância com o Enunciado 715 da Súmula do Supremo Tribunal Federal entendeu inaplicável no cômputo para a concessão de regime mais benéfico em relação a penas unificadas o limite imposto pelo art 75 do CP devendo ser considerada a reprimenda total STF HC 112182RJ rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 03042018 noticiado no Informativo 896 MIRABETE Julio Fabbrini Execução penal 8 ed São Paulo Atlas 1997 p 264 O STF já decidiu que a existência de ação penal em curso não pode ser considerada para afastar a progressão de regime de cumprimento da pena HC 99141SP rel Min Luiz Fux 1ª Turma j 2932011 noticiado no Informativo 621 EP 12 ProgRegAgRDF rel Min Roberto Barroso Plenário j 08042015 noticiado no Informativo 780 Art 2º caput da Lei 80691990 Estatuto da Criança e do Adolescente Considerase criança para os efeitos desta Lei a pessoa com até doze anos de idade incompletos Art 2º caput da Lei 131462015 Estatuto da Pessoa com Deficiência Considerase pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física mental intelectual ou sensorial o qual em interação com uma ou mais barreiras pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas Na hipótese de pessoa com deficiência pouco importa a sua idade é dizer não precisa tratarse de criança ou adolescente Considerase organização criminosa a associação de 4 quatro ou mais pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas ainda que informalmente com objetivo de obter direta ou indiretamente vantagem de qualquer natureza mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4 quatro anos ou que sejam de 25 26 27 28 29 30 31 32 caráter transnacional Esta também é posição consolidada no Superior Tribunal de Justiça Quanto à pretendida progressão diretamente para o regime aberto observouse que a jurisprudência deste Superior Tribunal não admite a progressão per saltum HC 168588SP rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 14122010 noticiado no Informativo 460 EP 22 ProgRegAgRDF rel Min Roberto Barroso Plenário j 17122014 noticiado no Informativo 772 A progressão de regime para os condenados por crime hediondo darseá se o sentenciado for reincidente após o cumprimento de 35 da pena ainda que a reincidência não seja específica em crime hediondo ou equiparado Isso porque conforme o entendimento adotado pelo STJ a Lei dos Crimes Hediondos não faz distinção entre a reincidência comum e a específica Desse modo havendo reincidência ao condenado deverá ser aplicada a fração de 35 da pena cumprida para fins de progressão do regime STJ HC 301481SP rel Min Ericson Maranho Desembargador convocado do TJSP 6ª Turma j 02062015 noticiado no Informativo 563 Tais percentuais 25 ou 35 não incidem na hipótese de progressão especial para mulher gestante ou que for mãe ou responsável por crianças ou pessoas com deficiência a teor da regra contida no art 2º 2º da Lei 80721990 desde que presentes os requisitos elencados pelo art 112 3º da Lei 72101984 Lei de Execução Penal Para o estudo detalhado do tema remetemos à leitura do item 33141 HC 91631SP rel Min Cármen Lúcia 1ª Turma j 16102007 noticiado no Informativo 484 No mesmo sentido RHC 91300DF rel Min Ellen Gracie Tribunal Pleno j 05032009 noticiado no Informativo 537 É também o entendimento assentado no Superior Tribunal de Justiça AgRg no HC 96226SP rel Min Nilson Naves 6ª Turma j 29042008 noticiado no Informativo 354 HC 100499RJ rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 26102010 noticiado no Informativo 606 No mesmo sentido HC 96824RS rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 12042011 noticiado no Informativo 623 REsp 1557461SC rel Min Rogerio Schietti Cruz 3ª Seção j 22022018 noticiado no Informativo 621 Igual conclusão pode ser extraída da parte final da Súmula Vinculante 33 34 35 36 37 38 39 40 26 do Supremo Tribunal Federal Para efeito de progressão de regime no cumprimento de pena por crime hediondo ou equiparado o juízo da execução observará a inconstitucionalidade do art 2º da Lei n 8072 de 25 de julho de 1990 sem prejuízo de avaliar se o condenado preenche ou não os requisitos objetivos e subjetivos do benefício podendo determinar para tal fim de modo fundamentado a realização de exame criminológico STF HC 102652RS rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 29062010 noticiado no Informativo 593 e HC 100729RS rel Min Ricardo Lewandowski 1ª Turma j 16032010 noticiado no Informativo 579 No STJ A prática de falta grave interrompe o prazo para a progressão de regime acarretando a modificação da database e o início de nova contagem do lapso necessário para o preenchimento do requisito objetivo REsp 1364192RS rel Min Sebastião Reis Júnior 3ª Seção j 12022014 noticiado no Informativo 546 STJ HC 122860RS rel Min Napoleão Nunes Maia Filho 5ª Turma j 12052009 noticiado no Informativo 394 STJ HC 89851RJ rel Min Jane Silva Desembargadora convocada do TJMG 6ª Turma j 22042008 HC 104174RJ rel Min Ayres Britto 2ª Turma j 29032011 noticiado no Informativo 621 É também a posição do Superior Tribunal de Justiça HC 215765RS rel Min Gilson Dipp 5ª Turma j 08112011 noticiado no Informativo 487 HC 131649RJ rel orig Min Cármen Lúcia rel p ac Min Dias Toffoli 2ª Turma j 06092016 noticiado no Informativo 838 RHC 142463MG rel Min Luiz Fux 1ª Turma j 12092017 noticiado no Informativo 877 A conduta de o paciente durante a execução da pena de reclusão não ter comparecido perante o oficial de Justiça para ser citado não pode ser considerada como falta grave uma vez que referida conduta não está propriamente ligada aos deveres do preso durante a execução penal As faltas graves devem ser expressamente dispostas na Lei de Execução Penal não cabendo interpretação extensiva quer do art 39 quer do art 50 para que sejam aplicadas STJ HC 108616SP rel Min Jane Silva Desembargadora convocada do TJMG 6ª Turma j 06022009 noticiado no Informativo 382 Na visão do STF o condenado em regime semiaberto contemplado pelo 41 42 43 44 45 46 47 48 benefício da permissão de saída para tratamento de dependência química continua sob a custódia do Estado Consequentemente subsiste a condição de preso razão pela qual sua fuga da clínica caracteriza falta grave com todos os efeitos daí decorrentes perda dos dias remidos regressão no regime de pena reinício da contagem do prazo para futuros benefícios e cassação de saídas temporárias HC 97980RS rel orig Min Marco Aurélio red p o acórdão Min Dias Toffoli 1ª Turma j 23022010 noticiado no Informativo 576 São eles obediência ao servidor e respeito a qualquer pessoa com quem deve relacionarse e execução do trabalho das tarefas e das ordens recebidas O STJ já decidiu ser obrigatória a prévia oitiva do condenado somente na regressão definitiva Em outras palavras a prática de falta grave pode ensejar a regressão cautelar ou provisória independentemente da prévia oitiva do apenado HC 184988RJ rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 05022013 É também o entendimento consagrado no STF EP 8 ProgRegAgRDF rel Min Roberto Barroso Plenário j 01072016 e EP 16 Agr terceiroDF rel Min Roberto Barroso Plenário j 01072016 noticiados no Informativo 832 STF RE 398269RS rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 15122009 noticiado no Informativo 572 No STJ Para o reconhecimento da prática de falta disciplinar no âmbito da execução penal é imprescindível a instauração de procedimento administrativo pelo diretor do estabelecimento prisional assegurado o direito de defesa a ser realizado por advogado constituído ou defensor público nomeado REsp 1378557RS rel Min Marco Aurélio Bellizze 3ª Seção j 23102013 EP 8 ProgRegAgRDF rel Min Roberto Barroso Plenário j 01072016 e EP 16 AgrterceiroDF rel Min Roberto Barroso Plenário j 01072016 noticiados no Informativo 832 STF HC 93761RS rel Min Eros Grau 2ª Turma j 10062008 noticiado no Informativo 510 STJ HC 184988RJ rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 05022013 Em execução provisória de pena fixada em ação penal originária a expedição de guia de recolhimento de réu cabe ao tribunal competente para processála e julgála STJ EDcl no REsp 1484415DF rel Min 49 50 51 52 53 54 55 Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 03032016 noticiado no Informativo 581 Esse julgamento encontrase sintetizado no Informativo 814 e sua conclusão foi reforçada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento das medidas cautelares ajuizadas nas ações declaratórias de constitucionalidade 43 e 44 ADC 43 MCDF rel Min Marco Aurélio Plenário j 05102016 e ADC 44 MCDF rel Min Marco Aurélio Plenário j 05102016 noticiadas no Informativo 842 bem como no HC 152752PR impetrado pela defesa do exPresidente da República Luiz Inácio Lula da Silva julgado pelo Plenário em 04 de abril de 2018 A propósito nosso arrazoado está em sintonia com o parecer que elaboramos a pedido da ProcuradoriaGeral de Justiça de São Paulo para juntada aos autos das citadas medidas cautelares representando o Ministério Público brasileiro A decisão de 1ª instância é mais robusta nos crimes de competência do Tribunal do Júri norteado pela soberania dos veredictos CF art 5º XXXVIII c É preciso destacar que a execução provisória da pena reclama o exaurimento completo da instância ordinária ou seja não pode existir espaço para nenhum recurso notadamente embargos de declaração perante o Tribunal de Justiça nos Estados ou junto ao Tribunal Regional Federal na esfera da União STJ HC 366907PR rel Min Rogério Schietti Cruz 6ª Turma j 06122016 noticiado no Informativo 595 e STJ HC 371870SP rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 13122016 noticiado no Informativo 597 ADC 43 MCDF rel Min Marco Aurélio Plenário j 05102016 e ADC 44 MCDF rel min Marco Aurélio Plenário j 05102016 noticiadas no Informativo 842 Rcl 2511 AgRPR rel Min Dias Toffoli 2ª Turma j 16052017 noticiado no Informativo 865 Os dados estatísticos têm revelado felizmente que tais equívocos são raros Como se extrai do voto proferido pelo Min Roberto Barroso no HC 126292SP os dados oficiais da assessoria de gestão estratégica do STF revelam que no período de 01012009 até 19042016 somente 0035 de absolvições foram proferidas pelo STF em grau de recurso A prisão em flagrante deve ser convertida em prisão preventiva se presentes os requisitos contidos no art 312 do CPP e se revelarem 56 57 58 59 60 61 62 63 64 inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares da prisão CPP art 310 inc I e a prisão temporária somente pode ser decretada na fase investigatória Lei 79601989 art 1º inc I EDcl no REsp 1484415DF rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 03032016 noticiado no Informativo 581 O Superior Tribunal de Justiça contudo já decidiu em sentido contrário EDcl no REsp 1484415DF rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 03032016 noticiado no Informativo 581 HC 140449RJ rel orig Min Marco Aurélio red p o ac Min Roberto Barroso 1ª Turma j 06112018 noticiado no Informativo 622 HC 374713RS rel Min Antônio Saldanha Palheiro 6ª Turma noticiado no Informativo 605 HC 88500RS rel Min Joaquim Barbosa 2ª Turma j 20102009 noticiado no Informativo 564 EREsp 1619087SC rel Min Maria Thereza de Assis Moura rel para acórdão Min Jorge Mussi 3ª Seção j 14062017 noticiado no Informativo 609 Na linha da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal O ingresso no regime prisional semiaberto é apenas um pressuposto que pode eventualmente legitimar a concessão de autorizações de saídas em qualquer de suas modalidades permissão de saída ou saída temporária mas não garante necessariamente o direito subjetivo de obtenção dessas benesses Asseverouse cumprir ao juízo das execuções criminais avaliar em cada caso a pertinência e a razoabilidade da pretensão observando os requisitos objetivos e subjetivos do paciente HC 102773RJ rel Min Ellen Gracie 2ª Turma j 22062010 noticiado no Informativo 592 Com apoio no art 122 III da Lei de Execução Penal o Superior Tribunal de Justiça já concedeu a saída temporária para autorizar a visita do preso a conselheiro religioso com o argumento de que esta prática contribui para o retorno do condenado ao convívio social HC 175674RJ rel Min Gilson Dipp 5ª Turma j 10052011 noticiado no Informativo 472 Como preceitua a Súmula 520 do Superior Tribunal de Justiça O benefício de saída temporária no âmbito da execução penal é ato jurisdicional insuscetível de delegação à autoridade administrativa do estabelecimento prisional 65 66 67 68 69 70 71 72 73 74 HC 130502RJ rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 21062016 noticiado no Informativo 831 Em igual sentido HC 128763RJ rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 04082015 noticiado no Informativo 793 REsp 1544036RJ rel Min Rogerio Schietti Cruz 3ª Seção j 14092016 noticiado no Informativo 590 COSTA Álvaro Mayrink da Direito penal volume 3 parte geral 7 ed Rio de Janeiro Forense 2007 p 148 O Superior Tribunal de Justiça já vetou o trabalho externo em região tomada pelo crime organizado a ponto de impedir a fiscalização do cumprimento do benefício mesmo com a presença do mérito carcerário do preso Afirmouse que o trabalho extramuros em tal localidade poderia servir de estímulo à delinquência e até de meio à burla da execução da pena o que desvirtuaria sobremaneira a própria finalidade do instituto do trabalho extramuros qual seja de contribuir para a reinserção social do apenado HC 165081DF rel Min Gilson Dipp 5ª Turma j 31052011 noticiado no Informativo 475 Também foi negado o trabalho externo quando o benefício depende de escolta policial diária situação de nítida inviabilidade prática STJ HC 41940DF rel Min Arnaldo Esteves Lima 5ª Turma j 24052005 HC 310515RS rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 17092015 noticiado no Informativo 569 STJ AgRg no HC 209452RJ rel Min Jorge Mussi 5ª Turma j 07082014 Para o Supremo Tribunal Federal esse raciocínio se ampara no fato de a Constituição Federal classificar a família como a base da sociedade e dotada de especial proteção por parte do Estado HC 101540SP rel Min Ayres Britto 2ª Turma j 19102010 noticiado no Informativo 605 STF HC 106039MT rel Min Ayres Britto 2ª Turma j 27032012 No STJ HC 289602DF rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 24042014 STJ CC 90702PR rel Min Og Fernandes 3ª Seção j 22042009 noticiado no Informativo 391 Com igual conclusão CC 110576AM rel Min Arnaldo Esteves Lima 3ª Seção j 09062010 noticiado no Informativo 438 STF HC 115539RO rel Min Luiz Fux 1ª Turma j 03092013 noticiado no Informativo 718 No STJ HC 85106PR rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 02022010 75 76 77 78 79 80 81 82 83 84 85 Deferido o requerimento pelo magistrado de execução estadual não cabe ao juiz federal exercer juízo de valor sobre a gravidade das razões do solicitante STF HC 112650RJ rel Min Rosa Weber 1ª Turma j 11032014 noticiado no Informativo 738 STJ RMS 19385RJ rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 26042005 A Lei 128502013 atribuiu nova redação ao art 288 do Código Penal responsável pela tipificação do delito atualmente denominado de associação criminosa STJ HC 117199SP rel Min Napoleão Nunes Maia Filho 5ª Turma j 15092009 noticiado no Informativo 407 HC 40300RJ rel Min Arnaldo Esteves de Lima 5ª Turma j 07062005 Em igual sentido AgRg no RHC 46314MS rel Min Moura Ribeiro 5ª Turma j 05082014 STF EP 2 TrabExtAgRDF rel Min Roberto Barroso Plenário j 25062014 noticiado no Informativo 752 Rcl 25123SC rel Min Ricardo Lewandowski 2ª Turma j 18042017 noticiado no Informativo 861 HC 227960MG rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 18102012 noticiado no Informativo 507 As Turmas que integram a Terceira Seção desta Corte consagraram o entendimento de que a regra do art 114 I da LEP a qual exige do condenado para ingressar no regime aberto a comprovação de trabalho ou a possibilidade imediata de fazêlo apresentação de proposta de emprego deve sofrer temperamentos ante a realidade brasileira STJ HC 292764RJ rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 10062014 STJ HC 164056SP rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 10062010 noticiado no Informativo 438 No entanto amparado na dignidade da pessoa humana o STF já reconheceu o benefício da prisão domiciliar a preso provisório Confira Em seguida enfatizouse que a situação do paciente não estaria entre aquelas listadas nas alíneas do art 117 da LEP mas a demonstração cabal de que o Estado não teria condições de prestarlhe a assistência médica de que necessita para não falecer no cárcere justificaria a concessão de prisão domiciliar tendo em conta o princípio da dignidade da pessoa humana HC 98675ES rel Min Eros Grau 2ª Turma j 09062009 86 87 88 89 90 noticiado no Informativo 550 O STJ por sua vez já admitiu a prisão albergue domiciliar para condenados que cumprem pena nos regimes fechado e semiaberto HC 271060SP rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 17102013 e REsp 962078RS rel Min Adilson Vieira Macabu Desembargador convocado do TJRJ 5ª Turma j 17022011 noticiado no Informativo 463 O Supremo Tribunal Federal entretanto já abrandou o rigor do art 117 da LEP interpretandoo como uma relação meramente exemplificativa A propósito Na espécie a impetração insurgiase contra as precárias condições de higiene bem como a superlotação na casa de albergado em que o paciente condenado a cumprimento de pena em regime aberto se encontrava aduzindo que no ponto inexistiria separação entre condenados que cumprem pena em regime semiaberto e aberto O pleito da defesa fora indeferido nas demais instâncias ao argumento de que não se enquadraria no rol do art 117 da Lei de Execução Penal Enfatizouse o fato de o paciente estar em estabelecimento cuja população superaria o viável além de haver a junção de presos que cumprem a pena em regime aberto e aqueles que a cumprem no semiaberto Ademais asseverouse que o STF tem afastado o caráter taxativo da LEP relativamente ao direito em si da custódia domiciliar e que o faz quando não se tem casa do albergado Nesse sentido afirmouse que a situação concreta seria em tudo semelhante à inexistência da casa do albergado HC 95334RS rel orig Min Ricardo Lewandowski rel po acórdão Min Marco Aurélio 1ª Turma j 03032009 noticiado no Informativo 537 STF EP 23 AgRDF rel Min Roberto Barroso Plenário j 27082014 noticiado no Informativo 756 HC 115941PE rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 02042009 noticiado no Informativo 389 Falase nesse caso em prisão domiciliar humanitária STF HC 153961DF rel Min Dias Toffoli 2ª Turma j 27032018 noticiado no Informativo 895 A prisão preventiva poderá ser substituída pela domiciliar quando o agente for mulher com filho de até 12 anos de idade Com base nesse entendimento a Primeira Turma concedeu a ordem de habeas corpus para implementar a prisão domiciliar da paciente A paciente e o marido foram presos em flagrante como incurso no art 33 caput da Lei 113432006 Lei de Drogas O Colegiado asseverou que não foi observado o art 318 inciso V do Código de Processo Penal CPP 91 92 93 94 95 96 97 incluído pela Lei 132572016 que versa sobre políticas públicas para a primeira infância Esse benefício não foi estendido pela Turma ao cônjuge que é corréu no processo STF HC 136408SP rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 05122017 noticiado no Informativo 887 Os arts 318A e 318B do Código de Processo Penal disciplinam a prisão domiciliar aplicada em substituição à prisão preventiva imposta à mulher gestante ou que for mãe ou responsável por crianças ou pessoas com deficiência HC 143641SP rel Min Ricardo Lewandowski 2ª Turma j 20022018 noticiado no Informativo 891 A manutenção de monitoramento por meio de tornozeleira eletrônica sem fundamentação concreta evidencia constrangimento ilegal ao apenado Consoante dispõe o art 146D da Lei de Execução Penal a monitoração eletrônica poderá ser revogada quando se tornar desnecessária ou inadequada De qualquer sorte ainda que o monitoramento eletrônico com a colocação de tornozeleiras seja uma alternativa tecnológica ao cárcere a necessidade de sua manutenção deve ser aferida periodicamente podendo ser dispensada a cautela em casos desnecessários Todavia a simples afirmação de que o monitoramento é medida mais acertada à fiscalização do trabalho externo com prisão domiciliar deferido ao apenado em cumprimento de pena de reclusão no regime semiaberto sem maiores esclarecimentos acerca do caso concreto não constitui fundamento idôneo para justificar o indeferimento do pleito Assim como tem a jurisprudência exigido motivação concreta para a incidência de cautelares penais durante o processo criminal a fixação de medidas de controle em fase de execução da pena igual motivação exigem de modo que a incidência genérica sempre e sem exame da necessidade da medida gravosa de tornozeleiras eletrônicas não pode ser admitida STJ HC 351273CE rel Min Nefi Cordeiro 6ª Turma j 02022017 noticiado no Informativo 597 STF HC 104174RJ rel Min Ayres Britto 2ª Turma j 29032011 e STJ HC 215765RS rel Min Gilson Dipp 5ª Turma j 08112011 RE 641320RS rel Min Gilmar Mendes Plenário j 11052016 noticiado no Informativo 825 STJ REsp 1710674MG rel Min Reynaldo Soares da Fonseca 3ª Seção j 22082018 noticiado no Informativo 632 O habeas corpus não é o meio adequado para tutelar visita íntima por 98 99 100 101 102 103 104 105 106 107 108 não estar envolvido o direito de ir e vir Com base nesse entendimento a Primeira Turma inadmitiu a impetração STF HC 138286SP rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 05122017 noticiado no Informativo 887 A jurisprudência tem recomendado cautela e bom senso na aplicação das sanções indicadas na Súmula Vinculante 11 do Supremo Tribunal Federal sem apego ao excessivo formalismo Nesse sentido STF Rcl 11845MT AgR rel Min Celso de Mello Plenário j 19022014 O STF entendeu ser lícito o uso de algemas em caso envolvendo a presença de muitos advogados e funcionários tendo em conta o fato de haver mais de 10 réus na audiência com a agravante de que pertenceriam a uma facção criminosa muito atuante no Estado de São Paulo HC 103003SP rel Min Ellen Gracie 2ª Turma j 2932011 noticiado no Informativo 621 PSV 13DF Plenário j 24092015 noticiado no Informativo 800 Rcl 7116PE rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 24052016 noticiado no Informativo 827 HC 152720DF rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 10042018 noticiado no Informativo 897 Esta nomenclatura já foi utilizada pelo STF ADPF 347 MCDF rel Min Marco Aurélio Plenário j 09092015 noticiada no Informativo 798 RE 592581RS rel Min Ricardo Lewandowski Plenário j 13082015 noticiado no Informativo 794 RE 580252MS rel orig Min Teori Zavascki red p o ac Min Gilmar Mendes Plenário j 16022017 noticiado no Informativo 584 HC 264989SP rel Min Ericson Maranho 6ª Turma j 04082015 noticiado no Informativo 567 HC 98261RS rel Min Cezar Peluso 2ª Turma j 02032010 noticiado no Informativo 577 E mais STF RHC 117075DF rel Min Teori Zavascki 2ª Turma j 06112013 e STJ HC 277885MG rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 15102013 STF HC 114393RS rel Min Cármen Lúcia 2ª Turma j 03122013 noticiado no Informativo 731 O STJ firmou jurisprudência em sentido contrário permitindo seja o período de atividade laboral do apenado excedente ao limite máximo da jornada de trabalho 8 horas computado para fins de remição na razão de um dia de trabalho a cada seis horas 109 110 111 112 113 114 115 116 117 118 extras realizadas HC 216815RS rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 17102013 e AgRg no HC 196715RS rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 15082013 STF RHC 136509MG rel Min Dias Toffoli 2ª Turma j 04042017 noticiado no Informativo 860 HC 346948RS rel Min Reynaldo Soares da Fonseca 5ª Turma j 21062016 noticiado no Informativo 586 A Resolução nº 04 de 30 de maio de 2016 editada pelo Conselho Nacional de Educação órgão ligado ao Ministério da Educação dispõe sobre as diretrizes operacionais nacionais para a remição de pena pelo estudo de pessoas em privação de liberdade nos estabelecimentos penais do sistema prisional brasileiro A remição pelo estudo sem o bônus de 13 ocorre independentemente da conclusão do ensino ou do seu aproveitamento satisfatório STJ HC 289382RJ rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 08042014 e STJ AgRg no AREsp 426479MS rel Min Marilza Maynard Desembargadora convocada do TJSE 6ª Turma j 19082014 HC 382780PR rel Min Reynaldo Soares da Fonseca 5ª Turma j 04042017 HC 312486SP rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 09062015 noticiado no Informativo 564 HC 353689SP rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 14062016 noticiado no Informativo 837 REsp 1666637RS rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 26092017 noticiado no Informativo 613 É possível a remição do tempo de trabalho realizado antes do início da execução da pena desde que em data posterior à prática do delito STJ HC 420257RS rel Min Nefi Cordeiro 6ª Turma j 19042018 noticiado no Informativo 625 O STJ acertadamente entende que apenas continuará a beneficiarse da remição o preso que fique impossibilitado por acidente de prosseguir no trabalho ou nos estudos De fato se o condenado sequer iniciou o trabalho ou o estudo não pode obter o benefício de forma fictícia ainda que não apresente capacidade laborativa em razão da sua invalidez STJ HC 261514SP rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 19082014 119 120 121 122 123 124 125 126 127 128 129 STJ HC 174947SP rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 23102012 e STJ HC 167537SP rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 20032012 A relação de faltas graves inerentes à pena privativa de liberdade encontrase descrita no art 50 da Lei de Execução Penal em rol taxativo HC 94701RS rel orig Min Menezes Direito rel p acórdão Min Marco Aurélio 1ª Turma j 05082008 noticiado no Informativo 514 AgRg no REsp 1430097PR rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 19032015 noticiado no Informativo 559 Reconhecida falta grave no decorrer da execução penal não pode ser determinada a perda dos dias remidos na fração máxima de 13 sem que haja fundamentação concreta para justificála STJ HC 282265RS rel Min Rogerio Shietti Cruz 5ª Turma j 22042014 noticiado no Informativo 539 Em razão disso a Súmula Vinculante 9 está sujeita a revisão ou cancelamento pelo Supremo Tribunal Federal a teor da regra estabelecida pelo art 103A 2º da Constituição Federal e regulamentada pelo art 5º da Lei 114172006 Revogada ou modificada a lei em que se fundou a edição de enunciado de súmula vinculante o Supremo Tribunal Federal de ofício ou por provocação procederá à sua revisão ou cancelamento conforme o caso REsp 1517936RS rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 01102015 noticiado no Informativo 571 Cabe ao juízo da execução fixar a fração aplicável de perda dos dias remidos na hipótese de cometimento de falta grave observando o limite máximo de 13 um terço do total e a necessidade de fundamentar a decisão em elementos concretos conforme o art 57 da Lei de Execução Penal STJ HC 248232RJ rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 03042014 HC 95423RS rel orig Min Ellen Gracie rel p o acórdão Min Eros Grau 2ª Turma j 03032009 noticiado no Informativo 537 HC 193321SP rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 31052011 noticiado no Informativo 475 HC 110921RS rel Min Ricardo Lewandowski 2ª Turma j 22052012 noticiado no Informativo 667 130 131 132 133 134 HC 124520RO rel Min Marco Aurélio red p ac Min Roberto Barroso 1ª Turma j 29052018 noticiado no Informativo 904 MORAES Alexandre de SMANIO Gianpaolo Poggio Legislação penal especial 10 ed 2 reimpr São Paulo Atlas 2008 p 185 RHC 85026SP rel Min Eros Grau j 26042005 Em igual sentido HC 100001RJ rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 11052010 noticiado no Informativo 586 O STJ compartilha deste entendimento HC 216876SP rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 17122013 HC 93979RS rel Min Cármen Lúcia 1ª Turma j 22042008 noticiado no Informativo 503 É também a posição consolidada no Superior Tribunal de Justiça HC 178129RS rel Min Og Fernandes 6ª Turma j 07062011 noticiado no Informativo 476 REsp 1557408DF rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 16022016 noticiado no Informativo 577 341 342 CONCEITO A atividade de aplicar a pena exclusivamente judicial consiste em fixála na sentença depois de superadas todas as etapas do devido processo legal em quantidade determinada e respeitando os requisitos legais em desfavor do réu a quem foi imputada a autoria ou participação em uma infração penal Cuidase de ato discricionário juridicamente vinculado O juiz está preso aos parâmetros que a lei estabelece Dentro deles poderá fazer as suas opções para chegar a uma aplicação justa da pena atento às exigências da espécie concreta isto é às suas singularidades às suas nuanças objetivas e principalmente à pessoa a quem a sanção se destina É o que se convencionou chamar de teoria das margens ou seja limites mínimo e máximo para a dosimetria da pena Todavia é forçoso reconhecer estar habitualmente presente nesta atividade do julgador um coeficiente criador e mesmo irracional em que inclusive inconscientemente se projetam a personalidade e as concepções da vida e do mundo do juiz1 PRESSUPOSTO A aplicação da pena tem como pressuposto a culpabilidade do agente constituída por imputabilidade potencial consciência da ilicitude e exigibilidade de conduta diversa Ausente a culpabilidade será impossível a imposição de pena qualquer que seja a sua modalidade privativa de liberdade restritiva de direitos ou multa Mas na hipótese de inadequação da 343 pena poderá o réu suportar uma medida de segurança se for maior de 18 anos de idade e dotado de periculosidade Concluise pois que enquanto a culpabilidade é pressuposto de aplicação da pena a periculosidade funciona como pressuposto de aplicação da medida de segurança A pena no direito brasileiro deve ser aplicada mesmo quando o condenado posteriormente ao crime e por qualquer motivo não mais dependa de ressocialização Justificase esse posicionamento pela adoção da teoria mista ou unificadora da pena que possui além da finalidade preventiva especial a prevenção geral como objetivo intimidação da coletividade e principalmente o caráter retributivo obrigatoriedade de punição SISTEMAS OU CRITÉRIOS PARA APLICAÇÃO DA PENA A história recente do Direito Penal brasileiro indica a existência de dois sistemas principais para a aplicação da pena privativa de liberdade um bifásico e outro trifásico Para o critério bifásico idealizado por Roberto Lyra a pena privativa de liberdade deveria ser aplicada em duas fases distintas Na primeira fase o magistrado calcularia a penabase levando em conta as circunstâncias judiciais e as atenuantes e agravantes genéricas Em seguida incidiriam na segunda fase as causas de diminuição e de aumento da pena2 Esse sistema encontrou ressonância nos pensamentos de José Frederico Marques e de Basileu Garcia3 Por sua vez o critério trifásico elaborado por Nélson Hungria sustenta a dosimetria da pena privativa de liberdade em três etapas Na primeira o juiz fixa a penabase com apoio nas circunstâncias judiciais Em seguida aplica as atenuantes e agravantes genéricas e finalmente as causas de diminuição e de aumento da pena O art 68 caput do Código Penal filiouse ao critério trifásico De fato a penabase será fixada atendendose ao critério do art 59 deste Código em seguida serão consideradas as circunstâncias atenuantes e agravantes por 344 último as causas de diminuição e de aumento Entretanto para a pena de multa adotouse o sistema bifásico CP art 49 caput e 1º Fixase inicialmente o número de diasmulta e após calculase o valor de cada diamulta Para Alberto Silva Franco a reforma da Parte Geral do Código Penal pela Lei 72091984 embora acolhendo o critério trifásico foi além criou uma quarta fase ou seja a da substituição da pena privativa de liberdade pela pena restritiva de direitos ou pela pena pecuniária4 Por questões didáticas analisaremos cada um dos fatores que influem na aplicação da pena para em seguida enfrentarmos detalhadamente o critério trifásico e cada um de seus estágios ELEMENTARES E CIRCUNSTÂNCIAS Elementares ou elementos são os fatores que compõem a estrutura da figura típica integrando o tipo fundamental É o caso de alguém no crime de homicídio CP art 121 caput Por outro lado circunstâncias são os dados que se agregam ao tipo fundamental para o fim de aumentar ou diminuir a quantidade da pena tais como o motivo torpe e o relevante valor moral qualificadora e privilégio no homicídio doloso respectivamente Formam o tipo derivado As elementares normalmente encontramse descritas no caput do tipo penal enquanto as circunstâncias estão nos parágrafos a ele vinculados Excepcionalmente entretanto o legislador prevê elementares fora do caput como se verifica no crime de excesso de exação descrito pelo art 316 1º do Código Penal independente do delito de concussão tipificado pelo seu caput A forma mais segura para distinguir se determinado fator previsto em lei constituise em elementar ou circunstância se faz pelo critério da exclusão Se a sua retirada resultar na atipicidade do fato ou na desclassificação para outro delito tratase de elementar Mas se subsistir o mesmo crime alterandose somente a quantidade da pena cuidase de circunstância 345 No campo da aplicação da pena as circunstâncias podem ser legais ou judiciais Circunstâncias legais são as previstas no Código Penal e pela legislação penal especial São suas espécies as qualificadoras as atenuantes e agravantes genéricas e as causas de diminuição e de aumento da pena Circunstâncias judiciais de outro lado são as relacionadas ao crime e ao agente e alcançadas pela atividade judicial dependem da valoração do magistrado em conformidade com as regras previstas no art 59 caput do Código Penal Têm natureza residual ou subsidiária pois somente incidem quando não configuram circunstâncias legais No tocante à compensação entre as circunstâncias legais e as circunstâncias judiciais entendese ser possível essa operação somente quando dentro da mesma fase sob pena de se frustrar o sistema trifásico estabelecido em lei Exemplo na primeira fase o magistrado pode compensar os maus antecedentes circunstância judicial desfavorável ao réu com o comportamento inadequado da vítima circunstância judicial favorável ao réu É vedada a compensação envolvendo fases distintas5 Exemplo o juiz não pode compensar a personalidade desajustada do réu circunstância judicial desfavorável 1ª fase com a menoridade relativa atenuante genérica 2ª fase AGRAVANTES GENÉRICAS E CAUSAS DE AUMENTO DA PENA As agravantes genéricas são assim chamadas por estarem previstas taxativamente na Parte Geral do Código Penal arts 61 e 62 e serem aplicáveis aos delitos em geral6 A exasperação da pena que deve respeitar o limite máximo cominado pelo legislador é definida pelo juiz no caso concreto uma vez que a lei não indica a quantidade de aumento Incidem na segunda fase de aplicação da pena As causas de aumento da pena obrigatórias ou facultativas por sua vez 346 347 situamse na Parte Geral exemplos arts 70 71 73 e 74 na Parte Especial do Código Penal exemplos arts 155 1º 157 2º e 2ºA 158 1º 317 1º etc e também na legislação especial exemplos Lei 96131998 Lavagem de Dinheiro art 1º 4º e Lei 113432006 Drogas art 40 etc São previstas em quantidade fixa exemplo aumentase a pena de um terço ou variável exemplo aumentase a pena de 16 a 23 podendo elevar a pena concreta acima do limite máximo legalmente estipulado pelo legislador Aplicamse na terceira fase da dosimetria da pena e são também chamadas de qualificadoras em sentido amplo CAUSAS DE AUMENTO DA PENA E QUALIFICADORAS As causas de aumento da pena utilizáveis na terceira fase da aplicação da pena funcionam exclusivamente como percentuais para a elevação da reprimenda em quantidade fixa ou variável Encontram previsão tanto na Parte Geral como na Parte Especial do Código Penal e também na legislação especial Já as qualificadoras têm penas próprias dissociadas do tipo fundamental pois são alterados os próprios limites mínimo e máximo abstratamente cominados Ademais no caso de crime qualificado o magistrado já utiliza na primeira fase da dosimetria da pena a sanção a ele correspondente Finalmente estão previstas na Parte Especial do Código Penal e na legislação especial mas não em hipótese alguma na Parte Geral ATENUANTES GENÉRICAS E CAUSAS DE DIMINUIÇÃO DA PENA As atenuantes genéricas recebem essa denominação por estarem localizadas exemplificativamente na Parte Geral do Código Penal arts 65 e 66 e serem aplicáveis aos delitos em geral7 O abrandamento da pena que deve observar o limite mínimo cominado pelo legislador8 é definido pelo juiz no caso concreto uma vez que a lei não indica a quantidade de diminuição Têm lugar na segunda fase de aplicação da pena 348 As causas de diminuição da pena obrigatórias ou facultativas estão previstas na Parte Geral exemplos arts 16 21 caput in fine 24 2º 26 parágrafo único etc e na Parte Especial do Código Penal exemplos arts 121 1º 155 2º etc bem como na legislação especial exemplos Lei 74921986 Crimes contra o Sistema Financeiro Nacional art 25 2º Lei 113432006 Drogas art 33 4º etc em quantidade fixa exemplo diminuise a pena de 13 ou variável exemplo diminuise a pena de 13 a 23 Podem reduzir a pena abaixo do mínimo legal e incidem na terceira fase de aplicação da pena O CRITÉRIO TRIFÁSICO O art 68 do Código Penal adotou o critério ou sistema trifásico Impõese a dosimetria da pena privativa de liberdade em três fases distintas e sucessivas Cada etapa de fixação da pena deve ser suficientemente fundamentada pelo julgador Permitese assim a regular individualização da pena CF art 5º XLVI além de conferir ao réu o exercício da ampla defesa pois lhe concede o direito de acompanhar e impugnar se reputar adequado cada estágio de aplicação da pena Na visão do Supremo Tribunal Federal A necessidade de fundamentação dos pronunciamentos judiciais inciso IX do art 93 da Constituição Federal tem na fixação da pena um dos seus momentos culminantes Garantia constitucional que submete o magistrado a coordenadas objetivas de imparcialidade e propicia às partes conhecer os motivos que levaram o julgador a decidir neste ou a b c d naquele sentido O dever de motivação no trajeto da dosimetria da pena não passou despercebido à reforma penal de 1984 Tanto que a ele o legislador fez expressa referência na Exposição de Motivos da Nova Parte Geral do Código Penal ao cuidar do sistema trifásico de aplicação da pena privativa de liberdade9 A ausência de fundamentação leva à nulidade da sentença CF art 93 IX10 ou pelo menos à redução da pena ao mínimo legal pela instância superior Com efeito prevalece o entendimento de que a aplicação da pena no mínimo legal prescinde de motivação em face da inexistência de prejuízo ao réu11 A análise do Código Penal autoriza a extração de algumas regras inerentes ao critério trifásico na penabase o juiz deve navegar dentro dos limites legais cominados à infração penal isto é não pode ultrapassar o patamar mínimo nem o patamar máximo correspondente ao crime ou à contravenção penal pelo qual o réu foi condenado se estiverem presentes agravantes ou atenuantes genéricas a pena não pode ser elevada além do máximo abstratamente cominado nem reduzida aquém do mínimo legal as causas de aumento e de diminuição são aplicáveis em relação à reprimenda resultante da segunda fase e não sobre a penabase E se existirem causas de aumento ou de diminuição a pena pode ser definitivamente fixada acima ou abaixo dos limites máximo e mínimo abstratamente definidos pelo legislador12 na ausência de agravantes eou atenuantes genéricas e também de causas de aumento eou de diminuição da pena a penabase resultará como definitiva Concluída a operação relativa à dosimetria da pena a etapa seguinte consiste em determinar o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade fechado semiaberto ou aberto Após o magistrado deve analisar na própria sentença condenatória 349 eventual possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos ou multa E se não for cabível a substituição mas a pena for igual ou inferior a 2 dois anos exigese manifestação fundamentada acerca da pertinência ou não da suspensão condicional da pena sursis se presentes os requisitos legais Depois de concretizada a sanção penal o juiz fixará valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido CPP art 387 inc IV13 Finalmente se não foi possível a substituição ou a suspensão condicional da pena privativa de liberdade o magistrado na sentença decidirá fundamentadamente sobre a manutenção ou se for o caso a imposição de prisão preventiva ou de outra medida cautelar sem prejuízo do conhecimento da apelação que vier a ser interposta CPP art 387 1º A PRIMEIRA FASE DA DOSIMETRIA DA PENA FIXAÇÃO DA PENABASE Para o cálculo da penabase o juiz se vale das circunstâncias judiciais indicadas pelo art 59 caput do Código Penal14 Posteriormente sobre essa penabase incidirão as atenuantes e agravantes genéricas 2ª fase bem como as causas de diminuição ou de aumento da pena 3ª fase Nessa etapa ainda que todas as circunstâncias sejam extremamente favoráveis ao réu a penabase não pode ser inferior ao mínimo abstratamente cominado ao crime E de igual modo mesmo sendo as circunstâncias judiciais inteiramente contrárias ao acusado a penabase deve respeitar o máximo legalmente previsto Em suma o juiz está adstrito aos parâmetros legais não podendo ultrapassálos15 Essas circunstâncias são também conhecidas como inominadas porque a lei não lhes fornece nomenclatura específica ao contrário do que fez com as circunstâncias legais Têm caráter residual ou subsidiário pois apenas podem ser utilizadas quando não configurarem elementos do tipo penal qualificadoras ou privilégios agravantes ou atenuantes genéricas ou ainda causas de aumento ou de diminuição da pena todas elas preferenciais pelo fato de terem sido expressamente definidas em lei Em razão disso o julgador ao determinar a quantidade de pena aplicável deve ter a prudência de evitar o bis in idem como corolário da utilização ainda que impensada por duas ou mais vezes de uma mesma circunstância para elevar a reprimenda16 Exemplo em crime de lesões corporais cometido contra uma senhora de 90 noventa anos de idade o magistrado fundamenta a exasperação da penabase em decorrência da covardia e da superioridade de forças do agente Depois impõe na segunda fase a agravante genérica contida no art 61 II h do Código Penal crime contra pessoa maior de 60 anos É patente a dupla punição pelo mesmo fato pois tais circunstâncias são ínsitas ao crime praticado contra a pessoa idosa Não podem funcionar simultaneamente como circunstância judicial e agravante genérica Quando o preceito secundário do tipo penal cominar penas alternativas exemplo detenção ou multa o magistrado deve previamente à dosimetria da pena optar por qual delas irá aplicar E se o crime imputado for qualificado iniciase a fixação da penabase a partir da pena correspondente à qualificadora Na hipótese de estarem presentes duas ou mais qualificadoras exemplo homicídio qualificado pelo motivo torpe pelo meio cruel e pelo recurso que dificultou a defesa do ofendido CP art 121 2º I III e IV o magistrado deve utilizar uma delas para qualificar o crime e as demais como agravantes genéricas na segunda fase desde que encontrem correspondência nos arts 61 e 62 do Código Penal Em outras palavras a circunstância que funciona como qualificadora do crime deve ser também prevista como agravante genérica E se não houver essa correspondência as demais qualificadoras passam a funcionar como circunstâncias judiciais desfavoráveis incidindo na fixação da penabase 1ª base17 Mas também há posicionamentos sustentando que em qualquer hipótese as demais qualificadoras atuam como circunstâncias judiciais desfavoráveis influenciando na dosimetria da penabase 1ª fase E finalmente há entendimento minoritário no sentido de que na pluralidade de qualificadoras somente uma pode ser empregada pelo julgador desprezandose as demais pois a função a elas correlata aumentar a pena em abstrato já foi desempenhada Essa posição encontra forte resistência uma vez que a sua aplicação prática viola o princípio da isonomia constitucionalmente consagrado De fato pessoas em situação diversa receberiam igual tratamento pelo magistrado responsável pela fixação da pena privativa de liberdade O art 59 caput do Código Penal contém 8 oito circunstâncias judiciais as quais devem ser enfrentadas pelo magistrado fundamentadamente sob pena de nulidade da sentença Não é suficiente a indicação genérica dessas circunstâncias Exigese a análise específica de cada uma delas reportandose o julgador aos elementos dos autos da ação penal relativos a elas De fato se a penabase for majorada sem fundamentação estará configurado o excesso de pena reclamando sua diminuição pela instância superior Convencionouse chamarse essa tarefa judicial de redimensionamento da pena18 Somente quando todas as circunstâncias judiciais forem favoráveis ao réu a pena deve ser fixada no mínimo legal Em verdade se uma delas lhe for desfavorável o juiz deve elevála acima do piso19 E nesse contexto se diversas circunstâncias inominadas apresentaremse como prejudiciais ao acusado nada impede a imposição da pena máxima ou então próxima do máximo legal Todavia instalouse na prática forense o raciocínio equivocado pelo qual a penabase equivale à pena mínima o que não se compactua com o espírito da legislação penal Em consonância com a cultura da pena mínima reinante no Brasil a jurisprudência se firmou no sentido de que quando imposta a reprimenda em seu patamar mínimo prescindese de fundamentação judicial É a posição consolidada inclusive no Supremo Tribunal Federal A jurisprudência do Supremo é assente no sentido de não reconhecer a nulidade do tópico da decisão que como na espécie fixa a pena no mínimo legal haja vista não haver como se comprovar qualquer prejuízo ao réu20 Discordamos dessa ideia pois além do direito do réu acerca da fundamentação existe também o direito da sociedade em saber as razões que levaram o Poder Judiciário a aplicar a pena privativa de liberdade em seu patamar mínimo O Direito Penal constituise em ramo do Direito Público e portanto insuscetível de ser moldado apenas pelo interesse de uma das partes réu da relação processual Para nós a aplicação da pena deve ser sempre suficientemente motivada nos moldes do art 93 IX da Constituição Federal independentemente da sua quantidade em concreto É necessário na fixação da penabase o respeito ao princípio da proporcionalidade evidenciado pela relação lógica entre o número de circunstâncias judiciais prejudiciais ao réu e a elevação da pena mínima legalmente prevista Na linha de raciocínio do Supremo Tribunal Federal Consignou que as circunstâncias judiciais CP art 59 são alvo de críticas por parte da doutrina e da própria jurisprudência quanto à indeterminação do seu conteúdo e quanto à falta de parâmetros objetivos para o cálculo da penabase Aduziu a necessidade de observância da proporcionalidade entre a penabase aplicada e as circunstâncias judiciais valoradas a partir das peculiaridades do caso concreto pelo julgador No ponto asseverou que a proporcionalidade seria estabelecida entre a quantidade de circunstâncias judiciais desfavoráveis ao agente e a majoração da pena mínima definida no tipo penal21 Vejamos cada uma das circunstâncias judiciais elencadas pelo art 59 caput do Código Penal Algumas dizem respeito ao agente culpabilidade antecedentes conduta social personalidade e motivos do crime e outras se relacionam à infração penal circunstâncias consequências e comportamento do ofendido A partir da Reforma da Parte Geral do Código Penal pela Lei 72091984 essa circunstância judicial substituiu as expressões intensidade do dolo e grau da culpa previstas originariamente no art 42 do Código Penal como relevantes para a aplicação da penabase O legislador agiu corretamente pois com a adoção do sistema finalista o dolo e a culpa passaram a ser considerados no interior da conduta integrando a estrutura do fato típico Destarte tais elementos não mais se relacionam com a aplicação da pena22 A culpabilidade deve ser compreendida como o juízo de reprovabilidade como o juízo de censura que recai sobre o responsável por um crime ou contravenção penal no intuito de desempenhar o papel de pressuposto de aplicação da pena E nesse ponto equivocouse o legislador pois todos os envolvidos em uma infração penal desde que culpáveis devem ser punidos Em outras palavras a culpabilidade relacionase com a possibilidade de aplicação da pena mas não com a sua dosimetria Portanto teria sido mais feliz o legislador se tivesse utilizado a expressão grau de culpabilidade para transmitir a ideia de que todos os agentes culpáveis autores ou partícipes de um ilícito penal serão punidos mas os que agiram de modo mais reprovável suportarão penas mais elevadas Para o Supremo Tribunal Federal A circunstância judicial culpabilidade disposta no art 59 do CP atende ao critério constitucional da individualização da pena Com base nessa orientação o Plenário indeferiu habeas corpus em que se pleiteava o afastamento da mencionada circunstância judicial Consignouse que a previsão do aludido dispositivo legal atinente à culpabilidade mostrarse ia afinada com o princípio maior da individualização porquanto a análise judicial das circunstâncias pessoais do réu seria indispensável à adequação temporal da pena em especial nos crimes perpetrados em concurso de pessoas nos quais se exigiria que cada um respondesse tão somente na medida de sua culpabilidade CP art 29 Afirmouse que o dimensionamento desta quando cotejada com as demais circunstâncias descritas no art 59 do CP revelaria ao magistrado o grau de censura pessoal do réu na prática do ato delitivo Aduziuse que ao contrário do que sustentado a ponderação acerca das circunstâncias judiciais do crime atenderia ao princípio da proporcionalidade e representaria verdadeira limitação da discricionariedade judicial na tarefa individualizadora da penabase23 Com amparo nessa circunstância judicial o Supremo Tribunal Federal já reconheceu a possibilidade de exasperação da penabase aplicada a policial civil responsável pelo crime de concussão na situação em que o agente público valese da autoridade inerente ao seu cargo para exigir vantagem indevida de pessoa envolvida na prática de crimes É legítima a utilização da condição pessoal de policial civil como circunstância judicial desfavorável para fins de exasperação da pena base aplicada a acusado pela prática do crime de concussão A Turma afirmou que seria possível no que se refere à culpabilidade CP art 59 promover em cada caso concreto juízo de reprovabilidade maior tendo em consideração a condição de policial civil do agente O delito previsto no art 316 do CP seria de mão própria porém presentes as circunstâncias do art 59 do CP se poderia levar em conta quando do juízo de reprovabilidade a qualidade específica ou a qualificação do funcionário público Dentro do Estado Democrático de Direito e do país que se almeja construir o fato de uma autoridade pública no caso uma autoridade policial obter vantagem indevida de alguém que esteja praticando um delito comprometeria de maneira grave o fundamento de legitimidade da autoridade que seria atuar pelo bem comum e pelo bem público Portanto aquele que fosse investido de parcela de autoridade pública fosse juiz membro do Ministério Público ou autoridade policial deveria ser avaliado no desempenho da sua função com escrutínio mais rígido24 São os dados atinentes à vida pregressa do réu na seara criminal Dizem respeito a todos os fatos e acontecimentos que envolvem o seu passado criminal bons ou ruins Em suma os antecedentes se revelam como o filme de tudo o que ele fez ou deixou de fazer antes de envolverse com o ilícito penal desde que contidos em sua folha de antecedentes Todos os demais fatores relacionados à sua vida pretérita que não os indicados na folha de antecedentes devem ser analisados no âmbito da conduta social também circunstância judicial prevista no art 59 caput do Código Penal25 E o que são maus antecedentes No passado o Supremo Tribunal Federal entendia que inquéritos policiais e ações penais contidas na folha de antecedentes do réu podiam caracterizar maus antecedentes ainda que estivessem em curso é dizer mesmo sem condenação transitada em julgado26 Isso porque uma anotação criminal não surge imotivadamente na vida de alguém e quando existente representa um antecedente negativo no aspecto criminal Contudo ultimamente o Pretório Excelso tem decidido que maus antecedentes são unicamente as condenações definitivas que não caracterizam reincidência seja pelo decurso do prazo de 5 anos após a extinção da pena CP art 64 I seja pela condenação anterior ter sido lançado em consequência de crime militar próprio ou político CP art 64 II seja finalmente pelo fato de o novo crime ter sido cometido antes da condenação definitiva por outro delito Vale a pena conferir o seguinte julgado Inquéritos policiais ou ações penais sem trânsito em julgado não podem ser considerados como maus antecedentes para fins de dosimetria da pena Esse o entendimento do Plenário que em conclusão de julgamento e por maioria desproveu recurso extraordinário O Colegiado explicou que a jurisprudência da Corte sobre o tema estaria em evolução e a tendência atual seria no sentido de que a cláusula constitucional da não culpabilidade CF art 5º LVII não poderia ser afastada Haveria semelhante movimento por parte da doutrina a concluir que sob o império da nova ordem constitucional somente poderiam ser valoradas como maus antecedentes as decisões condenatórias irrecorríveis Assim não poderiam ser considerados para esse fim quaisquer outras investigações ou processos criminais em andamento mesmo em fase recursal Esse ponto de vista estaria em consonância com a moderna jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos e do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem Ademais haveria recomendação por parte do Comitê de Direitos Humanos das Nações Unidas no sentido de que o Poder Público deveria absterse de prejulgar o acusado O lançamento no mundo jurídico de enfoque ainda não definitivo e portanto sujeito a condição resolutiva potencializaria a atuação da polícia judiciária bem como a precariedade de certos pronunciamentos judiciais Nesse sentido uma vez admitido pelo sistema penal brasileiro o conhecimento do conteúdo da folha penal como fator a se ter em conta na fixação da pena a presunção deveria militar em favor do acusado O arcabouço normativo não poderia ser interpretado a ponto de gerar perplexidade27 No Superior Tribunal de Justiça é pacífico o entendimento no sentido de que responder a processo criminal não significa ter maus antecedentes uma vez que só se considera o réu culpado após o trânsito em julgado de sentença penal condenatória Além disso o agente não pode ser prejudicado pela simples existência de inquéritos policiais em curso ou arquivados ou de ação penal em andamento ou com a pretensão punitiva julgada improcedente ou ainda com a transação penal concedida no âmbito dos Juizados Especiais Criminais Essa posição restou consolidada na Súmula 444 do Superior Tribunal de Justiça É vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a penabase28 Na mesma direção preceitua o art 20 parágrafo único do Código de Processo Penal com a redação conferida pela Lei 126812012 Nos atestados de antecedentes que lhe forem solicitados a autoridade policial não poderá mencionar quaisquer anotações referentes a instauração de inquérito contra os requerentes É importante destacar que para fins de caracterização dos maus antecedentes basta a existência de uma condenação penal definitiva pouco importando o momento da sua concretização Em outras palavras embora exista um delito anterior o trânsito em julgado da condenação dele decorrente pode ser posterior à prática do novo crime no qual será considerada a circunstância judicial desfavorável Como já decidido pelo Supremo Tribunal Federal A dosimetria da pena é matéria sujeita a certa discricionariedade judicial O Código Penal não estabelece rígidos esquemas matemáticos ou regras absolutamente objetivas para a fixação da pena Condenações transitadas em julgado após o cometimento dos crimes objeto da condenação são aptas a desabonar na primeira fase da dosimetria os antecedentes criminais para efeito de exacerbação da penabase CP art 5929 Vale frisar é imperioso que exista uma condenação definitiva por fato anterior ao crime cuja pena se esteja a individualizar Essa ilação extraise do próprio nome da circunstância judicial antecedente Na dicção do Superior Tribunal de Justiça No cálculo da penabase é impossível a consideração de condenação transitada em julgado correspondente a fato posterior ao narrado na denúncia para valorar negativamente os maus antecedentes a personalidade ou a conduta social do agente30 No tocante à validade da condenação anterior para fins de maus antecedentes o Código Penal filiouse ao sistema da perpetuidade ou seja o decurso do tempo após o cumprimento ou extinção da pena não elimina esta circunstância judicial desfavorável ao contrário do que se verifica na reincidência CP art 64 I Em apertada síntese não há para aos maus antecedentes regra análoga àquela contida em relação à reincidência Esta é a nossa posição amparada pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal O Plenário asseverou que o transcurso do quinquênio previsto no art 64 I do CP não seria óbice ao acionamento do art 59 do mesmo diploma31 A 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal todavia já decidiu que os maus antecedentes também desaparecem após 5 anos do cumprimento ou da extinção da pena As condenações transitadas em julgado há mais de cinco anos não poderão ser caracterizadas como maus antecedentes para efeito de fixação da pena conforme previsão do art 64 I do CP Para efeito de reincidência I não prevalece a condenação anterior se entre a data do cumprimento ou extinção da pena e a infração posterior tiver decorrido período de tempo superior a 5 cinco anos computado o período de prova da suspensão ou do livramento condicional se não ocorrer revogação Esse é o entendimento da Segunda Turma que em conclusão de julgamento e por maioria concedeu a ordem em habeas corpus para restabelecer a decisão do tribunal de justiça que afastara os maus antecedentes considerada condenação anterior ao período depurador CP art 64 I para efeito de dosimetria da pena A Turma afirmou que o período depurador de cinco anos teria a aptidão de nulificar a reincidência de forma que não poderia mais influenciar no quantum de pena do réu e em nenhum de seus desdobramentos Observou que seria assente que a ratio legis consistiria em apagar da vida do indivíduo os erros do passado já que houvera o devido cumprimento de sua punição de modo que seria inadmissível atribuir à condenação o status de perpetuidade sob pena de violação aos princípios constitucionais e legais sobretudo o da ressocialização da pena A Constituição vedaria expressamente na alínea b do inciso XLVII do art 5º as penas de caráter perpétuo Esse dispositivo suscitaria questão acerca da proporcionalidade da pena e de seus efeitos para além da reprimenda corporal propriamente dita Nessa perspectiva por meio de cotejo das regras basilares de hermenêutica constatarseia que se o objetivo primordial fosse o de se afastar a pena perpétua reintegrando o apenado no seio da sociedade com maior razão deverseia aplicar esse raciocínio aos maus antecedentes Ademais o agravamento da penabase com fundamento em condenações transitadas em julgado há mais de cinco anos não encontraria previsão na legislação pátria tampouco na Constituição mas se trataria de uma analogia in malam partem método de integração vedado em nosso ordenamento32 Em outras palavras a Suprema Corte aplicou o sistema da temporariedade para a circunstância judicial em estudo partindo da premissa de que se a reincidência mais grave desaparece após cinco anos da extinção da pena igual raciocínio deve ser utilizado para os maus antecedentes pois revestemse de menor gravidade Também conhecida como antecedentes sociais é o estilo de vida do réu correto ou inadequado perante a sociedade sua família ambiente de trabalho círculo de amizades e vizinhança etc33 Deve ser objeto de questionamento do magistrado tanto no interrogatório como na colheita da prova testemunhal Se necessária para a busca da verdade real pode ser ainda determinada a avaliação do acusado pelo Setor Técnico do juízo avaliação social e psicológica De acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça na dosimetria da pena os fatos posteriores ao crime em julgamento não podem ser utilizados como fundamento para valorar negativamente a culpabilidade a personalidade e a conduta social do réu34 É preciso cuidado para não confundir a conduta social com os maus antecedentes os quais se limitam ao passado do réu no âmbito criminal Mais do que isso devese ter muita atenção para não se valorar duplamente um mesmo dado fático como conduta social e mau antecedente afastandose o inaceitável bis in idem Na lúcida advertência do Supremo Tribunal Federal Em conclusão de julgamento a Segunda Turma deu provimento a recurso ordinário para determinar ao juízo de execução competente que redimensione a penabase de condenado a quatro anos e onze meses de reclusão em regime inicial semiaberto pela prática do delito de furto qualificado Cuidavase de habeas corpus no qual se alegava afronta ao princípio do ne bis in idem uma vez que o tribunal de origem não poderia ter valorado a conduta social com elementos próprios e típicos dos maus antecedentes e da reincidência O Colegiado afirmou que a decisão impugnada teria considerado negativamente circunstâncias judiciais diversas com fundamento na mesma base empírica qual seja os registros criminais a conferirlhes conceitos jurídicos assemelhados Apontou que antes da reforma da parte geral do CP1984 entendiase que a análise dos antecedentes abrangeria todo o passado do agente a incluir além dos aludidos registros o comportamento em sociedade Com o advento da Lei 72091984 a conduta social teria passado a ter configuração própria Introduzirase um vetor apartado com vistas a avaliar o comportamento do condenado no meio familiar no ambiente de trabalho e no relacionamento com outros indivíduos Ou seja os antecedentes sociais do réu não mais se confundiriam com os seus antecedentes criminais Tratarseia de circunstâncias diversas e por isso mesmo a exasperação da penabase mediante a invocação delas exigiria do magistrado a clara demonstração de subsunção da realidade fática ao preceito legal dentro dos limites típicos Concluiu que teria havido indevida desvalorização plural de circunstâncias as quais possuiriam balizas próprias com justificativa na mesma base fática35 É o perfil subjetivo do réu nos aspectos moral e psicológico pelo qual se analisa se tem ou não o caráter voltado à prática de infrações penais O Superior Tribunal de Justiça faz importante advertência sobre o tema Havendo registros criminais já considerados na primeira e na segunda fases da fixação da pena maus antecedentes e reincidência essas mesmas condenações não podem ser valoradas para concluir que o agente possui personalidade voltada à criminalidade A adoção de entendimento contrário caracteriza o indevido bis in idem36 São os fatores psíquicos que levam a pessoa a praticar o crime ou a contravenção penal Só tem cabimento essa circunstância judicial favorável ou desfavorável ao réu quando a motivação não caracterizar elementar do delito qualificadora causa de diminuição ou de aumento da pena ou atenuante ou agravante genérica37 Exemplo o motivo fútil é qualificadora do homicídio CP art 121 2º II e agravante genérica para os demais crimes CP art 61 II a Destarte se fútil o motivo será utilizado como qualificadora ou agravante genérica conforme o caso e não como circunstância judicial desfavorável evitandose o bis in idem Os motivos do crime não se confundem com o dolo e a culpa Aqueles são dinâmicos mutáveis desvinculados do tipo penal e revelam os desejos do agente Podem ou não ser alcançados com a prática da infração penal Exemplo A mata B seu colega de trabalho com o propósito de conseguir a única vaga de chefe da empresa motivo torpe No entanto C até então desconhecido vem a ser promovido ao disputado cargo O dolo e a culpa alocados no fato típico por outro lado são estáticos e vinculados ao tipo penal e é irrelevante para sua caracterização o móvel da conduta Exemplo A efetua disparos de arma de fogo contra B matandoo Seja qual for o motivo o dolo está configurado São os dados acidentais secundários relativos à infração penal mas que não integram sua estrutura tais como o modo de execução do crime os instrumentos empregados em sua prática as condições de tempo e local em que ocorreu o ilícito penal o relacionamento entre o agente e o ofendido etc Nesse contexto o Superior Tribunal de Justiça já admitiu a elevação da pena base em estelionato no qual a vítima nutria plena confiança no agente O cometimento de estelionato em detrimento de vítima que conhecia o autor do delito e lhe depositava total confiança justifica a exasperação da penabase De fato tendo sido apontados argumentos idôneos e diversos do tipo penal violado que evidenciam como desfavoráveis as circunstâncias do crime não há constrangimento ilegal na valoração negativa dessa circunstância judicial38 Não há lugar para a gravidade abstrata do crime pois essa circunstância já foi levada em consideração pelo legislador para a cominação das penas mínima e máxima39 As circunstâncias do crime vinculamse ao aumento da pena pois as circunstâncias favoráveis ao réu devem ser aceitas como atenuantes genéricas inominadas na forma do art 66 do Código Penal A pena poderá ser ainda atenuada em razão de circunstância relevante anterior ou posterior ao crime embora não prevista expressamente em lei Justificase essa conclusão pela natureza residual das circunstâncias judiciais Envolvem o conjunto de efeitos danosos provocados pelo crime em desfavor da vítima de seus familiares ou da coletividade Essa circunstância judicial deve ser aplicada com atenção em um estupro exemplificativamente o medo provocado na pessoa homem ou mulher vitimada é consequência natural do delito e não pode funcionar como fator de exasperação da pena ao contrário do trauma certamente causado em seus filhos menores quando o crime é por eles presenciado Como alerta o Superior Tribunal de Justiça Não é possível a utilização de argumentos genéricos ou circunstâncias elementares do próprio tipo penal para o aumento da penabase com fundamento nas consequências do delito40 Nesse contexto o Supremo Tribunal Federal já decidiu que os elevados custos da atuação estatal para apuração da conduta criminosa e o enriquecimento ilícito logrado pelo agente não constituem motivação idônea para a valoração negativa do vetor consequências do crime na primeira fase da dosimetria da pena41 É a atitude da vítima que tem o condão de provocar ou facilitar a prática do crime Cuidase de circunstância judicial ligada à vitimologia isto é ao estudo da participação da vítima e dos males a ela produzidos por uma infração penal Nesse sentido aquele que abertamente manuseia grande quantidade de dinheiro em um ônibus por exemplo incentiva a prática de furtos ou roubos por ladrões E a mulher que interessada em lucros fáceis presta favores sexuais mediante remuneração em estabelecimento pertencente a outrem colabora para o crime de favorecimento da prostituição tipificado pelo art 228 do Código Penal42 3410 Fácil concluir portanto que se trata de circunstância judicial neutra ou então favorável ao réu mas que nunca pode ser utilizada para prejudicálo Como destaca o Superior Tribunal de Justiça O comportamento da vítima apenas deve ser utilizado em benefício do réu devendo tal circunstância ser neutralizada no caso de não interferência do ofendido na prática do crime43 A SEGUNDA FASE DA DOSIMETRIA DA PENA ATENUANTES E AGRAVANTES Atenuantes e agravantes são circunstâncias legais de natureza objetiva ou subjetiva não integrantes da estrutura do tipo penal mas que a ele se ligam com a finalidade de diminuir ou aumentar a pena Podem ser genéricas quando previstas na Parte Geral do Código Penal e aplicáveis à generalidade dos crimes ou específicas se contidas em leis extravagantes e aplicáveis somente a determinados crimes tal como se verifica no art 298 da Lei 95031997 Código de Trânsito Brasileiro em relação aos crimes de trânsito agravantes e no art 14 da Lei 96051998 no tocante aos crimes ambientais atenuantes As agravantes genéricas prejudiciais ao réu estão previstas nos arts 61 e 62 do Código Penal em rol taxativo não se admitindo analogia in malam partem Contrariamente as atenuantes genéricas favoráveis ao acusado encontramse descritas em rol exemplificativo Com efeito nada obstante o art 65 do Código Penal apresente relação detalhada de atenuantes genéricas o art 66 abre grande válvula de escape ao estatuir que a pena poderá ser ainda atenuada em razão de circunstância relevante anterior ou posterior ao crime embora não prevista expressamente em lei Destarte qualquer circunstância relevante e favorável ao réu seja anterior ou posterior ao crime pode atuar como fator judicialmente discricionário de abrandamento da pena Atenuantes e agravantes são de aplicação compulsória pelo magistrado que não pode deixar de leválas em conta quando presentes na dosimetria da pena No tocante às agravantes genéricas o art 61 caput do Código Penal dispõe que são causas que sempre agravam a pena enquanto estabelece o art 62 caput do Código Penal que a pena será ainda agravada Mas para evitar o bis in idem vedase a sua utilização quando já funcionarem como elementar do tipo penal ou ainda como qualificadora ou causa de aumento da pena As agravantes serão inócuas ainda que muitas delas estejam presentes quando a penabase já tiver sido fixada no máximo legalmente previsto Com efeito embora sempre agravem a pena tais circunstâncias não podem elevála acima do teto cominado em abstrato pois não integram a estrutura típica e como o legislador não previu expressamente o percentual de exasperação da pena a atividade judicial que criasse uma nova reprimenda para determinada infração penal violaria o princípio da separação de poderes do Estado CF art 2º uma vez que estaria inovando no plano legislativo Nos crimes dolosos contra a vida de competência do Tribunal do Júri as agravantes e atenuantes não são indagadas aos jurados mas aplicadas diretamente pelo juizpresidente desde que tenham sido alegadas nos debates entre as partes CPP art 492 I b O Código Penal em seu art 61 I trata da reincidência agravante genérica cuja amplitude e complexidade reclamam análise isolada No inciso II o art 61 elenca diversas agravantes genéricas e de acordo com o posicionamento dominante nos âmbitos doutrinário e jurisprudencial aplicamse exclusivamente aos crimes dolosos e também aos preterdolosos pois tais delitos têm a fase inicial caracterizada pela presença do dolo44 já que seria incompatível a incidência nos crimes culposos não se justificando a elevação da pena quando produzido involuntariamente o resultado naturalístico Já decidiu o Supremo Tribunal Federal contudo no julgamento histórico do navio Bateau Mouche que tais agravantes também recaem sobre os crimes culposos Não obstante a corrente afirmação apodíctica em contrário além da reincidência outras circunstâncias agravantes podem incidir na hipótese de crime culposo assim as atinentes ao motivo quando referidas à valoração da conduta a qual também nos delitos culposos é voluntária independentemente da não voluntariedade do resultado admissibilidade no caso da afirmação do motivo torpe a obtenção do lucro fácil que segundo o acórdão condenatório teria induzido os agentes ao comportamento imprudente e negligente de que resultou o sinistro45 Finalmente o art 62 do Código Penal cuida das agravantes no concurso de pessoas As atenuantes genéricas também são de incidência obrigatória De fato diz o art 65 caput que são circunstâncias que sempre atenuam a pena Consequentemente quando presentes devem ser aplicadas pelo juiz salvo quando já funcionarem como causa de diminuição da pena Além disso as atenuantes genéricas ainda que existam muitas delas no caso concreto serão ineficazes quando a penabase 1ª fase for fixada no mínimo legal Como não integram a estrutura do tipo penal e não tiveram o percentual de redução previsto expressamente pelo legislador a aplicação da pena fora dos parâmetros legais representaria intromissão indevida do Poder Judiciário na função legiferante Tais motivos levaram o Superior Tribunal de Justiça a editar a Súmula 231 A incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal46 Recordese que as atenuantes genéricas estão previstas no Código Penal em rol exemplificativo porque além das expressamente definidas pelo art 65 o art 66 consagra as atenuantes inominadas não indicadas pela lei A lei não estabelece o percentual de aumento ou de diminuição da pena no tocante às agravantes ou atenuantes genéricas Na prática forense todavia consagrouse o entendimento de que o aumento ou a diminuição deve ser de 16 sobre a penabase por se tratar do menor índice estipulado pela legislação penal Código Penal e leis especiais para as causas de aumento e de diminuição da pena47 Vejamos cada uma das agravantes e atenuantes genéricas A pena no Brasil apresenta uma dupla finalidade retributiva e preventiva Essa última dividese em geral e especial A prática de uma nova infração penal com a caracterização da reincidência também chamada de recidiva revela o não cumprimento da pena quanto às suas finalidades Falhou na tarefa retributiva pois o condenado não se atemorizou suficientemente com o castigo ao ponto de descumprir novamente a lei penal suportando o risco de ser mais uma vez privado de sua liberdade ou de seus bens A pena mostrouse insuficiente justificando uma nova punição agora mais grave Por esse motivo não se pode falar em dupla punição pelo mesmo fato O reincidente não é punido duas vezes pelo mesmo fato Ao contrário já foi apenado pelo crime anterior pressuposto da reincidência e posteriormente pelo novo delito com a pena agravada Tratase de punição mais rigorosa daquele que novamente demonstrou não se intimidar com a autoridade estatal Além disso a pena também deixou a desejar na missão de prevenção especial revelando não ter ressocializado satisfatoriamente seu destinatário É o fracasso do Estado no cumprimento de uma finalidade que lhe foi constitucional e legalmente atribuída mas que por motivos diversos e de conhecimento notório não é desempenhada a contento Destarte o fundamento da reincidência é claro o recrudescimento da pena resulta da opção do agente por continuar a delinquir Em síntese é constitucional a opção do legislador de incluir a reincidência no rol das agravantes genéricas Esta é a posição encampada pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal Vale a pena acompanhar o teor da decisão É constitucional a aplicação da reincidência como agravante da pena em processos criminais CP art 61 I Essa a conclusão do Plenário ao desprover recurso extraordinário em que alegado que o instituto configuraria bis in idem bem como ofenderia os princípios da proporcionalidade e da individualização da pena Registrouse que as repercussões legais da reincidência seriam múltiplas não restritas ao agravamento da pena Nesse sentido ela obstaculizaria a cumprimento de pena nos regimes semiaberto e aberto CP art 33 2º b e c b substituição de pena privativa de liberdade por restritiva de direito ou multa CP artigos 44 II e 60 2º c sursis CP art 77 I d diminuição de pena reabilitação e prestação de fiança e e transação e sursis processual em juizados especiais Lei 909995 artigos 76 2º I e 89 Além disso a recidiva seria levada em conta para a deslinde do concurso de agravantes e atenuantes CP art 67 b efeito de lapso temporal quanto ao livramento condicional CP art 83 I e II c interrupção da prescrição CP art 117 VI e d revogação de sursis e livramento condicional a impossibilitar em alguns casos a diminuição da pena a reabilitação e a prestação de fiança CP artigos 155 2º 170 171 1º 95 e CPP art 323 III Consignouse que a reincidência não contrariaria a individualização da pena Ao contrário levarseia em conta justamente o perfil do condenado ao distinguilo daqueles que cometessem a primeira infração penal Nesse sentido lembrouse que a Lei 113432006 preceituaria como causa de diminuição de pena o fato de o agente ser primário e detentor de bons antecedentes art 33 4º Do mesmo modo a recidiva seria considerada no cômputo do requisito objetivo para progressão de regime dos condenados por crime hediondo Nesse aspecto a lei exigiria o implemento de 25 da reprimenda se primário o agente e 35 se reincidente O instituto impediria também o livramento condicional aos condenados por crime hediondo tortura e tráfico ilícito de entorpecentes CP art 83 V Figuraria ainda como agravante da contravenção penal prevista no art 25 do DecretoLei 368841 Influiria na revogação do sursis processual e do livramento condicional assim como na reabilitação CP artigos 81 I e 1º 86 87 e 95 Considerouse que a reincidência comporia consagrado sistema de política criminal de combate à delinquência e que eventual inconstitucionalidade do instituto alcançaria todas as normas acima declinadas Asseverouse que sua aplicação não significaria duplicidade porquanto não alcançaria delito pretérito mas novo ilícito que ocorrera sem que ultrapassado o interregno do art 64 do CP Asseverouse que o julgador deveria ter parâmetros para estabelecer a pena adequada ao caso concreto Nesse contexto a reincidência significaria o cometimento de novo fato antijurídico além do anterior Reputouse razoável o fator de discriminação considerado o perfil do réu merecedor de maior repreensão porque voltara a delinquir a despeito da condenação havida que deveria ter sido tomada como advertência no que tange à necessidade de adoção de postura própria ao homem médio Explicouse que os tipos penais preveriam limites mínimo e máximo de apenação somente alijados se verificada causa de diminuição ou de aumento da reprimenda A definição da pena adequada levaria em conta particularidades da situação inclusive se o agente voltara a claudicar Estaria respaldado então o instituto constitucional da individualização da pena na medida em que se evitaria colocar o reincidente e o agente episódico no mesmo patamar Frisouse que a jurisprudência da Corte filiarseia predominantemente à corrente doutrinária segundo a qual o instituto encontraria fundamento constitucional porquanto atenderia ao princípio da individualização da pena Assinalouse que não se poderia a partir da exacerbação do garantismo penal desmantelar o sistema no ponto consagrador da cabível distinção ao se tratar os desiguais de forma igual A regência da matéria harmônica com a Constituição denotaria razoável política normativa criminal48 Em conformidade com o art 63 do Código Penal Verificase a reincidência quando o agente comete novo crime depois de transitar em julgado a sentença que no País ou no estrangeiro o tenha condenado por crime anterior Cuidase assim da prática de novo crime depois da condenação a b c definitiva no Brasil ou no exterior pela prática de crime anterior Da análise do art 63 do Código Penal despontam três requisitos imprescindíveis para a configuração da reincidência ordenados cronologicamente um crime cometido no Brasil ou em outro país condenação definitiva isto é com trânsito em julgado por esse crime e prática de novo crime Destarte a reincidência depende obrigatoriamente de ao menos dois crimes um anterior em cuja ação penal já foi proferida sentença condenatória com seu respectivo trânsito em julgado e outro posterior ao trânsito em julgado Com a prática desse novo crime será tratado como reincidente com todas as consequências rigorosas daí decorrentes49 Portanto somente existe reincidência quando o novo crime tiver sido praticado depois do trânsito em julgado da condenação anterior Logo se for cometido na data do trânsito em julgado não estará caracterizada a recidiva E ainda não haverá reincidência se o agente praticar os dois crimes na mesma ocasião e forem julgados pela mesma sentença50 Além disso não há falar em reincidência quando a denúncia ou queixacrime pelo novo crime não contém a data exata do fato apta a demonstrar sua prática após o trânsito em julgado da condenação anterior Na linha de raciocínio do Superior Tribunal de Justiça A agravante da reincidência não deve ser aplicada se não há na denúncia exatidão da data dos fatos apta a demonstrar que o delito ocorreu após o trânsito em julgado de condenação anterior Em observância ao princípio do in dubio pro reo deve ser dada a interpretação mais favorável ao acusado não se podendo presumir que o trânsito em julgado referente ao crime anterior ocorreu antes do cometimento do segundo delito51 Pouco importa tenha sido o crime que resultou na condenação definitiva praticado no Brasil ou no estrangeiro A propósito para a caracterização da reincidência a sentença estrangeira não precisa ser homologada pelo Superior Tribunal de Justiça como se extrai do art 9º do Código Penal Basta a prova de que foi proferida judicialmente e transitou em julgado52 Mas desaparece a reincidência quando a condenação que a justifica teve seu trânsito em julgado desconstituído judicialmente53 Pode acontecer uma situação curiosa o agente possuir contra si diversas condenações definitivas no campo penal e ainda assim ser primário Esse fenômeno ocorre quando nada obstante as múltiplas sentenças condenatórias transitadas em julgado ainda não praticou nenhum delito após a primeira condenação definitiva ou seja todos os crimes praticados pelo indivíduo antecederam a primeira sentença condenatória transitada em julgado a b c d Estabelece o art 7º do Decretolei 36881941 Lei das Contravenções Penais Verificase a reincidência quando o agente pratica uma contravenção depois de passar em julgado a sentença que o tenha condenado no Brasil ou no estrangeiro por qualquer crime ou no Brasil por motivo de contravenção A combinação desse dispositivo com o art 63 do Código Penal permite as seguintes conclusões a condenação definitiva no exterior pela prática de contravenção penal não serve no Brasil em nenhuma hipótese como pressuposto da reincidência é reincidente o agente que depois do trânsito em julgado de uma condenação por crime no Brasil ou no estrangeiro ou contravenção penal no Brasil cometer novo crime aqui ou no estrangeiro ou contravenção penal no Brasil é reincidente aquele que após o trânsito em julgado de uma condenação no Brasil pela prática de contravenção penal cometer nova contravenção penal e não é reincidente o sujeito que depois do trânsito em julgado da condenação no Brasil por contravenção penal praticar no Brasil ou no estrangeiro novo crime Não se caracteriza a reincidência portanto na hipótese em que o agente decide enveredar por uma infração penal mais grave deixando de ser mero contraventor para se tornar criminoso O fundamento dessa brecha é a falha legislativa que lamentavelmente insistese em manter As conclusões podem ser assim representadas Infração penal anterior Infração penal posterior Resultado Crime Crime Reincidente Contravenção penal Contravenção penal Reincidente Crime Contravenção penal Reincidente Contravenção penal Crime Primário Para a caracterização da reincidência basta o trânsito em julgado da condenação resultante da prática de um crime anterior O art 63 do Código Penal não permite qualquer distinção em face da pena imposta Portanto é irrelevante a espécie de pena aplicada privativa de liberdade que pode ou não ter sido substituída por restritiva de direitos ou multa Destarte não pode ser acolhido o argumento de que a condenação exclusiva à pena de multa não gera reincidência Essa posição sem amparo doutrinário ou jurisprudencial mas utilizada em casos práticos fundase em duas premissas a a pena pecuniária é de pouca importância e não teria forças para ensejar a recidiva e b o art 77 1º do Código Penal diz que a condenação anterior à pena de multa não impede o sursis e por esse motivo a aplicação exclusiva da pena pecuniária não configura a reincidência pois o sursis não é cabível ao reincidente CP art 77 I No tocante à posse de droga para consumo pessoal art 28 da Lei 113432006 o Superior Tribunal de Justiça firmou jurisprudência no sentido de que a condenação por tal delito não funciona como pressuposto da reincidência Condenações anteriores pelo delito do art 28 da Lei n 113432006 não são aptas a gerar reincidência Inicialmente cumpre salientar que consoante o posicionamento firmado pela Suprema Corte na questão de ordem no RE 430105RJ sabese que a conduta de porte de substância entorpecente para consumo próprio prevista no art 28 da Lei n 113432006 foi apenas despenalizada mas não descriminalizada em outras palavras não houve abolitio criminis Contudo ainda que a conduta tipificada no art 28 da Lei n 113432006 tenha sido despenalizada e não descriminalizada essa conduta é punida apenas com advertência sobre os efeitos das drogas prestação de serviços à comunidade e medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo Além disso não existe a possibilidade de converter essas penas em privativas de liberdade em caso de descumprimento Cabe ressaltar que as condenações anteriores por contravenções penais não são aptas a gerar reincidência tendo em vista o que dispõe o art 63 do Código Penal que apenas se refere a crimes anteriores E se as contravenções penais puníveis com pena de prisão simples não geram reincidência mostrase desproporcional o delito do art 28 da Lei n 113432006 configurar reincidência tendo em vista que nem é punível com pena privativa de liberdade54 Tratase de circunstância agravante genérica CP art 61 I Incide na segunda fase da aplicação da pena privativa de liberdade Além disso é de caráter subjetivo ou pessoal pois se relaciona à figura do agente e não ao fato Não se comunica aos demais coautores ou partícipes Há duas posições sobre a forma pela qual se prova a recidiva 1ª posição Exigese certidão expedida pelo cartório judicial acerca da condenação anterior com todos os seus detalhes Fundamentase no argumento de que a folha de antecedentes pode ser incompleta além de apresentar diversos equívocos pois não é emitida diretamente pelo juízo responsável pela condenação 2ª posição Basta a juntada aos autos da ação penal da folha de antecedentes pois dela consta a condenação anterior É o entendimento do Supremo Tribunal Federal A legislação pátria não exige documento específico para que seja comprovada a reincidência do agente Enfatizouse que no caso a folha de antecedentes expedida por órgão policial seria idônea a demonstrála por conter todas as informações necessárias para isso além de ser um documento público com presunção iuris tantum de veracidade55 Em relação à necessidade de cumprimento da pena imposta pela condenação anterior a reincidência pode ser real ou presumida Reincidência real própria ou verdadeira é a que ocorre quando o agente comete novo crime depois de ter cumprido integralmente a pena imposta como decorrência da prática do crime anterior Reincidência presumida ficta imprópria ou falsa por sua vez é a que ocorre quando o sujeito pratica novo crime depois da condenação definitiva pela prática de crime anterior pouco importando tenha sido ou não cumprida a pena O Código Penal em vigor filiouse à reincidência presumida É suficiente para alguém ser tratado como reincidente a prática de novo crime depois do trânsito em julgado da condenação anterior Em outro plano relativo às categorias dos crimes a reincidência pode ser genérica ou específica Na reincidência genérica os crimes praticados pelo agente são previstos por tipos penais diversos Exemplo A comete um furto pelo qual é condenado com trânsito em julgado e posteriormente pratica um estupro É reincidente genérico De seu turno na reincidência específica os dois ou mais crimes perpetrados pelo agente encontramse definidos pelo mesmo tipo penal Exemplo B pratica um roubo e depois de definitivamente condenado comete outro roubo É reincidente específico A legislação penal brasileira seguindo a tendência mundial trata as duas situações de modo análogo Os efeitos em regra são idênticos seja genérica ou específica a reincidência56 Em algumas raras situações todavia a reincidência específica comporta tratamento diferenciado No Código Penal o art 44 3º veda peremptoriamente a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos ao reincidente específico embora seja a medida socialmente recomendável É o que também se dá no livramento condicional para os crimes hediondos e equiparados vedado para reincidente específico em crimes dessa natureza CP art 83 V acrescentado pela Lei 80721990 Lei dos Crimes Hediondos Essa restrição foi ainda prevista expressamente aos autores dos crimes tipificados nos arts 33 caput e 1º e 34 a 37 da Lei de Drogas Lei 113432006 art 44 parágrafo único Em relação aos crimes definidos na Lei 95031997 Código de Trânsito Brasileiro o art 296 autoriza ao reincidente específico em crimes nela previstos a aplicação da penalidade de suspensão da permissão ou habilitação para dirigir veículo automotor sem prejuízo das demais sanções penais cabíveis Nos termos do art 64 I do Código Penal Art 64 Para efeito de reincidência I não prevalece a condenação anterior se entre a data do cumprimento ou extinção da pena e a infração posterior tiver decorrido período de tempo superior a 5 cinco anos computado o período de prova da suspensão ou do livramento condicional se não ocorrer revogação O dispositivo evidencia que a partir da Reforma da Parte Geral do Código Penal pela Lei 72091984 adotouse o sistema da temporariedade limitando a validade da reincidência ao período de 5 cinco anos É o que se convencionou chamar de período depurador ou caducidade da condenação anterior para fins de reincidência Na redação original do Código Penal acolhiase o sistema da perpetuidade pelo qual o estigma da reincidência jamais seria desvinculado da pessoa do criminoso57 O quinquênio deve ser contado entre a extinção da pena resultante do crime anterior pelo seu cumprimento ou por qualquer outro motivo e a prática do novo crime sendo irrelevante a data da sentença proferida como sua decorrência Levase em conta a data em que a pena foi efetivamente extinta pouco importando o dia em que foi proferida a decisão judicial declaratória da extinção da punibilidade Computase nesse prazo de 5 cinco anos o período de prova da suspensão ou do livramento condicional se não ocorrer revogação Nessas hipóteses o prazo é contado do início do período de prova que flui a partir da audiência admonitória e não da extinção da pena que somente se opera com o fim do período de prova Destarte se o condenado cumpre o sursis por 4 quatro anos sem revogação ao final do período de prova o juiz deverá declarar extinta a pena privativa de liberdade CP art 82 e ele precisará somente de mais 1 um ano para que essa condenação não seja mais apta a caracterizar a reincidência A questão que se coloca é a seguinte Com a extinção da punibilidade do crime anterior desaparece o pressuposto da reincidência Depende de dois fatores o momento em que ocorreu a causa extintiva da punibilidade e a espécie de causa de extinção da punibilidade Com efeito se a causa de extinção da punibilidade ocorreu antes do trânsito em julgado da sentença condenatória o crime anterior não subsiste para fins de reincidência Essa conclusão é evidente até mesmo porque nesse caso não existe condenação definitiva58 É o que se dá por exemplo com a prescrição da pretensão punitiva Por outro lado se a extinção da punibilidade efetivouse após o trânsito em julgado da condenação a sentença penal continua apta a caracterizar a reincidência tal como ocorre na prescrição da pretensão executória Essa regra entretanto comporta duas exceções anistia e abolitio criminis Nesses casos desfazse a própria condenação pois são veiculadas por meio de lei que torna atípico o fato até então incriminado abolitio criminis ou exclui determinados fatos do raio de incidência do Direito Penal anistia O próprio fato praticado pelo agente deixa de ser penalmente ilícito não se podendo por corolário falarse em reincidência O Código Penal define somente o conceito de reincidente é o sujeito que comete um novo crime depois do trânsito em julgado da sentença que o tenha condenado no Brasil ou no estrangeiro pela prática de crime anterior Destarte o conceito de primário é obtido pela via residual isto é por exclusão Com efeito primário é todo aquele que não se encaixa no perfil do reincidente Não se exige jamais tenha praticado um crime basta que não tenha cometido um crime depois do trânsito em julgado de uma condenação anterior Em sede jurisprudencial contudo criouse a figura do tecnicamente primário que seria a pessoa que possui condenação definitiva sem ser reincidente A primariedade estaria limitada aos casos em que o agente não ostenta nenhuma condenação Em nosso sistema penal o tecnicamente primário poderia ser visualizado em duas hipóteses a o sujeito possui uma ou diversas condenações definitivas mas não praticou nenhum dos crimes depois da primeira sentença condenatória transitada em julgado e b o indivíduo ostenta uma condenação definitiva e depois dela praticou um novo crime Entretanto entre a extinção da punibilidade do crime anterior e o novo delito decorreu período superior a 5 cinco anos CP art 64 I Essa denominação contudo deve ser utilizada com prudência porque não encontra amparo legal Falase ainda em multirreincidente expressão utilizada para referirse ao sujeito que mais do que ser reincidente possui três ou mais condenações transitadas em julgado a b c d e f g h i j k A reincidência além de constituirse em agravante genérica produz entre outros diversos efeitos desfavoráveis ao réu na pena de reclusão impede o início do cumprimento da pena privativa de liberdade em regime semiaberto ou aberto e na pena de detenção obsta o início do cumprimento da pena privativa de liberdade em regime aberto CP art 33 caput e 2º59 quando em crime doloso é capaz de impedir a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos CP art 44 II no concurso com atenuantes genéricas possui caráter preponderante CP art 67 se em crime doloso salvo quando imposta somente a pena de multa impede a concessão do sursis CP art 77 I e 1º autoriza a revogação do sursis CP art 81 I e 1º do livramento condicional CP art 86 I e II e art 87 e da reabilitação se a condenação for a pena que não seja de multa CP art 95 quando em crime doloso aumenta o prazo para a concessão do livramento condicional CP art 83 II impede o livramento condicional em crimes hediondos ou equiparados em caso de reincidência específica em crimes dessa natureza CP art 83 V se antecedente à condenação aumenta de um terço o prazo da prescrição da pretensão executória CP art 110 caput se posterior à condenação interrompe a prescrição da pretensão executória CP art 117 VI impede a obtenção do furto privilegiado da apropriação indébita privilegiada do estelionato privilegiado e da receptação privilegiada CP arts 155 2º 170 171 1º e 180 5º in fine obsta os benefícios da transação penal e da suspensão condicional do processo Lei 90991995 art 76 2º I e art 89 caput e l a autoriza a decretação da prisão preventiva quando o réu tiver sido condenado por crime doloso CPP art 313 II O art 63 do Código Penal referese unicamente a crime Essa é a regra qualquer crime pode ensejar a reincidência dolosos ou culposos punidos com reclusão ou detenção de elevada ou mínima gravidade consumados e mesmo os tentados pois a lei limitase a dizer crime cometido o que não se confunde com crime consumado Um pouco adiante porém o art 64 II do Código Penal abre espaço para duas exceções ao estatuir que para efeito de reincidência não se consideram os crimes militares próprios e os políticos Crimes militares próprios são os tipificados exclusivamente pelo Código Penal Militar Decretolei 10011969 Assim somente podem ser praticados por quem preencha a condição específica de militar Despontam como exemplos a deserção o motim a revolta e o desrespeito entre outros Limitase essa regra às hipóteses em que o agente pratica um crime militar próprio e depois um crime comum ou ainda um crime militar impróprio De fato o art 71 do Código Penal Militar prevê a reincidência quando o militar pratica um crime militar próprio e depois da condenação definitiva comete outro crime de igual natureza Já os crimes militares impróprios são os previstos no Código Penal Militar e também pelo Código Penal dos quais são exemplos o homicídio e o estupro Funcionam como pressuposto da reincidência pois foram excluídos pelo art 64 II a eles se aplicando a regra geral definida pelo art 63 do Código Penal Também não caracteriza reincidência a condenação anterior transitada em julgado por crime político que pode ser próprio ou puro ofende apenas a segurança ou a organização do Estado São os crimes contra a segurança nacional Lei 71701983 Será considerado reincidente específico em crime político próprio aquele que praticar um crime desta índole e após o b trânsito em julgado da condenação cometer outro delito de igual natureza uma vez que a Lei de Segurança Nacional não possui norma equivalente à prevista no art 64 I do Código Penal impróprio impuro ou relativo ofende a segurança ou a organização do Estado e também um bem jurídico protegido pela legislação comum Em ambas as espécies afastase a reincidência do Código Penal pois este diploma normativo ao contrário do que fez no tocante aos crimes militares não estabeleceu distinção entre crimes políticos próprios ou impróprios60 Vale destacar que a condenação definitiva por crimes militares próprios e por crimes políticos caracteriza maus antecedentes pois essa vedação não é alcançada pela regra contida no art 64 I do Código Penal limitada ao instituto da reincidência No critério trifásico de aplicação da pena privativa de liberdade os maus antecedentes do réu incidem na primeira fase e a reincidência é utilizada na etapa seguinte Destarte em se tratando de réu reincidente a condenação penal definitiva deve ser realçada pelo magistrado somente na segunda fase da dosimetria da pena por se constituir em agravante genérica prevista expressamente no art 61 I do Código Penal Não pode ser também utilizada para a caracterização de maus antecedentes sob pena de fomentar o bis in idem é dizer a dupla punição pelo mesmo fato Esse é o teor da Súmula 241 do Superior Tribunal de Justiça A reincidência penal não pode ser considerada como circunstância agravante e simultaneamente como circunstância judicial Entretanto se o réu possui mais de uma condenação definitiva uma pode ser utilizada como mau antecedente e outra como agravante genérica reincidência não se falando em bis in idem Se a reincidência foi equivocadamente reconhecida na sentença ou no acórdão condenatório seja porque não estava devidamente constituída seja porque não foi observado o período depurador CP art 64 inc I daí resultando danos materiais eou morais ao acusado estará caracterizado o erro judiciário acarretando ao Estado o dever de indenizar os prejuízos causados na forma definida pelo art 5º inc LXXV da Constituição Federal Como já decidido pelo Superior Tribunal de Justiça No caso em que o reconhecimento da reincidência tenha origem em infração anterior cuja pena tenha sido cumprida ou extinta há mais de 5 anos deferido o pedido revisional para diminuir a pena equivocadamente fixada será devida a indenização ao condenado que tenha sofrido prejuízos em virtude do erro judiciário É que tendo sido reconhecido que o acusado foi considerado indevidamente reincidente há clara contrariedade ao disposto no art 64 I do CP Sobre o assunto pondera a doutrina o conceito de erro judiciário deve transcender as barreiras limitativas da sentença condenatória impositiva de pena privativa de liberdade para envolver toda e qualquer decisão judicial errônea que tenha provocado evidente prejuízo à liberdade individual ou mesmo à imagem e à honra do acusado E nessa perspectiva outra doutrina arremata é importante notar que tal como a sentença condenatória que serve como título judicial para a execução do dano praticado pelo agente em favor do ofendido art 63 CPP também o acórdão rescindido em que se tenha reconhecido o direito à indenização servirá unicamente como título executivo para o réu condenado injustamente demandar o Estado cujo quantum deverá ser apurado na esfera cível61 Motivo fútil é o insignificante de pouca importância completamente desproporcional à natureza do crime praticado Exemplo age com motivo fútil o marido que mata a esposa por não ter passado adequadamente uma peça do seu vestuário Fundamentase a agravação da resposta estatal em razão do egoísmo da atitude mesquinha que alimenta a conduta do responsável pela infração penal A ausência de motivo não deve ser equiparada ao motivo fútil pois todo crime tem a sua motivação Destarte o desconhecimento acerca do móvel do agente não deve ser colocado no mesmo nível do motivo de somenos importância62 Há todavia adeptos de posição contrária os quais alegam que se um motivo ínfimo justifica a elevação da pena com maior razão deve ser punida mais gravemente a infração penal imotivada O ciúme não deve ser enquadrado como motivo fútil Esse sentimento que destrói o equilíbrio do ser humano e arruína a sua vida não pode ser considerado insignificante ou desprezível A embriaguez por sua vez é incompatível com o motivo fútil O embriagado não tem pleno controle do seu modo de agir afastando assim a futilidade da força que o impele a transgredir o Direito Penal Mas há quem diga que em face da norma prevista no art 28 II do Código Penal embriaguez voluntária ou culposa não exclui a imputabilidade penal essa agravante genérica pode ser aplicada ao ébrio63 Anotese ainda que motivo fútil e motivo injusto não se confundem todo crime é injusto pois o sujeito passivo não é obrigado a suportálo embora nem sempre seja fútil Motivo torpe é o vil repugnante abjeto moralmente reprovável Exemplo matar um parente para ficar com a sua herança Fundamentase a maior quantidade de pena pela violação do sentimento comum de ética e de justiça A vingança não caracteriza automaticamente a torpeza Será ou não torpe dependendo do motivo que levou o indivíduo a vingarse de alguém Exemplos 1 Não é torpe a conduta do pai que mata o estuprador de sua filha Ao contrário tratase de relevante valor moral privilégio nos moldes do art 121 1º do Código Penal e 2 É torpe o ato de um traficante consistente em matar outro vendedor de drogas que havia no passado dominado o controle do tráfico na favela então gerenciada pelo assassino Ressaltese que por absoluta incompatibilidade um motivo não pode ser simultaneamente fútil e torpe Uma motivação exclui a outra Pode ser fútil ou torpe mas nunca ambos Essa agravante genérica repousa na conexão ou seja na ligação entre dois ou mais crimes A conexão pode ser teleológica quando o crime é praticado para facilitar ou assegurar a execução de outro crime exemplo furtar um banco para com o dinheiro adquirir um carro roubado ou consequencial na hipótese em que o crime é cometido para facilitar ou assegurar a ocultação a impunidade ou a vantagem de outro crime exemplo coagir uma testemunha para não incriminar em juízo o autor de um tráfico de drogas Cuidase em verdade de uma forma especial de motivo torpe pois buscar de qualquer modo com um crime executar outro delito ocultálo dele escapar ou em razão dele lucrar revela a intensa depravação moral do agente Configurase a agravante genérica mesmo que não seja iniciado o crime almejado pelo agente Basta sua intenção de cometêlo Contudo quando forem realizados os dois delitos por eles responderá o sujeito em concurso material CP art 69 Valeuse o legislador da interpretação analógica ou intra legem O dispositivo contém uma fórmula casuística seguida de uma fórmula genérica Isso quer significar que a traição a emboscada e a dissimulação dificultam ou impossibilitam a defesa do ofendido Mas não é só pois outros recursos similares como a surpresa e a superioridade de armas também podem fazêlo Por coerência legal deve ser uma situação semelhante à traição à emboscada e à dissimulação Traição é a deslealdade a perfídia a quebra da confiança que o ofendido depositava no responsável pelo crime Pode ser material ou objetiva exemplo agredir um amigo durante seu sono ou moral ou subjetiva exemplo atrair a vítima embriagada para o alto de uma ponte e de lá empurrála rumo ao chão Emboscada é a tocaia a cilada ou seja aguardar escondido a passagem da vítima para repentinamente atacála Dissimulação é o disfarce a ocultação da vontade criminosa para agredir a vítima descuidada Exemplo fingirse funcionário de uma empresa de telefonia para ingressar na residência de alguém e ofender sua integridade corporal O legislador uma vez mais utiliza a interpretação analógica Dessa vez contudo relacionada aos meios de execução do crime Há nesse dispositivo três gêneros e quatro espécies O primeiro gênero é o meio insidioso que tem como espécie o emprego de veneno O outro gênero é o meio cruel dele resultando as espécies emprego de fogo e de tortura Por fim perigo comum é gênero e o explosivo e o fogo suas espécies Meio insidioso é o que revela estratagema ou seja é o dissimulado em sua capacidade danosa Exigese seja empregado subrepticiamente isto é sem ser notado pela vítima O exemplo legal é o veneno definido como qualquer substância química ou não que pode ferir ou matar quando inoculada no organismo humano Meio cruel é o que inflige à vítima um intenso e desnecessário sofrimento para alcançar o resultado desejado revelando a insensibilidade do agente O dispositivo legal apresenta dois exemplos fogo e tortura Como a lei autoriza a interpretação analógica pode ser ainda citada a asfixia O emprego de veneno se introduzido à força no organismo da vítima caracteriza meio cruel Meio de que possa resultar perigo comum é aquele que além de proporcionar sofrimento intenso e exagerado à vítima pode também colocar em risco um número indeterminado de pessoas A lei aponta como exemplos o explosivo e o fogo esse último quando oferece perigo a diversas pessoas O fundamento dessa agravante genérica repousa na apatia moral do agente que se prevalece de relações familiares para a prática do crime transgredindo o dever de auxílio recíproco existente entre parentes e pessoas ligadas pelo matrimônio O sujeito deve efetivamente aproveitarse das facilidades que o parentesco ou o matrimônio lhe proporcionam pois caso contrário não terá incidência o dispositivo legal O parentesco pode ser civil ou natural pois o art 227 6º da Constituição Federal proíbe qualquer discriminação entre os filhos havidos ou não do casamento Não ingressam na agravante genérica porém as relações decorrentes do parentesco por afinidade tais como sogra e genro cunhados etc De seu turno a união estável não autoriza a aplicação da agravante genérica em face da inadmissibilidade da analogia in malam partem no Direito Penal Exigese para a incidência da agravante prova documental da relação de parentesco ou do vínculo matrimonial De fato a prova do estado das pessoas deve observar as restrições estabelecidas na lei civil CPP art 155 parágrafo único com a redação alterada pela Lei 116902008 Legitimase a exasperação da pena em face da violação dos postulados de solidariedade e de assistência que devem reinar nas situações ali descritas A expressão abuso de autoridade relacionase ao direito privado exemplo tutor e tutelado Excluemse as relações de direito público Deve existir um vínculo de dependência entre o agente e a vítima Caracterizase pelo mau uso que dela se faz pelo excesso ou pela violência fora dos casos de exercício de cargo ofício ministério ou profissão64 Relações domésticas são as criadas entre os membros de uma família podendo ou não existir ligações de parentesco exemplo patrão e babá de seu filho No tocante à união estável em que não é possível sua equiparação ao cônjuge para agravação da pena nada impede a inserção da companheira ou do companheiro nessa alínea prevalecendose das relações domésticas Coabitação é a moradia sob o mesmo teto ainda que por breve período exemplo moradores de uma república de estudantes Deve ser lícita e conhecida dos coabitantes Pode ser voluntária fortuita ou ainda coativa como ocorre na carcerária Hospitalidade é a recepção eventual durante a estadia provisória na residência de alguém sem necessidade de pernoite exemplo receber amigos para um jantar Afastase a relação de hospitalidade quando o agente ingressa clandestina ou astuciosamente ou ainda com violência na moradia do hospedeiro uma vez que depende do seu consentimento para caracterizar se Esses três últimos casos de relações domésticas coabitação e hospitalidade devem existir ao tempo do crime nada importando tenha sido o delito praticado fora do âmbito da relação doméstica ou do local que ensejou a coabitação ou a hospitalidade Incide a agravante genérica exemplificativamente quando o morador de uma república subtrai bens de um colega que com ele divide a residência em momento no qual estavam no interior de um ônibus no transporte à faculdade A parte final do dispositivo legal ou com violência contra a mulher na forma da lei específica foi acrescentada pela Lei 113402006 Lei Maria da Penha Essa inovação legislativa não trouxe nenhuma utilidade prática pois a violência doméstica ou familiar contra a mulher já funcionava como agravante genérica nessa alínea prevalecendose das relações domésticas ou na alínea anterior contra ascendente descendente irmão ou cônjuge Essa alínea prevê duas agravantes diversas abuso de poder e violação de dever O abuso de poder e a violação de dever inerente a cargo têm como principal característica serem praticados por funcionários públicos ou então por particulares ligados a cargos públicos contra funcionários públicos entre si ou contra o público em geral Pressupõem no agente a condição de funcionário público e o crime deve ser cometido no desempenho do cargo público ou seja é imprescindível que se beneficie o agente da sua condição funcional para cometer o ilícito penal Ligamse assim ao exercício do poder público e do cargo público de maneira ilegítima e excessiva com violação das regras de Direito Público Cargo público é o lugar instituído na organização do serviço público com denominação própria atribuições e responsabilidades específicas e estipêndio correspondente para ser provido e exercido por um titular na forma estabelecida em lei65 O abuso de poder e a violação de dever inerente a cargo podem em determinadas circunstâncias configurar crime autônomo e não atuar como agravante genérica Exemplo violação de sigilo funcional CP art 325 Quando o sujeito for punido pelo crime de abuso de autoridade tipificado pela Lei 48981965 afastase essa agravante genérica para evitar o bis in idem Já a expressão violação de dever inerente a ofício ministério ou profissão se refere a atividades de natureza privada Ofício é a atividade remunerada e predominantemente manual Exemplo mecânico de automóveis Ministério diz respeito ao exercício de um culto religioso Exemplo padre ou pastor de uma igreja Deve tratarse de religião reconhecida e permitida pelo Estado Profissão por sua vez é remunerada e reclama conhecimentos restritos e especializados com predominância do fator intelectual Exemplos advogado engenheiro médico etc Essa agravante genérica fundamentase na situação de fragilidade ou debilidade da vítima na facilidade que encontra o agente para cometer o delito e na sua covardia Essas pessoas indubitavelmente têm menor chance de defesa Criança é a pessoa de até 12 anos de idade incompletos ECA Lei 80691990 art 2º caput Quanto ao idoso é dizer pessoa maior de 60 anos essa redação se deve à entrada em vigor da Lei 107412003 Estatuto do Idoso Adotouse um critério cronológico com o abandono do termo velho É necessário o nexo de dependência entre a situação de fragilidade do ofendido e o crime praticado Exemplo um idoso pode ser alvo fácil de lesões corporais mas não necessariamente o será para um estelionato Enfermo é o indivíduo que em decorrência de alguma doença permanente ou transitória enfrenta debilidade em sua capacidade física ou mental É em suma a pessoa portadora de deficiência física ou mental Aqui também se exige o nexo entre o crime praticado e a enfermidade da vítima Exemplo um furto contra um cego autoriza a agravante genérica ao contrário de igual crime cometido contra pessoa resfriada já que tal doença não deixa de constituirse em uma deficiência do corpo humano Mulher grávida para justificar a agravante deve ser aquela em estágio avançado da gestação capaz de tornála mais vulnerável às investidas criminosas e desde que a sua peculiar condição facilite a prática do delito Em qualquer das hipóteses o agente deve ter ciência da situação de fragilidade da vítima pois não se admite a responsabilidade penal objetiva66 Nessa situação é mais grave a punição porque quem se encontra sob a proteção do Estado não deve ser ofendido por condutas criminosas Diante da proteção do poder público o agente revela destemor e incredulidade com a força dos poderes constituídos merecendo mais rigorosa reprovação Proteção imediata significa guarda dependência sujeição Destarte enquadrase nessa agravante o resgate de preso para ser morto por facção rival mas não o crime cometido contra vítima que se encontrava ao lado de um policial Nessa alínea o Código Penal mais uma vez se utiliza da interpretação analógica ou intra legem Essa agravante genérica justificase pela insensibilidade moral do agente que não observa os mais comezinhos postulados de fraternidade e de solidariedade humana e se aproveita de situações calamitosas ou de desgraça particular da vítima que se encontra em posição de inferioridade para praticar um crime Calamidade pública é o acidente generalizado a tragédia que engloba um número indeterminado de pessoas Exemplo roubo cometido durante incêndio em uma universidade durante o período letivo Desgraça particular do ofendido por outro lado é o acidente ou tragédia relativo a uma pessoa ou a um grupo determinado de pessoas Exemplo saque dos bens da vítima logo após o capotamento do seu automóvel Nessa situação punese com maior rigor para evitar que pessoas se embriaguem buscando encorajamento para a prática de infrações penais bem como a exclusão da imputabilidade penal Utilizase a teoria da actio libera in causa Capítulo 28 item 28148 A terminologia utilizada pelo legislador é inadequada Afigurase equivocado falarse em agravante no concurso de pessoas Concurso de pessoas em termos técnicos é a colaboração de dois ou mais agentes culpáveis para a prática de uma infração penal E como a pluralidade de agentes culpáveis é um dos traços característicos do instituto essa expressão é imprópria pois os incisos II e III do art 62 dizem respeito a dois típicos casos de autoria mediata Como se sabe não há concurso de pessoas na autoria mediata pois os envolvidos não são dotados de culpabilidade o que inviabiliza consequentemente o vínculo subjetivo entre eles Faltam pois requisitos do instituto delineado pelo art 29 caput do Código Penal É bom saber portanto que nesse dispositivo legal o Código Penal impropriamente utiliza a expressão concurso de pessoas para referirse aos crimes praticados com qualquer tipo de atuação de duas ou mais pessoas mas não obrigatoriamente nos moldes do seu art 29 caput Promover ou organizar a cooperação no crime ou dirigir a atividade dos demais criminosos consiste em arquitetar mentalmente a estrutura do delito de modo a permitir a operacionalização da conduta ilícita É o que se dá com o autor intelectual bem como com o autor de escritório maestros de toda a empreitada criminosa Reclamase para incidência da agravante a real hierarquia do agente sobre os demais comparsas Logo não há aumento da pena na hipótese de simples sugestão quanto à prática da infração penal Por esse motivo é imprescindível nesse caso o ajuste prévio desnecessário no concurso de pessoas capaz de identificar a subserviência de um ou mais indivíduos em relação ao líder Em nosso sistema penal o autor intelectual mentor do crime não é propriamente autor e sim partícipe Com efeito não realiza o núcleo do tipo incriminador mas de qualquer modo concorre para o crime E em face da adoção como regra da teoria unitária ou monista no concurso de pessoas é possível seja o autor intelectual punido mais gravemente do que o autor propriamente dito executor Sua culpabilidade certamente é mais acentuada já que sem a sua contribuição moral o crime não se concretizaria Cumpre destacar a inexistência de bis in idem na atividade judicial que depois de reconhecer a participação aplica essa agravante genérica Seus motivos e finalidades são distintos Na verdade nem todo partícipe merece a agravante genérica uma vez que concorrer para o crime não importa necessariamente em promover ou organizar a cooperação no crime ou dirigir a atividade dos demais agentes Em síntese a agravante prevista no art 62 inc I do Código Penal não é incompatível com a participação a exemplo do que ocorre com o mandante do delito Mas sua incidência não é automática pois reclama comprovação no caso concreto Na visão do Superior Tribunal Justiça Em princípio não é incompatível a incidência da agravante do art 62 I do CP ao autor intelectual do delito mandante O art 62 I do CP prevê que A pena será ainda agravada em relação ao agente que I promove ou organiza a cooperação no crime ou dirige a atividade dos demais agentes Em princípio não há que se falar em bis in idem em razão da incidência dessa agravante ao autor intelectual do delito mandante De acordo com a doutrina a agravante em foco objetiva punir mais severamente aquele que tem a iniciativa da empreitada criminosa e exerce um papel de liderança ou destaque entre os coautores ou partícipes do delito coordenando e dirigindo a atuação dos demais fornecendo por exemplos dados relevantes sobre a vítima determinando a forma como o crime será perpetrado emprestando os meios para a consecução do delito independente de ser o mandante ou não ou de quantas pessoas estão envolvidas Há inclusive precedente do STF Tribunal Pleno AO 1046RR DJe 2262007 indicando a possibilidade de coexistência da agravante e da condenação por homicídio na qualidade de mandante Entretanto não obstante a inexistência de incompatibilidade entre a condenação por homicídio como mandante e a incidência da agravante do art 62 I do CP devese apontar elementos concretos suficientes para caracterizar a referida circunstância agravadora Isso porque se o fato de ser o mandante do homicídio não exclui automaticamente a agravante do art 62 I do CP também não obriga a sua incidência em todos os casos67 Coagir é obrigar alguém com emprego de violência ou grave ameaça de forma irresistível ou não a cometer um crime A coação física irresistível exclui a conduta e portanto o fato típico A coação moral irresistível por outro lado exclui a culpabilidade por inexigibilidade de conduta diversa Somente o coator responde pelo crime Se entretanto for resistível a coação há concurso de pessoas Mas o coagido em razão da pressão suportada terá a pena atenuada CP art 65 III c 1ª parte A agravante genérica recairá sobre o coator tanto na coação física como na coação moral irresistíveis ou resistíveis A lei não permite nenhum tipo de exceção Induzir é fazer surgir na mente de outrem o propósito criminoso até então inexistente Não há violência ou grave ameaça apenas sugestão Com a incidência da agravante genérica o partícipe quem induz será em tese apenado com mais vigor do que o autor executor material Instigar é reforçar a ideia criminosa já existente Determinar é ordenar a prática do delito Exigese esteja o executor do crime sob a autoridade de quem instiga ou determina A lei se refere a qualquer espécie de relação ou subordinação pública ou privada religiosa ou profissional e até mesmo doméstica Basta ser capaz de influir no espírito do agente e dependendo do seu grau pode configurar uma dirimente CP art 22 obediência hierárquica ou uma atenuante genérica CP art 65 III A instigação ou determinação pode dirigirse até mesmo aos inimputáveis pessoas não puníveis em virtude de sua condição ou qualidade pessoal caracterizando a autoria mediata Punese mais gravemente o criminoso mercenário Cuidase de especial forma de motivo torpe caracterizado pela ganância pela ambição desmedida pela cupidez isto é cobiça desejo imoderado de riquezas Na paga a recompensa é anterior à prática do crime Na promessa posterior e não é obrigatório para a aplicação da agravante genérica que seja a recompensa efetivamente recebida É suficiente tenha sido o crime motivado pela crença no ulterior pagamento São duas as atenuantes genéricas menoridade relativa e velhice também denominada de senilidade Menoridade relativa é a atenuante genérica aplicável aos réus menores de 21 anos ao tempo do fato pouco importando a data da sentença Devem ser maiores de 18 anos independentemente de eventual emancipação civil pois do contrário incidem as regras do Estatuto da Criança e do Adolescente Lei 80691990 Essa atenuante foi inicialmente prevista no direito pátrio no Código Criminal do Império de 1830 e desde então não deixou de existir Fundamentase na imaturidade do agente que por tal motivo merece uma pena mais branda suficiente para alcançar suas finalidades de retribuição e prevenção geral e especial De acordo com o parágrafo único do art 155 do Código de Processo Penal com a redação alterada pela Lei 116902008 a prova da idade somente pode ser feita pela certidão de nascimento A jurisprudência entretanto admite outros meios probatórios tais como a carteira de identidade a carteira nacional de habilitação e o certificado de reservista Vejase a propósito a Súmula 74 do Superior Tribunal de Justiça Para efeitos penais o reconhecimento da menoridade do réu requer prova por documento hábil Basta assim qualquer documento juridicamente hábil não se vinculando a prova da menoridade unicamente à certidão de nascimento O art 5º do Código Civil de 2002 pelo qual A menoridade cessa aos 18 dezoito anos completos quando a pessoa fica habilitada à prática de todos os atos da vida civil não revogou essa atenuante genérica por dois fundamentos 1 em se tratando de norma favorável ao réu deveria ter sido revogada expressamente em face da inadmissibilidade no Direito Penal da analogia in malam partem Respeitase desse modo o princípio da reserva legal e 2 os dispositivos penais foram expressamente preservados pelo art 2043 do Código Civil Velhice ou senilidade é a atenuante genérica incidente ao réu maior de 70 setenta anos ao tempo da sentença qualquer que seja a data do fato Fundamentase nas alterações físicas e psicológicas que atingem pessoas em idade avançada aptas a influírem no ânimo criminoso e também na menor capacidade que têm para suportar integralmente a pena que por isso deve ser amenizada Levase em conta a data da publicação da sentença ou seja o dia em que é entregue em mãos do escrivão Em caso de acórdão condenatório isto é decisão do tribunal que reforma a sentença absolutória a idade deve ser aferida na data da sessão de julgamento do recurso de apelação interposto pela acusação Essa regra também não foi modificada com a superveniência da Lei 107412003 Estatuto do Idoso que em seu art 1º considerou idoso o ser humano com idade igual ou superior a 60 anos Com efeito a lei fala em maior de 70 anos e não em idoso situações diversas que comportam tratamento distinto É a posição do Supremo Tribunal Federal em relação à diminuição pela metade do prazo prescricional CP art 115 aplicável a esse dispositivo legal por identidade de razões68 Embora o desconhecimento da lei seja inescusável CP art 21 caput e não afaste o caráter criminoso do fato funciona como atenuante genérica Suavizase no campo penal a regra definida pelo art 3º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro Ninguém se escusa de cumprir a lei alegando que não a conhece De fato subsiste o crime e a responsabilidade penal Cumprese a lei mas é abrandada a pena Justificase essa atenuante pelo fato de o ordenamento jurídico brasileiro ser composto por um emaranhado complexo de leis e atos normativos constantemente revogados e em contínua modificação dificultando por parte do cidadão a exata compreensão do seu significado e do seu alcance Na seara das contravenções penais a ignorância ou a errada compreensão da lei se escusáveis autorizam o perdão judicial LCP art 8º Em seu sentido comum motivo é o que causa ou origina alguma coisa No Direito Penal é o antecedente psíquico da conduta criminosa Os motivos do crime são circunstâncias judiciais importantes na fixação da penabase CP art 59 caput Podem também desempenhar o papel de qualificadora ou de privilégio em determinados crimes como no homicídio doloso ou ainda de agravante CP art 61 II a ou de atenuante genérica como aqui ocorre Para ser reconhecido como atenuante o motivo deve ser relevante isto é importante considerável Para aferirse essa relevância o magistrado adota como parâmetro a figura do homem médio e não o perfil subjetivo do réu Valor social é o que atende aos anseios da coletividade exemplo matar um perigoso estuprador que amedrontava as moradoras de uma pacata cidade Valor moral é o que diz respeito ao agente e está em conformidade com a moralidade e os princípios éticos dominantes exemplo matar o responsável por torturas pretéritas muito tempo depois dos atos de covardia Não se pode confundir a primeira parte procurado por sua espontânea vontade e com eficiência logo após o crime evitarlhe ou minorarlhe as consequências com a figura do arrependimento eficaz CP art 15 No arrependimento eficaz o agente esgota os atos executórios mas impede a consumação do crime Exemplo depois de efetuar disparos de arma de fogo contra a vítima com o intuito de matála arrependese o agente e a leva ao hospital salvandoa da morte Tratase de causa de exclusão da tipicidade pois subsiste somente a responsabilidade penal pelos atos praticados Não há tentativa uma vez que o crime não se consumou por vontade do agente Por sua vez na atenuante genérica o crime se consuma mas o seu responsável procura por sua espontânea vontade e com eficiência logo após o crime impedir ou reduzir as suas consequências Exemplo o sujeito atropela e mata um pai de família mas passa a pagar pensão mensal aos seus herdeiros Atendese à menor reprovabilidade que indica quem passado o ímpeto da ação delituosa procura com eficácia diminuir ou evitar as consequências de sua ação Deve o arrependimento ocorrer logo após ou seja em lapso de tempo que não pode ser exatamente quantificado e que se deve aferir pelos fundamentos da atenuação Por outro lado é preciso que o arrependimento se materialize por espontânea vontade O arrependimento tem de ser eficaz De nada valerão os esforços do agente se não conseguir ele efetivamente evitar ou diminuir as consequências69 Já a parte final do dispositivo ter antes do julgamento reparado o dano precisa ser diferenciada do arrependimento posterior CP art 16 causa obrigatória de diminuição da pena Nesse a reparação do dano ou restituição da coisa deve preceder o recebimento da denúncia ou da queixa enquanto na atenuante genérica é possível a reparação do dano antes do julgamento em 1ª instância Porém aqui também a reparação do dano deve ser integral e efetuada pelo réu livre de coação Destarte se o dano é reparado em razão de condenação no juízo civil não se aplica a atenuante Incide contudo o abrandamento da pena quando a vítima renunciar ao seu direito de crédito ou recusar injustificadamente a indenização Fundamentase essa atenuante genérica em questões de política criminal buscando estimular o acusado mediante a diminuição de sua pena a reparar o dano provocado a um bem jurídico penalmente tutelado Fundamentamse essas atenuantes genéricas pelo fato de ser atacado o juízo de culpabilidade do réu passando sua conduta a apresentar menor reprovabilidade social No tocante à coação a de natureza física e irresistível afasta a conduta do coagido e consequentemente o fato típico por ausência de vontade um dos elementos inerentes ao dolo e à culpa Já a coação moral irresistível exclui a culpabilidade do coagido em face da inexigibilidade de conduta diversa CP art 22 1ª parte Porém se tais coações forem resistíveis haverá concurso de pessoas entre coator e coagido Aquele terá a pena agravada CP art 62 II já em relação a este a reprimenda será atenuada E para aferirse a resistibilidade ou não da coação analisase o perfil do agente e não a figura do homem médio Por sua vez a obediência hierárquica de ordem não manifestamente ilegal exclui a culpabilidade também por inexigibilidade de conduta diversa CP art 22 in fine Somente o superior hierárquico responde pelo crime Todavia se a ordem for manifestamente ilegal tanto o superior hierárquico como o funcionário público subalterno responderão em concurso pelo crime Àquele incidirá uma agravante genérica CP art 62 III enquanto a este uma atenuante genérica pois o subalterno é colocado em difícil posição quando o superior lhe determina a execução de ato ilegal A influência de violenta emoção provocada por ato injusto da vítima também figura como atenuante genérica Se o crime for de homicídio ou de lesões corporais circunstâncias semelhantes caracterizam privilégio CP arts 121 1º e 129 4º Nesses casos porém reclamase o domínio de violenta emoção logo em seguida a injusta provocação da vítima Domínio é mais amplo e mais forte do que influência O primeiro envolve o controle do agente ao passo que a última somente perturba o seu ânimo Mas não é só Na atenuante genérica basta um ato injusto da vítima enquanto no privilégio impõese sua injusta provocação Finalmente no privilégio a reação é imediata logo em seguida ao passo que na atenuante admitese certo hiato temporal uma vez que a lei não condiciona a atuação do agente a determinado período de tempo Para servir como atenuante genérica a confissão há de ser espontânea é dizer deve surgir como fruto da sinceridade do íntimo do agente Não basta ser voluntária livre de coação pois poderia o réu confessar apenas para aproveitarse de um benefício legal sem revelar crível intenção de colaborar na apuração da infração penal70 Para o Supremo Tribunal Federal a simples postura de reconhecimento da prática do delito enseja o reconhecimento desta atenuante genérica pois o art 65 III d do Código Penal não faz qualquer ressalva no tocante à maneira como o agente pronuncia a confissão Além disso esta circunstância possui natureza objetiva razão pela qual independe do subjetivismo do julgador71 Exigese seja a confissão relativa à autoria em sentido amplo para abranger a autoria propriamente dita e a participação e também seja prestada perante a autoridade pública envolvida na persecução penal delegado de Polícia membro do Poder Judiciário ou do Ministério Público Se presente a confissão perante a autoridade pública a circunstância funcionará como atenuante genérica mesmo se existirem outras provas aptas a embasar a condenação A confissão pode ser parcial pois não precisa alcançar eventuais qualificadoras ou causas de aumento da pena72 Seu limite temporal é o trânsito em julgado da condenação O fundamento dessa atenuante é a lealdade processual Na linha da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal Inicialmente acentuouse que a Constituição art 5º LXIII asseguraria aos presos o direito ao silêncio e que o Pacto de São José da Costa Rica art 8º 2 g institucionalizaria o princípio da não autoincriminação nemo denetur se detegere Nesse contexto o chamado réu confesso assumiria postura incomum ao afastarse do instinto do autoacobertamento para colaborar com a elucidação dos fatos do que resultaria a prevalência de sua confissão Em seguida enfatizouse que na concreta situação dos autos a confissão do paciente contribuíra efetivamente para sua condenação e afastara as chances de reconhecimento da tese da defesa técnica no sentido da não consumação do crime Asseverouse que o instituto da confissão espontânea seria sanção do tipo premial e que se assumiria com o paciente postura de lealdade Destacouse o caráter individual personalístico dos direitos subjetivos constitucionais em matéria criminal e como o indivíduo seria uma realidade única afirmouse que todo o instituto de direito penal que se lhe aplicasse deveria exibir o timbre da personalização notadamente na dosimetria da pena73 Como corolário da lealdade processual esta atenuante não é aplicável quando o acusado depois de confessar na fase inquisitiva o seu envolvimento no ilícito penal retratase em juízo Entretanto subsiste a atenuante genérica se as declarações do réu na fase préprocessual em conjunto com as provas apuradas sob o contraditório embasaram a condenação74 A propósito a Súmula 545 do Superior Tribunal de Justiça encontrase assim redigida Quando a confissão for utilizada para a formação do convencimento do julgador o réu fará jus à atenuante prevista no artigo 65 III d do Código Penal Daí decorre porém que não se aplica a atenuante relativa à confissão no inquérito policial posteriormente retratada em juízo se esta não serviu efetivamente para consolidar a sentença condenatória uma vez que outros elementos e circunstâncias da ação penal foram considerados para formar a convicção do julgador a respeito da autoria e materialidade do crime praticado75 A prisão em flagrante do agente não impede por si só o reconhecimento da atenuante da confissão espontânea76 Para o Supremo Tribunal Federal a confissão qualificada na qual o acusado reconhece sua participação no fato típico mas aduz ter agido sob o manto de uma causa de exclusão da ilicitude ou da culpabilidade não autoriza a incidência da atenuante genérica Nessa hipótese a finalidade do réu é exercer sua autodefesa e não contribuir para a descoberta da verdade real A confissão qualificada não é suficiente para justificar a atenuante prevista no art 65 III d do Código Penal A aplicação da atenuante da confissão espontânea prevista no art 65 III d do Código Penal não incide quando o agente reconhece sua participação no fato contudo alega tese de exclusão da ilicitude77 O Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento em sentido contrário A confissão mesmo que qualificada dá ensejo à incidência da atenuante prevista no art 65 III d do CP quando utilizada para corroborar o acervo probatório e fundamentar a condenação78 Finalmente não incide a atenuante genérica nas situações em que o acusado busca minimizar indevidamente sua responsabilidade penal a exemplo do que se verifica quando um traficante confessa a propriedade da droga mas nega sua comercialização aduzindo que o produto se destinava ao consumo próprio ou então quando o autor de um roubo confessa a subtração do bem furto mas nega o emprego de violência ou grave ameaça contra a vítima79 Tratase do crime multitudinário do qual são exemplos as invasões de propriedades rurais as brigas em estádios de futebol etc Pode ser definido como o crime cometido pela multidão em tumulto espontaneamente organizada no sentido de uma conduta comum contra coisas ou pessoas Apurada a autoria do fato todos os seus componentes respondem pelo delito80 Justificase a atenuação da pena na deformação transitória da personalidade que sofre o indivíduo sob a pressão das paixões violentas que agitam o grupo em sublevação A lei toma em conta essa turvação acidental que acomete o espírito dos amotinados em quem falta a serenidade necessária para pesar razões e decidir conforme o Direito atribuindolhe então uma responsabilidade diminuída e com ela a minoração da pena Não podem gozar da atenuante os que provocaram o tumulto Eles mesmos trouxeram a rebeldia para o seio da multidão desencadearam a sua agitação desordenada e embora mais tarde possam passar de condutores a conduzidos não se podem libertar da responsabilidade que pesa sobre eles81 Com efeito a mera provocação de tumulto por si só caracteriza contravenção penal Decretolei 36881941 art 40 O beneficiário da atenuante genérica não pode se valer da premeditação pois tal circunstância afastaria o seu fundamento A quantidade de pessoas para a configuração da multidão fica a critério do juiz No direito canônico da Inquisição falavase em pelo menos 40 pessoas para a formação dessa alma coletiva Não estão especificadas em lei podendo ser qualquer circunstância relevante anterior ou posterior ao crime São também chamadas de atenuantes de clemência pois normalmente o magistrado as concede por ato de bondade Eugenio Raúl Zaffaroni e José Henrique Pierangeli sustentam o cabimento de atenuante dessa estirpe na coculpabilidade isto é situação em que o agente em regra o pobre e marginalizado deve ser punido de modo mais brando pelo motivo de a ele não terem sido conferidas pela sociedade e pelo Estado responsáveis pelo bemestar das pessoas em geral todas as oportunidades para o seu desenvolvimento como ser humano82 O Superior Tribunal de Justiça é preciso destacar não tem admitido a aplicação desta teoria A teoria da coculpabilidade invocada pelo impetrante no lugar de explicitar a responsabilidade moral a reprovação da conduta ilícita e o louvor à honestidade fornece uma justificativa àqueles que apresentam inclinação para a vida delituosa estimulandoos a afastar da consciência mesmo que em parte a culpa por seus atos83 Eventuais bons antecedentes criminais ou antecedentes criminais positivos do réu não podem ser classificados como atenuante inominada pois funcionam como circunstância judicial na 1ª fase da dosimetria da pena privativa de liberdade com fundamento no art 59 caput do Código Penal Na visão do Superior Tribunal de Justiça Não caracteriza circunstância relevante anterior ao crime art 66 do CP o fato de o condenado possuir bons antecedentes criminais A atenuante inominada é entendida como uma circunstância relevante anterior ou posterior ao delito não disposta em lei mas que influencia no juízo de reprovação do autor Excluemse portanto os antecedentes criminais que já são avaliados na fixação da penabase e expressamente previstos como circunstância judicial do art 59 do CP84 Se presentes simultaneamente agravantes e atenuantes genéricas a regra geral é a de que uma neutraliza a eficácia da outra É o que se denomina de equivalência das circunstâncias Excepcionase essa sistemática quando existente alguma circunstância preponderante Como define o art 67 do Código Penal Art 67 No concurso de agravantes e atenuantes a pena deve aproximar se do limite indicado pelas circunstâncias preponderantes entendendose como tais as que resultam dos motivos determinantes do crime da personalidade do agente e da reincidência Há em suma agravantes e atenuantes genéricas mais valiosas do que outras no âmbito da aplicação da pena São as atinentes aos motivos do crime à personalidade do agente e à reincidência Durante muito tempo sustentouse o entendimento de que a menoridade relativa ligada à personalidade era a circunstância preponderante por excelência prevalecia sobre todas as demais uma vez que os menores de 21 anos na vigência do Código Civil de 1916 eram relativamente incapazes Essa posição perdeu seu fundamento de validade depois da entrada em vigor do Código Civil de 2002 que considerou os maiores de 18 anos plenamente capazes para os atos da vida civil Cumpre destacar a diferença entre circunstâncias preponderantes e circunstâncias incompatíveis Nessas uma das circunstâncias tem que desaparecer exemplo o relevante valor moral é incompatível com o motivo fútil enquanto naquelas subsistem todas as agravantes e atenuantes genéricas pesando mais a que prepondera quer para agravar a pena quer para atenuála85 A reincidência agravante genérica e a confissão espontânea atenuante genérica são utilizadas pelo magistrado na segunda fase da dosimetria da pena Além disso ambas possuem natureza preponderante como se extrai do art 67 do Código Penal Mas na hipótese de concurso qual destas circunstâncias legais deve prevalecer Para o Supremo Tribunal Federal a agravante da reincidência prepondera sobre a atenuante da confissão espontânea Nos termos do art 67 do Código Penal no concurso de atenuantes e agravantes a pena deve aproximarse do limite indicado pelas circunstâncias preponderantes No caso sob exame a agravante da reincidência prepondera sobre a atenuante da confissão espontânea razão pela qual é inviável a compensação pleiteada86 O Superior Tribunal de Justiça de seu turno firmou entendimento em sentido contrário A Seção por maioria entendeu que devem ser compensadas a atenuante da confissão espontânea e a agravante da reincidência por serem igualmente preponderantes Segundo se afirmou a confissão revela traço da personalidade do agente indicando o seu arrependimento e o desejo de emenda Assim nos termos do art 67 do CP o peso entre a confissão que diz respeito à personalidade do agente e a reincidência expressamente prevista no referido artigo como circunstância preponderante deve ser o mesmo daí a possibilidade de compensação87 É importante destacar que o Superior Tribunal de Justiça não admite esta compensação na hipótese de réu multirreincidente em respeito aos princípios da proporcionalidade e da individualização da pena De fato tal sujeito apresenta grau de reprovabilidade de comportamento sensivelmente superior àquele que ostenta uma única condenação definitiva Tratandose de réu multirreincidente não é possível promover a compensação entre a atenuante da confissão espontânea e a agravante da reincidência De fato a Terceira Seção do STJ firmou o entendimento de que a atenuante da confissão espontânea pode ser compensada com a agravante da reincidência EREsp 1154752RS DJe 04092012 No entanto tratandose de réu multirreincidente promover essa compensação implicaria ofensa aos princípios da individualização da pena e da proporcionalidade Isso porque a multirreincidência exige maior reprovação do que aquela conduta perpetrada por quem ostenta a condição de reincidente por força apenas de um único evento isolado em sua vida88 3411 O Superior Tribunal de Justiça já admitiu a compensação entre a atenuante da confissão espontânea e a agravante da promessa de recompensa reputandoas como igualmente preponderantes É possível compensar a atenuante da confissão espontânea art 65 III d do CP com a agravante da promessa de recompensa art 62 IV O STJ pacificou o entendimento no sentido de ser possível na segunda fase da dosimetria da pena a compensação da atenuante da confissão espontânea com a agravante da reincidência REsp 1341370MT Terceira Seção DJe 1742013 Esse raciocínio mutatis mutandis assemelhase à presente hipótese por se tratar da possibilidade de compensação entre circunstâncias igualmente preponderantes a saber a agravante de crime cometido mediante paga com a atenuante da confissão espontânea89 A TERCEIRA FASE DA DOSIMETRIA DA PENA CAUSAS DE DIMINUIÇÃO MINORANTES E DE AUMENTO MAJORANTES São circunstâncias obrigatórias ou facultativas de diminuição ou de aumento da pena previstas na Parte Geral ou na Parte Especial do Código Penal e também na legislação especial em quantidade fixa ou variável90 Incidem sobre o montante resultante da segunda fase de aplicação da pena agravantes e atenuantes e não sobre a penabase Ao contrário das circunstâncias judiciais e das atenuantes e agravantes as minorantes e as majorantes podem trazer a pena abaixo do mínimo legal ou levála acima do máximo cominado uma vez que o legislador aponta os limites de diminuição eou de aumento91 Exemplificativamente o preceito secundário do crime de furto simples prevê no tocante à pena privativa de liberdade reclusão de 1 um a 4 quatro anos Se o magistrado aplicar a penabase no mínimo legal mantendose essa reprimenda na segunda fase e presente a figura da tentativa causa geral e obrigatória de diminuição da pena deverá reduzila ao menos no patamar mínimo CP art 14 parágrafo único 13 alcançando a pena final de 8 oito meses muito abaixo do piso legalmente previsto As causas de diminuição e de aumento da pena dividemse em genéricas quando definidas na Parte Geral do Código Penal e aplicáveis à generalidade dos crimes e específicas se contidas na Parte Especial do Código Penal ou na legislação extravagante e de aplicação restrita a determinados delitos Nos termos do art 68 parágrafo único do Código Penal No concurso de causas de aumento ou de diminuição previstas na parte especial pode o juiz limitarse a um só aumento ou a uma só diminuição prevalecendo todavia a causa que mais aumente ou diminua Extraemse desse dispositivo as seguintes conclusões a se existirem duas ou mais causas de aumento ou de diminuição previstas na Parte Geral ambas deverão ser aplicadas desde que obrigatórias Exemplo tentativa CP art 14 parágrafo único e semi imputabilidade CP art 26 parágrafo único causas de diminuição da pena O segundo aumento incide sobre a pena já aumentada pela primeira causa e não sobre a pena obtida na fase das agravantes e atenuantes genéricas É o sistema dos juros sobre juros Há todavia entendimento em sentido diverso sustentando que o segundo aumento deve se calculado sobre a pena inicial e não sobre a pena já aumentada juros sobre o montante original da dívida92 Na hipótese de incidirem duas causas de diminuição a segunda diminuição deve recair sobre o quantum já reduzido pela primeira e não sobre a penabase evitandose a pena zero93 Do contrário imaginese a pena de um ano de reclusão imposta ao condenado semiimputável por tentativa de furto simples Com a primeira diminuição 23 a pena baixaria para 4 quatro meses e com a segunda diminuição 23 calculada sobre a pena inicial a reprimenda seria negativa gerando um absoluto contrassenso b se existirem duas ou mais causas de aumento ou de diminuição previstas na Parte Especial ou na legislação especial analogia in bonam partem o juiz pode limitarse a um só aumento ou a uma só diminuição ainda que obrigatórias prevalecendo nesse caso a causa que mais aumente ou mais diminua Cuidase de faculdade judicial Exemplo crime de incêndio tipificado pelo art 250 caput do Código Penal quando presentes duas ou mais causas de aumento previstas nos incisos I e II do seu 1º Nada impede porém a incidência de todas as causas de aumento ou de diminuição da pena94 As causas de aumento remanescentes deverão ser utilizadas como agravantes genéricas se previstas em lei CP arts 61 e 62 ou residualmente como circunstâncias judiciais desfavoráveis Já as restantes causas de diminuição funcionarão como atenuantes genéricas nominadas CP art 65 ou inominadas art 66 c se existirem uma causa de aumento e uma causa de diminuição simultaneamente ambas deverão ser aplicadas desde que obrigatórias Em primeiro lugar o magistrado aplica as causas de aumento e depois as de diminuição Não pode a sentença fazêlas recair ao mesmo tempo compensandoas Exemplo concurso formal causa de aumento CP art 70 e semiimputabilidade causa de diminuição CP art 26 parágrafo único d se existirem ao mesmo tempo duas causas de aumento ou então duas causas de diminuição previstas uma na Parte Geral e outra na Parte Especial ou legislação especial todas elas serão aplicáveis Por questão de lógica intrínseca à estrutura do tipo penal incidem inicialmente as causas de aumento e de diminuição da Parte Especial ou da legislação especial e posteriormente as majorantes ou minorantes da Parte Geral Concurso entre causas de aumento Ambas da Parte Geral O juiz aplicará os dois aumentos embora a hipótese seja raríssima Ambas da Parte Especial O juiz poderá aplicar a causa que mais aumente art 68 parágrafo único do CP Uma da Parte Geral outra da Parte Especial O juiz aplicará os dois aumentos Concurso entre causas de diminuição Ambas da Parte Geral O juiz aplicará as duas diminuições Ambas da Parte Especial O juiz poderá aplicar a causa que mais diminua art 68 parágrafo único do CP Uma da Parte Geral outra da Parte Especial O juiz aplicará as duas diminuições 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 LUISI Luiz Os princípios constitucionais penais 2 ed Porto Alegre Sergio Fabris 2003 p 54 LYRA Roberto Comentários ao código penal Rio de Janeiro Forense 1942 v II p 172 Parecenos haver inaceitável artificialismo na separação do trabalho do julgador em três fases Duas sem dúvida serão imprescindíveis sempre que existir causa de aumento ou de diminuição a atender Só então surgirá a contingência de fixarse uma penabase Essa designação corrente em nosso meio como entre os comentadores italianos pode ser mantida sem desvantagem Exprimirá a quantidade fundamental da pena sobre a qual se computarão os aumentos e diminuições Não queremos dizer que a verificação não possa tripartirse mas tão só que não há necessidade Nada impede que o juiz no uso dos seus largos poderes complique um pouco mais o seu labor espiritual detendose numa etapa provisória na certeza de que terá imediatamente de alterar o resultado colhido ante a eficácia de agravantes e atenuantes obrigatórias já presentes na sua consciência ao início da operação GARCIA Basileu Instituições de direito penal 4 ed 37 tir São Paulo Max Limonad t II v I 1975 FRANCO Alberto Silva STOCO Rui Código penal e sua interpretação jurisprudencial Parte geral 7 ed São Paulo RT 2001 v 1 p 1233 STF RHC 117037SP rel Min Dias Toffoli 1ª Turma j 08102013 Isso não impede porém sejam previstas agravantes por leis especiais a exemplo do que ocorre no art 298 da Lei 95031997 em relação aos crimes de trânsito Mas no Código Penal estão arroladas na Parte Geral É possível entretanto sua definição também por leis especiais a exemplo do art 14 da Lei 96051998 crimes ambientais Mas no Código Penal encontramse previstas exclusivamente na Parte Geral Súmula 231 do Superior Tribunal de Justiça A incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal HC 106965AC rel Min Ayres Britto 2ª Turma j 19042011 STF RHC 84295RJ rel Min Cezar Peluso 1ª Turma j 29112005 STJ HC 246658SP rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 26082014 12 13 14 15 16 17 18 19 20 Para as duas primeiras fases devese observar os limites mínimo e máximo cominados somente exsurge a possibilidade de diminuição ou de elevação da pena aquém de seu mínimo legal ou além do máximo quando da terceira etapa da aplicação da reprimenda STJ AgRg no AREsp 437391SP rel Min Jorge Mussi 5ª Turma j 27032014 Para o Superior Tribunal de Justiça a fixação do valor mínimo depende de pedido expresso do titular da ação penal Ministério Público ou querelante e pode abranger tantos os danos materiais como também os danos morais causados pela infração penal REsp 1265707RS rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 27052014 e REsp 1585684DF rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 09082016 noticiado no Informativo 588 Nos crimes envolvendo drogas há outras circunstâncias judiciais de natureza preponderante previstas no art 42 da Lei 113432006 O juiz na fixação das penas considerará com preponderância sobre o previsto no art 59 do Código Penal a natureza e a quantidade da substância ou do produto a personalidade e a conduta social do agente STF RHC 117037SP rel Min Dias Toffoli 1ª Turma j 08102013 e STJ AgRg no HC 274128BA rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 19082014 STF AP 971RJ rel Min Edson Fachin 1ª Turma j 28062016 noticiado no Informativo 832 e STJ EDv nos EREsp 1196136RO rel Min Reynaldo Soares da Fonseca 3ª Seção j 24052017 noticiado no Informativo 608 Vejase que algumas das circunstâncias legais que qualificam o homicídio CP art 121 2º I a V funcionam como agravantes genéricas para os demais crimes CP art 61 II a b c e d STF HC 112309MS rel Min Dias Toffoli 1ª Turma j 27112012 noticiado no Informativo 690 Resulta legítima a fixação da penabase acima do mínimo legal com fundamento em apenas uma das circunstâncias judiciais arroladas no art 59 do Código Penal in casu os motivos do crime STF HC 108146GO rel Min Luiz Fux 1ª Turma j 05062012 E mesmo sem fundamentação da decisão judicial a defesa somente teria interesse em questionar sua nulidade na presença de causa de diminuição da pena pois nessa hipótese a pena poderia ser reduzida abaixo do mínimo legal HC 92322PA rel Min Cármen Lúcia 1ª Turma j 21 22 23 24 25 26 11122007 noticiado no Informativo 492 HC 97056DF rel Min Ricardo Lewandowski 1ª Turma j 13102009 noticiado no Informativo 563 Tais circunstâncias judiciais continuam previstas no art 69 do Decretolei 10011969 Código Penal Militar Para fixação da pena privativa de liberdade o juiz aprecia a gravidade do crime praticado e a personalidade do réu devendo ter em conta a intensidade do dolo ou grau da culpa a maior ou menor extensão do dano ou perigo de dano os meios empregados o modo de execução os motivos determinantes as circunstâncias de tempo e lugar os antecedentes do réu e sua atitude de insensibilidade indiferença ou arrependimento após o crime Como se sabe este diploma normativo não foi atingido pela Lei 72091984 Reforma da Parte Geral do Código Penal HC 105674RS rel Min Marco Aurélio Plenário j 17102013 noticiado no Informativo 724 É também o entendimento do STJ O fato de o agente ter se aproveitado para a prática do crime da situação de vulnerabilidade emocional e psicológica da vítima decorrente da morte de seu filho em razão de erro médico pode constituir motivo idôneo para a valoração negativa de sua culpabilidade De fato conforme entendimento do STJ é possível a valoração negativa da circunstância judicial da culpabilidade com base em elementos concretos e objetivos constantes dos autos que demonstrem que o comportamento da condenada é merecedor de maior reprovabilidade de maneira a restar caracterizado que a conduta delituosa extrapolou os limites naturais próprios à execução do crime HC 264459SP rel Min Reynaldo Soares da Fonseca 5ª Turma j 10032016 noticiado no Informativo 579 HC 132990PE rel orig Min Luiz Fux red p o acórdão Min Edson Fachin 2ª Turma j 16082016 noticiado no Informativo 835 Os atos infracionais praticados pelo agente não são classificados como maus antecedentes Atos infracionais não configuram crimes e por isso não é possível considerálos como maus antecedentes nem como reincidência até porque fatos ocorridos ainda na adolescência estão acobertados por sigilo e estão sujeitos a medidas judiciais exclusivamente voltadas à proteção do jovem STJ HC 338936SP rel Min Nefi Cordeiro 6ª Turma j 17122015 noticiado no Informativo 576 HC 95585SP rel Min Ellen Gracie 2ª Turma j 11112008 noticiado no Informativo 528 AO 1046RR rel Min Joaquim Barbosa Plenário j 27 28 29 30 31 32 33 34 35 36 37 23042007 noticiado no Informativo 464 e HC 84088MS rel orig Min Gilmar Mendes rel p o acórdão Min Joaquim Barbosa 2ª Turma j 29112005 noticiado no Informativo 411 RE 591054SC rel Min Marco Aurélio Plenário j 17122014 noticiado no Informativo 772 Na mesma direção HC 122940PI rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 13122016 noticiado no Informativo 851 e RHC 121126AC rel Min Rosa Weber 1ª Turma j 22042014 Inquéritos policias e ações penais em curso não caracterizam maus antecedentes mas podem ser utilizados para justificar a decretação da prisão preventiva como garantia da ordem pública STJ RHC 70698MG rel Min Joel Ilan Paciornik 5ª Turma j 28062016 e para afastar a causa de diminuição da pena contida no art 33 4º da Lei 113432006 Lei de Drogas STJ ERESP 1431091SP rel Min Felix Fischer 3ª Seção j 04122016 HC 117737 rel Min Rosa Weber 1ª Turma j 15102013 No STJ AgRg no AREsp 243109SP rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 05062014 HC 189385RS rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 20022014 STF RE 591054SC rel Min Marco Aurélio Plenário j 17122014 noticiado no Informativo 772 O STJ compartilha deste entendimento REsp 1160440MG rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 17032016 noticiado no Informativo 580 HC 126315SP rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 15092015 noticiado no Informativo 799 STJ HC 225035ES rel Min Rogério Schietti Cruz 6ª Turma j 12082014 e STJ HC 280183SP rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 05082014 HC 189385RS rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 20022014 noticiado no Informativo 535 RHC 130132MS rel Min Teori Zavascki 2ª Turma j 10052016 noticiado no Informativo 825 HC 165089DF rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 16102012 noticiado no Informativo 506 STJ REsp 1243923AM rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 12082014 38 39 40 41 42 43 44 45 46 47 48 HC 332676PE rel Min Ericson Maranho Desembargador convocado do TJSP 6ª Turma j 17122015 noticiado no Informativo 576 STF HC 92274MS rel Min Ricardo Lewandowski 1ª Turma j 19022008 HC 165089DF rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 16102012 noticiado no Informativo 506 E também AgRg no REsp 1446730ES rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 21082014 HC 134193GO rel Min Dias Toffoli 2ª Turma j 26102016 noticiado no Informativo 485 Em se tratando de crime sexual praticado contra menor de 14 anos a experiência sexual anterior e a eventual homossexualidade do ofendido não servem para justificar a diminuição da penabase a título de comportamento da vítima STJ REsp 897734PR rel Min Nefi Cordeiro 6ª Turma j 03022015 noticiado no Informativo 555 HC 284951MG rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 08042014 No mesmo sentido HC 189385RS rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 20022014 noticiado no Informativo 535 STJ REsp 1254749SC rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 06052014 noticiado no Informativo 541 HC 70362RJ rel Min Sepúlveda Pertence 1ª Turma j 05101995 É também o entendimento do Supremo Tribunal Federal Como assentado em precedentes da Suprema Corte a presença de atenuantes não pode levar a pena a ficar abaixo do mínimo e a de agravantes também não pode levar a pena a ficar acima do máximo previsto no tipo penal básico ou qualificado HC 93071RS rel Min Menezes Direito 1ª Turma j 18032008 E ainda RE 597270 QORS rel Min Cezar Peluso Plenário j 26032009 noticiado no Informativo 540 O STJ já admitiu a exasperação da pena em face da incidência de agravante genérica em fração superior a 16 desde que presente motivação idônea em atenção aos princípios da proporcionalidade razoabilidade necessidade e suficiência à reprovação e à prevenção do crime HC 170861SP rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 12082014 e HC 276366SP rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 18062014 RE 453000RS rel Min Marco Aurélio Plenário j 04042013 noticiado no Informativo 700 No STJ AgRg no AREsp 516097MT rel 49 50 51 52 53 54 55 56 Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 07082014 Os atos infracionais praticados pelo agente não servem como pressuposto da reincidência Atos infracionais não configuram crimes e por isso não é possível considerálos como maus antecedentes nem como reincidência até porque fatos ocorridos ainda na adolescência estão acobertados por sigilo e estão sujeitos a medidas judiciais exclusivamente voltadas à proteção do jovem STJ HC 338936SP rel Min Nefi Cordeiro 6ª Turma j 17122015 noticiado no Informativo 576 FARIA Bento Código Penal brasileiro comentado Rio de Janeiro Record 1961 v III p 44 HC 200900RJ rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 27092012 noticiado no Informativo 505 Contudo estará caracterizado um mau antecedente Para o STF Condenações transitadas em julgado após o cometimento dos crimes objeto da condenação são aptas a desabonar na primeira fase da dosimetria os antecedentes criminais para efeito de exacerbação da pena base CP art 59 STF HC 117737SP rel Min Rosa Weber 1ª Turma j 15102013 É também o entendimento do STJ AgRg no AREsp 243109SP rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 05062014 STF RHC 88022RJ rel Min Sepúlveda Pertence 1ª Turma j 28032006 HC 453437SP rel Min Reynaldo Soares da Fonseca 5ª Turma j 04102018 noticiado no Informativo 636 E também REsp 1672654SP rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 21082018 noticiado no Informativo 632 HC 103969MS rel Min Ricardo Lewandowski 1ª Turma j 21092010 noticiado no Informativo 601 No STJ É firme o entendimento deste Superior Tribunal no sentido de que a folha de antecedentes criminais é documento hábil e suficiente a comprovar os maus antecedentes e a reincidência não sendo pois obrigatória a apresentação de certidão cartorária HC 175538SP rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 11042013 E também HC 284910MS rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 26082014 Antes da reforma da Parte Geral pela Lei 72091984 o Código Penal preceituava que estava presente a reincidência específica quando da mesma natureza os crimes E consideravamse crimes da mesma natureza os previstos no mesmo dispositivo legal bem como os que embora 57 58 59 60 61 62 63 64 65 66 67 68 69 70 previstos em dispositivos diversos apresentassem pelos seus fatos constitutivos ou por seus motivos determinantes caracteres fundamentais comuns As consequências da reincidência específica eram a aplicação da pena privativa de liberdade acima da metade da soma do mínimo com o máximo e a aplicação da pena mais grave em qualidade dentre as cominadas alternativamente art 46 1º II e 2º e art 47 I e II LYRA Roberto Comentários ao Código Penal Rio de Janeiro Forense 1942 v II p 280 e ss STJ HC 390038SP rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 06022018 noticiado no Informativo 619 Há exceções a essa regra Confirase a propósito o Capítulo 33 item 337 Há posições em contrário É o caso de NUCCI Guilherme de Souza Código Penal comentado 6 ed São Paulo RT 2006 p 380 REsp 1243516SP rel Min Reynaldo Soares da Fonseca 5ª Turma j 22092016 noticiado no Informativo 590 STJ AgRg no REsp 1289181SP rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 17102013 STJ REsp 908396MG rel Min Arnaldo Esteves Lima 5ª Turma j 03032009 SABINO JÚNIOR Vicente Direito penal São Paulo Sugestões Literárias 1967 v II p 358 MEIRELLES Hely Lopes Direito administrativo brasileiro 32 ed atual por Eurico de Andrade Azevedo Délcio Balestero Aleixo e José Emmanuel Burle Filho São Paulo Malheiros 2006 p 417 STJ HC 284951MG rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 08042014 REsp 1563169DF rel Min Reynaldo Soares da Fonseca 5ª Turma j 10032016 noticiado no Informativo 580 HC 89969RJ rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 26062007 FRAGOSO Heleno Cláudio Lições de direito penal parte geral 15 ed rev e atual por Fernando Fragoso Rio de Janeiro Forense 1994 p 340 341 Entretanto o Superior Tribunal de Justiça já decidiu ser prescindível a 71 72 73 74 75 76 77 78 79 80 81 82 espontaneidade bastando que haja apenas a voluntariedade HC 117764SP rel Min Og Fernandes j 27102009 6ª Turma noticiado no Informativo 413 HC 106376MG rel Min Cármen Lúcia 1ª Turma j 01032011 noticiado no Informativo 618 O fato de o denunciado por furto qualificado pelo rompimento de obstáculo ter confessado a subtração do bem apesar de ter negado o arrombamento é circunstância suficiente para a incidência da atenuante da confissão espontânea art 65 III d do CP Isso porque consoante entendimento sufragado no âmbito do STJ mesmo que o agente tenha confessado parcialmente os fatos narrados na exordial acusatória deve ser beneficiado com a atenuante genérica da confissão espontânea STJ HC 328021SC rel Min Leopoldo de Arruda Raposo Desembargador convocado do TJPE 5ª Turma j 03092015 noticiado no Informativo 569 HC 101909MG rel Min Ayres Britto 2ª Turma j 28022012 noticiado no Informativo 656 STF HC 91654PR rel Min Carlos Britto 1ª Turma j 08042008 noticiado no Informativo 501 STJ AgRg no REsp 1332113SP rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 05122013 HC 135666RJ rel Min Og Fernandes 6ª Turma j 22022011 noticiado no Informativo 464 HC 119671SP rel Min Luiz Fux 1ª Turma j 05112013 EREsp 1416247GO rel Min Ribeiro Dantas 3ª Seção j 22062016 noticiado no Informativo 586 E também AgRg no REsp 1198354ES rel Min Jorge Mussi 5ª Turma j 16102014 noticiado no Informativo 551 STJ HC 301063SP rel Min Gurgel de Faria 5ª Turma j 03092015 noticiado no Informativo 569 JESUS Damásio E de Da codelinquência em face do novo Código Penal São Paulo RT 1976 p 83 BRUNO Aníbal Das penas Rio de Janeiro Editora Rio 1976 p 143 ZAFFARONI Eugenio Raúl PIERANGELI José Henrique Manual de direito penal brasileiro Parte geral 7 ed São Paulo RT 2007 v 1 p 83 84 85 86 87 88 89 90 91 92 93 525 HC 172505MG rel Min Gilson Dipp 5ª Turma j 31052011 Em igual sentido HC 187132MG rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 05022013 REsp 1405989SP rel para o acórdão Min Nefi Cordeiro 6ª Turma j 18082015 noticiado no Informativo 569 VERGARA Pedro Das circunstâncias atenuantes no direito penal vigente Rio de Janeiro Bofoni 1948 p 5054 RHC 120677SP rel Min Ricardo Lewandowski 2ª Turma j 18032014 EREsp 1154752RS rel Min Sebastião Reis Júnior 3ª Seção j 23052012 noticiado no Informativo 498 Com igual conclusão REsp 1341370MT rel Min Sebastião Reis Júnior 3ª Seção j 10042013 noticiado no Informativo 522 O STJ estende essa conclusão ao concurso entre a atenuante da confissão espontânea com a agravante do crime ter sido praticado com violência contra a mulher art 65 III d do CP AgRg no AREsp 689064RJ rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 06082015 noticiado no Informativo 568 AgRg no REsp 1424247DF rel Min Nefi Cordeiro 6ª Turma j 03022015 noticiado no Informativo 555 HC 318594SP rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 24022016 noticiado no Informativo 577 A quantidade do aumento ou da diminuição deve ser avaliada no caso concreto A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal não admite o tabelamento das penas representado por percentuais previamente definidos RHC 116676MG rel Min Ricardo Lewandowski 2ª Turma j 20082013 noticiado no Informativo 716 STF RE 453000RS rel Min Marco Aurélio Plenário j 04042013 noticiado no Informativo 700 É o que pensam entre outros SHECAIRA Sérgio Salomão e CORRÊA JUNIOR Alceu Teoria da pena finalidades direito positivo jurisprudência e outros estudos de ciência criminal São Paulo RT 2002 p 283284 JESUS Damásio E de Código Penal anotado 15 ed São Paulo Saraiva 2004 p 249 94 Acentuou que a previsão do art 68 do CP estabeleceria sob o ângulo literal apenas uma possibilidade de atuação STF HC 110960DF rel Min Luiz Fux 1ª Turma j 19082014 noticiado no Informativo 755 As penas restritivas de direitos são também chamadas de penas alternativas pois têm o propósito de evitar a desnecessária imposição da pena privativa de liberdade nas situações expressamente indicadas em lei relativas a indivíduos dotados de condições pessoais favoráveis e envolvidos na prática de infrações penais de reduzida gravidade Buscase a fuga da pena privativa de liberdade reservada exclusivamente para situações excepcionais aplicandose em seu lugar a restrição de um ou mais direitos do condenado1 Falase atualmente em falência da pena de prisão provocada por diversos motivos e notadamente por seu fator criminógeno A privação da liberdade em vez de combater a delinquência muitas vezes a estimula Não traz benefícios ao condenado proporcionando ao contrário abertura para vícios e degradações morais2 Para o Supremo Tribunal Federal As penas restritivas de direitos são em essência uma alternativa aos efeitos certamente traumáticos estigmatizantes e onerosos do cárcere Não é à toa que todas elas são comumente chamadas de penas alternativas pois essa é mesmo a sua natureza constituirse num substitutivo ao encarceramento e suas sequelas E o fato é que a pena privativa de liberdade corporal não é a única a cumprir a função retributivoressocializadora ou restritivopreventiva da sanção penal As demais penas também são vocacionadas para esse geminado papel da retribuiçãoprevençãoressocialização e ninguém melhor do que o juiz natural da causa para saber no caso concreto qual o tipo alternativo de reprimenda é suficiente para castigar e ao mesmo tempo recuperar socialmente o apenado prevenindo comportamentos do gênero3 Nos moldes do art 43 do Código Penal Art 43 As penas restritivas de direitos são I prestação pecuniária II perda de bens e valores III Vetado IV prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas V interdição temporária de direitos VI limitação de fim de semana As duas primeiras penas restritivas de direitos prestação pecuniária e perda de bens e valores foram criadas pela Lei 97141998 enquanto as demais já existiam no Código Penal Esse rol é exaustivo Portanto não pode o magistrado no caso concreto criar outra espécie de pena alternativa O inciso III vetado pelo Presidente da República previa a pena de recolhimento domiciliar Amparouse o veto na alegação de impossibilidade de fiscalização de pena dessa natureza nada obstante sua existência no art 8º V da Lei 96051998 Lei dos Crimes Ambientais que a define no art 13 O recolhimento domiciliar baseiase na autodisciplina e senso de responsabilidade do condenado que deverá sem vigilância trabalhar frequentar curso ou exercer atividade autorizada permanecendo recolhido nos dias e horários de folga em residência ou em qualquer local destinado a sua moradia habitual conforme estabelecido na sentença condenatória As penas restritivas de direitos são efetivamente penas independentemente da ausência de privação da liberdade Muitas delas foram assim definidas expressamente pelo art 5º XLVI da Constituição Federal que apresenta um rol exemplificativo ao estatuir que a lei regulará a individualização da pena e adotará entre outras as seguintes Possuem duas características marcantes indicadas pelos arts 44 e 54 do Código Penal substitutividade e autonomia As penas restritivas de direitos são substitutivas porque resultam do procedimento judicial que depois de aplicar uma pena privativa de liberdade efetua a sua substituição por uma ou mais penas restritivas de direitos desde que presentes os requisitos legais Isso ocorre em razão de os tipos penais não possuírem no preceito secundário a previsão direta de penas restritivas de direitos as quais estão definidas pela Parte Geral do Código Penal De fato os tipos incriminadores depois de definirem a conduta criminosa não dizem exemplificativamente Pena prestação de serviços à comunidade por 1 um ano A Lei 113432006 Lei de Drogas contudo abriu nítida exceção a essa regra no tocante ao crime tipificado pelo art 28 posse de droga para consumo pessoal ao qual não se impõe pena privativa de liberdade mas imediatamente penas restritivas de direitos consistentes em advertência sobre os efeitos das drogas prestação de serviços à comunidade e medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo As penas restritivas de direitos são também dotadas de autonomia isto é uma vez substituídas não podem ser cumuladas com a pena privativa de liberdade Em suma o magistrado deve aplicar isoladamente uma pena privativa de liberdade para em seguida substituíla por uma ou mais restritivas de direitos É vedado contudo somálas Além disso durante a execução penal o Poder Judiciário deve regular o cumprimento da pena restritiva de direitos olvidandose da pena privativa de liberdade exceto se for necessário o seu restabelecimento nas hipóteses extraordinariamente previstas em lei 3551 A Lei 95031997 Código de Trânsito Brasileiro todavia previu em diversos delitos a aplicação conjunta de penas privativa de liberdade e restritiva de direitos como se observa dos arts 302 homicídio culposo na direção de veículo automotor 303 lesão corporal culposa na direção de veículo automotor 306 embriaguez ao volante 307 violação de proibição ou restrição para direção de veículo automotor e 308 participação em competição não autorizada E se não bastasse afirmou expressamente em seu art 292 A suspensão ou a proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor pode ser imposta como penalidade principal isolada ou cumulativamente com outras penalidades4 Dispõe o art 55 do Código Penal que as penas restritivas de direitos de prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas interdição temporária de direitos e limitação de fim de semana têm a mesma duração da pena privativa de liberdade substituída Mas a pena de prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas superior a 1 um ano pode ser cumprida em menor tempo nunca inferior à metade da pena privativa de liberdade fixada CP art 46 4º Essa regra não se aplica às penas de prestação pecuniária e perda de bens e valores pois em nada se relacionam com o limite temporal da pena privativa de liberdade substituída Têm notadamente cunho patrimonial e não de restrição de direitos por prazo certo A substituição da pena privativa de liberdade está condicionada ao atendimento de diversos requisitos indicados pelo art 44 I a III do Código Penal de duas ordens objetivos e subjetivos5 No caso concreto se todos os requisitos estiverem presentes o magistrado não poderá negar a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos6 Requisitos objetivos Dizem respeito à natureza do crime e à quantidade da pena aplicada a Natureza do crime Em se tratando de crime doloso deve ter sido cometido sem violência ou grave ameaça à pessoa E na visão do Superior Tribunal de Justiça na hipótese de crime cuja substituição seja vedada pelo Código Penal pouco importa o grau de participação do agente no delito mesmo que de menor importância pois isso constituiria causa de diminuição da pena sem alteração da classificação jurídica do crime de que lhe são meios a violência e a grave ameaça a obstar a pena alternativa7 Quanto à violência imprópria isto é aquela em que não há emprego de força física contra a vítima mas o agente a reduz por qualquer meio à impossibilidade de resistência o entendimento dominante é de não ser possível a substituição pois a violência imprópria nada mais é do que uma forma específica de violência Disso discorda Mirabete sustentando a incidência do benefício ao crime de roubo cometido com o emprego de narcótico8 Discutese também se seria admissível a substituição nos casos de infrações penais de menor potencial ofensivo quando praticadas com emprego de violência ou grave ameaça à pessoa tais como lesão corporal de natureza leve ameaça e constrangimento ilegal Alguns sustentam que seriam pertinentes os benefícios da Lei 90991995 mas não a conversão da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos Destarte em caso de condenação o magistrado deveria limitarse a fixar o regime aberto para o cumprimento da pena ou no máximo conceder o sursis Prevalece contudo entendimento diverso Deveras se é possível até mesmo a composição dos danos civis em determinados casos e frequentemente a transação penal institutos muito mais benéficos não seria pertinente a vedação da substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos Vejase a propósito a exposição de Rogério Greco A primeira indagação que levanta é a seguinte Se uma das finalidades da substituição é justamente evitar o encarceramento daquele que teria sido condenado ao cumprimento de uma pena de curta duração nos crimes de lesão corporal leve de constrangimento ilegal ou mesmo de ameaça onde a violência e grave ameaça fazem parte desses tipos estaria impossibilitada a substituição Entendemos que não pois que se as infrações penais se amoldam àquelas consideradas de menor potencial ofensivo sendo o seu julgamento realizado até mesmo no Juizado Especial Criminal seria um verdadeiro contrassenso impedir justamente nesses casos a substituição Assim se a infração penal for da competência do Juizado Especial Criminal em virtude da pena máxima a ela cominada entendemos que mesmo que haja o emprego de violência ou grave ameaça será possível a substituição9 Na hipótese de crimes culposos entendese ser possível a substituição em todos eles ainda que resulte na produção de violência contra a pessoa tal como no homicídio culposo tanto do Código Penal art 121 3º como do Código de Trânsito Brasileiro art 30210 b Quantidade da pena aplicada Preocupouse o legislador com a pena efetivamente aplicada na situação concreta independentemente daquela cominada pelo preceito secundário do tipo penal Nos crimes dolosos desde que não tenham sido cometidos com emprego de violência ou grave ameaça à pessoa o limite é de 4 quatro anos Em se tratando de concurso de crimes a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos somente será possível quando o total das reprimendas não ultrapasse o limite de quatro anos previsto no art 44 I do CP11 Na hipótese de concurso formal ou de crime continuado levase em conta o total da pena imposta aí se computando o acréscimo legal 16 até 12 no concurso formal ou 16 até 23 no crime continuado No tocante ao concurso material o magistrado fixa na sentença a pena de cada crime separadamente Em seguida analisa também isoladamente em relação a cada delito o cabimento da substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos Se todavia para um dos crimes tiver sido negado o sursis para os demais será incabível a substituição por pena restritiva de direitos CP art 69 1º E quando forem aplicadas penas restritivas de direitos o condenado cumprirá simultaneamente as que forem compatíveis entre si e sucessivamente as demais CP art 69 2º Em relação aos crimes culposos é possível a substituição por pena restritiva de direitos qualquer que seja a quantidade de pena privativa de liberdade imposta b1 A polêmica relacionada ao homicídio culposo na direção de veículo automotor com embriaguez ao volante O art 302 3º da Lei 95031997 Código de Trânsito Brasileiro com a redação dada pela Lei 135462017 prevê a pena de reclusão de cinco a oito anos e suspensão ou proibição do direito de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor quando o agente praticar homicídio culposo na direção de veículo automotor conduzindoo sob a influência de álcool ou de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência Criouse uma figura até então inexistente no Brasil qual seja crime culposo punido com reclusão e de significativa quantidade cinco a oito anos12 Essa mudança baseouse em diversos propósitos Um deles indiscutivelmente foi vedar a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos pois a pena mínima a ser aplicada será superior a quatro anos ultrapassando o limite imposto pelo art 44 inc I do Código Penal13 O legislador se olvidou contudo de um ponto de fundamental importância Cuidase de crime culposo para o qual é cabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos independentemente do montante da sanção aplicada Portanto não se pode impedir a substituição unicamente em razão da quantidade da pena imposta no caso concreto Porém ao menos em tese é possível obstar a substituição em face da ausência do requisito subjetivo exigido pelo art 44 inc III do Código Penal princípio da suficiência Com efeito é difícil visualizar uma situação real em que a culpabilidade os antecedentes a conduta social e a personalidade do condenado bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente na hipótese em que alguém de forma irresponsável e leviana embriagase conduz veículo automotor e elimina a 3552 1 2 vida alheia Requisitos subjetivos Referemse à pessoa do condenado seja ele nacional ou estrangeiro residente no Brasil ou não14 a Não ser reincidente em crime doloso Esse requisito está contido no art 44 II do Código Penal Concluise indiretamente não ser a reincidência em crime culposo impeditiva da substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos E mesmo para o reincidente em crime doloso abrese uma exceção Com efeito se o condenado for reincidente o juiz poderá aplicar a substituição desde que em face de condenação anterior a medida seja socialmente recomendável e a reincidência não se tenha operado em virtude da prática do mesmo crime CP art 44 3º Na ótica do Superior Tribunal de Justiça A reincidência genérica não é motivo suficiente por si só para o indeferimento da substituição da pena privativa de liberdade Nos termos do art 44 3º do Código Penal é possível o deferimento da benesse ao réu reincidente desde que atendidos dois requisitos cumulativos quais sejam ser a medida socialmente recomendável em face da condenação anterior e que não esteja caracterizada a reincidência específica15 Portanto o reincidente em crime doloso pode ser beneficiado pela substituição quando estiverem presentes dois requisitos cumulativos A medida seja socialmente recomendável cuidase de análise subjetiva a ser minuciosamente desenvolvida pelo magistrado levando em conta as condições do caso concreto tais como as circunstâncias do delito e principalmente os dados pessoais do condenado Não se tratar de reincidente específico a lei foi clara ao definir a reincidência específica como a repetição do mesmo crime ou seja da conduta apresentada pelo mesmo tipo penal b Princípio da suficiência Como estatui o art 44 III do Código Penal a culpabilidade os antecedentes a conduta social e a personalidade do condenado bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente A pena restritiva de direitos precisa ser adequada e suficiente para atingir as finalidades da pena Em outras palavras tanto a retribuição do mal praticado pelo crime como a prevenção geral e especial de novos crimes inerentes à pena privativa de liberdade devem ser alcançadas com a pena restritiva de direitos Por corolário não cabe a substituição quando a penabase tiver sido fixada acima do mínimo legal em razão do reconhecimento judicial expresso e fundamentado das circunstâncias desfavoráveis em face do não atendimento do art 44 III do Código Penal16 Em regra os requisitos legais impedem a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos no tocante aos crimes hediondos ou equiparados tráfico de drogas tortura e terrorismo pois a pena aplicada é superior a 4 quatro anos ou então os delitos são cometidos com emprego de 3561 violência à pessoa ou grave ameaça17 Se não bastasse a pena privativa de liberdade imposta a tais crimes deve ser cumprida em regime inicialmente fechado a teor do art 2º 1º da Lei 80721990 com a redação dada pela Lei 114642007 Esse mandamento legal inviabiliza a substituição porque não se admite a incidência do benefício quando a sanção penal tem seu cumprimento obrigatoriamente iniciado no regime mais gravoso incompatível com a simples restrição de direitos É preciso destacar entretanto ter o Supremo Tribunal Federal firmado jurisprudência no sentido da inconstitucionalidade do art 2º 1º da Lei 8072199018 A problemática relacionada ao tráfico de drogas A pena cominada ao crime de tráfico de drogas tanto na forma simples como na modalidade equiparada Lei 113432006 Lei de Drogas art 33 caput e 1º é de reclusão de 5 cinco a 15 quinze anos e 500 a 1500 diasmulta Na sistemática da revogada Lei 63681976 o tráfico era apenado com reclusão de 3 três a 15 quinze anos sem prejuízo da multa art 12 caput O objetivo do legislador ao elevar o patamar mínimo da pena privativa de liberdade inerente ao tráfico de drogas foi afastar a discussão atinente ao cabimento de penas alternativas em delito de tão elevada gravidade equiparado pelo art 5º XLIII da Constituição Federal aos crimes hediondos Contudo nas situações em que o agente for primário e de bons antecedentes não se dedicar a atividades criminosas nem integrar organizações criminosas as penas privativa de liberdade e multa poderão ser reduzidas de 16 um sexto a 23 dois terços nos termos do art 33 4º da Lei 113432006 Nesses casos é possível a aplicação da pena abaixo do teto de 4 quatro anos ao sujeito condenado pelo crime de tráfico de drogas Mas a Lei 113432006 visando afastar qualquer controvérsia impediu expressamente a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos no tráfico de drogas É o que se extrai do próprio art 33 4º e também do art 44 caput Em síntese o povo brasileiro representado pelo Congresso Nacional optou pela impossibilidade de aplicação das penas alternativas ao traficante de drogas independentemente do seu perfil subjetivo e da quantidade da pena imposta O Supremo Tribunal Federal entretanto decidiu pela inconstitucionalidade das regras impeditivas da substituição da pena privativa de liberdade por ofensa ao princípio da individualização da pena Destarte admitese a aplicação de penas restritivas de direitos desde que presentes os requisitos elencados pelo art 44 do Código Penal19 Para conferir eficácia erga omnes à decisão do Supremo Tribunal Federal e amparado no art 52 inc X da Constituição Federal o Senado editou a Resolução nº 5 de 2012 com a seguinte redação É suspensa a execução da expressão vedada a conversão em penas restritivas de direitos do 4º do art 33 da Lei nº 11343 de 23 de agosto de 2006 declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal nos autos do Habeas Corpus nº 97256RS Estabelece o art 17 da Lei 113402006 Lei Maria da Penha É vedada a aplicação nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher de penas de cesta básica ou outras de prestação pecuniária bem como a substituição de pena que implique o pagamento isolado de multa A finalidade desse dispositivo foi eliminar o constrangimento então causado aos juízes membros do Ministério Público advogados e principalmente à mulher vítima dos crimes de ameaça ou lesão corporal de natureza leve que depois de intimidada ou covardemente agredida por seu cônjuge ou companheiro era exposta à humilhação pública de ver em audiência sua liberdade individual ou sua integridade física ser trocada por uma ou algumas poucas cestas básicas gerando o sentimento de revolta de impunidade e de injustiça A Lei Maria da Penha não vedou expressamente a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos em qualquer situação mas somente naquelas expressamente indicadas A jurisprudência contudo visando conferir maior proteção à mulher tem decidido pela proibição total de aplicação de penas restritivas de direitos nos crimes com violência doméstica ou familiar contra ela praticados Na visão do Supremo Tribunal Federal Não é possível a substituição de pena privativa de liberdade por restritiva de direitos ao condenado pela prática do crime de lesão corporal praticado em ambiente doméstico CP art 129 9º na redação dada pela Lei 113402006 A Turma destacou que a substituição da pena privativa de liberdade por sanções restritivas de direitos encontrarseia condicionada ao preenchimento dos requisitos objetivos e subjetivos elencados no art 44 do CP Art 44 As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade quando I aplicada pena privativa de liberdade não superior a quatro anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa ou qualquer que seja a pena aplicada se o crime for culposo II o réu não for reincidente em crime doloso III a culpabilidade os antecedentes a conduta social e a personalidade do condenado bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente Assim a execução do crime mediante o emprego de violência seria circunstância impeditiva do benefício Com advento da Lei 90991995 acentuada parcela da doutrina passara a sustentar que a vedação abstrata prevista no art 44 do CP ao menos em relação aos crimes de menor potencial ofensivo implicaria violação ao princípio da proporcionalidade ou seja não haveria razão para impedir a conversão da reprimenda a autores de delitos que poderiam em tese ser agraciados com a transação penal ou suspensão condicional do processo Essa linha argumentativa porém não teria espaço em relação ao crime de lesão corporal praticado em ambiente doméstico por duas razões a a pena máxima prevista para esse delito três anos a impedir a transação penal Lei 90991995 art 61 e b a existência de comando proibitivo previsto no art 41 da Lei Maria da Penha Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher independentemente da pena prevista não se aplica a Lei nº 9099 de 26 de setembro de 1995 Portanto o principal fundamento aplicação da Lei 90991995 daqueles que militariam pelo abrandamento do art 44 do CP deixaria de existir quando o cenário fosse de crime de lesão corporal no seio familiar Ademais não seria crível imaginar que a Lei Maria da Penha que teria vindo justamente tutelar com maior rigor a integridade física das mulheres tivesse autorizado a substituição da pena corporal mitigando a regra geral do CP que a proíbe Nesse contexto perderia sustento a alegação de que o art 17 da Lei 113402006 autorizaria a substituição de pena Art 17 É vedada a aplicação nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher de penas de cesta básica ou outras de prestação pecuniária bem como a substituição de pena que implique o pagamento isolado de multa21 A propósito o Supremo Tribunal Federal tem igualmente se pronunciado pela impossibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos em sede de contravenção penal cometida com violência doméstica ou familiar contra a mulher A Primeira Turma por maioria indeferiu a ordem de habeas corpus em que solicitada a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos em caso de contravenção penal envolvendo violência doméstica O paciente foi condenado por vias de fato nos termos do art 21 da Lei de Contravenções Penais LCP a vinte dias de prisão simples em regime aberto O juízo de 1º grau concedeu a suspensão condicional da pena sursis pelo prazo de dois anos A Turma julgou improcedente o pedido com base em interpretação extensiva do art 44 I do Código Penal no caso de violência doméstica e familiar contra a mulher em que a noção de crime abarcaria qualquer conduta delituosa inclusive contravenção penal Nesse sentido reconhecida a necessidade de combate à cultura de violência contra a mulher no Brasil o Colegiado considerou a equiparação da conduta do paciente à infração de menor potencial ofensivo incoerente com o entendimento da violência de gênero como grave violação dos direitos humanos22 Esse também é o entendimento consolidado na Súmula 588 do Superior Tribunal de Justiça A prática de crime ou contravenção penal contra a mulher com violência ou grave ameaça no ambiente doméstico impossibilita a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos Não se admite a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos no âmbito dos crimes militares com fundamento no art 44 do Código Penal em face da inaplicabilidade da analogia pois o Decretolei 10011969 Código Penal Militar conferiu tratamento diverso ao tema23 O juiz substitui a pena privativa de liberdade por restritiva de direitos na sentença condenatória Depois de aplicar a pena adequada com obediência ao critério trifásico o magistrado estabelece o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade e finalmente decide sobre o cabimento de pena restritiva de direitos CP art 59 IV Porém se na sentença condenatória o magistrado não tiver aplicado pena restritiva de direitos o art 180 da Lei 72101984 permite a substituição da pena privativa de liberdade não superior a 2 dois anos durante a execução penal desde que I o condenado a esteja cumprindo em regime aberto II tenha sido cumprido pelo menos 14 um quarto da pena e III os antecedentes e a personalidade do condenado indiquem ser a conversão recomendável Nos termos do art 44 2º 1ª parte do Código Penal na condenação igual ou inferior a 1 um ano a substituição pode ser feita por multa ou por uma pena restritiva de direitos É irrelevante seja o crime doloso ou culposo punido com reclusão ou detenção Basta o limite quantitativo pena aplicada igual ou inferior a um a b ano Por sua vez o art 60 2º do Código Penal não alterado pela Lei 97141998 que disciplinou a atual sistemática das penas restritivas de direitos dispõe A pena privativa de liberdade aplicada não superior a 6 seis meses pode ser substituída pela de multa observados os critérios dos incisos II e III do art 44 deste Código Com a análise conjunta dos dois dispositivos art 44 2º 1ª parte e art 60 2º ambos do Código Penal surge a seguinte indagação Para as condenações superiores a 6 seis meses mas iguais ou inferiores a 1 um ano é possível a substituição da pena privativa de liberdade por multa Há duas posições sobre o assunto é possível a substituição pois o art 44 2º 1ª parte mais recente e também mais favorável ao réu revogou o art 60 2º É o entendimento majoritário e não é possível a substituição Os dispositivos devem ser interpretados em conjunto Destarte nas condenações iguais ou inferiores a 6 seis meses a pena privativa de liberdade pode ser substituída por multa ou por uma restritiva de direitos enquanto nas superiores a 6 seis meses e iguais ou inferiores a 1 um ano a pena privativa de liberdade pode ser substituída exclusivamente por uma restritiva de direitos Entretanto se a condenação for superior a 1 um ano a pena privativa de liberdade pode ser substituída por uma pena restritiva de direitos e multa ou por duas restritivas de direitos CP art 44 2º in fine E quando forem aplicadas duas penas restritivas de direitos o condenado cumprirá simultaneamente as que forem compatíveis entre si e sucessivamente as demais CP art 69 2º Essa última disposição não se aplica aos crimes ambientais pois o art 7º inc I da Lei 96051998 contempla regra específica Consequentemente é possível a substituição da pena privativa de liberdade superior a 1 um ano desde que inferior a 4 quatro anos por uma única restritiva de direitos Nos termos do art 44 4º do Código Penal A pena restritiva de direitos convertese em privativa de liberdade quando ocorrer o descumprimento injustificado da restrição imposta No cálculo da pena privativa de liberdade a executar será deduzido o tempo cumprido da pena restritiva de direitos respeitado o saldo mínimo de 30 trinta dias de detenção ou reclusão O dispositivo legal fala em conversão mas deve ser lido como reconversão A pena privativa de liberdade foi convertida em restritiva de direitos mas por força do descumprimento injustificado da restrição imposta reconvertese ao estado original Essa é a interpretação correta É simples o fundamento legal a pena restritiva de direitos consiste em um benefício concedido ao réu Evitase a privação da liberdade em troca da restrição de direitos injustificadamente descumprida pelo condenado Se não há efetiva restrição de direitos necessário restabelecerse a pena privativa de liberdade Exemplos 1 Aplicase a pena de prestação de serviços à comunidade mas o condenado não se submete aos necessários serviços e 2 Substituise a pena privativa de liberdade por prestação pecuniária mas o agente não efetua o pagamento devido à vítima aos seus dependentes ou a entidade pública ou privada com destinação social Cuidase de incidente na execução penal na forma definida pelo art 181 da Lei 72101984 e exige obediência aos princípios do contraditório e da ampla defesa sob pena de nulidade24 A segunda parte do art 44 4º preceitua que no cálculo da pena privativa de liberdade a executar será deduzido o tempo cumprido da pena restritiva de direitos respeitado o saldo mínimo de 30 trinta dias de detenção ou reclusão Exemplo a pena privativa de liberdade foi substituída por prestação de serviços à comunidade por 1 um ano Depois de 10 meses em situação regular o condenado parou de prestar o serviço determinado em juízo ensejando a reconversão para pena privativa de liberdade Nesse caso 35111 faltará ao condenado o cumprimento de 2 dois meses de pena privativa de liberdade Mas deve ser respeitado o saldo mínimo de 30 trinta dias de detenção ou reclusão Destarte se no referido exemplo o condenado tiver prestado serviços à comunidade por 11 meses e 20 dias e faltando 10 dias para o seu integral cumprimento abandonar a pena restritiva de direitos será reconvertida para privativa de liberdade pelo prazo mínimo de 30 dias Em caso de prisão simples decorrente da condenação pela prática de contravenção penal convertida para pena restritiva de direitos não há exigência de período mínimo na hipótese de reconversão para privativa de liberdade Em relação às penas restritivas de direitos de prestação pecuniária e perda de bens e valores em que não existe período de tempo de cumprimento a ser abatido afigurase adequado descontarse da pena privativa de liberdade o percentual do pagamento já efetuado pelo condenado Exemplificativamente se a pena privativa de liberdade de 1 um ano foi substituída por prestação pecuniária no valor de R 100000 mil reais e o condenado pagou somente R 50000 quinhentos reais determinandose a reconversão restará o cumprimento de 6 seis meses da pena privativa de liberdade Reconversão da pena restritiva de direitos em privativa de liberdade e princípio da boafé objetiva A pena restritiva de direitos deve ser reconvertida para privativa de liberdade quando o réu depois de ter participado de todos os atos processuais e ciente da condenação muda seu domicílio sem prévia comunicação ao juízo competente Justificase essa opção com base no princípio da boafé objetiva que deve reger todas as relações jurídicas inclusive entre o agente e o Estado Não há nessa hipótese ofensa aos princípios constitucionais do devido processo legal e da ampla defesa uma vez que o acusado que acompanhou todo o processo de conhecimento tem plena ciência das consequências que lhe são prejudiciais se deixar de cumprir a pena restritiva de direitos aplicada25 35112 Impossibilidade de reconversão da pena restritiva de direitos em privativa de liberdade a pedido do réu Se o juiz ou Tribunal na sentença ou no acórdão substituiu a pena privativa de liberdade por uma ou duas penas restritivas de direitos não se admite a reconversão a pedido do acusado independentemente do regime prisional na hipótese de ele reputar menos gravoso o cumprimento da pena de reclusão ou de detenção Com efeito a aplicação da pena representa uma manifestação da soberania do Estado e sua escolha não pode se sujeitar aos interesses do condenado Na dicção do Superior Tribunal de Justiça Não é possível em razão de pedido feito por condenado que sequer iniciou o cumprimento da pena a reconversão de pena de prestação de serviços à comunidade e de prestação pecuniária restritivas de direitos em pena privativa de liberdade a ser cumprida em regime aberto O art 33 2º c do CP apenas estabelece que o condenado não reincidente cuja pena seja igual ou inferior a 4 quatro anos poderá desde o início cumprila em regime aberto O referido dispositivo legal não traça qualquer direito subjetivo do condenado quanto à escolha entre a sanção alternativa e a pena privativa de liberdade Ademais a escolha da pena e do regime prisional bem como do preenchimento dos requisitos do art 44 do CP inserese no campo da discricionariedade vinculada do magistrado Além disso a reconversão da pena restritiva de direitos imposta na sentença condenatória em pena privativa de liberdade depende do advento dos requisitos legais descumprimento das condições impostas pelo juiz da condenação Por isso não cabe ao condenado que sequer iniciou o cumprimento da pena escolher ou decidir a forma como pretende cumprir a condenação que lhe foi imposta Ou seja não é possível pleitear a forma que lhe parecer mais cômoda ou conveniente Nesse sentido oportuna a transcrição do seguinte entendimento doutrinário Reconversão fundada em lei e não em desejo do condenado a reconversão da pena restritiva de direitos imposta na sentença condenatória em pena privativa de liberdade para qualquer regime a depender do caso concreto depende do advento dos requisitos legais não bastando o mero intuito do sentenciado em cumprir pena na prática mais fácil Em tese o regime carcerário mesmo o aberto é mais prejudicial ao réu do que a pena restritiva de direitos sabese no entanto ser o regime aberto quando cumprido em prisão albergue domiciliar muito mais simples do que a prestação de serviços à comunidade até pelo fato de inexistir fiscalização Por isso alguns condenados manifestam preferência pelo regime aberto em lugar da restritiva de direitos A única possibilidade para tal ocorrer será pela reconversão formal vale dizer ordenase o cumprimento da restritiva e ele não segue a determinação Outra forma é inadmissível26 Para o art 44 5º do Código Penal Sobrevindo condenação a pena privativa de liberdade por outro crime o juiz da execução penal decidirá sobre a conversão podendo deixar de aplicála se for possível ao condenado cumprir a pena substitutiva anterior A condenação superveniente a pena privativa de liberdade pela prática de outro crime não impõe a reconversão da pena restritiva de direitos Exigese mais além de não ter sido concedido sursis é necessária a impossibilidade de cumprimento conjunto das penas privativa de liberdade e restritiva de direitos É o que acontece hipoteticamente em pena privativa de liberdade em regime fechado e prestação de serviços à comunidade27 Se por outro lado for possível o cumprimento conjunto de ambas as penas o juiz pode manter a pena restritiva de direitos Exemplo pena privativa de liberdade em qualquer regime prisional e prestação pecuniária Na linha da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça Consoante a orientação sedimentada nesta Corte Superior uma vez iniciada a execução as hipóteses de conversão das penas restritivas de direito em privativas de liberdade se restringem ao eventual descumprimento injustificado das obrigações impostas art 44 4º do CP cc o art 181 da LEP e à superveniente condenação à pena privativa de liberdade por outro crime que se revele incompatível com a primeira reprimenda aplicada art 44 5º do CP Não há que se cogitar de 35131 reconversão em pena reclusiva quando se revelar possível a execução simultânea ou sucessiva das medidas alternativas impostas ao réu Na hipótese tratandose de duas condenações subsequentes a penas privativas de liberdade a serem cumpridas em regime aberto ambas substituídas por penas restritivas de direito prestação de serviços à comunidade fazse plenamente possível a execução sucessiva das penas alternativas aplicadas28 A redação do art 44 5º do Código Penal evidencia a impossibilidade de reconversão obrigatória ou facultativa da pena restritiva de direitos em privativa de liberdade com a condenação à pena de multa ou em decorrência de contravenção penal em face da proibição da analogia in malam partem no Direito Penal Esta matéria encontrase disciplinada no art 147 da Lei de Execução Penal Dáse após o trânsito em julgado da sentença que aplicou a pena restritiva de direitos momento em que o juiz da execução de ofício ou a requerimento do Ministério Público promoverá a execução podendo para tanto requisitar quando necessário a colaboração de entidades públicas ou solicitála a particulares Penas restritivas de direitos e execução provisória O Supremo Tribunal Federal em pronunciamento anterior ao decidido pelo Plenário no julgamento do HC 126292SP constitucionalidade da execução provisória da pena privativa de liberdade já admitiu a execução provisória de penas restritivas de direitos nas hipóteses excepcionais em que seja comprovado o intuito meramente protelatório do réu ou do seu defensor no exercício do direito recursal buscando o retardamento do trânsito em julgado da condenação29 Essa posição nos parece correta Não há razão legítima para aceitarse a execução provisória da pena privativa de liberdade cujo cumprimento é mais gravoso ao acusado e negarse tal instituto nas penas restritivas de direitos O Superior Tribunal de Justiça contudo tem se posicionado pela impossibilidade de execução provisória no âmbito das penas restritivas de direitos seja pela falta de pronunciamento recente do Supremo Tribunal sobre o assunto seja pela interpretação literal do art 147 da Lei de Execução Penal Não é possível a execução da pena restritiva de direitos antes do trânsito em julgado da condenação A divergência tratada nos embargos envolve a possibilidade de se executar provisoriamente penas restritivas de direito O acórdão embargado da Quinta Turma decidiu que nos termos do art 147 da Lei de Execução Penal as penas restritivas de direitos só podem ser executadas após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória A tese paradigma foi apresentada com base no entendimento firmado no AgRg no REsp 1627367SP segundo o qual É cabível a determinação de execução provisória de pena privativa de liberdade convertida em restritivas de direitos Sobre o tema o STF já se manifestara expressamente a respeito da impossibilidade da execução das reprimendas restritivas de direitos antes do trânsito em julgado por força na norma prevista no art 147 da LEP Recentemente o Supremo Tribunal Federal por meio do HC n 126292SP não considerou a possibilidade de se executar provisoriamente a pena restritiva de direitos mas restringiuse à reprimenda privativa de liberdade na medida em que dispôs tão somente sobre a prisão do acusado condenado em segundo grau antes do trânsito em julgado Em vista da ausência de apreciação pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal quanto à possibilidade de executar a reprimenda restritiva de direitos antes do trânsito em julgado da condenação somado ao texto expresso do art 147 da Lei de Execução Penal deve prevalecer o entendimento firmado no acórdão embargado30 A Portaria 4952016 do Ministro de Estado da Justiça instituiu no âmbito do seu Ministério a Política Nacional de Alternativas Penais com o objetivo de desenvolver ações projetos e estratégias voltadas ao enfrentamento do encarceramento em massa e à ampliação da aplicação de alternativas penais à 35151 35152 prisão com enfoque restaurativo em substituição à privação de liberdade Seu art 1º parágrafo único inc I preceitua que as alternativas penais abrangem as penas restritivas de direitos Classificação As penas restritivas de direitos podem ser genéricas ou específicas Genéricas ou gerais são as que substituem as penas privativas de liberdade em qualquer crime desde que presentes os requisitos legais Nessa relação se incluem a prestação pecuniária a perda de bens e valores a prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas a proibição de frequentar determinados lugares e a limitação de fim de semana Específicas ou especiais de seu turno são as penas restritivas de direitos que substituem as penas privativas de liberdade aplicadas como decorrência da prática de crimes determinados Cuidamse das interdições temporárias de direitos salvo nas modalidades proibição de frequentar determinados lugares e proibição de inscreverse em concurso avaliação ou exame públicos CP art 47 incs IV e V Prestação pecuniária Cuidase de pena restritiva de direitos criada pela Lei 97141998 disciplinada pelo art 45 1º e 2º do Código Penal31 Consiste no pagamento em dinheiro à vítima a seus dependentes ou a entidade pública ou privada com destinação social de importância fixada pelo juiz não inferior a 1 um salário mínimo nem superior a 360 trezentos e sessenta salários mínimos CP art 45 1º 1ª parte Para identificação dos dependentes deve ser utilizada analogicamente a relação contida no art 16 da Lei 82131991 I o cônjuge a companheira o companheiro e o filho não emancipado de qualquer condição menor de 21 vinte e um anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz assim declarado judicialmente II os pais e III o irmão não emancipado de qualquer condição menor de 21 vinte e um anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz assim declarado judicialmente Qualquer entidade pública pode ser beneficiária do valor correspondente à prestação pecuniária mas em se tratando de entidade privada exigese que tenha destinação social Importante destacar que o Poder Judiciário e o Ministério Público não podem ser favorecidos por essa pena uma vez que não são entidades embora apresentem destinação social O dispositivo legal contém uma relação preferencial Assim os dependentes somente serão destinatários na ausência da vítima E as entidades na falta da vítima e de seus dependentes Em se tratando de sanção penal a prestação pecuniária se reveste de caráter unilateral impositivo e cogente razão pela qual independe de aceitação da pessoa por ela favorecida O juiz aplica essa pena sem prévia oitiva da vítima de seus dependentes ou de entidade pública ou privada com destinação social Não pode ser inferior a 1 um salário mínimo nem superior a 360 trezentos e sessenta salários mínimos E o valor pago será deduzido do montante de eventual condenação em ação de reparação civil se coincidentes os beneficiários CP art 45 1º in fine Essa última parte revela que nada obstante seja pena restritiva de direitos a prestação pecuniária ostenta ainda que indiretamente caráter de indenização civil antecipada impedindo o enriquecimento ilícito do ofendido ou de seus dependentes Frisese porém que desaparece qualquer aspecto civil quando o valor fixado na sentença condenatória for destinado em sua totalidade a alguma entidade pública ou privada com destinação social pois são diversos os beneficiários Nesse contexto em que pese a omissão legislativa é possível estender a dedução do valor pago a título de prestação pecuniária em relação às conciliações homologadas em juízo em ações cíveis indenizatórias qualquer que seja o rito processual Também será cabível esse desconto no campo dos Juizados Especiais Criminais tanto em sede de composição dos danos civis ou de transação penal Lei 90991995 arts 74 e 76 Anotese que no campo dos Juizados Especiais Criminais esse abatimento somente poderá ocorrer em ações penais públicas incondicionadas pois a composição civil redunda em extinção da punibilidade nas ações penais privadas e nas ações penais públicas condicionadas à representação do ofendido ou de quem o represente inexistindo por corolário sanção penal de qualquer espécie32 A fórmula legal abre espaço para verdadeiras situações de despenalização É o que se dá quando a sentença penal determina a prestação pecuniária em favor da vítima de valor igual ou inferior ao posteriormente estipulado em ação de reparação civil Como tal montante deve ser deduzido da condenação civil o condenado nada mais fez do que reparar o dano causado pelo crime A conduta criminosa foi portanto despenalizada O Código Penal impõe seja efetuado o pagamento em dinheiro Mas se houver aceitação do beneficiário a prestação pecuniária pode consistir em prestação de outra natureza CP art 45 2º Essa fórmula prestação de outra natureza é excessivamente ampla dando margem à criação no caso concreto de penas indeterminadas e não previstas em lei É fundamental pois a razoabilidade e também a coerência por parte do juiz da execução penal pois é nessa fase que será buscada a anuência do beneficiário em caso de impossibilidade do pagamento em moeda corrente Na prática tem sido admitido o pagamento em pedras preciosas obras de arte imóveis automóveis títulos mobiliários e bens móveis em geral A Exposição de Motivos da Lei 97141998 fala inclusive em entrega de cestas básicas e fornecimento de mão de obra Exemplo um pedreiro é condenado a pagar à vítima do crime por ele praticado a quantia de RS 200000 dois mil reais em dinheiro Diante de sua absoluta impossibilidade financeira e se a vítima concordar o juiz pode substituir o pagamento em dinheiro por 100 horas de mão de obra para reforma da casa do ofendido levando em conta o valor de R 2000 vinte reais por hora de trabalho de um pedreiro A prestação pecuniária é uma pena restritiva de direitos Logo ao contrário do que ocorre com a pena de multa se o condenado solvente não efetuar o pagamento devido frustrando sua execução deve ser reconvertida em pena privativa de liberdade com fundamento no art 44 4º 1ª parte do Código Penal33 Essa é a medida adequada não se podendo falar na imposição de alguma medida coercitiva arresto de bens por exemplo para assegurar seu cumprimento Como já decidido pelo Superior Tribunal de Justiça Havendo expressa previsão legal de reconversão da pena restritiva de direitos em privativa de liberdade não há falar em arresto para o cumprimento forçado da pena substitutiva De início tratandose de pena substitutiva fixada com base no artigo 44 do Código Penal temse que o eventual descumprimento da obrigação dá ensejo à reconversão da pena restritiva de direitos em privativa de liberdade por força do comando expresso da norma do parágrafo 4º do referido artigo No cálculo da pena privativa de liberdade a executar será deduzido o tempo cumprido da pena restritiva de direitos respeitado o saldo mínimo de trinta dias de detenção ou reclusão Ressaltase que a execução das penas restritivas assim como de modo geral de todas as alternativas à prisão demanda um mecanismo coercitivo capaz de assegurar o seu cumprimento e este só pode ser a pena privativa de liberdade Assim não há falar em arresto para o cumprimento forçado da pena substitutiva já que a reconversão da pena é medida que por si só atribui conectividade à pena restritiva de direito34 Além disso a fiscalização da sua execução deve ser promovida pelo Ministério Público pois não se pode delegar essa tarefa eminentemente pública à vítima a seus dependentes ou a entidade pública ou privada com destinação social Finalmente pode ser formulada a seguinte indagação Se a reparação do dano é efeito genérico e automático da condenação CP art 91 I qual a essência da pena de prestação pecuniária que geralmente busca a indenização da vítima o que se acentua ao dizer o art 45 2º que o valor pago será deduzido do montante de eventual condenação em ação de reparação civil se coincidentes os beneficiários A prestação pecuniária é mais favorável e vantajosa ao ofendido De fato 35153 na obrigação de reparar o dano a vítima ou seus herdeiros têm um título executivo mas sem liquidez exigindose sua prévia liquidação no juízo cível Por sua vez na pena de prestação pecuniária o magistrado fixa o valor do pagamento a ser formulado à vítima ou aos seus dependentes que são dispensados da liquidação e do ajuizamento de ação executiva no juízo cível Em que pese o comum perfil pecuniário essas espécies de pena não se confundem35 Inicialmente a prestação pecuniária constituise em pena restritiva de direitos regulada pelos arts 44 e 45 1º e 2º do Código Penal ao passo que a multa é pena pecuniária propriamente dita e segue a sistemática dos arts 49 a 52 do Código Penal Se não bastasse na prestação pecuniária o dinheiro ou prestação de outra natureza é destinado à vítima do crime aos seus dependentes ou a entidade pública ou privada com destinação social e seu montante não pode ser inferior a 1 um salário mínimo nem superior a 360 trezentos e sessenta salários mínimos Na pena de multa por sua vez o valor arrecadado é encaminhado ao Fundo Penitenciário e calculase entre 10 dez e 360 trezentos e sessenta diasmulta fixandose cada um deles entre 130 um trigésimo do salário mínimo até 5 cinco salários mínimos Finalmente na prestação pecuniária o valor pago será deduzido do montante de eventual condenação em ação de reparação civil se coincidentes os beneficiários o que não ocorre na pena de multa Perda de bens e valores Cuidase de pena restritiva de direitos que consiste na retirada de bens e valores integrantes do patrimônio lícito do condenado transferindoos ao Fundo Penitenciário Nacional Seu valor terá como teto o que for maior o montante do prejuízo causado ou do proveito obtido pelo agente ou por terceiro em consequência da prática do crime CP art 45 3º36 Notase de início a possibilidade de aplicação dessa pena exclusivamente no tocante a crimes pois o seu valor leva em conta o prejuízo causado ao ofendido ou a vantagem auferida pelo condenado ou por terceiro em decorrência do seu cometimento Não pode ser utilizada destarte para contravenções penais Além disso exigese tenha o crime produzido algum tipo de prejuízo à vítima ou ainda proporcionado vantagem patrimonial ao responsável pelo crime ou a terceira pessoa Nessa linha de raciocínio exemplificativamente seria uma pena adequada a um crime de furto mas incabível para crime de participação na direção de veículo automotor em competição não autorizada Lei 95031997 Código de Trânsito Brasileiro art 308 Em face do caráter pessoal da pena princípio da personalidade da intransmissibilidade ou da intranscendência previsto no art 5º XLV da Constituição Federal a perda de bens e valores não pode ultrapassar a pessoa do condenado Portanto é vedado atingir o patrimônio de terceiros Essa pena possui nítido conteúdo confiscatório possível e legítimo pois foi expressamente admitida pelo art 5º XLVI b da Constituição Federal Nada obstante a Exposição de Motivos da Lei 97141998 sustenta o contrário alegando ser a prática de um crime motivo justo e suficiente para a perda de bens e valores Não deixa porém de ser confisco definido como a retirada dos bens do patrimônio lícito de alguém sem qualquer tipo de indenização O dispositivo legal indica o limite máximo dessa pena sempre o que for maior o prejuízo causado pelo crime ou o proveito obtido pelo agente ou por terceiro em consequência da prática do crime O proveito do crime engloba o bem auferido pela conduta criminosa seja diretamente exemplo o relógio de ouro furtado seja mediante especificação exemplo a joia produzida com o derretimento do relógio de ouro e também os bens adquiridos pelo agente como consequência da alienação do produto do crime exemplo a bicicleta comprada com o dinheiro resultante da venda do relógio 35154 A perda de bens e valores e o confisco não se confundem Aquela é uma pena restritiva de direitos CP art 45 3º ao passo que este é efeito genérico e automático da condenação CP art 91 II Podem ser impostos cumulativamente mas as diferenças são nítidas O confisco incide sobre os instrumentos ou sobre o produto do crime de cunho ilícito enquanto a perda de bens e valores recai sobre o patrimônio lícito do condenado Como bem define Damásio E de Jesus Não devemos confundir a pena de perda de bens e valores como pena CP art 43 II e o confisco CP art 91 Este constitui efeito da condenação e atinge os instrumentos e o produto do crime instrumenta e producta sceleris Na pena alternativa os bens e valores são de natureza e origem lícitas37 Prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas Cuidase de pena restritiva de direitos consistente na atribuição de tarefas gratuitas ao condenado em entidades assistenciais hospitais escolas orfanatos e outros estabelecimentos congêneres em programas comunitários ou estatais CP art 46 1º e 2º A expressão entidades públicas deve ser interpretada em sentido amplo para englobar tanto as públicas em sentido estrito Administração Pública direta ou indireta como também as privadas com destinação social Essa pena somente é aplicável às condenações superiores a 6 seis meses de privação da liberdade CP art 46 caput Nada obstante seja uma pena restritiva de direitos possui indiretamente caráter de privação da liberdade já que o condenado deve ficar confinado na entidade destinatária dos serviços durante algumas horas da semana para desempenho das atividades impostas pelo juízo da execução Nesse período portanto assemelhase à pena privativa da liberdade embora com ela não se confunda pois o condenado não é retirado do convívio social As tarefas serão atribuídas conforme as aptidões do condenado CP art 46 3º Vedase assim atividade cruel ociosa vexatória ou humilhante que em nada se compatibilizaria com as finalidades da pena Exemplo seria inadequado e ilegal determinar a um advogado condenado pela prática de desacato contra um Delegado de Polícia a prestação de serviços de limpeza das salas da Delegacia de Polícia em que trabalha a pessoa por ele atingida pela conduta criminosa Da mesma forma não é possível a imposição de prestação de serviços em igreja ou qualquer tipo de templo religioso por não se tratar de serviço à comunidade além de ofender o caráter laico do Estado CF art 19 I As tarefas devem ser cumpridas à razão de 1 uma hora de tarefa por dia de condenação fixadas de modo a não prejudicar a jornada normal de trabalho CP art 46 3º Adotouse nesse ponto o sistema da horatarefa Essa opção foi necessária para permitir a regular execução da pena já que o cumprimento em dias seria de difícil ou até mesmo impossível fiscalização Mas apresenta contradição com a regra estipulada pelo art 10 in fine do Código Penal pela qual se contam os dias os meses e os anos pelo calendário comum isto é sem conversão dos dias em horas e também com o art 11 do Código Penal pelo qual devem ser desprezadas nas penas restritivas de direitos as frações de dias ou seja as horas Entretanto se a pena substituída for superior a 1 um ano é facultado ao condenado cumprir a pena alternativa em menor tempo nunca inferior à metade da pena privativa de liberdade fixada CP art 46 4º Essa antecipação da finalização da pena é faculdade do condenado não podendo ser imposta pelo juiz Além disso somente é admissível na hipótese de pena privativa de liberdade substituída por prestação de serviços superior a 1 um ano Mas para não transformála em pena meramente simbólica e também para não prejudicar a jornada normal de trabalho do condenado estabeleceu o dispositivo legal que a antecipação nunca pode ocorrer em período inferior à metade da pena privativa de liberdade fixada Vejamos um exemplo o réu é condenado a 2 dois anos de reclusão pela prática de furto CP art 155 caput Presentes os requisitos legais o juiz substitui a pena privativa de liberdade por restritiva de direitos consistente em prestação de serviços à comunidade O condenado sequioso por cumprir brevemente a sanção penal decide trabalhar mais de uma hora por dia Se trabalhar duas horas por dia cumprirá integralmente a pena em 1 um ano Entretanto se trabalhar mais de duas horas por dia ainda assim não poderá reduzir a pena para aquém de 1 um ano pois esse tempo representa a metade da pena privativa de liberdade fixada As tarefas executadas como prestação de serviços à comunidade não serão remuneradas LEP art 30 e também não geram vínculo empregatício com o Estado LEP art 28 2º A execução da pena de prestação de serviços à comunidade tem início a partir da data do primeiro comparecimento do condenado à entidade beneficiada LEP art 149 2º Cabe ao juiz da execução nos termos do art 149 da Lei de Execução Penal I designar a entidade ou programa comunitário ou estatal devidamente credenciado ou convencionado junto ao qual o condenado deverá trabalhar gratuitamente de acordo com as suas aptidões II determinar a intimação do condenado cientificandoo da entidade dias e horários em que deverá cumprir a pena e III alterar a forma de execução a fim de ajustála às modificações ocorridas na jornada de trabalho Finalmente a entidade beneficiada com a prestação de serviços encaminhará mensalmente ao juiz da execução relatório circunstanciado das atividades do condenado bem como a qualquer tempo comunicação sobre ausência ou falta disciplinar LEP art 150 Não é correto alegar a inconstitucionalidade da pena de prestação de serviços à comunidade ou entidades públicas sob o fundamento de constituirse em inaceitável pena de trabalhos forçados CF art 5º XLVII c por dois motivos fundamentais Em primeiro lugar a prestação de serviços tem amparo constitucional a b c fruto do Poder Constituinte Originário art 5º XLVI d afastando assim a argumentação de inconstitucionalidade Como se sabe não há norma constitucional inconstitucional quando instituída originariamente pelo texto constitucional Além disso essa pena restritiva de direitos representa um benefício ao condenado que pode ou não desempenhar as tarefas atribuídas optando pela pena substitutiva ou então pela reconversão à pena privativa de liberdade Em relação à pessoa física dispõe o art 9º da Lei 96051998 que a prestação de serviços à comunidade consiste na atribuição ao condenado de tarefas gratuitas junto a parques e jardins públicos e unidades de conservação e no caso de dano da coisa particular pública ou tombada na restauração desta se possível Já a pessoa jurídica condenada por crime ambiental se sujeita às seguintes tarefas como prestação de serviços à comunidade a custeio de programas e de projetos ambientais b execução de obras de recuperação de áreas degradadas c manutenção de espaços públicos e d contribuições a entidades ambientais ou culturais públicas Lei 96051998 art 23 Se na prática não existir local adequado para cumprimento dessa pena restritiva de direitos há três propostas para a solução do problema a pena deve ser considerada cumprida desde que tenha decorrido o tempo a ela correspondente e o condenado estava à disposição do Estado deve aguardarse o oferecimento de local adequado com a superveniência do início do cumprimento da pena ou então com o reconhecimento da prescrição e o juízo da execução deve buscar outro local adequado para o cumprimento da pena restritiva de direitos Nesse sentido dispõe o art 148 da Lei de Execução Penal Em qualquer fase da execução poderá o juiz motivadamente alterar a forma de cumprimento das penas de prestação de serviços à comunidade e de limitação de fim de semana ajustandoas às condições pessoais do condenado e às características do estabelecimento da entidade ou do programa comunitário ou estatal É o entendimento do Superior Tribunal de Justiça A impossibilidade de cumprimento pelo sentenciado de pena restritiva de direitos não possibilita sua extinção por absoluta falta de previsão legal para tanto É certo que o art 148 da Lei de Execução Penal permite a alteração da forma de cumprimento das penas restritivas de direitos mas não simplesmente a extinção da pena por reputar suficiente o que já foi cumprido pelo apenado Tal medida vai de encontro ao próprio fim ressocializador da reprimenda38 Nos crimes definidos nos arts 302 a 312 da Lei 95031997 Código de Trânsito Brasileiro se o juiz substituir a pena privativa de liberdade por restritiva de direitos deverá obrigatoriamente aplicar a prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas em uma das seguintes atividades I trabalho aos fins de semana em equipes de resgate dos corpos de bombeiros e em outras unidades móveis especializadas no atendimento a vítimas de trânsito II trabalho em unidades de prontosocorro de hospitais da rede pública que recebem vítimas de acidente de trânsito e politraumatizados III trabalho em clínicas ou instituições especializadas na recuperação de acidentados de trânsito ou IV outras atividades relacionadas ao resgate atendimento e recuperação de vítimas de acidentes de trânsito Essa determinação encontrase prevista no art 312A do Código de Trânsito Brasileiro e foi criada pela Lei 132812016 com o inequívoco 35155 propósito de além de proporcionar a justa punição do infrator e disponibilizar mão de obra para auxiliar as vítimas de acidentes de trânsito conscientizar os condutores de veículos automotores da gravidade dos males provocados pelos seus comportamentos ilícitos especialmente aqueles que oferecem risco de morte às vítimas ou lhes causam graves problemas de saúde Interdição temporária de direitos Essas penas restritivas de direitos estão elencadas pelo art 47 do Código Penal I proibição do exercício de cargo função ou atividade pública bem como de mandato eletivo II proibição do exercício de profissão atividade ou ofício que dependam de habilitação especial de licença ou autorização do poder público III suspensão de autorização ou habilitação para dirigir veículo IV proibição de frequentar determinados lugares e V proibição de inscreverse em concurso avaliação ou exame públicos As duas primeiras e também a última são alvos de críticas fundadas principalmente na contrariedade às finalidades da pena especialmente em relação à prevenção especial ressocialização do criminoso uma vez que não existe vantagem nenhuma em impedir o condenado de desempenhar uma profissão ou atividade lícita Deve sim ser punido mas não proibido de exercer profissões ou atividades por si só legais e até mesmo fomentadas pelo Estado Vejamos cada uma delas Essa pena restritiva de direitos é específica uma vez que somente é aplicável ao crime cometido no exercício de profissão atividade ofício cargo ou função sempre que houver violação dos deveres que lhes são inerentes CP art 56 Diz respeito à vida pública do condenado por relacionarse a cargo função ou atividade pública bem como a mandato eletivo E nada obstante essa pena tenha como propósito englobar as condutas praticadas por funcionários públicos em consonância com o conceito previsto no art 327 do Código Penal não é imprescindível tenha sido praticado um crime contra a Administração Pública podendo ser um crime comum desde que com violação dos deveres funcionais do agente A interdição temporária de direitos engloba tanto a suspensão daquele que exerce cargo função ou atividade pública bem como mandato eletivo ao tempo da condenação como também daquele que deixou de exercer tais misteres voluntariamente ou não posteriormente à prática do crime No tocante à proibição do exercício de mandato eletivo de deputados federais e senadores parte da doutrina sustenta ser essa pena inconstitucional pois tais parlamentares somente podem ser proibidos de exercer o mandato na forma prevista na Constituição Federal Com efeito o art 55 VI e 2º previu somente a perda do mandato e não a interdição temporária39 Com o integral cumprimento da pena encerrase a proibição do exercício do direito Essa pena contudo não se confunde com o efeito da condenação relativo à perda de cargo função pública ou mandato eletivo definido pelo art 92 I do Código Penal cabível a quando aplicada pena privativa de liberdade por tempo igual ou superior a um ano nos crimes praticados com abuso de poder ou violação de dever para com a administração pública e b quando for aplicada pena privativa de liberdade por tempo superior a 4 quatro anos nos demais casos Cuidase também de pena restritiva de direitos específica aplicável exclusivamente ao crime cometido no exercício de profissão atividade ofício cargo ou função sempre que houver violação dos deveres que lhes são inerentes CP art 56 Referese contudo à esfera privada de atuação do condenado embora dependente de habilitação especial de licença ou autorização do poder público Profissão é o trabalho remunerado e com índole intelectual dominante tais como a de médico dentista advogado e engenheiro40 Ofício é o trabalho remunerado predominantemente mecânico ou manual Atividade por sua vez tem natureza residual qualquer outra forma de labor remunerada ou não É necessário que dependam frisese de habilitação especial de licença ou autorização do poder público sob pena de ser impossível a ingerência do Estado para exigir a interdição temporária do direito O condenado é impedido durante o tempo da pena de desempenhar a profissão ofício ou atividade Essa pena aplicase somente aos crimes culposos de trânsito CP art 57 Mas como tais crimes encontramse atualmente previstos em sua maioria pelo Código de Trânsito Brasileiro Lei 95031997 esse dispositivo foi por ele tacitamente revogado Para elucidar o raciocínio razoável diferenciar sob a ótica do Código de Trânsito Brasileiro autorização permissão e habilitação para dirigir veículos A autorização é exigida para condução de ciclomotores CTB art 141 Por sua vez a permissão se destina a candidatos aprovados nos exames de habilitação com validade de um ano CTB art 148 2º E finalmente a habilitação diz respeito a condutores definitivamente aprovados nos exames e com licença para dirigir veículos automotores isto é portadores de Carteira Nacional de Habilitação CTB art 148 3º Extraise desde já uma primeira conclusão o art 47 III do Código Penal fala apenas em autorização ou habilitação Logo tudo o que se relaciona com a permissão deve ser disciplinado pelo Código de Trânsito Brasileiro E quanto à habilitação os arts 302 e 303 do Código de Trânsito Brasileiro impõem a cominação cumulativa da pena privativa de liberdade com a pena de suspensão ou proibição de obter permissão ou habilitação para dirigir veículo automotor Destarte por se tratar de lei posterior e especial a suspensão da habilitação aos crimes culposos de trânsito também é tratada pelo Código de Trânsito Brasileiro Além disso seria impossível e destituída de qualquer finalidade a substituição da pena privativa de liberdade por essa pena restritiva de direitos resultando em duas penas restritivas de igual natureza Resta à incidência do art 47 III do Código Penal exclusivamente portanto a suspensão de autorização para dirigir veículo autorização esta destinada exclusivamente a ciclomotores CTB art 141 Portanto o juiz somente pode aplicar com fulcro no art 47 III do Código Penal a pena restritiva de direitos de suspensão de autorização para dirigir ciclomotores relativamente a crimes culposos de trânsito com ele praticados E como ciclomotor na definição do Anexo I do Código de Trânsito Brasileiro é o veículo de duas ou três rodas provido de um motor de combustão interna cuja cilindrada não exceda a cinquenta centímetros cúbicos 305 polegadas cúbicas e cuja velocidade máxima de fabricação não exceda a cinquenta quilômetros por hora essa pena foi praticamente abolida pois sua aplicação é de quase impossível ocorrência concreta Por último não se deve confundir essa espécie de pena atinente à suspensão de autorização e aos crimes culposos com o efeito da condenação previsto no art 92 III do Código Penal inabilitação para dirigir veículo quando utilizado como meio para a prática de crime doloso Essa pena embora definida pelo art 47 IV do Código Penal como restritiva de direitos é na verdade uma restrição da liberdade pois o condenado é atingido diretamente em sua liberdade de locomoção Além disso a proibição de frequentar determinados lugares é também uma condição do sursis especial CP art 78 2º a Cuidase de pena praticamente inócua de difícil e inexistente fiscalização O legislador poderia ter delimitado o seu âmbito de incidência indicando expressamente os lugares em que o condenado fica proibido de frequentar Por exemplo retornar ao local do crime comparecer ao local de trabalho ou à residência da vítima e de seus familiares etc Essa precaução reduziria também a possibilidade inaceitável de o juiz violar direitos do condenado proibindoo de frequentar locais lícitos e sem vinculação com o crime Essa pena é constitucional Não caracteriza banimento41 e não ofende o princípio da reserva legal a proibição de frequentar determinados lugares Como informam Sérgio Salomão Shecaira e Alceu Corrêa Junior Com efeito tratase de medida penal que corresponde aos anseios do Direito Penal liberal e democrático na medida em que representa uma alternativa à pena privativa de liberdade42 Esta modalidade de pena restritiva consistente em interdição temporária de direitos foi instituída pela Lei 125502011 a qual autorizou o Poder Executivo a criar a empresa pública unipessoal denominada Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares EBSERH Embora o diploma normativo não apresente vinculação com o Direito Penal o legislador se aproveitou de projeto de lei que estava em trâmite adiantado no Congresso Nacional para inserir o inc V no art 47 do Código Penal visando impedir a inscrição de condenados em concursos avaliações ou exames públicos durante o cumprimento da sanção penal Nada obstante esta pena restritiva de direitos guarde estreita relação com o crime tipificado no art 311A do Código Penal fraudes em certames de interesse público43 igualmente inserido pela Lei 125502011 sua aplicação a critério do magistrado é possível aos condenados em geral se presentes os requisitos elencados pelo art 44 do Código Penal Com efeito a condenação por diversos delitos recomenda a vedação do acesso às funções e cargos públicos pela ausência de lisura e de idoneidade moral do agente a exemplo do que se dá no estelionato nos crimes contra a Administração Pública nos crimes da Lei de Licitações Lei 86661993 entre tantos outros Tratase portanto de pena restritiva de direitos genérica pois seu raio de 35156 incidência não se limita ao crime definido no art 311A do Código Penal Limitação de fim de semana Essa modalidade de pena originouse na Alemanha e está regulada no Brasil pelo art 48 do Código Penal Art 48 A limitação de fim de semana consiste na obrigação de permanecer aos sábados e domingos por 5 cinco horas diárias em casa de albergado ou estabelecimento adequado Parágrafo único Durante a permanência poderão ser ministrados ao condenado cursos e palestras ou atribuídas atividades educativas É pouco aplicada uma vez que praticamente não existem casas de albergado Na linha do raciocínio do Superior Tribunal de Justiça Se a pena de limitação de fim de semana deve ser efetivada em Casa de Albergado não pode o paciente na falta do referido estabelecimento ser submetido a cumprimento da reprimenda em presídio situação mais gravosa do que a estabelecida pelo decreto condenatório44 Em consonância com as regras definidas pelos arts 94 e 95 da Lei de Execução Penal o prédio da casa de albergado deverá situarse em centro urbano separado dos demais estabelecimentos e caracterizarse pela ausência de obstáculos físicos contra a fuga Deverá conter além dos aposentos para acomodar os presos local adequado para cursos e palestras e instalações para os serviços de fiscalização e orientação dos condenados Cabe ao juiz da execução determinar a intimação do condenado cientificandoo do local dias e horário em que deverá cumprir a pena a qual terá início a partir da data do primeiro comparecimento LEP art 151 e parágrafo único E mensalmente o estabelecimento designado encaminhará ao juiz da execução relatório e comunicará a qualquer tempo a ausência ou falta disciplinar do condenado LEP art 153 1 2 3 4 5 6 7 8 A pena privativa de liberdade deveria se restringir às hipóteses de reconhecida necessidade tendo em vista seu custo elevado as consequências deletérias para infratores primários ocasionais ou responsáveis por delitos de pequena significação STF HC 123108MG rel Min Roberto Barroso Plenário j 03082015 noticiado no Informativo 793 Nesse sentido BITENCOURT Cezar Roberto Falência da pena de prisão causas e alternativas 2 ed São Paulo Saraiva 2001 p 157 HC 110078SC rel Min Ayres Britto 2ª Turma j 29112011 As penas restritivas de direitos também assumem um importante papel para os demais membros da sociedade assim destacado pelo Supremo Tribunal Federal Registrou que em pequenas comunidades a substituição da pena privativa de liberdade por medida restritiva de direito a permitir que as pessoas vejam onde está sendo cumprida tem valor simbólico e pedagógico maior do que a fixação do regime semiaberto ou aberto HC 137217MG rel Min Marco Aurélio red p ac Min Alexandre de Moraes 1ª Turma j 28082018 noticiado no Informativo 913 Outra exceção à autonomia das penas restritivas de direitos é encontrada no art 78 da Lei 80781990 Código de Defesa do Consumidor Art 78 Além das penas privativas de liberdade e de multa podem ser impostas cumulativa ou alternadamente observado o disposto nos arts 44 a 47 do Código Penal I a interdição temporária de direitos II a publicação em órgãos de comunicação de grande circulação ou audiência às expensas do condenado de notícia sobre os fatos e a condenação III a prestação de serviços à comunidade STF HC 117719RN rel Min Teori Zavascki 2ª Turma j 24062014 e STJ AgRg no REsp 1365534SP rel Min Nefi Cordeiro 6ª Turma j 05082014 STF RHC 100657MS rel Min Ellen Gracie 2ª Turma j 14092010 e STJ HC 108930RJ rel Min Napoleão Maia Nunes Filho 5ª Turma j 13042010 HC 66402GO rel Min Hamilton Carvalhido 6ª Turma j 06122007 noticiado no Informativo 341 MIRABETE Julio Fabbrini Manual de direito penal Parte geral 24 ed São Paulo Atlas 2007 v 1 p 283 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 GRECO Rogério Curso de direito penal Parte geral 10 ed Rio de Janeiro Impetus 2008 p 533 É também o entendimento do STJ HC 180353MS rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 16112010 noticiado no Informativo 456 STJ RHC 30680SP rel Min Og Fernandes 6ª Turma j 06092011 STJ HC 289110RJ rel Min Jorge Mussi 5ª Turma j 18062014 Esse fenômeno se repetiu na lesão corporal culposa na direção de veículo automotor quando o agente conduz o veículo com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência e se do crime resultar lesão corporal de natureza grave ou gravíssima punido com reclusão de dois a cinco anos Lei 95031997 Código de Trânsito Brasileiro art 303 2º Outro propósito no campo penal foi o afastamento do regime aberto e a possibilidade do regime fechado para início de cumprimento da pena privativa de liberdade CP art 33 caput e 2º c HC 94477PR rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 06092011 noticiado no Informativo 639 AgRg nos EDcl no AREsp 279042SP rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 24092013 É também o entendimento do STF HC 94990MG rel Min Ricardo Lewandowski 1ª Turma j 021220008 noticiado no Informativo 531 STJ AgRg no HC 202056MG rel Min Gurgel de Faria 5ª Turma j 16092014 Há de ser ressaltada entretanto a ausência de norma específica na Lei 80721990 Lei dos Crimes Hediondos proibitiva de penas restritivas de direitos para delitos de natureza hedionda HC 94477PR rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 06092011 noticiado no Informativo 639 HC 111840ES rel Min Dias Toffoli Plenário j 27062012 noticiado no Informativo 672 HC 97256RS rel Min Ayres Britto Plenário j 01092010 noticiado no Informativo 598 E também HC 129714SP rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 11102016 noticiado no Informativo 843 Súmula 600 do Superior Tribunal de Justiça Para configuração da violência doméstica e familiar prevista na Lei 113402006 Lei Maria da 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 31 32 33 Penha não se exige coabitação entre autor e vítima HC 129446MS rel Min Teori Zavascki 2ª Turma j 20102015 noticiado no Informativo 804 HC 137888MS rel Min Rosa Weber 1ª Turma j 31102017 noticiado no Informativo 884 STF ARE 779938MG AgR rel Min Luiz Fux 1ª Turma j 05082014 No STJ HC 286802RJ rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 23102014 noticiado no Informativo 551 É imprescindível a prévia intimação pessoal do reeducando que descumpre pena restritiva de direitos para que se proceda à conversão da pena alternativa em privativa de liberdade Isso porque se deve dar oportunidade para que o reeducando esclareça as razões do descumprimento em homenagem aos princípios do contraditório e da ampla defesa STJ HC 251312SP rel Min Moura Ribeiro 5ª Turma j 18022014 noticiado no Informativo 536 STF HC 92012SP rel Min Ellen Gracie 2ª Turma j 10062008 noticiado no Informativo 510 REsp 1524484PE rel Min Reynaldo Soares da Fonseca 5ª Turma j 17052016 noticiado no Informativo 584 O STJ compartilha deste entendimento HC 262832RS rel Min Marilza Maynard Desembargadora convocada do TJSE 6ª Turma j 17122013 HC 193041DF rel Min Alderita Ramos de Oliveira Desembargadora convocada do TJPE 6ª Turma j 15082013 HC 88500RS rel Min Joaquim Barbosa 2ª Turma j 20102009 noticiado no Informativo 564 EREsp 1619087SC rel Min Maria Thereza de Assis Moura rel para acórdão Min Jorge Mussi 3ª Seção j 14062017 noticiado no Informativo 609 A Resolução nº 1542012 editada pelo CNJ Conselho Nacional de Justiça define a política institucional do Poder Judiciário na utilização dos recursos oriundos da aplicação da pena de prestação pecuniária BITENCOURT Cezar Roberto Novas penas alternativas São Paulo Saraiva 1999 p 118 Conforme jurisprudência do STF é viável a utilização do habeas corpus 34 35 36 37 38 39 40 41 42 43 para discutir questões relacionadas à pena pecuniária estabelecida em substituição à reprimenda corporal CP art 43 I cc o art 45 1º porquanto diferentemente da pena de multa que possui natureza jurídica distinta aquela pode ser revertida em pena privativa de liberdade caso descumprida injustificadamente pelo condenado CP art 44 4º STF HC 122563MG rel Min Teori Zavascki 2ª Turma j 02092014 REsp 1699665SP rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma noticiado no Informativo 631 STF HC 122563MG rel Min Teori Zavascki 2ª Turma j 02092014 O art 244A da Lei 80691990 Estatuto da Criança e do Adolescente prevê a aplicação ao condenado pelo delito de submeter criança ou adolescente à prostituição ou à exploração sexual além da pena de reclusão de quatro a dez anos e multa a perda de bens e valores utilizados na prática criminosa em favor do Fundo dos Direitos da Criança e do Adolescente da unidade da Federação Estado ou Distrito Federal em que foi cometido o crime ressalvado o direito de terceiro de boafé JESUS Damásio E de Penas alternativas anotações à Lei n 9714 de 25 de novembro de 1998 2 ed São Paulo Saraiva 2000 p 152 HC 176490SP rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 23102012 Nesse sentido entre outros GOMES Luiz Flávio Penas e medidas alternativas à prisão 1 ed 2 tir São Paulo RT 1999 p 146 Se o crime foi praticado no exercício da atividade advocatícia não constitui excessivo rigor substituir a pena privativa de liberdade pela suspensão da atividade profissional pelo mesmo prazo STJ HC 126373SP rel Min Og Fernandes 6ª Turma j 11122012 STJ HC 252807BA rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 24092013 SHECAIRA Sérgio Salomão CORRÊA JUNIOR Alceu Teoria da pena finalidades direito positivo jurisprudência e outros estudos de ciência criminal São Paulo RT 2002 p 226 Art 311A Utilizar ou divulgar indevidamente com o fim de beneficiar a si ou a outrem ou de comprometer a credibilidade do certame conteúdo sigiloso de I concurso público II avaliação ou exame públicos III processo seletivo para ingresso no ensino superior ou IV exame ou processo seletivo previstos em lei Pena reclusão de 1 um a 4 quatro 44 anos e multa 1º Nas mesmas penas incorre quem permite ou facilita por qualquer meio o acesso de pessoas não autorizadas às informações mencionadas no caput 2º Se da ação ou omissão resulta dano à administração pública Pena reclusão de 2 dois a 6 seis anos e multa 3º Aumentase a pena de 13 um terço se o fato é cometido por funcionário público HC 60919DF rel Min Gilson Dipp 5ª Turma j 10102006 361 362 CONCEITO É a espécie de sanção penal de cunho patrimonial consistente no pagamento de determinado valor em dinheiro em favor do Fundo Penitenciário Por se tratar de pena deve respeitar os princípios da reserva legal e da anterioridade ou seja é necessária a sua cominação por lei em sentido material e formal vigente anteriormente à prática do fato típico cuja punição se pretende FUNDO PENITENCIÁRIO O Fundo Penitenciário Nacional Funpen instituído no âmbito do Ministério da Justiça e Segurança Pública é gerido pelo Departamento Penitenciário Nacional Depen e tem a finalidade de proporcionar recursos e meios para financiar e apoiar as atividades e os programas de modernização e aprimoramento do sistema penitenciário nacional Lei Complementar 791994 art 1º Entre os seus variados recursos estão as multas decorrentes de sentenças penais condenatórias com trânsito em julgado LC 791994 art 2º V A Lei Complementar 791994 não indica a origem das penas de multa isto é se provenientes da Justiça Estadual ou da Justiça Federal Nesse contexto os Estados e o Distrito Federal podem legislar sobre este assunto com a finalidade de encaminhar a sanção pecuniária para o fundo penitenciário sob sua gestão Com efeito o art 24 I da Constituição Federal fixa a competência concorrente entre a União os Estados e o Distrito Federal 363 364 para legislar sobre direito penitenciário1 CRITÉRIO ADOTADO PARA A PENA DE MULTA O Código Penal adota por força do art 2º da Lei 72091994 Reforma da Parte Geral do Código Penal o critério do diamulta pelo qual o preceito secundário de cada tipo penal se limita a cominar a pena de multa sem indicar seu valor o qual deve ser calculado com base nos critérios previstos no art 49 do Código Penal Em face da redação do art 12 do Código Penal essa regra não impede a existência de exceções ou seja é possível que leis especiais se valham pontualmente de critérios diversos A título ilustrativo a Lei 86661993 Lei de Licitações prevê em seu art 99 caput A pena de multa cominada nos arts 89 a 98 desta Lei consiste no pagamento de quantia fixada na sentença e calculada em índices percentuais cuja base corresponderá ao valor da vantagem efetivamente obtida ou potencialmente auferível pelo agente APLICAÇÃO DA PENA DE MULTA A aplicação da pena privativa de liberdade obedece a um sistema trifásico delineado pelo art 68 caput do Código Penal Já a pena de multa e somente ela segue um sistema bifásico é dizer sua aplicação deve respeitar duas fases distintas e sucessivas quais sejam 1ª fase O juiz estabelece o número de diasmulta que varia entre o mínimo de 10 dez e o máximo de 360 trezentos e sessenta É o que dispõe o art 49 caput parte final do Código Penal Para encontrar esse número o magistrado leva em conta as circunstâncias judiciais do art 59 caput do Código Penal bem como eventuais agravantes e atenuantes genéricas e as causas de aumento e de diminuição da pena Em suma todas as etapas que devem ser percorridas para a dosimetria da pena privativa de liberdade são utilizadas para o cálculo do número de diasmulta na sanção pecuniária 1 2 365 2ª fase Já definido o número de diasmulta cabe agora ao magistrado a fixação do valor de cada diamulta que não pode ser inferior a um trigésimo do maior salário mínimo mensal vigente ao tempo do fato nem superior a cinco vezes esse salário CP art 49 1º Levase em conta a situação econômica do réu nos termos do art 60 caput do Código Penal Com tais dados o juiz conclui o cálculo da pena de multa que pode ser assim sintetizado Esse método possibilita a perfeita individualização da pena de multa na forma exigida pelo art 5º XLVI da Constituição Federal E anotese com o trânsito em julgado da sentença penal condenatória é irretratável o seu valor2 Vejamos dois exemplos Uma pessoa de elevado poder econômico pratica um crime de estelionato As circunstâncias judiciais do art 59 caput do Código Penal lhe são favoráveis O juiz deve aplicar o número de diasmulta no mínimo legal 10 diasmulta mas fixar o valor de cada um deles em montante relevante bem acima do piso legal em face da situação econômica do réu3 Outra pessoa com péssimos antecedentes criminais e conduta social desajustada portadora de personalidade voltada à prática rotineira de infrações penais comete uma extorsão com requintes de crueldade É todavia paupérrima O juiz deve aplicar o número de diasmulta bem acima do mínimo legal e estipular o valor de cada um deles no patamar raso diante da condição econômica do réu VALOR INEFICAZ DA PENA DE MULTA 366 367 1 Concluído o sistema bifásico e calculado o valor da pena de multa o magistrado pode reputar que em face do elevado poder econômico do réu a sanção pecuniária embora aplicada no máximo legal é ineficaz Nessa hipótese a ele se reserva a faculdade de aumentar o seu valor até o triplo CP art 60 1º Nos crimes contra a propriedade industrial Lei 92791996 art 197 parágrafo único e nos crimes previstos nos arts 33 a 39 da Lei de Drogas Lei 113432006 art 43 parágrafo único o valor final da pena de multa pode ser aumentado até o décuplo Por sua vez nos crimes contra o sistema financeiro nacional o valor do diamulta pode ser estendido até o décuplo Lei 74921986 art 33 MULTA EXCESSIVA O art 76 1º da Lei 90991995 autoriza o juiz nas hipóteses em que a pena de multa seja a única aplicável a reduzila até a metade Essa redução somente é possível quando a situação econômica do autor do fato a recomendar De seu turno o art 197 parágrafo único da Lei 92791996 crimes contra a propriedade industrial autoriza a redução da pena de multa em até 10 vezes dependendo das condições pessoais do agente e da vantagem auferida no caso concreto MULTA IRRISÓRIA Multa irrisória é a de valor extremamente reduzido Não há definição legal acerca do seu montante A questão controversa reside na necessidade ou não de sua cobrança pelo Estado Destacamse duas posições A multa irrisória não deve ser executada em juízo já que o Poder Público arcará em sua cobrança com valor superior ao que será ao final arrecadado e o condenado sequer suportará o caráter retributivo da pena 2 368 A cobrança em juízo é obrigatória Pouco importa o seu valor a multa é pena incidindo sobre ela os princípios da imperatividade da sua aplicação e da inderrogabilidade de seu cumprimento É o entendimento dominante A propósito o art 1º 1º da Portaria do Ministério da Fazenda 752012 que fixa os valores mínimos para inscrição e execução da Dívida Ativa da União faz expressa ressalva à pena de multa no sentido de inexistir valor mínimo para legitimar a sua execução judicial PAGAMENTO VOLUNTÁRIO DA MULTA O pagamento voluntário ou espontâneo da pena de multa deve ser efetuado no prazo de 10 dez dias depois do trânsito em julgado da sentença condenatória como determina o art 50 caput 1ª parte do Código Penal O juiz pode atendendo a requerimento do condenado e considerando as circunstâncias do caso permitir o parcelamento do pagamento da pena de multa CP art 50 caput in fine O art 169 da Lei de Execução Penal determina que esse parcelamento em prestações iguais e sucessivas deverá ser pleiteado pelo condenado antes de vencido o prazo legal para pagamento da multa A lei não prevê limite ao número de parcelas reservandose tal tarefa ao juízo da execução o qual antes de decidir sobre o pedido de parcelamento poderá determinar diligências para verificar a real situação econômica do condenado e deverá ouvir o Ministério Público LEP art 169 1º Concedido o parcelamento o benefício será revogado pelo juiz de ofício ou a pedido do Ministério Público se o condenado for impontual no pagamento ou se melhorar sua condição econômica LEP art 169 2º É possível ainda que a cobrança da multa seja efetuada mediante desconto na remuneração do condenado quando tiver sido aplicada isoladamente cumulativamente com pena restritiva de direitos ou então quando tiver sido concedida a suspensão condicional da pena CP art 50 2º Em síntese somente não se admite a cobrança da multa por meio de desconto na remuneração quando tiver sido imposta pena privativa de 369 liberdade não suspensa O desconto não deve incidir sobre os recursos indispensáveis ao sustento do condenado e de sua família e terá como limites o máximo de um quarto e o mínimo de um décimo da remuneração CP art 50 2º e LEP art 168 I EXECUÇÃO DA PENA DE MULTA Pode ocorrer a omissão do condenado durante o prazo legal para pagamento da multa Procedese no caso ao pagamento forçado ou coercitivo mediante a execução da pena pecuniária sendo vedada a sua conversão para pena privativa de liberdade Com efeito a Lei 92681996 conferiu ao art 51 do Código Penal a seguinte redação Transitada em julgado a sentença condenatória a multa será considerada dívida de valor aplicandoselhe as normas da legislação relativa à dívida ativa da Fazenda Pública inclusive no que concerne às causas interruptivas e suspensivas da prescrição4 Embora considerada dívida de valor após o trânsito em julgado da sentença condenatória a multa conserva seu caráter de pena A Lei 92681996 apenas impediu a sua conversão para prisão mas não afetou sua natureza jurídica Nem poderia fazêlo uma vez que a multa foi tratada como espécie de pena pelo art 5º XLVI c da Constituição Federal Esse é o entendimento consagrado no Supremo Tribunal Federal5 Por corolário a inadimplência da multa seguida da morte do condenado não tem o condão de estender sua cobrança aos seus herdeiros em obediência ao princípio da personalidade ou intransmissibilidade da pena consagrado pelo art 5º XLV da Constituição Federal Importante destacar entretanto a existência de julgados no Superior Tribunal de Justiça afirmando ter sido retirado da multa o seu caráter de pena A Lei 92681996 deu nova redação ao art 51 do CP e extirpou do diploma jurídico a possibilidade de conversão da pena de multa em detenção no caso de inadimplemento da sanção pecuniária Após a alteração legislativa o mencionado artigo passou a vigorar com a seguinte redação Transitada em julgado a sentença condenatória a multa será considerada dívida de valor aplicandoselhes as normas da legislação relativa à dívida ativa da Fazenda Pública inclusive no que concerne às causas interruptivas e suspensivas da prescrição Portanto diante da nova redação dada ao CP a pena de multa não mais possui o condão de constranger o direito à locomoção do sentenciado É imperioso frisar que a nova redação do art 51 do CP trata da pena de multa como dívida de valor já a partir do trânsito em julgado da sentença penal condenatória ou seja em momento inclusive anterior ao próprio cumprimento da pena privativa de liberdade ou da restritiva de direitos Isso implica afirmar que o jus puniendi do Estado exaurese ao fim da execução da pena privativa de liberdade ou da restritiva de direitos porquanto em nenhum momento engloba a pena de multa considerada dívida de valor a partir do trânsito em julgado da sentença penal condenatória Entendimento oposto ou seja a possibilidade de constrição da liberdade daquele que é apenado somente em razão de sanção pecuniária consistiria em legitimação da prisão por dívida em afronta portanto ao disposto no art 5º LXVII da CF e ainda no art 7º 7 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos Pacto de San José da Costa Rica cujo texto estabelece que ninguém deve ser detido por dívida Dessa forma o reconhecimento da pena de multa como dívida de valor atribui à sanção pecuniária caráter extrapenal6 Discutese a forma adequada para a execução da pena de multa Formaramse duas posições sobre o assunto 1ª posição A pena de multa deve ser executada pelo Ministério Público perante a Vara das Execuções Penais na forma da Lei 72101984 Lei de Execução Penal Cabe ao Parquet depois de extrair certidão da sentença penal condenatória com trânsito em julgado que funcionará como título executivo judicial requerer em autos apartados a citação do condenado para no prazo de 10 dias pagar o valor da multa ou nomear bens à penhora LEP art 164 caput Decorrido esse prazo sem o pagamento da multa ou o depósito da respectiva importância proceder 3610 seá à penhora de tantos bens quantos bastem para garantir a execução LEP art 164 1º Entretanto se o Ministério Público não executar a pena de multa no prazo de 90 dias após o trânsito em julgado da condenação o juízo criminal comunicará a Fazenda Pública para efetuar a cobrança perante a Vara das Execuções Fiscais nos termos da Lei 68301980 Lei de Execução Fiscal Esse é o entendimento do Supremo Tribunal Federal7 2ª posição A pena de multa deve ser executada pela Fazenda Pública perante a Vara das Execuções Fiscais Essa linha de pensamento se fundamenta na imposição legal de ser a multa penal considerada dívida de valor para fins de cobrança e consequentemente deve ser executada por sua credora a Fazenda Pública Com o trânsito em julgado o juízo da Vara das Execuções Penais intima o condenado para efetuar em 10 dias o pagamento da pena de multa Decorrido o prazo sem pagamento extraise certidão contendo informações acerca da condenação e da pena de multa com remessa à Fazenda Pública para execução É o entendimento consagrado na Súmula 521 do Superior Tribunal de Justiça A legitimidade para a execução fiscal de multa pendente de pagamento imposta em sentença condenatória é exclusiva da Procuradoria da Fazenda Pública8 A possibilidade de execução da pena de multa pela Fazenda Pública contudo não retira do Ministério Público na condição de titular da ação penal a possibilidade de ajuizar medidas assecuratórias para garantir o futuro pagamento da sanção pecuniária9 CAUSAS SUSPENSIVAS E INTERRUPTIVAS DA PRESCRIÇÃO DA PENA DE MULTA O art 51 do Código Penal determina a aplicação das normas da legislação relativa à dívida ativa da Fazenda Pública no que concerne às causas interruptivas e suspensivas da prescrição Incidem assim as disposições da Lei 68301980 Lei de Execução Fiscal e do Código Tributário Nacional Em relação à suspensão da prescrição dispõe o art 40 da Lei de Execução Fiscal O juiz suspenderá o curso da execução enquanto não for 3611 3612 3613 localizado o devedor ou encontrados bens sobre os quais possa recair a penhora e nesses casos não correrá o prazo de prescrição Esta suspensão não é eterna a teor do contido na Súmula 314 do Superior Tribunal de Justiça Em execução fiscal não localizados bens penhoráveis suspendese o processo por um ano findo o qual se inicia o prazo da prescrição quinquenal intercorrente As causas de interrupção da prescrição encontramse no art 174 parágrafo único do Código Tributário Nacional destacandose o inciso I A prescrição se interrompe pelo despacho do juiz que ordenar a citação em execução fiscal PENA DE MULTA E HABEAS CORPUS Não se admite a utilização do habeas corpus para discussão de temas inerentes à pena de multa pois como essa espécie de sanção penal não pode mais ser convertida em privativa de liberdade em nada afetando a liberdade de locomoção incabível se torna o emprego do remédio disciplinado pelo art 5º LXVIII da Constituição Federal Esse fundamento ensejou a edição da Súmula 693 do Supremo Tribunal Federal Não cabe habeas corpus contra decisão condenatória a pena de multa ou relativo a processo em curso por infração penal a que a pena pecuniária seja a única cominada MULTA E CORREÇÃO MONETÁRIA Incide correção monetária na pena de multa O termo inicial é a data em que foi praticada a infração penal por se tratar de mera atualização do valor10 SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA MULTA Preceitua o art 52 do Código Penal É suspensa a execução da pena de multa se sobrevém ao condenado doença mental O art 167 da Lei 72101984 Lei de Execução Penal apresenta igual redação 3614 3615 Notese que é suspensa a execução da pena de multa mas não a prescrição em relação à qual se aplicam os prazos definidos pelo art 114 do Código Penal MULTA SUBSTITUTIVA A multa substitutiva ou vicariante é prevista no art 60 2º do Código Penal A pena privativa de liberdade aplicada não superior a 6 seis meses pode ser substituída pela de multa observados os critérios dos incisos II e III do art 44 deste Código Como não há menção ao inciso I do art 44 do Código Penal não se aplica o limite temporal de quatro anos no tocante aos crimes dolosos Dessa forma a multa substitutiva da pena privativa de liberdade tem natureza jurídica distinta da pena de multa cominada pelo preceito secundário do tipo penal Permanece portanto o teto de seis meses11 e independe do emprego de violência ou grave ameaça à pessoa Basta para a sua incidência que o réu não seja reincidente em crime doloso e ademais a culpabilidade os antecedentes a conduta social e a personalidade do condenado bem como os motivos e as circunstâncias indiquem a suficiência da substituição SÚMULA 171 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Estatui o enunciado Cominadas cumulativamente em lei especial penas privativa de liberdade e pecuniária é defeso a substituição da prisão por multa Essa súmula foi idealizada para atingir o crime de porte de substância entorpecente para uso próprio à época definido pelo art 16 da Lei 63681976 Tinha o propósito de impedir que o usuário valendose da multa substitutiva fosse condenado somente às penas pecuniárias Em que pese a revogação da Lei 63681976 pela Lei 113432006 Lei de Drogas o enunciado sumular permanece válido e aplicável aos casos que se amoldem à sua definição12 3616 PENA DE MULTA NA LEI DE DROGAS A Lei 113432006 Lei de Drogas também se filiou ao sistema do dia multa Mas as regras relativas ao número de diasmulta e ao valor de cada diamulta são diversas das estabelecidas pelo Código Penal Com efeito para o crime tipificado pelo art 28 adquirir guardar ter em depósito transportar ou trazer consigo para consumo pessoal drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar o juiz fixará o número de diasmulta em quantidade nunca inferior a 40 nem superior a 100 atendendo à reprovabilidade da conduta e o valor do dia multa em conformidade com a capacidade econômica do agente atribuindo a cada um deles o valor de 130 um trinta avos até três vezes o valor do salário mínimo art 29 caput E os valores arrecadados serão creditados à conta do Fundo Nacional Antidrogas art 29 parágrafo único Já para os crimes inerentes à produção não autorizada e ao tráfico de drogas arts 33 a 39 o número de diasmulta é previsto particularmente para cada delito e será dosado levandose em conta com preponderância sobre o previsto no art 59 do Código Penal a natureza e a quantidade da substância ou do produto a personalidade e a conduta social do agente Em seguida o valor do diamulta deve ser calculado com base nas condições econômicas do réu não inferior a 130 um trinta avos nem superior a cinco vezes o salário mínimo art 43 caput Na hipótese de concurso de crimes em qualquer modalidade concurso material concurso formal ou crime continuado as penas de multa serão impostas sempre cumulativamente art 43 parágrafo único 1ª parte Finalmente em tais delitos o juiz poderá aumentar o valor da pena de multa até o décuplo se em virtude da situação econômica do acusado considerálas ineficazes ainda que aplicadas no máximo art 43 parágrafo único parte final 3617 PENA DE MULTA E VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER Estabelece o artigo 17 da Lei 113402006 Lei Maria da Penha ser vedada a aplicação nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher de penas de cesta básica ou outras de prestação pecuniária bem como a substituição de pena que implique o pagamento isolado de multa 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 Em São Paulo por exemplo a Lei Estadual 91711995 criou o Fundo Penitenciário Estadual dispondo ainda que as multas impostas pela Justiça Estadual a ele se destinam LYRA Roberto Comentários ao Código Penal Rio de Janeiro Forense 1942 v II p 143 É de se observar que a pobreza do réu por mais acentuada que seja não pode anular o valor do dia multa pena zero Para o STJ Inexiste previsão legal para a isenção da pena de multa em razão da situação econômica do réu devendo esta servir tão somente de parâmetro para a fixação de seu valor STJ REsp 761268RS rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 17082006 Diante da atual redação do art 51 do Código Penal é inevitável concluir pela inaplicabilidade do art 9º caput do Decretolei 36881941 Lei das Contravenções Penais A multa convertese em prisão simples de acordo com o que dispõe o Código Penal sobre a conversão de multa em detenção STF ADI 3150DF rel Min Marco Aurélio Plenário j 13122018 noticiado no Informativo 927 REsp 1519777SP rel Min Rogerio Schietti Cruz 3ª Seção j 26082015 noticiado no Informativo 568 ADI 3150DF rel Min Marco Aurélio red p acórdão Min Roberto Barroso Plenário j 13122018 Em face do entendimento adotado pelo Supremo Tribunal Federal esta súmula tende a ser cancelada pelo Superior Tribunal de Justiça STJ REsp 1275834PR rel Min Ericson Maranho Desembargador convocado do TJSP 6ª Turma j 17032015 noticiado no Informativo 558 STJ AgRg no REsp 1063031PR rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 14022012 STF HC 98995RS rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 19102010 noticiado no Informativo 605 STJ REsp 879289SP rel Min Félix Fischer 5ª Turma j 15032007 Concurso de crimes é o instituto que se verifica quando o agente mediante uma ou várias condutas pratica duas ou mais infrações penais Pode haver portanto unidade ou pluralidade de condutas Sempre serão cometidas contudo duas ou mais infrações penais O concurso de crimes pode se manifestar sob três formas concurso material concurso formal e crime continuado Destacamse no Brasil três sistemas de aplicação da pena no concurso de infrações penais cúmulo material exasperação e absorção Passemos à análise de cada um deles Aplicase ao réu o somatório das penas de cada uma das infrações penais pelas quais foi condenado Esse sistema foi adotado em relação ao concurso material art 69 ao concurso formal imperfeito ou impróprio art 70 caput 2ª parte e pelo texto da lei ao concurso das penas de multa art 72 Aplicase somente a pena da infração penal mais grave praticada pelo agente aumentada de determinado percentual É o sistema acolhido em relação ao concurso formal próprio ou perfeito art 70 caput 1ª parte e ao crime continuado art 71 Aplicase exclusivamente a pena da infração penal mais grave dentre as diversas praticadas pelo agente sem qualquer aumento Esse sistema foi consagrado pela jurisprudência em relação aos crimes falimentares praticados pelo falido sob a égide do Decretolei 76611945 em virtude do princípio da unidade ou unicidade dos crimes falimentares Para o Superior Tribunal de Justiça Em matéria de crimes falimentares há unidade no crime não obstante a multiplicidade de fatos que a caracterizem O fato criminoso que em última análise se pune é a violação do direito dos credores pela superveniente insolvência do comerciante Todos os atos portanto contra tal direito devem ser considerados como um todo único Concluindo é de se observar o princípio da unicidade dos crimes falimentares pois no caso concreto os atos lesivos ensejaram a falência da empresa1 A unidade do crime falimentar contudo não impedia o concurso material ou formal entre um crime falimentar e outro delito comum Com a entrada em vigor da Lei 111012005 Lei de Falências a situação deve ser mantida mas ainda não há jurisprudência consolidada sobre o assunto O concurso material também chamado de real está disciplinado pelo art 69 do Código Penal Art 69 Quando o agente mediante mais de uma ação ou omissão pratica dois ou mais crimes idênticos ou não aplicamse cumulativamente as penas privativas de liberdade em que haja incorrido No caso de aplicação cumulativa de penas de reclusão ou de detenção executase primeiro aquela 1º Na hipótese deste artigo quando ao agente tiver sido aplicada pena privativa de liberdade não suspensa por um dos crimes para os demais será incabível a substituição de que trata o art 44 deste Código 2º Quando forem aplicadas penas restritivas de direitos o condenado cumprirá simultaneamente as que forem compatíveis entre si e sucessivamente as demais Há pluralidade de condutas e pluralidade de resultados O agente por meio de duas ou mais condutas pratica dois ou mais crimes pouco importando se os fatos ocorreram ou não no mesmo contexto fático O concurso material pode ser homogêneo ou heterogêneo Homogêneo quando os crimes são idênticos e heterogêneo quando os crimes são diversos Se houver conexão entre as infrações penais com a consequente unidade processual a regra do concurso material é aplicada pelo juiz que profere a sentença condenatória O magistrado em respeito ao princípio constitucional da individualização da pena deve fixar separadamente a pena de cada uma das infrações penais Em seguida na própria sentença procede à soma de todas elas Caso porém não exista conexão entre as diversas infrações penais sendo elas consequentemente objeto de ações penais diversas as disposições inerentes ao concurso material serão aplicadas pelo juízo da execução Com o trânsito em julgado das sentenças todas as condenações são reunidas na mesma execução e aí se procederá à soma das penas na forma prevista no art 66 III a da Lei de Execução Penal Se for imposta pena de reclusão para um dos crimes e de detenção para o outro executase inicialmente a de reclusão art 69 caput 2ª parte do CP O 1º do art 69 do Código Penal revela a possibilidade de se cumular na aplicação das penas de crimes em concurso material uma pena privativa de liberdade desde que tenha sido concedido sursis com uma restritiva de direitos Por lógica também será admissível a aplicação de pena restritiva de direitos quando ao agente tiver sido imposta pena privativa de liberdade com regime aberto para seu cumprimento eis que será possível a execução simultânea de ambas De acordo com o art 69 2º do Código Penal o condenado cumprirá simultaneamente as penas restritivas de direitos que forem compatíveis entre si e sucessivamente as demais Admitese por exemplo o cumprimento simultâneo de prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária Se forem todavia duas penas de limitação de final de semana serão cumpridas sucessivamente A suspensão condicional do processo somente é admissível quando no concurso material a somatória das penas impostas ao acusado preencha os pressupostos do art 89 da Lei 909919952 O total das penas mínimas portanto deve ser igual ou inferior a 1 um ano Concurso formal ou ideal é aquele em que o agente mediante uma única conduta pratica dois ou mais crimes idênticos ou não Como dispõe o art 70 do Código Penal Art 70 Quando o agente mediante uma só ação ou omissão pratica dois ou mais crimes idênticos ou não aplicaselhe a mais grave das penas cabíveis ou se iguais somente uma delas mas aumentada em qualquer caso de um sexto até metade As penas aplicamse entretanto cumulativamente se a ação ou omissão é dolosa e os crimes concorrentes resultam de desígnios autônomos consoante o disposto no artigo anterior Parágrafo único Não poderá a pena exceder a que seria cabível pela regra do art 69 deste Código Destacamse dois requisitos unidade de conduta e pluralidade de resultados A unidade de conduta somente se concretiza quando os atos são realizados no mesmo contexto temporal e espacial Com efeito a unidade de conduta não importa obrigatoriamente em ato único pois há condutas fracionáveis em diversos atos como no caso daquele que mata alguém conduta mediante diversos golpes de punhal atos Confirase o seguinte julgado do Supremo Tribunal Federal Roubo qualificado consistente na subtração de dois aparelhos celulares pertencentes a duas pessoas distintas no mesmo instante A jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de configurarse concurso formal a ação única que tenha como resultado a lesão ao patrimônio de vítimas diversas e não crime único3 O concurso formal inicialmente pode ser homogêneo ou heterogêneo É homogêneo quando os crimes são idênticos Exemplo três homicídios culposos praticados na direção de veículo automotor Dizse por sua vez heterogêneo o concurso formal quando os delitos são diversos Exemplo A dolosamente efetua disparos de arma de fogo contra B seu desafeto matandoo O projétil entretanto perfura o corpo da vítima resultando em lesões culposas em terceira pessoa Dividese o concurso formal ainda em perfeito e imperfeito Perfeito ou próprio é a espécie de concurso formal em que o agente realiza a conduta típica que produz dois ou mais resultados sem agir com desígnios autônomos Desígnio autônomo ou pluralidade de desígnios é o propósito de produzir com uma única conduta mais de um crime É fácil concluir portanto que o concurso formal perfeito ou próprio ocorre entre crimes culposos ou então entre um crime doloso e um crime culposo4 Imperfeito ou impróprio é a modalidade de concurso formal que se verifica quando a conduta dolosa do agente e os crimes concorrentes derivam de desígnios autônomos Portanto envolve crimes dolosos qualquer que seja sua espécie dolo direto ou dolo eventual Para o Superior Tribunal de Justiça Os desígnios autônomos que caracterizam o concurso formal impróprio referemse a qualquer forma de dolo direto ou eventual A segunda parte do art 70 do CP ao dispor sobre o concurso formal impróprio exige para sua incidência que haja desígnios autônomos ou seja a intenção de praticar ambos os delitos O dolo eventual também representa essa vontade do agente visto que mesmo não desejando diretamente a ocorrência de um segundo resultado aceitouo Assim quando mediante uma só ação o agente deseja mais de um resultado ou aceita o risco de produzilo devem ser aplicadas as penas cumulativamente afastandose a regra do concurso formal perfeito5 Apontamse em doutrina duas teorias acerca do concurso formal de crimes Pela teoria subjetiva exigese unidade de desígnios na conduta do agente para a configuração do concurso formal Já pela teoria objetiva bastam a unidade de conduta e a pluralidade de resultados para a caracterização do concurso formal Pouco importa se o agente agiu ou não com unidade de desígnios Foi acolhida pelo Código Penal uma vez que o art 70 caput 2ª parte admite o concurso formal imperfeito em que despontam os desígnios autônomos Em relação ao concurso formal perfeito ou próprio o Código Penal acolheu o sistema da exasperação Aplicase a pena de qualquer dos crimes se idênticos ou então a mais grave aumentada em qualquer caso de um sexto até a metade O critério que norteia o juiz para fixar o aumento da pena entre os patamares legalmente previstos é exclusivamente o número de crimes cometidos pelo agente6 Essa regra permite a construção da seguinte tabela No caso de serem perpetrados sete ou mais crimes devese aplicar o montante máximo de aumento qual seja a metade relativamente a seis crimes ao passo que os demais devem ser considerados como circunstâncias judiciais desfavoráveis para a dosimetria da penabase nos moldes do art 59 caput do Código Penal O concurso formal perfeito é causa de aumento de pena e incide por corolário na terceira fase de aplicação da pena E na aplicação da pena privativa de liberdade esse aumento não incide sobre a penabase mas sobre a pena acrescida por circunstância qualificadora ou causa especial de aumento7 É nítida a conclusão de que a regra do concurso formal perfeito constituise em flagrante benefício ao réu Com efeito tratase de fórmula destinada a lhe favorecer uma vez que a lógica seria responder normalmente por todos os crimes que praticou O Código Penal utilizouse dessa opção todavia por se tratar de hipótese em que a pluralidade de resultados não deriva de desígnios autônomos eis que os crimes são culposos ou no máximo apenas um é doloso e os demais culposos Por outro lado no que diz respeito ao concurso formal impróprio ou imperfeito o art 70 caput 2ª parte do Código Penal consagrou o sistema do cúmulo material Tal como no concurso material serão somadas as penas de todos os crimes produzidos pelo agente E nesse ponto agiu acertadamente o legislador De fato se há desígnios autônomos há dolo na conduta que produz a pluralidade de resultados e o agente deve responder por todos os resultados a que deu causa sem nenhum tratamento diferenciado Ora é clara a inexistência de diferença exemplificativamente na conduta daquele que desejando a morte de todos os membros de uma família ingressa na residência em que vivem e coloca fogo no corpo de cada uma das pessoas matandoas da conduta de atear fogo na residência durante o período de repouso noturno causando a morte de todos os indivíduos Em ambas as situações o agente queria a morte de várias pessoas e as efetivou Na primeira hipótese estaria desenhado o concurso material pluralidade de condutas e pluralidade de resultados enquanto na segunda restaria delineado o concurso formal unidade de conduta e pluralidade de resultados O tratamento jurídico por questões de lógica de bom senso e notadamente de Justiça deve ser idêntico em ambos os casos Estatui o parágrafo único do art 70 do Código Penal Não poderá a pena exceder a que seria cabível pela regra do art 69 deste Código O concurso formal próprio ou perfeito no qual se adota o sistema da exasperação para aplicação da pena foi criado para favorecer o réu afastando o rigor do concurso material nas hipóteses em que a pluralidade de resultados não deriva de desígnios autônomos Seria contraditório portanto que a sua regra no caso concreto prejudicasse o agente Assim quando o sistema da exasperação for prejudicial ao acusado deve ser excluído para o fim de incidir o sistema do cúmulo material pois a soma das penas é mais vantajosa do que o aumento de uma delas com determinado percentual ainda que no patamar mínimo Vejase o seguinte exemplo A com a intenção de ser promovido na empresa em que trabalha arremessa dolosamente uma pedra contra a cabeça de B com o escopo de tirálo da disputa pela vaga motivo torpe matandoo Em face de sua imprudência uma vez que o local em que foi praticada a conduta estava repleto de pessoas a pedra atinge também a perna de C nele produzindo culposamente lesões corporais Após o regular trâmite da ação penal é condenado pela prática dos dois crimes em concurso formal perfeito Levandose em conta o mínimo legal de cada um dos crimes como devem as penas ser aplicadas O homicídio qualificado tem a pena mínima de 12 anos de reclusão e as lesões corporais culposas detenção de 2 meses De acordo com o sistema da exasperação o cálculo seria 12 anos de reclusão crime mais grave 16 aumento mínimo 14 anos de reclusão pena final Já para o sistema do cúmulo material o cálculo seria outro 12 anos de reclusão homicídio qualificado 2 meses de detenção lesões culposas 12 anos de reclusão e 2 meses de detenção pena final Concluise pois ser em alguns casos o sistema do cúmulo material melhor do que o da exasperação prevalecendo sobre este Falase no caso em concurso material benéfico ou favorável Crime continuado ou continuidade delitiva é a modalidade de concurso de crimes que se verifica quando o agente por meio de duas ou mais condutas comete dois ou mais crimes da mesma espécie e pelas condições de tempo local modo de execução e outras semelhantes devem os subsequentes ser havidos como continuação do primeiro Nos termos do art 71 do Código Penal Art 71 Quando o agente mediante mais de uma ação ou omissão pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e pelas condições de tempo lugar maneira de execução e outras semelhantes devem os subsequentes ser havidos como continuação do primeiro aplicaselhe a pena de um só dos crimes se idênticas ou a mais grave se diversas aumentada em qualquer caso de 16 um sexto a 23 dois terços Parágrafo único Nos crimes dolosos contra vítimas diferentes cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa poderá o juiz considerando a culpabilidade os antecedentes a conduta social e a personalidade do agente bem como os motivos e as circunstâncias aumentar a pena de um só dos crimes se idênticas ou a mais grave se diversas até o triplo observadas as regras do parágrafo único do art 70 e do art 75 deste Código O crime continuado como unidade delitiva surgiu como forma de manifestação às leis penais excessivamente severas Originouse como fenômeno de defesa fundado em sentimento de humanidade por meio dos glosadores italianos notadamente Bartolo de Sassoferrato e Baldo de Ubaldi no século XIV A ideia por eles concebida foi posteriormente desenvolvida pelos práticos italianos dos séculos XV e XVI destacandose Julio Claro e Próspero Farinaccio que propuseram considerar três ou mais furtos como um crime único quando haviam sido cometidos em determinadas condições especialmente de tempo e lugar pois a legislação penal da época impunha a pena de morte ao autor do terceiro furto8 Àquela época constava da lei Carolina como informa Manzini Se ficar devidamente provado que o ladrão atual se encontra na prática do seu terceiro furto verseá considerado como ladrão famoso não menos culpado do que os ladrões violentos e deverá ser condenado à morte9 Duas teorias principais buscam explicar o fundamento do crime continuado a da ficção jurídica e a da realidade Para a teoria da ficção jurídica desenvolvida por Francesco Carrara como seu próprio nome indica a continuidade delitiva é uma ficção criada pelo Direito Existem na verdade vários crimes considerados como um único delito para fins de aplicação da pena10 Os diversos delitos parcelares formam um crime final Foi a teoria acolhida pelo art 71 do Código Penal11 A unidade do crime continuado se opera exclusivamente para fins de aplicação da pena Para as demais finalidades há concurso tanto que a prescrição por exemplo é analisada separadamente em relação a cada delito como se extrai do art 119 do Código Penal e da Súmula 497 do Supremo Tribunal Federal Quando se tratar de crime continuado a prescrição regulase pela pena imposta na sentença não se computando o acréscimo decorrente da continuação Por outro lado a teoria da realidade ou da unidade real idealizada por Bernardino Alimena vislumbra o crime continuado como um único delito Para ele a conduta pode ser composta por um ou vários atos os quais não necessariamente guardam absoluta correspondência com a unidade ou pluralidade de delitos12 A análise do art 71 caput do Código Penal autoriza a ilação de que o reconhecimento do crime continuado depende da existência simultânea de três requisitos 1 pluralidade de condutas 2 pluralidade de crimes da mesma espécie e 3 condições semelhantes de tempo lugar maneira de execução e outras semelhantes Doutrina e jurisprudência divergem acerca da necessidade de um quarto requisito consistente na unidade de desígnio O Código Penal é taxativo ao exigir seja o crime continuado praticado mediante mais de uma ação ou omissão Tal como no concurso material o crime continuado reclama uma pluralidade de condutas o que não se confunde com a mera pluralidade de atos Repitase nada impede seja uma conduta composta de diversos atos A pluralidade de condutas é necessária para ensejar a prática de dois ou mais crimes da mesma espécie Surge então uma primeira indagação O que são crimes da mesma espécie Doutrina e jurisprudência se dividem sobre o assunto Para uma primeira posição amplamente majoritária em sede jurisprudencial crimes da mesma espécie são aqueles tipificados pelo mesmo dispositivo legal consumados ou tentados seja na forma simples privilegiada ou qualificada13 Mas não basta Os crimes precisam possuir a mesma estrutura jurídica ou seja devem ser idênticos os bens jurídicos tutelados Nesse sentido roubo e latrocínio embora previstos no art 157 do Código Penal são crimes do mesmo gênero não são crimes da mesma espécie14 Na doutrina é o entendimento dentre outros de Damásio E de Jesus e Nélson Hungria A outra posição da qual são partidários entre outros Manoel Pedro Pimentel Basileu Garcia e Heleno Cláudio Fragoso sustenta serem crimes da mesma espécie aqueles que tutelam o mesmo bem jurídico pouco importando se estão ou não previstos no mesmo tipo penal Exemplificativamente furto mediante fraude e estelionato crimes contra o patrimônio seriam da mesma espécie15 A lei ainda exige condições de tempo semelhantes o que importa dizer que não se admite um intervalo excessivo entre um crime e outro É importante frisar que se trata de conexão temporal e não de imediatismo cronológico16 A jurisprudência consagrou um critério objetivo pelo qual entre um crime parcelar e outro não pode transcorrer um hiato superior a 30 trinta dias17 Mas em ação penal pela prática de crime contra a ordem tributária o Pretório Excelso excepcionalmente admitiu a continuidade delitiva com intervalo temporal de até 3 três meses entre as condutas18 Reclamase também sejam os crimes praticados em semelhantes condições de lugar A jurisprudência firmou o entendimento de que os diversos delitos devem ser praticados na mesma cidade ou no máximo em cidades limítrofes ou ainda contíguas isto é próximas entre si19 A lei ainda impõe a semelhança entre a maneira de execução pela qual os crimes são praticados isto é o agente deve seguir sempre um padrão análogo em suas diversas condutas20 Um furto praticado por meio de escalada e outro efetuado com rompimento de obstáculo por exemplo malgrado compreendidos como crimes da mesma espécie impedem a continuidade delitiva em face do distinto modo de execução Pelo mesmo motivo a variação de comparsas e o fato de o agente praticar um crime isoladamente e outro em concurso inviabilizam a configuração do crime continuado Não foi prevista em lei mas é exigida por parcela da doutrina e da jurisprudência em razão de admitir o art 71 caput do Código Penal outras condições semelhantes O agente para executar os crimes posteriores deve se valer da ocasião proporcionada pelo crime anterior Há duas teorias no que diz respeito à necessidade de o crime continuado ser praticado pelo agente com unidade de desígnio 1ª Teoria objetivosubjetiva ou mista Não basta a presença dos requisitos objetivos previstos no art 71 caput do Código Penal Reclamase também a unidade de desígnio isto é os vários crimes resultam de plano previamente elaborado pelo agente É a posição adotada entre outros por Eugenio Raúl Zaffaroni Magalhães Noronha e Damásio E de Jesus e amplamente dominante no âmbito jurisprudencial Confirase um lúcido julgado do Supremo Tribunal Federal Para configurar o crime continuado na linha adotada pelo Direito Penal brasileiro é imperioso que o agente a pratique mais de uma ação ou omissão b que as referidas ações ou omissões sejam previstas como crime c que os crimes sejam da mesma espécie d que as condições do crime tempo lugar modo de execução e outras similares indiquem que as ações ou omissões subsequentes efetivamente constituem o prosseguimento da primeira É assente na doutrina e na jurisprudência que não basta que haja similitude entre as condições objetivas tempo lugar modo de execução e outras similares É necessário que entre essas condições haja uma ligação um liame de tal modo a evidenciarse de plano terem sido os crimes subsequentes continuação do primeiro O entendimento desta Corte é no sentido de que a reiteração criminosa indicadora de delinquência habitual ou profissional é suficiente para descaracterizar o crime continuado21 Essa posição deve ser utilizada em concursos públicos que exigem uma postura mais rigorosa do candidato para o fim de diferenciar o crime continuado extremamente vantajoso ao réu da atividade habitual daquele que adota o crime como estilo de vida 2ª Teoria objetiva pura ou puramente objetiva Basta a presença dos requisitos objetivos elencados pelo art 71 caput do Código Penal Sustenta ainda que como o citado dispositivo legal apresenta apenas requisitos objetivos as outras semelhantes condições ali admitidas devem ser de natureza objetiva exclusivamente Traz ainda o argumento arrolado pelo item 59 da Exposição de Motivos da Nova Parte Geral do Código Penal O critério da teoria puramente objetiva não revelou na prática maiores inconvenientes a despeito das objeções formuladas pelos partidários da teoria objetivosubjetiva Em suma dispensase a intenção do agente de praticar os crimes em continuidade É suficiente a presença das semelhantes condições de índole objetiva É a posição na doutrina de Roberto Lyra Nélson Hungria e José Frederico Marques O art 71 do Código Penal apresenta três espécies de crime continuado simples qualificado e específico Foi adotado em todos os casos o sistema da exasperação Crime continuado simples ou comum é aquele em que as penas dos delitos parcelares são idênticas Exemplo três furtos simples Aplicase a pena de um só dos crimes aumentada de 16 a 23 No crime continuado qualificado as penas dos crimes são diferentes Exemplo um furto simples consumado e um furto simples na forma tentada Aplicase a pena do crime mais grave exasperada de 16 a 23 Em ambas as situações o vetor para o aumento da pena entre 16 e 23 é o número de crimes exclusivamente22 Seguese a sistemática abaixo É possível o aumento da pena na fração máxima 23 quando não se conhece com exatidão o número de delitos praticados pelo agente desde que sejam vários e prolongados em amplo espaço de tempo Na ótica do Supremo Tribunal Federal Consignou ademais que o aumento de 23 da pena se harmonizaria com a jurisprudência pacífica da Corte no sentido de que o quantum de exasperação da pena por força do reconhecimento da continuidade delitiva deveria ser proporcional ao número de infrações cometidas Considerou por fim que a imprecisão quanto ao número de crimes praticados pelo paciente não obstaria a incidência da causa de aumento da pena em seu patamar máximo desde que houvesse elementos seguros como na espécie que demonstrassem que vários seriam os crimes praticados ao longo de dilatadíssimo lapso temporal23 Na hipótese de serem cometidos oito ou mais crimes devese aplicar o montante máximo de aumento qual seja 23 relativamente a sete crimes enquanto os restantes serão considerados circunstâncias judiciais desfavoráveis para a dosimetria da penabase nos moldes do art 59 do Código Penal Por sua vez crime continuado específico é o previsto no parágrafo único do art 71 do Código Penal o qual se verifica nos crimes dolosos contra vítimas diferentes cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa Aplicase a pena de qualquer dos crimes se idênticas ou a mais grave se diversas aumentada até o triplo24 A lei não indica o percentual mínimo de aumento da pena mas somente o máximo até o triplo Mas por óbvio em sintonia com o caput deve ser utilizado o mínimo de 16 pois caso contrário o crime continuado seria inútil por se confundir com o concurso material ofendendose a vontade da lei e a origem do instituto consistente em tratar de forma benéfica os autores de crimes da mesma espécie ligados entre si pelas mesmas condições de tempo local maneira de execução e outras semelhantes Na esteira do entendimento do Supremo Tribunal Federal A doutrina e a jurisprudência dos Tribunais inclusive a desta Suprema Corte acentuam que no delito continuado específico cometido dolosamente com violência à pessoa previsto no art 71 parágrafo único do Código Penal a exasperação da pena varia de um sexto limite mínimo até o triplo limite máximo calculada quando desiguais as sanções cabíveis sobre a pena cominada para o delito sujeito à punição mais grave25 Observase nessa modalidade a possibilidade de crime continuado contra bens jurídicos personalíssimos inclusive contra vítimas diferentes tal como na pluralidade de homicídios Com o advento na Nova Parte Geral do Código Penal introduzida pela Lei 72091984 forçoso concluir pela insubsistência da Súmula 605 do Supremo Tribunal Federal a qual vedava a continuidade delitiva nos crimes contra a vida26 O crime continuado em qualquer de suas espécies constituise em causa obrigatória de aumento da pena e incide por corolário na terceira fase de aplicação da pena Se entretanto os diversos crimes parcelares forem objetos de variadas ações penais em juízos distintos não unificadas antes do trânsito em julgado é possível a unificação das penas em sede de execução com fulcro no art 82 do Código de Processo Penal Se não obstante a conexão ou continência forem instaurados processos diferentes a autoridade de jurisdição prevalente deverá avocar os processos que corram perante outros juízes salvo se já estiverem com sentença definitiva Neste caso a unidade dos processos se dará ulteriormente para efeito de soma ou unificação das penas27 Pelos mesmos fundamentos explicados no concurso formal item 3754 a pena do crime continuado não pode exceder a que seria resultante do concurso material É o que se extrai da parte final do art 71 parágrafo único do Código Penal O crime continuado é formado por uma pluralidade de crimes da mesma espécie Pode ocorrer de estar em vigor uma determinada lei para um grupo de delitos e com a superveniência de outra lei mais gravosa ser praticada uma nova série de crimes todos eles em continuidade nos moldes do art 71 caput do Código Penal A lei mais gravosa deve ser aplicada a toda a série delitiva pois o agente que insistiu na empreitada criminosa depois da entrada em vigor da nova lei tinha a opção de seguir ou não seus mandamentos Além disso se o crime continuado é um único delito para fins de aplicação da pena deve incidir a lei em vigor por ocasião da sua conclusão Nesse sentido é o teor da Súmula 711 do Supremo Tribunal Federal A lei penal mais grave aplicase ao crime continuado ou ao crime permanente se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da permanência A teoria da ficção jurídica considera vários crimes como um só para fins de aplicação da pena Para os demais efeitos subsiste a pluralidade de delitos Em relação à extinção da punibilidade destacandose a prescrição como uma de suas formas o art 119 do Código Penal estatui No caso de concurso de crimes a extinção da punibilidade incidirá sobre a pena de cada um isoladamente E especificamente no tocante à prescrição do crime continuado estabelece a Súmula 497 do Supremo Tribunal Federal Quando se tratar de crime continuado a prescrição regulase pela pena imposta na sentença não se computando o acréscimo decorrente da continuação28 Tomemos o exemplo de dois furtos qualificados praticados em continuidade delitiva com aplicação da pena privativa de liberdade no patamar mínimo A operação seria 2 anos pena mínima aumento de 16 em face da continuidade delitiva 4 meses pena final de 2 dois anos e 4 quatro meses Essa pena prescreve em 8 oito anos conforme previsto no art 109 IV do Código Penal Com a aplicação da Súmula 497 do Supremo Tribunal Federal porém a prescrição será calculada com base na pena de 2 dois anos desprezandose o aumento decorrente da continuação Logo a prescrição se concretizará em 4 quatro anos CP art 109 V O instituto da suspensão condicional do processo encontra previsão no art 89 da Lei 90991995 assim redigido Art 89 Nos crimes em que a pena mínima cominada for igual ou inferior a 1 um ano abrangidas ou não por esta Lei o Ministério Público ao oferecer denúncia poderá propor a suspensão do processo por 2 dois anos a 4 quatro anos desde que o acusado não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro crime presentes os demais requisitos que autorizariam a suspensão condicional da pena art 77 do Código Penal O crime continuado pela teoria da ficção jurídica aceita pelo Código Penal é um único crime para fins de aplicação da sanção penal sobre o qual deve incidir a exasperação de 16 a 23 por se tratar de causa obrigatória de aumento da pena Para se admitir a suspensão condicional do processo portanto é necessário respeitar o limite da pena mínima do crime de 1 ano aí já computado o aumento decorrente da continuação Dois estelionatos em continuidade delitiva por exemplo não comportariam o benefício processual pois a pena rasa seria de 1 um ano e 2 dois meses corolário do mínimo da cominação legal 1 ano majorado de 16 2 meses É o que estabelece a Súmula 723 do Supremo Tribunal Federal Não se admite a suspensão condicional do processo por crime continuado se a soma da pena mínima da infração mais grave com o aumento mínimo de 16 um sexto for superior a 1 um ano No crime continuado vários delitos por ficção jurídica são legalmente considerados como um só para fins de aplicação da pena Cada crime parcelar contudo tem existência autônoma e não fosse a série de continuidade subsistiria isoladamente como fato punível Como exemplo três apropriações indébitas cometidas por um indivíduo nas mesmas condições de tempo lugar maneira de execução e outras semelhantes caracterizam um crime continuado mas não se pode dizer que uma apropriação indébita por si só não seja crime De seu turno crime habitual é aquele em que cada ato isolado representa um indiferente penal O crime somente se aperfeiçoa quando a conduta é reiteradamente praticada pelo agente Exemplificativamente cada ato de exercício ilegal da medicina analisado separadamente é irrelevante mas a pluralidade de atos iguais acarreta na tipicidade do fato Estabelece o art 72 do Código Penal No concurso de crimes as penas de multa são aplicadas distinta e integralmente Como já mencionado a interpretação literal do texto da lei revela a adoção no tocante às penas de multa no concurso de crimes do sistema do cúmulo material Essa conclusão é inquestionável no tocante ao concurso material e ao concurso formal Mas há forte controvérsia em relação ao crime continuado Discutese se nessa hipótese as multas cominadas aos diversos delitos praticados pelo agente devem ser somadas sistema do cúmulo material ou então aplicada somente uma delas com aumento de determinado percentual sistema da exasperação Para os partidários da primeira corrente o art 72 do Código Penal foi taxativo ao determinar a soma das penas de multa no concurso de crimes pouco importando a sua modalidade isto é se concurso material formal ou ainda crime continuado Não se poderia assim ser acolhida interpretação diversa em manifesta oposição ao texto legal Além disso a posição geográfica da regra revelaria a intenção do legislador de fazer valer seu mandamento a todas as espécies de concurso de crimes Com efeito por estar no art 72 irradiaria seus efeitos sobre os arts 69 70 e 71 todos do Código Penal É a posição dominante em sede doutrinária Os adeptos da segunda corrente por outro lado alegam que a adoção da teoria da ficção jurídica pelo art 71 do Código Penal implica na aplicação de uma única pena de multa por se tratar de crime único para fins de dosimetria da sanção penal Não teria sentido aplicarse uma só pena privativa de liberdade e várias penas de multa para um crime continuado É a posição majoritária no âmbito jurisprudencial Vejase a decisão do Superior Tribunal de Justiça A pena de multa aplicada no crime continuado escapa à norma contida no art 72 do Código Penal As penas de multa no caso de concurso de crimes material e formal aplicamse cumulativamente diversamente do a b que ocorre com o crime continuado induvidoso concurso material de crimes gravado pela menor culpabilidade do agente mas que é tratado como crime único pela lei penal vigente como resulta da simples letra dos arts 71 e 72 do Código Penal à luz dos arts 69 e 70 do mesmo diploma legal29 O concurso de crimes é moderado ou limitado em razão do teto máximo de 30 anos para o cumprimento da pena privativa de liberdade Embora a somatória das penas possa ultrapassar esse montante o efetivo cumprimento deverá obedecer ao prazo previsto no art 75 do Código Penal Falase assim em moderação ou limitação ao concurso de crimes É possível entre as modalidades de concurso de crimes Imaginese exemplificativamente que determinada pessoa pratique em um dia três homicídios culposos em concurso formal e no outro dia mais dois crimes de homicídio culposo também em concurso formal Entre esses dois blocos de concursos haverá concurso material A imputação seria assim definida art 121 3º por três vezes na forma do art 70 caput 1ª parte em concurso material art 69 caput com art 121 3º por duas vezes na forma do art 70 caput 1ª parte todos do Código Penal A pena seria calculada pelo juiz com base nas seguintes etapas no tocante aos três crimes praticados no primeiro dia utilização da pena do crime de homicídio culposo detenção de 1 a 3 anos aumentada de 16 até 12 Pelo critério adotado seria exasperada em 15 em razão da prática de três crimes em relação aos dois crimes cometidos posteriormente emprego da c pena do crime de homicídio culposo detenção de 1 a 3 anos aumentada de 16 até 12 Pelo critério adotado seria exasperada em 16 pela prática de dois crimes e finalmente as penas resultantes dos dois grupos de concurso formal seriam somadas em obediência ao concurso material Na hipótese de concurso de crimes a pena considerada para fins de fixação da competência do Juizado Especial Criminal será o resultado da soma no caso de concurso material ou de concurso formal impróprio ou imperfeito ou da exasperação na hipótese de concurso formal próprio ou perfeito ou crime continuado das penas máximas cominadas aos delitos Com efeito se desse somatório resultar um apenamento superior a dois anos fica afastada a competência do Juizado Especial30 No concurso de infrações penais estabelece o art 76 do Código Penal que executarseá primeiramente a pena mais grave Ao se referir a infrações o Código Penal em harmonia com o art 1º da Lei de Introdução ao Código Penal trata do gênero do qual são espécies o crime e a contravenção penal E nesse contexto o propósito do dispositivo legal é esclarecer que no concurso entre crimes e contravenções penais cumprese inicialmente a pena privativa de liberdade inerente ao crime reclusão ou detenção de maior gravidade e depois a pena de prisão simples correspondente à contravenção penal 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 RHC 10593SP rel Min Jorge Scartezzini 5ª Turma j 28082001 STF HC 89708BA rel Min Ricardo Lewandowski 1ª Turma j 24042007 HC 91615RS rel Min Cármen Lúcia 1ª Turma j 11092007 O concurso formal perfeito ou próprio não se confunde com o crime preterdoloso Naquele há dois ou mais crimes um doloso e os demais culposos ou então todos culposos enquanto nesse há um único crime composto de uma conduta inicial dolosa e de um resultado agravador de natureza culposa HC 191490RJ rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 27092012 noticiado no Informativo 505 E também HC 200919MS rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 08102013 STJ HC 284951MG rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 08042014 STF RHC 86080MG rel Min Cezar Peluso 1ª Turma j 06062006 noticiado no Informativo 433 FONTÁN BALESTRA Derecho penal Introducción y parte general 17 ed atual por Guillermo A C Ledesma Buenos Aires Abeledo Perrot 2002 p 450 PIMENTEL Manoel Pedro Do crime continuado 2 ed São Paulo RT 1969 p 42 CARRARA Francesco Programa de derecho criminal Parte general Bogotá Temis 2004 v I p 343 e ss STF HC 100612SP rel orig Min Marco Aurélio red p o acórdão Min Roberto Barroso 1ª Turma j 16082016 noticiado no Informativo 835 No STJ RHC 38675SP rel Min Jorge Mussi 5ª Turma j 25032014 ALIMENA Bernardino Principios de derecho penal Trad Eugenio Cuello Callón Madrid Victoriano Suárez 1915 v I p 492 STF HC 114667SP rel orig Min Marco Aurélio red p o ac Min Roberto Barroso 1ª Turma j 24042018 noticiado no Informativo 899 No STJ REsp 1405989SP rel originário Min Sebastião Reis Júnior rel para acórdão Min Nefi Cordeiro 6ª Turma j 18082015 noticiado 14 15 16 17 18 19 20 21 no Informativo 569 e HC 77467SP rel Min Nefi Cordeiro 6ª Turma j 02102014 noticiado no Informativo 549 STF RHC 91552RJ rel Min Cezar Peluso 2ª Turma j 09032010 No STJ HC 240630RS rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 04022014 O STJ já utilizou esta linha de raciocínio no tocante aos crimes de apropriação indébita previdenciária CP art 168A e sonegação de contribuição previdenciária tipificado no art 337A do Código Penal REsp 1212911RS rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 20032012 noticiado no Informativo 493 LYRA Roberto A expressão mais simples do direito penal Edição histórica Rio de Janeiro Editora Rio 1976 p 184 O Supremo Tribunal Federal todavia lançou luz sobre o tema ao firmar e a consolidar o entendimento de que excedido o intervalo de 30 dias entre os crimes não é possível terse o segundo delito como continuidade do primeiro STF HC 107636RS rel Min Luiz Fux 1ª Turma j 06032012 No STJ AgRg no AREsp 468460MG rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 08052014 e HC 239397RS rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 08042014 HC 89573PE rel Min Sepúlveda Pertence 1ª Turma j 13022007 noticiado no Informativo 456 Em dois roubos entretanto o STF rechaçou a continuidade delitiva em face do intervalo de 89 dias entre os crimes STF HC 106173PR rel Min Rosa Weber 1ª Turma j 19062012 STJ HC 206227RS rel Min Gilson Dipp 5ª Turma j 06102011 e HC 174612RS rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 31052011 STJ AgRg no HC 184814SP rel Min Jorge Mussi 5ª Turma j 07112013 e HC 223711SP rel Min Marilza Maynard Desembargadora convocada do TJSE 5ª Turma j 23042013 RHC 93144SP rel Min Menezes Direito 1ª Turma j 18032008 Em igual sentido STF HC 109730RS rel Min Rosa Weber 1ª Turma j 02102012 noticiado no Informativo 682 No STJ Para a caracterização da continuidade delitiva é imprescindível o preenchimento de requisitos de ordem objetiva mesmas condições de tempo lugar e forma de execução e de ordem subjetiva unidade de desígnios ou vínculo subjetivo entre os eventos Teoria Mista ou Objetivosubjetiva RHC 43601DF rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 03062014 22 23 24 25 26 27 STF HC 99245RJ rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 06092011 noticiado no Informativo 639 e STJ AgRg nos EDcl no AREsp 267637SP rel Min Assusete Magalhães 6ª Turma j 13082013 HC 127158MG rel Min Dias Toffoli 2ª Turma j 23062015 noticiado no Informativo 791 No STJ HC 311146SP rel Min Newton Trisotto Desembargador convocado do TJSC 5ª Turma j 17032015 noticiado no Informativo 559 Também devem estar presentes 6 seis circunstâncias judiciais favoráveis culpabilidade antecedentes conduta social personalidade do agente motivos e circunstâncias do crime Essas circunstâncias encontramse igualmente previstas no art 59 caput do Código Penal e incidem na dosimetria da penabase Não há falar em bis in idem na nova utilização desses fatores pois o crime continuado constituise em instituto favorável ao réu Se não existisse as penas seriam aplicadas em sintonia com a regra do concurso material HC 70593SP rel Min Celso de Mello 1ª Turma j 05101993 noticiado no Informativo 448 E também Se reconhecida a continuidade delitiva específica entre estupros praticados contra vítimas diferentes deve ser aplicada exclusivamente a regra do art 71 parágrafo único do Código Penal mesmo que em relação a cada uma das vítimas especificamente também tenha ocorrido a prática de crime continuado A quantidade de infrações praticadas quanto a todas as vítimas deve ser avaliada de uma só vez refletindo na fixação do patamar de aumento decorrente da incidência do crime continuado específico em cuja estipulação também deverão ser observadas as demais circunstâncias mencionadas no art 71 parágrafo único do CP Esse procedimento não faz com que a continuidade delitiva existente em relação a cada vítima específica deixe de ser considerada mas apenas com que a sua valoração seja feita em conjunto o que é possível porque os parâmetros mínimo e máximo de aumento previstos no art 71 parágrafo único são mais amplos do que aqueles estabelecidos no caput do mesmo artigo STJ REsp 1471651MG rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 13102015 noticiado no Informativo 573 Súmula 605 do STF Não se admite continuidade delitiva nos crimes contra a vida STF HC 81134RS rel Min Sepúlveda Pertence 1ª Turma j 07082007 noticiado no Informativo 475 28 29 30 NO STJ AgRg no AREsp 221016SP Rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 25022014 AgRg no REsp 607929PR rel Min Hamilton Carvalhido 6ª Turma j 26042007 No mesmo sentido HC 95641DF rel Min Jane Silva Desembargadora convocada do TJMG 6ª Turma j 18032008 e REsp 905854SP rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 25102007 STJ HC 143500PE rel Min Napoleão Nunes Maia Filho 5ª Turma j 31052011 381 382 INTRODUÇÃO Estabelece o art 75 do Código Penal Art 75 O tempo de cumprimento das penas privativas de liberdade não pode ser superior a 30 trinta anos 1 Quando o agente for condenado a penas privativas de liberdade cuja soma seja superior a 30 trinta anos devem elas ser unificadas para atender ao limite máximo deste artigo 2 Sobrevindo condenação por fato posterior ao início do cumprimento da pena farseá nova unificação desprezandose para esse fim o período de pena já cumprido Por sua vez dispõe o art 10 do Decretolei 36881941 Lei das Contravenções Penais A duração da pena de prisão simples não pode em caso algum ser superior a 5 cinco anos FUNDAMENTOS Os dispositivos legais que limitam o cumprimento da pena privativa de liberdade têm como amparo a vedação constitucional da pena de caráter perpétuo CF art 5º XLVII b Com efeito seria inócuo e incoerente a Constituição Federal proibir a 383 a prisão perpétua e por outro lado alguém ser condenado ao cumprimento efetivo de uma pena privativa de liberdade de 80 90 ou mais anos É possível todavia a condenação por tempo superior a 30 anos ou o que é mais comum diversas condenações que resultem em um total de penas superior a esse limite Se não bastasse a proibição de cumprimento de pena privativa de liberdade acima de 30 anos se coaduna com a dignidade da pessoa humana fundamento da República Federativa do Brasil consagrado pelo art 1º III da Constituição Federal Não seria correto privar alguém de sua liberdade retirandolhe a esperança de um dia voltar a viver em sociedade Essa atitude estaria em descompasso com a finalidade da pena consistente na ressocialização do condenado Como sustentam Miguel Reale Júnior René Ariel Dotti Ricardo Antunes Andreucci e Sérgio M de Moraes Pitombo Uma vez que a Constituição Federal proíbe a prisão perpétua era corolário que no Código Penal se fixasse o prazo máximo do tempo de cumprimento Se o condenado não obtiver o livramento condicional e perfizer trinta anos de cumprimento de pena é de ser posto em liberdade Uma das condições para preservação moral do condenado com positivas repercussões na disciplina carcerária está na possibilidade de vislumbrar a liberdade Daí fixarse um limite no tempo de cumprimento1 UNIFICAÇÃO DE PENAS Diz o art 75 1 do Código Penal que quando o agente for condenado a penas privativas de liberdade cuja soma seja superior a 30 anos devem ser unificadas para atender a este limite A unificação é a transformação de várias penas em uma única Pode ocorrer em duas situações razões de política criminal evitar o cumprimento de uma pena privativa de caráter perpétuo O sistema penal brasileiro adotou o limite máximo de 30 anos b 384 385 adequação de tipicidade nos casos em que restou configurado o crime continuado mas a aplicação de suas regras não foi possível pelo juiz da ação penal reservandose essa tarefa para a fase executória Essa unificação se dá somente para fins de cumprimento da pena não se aplicando a benefícios como livramento condicional remição progressão de regimes entre outros Como consagrado pela Súmula 715 do Supremo Tribunal Federal A pena unificada para atender ao limite de trinta anos de cumprimento determinado pelo art 75 do Código Penal não é considerada para a concessão de outros benefícios como o livramento condicional ou o regime mais favorável de execução2 COMPETÊNCIA PARA UNIFICAÇÃO DAS PENAS É do juiz das execuções penais a teor do art 66 III a da Lei 72101984 NOVA CONDENAÇÃO E UNIFICAÇÃO DAS PENAS Sobrevindo condenação por fato posterior ao início do cumprimento da pena farseá nova unificação desprezandose para esse fim o período de pena já cumprido CP art 75 2º Essa regra se destina aos casos em que o agente encontrandose no cumprimento da pena privativa de liberdade é condenado por fato praticado posteriormente ao início de satisfação da sanção penal Desprezase o tempo já obedecido pelo sentenciado procedendose a nova unificação para obedecer ao limite de 30 anos Exemplo no cárcere cumprindo pena de 25 anos pela prática de latrocínio o sentenciado comete um homicídio qualificado pelo qual é condenado depois de cinco anos à pena de 20 anos As penas serão unificadas desprezandose os 5 anos já cumpridos restarão 20 anos da primeira condenação e outros 20 anos da subsequente A unificação se destina a impedir que desse novo resultado o agente cumpra mais de 30 anos Terá cumprido assim os 5 primeiros anos restandolhe 386 outros 30 com a nova unificação Tal sistemática contudo é deficiente ao deixar praticamente impune o crime cometido por quem condenado a 30 anos ou mais de reclusão comete novo crime logo no início do cumprimento da sanção penal A nova pena será praticamente inútil pois pouco acrescentará no montante final a ser descontado Deve ser ressaltado que o art 75 do Código Penal referese somente ao limite das penas aplicadas antes e durante a fase executória Destarte se houver intervalo entre o cumprimento das penas anteriores cumpridas pelo condenado e o início das novas penas impostas depois da satisfação integral daquelas não se aplica a regra prevista no citado dispositivo legal FUGA DO RÉU E CUMPRIMENTO DA PENA UNIFICADA Em caso de fuga do condenado do estabelecimento prisional e desde que não seja praticado nenhum novo crime durante este período o limite de 30 anos deve ser contado a partir do início do cumprimento da pena e não de sua eventual recaptura Em outras palavras a fuga não interrompe a execução da pena privativa de liberdade Provoca apenas sua suspensão Para o Supremo Tribunal Federal A Turma deferiu em parte habeas corpus impetrado em favor de condenado a um total de 54 anos de prisão pela prática de diversos delitos cuja execução da pena unificada 30 anos deveria ser iniciada a partir da data de sua recaptura desprezandose o período de tempo por ele já cumprido Considerouse que a fuga do paciente não poderia configurarse como meio interruptivo do cumprimento da pena privativa de liberdade com a consequência de acarretar novo cômputo do período de prisão como se houvesse perda do tempo anteriormente cumprido No ponto asseverouse que o ponto de partida para a unificação seria nessa hipótese não a data em que o sentenciado fora recapturado mas a época em que ele iniciara efetivamente o cumprimento das penas3 Contudo se durante o período de fuga o condenado praticar um novo delito em relação ao qual venha a ser condenado deverá ocorrer nova unificação das penas restante da pena anterior acrescido do montante correspondente à nova condenação e o limite de 30 anos terá início na data da recaptura Na esteira da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça Ante a superveniência de nova condenação do paciente por fatos ocorridos quando se encontrava foragido o juízo singular no que foi referendado pela Corte a quo unificou as reprimendas e a fim de respeitar o teto de 30 anos para o cumprimento do restante das penas privativas de liberdade observando a regra estabelecida pelo 2º do art 75 do Código Penal considerou como termo inicial para cálculo da limitação de pena a data da recaptura do paciente O acórdão ora objurgado está em conformidade com o entendimento deste Tribunal Superior uma vez que apesar do limite constitucional relativo à imposição de pena privativa de liberdade fixado em 30 trinta anos de prisão art 75 do Código Penal na hipótese de fuga do paciente ante a superveniência de novas condenações impõese outra unificação desprezandose o quantum de pena já cumprida4 1 2 3 4 REALE JR Miguel DOTTI René Ariel ANDREUCCI Ricardo Antunes PITOMBO Sérgio M de Moraes Penas e medidas de segurança no novo Código 2 ed Rio de Janeiro Forense 1987 p 38 A defesa do impetrante condenado a pena unificada de 79 anos e 6 meses de reclusão em regime inicial fechado alegou que no cômputo para concessão de benefícios na execução deve ser levado em conta o limite de 30 anos versado no artigo 75 do Código Penal Articulou que considerar no cálculo do benefício da progressão de regime pena unificada maior que o teto estabelecido pelo CP violaria o princípio da individualização da pena e a vedação constitucional à aplicação de sanções perpétuas O Colegiado em consonância com o Enunciado 715 da Súmula do Supremo Tribunal Federal entendeu inaplicável no cômputo para a concessão de regime mais benéfico em relação a penas unificadas o limite imposto pelo art 75 do CP devendo ser considerada a reprimenda total STF HC 112182RJ rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 03042018 noticiado no Informativo 896 HC 84766SP rel Min Celso de Mello 2ª Turma j 11092007 noticiado no Informativo 479 HC 193381RS rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 17032011 1 2 3 O sursis como forma de suspensão condicional da execução da pena surgiu na França com a lei de 26 de março de 1891 que tem o seu precedente e a sua fonte inspiradora numa proposição do Sen Bérenger apresentada ao Parlamento em 18841 No Brasil a primeira iniciativa para adoção do instituto foi de Esmeraldino Bandeira que em 18 de julho de 1906 apresentou à Câmara dos Deputados sem sucesso um projeto baseado na lei francesa Posteriormente a Lei 4577 de 5 de setembro de 1922 autorizou o Poder Executivo no governo do Presidente da República Arthur da Silva Bernardes a expedir o Decreto 16588 de setembro de 1924 regulamentando o assunto Na Exposição de Motivos desse decreto o então Ministro da Justiça João Luiz Alves ressaltou as finalidades do instituto as quais subsistem nos dias atuais Não inutilizar desde logo pelo cumprimento da pena o criminoso primário não corrompido e não perverso Evitarlhe com o contágio na prisão as funestas e conhecidas consequências desse grave mal Diminuir o índice da reincidência pelo receio de que se torne efetiva a primeira condenação2 1 2 3 a Existem três sistemas sobre a suspensão condicional da execução da pena privativa de liberdade Sistema angloamericano ou probation system o magistrado sem aplicar pena reconhece a responsabilidade penal do réu submetendolhe a um período de prova no qual em liberdade deve ele comportarse adequadamente Se o acusado não agir de forma correta o julgamento é retomado com a consequente prolação de sentença condenatória e imposição de pena privativa de liberdade Sistema do probation of first offenders act o juiz determina a suspensão da ação penal permitindo a liberdade do acusado sem contudo declarálo culpado Durante a suspensão o réu deve apresentar boa conduta pois caso contrário é reiniciada a ação penal Esse sistema foi acolhido no Brasil no tocante à suspensão condicional do processo definida pelo art 89 da Lei 90991995 Sistema francobelga o réu é processado normalmente e com a condenação a ele é atribuída uma pena privativa de liberdade O juiz entretanto levando em conta condições legalmente previstas suspende a execução da pena por determinado período dentro do qual o acusado deve revelar bom comportamento e atender as condições impostas pois caso contrário deverá cumprir integralmente a sanção penal Foi adotado pelos arts 77 a 82 do Código Penal em relação ao sursis Sursis é a suspensão condicional da execução da pena privativa de liberdade na qual o réu se assim desejar se submete durante o período de prova à fiscalização e ao cumprimento de condições judicialmente estabelecidas Há três posições acerca da natureza jurídica do sursis Instituto de política criminal cuidase de execução mitigada da b c pena privativa de liberdade O condenado cumpre a pena que lhe foi imposta mas de forma menos gravosa É assim benefício tal como proclama o art 77 II do Código Penal e também modalidade de satisfação da pena É o entendimento dominante Direito público subjetivo do condenado consubstanciase em benefício penal assegurado ao réu O juiz tem liberdade para analisar a presença dos requisitos legais os quais se presentes impõem a concessão do sursis Pena tratase de espécie de pena embora não prevista no art 32 do Código Penal A Portaria 4952016 do Ministro de Estado da Justiça instituiu no âmbito do seu Ministério a Política Nacional de Alternativas Penais com o objetivo de desenvolver ações projetos e estratégias voltadas ao enfrentamento do encarceramento em massa e à ampliação da aplicação de alternativas penais à prisão com enfoque restaurativo em substituição à privação de liberdade Seu art 1º parágrafo único inc III preceitua que as alternativas penais abrangem a suspensão condicional da pena privativa de liberdade sursis Os requisitos da suspensão condicional da execução da pena são previstos no art 77 do Código Penal Art 77 A execução da pena privativa de liberdade não superior a 2 dois anos poderá ser suspensa por 2 dois a 4 quatro anos desde que I o condenado não seja reincidente em crime doloso II a culpabilidade os antecedentes a conduta social e a personalidade do agente bem como os motivos e as circunstâncias autorizem a concessão do benefício III não seja indicada ou cabível a substituição prevista no art 44 do Código 1º A condenação anterior a pena de multa não impede a concessão do benefício 2º A execução da pena privativa de liberdade não superior a 4 quatro anos poderá ser suspensa por 4 quatro a 6 seis anos desde que o condenado seja maior de 70 setenta anos de idade ou razões de saúde justifiquem a suspensão O dispositivo legal apresenta requisitos objetivos relacionados à pena e subjetivos ligados ao agente Vejamos a Natureza da pena a pena deve ser privativa de liberdade isto é reclusão ou detenção no caso de crime ou prisão simples em se tratando de contravenção penal E como determina o art 80 do Código Penal o sursis não se estende às penas restritivas de direitos nem à multa O sursis não se aplica em hipótese alguma às medidas de segurança O próprio nome do instituto é elucidativo suspensão condicional da pena e não da medida de segurança Se não bastasse em relação aos inimputáveis a sentença é absolutória não se falando em imposição de pena privativa de liberdade Já no tocante aos semiimputáveis a sentença condenatória que determina a incidência de pena reduzida a substitui por medida de segurança que em qualquer caso possui finalidade completamente diversa do sursis b Quantidade da pena privativa de liberdade a pena concreta efetivamente aplicada na sentença condenatória não pode ser superior a dois anos3 Em se tratando de concurso de crimes seja qual for sua espécie a pena resultante da pluralidade de infrações penais não pode ultrapassar o limite legal Destarte o concurso de crimes por si só não exclui a suspensão condicional da pena Há situações contudo em que o Código Penal e leis especiais admitem excepcionalmente o sursis para condenações superiores a dois anos Em se tratando de condenado maior de 70 anos de idade ao tempo da sentença ou do acórdão sursis etário ou com problemas de saúde sursis humanitário ou profilático a pena aplicada pode ser igual ou inferior a quatro anos Nos crimes previstos na Lei 96051998 Crimes Ambientais art 16 a execução da pena privativa de liberdade pode ser condicionalmente suspensa nas condenações iguais ou inferiores a três anos c Não tenha sido a pena privativa de liberdade substituída por restritiva de direitos o inciso III do art 77 do Código Penal evidencia ser o sursis subsidiário em relação às penas restritivas de direitos por ser menos favorável ao condenado Com o alargamento das penas restritivas de direitos a partir da Lei 97141998 o instituto em apreço passou a ser cada vez menos utilizado Em regra quando cabível o sursis será também possível a substituição da pena privativa de liberdade nos moldes do art 44 do Código Penal mais vantajosa ao réu Remanesce o sursis para raras hipóteses tal como quando o réu não reincidente em crime doloso for condenado à pena privativa de liberdade igual ou inferior a dois anos por delito cometido com o emprego de violência à pessoa ou grave ameaça a Réu não reincidente em crime doloso a reincidência em crime culposo não impede o sursis Lembrese ainda que a condenação anterior por contravenção penal não caracteriza a reincidência É possível o sursis ao reincidente em crime doloso em uma hipótese a condenação anterior foi exclusivamente à pena de multa CP art 77 1º Nesse sentido estatui a Súmula 499 do Supremo Tribunal Federal Não obsta à concessão do sursis condenação anterior à pena de multa b A culpabilidade os antecedentes a conduta social e personalidade do agente bem como os motivos e as circunstâncias do crime autorizem a concessão do benefício a análise deve ser efetuada exclusivamente no caso concreto4 A existência de outras ações penais em trâmite contra o réu embora não lhe retirem a primariedade pode impedir a suspensão condicional da pena pelo não preenchimento do requisito subjetivo contido no inciso II do art 77 do Código Penal Vejase pode impedir mas não impede automaticamente Nesse sentido já decidiu o Superior Tribunal de Justiça que uma única ocorrência penal não é motivo suficiente para impedir a concessão do sursis5 Preceitua o art 157 da Lei de Execução Penal O juiz ou tribunal na sentença que aplicar pena privativa de liberdade deverá pronunciarse motivadamente sobre a suspensão condicional quer a conceda quer a denegue Destarte o cabimento ou não do sursis deve ser analisado de maneira fundamentada na sentença ou no acórdão O juízo da execução pode conceder a suspensão condicional da pena Não em regra por ser questão que deve ser solucionada durante o trâmite da ação penal É possível todavia a delegação dessa matéria ao juízo da execução quando a ação penal não apresentar elementos probatórios suficientes para se decidir se o condenado preenche ou não os requisitos legalmente exigidos para a medida O juízo da execução também poderá conceder o sursis quando por força de fato superveniente à sentença ou ao acórdão condenatório desaparecer o motivo que obstava sua concessão Nos dois casos o fundamento legal repousa no art 66 III d da Lei 72101984 Lei de Execução Penal O Código Penal possui duas espécies de sursis simples e especial a Sursis simples aplicável quando o condenado não houver reparado o dano injustificadamente eou as circunstâncias do art 59 do Código Penal não lhe forem inteiramente favoráveis No primeiro ano do período de prova o condenado deverá prestar serviços à comunidade ou submeterse à limitação de fim de semana cabendo a escolha ao magistrado b Sursis especial aplicável quando o condenado tiver reparado o dano salvo impossibilidade de fazêlo e se as circunstâncias do art 59 do Código Penal lhe forem inteiramente favoráveis Nessa modalidade o condenado em regra não presta serviços à comunidade nem se submete a limitação de fim de semana pois o juiz pode substituir tal exigência por outras condições cumulativas proibição de frequentar determinados lugares e de ausentarse da comarca onde reside sem autorização do juiz e comparecimento pessoal e obrigatório a juízo mensalmente para informar e justificar suas atividades Não é possível a cumulação das condições do sursis especial no sursis simples Como deixa claro o Código Penal a suspensão da pena é condicional isto é obedece a condições No sursis simples a condição legal e obrigatória é a prestação de serviços à comunidade ou limitação de fim de semana durante o primeiro ano do período de suspensão CP art 78 1º No sursis especial as condições legais que devem ser cumpridas cumulativamente no primeiro ano do período de suspensão são proibição de frequentar determinados lugares e de ausentarse da comarca onde reside sem autorização do juiz e comparecimento pessoal e obrigatório a juízo mensalmente para informar e justificar suas atividades Além dessas condições legais o art 79 do Código Penal permite ao magistrado especificar na sentença outras condições a que fica subordinada a suspensão desde que adequadas ao fato e à situação pessoal do condenado São as denominadas condições judiciais que jamais podem ser vexatórias ou abusivas não se admitindo que violem direitos fundamentais do condenado Também devem ser cumpridas por identidade de razão somente no primeiro ano do período de suspensão O art 81 do Código Penal ainda prevê condições legais indiretas assim chamadas por autorizarem a revogação do sursis São condições proibitivas uma vez que se presentes acarretarão na revogação do benefício O Código Penal após a Reforma da Parte Geral pela Lei 72091984 não admite o sursis sem condições De fato seria no mínimo contraditório instituir a suspensão condicional da pena sem condições Consequentemente se o juiz se esquecer de lançar as condições na sentença condenatória criando um sursis incondicionado a acusação deve recorrer para que a decisão seja reformada pela instância superior A questão se agrava no caso de a omissão da sentença ser alcançada pelo trânsito em julgado da condenação Questionase Pode nesse caso o juízo da execução fixar as condições para o sursis Há duas posições sobre o assunto 1ª posição É possível Com efeito se a Lei de Execução Penal em seu art 158 2º autoriza o juiz a qualquer tempo de ofício a requerimento do Ministério Público ou mediante proposta do Conselho Penitenciário a modificar as condições e regras estabelecidas na sentença ouvido o condenado além de em seu art 159 2º permitir ao tribunal conferir ao juízo da execução a incumbência de estabelecer as condições do benefício nada obsta que esse juízo fixe condições não determinadas pela sentença As condições do sursis também podem ser fixadas pelo juízo da execução quando o benefício tiver sido negado pela instância inferior mas concedido pela instância superior6 2ª posição Não é possível O juízo da execução violaria a coisa julgada e além disso a situação do réu seria agravada sem recurso com essa finalidade É o intervalo de tempo fixado na sentença condenatória concessiva do sursis no qual o condenado deverá revelar boa conduta bem como cumprir as condições que lhe foram impostas pelo Poder Judiciário Na regra geral do Código Penal varia entre dois e quatro anos art 77 caput o que também se dá nos crimes ambientais embora o limite da condenação seja de três anos diferentemente do previsto na legislação comum No caso de sursis etário ou humanitário o período de prova é de quatro a seis anos desde que a condenação seja superior a dois anos e inferior a quatro anos por questão de razoabilidade Com efeito se a condenação seguir a sistemática comum ou seja for igual ou inferior a dois anos o período de prova será o comum dois a quatro anos Nos crimes contra a segurança nacional praticados em tempo de paz o período de prova varia entre dois a seis anos Lei 71701983 art 5º caput No Decretolei 36881941 Lei das Contravenções Penais o período de suspensão é de um a três anos art 11 A fixação do período de prova acima do patamar mínimo legalmente previsto deve ser justificada fundamentadamente sob pena de nulidade e redução pela superior instância O período de prova tem início com a audiência admonitória assim chamada pelo art 161 da Lei de Execução Penal também conhecida como audiência de advertência realizada pelo juiz depois do trânsito em julgado da condenação Nessa audiência o juiz procede à leitura da sentença ao condenado advertindoo das consequências de nova infração penal e do descumprimento das condições impostas LEP art 160 A fiscalização do cumprimento das condições do sursis será atribuída pelo juiz a serviço social penitenciário Patronato Conselho da Comunidade ou instituição beneficiada com a prestação de serviços inspecionados pelo Conselho Penitenciário pelo Ministério Público ou por ambos LEP art 158 3º Com a revogação do sursis o condenado deverá cumprir integralmente a pena privativa de liberdade que se encontrava suspensa observandose o regime prisional fechado semiaberto ou aberto determinado na sentença Portanto não se considera o tempo em que permaneceu no período de prova ainda que nesse intervalo tenha cumprido as condições impostas7 A revogação pode ser de duas espécies obrigatória ou facultativa A revogação obrigatória decorre da lei É dever do juiz decretála não havendo margem para discricionariedade acerca da decisão de manter ou não a suspensão Por sua vez a revogação facultativa permite ao juiz a liberdade de revogar ou não o benefício Analisemos cada uma delas as hipóteses em que se verificam e respectivas consequências A revogação obrigatória nada obstante imponha ao magistrado a atuação em consonância com a lei não é automática Exigese decisão judicial Com efeito dispõe o art 81 I do Código Penal A suspensão será revogada se no curso do prazo o beneficiário I é condenado em sentença irrecorrível por crime doloso É causa de revogação a prática de crime doloso antes ou durante o período de prova pois a lei fala apenas em condenação irrecorrível durante o prazo de suspensão condicional da pena Pouco importa assim o momento da prática do delito O fator decisivo é o tempo do trânsito em julgado da condenação Na visão do Superior Tribunal de Justiça Na hipótese prevista no inciso I do art 81 do Código Penal a revogação do sursis é obrigatória não dispondo o magistrado de discricionariedade diante de uma segunda condenação irrecorrível pela prática de crime doloso Sendo assim se a revogação na espécie é medida necessária decorrente de condição objetiva não há razão para a prévia audiência do apenado diversamente das situações de revogação nas quais existe a possibilidade no caso concreto de não ser o benefício revogado Tendo o apenado sido condenado a pena privativa de liberdade pela prática de crime doloso em decisão irrecorrível durante o período de prova a revogação do sursis é medida que se impõe nos termos do inc I do art 81 do Código Penal8 Em primeira análise a revogação deveria ocorrer qualquer que fosse a sanção penal imposta como decorrência da prática de crime doloso Porém é pacífico o entendimento de que a condenação irrecorrível à pena de multa não autoriza a revogação da suspensão condicional mesmo em se tratando de crime doloso O raciocínio é simples se a condenação a esse tipo de pena não impede o sursis CP art 77 1º por igual fundamento não pode revogálo Por fim a sentença que concede perdão judicial pela prática de crime doloso não revoga o sursis pois não é condenatória mas declaratória da extinção da punibilidade Súmula 18 do STJ II frustra embora solvente a execução da pena de multa ou não efetua sem motivo justificado a reparação do dano Em relação à inadimplência da multa há duas posições acerca da possibilidade de revogação do sursis 1ª posição Não é possível A multa deve ser tratada como dívida de valor sujeitandose sua cobrança às disposições da Lei 68301980 Lei de Execução Fiscal Como a multa não pode ser convertida em prisão sua inadimplência não justifica a revogação da suspensão condicional da pena 2ª posição É possível A Lei 92681996 modificou somente o art 51 do Código Penal em nada se relacionando com os demais dispositivos legais relativos à multa Além disso a pena privativa de liberdade já foi imposta e o sursis não se confunde com a pena de multa Prevalece o entendimento no sentido de que se depois de revogado o benefício o condenado paga a multa é permitido o seu restabelecimento A lei também determina a revogação do sursis em caso de ausência injustificada da reparação do dano III descumpre a condição do 1º do art 78 deste Código É causa obrigatória de revogação da suspensão condicional da pena o descumprimento da prestação de serviços à comunidade ou da limitação de fim de semana no primeiro ano do período de prova do sursis simples O fundamento é simples o condenado que não reparou o dano e possui circunstâncias judiciais desfavoráveis descumpre uma das condições da suspensão condicional da pena Logo contraria a natureza do instituto justificando sua revogação9 Nos termos do art 81 1º do Código Penal A suspensão poderá ser revogada se o condenado descumpre qualquer outra condição imposta ou é irrecorrivelmente condenado por crime culposo ou por contravenção a pena privativa de liberdade ou restritiva de direitos Recordese que quando facultativa a revogação o juiz pode em vez de decretála prorrogar o período de prova até o máximo se este não foi o fixado Vislumbramse duas situações de revogação facultativa Vejamos 1ª situação Descumprimento de qualquer outra condição imposta As condições ora indicadas são as previstas no Código Penal em seus arts 78 2º a b e c e 79 isto é proibição de frequentar determinados lugares e de ausentarse da comarca onde reside sem autorização do juiz comparecimento pessoal e obrigatório a juízo mensalmente para informar e justificar suas atividades além das judiciais desde que adequadas ao fato e à situação pessoal do condenado De fato o descumprimento das condições arroladas pelo art 78 1º do Código Penal enseja a revogação obrigatória do sursis 2ª situação Condenação irrecorrível por crime culposo ou contravenção a pena privativa de liberdade ou restritiva de direitos A condenação com trânsito em julgado por crime culposo ou contravenção penal a pena privativa de liberdade somente comportará a manutenção do sursis quando for imposto o regime prisional aberto para o seu cumprimento De fato a aplicação de regime fechado ou semiaberto acarreta a obrigação de o condenado ser colocado em estabelecimento penal incompatibilizando o cumprimento da suspensão condicional da pena Atentese ainda ao fato de que a condenação à pena pecuniária não se constitui sequer em causa de revogação facultativa do sursis o que se coaduna com a regra traçada pelo art 77 1º do Código Penal O gráfico abaixo indica as causas de revogação do sursis e do livramento condicional Quanto a esse último instituto a apresentação é por ora sucinta pois a matéria será detalhadamente enfrentada no próximo capítulo Em respeito aos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório entendese que deve ser ouvido o condenado antes da revogação do benefício a ele conferindo a oportunidade para justificar eventual manutenção da suspensão condicional da pena Essa oitiva entretanto é impertinente e desnecessária quando a causa de revogação for a condenação irrecorrível por crime doloso ou culposo ou por contravenção penal CP art 81 I e 1º parte final Nesse caso nada de relevante poderá o réu apresentar Já teve chances suficientes para se defender durante a ação penal pessoalmente e por defensor e não poderá com suas escusas alterar a coisa julgada 1ª A questão que se coloca é a seguinte Admitese a revogação do sursis depois do término do período de prova na hipótese de ser descoberta uma condenação transitada em julgado pela prática de crime doloso durante o curso do seu prazo Há duas posições 1ª posição É possível A revogação do sursis nesse caso é automática CP art 81 I É a posição a que se filia o Superior Tribunal de Justiça Inexiste constrangimento ilegal quanto à revogação do benefício da suspensão condicional da pena em razão de condenação pelo cometimento de outro crime durante o período de prova desde que não tenha sido extinta a punibilidade do agente mediante sentença transitada em julgado nos termos do inciso I do art 81 do Código Penal Esta Corte tem firmado o entendimento no sentido de que o período de prova do sursis fica automaticamente prorrogado quando o beneficiário está sendo processado por outro crime ou contravenção bem como que a superveniência de sentença condenatória irrecorrível é caso de revogação obrigatória do benefício mesmo quando ultrapassado o período de prova10 2ª posição Não é possível Por se tratar de sentença meramente declaratória CP art 82 a pena privativa de liberdade estará automaticamente extinta com o término do período de prova A cassação do sursis se verifica quando o benefício fica sem efeito antes do início do período de prova Não se confunde pois com a revogação que somente pode ser decretada durante a suspensão condicional da pena A cassação pode ocorrer em quatro hipóteses O condenado não comparece injustificadamente à audiência admonitória LEP art 161 A suspensão ficará sem efeito executandose imediatamente a pena 2ª 3ª 4ª O condenado renuncia ao benefício O cumprimento do sursis é vinculado à aceitação do condenado podendo o réu preferir o cumprimento da pena O réu é irrecorrivelmente condenado a pena privativa de liberdade não suspensa A condenação à prisão durante o período de prova é causa de revogação do sursis Tem lugar a cassação todavia quando o trânsito em julgado ocorrer antes do início do período de prova pois é incompatível o cumprimento simultâneo da pena em regime fechado ou semiaberto e do sursis A pena privativa de liberdade é majorada em grau de recurso da acusação passando de dois anos O sursis anteriormente concedido é cassado pelo tribunal Sursis sucessivo é o concedido a réu que anteriormente teve a sua pena privativa de liberdade extinta em razão do cumprimento integral de sursis originário da prática de outra infração penal Essa situação é possível quando o agente após cumprir a suspensão condicional da pena comete crime culposo ou contravenção penal Por não ser reincidente em crime doloso é permitida a concessão de novo sursis São simultâneos também conhecidos como coetâneos os sursis cumpridos ao mesmo tempo Isso pode ocorrer em duas hipóteses 1ª hipótese O réu durante o período de prova é irrecorrivelmente condenado por crime culposo ou contravenção penal a pena privativa de liberdade igual ou inferior a dois anos Pode ser a ele concedido novo sursis pois não é reincidente em crime doloso e nada impede a manutenção do sursis anterior eis que a revogação é facultativa 2ª hipótese O réu antes do início do período de prova é irrecorrivelmente condenado pela prática de crime doloso sem ser reincidente e obtém novo sursis O sursis anterior é preservado pois a condenação por crime doloso apenas o revoga quando seu trânsito em julgado se verificar durante o período de prova É a situação em que a duração da suspensão condicional da pena excede o prazo do período de prova determinado na sentença condenatória Prevalece o entendimento de que durante a prorrogação do período de prova não subsistem as condições do sursis Existem no Código Penal duas hipóteses de prorrogação do período de prova 1ª hipótese O beneficiário está sendo processado por outro crime ou contravenção art 81 2º Nesse caso considerase prorrogado o prazo da suspensão até o julgamento definitivo Como o Código Penal disse considerase concluise ser automática a prorrogação ou seja independe de decisão judicial expressa nesse sentido Basta o recebimento da denúncia ou queixa e não a mera prática do crime ou contravenção penal pois a lei fala em beneficiário que está sendo processado11 A ação penal pode relacionarse a crime ou contravenção penal praticados durante o período de prova ou mesmo com infração penal cometida antes daquela cuja condenação redundou na concessão do sursis que teve seu período de prova prorrogado O fundamento da prorrogação é o seguinte não é o cometimento do crime ou da contravenção penal que autoriza a revogação do sursis mas a condenação transitada em julgado daí derivada É razoável destarte aguardar o término da ação penal para se constatar se será ou não caso de revogação seja ela obrigatória crime doloso ou facultativa contravenção penal se o réu for condenado ou de extinção da pena privativa de liberdade nos moldes do art 82 do Código Penal na hipótese de ser absolvido A mera instauração de inquérito policial não autoriza a prorrogação do período de prova 2ª hipótese Nas hipóteses de revogação facultativa art 81 3º Nesses casos o juiz pode em vez de decretar a revogação do sursis prorrogar o período de prova até o máximo se este não foi o fixado A prorrogação não é automática Depende de expressa decisão judicial nesse sentido Formulase a indagação Em se tratando de sentença declaratória o ato que declara extinta a pena privativa de liberdade na forma do art 82 do Código Penal pode o juiz depois de encerrado o período de prova prorrogálo por descobrir que o condenado está sendo processado por outro crime ou contravenção penal para decidir no futuro se o benefício deve ou não ser revogado Formaramse duas posições acerca do assunto 1ª posição É possível a prorrogação Aliás essa prorrogação é automática prescindindo de decisão judicial É o entendimento dominante consagrado inclusive no Supremo Tribunal Federal e no Superior Tribunal de Justiça12 Anotese contudo que a prorrogação será cabível desde que o juiz ainda não tenha declarado extinta a pena privativa de liberdade com o consequente trânsito em julgado De fato se já tiver transitado em julgado a declaração de extinção da punibilidade nada mais poderá ser feito 2ª posição Não se admite a prorrogação A pena estará automaticamente extinta com o término do período de prova Cumprido integralmente o período de prova sem revogação considerase extinta a pena privativa de liberdade É o que se extrai do art 82 do Código Penal A sentença é meramente declaratória e retroage ao dia em que se encerrou o período de prova Exigese prévia manifestação do Ministério Público sob pena de nulidade com fundamento no art 67 da Lei de Execução Penal Em regra as penas impostas em condenações pela prática de crimes hediondos ou equiparados tráfico de drogas tortura e terrorismo são superiores a dois anos por se tratarem de infrações penais consideradas de elevada gravidade pelo Poder Constituinte Originário e consequentemente também pelo legislador ordinário Seria extrapolado portanto o limite quantitativo para aplicação da suspensão condicional da pena Todavia é possível vislumbrar ao menos em tese algumas situações em que uma pena privativa de liberdade decorrente da prática de crime hediondo ou equiparado comporte o benefício Imaginese um tráfico de drogas art 33 caput com pena no mínimo legal 5 anos e acompanhado da causa de diminuição contida no 4º do art 33 da Lei 113432006 em seu patamar máximo 23 A pena seria de um ano e oito meses dentro do teto previsto no art 77 caput do Código Penal Questionase É cabível nesse caso a suspensão condicional da pena Formaramse duas correntes sobre o assunto 1ª Corrente É inaplicável o sursis A dimensão do benefício não se compactua com a natureza do delito em relação ao qual a própria Constituição Federal em seu art 5º XLIII determinou um tratamento mais severo É a posição dominante13 2ª Corrente É cabível o sursis o qual não foi vedado pela Lei 80721990 Lei dos Crimes Hediondos Não pode o juiz criar restrições não previstas por lei em face da inadmissibilidade no campo penal da analogia in malam partem Há decisão do Supremo Tribunal Federal nesse sentido14 Nada impede a concessão de sursis ao estrangeiro que se encontra em território nacional de forma permanente ou transitória ainda que responda a processo de expulsão por força da prática de crime comum É o que se extrai da regra contida no art 54 3º da Lei 134452017 Lei de Migração Art 54 A expulsão consiste em medida administrativa de retirada compulsória de migrante ou visitante do território nacional conjugada com o impedimento de reingresso por prazo determinado 3º O processamento da expulsão em caso de crime comum não prejudicará a progressão de regime o cumprimento da pena a suspensão condicional do processo a comutação da pena ou a concessão de pena alternativa de indulto coletivo ou individual de anistia ou de quaisquer benefícios concedidos em igualdade de condições ao nacional brasileiro Enquanto não declarada a extinção da sanção penal por força do integral decurso do período de prova do sursis sem revogação o condenado cumprirá ainda que de forma alternativa a pena privativa de liberdade Estarão presentes destarte os efeitos da condenação criminal Logo ao agente incidirá a suspensão dos direitos políticos com fulcro no art 15 III da Constituição Federal O habeas corpus não é adequado para se pleitear a concessão da suspensão condicional da pena nem para discutir o cabimento das condições legais e judiciais impostas no caso concreto pois em tais hipóteses seria necessária a análise dos requisitos subjetivos indicados pelo art 77 I e principalmente II do Código Penal E como se sabe não se admite dilação probatória na via estreita desse remédio constitucional Excepcionamse todavia situações teratológicas como exemplificativamente no caso de um antigo Prefeito a quem é imposta a condição de varrer as ruas do centro da cidade que governou Em primeira análise a suspensão condicional da pena não é compatível com a detração penal Com efeito o benefício se destina a impedir a execução de uma pena privativa de liberdade motivo pelo qual é impossível o desconto do período cumprido a título de prisão provisória no montante da pena imposta que por estar suspensa sequer é objeto de cumprimento pelo condenado Entretanto se o sursis for revogado daí resultará o cumprimento integral da pena privativa de liberdade autorizandose a partir de então a aplicação do instituto da detração penal e de todos os seus efeitos Discutese a possibilidade de incidência de indulto aos condenados que se encontram em período de prova como decorrência da suspensão condicional da execução da pena Há duas posições sobre o assunto 1ª posição É possível O indulto se destina a pessoas condenadas ao cumprimento de penas privativas de liberdade e o sursis nada mais é do que uma forma diferenciada de execução da pena Pode o decreto de indulto portanto beneficiar condenados que estejam cumprindo a suspensão condicional da pena 2ª posição Não é possível O indulto alcança somente os condenados que se encontram privados da liberdade e aquele que teve suspensa sua pena não precisa desse benefício emanado do Poder Executivo federal15 Em cumprimento ao previsto no art 59 III do Código Penal deve o magistrado depois de superado o critério trifásico e dosada a pena privativa de liberdade estabelecer o regime prisional inicial E para encontrar o regime prisional adequado o juiz se apoia nos critérios norteadores indicados pelo art 33 2º e 3º do Código Penal Superada essa etapa passa o magistrado à fase seguinte analisar a possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos ou multa Finalmente se a pena privativa de liberdade aplicada não foi substituída por restritiva de direitos ou multa e não ultrapassar dois anos o juiz ingressa na derradeira operação aferir o cabimento da suspensão condicional da pena Portanto concluise que o juiz ao decidir sobre a concessão ou não do sursis já terá definido o regime prisional para início de cumprimento da pena privativa de liberdade fechado semiaberto ou aberto respeitando o direito do condenado de saber as condições em que cumprirá a sanção penal caso não aceite o benefício ou na hipótese de ser este revogado no futuro Não deve ser aceita portanto a tese pela qual se sustenta que uma vez concedido o sursis prescindese da fixação do regime prisional Essa definição é lógica e legalmente precedente podendose concluir que se assim agir o magistrado estará violando o procedimento de aplicação da pena delineado pelo art 59 do Código Penal 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 MARTINS José Salgado Direito penal introdução e parte geral São Paulo Saraiva 1974 p 375 Cf SIQUEIRA Galdino Tratado de direito penal Parte geral Rio de Janeiro José Konfino Editor 1947 t II p 863864 Esse montante da pena também foi expressamente previsto para o sursis no tocante aos crimes contra a Segurança Nacional Lei 71701983 art 5º A valoração desfavorável quanto à culpabilidade do agravante ante a maior reprovabilidade de sua conduta consubstanciada na gravidade concreta do crime impede o deferimento da suspensão condicional da pena por ausência do requisito previsto no inciso II do art 77 do Código Penal STJ AgRg no AREsp 368384DF rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 22202013 HC 80923RJ rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 06122007 STF HC 92322PA rel orig Min Cármen Lúcia rel p o acórdão Min Marco Aurélio 1ª Turma 18122007 noticiado no Informativo 493 A consequência da revogação do sursis da pena é o cumprimento da reprimenda privativa de liberdade imposta no édito condenatório que se encontrava suspensa diante do preenchimento dos requisitos constantes no art 77 do Código Penal STJ HC 142263RS rel Min Félix Fischer 5ª Turma j 03122009 RHC 18521MG rel Min Arnaldo Esteves Lima 5ª Turma j 03042007 Em igual sentido HC 43950SP rel Min Hamilton Carvalhido 6ª Turma j 10052007 STF HC 91562PR rel Min Joaquim Barbosa 2ª Turma j 09102007 HC 175758SP rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 04102011 e REsp 723090MG rel Min Gilson Dipp 5ª Turma j 19092006 É também o pensamento do Supremo Tribunal Federal HC 114862SP rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 01102013 Esta Corte tem firmado o entendimento no sentido de que o período de prova do sursis fica automaticamente prorrogado quando o beneficiário está sendo processado por outro crime ou contravenção STJ HC 175758SP rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 04102011 12 13 14 15 STF HC 91562PR rel Min Joaquim Barbosa 2ª Turma j 09102007 e STJ REsp 723090MG rel Min Gilson Dipp 5ª Turma j 19092006 STF HC 101919MG rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 06092011 noticiado no Informativo 639 No STJ O óbice previsto no artigo 44 da Lei 113432006 à suspensão condicional da pena imposta ante tráfico de drogas mostrase afinado com a Lei 80721990 e com o disposto no inciso XLIII do artigo 5º da Constituição Federal HC 197268SP rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 26022013 HC 86698SP rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 19062007 STJ HC 276416SP rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 27032014 401 402 EVOLUÇÃO HISTÓRICA O livramento condicional surgiu no ano de 1846 na França com a decisão do magistrado Beneville que se referiu ao instituto denominandoo liberação preparatória No Brasil sua primeira manifestação ocorreu com a edição do Código Penal Republicano de 1890 arts 50 a 52 regulamentado pelos Decretos 4577 de 5 de setembro de 1922 e 16665 de 6 de novembro de 1924 A partir de então foi mantido pela legislação penal brasileira como derradeira etapa do processo escalonado de reforma do criminoso CONCEITO Livramento condicional é o benefício que permite ao condenado à pena privativa de liberdade superior a 2 dois anos a liberdade antecipada condicional e precária desde que cumprida parte da reprimenda imposta e sejam observados os demais requisitos legais A liberdade é antecipada condicional e precária Antecipada pois o condenado retorna ao convívio social antes do integral cumprimento da pena privativa de liberdade Condicional pois durante o período restante da pena período de prova o egresso submetese ao atendimento de determinadas condições fixadas na decisão que lhe concede o benefício E precária pois pode ser revogada se sobrevier uma ou mais condições previstas nos arts 86 e 87 do Código Penal Em sintonia com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal Para maior respeito à finalidade reeducativa da pena o livramento condicional constitui a última etapa da execução penal timbrada esta 403 404 pela ideia central da liberdade responsável do condenado de modo a permitirlhe melhores condições de reinserção social A Lei de Execução Penal é de ser interpretada com os olhos postos em seu art 1º Artigo que institui a lógica da prevalência de mecanismos de reinclusão social e não de exclusão do sujeito apenado no exame dos direitos e deveres dos sentenciados Isso para favorecer sempre que possível a redução de distância entre a população intramuros penitenciários e a comunidade extramuros Essa particular forma de parametrar a interpretação da lei no caso a LEP é a que mais se aproxima da Constituição Federal que faz da cidadania e da dignidade da pessoa humana dois de seus fundamentos incisos II e III do art 1º A reintegração social dos apenados é justamente pontual densificação de ambos os fundamentos constitucionais1 NATUREZA JURÍDICA O livramento condicional constituise em benefício conferido pela lei ao condenado que preenche os requisitos legais2 Embora se constitua em instituto penal restritivo da liberdade por importar em limitação de diversos direitos da pessoa humana funciona como direito subjetivo pois a liberdade precoce não pode ser negada àquele que atende a todos os mandamentos aplicáveis à espécie E nada obstante seja concedido durante a execução da pena privativa de liberdade não pode ser tratado como um de seus incidentes pois não encontra previsão nos arts 180 a 193 da Lei 72101984 Lei de Execução Penal Damásio E de Jesus entretanto apresenta posicionamento diverso Para ele cuidase de forma especial de cumprimento da pena O instituto na reforma penal de 1984 não constitui mais um direito público subjetivo de liberdade do condenado nem incidente de execução É medida penal de natureza restritiva da liberdade de cunho repressivo e preventivo Não é um benefício3 DIFERENÇAS COM O SURSIS Livramento condicional e sursis apresentam pontos comuns São benefícios conferidos aos condenados à pena privativa de liberdade que atendem a diversos requisitos previstos em lei São ainda condicionais pois durante o período de vigência dos institutos seus destinatários sujeitam se à fiscalização quanto à observância de condições judicialmente fixadas Em ambos esse período de prova tem início com a audiência admonitória E finalmente apresentam a finalidade de evitar a execução da pena privativa de liberdade total ou parcialmente Mas as diferenças são nítidas No livramento condicional o condenado retorna ao convívio social depois do cumprimento de parte da pena que lhe foi imposta dependendo da natureza do crime e de suas condições pessoais Foi condenado cumpre uma fração da reprimenda e posteriormente é colocado em liberdade Por sua vez no sursis o condenado sequer inicia o cumprimento da pena privativa de liberdade Daí o seu nome suspensão condicional da execução da pena privativa de liberdade É condenado mas a execução da sua pena é suspensa obstando seu início Distinguemse também quanto à duração Com efeito no livramento condicional o período de prova também chamado de período de experiência isto é o tempo em que o condenado deve observar as condições legais e judiciais impostas bem como respeitar as causas de revogação é representado pelo restante da pena ainda não cumprido Exemplo o réu condenado a 8 oito anos obtém o benefício depois de 4 quatro anos O período de prova será composto pelos 4 quatro anos remanescentes No sursis de seu turno o período de prova deve ser estipulado dentro dos parâmetros legalmente indicados entre 2 dois e 4 quatro anos mas que pode ser diverso tal como no sursis etário e no sursis humanitário bem como em hipóteses indicadas por leis especiais como é o caso dos crimes contra a segurança nacional Lei 71701983 art 5º Finalmente o sursis geralmente é concedido pela sentença condenatória que comporta recurso de apelação CPP art 593 e 4º Mas também pode ser concedido pelo acórdão em grau de recurso ou em se tratando de 405 competência originária dos tribunais Já o livramento condicional é obrigatoriamente deferido pelo juízo da execução e para impugnar essa decisão o recurso cabível é o agravo em execução LEP art 197 JUÍZO COMPETENTE PARA CONCESSÃO DO LIVRAMENTO CONDICIONAL O livramento condicional somente pode ser concedido depois de cumprida parte da pena privativa de liberdade Normalmente já existe trânsito em julgado da condenação inclusive com cumprimento da pena razão pela qual é competente o juízo da execução para analisar o cabimento ou não do benefício LEP art 66 III e 406 407 4071 Todavia o Supremo Tribunal Federal tem admitido a concessão do livramento condicional em sede de execução provisória isto é com o trânsito em julgado da condenação apenas para a acusação A propósito A jurisprudência do STF já não reclama o trânsito em julgado da condenação nem para a concessão do indulto nem para a progressão de regime de execução nem para o livramento condicional4 Nesse caso também será competente o juízo da execução Em face do caráter itinerante do processo de execução é competente o juízo do local em que o condenado cumpre a pena independentemente da comarca em que foi proferida a sentença condenatória Exemplo a sentença condenatória foi proferida na comarca de São Paulo mas o agente encontrase recolhido na penitenciária de Ribeirão Preto Será competente o juízo da execução desta última comarca EGRESSO É a nomenclatura dispensada pelo art 26 II da Lei de Execução Penal ao condenado beneficiado pelo livramento condicional durante o período de prova REQUISITOS O livramento condicional para ser concedido depende do preenchimento de vários requisitos objetivos e subjetivos5 Aqueles se relacionam à pena espécie quantidade e parcela já cumprida bem como à reparação do dano estes dizem respeito às condições pessoais do condenado Requisitos objetivos O art 83 I II IV e V do Código Penal exige para concessão do livramento condicional 4 quatro requisitos objetivos relacionados à pena e à reparação do dano 1 Espécie da pena Deve ser privativa de liberdade reclusão detenção ou prisão simples 2 Quantidade da pena A pena privativa de liberdade imposta ao condenado a qual se encontra em sede de execução deve ser igual ou superior a 2 dois anos Nesse ponto convém destacar que nos termos do art 84 do Código Penal As penas que correspondem a infrações diversas devem somarse para efeito do livramento Essa medida é salutar pois se não existisse estaria vedado o benefício a indivíduo que exemplificativamente fora condenado por dois furtos de diminuta gravidade cada um com pena de 1 um ano e 2 dois meses de reclusão uma vez que o montante das penas impediria o sursis enquanto para um criminoso autor de roubo com emprego de arma de fogo com pena de 7 sete anos a medida seria cabível Finalmente não há como somar a pena aplicada em sentença ainda não transitada em julgado ao cálculo do total da pena a ser cumprida para efeito de concessão do livramento condicional6 3 Parcela da pena já cumprida O montante depende das condições do condenado e da natureza do crime por ele praticado Para o condenado que não for reincidente em crime doloso e apresentar bons antecedentes basta o cumprimento de mais de um terço da pena CP art 83 I Tratase do livramento condicional simples E em relação ao reincidente em crime culposo Há duas posições a encaixase na regra prevista no art 83 I do Código Penal e b esse tratamento a ele não se aplica pois um reincidente em crime culposo não pode ser considerado possuidor de bons antecedentes No caso porém de condenado reincidente em crime doloso exigese o cumprimento de mais de metade da pena CP art 83 II É o livramento condicional qualificado E na hipótese de diversos crimes o requisito objetivo é o cumprimento de mais da metade do total das penas unificadas7 Falhou a lei contudo ao olvidarse de uma situação condenado não reincidente em crime doloso mas portador de maus antecedentes Não se a b enquadra no inciso I nem no inciso II do art 83 do Código Penal Então é de se questionar como deve ser tratado Formaramse duas posições sobre o assunto Deve receber igual tratamento dispensado ao reincidente em crime doloso de modo que o livramento condicional só será possível com o cumprimento de mais de metade da pena Como não possui bons antecedentes não se amolda ao inciso I que exige dois requisitos cumulativos não ser reincidente em crime doloso e ostentar bons antecedentes Aplicase subsidiariamente portanto a regra delineada pelo inciso II É necessário seja adotada a posição mais favorável ao condenado em face da ausência de expressa previsão legal Destarte será cabível o benefício com o cumprimento de mais de um terço da pena pois embora portador de maus antecedentes não é reincidente em crime doloso Alberto Silva Franco filiase a esse entendimento Não se pode em matéria penal interpretar em detrimento de quem sofre a aflição da pena texto que apresenta inadequação evidente pena de se configurar ilegal restrição ao pedaço da liberdade individual cerceado à ausência de norma pois a isso equivale a imprecisão a contradição ou a lacuna Não há como enquadrar como detentor de duas circunstâncias exigidas cumulativamente pela lei para a exigência do prazo maior de metade da pena quem na verdade ostenta apenas uma dessas circunstâncias contra si Impossível sair do problema que é da lei interpretandoa em detrimento do condenado em matéria penal8 É também a posição do Superior Tribunal de Justiça No caso de paciente primário de maus antecedentes como o Código não contemplou tal hipótese ao tratar do prazo para concessão do livramento condicional não se admite a interpretação em prejuízo do réu devendo ser aplicado o prazo de um terço O paciente primário com maus antecedentes não pode ser equiparado ao reincidente em seu prejuízo9 Finalmente em se tratando de condenado pela prática de crime hediondo Lei 80721990 art 1º ou equiparado tráfico de drogas tortura e terrorismo ou ainda pelo tráfico de pessoas é necessário o cumprimento de mais de dois terços da pena desde que não seja reincidente específico em delitos dessa natureza Cuidase do livramento condicional específico10 Na hipótese de execução conjunta de penas por crime hediondo ou equiparado e crime comum a concessão do livramento condicional deve ser analisada separadamente computandose por primeiro o percentual de 23 referente à condenação pelo delito hediondo ou equiparado e em seguida o percentual de 13 concernente ao delito comum11 A leitura do art 83 V do Código Penal e do art 44 parágrafo único da Lei 113432006 Lei de Drogas deixa nítida a proibição do livramento condicional para o condenado por crime hediondo ou equiparado quando reincidente específico em delito dessa natureza Tal proibição é constitucional pois a disciplina desta matéria é reservada à legislação ordinária podendo ser impedido o benefício às pessoas que revelam comportamento social desajustado e elevada periculosidade Em suma a regra é o integral cumprimento da pena facultandose à lei restringir a liberdade antecipada àqueles que não preenchem os requisitos por ela exigidos Como já decidido pelo Superior Tribunal de Justiça O livramento condicional consiste na última etapa da execução da pena visando a ressocialização do apenado atendidos os requisitos do art 83 do CP vedado contudo expressamente o benefício para reincidentes específicos A vedação legal à concessão do livramento condicional ao reincidente específico não padece de inconstitucionalidade por ofensa ao princípio da individualização da pena por atender aos fins repressivos da reprimenda12 Nesse contexto nas hipóteses em que o réu reincidente específico cumpre pena pela prática de delitos hediondos ou a eles equiparados e também de delitos não hediondos a possibilidade de concessão do livramento condicional estará condicionada ao cumprimento integral das penas referentes àqueles delitos13 a b 4072 E surge nesse ponto mais uma discussão Para fins de livramento condicional o que se entende por reincidente específico Formaramse basicamente duas posições É reincidente específico aquele que condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado pratica novamente qualquer um desses delitos ainda que tipificados por dispositivos distintos Exemplo homicídio qualificado e tráfico de drogas É a tendência atualmente dominante pois a lei dos crimes hediondos não definiu a reincidência específica e todos os delitos por ela abrangidos merecem igual tratamento por força constitucional CF art 5º XLIII É reincidente específico o agente que depois de condenado por crime hediondo ou equiparado comete idêntico delito Exemplo latrocínio e latrocínio 4 Reparação do dano Dispensase esse requisito quando comprovada a efetiva impossibilidade do condenado em atendêlo CP art 83 IV Esse requisito pode ser ainda dispensado quando a vítima não for encontrada para ser indenizada bem como quando renunciar a dívida ou mostrarse desinteressada em ser ressarcida Requisitos subjetivos Não bastam os requisitos objetivos Reclamase ainda o atendimento aos requisitos subjetivos legalmente previstos atinentes à pessoa do condenado São eles 1 Comportamento satisfatório durante a execução da pena Com a edição da Lei 107922003 o art 112 caput da Lei 72101984 Lei de Execução Penal referese ao bom comportamento carcerário e não mais ao comportamento satisfatório Contudo a redação do Código Penal foi mantida art 83 III Esse requisito deve ser comprovado pelo diretor do estabelecimento prisional levando em conta o modo de agir do condenado após o início da execução da pena de uma forma ampla desprezandose seu comportamento pretérito Na dicção do Superior Tribunal de Justiça Para a concessão de livramento condicional a avaliação da satisfatoriedade do comportamento do executado não pode ser limitada a um período absoluto e curto de tempo Embora não se possa inviabilizar a concessão do livramento condicional apenas porque durante a execução penal o condenado cometeu uma falta grave o comportamento de um recluso do sistema penitenciário há de ser aferido em sua inteireza por todo o período em que esteve cumprindo sua pena Cingir o comprovado comportamento satisfatório durante a execução da pena conforme demanda o art 83 III do CP apenas a um curto período de tempo que anteceda a análise do pedido implica dispensar o magistrado especialmente o que está em permanente contato com a realidade dos presídios de usar seu tirocínio sua experiência e as informações de que dispõe nos autos para avaliar o merecimento do benefício pretendido pelo interno O poder discricionário do juízo da execução penal não pode ser restringido a ponto de transformar a avaliação subjetiva em um simples cálculo aritmético14 E nos termos da Súmula 441 do Superior Tribunal de Justiça A falta grave não interrompe o prazo para obtenção de livramento condicional15 No caso concreto entretanto a prática de falta grave pode inviabilizar o benefício em face da ausência de um dos seus requisitos subjetivos qual seja o bom comportamento carcerário16 2 Bom desempenho no trabalho que lhe foi atribuído Nada obstante a proibição do trabalho forçado CF art 5º XLVII c o exercício de atividade laboral é obrigatório para a concessão do livramento condicional O preso não é forçado a trabalhar mas se não o fizer será vedado o benefício da liberdade antecipada Esse requisito deve ser desprezado quando em face de problemas do estabelecimento prisional nenhum trabalho foi atribuído ao condenado 3 Aptidão para prover à própria subsistência mediante trabalho honesto Exigese unicamente prova da aptidão para o exercício de trabalho honesto e não de emprego certo e garantido após a saída do estabelecimento prisional De fato requisito dessa natureza inviabilizaria o benefício pois se até mesmo muitos primários e de vida pretérita escorreita encontramse desempregados o que falarse daqueles que carregam em suas folhas de antecedentes a pecha da condenação por crimes e contravenções penais 4 Para o condenado por crime doloso cometido com violência ou grave ameaça à pessoa a constatação de condições pessoais que façam presumir que o liberado não voltará a delinquir Encontrase definido pelo art 83 parágrafo único do Código Penal e deve ser constatado pela Comissão Técnica de Classificação responsável pela elaboração e fiscalização do programa de individualização da execução penal LEP arts 5º a 9º Fazse um juízo de prognose direcionado ao futuro com o propósito de constatar se em razão de suas condições pessoais é provável a reincidência pelo condenado Em caso positivo negase o benefício Esse requisito obrigatório para os crimes cometidos com violência à pessoa ou grave ameaça é facultativo para os demais delitos Pode ser inclusive realizado exame criminológico para elaboração desse prognóstico Esse procedimento entretanto encontra resistência em parte da jurisprudência em face da ausência de previsão legal 408 RITO DO LIVRAMENTO CONDICIONAL O pedido de livramento condicional deve ser endereçado ao juízo da execução LEP arts 66 III e e 131 Não precisa ser subscrito por advogado a teor do art 712 caput do Código de Processo Penal O livramento condicional poderá ser concedido mediante requerimento do sentenciado de seu cônjuge ou de parente em linha reta ou por proposta do diretor do estabelecimento penal ou por iniciativa do Conselho Penitenciário E antes de sua decisão o juiz deve ouvir o Ministério Público sob pena de nulidade LEP arts 67 e 131 Discutese a necessidade de manifestação do Conselho Penitenciário antes da concessão do livramento condicional A polêmica reside na Lei 107922003 que alterou diversos dispositivos da Lei de Execução Penal Com efeito entre as incumbências do Conselho Penitenciário não mais se inclui emitir parecer sobre livramento condicional pois esse encargo foi eliminado do art 70 I da Lei de Execução Penal pela lei acima indicada Entretanto essa mesma lei não modificou o art 131 da Lei de Execução Penal que reclama a oitiva do Conselho Penitenciário Essa é a polêmica Prescindese ou não do parecer do Conselho Penitenciário Há duas posições sobre o assunto 1ª posição É necessário o parecer do Conselho Penitenciário Embora a Lei 107922003 tenha retirado do art 70 I da Lei de Execução Penal dentre as incumbências do Conselho Penitenciário a de emitir parecer sobre livramento condicional remanesce no art 131 da LEP a necessidade dessa manifestação no procedimento da liberdade antecipada 2ª posição Com a edição da Lei 107922003 dispensase o parecer do Conselho Penitenciário Pode o juiz da execução portanto conceder ou denegar o livramento condicional sem a prévia manifestação desse órgão Anotese contudo que o parecer do Conselho Penitenciário não foi extirpado peremptoriamente Fica à discricionariedade do juiz quando reputar necessário determinar sua realização Para o Supremo Tribunal Federal A Lei 107922003 deu nova redação ao artigo 112 da Lei de Execuções Penais Lei n 72101984 excluindo a previsão de exame criminológico para a obtenção da progressão de regime livramento condicional indulto e comutação de penas O silêncio da Lei a respeito da obrigatoriedade do exame criminológico contudo não inibe o juízo da execução do poder de determinálo desde que fundamentadamente Isso porque a análise do requisito subjetivo pressupõe a verificação do mérito do condenado que não está adstrito ao bom comportamento carcerário como faz parecer a literalidade da lei sob pena de concretizarse o absurdo de transformar o diretor do presídio no verdadeiro concedente do benefício e o juiz em simples homologador17 Ressaltese porém qualquer que seja a posição adotada que a 409 manifestação do Conselho Penitenciário tipicamente de índole administrativa tanto pela concessão como pela denegação do livramento condicional não vincula o juízo da execução que pode acolher ou rejeitar o parecer lançado Vejase a propósito o teor do art 713 do Código de Processo Penal As condições de admissibilidade conveniência e oportunidade da concessão do livramento serão verificadas pelo Conselho Penitenciário a cujo parecer não ficará entretanto adstrito o juiz Finalmente a decisão judicial que concede ou denega o livramento condicional pode ser impugnada por recurso de agravo LEP art 197 Concedido o benefício será expedida carta de livramento com cópia integral da decisão judicial em duas vias remetendose uma à autoridade administrativa incumbida da sua execução e outra ao Conselho Penitenciário LEP art 136 Após em dia marcado pelo presidente do Conselho Penitenciário será realizada audiência admonitória consistente em cerimônia solene no estabelecimento onde o condenado cumpre a pena privativa de liberdade observandose o procedimento previsto no art 137 da Lei de Execução Penal I a sentença será lida ao liberando na presença dos demais condenados pelo presidente do Conselho Penitenciário ou membro por ele designado ou na falta pelo juiz II a autoridade administrativa chamará a atenção do liberando para as condições impostas na sentença de livramento e III o liberando declarará se aceita as condições Se aceitar as condições o liberado ao sair do estabelecimento penal receberá uma caderneta que exibirá à autoridade judiciária ou administrativa sempre que lhe for exigida LEP art 138 caput CONDIÇÕES Como indica o próprio nome do instituto o livramento é condicional Com efeito a liberdade antecipada se sujeita ao cumprimento de condições a serem observadas pelo condenado durante o período de prova ou de experiência isto é pelo tempo restante da pena privativa de liberdade Esse período de prova tem início com a cerimônia realizada no a b c a b estabelecimento prisional em que o condenado cumpre a pena realizada após a concessão do benefício pelo juízo da execução Na cerimônia com suas etapas definidas pelo art 137 da Lei de Execução Penal o condenando declara se aceita ou não as condições a que fica subordinado o livramento CP art 85 Essas condições podem ser legais ou judiciais Condições legais são as que decorrem do mandamento legal Estão previstas em rol taxativo Nos termos do art 132 1º da Lei de Execução Penal serão sempre impostas ao liberado condicional as obrigações seguintes obter ocupação lícita dentro de prazo razoável se for apto para o trabalho Esse prazo razoável deve ser estipulado pelo juiz Entendese que se o condenado for pessoa portadora de deficiência física impeditiva de atividade laborativa não se impõe essa condição comunicar periodicamente ao juiz sua ocupação O prazo da comunicação também deve ser indicado pelo magistrado Na praxe normalmente é mensal não mudar do território da comarca do Juízo da Execução sem prévia autorização deste Sem prejuízo dessas condições podem ainda ser impostas condições judiciais Não são de aplicação peremptória reservando espaço para a discricionariedade do magistrado Estão indicadas em rol exemplificativo pois o juiz da execução tem a faculdade de estabelecer outras condições desde que adequadas ao caso e em conformidade com os direitos constitucionais do condenado Em conformidade com o art 132 2º da Lei de Execução Penal poderão ser ainda impostas ao liberado condicional entre outras obrigações as seguintes não mudar de residência sem comunicação ao juiz e à autoridade incumbida da observação cautelar e de proteção recolherse à habitação em hora fixada e c 4010 não frequentar determinados lugares Nas duas últimas condições b e c o juízo da execução deve indicar precisamente qual o horário para recolhimento da habitação e os lugares cuja frequência está proibida Falase ainda em condições legais indiretas Consistem nas causas de revogação do livramento condicional e recebem esse nome pela razão de se constituírem em condições negativas ou seja revogam o benefício se estiverem presentes Portanto o condenado para não ensejar a revogação da liberdade antecipada durante o período de prova deve evitar que tais acontecimentos se verifiquem REVOGAÇÃO DO LIVRAMENTO CONDICIONAL O livramento condicional é precário Destarte é inerente ao benefício sua possibilidade de revogação a qualquer momento desde que não sejam cumpridas suas condições legais judiciais ou indiretas A revogação pode ser obrigatória ou facultativa e suas causas encontramse disciplinadas pelos arts 86 e 87 do Código Penal Deve ser decretada pelo juiz da execução de ofício a requerimento do Ministério Público ou mediante representação do Conselho Penitenciário Em qualquer caso o juiz deve proceder à prévia oitiva do condenado sob pena de nulidade por violação do princípio constitucional da ampla defesa 40101 401011 Revogação obrigatória De acordo com o art 86 do Código Penal Art 86 Revogase o livramento se o liberado vem a ser condenado a pena privativa de liberdade em sentença irrecorrível I por crime cometido durante a vigência do benefício II por crime anterior observado o disposto no art 84 deste Código Podem ser retiradas algumas conclusões desse dispositivo legal Inicialmente são causas legais de revogação pois ao magistrado não é dado o direito de recusálas Decorrem da lei sem qualquer margem de discricionariedade para o Poder Judiciário Ademais a condenação irrecorrível por contravenção penal qualquer que seja o momento de sua prática com aplicação de pena privativa de liberdade não autoriza a revogação obrigatória do livramento condicional Essa posição se reforça com a análise do art 87 do Código Penal que permite a revogação facultativa do benefício quando o liberado é condenado irrecorrivelmente por contravenção penal a pena que não seja privativa de liberdade Se não bastasse não é possível a revogação obrigatória do livramento condicional quando o crime é cometido antes da cerimônia do livramento condicional mas após a decisão judicial que concedeu o benefício De fato o inciso I referese ao crime cometido durante a vigência do benefício ao passo que o inciso II reportase a crime anterior Finalmente a decisão judicial que revoga o livramento condicional em razão de condenação irrecorrível dispensa fundamentação pois toda a motivação já foi efetuada na sentença condenatória limitandose o juízo da execução a reconhecêla Inciso I O liberado deve ser condenado à pena privativa de liberdade por decisão transitada em julgado por crime cometido durante a vigência do benefício Nesse caso o juiz poderá ordenar a prisão do liberado ouvidos o a b c Conselho Penitenciário e o Ministério Público suspendendo o curso do livramento condicional cuja revogação entretanto ficará dependendo da decisão final LEP art 145 Se a decisão final for condenatória e transitar em julgado o juiz deverá revogar o livramento condicional De fato o juiz não poderá declarar extinta a pena enquanto não passar em julgado a sentença em processo a que responde o liberado por crime cometido na vigência do livramento CP art 89 Na esteira da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal À luz do disposto no art 86 I do Código Penal e no art 145 da Lei das Execuções Penais se durante o cumprimento do benefício o liberado cometer outra infração penal o juiz poderá ordenar a sua prisão suspendendo o curso do livramento condicional cuja revogação entretanto aguardará a conclusão do novo processo instaurado A suspensão do livramento condicional não é automática Pelo contrário deve ser expressa por decisão fundamentada para se aguardar a apuração da nova infração penal cometida durante o período de prova e então se o caso revogar o benefício18 E como violou a confiança nele depositada pelo juízo da execução praticando um crime durante a vigência do benefício os efeitos da revogação são rigorosos quais sejam não se computa na pena o tempo em que esteve solto o liberado não se concede em relação à mesma pena novo livramento e não se pode somar o restante da pena cominada ao crime à nova pena para fins de concessão de novo livramento É o que se extrai do art 88 do Código Penal19 bem como dos arts 141 e 142 da Lei de Execução Penal Para o Superior Tribunal de Justiça Praticado pelo condenado novo crime com trânsito em julgado no curso do livramento condicional deverá o benefício ser revogado e o lapso de tempo em que o beneficiário ficou em liberdade não será computado como pena cumprida O gozo do livramento condicional requer responsabilidade do beneficiário e um comportamento afastado da vida 401012 a b c delitiva de forma que ele dê mostras de que merece desfrutar do convívio social sob pena de ver revogado o benefício e perdido o lapso temporal que esteve em liberdade20 Inciso II O livramento condicional deve ser revogado quando o liberado vem a ser condenado a pena privativa de liberdade em sentença irrecorrível por crime anterior observado o disposto no art 84 do Código Penal A referência ao art 84 tem o seguinte significado somente é possível a revogação quando a nova pena privativa de liberdade somada à anterior que ensejou o livramento condicional resultar na impossibilidade de manutenção do benefício Exemplo depois de condenado a 12 anos de reclusão o réu primário e com bons antecedentes cumpriu mais de quatro anos da pena e a ele foi concedida a liberdade antecipada Após dois anos no gozo do benefício e portanto faltando seis anos para a extinção da pena privativa de liberdade é condenado a 20 anos de reclusão por crime anterior Sua pena faltante somadas as duas é de 26 anos razão pela qual é incompatível preservar o livramento condicional com os seis anos de pena até então cumpridos que representam menos de um terço do total Como entretanto o liberado não abusou a confiança nele depositada pelo Poder Judiciário pois o crime foi cometido antes da concessão da liberdade antecipada os efeitos da revogação são mais suaves quais sejam computase como cumprimento da pena o tempo em que o condenado esteve solto admitese a soma do tempo das duas penas para concessão de novo livramento e permitese novo livramento condicional desde que o condenado tenha cumprido mais de um terço ou mais de metade do total da pena imposta soma das penas conforme seja primário e portador de bons antecedentes ou reincidente em crime doloso É o que consta do art 88 do Código Penal e dos arts 141 e 142 da Lei de Execução Penal Como já decidido pelo Superior Tribunal de Justiça 40102 Determina o art 141 da Lei de Execução Penal que se a revogação do livramento condicional for motivada por infração penal anterior à vigência do benefício computarseá como tempo de cumprimento da pena o período de prova sendo permitida para a concessão de novo livramento a soma do tempo das duas penas Por seu turno o art 142 do mesmo diploma legal estabelece que no caso de revogação por outro motivo não se computará na pena o tempo em que esteve solto o liberado e tampouco se concederá em relação à mesma pena novo livramento21 Revogação facultativa Nos termos do art 87 do Código Penal Art 87 O juiz poderá também revogar o livramento se o liberado deixar de cumprir qualquer das condições constantes da sentença ou for irrecorrivelmente condenado por crime ou contravenção a pena que não seja privativa de liberdade O dispositivo citado contém causas judiciais de revogação do livramento condicional pois fica a critério do magistrado eventual manutenção do benefício E se decidir não revogálo o juiz deverá advertir o liberado ou agravar as condições impostas LEP art 140 parágrafo único22 A revogação facultativa é possível em duas hipóteses 1ª hipótese Se o liberado deixar de cumprir qualquer das obrigações constantes da sentença O motivo dessa causa é simples o livramento é condicional mas o condenado não cumpre as condições assumidas por ocasião da concessão do benefício Se ele não honrou sua palavra o Estado pode revogar a liberdade antecipada com a consequente retomada da execução da pena privativa de liberdade O descumprimento de qualquer condição legal ou judicial faculta a revogação do livramento condicional É prudente contudo sem prejuízo da prévia oitiva do condenado LEP art 143 que lhe seja feita nova advertência com reiteração das condições impostas ou mesmo com o 4011 agravamento de tais condições Em suma razoável tentarse a manutenção do benefício e somente revogálo com o desatendimento reiterado das condições que lhe são inerentes Porém se o juiz optar pela revogação do benefício seus efeitos serão rigorosos pois o liberado abusou da confiança nele depositada pelo Estado Como se infere do art 88 do Código Penal não se desconta na pena o tempo em que esteve solto o condenado e também não se permite a concessão no tocante à mesma pena de novo livramento condicional 2ª hipótese Se o liberado for irrecorrivelmente condenado por crime ou contravenção a pena que não seja privativa de liberdade É irrelevante o momento da prática do crime ou da contravenção penal isto é se antes do livramento condicional ou durante o período de experiência Salientese porém que a revogação facultativa depende de condenação irrecorrível a pena que não seja privativa de liberdade A condenação irrecorrível a pena privativa de liberdade pela prática de crime induz à revogação obrigatória CP art 86 e não gera nenhum efeito se decorrente de contravenção penal De acordo com a regra estipulada pelo art 88 do Código Penal variam os efeitos todavia em razão do momento em que a infração penal foi praticada Se cometido o crime ou contravenção penal anteriormente ao benefício os efeitos são os seguintes descontase da pena o tempo em que esteve solto o condenado e também se permite novo livramento condicional em relação à mesma pena Por outro lado se praticado o crime ou contravenção penal na vigência do benefício os efeitos são mais graves não se desconta da pena o tempo em que esteve solto o condenado e não se autoriza a concessão no tocante à mesma pena de novo livramento condicional SUSPENSÃO DO LIVRAMENTO CONDICIONAL Dispõe o art 145 da Lei de Execução Penal Praticada pelo liberado outra infração penal o juiz poderá ordenar a sua prisão ouvidos o Conselho Penitenciário e o Ministério Público suspendendo o curso do livramento condicional cuja revogação entretanto ficará dependendo da decisão final A revogação do livramento condicional tanto na modalidade obrigatória como na forma facultativa quando motivada pela prática de crime ou contravenção penal depende do trânsito em julgado da condenação É o que consta expressamente dos arts 86 e 87 do Código Penal Pode acontecer entretanto de ser moroso o trâmite da ação penal iniciada em razão do cometimento do crime ou da contravenção penal a ponto de não haver decisão definitiva ao tempo do término do período de prova do livramento condicional Nesse caso deveria ser declarada a extinção da pena privativa de liberdade com fulcro no art 90 do Código Penal Esse procedimento levaria ao inconveniente de posteriormente à extinção da pena privativa de liberdade ser o agente definitivamente condenado por crime ou contravenção penal cometidos antes ou durante a vigência do benefício Para superar esse entrave o art 145 da Lei de Execução Penal permite ao magistrado depois de ouvidos o Conselho Penitenciário e o Ministério Público a suspensão do livramento condicional até a decisão final O dispositivo legal é aplicável às hipóteses descritas pelo art 86 I e II bem como pelo art 87 ambos do Código Penal Com efeito o art 145 da LEP limitase a falar em prática de outra infração penal crime ou contravenção pouco importando se na vigência do livramento condicional ou em momento pretérito Não se exige portanto condenação definitiva bastando o cometimento do crime ou da contravenção penal23 Ademais a condenação por sentença irrecorrível decorrente de crime do qual resulte pena privativa de liberdade deve ensejar a revogação do benefício enquanto a condenação definitiva por crime ou contravenção penal a pena que não seja privativa de liberdade pode produzir igual efeito Mas não é possível a suspensão do livramento condicional quando o liberado deixa de cumprir qualquer das obrigações decorrentes da sentença CP art 87 1ª parte pois a Lei de Execução Penal autoriza essa medida somente quando praticada outra infração penal24 4012 PRORROGAÇÃO DO PERÍODO DE PROVA É cabível a prorrogação do período de prova quando o beneficiário responde a ação penal em razão de crime cometido na vigência do livramento condicional É o que dispõe o art 89 do Código Penal O juiz não poderá declarar extinta a pena enquanto não passar em julgado a sentença em processo a que responde o liberado por crime cometido na vigência do livramento O juiz da vara das execuções não poderá declarar a extinção da pena privativa de liberdade enquanto não transitar em julgado a sentença proferida na ação penal ajuizada em decorrência do crime cometido na vigência do livramento condicional Deve prorrogar o período de prova até o trânsito em julgado da sentença que poderá ser condenatória ou absolutória Durante a prorrogação não subsistem as condições do livramento condicional desde que já tenha sido ultrapassado o período de prova ou seja já tenha se esvaído o tempo restante da pena privativa de liberdade A dúvida reside em saber se essa prorrogação é automática ou se depende de expressa decisão judicial Há duas posições sobre o assunto 1ª posição A prorrogação é automática e prescinde de decisão judicial Para essa corrente basta o recebimento da denúncia ou da queixa É o entendimento que se extrai da leitura do art 89 do Código Penal 2ª posição A prorrogação não é automática e depende de decisão judicial expressa É a posição do Supremo Tribunal Federal À luz do disposto no art 86 I do Código Penal e no art 145 da Lei das Execuções Penais se durante o cumprimento do benefício o liberado cometer outra infração penal o juiz poderá ordenar a sua prisão suspendendo o curso do livramento condicional cuja revogação entretanto aguardará a conclusão do novo processo instaurado A suspensão do livramento condicional não é automática Pelo contrário deve ser expressa por decisão fundamentada para se aguardar a apuração da nova infração penal cometida durante o período de prova e então se o caso revogar o benefício25 a b c 4013 Para ambas as posições a prorrogação somente é possível em relação a crime cometido na vigência do benefício pois o crime anterior permite o desconto na pena do tempo em que esteve solto o condenado Destarte seria inócuo prorrogar o benefício além do período de prova uma vez que a pena privativa de liberdade já estaria integralmente cumprida Pouco importa seja o crime doloso ou culposo punido com reclusão ou detenção Não se admite entretanto a prorrogação do período de prova no caso de contravenção penal cometida durante a vigência do livramento condicional pois a lei fala somente em crime Com o término da prorrogação em razão de crime cometido durante a vigência do benefício operandose o trânsito em julgado da sentença podem ocorrer as seguintes situações o liberado é absolvido declarase a extinção da pena privativa de liberdade o liberado é condenado a pena privativa de liberdade o benefício é obrigatoriamente revogado CP art 86 I e II e o liberado é condenado a pena que não seja privativa de liberdade a revogação do livramento condicional é facultativa CP art 87 in fine EXTINÇÃO DA PENA Superado sem revogação o período de prova do livramento condicional considerase extinta a pena privativa de liberdade CP art 9026 Como estatui a Súmula 617 do Superior Tribunal de Justiça A ausência de suspensão ou revogação do livramento condicional antes do término do período de prova enseja a extinção da punibilidade pelo integral cumprimento da pena Cuidase de sentença meramente declaratória com eficácia retroativa ex tunc à data em que se encerrou o período de prova Destarte extinguese a pena privativa de liberdade com o término sem revogação do período de prova e não com a decisão judicial que se limita a reconhecer o fim da sanção 4014 40141 40142 40143 penal Antes da decretação da extinção da pena privativa de liberdade o magistrado deve ouvir o Ministério Público LEP art 67 QUESTÕES DIVERSAS SOBRE LIVRAMENTO CONDICIONAL Livramento condicional insubsistente É aquele em que o condenado foge do estabelecimento prisional depois da concessão do benefício mas antes da aceitação das condições realizada por ocasião da cerimônia solene descrita pelo art 137 da Lei de Execução Penal Não há causa para revogação do livramento condicional que deve ser considerado insubsistente Utilizase igual raciocínio para a hipótese em que o condenado a quem foi deferido o livramento condicional não comparece por qualquer motivo na referida cerimônia Livramento condicional e habeas corpus O habeas corpus não é meio adequado para discutir eventual equívoco da decisão do juízo da execução que denegou o livramento condicional De fato no bojo do remédio constitucional não se admite dilação probatória indispensável para análise do preenchimento dos requisitos legais exigidos para concessão do benefício Em hipóteses excepcionais porém o tribunal ad quem pode conceder livramento condicional em sede de habeas corpus quando a decisão denegatória for teratológica isto é manifestamente ilegal e todos os requisitos legais estiverem documentalmente comprovados27 Livramento condicional humanitário É o livramento condicional deferido ao condenado que ainda não cumpriu o montante da pena legalmente exigido CP art 83 I II ou V mas está acometido por enfermidade grave e incurável Baseiase em razões de piedade de forma análoga ao sursis humanitário 40144 40145 Não pode ser permitido por ausência de previsão legal Para a concessão do livramento condicional o condenado deve atender a todos os requisitos objetivos e subjetivos exigidos pela legislação em vigor Livramento condicional cautelar Cuidase de criação pretoriana aplicável em duas hipóteses 1 em substituição ao regime aberto visando evitar a inócua prisão domiciliar em face da inexistência de Casa de Albergado e 2 nos casos em que o condenado preenche os requisitos objetivos mas o juízo aguarda o parecer do Conselho Penitenciário para aqueles que acreditam ainda ser essa medida necessária perante a Lei de Execução Penal Se o parecer posteriormente for favorável ratificase o livramento condicional e se negativo ordenase o retorno ao estabelecimento prisional Essa modalidade de livramento condicional deve ser rejeitada Na primeira hipótese por constituirse em decisão judicial estranha ao pedido o regime aberto deve ser deferido ou indeferido não se permitindo a criação de uma terceira alternativa automaticamente excluída E na segunda hipótese por ausência de previsão legal ou estão presentes os requisitos do livramento condicional e o benefício deve ser concedido ou estão ausentes e há de ser negado Não se permite uma meia concessão da liberdade antecipada Livramento condicional para estrangeiro É possível a concessão de livramento condicional ao estrangeiro que cumpre pena no território nacional imposta pela prática de crime comum ainda que esteja em trâmite seu processo de expulsão Extraise tal conclusão do art 54 3º da Lei 134452017 Lei de Migração Art 54 A expulsão consiste em medida administrativa de retirada compulsória de migrante ou visitante do território nacional conjugada com o impedimento de reingresso por prazo determinado 3º O processamento da expulsão em caso de crime comum não prejudicará a progressão de regime o cumprimento da pena a suspensão condicional do processo a comutação da pena ou a concessão de pena alternativa de indulto coletivo ou individual de anistia ou de quaisquer benefícios concedidos em igualdade de condições ao nacional brasileiro 1 2 3 4 5 6 7 8 HC 99652RS rel Min Carlos Britto 1ª Turma j 03112009 No STJ HC 235480SP rel Min Gilson Dipp 5ª Turma j 26062012 STF HC 119938RJ rel Min Rosa Weber 1ª Turma j 03062014 e STJ HC 277229RS rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 18092014 JESUS Damásio E de Direito penal Parte geral 28 ed 2 tir São Paulo Saraiva 2006 v 1 p 625 HC 87801SP rel Min Sepúlveda Pertence 1ª Turma j 02052006 No mesmo sentido HC 90813SP rel Min Cármen Lúcia 1ª Turma j 24042007 É também o entendimento do STJ REsp 1154726RS rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 08052014 STF HC 106218RS rel Min Dias Toffoli 1ª Turma j 26042011 e STJ HC 287754RN rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 20032014 HC 48269RS rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 19042007 noticiado no Informativo 317 Esta Corte possui orientação no sentido de que ao sentenciado reincidente em crime doloso deve ser adotado o lapso preconizado no art 83 II do Código Penal impondose o transcurso do patamar de 12 um meio da sanção para a obtenção da liberdade clausulada não havendo de se cogitar na aplicação concomitante do patamar de 13 um terço para a execução de pena aplicada ao tempo em que o réu ostentava a primariedade e de 12 um meio para as demais execuções STJ EDcl no HC 267328MG rel Min Moura Ribeiro 5ª Turma j 03062014 E também Na definição do requisito objetivo para a concessão de livramento condicional a condição de reincidente em crime doloso deve incidir sobre a somatória das penas impostas ao condenado ainda que a agravante da reincidência não tenha sido reconhecida pelo juízo sentenciante em algumas das condenações Isso porque a reincidência é circunstância pessoal que interfere na execução como um todo e não somente nas penas em que ela foi reconhecida STJ HC 307180RS rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 16042015 noticiado no Informativo 561 FRANCO Alberto Silva STOCO Rui Código penal e sua interpretação jurisprudencial Parte geral 7 ed São Paulo RT 2001 v 1 p 1543 1544 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 HC 102278RJ rel Min Jane Silva Desembargadora convocada do TJMG 6ª Turma j 03042008 Esta exigência é legítima e não ofende a Constituição Federal STJ HC 311656SP rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 25082015 noticiado no Informativo 568 e HC 168588SP rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 14122010 noticiado no Informativo 460 STJ HC 267328MG rel Min Moura Ribeiro 5ª Turma j 25022014 HC 139511RJ rel Min Arnaldo Esteves Lima 5ª Turma j 06102009 STJ HC 84189RJ rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 18122007 REsp 1325182DF rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 20022014 noticiado no Informativo 535 É também o entendimento do STF HC 100062SP rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 20042010 STF HC 118325SP rel Min Teori Zavascki 2ª Turma j 05112013 e STF HC 113763SP rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 17092013 RHC 121851SP rel Min Luiz Fux 1ª Turma j 13052014 É também o entendimento do STJ AgRg no HC 302033SP rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 04092014 HC 119938RJ rel Min Rosa Weber 1ª Turma j 03062014 Para o STF o art 88 do Código Penal é aplicável unicamente ao livramento condicional não incidindo no tocante à comutação da pena HC 98422RJ rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 05102010 noticiado no Informativo 603 AgRg no REsp 897696RS rel Min Jane Silva Desembargadora convocada do TJMG 6ª Turma j 29042008 Em igual sentido HC 271907SP rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 27032014 noticiado no Informativo 539 REsp 1154726RS rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 08052014 Na hipótese de deixar de cumprir uma das condições impostas pelo Juízo da Execução Penal o liberado poderá ter seu benefício revogado ser advertido ou as suas condições poderão ser agravadas STJ AgRg no REsp 1236295RS rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 24092013 STJ HC 15379RS rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 18032010 24 25 26 27 noticiado no Informativo 427 O STJ já decidiu em sentido contrário O Superior Tribunal de Justiça ao fazer a interpretação conjugada do art 87 do Código Penal com o art 145 da Lei de Execução Penal entende que não obstante a revogação do livramento condicional dependa da prévia oitiva do apenado a suspensão cautelar do benefício quando o liberado deixa de cumprir as obrigações que lhe são impostas prescinde de tal formalidade AgRg no RHC 49213MG rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 04092014 STF HC 119938RJ rel Min Rosa Weber 1ª Turma j 03062014 Inexistindo portanto decisão que suspenda cautelarmente o livramento condicional e transcorrendo sem óbice o prazo do benefício é impositivo nos termos da jurisprudência desta Corte reconhecer a extinção da pena pelo integral cumprimento STJ HC 295881SP rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 26082014 O STF compartilha deste entendimento HC 119938RJ rel Min Rosa Weber 1ª Turma j 03062014 Condenação é o ato exclusivo do Poder Judiciário que representado por um de seus membros e depois de obedecido o devido processo legal aplica em sentença ou acórdão uma pena ao agente culpável reconhecido como responsável por um fato típico e ilícito Efeitos da condenação são todas as consequências que direta ou indiretamente atingem a pessoa do condenado por sentença penal transitada em julgado Esses efeitos não se limitam ao campo penal incidindo também nas áreas cível administrativa trabalhista e políticoeleitoral entre outras Para se falar em seus efeitos por óbvio reclamase a existência de uma sentença penal condenatória com trânsito em julgado Sentença penal condenatória é aquela proferida em regular ação penal impondo pena ao envolvido autor coautor ou partícipe em um crime ou contravenção penal Transitada em julgado é a decisão judicial que não mais comporta recursos A sentença que aplica medida de segurança aos inimputáveis do art 26 caput do Código Penal tem natureza absolutória CPP art 386 parágrafo único1 Por corolário ausente a condenação não produz os efeitos ora em estudo Por outro lado a sentença que aplica medida de segurança aos semi imputáveis do art 26 parágrafo único do Código Penal é condenatória De fato o sistema vicariante acolhido por nosso sistema jurídico impõe ao juiz a condenação do agente com redução da pena de um a dois terços e posteriormente se recomendável a substituição da pena diminuída por medida de segurança CP art 98 caput De seu turno a decisão judicial que implementa a transação penal é homologatória do acordo celebrado entre o Ministério Público e o autor do fato Como não há condenação é vedado falar em seus efeitos Como já decidido pelo Supremo Tribunal Federal As consequências jurídicas extrapenais previstas no art 91 do CP são decorrentes de sentença penal condenatória Isso não ocorre portanto quando há transação penal cuja sentença tem natureza meramente homologatória sem qualquer juízo sobre a responsabilidade criminal do aceitante As consequências geradas pela transação penal são essencialmente aquelas estipuladas por modo consensual no respectivo instrumento de acordo Apesar de não possuírem natureza penal propriamente dita não haveria dúvidas de que esses efeitos constituiriam drástica intervenção estatal no patrimônio dos acusados razão pela qual sua imposição só poderia ser viabilizada mediante a observância do devido processo que garantisse ao acusado a possibilidade de exercer seu direito de resistência por todos os meios colocados à sua disposição Ou seja as medidas acessórias previstas no art 91 do CP embora incidissem ex lege exigiriam juízo prévio a respeito da culpa do investigado sob pena de transgressão ao devido processo legal2 Esta conclusão também é extraída da Súmula Vinculante 35 do Supremo Tribunal Federal A homologação da transação penal prevista no art 76 da Lei 90991995 não faz coisa julgada material e descumpridas suas cláusulas retomase a situação anterior possibilitandose ao Ministério Público a continuidade da persecução penal mediante oferecimento de denúncia ou requisição de inquérito policial Os efeitos da condenação se dividem em principais e secundários a b c d e São a imposição da pena privativa de liberdade restritiva de direitos pecuniária e ainda de medida de segurança ao semiimputável dotado de periculosidade A imposição de sanção penal é sem dúvida o efeito precípuo da condenação A circunstância de estar o condenado obrigado a cumprila todavia não afasta a existência de outros efeitos de cunho penal ou não que em determinadas situações obrigatoriamente a ela aderem Também conhecidos como efeitos mediatos acessórios reflexos ou indiretos constituemse em consequências da sentença penal condenatória como fato jurídico Os efeitos secundários se dividem em dois blocos penais e extrapenais Estão previstos no Código Penal e fora dele O trânsito em julgado da sentença penal condenatória gera diversos efeitos jurídicos3 destacandose no Código Penal caracterização da reincidência se posteriormente for praticado novo crime com todas as consequências daí resultantes arts 63 e 64 fixação de regime fechado para cumprimento da pena privativa de liberdade se for cometido novo crime art 33 2º configuração de maus antecedentes art 59 impedimento à concessão da suspensão condicional da pena quando da prática de novo crime e revogação obrigatória ou facultativa do sursis e do livramento condicional arts 77 I e 1º 81 I 86 caput e 87 aumento ou interrupção do prazo da prescrição da pretensão executória arts 110 caput e 117 VI em face do reconhecimento da reincidência quando da prática de novo crime f g h revogação da reabilitação como consequência do reconhecimento da reincidência art 95 conversão da pena restritiva de direitos por privativa de liberdade se não for possível ao condenado o cumprimento simultâneo da pena substitutiva anterior art 44 5º e vedação da concessão de privilégios a crimes contra o patrimônio como desdobramento do reconhecimento da reincidência arts 155 2º 170 e 171 1º Produz também efeitos na legislação especial tal como a impossibilidade de concessão da transação penal e da suspensão condicional do processo na eventual prática de novo delito arts 76 2º I e 89 caput da Lei 90991995 São assim denominados extrapenais por incidirem em áreas diversas do Direito Dividemse em genéricos e específicos Efeitos genéricos chamados dessa maneira por recaírem sobre todos os crimes são os previstos no art 91 do Código Penal obrigação de reparar o dano e confisco A interpretação a contrario sensu do art 92 parágrafo único do Código Penal mostra serem tais efeitos automáticos ou seja não precisam ser expressamente declarados na sentença Toda condenação os produz Efeitos específicos são os indicados pelo art 92 do Código Penal perda do cargo função pública ou mandato eletivo inc I incapacidade para o exercício do poder familiar da tutela ou da curatela inc II e inabilitação para dirigir veículo quando utilizado como meio para a prática de crime doloso inc III Têm essa denominação pelo fato de serem aplicados somente em determinados crimes Por fim não são automáticos necessitando de expressa motivação na sentença condenatória para produzirem efeitos É o que consta do art 92 parágrafo único do Código Penal Para o art 91 I do Código Penal é efeito da condenação tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime Em sintonia com esse dispositivo o art 63 do Código de Processo Penal estatui que transitada em julgado a sentença condenatória poderão promoverlhe a execução no juízo cível para efeito de reparação do dano o ofendido seu representante legal e seus herdeiros Nesse sentido estabelece o art 515 VI do Código de Processo Civil de 2015 ser título executivo judicial a sentença penal condenatória transitada em julgado Recordese que a sentença que concede perdão judicial não é condenatória mas declaratória da extinção da punibilidade Súmula 18 do STJ Por outro lado a sentença que aplica medida de segurança ao inimputável é absolutória enquanto a que impõe igual sanção penal ao semiimputável é condenatória O cometimento de um crime acarreta na atribuição de duas responsabilidades ao autor uma penal e outra civil e nada obstante tais instâncias sejam independentes seria desarrazoado exigir que já presente uma sentença penal condenatória com trânsito em julgado reconhecendo a prova da autoria e da materialidade de um fato delituoso tivesse a vítima ou seu representante legal a necessidade de iniciar uma ação de conhecimento para conseguir a reparação do dano Buscase assim facilitar o ressarcimento da vítima Já estará reconhecido o caráter ilícito do fato bem como a obrigação de reparar o dano an debeatur Entretanto como o título executivo é incompleto a sentença penal deverá ser liquidada por artigos para se apurar com exatidão o quantum debeatur na forma definida pelo art 509 caput do Código de Processo Civil de 2015 De fato o juiz ao proferir sentença condenatória obrigatoriamente fixará valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido CPP art 387 inc IV4 Operase a determinação de um valor mínimo ainda impreciso mas com o trânsito em julgado da sentença condenatória a execução poderá ser efetuada por esse montante preestabelecido sem prejuízo da liquidação para a apuração do dano efetivamente sofrido CPP art 63 parágrafo único5 Destarte transitada em julgado a sentença penal condenatória não se pode questionar no juízo cível a obrigação de reparar o dano causado pelo crime mas somente o seu valor Não perde a condição de título executivo judicial a sentença penal condenatória com trânsito em julgado se posteriormente a ela verificarse a extinção da punibilidade do agente Em se tratando de extinção da punibilidade derivada de abolitio criminis ou de anistia embora rescindam a sentença condenatória no plano penal persiste o efeito civil da reparação do dano Quando o titular do direito à reparação do dano for pobre a execução da sentença penal condenatória será promovida dependendo do seu requerimento pelo Ministério Público CPP art 68 ou pela Defensoria Pública onde houver Se após o trânsito em julgado da sentença penal falecer o condenado a execução civil será ajuizada em face de seus herdeiros até os limites das forças da herança em consonância com as regras previstas no art 5º XLV da Constituição Federal e no art 943 do Código Civil A sentença penal condenatória com trânsito em julgado apenas pode ser executada civilmente contra aquele que foi réu na ação penal Para acionar o responsável civil que não foi criminalmente acusado será obrigatório o ajuizamento de ação civil de conhecimento funcionando a condenação como elemento probatório e não como título executivo Se o réu condenado com trânsito em julgado for absolvido em revisão criminal desaparece a força executiva mesmo se já tiver sido iniciada a execução civil Tal como fora criado o título é desconstituído por decisão judicial Sempre que a decisão judicial não tiver natureza condenatória como nos casos de sentença declaratória da extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva arquivamento de inquérito policial transação penal entre outros deverá o prejudicado intentar ação civil de indenização em razão de ato ilícito6 O ofendido seu representante legal ou herdeiros não precisam aguardar o final da ação penal para postular no juízo cível a reparação do dano Mas sem o título executivo deverá ser ajuizada a ação civil ex delicto situação em que o seu trâmite pode ser suspenso por decisão judicial até o julgamento definitivo da ação penal CPP art 64 parágrafo único visando evitar decisões judiciais contraditórias A absolvição na esfera penal faz coisa julgada no campo civil impedindo a reparação do dano quando fundamentada no reconhecimento inequívoco da inexistência do fato ou da autoria no exercício regular do direito no estrito cumprimento do dever legal e na legítima defesa Nas demais hipóteses de absolvição arroladas no art 386 do Código de Processo Penal subsiste a possibilidade de se buscar civilmente a reparação do dano Finalmente em caso de absolvição penal em razão da comprovação do estado de necessidade permanece a responsabilidade civil na forma prevista no art 929 do Código Civil Com efeito quando o proprietário da coisa destruída ou deteriorada não foi o responsável pelo perigo a ele é assegurado o direito à indenização do prejuízo que lhe foi causado por parte do autor do fato típico Por sua vez se o perigo foi causado por terceiro quem sofreu o prejuízo deverá ajuizar ação indenizatória contra aquele que em estado de necessidade destruiu ou deteriorou o bem que lhe pertencia A este contudo é reservado o direito de mover ação de regresso contra quem provocou o perigo na forma do art 930 do Código Civil O confisco é previsto como efeito da condenação no art 91 II do Código Penal Art 91 São efeitos da condenação II a perda em favor da União ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boafé a dos instrumentos do crime desde que consistam em coisas cujo fabrico alienação uso porte ou detenção constitua fato ilícito b do produto do crime ou de qualquer bem ou valor que constitua proveito auferido pelo agente com a prática do fato criminoso 1º Poderá ser decretada a perda de bens ou valores equivalentes ao produto ou proveito do crime quando estes não forem encontrados ou quando se localizarem no exterior 2º Na hipótese do 1º as medidas assecuratórias previstas na legislação processual poderão abranger bens ou valores equivalentes do investigado ou acusado para posterior decretação de perda Confisco como efeito da condenação é a perda de bens de natureza ilícita em favor da União A medida possui dupla finalidade impedir a difusão de instrumentos adequados à prática de novos crimes e proibir o enriquecimento ilícito por parte do criminoso7 Instrumento do crime instrumenta sceleris é o meio de que se vale o agente para cometer o delito e apenas pode ser confiscado quando seu fabrico alienação uso porte ou detenção constituir fato ilícito É o caso por exemplo da arma de fogo que o agente utilizou para cometer um roubo salvo se ele possuir seu registro e autorização para portála Os veículos embarcações aeronaves e quaisquer outros meios de transporte não podem ser confiscados exceto quando utilizados para a prática de crimes previstos na Lei de Drogas Lei 113432006 arts 62 e 63 ou então quando sua fabricação ou uso constituir fato ilícito CP art 91 II a Por mandamento constitucional as propriedades rurais e urbanas de qualquer região do País onde forem localizadas culturas ilegais de plantas psicotrópicas ou a exploração de trabalho escravo na forma da lei serão expropriadas e destinadas à reforma agrária e a programas de habitação popular sem qualquer indenização ao proprietário e sem prejuízo de outras sanções previstas em lei Além disso todo e qualquer bem de valor econômico apreendido em decorrência do tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e da exploração de trabalho escravo será confiscado e reverterá a fundo especial com destinação específica na forma da lei CF art 243 caput e parágrafo único Embora existam entendimentos em contrário os instrumentos de contravenção penal não podem ser confiscados pois a lei penal deve ser interpretada restritivamente e o art 91 II a do Código Penal fala somente em confisco dos instrumentos do crime A perda dos instrumentos do crime é automática resultando do trânsito em julgado da sentença penal condenatória Não cabe o confisco por consequência nos casos de absolvição ou quando celebrada transação penal por se tratar de sentença meramente homologatória ou na hipótese de arquivamento do inquérito policial ou declaração da extinção da punibilidade fundada na prescrição da pretensão punitiva Produto do crime producta sceleris significa a vantagem direta obtida pelo agente em decorrência da prática do crime É o caso do relógio roubado Proveito do crime por outro lado é a vantagem indireta do crime resultante da especificação do produto do crime é o caso do ouro derivado do derretimento do relógio o bem adquirido pelo agente em razão de alienação do produto do crime o dinheiro auferido com a venda do relógio roubado bem como o preço do crime pretium sceleris Inicialmente o produto e o proveito do crime deverão ser restituídos ao prejudicado pelo crime ou ao terceiro de boafé8 Essa restituição será possível ainda que se trate de bem cujo fabrico alienação uso porte ou detenção se constitua em fato ilícito desde que tal pessoa por força de sua qualidade ou função tenha autorização para ser seu proprietário Exemplo uma arma de guerra é apreendida mas vem a ser devolvida ao seu legítimo dono um colecionador de armas autorizado pelo Comando do Exército O confisco pela União somente será efetuado se for desconhecida a identidade do proprietário do bem ou não for reclamado seu valor hipótese em que uma vez confiscados os instrumentos e produtos do crime passam à União integrando o patrimônio do Fundo Penitenciário Nacional art 2º IV da Lei Complementar 791994 regulamentada pelo Decreto 109319949 Os 1º e 2º do art 91 do Código Penal foram introduzidos pela Lei 126942012 com o propósito de proporcionar maior eficácia nas condenações proferidas em delitos cometidos no contexto de organizações criminosas Nesses casos poderá ser decretada a perda de bens ou valores equivalentes ao produto ou proveito do crime quando estes não forem encontrados ou quando se localizarem no exterior notas comuns aos delitos praticados pelas estruturas ilícitas de poder Além disso as medidas assecuratórias previstas na legislação processual sequestro arresto especialização de hipoteca legal etc poderão abranger bens ou valores equivalentes do investigado ou acusado para posterior decretação de perda O art 92 I do Código Penal define como efeito específico da condenação Art 92 São também efeitos da condenação I a perda de cargo função pública ou mandato eletivo a quando aplicada pena privativa de liberdade por tempo igual ou superior a 1 um ano nos crimes praticados com abuso de poder ou violação de dever para com a Administração Pública b quando for aplicada pena privativa de liberdade por tempo superior a 4 quatro anos nos demais casos Esses efeitos não são automáticos devendo ser motivadamente declarados na sentença Consequentemente o magistrado precisa proceder à apreciação da natureza e da extensão do dano bem como às condições pessoais do réu para aferir seu cabimento no caso concreto10 Na alínea a além do conceito de funcionário público contido no art 327 do Código Penal deve ser analisado se o crime ocorreu no exercício das funções exercidas pelo agente isto é se ele se valeu das facilidades proporcionadas por sua função para praticar o delito Via de regra esse efeito da condenação restringese ao cargo função pública ou mandato eletivo ocupado pelo funcionário público na data em que o crime foi praticado No caso concreto entretanto o magistrado pode estendêlo a cargo função pública ou mandato eletivo diverso exercido pelo agente ao tempo da condenação caso entenda que o novo posto guarda relação com as atribuições anteriores De fato o art 92 inc I do Código Penal fala em perda de e não do cargo função pública ou mandato eletivo Como já decidido pelo Superior Tribunal de Justiça A pena de perdimento deve ser restrita ao cargo ocupado ou função pública exercida no momento do delito à exceção da hipótese em que o magistrado motivadamente entender que o novo cargo ou função guarda correlação com as atribuições anteriores Cingese a controvérsia a saber se a pena de perdimento prevista no art 92 I do CP se restringe à atividade pública exercida no momento do delito O STJ entende que o reconhecimento de que o réu praticou ato incompatível com o cargo por ele ocupado é fundamento suficiente para a decretação do efeito extrapenal de perda do cargo público AgRg no REsp 1613927RS DJe 3092016 Em regra a pena de perdimento deve ser restrita ao cargo público ocupado ou função pública exercida no momento do delito Porém salientase que se o magistrado de origem considerar motivadamente que o novo cargo guarda correlação com as atribuições do anterior ou seja naquele em que foram praticados os crimes mostra se devida a perda da nova função uma vez que tal ato visa anular a possibilidade de reiteração de ilícitos da mesma natureza11 Já na alínea b é possível a incidência do efeito da condenação em qualquer crime bastando a presença de dois requisitos em decisão fundamentada 1 natureza da pena privativa de liberdade e 2 quantidade da pena superior a 4 quatro anos12 Para o Superior Tribunal de Justiça A determinação da perda de cargo público fundada na aplicação de pena privativa de liberdade superior a 4 anos art 92 I b do CP pressupõe fundamentação concreta que justifique o cabimento da medida De fato para que seja declarada a perda do cargo público na hipótese descrita no art 92 I b do CP são necessários dois requisitos a que o quantum da sanção penal privativa de liberdade seja superior a 4 anos e b que a decisão proferida apresentese de forma motivada com a explicitação das razões que ensejaram o cabimento da medida A motivação dos atos jurisdicionais conforme imposição do art 93 IX da CF Todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos e fundamentadas todas as decisões sob pena de nulidade funciona como garantia da atuação imparcial e secundum legis sentido lato do órgão julgador Ademais a motivação dos atos judiciais serve de controle social sobre os atos judiciais e de controle pelas partes sobre a atividade intelectual do julgador para que verifiquem se este ao decidir considerou todos os argumentos e as provas produzidas pelas partes e se bem aplicou o direito ao caso concreto13 Esse efeito específico da condenação não se confunde com a proibição do exercício de cargo função ou atividade pública elencada no art 47 I do Código Penal como pena restritiva de direitos espécie de pena de interdição temporária de direitos O efeito da condenação por sua vez é permanente já que o condenado ainda que seja posteriormente reabilitado jamais poderá ocupar o cargo função ou mandato objeto da perda salvo se o recuperar por investidura legítima Anotese porém que a possibilidade de perda do cargo público não precisa vir prevista na denúncia posto que decorre de previsão legal expressa como efeito da condenação nos termos do art 92 do Código Penal14 É de se observar que como o art 92 inc I do Código Penal diz respeito à perda de cargo função pública ou mandato eletivo este efeito da condenação não alcança a cassação da aposentadoria ainda que o crime tenha sido praticado quando o funcionário público estava na ativa Na esteira da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça Ainda que condenado por crime praticado durante o período de atividade o servidor público não pode ter a sua aposentadoria cassada com fundamento no art 92 I do CP mesmo que a sua aposentadoria tenha ocorrido no curso da ação penal De fato os efeitos de condenação criminal previstos no art 92 I do CP segundo o qual são efeitos da condenação criminal a perda de cargo função pública ou mandato eletivo embora possam repercutir na esfera das relações extrapenais são efeitos penais na medida em que decorrem de lei penal Sendo assim pela natureza constrangedora desses efeitos que acarretam restrição ou perda de direitos eles somente podem ser declarados nas hipóteses restritas do dispositivo mencionado o que implica afirmar que o rol do art 92 do CP é taxativo sendo vedada a interpretação extensiva ou analógica para estendêlos em desfavor do réu sob pena de afronta ao princípio da legalidade Dessa maneira como essa previsão legal é dirigida para a perda de cargo função pública ou mandato eletivo não se pode estendêla ao servidor que se aposentou ainda que no decorrer da ação penal15 Se o condenado é Deputado Federal ou Senador o Poder Judiciário pode decretar a perda do mandato eletivo A resposta é negativa pois tratase de matéria de competência reservada à casa legislativa respectiva na forma prevista pelo art 55 2º da Constituição Federal Nos casos dos incisos I II e VI a perda do mandato será decidida pela Câmara dos Deputados ou pelo Senado Federal por maioria absoluta mediante provocação da respectiva Mesa ou de partido político representado no Congresso Nacional assegurada ampla defesa O Supremo Tribunal Federal já decidiu nesse sentido O Plenário condenou senador prefeito à época dos fatos delituosos bem assim o presidente e o vicepresidente de comissão de licitação municipal pela prática do crime descrito no art 90 da Lei 866693 Art 90 Frustrar ou fraudar mediante ajuste combinação ou qualquer outro expediente o caráter competitivo do procedimento licitatório com o intuito de obter para si ou para outrem vantagem decorrente da adjudicação do objeto da licitação Pena detenção de 2 dois a 4 quatro anos e multa à pena de 4 anos 8 meses e 26 dias de detenção em regime inicial semiaberto Fixouse por maioria multa de R 20181705 ao detentor de cargo político e de R 13454407 aos demais apenados valores a serem revertidos aos cofres do município Determinouse caso estejam em exercício a perda de cargo emprego ou função pública dos dois últimos réus Entendeuse em votação majoritária competir ao Senado Federal deliberar sobre a eventual perda do mandato parlamentar do exprefeito CF art 55 VI e 2º16 O art 208 da Lei Complementar 751993 dispõe Os membros do Ministério Público da União após dois anos de efetivo exercício só poderão ser demitidos por decisão judicial transitada em julgado De seu turno a Lei 86251993 Lei Orgânica Nacional dos Ministérios Públicos dos Estados e do Distrito Federal estabelece em seu art 38 1º I a III que o membro vitalício do Ministério Público somente perderá o cargo por sentença judicial transitada em julgado proferida em ação civil própria em três casos 1 prática de crime incompatível com o exercício do cargo após decisão judicial transitada em julgado 2 exercício da advocacia e 3 abandono do cargo por prazo superior a 30 dias corridos Assim fica fácil concluir que no tocante aos membros vitalícios do Ministério Público da União a perda do cargo decorrente de sentença penal condenatória transitada em julgado segue as regras do art 92 I do Código Penal A questão se torna mais complicada todavia em relação aos membros vitalícios dos Ministérios Públicos dos Estados e do Distrito Federal pelo fato de se exigir para a perda do cargo decisão judicial transitada em julgado em ação civil própria ajuizada pelo ProcuradorGeral de Justiça perante o Tribunal de Justiça após condenação definitiva em ação penal movida pela prática de crime incompatível com o exercício do cargo Em síntese para a perda do cargo a teor da interpretação literal do mencionado dispositivo legal seriam necessárias duas condenações transitadas em julgado uma pela prática do crime e outra em ação civil própria a qual depende da anterior Esta é a posição adotada pelo Superior Tribunal de Justiça Em ação penal decorrente da prática de corrupção passiva praticada por membro vitalício do Ministério Público Estadual não é possível determinar a perda do cargo com fundamento no art 92 I a do CP De acordo com o art 92 I a do CP é efeito não automático da condenação a perda do cargo função pública ou mandato eletivo quando aplicada a pena privativa de liberdade por tempo igual ou superior a um ano nos crimes praticados com abuso de poder ou violação de dever para com a Administração Pública Entretanto quanto à perda do cargo de membro do Ministério Público Estadual há norma especial Lei 86251993 Lei Orgânica Nacional do Ministério Público que dispõe que a perda do referido cargo somente pode ocorrer após o trânsito em julgado de ação civil proposta para esse fim O art 38 2º da Lei 86251993 ainda prevê que a ação civil para a decretação da perda do cargo somente pode ser ajuizada pelo ProcuradorGeral de Justiça quando previamente autorizado pelo Colégio de Procuradores o que constitui condição de procedibilidade juntamente com o trânsito em julgado da sentença penal condenatória Com efeito em se tratando de normas legais de mesma hierarquia o fato de a Lei Orgânica Nacional do Ministério Público prever regras específicas e diferenciadas das do Código Penal para a perda de cargo em atenção ao princípio da especialidade lex specialis derogat generali deve prevalecer o que dispõe a lei orgânica17 Porém há entendimento diverso no sentido de que essa sistemática seria por demais protetiva e desnecessária Basta o cumprimento das regras do Código Penal para que possa ser decretada na sentença condenatória a perda do cargo Para Hugo Nigro Mazzilli A nosso ver o art 38 1º da LONMP referese às únicas hipóteses em que se admite perda do cargo por ação civil específica mas não obsta a que respeitados os pressupostos constitucionais a lei admita outras hipóteses de perda do cargo de membro do Ministério Público como em razão de condenação criminal18 Com efeito a garantia da vitaliciedade estaria respeitada pois a ação penal contra Promotor de Justiça somente pode ser ajuizada pelo Procurador Geral de Justiça perante o Tribunal de Justiça respectivo Não haveria motivo para esse procedimento ser repetido É a posição a que nos filiamos É também efeito específico da condenação a incapacidade para o exercício do poder familiar da tutela ou da curatela nos crimes dolosos sujeitos à pena de reclusão cometidos contra outrem igualmente titular do mesmo poder familiar contra filho filha ou outro descendente ou contra tutelado ou curatelado CP art 92 II Esse efeito não é automático e para a sua imposição reclama três requisitos 1 natureza do crime somente os dolosos 2 natureza da pena reclusão e 3 qualidade da vítima pessoa igualmente detentora do poder familiar exemplo marido comete feminicídio contra a esposa daí decorrendo a perda do poder familiar no tocante ao filho que tinham em comum filho filha outro descendente exemplo o agente abusa sexualmente da neta e por esta razão perde o poder familiar em relação a um filho menor tutelado ou curatelado Presentes os requisitos o juiz pode declarar na sentença esse efeito Pouco importa a quantidade da pena bem como o regime prisional Sua aplicação não é obrigatória e sua pertinência deve ser avaliada no caso concreto notadamente quando o crime provoque a incompatibilidade para o exercício do poder familiar tutela ou curatela Essa incapacidade pode ser estendida para alcançar outros filhos pupilos ou curatelados além da vítima do crime Não seria razoável exemplificativamente decretar a perda do poder familiar somente em relação à filha de dez anos de idade estuprada pelo pai aguardando fosse igual delito praticado contra as outras filhas mais jovens para que só então se privasse o genitor desse direito Em relação à vítima do crime doloso e punido com reclusão essa incapacidade é permanente De fato mesmo em caso de reabilitação é vedada a reintegração do agente na situação anterior CP art 93 parágrafo único No tocante a outros filhos pupilos ou curatelados a incapacidade é provisória pois o condenado se reabilitado poderá voltar a exercer o poder familiar tutela ou curatela O art 92 III do Código Penal reza ser efeito específico da condenação a inabilitação para dirigir veículo quando utilizado como meio para a prática de crime doloso A lei exige portanto dois requisitos 1 o crime deve ser doloso e 2 utilização do veículo como meio de execução Não se autoriza esse efeito pois no caso de crime culposo Esse efeito da condenação não se confunde com a suspensão da autorização ou de habilitação definida pelo art 47 III do Código Penal como pena restrita de direitos aplicável aos responsáveis por crimes culposos de trânsito com igual duração à da pena privativa de liberdade substituída No caso de crime praticado na direção de veículo automotor os arts 292 e 293 da Lei 95031997 Código de Trânsito Brasileiro preveem a suspensão ou proibição de se obter a permissão ou habilitação como pena a ser aplicada isolada ou cumulativamente com outras penas pelo prazo de 2 dois meses a 5 cinco anos Nos termos do art 15 III da Constituição Federal operase a suspensão dos direitos políticos em face da condenação criminal transitada em julgado enquanto durarem seus efeitos Esse efeito é automático prescindindo de motivação expressa na sentença condenatória e a suspensão abrange os direitos políticos de natureza ativa e passiva Subsiste até a extinção da sanção penal É indiferente o regime prisional fixado na sentença condenatória bem como eventual substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos ou multa Da mesma forma a concessão de sursis e de livramento condicional não influi na suspensão dos direitos políticos pois não extinguem a pena Como estabelece a Súmula 9 do Tribunal Superior Eleitoral A suspensão dos direitos políticos decorrentes de condenação criminal transitada em julgado cessa com o cumprimento ou a extinção da pena independendo de reabilitação ou prova de reparação dos danos A condenação criminal transitada em julgado contra o empregado qualquer que seja o crime bem como o local de sua prática e a sua vítima faz coisa julgada na Justiça do Trabalho Se a execução da pena não tiver sido suspensa autoriza a demissão por justa causa pelo empregador É o que dispõe o art 482 d da Consolidação das Leis do Trabalho Esse efeito como é lógico não precisa ser motivadamente fundamentado na sentença penal condenatória De acordo com o art 83 da Lei 86661993 os crimes referentes a licitações e contratos da Administração Pública ainda que na forma tentada sujeitam seus autores quando servidores públicos além das sanções penais à perda do cargo emprego função ou mandato eletivo Como a lei não dispõe sobre a aplicabilidade desse efeito utilizase a sistemática prevista no Código Penal Consequentemente sua incidência depende de fundamentação expressa na sentença condenatória O art 181 I a III da Lei 111012005 Lei de Falências estabelece como efeitos da condenação aos crimes nela previstos a inabilitação para o exercício de atividade empresarial o impedimento para o exercício de cargo ou função em conselho de administração diretoria ou gerência das sociedades sujeitas à lei de falências e a impossibilidade de gerir empresa por mandato ou por gestão de negócio Por sua vez o art 181 1º esclarece que tais efeitos não são automáticos devendo ser motivadamente declarados na sentença e perdurarão até 5 cinco anos após a extinção da punibilidade podendo contudo cessar antes pela reabilitação criminal Com o trânsito em julgado da condenação o juiz deverá notificar o Registro Público de Empresas para que adote as medidas necessárias para impedir novo registro em nome dos inabilitados art 181 2º A condenação pela prática de crime definido pela Lei de Tortura se o agente for funcionário público acarretará a perda do cargo função ou emprego público bem como a interdição para seu exercício pelo dobro do prazo da pena aplicada Lei 94551997 art 1º 5º Cuidase de efeito automático da condenação Como destaca o Superior Tribunal de Justiça Conforme dispõe o 5º do art 1º deste diploma legal a perda do cargo função ou emprego público é efeito automático da condenação sendo dispensável fundamentação concreta19 No caso de crime ligado ao tráfico de drogas arts 33 caput e 1º e 34 a 37 da Lei 113432006 seu art 56 1º permite ao juiz por ocasião do recebimento da denúncia decretar o afastamento cautelar do acusado de suas atividades se for funcionário público comunicando o órgão respectivo Tratase de medida cautelar Em caso de condenação a perda do cargo ou função pública observa a regra geral delineada pelo Código Penal O art 16 da Lei 77161989 estabelece ser efeito da condenação aos crimes nela previstos a perda do cargo ou função pública para o servidor público e a suspensão do funcionamento do estabelecimento particular por prazo não superior a 3 três meses Esses efeitos não são automáticos devendo ser expressamente declarados na sentença art 18 O art 7º da Lei 96131998 com as modificações incorporadas pela Lei 126832012 dispõe acerca dos efeitos da condenação atinentes aos crimes de lavagem ou ocultação de bens direitos e valores sem prejuízo da incidência das medidas previstas no Código Penal Sua redação é a seguinte Art 7º São efeitos da condenação além dos previstos no Código Penal I a perda em favor da União e dos Estados nos casos de competência da Justiça Estadual de todos os bens direitos e valores relacionados direta ou indiretamente à prática dos crimes previstos nesta Lei inclusive aqueles utilizados para prestar a fiança ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boafé II a interdição do exercício de cargo ou função pública de qualquer natureza e de diretor de membro de conselho de administração ou de gerência das pessoas jurídicas referidas no art 9º pelo dobro do tempo da pena privativa de liberdade aplicada 1º A União e os Estados no âmbito de suas competências regulamentarão a forma de destinação dos bens direitos e valores cuja perda houver sido declarada assegurada quanto aos processos de competência da Justiça Federal a sua utilização pelos órgãos federais encarregados da prevenção do combate da ação penal e do julgamento dos crimes previstos nesta Lei e quanto aos processos de competência da Justiça Estadual a preferência dos órgãos locais com idêntica função 2º Os instrumentos do crime sem valor econômico cuja perda em favor da União ou do Estado for decretada serão inutilizados ou doados a museu criminal ou a entidade pública se houver interesse na sua conservação Como a Lei 96131998 calouse no tocante à aplicabilidade destes efeitos é preciso utilizar a sistemática adotada pelo Código Penal Desta forma concluise que o efeito da condenação previsto no inc I é automático ao passo que o inc II contempla efeito não automático reclamando declaração motivada na sentença condenatória Principal Efeitos da condenação Secundários De natureza penal Genéricos De natureza extrapenal Específicos Fora do CP Imposição das penas privativas de liberdade restritivas de direitos pecuniárias e ainda de medidas de segurança as semiimputáveis induz à reincidência art 63 CP impede a concessão de sursis art 77 I do CP se a condenação por crime doloso tal decisão determina a revogação obrigatória do sursis art 81 I do CP se a pena aplicada for privativa de liberdade o livramento condicional será obrigatoriamente revogado o prazo da prescrição da pretensão executória é aumentado em 13 art 110 caput do CP a condenação tornase elementar da contravenção penal de posse de instrumento de furto art 25 do Decretolei 36881941 revogação da reabilitação art 95 do CP etc 1 2 3 4 5 6 7 Como impõe medida de segurança é chamada de absolvição imprópria RE 795567PR rel Min Teori Zavascki Plenário j 28052015 noticiado no Informativo 787 São inúmeros os efeitos penais secundários da condenação e inviável e cansativo aqui enumerálos Escolhemos por isso os mais importantes e de maior incidência em concursos públicos A aplicação do instituto disposto no art 387 inciso IV do CPP referente à reparação de natureza cível quando da prolação da sentença condenatória requer a dedução de um pedido expresso do querelante ou do Ministério Público em respeito às garantias do contraditório e da ampla defesa Neste caso houve pedido expresso por parte do Ministério Público na exordial acusatória o que é suficiente para que o juiz sentenciante fixe o valor mínimo a título de reparação dos danos causados pela infração Assim sendo não há que se falar em iliquidez do pedido pois o quantum há que ser avaliado e debatido ao longo do processo não tendo o Parquet o dever de na denúncia apontar valor líquido e certo o qual será devidamente fixado pelo Juiz sentenciante STJ REsp 1265707RS rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 27052014 No tocante à fixação do valor mínimo na sentença condenatória e com o propósito de promover maior eficácia ao direito da vítima em ver ressarcido o dano sofrido o Superior Tribunal de Justiça já decidiu que o magistrado pode estipular tanto o dano material como também o dano moral suportados pelo ofendido REsp 1585684DF rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 09082016 noticiado no Informativo 588 A sentença penal absolutória em regra não produz a obrigação de reparar o dano salvo na hipótese de acórdão que absolve o réu em sede de revisão criminal De fato o injustamente condenado pode ao efetuar pedido de revisão criminal cumulálo com indenização por perdas e danos Nesse caso podese reconhecer o direito à indenização na esfera cível O confisco é disciplinado no art 91 do Código Penal como forma de expropriação em favor do Estado dos instrumentos e produtos de crime com a finalidade de assegurar a indisponibilidade dos bens ilícitos utilizados para a prática da infração ou que tenham sido angariados com a conduta ilícita STJ REsp 1316694PR rel Min Regina Helena Costa 8 9 10 11 12 13 14 15 5ª Turma j 17122013 O lesado ou terceiro de boafé a que se referem os arts 91 II do CP e 133 parágrafo único do CPP são aqueles diretamente prejudicados pelo confisco do bem como é o caso por exemplo do condômino ou do comprador de boafé Aqueles que estejam sendo apenas obliquamente prejudicados pelo confisco que jamais tenham estabelecido relação jurídica que envolvesse diretamente o bem perdido não se enquadram nesse conceito de lesado ou terceiro de boafé STJ REsp 1366894RS rel Min Nancy Andrighi 3ª Turma j 22042014 Depois da apreensão dos instrumentos e produtos do crime serão esses bens inutilizados leiloados ou recolhidos a museu criminal se houver interesse na sua conservação Os bens imóveis adquiridos pelo agente com o proveito do crime ainda que transferidos a terceiro serão sequestrados CPP arts 122 a 125 Registrese por oportuno que os efeitos da condenação trazidos no art 92 do Código Penal não são automáticos Ou seja ainda que se trate de situação abrangida pelas alíneas a e b do inciso I da referida norma a perda do cargo ou função pública não prescinde da devida motivação nos termos do que disciplina o parágrafo único STJ REsp 1285783PB rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 03092013 REsp 1452935PE rel Min Reynaldo Soares da Fonseca 5ª Turma j 14032017 noticiado no Informativo 599 Com o merecido respeito esse julgado comporta um reparo A perda de cargo função pública ou mandato eletivo constituise em efeito da condenação Não se trata de pena A substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos não tem o condão de afastar o efeito disposto no art 92 do Código Penal pois a perda do cargo não está adstrita à efetiva privação da liberdade do réu STJ AgRg no REsp 1208940RS rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 10062014 REsp 1044866MG rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 02102014 noticiado no Informativo 549 STJ AgRg no AREsp 46266SP rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 26062012 REsp 1416477SP rel Min Walter de Almeida Guilherme Desembargador convocado do TJSP 5ª Turma j 18112014 noticiado no Informativo 552 Em igual sentido REsp 1317487MT rel Min 16 17 18 19 Laurita Vaz 5ª Turma j 22082014 AP 565RO rel Min Cármen Lúcia Plenário j 07 e 08082013 noticiado no Informativo 714 E também AP 563SP rel Min Teori Zavascki 2ª Turma j 21102014 noticiado no Informativo 764 REsp 1251621AM rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 16102014 noticiado no Informativo 552 MAZZILLI Hugo Nigro Introdução ao Ministério Público 5 ed São Paulo Saraiva 2005 p 91 REsp 1044866MG rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 02102014 noticiado no Informativo 549 421 422 CONCEITO Reabilitação é o instituto jurídicopenal que se destina a promover a reinserção social do condenado a ele assegurando o sigilo de seus antecedentes criminais bem como a suspensão condicional de determinados efeitos secundários de natureza extrapenal e específicos da condenação mediante a declaração judicial no sentido de que as penas a ele aplicadas foram cumpridas ou por qualquer outro modo extintas Busca pois reintegrar o condenado que tenha cumprido a pena na posição jurídica que desfrutava anteriormente à prolação da condenação1 Tem portanto duas funções 1 assegurar ao condenado o sigilo dos registros sobre seu processo e condenação art 93 caput e 2 suspender condicionalmente os efeitos da condenação previstos no art 92 do Código Penal art 93 parágrafo único ORIGEM HISTÓRICA A primeira manifestação do instituto da reabilitação ocorreu no Direito Romano por meio da restitutio in integrum forma de clemência soberana extintiva da pena e restauradora dos direitos patrimoniais e morais do condenado No Brasil surgiu inicialmente no art 86 do Código Penal de 1890 prevista como causa de extinção da condenação Com o trânsito em julgado da revisão criminal favorável ao réu tinha ele automaticamente restabelecidos todos os seus direitos bem como era garantida a indenização pelos prejuízos decorrentes da condenação 423 424 4241 NATUREZA JURÍDICA Cuidase de medida de política criminal assecuratória do sigilo sobre os antecedentes criminais do condenado e ainda causa suspensiva condicional de certos efeitos secundários de natureza extrapenal e específicos da condenação Não se trata pois de causa de extinção da punibilidade De fato como consta da Exposição de Motivos item 82 Tratase de instituto que não extingue mas tão somente suspende alguns efeitos penais da sentença condenatória visto que a qualquer tempo revogada a reabilitação se restabelece o status quo ante Diferentemente as causas extintivas da punibilidade operam efeitos irrevogáveis fazendo cessar definitivamente a pretensão punitiva ou a execução MODALIDADES DE REABILITAÇÃO NO CÓDIGO PENAL Sigilo das condenações art 93 caput parte final A reabilitação assegura ao condenado o sigilo dos registros sobre seu processo e condenação nos termos do art 93 caput parte final do Código Penal Mas qual é o verdadeiro alcance dessa finalidade da reabilitação O art 202 da Lei de Execução Penal estatui que cumprida ou extinta a pena não constarão da folha corrida atestados ou certidões fornecidas por autoridade policial ou por auxiliares da Justiça qualquer notícia ou referência à condenação salvo para instruir processo pela prática de nova infração penal ou outros casos expressos em lei Esse sigilo como se percebe é garantido de forma automática e imediata depois do cumprimento integral ou extinção da pena por qualquer outro motivo Prescinde da reabilitação Tal sigilo entretanto é mais restrito pois pode ser quebrado por qualquer autoridade judiciária por membro do Ministério Público ou ainda por 4242 42421 Delegado de Polícia De outro lado o sigilo assegurado pela reabilitação é mais amplo pois as informações por ele cobertas somente podem ser obtidas por requisição ordem não de qualquer integrante do Poder Judiciário mas exclusivamente do juiz criminal É o que se extrai do art 748 do Código de Processo Penal Esta é a utilidade prática do instituto Na esteira do pensamento do Superior Tribunal de Justiça Esta Corte Superior de Justiça já pacificou o entendimento segundo o qual por analogia à regra inserta no art 748 do Código de Processo Penal as anotações referentes a inquéritos policiais e ações penais não serão mencionadas na Folha de Antecedentes Criminais nem em certidão extraída dos livros do juízo nas hipóteses em que resultarem na extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva arquivamento absolvição ou reabilitação2 Efeitos secundários de natureza extrapenal e específicos da condenação art 93 parágrafo único Os efeitos secundários de natureza extrapenal e específicos da condenação estão elencados no art 92 do Código Penal A suspensão desses efeitos é condicional porque do reabilitando exigese o cumprimento de condições para retornar à situação em que estava previamente à condenação Vejamos cada um deles e os reflexos provocados pela reabilitação Perda de cargo função pública ou mandato eletivo O art 92 I do Código Penal prevê como efeito secundário de natureza extrapenal e específico da condenação a perda de cargo função pública ou mandato eletivo quando aplicada pena privativa de liberdade por tempo igual ou superior a um ano nos crimes praticados com abuso de poder ou violação de dever para com a administração pública ou ainda quando aplicada pena privativa de liberdade por tempo superior a quatro anos nos demais crimes O agente reabilitado não é reintegrado automaticamente à situação 42422 42423 anterior por expressa determinação do art 93 parágrafo único do Código Penal Pode voltar contudo a exercer novo cargo emprego ou função pública desde que proveniente de nova investidura Exemplo o funcionário público condenado por peculato que perdeu o cargo público que ocupava desde que reabilitado pode novamente ser funcionário público se aprovado no concurso público respectivo Incapacidade para o exercício do pátrio poder da tutela ou da curatela É também efeito secundário de natureza extrapenal e específico da condenação a incapacidade para o exercício do poder familiar da tutela ou da curatela nos crimes dolosos sujeitos à pena de reclusão cometidos contra outrem igualmente titular do mesmo poder familiar contra filho filha ou outro descendente ou contra tutelado ou curatelado Como se sabe os efeitos da condenação decorrentes de um crime doloso punido com reclusão cometido contra outrem igualmente titular do mesmo poder familiar contra filho filha ou outro descendente ou contra tutelado ou curatelado podem ser estendidos a outros filhos tutelados ou curatelados Com a reabilitação o condenado pode voltar a exercer o poder familiar a tutela ou a curatela em relação àqueles que não foram vítimas do delito doloso punido com reclusão pois em relação ao ofendido a incapacidade é permanente conforme determina o art 93 parágrafo único do Código Penal Em outras palavras jamais poderá ser exercido novamente o poder familiar tutela ou curatela em face da vítima do crime cuja condenação produziu o efeito previsto no art 92 II do Código Penal Inabilitação para dirigir veículo O art 92 III do Código Penal arrola como efeito secundário de natureza extrapenal e específico da condenação a inabilitação para dirigir veículo quando utilizado como meio para a prática de crime doloso Uma vez reabilitado o agente poderá obter nova carteira de 425 426 4261 4262 habilitação sem qualquer restrição legal REABILITAÇÃO E REINCIDÊNCIA A reabilitação suspende condicionalmente alguns efeitos secundários de natureza extrapenal e específicos da condenação A condenação todavia permanece íntegra pois o instituto em análise não a rescinde Portanto se embora reabilitado o agente vier a praticar novo delito será considerado reincidente Com efeito o art 64 I do Código Penal é peremptório ao esclarecer que a condenação anterior somente perde força para gerar a reincidência quando entre a data do cumprimento ou extinção da pena dela decorrente e a infração posterior tiver decorrido período de tempo superior a 5 cinco anos computado o período de prova da suspensão ou do livramento condicional se não ocorrer revogação Esse hiato temporal é o que se convencionou chamar de período depurador ou caducidade da reincidência PRESSUPOSTO E REQUISITOS DA REABILITAÇÃO Pressuposto A interpretação do art 94 do Código Penal revela que a reabilitação possui um pressuposto e diversos requisitos O pressuposto é a existência de uma sentença condenatória transitada em julgado É indiferente a natureza da sanção penal aplicada ao condenado uma vez que a reabilitação alcança quaisquer penas aplicadas em sentença definitiva tal como dispõe o art 93 caput do Código Penal3 Requisitos A lei exige ainda a observância de determinados requisitos de natureza objetiva e subjetiva 42621 Requisitos objetivos São os que se relacionam ao tempo de cumprimento da pena e à reparação do dano a Tempo de cumprimento da pena O art 94 caput do Código Penal condiciona a reabilitação a um marco temporal Deve ter transcorrido o período de 2 dois anos do dia em que tiver sido extinta de qualquer modo a pena ou terminar a sua execução computandose o período de prova do sursis e do livramento condicional se não sobrevier revogação O prazo é o mesmo seja o condenado primário ou reincidente Nas hipóteses de sursis e de livramento condicional o termo inicial do prazo é a audiência admonitória Na pena de multa o prazo se inicia a partir do seu efetivo pagamento pois esse ato enseja a sua extinção Se ocorrer a sua execução motivada pela ausência do adimplemento voluntário a multa será cobrada como dívida de valor razão pela qual o decurso legal para a reabilitação iniciase a partir da data em que deveria ter ocorrido o pagamento da pena pecuniária Como já decidido pelo Superior Tribunal de Justiça Consoante a jurisprudência compete ao Juízo da Execução Penal determinar a intimação do condenado para realizar o pagamento da pena de multa a teor do que dispõe o art 50 do Código Penal e acaso ocorra o inadimplemento da referida obrigação o fato deve ser comunicado à Fazenda Pública a fim de que ajuíze a execução fiscal no foro competente de acordo com as normas da Lei n 683080 porquanto a Lei n 926896 ao alterar a redação do art 51 do Código Penal afastou a titularidade do Ministério Público STJ REsp 832267 rel Min Laurita Vaz 5ª Turma DJU de 14052007 Nessa linha de raciocínio concluiu a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça pela possibilidade de extinção da execução penal quando cumprida a pena privativa de liberdade resta pendente a multa na medida em que esta deverá ser cobrada pela Fazenda Pública no Juízo competente Firmou se o entendimento da 3ª Seção do STJ no sentido de que considerando se a pena de multa como dívida de valor e consequentemente tornando se legitimado a efetuar sua cobrança a Procuradoria da Fazenda Pública na Vara Fazendária perde a razão de ser a manutenção do Processo de Execução perante a Vara das Execuções Penais quando pendente unicamente o pagamento desta STJ EREsp 845902RS rel Min Maria Thereza de Assis Moura 3ª Seção DJe de 01022011 O entendimento contrário ou seja o de que a punibilidade do réu permaneceria incólume enquanto não adimplida a multa vincularia a finalização do procedimento penal à eventual cobrança do valor pela Fazenda Pública que como se sabe pode deixar de ajuizar a execução para cobrança da dívida ativa em várias situações Tal vinculação assim parece não se coadunar com as peculiaridades do processo penal sendo desarrazoado que o réu tendo cumprido a pena privativa de liberdade fique impossibilitado de obter sua reabilitação após o prazo estabelecido em lei enquanto não comprovar o pagamento da multa submetida a procedimento de cobrança cível4 Em se tratando de extinção da pena pela ocorrência da prescrição a contagem do prazo tem início na data em que ocorreu a causa extintiva da punibilidade pouco importando o momento em que se deu o seu reconhecimento judicial Se o agente ostentar diversas condenações o pedido de reabilitação deve ser formulado no tocante a todas elas Não pode se limitar somente a parcela das penas em razão de as demais ainda não terem sido integralmente cumpridas ou extintas por qualquer outra causa A reabilitação tem por essência a totalidade de seus efeitos proporcionando a plena reinserção social do condenado Como leciona Aloysio de Carvalho Filho Duas ou mais as penas impostas a reabilitação não pode ser deferida enquanto não preenchida a condição do cumprimento de todas elas É da índole e da finalidade do instituto ser de efeitos totais gerais Do mesmo modo que não se compreenderia uma reabilitação em porções não se justifica uma reabilitação que anule umas penas deixando outras de pé Teríamos o penoso espetáculo de um reabilitado manco para quem a reabilitação afinal seria uma irrisória inutilidade por lhe não haver 42622 restituído senão em parte a liberdade de ação quando no seu caso ou toda ou nenhuma5 b Reparação do dano O art 94 III do Código Penal autoriza a reabilitação ao condenado que tenha ressarcido o dano causado pelo crime ou demonstre a absoluta impossibilidade de fazêlo até o dia do pedido ou exiba documento que comprove a renúncia da vítima ou novação da dívida Esse requisito é dispensado quando já se operou a prescrição do débito no âmbito civil Em homenagem à separação e independência entre as instâncias subsiste a obrigação de reparar o dano como requisito da reabilitação quando em prol do penalmente condenado tiver sido julgado improcedente o pedido de indenização formulado no juízo civil Com efeito prevalece a decisão penal no tocante à prova da autoria e da materialidade do fato delituoso Não há falar em dano a ser reparado nos crimes que não o produzem tal como apologia ao crime ato obsceno e associação criminosa Da mesma forma não incide esse requisito quando o crime não apresenta vítima determinada ou ainda quando figura como sujeito passivo um ente destituído de personalidade jurídica crime vago A pobreza na acepção jurídica do termo que justifica a dispensa da reparação do dano pode ser provada por qualquer meio legítimo A renúncia da vítima ou a novação civil da dívida também autorizam a reabilitação independentemente do ressarcimento dos prejuízos O fato de a vítima não ter ajuizado ação indenizatória contra o condenado não significa estar ele livre de reparar o dano Requisitos subjetivos Dizem respeito à pessoa do condenado São dois domicílio no país nos dois anos seguintes ao cumprimento ou extinção da pena e bom comportamento público e privado nesse período 427 a Domicílio no país Exigese que o condenado tenha sido domiciliado no Brasil no prazo de dois anos após a extinção da pena o que admite liberdade de prova b Bom comportamento público e privado O condenado no prazo de dois anos posteriormente à extinção da pena deve ter apresentado de forma efetiva e constante bom comportamento público e privado Não só a prática de novo delito impede a reabilitação Qualquer ato capaz de macular a reputação do agente pode fazêlo A demonstração efetiva e constante de bom comportamento público e privado pode ser feita exemplificativamente com frequência a estabelecimentos de ensino e cursos profissionalizantes ocupação lícita e honesta participação em programas filantrópicos e sociais etc PEDIDO DE REABILITAÇÃO A legitimidade para formular o pedido de reabilitação é privativa do condenado Cuidase de ato eminentemente pessoal intransferível Não se estende aos seus herdeiros ou sucessores em caso de falecimento do titular o que se justifica pela finalidade do instituto reinserção social do condenado Inexiste pois reabilitação em prol da memória do condenado falecido uma vez que a medida somente produz efeitos para o futuro O condenado deve ser assistido por advogado e o pedido deve ser 428 429 endereçado ao juízo de primeiro grau em que tramitou a ação penal ainda que a decisão condenatória transitada em julgado tenha sido proferida em sede recursal No caso de competência originária a reabilitação deve ser ajuizada perante o Tribunal competente6 A petição inicial deve estar acompanhada de todos os requisitos de índole objetiva e subjetiva disciplinados pelo art 94 do Código Penal Deve ser ouvido o Ministério Público previamente à decisão judicial A sentença que concede ou nega a reabilitação pode ser impugnada por meio de recurso de apelação na forma do art 593 II do Código de Processo Penal Na hipótese de concessão comporta também recurso de ofício conforme determina o art 746 do citado diploma legal O art 94 parágrafo único do Código Penal revela o caráter rebus sic stantibus da reabilitação pois uma vez negada poderá ser novamente requerida a qualquer tempo desde que o pedido seja instruído com novos elementos comprobatórios dos requisitos necessários REVOGAÇÃO DA REABILITAÇÃO Preceitua o art 95 do Código Penal A reabilitação será revogada de ofício ou a requerimento do Ministério Público se o reabilitado for condenado como reincidente por decisão definitiva a pena que não seja de multa REABILITAÇÃO E HABEAS CORPUS A via do habeas corpus não é a adequada para instrumentalizar o pedido de reabilitação seja porque não há risco à liberdade de locomoção seja pela impossibilidade de dilação probatória no âmbito do remédio constitucional7 1 2 3 4 5 6 7 BETTIOL Giuseppe Direito penal Trad Paulo José da Costa Jr e Alberto Silva Franco São Paulo RT 1966 p 226 RMS 42972SP rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 22042014 Por esse motivo se ocorrer a declaração da extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva de modo a apagar a condenação falta ao acusado o interesse processual para se obter a reabilitação REsp 1166866MS rel Min Assusete Magalhães 6ª Turma j 20082013 CARVALHO FILHO Aloysio de Comentários ao Código Penal Rio de Janeiro Forense 1944 v IV p 388389 No nosso sistema processual vigente não se inclui a reabilitação entre os incidentes da execução e o Código de Processo Penal comum art 743 e o Código de Processo Penal Militar art 651 determinam expressamente que o benefício seja requerido no juízo da condenação STF CC 7015SP rel Min Moreira Alves Plenário j 01081994 STF HC 90554RJ rel Min Cármen Lúcia 1ª Turma j 06032007 Medida de segurança é a modalidade de sanção penal com finalidade exclusivamente preventiva e de caráter terapêutico destinada a tratar inimputáveis e semiimputáveis portadores de periculosidade com o escopo de evitar a prática de futuras infrações penais Em que pese o seu aspecto curativo revelase como espécie de sanção penal pois toda e qualquer privação ou restrição de direitos para quem a suporta apresenta conteúdo penoso Há contudo entendimentos minoritários no sentido de tratarse de instituto estritamente assistencial ou curativo razão pela qual não estaria submetido aos princípios vetores do Direito Penal dentre os quais o da reserva legal e da anterioridade1 No Direito Penal brasileiro penas e medidas de segurança apresentam claras distinções As penas têm finalidade eclética isto é retributiva e preventiva enquanto as medidas de segurança destinamse exclusivamente à prevenção de novas infrações penais prevenção especial2 As penas são aplicadas por período determinado guardando proporcionalidade com a reprovação do crime Já as medidas de segurança são aplicadas por período determinado quanto ao limite mínimo mas absolutamente indeterminado no tocante à duração máxima pois a sua extinção depende do fim da periculosidade do agente As penas têm como pressuposto a culpabilidade ao passo que as medidas de segurança reclamam a periculosidade do indivíduo No tocante aos destinatários as penas se dirigem aos imputáveis e semi imputáveis sem periculosidade Por sua vez as medidas de segurança se dirigem aos inimputáveis e aos semiimputáveis perigosos Não é possível a aplicação de medidas de segurança aos imputáveis Apenas a lei pode criar medidas de segurança Não podem ser veiculadas por medida provisória nos termos do art 62 1º I b da Constituição Federal Somente se admite a imposição de uma medida de segurança quando sua previsão legal for anterior à prática da infração penal eis que a essa espécie de sanção penal também incide o princípio constitucional da irretroatividade da lei penal mais severa CF art 5º XL A medida de segurança apenas pode ser aplicada pelo Poder Judiciário com observância do devido processo legal A aplicação de medida depende de três requisitos 1 prática de um fato típico e ilícito 2 periculosidade do agente e 3 não tenha ocorrido a extinção da punibilidade Deve ter sido praticada uma infração penal ou seja reclamamse certeza da autoria e prova da materialidade do fato delituoso O raciocínio a ser feito é o seguinte há provas para a condenação mas como o caso concreto não autoriza a imposição de pena é necessária a aplicação de medida de segurança Destarte o simples fato de ser a pessoa portadora de periculosidade não permite a incidência da medida de segurança É imperioso o respeito ao devido processo legal com o exercício do contraditório e da ampla defesa Exemplificativamente um inimputável que tenha praticado um fato típico em estado de necessidade não comete crime razão pela qual não se aplica medida de segurança Da mesma forma não incide essa espécie de sanção penal quando ausentes provas inequívocas da autoria e da materialidade do fato Em segundo lugar o agente deve possuir periculosidade E finalmente é obrigatório que o Estado ainda possua o direito de punir Nos termos do art 96 parágrafo único do Código Penal Extinta a punibilidade não se impõe medida de segurança nem subsiste a que tenha sido imposta Periculosidade é a efetiva probabilidade relativa ao responsável por uma infração penal inimputável ou semiimputável de voltar a envolverse em crimes ou contravenções penais Extraise da natureza e da gravidade do fato cometido e das circunstâncias indicadas na legislação nacional É considerada socialmente perigosa a pessoa que cometeu o fato quando é de temer que pratique novos fatos previstos na lei como infrações3 Não é assim a mera possibilidade de reincidência Exigese mais é dizer fazse necessário um juízo de probabilidade no qual a chance de nova infração penal ser praticada é concreta e potencial segundo as regras da experiência comum Reclamase um prognóstico completo calcado em conjecturas razoáveis de que o indivíduo tornará a cometer infrações penais De fato funcionando a periculosidade como um dos pressupostos das medidas de segurança e tendo essa espécie de sanção penal como função exclusiva a prevenção especial o magistrado deve analisar o futuro com o escopo de aferir a probabilidade de o agente praticar novos ilícitos penais Daí falarse em juízo de prognose Nas penas ao contrário operase um diagnóstico acerca do passado do agente para se concluir se é ou não necessária sua aplicação Falase nesse caso de juízo de diagnose Com efeito as penas têm como pressuposto a culpabilidade Em suma a pena se justifica em razão daquilo que fez o agente A medida de segurança por outro lado somente se legitima se necessária para evitar que o indivíduo venha novamente a enveredar pelo caminho da ilicitude penal De acordo com o sistema adotado pelo Código Penal a periculosidade pode ser presumida ou real Periculosidade presumida é a que ocorre quando a lei expressamente considera determinado indivíduo perigoso Essa presunção é absoluta iuris et de iure e o juiz tem a obrigação de impor ao agente a medida de segurança Aplicase aos inimputáveis do art 26 caput do Código Penal de modo que tais pessoas serão submetidas a medida de segurança quando comprovado seu envolvimento em uma infração penal Se um inimputável portanto praticou uma infração penal será tratado como perigoso prescindindose de conclusão pericial específica nesse sentido Basta ser inimputável e responsável por um crime ou contravenção penal Periculosidade real é a que deve ser provada no caso concreto isto é a lei não presume sua existência É aplicável aos semiimputáveis do art 26 parágrafo único do Código Penal Destarte quando um semiimputável comete uma infração penal será tratado como culpável salvo se o exame pericial que constatar sua responsabilidade diminuída concluir também e essa conclusão for aceita pelo magistrado pela sua periculosidade recomendando a substituição da pena por medida de segurança O inimputável CP art 26 caput que pratica uma infração penal é absolvido Não se aplica pena em virtude da ausência de seu pressuposto qual seja a culpabilidade Essa absolvição está prevista no art 386 VI do Código de Processo Penal Diante de sua periculosidade todavia impõese uma medida de segurança Tratase de sentença absolutória imprópria assim chamada por recair sobre o réu uma sanção penal na forma definida pelo art 386 parágrafo único III do Código de Processo Penal De acordo com a Súmula 422 do Supremo Tribunal Federal A absolvição criminal não prejudica a medida de segurança quando couber ainda que importe privação da liberdade Por outro lado no tocante ao semiimputável CP art 26 parágrafo único responsável por um crime ou contravenção penal a sentença é condenatória A presença da culpabilidade embora diminuída autoriza a imposição de pena reduzida obrigatoriamente de um a dois terços Se entretanto constatarse a sua periculosidade de forma a necessitar o condenado de especial tratamento curativo a pena reduzida pode ser substituída por medida de segurança O art 98 do Código Penal acolheu o sistema vicariante ou unitário pois ao semiimputável será aplicada pena reduzida de um a dois terços ou medida de segurança conforme seja mais adequado ao caso concreto Antes da reforma da Parte Geral do Código Penal pela Lei 72091984 imperava o sistema do duplo binário derivado do italiano doppio binario4 também chamado de duplo trilho ou dupla via pelo qual o semiimputável perigoso cumpria inicialmente a pena privativa de liberdade e ao final desta se subsistisse a periculosidade era submetido a medida de segurança Nada impede a imposição simultânea ao semiimputável de pena privativa de liberdade e de medida de segurança pela prática de fatos diversos situação que não viola o sistema vicariante Nesse contexto se o condenado estava cumprindo pena e sobreveio a imposição em outra ação penal de medida de segurança não é obrigatória a conversão da reprimenda em internação ou tratamento ambulatorial O Superior Tribunal de Justiça já se pronunciou nesse sentido Durante o cumprimento de pena privativa de liberdade o fato de ter sido imposta ao réu em outra ação penal medida de segurança referente a fato diverso não impõe a conversão da pena privativa de liberdade que estava sendo executada em medida de segurança Inicialmente convém apontar que o sistema vicariante afastou a imposição cumulativa ou sucessiva de pena e medida de segurança uma vez que a aplicação conjunta ofenderia o princípio do ne bis in idem já que o mesmo indivíduo suportaria duas consequências em razão do mesmo fato No caso em análise evidenciase que cada reprimenda imposta corresponde a um fato distinto Portanto não há que se falar em ofensa ao sistema vicariante porquanto a medida de segurança referese a um fato específico e a aplicação da pena privativa de liberdade correlacionase a outro fato e delito5 Em relação aos semiimputáveis a sentença sempre será condenatória tanto na hipótese de aplicação de pena privativa de liberdade como no caso de sua substituição por medida de segurança Mas uma vez aplicada a medida de segurança seguese o mesmo regramento existente para os inimputáveis no tocante à execução da sanção penal O art 96 do Código Penal apresenta duas espécies de medidas de segurança detentiva e restritiva Detentiva prevista no inciso I consiste em internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico ou à falta em outro estabelecimento adequado Importa em privação da liberdade do agente Restritiva elencada pelo inciso II é a sujeição a tratamento ambulatorial O agente permanece livre mas submetido a tratamento médico adequado O critério para escolha da espécie de medida de segurança a ser aplicada reside na natureza da pena cominada à infração penal Com efeito dispõe o art 97 caput do Código Penal que se o fato é punido com reclusão o juiz determinará obrigatoriamente sua internação Se o fato todavia for punível com detenção poderá o juiz optar entre a internação e o tratamento ambulatorial No caso de pena de detenção a escolha entre as medidas de segurança detentiva e restritiva deve ser guiada pelo grau de periculosidade do réu O rígido critério adotado pelo Código Penal é alvo de críticas por estabelecer um modelo padrão para medidas de segurança e levar à internação de diversas pessoas que poderiam ser tratadas de forma mais branda Cria inclusive distinções injustas entre imputáveis e inimputáveis O condenado pela prática de crime de furto simples dificilmente seria submetido ao cárcere pois teria direito a diversos institutos que evitam a privação da liberdade tais como penas restritivas de direitos sursis etc Se inimputável contudo seria inevitavelmente internado por se tratar de crime punido com reclusão Em face disso há propostas para a correção do equívoco legislativo reservando a internação somente aos casos em que a periculosidade do agente efetivamente reclame a privação da liberdade Para Carlota Pizarro de Almeida Não é correto portanto quando se trate de portadores de anomalia psíquica estabelecer uma correspondência entre a medida de segurança e a gravidade do fato praticado Mas já será importante estabelecêla em relação à perigosidade do agente só assim se respeita o princípio da proporcionalidade6 O Supremo Tribunal Federal acolhe esta proposta doutrinária Em casos excepcionais admitese a substituição da internação por medida de tratamento ambulatorial quando a pena estabelecida para o tipo é a reclusão notadamente quando manifesta a desnecessidade da internação7 É também o entendimento do Superior Tribunal de Justiça Na fixação da medida de segurança por não se vincular à gravidade do delito perpetrado mas à periculosidade do agente cabível ao magistrado a opção por tratamento mais apropriado ao inimputável independentemente de o fato ser punível com reclusão ou detenção em homenagem aos princípios da adequação da razoabilidade e da proporcionalidade arts 26 e 97 do CP8 A sentença que aplica medida de segurança deve obrigatoriamente fixar o prazo mínimo de internação ou tratamento ambulatorial entre um a três anos nos termos do art 97 1º in fine do Código Penal O prazo mínimo se destina à realização do exame de cessação da periculosidade O Código Penal estabelece em seu art 97 1º 1ª parte A internação ou tratamento ambulatorial será por tempo indeterminado perdurando enquanto não for averiguada mediante perícia médica a cessação de periculosidade A medida de segurança pelo texto da lei pode ser eterna De fato se a periculosidade durar por toda a vida do agente pelo mesmo período se arrastará a internação ou o tratamento ambulatorial Essa opção legal se funda na premissa de que por ser a medida de segurança um bem destinada a proteger o responsável por uma infração penal e também recuperálo do mal de que padece não encontra limites no tempo O que é bom não deve ser barrado por questões temporais A escolha legislativa todavia não é unânime Diversos penalistas pugnam pela inconstitucionalidade da duração indeterminada quiçá perpétua da medida de segurança espécie de sanção penal Além disso se o imputável é protegido pelo limite de 30 anos para cumprimento da pena privativa de liberdade não poderia um inimputável doente ser internado por prazo indeterminado9 Essa posição é atualmente aceita pelo Supremo Tribunal Federal A interpretação sistemática e teleológica dos arts 75 97 e 183 os dois primeiros do Código Penal e o último da Lei de Execuções Penais deve fazerse considerada a garantia constitucional abolidora das prisões perpétuas A medida de segurança fica jungida ao período máximo de trinta anos10 O Superior Tribunal de Justiça de seu turno tem inovado sobre o assunto decidindo que a duração da medida de segurança não pode ultrapassar o limite máximo da pena cominada ao delito praticado em obediência aos princípios da isonomia e da proporcionalidade pois caso contrário os destinatários das medidas de segurança normalmente inimputáveis acabariam recebendo um tratamento jurídicopenal mais severo do que aquele dispensado aos imputáveis Este é o entendimento consolidado na Súmula 527 O tempo de duração da medida de segurança não deve ultrapassar o limite máximo da pena abstratamente cominada ao delito praticado Em nossa opinião a posição adotada pelo STJ desponta como a mais adequada acerca do máximo de duração da medida de segurança especialmente no tocante à internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico Com efeito se uma pessoa culpável imputável ou semi imputável e portanto dotada de livre arbítrio e responsável por uma conduta reprovável pode ser apenada até o limite previsto em lei não há razão para se permitir que um indivíduo envolvido pela periculosidade inimputável ou semiimputável normalmente portador de doença mental receba uma medida de segurança por período superior Com o trânsito em julgado da sentença que aplica a medida de segurança será ordenada pelo juiz a expedição de guia para a execução LEP art 171 Essa guia é imprescindível pois sem ela ninguém será internado em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico nem submetido a tratamento ambulatorial para cumprimento da medida de segurança LEP art 172 Em se tratando de internação o agente é obrigatoriamente submetido a exame criminológico No tratamento ambulatorial esse exame é facultativo LEP art 174 Durante a execução da medida de segurança o sentenciado pode contratar médico de sua confiança pessoal para orientar e acompanhar o tratamento Em caso de divergência entre o profissional particular e o médico oficial decidirá o juiz da execução como peritum peritorum isto é o perito dos peritos LEP art 43 e parágrafo único Ao término do prazo mínimo de duração da medida de segurança será averiguada a cessação da periculosidade pelo exame das condições pessoais do agente O procedimento a ser seguido consta do art 175 da Lei de Execução Penal I a autoridade administrativa até 1 um mês antes de expirar o prazo mínimo de duração da medida de segurança remeterá ao juiz da execução minucioso relatório instruído com o laudo psiquiátrico que o habilite a resolver sobre a revogação ou permanência da medida Prescindese de intervenção judicial II o juiz pode determinar a realização de diligências para esclarecer dúvidas acaso existentes III com a juntada do relatório e realização de eventuais diligências serão ouvidos sucessivamente o Ministério Público e o curador ou defensor no prazo de 3 três dias para cada um O juiz nomeará curador ou defensor se o sentenciado não o tiver IV o juiz de ofício ou a pedido das partes poderá determinar a realização de novas diligências ainda que expirado o prazo mínimo de duração da medida de segurança e V ouvidas as partes e cumpridas as diligências acaso determinadas o juiz profere sua decisão no prazo de 5 cinco dias Excepcionalmente o juiz pode determinar a antecipação do exame de cessação da periculosidade embora não decorrido o período mínimo de duração da medida de segurança atendendo a pedido fundamentado do Ministério Público ou do interessado seu procurador ou defensor LEP art 176 Ainda que não previsto em lei entendese que o juiz pode também de ofício ordenar antecipadamente a realização do exame quando tiver ciência de fato relevante capaz de justificar sua atuação Se concluir pela persistência da periculosidade o juiz manterá a medida de segurança devendo a autoridade administrativa renovar o exame psiquiátrico de ano em ano ou a qualquer tempo se o determinar o juiz da execução CP art 97 2º Por outro lado se concluir pela cessação da periculosidade o juiz suspende a execução da medida de segurança determinando a desinternação para a espécie detentiva ou a liberação para a modalidade restritiva do agente Essa decisão comporta agravo em execução com efeito suspensivo pois a desinternação ou liberação dependem do trânsito em julgado LEP art 179 Essa é a única hipótese de agravo de execução com efeito suspensivo LEP art 197 cc art 179 A desinternação e a liberação serão sempre condicionadas pois o juiz deve impor ao agente as mesmas condições do livramento condicional LEP art 178 Essas condições se dividem em obrigatórias e facultativas São condições obrigatórias 1 obter ocupação lícita se apto para o trabalho 2 comunicar periodicamente ao juiz sua ocupação e 3 não mudar da comarca sem prévia autorização judicial LEP art 178 cc o art 132 1º O juiz tem ainda a discricionariedade para impor condições facultativas tais como 1 não mudar de residência sem comunicação ao juiz e à autoridade incumbida da observância cautelar e de proteção 2 recolherse à habitação em hora fixada e 3 não frequentar determinados lugares LEP art 178 cc o art 132 2º A desinternação e a liberação de natureza condicional serão revogadas pelo juízo da execução se o agente antes do decurso de 1 ano praticar fato e não necessariamente infração penal indicativo da manutenção da sua periculosidade CP art 97 3º O internado ou submetido a tratamento ambulatorial que foi liberado pelo período de 1 um ano a contar da saída do estabelecimento é chamado de a b c egresso pelo art 26 I da Lei de Execução Penal Em sua redação original o art 80 caput do Código Penal previa a medida de segurança provisória ou preventiva é dizer aplicada durante o trâmite da ação penal Entretanto com a entrada em vigor da Lei 72091984 Reforma da Parte Geral do Código Penal este instituto foi suprimido do sistema jurídicopenal brasileiro Com a edição da Lei 124032011 reafirmouse o instituto da internação provisória inserida entre as medidas cautelares de cunho pessoal no art 319 VII do Código de Processo Penal Para a sua utilização exigemse os seguintes requisitos cumulativos crime praticado com emprego de violência à pessoa ou grave ameaça exemplos roubo homicídio estupro etc perícia concluindo pela inimputabilidade ou semiimputabilidade do agente Nesse último caso é imprescindível a demonstração da periculosidade indicando a necessidade do tratamento curativo e não somente da diminuição da pena risco de reiteração de novas condutas criminosas Este risco é presumido no tocante aos inimputáveis em face da sua periculosidade No tocante aos semiimputáveis e desde que seja recomendável o especial tratamento curativo o risco de reiteração deve ser provado no caso concreto Se não for recomendado o especial tratamento curativo cabe prisão preventiva desde que presentes os requisitos legais CPP arts 282 e 311 a 313 Esta inovação é salutar pois evita o encarceramento de pessoas portadoras de doenças mentais as quais anteriormente eram presas preventivamente e ficavam desprovidas de tratamento médico prejudicando ainda mais o seu já debilitado estado No entanto há um inconveniente Como a imputabilidade de todo ser humano é presumida a partir dos 18 anos muitas pessoas continuarão sendo presas provisoriamente e somente durante a instrução criminal mais especificamente no bojo do incidente de insanidade mental será provada a inimputabilidade ou semiimputabilidade autorizando a partir daí a internação provisória Vale destacar que o art 319 VII do Código de Processo Penal prevê somente a internação provisória Não se admite por falta de previsão legal o tratamento ambulatorial preventivo ou seja antes do trânsito em julgado da sentença ou acórdão que aplica essa modalidade de medida de segurança De acordo com o art 97 4º do Código Penal em qualquer fase do tratamento ambulatorial poderá o juiz determinar a internação do agente se essa providência for necessária para fins curativos E ainda estabelece o art 184 da Lei de Execução Penal O tratamento ambulatorial poderá ser convertido em internação se o agente revelar incompatibilidade com a medida Além disso determina o parágrafo único do citado dispositivo legal que nessa hipótese o prazo mínimo de internação será de 1 um ano Cuidase da conversão da internação para tratamento ambulatorial durante o prazo de duração da medida de segurança como forma de preparar o sentenciado progressivamente para o retorno ao convívio social nos casos em que a internação não se mostra mais necessária embora o agente dependa da manutenção dos cuidados médicos Essa providência nada obstante não prevista em lei tem sido admitida na prática forense uma vez que a medida de segurança não possui o caráter de castigo podendo ser abrandada quando a situação fática dispensar a privação da liberdade do agente Confirase a posição do Superior Tribunal de Justiça Ainda que a cessação da periculosidade do paciente tenha sido atestada por dois laudos consecutivos não é recomendável a desinternação imediata tendo em vista as circunstâncias do caso já que a doença do paciente é controlada apenas mediante o uso contínuo da medicação que este não tem qualquer respaldo familiar e que possui extensa folha de antecedentes demonstrando a possibilidade de reiteração de condutas previstas como crime Cabível no caso a desinternação progressiva do paciente para que se adapte ao meio externo e à responsabilidade de dar continuidade ao tratamento quando em liberdade11 É também o entendimento reinante no Supremo Tribunal Federal Observouse que na espécie o último laudo psiquiátrico informara que apesar de persistir a periculosidade do agente esta se encontraria atenuada de modo a indicar ser cabível a adoção da desinternação progressiva12 Para os partidários da desinternação progressiva o inimputável ou o semi imputável tem o direito à progressividade ao tratamento ambulatorial sob pena de afrontarse a individualização na execução da sanção criminal prevista constitucionalmente no art 5º XLVI A progressividade do internamento ao tratamento ambulatorial consiste numa garantia constitucional inerente a qualquer cidadão configurandose sua inadmissibilidade um contrassenso às finalidades do tratamento13 Se no curso da execução da pena privativa de liberdade sobrevier ao condenado doença mental ou perturbação de saúde mental o art 183 da Lei de Execução Penal autoriza o juiz de ofício a requerimento do Ministério Público ou da autoridade administrativa a substituíla por medida de segurança Essa substituição somente deve ocorrer quando a doença mental ou perturbação da saúde mental for de natureza permanente Se transitória transferese o condenado a hospital de custódia e tratamento psiquiátrico e uma vez curado retorna ao estabelecimento prisional nos moldes do art 41 do Código Penal A conversão somente poderá ser efetuada durante o prazo de cumprimento da pena e necessita de perícia médica Realizada a conversão discutese o período máximo de duração da medida de segurança É grande a controvérsia existindo quatro posições sobre o assunto 1ª posição A medida de segurança deverá persistir por prazo indeterminado até a cessação da periculosidade nos moldes do art 97 1º do Código Penal Pouco importa a duração da pena privativa de liberdade substituída 2ª posição A medida de segurança terá a duração máxima de 30 anos limite fixado pelo art 75 do Código Penal para a pena privativa de liberdade 3ª posição A medida de segurança terá a duração da pena máxima cominada em abstrato à infração penal que ensejou a imposição da pena privativa de liberdade 4ª posição A medida de segurança terá igual duração à pena privativa de liberdade originariamente aplicada O sentenciado cumpre a medida de segurança pelo restante da pena aplicada Como observa Antonio Carlos da Ponte Realizada a conversão que optará por uma medida de segurança detentiva internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico ou restritiva sujeição a tratamento ambulatorial passam a reger a execução penal as regras próprias da sanção aplicada em substituição Isso significa que a medida de segurança será estabelecida por um prazo mínimo variável de um a três anos sem contudo que seu prazo máximo ultrapasse aquele correspondente à pena substituída sob pena de ofensa à coisa julgada uma vez que a superveniência de doença mental não tem o condão de retroagir seus efeitos de modo a alterar o que ficou decidido e transitou em julgado Do contrário estarseia de modo indireto impondose ao sentenciado o cumprimento correspondente ao somatório da pena e da medida de segurança possibilidade definitivamente afastada pelo sistema vicariante14 É também a posição do Superior Tribunal de Justiça Em se tratando de medida de segurança aplicada em substituição à pena corporal prevista no art 183 da Lei de Execução Penal sua duração está adstrita ao tempo que resta para o cumprimento da pena privativa de liberdade estabelecida na sentença condenatória sob pena de ofensa à coisa julgada15 Reza o art 99 do Código Penal O internado será recolhido a estabelecimento dotado de características hospitalares e será submetido a tratamento Como consequência desse mandamento legal o sentenciado a quem foi imposta medida de segurança detentiva não pode ser colocado em estabelecimento prisional comum Tal situação caracteriza nítido constrangimento ilegal sanável pela via do habeas corpus Ele deve aguardar o surgimento de vaga em tratamento ambulatorial pois a responsabilidade pela precariedade do sistema penal não lhe pode ser transferida pelo Estado É a posição do Supremo Tribunal Federal A 2ª Turma não conheceu de habeas corpus mas deferiu a ordem de ofício para determinar a inclusão do paciente em tratamento ambulatorial sob a supervisão do juízo da execução criminal No caso a pena privativa de liberdade ao paciente dois anos um mês e vinte dias de reclusão fora substituída por medida de segurança consistente em internação hospitalar ou estabelecimento similar para tratamento de dependência química pelo prazo de dois anos e ao seu término pelo tratamento ambulatorial Nada obstante passados quase três anos do recolhimento do paciente em estabelecimento prisional o Estado não lhe teria garantido o direito de cumprir a medida de segurança fixada pelo juízo sentenciante16 Os arts 45 parágrafo único e 47 ambos da Lei 113432006 disciplinam expressamente as medidas de segurança no tocante aos crimes nela previstos em relação aos agentes inimputáveis e semiimputáveis dependentes de drogas A internação decorrente da condenação pela prática de ato infracional é medida socioeducativa e não sanção penal e deverá ser cumprida em entidade exclusiva para adolescentes em local distinto daquele destinado ao abrigo obedecida rigorosa separação por critérios de idade compleição física e gravidade da infração Lei 80691990 ECA art 123 O fato de o adolescente infrator ter completado 21 vinte e um anos impõe a sua liberação compulsória da medida de internação ECA art 121 5º Portanto com a superveniência dos 21 anos de idade como inexiste espaço sequer à medida socioeducativa não é possível aplicar por analogia medida de segurança prevista no Código Penal àquele sob proteção do Estatuto da Criança e do Adolescente ainda que a personalidade do infrator revele manifesta periculosidade 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 É o caso de TOLEDO Francisco de Assis Princípios básicos de direito penal 5 ed 13 tir São Paulo Saraiva 2007 p 4042 As funções objetivos imediatos ou fins meios das medidas de segurança são de prevenção especial de recuperação social do agente perigoso através do tratamento da anomalia psíquica ou da correção da tendência criminosa e ainda inocuização ou neutralização da perigosidade criminal do infrator CARVALHO Américo Taipa de Direito penal Parte Geral Questões fundamentais Teoria Geral do Crime 2 ed Coimbra Coimbra Editora 2008 p 76 NOGUEIRA J C Ataliba Medidas de segurança São Paulo Saraiva 1937 p 221 DOTTI René Ariel Visão geral da medida de segurança In SHECAIRA Sérgio Salomão Org Estudos criminais em homenagem a Evandro Lins e Silva São Paulo Método 2001 p 310 HC 275635SP rel Min Nefi Cordeiro 6ª Turma j 08032016 noticiado no Informativo 579 ALMEIDA Carlota Pizarro de Modelos de inimputabilidade Da teoria à prática Coimbra Almedina 2000 p 34 HC 85401RS rel Min Cezar Peluso 2ª Turma j 04122009 REsp 1266225PI rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 16082012 Em igual sentido REsp 912668SP rel Min Rogério Schietti Cruz 6ª Turma j 18032014 É o caso de ZAFFARONI Eugenio Raúl PIERANGELLI José Henrique Manual de direito penal brasileiro Parte geral 7 ed São Paulo RT 2007 v 1 p 733 HC 84219SP rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 16082005 E também HC 107432RS rel Min Ricardo Lewandowski 1ª Turma j 24052011 noticiado no Informativo 628 HC 89212SP rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 27032008 HC 98360RS rel Min Ricardo Lewandowski 1ª Turma j 04082009 noticiado no Informativo 554 Na mesma direção HC 102489RS rel Min Luiz Fux 1ª Turma j 22112011 noticiado no Informativo 649 13 14 15 16 FERRARI Eduardo Reale Medidas de segurança e direito penal no estado democrático de direito São Paulo RT 2001 p 172173 PONTE Antonio Carlos da Inimputabilidade e processo penal 2 ed São Paulo Quartier Latin 2007 p 87 HC 130162SP rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 02082012 E também HC 219014RJ rel Min Og Fernandes 6ª Turma j 16052013 HC 122670SP rel Min Ricardo Lewandowski 2ª Turma j 05082014 noticiado no Informativo 753 É também o entendimento do STJ RHC 38499SP rel Min Maria Thereza De Assis Moura 6ª Turma j 11032014 noticiado no Informativo 537 441 442 443 a b c d INTRODUÇÃO O instituto da ação penal em que pese ser mais intimamente relacionado ao processo penal e por consequência disciplinado pelo Código de Processo Penal é também tratado pelos arts 100 a 106 do Código Penal o que redunda em críticas doutrinárias por ser o direito de ação um direito subjetivo processual autônomo e distinto do direito material Essa postura se justifica pelo fato de diversas questões afetas à ação penal implicarem na extinção da punibilidade ampliando a esfera de liberdade do cidadão e retirando do Estado o direito de punir CONCEITO Ação penal é o direito de exigir do Estado a aplicação do direito penal objetivo em face do indivíduo envolvido em um fato tipificado em lei como infração penal CARACTERÍSTICAS O direito ao exercício da ação penal apresenta as seguintes características público a atividade jurisdicional provocada é incumbência do Poder Público subjetivo o seu titular exige do Estado a prestação jurisdicional autônomo independe da efetiva existência do direito material abstrato independe do resultado final da postulação favorável ou desfavorável e e 444 4441 a b c 4442 instrumental embora o fim último do autor seja o de obter um resultado favorável à pretensão insatisfeita o direito de ação tem por fim a instauração de um processo com a tutela jurisdicional para a composição da lide Esse direito instrumental porém só existe porque é conexo a um caso concreto1 CLASSIFICAÇÃO DA AÇÃO PENAL A classificação da ação penal pode ser efetuada levando em consideração a tutela jurisdicional invocada ou a titularidade para sua propositura Divisão com base na tutela jurisdicional invocada É a utilizada também no processo civil e classifica as ações em de conhecimento visa o reconhecimento do direito submetido à apreciação judicial É exemplo a ação proposta pelo Ministério Público ou pelo ofendido ou seu representante legal visando a condenação do responsável por um fato típico e ilícito É também chamada de ação penal condenatória2 cautelar busca resguardar o direito invocado na ação principal de forma a permitir a eficácia da prestação jurisdicional Há diversos provimentos cautelares tal como o sequestro previsto nos arts 125 e 132 do Código de Processo Penal medida destinada a efetuar a constrição dos bens adquiridos com os proventos da infração penal e de execução almeja a satisfação de um direito já reconhecido A Lei 72101984 cuida da execução da sentença penal condenatória Divisão subjetiva É a classificação adotada pelo art 100 do Código Penal A ação penal é pública salvo quando a lei expressamente a declara privativa do ofendido Essa divisão parte da titularidade para propositura da ação penal É pública a proposta pelo Ministério Público e privada a que tem como sujeito ativo o ofendido ou seu representante legal 445 4451 CONDIÇÕES DA AÇÃO PENAL Condições genéricas Ao contrário do que se dá no Código de Processo Civil arts 17 e 485 inc VI o Código de Processo Penal não indica de forma expressa as condições genéricas para a propositura da ação penal São indicadas pela doutrina e pela jurisprudência no entanto três condições possibilidade jurídica do pedido legitimidade ad causam e interesse processual3 Afrânio Silva Jardim aponta ainda uma quarta condição genérica qual seja a justa causa4 Essa posição anteriormente doutrinária foi recepcionada pela Lei 117192008 que deu nova redação ao art 395 do Código de Processo Penal para o fim de estabelecer em seu inciso III a rejeição da denúncia quando faltar justa causa para o exercício da ação penal Passemos à análise de cada uma delas Para o possível exercício do direito de ação o fato descrito na denúncia ou queixacrime há de ser típico ou seja deve encontrar subsunção na lei penal incriminadora Por tal motivo dispõe o art 395 II do Código de Processo Penal A denúncia ou queixa será rejeitada quando faltar pressuposto processual ou condição para o exercício da ação penal Para Fernando Capez A fim de não se confundir a análise dessa condição da ação com o mérito a apreciação da possibilidade jurídica do pedido deve ser feita sobre a causa de pedir causa petendi considerada em tese desvinculada de qualquer prova porventura existente Analisase o fato tal qual narrado na peça inicial sem se perquirir se essa é ou não a verdadeira realidade a fim de se concluir se o ordenamento material cominalhe em abstrato uma sanção Deixase para o mérito a análise dos fatos provados5 Temse portanto que a verificação do preenchimento da condição da ação em exame é efetuada tomandose em consideração o ordenamento jurídico penal isto é verificase se os fatos narrados pela inicial acusatória encontram previsão em lei penal incriminadora independentemente nesse primeiro momento da prova concreta de sua efetiva ocorrência ad causam Na consagrada definição de Alfredo Buzaid legitimidade ad causam é a pertinência subjetiva para a ação Nesses termos apenas a pessoa cuja titularidade da ação penal é garantida pela lei tem o poder de ajuizála legitimidade ativa bem como somente aquele supostamente responsável pelo fato definido como infração penal pode figurar no polo passivo dessa mesma ação legitimidade passiva A lei penal estabelece como regra geral a ação penal pública que apenas poderá ser proposta pelo Ministério Público na forma definida pelo art 129 I da Constituição Federal Destarte nos crimes de ação penal pública se a demanda for iniciada pelo ofendido ou seu representante legal manifesta será a ilegitimidade ativa ad causam salvo na situação prevista no art 5º LIX da Constituição Federal e no art 29 do Código de Processo Penal ação penal privada subsidiária da pública Da mesma forma em caso de ação penal privada se a contenda for iniciada pelo Ministério Público estará configurada a ilegitimidade para agir Essa condição deve ser analisada pelo magistrado por ocasião do recebimento da denúncia ou queixa constituindose em causa de sua rejeição a ilegitimidade da parte CPP art 395 II O interesse processual se relaciona com a utilidade ou necessidade da providência jurisdicional e com a adequação do meio utilizado para alcançar o fim almejado A obrigatoriedade da providência jurisdicional para que se possa impor qualquer sanção ao envolvido em uma infração penal decorre do art 5º LIV da Constituição Federal ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal 4452 Portanto a ação penal é pressuposto para aplicação da pena restando preenchido o requisito da necessidade A utilidade por sua vez se revela na eficácia da decisão judicial para satisfação do interesse pleiteado pelo titular da ação Por esse motivo a ocorrência de qualquer causa extintiva da punibilidade implicará na rejeição da denúncia ou queixa CPP art 395 II pois a ação penal será completamente inócua ou ainda na absolvição sumária CPP art 397 IV Apontase rotineiramente a prescrição antecipada ou virtual como hipótese de inutilidade do exercício da ação penal Cumpre frisar contudo não ser essa espécie doutrinária de extinção da punibilidade aceita pelo Supremo Tribunal Federal por ausência de previsão legal6 Finalmente a adequação desponta na compatibilidade entre o meio empregado pelo titular do direito posto em debate ação penal e a sua pretensão condenação do autor do fato típico e ilícito Para Afrânio Silva Jardim às três condições clássicas que se apresentam no processo civil deve ser acrescentada uma quarta a justa causa ou seja um lastro mínimo de prova capaz de fornecer arrimo à pretensão acusatória uma vez que a simples instauração do processo penal atinge o status dignitatis do imputado Esse lastro probatório é fornecido pelo inquérito policial ou pelas peças de informação procedimentos investigatórios e informativos que devem acompanhar a inicial acusatória CPP arts 12 39 5º e 46 1º7 Nessa esteira os arts 647 e 648 I do Código de Processo Penal rotulam como coação ilegal a ausência de justa causa na ação penal autorizando a concessão da ordem de habeas corpus para sanar o problema8 Com a entrada em vigor da Lei 117192008 a ausência de justa causa para o exercício da ação penal autoriza a rejeição da denúncia ou queixa CPP art 395 III9 Condições específicas ou condições de procedibilidade São condições específicas ou condições de procedibilidade aquelas estabelecidas em lei cuja ausência impede o regular exercício do direito de ação Encontram respaldo no art 395 II 2ª parte do Código de Processo Penal ao estatuir que a denúncia ou queixa será rejeitada quando faltar condição para o exercício da ação penal São exemplos de condições de procedibilidade 1 a representação do ofendido ou de quem tiver qualidade para representálo e a requisição do Ministro da Justiça na ação penal pública condicionada CPP art 24 caput 2 a entrada do agente em território nacional em caso de crime praticado no exterior CP art 7º 2º a e o trânsito em julgado da sentença que anula o casamento no crime de induzimento a erro essencial e ocultação de impedimento CP art 236 parágrafo único O Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça também reconhecem como condição de procedibilidade a conclusão do procedimento administrativo com o consequente lançamento definitivo do tributo quando se discute a existência do débito ou do montante devido para a instauração da ação penal por crimes contra a ordem tributária previstos no art 1º da Lei 8137199010 Relativamente aos crimes definidos no art 1º I a IV da Lei 8137199011 o Supremo Tribunal Federal para espancar qualquer polêmica editou a Súmula Vinculante 24 Não se tipifica crime material contra a ordem tributária previsto no artigo 1º inciso I a IV da Lei nº 813790 antes do lançamento definitivo do tributo12 Convém destacar que no descaminho tipificado no art 334 do Código Penal é prescindível a prévia constituição do crédito tributário na esfera administrativa a título de condição de procedibilidade pois se trata de delito formal Na visão do Superior Tribunal de Justiça O fato de um dos bens jurídicos tutelados pelo direito penal no crime de descaminho ser a arrecadação tributária não pode levar à conclusão de que sua natureza jurídica é a mesma do crime previsto no art 1º da Lei 81371990 De rigor conceder tratamento adequado às especificidades dos respectivos tipos a fim de emprestarlhes interpretação adequada à natureza de cada delito considerado o sistema jurídico como um todo à luz do que pretendeu o Legislador ao editar referidas normas A norma penal do art 334 do Código Penal elencada sob o Título XI Dos Crimes Contra a Administração Pública visa a proteger em primeiro plano a integridade do sistema de controle de entrada e saída de mercadorias do país como importante instrumento de política econômica Engloba a própria estabilidade das atividades comerciais dentro do país refletindo na balança comercial entre o Brasil e outros países Na fraude pressuposta pelo referido tipo ademais há artifícios mais amplos para a frustração da atividade fiscalizadora do Estado do que o crime de sonegação fiscal podendo referirse tanto à utilização de documentos falsificados quanto e em maior medida à utilização de rotas marginais e estradas clandestinas para fuga da fiscalização alfandegária A exigência de lançamento tributário definitivo no crime de descaminho esvazia o próprio conteúdo do injusto penal equivalendo quase a uma descriminalização por via hermenêutica já que segundo a legislação aduaneira e tributária nesses casos incide a pena de perdimento da mercadoria operação que tem por efeito jurídico justamente tornar insubsistente o fato gerador do tributo e por conseguinte impedir a apuração administrativa do valor devido A prática do descaminho não se submete à regra instituída pelo Supremo Tribunal Federal ao editar a Súmula Vinculante 24 expressa em exigir o exaurimento da via administrativa somente em crime material contra a ordem tributária previsto no art 1º incisos I a IV da Lei 81371990 Em suma o crime de descaminho perfazse com o ato de iludir o pagamento de imposto devido pela entrada de mercadoria no país Não é necessária a apuração administrativofiscal do montante que deixou de ser recolhido para a configuração do delito embora este possa orientar a aplicação do princípio da insignificância quando se tratar de conduta isolada Tratase de crime formal e não material razão pela qual o resultado da conduta delituosa relacionada ao quantum do imposto devido não integra o tipo legal13 446 4461 AÇÃO PENAL PÚBLICA Nos termos do art 129 I da Constituição Federal é função institucional do Ministério Público promover privativamente a ação penal pública na forma da lei A ação penal pública é iniciada por denúncia ajuizada pelo Ministério Público O oferecimento da denúncia pode no entanto estar condicionado à representação da vítima ou seu representante legal ou ainda à requisição do Ministro da Justiça em hipóteses expressamente elencadas pela lei penal A ação penal pública portanto pode ser condicionada ou incondicionada em conformidade com o art 100 1º do Código Penal A ação pública é promovida pelo Ministério Público dependendo quando a lei o exige de representação do ofendido ou de requisição do Ministro da Justiça No mesmo sentido o disposto pelo art 24 caput do Código de Processo Penal Nos crimes de ação pública esta será promovida pelo Ministério Público mas dependerá quando a lei o exigir de requisição do Ministro da Justiça ou de representação do ofendido ou de quem tiver qualidade para representálo Princípios A ação penal pública é regida pelos seguintes princípios 1 Oficialidade ou autoritariedade os órgãos responsáveis pela persecução penal são públicos oficiais e a eles é atribuída autoridade uma vez que o Estado detém a titularidade exclusiva do direito de punir14 2 Obrigatoriedade ou legalidade se estiverem presentes elementos suficientes à propositura da ação penal não há discricionariedade por parte do Ministério Público que deverá obrigatoriamente oferecer denúncia Por esse motivo diz o art 24 caput do Código de Processo Penal que esta será promovida Pela mesma razão o arquivamento do inquérito policial há de ser necessariamente motivado CPP art 28 dependendo de pedido expresso do Parquet seguido do deferimento igualmente explícito da autoridade judiciária CPP art 18 e Súmula 524 do STF Em outras palavras não há espaço no sistema processual brasileiro para o arquivamento implícito15 Esse princípio é mitigado pela previsão contida no art 98 I da Constituição Federal que permite a transação penal nas infrações penais de menor potencial ofensivo cuja regulamentação se deu pelo art 76 caput da Lei 90991995 3 Indivisibilidade a ação penal pública deve englobar todos os envolvidos coautores e partícipes na infração penal regra que decorre do próprio princípio da obrigatoriedade O Ministério Público porém não está obrigado a ofertar denúncia quando não houver elementos probatórios mínimos para demonstrar sumariamente a participação de uma determinada pessoa no ilícito penal A exclusão de um agente entretanto deve ser suficientemente justificada pedindose no tocante a ele o arquivamento do inquérito policial ou das peças de informação16 Com interpretação divergente há autores que falam na divisibilidade da ação penal pública no sentido de que o processo penal pode ser desmembrado pois o oferecimento de denúncia contra um acusado não exclui a possibilidade futura de ação penal contra outros envolvidos e além disso permitese o aditamento da denúncia com a inclusão de corréu a qualquer tempo e ainda a propositura de nova ação penal contra agente não incluído em 4462 processo já sentenciado No famoso inquérito do mensalão assim se pronunciou o Supremo Tribunal Federal Também não procede a alegação de que a ausência de acusação contra dois supostos envolvidos beneficiados por acordo de delação premiada conduziria à rejeição da denúncia por violação ao princípio da indivisibilidade da ação penal A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é pacífica no sentido da inaplicabilidade de tal princípio à ação penal pública o que aliás se depreende da própria leitura do art 48 do Código de Processo Penal17 4 Indisponibilidade ou indesistibilidade depois de instaurada a ação penal o Ministério Público não poderá dela desistir CPP art 42 bem como lhe é vedado desistir de eventual recurso interposto CPP art 576 Esse princípio é abrandado pelo instituto disciplinado pelo art 89 da Lei 90991995 que autoriza o Parquet a propor ao acusado depois do oferecimento da denúncia a suspensão condicional do processo pelo prazo de dois a quatros anos o qual se decorrido integralmente sem revogação implicará na extinção da punibilidade 5 Intranscendência a ação penal somente pode ser ajuizada contra os supostos responsáveis pela prática da infração penal não abrangendo seus sucessores ou eventuais responsáveis civis Para a condenação dos responsáveis pela indenização em se tratando de pessoas distintas dos envolvidos no ilícito penal deverá ser proposta ação autônoma de conhecimento em consonância com a legislação processual civil 6 Oficiosidade salvo no caso da ação pública condicionada os órgãos encarregados pela persecução penal devem agir de ofício independentemente de provocação 7 Suficiência a ação penal é capaz de solucionar por si só a questão prejudicial não ligada ao estado civil das pessoas Logo é prescindível aguardar a solução de qualquer outra questão no âmbito cível Ação penal pública incondicionada É a espécie de ação penal iniciada pelo Ministério Público com o 4463 oferecimento de denúncia que depende somente da existência de prova da materialidade e de indícios de autoria de um fato previsto em lei como infração penal A grande maioria das infrações penais pertence a essa categoria de ação penal Consequentemente sua pertinência é obtida por via residual isto é sempre que a lei não exigir a representação do ofendido ou de quem tiver qualidade para representálo somente se procede mediante representação a requisição do Ministro da Justiça ou ainda indicar o cabimento de ação penal privada somente se procede mediante queixa o Ministério Público poderá oferecer denúncia se presentes seus requisitos independentemente de qualquer tipo de provocação Ação penal pública condicionada É condicionada a ação penal quando a lei expressamente exigir como condição para o oferecimento da denúncia a existência de representação do ofendido ou de quem tiver qualidade para representálo ou ainda de requisição do Ministro da Justiça CP art 100 1º e CPP art 24 A necessidade de representação do ofendido ou requisição do Ministro da Justiça visa proteger o ofendido evitando que o escândalo do processo strepitus judicii ou strepitus fori seja ainda mais prejudicial do que a ocorrência do crime em si Não há consenso doutrinário sobre o assunto Hélio Tornaghi as considerava condições objetivas de punibilidade18 enquanto Ada Pellegrini Grinover entende ser a representação uma parcela da possibilidade jurídica do pedido já que sem ela a pretensão deduzida em juízo sequer pode ser admitida por ser juridicamente impossível19 Para Fernando Capez20 e Fernando da Costa Tourinho Filho21 a representação do ofendido ou de seu representante legal e a requisição do Ministro da Justiça são condições de procedibilidade 446321 446322 Julio Fabbrini Mirabete por sua vez considera a representação e a requisição como condições suspensivas de procedibilidade já que sem elas não pode ser proposta a ação penal pública22 O Supremo Tribunal Federal entende tratarse de condição de procedibilidade O oferecimento da representação condição de procedibilidade da ação penal pública condicionada não exige requisito formal podendo ser suprida pela manifestação expressa da vítima ou de seu representante no sentido do prosseguimento da ação penal contra o autor23 Conceito A representação também chamada de delatio criminis postulatória apresenta duplo aspecto é simultaneamente autorização e pedido para que se possa iniciar a persecução penal nos casos exigidos em lei Legitimados Podem oferecer representação 1 O ofendido quando maior de 18 anos CPP art 24 O art 34 do Código de Processo Penal que traçava a legitimidade concorrente para representação entre o ofendido maior de 18 e menor de 21 anos de idade e seu representante legal foi tacitamente revogado pelo art 5º do Código Civil de 2002 que não mais prevê a incapacidade relativa para tal faixa etária De fato o fundamento da concorrência na legitimidade era o desenvolvimento civil incompleto do menor de 21 anos de idade que ainda não tinha plena compreensão dos seus direitos e deveres o que não mais se admite na legislação civil ora em vigor 2 O procurador com poderes especiais CPP art 39 caput Não se exige seja o procurador advogado regularmente inscrito nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil Deve porém possuir poderes 446323 446324 específicos para oferecer representação 3 O representante legal se o ofendido for menor de 18 anos ou mentalmente enfermo CPP art 24 caput cc art 33 aplicável por analogia 4 O curador especial quando o ofendido for menor de 18 anos ou mentalmente enfermo e não tiver representante legal ou os interesses deste colidirem com os daquele nomeado de ofício pelo juiz ou a requerimento do Ministério Público CPP art 33 aplicável por analogia Eficácia objetiva da representação Uma vez oferecida representação contra um dos responsáveis pela infração penal o Ministério Público poderá oferecer denúncia contra qualquer dos envolvidos em obediência ao princípio da indivisibilidade da ação penal pública E se operarse a retratação em relação a qualquer deles seus efeitos se estenderão a todos por aplicação analógica do art 49 do Código de Processo Penal Prazo O direito de representação poderá ser exercido no prazo de seis meses contado a partir do dia em que o ofendido ou seu representante legal tomou ciência acerca da autoria da infração penal Decorrido esse prazo com a omissão de quem tinha a prerrogativa de oferecer a representação verificarseá a extinção da punibilidade pela decadência CP art 107 IV 2ª figura Na hipótese de curador especial tal prazo é computado a partir da aceitação da nomeação para exercer o munus público e não do conhecimento da autoria Com a morte do ofendido e se ainda não tiver se esgotado o prazo decadencial o direito de representação será transmitido ao CADI cônjuge ascendente descendente ou irmão CPP art 24 1º E nos termos do art 38 parágrafo único do Código de Processo Penal a decadência nesse caso ocorrerá no mesmo prazo 446325 A doutrina diverge em relação à compreensão da contagem do prazo decadencial no caso de transmissão às pessoas acima indicadas Deve ser contado a partir do dia em que o ofendido soube quem é o autor do crime Ou deve ser contado a partir da data em que as pessoas indicadas pelo art 24 1º do Código de Processo Penal tomaram conhecimento da autoria Para uma primeira corrente o termo inicial ou a quo é o conhecimento da autoria pelo cônjuge ascendente descendente ou irmão Para outra corrente no entanto os sucessores terão o prazo de seis meses para o exercício do direito de representação contado a partir da data em que tomaram conhecimento da autoria Se os sucessores entretanto já tinham ciência da autoria da infração penal à época em que o ofendido estava vivo o prazo decadencial se iniciará a partir da morte do ofendido No tocante ao ofendido menor de 18 anos ou enfermo mental o prazo não começa a correr enquanto não cessar a incapacidade ou a enfermidade Com efeito não se pode falar na perda de um direito impossível de ser exercido Todavia para o representante legal o prazo tem início com o conhecimento da autoria Se houver conflito entre o interesse do ofendido incapaz e o do seu representante legal será necessária a nomeação de curador especial para defender os anseios da vítima Nessa hipótese o prazo para oferecimento da representação terá início na data em que o curador tiver ciência da sua nomeação Como já decidido pelo Superior Tribunal de Justiça Segundo o entendimento desta Corte Superior de Justiça havendo conflito de interesses entre a vítima menor e o seu representante legal poderá exercer o direito de representação o curador especial nomeado de ofício ou a requerimento do Ministério Público pelo Juízo condutor do feito hipótese em que o prazo decadencial começará a fluir a partir da data em que o curador tomar ciência da nomeação24 Representação na Lei 90991995 Em relação às infrações penais de menor potencial ofensivo isto é as contravenções penais e os crimes com pena máxima em abstrato igual ou a b c 446326 1 2 inferior a 2 dois anos cumulada ou não com multa independentemente da existência de rito especial deve ser seguido o procedimento definido pelo art 72 e seguintes da Lei 90991995 a saber abrese oportunidade para composição dos danos civis entre o ofendido e o autor do fato no caso de ação penal iniciativa privada ou de ação penal pública condicionada à representação se obtida a composição sua homologação judicial importa na renúncia ao direito de queixa ou de representação com a consequente extinção da punibilidade se contudo não for obtida a composição dos danos civis e em se tratando de ação penal pública condicionada à representação será dada oportunidade ao ofendido ou ao seu representante legal para exercer o direito de representação verbalmente com posterior redução a termo O não oferecimento da representação na audiência preliminar não implica decadência do direito que poderá ser exercido no prazo previsto em lei Lei 90991995 art 75 caput e parágrafo único prazo este definido como regra pelo art 38 do Código de Processo Penal Retratação da representação Estatui o art 102 do Código Penal A representação será irretratável depois de oferecida denúncia Notese que o dispositivo legal fala em oferecimento da denúncia e não em recebimento Assim se o Ministério Público já ofereceu denúncia mas o Poder Judiciário ainda não a recebeu formalmente será vedada a retratação Na hipótese de retratação da representação antes do oferecimento da denúncia há dois entendimentos o juiz deve declarar a extinção da punibilidade em que pese a ausência de previsão expressa pelo art 107 do Código Penal e os autos devem permanecer em cartório uma vez que antes do decurso do prazo decadencial será possível o oferecimento de nova 446327 446328 representação ou seja a retratação da retratação25 Também é cabível a retratação tácita da representação desde que demonstrada de forma inequívoca a prática de ato incompatível com o desejo de instaurar a persecução penal em juízo Exemplo a vítima de um crime de ameaça convida o apontado autor do fato para ser padrinho de seu filho O art 104 caput e seu parágrafo único do Código Penal entretanto somente admitem essa possibilidade retratação tácita relativamente ao direito de queixa Art 104 O direito de queixa não pode ser exercido quando renunciado expressa ou tacitamente Parágrafo único Importa renúncia tácita ao direito de queixa a prática de ato incompatível com a vontade de exercêlo não a implica todavia o fato de receber o ofendido a indenização do dano causado pelo crime Forma A representação independe de forma especial O Supremo Tribunal Federal firmou o entendimento de que é suficiente a demonstração inequívoca da intenção do ofendido ou de quem tiver qualidade para representálo em iniciar a ação penal26 No caso de vítima menor de 18 anos admitese seja a representação ofertada por qualquer pessoa que exerça sua guarda de fato ou ainda por quem o sustente materialmente com o propósito de evitar a impunidade do responsável pela prática da infração penal Requisição do Ministro da Justiça Cuidase de condição de procedibilidade consistente em ato de natureza administrativa e política revestido de discricionariedade pois há crimes em que a viabilidade de propositura da ação penal depende de um juízo de conveniência e oportunidade por parte do Ministro da Justiça As hipóteses de ação penal pública condicionada à requisição do Ministro da Justiça no Código Penal são a crime cometido por estrangeiro contra brasileiro fora do território nacional art 7º 3º b e b crimes contra a 446329 4463210 1º 2º 4463211 honra praticados contra o Presidente da República e contra chefe de governo estrangeiro art 141 I cc o art 145 parágrafo único Há ainda a hipótese prevista no art 31 IV da Lei 71701983 Crimes contra a Segurança Nacional Art 31 Para apuração de fato que configure crime previsto nesta Lei instaurarseá inquérito policial pela Polícia Federal IV mediante requisição do Ministro da Justiça Prazo A legislação não impõe prazo decadencial para o oferecimento da requisição do Ministro da Justiça Dessa forma pode ser lançada a qualquer tempo desde que não tenha ocorrido a extinção da punibilidade pela prescrição ou qualquer outra causa Retratação da requisição O direito positivo não previu a retratação da requisição A doutrina entretanto apresenta dois posicionamentos A requisição do Ministro da Justiça é ato administrativo e político de caráter discricionário Pode portanto ser revogado se não subsistirem os motivos de conveniência e oportunidade que a ensejaram27 até o oferecimento da denúncia e Não se admite a retratação seja por falta de previsão legal seja pela seriedade de que deve revestirse o ato mormente diante da ausência de prazo decadencial para seu oferecimento o que proporciona tempo suficiente para reflexão acerca do seu cabimento Não vinculação da requisição A palavra requisição significa ordem mandamento de modo que seu destinatário está obrigado a cumprila Nesse sentido o Ministério Público e a autoridade judiciária requisitam à autoridade policial a instauração de inquérito policial CPP art 5º II 1ª parte Questionase Com a requisição do Ministro da Justiça estará o Ministério Público obrigado a oferecer denúncia 447 Imaginese a hipotética situação em que alguém se refira ao Presidente da República como apreciador de bebidas alcoólicas O chefe do Poder Executivo Federal sentindose ofendido em sua honra subjetiva determina ao Ministro da Justiça o endereçamento de requisição ao Ministério Público para que a pessoa indicada como autora do delito seja denunciada pela prática de injúria Nesse caso ainda que entenda o representante do Parquet não ocorrida a tipicidade do crime definido pelo art 140 do Código Penal deverá oferecer denúncia A resposta é não obviamente Com efeito essa requisição é incompatível com a independência funcional princípio institucional do Ministério Público na forma do art 127 1º da Constituição Federal Desse modo os dispositivos legais que se referem à requisição do Ministro da Justiça devem ser interpretados em conformidade com a época em que foram editados especialmente os do Código de Processo Penal de 1941 em que o Ministério Público não tinha o perfil constitucional atual Ao contrário era um mero ramo do Poder Executivo o que se justificava com a expressão requisição do Ministro da Justiça pois o Parquet a ele estava hierarquicamente vinculado A partir da Constituição de 1988 entretanto a palavra requisição deve ser compreendida como representação AÇÃO PENAL PRIVADA Dizse privada a ação penal cuja legitimidade para propositura pertence ao ofendido ou a quem legalmente o represente quando aquele for menor de 18 anos ou mentalmente enfermo É iniciada com o oferecimento de queixa crime a qual deve conter os mesmos elementos da denúncia CPP art 41 Poucos crimes são processados por meio de ação penal privada e vale recordar tais casos são expressamente indicados pela lei No Código Penal podem ser lembrados os exemplos dos crimes tipificados pelos arts 184 236 e 345 sem emprego de violência entre outros 4471 4472 Prazo A queixacrime deve ser ajuizada no prazo de seis meses contado a partir da data em que o ofendido ou seu representante legal tomar conhecimento da autoria da infração penal CPP art 38 Esse prazo é decadencial Não se prorroga por força de domingos feriados ou férias e deve ser incluído em seu cômputo o dia do começo excluindose o dia do final em consonância com a regra traçada pelo art 10 do Código Penal O art 38 do Código de Processo Penal ao utilizar a expressão salvo disposição em contrário admite a existência de prazos diferenciados tal como se dá no crime definido pelo art 236 do Código Penal e nos crimes de ação penal privada contra a propriedade imaterial que deixam vestígios CPP art 529 caput Princípios A ação penal privada é regida pelos seguintes princípios 1 Oportunidade ou conveniência o ofendido tem liberdade para iniciar a ação penal Pode ou não fazêlo a seu exclusivo critério A renúncia tácita ou expressa ao direito de queixa encontra previsão nos arts 50 e 57 do Código de Processo Penal Contudo a renúncia contra um dos autores do crime a todos se estenderá CPP art 49 O art 74 parágrafo único da Lei 90991995 contém mais uma hipótese de renúncia ao direito de queixa quando a composição dos danos civis causados pela infração de menor potencial ofensivo for homologada em juízo 2 Disponibilidade decorre do princípio da oportunidade e permite ao ofendido ou representante legal a possibilidade de desistir da ação penal ou do recurso eventualmente interposto Pode ainda o querelante desistir da ação penal até o trânsito em julgado da sentença condenatória valendose dos institutos do perdão aceito e da perempção CPP arts 51 e 60 3 Indivisibilidade a queixacrime contra qualquer dos autores do crime obrigará ao processo de todos e o Ministério Público zelará pela sua indivisibilidade CPP art 48 Portanto o ofendido ou representante legal pode escolher entre ajuizar ou não a queixacrime Não é cabível todavia optar por oferecêla somente contra um ou outro envolvido na infração penal Como já decidido pelo Supremo Tribunal Federal Não oferecida a queixacrime contra todos os supostos autores ou partícipes da prática delituosa há afronta ao princípio da indivisibilidade da ação penal a implicar renúncia tácita ao direito de querela cuja eficácia extintiva da punibilidade estendese a todos quantos alegadamente hajam intervindo no cometimento da infração penal28 Este princípio contudo tem limites De fato só se pode falar em indivisibilidade da ação penal privada quando todos os agentes são conhecidos pela vítima ou pelo seu representante legal isto é ela tinha condições de oferecer a queixacrime contra todos os envolvidos na prática do delito mas optou por processar somente alguns ou algum deles Nesse caso a renúncia deliberada quanto a um dos agentes a todos se estenderá Para o Superior Tribunal de Justiça A não inclusão de eventuais suspeitos na queixacrime não configura por si só renúncia tácita ao direito de queixa Com efeito o direito de queixa é indivisível é dizer a queixa contra qualquer dos autores do crime obrigará ao processo de todos art 48 do CPP Dessarte o ofendido não pode limitar a este ou aquele autor da conduta tida como delituosa o exercício do jus accusationis tanto que o art 49 do CPP dispõe que a renúncia ao direito de queixa em relação a um dos autores do crime a todos se estenderá Portanto o princípio da indivisibilidade da ação penal privada torna obrigatória a formulação da queixacrime em face de todos os autores coautores e partícipes do injusto penal sendo que a inobservância de tal princípio acarreta a renúncia ao direito de queixa que de acordo com o art 107 V do CP é causa de extinção da punibilidade Contudo para o reconhecimento da renúncia tácita ao direito de queixa exigese a demonstração de que a não inclusão de determinados autores ou partícipes na queixacrime se deu de forma deliberada pelo querelante29 4473 No tocante à possibilidade de o Ministério Público aditar a queixacrime para incluir eventuais coautores ou partícipes há três posições acerca do assunto 1ª posição O Ministério Público não pode fazêlo uma vez que estaria invadindo a legitimação do ofendido ou de seu representante legal 2ª posição O aditamento é possível e expressamente previsto no art 46 2º do Código de Processo Penal O prazo para aditamento da queixa será de 3 três dias contado da data em que o órgão do Ministério Público receber os autos e se este não se pronunciar dentro do tríduo entenderseá que não tem o que aditar prosseguindose nos demais termos do processo30 3ª posição O Ministério Público não pode aditar a queixacrime E além disso a inicial acusatória deve ser rejeitada em razão da renúncia tácita com relação aos não incluídos uma vez que referida causa de extinção da punibilidade se comunica aos demais CPP art 49 4 Intranscendência a ação penal privada somente pode ser proposta contra os autores ou partícipes da infração penal não abrangendo seus sucessores ou eventuais responsáveis civis Espécies A legitimidade para ajuizamento da queixacrime é do ofendido se maior de 18 anos e capaz Se for menor de 18 anos ou mentalmente enfermo poderá ser proposta por seu representante legal CPP art 30 No caso de morte do ofendido ou quando declarado ausente por decisão judicial o direito de oferecer queixa ou prosseguir na ação passará ao cônjuge ascendente descendente ou irmão CPP art 31 Se o ofendido for menor de 18 anos ou mentalmente enfermo e não tiver representante legal ou colidirem os interesses deste com os daquele o direito de queixa poderá ser exercido por curador especial nomeado de ofício ou a requerimento do Ministério Público pelo juiz competente para o processo penal CPP art 33 Nessa modalidade de ação penal a lei confere exclusivamente ao ofendido a titularidade do direito de queixa intransmissível mesmo na hipótese do seu falecimento Também não é possível a nomeação de curador especial ao incapaz nem o oferecimento de queixacrime pelo seu representante legal O único exemplo de ação penal privada personalíssima subsistente em nosso ordenamento jurídico é o crime de induzimento a erro essencial e ocultação de impedimento tipificado pelo art 236 do Código Penal Art 236 Contrair casamento induzindo em erro essencial o outro contraente ou ocultandolhe impedimento que não seja casamento anterior Pena detenção de 6 seis meses a 2 dois anos Parágrafo único A ação penal depende de queixa do contraente enganado e não pode ser intentada senão depois de transitar em julgado a sentença que por motivo de erro ou impedimento anule o casamento A capacidade civil por emancipação ou pelo casamento não altera a impossibilidade de oferecer queixa Destarte o prazo decadencial apenas passará a fluir quando cessar a incapacidade penal ou seja quando o ofendido completar 18 anos de idade De acordo com o art 100 3º do Código Penal A ação de iniciativa privada pode intentarse nos crimes de ação pública se o Ministério Público não oferece denúncia no prazo legal O direito à ação penal privada subsidiária da pública foi erigido à categoria de direito fundamental pelo art 5º LIX da Constituição Federal será admitida ação privada nos crimes de ação pública se esta não for intentada no prazo legal Em caso de inércia do Ministério Público o ofendido ou representante legal pode oferecer queixa subsidiária no prazo de seis meses contados do termo final do prazo para oferecimento da denúncia Nesse caso o Ministério Público poderá aditar a queixa repudiála e oferecer denúncia substitutiva intervir em todos os atos do processo fornecer elementos de prova interpor recurso e a todo tempo no caso de negligência do querelante retomar a ação como parte principal CPP art 29 Após o prazo de seis meses cessa a possibilidade de ação privada subsidiária nada obstante o Parquet ainda possa oferecer denúncia enquanto não extinta a punibilidade do agente uma vez que a ação não perde seu caráter público Cumpre frisar que a ação privada subsidiária tem cabimento apenas na inércia do Ministério Público Dessa forma não é admitida quando o Parquet solicitar o arquivamento do inquérito policial ou das peças de informação ou requisitar a realização de novas diligências para elucidar a materialidade do fato ou sua autoria31 Nas palavras do Superior Tribunal de Justiça a ação penal privada subsidiária da pública somente teria guarida diante da prova inequívoca de haver a total inércia do Ministério Público mesmo de posse de todos os elementos necessários para formular acusação ele deixa de ajuizar a ação penal no prazo legal sem qualquer motivo justificado32 Também se admite a ação penal privada concorrente no tocante aos crimes contra a honra praticados contra funcionário público em razão de suas funções Facultase ao ofendido escolher entre ajuizar a ação penal privada ou então oferecer representação autorizando o Ministério Público a exercitar a ação penal pública condicionada à representação Nos termos da Súmula 714 do Supremo Tribunal Federal É concorrente a legitimidade do ofendido mediante queixa e do Ministério Público condicionada à representação do ofendido para a ação penal por 448 crime contra a honra de servidor público em razão do exercício de suas funções Nessas hipóteses a legitimidade além de concorrente é excludente da atuação do outro legitimado Em síntese o exercício da ação pública condicionada exclui a utilização da ação penal privada e viceversa Na visão do Superior Tribunal de Justiça Nos crimes contra a honra de servidor público a legitimidade para a ação é concorrente vale dizer o ofendido pode propor a queixacrime ou pode representar ao Ministério Público para que ofereça denúncia A opção por uma das vias torna a outra preclusa não se admitindo que a vítima represente ao Ministério Público e posteriormente ofereça ela própria a queixacrime33 AÇÃO PENAL NOS CRIMES COMPLEXOS Para o art 101 do Código Penal Quando a lei considera como elemento ou circunstâncias do tipo legal fatos que por si mesmos constituem crimes cabe ação pública em relação àquele desde que em relação a qualquer destes se deva proceder por iniciativa do Ministério Público Crimes complexos são aqueles que resultam da fusão de dois ou mais tipos penais Exemplos roubo furto lesão corporal ou ameaça latrocínio roubo homicídio e extorsão mediante sequestro extorsão sequestro Destarte o crime que resulta da união de dois outros será de ação penal 449 pública desde que um deles pertença a esta categoria ainda que seja o outro de ação penal privada Como porém a lei sempre indica expressamente as hipóteses de crime de ação penal privada essa regra é inócua e absolutamente desnecessária AÇÃO PENAL NOS CRIMES CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL Nos delitos contra a liberdade sexual e nos delitos sexuais contra vulneráveis previstos nos Capítulos I e II do Título VI da Parte Especial do Código Penal Crimes contra a dignidade sexual a ação penal é pública incondicionada É o que se extrai do art 225 do Código Penal Mas nem sempre foi assim Na sistemática original do Código Penal texto de 1940 os então denominados crimes contra os costumes eram processados em regra mediante ação penal privada Com as alterações promovidas pela Lei 120152009 a regra passou a ser a ação pública condicionada à representação ficando excepcionada quando a vítima era menor de 18 anos ou pessoa vulnerável hipóteses em que a ação penal era pública incondicionada Em nossa opinião esta era a opção mais acertada De fato afastandose a ação penal privada retiravase do ofendido ou de seu representante legal o ônus de oferecer a queixacrime Se não bastasse a exigência da representação protegia a intimidade da vítima que poderia optar por não oferecer a condição de procedibilidade para evitar o escândalo do processo strepitus fori Em síntese se a vítima maior de idade e capaz desejasse preservar sua vida privada bastava não representar Porém fazendoo cabia ao Ministério Público ajuizar a ação penal sem ônus processuais ao ofendido Com a atual redação do art 225 do Código Penal dada pela Lei 137182018 e a Súmula 608 do Supremo Tribunal Federal No crime de estupro praticado mediante violência real a ação penal é pública incondicionada tornouse desnecessária pois o estupro qualquer que seja seu meio de execução passou a ser crime de ação pública incondicionada 4410 1 2 AÇÃO PENAL E CRIME DE LESÃO CORPORAL PRATICADO COM VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER34 Nos crimes de lesões corporais com violência doméstica e familiar contra a mulher em todas as suas modalidades inclusive de natureza leve e culposa a ação penal é pública incondicionada Esta é a nossa posição As lesões leves e culposas no plano histórico sempre foram consideradas crimes de ação penal pública incondicionada pelo direito brasileiro Todavia com a entrada em vigor da Lei 90991995 elas foram transformadas pelo seu art 88 em delitos de ação penal pública condicionada à representação do ofendido ou de seu representante legal Esse panorama foi alterado com a Lei 113402006 Lei Maria da Penha pois estabelece seu art 41 Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher independentemente da pena prevista não se aplica a Lei 9099 de 26 de setembro de 1995 Portanto como não se aplicam as disposições da Lei 90991995 afastase a incidência do seu art 88 e os crimes de lesões corporais de natureza leve e culposa voltam a ser de ação penal pública incondicionada exclusivamente quando cometidos com violência doméstica e familiar contra a mulher Além disso podem ser apontados outros argumentos que justificam essa posição o art 88 da Lei 90991995 foi derrogado em relação à Lei Maria da Penha em razão de o art 41 deste diploma legal ter expressamente afastado a aplicação por inteiro daquela lei ao tipo descrito no art 129 9º do CP isso se deve ao fato de que as referidas leis possuem escopos diametralmente opostos Enquanto a Lei dos Juizados Especiais busca evitar o início do processo penal que poderá culminar em imposição de sanção ao agente a Lei Maria da Penha procura punir com maior rigor o agressor que age às escondidas nos lares pondo em risco a saúde de sua família 3 4 a Lei 113402006 procurou criar mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra as mulheres nos termos do 8º do art 226 e do art 227 ambos da CF1988 daí não se poder falar em representação quando a lesão corporal culposa ou dolosa simples atingir a mulher em casos de violência doméstica familiar ou íntima e ademais até a nova redação do 9º do art 129 do CP dada pelo art 44 da Lei 113402006 impondo pena máxima de três anos à lesão corporal leve qualificada praticada no âmbito familiar corrobora a proibição da utilização do procedimento dos Juizados Especiais afastando assim a exigência de representação da vítima O Supremo Tribunal Federal comunga deste entendimento Em seguida o Plenário por maioria julgou procedente ação direta proposta pelo ProcuradorGeral da República para atribuir interpretação conforme a Constituição aos artigos 12 I 16 e 41 todos da Lei 113402006 e assentar a natureza incondicionada da ação penal em caso de crime de lesão corporal praticado mediante violência doméstica e familiar contra a mulher No mérito evidenciouse que os dados estatísticos no tocante à violência doméstica seriam alarmantes visto que na maioria dos casos em que perpetrada lesão corporal de natureza leve a mulher acabaria por não representar ou por afastar a representação anteriormente formalizada A respeito o Min Ricardo Lewandowski advertiu que o fato ocorreria estatisticamente por vício de vontade da parte dela Apontouse que o agente por sua vez passaria a reiterar seu comportamento ou a agir de forma mais agressiva Afirmouse que sob o ponto de vista feminino a ameaça e as agressões físicas surgiriam na maioria dos casos em ambiente doméstico Seriam eventos decorrentes de dinâmicas privadas o que aprofundaria o problema já que acirraria a situação de invisibilidade social Registrou se a necessidade de intervenção estatal acerca do problema baseada na dignidade da pessoa humana CF art 1º III na igualdade CF art 5º I e na vedação a qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais CF art 5º XLI Reputouse que a legislação ordinária protetiva estaria em sintonia com a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra a Mulher e com a Convenção de Belém do Pará Sob o ângulo constitucional ressaltouse o dever do Estado de assegurar a assistência à família e de criar mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações Não seria razoável ou proporcional assim deixar a atuação estatal a critério da vítima A proteção à mulher esvaziarseia portanto no que admitido que verificada a agressão com lesão corporal leve pudesse ela depois de acionada a autoridade policial recuar e retratarse em audiência especificamente designada com essa finalidade fazendoo antes de recebida a denúncia Dessumiuse que deixar a mulher autora da representação decidir sobre o início da persecução penal significaria desconsiderar a assimetria de poder decorrente de relações históricoculturais bem como outros fatores tudo a contribuir para a diminuição de sua proteção e a prorrogar o quadro de violência discriminação e ofensa à dignidade humana Implicaria relevar os graves impactos emocionais impostos à vítima impedindoa de romper com o estado de submissão Entendeuse não ser aplicável aos crimes glosados pela lei discutida o que disposto na Lei 909995 de maneira que em se tratando de lesões corporais mesmo que de natureza leve ou culposa praticadas contra a mulher em âmbito doméstico a ação penal cabível seria pública incondicionada Acentuouse entretanto permanecer a necessidade de representação para crimes dispostos em leis diversas da 909995 como o de ameaça e os cometidos contra a dignidade sexual Consignouse que o Tribunal ao julgar o HC 106212MS DJe de 13062011 declarara em processo subjetivo a constitucionalidade do art 41 da Lei 113402006 no que afastaria a aplicação da Lei dos Juizados Especiais relativamente aos crimes cometidos com violência doméstica e familiar contra a mulher independentemente da pena prevista35 É também a posição consolidada na Súmula 542 do Superior Tribunal de Justiça A ação penal relativa ao crime de lesão corporal resultante de violência doméstica contra a mulher é pública incondicionada36 Há entretanto vozes cada vez mais raras no sentido de que os delitos de lesão corporal de natureza leve e lesão corporal culposa quando praticados com violência doméstica ou familiar contra a mulher subsistem como crimes de ação penal pública condicionada Fundamentam esse raciocínio no art 16 da Lei 113402006 Nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida de que trata esta Lei só será admitida a renúncia à representação perante o juiz em audiência especialmente designada com tal finalidade antes do recebimento da denúncia e ouvido o Ministério Público Para quem compartilha desta opinião tais crimes ainda são de ação penal pública condicionada pois em caso contrário não haveria razão para a lei falar em renúncia à representação 1 2 3 4 5 6 7 8 9 DEMERCIAN Pedro Henrique MALULY Jorge Assaf Curso de processo penal 3 ed Rio de Janeiro Forense 2005 p 8788 Para o STJ não há constrangimento na utilização do termo ação penal condenatória na denúncia apresentada pelo Ministério Público porque essa é a classificação dada à ação penal instaurada pelo Estado contra o acusado HC 88448DF rel Min Og Fernandes 6ª Turma j 06052010 noticiado no Informativo 433 O Código de Processo Civil prevê como condições da ação somente o interesse processual e a legitimidade para a causa JARDIM Afrânio Silva Ação penal pública princípio da obrigatoriedade 2 ed Rio de Janeiro Forense 1994 p 39 CAPEZ Fernando Curso de processo penal 13 ed São Paulo Saraiva 2006 p 113 RHC 121152BA rel Min Ricardo Lewandowski 2ª Turma j 11032014 É também o entendimento consolidado na Súmula 438 do Superior Tribunal de Justiça É inadmissível a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva com fundamento em pena hipotética independentemente da existência ou sorte do processo penal JARDIM Afrânio Silva Ação penal pública princípio da obrigatoriedade 2 ed Rio de Janeiro Forense 1994 p 36 A verificação da justa causa admite inclusive a utilização do reconhecimento fotográfico na fase policial Para embasar a denúncia oferecida é possível a utilização do reconhecimento fotográfico realizado na fase policial desde que este não seja utilizado de forma isolada e esteja em consonância com os demais elementos probatórios constantes dos autos STJ HC 238577SP rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 06122012 noticiado no Informativo 514 STJ RHC 27102RR rel Min Sebastião Reis Júnior rel p acórdão Min Rogério Schietti Cruz 6ª Turma j 13052014 e STJ RHC 42029RJ rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 26082014 a imputação penal desacompanhada de documentos hábeis a demonstrar ainda que de modo indiciário a autoria e a materialidade do crime destituída desse modo de base empírica idônea implica ausência de justa causa fato que nos termos do art 395 III do CPP desautoriza a instauração da persecutio criminis in iudicio STJ RHC 61822DF 10 11 12 13 14 15 16 17 18 rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 17122015 noticiado no Informativo 577 STF HC 122755PE rel Min Luiz Fux 1ª Turma j 19082014 e STJ HC 266462SP rel Min Laurita Vaz rel p acórdão Min Regina Helena Costa 5ª Turma j 25022014 Art 1º I a IV da Lei 81371990 Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo ou contribuição social e qualquer acessório mediante as seguintes condutas I omitir informação ou prestar declaração falsa às autoridades fazendárias II fraudar a fiscalização tributária inserindo elementos inexatos ou omitindo operação de qualquer natureza em documento ou livro exigido pela lei fiscal III falsificar ou alterar nota fiscal fatura duplicata nota de venda ou qualquer outro documento relativo à operação tributável IV elaborar distribuir fornecer emitir ou utilizar documento que saiba ou deva saber falso ou inexato É desnecessária contudo a juntada integral do Procedimento Administrativo Fiscal correspondente STJ RHC 94288RJ rel Min Reynaldo Soares da Fonseca 5ª Turma j 22052018 noticiado no Informativo 627 RHC 35180RS rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 01042014 Este princípio também incide no tocante à ação penal privada ajuizada pela Defensoria Pública HC 104356RJ rel Min Ricardo Lewandowski 1ª Turma j 19102010 noticiado no Informativo 605 O STJ compartilha deste entendimento HC 224246DF rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 25022014 STJ HC 237168SP rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 08042014 Inq 2245MG rel Min Joaquim Barbosa Tribunal Pleno j 28082007 O STJ também já decidiu nesse sentido Não vigora o princípio da indivisibilidade na ação penal pública O Parquet é livre para formar sua convicção incluindo na increpação as pessoas que entenda terem praticados ilícitos penais ou seja mediante a constatação de indícios de autoria e materialidade não se podendo falar em arquivamento implícito em relação a quem não foi denunciado STJ RHC 34233SP rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 06052014 TORNAGUI Hélio Curso de processo penal 5 ed São Paulo Saraiva 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 31 1988 v 1 p 44 Apud DEMERCIAN Pedro Henrique MALULY Jorge Assad Op cit p 116 CAPEZ Fernando Curso de processo penal 13 ed São Paulo Saraiva 2006 p 121 TOURINHO FILHO Fernando da Costa Manual de processo penal 8 ed São Paulo Saraiva 2006 p 296302 MIRABETE Julio Fabbrini Processo penal 18 ed São Paulo Atlas 2007 p 9899 HC 88387MT rel Min Ricardo Lewandowski 1ª Turma j 10102006 É também a posição adotada pelo STJ A representação do ofendido condição de procedibilidade da ação penal pública condicionada prescinde de rigor formal sendo suficiente a demonstração inequívoca da parte interessada de que seja apurada e processada a infração penal RHC 42029RJ rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 26082014 HC 170030PR rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 28082012 A doutrina e a jurisprudência admitem a retração de retratação dentro do prazo decadencial STJ AgRg no REsp 1131357DF rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 05112013 RHC 116171SC rel Min Cármen Lúcia 2ª Turma j 03092013 No STJ HC 240678SP rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 03042014 ROMEIRO Jorge Alberto Da ação penal Rio de Janeiro Forense 1978 p 125 Inq 3256DF rel Min Roberto Barroso 1ª Turma j 02022016 noticiado no Informativo 813 No STJ APn 724DF rel Min Og Fernandes Corte Especial j 20082014 noticiada no Informativo 547 RHC 55142MG rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 12052015 noticiado no Informativo 562 Nos termos do artigo 45 do CPP a queixa poderá ser aditada pelo Ministério Público ainda que se trate de ação penal privativa do ofendido desde que não proceda à inclusão de coautor ou partícipe tampouco inove quanto aos fatos descritos hipóteses por sua vez inocorrentes na espécie STJ HC 85039SP rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 05032009 Essa posição é acolhida pelo STJ AgRg no RMS 27518SP rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 20022014 32 33 34 35 36 HC 175141MT rel Min Celso Limongi Desembargador convocado do TJSP 6ª Turma j 02122010 noticiado no Informativo 458 HC 259870ES rel Min Jorge Mussi 5ª Turma j 17122013 Súmula 600 do Superior Tribunal de Justiça Para configuração da violência doméstica e familiar prevista na Lei 113402006 Lei Maria da Penha não se exige coabitação entre autor e vítima ADI 4424DF rel Min Marco Aurélio Plenário j 09022012 noticiado no Informativo 654 Com igual orientação estatui a Súmula 536 do Superior Tribunal de Justiça A suspensão condicional do processo e a transação penal não se aplicam na hipótese de delitos sujeitos ao rito da Lei Maria da Penha Praticado um crime ou uma contravenção penal nasce automaticamente a punibilidade compreendida como a possibilidade jurídica de o Estado impor uma sanção penal ao responsável autor coautor ou partícipe pela infração penal A punibilidade consiste pois em consequência da infração penal Não é seu elemento razão pela qual o crime e a contravenção penal permanecem íntegros com a superveniência de causa extintiva da punibilidade Desaparece do mundo jurídico somente o poder punitivo estatal o Estado não pode mais punir nada obstante a existência concreta e inapagável de um ilícito penal Em hipóteses excepcionais entretanto a extinção da punibilidade elimina a própria infração penal Esse fenômeno somente é possível com a abolitio criminis e com a anistia pois os seus efeitos possuem força para rescindir inclusive eventual sentença penal condenatória De fato a abolitio criminis funciona como causa superveniente de extinção da tipicidade pois a nova lei torna atípico o fato até então incriminado De seu turno a anistia por ficção legal e por força de sua eficácia retroativa provoca a atipicidade temporária do fato cometido pelo agente resultando na exclusão da infração penal Isso se justifica pelo fato de tanto a abolitio criminis como a anistia serem veiculadas por meio de lei ordinária de igual natureza àquela que no passado instituiu o crime ou a contravenção penal Com efeito se uma lei criou a infração penal nada impede sejam os seus efeitos apagados por outra lei de igual hierarquia no universo jurídico a b c d e f g h i É unânime o entendimento doutrinário no sentido de ser exemplificativo o rol do art 107 do Código Penal o qual contém em seu interior algumas causas de extinção da punibilidade admitidas pelo Direito Penal brasileiro Em verdade diversas outras causas extintivas podem ser encontradas no Código Penal e na legislação especial destacandose término do período de prova sem revogação do sursis do livramento condicional e da suspensão condicional do processo Lei 90991995 art 89 escusas absolutórias CP arts 181 e 348 2º reparação do dano no peculato culposo efetivada antes do trânsito em julgado da sentença condenatória CP art 312 3º pagamento do tributo ou contribuição social nos crimes contra a ordem tributária Lei 106842003 art 9º 2º1 confissão espontânea e pagamento das contribuições importâncias ou valores e prestação das informações devidas à previdência social na forma definida em lei ou regulamento antes do início da ação fiscal nos crimes de apropriação indébita previdenciária e sonegação de contribuição previdenciária CP arts 168A 2º e 337A 1º e Lei 94301996 art 83 4º anulação do primeiro casamento em crime de bigamia CP art 235 2º conciliação efetuada em relação aos crimes contra a honra nos termos dos arts 520 a 522 do Código de Processo Penal morte do cônjuge ofendido no crime de induzimento a erro essencial e ocultação de impedimento CP art 236 por se tratar de ação penal privada personalíssima e cumprimento integral do acordo de leniência relativamente aos crimes contra a ordem econômica tipificados na Lei 81371990 Lei 125292011 art 87 parágrafo único A propósito nada impede a construção de causas supralegais não previstas em lei de extinção da punibilidade a exemplo daquela contida na Súmula 554 do Supremo Tribunal Federal O pagamento de cheque emitido sem provisão de fundos após o recebimento da denúncia não obsta ao prosseguimento da ação penal2 As causas de extinção da punibilidade podem alcançar a pretensão punitiva interesse do Estado em aplicar a sanção penal surge com a prática da infração penal ou a pretensão executória interesse do Estado em exigir o cumprimento de uma sanção penal já imposta nasce com o trânsito em julgado da condenação conforme ocorram antes ou depois do trânsito em julgado da sentença penal condenatória Quanto àquelas previstas no art 107 do Código Penal algumas causas extintivas atacam exclusivamente a pretensão punitiva São elas decadência perempção renúncia do direito de queixa perdão aceito retratação do agente e perdão judicial Por outro lado duas outras causas atingem apenas a pretensão executória indulto pelo texto da Lei de Execução Penal pois o STF como se verá admite o indulto antes do trânsito em julgado da condenação e graça Além disso o sursis e o livramento condicional previstos fora do art 107 do Código Penal afetam exclusivamente a pretensão executória em face do término do período de prova sem revogação Finalmente as causas de extinção da punibilidade remanescentes podem direcionarse tanto contra a pretensão punitiva como também contra a pretensão executória dependendo do momento em que ocorrerem isto é antes ou depois da condenação definitiva Incluemse nessa relação a morte do agente a anistia a abolitio criminis e a prescrição As causas de extinção da punibilidade que atingem a pretensão punitiva eliminam todos os efeitos penais de eventual sentença condenatória já proferida Destarte esse ato judicial não serve como pressuposto da reincidência nem pode ser usado como título executivo judicial na área cível Por sua vez as causas extintivas que afetam a pretensão executória salvo nas hipóteses de abolitio criminis e anistia apagam unicamente o efeito principal da condenação é dizer a pena Subsistem os efeitos secundários da sentença condenatória pressuposto da reincidência e constituição de título executivo judicial no campo civil Estabelece o art 108 do Código Penal A extinção da punibilidade de crime que é pressuposto elemento constitutivo ou circunstância agravante de outro não se estende a este Nos crimes conexos a extinção da punibilidade de um deles não impede quanto aos outros a agravação da pena resultante da conexão Crime acessório também denominado de crime de fusão ou parasitário é aquele cuja existência depende da prática anterior de outro crime chamado de principal A extinção da punibilidade do crime principal não se estende ao crime acessório Exemplo a lavagem de dinheiro Lei 96131998 art 1º será punível mesmo com a extinção da infração penal que permitiu a sua prática3 Crime complexo por sua vez é aquele que resulta da união de dois ou mais crimes A extinção da punibilidade da parte um dos crimes não alcança o todo crime complexo Exemplo eventual prescrição do roubo não importa na automática extinção da punibilidade do latrocínio Crime conexo finalmente é o praticado para assegurar a execução a ocultação a impunidade ou a vantagem de outro crime É o que se dá com o indivíduo que para vender drogas mata um policial que o investigava A ele serão imputados os crimes de homicídio qualificado pela conexão CP art 121 2º V em concurso material com o tráfico de drogas Lei 113432006 art 33 E de acordo com o art 108 do Código Penal ainda que ocorra a prescrição do tráfico de drogas subsiste no tocante ao homicídio a qualificadora da conexão No âmbito do princípio da consunção conflito aparente de normas penais a extinção da punibilidade do crimefim igualmente atinge o direito de punir do Estado em relação ao crimemeio Para o Superior Tribunal de Justiça No caso em que a falsidade ideológica tenha sido praticada com o fim exclusivo de proporcionar a realização do crime de descaminho a extinção da punibilidade quanto a este diante do pagamento do tributo devido impede que em razão daquela primeira conduta considerada de forma autônoma procedase à persecução penal do agente Isso porque nesse contexto exaurindose o crimemeio na prática do crime fim cuja punibilidade não mais persista falta justa causa para a persecução pelo crime de falso porquanto carente de autonomia4 Extinguese a punibilidade pela morte do agente art 107 I do CP Essa opção legislativa tem dois fundamentos 1 o princípio da personalidade da pena a pena não pode passar da pessoa do condenado CF art 5º XLV 1ª parte e 2 o brocardo de justiça pelo qual a morte tudo apaga mors omnia solvit Essa regra alcança todas as espécies de penas privativa de liberdade restritiva de direitos e multa além dos efeitos penais da sentença condenatória Excepcionamse porém por expressa disposição constitucional a obrigação de reparar o dano até os limites das forças da herança e a decretação do perdimento de bens E como bem observa Júlio Fabbrini Mirabete essa mesma regra se estende à pessoa jurídica podendo a obrigação ser transferida à sua sucessora5 relativamente aos crimes que podem por ela ser praticados Mas se a morte do agente ocorrer após o trânsito em julgado da condenação subsistem os efeitos secundários extrapenais autorizando a execução da sentença penal no juízo cível contra os seus herdeiros A expressão agente foi empregada em sentido amplo significando indiciado réu sentenciado condenado ou reeducando pois essa causa de extinção da punibilidade pode ocorrer em qualquer etapa da persecução penal ou seja da instauração do inquérito policial até o término da execução da pena Cuidase de causa personalíssima razão pela qual não se comunica aos demais coautores e partícipes que respondem normalmente pela infração penal O art 62 do Código de Processo Penal é claro ao exigir seja a prova da morte efetuada exclusivamente com a certidão de óbito Alguns doutrinadores tais como Nélson Hungria e Magalhães Noronha entendiam que a declaração judicial de ausência Código Civil art 6º ou da extrema probabilidade de morte de quem estava em perigo de vida ou prisioneiro ou desaparecido em campanha não encontrado até dois anos após o término da guerra Código Civil art 7º teria o mesmo efeito de extinção da punibilidade6 Essas propostas entretanto não têm amparo legal Com efeito em caso de morte do acusado o juiz somente à vista da certidão de óbito e depois de ouvido o Ministério Público declarará extinta a punibilidade CPP art 62 Discutese o que pode ser feito se com fundamento em certidão de óbito falsa foi declarada a extinção da punibilidade Surgiram dois posicionamentos distintos 1ª posição o réu pode ser processado somente pelo crime de falso pois o ordenamento jurídico brasileiro não contempla a revisão criminal pro societate É a posição dominante em sede doutrinária e 2ª posição poderá haver revogação da decisão judicial pois a declaração com falso fundamento não faria coisa julgada em sentido estrito Em verdade tratase de decisão judicial inexistente inidônea a produzir os efeitos inerentes à autoridade da coisa julgada Se não bastasse o sujeito não pode ser beneficiado pela sua própria torpeza e a formalidade não há de ser levada ao ponto de tornar imutável uma decisão lastreada em uma falsidade É a posição do Supremo Tribunal Federal7 e também do Superior Tribunal de Justiça8 Anistia graça e indulto são modalidades de indulgência soberana emanadas de órgãos estranhos ao Poder Judiciário que dispensam em determinadas hipóteses a total ou parcial incidência da lei penal Concretizam a renúncia do Estado ao direito de punir Embora advenham de órgãos alheios ao Poder Judiciário a anistia a graça e o indulto somente acarretam na extinção da punibilidade de seu destinatário após acolhimento por decisão judicial Essas causas extintivas da punibilidade têm lugar em crimes de ação penal pública incondicionada e condicionada e de ação penal privada De fato nesses últimos o Estado transferiu ao particular unicamente a titularidade para iniciativa da ação penal mantendo sob seu controle o direito de punir capaz de ser renunciado pelos institutos ora em análise Anistia é a exclusão por lei ordinária com efeitos retroativos de um ou mais fatos criminosos do campo de incidência do Direito Penal A clemência estatal é concedida por lei ordinária editada pelo Congresso Nacional CF arts 21 XVII e 48 VIII9 A iniciativa do projeto de lei visando a concessão de anistia é livre ao contrário do que ocorria na Constituição anterior em que o art 57 VI reservava a iniciativa ao Presidente da República quando se tratasse de crimes políticos A competência da União para concessão de anistia abrange somente as infrações penais10 Essa causa de extinção da punibilidade destinase em regra a crimes políticos anistia especial abrangendo excepcionalmente crimes comuns11 Abrange fatos e não indivíduos embora possam ser impostas condições específicas ao réu ou condenado anistia condicionada E concedida a anistia o juiz de ofício a requerimento do interessado ou do Ministério Público por proposta da autoridade administrativa ou do Conselho Penitenciário declarará extinta a punibilidade LEP art 187 É exemplo de anistia o determinado pelo art 1º da Lei 66831979 pelo qual foi concedida anistia a todos que no período compreendido entre 2 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979 cometeram crimes políticos ou conexos com estes crimes eleitorais aos que tiveram seus direitos políticos suspensos e aos servidores da Administração Direta e Indireta de fundações vinculadas ao poder público aos servidores dos Poderes Legislativo e Judiciário aos Militares e aos dirigentes e representantes sindicais punidos com fundamento em Atos Institucionais e Complementares Vejase portanto que a anistia abrangeu todos aqueles que praticaram crimes políticos ou conexos no período mencionado sem qualquer alusão a pessoa determinada O que importa na anistia é o fato e não seu destinatário Dividese em própria quando concedida anteriormente à condenação e imprópria na hipótese em que sua concessão operase após a sentença condenatória Pode ser também condicionada ou incondicionada conforme esteja ou não sujeita a condições para sua aceitação A anistia tem efeitos ex tunc isto é para o passado apagando todos os efeitos penais Rescinde até mesmo a condenação Portanto se no futuro o agente praticar nova infração penal não será atingido pela reincidência em face da ausência do seu pressuposto Permanecem íntegros entretanto os efeitos civis da sentença condenatória que por esse motivo subsiste como título executivo judicial no campo civil A decisão judicial que reconhece a anistia e declara a extinção da punibilidade deve ser lançada pelo magistrado que conduz a ação penal Se todavia a ação penal estiver no tribunal em grau recursal ou por se tratar de processo de sua competência originária compete a ele a declaração da extinção da punibilidade Por último se a lei concessiva da anistia entrar em vigor depois do trânsito em julgado da condenação será competente o juízo da execução para a declaração da extinção da punibilidade LEP art 66 III e Súmula 611 do STF A anistia pode ser ainda geral ou absoluta quando concedida em termos gerais ou parcial ou relativa na hipótese em que faz exceções entre crimes ou pessoas A causa extintiva apenas pode ser recusada por seu destinatário quando condicionada isto é vinculada ao cumprimento de determinadas condições Os crimes hediondos e os delitos a estes equiparados são incompatíveis com a anistia em face da regra contida no art 5º XLIII da Constituição Federal a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins o terrorismo e os definidos como crimes hediondos por eles respondendo os mandantes os executores e os que podendo evitálos se omitirem Esse mandamento constitucional foi regulamentado pelos arts 2º I da Lei 80721990 crimes hediondos pelo art 1º 6º da Lei 94551997 tortura e pelo art 44 caput da Lei 113432006 tráfico de drogas A graça tem por objeto crimes comuns com sentença condenatória transitada em julgado visando o benefício de pessoa determinada por meio da extinção ou comutação da pena imposta É também denominada inclusive pela Lei de Execução Penal de indulto individual Em regra depende de provocação da parte interessada De fato o indulto individual poderá ser provocado por petição do condenado por iniciativa do Ministério Público do Conselho Penitenciário ou da autoridade administrativa LEP art 188 A petição acompanhada dos documentos que a instruírem será entregue ao Conselho Penitenciário para a elaboração de parecer e posterior encaminhamento ao Ministério da Justiça LEP art 189 A graça é ato privativo e discricionário do Presidente da República CF art 84 XII desde que respeitas as vedações impostas pelo sistema constitucional e passível de delegação aos Ministros de Estado ao ProcuradorGeral da República ou ao AdvogadoGeral da União CF art 84 parágrafo único Alcança apenas o cumprimento da pena na forma realçada pelo decreto presidencial restando íntegros os efeitos penais secundários e também os efeitos de natureza civil Classificase como plena quando importa em extinção da pena imposta ao condenado ou parcial quando acarreta em diminuição ou comutação da pena A graça normalmente não poderá ser recusada salvo quando proposta comutação de pena CPP art 739 ou submetida a condições para sua concessão E uma vez concedida a graça ou indulto individual e anexada aos autos cópia do decreto o juiz declarará extinta a punibilidade ou ajustará a execução aos termos do decreto em caso de comutação da pena LEP art 192 A Constituição Federal em seu art 5º XLIII considera insuscetíveis de graça a prática de tortura o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins o terrorismo e os crimes definidos como hediondos Essa regra foi regulamentada pelos arts 2º I da Lei 80721990 crimes hediondos pelo art 1º 6º da Lei 94551997 tortura e pelo art 44 caput da Lei 113432006 tráfico de drogas O indulto propriamente dito ou indulto coletivo é modalidade de clemência concedida espontaneamente pelo Presidente da República a todo o grupo de condenados que preencherem os requisitos apontados pelo decreto Embora essa seja a regra não se faz necessário o trânsito em julgado da sentença condenatória para sua concessão12 O indulto leva em consideração a duração da pena aplicada bem como o preenchimento de determinados requisitos subjetivos exemplo primariedade e objetivos exemplo cumprimento de parte da pena13 Pode também ser total quando há extinção da pena ou parcial diminuição ou comutação de penas incondicionado ou condicionado caso em que poderá ser recusado No indulto total extinguemse as sanções penais mencionadas no decreto presidencial subsistindo os demais efeitos penais ou extrapenais não abarcados pelo benefício14 Na comutação de penas não se pode falar propriamente em extinção da punibilidade mas somente em transformação da pena em outra de menor gravidade Na diminuição de pena por sua vez há extinção da punibilidade só em relação ao quantum perdoado15 A Lei de Crimes Hediondos Lei 80721990 em seu art 2º I vedou a concessão de indulto para crimes hediondos prática de tortura tráfico de drogas e terrorismo Igual vedação é atualmente prevista no art 44 caput da Lei 113432006 no tocante ao tráfico de drogas E como a Constituição Federal proibiu expressamente apenas a concessão de graça ou anistia para os crimes mencionados no art 5º XLIII surgiram dois posicionamentos acerca da proibição legal 1ª posição a regra é inconstitucional por abranger hipótese não prevista no texto constitucional e 2ª posição a regra é constitucional pois a graça seria gênero do qual o indulto é espécie É a atual posição do Supremo Tribunal Federal É constitucional o art 2º I da L 807290 porque nele a menção ao indulto é meramente expletiva da proibição de graça aos condenados por crimes hediondos ditada pelo art 5º XLIII da Constituição Na Constituição a graça individual e o indulto coletivo que ambos tanto podem ser totais ou parciais substantivando nessa última hipótese a comutação de pena são modalidades do poder de graça do Presidente da República art 84 XII que no entanto sofre a restrição do art 5º XLIII para excluir a possibilidade de sua concessão quando se trata de condenação por crime hediondo16 A natureza dos crimes abrangidos pelo indulto deve ser analisada à época da sua prática e não no momento da concessão do benefício17 Exemplificativamente se quando cometido o delito não era hediondo e depois passou a ostentar esta característica em tese será cabível o indulto Tal como na graça o indulto coletivo é o ato que se insere na atividade privativa e discricionária do Presidente da República que poderá optar pela concessão de benefício a determinados crimes e não a outros por critérios razoáveis de política criminal Como já decidido pelo Supremo Tribunal Federal O indulto é instrumento de política criminal de que dispõe o Chefe do Poder Executivo configurando o seu emprego típica sanção premial decisão esta sujeita a critérios de conveniência e oportunidade a ser empreendida sob a ótica da prevenção criminal18 Cumpre também destacar o teor da Súmula 535 do Superior Tribunal de Justiça A prática de falta grave não interrompe o prazo para fim de comutação de pena ou indulto De fato não basta a prática da falta grave para que ocorra automaticamente a interrupção do prazo É preciso analisar no caso concreto o cumprimento dos requisitos previstos no decreto presidencial pelo qual foram instituídos o indulto ou a comutação da pena Finalmente convém observar a incidência do indulto não só às penas mas também às medidas de segurança Na dicção do Supremo Tribunal Federal Revestese de legitimidade jurídica a concessão pelo presidente da República do benefício constitucional do indulto CF art 84 XII que traduz expressão do poder de graça do Estado mesmo se se tratar de indulgência destinada a favorecer pessoa que em razão de sua inimputabilidade ou semiimputabilidade sofre medida de segurança ainda que de caráter pessoal e detentivo Essa a conclusão do Plenário que negou provimento a recurso extraordinário em que discutida a possibilidade de extensão de indulto a internados em cumprimento de medida de segurança O Colegiado assinalou que a competência privativa do presidente da República prevista no art 84 XII da CF abrange a medida de segurança espécie de sanção penal inexistindo restrição à concessão de indulto Embora não seja pena em sentido estrito é medida de natureza penal e ajustase ao preceito cuja interpretação deveria ser ontológica Lembrou o HC 84219SP DJU de 2392005 em que o período máximo da medida de segurança fora limitado a 30 anos mediante interpretação sistemática e teleológica dos artigos 75 e 97 do CP e 183 da LEP Fora reconhecida na ocasião a feição penal da medida de segurança a implicar restrição coercitiva da liberdade Em reforço a esse entendimento sublinhou o art 171 da LEP a condicionar a execução da sentença ao trânsito em julgado bem assim o art 397 II do CPP a proibir a absolvição sumária imprópria em observância ao princípio da não culpabilidade CF art 5º LVII19 1ª 2ª 3ª É a nova lei que exclui do âmbito do Direito Penal um fato até então considerado criminoso Encontra previsão legal no art 2º caput do Código Penal e tem natureza jurídica de causa de extinção da punibilidade art 107 III Alcança a execução e os efeitos penais da sentença condenatória não servindo como pressuposto da reincidência nem configurando maus antecedentes Sobrevivem entretanto os efeitos civis de eventual condenação isto é a obrigação de reparar o dano provocado pela infração penal e a constituição de título executivo judicial Questão normalmente abordada em concursos públicos é a seguinte Qual é o juízo competente para aplicar a abolitio criminis A resposta é simples Guarde o seguinte raciocínio a lei será sempre aplicada pelo órgão do Poder Judiciário em que a ação penal estiver em trâmite Extraemse as seguintes ilações Em se tratando de inquérito policial ou de ação penal que se encontre em 1º grau de jurisdição ao juiz natural compete a aplicação da lei mais favorável Exemplo crime praticado na comarca de São Paulo com inquérito policial distribuído e ação penal ajuizada na 10ª Vara Criminal O juiz de Direito responsável por esta Vara deverá aplicar a lei mais favorável No caso de ação penal em grau de recurso ou ainda na hipótese de crime de competência originária dos Tribunais tal mister será reservado ao Tribunal respectivo Se a condenação já tiver sido alcançada pelo trânsito em julgado a competência será do juízo da Vara das Execuções Criminais É o que se extrai do art 66 I da Lei de Execução Penal e da Súmula 611 do Supremo Tribunal Federal20 Em face de sua amplitude será analisada no capítulo seguinte A decadência é a perda do direito de queixa ou de representação em face da inércia de seu titular durante o prazo legalmente previsto O prazo salvo disposição legal em contrário é de 6 seis meses independentemente do número de dias de cada mês21 contados do dia em que o ofendido veio a saber quem é o autor do crime ou no caso de ação penal privada subsidiária da pública do dia em que se esgota o prazo para oferecimento da denúncia CP art 103 Esse prazo é contado a partir do conhecimento inequívoco da autoria e não de meras suspeitas22 A contagem do prazo obedece aos ditames do art 10 do Código Penal pois possui índole penal Logo em caso de dúvida acerca do decurso ou não do prazo legal a decadência não pode ser reconhecida O prazo decadencial é para o oferecimento da queixacrime e não para o seu recebimento pelo Poder Judiciário e no caso de ser ela antecedida por inquérito policial pedido de providências deve o prazo ser apurado a partir da conclusão oficial deste procedimento preparatório se somente nesse momento foi apurada a autoria da infração penal23 O prazo decadencial é preclusivo e improrrogável e não se submete em face de sua própria natureza jurídica à incidência de quaisquer causas de interrupção e suspensão24 No caso de crime continuado o prazo decadencial é contado separadamente para cada delito parcelar De fato a ficção jurídica de unidade de crime tem lugar exclusivamente para fins de aplicação da pena E no crime habitual tal prazo deve ser computado a partir do último fato praticado pelo agente São nítidas as diferenças entre a decadência e a prescrição Vejamos o gráfico esquemático É a perda do direito de ação que acarreta na extinção da punibilidade provocada pela inércia processual do querelante25 A perempção não é aplicável na ação penal privada subsidiária da pública uma vez que nessa hipótese o Ministério Público dará andamento à ação na hipótese de omissão ou desídia do querelante26 As causas de perempção foram previstas no art 60 do Código de Processo Penal Art 60 Nos casos em que somente se procede mediante queixa considerarseá perempta a ação penal I quando iniciada esta o querelante deixar de promover o andamento do processo durante 30 trinta dias seguidos II quando falecendo o querelante ou sobrevindo sua incapacidade não comparecer em juízo para prosseguir no processo dentro do prazo de 60 dias qualquer das pessoas a quem couber fazêlo ressalvado o disposto no art 36 III quando o querelante deixar de comparecer sem motivo justificado a qualquer ato do processo a que deva estar presente ou deixar de formular o pedido de condenação nas alegações finais IV quando sendo o querelante pessoa jurídica esta se extinguir sem deixar sucessor Pelo texto legal notase ser a perempção sanção que somente pode ser imposta após a propositura da queixa Com efeito fala o Código de Processo Penal em início da ação penal atos do processo etc27 Na primeira hipótese inc I se faz necessária a regular intimação do querelante para o ato processual Se ainda assim não se manifestar no prazo legal de 30 dias será declarada a extinção da punibilidade pela perempção28 Exemplo o querelante deixa de nomear novo advogado apesar de devidamente intimado da renúncia do patrono antecessor Há perempção ainda no caso de falecimento ou incapacidade do querelante quando as pessoas determinadas pela lei não comparecerem em juízo para prosseguimento do feito inc II No caso de morte o direito de prosseguir na ação passará ao cônjuge ascendente descendente ou irmão CPP art 31 No caso de interdição ao curador O inciso III do art 60 prevê a ocorrência de perempção quando o querelante a deixar de comparecer sem motivo justificado a qualquer ato do processo e b nas alegações finais deixar de formular pedido de condenação A presença do querelante deve ser necessária para a prática do ato processual Assim não se faz obrigatório o seu comparecimento na audiência preliminar tanto por ser ato anterior ao recebimento ou rejeição da queixacrime quanto pelo fato de se tratar de mera faculdade conferida às partes29 Também não se dá a perempção pela ausência do querelante na audiência prevista no art 520 do Código de Processo Penal30 O ato processual a ser praticado portanto deve demandar a participação pessoal do querelante não havendo perempção se nos demais atos ele se fizer representar por seu procurador Não pode ser declarada a extinção da punibilidade da mesma forma se a ausência for justificada A declaração de perempção só pode ocorrer se o querelante for intimado para o ato a ser praticado Portanto nos casos de audiência realizada por carta precatória em virtude da desnecessidade de intimação não pode ser considerada perempta a ação pela ausência do querelante ou seu defensor31 A falta de pedido de condenação nas alegações finais atuais memoriais é igualmente hipótese de perempção inc III 2ª parte Esse fenômeno não tem lugar na ação penal pública pois o magistrado pode proferir sentença condenatória mesmo com pedido de absolvição do Ministério Público CPP art 385 Não é preciso que o querelante manifeste expressamente o pedido de condenação bastando que dos seus termos possa extrairse esse propósito Nesse contexto os pedidos de procedência da ação penal ou de aplicação da pena são suficientes para revelar tal vontade do ofendido A não apresentação de alegações finais no prazo legal equivale à falta de pedido de condenação desde que intimado o querelante para o ato Essa regra nada obstante a manutenção do texto do art 60 inc III do Código de Processo Penal reclama interpretação em sintonia com as modificações introduzidas pela Lei 117192008 Com efeito a partir de então as alegações finais tanto da acusação como da defesa são lançadas oralmente em audiência Mas o juiz poderá considerada a complexidade do caso ou o número de acusados conceder às partes o prazo de 5 cinco dias sucessivamente para apresentação de memoriais CPP art 403 caput e 3 Por último a ação penal é considerada perempta quando o querelante pessoa jurídica se extinguir sem deixar sucessor CPP art 60 inc IV Se houver sucessor procederseá na forma prevista no art 60 inc II do Código de Processo Penal exigindose habilitação no prazo legal para prosseguimento da lide sob pena de perempção Além das hipóteses legais também pode ser considerada perempta a ação penal com a morte do querelante na ação penal privada personalíssima O único exemplo vigente é possível no crime tipificado pelo art 236 do Código Penal induzimento a erro essencial e ocultação de impedimento Em caso de pluralidade de querelantes a perempção somente atingirá o desidioso persistindo a ação penal no tocante aos demais A renúncia é ato unilateral pelo qual se efetua a desistência do direito de ação pela vítima Nos termos do art 104 caput do Código Penal O direito de queixa não pode ser exercido quando renunciado expressa ou tacitamente A renúncia pode ocorrer na ação penal exclusivamente privada mas não na subsidiária da pública pois se o ofendido deixar de oferecer queixa o Ministério Público poderá iniciar a ação penal enquanto não extinta a punibilidade do agente pela prescrição ou por qualquer outra causa A renúncia expressa constará de declaração assinada pelo ofendido por seu representante legal ou procurador com poderes especiais CPP art 50 caput De seu turno a renúncia tácita ao direito de queixa resulta da prática de ato incompatível com a vontade de exercêlo que admitirá todos os meios de prova CP art 104 parágrafo único e CPP art 57 Não acarreta em renúncia tácita todavia o fato de receber o ofendido a indenização do dano causado pelo crime CP art 104 parágrafo único Na hipótese porém da Lei 90991995 tratandose de ação penal de iniciativa privada ou de ação pública condicionada à representação o acordo entre ofensor e ofendido homologado em juízo acarreta a renúncia ao direito de queixa ou representação art 74 parágrafo único Portanto nos crimes de iniciativa privada e pública condicionada à representação de competência dos Juizados Especiais a composição civil extingue a punibilidade do autor do fato32 Nos termos do art 49 do Código de Processo Penal a renúncia ao exercício do direito de queixa em relação a um dos autores do crime a todos se estenderá Como já decidiu o Supremo Tribunal Federal tratandose de ação penal privada o oferecimento de queixacrime somente contra um ou alguns dos supostos autores ou partícipes da prática delituosa com exclusão dos demais envolvidos configura hipótese de violação ao princípio da indivisibilidade CPP art 48 implicando por isso mesmo em renúncia tácita ao direito de querela CPP art 49 cuja eficácia extintiva da punibilidade estendese a todos quantos alegadamente hajam intervindo no suposto cometimento da infração penal CP art 107 V cc o art 10433 A renúncia apenas pode ser exercida antes do oferecimento da queixa De fato depois do início da ação penal poderão ocorrer outras formas de extinção da punibilidade tais como a perempção ou o perdão do ofendido Na linha da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça A renúncia a que alude o art 104 do CP diz respeito ao direito de queixa não influindo no prosseguimento da ação penal já promovida Então oferecida a queixacrime não é mais cabível a renúncia porque não há mais nada a renunciar A pretensão do querelante de obstar o prosseguimento da ação penal pode ser acolhida pelo perdão do ofendido arts 105 e 106 do CP a depender contudo da aceitação do querelado34 No caso de morte da vítima o direito de oferecer queixa passará ao cônjuge ascendente descendente ou irmão CPP art 31 E a renúncia por parte de um dos colegitimados não impedirá o exercício da ação penal privada pelos outros De igual modo em caso de crime com duas ou mais vítimas a renúncia de uma delas não obsta o direito de queixa pelas demais O perdão do ofendido é a desistência manifestada após o oferecimento da queixa impeditiva do prosseguimento da ação CP art 105 Portanto seja ele expresso ou tácito somente constituise em causa de extinção da punibilidade nos crimes que se apuram exclusivamente por ação penal privada35 O perdão pode ocorrer a qualquer momento depois do início da ação penal privada até o trânsito em julgado da sentença condenatória CP art 106 2º De acordo com o art 106 do Código Penal Art 106 O perdão no processo ou fora dele36 expresso ou tácito I se concedido a qualquer dos querelados a todos aproveita II se concedido por um dos ofendidos não prejudica o direito dos outros III se o querelado o recusa não produz efeitos Perdão tácito é o que resulta da prática de ato incompatível com a vontade de prosseguir na ação CP art 106 1º e admitirá todos os meios de prova CPP art 57 A concessão do perdão pode ser feita pelo ofendido ou por seu representante legal quando menor de 18 anos ou incapaz encontrandose tacitamente revogado pelo novo Código Civil o disposto pelo art 52 do Código de Processo Penal Se o querelante for menor de 21 e maior de 18 anos o direito de perdão poderá ser exercido por ele ou por seu representante legal mas o perdão concedido por um havendo oposição do outro não produzirá efeito Por se tratar de ato bilateral o perdão depende da aceitação do querelado pois a ele pode ser interessante provar a sua inocência O perdão concedido a um dos querelados aproveitará a todos sem que produza todavia efeito em relação ao que o recusar CPP art 51 No perdão o querelado será intimado a dizer dentro de três dias se o aceita devendo ao mesmo tempo ser cientificado de que o seu silêncio importará em anuência Aceito o perdão expressa ou tacitamente o juiz julgará extinta a punibilidade CPP art 58 caput e parágrafo único O perdão referese a cada crime individualmente considerado Consequentemente nada impede o posterior oferecimento de queixa em caso de reiteração da infração penal pelo perdoado Finalmente se concedido o perdão por um ou alguns dos ofendidos isso não prejudicará o direito das demais vítimas em prosseguir com a ação penal Retratarse é desdizerse confessar que errou revelando o arrependimento do responsável pela infração penal Tem cabimento como causa de extinção da punibilidade apenas nos casos em que a lei a admite CP art 107 VI É o que ocorre exemplificativamente quando o querelado antes da sentença se retrata cabalmente da calúnia ou da difamação CP art 143 Por esse motivo não extingue a punibilidade no crime de injúria pois nessa situação não foi expressamente prevista A retratação depende dos requisitos exigidos pelo dispositivo legal que a prevê Como já decidiu o Superior Tribunal de Justiça relativamente a tais crimes contra a honra A retratação para gerar a extinção da punibilidade do agente deve ser cabal ou seja completa inequívoca No caso em que a ofensa foi praticada mediante texto veiculado na internet o que potencializa o dano à honra do ofendido a exigência de publicidade da retratação revelase necessária para que esta cumpra a sua finalidade e alcance o efeito previsto na lei37 De igual modo o Código Penal admite a retratação no art 342 2º segundo o qual o fato deixa de ser punível se antes da sentença no processo em que ocorreu o ilícito o agente se retrata ou declara a verdade38 O inc VII do art 107 previa como causa de extinção da punibilidade o casamento do agente com a vítima nos crimes contra os costumes definidos nos Capítulos I II e III do Título IV da Parte Especial do Código Penal O inc VIII trazia como causa de extinção da punibilidade o casamento da vítima com terceiro nos crimes referidos no inciso anterior se cometidos sem violência real ou grave ameaça e desde que a ofendida não requeresse o prosseguimento do inquérito policial ou da ação penal no prazo de 60 dias a contar da celebração a b c d e f g Perdão judicial é o ato exclusivo de membro do Poder Judiciário que na sentença deixa de aplicar a pena ao réu em face da presença de requisitos legalmente exigidos Somente pode ser concedido nos casos expressamente previstos em lei CP art 107 inc IX É vedada a sua aplicação a delito para o qual a lei não prevê a extensão do benefício39 O perdão judicial em regra é aplicável aos crimes culposos Entretanto também tem incidência a crimes dolosos dependendo apenas da vontade do legislador Vejamos alguns casos em que foi previsto art 121 5º do Código Penal na hipótese de homicídio culposo o juiz poderá deixar de aplicar a pena se as consequências da infração atingirem o próprio agente de forma tão grave que a sanção penal se torne desnecessária art 129 8º do Código Penal aplicase à lesão corporal culposa o disposto no art 121 5º art 140 1º do Código Penal no tocante ao crime de injúria o juiz pode deixar de aplicar a pena I quando o ofendido de forma reprovável provocou diretamente a injúria II no caso de retorsão imediata que consista em outra injúria art 180 5º do Código Penal relativamente à receptação culposa na hipótese do 3º se o criminoso é primário pode o juiz tendo em consideração as circunstâncias deixar de aplicar a pena art 8º da Lei das Contravenções Penais no caso de ignorância ou errada compreensão da lei quando escusáveis a pena pode deixar de ser aplicada art 39 2º da Lei das Contravenções Penais na conduta de participar de associações secretas mas com fins lícitos o juiz pode deixar de aplicar a pena art 29 2º da Lei 96051998 Lei dos Crimes Ambientais no caso de guarda doméstica de espécie silvestre não considerada ameaçada de extinção pode o juiz considerando as circunstâncias h deixar de aplicar a pena art 13 da Lei 98071999 Poderá o juiz de ofício ou a requerimento das partes conceder o perdão judicial e a consequente extinção da punibilidade ao acusado que sendo primário tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e o processo criminal desde que dessa colaboração tenha resultado I a identificação dos demais coautores ou partícipes da ação criminosa II a localização da vítima com a sua integridade física preservada III a recuperação total ou parcial do produto do crime No tocante ao homicídio e lesão culposos cometidos na direção de veículo automotor o Código de Trânsito não prevê o perdão judicial É imperativa contudo a aplicação analógica do 5º do art 121 e do 8º do art 129 ambos do Código Penal que são normas de caráter geral CP art 12 justificativa que restou bem delineada com o veto do Presidente da República ao dispositivo legal que previa o perdão judicial em tais crimes do Código de Trânsito Brasileiro40 O perdão judicial é causa extintiva da punibilidade CP art 107 inc IX e consubstanciase em direito público subjetivo razão pela qual o magistrado deve concedêlo ao réu quando presentes os requisitos exigidos em lei Em síntese o juiz possui discricionariedade para verificar a presença dos requisitos legais mas se considerálos existentes a aplicação do perdão judicial é obrigatória A jurisprudência tem conferido amplo alcance ao perdão judicial permitindo sua aplicação quando as consequências da infração atingirem de forma física ou moral o próprio agente seus familiares noiva amigos íntimos etc Em qualquer caso porém é imprescindível o vínculo familiar ou afetivo entre o autor e a vítima do crime Nas lições do Superior Tribunal de Justiça O perdão judicial não pode ser concedido ao agente de homicídio culposo na direção de veículo automotor art 302 do CTB que embora atingido moralmente de forma grave pelas consequências do acidente não tinha vínculo afetivo com a vítima nem sofreu sequelas físicas gravíssimas e permanentes Conquanto o perdão judicial possa ser aplicado nos casos em que o agente de homicídio culposo sofra sequelas físicas gravíssimas e permanentes a doutrina quando se volta para o sofrimento psicológico do agente enxerga no 5º do art 121 do CP a exigência de um laço prévio entre os envolvidos para reconhecer como tão grave a forma como as consequências da infração atingiram o agente A interpretação dada na maior parte das vezes é no sentido de que só sofre intensamente o réu que de forma culposa matou alguém conhecido e com quem mantinha laços afetivos O exemplo mais comumente lançado é o caso de um pai que mata culposamente o filho Essa interpretação desdobrase em um norte que ampara o julgador Entender pela desnecessidade do vínculo seria abrir uma fenda na lei não desejada pelo legislador Isso porque além de ser de difícil aferição o tão grave sofrimento o argumento da desnecessidade do vínculo serviria para todo e qualquer caso de delito de trânsito com vítima fatal Isso não significa dizer o que a lei não disse mas apenas conferirlhe interpretação mais razoável e humana sem perder de vista o desgaste emocional que possa sofrer o acusado dessa espécie de delito mesmo que não conhecendo a vítima A solidarização com o choque psicológico do agente não pode conduzir a uma eventual banalização do instituto do perdão judicial o que seria no mínimo temerário no atual cenário de violência no trânsito que tanto se tenta combater Como conclusão conforme entendimento doutrinário a desnecessidade da pena que esteia o perdão judicial deve a partir da nova ótica penal e constitucional referirse à comunicação para a comunidade de que o intenso e perene sofrimento do infrator não justifica o reforço de vigência da norma por meio da sanção penal41 Se a conduta do agente acarretou a produção de dois ou mais resultados o perdão judicial incidirá somente no tocante ao delito em que ficar comprovado o vínculo familiar ou afetivo entre ele e a vítima de modo a tornar evidente que as consequências do crime o atingiram de forma tão grave que a sanção penal se revela desnecessária Em outras palavras a caracterização do concurso formal mediante unidade de conduta e pluralidade de resultados não autoriza o reconhecimento automático do perdão judicial para todos os delitos Como já decidido pelo Superior Tribunal de Justiça O fato de os delitos haverem sido cometidos em concurso formal não autoriza a extensão dos efeitos do perdão judicial concedido para um dos crimes se não restou comprovado quanto ao outro a existência do liame subjetivo entre o infrator e a outra vítima fatal A matéria tratada nos autos consiste em averiguar a possibilidade de concessão do perdão judicial art 121 5º do CP a autor de crime culposo de trânsito que mediante uma única ação imprudente leva duas vítimas a óbito independentemente de haver prova de que mantivesse fortes vínculos afetivos com uma das vítimas fatais Sob esse prisma cumpre observar que quando a avaliação está voltada para o sofrimento psicológico do autor do crime a melhor doutrina enxerga no 5º do art 121 do CP a exigência de um vínculo de um laço prévio de conhecimento entre os envolvidos para que seja tão grave a consequência ao agente a ponto de ser despicienda e até exacerbada outra pena além da própria dor causada intimamente pelo dano provocado ao outro42 O perdão judicial constituise em condição subjetiva ou pessoal Consequentemente não se comunica aos demais envolvidos na empreitada criminosa De fato somente quem ostenta as condições legalmente exigidas pelo perdão judicial pode ser beneficiado com a extinção da punibilidade Imagine se exemplificativamente um homicídio culposo praticado na direção de veículo automotor No automóvel estavam o condutor seus dois filhos de pouca idade e terceira pessoa até então desconhecida a quem havia dado carona O motorista em excesso de velocidade é incentivado pelo carona a correr ainda mais Em face dessa imprudência perde a direção do veículo que capota resultando na morte das duas crianças Os adultos sobrevivem Nessa situação o perdão judicial se cabível incidirá somente em relação ao motorista pois apenas ele suportou as graves consequências do crime de modo a tornar desnecessária a aplicação da pena O perdão judicial somente pode ser concedido pelo Poder Judiciário na sentença ou no acórdão em grau recursal ou em ações penais de competência originária dos tribunais Com base nessa premissa discutese a natureza jurídica da sentença lato sensu concessiva do perdão judicial Há três posições sobre o assunto 1ª posição Condenatória Foi defendida pelo Supremo Tribunal Federal antes da reforma da Parte Geral pela Lei 72091984 e subsistiu após a entrada em vigor do citado diploma legal até a promulgação da atual Constituição Federal Deveras naquele período o STF apreciava e julgava questões infraconstitucionais e firmou o entendimento de que somente se perdoa quem errou isto é quem cometeu uma infração penal Portanto o magistrado deve condenar o réu e posteriormente conceder o perdão judicial deixando de aplicar a pena43 Atualmente quem defende essa posição o faz com amparo no art 120 do Código Penal o qual dispõe expressamente que a sentença concessiva de perdão judicial não prevalece para efeito de reincidência Seria uma condenação com todos os seus efeitos exceto para fins de recidiva 2ª posição Absolutória Fundase no fato de não existir condenação sem aplicação de pena Desse modo como há sentença sem imposição de sanção penal seria inevitavelmente de cunho absolutório Essa corrente falha em uma questão terminológica somente se perdoa quem errou Quem deve ser absolvido não depende de perdão Além disso a sentença concessiva do perdão judicial não se enquadra no art 386 do Código de Processo Penal responsável pela previsão das hipóteses de absolvição na justiça penal brasileira 3ª posição Declaratória da extinção da punibilidade O juiz reconhece a prática de um fato típico e ilícito bem como a culpabilidade do réu mas por questões de política criminal reforçadas pela lei deixa de aplicar a pena A sentença não pode ser condenatória pois é impossível falarse em condenação sem pena E também não pode ser absolutória já que um inocente que deve ser absolvido não precisa clamar por perdão Resta assim uma única saída a sentença é declaratória da extinção da punibilidade O juiz não condena nem absolve Em se tratando de crime que a admite e presentes os requisitos legais o magistrado limitase a declarar a ocorrência da causa extintiva da punibilidade Essa posição foi consagrada pela Súmula 18 do Superior Tribunal de Justiça A sentença concessiva do perdão judicial é declaratória de extinção da punibilidade não subsistindo qualquer efeito condenatório Contudo existem autores que sustentam a aplicação do perdão judicial a qualquer tempo amparados no art 61 caput do Código de Processo Penal por se tratar de causa de extinção da punibilidade44 Não concordamos com esse entendimento uma vez que o perdão judicial somente se justifica quando o réu deveria ser condenado há prova da autoria e da materialidade do fato mas a lei autoriza o juiz a declarar a extinção da punibilidade Além disso a prova segura do seu cabimento somente pode ser produzida durante a instrução criminal em juízo sob o crivo do contraditório De qualquer modo a decisão que concede o perdão judicial sempre é declaratória da extinção da punibilidade independentemente da posição que se adote acerca do momento em que pode ser reconhecido Em ambos o fato é típico e ilícito e o agente possui culpabilidade Subsiste a infração penal operandose exclusivamente a extinção da punibilidade Em suma há um crime ou contravenção penal e o seu responsável deve submeterse ao juízo de reprovabilidade mas o Estado está impedido de punir Além disso tanto o perdão judicial como as escusas absolutórias são condições subjetivas ou pessoais incomunicáveis aos demais coautores e partícipes da infração penal Nada obstante tais semelhanças os institutos não se confundem O perdão judicial somente pode ser concedido na sentença ou no acórdão depois de cumprido o devido processo legal Por sua vez as escusas absolutórias CP arts 181 e 348 2º impedem a instauração da persecução penal Sequer existe inquérito policial Com efeito as escusas absolutórias se justificam por questões objetivas provadas de imediato Exemplo relação de parentesco na linha reta De outro lado o perdão judicial reclama o regular trâmite da ação penal para provar se estão ou não presentes os requisitos legalmente exigidos Exemplificativamente somente com o término da instrução criminal será possível concluir se em um homicídio culposo praticado por um homem contra sua esposa as consequências do crime foram tão graves de modo a tornar dispensável a aplicação da pena O viúvo pode ter ficado profundamente abalado e até mesmo com depressão hipótese em que será pertinente o perdão judicial mas é possível também que logo após a morte tenha se casado com outra mulher e utilizado a herança da falecida para adquirir carros de luxo bens que até então não possuía e realizar festas caríssimas afastando a causa extintiva da punibilidade O perdão judicial é ato exclusivo do Poder Judiciário Além disso é unilateral ou seja independe de aceitação da parte contrária e tem lugar em crimes de ação penal pública ou privada Já o perdão do ofendido é concedido pela vítima de um crime que somente se processa por meio de ação penal privada Se não bastasse é bilateral pois reclama para surtir efeitos a aceitação expressa ou tácita do querelado Perdão judicial Perdão do ofendido Concessão Só o juiz Só o ofendido ou o seu representante com poderes especiais Tipo de ação penal Qualquer uma desde que haja autorização legal Só na ação penal exclusivamente privada Eficácia Não depende da aceitação do réu Depende da aceitação do réu 1 2 3 4 5 6 7 8 STJ HC 362478SP rel Min Jorge Mussi 5ª Turma j 14092017 noticiado no Informativo 611 No tocante ao furto de energia elétrica convém destacar que o Superior Tribunal de Justiça entende que o pagamento do débito antes do oferecimento da denúncia não configura causa de extinção da punibilidade sem prejuízo do reconhecimento do arrependimento posterior previsto no art 16 do Código Penal HC 412208SP rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 20032018 noticiado no Informativo 622 A extinção da punibilidade pela prescrição quanto aos crimes antecedentes não implica o reconhecimento da atipicidade do delito de lavagem de dinheiro art 1º da Lei nº 96131998 imputado ao paciente Nos termos do art 2º 1º da lei mencionada para a configuração do delito de lavagem de dinheiro não há necessidade de prova cabal do crime anterior mas apenas a demonstração de indícios suficientes de sua existência Assim sendo o crime de lavagem de dinheiro é delito autônomo independente de condenação ou da existência de processo por crime antecedente STJ HC 207936MG rel Min Jorge Mussi 5ª Turma j 27032012 noticiado no Informativo 494 RHC 31321PR rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 16052013 noticiado no Informativo 523 MIRABETE Julio Fabbrini Manual de direito penal Parte geral 24 ed São Paulo Atlas 2007 v 1 p 402 HUNGRIA Nélson Novas questões jurídicopenais Rio de Janeiro Forense 1945 p 108 NORONHA E Magalhães Direito penal 15 ed São Paulo Saraiva 1978 v 1 p 396 Afirmou que o suposto óbito do paciente seria fato inexistente e que portanto não poderia existir no mundo jurídico Por essa razão reputou não haver óbice à desconstituição da coisa julgada HC 104998SP rel Min Dias Toffoli 1ª Turma j 14122010 noticiado no Informativo 613 HC 143474SP rel Min Celso Limongi Desembargador convocado do TJSP 6ª Turma j 06052010 noticiado no Informativo 433 E ainda O desfazimento da decisão que admitindo por equívoco a morte do agente declarou a extinção da punibilidade não constitui ofensa à coisa julgada HC 31234 rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 16122003 9 10 11 12 13 14 15 No Estado democrático de direito o Poder Judiciário não está autorizado a alterar a dar outra redação diversa da nele contemplada a texto normativo Pode a partir dele produzir distintas normas Mas nem mesmo o Supremo Tribunal Federal está autorizado a rescrever leis de anistia Revisão de lei de anistia se mudanças do tempo e da sociedade a impuserem haverá ou não de ser feita pelo Poder Legislativo não pelo Poder Judiciário STF ADPF 153DF rel Min Eros Grau Plenário j 29042010 STF ADI 104RO rel Min Sepúlveda Pertence Plenário j 04062007 e STJ RMS 40534BA rel Min Humberto Martins 2ª Turma j 15102013 STF ADI 1231DF rel Min Carlos Velloso Tribunal Pleno j 15122005 A jurisprudência do STF já não reclama o trânsito em julgado da condenação nem para a concessão do indulto nem para a progressão de regime de execução nem para o livramento condicional STF HC 87801SP rel Min Sepúlveda Pertence 1ª Turma j 02052006 Não é possível o cômputo do período de prova cumprido em suspensão condicional da pena para preenchimento do requisito temporal objetivo do indulto STF HC 123698PE rel Min Cármen Lúcia 2ª Turma j 17112015 noticiado no Informativo 808 Exemplificativamente se o decreto de indulto limitouse a prever o benefício à pena privativa de liberdade não ocorrerá a extinção da punibilidade no tocante à sanção pecuniária cumulativamente aplicada O indulto da pena privativa de liberdade não alcança a pena de multa que tenha sido objeto de parcelamento espontaneamente assumido pelo sentenciado STF EP 11 IndComAgRDF rel Min Roberto Barroso Plenário j 08112017 noticiado no Informativo 884 A concessão do indulto pleno ou parcial atinge a pena Será pleno quando extinguir a pena por completo resultando na extinção da punibilidade E será parcial também chamado de comutação quando o afastamento da pena não se der por completo No entanto em ambos os casos os demais efeitos penais e civis do crime permanecem inalterados Assinalese ainda que o indulto não é aplicado de forma automática Necessita assim de um procedimento judicial em que o juiz da execução irá avaliar se o apenado preenche ou não os requisitos insculpidos no decreto presidencial STJ REsp 1557408DF rel Min Maria Thereza 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 de Assis Moura 6ª Turma j 16022016 noticiado no Informativo 577 HC 81565SC rel Min Sepúlveda Pertence 1ª Turma j 19022002 Em igual sentido Assinalou que a proibição do art 5º XLIII da CF seria aplicável ao indulto individual e ao indulto coletivo HC 118213SP rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 06052014 noticiado no Informativo 745 O STJ compartilha deste entendimento Há expressa vedação legal ao benefício de indulto em se tratando de crimes hediondos ou a eles equiparados e a Lei Antidrogas reforça tal proibição HC 271537SP rel Min Moura Ribeiro 5ª Turma j 22102013 STF RE 274265DF rel Min Néri da Silveira 2ª Turma j 14082001 e STJ HC 276686SP rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 18062014 HC 90364MG rel Min Ricardo Lewandowski Tribunal Pleno j 31102007 noticiado no Informativo 486 RE 628658RS rel Min Marco Aurélio Plenário j 05112015 noticiado no Informativo 806 É o seu texto Transitada em julgado a sentença condenatória compete ao Juízo das execuções a aplicação de lei mais benigna No mesmo sentido o teor da Súmula 23 do extinto Tribunal Federal de Recursos O juízo da execução criminal é o competente para a aplicação de lei nova mais benigna a fato julgado por sentença condenatória irrecorrível STJ APn 562MS rel originário Min Fernando Gonçalves rel para acórdão Min Felix Fischer Corte Especial j 02062010 noticiado no Informativo 437 STF HC 89938SP rel Min Sepúlveda Pertence 1ª Turma j 14112006 STF RHC 85951PR rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 07022006 No mesmo sentido HC 85872SP rel Min Eros Grau 1ª Turma j 06092005 STF Inq 774RJ rel Min Celso de Mello Tribunal Pleno j 23091993 De acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça a perempção como perda do direito de prosseguir na ação penal de iniciativa privada é uma sanção jurídica imposta ao querelante por sua inércia negligência ou contumácia STJ EDcl no HC 156230PE rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 06032012 26 27 28 29 30 31 32 33 34 35 36 37 38 STJ RHC 26530SC rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 08112011 STF HC 86942MG rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 07022006 É também o entendimento do STJ HC 180479RS rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 24092013 STF Inq AgRg 920DF rel Min Celso de Mello Tribunal Pleno j 03081995 No mesmo sentido STJ REsp 440237SP rel Min Gilson Dipp 5ª Turma j 20052003 STF HC 86942MG rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 07022006 STF HC 81264RJ rel Maurício Côrrea 2ª Turma j 05032003 STJ RHC 26530SC rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 08112011 O querelante formulou proposta de composição de danos a dois dos querelados o que implica em sendo aceita e homologada judicialmente a renúncia ao direito de queixa nos termos do disposto no art 74 parágrafo único da Lei 90991995 A renúncia expressa ou tácita art 104 do CPB é causa extintiva da punibilidade sendo irretratável art 107 V CPB STJ APn 724DF rel Min Og Fernandes Corte Especial j 20082014 HC 88165RJ rel Min Celso de Mello 2ª Turma j 18042006 No STJ APn 724DF rel Min Og Fernandes Corte Especial j 20082014 APn 600MS rel Min Teori Albino Zavascki Corte Especial j 18082010 noticiado no Informativo 443 Nos termos do art 105 do Código Penal o perdão do ofendido nos crimes em que somente se procede mediante queixa obsta ao prosseguimento da ação logo é de se concluir que a referida causa extintiva de punibilidade somente tem efetiva aplicabilidade nas ações penais exclusivamente privadas já que na ação penal pública condicionada à representação ao ser proposta a titularidade é de imediato transferida ao órgão ministerial não mais dela dispondo a parte STJ HC 111326MT rel Min Jorge Mussi 5ª Turma j 26102010 O perdão concedido fora do processo é denominado extraprocessual REsp 320958RN rel Min Arnaldo Esteves Lima 5ª Turma j 06092007 A retratação prevista como causa de extinção da punibilidade do delito de falso testemunho deve ser realizada antes da sentença e no próprio processo no qual a afirmação inverídica foi feita STJ RHC 33350RS 39 40 41 42 43 44 rel Min Jorge Mussi 5ª Turma j 01102013 Condenado por homicídio duplamente qualificado não faz jus ao perdão judicial por absoluta ausência de previsão legal à sua aplicação STJ HC 55430RS rel Min Gilson Dipp 5ª Turma j 04052006 De fato previa o art 300 do Projeto de Lei 37101993 origem do CTB Lei 95031997 que nas hipóteses de homicídio culposo e lesão corporal culposa o juiz poderá deixar de aplicar a pena se as consequências da infração atingirem exclusivamente o cônjuge ou companheiro ascendente descendente irmão ou afim em linha reta do condutor do veículo As razões do veto presidencial foram as seguintes O artigo trata do perdão judicial já consagrado pelo Direito Penal Deve ser vetado porém porque as hipóteses previstas no 5 do art 121 e 8 do art 129 do Código Penal disciplinam o instituto de forma mais abrangente REsp 1455178DF rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 05062014 noticiado no Informativo 542 REsp 1444699RS rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 01062017 noticiado no Informativo 606 O perdão judicial pressupõe condenação pelo que não se estende aos efeitos secundários próprios da sentença condenatória RE 104679SP rel Min Aldir Passarinho 2ª Turma j 22101985 Nesse sentido CAPEZ Fernando e BONFIM Edilson Mougenot Direito penal Parte Geral São Paulo Saraiva 2004 p 843 461 INTRODUÇÃO O Estado é o titular exclusivo do direito de punir Somente ele pode aplicar pena ou medida de segurança ao responsável por uma infração penal1 Esse direito tem natureza abstrata pois pode ser exercido sobre todas as pessoas Paira indistintamente sobre elas independentemente da prática de um crime ou de uma contravenção penal funcionando como advertência pois a prática de um ilícito penal importará na imposição de uma sanção ao infrator Com a prática da infração penal contudo o ius puniendi automaticamente se concretiza pois a partir de então o Estado tem o poder e o dever de punir o responsável pelo fato típico e ilícito A pretensão punitiva outrora abstrata e dirigida contra todos os indivíduos transformase em concreta visando uma pessoa determinada Esse interesse estatal de índole pública se sobrepõe ao direito de liberdade do responsável pelo ilícito penal O direito de punir todavia é limitado Encontra barreiras penais e processuais tais como a representação do ofendido nos crimes de ação penal pública condicionada as condições da ação penal e a necessidade de obediência a regras constitucionais e processuais para ser efetivamente exercido devido processo legal Mas não é só Na ampla maioria dos casos há ainda limites temporais pois o direito de punir não pode se arrastar ao longo dos anos eternamente O Estado deve aplicar a sanção penal dentro de períodos legalmente fixados pois em caso contrário sua inércia tem o condão de extinguir a consciência do delito renunciando implicitamente ao poder que lhe foi conferido pelo 462 463 464 ordenamento jurídico Cabe a ele pois empreender todos os esforços para que a punibilidade se efetive célere e prontamente Entra em cena o instituto da prescrição É como se cometida uma infração penal o sistema jurídico virasse em desfavor do Estado uma ampulheta variando o seu tamanho proporcionalmente à gravidade do ilícito penal O poderdever de aplicar a sanção penal precisa ser efetivado antes de escoar toda a areia que representa o tempo que se passa pois se não o fizer dentro dos limites legalmente previstos o Estado perderá para sempre o direito de punir ORIGEM HISTÓRICA A prescrição existe desde os tempos antigos mas como causa de extinção da punibilidade a sua adoção remonta à legislação penal francesa do final do século XVIII2 Sempre foi calcada em idênticas premissas o esquecimento do ilícito penal e a presunção de emenda do seu responsável com a consequente inutilidade da pena Com a prescrição o Estado renuncia ao castigo pertinente ao agente culpável envolvido em determinada infração penal limitando o seu próprio poder punitivo CONCEITO Prescrição é a perda da pretensão punitiva ou da pretensão executória em face da inércia do Estado durante determinado tempo legalmente previsto Pretensão punitiva é o interesse em aplicar uma sanção penal ao responsável por um crime ou por uma contravenção penal enquanto a pretensão executória é o interesse em executar em exigir seja cumprida uma sanção penal já imposta FUNDAMENTOS Os fundamentos da prescrição são os seguintes a Segurança jurídica ao responsável pela infração penal não seria justa nem correta a imposição ou a execução de uma sanção penal muito tempo depois da prática do crime ou da contravenção penal Imaginese alguém que praticou um crime de pouca gravidade aos 18 anos de idade Seria ilógico e absurdo não exercitasse prontamente o Estado seu direito de punir e décadas depois essa mesma pessoa com 70 anos de idade e avô de diversos netos viesse a ser presa pelo fato há muito cometido contrariando o bomsenso e as finalidades da pena que não surtiria efeito algum Ao contrário implicaria somente em malefícios ao Estado à sociedade e principalmente ao agente e aos seus familiares Nas palavras de Bento de Faria Decorrido certo lapso de tempo desde a prática do crime sem que se tenha instaurado procedimento criminal contra o delinquente e se instaurado sem que se tenha prosseguido nesse procedimento ou desde a sentença condenatória sem que se tenha feito executar a pena a memória do fato punível apagouse e a necessidade do exemplo desaparece E seria repugnante aos princípios de equidade e de justiça que ficasse perpetuamente suspensa sobre a cabeça do criminoso a ameaça do procedimento criminal3 b Luta contra a ineficiência do Estado os órgãos estatais responsáveis pela apuração processo e julgamento de infrações penais devem atuar com zelo e celeridade em obediência à eficiência dos entes públicos estatuída pelo art 37 caput da Constituição Federal como princípio vetor da Administração Pública Serve portanto como castigo em caso de não ser alcançada uma meta pelo Estado qual seja aplicar a sanção penal dentro de prazos legalmente previstos c Impertinência da sanção penal a resposta do Estado somente cumpre a sua função preventiva especial e geral quando manifestada logo após a prática da infração penal O Direito Penal intimida não pela gravidade da punição mas pela certeza de seu exercício Nos idos de 1764 já afirmava Cesare Beccaria que quanto mais próxima do delito seja a aplicação da pena tanto mais justa e útil será De fato o maior freio aos delitos não é a crueldade 465 466 da pena mas sua infalibilidade porque a certeza do castigo ainda que mais moderado fará sempre maior impressão do que o temor de outro mais terrível unido com a esperança da impunidade Em suas palavras É pois de suma importância a proximidade do delito e da pena se se quiser que nas mentes rudes e incultas o quadro sedutor de um delito vantajoso seja imediatamente seguido da ideia associada à pena A longa demora não produz outro efeito além de dissociar cada vez mais essas duas ideias e ainda que o castigo de um delito cause uma impressão será menos a de um castigo que a de um espetáculo e isso só acontecerá após terse atenuado nos espectadores o horror de um certo delito em particular que serviria para reforçar o sentimento da pena4 NATUREZA JURÍDICA A prescrição é causa de extinção da punibilidade prevista no art 107 IV 1ª figura do Código Penal A infração penal por ela atingida portanto permanece íntegra e inabalável Desaparece tão somente a punibilidade compreendida como consequência e não como elemento de um crime ou de uma contravenção penal ALOCAÇÃO A prescrição embora produza diversos efeitos no processo penal é matéria inerente ao Direito Penal pois quando ocorre extingue o direito de punir de titularidade do Estado Para o cômputo de seu prazo observase o art 10 do Código Penal inclui se o dia do começo e excluise o dia do final contandose os dias os meses e os anos pelo calendário comum ou gregoriano Os prazos prescricionais são improrrogáveis não se suspendendo em finais de semana feriados ou férias Além disso tratase de matéria de ordem pública podendo e devendo ser decretada de ofício em qualquer tempo e grau de jurisdição ou mediante 467 a b requerimento de qualquer das partes Nos termos do art 61 caput do Código de Processo Penal Em qualquer fase do processo o juiz se reconhecer extinta a punibilidade deverá declarála de ofício5 Finalmente constituise em matéria preliminar isto é impede a análise do mérito da ação penal seja pelo juízo natural seja em grau de recurso Em caso de prescrição não há que falar em absolvição ou condenação mas apenas em extinção da punibilidade Para o Superior Tribunal de Justiça a prescrição é matéria prejudicial ao exame do mérito por constituir fato impeditivo do direito estatal de punir e extintivo da punibilidade do réu podendo ser inclusive analisada de ofício em qualquer fase do processo6 IMPRESCRITIBILIDADE PENAL O Código Criminal do Império de 1830 dispunha em seu art 65 que as penas impostas aos condenados não prescreviam em tempo algum Os diplomas posteriores Código Penal de 1890 Consolidação das Leis Penais de 1932 e Código Penal de 19407 não repetiram aquela fórmula já criticada em seu tempo Atualmente a regra geral consiste na aplicação da prescrição a todas as modalidades de infrações penais inclusive aos crimes hediondos8 A Constituição Federal todavia na contramão de seu próprio espírito por vedar qualquer espécie de prisão perpétua art 5º XLVII b determina a imprescritibilidade de dois grupos de crimes que a propósito não são os mais graves em nosso Direito Penal racismo art 5º XLII regulamentado pela Lei 771619899 e ação de grupos armados civis ou militares contra a ordem constitucional e o Estado Democrático art 5º XLIV disciplinados pela Lei 71701983 Lei de Segurança Nacional Como corolário dessas exceções taxativamente indicadas pelo texto constitucional prevalece em seara doutrinária o entendimento de que a legislação ordinária não pode criar outras hipóteses de imprescritibilidade penal10 Com efeito no momento em que o Poder Constituinte Originário admitiu apenas esses dois crimes como insuscetíveis de prescrição afirmou implicitamente que as penas de todas as demais infrações penais prescrevem e pela posição em que tais exceções foram previstas art 5º a prescrição teria sido erigida à categoria de direito fundamental do ser humano consistente na obrigação do Estado de investigar processar e punir alguém dentro de prazos legalmente previstos11 Foi essa a razão que levou a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça a firmarse no sentido de que em caso de citação por edital e consequente aplicação do art 366 do Código de Processo Penal com redação dada pela Lei 92711996 não se admite a suspensão da prescrição por tempo indefinido o que poderia configurar uma situação de imprescritibilidade Ao contrário o processo penal deve permanecer suspenso pelo prazo máximo em abstrato relativo ao crime na forma do art 109 do Código Penal Superado esse prazo retomase o trâmite da prescrição calculado pelo máximo da pena em abstrato legalmente previsto Na prática a prescrição passa a ser calculada em dobro sem falarse em imprescritibilidade Exemplificativamente uma ação penal por crime de furto simples CP art 155 caput em que o réu foi citado por edital e não compareceu ao interrogatório nem constituiu defensor deve ser suspensa operandose também a suspensão do prazo prescricional por 8 oito anos uma vez que a pena máxima cominada ao delito é de 4 quatro anos Em seguida decorrido tal prazo é retomado o curso da prescrição que se efetivará após outros 8 oito anos Esse é o entendimento consagrado na Súmula 415 do Superior Tribunal de Justiça O período de suspensão do prazo prescricional é regulado pelo máximo da pena cominada O Supremo Tribunal Federal todavia já entendeu que a Constituição Federal não veda seja indeterminado o prazo de suspensão da prescrição uma vez que não se constitui em hipótese de imprescritibilidade e a retomada do curso da prescrição fica apenas condicionada a evento futuro e incerto Além disso aduziu que a Lei Suprema se restringe a enumerar os crimes sujeitos à imprescritibilidade art 5º XLII e XLIV sem proibir em tese que lei ordinária crie outros casos12 468 Cumpre também observar o teor do art 29 do Decreto 43882002 responsável pela promulgação no Brasil do Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional Os crimes de competência do Tribunal não prescrevem13 As penas dos crimes contra a humanidade submetemse ao instituto da prescrição pois não há norma no direito pátrio impondo a imprescritibilidade penal em tais delitos Como já decidido pelo Supremo Tribunal Federal A Corte se referiu a fundamentos expostos na ADPF 153DF no sentido da não aplicação no Brasil da imprescritibilidade dos crimes dessa natureza haja vista o País não ter subscrito a Convenção sobre a Imprescritibilidade dos Crimes de Guerra e dos Crimes contra a Humanidade nem ter a ela aderido e ainda em razão de somente lei interna poder dispor sobre prescritibilidade ou imprescritibilidade da pretensão estatal de punir Ponderou que mesmo se houvesse norma de direito internacional de caráter cogente a estabelecer a imprescritibilidade dos crimes contra a humanidade ela não seria aplicável no Brasil por não ter sido ainda reproduzida no direito interno14 DIFERENÇAS ENTRE PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA15 Prescrição e decadência são causas de extinção da punibilidade previstas no art 107 IV do Código Penal Além disso ocorrem em razão da inércia do titular de um direito durante determinado tempo legalmente definido Todavia a decadência somente pode se verificar nos crimes de ação penal privada e de ação penal pública condicionada à representação do ofendido ou de quem o represente decurso in albis do prazo para ajuizamento da queixa crime ou oferecimento da representação A prescrição por sua vez é capaz de atingir qualquer espécie de crime pouco importando a forma pela qual se processa Consequentemente somente pode ocorrer a decadência antes do início da ação penal pois o legitimado tinha um prazo para ajuizar a queixacrime ou 469 4691 lançar a representação mas assim não o fez Ao reverso a prescrição pode se concretizar a qualquer momento isto é antes ou durante a ação penal e até mesmo depois do trânsito em julgado da sentença penal condenatória Por último a decadência importa diretamente na perda do direito de ação pois com seu advento a ação penal não pode mais ser iniciada seja pelo decurso do prazo para ajuizamento da queixacrime seja pelo transcurso do intervalo temporal para oferecimento da representação Perdese imediatamente o direito de ação e mediatamente o direito de punir haja vista que sem o direito de ação o Estado não tem meios legítimos devido processo legal para punir o responsável pela infração penal Na prescrição por outro lado operase imediatamente em relação ao Estado a perda do direito de punir fulminando qualquer possibilidade de exercício do direito de ação ESPÉCIES DE PRESCRIÇÃO Introdução O Código Penal apresenta dois grandes grupos de prescrição 1 da pretensão punitiva e 2 da pretensão executória De seu turno a prescrição da pretensão punitiva é subdividida em outras três modalidades 1 prescrição da pretensão punitiva propriamente dita ou prescrição da ação penal 2 prescrição intercorrente e 3 prescrição retroativa A prescrição da pretensão executória existe isoladamente ou seja não se divide em espécies A linha divisória entre os dois grandes grupos é o trânsito em julgado da condenação na prescrição da pretensão punitiva não há trânsito em julgado para ambas as partes acusação e defesa ao contrário do que se dá na prescrição da pretensão executória na qual a sentença penal condenatória já transitou em julgado para o Ministério Público ou para o querelante e também para a defesa Pelo fato porém de a prescrição intercorrente e a prescrição retroativa 4692 estarem situadas no 1º do art 110 do Código Penal é comum fazerse inaceitável confusão Dizse que somente na prescrição da pretensão punitiva propriamente dita ou prescrição da ação não existe trânsito em julgado ao contrário das demais espécies mormente por tratar o caput do art 110 do Estatuto Repressivo da prescrição depois de transitar em julgado a sentença condenatória Essa conclusão é equivocada A prescrição intercorrente e a prescrição retroativa pertencem ao grupo da prescrição da pretensão punitiva Só há prescrição da pretensão executória depois do trânsito em julgado da sentença penal condenatória para ambas as partes do processo penal E na prescrição intercorrente e na prescrição retroativa há trânsito em julgado da condenação mas apenas para a acusação Destarte andou mal o legislador ao inserir no art 110 do Código Penal a prescrição intercorrente e a prescrição retroativa Em verdade deveria ter delas tratado em dispositivo à parte principalmente em razão da relevância dos institutos Efeitos da prescrição e competência para sua declaração Os efeitos da prescrição no ordenamento jurídico brasileiro dependem da espécie em análise da pretensão punitiva ou da pretensão executória a Prescrição da pretensão punitiva Essa modalidade de prescrição obsta o exercício da ação penal seja na fase administrativa inquérito policial ou na fase judicial ação penal16 Não há interesse apto a legitimar a intervenção estatal autorizandose inclusive a 4610 rejeição da denúncia ou queixa nos moldes do art 395 II do Código de Processo Penal Se já foi instaurada a persecução penal por outro lado a prescrição da pretensão punitiva impede a sua continuação Deve o magistrado depois de ouvido o Ministério Público declarar a extinção da punibilidade sem análise do mérito arquivandose os autos em seguida17 Caso assim não faça assistirá ao acusado o direito de impetrar habeas corpus para cessar a coação ilegal com fulcro no art 648 VII do Código de Processo Penal Seu reconhecimento é da competência do membro do Poder Judiciário a quem estiver afeta a ação penal juízo de 1ª instância ou tribunais em grau de recurso ou no caso de infrações penais que sejam de sua competência originária Por último a prescrição da pretensão punitiva apaga todos os efeitos de eventual sentença condenatória já proferida principal ou secundários penais ou extrapenais18 Não servirá como pressuposto da reincidência nem como maus antecedentes Além disso não constituirá título executivo no juízo civil b Prescrição da pretensão executória Como já existe trânsito em julgado da sentença penal condenatória para acusação e defesa compete ao juízo da execução reconhecêla e declarar a extinção da punibilidade depois de ouvido o Parquet comportando essa decisão recurso de agravo sem efeito suspensivo LEP arts 66 II e 197 Extingue somente a pena efeito principal19 mantendose intocáveis todos os demais efeitos secundários da condenação penais e extrapenais Subsiste a condenação ou seja não se rescinde a sentença penal que funciona como pressuposto da reincidência dentro do período depurador previsto no art 64 I do Código Penal20 Por igual fundamento a condenação caracteriza antecedente negativo e serve como título executivo no campo civil PRESCRIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE 46101 LIBERDADE Prescrição da pretensão punitiva propriamente dita ou prescrição da ação penal21 Essa espécie de prescrição está disciplinada pelo art 109 caput do Código Penal A prescrição antes de transitar em julgado a sentença final regulase pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime Façamos um raciocínio simples mas eficiente para compreender os prazos prescricionais Entendao e depois o memorize pois será utilizado para todas as espécies de prescrição A prescrição é a perda do direito estatal de punir por força do decurso do tempo Antes de se retirar um direito de qualquer pessoa devese dar a ela todas as chances de exercêlo Com o Estado não é diferente pois a ele também se reserva a ampla defesa de seus direitos Na prescrição da pretensão punitiva propriamente dita não há trânsito em julgado para acusação nem para defesa Nada impede assim a fixação da pena no máximo legal E se a reprimenda pode chegar ao limite máximo não se pode privar o Estado do direito de punir com base em quantidade diversa de sanção penal Por esse motivo essa prescrição deve levar em consideração o máximo da pena privativa de liberdade cominada ao delito conforme determina o art 109 caput do Código Penal O Código Penal estabeleceu um critério lógico e objetivo A prescrição da ação penal é calculada com base no máximo da pena privativa de liberdade abstratamente cominada ao crime Utilizase a quantidade máxima prevista no preceito secundário do tipo penal enquadrandoa em algum dos incisos do art 109 do Código Penal com os quais podemos formar uma tabela O prazo previsto no inciso VI do art 109 do Código Penal 3 anos era anteriormente à Lei 122342010 de 2 dois anos Agora o menor prazo prescricional previsto no Código Penal é de 3 três anos no tocante às penas privativas de liberdade Cuidase do único prazo prescricional ímpar Essa modificação fundamentouse precipuamente no combate à impunidade das contravenções penais e dos crimes de reduzida lesividade agravada pela reconhecida morosidade da justiça penal Anotese porém que subsiste o prazo prescricional de 2 dois anos em três hipóteses a para a pena de multa quando for a única cominada ou aplicada CP art 114 I e b para o crime tipificado no art 28 caput da Lei 113432006 porte de droga para consumo pessoal nos termos do art 30 da Lei de Drogas e c no art 125 VII Código Penal Militar Decretolei 10011969 quando o máximo da pena privativa de liberdade é inferior a 1 um ano Essas três regras específicas não foram atingidas pelas alterações promovidas no Código Penal pela Lei 122342010 A propósito existe uma situação em que o prazo prescricional independe da quantidade da pena cominada ao delito Aliás sequer existe limite máximo da pena Tratase da pena de morte aplicável em tempo de guerra cuja prescrição operase em 30 anos CPM art 125 I Como entretanto a pena privativa de liberdade é calculada por meio de um sistema trifásico CP art 68 caput cada uma dessas etapas pode ou não influenciar no cômputo da prescrição Vejamos a 1ª fase Circunstâncias judiciais do art 59 caput Nessa fase o juiz deve navegar entre os limites mínimo e máximo previstos no preceito secundário do tipo penal não podendo em hipótese alguma ultrapassálos Consequentemente as circunstâncias judiciais não influenciam no cálculo da prescrição b 2ª fase Agravantes e atenuantes genéricas As agravantes genéricas estão arroladas taxativamente pelos arts 61 e 62 do Código Penal Por sua vez as atenuantes genéricas de caráter exemplificativo encontramse nos arts 65 e 66 do Código Penal Como sabido não podem ultrapassar os limites legais isto é o juiz deve respeitar em caso de agravantes genéricas por mais numerosas que sejam o máximo cominado pelo tipo penal e no tocante às atenuantes genéricas o patamar mínimo ainda que diversas estejam presentes e por mais ínfima que seja a reprovabilidade do agente Com efeito agravantes e atenuantes não indicam o percentual de aumento ou de diminuição A lei diz apenas são circunstâncias que sempre agravam art 61 a pena será ainda agravada art 62 são circunstâncias que sempre atenuam ou a pena poderá ainda ser atenuada art 66 Portanto a não observância dos parâmetros legais implicaria na criação de uma nova pena convertendo o magistrado em legislador em evidente violação da separação de Poderes consagrada pelo art 2º da Constituição Federal Nessa esteira a Súmula 231 do Superior Tribunal de Justiça A incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal Por identidade de razões os motivos que levaram à criação do enunciado também se aplicam às agravantes genéricas Concluise pois que as agravantes e atenuantes genéricas também não influem na contagem do prazo prescricional Há entretanto duas exceções por expressa previsão legal menoridade relativa e senilidade Constituemse em atenuantes genéricas tratadas pelo art 65 I do Código Penal as circunstâncias de ser o agente menor de 21 vinte e um na data do fato ou maior de 70 setenta anos na data da sentença Essas atenuantes na forma do art 115 do Código Penal reduzem pela metade os prazos de prescrição qualquer que seja sua modalidade prescrição da pretensão punitiva ou prescrição da pretensão executória Em relação à menoridade compreendese o acusado maior de 18 anos penalmente imputável mas menor de 21 anos ao tempo do fato pouco importando a data da sentença Se exemplificativamente o agente pratica um crime aos 20 mas é condenado apenas quando já completados 25 anos de idade a prescrição será contada pela metade Essa regra em nada foi alterada pelo Código Civil em vigor 1 por se tratar de norma favorável ao réu deveria ter sido revogada expressamente em face da inadmissibilidade no Direito Penal da analogia in malam partem e 2 os dispositivos penais foram expressamente preservados pelo art 2043 do Código Civil Anotese não ser imprescindível para comprovação da menoridade a juntada aos autos de certidão de nascimento o que pode ser feito por qualquer documento apto Nos moldes da Súmula 74 do Superior Tribunal de Justiça Para efeitos penais o reconhecimento da menoridade do réu requer prova por documento hábil22 Para a senilidade por sua vez a idade de 70 anos deve ser aferida ao tempo da sentença pouco importando a data da prática do fato23 Assim se o réu pratica um crime com 68 mas somente é condenado aos 71 anos de idade o prazo da prescrição será reduzido pela metade Nesse contexto o Supremo Tribunal Federal decidiu que a palavra sentença deve ser interpretada em sentido amplo para englobar também o acórdão quando a tiver o agente sido julgado diretamente por um colegiado b houver reforma da sentença absolutória em julgamento de recurso para condenar o réu e c ocorrer a substituição do decreto condenatório em sede de recurso no qual reformada parcialmente a sentença24 Em regra o Supremo Tribunal Federal não admite a redução da prescrição da pretensão punitiva pela metade quando o condenado completa 70 setenta anos de idade após a prolação da sentença condenatória A prescrição da pretensão punitiva de condenado com mais de 70 anos se consuma com a prolação da sentença e não com o trânsito em julgado conforme estatui o art 115 do CP Art 115 São reduzidos de metade os prazos de prescrição quando o criminoso era ao tempo do crime menor de 21 vinte e um anos ou na data da sentença maior de 70 setenta anos Com base nesse entendimento a Primeira Turma denegou a ordem de habeas corpus em que se discutia a extinção da punibilidade de paciente que completara 70 anos após a sentença condenatória porém antes do trânsito em julgado25 O Plenário da Suprema Corte contudo já aceitou a diminuição da prescrição pela metade quando a idade de 70 anos vem a ser atingida depois do julgamento desde que na data do aniversário do acusado a condenação ainda não tenha transitado em julgado Vale a pena acompanhar o teor do julgado Ao tecer considerações sobre a outra tese formulada nos embargos o Ministro Luiz Fux aduziu a ocorrência da prescrição da pretensão punitiva na modalidade retroativa em face da redução decorrente da idade avançada CP Art 115 São reduzidos de metade os prazos de prescrição quando o criminoso era ao tempo do crime menor de 21 vinte e um anos ou na data da sentença maior de 70 setenta anos Pontuou que o acusado completara 70 anos no dia seguinte à sessão do julgamento e que o art 115 do CP deveria ser interpretado à luz da irrecorribilidade do título penal condenatório e não da data do pronunciamento judicial Realçou ainda que houvera recurso apenas da defesa O Ministro Marco Aurélio acentuou que incidiria o prazo pela metade pois o Código Penal ao versar a matéria não se referiria a sentença ou acórdão condenatórios simplesmente prolatados mas recorríveis CP Art 117 O curso da prescrição interrompese IV pela publicação da sentença ou acórdão condenatórios recorríveis Avaliou que na espécie ele teria atingido a idade antes da publicação do acórdão Por sua vez o Ministro Dias Toffoli indicou que a publicação da mencionada decisão colegiada darseia na sessão de julgamento mas o acusado ao completar 70 anos antes do trânsito em julgado do acórdão teria jus ao benefício relativo à prescrição da pretensão punitiva O Ministro Ricardo Lewandowski ao reduzir pela metade o prazo também assentou a prescrição O Ministro Celso de Mello assinalou ser possível reconhecer a incidência da norma do art 115 do CP quando o condenado completasse 70 anos após a sessão pública de julgamento mas opusesse embargos de declaração reputados admissíveis nos quais se buscasse infringir a decisão de modo processualmente legítimo como no caso26 Finalmente o Supremo Tribunal Federal firmou jurisprudência no sentido de que o Estatuto do Idoso Lei 107412003 ao conferir especial proteção às pessoas com idade igual ou superior a 60 anos não derrogou o art 115 do Código Penal ao fundamento de ser completa a norma do Código Penal não remetendo à disciplina legal do que se entende por idoso mas fixando os 70 anos como capazes de levar à diminuição do prazo prescricional27 Em síntese a redução da prescrição da pretensão punitiva pela metade somente ocorre quando o acusado era maior de 70 anos e não de 60 anos ao tempo da sentença condenatória ou do acórdão condenatório c 3ª fase Causas de aumento e de diminuição da pena As causas de aumento e de diminuição da pena estão delineadas na Parte Geral genéricas e na Parte Especial específicas do Código Penal Aumentam e diminuem a pena em quantidade fixa exemplo CP art 155 1º aumentase de um terço ou variável exemplos CP art 14 parágrafo único diminuída de um a dois terços e art 70 caput aumentada em qualquer caso de um sexto até metade Como as causas de aumento podem levar a pena acima do limite máximo legal e as causas de diminuição têm o condão de reduzila abaixo do piso mínimo influem no cálculo da prescrição ao contrário do que ocorre com as circunstâncias judiciais e com as agravantes e atenuantes genéricas E aqui aplicase o raciocínio inicialmente formulado no item 461012 Nas causas de aumento da pena de quantidade variável incide o percentual de maior elevação Exemplo no crime de roubo circunstanciado com a pena aumentada em razão do concurso de pessoas CP art 157 2º II a exasperação é de 13 um terço até metade A pena do roubo é de 4 quatro a 10 dez anos O aumento máximo de 12 metade A prescrição da pretensão punitiva propriamente dita ou prescrição da ação penal deve ser calculada sobre a pena de 15 quinze anos a qual resulta da pena máxima do roubo 10 anos elevada da metade maior causa de aumento da pena De fato a pena pode chegar aos 15 anos razão pela qual seria equivocado retirar do Estado seu direito de punir antes de a ele permitir seu pleno exercício Por outro lado nas causas de diminuição da pena de quantidade variável utilizase o percentual de menor redução Exemplo na tentativa CP art 14 parágrafo único aplicase a pena do crime consumado reduzida de 1 um a 23 dois terços A título ilustrativo a pena do peculato apropriação CP art 312 caput 1ª parte é de 2 dois a 12 doze anos Em caso de tentativa deve ser obrigatoriamente diminuída de 13 um terço a 23 dois terços O cálculo prescricional de uma tentativa de peculato apropriação CP art 312 caput 1ª parte cc o art 14 II seria o seguinte 12 anos pena máxima do crime menos 13 causa de menor diminuição Logo a prescrição deveria ser computada sobre uma pena de 8 oito anos Com efeito as causas de diminuição da pena reduzem obrigatoriamente a pena Em síntese a pena será necessariamente reduzida restando ao juiz por ocasião da sentença definir o percentual adequado Essa conclusão se coaduna com o raciocínio já formulado item 461012 A pena até pode ser reduzida no máximo mas não há certeza disso Destarte seria errado retirar do Estado seu direito de punir com base na diminuição mais elevada quando no caso concreto a redução da pena pode se concretizar em percentual diverso Finalmente se estiverem presentes simultaneamente causas de aumento e de diminuição da pena ambas em quantidades variáveis o magistrado deve calcular a prescrição da pretensão punitiva propriamente dita com base na pena máxima cominada ao delito acrescida da causa que mais aumenta subtraindo em seguida o percentual da causa que menos diminui O quadro esquemático a seguir sintetiza a matéria Encontrase regulado pelo art 111 do Código Penal Art 111 A prescrição antes de transitar em julgado a sentença final começa a correr I do dia em que o crime se consumou II no caso de tentativa do dia em que cessou a atividade criminosa III nos crimes permanentes do dia em que cessou a permanência IV nos de bigamia e nos de falsificação ou alteração de assentamento do registro civil da data em que o fato se tornou conhecido V nos crimes contra a dignidade sexual de crianças e adolescentes previstos neste Código ou em legislação especial da data em que a vítima completar 18 dezoito anos salvo se a esse tempo já houver sido proposta a ação penal a Regra geral inciso I A normalidade é a fluência do prazo da prescrição da pretensão punitiva a partir da data em que o crime se consumou Nos crimes materiais iniciase com a produção do resultado naturalístico enquanto nos crimes formais e nos de mera conduta operase a partir da prática da conduta criminosa Em relação ao tempo do crime o art 4º do Código Penal acolheu a teoria da atividade Todavia no tocante à prescrição adotouse a teoria do resultado pois o que importa é o dia da consumação Se o caso concreto acarretar em dúvida insolúvel resolvese a questão em prol do réu considerando como data da consumação a mais remota em que a prescrição terá se iniciado há mais tempo Exemplo encontrase um feto já em estado de putrefação e descobrese ter sido praticado por determinada mulher um aborto criminoso A perícia conclui ter o delito ocorrido entre os meses de janeiro e setembro de um dado ano sem especificar a data Deve ser considerado como início do prazo prescricional o dia 1º de janeiro b Exceções incisos II a IV As exceções foram taxativamente previstas em lei Não se admite a analogia contrária ao réu uma vez que o início tardio da prescrição seria a ele prejudicial por dificultar a extinção da punibilidade b1 Tentativa inciso II A prescrição tem início no dia em que cessou a atividade criminosa isto é no dia em que foi praticado o último ato de execução b2 Crimes permanentes inciso III Crimes permanentes são aqueles em que a consumação se prolonga no tempo por vontade do agente É o caso do crime de extorsão mediante sequestro CP art 159 no qual a situação ilícita se arrasta enquanto a vítima é mantida privada da sua liberdade Nesses delitos enquanto não encerrada a permanência é dizer enquanto não cessada a consumação não se inicia o trâmite do prazo prescricional O fundamento dessa exceção é simples a consumação se prolonga no tempo somente se aperfeiçoando com o fim da permanência Em suma o crime continua se consumando A propósito no sequestro CP art 148 de índole permanente o Supremo Tribunal Federal já decidiu que tal delito não prescreve enquanto não for encontrada a pessoa ou o corpo28 b21 Crimes habituais São crimes habituais os que se compõem da reiteração de diversos atos isoladamente considerados irrelevantes perante o Direito Penal É o caso do exercício ilegal da medicina CP art 282 em que não basta a prática de um ato privativo de médico mas que essa postura se revele como o estilo de vida do agente Nesses crimes o prazo prescricional iniciase a partir da data da última das ações que constituem o fato típico Não há diversos delitos mas um crime único que atinge a consumação apenas com o último ato executório Exemplo no exercício ilegal da medicina flui a prescrição a partir da última prática ilegal de ato privativo de médico a derradeira consulta exemplificativamente e não em relação a cada ato individualmente analisado cada consulta por exemplo29 b3 Crimes de bigamia e de falsificação ou alteração de assentamento do registro civil inciso IV Nesses crimes a prescrição começa a correr a partir da data em que o fato se tornar conhecido O conhecimento do fato exigido pela lei referese à autoridade pública que tenha poderes para apurar processar ou punir o responsável pelo delito aí se incluindo o Delegado de Polícia o membro do Ministério Público e o órgão do Poder Judiciário30 Prevalece o entendimento de que não é necessária a ciência formal do crime notícia do delito perante o Poder Público bastando a de cunho presumido relativa à notoriedade do fato b4 Crimes contra a dignidade sexual de crianças e adolescentes inciso V A Lei 126502012 também conhecida como Lei Joanna Maranhão31 acrescentou o inc V ao art 111 do Código Penal com a seguinte redação nos crimes contra a dignidade sexual de crianças e adolescentes previstos neste Código ou em legislação especial da data em que a vítima completar 18 dezoito anos salvo se a esse tempo já houver sido proposta a ação penal Criouse mais uma exceção à regra segundo a qual a prescrição da pretensão punitiva tem como termo inicial a data da consumação do delito Esta hipótese é aplicável a todos os crimes contra a dignidade sexual previstos no Código Penal ou em leis especiais contra vítimas menores de 18 anos ou seja crianças ou adolescentes O fundamento da inovação legislativa é simples e louvável Com efeito lamentavelmente a ampla maioria dos crimes sexuais envolvendo vítimas menores de 18 anos ocorre no ambiente doméstico e seus autores são justamente aqueles que deveriam zelar pelo desenvolvimento das crianças e dos adolescentes pais padrastos avós parentes em geral e pessoas com alguma relação de afinidade Contudo poderia surgir como de fato tem surgido a seguinte crítica tais delitos são de ação penal pública incondicionada CP art 225 razão pela qual a autoridade policial e o Ministério Público poderiam e deveriam iniciar a persecução penal de ofício é dizer independentemente de autorização da vítima ou do seu representante legal É verdade Entretanto os crimes desta natureza normalmente ficam em sigilo restritos ao palco em que ocorreram As vítimas por medo ingenuidade ou até mesmo pela falta de acesso aos órgãos públicos não levam os fatos ao conhecimento das autoridades competentes Como se sabe abusos sexuais em crianças e adolescentes são tristes memórias que jamais se apagam Os traumas psicológicos nunca são superados Independentemente do decurso do tempo as vidas das vítimas ficam eternamente marcadas por frestas instaladas no porão das lembranças horríveis de um drama cujo algoz em geral estava dentro da própria casa Em razão disso o termo inicial da prescrição da pretensão punitiva iniciarseá na data em que a vítima completar 18 anos salvo se a esse tempo já houver sido proposta a ação penal Ao atingir a maioridade a vítima terá plenas condições para manterse por conta própria encerrando a relação de dependência perante seu agressor ou qualquer outra pessoa que pretenda blindálo com a impunidade De outro lado se a ação penal já tiver sido proposta a prescrição começará a fluir da data da propositura da denúncia ou queixa ação penal privada subsidiária da pública e o Estado estará habilitado para aplicar a sanção adequada com respeito ao devido processo legal A ação penal se considera proposta no dia em que o Ministério Público ou querelante oferece a denúncia ou queixa crime32 De fato se o dispositivo legal versasse sobre o recebimento seria de todo inútil em face da interrupção da prescrição da pretensão punitiva CP art 117 inc I É fácil notar portanto que nas hipóteses alcançadas pelo dispositivo em apreço CP art 111 inc V a prescrição pode ultrapassar o teto de 20 anos previsto no art 109 inc I do Código Penal Pensemos em um estupro de vulnerável CP art 217A praticado contra criança de cinco anos de idade A pena máxima deste delito 15 anos prescreve em 20 anos Se a denúncia não for ajuizada até a data da sua maioridade terão transcorridos 13 anos e a partir do seu 18º aniversário o Estado contará com mais 20 anos para a imposição da pena privativa de liberdade Em síntese a prescrição ocorrerá em 33 anos E mais Se existir na situação concreta alguma causa impeditiva da prescrição da pretensão punitiva o prazo prescricional não terá início enquanto o impedimento não for superado É o que se dá exemplificativamente na hipótese em que na data do 18º aniversário da vítima o agente encontrarse cumprindo pena no estrangeiro CP art 116 inc II Será preciso aguardar o término da reprimenda para a partir de então iniciarse o decurso da prescrição da pena atinente ao crime contra a dignidade sexual da criança ou do adolescente Se a vítima do crime sexual vier a falecer duas situações devem ser diferenciadas a se a morte ocorrer antes do 18º aniversário a prescrição terá início na data da consumação do delito de natureza sexual regra geral do CP art 111 inc I pois o ofendido jamais alcançará a maioridade Exemplo estupro contra criança de 10 anos que vem a suicidarse cinco anos depois ocasião em que deixa uma carta narrando o crime cometido pelo genitor contra ela e b se a morte ocorrer após o 18º aniversário a prescrição terá se iniciado com o advento da maioridade na forma delineada pelo art 111 inc V do Código Penal Finalmente é importante observar que a regra contida no art 111 inc V do Código Penal incide somente no tocante aos crimes sexuais praticados contra crianças ou adolescentes não se aplicando no âmbito dos demais vulneráveis diversos dos menores de 14 anos elencados pelo parágrafo único do art 217A do Código Penal pessoas com enfermidade ou deficiência mental sem discernimento para o ato ou que por qualquer outra causa não possam oferecer resistência Como regra a Lei 111012005 Lei de Falências estatui em seu art 182 que a prescrição dos crimes nela previstos regerseá pelo Código Penal No tocante ao termo inicial entretanto possui critério diverso o prazo da prescrição começa a correr do dia da decretação da falência da concessão da recuperação judicial ou com a homologação do plano de recuperação extrajudicial Essa disposição somente se aplica à prescrição da pretensão punitiva e jamais à prescrição da pretensão executória que depende do trânsito em julgado da sentença condenatória para ambas as partes do processo penal As hipóteses de interrupção da prescrição da pretensão punitiva foram definidas pelo art 117 I a IV do Código Penal Art 117 O curso da prescrição interrompese I pelo recebimento da denúncia ou da queixa II pela pronúncia III pela decisão confirmatória da pronúncia IV pela publicação da sentença ou acórdão condenatórios recorríveis Os incisos V e VI do art 117 do Código Penal referemse à interrupção da prescrição da pretensão executória Interrupção do prazo significa que verificada a causa legalmente prevista o intervalo temporal volta ao seu início desprezandose o tempo até então ultrapassado Os marcos interruptivos conduzem ao reinício do cálculo É o que consta expressamente do art 117 2º do Código Penal Exemplo se ocorrer uma causa interruptiva relativa a uma pena de 4 quatro anos cuja prescrição se dá em oito anos depois de transcorridos 7 sete anos esse período será desconsiderado e para a extinção da punibilidade exigirseá o decurso de outros 8 oito anos sem a atuação estatal Por se tratar de matéria prejudicial ao réu o rol do art 117 é taxativo não admitindo o emprego da analogia para englobar situações semelhantes não apontadas pela lei Analisemos as causas interruptivas que estabelecem os períodos entre os quais a prescrição pode se efetivar a Recebimento da denúncia ou da queixa Anotese inicialmente que o curso da prescrição da pretensão punitiva é interrompido pelo recebimento da inicial acusatória e não pelo seu oferecimento por parte do Ministério Público ou do querelante A interrupção se dá com a publicação do despacho de recebimento da denúncia ou da queixa Prescindese da veiculação do ato judicial na imprensa oficial ainda que por meio do processo judicial eletrônico Lei 114192007 Basta a publicação do ato em cartório com a entrega do despacho em mãos do escrivão33 A partir da reforma promovida no Código de Processo Penal pela Lei 117192008 o Superior Tribunal de Justiça considera como adequado ao recebimento da denúncia ou queixa o momento previsto no art 396 tão logo oferecida a acusação e antes mesmo da citação do acusado34 Esse recebimento pode ainda ocorrer em 2º grau de jurisdição pois no caso de a denúncia ou queixa ser rejeitada a interrupção ocorrerá na data da sessão de julgamento do recurso em sentido estrito CPP art 581 I ou da apelação Lei 90991995 art 82 caput pelo Tribunal É o que se extrai da Súmula 709 do Supremo Tribunal Federal Salvo quando nula a decisão de primeiro grau o acórdão que provê o recurso contra a rejeição da denúncia vale desde logo pelo recebimento dela A denúncia ou a queixa recebida por juízo absolutamente incompetente não interrompe a prescrição porque esse despacho tem índole de ato decisório aplicandose portanto a regra prevista no art 567 1ª parte do Código de Processo Penal35 A interrupção somente se efetivará com a publicação do despacho do juízo competente ratificando os atos anteriores Por sua vez o recebimento da denúncia ou da queixa por juízo relativamente incompetente interrompe a prescrição Na visão do Superior Tribunal de Justiça Tratandose de incompetência relativa o exame da prescrição da pretensão punitiva deve considerar o recebimento da denúncia realizado pelo Juízo incompetente e não a convalidação posterior do Juízo que detém competência territorial uma vez que este último ato possui natureza declarativa prestandose unicamente a confirmar a validade do primeiro Em outros termos pelo princípio da convalidação o recebimento da denúncia por parte de Juízo territorialmente incompetente tem o condão de interromper o prazo prescricional36 Se o despacho de recebimento da denúncia ou da queixa for posteriormente anulado por qualquer motivo não se interrompe o curso da prescrição pois os atos nulos não produzem efeitos jurídicos O recebimento do aditamento à denúncia ou à queixa não interrompe a prescrição exceto se for acrescentado novo crime quando a interrupção ocorrerá apenas em relação a esse novo delito37 b Pronúncia É a decisão interlocutória mista não terminativa fundada em prova da materialidade do fato delituoso e indícios suficientes de autoria que submete o responsável pela prática de um crime doloso contra a vida a julgamento perante o Tribunal do Júri Consequentemente essa causa de interrupção da prescrição da pretensão punitiva é aplicável somente aos crimes de competência do Tribunal do Júri A interrupção se efetiva com a publicação da sentença de pronúncia que prescinde de publicação na imprensa oficial É suficiente para essa finalidade a publicação da decisão em cartório No caso de o réu ter sido impronunciado interpondose contra a decisão recurso de apelação CPP art 416 ao qual se dá provimento para o fim de pronunciálo a interrupção se dá na data da sessão de julgamento do recurso pelo Tribunal competente E uma vez pronunciado persiste a força interruptiva da prescrição ainda que o Tribunal do Júri no julgamento em plenário desclassifique o crime para outro que não seja de sua competência É o que se extrai da Súmula 191 do Superior Tribunal de Justiça A pronúncia é causa interruptiva da prescrição ainda que o Tribunal do Júri venha a desclassificar o crime c Decisão confirmatória da pronúncia Essa forma de interrupção também é possível apenas nos crimes de competência do Tribunal do Júri e ocorre quando o réu foi pronunciado e contra essa decisão a defesa interpôs recurso em sentido estrito com fundamento no art 581 IV do Código de Processo Penal ao qual foi negado provimento Operase a interrupção na data de sessão de julgamento do recurso pelo Tribunal competente e não na data da publicação do acórdão Essas duas causas interruptivas pronúncia e decisão que a confirma são justificáveis pela amplitude e pela extensão do procedimento dos crimes de competência do Tribunal do Júri fatores que poderiam fomentar artimanhas processuais que levariam à impunidade pela prescrição d Publicação da sentença ou acórdão condenatórios recorríveis No caso da sentença condenatória a interrupção se opera com sua publicação isto é com sua entrega em mãos do escrivão que lavrará nos autos o respectivo termo registrandoa em livro especialmente destinado a esse fim CPP art 389 No tocante ao acórdão condenatório a interrupção se dá com a sessão de julgamento pelo Tribunal competente seja em grau de recurso da acusação seja nas hipóteses de sua competência originária38 Em relação a acórdão em sede recursal cumpre salientar que somente se pode taxálo de condenatório quando a sentença de 1ª instância foi absolutória E aqui surge uma importante pergunta O acórdão confirmatório da condenação funciona como causa interruptiva da prescrição da pretensão punitiva A jurisprudência atual do Supremo Tribunal Federal entende que sim A ideia de prescrição está vinculada à inércia estatal e o acórdão que confirma a sentença condenatória justamente por revelar pleno exercício da jurisdição penal é marco interruptivo do prazo prescricional nos termos do art 117 IV do Código Penal Acrescentese que a decisão proferida pelo Tribunal em sede de apelação substitui a sentença recorrida consoante reiteradamente proclamado em nossa legislação processual art 825 do CPC1939 art 512 do CPC1973 art 1008 do CPC2015 Entendimento firmado à unanimidade pela Primeira Turma39 O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento diverso Nos termos da jurisprudência desta Corte Superior o acórdão que confirma a condenação ainda que majore a pena não constitui marco interruptivo da prescrição40 Se todavia a sentença condenatória foi reformada pelo Tribunal em grau de apelação absolvendo o réu mantémse a interrupção provocada pela publicação da decisão de 1ª instância A sentença anulada não interrompe a prescrição pois repitase um ato nulo não produz efeitos jurídicos O acórdão proferido nas ações penais de competência originária do Supremo Tribunal Federal CF art 102 I b e c nas hipóteses em que não comporta mais nenhum recurso não interrompe a prescrição pois é irrecorrível Finalmente a sentença que aplica medida de segurança pode ou não interromper a prescrição Não interrompe quando impõe medida de segurança ao inimputável pois nesse caso tem natureza absolutória absolvição imprópria Interrompe contudo na hipótese de medida de segurança dirigida ao semiimputável já que a sentença é condenatória o magistrado condena o réu diminui a pena privativa de liberdade de 1 um a 23 dois terços e comprovada sua periculosidade substitui a pena diminuída por medida de segurança Para o art 117 1º do Código Penal 1º Excetuados os casos dos incisos V e VI deste artigo a interrupção da prescrição produz efeitos relativamente a todos os autores do crime Nos crimes conexos que sejam objeto do mesmo processo estendese aos demais a interrupção relativa a qualquer deles A previsão expressa da exceção relativa aos incisos V e VI se fundamenta na circunstância de se tratarem de causas de interrupção da prescrição da pretensão executória O dispositivo legal apresenta duas regras distintas comunicabilidade no concurso de pessoas e comunicabilidade nos crimes conexos que sejam objeto do mesmo processo a Concurso de pessoas Dispõe o texto de lei que a interrupção da prescrição produz efeitos relativamente a todos os autores do crime A palavra autores foi utilizada pelo Código Penal como gênero para englobar tanto coautores como partícipes do crime Fundamentase essa regra no fato de que quando o Estado exerce a persecução relativamente a um dos envolvidos no crime revelou o seu interesse em também efetivála em relação a todos os demais Exemplo A e B são regularmente processados pelo crime de roubo Aquele é condenado e este absolvido O Ministério Público interpõe recurso de apelação objetivando a reforma da sentença somente em relação a B para condenálo Pela regra do art 117 1º 1ª parte do Código Penal o Tribunal deverá considerar a prescrição interrompida para B diante da sentença condenatória recorrível proferida contra A Essa sistemática também se aplica a todas as demais causas interruptivas da prescrição da pretensão punitiva recebimento da denúncia ou queixa pronúncia decisão confirmatória da pronúncia e acórdão condenatório recorrível b Crimes conexos que sejam objeto do mesmo processo Crimes conexos são aqueles que possuem alguma ligação entre si Quando tais crimes forem objeto do mesmo processo digase da mesma ação penal ou seja forem imputados ao réu na mesma denúncia ou na mesma queixa crime a interrupção relativa a qualquer deles estende os seus efeitos aos demais Exemplo A pratica três crimes roubo furto e tráfico de drogas Os delitos são investigados em um único inquérito policial ensejando o oferecimento de denúncia por todos eles Após regular processamento A é condenado pelo roubo e absolvido pelos demais delitos O Ministério Público apela almejando a reforma da sentença na parte relativa às absolvições para o fim de condenar o réu por todos os crimes Pela regra contida no art 117 1º in fine do Código Penal a sentença condenatória recorrível proferida em relação ao roubo interrompe a prescrição desse crime estendendose esse efeito também ao furto e ao tráfico de drogas41 Essa disposição aplicase ainda às demais causas interruptivas da prescrição da pretensão punitiva recebimento da denúncia ou queixa pronúncia decisão confirmatória da pronúncia e publicação do acórdão condenatório recorrível Estatui o art 182 parágrafo único da Lei 111012005 Lei de Falências A decretação da falência do devedor interrompe a prescrição cuja contagem tenha iniciado com a concessão da recuperação judicial ou com a homologação do plano de recuperação extrajudicial As causas impeditivas da prescrição estão disciplinadas pelo art 116 I e II do Código Penal Art 116 Antes de passar em julgado a sentença final a prescrição não corre I enquanto não resolvida em outro processo questão de que dependa o reconhecimento da existência do crime II enquanto o agente cumpre pena no estrangeiro Nada obstante o Código Penal fale em causas impeditivas essas regras se aplicam ao impedimento e à suspensão da prescrição Impedimento é o acontecimento que obsta o início do curso da prescrição De seu turno na suspensão esse acontecimento desponta durante o trâmite do prazo prescricional travando momentaneamente a sua fluência Superado esse entrave a prescrição volta a correr normalmente nela se computando o período anterior Analisemos cada uma das hipóteses indicadas pelo Código Penal Inciso I Enquanto não resolvida em outro processo questão de que dependa o reconhecimento da existência do crime Tratase da questão prejudicial ainda não resolvida em outro processo Questão prejudicial é a que influencia na tipicidade da conduta é dizer aquela cuja solução é fundamental para a existência do crime e consequentemente para o julgamento do mérito da ação penal As questões prejudiciais estão previstas nos arts 92 relativas ao estado civil das pessoas e 93 relativas a questões diversas do Código de Processo Penal O juiz criminal geralmente possui jurisdição para decidir qualquer questão salvo a inerente ao estado civil das pessoas caso em que a ação a penal será obrigatoriamente suspensa até o trânsito em julgado da sentença proferida na ação civil CPP art 92 Destarte o termo inicial da suspensão da prescrição é o despacho que suspende a ação penal e o termo final é o despacho que determina a retomada do seu trâmite O exemplo clássico é o do agente processado por bigamia que no juízo cível busca a anulação de um dos casamentos Se obtiver sucesso não haverá o crime tipificado pelo art 235 do Código Penal Em relação às questões prejudiciais diversas ou seja não atinentes ao estado civil das pessoas CPP art 93 a suspensão da ação penal é facultativa mas se o juiz por ela optar também estará suspensa a prescrição Inciso II Enquanto o agente cumpre pena no estrangeiro Justificase essa causa impeditiva porque normalmente não se consegue a extradição de pessoa que cumpre pena no exterior Em respeito à soberania do outro país aguardase a integral satisfação da sanção penal no estrangeiro para posteriormente ser o agente punido no Brasil Em se tratando de matéria prejudicial ao réu por dificultar a ocorrência da extinção da punibilidade a enumeração das causas suspensivas e interruptivas é taxativa não comportando aplicação analógica Dessa forma é importante ressaltar que a instauração de incidente de insanidade mental versado pelo art 149 do Código de Processo Penal não suspende a prescrição da pretensão punitiva por falta de amparo legal A previsão de causas impeditivas e suspensivas da prescrição da pretensão punitiva não se restringe ao Código Penal podendo ser encontradas nos seguintes diplomas legais Art 89 6º da Lei 90991995 Suspensão condicional do processo nos crimes com pena mínima igual ou inferior a 1 ano em b c d e f que também se opera a suspensão da prescrição Art 366 do CPP Quando o réu citado por edital não comparecer ao interrogatório nem constituir defensor suspendese o processo e a prescrição Art 368 do CPP Estando o acusado no estrangeiro em lugar sabido será citado mediante carta rogatória suspendendose o curso da prescrição até o seu cumprimento Art 53 5º da Constituição Federal A sustação pela Câmara dos Deputados ou pelo Senado Federal dos processos criminais contra Deputado Federal ou Senador suspende a prescrição enquanto durar o mandato Com a modificação introduzida pela EC 352001 o Supremo Tribunal Federal pode receber a denúncia sem licença prévia da Casa respectiva No entanto deve comunicála à Câmara dos Deputados ou ao Senado Federal conforme o caso podendo o Poder Legislativo por iniciativa de partido político nele representado e pelo voto da maioria absoluta de seus membros sustar o andamento da ação suspendendose automaticamente o curso da prescrição Acordo de leniência nos crimes contra a ordem econômica Na forma do art 87 da Lei 125292012 Art 87 Nos crimes contra a ordem econômica tipificados na Lei 8137 de 27 de dezembro de 1990 e nos demais crimes diretamente relacionados à prática de cartel tais como os tipificados na Lei 8666 de 21 de junho de 1993 e os tipificados no art 288 do DecretoLei 2848 de 7 de dezembro de 1940 Código Penal a celebração de acordo de leniência nos termos desta Lei determina a suspensão do curso do prazo prescricional e impede o oferecimento da denúncia com relação ao agente beneficiário da leniência Crimes contra a ordem tributária Nesses delitos a suspensão da prescrição pode ocorrer em diversas hipóteses entre elas a do parcelamento do débito tributário que importa na suspensão da a b c prescrição da pretensão punitiva com fundamento no art 83 2º e 3º da Lei 94301996 com a redação que lhe foi conferida pela Lei 123822011 Para o Supremo Tribunal Federal nos crimes materiais contra a ordem tributária Lei 81371990 art 1º o lançamento do tributo pendente de decisão definitiva do processo administrativo importa na falta de justa causa para a ação penal suspendendo porém o curso da prescrição enquanto obstada a sua propositura pela falta do lançamento definitivo42 Para o Supremo Tribunal Federal a suspensão processual prevista no art 1035 5º do Código de Processo Civil Reconhecida a repercussão geral o relator no Supremo Tribunal Federal determinará a suspensão do processamento de todos os processos pendentes individuais ou coletivos que versem sobre a questão e tramitem no território nacional produz efeitos nos processos penais cuja matéria tenha sido objeto de repercussão geral reconhecida pela Corte Destarte enquanto não julgado o recurso extraordinário paradigma é possível a suspensão da prescrição da pretensão punitiva de crimes ou contravenções penais objeto das ações penais sobrestadas com as seguintes características fundamentais a suspensão de processamento prevista no 5º do art 1035 do CPC não consiste em consequência automática e necessária do reconhecimento da repercussão geral realizada com fulcro no caput do mesmo dispositivo sendo da discricionariedade do relator do recurso extraordinário paradigma determinála ou modulála a possibilidade de sobrestamento se aplica aos processos de natureza penal nesse contexto em sendo determinado o sobrestamento de processos de natureza penal operase automaticamente a suspensão da prescrição da pretensão punitiva relativa aos crimes d e f que forem objeto das ações penais sobrestadas a partir de interpretação conforme a Constituição Federal do art 116 inc I do Código Penal em nenhuma hipótese o sobrestamento de processos penais determinado com fundamento no art 1035 5º do CPC abrangerá inquéritos policiais ou procedimentos investigatórios conduzidos pelo Ministério Público em nenhuma hipótese o sobrestamento de processos penais determinado com fundamento no art 1035 5º do CPC abrangerá ações penais em que haja réu preso provisoriamente em qualquer caso de sobrestamento de ação penal determinado com fundamento no art 1035 5º do CPC poderá o juízo de piso no curso da suspensão proceder conforme a necessidade à produção de provas de natureza urgente Na visão do Supremo Tribunal Federal a suspensão do prazo prescricional para a resolução de questão externa prejudicial ao reconhecimento do crime abrange a hipótese de suspensão do prazo prescricional nos processos criminais com repercussão geral reconhecida Se não bastasse a interpretação conforme a Constituição Federal do art 116 inc I do Código Penal se fundamenta nos princípios da unidade e da concordância prática das normas constitucionais O legislador ao impor a suspensão dos processos sem instituir simultaneamente a suspensão dos prazos prescricionais cria o risco de erigir sistema processual que vulnera a eficácia normativa e a aplicabilidade imediata de princípios constitucionais Além disso o sobrestamento de processo criminal sem previsão legal de suspensão do prazo prescricional impede o exercício da pretensão punitiva pelo Ministério Público e gera desequilíbrio entre as partes Desse modo fere a prerrogativa institucional do parquet e o postulado da paridade de armas violando os princípios do contraditório e do devido processo legal Para a Suprema Corte o princípio da proporcionalidade opera tanto na esfera de proteção contra excessos estatais quanto na proibição de proteção deficiente vertente esta que seria flagrantemente violada pelo obstáculo intransponível à proteção de direitos fundamentais da sociedade de impor sua ordem penal Destacouse que a interpretação conforme a Constituição segundo os limites reconhecidos pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal encontrase preservada A exegese proposta não implica violação à expressão literal do texto infraconstitucional tampouco à vontade do legislador considerando a opção legislativa que fixou todas as hipóteses de suspensão da prescrição da pretensão punitiva previstas no ordenamento jurídico nacional qual seja a superveniência de fato impeditivo da atuação do Estado acusador Aduziu que o sobrestamento de processos penais determinado em razão da adoção da sistemática da repercussão geral não abrangerá inquéritos policiais ou procedimentos investigatórios conduzidos pelo Ministério Público O 5º do art 1035 do CPC prevê apenas a possibilidade de suspensão dos processos pendentes que versarem sobre a questão debatida e tramitarem no território nacional não ostentando os mencionados expedientes de investigação a natureza jurídica de processo e sim de procedimento Acrescentou que o sobrestamento de processos penais determinado em razão da adoção da sistemática da repercussão geral tampouco abrangerá ações penais em que haja réu preso provisoriamente Não se mostra admissível sob pena de ampliação injustificada do período de restrição do direito de liberdade do acusado que a segregação processual perdure enquanto estiver suspenso o curso da marcha processual e do prazo prescricional concernente às infrações penais cogitadas Finalmente registrouse que em qualquer caso de sobrestamento de ação penal determinado com fundamento no art 1035 5º do Código de Processo Civil o juízo de piso poderá a partir de aplicação analógica do disposto no art 92 caput do Código de Processo Penal autorizar no curso da suspensão a produção de provas de natureza urgente43 Em que pese a força desta decisão e a inquestionável utilidade da sua aplicação prática ousamos discordar do Supremo Tribunal Federal por uma razão muito simples a suspensão da prescrição é matéria prejudicial ao acusado pois retarda ou inviabiliza a extinção da punibilidade 46102 Portanto somente lei em sentido formal cuidando expressamente desse tema seria capaz de criar de modo legítimo nova causa suspensiva da prescrição da pretensão punitiva em obediência ao princípio da taxatividade compreendido como fundamento jurídico do princípio da reserva legal CF art 5º inc XXXIX e CP art 1º De fato não se pode utilizar no Direito Penal por analogia in malam partem um dispositivo do Código de Processo Civil para criar embaraço à prescrição As regras estruturantes do sistema penal devem ser preservadas Prescrição superveniente intercorrente ou subsequente É a modalidade de prescrição da pretensão punitiva não há trânsito em julgado para ambas as partes que se verifica entre a publicação da sentença condenatória recorrível44 e seu trânsito em julgado para a defesa45 Daí seu nome superveniente ou seja posterior à sentença Depende do trânsito em julgado para a acusação no tocante à pena imposta seja pela não interposição de recurso seja pelo seu improvimento Portanto é possível falar em prescrição intercorrente ainda que sem trânsito em julgado para a acusação quando tenha recorrido o Ministério Público ou o querelante sem pleitear o aumento da pena exemplo modificação do regime prisional Além disso admitese também a prescrição intercorrente quando o recurso da acusação visa ao aumento da pena mas mesmo com o seu provimento e considerandose a pena imposta pelo Tribunal ainda assim tenha decorrido o prazo prescricional Exemplo a pena do furto simples foi fixada em 1 um ano O Ministério Público recorre requerendo seja a reprimenda elevada para 2 dois anos Ainda que obtenha êxito o prazo da prescrição permanecerá inalterado em 4 quatro anos É calculada com base na pena concreta Nos termos da Súmula 146 do Supremo Tribunal Federal A prescrição da ação penal regulase pela pena concretizada na sentença quando não há recurso da acusação De fato se a sentença condenatória aplicou uma pena ao réu e contra ela não foi interposto recurso ou se o foi negouse provimento o Tribunal não pode agravar a situação do condenado em recurso exclusivo da defesa como determina o art 617 do Código de Processo Penal ao consagrar o princípio da non reformatio in pejus Com efeito a pena imposta na sentença é a mais grave que o réu pode suportar Pode ser mantida diminuída ou mesmo suprimida no julgamento de seu eventual recurso Logo o Estado deve fazer com que seja cumprida no prazo a ela correspondente e não mais levando em conta a pena máxima em abstrato Lembrese do raciocínio formulado no item 461012 Portanto em um crime de furto simples CP art 155 caput a prescrição da pretensão punitiva calculada sobre a pena máxima ocorre em 8 oito anos Se entretanto foi aplicada a pena mínima isto é 1 um ano e a sentença condenatória transitou em julgado para a acusação a prescrição intercorrente será com base nela calculada verificandose em 4 quatro anos A prescrição intercorrente começa a fluir com a publicação da sentença condenatória recorrível embora condicionada ao trânsito em julgado para a acusação Em suma depende do trânsito em julgado para o Ministério Público 1 2 ou para o querelante mas com esse pressuposto seu prazo inicial retroage à data da publicação do decreto condenatório A prescrição superveniente pode ocorrer por dois motivos 1 demora em se intimar o réu da sentença isto é ultrapassase o prazo prescricional e o réu ainda não foi dela intimado CPP art 392 ou 2 demora no julgamento do recurso de defesa ou seja o réu foi intimado recorreu superouse o prazo da prescrição e o Tribunal ainda não apreciou o seu recurso A prescrição superveniente não pode ser decretada na própria sentença condenatória em face da ausência do trânsito em julgado para a acusação ou do improvimento do seu recurso Depois do trânsito em julgado para a acusação seja com o decurso in albis do prazo recursal seja com o improvimento do seu recurso pelo Tribunal há duas posições acerca do momento adequado para o seu reconhecimento Pode ser reconhecida exclusivamente pelo Tribunal pois o magistrado de 1ª instância ao proferir a sentença esgota a sua atividade jurisdicional Essa posição extremamente conservadora é custosa e demorada pois obriga o réu a recorrer somente para que seja decretada a prescrição Pode ser decretada em 1º grau de jurisdição por se tratar de matéria de ordem pública a qual pode ser reconhecida de ofício a qualquer 46103 tempo CPP art 61 caput É o entendimento do Superior Tribunal de Justiça46 Na hipótese em que a pena imposta pela sentença de 1ª instância for reduzida pelo Tribunal a prescrição superveniente entre a sentença e o acórdão deve ser calculada com base na pena aplicada pela sentença condenatória a teor da regra prevista no art 110 1º do Código Penal Esse raciocínio fica ainda mais reforçado com a eventual existência de recurso especial ou extraordinário ajuizado pela acusação contra o acórdão que diminui a reprimenda utilizada como parâmetro para o cômputo prescricional47 Prescrição retroativa Damásio E de Jesus informa ter ocorrido em 12 de junho de 1946 nos autos do HC 29370 rel Min Castro Nunes a pioneira manifestação do Supremo Tribunal Federal sobre o que iria posteriormente se transformar na prescrição retroativa Se o art 109 depois de assentar o princípio de que a prescrição da ação é a que ocorre antes do trânsito em julgado da sentença final admite uma exceção a do parágrafo único do art 110 parece claro que a exceção se refere à prescrição do procedimento penal A razão do dispositivo legal é óbvia se pelo recurso do réu não seria possível uma reformatio in pejus a fixação da pena se torna definitiva como se fora a pena cominada na lei48 A prescrição retroativa espécie da prescrição da pretensão punitiva não há trânsito em julgado da condenação para ambas as partes é calculada pela pena concreta ou seja pela pena aplicada na sentença condenatória49 É o que se extrai do art 110 1º do Código Penal50 e também da Súmula 146 do Supremo Tribunal Federal A prescrição da ação penal regulase pela pena concretizada na sentença quando não há recurso da acusação Depende contudo do trânsito em julgado da sentença condenatória51 para a acusação no tocante à pena imposta seja pela não interposição do recurso cabível no prazo legal seja pelo fato de ter sido improvido seu recurso Se a sentença condenatória aplicou determinada pena ao réu contra a qual não foi interposto recurso ou se o foi negouse provimento a instância superior não pode agravar a situação do condenado em recurso exclusivo da defesa como determina o art 617 do Código de Processo Penal ao consagrar o princípio da non reformatio in pejus Assim sendo a pena concretizada na sentença é a mais grave a ser suportada pelo réu pois pode ser mantida diminuída ou mesmo suprimida no julgamento de seu eventual recurso O Estado deve fazer com que a pena seja cumprida no prazo a ela correspondente e não mais levando em conta a pena máxima em abstrato Recordese uma vez mais do raciocínio firmado no item 461012 Portanto em um crime de furto simples CP art 155 caput a prescrição da pretensão punitiva calculada sobre a pena máxima ocorre em 8 oito anos Se entretanto foi aplicada a pena mínima 1 ano e a sentença condenatória transitou em julgado para a acusação a prescrição retroativa será com base nela calculada verificandose em 4 quatro anos A prescrição retroativa começa a correr a partir da publicação da sentença ou acórdão condenatório desde que é evidente haja transitado em julgado para a acusação ou ao seu recurso tenha sido negado provimento a b c Justificase seu nome retroativa pelo fato de ser contada da sentença ou acórdão condenatórios para trás Desta forma no campo dos crimes em geral a prescrição retroativa pode ocorrer entre a publicação da sentença ou acórdão condenatórios e o recebimento da denúncia ou queixa Já nos crimes de competência do Tribunal do Júri a prescrição retroativa pode se verificar entre a publicação da sentença ou acórdão condenatório52 e a decisão confirmatória da pronúncia entre a decisão confirmatória da pronúncia e a pronúncia entre a pronúncia e o recebimento da denúncia ou queixa A Lei 122342010 responsável pela atual redação do art 110 do Código Penal promoveu diversas modificações no âmbito da prescrição notadamente na seara da prescrição retroativa Sua finalidade precípua a teor do seu art 1º consistia na eliminação da prescrição retroativa Aliás esta espécie de prescrição é criação genuinamente brasileira introduzida em nosso Direito Penal na década de 1960 por diversos julgados que culminaram na edição da Súmula 146 do Supremo Tribunal Federal e posteriormente sacramentada no revogado 2º do art 110 do Código Penal nos moldes da redação conferida pela Reforma da Parte Geral do Código Penal pela Lei 7209198453 Entretanto seja por ausência de técnica legislativa seja por manobra de bastidores54 não se operou a total eliminação da prescrição retroativa como pretendia o art 1º da Lei 122342010 De fato o art 110 1º e único do Código Penal passou a apresentar a seguinte redação 1º A prescrição depois da sentença condenatória com trânsito em julgado para a acusação ou depois de improvido seu recurso regulase pela pena aplicada não podendo em nenhuma hipótese ter por termo inicial data anterior à da denúncia ou queixa Notase facilmente a sobrevivência da prescrição retroativa na fase processual ou seja após o oferecimento da denúncia ou queixa Mas não se pode reconhecer a prescrição retroativa na fase investigatória isto é no período compreendido entre a data do fato e o oferecimento da inicial acusatória Em síntese a Lei 122342010 promoveu a extinção parcial da prescrição retroativa55 Mas qual foi o fundamento desta opção legislativa A investigação criminal desacompanhada de acusação formal e de cunho extraprocessual não é processo e sim procedimento comporta dilação temporal mais ampla orientada somente pelo máximo da pena privativa de liberdade em abstrato Com efeito não há falar em imprescritibilidade penal no período anterior ao recebimento da denúncia ou queixa pois continua a incidir normalmente a prescrição da pretensão punitiva propriamente dita prescrição da ação como castigo à inércia estatal Por essa razão não há espaço para a prescrição retroativa na fase investigatória De seu turno com o oferecimento da denúncia ou queixa tem início a ação penal impondose um ônus ao imputado em face da acusação formal contra ele endereçada A lentidão em seu trâmite ofende um direito fundamental consistente na razoável duração do processo CF art 5º LXXVIII e é sancionada com a prescrição retroativa A nova redação do 1º do art 110 do Código Penal poderia ter sido mais precisa Com efeito ao invés de falar em data anterior ao recebimento da denúncia ou queixa como fez o art 117 I do Código Penal falou em data anterior à denúncia ou queixa o que autoriza a conclusão no sentido de referirse ao oferecimento ou seja ao ajuizamento da denúncia ou queixa Portanto existem duas datas importantes relacionadas à prescrição a a do oferecimento da denúncia ou queixa destinada a impedir a prescrição retroativa em data anterior a esse fato CP art 110 1º in fine e b a do 46104 recebimento da denúncia ou queixa voltada à interrupção do prazo prescricional CP art 117 I A prescrição retroativa jamais pode ser reconhecida na própria sentença condenatória em face da ausência de um pressuposto fundamental o trânsito em julgado para a acusação ou o improvimento do seu recurso Depois do trânsito em julgado para a acusação seja com o decurso in albis do prazo recursal seja com o improvimento do seu recurso pelo Tribunal há duas posições acerca do momento adequado para a decretação da prescrição retroativa 1ª posição Pode ser reconhecida exclusivamente pelo Tribunal pois o magistrado de 1ª instância ao proferir a sentença exaure sua função jurisdicional Essa posição extremamente conservadora é custosa e demorada pois obriga o réu a recorrer somente para que seja decretada a prescrição 2ª posição Pode ser decretada em 1º grau de jurisdição pelo juízo sentenciante ou pelo juízo da execução por se tratar de matéria de ordem pública a qual pode ser reconhecida de ofício a qualquer tempo CPP art 61 caput É a posição consagrada no Superior Tribunal de Justiça56 Prescrição da pretensão executória ou prescrição da condenação É a perda em razão da omissão do Estado durante determinado prazo legalmente previsto do direito e do dever de executar uma sanção penal definitivamente aplicada pelo Poder Judiciário A prescrição da pretensão executória da pena privativa de liberdade é calculada com base na pena concreta fixada na sentença ou no acórdão pois já existe trânsito em julgado da condenação para a acusação e para a defesa É o que consta da Súmula 604 do Supremo Tribunal Federal A prescrição pela pena em concreto é somente da pretensão executória da pena privativa de liberdade Em consonância com o raciocínio esposado no item 461012 o Estado não tem mais a expectativa de aplicação da pena máxima em abstrato pois o seu limite para execução é o da pena definitiva Deve portanto exercer o direito de punir dentro do prazo correlato à pena concreta pois depois não mais poderá fazêlo Na hipótese de reincidência devidamente reconhecida na sentença ou no acórdão o prazo prescricional aumentase de um terço CP art 110 caput Esse aumento é aplicável exclusivamente à prescrição da pretensão executória A propósito estabelece a Súmula 220 do Superior Tribunal de Justiça A reincidência não influi no prazo da prescrição da pretensão punitiva E na forma do art 113 do Código Penal No caso de evadirse o condenado ou de revogarse o livramento condicional a prescrição é regulada pelo tempo que resta da pena Esse dispositivo consagra o princípio penal segundo o qual pena cumprida é pena extinta57 Com efeito se o condenado já cumpriu parte do débito correspondente à infração penal por ele cometida o Estado não tem mais o poder de executála Por conseguinte esse período não pode ser computado no cálculo prescricional Estatui o art 112 do Código Penal Art 112 No caso do art 110 deste Código a prescrição começa a correr I do dia em que transita em julgado a sentença condenatória para a acusação ou a que revoga a suspensão condicional da pena ou o livramento condicional II do dia em que se interrompe a execução salvo quando o tempo da interrupção deva computarse na pena Esse dispositivo consagra três critérios dois no inciso I e outro no inciso II Vejamos 1º critério Do dia em que transita em julgado a sentença condenatória para a acusação Essa regra se afigura contraditória mas é extremamente favorável ao réu De fato a prescrição da pretensão executória depende do trânsito em julgado para ambas as partes mas a partir do momento em que isso ocorre seu termo inicial retroage ao trânsito em julgado para a acusação É o que se infere do art 112 I 1ª parte do Código Penal Na visão do Superior Tribunal de Justiça A possibilidade de ocorrência da prescrição da pretensão executória surge somente com o trânsito em julgado da condenação para ambas as partes Isso porque o título penal executório surge a partir da sentença condenatória definitiva isto é com o trânsito em julgado para acusação e defesa quando também surgirá a possibilidade de ocorrência da prescrição executória Antes do trânsito em julgado para ambas as partes eventual prescrição será da pretensão punitiva Todavia esse entendimento não altera o termo inicial da contagem do lapso prescricional o qual começa da data em que a condenação transitou em julgado para a acusação conforme dispõe expressamente o art 112 I do CP58 A opção do legislador foi infeliz Para ilustrar nosso raciocínio pensemos em um exemplo Após o regular trâmite da ação penal a sentença condenatória aplica a pena de um ano de reclusão A acusação não apela daí sobrevindo para ela o trânsito em julgado da condenação A defesa contudo interpõe recurso de apelação o qual demora três anos para ser julgado Diante do seu caráter meramente protelatório o Tribunal nega provimento ao recurso e a sentença condenatória transita em julgado para a defesa A partir desse momento é viável o reconhecimento da prescrição da pretensão executória Como seu início retroage à data do trânsito em julgado para a acusação estará faltando somente um ano para a extinção da punibilidade uma vez que já se passaram 3 anos desde tal data É fácil notar portanto que o legislador criou um sistema destinado a favorecer o acusado inclusive com o estímulo à impunidade De fato não há coerência em condicionar a prescrição da pretensão executória ao trânsito em julgado para ambas as partes do processo penal e com o seu advento retroagir o termo inicial à data do trânsito em julgado para a acusação Como já decidido pelo Supremo Tribunal Federal O entendimento defensivo de que a prescrição da pretensão executória se inicia com o trânsito em julgado para a acusação viola o direito fundamental à inafastabilidade da jurisdição que pressupõe a existência de uma tutela jurisdicional efetiva ou melhor uma justiça efetiva A verificação em concreto de manobras procrastinatórias como sucessiva oposição de embargos de declaração e a renúncia do recorrente ao cargo de prefeito que ocupava apenas reforça a ideia de que é absolutamente desarrazoada a tese de que o início da contagem do prazo prescricional deve se dar a partir do trânsito em julgado para a acusação Em verdade tal entendimento apenas fomenta a interposição de recursos com fim meramente procrastinatório frustrando a efetividade da jurisdição penal59 Em que pese nosso inconformismo amparado inclusive em julgado do Supremo Tribunal Federal é preciso reconhecer que o criticado termo inicial da prescrição da pretensão executória favorável ao réu somente poderá ser alterado pelo legislador sob pena de caracterização da analogia in malam partem em face do teor do art 112 I 1ª parte do Código Penal 2º critério Do dia da revogação da suspensão condicional da pena ou do livramento condicional Com a revogação do sursis ou do livramento condicional o juiz determina a b a prisão do condenado A partir de então o Estado tem um prazo legalmente previsto para executar a pena imposta CP art 112 I in fine Recordese que com a revogação do sursis o condenado deverá cumprir integralmente a pena que lhe foi aplicada e com base nela será calculada a prescrição da pretensão executória Já em relação ao livramento condicional a revogação pode considerar ou não o tempo em que esteve solto o condenado CP art 88 É com amparo na pena total ou em seu restante que deverá ser aferida a prescrição da pretensão executória 3º critério Do dia em que se interrompe a execução salvo quando o tempo da interrupção deva computarse na pena Esse critério previsto no art 112 II do Código Penal abrange as seguintes situações Fuga do condenado no regime fechado ou semiaberto abandono do regime aberto ou descumprimento das penas restritivas de direitos a prescrição começa a correr a partir da data da evasão do abandono ou do descumprimento calculandose em conformidade com o restante da pena Lembrese pena cumprida é pena extinta Superveniência de doença mental disciplinada pelo art 41 do Código Penal Interrompese a execução mas esse período de interrupção é computado como cumprimento da pena pois o condenado foi acometido de doença mental necessitando de transferência para hospital de custódia e tratamento psiquiátrico ou à falta a outro estabelecimento adequado As causas de interrupção da prescrição da pretensão executória estão previstas no art 117 V e VI do Código Penal Art 117 O curso da prescrição interrompese V pelo início ou continuação do cumprimento da pena VI pela reincidência Existem pois três causas interruptivas da prescrição da pretensão executória Passemos à análise 1ª causa Início do cumprimento da pena Com a condenação ordenase o início do cumprimento da pena e quando isso efetivamente ocorre interrompese a prescrição da pretensão executória 2ª causa Continuação do cumprimento da pena O cumprimento da pena foi interrompido normalmente pela fuga ou ainda por outro motivo que possa se apresentar Quando o condenado é recapturado interrompese novamente o prazo prescricional 3ª causa Reincidência Nesse ponto é importante adotar redobrada cautela a reincidência antecedente ou seja aquela que já existia por ocasião da condenação aumenta em 13 o prazo da prescrição da pretensão executória enquanto a reincidência subsequente posterior à condenação transitada em julgado interrompe o prazo prescricional já iniciado Operase a interrupção com a prática do crime embora condicionada ao trânsito em julgado da condenação Consoante o ensinamento de Antonio Rodrigues Porto O réu será considerado reincidente quando passar em julgado a condenação pelo segundo crime mas o momento da interrupção da prescrição relativamente à condenação anterior é o dia da prática do novo crime e não a data da respectiva sentença A eficácia desta retroage para esse efeito à data em que se verificou o segundo delito60 Destarte se for absolvido pelo crime posterior não será interrompida a prescrição da pretensão executória Existe contudo posição em sentido contrário como decorrência do princípio da presunção de não culpabilidade CF art 5º LVII a interrupção deve ocorrer somente a partir do trânsito em julgado da condenação pelo segundo crime O art 117 1º 1ª parte do Código Penal impõe expressamente a incomunicabilidade das causas interruptivas da prescrição da pretensão executória Excetuados os casos dos incisos V e VI deste artigo a interrupção da prescrição produz efeitos relativamente a todos os autores do crime Fundamentase essa opção na natureza personalíssima dessas causas interruptivas intransmissíveis aos coautores e partícipes da infração penal De fato alguém iniciou o cumprimento da pena ou continuou a cumprila ou é reincidente e tais situações não são comunicáveis a qualquer outra pessoa Dispõe o art 116 parágrafo único do Código Penal Depois de passada em julgado a sentença condenatória a prescrição não corre durante o tempo em que o condenado está preso por outro motivo Se o Estado ainda não pode exigir do condenado o cumprimento da pena porque ele está preso por outro motivo não seria correto nem justo impossibilitálo de exercer no futuro seu direito de punir Sua omissão não é voluntária mas compulsória61 E em consonância com a orientação do Supremo Tribunal Federal embora o Código Penal não considere de forma explícita a suspensão condicional da pena sursis e o livramento condicional como causas impeditivas da prescrição da pretensão executória esse efeito deflui da lógica do sistema vigente62 46105 Quando o indulto não funciona como causa extintiva da punibilidade limitandose somente a diminuir a pena comutação da pena irradia efeitos sobre o cálculo da prescrição da pretensão executória que agora deve respeitar a nova sanção penal63 Prescrição virtual projetada antecipada prognostical ou retroativa em perspectiva Tratase de construção doutrinária e jurisprudencial Decretase a extinção da punibilidade com fundamento na perspectiva de que mesmo na hipótese de eventual condenação inevitavelmente ocorrerá a prescrição retroativa Vejamos um exemplo A pratica um crime de furto simples CP art 155 caput no dia 10 de outubro de 2008 A vítima comparece à Delegacia de Polícia levando a notitia criminis que resulta na instauração de inquérito policial para apuração do fato O procedimento investigatório é relatado e encaminhado ao Fórum O Ministério Público oferece denúncia que vem a ser recebida em 10 de dezembro de 2008 O trâmite processual entretanto é extremamente lento e a audiência de instrução e julgamento é designada para a data de 20 de novembro de 2015 Nos debates em audiência o membro do Parquet analisando a folha de antecedentes do réu verifica tratarse de pessoa primária e sem antecedentes criminais sendolhe favoráveis as circunstâncias judiciais ou inominadas elencadas no art 59 caput do Código Penal Na hipótese narrada não se operou a prescrição da pretensão punitiva propriamente dita prescrição da ação pois a pena máxima em abstrato do crime de furto simples é de 4 quatro anos e entre a data do recebimento da denúncia e a provável publicação da sentença condenatória recorrível ainda não se passaram 8 oito anos Desse modo o magistrado não teria razões legais para declarar a extinção da punibilidade em face da prescrição CP art 107 IV 1ª figura Todavia o Promotor de Justiça faz o seguinte raciocínio é razoável prosseguir na ação penal ciente de que somente se evitará a prescrição retroativa com a aplicação da pena privativa de liberdade em seu patamar máximo quando a situação real diminuta gravidade do crime e circunstâncias judiciais favoráveis do agente indica caminho contrário De fato somente a pena máxima seria apta a impedir a ocorrência da prescrição retroativa entre o recebimento da denúncia e a publicação da sentença condenatória recorrível e o caso concreto apresenta motivos suficientes para fazer acreditar que a reprimenda se condenado o réu dificilmente ultrapassaria o limite mínimo legalmente previsto Relevante parcela da doutrina é favorável à adoção prática dessa espécie de prescrição por dois motivos ausência de interesse de agir e economia processual Não existiria utilidade na ação penal pois irremediavelmente ocorreria a prescrição retroativa tornando inócuo o seu emprego Ademais seria despropositado gastar tempo dos operadores da Justiça e principalmente dinheiro público com um processo penal fadado a ter reconhecida a extinção da punibilidade Advirtase contudo que mesmo para os que aceitam essa construção científica é necessário agir com bomsenso O réu não tem antecipadamente o direito de receber a pena mínima Portanto é equivocado desejar a incidência da prescrição antecipada quando com a pena rasa estaria extinta a punibilidade Em verdade só há falar nessa espécie de prescrição quando exclusivamente a pena máxima ou algo dela muito próximo seria capaz de evitar a extinção da punibilidade O Supremo Tribunal Federal entretanto não admite essa espécie fictícia de prescrição Não se admite a denominada prescrição em perspectiva haja vista a inexistência de previsão legal do instituto64 Sustenta ainda ser precoce reconhecer a prescrição da pretensão punitiva com suporte na presunção de futura e incerta pena uma vez que no curso da instrução criminal poderiam ser provadas circunstâncias judiciais desfavoráveis ao paciente sem prejuízo da descoberta de novos fatos que poderiam inclusive alterar a tipicidade do fato65 Na mesma direção o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula 438 É inadmissível a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva com fundamento em pena hipotética independentemente da existência ou sorte do processo penal Vale destacar que a modificação do 1º do art 110 do Código Penal pela Lei 122342010 efetuada com a finalidade de impedir a prescrição retroativa em período anterior à denúncia ou queixa tornou extremamente difícil a ocorrência prática da prescrição virtual Como se sabe a prescrição antecipada normalmente se verificava na fase investigatória ou seja entre o fato criminoso e a provável data do recebimento da denúncia ou queixa Subsiste entretanto a possibilidade de reconhecimento da prescrição retroativa na fase judicial isto é entre a publicação da sentença condenatória recorrível e o recebimento da denúncia ou queixa Para os adeptos da prescrição virtual esta brecha abre ensejo para sua constatação durante o desenrolar da ação penal Nos crimes de competência do Tribunal do Júri para os defensores deste instituto também seria possível a prescrição antecipada em três momentos distintos a entre a publicação da sentença condenatória recorrível e a decisão confirmatória da pronúncia b entre a decisão confirmatória da pronúncia e a pronúncia e c entre a pronúncia e o recebimento da denúncia ou queixa 4611 4612 PRESCRIÇÃO DAS PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS Dispõe o parágrafo único do art 109 do Código Penal Aplicamse às penas restritivas de direitos os mesmos prazos previstos para as privativas de liberdade As penas restritivas de direitos por serem substitutivas das privativas de liberdade não têm previsão independente nos preceitos secundários dos tipos penais seguem os mesmos prazos das penas substituídas No tocante à prescrição da pretensão executória de pena restritiva de direitos descumprida pelo condenado o prazo é calculado de acordo com o tempo faltante da pena alternativa aplicada em substituição à pena privativa de liberdade Em sintonia com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça No caso de abandono pelo sentenciado do cumprimento da pena restritiva de direitos prestação de serviços à comunidade a prescrição da pretensão executória será regulada pelo tempo restante do cumprimento da medida substitutiva imposta Com base nesse entendimento a Turma concedeu a ordem para declarar extinta a punibilidade do paciente pela ocorrência da prescrição executória da pena Ao conferir interpretação extensiva ao art 113 do CP decidiuse que o abandono no cumprimento da pena restritiva de direitos pode ser equiparado às hipóteses de evasão e da revogação do livramento condicional previstas no referido artigo uma vez que as situações se assemelham na medida em que há em todos os casos sentença condenatória e o cumprimento de parte da pena pelo sentenciado66 PRESCRIÇÃO E DETRAÇÃO PENAL Discutese se a detração penal CP art 42 consistente no desconto na pena privativa de liberdade do tempo de prisão provisória já cumprida pelo condenado influencia ou não no cálculo da prescrição Para quem admite essa possibilidade fundada na aplicação analógica do art 113 do Código Penal a prescrição deveria ser computada com base no 4613 restante da pena ou seja somente com o tempo ainda não cumprido pelo sentenciado Exemplo A foi condenado a seis anos Provisoriamente antes do trânsito em julgado contudo ficou preso por três anos A prescrição seguindo esse raciocínio deveria ser calculada sobre a pena faltante isto é três anos e não sobre a pena total O Supremo Tribunal Federal inspirado no princípio da estrita legalidade de observância cogente em matéria penal tem posição diversa O art 113 do Código Penal tem aplicação vinculada às hipóteses de evasão do condenado ou de revogação do livramento condicional não se referindo ao tempo de prisão cautelar para efeito do cálculo da prescrição CP Art 113 No caso de evadirse o condenado ou de revogarse o livramento condicional a prescrição é regulada pelo tempo que resta da pena67 Em síntese o cálculo da prescrição deve observar a pena aplicada a pena concretizada no título executivo judicial sem diminuirse o período em que o réu esteve provisoriamente sob a custódia do Estado detração penal PRESCRIÇÃO DAS MEDIDAS DE SEGURANÇA As medidas de segurança qualquer que seja sua espécie podem ser aplicadas aos inimputáveis CP art 26 caput ou aos semiimputáveis CP art 26 parágrafo único quando comprovada a periculosidade e o condenado necessitar de especial tratamento curativo Submetemse em qualquer hipótese ao instituto da prescrição68 No tocante aos semiimputáveis a prescrição segue a sistemática inerente às penas privativas de liberdade uma vez que leva em conta a pena diminuída aplicada com a condenação e depois substituída por medida de segurança CP art 98 Existe uma sentença condenatória concreta apta a servir de parâmetro para o cálculo do prazo prescricional A questão é diversa porém em relação aos inimputáveis Destacamse duas posições acerca do tema 1ª posição É possível somente a prescrição da pretensão punitiva com 4614 base na pena máxima em abstrato e jamais a prescrição da pretensão executória porque esta última exige a imposição de pena concreta o que não se dá na medida de segurança aplicada ao inimputável Depois de atribuída a medida de segurança se o inimputável não for encontrado imediatamente pela fuga ou qualquer outra causa mas só depois de superado seu prazo mínimo o correto é analisar se subsiste ou não a periculosidade do agente que legitimou a sanção penal Em caso positivo deve ser executada Em caso negativo declarase sua extinção 2ª posição Podem ocorrer ambas as espécies de prescrição da pretensão punitiva e da pretensão executória calculandose as duas em conformidade com a pena máxima em abstrato69 É o entendimento consolidado no Supremo Tribunal Federal70 e também no Superior Tribunal de Justiça A prescrição da medida de segurança imposta em sentença absolutória imprópria é regulada pela pena máxima abstratamente prevista para o delito O CP não cuida expressamente da prescrição de medida de segurança mas essa é considerada uma espécie do gênero sanção penal Assim considerada sujeitase às regras previstas no CP relativas aos prazos prescricionais e às diversas causas interruptivas da prescrição O STF já se manifestou nesse sentido ao entender que incide o instituto da prescrição na medida de segurança estipulando que é espécie do gênero sanção penal e se sujeita por isso mesmo à regra contida no artigo 109 do Código Penal RHC 86888SP 1ª Turma DJ de 2122005 Esta Corte Superior por sua vez já enfrentou a questão também considerando a medida de segurança como espécie de sanção penal e portanto igualmente sujeita à prescrição e suas regras assentando ainda que o lapso temporal necessário à verificação da referida causa de extinção da punibilidade deve ser encontrado tendo como referência a pena máxima abstratamente prevista para o delito71 PRESCRIÇÃO E ABSORÇÃO DE PENAS O art 118 do Código Penal estabelece expressamente que as penas mais leves prescrevem com as mais graves 4615 A comparação de gravidade é a seguinte a pena privativa de liberdade é a mais grave enquanto mais leves são as restritivas de direitos e a multa Como sustentam Zaffaroni e Pierangeli Razões doutrinárias e muito especialmente de política criminal determinaram a solução legal Aliás seria incompreensível que o Estado em razão do tempo se conformasse com a não execução de uma pena de maior intensidade e determinasse a continuação da prescrição de penas mais leves72 O dispositivo é absolutamente dispensável para as penas restritivas de direitos as quais por serem substitutivas necessariamente prescrevem no mesmo prazo das penas privativas de liberdade substituídas Aliás isso já consta do art 109 parágrafo único do Código Penal Cumpre frisar no entanto que na hipótese de serem aplicadas simultaneamente uma pena privativa de liberdade e outra restritiva de direitos como admitem diversos crimes tipificados pelo Código de Trânsito Brasileiro Lei 95031997 arts 302 a 304 e 306 a 308 com a prescrição daquela a esta não se reservará melhor sorte No campo da pena de multa o art 114 II do Código Penal previu regra específica mas com o mesmo propósito da ora em análise Deve ser destacado porém que esse critério não tem incidência na seara do concurso de crimes em que a pena de cada delito prescreve isoladamente CP art 119 PRESCRIÇÃO NO CONCURSO DE CRIMES Conforme emana do art 119 do Código Penal No caso de concurso de crimes a extinção da punibilidade incidirá sobre a pena de cada um isoladamente Esse dispositivo é aplicável ao concurso material ao concurso formal e ao crime continuado73 Em relação ao concurso material caracterizado quando o agente mediante duas ou mais condutas pratica dois ou mais crimes idênticos ou não o art 69 caput do Código Penal acolheu o sistema do cúmulo material é dizer somamse as penas de todos os crimes No que concerne à prescrição a extinção da punibilidade deve ser analisada sobre a pena de cada um dos delitos isoladamente e não sobre a pena final resultante da soma das reprimendas cabíveis a cada um dos crimes Exemplo A pratica três crimes É condenado a 12 anos de reclusão 2 dois anos pelo primeiro delito 4 quatro anos pelo segundo e 6 seis anos pelo terceiro Para análise da prescrição desconsiderase a pena final O que vale é a pena de cada um dos crimes o primeiro prescreverá em 4 quatro anos o segundo em 8 oito anos e o terceiro em 12 doze anos Concluise assim hipoteticamente falando que após 10 dez anos com a omissão do Estado em executar a pena restará somente a pena de 6 anos atinente ao terceiro crime pois as demais já terão sido atingidas pela prescrição Esse raciocínio igualmente se aplica ao concurso formal impróprio ou imperfeito CP art 70 caput in fine pois nele as penas dos diversos crimes também devem ser somadas Já no que diz respeito ao concurso formal próprio ou perfeito e também ao crime continuado adotouse o sistema da exasperação CP arts 70 caput 1ª parte e 71 caput e parágrafo único pois o magistrado para dosar a pena aplica a inerente a qualquer dos crimes se idênticas ou a mais grave se diversas aumentada de determinado percentual Para o cálculo da prescrição o juiz há de considerar somente a pena inicial isto é a pena derivada de um dos crimes sem o aumento decorrente do concurso formal próprio ou da continuidade delitiva Exemplo B pratica dois crimes de furto qualificado pela destruição de obstáculo à subtração da coisa CP art 155 4º I devendo o segundo pelas condições de tempo local modo de execução e outras semelhantes ser considerado como continuação do primeiro É condenado à pena de 2 dois anos de reclusão com um acréscimo de 4 quatro meses em face da exasperação de 16 por se tratar de crime continuado A sua pena final é de 2 dois anos e 4 quatro meses A extinção da punibilidade ocorrerá em 4 quatro anos pois incide sobre a pena de 2 dois anos desprezandose o aumento decorrente da continuação Nessa linha de entendimento é o teor da Súmula 497 do Supremo 4616 Tribunal Federal Quando se tratar de crime continuado a prescrição regulase pela pena imposta na sentença não se computando o acréscimo decorrente da continuação74 A orientação da súmula também incide em relação ao concurso formal próprio ou perfeito pela identidade de fundamento De fato nas duas modalidades de concurso de crimes o legislador recepcionou para fins de aplicação da pena o sistema da exasperação PRESCRIÇÃO DA PENA DE MULTA A matéria é tratada pelo art 114 do Código Penal Art 114 A prescrição da pena de multa ocorrerá I em dois anos quando a multa for a única cominada ou aplicada75 II no mesmo prazo estabelecido para a prescrição da pena privativa de liberdade quando a multa for alternativa ou cumulativamente cominada ou cumulativamente aplicada Convém fazer a distinção entre a prescrição da pretensão punitiva e a prescrição da pretensão executória da pena pecuniária a Prescrição da pretensão punitiva da pena de multa O art 114 do Código Penal é pacificamente aplicado quando a sanção pecuniária ainda não transitou em julgado para ambas as partes Além disso incidem as causas impeditivas e interruptivas versadas pelos arts 116 I e II e 117 I a IV do Código Penal b Prescrição da pretensão executória Em relação à prescrição da pretensão executória as causas suspensivas e interruptivas são as previstas nas normas da legislação relativa à dívida ativa da Fazenda Pública isto é na Lei 68301980 CP art 51 A causa interruptiva mais importante é o despacho judicial que ordena a citação Lei 68301980 art 8º 2º No tocante ao prazo prescricional há duas correntes 1 2 4617 É de 5 cinco anos pois a Lei 92681996 ao alterar o art 51 do Código Penal determinou que para fins de execução a pena de multa fosse considerada dívida de valor É o mesmo prazo da pena privativa de liberdade se aplicada conjuntamente com esta em obediência ao art 118 do Código Penal pelo qual as penas mais leves prescrevem com as mais graves E se foi a única imposta ao condenado a pena de multa prescreve em 2 dois anos Vale ressaltar qualquer que seja a corrente adotada que a reincidência embora devidamente reconhecida na sentença não aumenta em 13 um terço o prazo da prescrição da pretensão executória da pena de multa Como determina a Súmula 604 do Supremo Tribunal Federal A prescrição pela pena em concreto é somente da pretensão executória da pena privativa de liberdade PRESCRIÇÃO NA LEGISLAÇÃO PENAL ESPECIAL Aplicamse as regras do Código Penal a todas as leis que não possuam tratamento específico acerca da prescrição Extraise essa conclusão do art 12 do Código Penal princípio da convivência das esferas autônomas É o que ocorre por exemplo nos crimes de abuso de autoridade Lei 48981965 nos crimes contra a segurança nacional Lei 71701983 nos crimes contra a economia popular Lei 15211951 nos crimes eleitorais Lei 47371965 nas contravenções penais Decretolei 36881941 nos crimes contra o sistema financeiro nacional Lei 74921986 nos crimes ambientais Lei 96051998 e nos crimes de lavagem de bens direitos e valores Lei 46171 46172 46173 96131998 entre vários outros Lei de Drogas Lei 113432006 Para a conduta prevista no art 28 da Lei 113432006 adquirir guardar ter em depósito transportar ou trazer consigo para consumo pessoal drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar operase em 2 dois anos tanto a prescrição da pretensão punitiva como a prescrição da pretensão executória Nesse sentido dispõe o art 30 da Lei de Drogas Art 30 Prescrevem em 2 dois anos a imposição e a execução das penas observado no tocante à interrupção do prazo o disposto nos arts 107 e seguintes do Código Penal Esse prazo prescricional subsiste no patamar de 2 dois anos Em se tratando de lei especial e portanto de regra específica não se aplica a alteração introduzida no art 109 VI do Código Penal pela Lei 122342010 É o que se extrai da leitura do art 12 do Código Penal As regras gerais deste Código aplicamse aos fatos incriminados por lei especial se esta não dispuser de modo diverso Anotese porém que em relação a todos os demais crimes previstos na Lei 113432006 o instituto da prescrição obedece aos mandamentos do Código Penal Código Penal Militar Decretolei 10011969 A prescrição da pretensão punitiva é regulada pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao delito art 125 caput Por sua vez a prescrição da pretensão executória é calculada pela quantidade de pena imposta a qual será aumentada de um terço se o réu é criminoso habitual ou por tendência art 126 Para a pena de morte o prazo prescricional é de 30 anos art 125 I Prescrição e Estatuto da Criança e do Adolescente As disposições do Código Penal relativas à prescrição são compatíveis 4618 com as medidas socioeducativas tratadas pela Lei 80691990 Estatuto da Criança e do Adolescente pois tais formas de resposta estatal a par de sua natureza preventiva e reeducativa possuem também caráter retributivo e repressivo Nesse sentido a Súmula 338 do Superior Tribunal de Justiça A prescrição penal é aplicável nas medidas socioeducativas Calculase a causa extintiva da punibilidade com base na pena máxima em abstrato cominada ao crime ou contravenção penal correspondente ao ato infracional reduzida pela metade pelo fato de tratarse de pessoa menor de 21 anos de idade76 Essa posição fundamentase no fato de serem as normas gerais do Código Penal aplicáveis subsidiariamente em caso de omissão do Estatuto da Criança e do Adolescente77 FALTA GRAVE NA LEI DE EXECUÇÃO PENAL E PRESCRIÇÃO DE INFRAÇÃO DISCIPLINAR Em face da ausência de norma específica na Lei 72101984 Lei de Execução Penal sobre o tema é constitucional porque mais benéfico ao reeducando o entendimento pelo qual é de 3 três anos o prazo prescricional para a aplicação de sanção disciplinar em razão da prática de falta grave LEP arts 52 e 53 Utilizase analogicamente o disposto no art 109 VI do Código Penal levandose em conta o menor lapso previsto78 E em caso de fuga do condenado do estabelecimento prisional o termo inicial do prazo de prescrição é a data da recaptura tomandose de empréstimo o art 111 III do Código Penal A prescrição antes de transitar em julgado a sentença final começa a correr nos crimes permanentes do dia em que cessou a permanência79 1 2 3 4 5 6 7 8 9 O interesse de punir constituise em monopólio do Estado e matéria de ordem pública inclusive nos crimes de ação privada em que se transfere ao particular unicamente a titularidade para a persecução penal STF AP 584 QOPR rel Min Dias Toffoli Plenário j 10042014 noticiado no Informativo 742 FONTÁN BALESTRA Derecho penal Introducción y parte general 17 ed atual por Guillermo A C Ledesma Buenos Aires Abeledo Perrot 2002 p 639 FARIA Bento Código penal brasileiro comentado Rio de Janeiro Record 1961 v III p 197 BECCARIA Cesare Dos delitos e das penas Trad Lucia Guidicini e Alessandro Berti Contessa São Paulo Martins Fontes 1991 p 85 STF HC 110221RJ rel Min Luiz Fux 1ª Turma j 03122013 noticiado no Informativo 731 No STJ AgRg no REsp 1316912SP rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 18032014 Rcl 4515SP rel Min Maria Thereza de Assis Moura 3ª Seção j 27042011 noticiado no Informativo 470 A única exceção estava no art 118 É imprescritível a pena acessória imposta na sentença ou resultante de condenação Essa regra não foi mantida pela Reforma Penal de 1984 inclusive pela extinção das penas acessórias Nesse diapasão JESUS Damásio E de Novíssimas questões criminais São Paulo Saraiva 1998 p 40 A Constituição Federal de 1988 impôs aos agentes de delitos dessa natureza pela gravidade e repulsividade da ofensa a cláusula de imprescritibilidade para que fique ad perpetuam rei memoriam verberado o repúdio e a abjeção da sociedade nacional à sua prática Jamais podem se apagar da memória dos povos que se pretendam justos os atos repulsivos do passado que permitiram e incentivaram o ódio entre iguais por motivos raciais de torpeza inominável A ausência de prescrição nos crimes de racismo justificase como alerta grave para as gerações de hoje e de amanhã para que se impeça a reinstauração de velhos e ultrapassados conceitos que a consciência jurídica e histórica não mais admitem STF HC 82424RS rel Min Moreira Alves rel p acórdão Min Maurício Corrêa Plenário j 17092003 No campo da injúria 10 11 12 13 14 15 16 17 18 racial CP art 140 3º o Superior Tribunal de Justiça decidiu que tal delito seria mais um no cenário do racismo e portanto sua pena não se submeteria à prescrição AgRg no AREsp 686965DF rel Min Ericson Maranhão Desembargador convocado do TJSP 6ª Turma j 18082015 Não concordamos com essa posição que a propósito não foi acolhida pelo STF nem reiterada pelo STJ Em igual sentido TRIPPO Maria Regina Imprescritibilidade penal São Paulo Juarez de Oliveira 2004 p 94 Para quem admite essa classificação a prescrição se situaria entre os chamados direitos fundamentais de 1ª geração Seria uma liberdade pública negativa consistente na omissão do Estado quanto à intervenção na esfera privada dos cidadãos relativamente à aplicação de uma pena atingida fatalmente pelo decurso do tempo Para um estudo aprofundado das gerações dos direitos humanos BOBBIO Norberto A era dos direitos Trad Carlos Nelson Coutinho Rio de Janeiro Campus 1992 p 5 e ss RE 460971RS rel Min Sepúlveda Pertence 1ª Turma j 13022007 No julgamento do AgRg no AREsp 686965DF rel Min Ericson Maranhão Desembargador convocado do TJSP 6ª Turma j 18082015 o Superior Tribunal de Justiça decidiu que a injúria racial CP art 140 3º seria mais um delito no cenário do racismo e portanto sua pena não se submeteria à prescrição Não concordamos com essa posição que a propósito não foi acolhida pelo STF nem reiterada pelo STJ Ext 1362DF rel Min Edson Fachin red p o ac Min Teori Zavascki Plenário j 09112016 noticiado no Informativo 846 Sempre que uma pergunta é formulada nesse sentido Qual a diferença entre as matérias questionadas apresentam pontos comuns Apresente sua resposta fornecendo inicialmente os pontos em comum para em seguida indicar as diferenças A resposta estará completa e revelará conhecimento aprofundado dos temas indagados STJ REsp 1113662SP rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 18022014 STJ REsp 908863SP rel Min Og Fernandes 6ª Turma j 08022011 noticiado no Informativo 462 O reconhecimento da extinção da punibilidade pelo implemento da prescrição da pretensão punitiva estatal enseja o desaparecimento de todos 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 os efeitos penais e extrapenais da condenação STJ AgRg nos EREsp 1022286RS rel Min Regina Helena Costa 3ª Seção j 27082014 No tocante aos semiimputáveis dotados de periculosidade a prescrição da pretensão executória também acarreta na extinção da medida de segurança aplicada em substituição à pena originariamente imposta Vale gizar que os efeitos da condenação remanescem apenas na hipótese de prescrição da pretensão executória que retira do Estado a possibilidade de executar a pena isto é extinguese a reprimenda sem contudo rescindir a sentença condenatória Logo ela produz os demais efeitos penais e extra penais Aqui a sentença gera reincidência e serve como título executivo STJ AgRg no AREsp 375892RJ rel Min Jorge Mussi 5ª Turma j 05082014 A terminologia prescrição da ação penal foi expressamente utilizada pelo art 125 do Código Penal Militar Decretolei 10011969 Para o STF a certidão do registro civil é exemplo de documento hábil RHC 105504MS rel Min Dias Toffoli 1ª Turma j 13122011 noticiado no Informativo 652 Também podemos lembrar da Carteira de Identidade RG e da Carteira Nacional de Habilitação CNH entre outros STF HC 107398RJ rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 10052011 noticiado no Informativo 626 HC 86320SP rel Min Ricardo Lewandowski 1ª Turma j 17102006 No mesmo sentido STJ HC 118862BA rel Min Jorge Mussi 5ª Turma j 12052009 noticiado no Informativo 394 e HC 132347RJ rel originário Min Nilson Naves rel para acórdão Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 22092009 noticiado no Informativo 408 HC 129696SP rel Min Dias Toffoli 2ª Turma j 19042016 noticiado no Informativo 822 E também HC 96968RS rel Min Carlos Britto 1ª Turma j 01122009 noticiado no Informativo 570 O STJ compartilha deste entendimento STJ HC 292404SP rel Min Jorge Mussi 5ª Turma j 05062014 AP 516 EDDF rel orig Min Ayres Britto red p o acórdão Min Luiz Fux Plenário j 05122013 noticiado no Informativo 731 HC 89969RJ rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 26062007 Ext 1270DF rel orig Min Marco Aurélio red p o ac Min Roberto Barroso 1ª Turma j 12122017 noticiado no Informativo 888 29 30 31 32 33 34 35 36 37 38 39 STF HC 87987RS rel Min Sepúlveda Pertence 1ª Turma j 09052006 noticiado no Informativo 426 No STJ HC 105074SP rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 18052010 STJ RHC 7206RJ rel Min José Dantas 5ª Turma j 28041998 Joanna Maranhão denunciou no ano de 2008 os abusos sexuais que sofreu aos 9 anos de idade no início da carreira de nadadora de Eugênio Miranda seu então treinador Esta é a jurisprudência tradicionalmente adotada pelo Supremo Tribunal Federal HC 93368PR rel Min Luiz Fux 1ª Turma j 09082011 Quando os autos da ação penal são remetidos ao juiz para recebimento da denúncia ou da queixa fazse conclusão conclusos O magistrado recebe carga dos autos e quando os devolve o escrivão registra essa baixa no livro respectivo Nesse momento se opera a publicação do despacho em cartório HC 138089SC rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 02032010 noticiado no Informativo 425 Doutrina e jurisprudência são uniformes no sentido de que o recebimento da denúncia por magistrado absolutamente incompetente não interrompe o curso do prazo prescricional STJ RHC 29599RS rel Min Jorge Mussi 5ª Turma j 20062013 E mais Quando a autoridade que receber a denúncia for incompetente em razão de prerrogativa de foro do réu o recebimento da peça acusatória será ato absolutamente nulo e portanto não interromperá a prescrição STJ APn 295RR rel Min Jorge Mussi Corte Especial j 17122014 noticiado no Informativo 555 No STF HC 104907PE rel Min Celso de Mello 2ª Turma j 10052011 noticiado no Informativo 626 RHC 40514MG rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 08052014 STJ HC 188471ES rel Min Napoleão Nunes Maia Filho 5ª Turma j 31052011 noticiado no Informativo 475 A prescrição da pretensão punitiva do Estado em segundo grau de jurisdição se interrompe na data da sessão de julgamento do recurso e não na data da publicação do acórdão STF RHC 125078SP rel Min Dias Toffoli 1ª Turma j 03032015 noticiado no Informativo 776 HC 138088RJ rel originário Min Marco Aurélio rel p acórdão Min Alexandre de Moraes 1ª Turma j 19092017 40 41 42 43 44 45 46 47 48 49 50 51 52 AgRg no REsp 1324845SP rel Min Ribeiro Dantas 5ª Turma j 26092017 O Superior Tribunal de Justiça encampa este entendimento RHC 40177PR rel Min Reynaldo Soares da Fonseca 5ª Turma j 25082015 noticiado no Informativo 568 ARE ED 709719SP relator Min Luiz Fux 1ª Turma j 04122012 RE 966177 RGRS rel Min Luiz Fux Plenário j 07062017 noticiado no Informativo 868 Engloba também o acórdão condenatório recorrível STJ AgRg no REsp 1406797PR rel Min Joel Ilan Paciornik 5ª Turma j 05122017 HC 162084MG rel Min Og Fernandes 6ª Turma j 10082010 noticiado no Informativo 442 STJ HC 53351RJ rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 24042007 noticiado no Informativo 318 JESUS Damásio E de Prescrição penal 10 ed São Paulo Saraiva 1995 p 130 STF HC 91959TO rel Min Eros Grau 2ª Turma j 09102007 A falha do legislador na elaboração da Lei 122342010 criou uma situação teratológica e lamentável demonstrando profunda falta de técnica ao instituir um 1º no art 110 do Código Penal sem existir o correspondente 2º existia mas foi revogado Curiosamente temos um 1º que na verdade se trata de parágrafo único Por sentença condenatória compreendase também o acórdão condenatório E aí em regra não se admite o acórdão condenatório em homenagem à soberania dos veredictos constitucionalmente consagrada Quando a sentença proferida no Tribunal do Júri é absolutória o acórdão não pode condenar Deve determinar a realização de novo julgamento quando a decisão dos jurados for manifestamente contrária à prova dos autos Há uma única exceção o Conselho de Sentença condena o réu mas o juiz presidente ao lavrar a sentença diverge das respostas dos jurados O Tribunal faz em sede recursal a devida retificação condenando o acusado CPP art 593 III b e 1º Temse um caso de acórdão condenatório recorrível causa de interrupção da prescrição da pretensão 53 54 55 56 57 58 59 60 punitiva no procedimento dos crimes de competência do Tribunal do Júri Nesse ponto cumpre recordar que o antigo 2º do art 110 do Código Penal foi um sórdido expediente de fantasmas que existem e sempre existiram no Congresso Nacional pois seu texto original aprovado mas misteriosamente alterado era o seguinte a prescrição de que trata o parágrafo anterior não pode ter como termo inicial data anterior à do recebimento da denúncia ou queixa A comunidade jurídica aguardava a aprovação integral do Projeto de Lei 13832009 de autoria do Deputado Federal Antonio Carlos Biscaia o qual eliminava definitivamente a prescrição retroativa e consequentemente a prescrição virtual tanto na fase investigatória como na fase judicial Mas de última hora e para surpresa geral a redação foi modificada extinguindose tão somente a prescrição retroativa e indiretamente a virtual na etapa investigativa É constitucional o art 110 1º do CP 1º A prescrição depois da sentença condenatória com trânsito em julgado para a acusação ou depois de improvido seu recurso regulase pela pena aplicada não podendo em nenhuma hipótese ter por termo inicial data anterior à da denúncia ou queixa na redação dada pela Lei 122342010 STF HC 122694SP rel Min Dias Toffoli Plenário j 10122014 noticiado no Informativo 771 HC 162084MG rel Min Og Fernandes 6ª Turma j 10082010 noticiado no Informativo 442 MIRABETE Julio Fabbrini Execução penal 8 ed São Paulo Atlas 1997 p 262 HC 254080SC rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 15102013 noticiado no Informativo 532 E mais O termo inicial da prescrição da pretensão executória é a data do trânsito em julgado da sentença condenatória para a acusação ainda que pendente de apreciação recurso interposto pela defesa que em face do princípio da presunção de inocência impeça a execução da pena STJ HC 254080SC rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 15102013 noticiado no Informativo 532 RE 696533SC rel originário Min Luiz Fux red do acórdão Min Roberto Barroso 1ª Turma j 06022018 PORTO Antonio Rodrigues Da prescrição penal 5 ed São Paulo RT 1998 p 89 61 62 63 64 65 66 67 68 69 70 71 STF RHC 105504MS rel Min Dias Toffoli 1ª Turma j 13122011 noticiado no Informativo 652 HC 91562PR rel Min Joaquim Barbosa 2ª Turma j 09102007 E também Durante a suspensão condicional da pena não corre prazo prescricional CP art 77 cc o art 112 STF Ext 1254Romênia 2ª Turma rel Min Teori Zavascki 2ª Turma j 29042014 noticiado no Informativo 744 STF Ext 6894 rel Min Marco Aurélio Tribunal Pleno j 19121997 Inq 3574 AgRMT rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 0262015 noticiado no Informativo 788 Inq 2584 EDEDSP rel Min Ayres Britto Plenário j 01032012 noticiado no Informativo 656 Em nossa opinião o principal óbice à aceitação da prescrição virtual repousa justamente na possibilidade de aditamento da denúncia mutatio libelli ao final da instrução probatória para reconhecimento de crime mais grave exemplo de furto para roubo nos moldes do art 384 caput do Código de Processo Penal HC 232764RS rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 25062012 noticiado no Informativo 500 RHC 85026SP rel Min Eros Grau 1ª Turma j 26042005 e HC 100001RJ rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 11052010 noticiado no Informativo 586 O STJ compartilha deste entendimento Não é possível a aplicação extensiva ou analógica do art 113 do Código Penal uma vez que o referido artigo especifica as situações de cabimento evasão de condenado ou revogação de livramento condicional Assim o período de prisão provisória do réu é considerado somente para o desconto da pena a ser cumprida e não para contagem do prazo prescricional o qual será analisado a partir da pena definitiva aplicada não sendo cabível a detração para fins prescricionais HC 216876SP rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 17122013 STF HC 97621RS rel Min Cezar Peluso 2ª Turma j 02062009 noticiado no Informativo 549 Nessa linha de raciocínio FERRARI Eduardo Reale Medidas de segurança e direito penal no estado democrático de direito São Paulo RT 2001 p 200207 STF RHC 86888SP rel Min Eros Grau 1ª Turma j 08112005 EREsp 39920RJ rel Min Jorge Mussi 5ª Turma j 06022014 72 73 74 75 76 77 78 79 noticiado no Informativo 535 E ainda RHC 33638RJ rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 05082014 e RHC 30915SP rel Min Rogério Schietti Cruz 6ª Turma j 18062014 ZAFFARONI Eugenio Raúl PIERANGELLI José Henrique Manual de direito penal brasileiro Parte geral 7 ed São Paulo RT 2007 v 1 p 652 O artigo 109 do Código Penal disciplina que o prazo prescricional antes do trânsito em julgado da decisão condenatória regulase pelo máximo da pena cominada ao crime No cálculo cada crime é considerado isoladamente não se considerando o acréscimo decorrente do concurso formal material ou da continuidade delitiva a teor do disposto no artigo 119 do Código Penal STJ AgRg no REsp 1341671MG rel Min Rogério Schietti Cruz 6ª Turma j 03062014 No STJ AgRg no AREsp 221016SP Rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 25022014 Esse prazo não foi alterado pela Lei 122342010 a qual estipulou o prazo prescricional mínimo de 3 anos unicamente no tocante às penas privativas de liberdade disciplinadas no Código Penal STF HC 107200RS rel Min Celso de Mello 2ª Turma j 28062011 noticiado no Informativo 633 e STJ HC 90172RJ rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 21022008 noticiado no Informativo 345 HC 88788SP rel Min Joaquim Barbosa 2ª Turma j 22042008 noticiado no Informativo 503 Ante a inexistência de legislação específica quanto à prescrição de infrações disciplinares de natureza grave aplicase por analogia o Código Penal A Turma sublinhou que em razão da ausência de norma específica aplicarseia à evasão do estabelecimento prisional infração disciplinar de natureza grave o prazo prescricional de dois anos em conformidade com o artigo 109 VI do CP STF HC 92000SP rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 06052014 noticiado no Informativo 745 STF HC 92000SP rel Min Ricardo Lewandowski 1ª Turma j 13112007 noticiado no Informativo 488 ALIMENA Bernardino Principios de derecho penal Trad Eugenio Cuello Callón Madrid Victoriano Suárez 1915 v I ALMEIDA Carlota Pizarro de Modelos de inimputabilidade Da teoria à prática Coimbra Almedina 2000 ALTAVILLA Enrico Psicologia judiciária O processo psicológico e a verdade judicial Trad Fernando Miranda Coimbra Armênio Amado 1981 v I ANCEL Marc A nova defesa social um movimento de política criminal humanista Trad Osvaldo Melo Rio de Janeiro Forense 1979 ANDRADE Manuel da Costa Liberdade de imprensa e inviolabilidade pessoal Uma perspectiva jurídicocriminal Coimbra Coimbra Editora 1996 ANTOLISEI Francesco Manual de derecho penal Parte general Trad espanhola Juan Del Rosal e Ángel Tório Buenos Aires Uteha Argentina 1960 ARAÚJO Luiz Alberto David NUNES JÚNIOR Vidal Serrano Curso de direito constitucional São Paulo Saraiva 1999 BARROS Flávio Augusto Monteiro de Direito penal Parte geral 5 ed São Paulo Saraiva 2006 BASTOS Celso Ribeiro Dicionário de direito constitucional São Paulo Saraiva 1994 BATISTA Nilo Concurso de agentes uma investigação sobre os problemas da autoria e da participação no direito penal brasileiro 2 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2004 BATTAGLINI Giulio Direito penal Parte geral Trad Paulo José da Costa Jr e Arminda Bergamini Miotto São Paulo Saraiva Editora da Universidade de São Paulo 1973 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Saraiva 1955 SIQUEIRA Galdino Tratado de direito penal Parte geral Rio de Janeiro José Konfino 1947 t I Tratado de direito penal Parte geral Rio de Janeiro José Konfino 1947 t II SODRÉ Moniz As três escolas penais 5 ed Rio de Janeiro Livraria Freitas Bastos 1952 SOLER Sebastian Derecho penal argentino Buenos Aires La Ley 1945 t II STEVENSON Oscar Concurso aparente de normas penais Estudos de direito e processo penal em homenagem a Nélson Hungria Rio de Janeiro Forense 1962 STRATENWERTH Günter Derecho penal Parte general El hecho punible Trad espanhola Gladys Romero Madrid Edersa 1976 Derecho penal Parte general I El hecho punible Trad Manuel Cancio Meliá e Marcelo A Sancinetti Buenos Aires 2005 TAIPA DE CARVALHO Américo A Direito penal Parte Geral Questões fundamentais Teoria Geral do Crime 2 ed Coimbra Coimbra Editora 2008 Sucessão de leis penais 3 ed Coimbra Coimbra Editora 2008 TAVARES Juarez Direito penal da negligência Uma contribuição à teoria do crime culposo 2 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 TELES Ney Moura Direito penal Parte geral São Paulo Atlas 2004 v I TOLEDO Francisco de Assis Ilicitude penal e causas de sua exclusão Rio de Janeiro Forense 1984 O erro no direito penal São Paulo Saraiva 1977 Princípios básicos de direito penal 5 ed 13 tir São Paulo Saraiva 2007 TORNAGUI Hélio Curso de processo penal 5 ed São Paulo Saraiva 1988 v 1 TOURINHO FILHO Fernando da Costa Manual de processo penal 8 ed São Paulo Saraiva 2006 TRIPPO Maria Regina Imprescritibilidade penal São Paulo Juarez de Oliveira 2004 VERGARA Pedro Das circunstâncias atenuantes no direito penal vigente Rio de Janeiro Bofoni 1948 WELZEL Hans Derecho penal alemán Trad Juan Busto Ramirez e Sergio Yañes Peréz Santiago Jurídica del Chile 1987 La teoría de la acción finalista Buenos Aires Depalma 1951 O novo sistema jurídicopenal Uma introdução à doutrina da ação finalista Trad Luiz Regis Prado São Paulo RT 2001 WESSELS Johannes Derecho penal Parte general Buenos Aires Depalma 1980 WILSON James Q e KELLING George L Broken windows The police and neighborhood safety Atlantic Monthly Magazine Washington DC março de 1982 ZAFFARONI Eugenio Raúl Criminología Aproximación desde um margen Tercera reimpresión Bogotá Temis 2003 Derecho penal Parte general 2 ed Buenos Aires Ediar 2002 Em busca das penas perdidas 5 ed Rio de Janeiro Revan 2001 O inimigo no direito penal Trad Sérgio Lamarão Rio de Janeiro Revan 2007 Tratado de derecho penal Parte general Buenos Aires Ediar 1982 v II PIERANGELI José Henrique Da tentativa 4 ed São Paulo RT 1995 Manual de direito penal brasileiro Parte geral 7 ed São Paulo RT 2007 v 1

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DIREITO PENAL PARTE GERAL ARTS 1 A 120 1 O GEN Grupo Editorial Nacional maior plataforma editorial brasileira no segmento científico técnico e profissional publica conteúdos nas áreas de concursos ciências jurídicas humanas exatas da saúde e sociais aplicadas além de prover serviços direcionados à educação continuada As editoras que integram o GEN das mais respeitadas no mercado editorial construíram catálogos inigualáveis com obras decisivas para a formação acadêmica e o aperfeiçoamento de várias gerações de profissionais e estudantes tendo se tornado sinônimo de qualidade e seriedade A missão do GEN e dos núcleos de conteúdo que o compõem é prover a melhor informação científica e distribuíla de maneira flexível e conveniente a preços justos gerando benefícios e servindo a autores docentes livreiros funcionários colaboradores e acionistas Nosso comportamento ético incondicional e nossa responsabilidade social e ambiental são reforçados pela natureza educacional de nossa atividade e dão sustentabilidade ao crescimento contínuo e à rentabilidade do grupo CLEBER MASSON DIREITO PENAL PARTE GERAL ARTS 1 A 120 1 13ª edição revista atualizada e ampliada De acordo com Prisão domiciliar da mulher gestante Lei 137692018 Política Nacional de Trabalho no âmbito do sistema prisional Decreto 94502018 CLEBER MASSON A EDITORA FORENSE se responsabiliza pelos vícios do produto no que concerne à sua edição impressão e apresentação a fim de possibilitar ao consumidor bem manuseálo e lêlo Nem a editora nem o autor assumem qualquer responsabilidade por eventuais danos ou perdas a pessoa ou bens decorrentes do uso da presente obra Nas obras em que há material suplementar online o acesso a esse material será disponibilizado somente durante a vigência da respectiva edição Não obstante a editora poderá franquear o acesso a ele por mais uma edição Todos os direitos reservados Nos termos da Lei que resguarda os direitos autorais é proibida a reprodução total ou parcial de qualquer forma ou por qualquer meio eletrônico ou mecânico inclusive através de processos xerográficos fotocópia e gravação sem permissão por escrito do autor e do editor Impresso no Brasil Printed in Brazil Direitos exclusivos para o Brasil na língua portuguesa Copyright 2019 by EDITORA FORENSE LTDA Uma editora integrante do GEN Grupo Editorial Nacional Rua Conselheiro Nébias 1384 Campos Elíseos 01203904 São Paulo SP Tel 11 50800770 21 35430770 faleconoscogrupogencombr wwwgrupogencombr O titular cuja obra seja fraudulentamente reproduzida divulgada ou de qualquer forma utilizada poderá requerer a apreensão dos exemplares reproduzidos ou a suspensão da divulgação sem prejuízo da indenização cabível art 102 da Lei n 9610 de 19021998 Quem vender expuser à venda ocultar adquirir distribuir tiver em depósito ou utilizar obra ou fonograma reproduzidos com fraude com a finalidade de vender obter ganho vantagem proveito lucro direto ou indireto para si ou para outrem será solidariamente responsável com o contrafator nos termos dos artigos precedentes respondendo como contrafatores o importador e o distribuidor em caso de reprodução no exterior art 104 da Lei n 961098 Capa Danilo Oliveira Produção digital Geethik Data de fechamento 07012019 CIP BRASIL CATALOGAÇÃO NA FONTE SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS RJ M372d Masson Cleber Direito Penal parte geral arts 1º a 120 vol 1 Cleber Masson 13 ed Rio de Janeiro Forense São Paulo MÉTODO 2019 Inclui bibliografia ISBN 9788530986285 1 Direito penal Brasil 2 Serviço público Brasil Concursos I Título II Série 1854088 CDU 343281 Meri Gleice Rodrigues de Souza Bibliotecária CRB76439 Aos meus pais e à minha irmã Com a sustentação moral e afetiva de uma família maravilhosa encontrei forças para chegar até aqui e ir adiante À Carol companheira de todos os momentos a quem entrego minha vida Às minhas princesas Maria Luísa e Rafaela Vocês roubaram para sempre meu coração mesmo antes de ter escutado o de vocês batendo Filhas vocês são o sentido de tudo O amor que tenho por cada uma de vocês é algo que não se pode descrever com simples palavras e sim pela preocupação constante pelos sorrisos desinteressados pelos olhares apaixonados e por todos os mais lindos sentimentos que vocês despertam em mim Aos meus sobrinhos Maria Eduarda Anna Lara Lorenzo e Chiara pelo carinho e pelos momentos de alegria que me proporcionam Ao Doutor Cássio Juvenal Faria mestre e amigo modelo de retidão e de brilhantismo profissional exemplo de membro do Ministério Público e de professor o qual busco seguir diariamente A todos os estudantes de Direito e em especial aos candidatos de concursos públicos Aos nossos alunos presenciais ou via satélite e aos nossos leitores aos quais empresto meu apoio e minha fé nessa fase tão difícil mas necessária de nossa vida Juntos enfrentaremos e superaremos o árduo caminho que leva à vitória Inúmeras pessoas são importantes durante o desenrolar de nossa vida Enumerálas seria tarefa impossível além de ingrata em face da certeza de que erros graves seriam cometidos Algumas pessoas e também instituições entretanto foram de fundamental importância para a concretização deste trabalho a saber Aloísio Masson mais do que um primo o irmão que não tive Presente em todos os momentos de luta de frustrações de alegrias e de conquistas Professor Doutor Damásio E de Jesus reconhecido como um dos maiores penalistas de todos os tempos e mundialmente respeitado visionário que com seu talento revolucionou o ensino jurídico no País por nos honrar com a oportunidade de ter integrado no período de 2006 a 2011 a seleta equipe de docentes do seu Complexo Jurídico Vauledir Ribeiro Santos por acreditar neste trabalho e Adriano Koenigkam pelo excelente trabalho de revisão que muito enriqueceu a obra Professor Doutor Marco Antonio Marques da Silva desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo e professor titular da Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo pela maestria e pelo zelo com que nos conduziu durante os trabalhos de orientação no curso de mestrado Ministério Público do Estado de São Paulo uma das reservas morais deste País instituição de que me orgulho fazer parte e a qual prometo sempre defender Rede LFG pela confiança depositada em nosso trabalho e principalmente pela generosidade com que fui recebido em seus quadros a partir do mês de novembro de 2011 Curso G7 Jurídico e todos os meus amigos que o integram por lutarem ao meu lado na realização de um sonho Estagiários e servidores do Ministério Público que comigo trabalham ou já trabalharam e especialmente ao Thiago e ao Gustavo Sou grato a todos vocês pela lealdade pela amizade e pelo apoio constante E é claro aos colegas promotores de Justiça e professores com quem convivemos diariamente pelo compromisso ético no desempenho de relevantes funções e por estarem sempre dispostos a compartilhar seus inesgotáveis conhecimentos A todos os que sempre nos ajudaram os meus sinceros agradecimentos Que a vida lhes recompense com muita saúde paz e alegria Muito obrigado O Autor NOTA DO AUTOR À 13a EDIÇÃO Esta 13ª edição do nosso Direito Penal volume 1 Parte Geral encontrase atualizada com a legislação penal lançada ao longo de 2018 notadamente as Leis 13654 alterações nos crimes de furto e roubo 13715 efeitos da condenação 13718 mudanças nos crimes contra a dignidade sexual 13769 substituição da prisão preventiva por prisão domiciliar da mulher gestante ou que for mãe ou responsável por crianças ou pessoas com deficiência e progressão especial de regime prisional para as condenadas na mesma situação 13771 novas causas de aumento de pena no feminicídio e 13772 definição da violência psicológica contra a mulher e criação do crime de registro não autorizado da intimidade sexual Abordamos as novas Súmulas do Superior Tribunal de Justiça e acrescentamos os julgados do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça noticiados nos respectivos Informativos publicados em 2018 atinentes à Parte Geral do Código Penal O livro também passa a contar com novas teorias e propostas doutrinárias surgidas tanto no direito comparado como no direito pátrio bem como com inovações jurisprudenciais a exemplo da posição da Suprema Corte acerca da legitimidade e da competência para execução da pena de multa Dessa forma buscamos proporcionar aos nossos leitores e às nossas leitoras uma obra ainda mais completa e em conformidade com suas finalidades precípuas colaborar na formação dos estudantes e na atuação prática dos operadores do Direito Penal bem como na preparação aos concursos públicos Agradecemos mais uma vez a confiança depositada neste trabalho e esperamos lhe ajudar a alcançar o almejado e merecido sucesso Bons estudos muita paz e felicidade em sua caminhada Um abraço Cleber Masson Quando cursava a faculdade de Direito buscava sempre conciliar a doutrina e a jurisprudência em meus estudos A tarefa era difícil e principalmente dispendiosa Livros custam caro e o acesso aos principais julgados dos Tribunais não é simples Demanda muito tempo a localização de ementas e acórdãos notadamente quando se pretende sistematizar a jurisprudência por assunto Em razão disso não raras vezes esse estudo completo era colocado em segundo plano o que me levava a constatar um sensível vazio acerca das matérias cujo conhecimento era necessário Com a colação de grau sobreveio a preparação para o concurso público A dificuldade outrora existente acentuouse significativamente Era preciso dominar novos assuntos a cada dia que se passava Somavamse a isso a elevada concorrência que aumenta anualmente a pressão própria e das pessoas próximas para a aprovação a ansiedade inerente ao concursando e ainda a luta incansável contra o relógio pois o tempo para os estudos era desproporcional à quantidade de matéria exigida pelo edital Além disso sabia que depois da primeira prova enfrentaria outra e depois mais outra E caso fracassasse precisaria aguardar longo período até o próximo edital o que nem sempre seria possível além de amargar a frustração da derrota Felizmente depois de muita luta a aprovação veio E logo no primeiro concurso No entanto foi intensa a preparação exigiu sacrifício dedicação desmedida e inúmeras privações Mas tudo valeu a pena E como valeu Se precisasse trilhava todo o caminho novamente Não há nada no mundo mais gratificante do que vencer pelo próprio esforço do que alcançar reconhecimento e satisfação com o exercício de um trabalho que se escolheu livremente pelo qual muito se lutou Porém decidi não parar por aí Era necessário repartir com outras pessoas o conhecimento adquirido ajudálas a enfrentar com segurança o tortuoso caminho que leva ao sucesso em concursos públicos Então comecei a lecionar em cursos preparatórios a compartilhar os medos e as angústias dos candidatos a colher com emoção as vitórias a festejar a tão almejada aprovação Depois de insistentes pedidos e de muito incentivo por parte dos alunos surgiu a ideia de escrever um livro Mais um desafio Não é simples atender às expectativas dos estudantes sejam acadêmicos sejam concursandos Revestese de enorme responsabilidade a tarefa de corresponder à confiança depositada na leitura de uma obra pois todos esperam que as palavras lançadas ao papel sejam capazes de auxiliar na conquista de seus objetivos Após certa relutância resolvi encarar mais essa prova da vida Espero sinceramente vencêla O trabalho de meses resultou nesta obra que você ora nos dá o orgulho de ler Tratase de um livro completo que envolve a Parte Geral do Código Penal incluindo toda a Teoria Geral do Direito Penal Escrita em linguagem clara e didática a obra abrange todas as questões relevantes dessa disciplina revelandose como suficiente para a aprovação em qualquer prova exame ou concurso público Além da doutrina clássica da história e da evolução do Direito Penal o livro aborda as mais recentes ideias penais de diversos países e variados doutrinadores Temas de vanguarda foram analisados tais como o funcionalismo penal a coculpabilidade a teoria da imputação objetiva a teoria do domínio do fato no concurso de pessoas a autoria por determinação o direito penal do inimigo as velocidades do direito penal o direito de intervenção entre tantos outros Nas matérias controversas foram expostas as diversas posições da doutrina e da jurisprudência destacandose sempre a mais aceita bem como se indicando a melhor corrente a ser adotada em cada perfil de concurso público Sabese que cada concurso público variando conforme seu perfil espera do candidato um pensamento coerente com a instituição cujo ingresso se pretende E é claro não podia ser olvidada a jurisprudência De elevada incidência em concursos públicos é indicada a posição do Supremo Tribunal Federal e a do Superior Tribunal de Justiça quando existentes em cada um dos tópicos abordados nos 46 capítulos que compõem o nosso Direito penal Parte geral Para facilitar a compreensão da matéria especialmente nos assuntos mais complexos o trabalho foi ilustrado com inúmeros exemplos sem prejuízo de gráficos e esquemas destinados à revisão do que foi lido e à assimilação visual de cada tema Dessa forma o leitor muitas vezes sentirseá em sala de aula como se estivesse lendo no quadro o que foi dito Também estão disponíveis em ambiente virtual questões objetivas de vários concursos públicos Além de simular uma prova esse recurso permite ao concursando atual ou futuro com a análise do número de questões acerca de cada assunto saber quais são os pontos mais cobrados pelas comissões examinadoras Espero colaborar para sua aprovação Estamos unidos em torno de um mesmo ideal sua vitória Agradeço pela confiança com que recebe esta obra e fico demasiadamente honrado com sua aceitação Críticas e sugestões serão muito bemvindas Torço por você Acredite lute com todas as suas forças por seu sonho Você é capaz Um forte abraço e boa sorte O Autor PREFÁCIO Colega de Ministério Público e de magistério Cleber Rogério Masson facultoume o privilégio de ter acesso aos originais de seu Direito penal Parte geral assim como me concedeu a honra de escrever algumas notas sobre o autor e a obra à guisa de prefácio O autor é bacharel em Direito e mestre em Direito Penal pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo Promotor de Justiça por vocação muito cedo despertada ingressou no Ministério Público de São Paulo em 2000 já no primeiro concurso realizado após a colação de grau passando a desempenhar com invulgar brilhantismo as suas funções institucionais para tanto conciliando o seu espírito jovem e aguerrido com uma precoce e ponderada maturidade Estudioso do Direito Penal logo tomou o caminho paralelo do magistério passando a lecionar em cursos preparatórios e a vivenciar as dificuldades e as preocupações de seus alunos candidatos a concursos públicos Hoje empresta o seu nome à magnificência do corpo docente do Complexo Jurídico Damásio de Jesus em São Paulo A leitura dos originais da primeira parte da obra eis que a ela se seguirá a Parte Especial trouxeme a certeza do acerto de sua planificação A obra se destina precipuamente aos concursandos e vem suprir uma lacuna editorial uma vez que oferece de forma consolidada e primando pela clareza de linguagem ao lado dos ensinamentos da doutrina clássica a análise dos temas hodiernos do Direito Penal assim como possibilita a imediata pesquisa da jurisprudência mais atualizada do STF e do STJ assegurando àqueles o estudo completo dessa disciplina fundamental em uma única e acessível fonte de consulta Nada obstante seja essa a destinação precípua da obra a densidade e a atualização de seu conteúdo doutrinário e jurisprudencial fazemna de molde a tornarse valiosa fonte de consulta também para aqueles que não têm a pretensão do concurso mas atuam profissionalmente com o Direito Penal Fica a expectativa de que para proveito de todos concursandos ou não também venha a lume o quanto antes o projetado complemento da Parte Especial São Paulo setembro de 2008 Cássio Juvenal Faria Procurador de Justiça aposentado e Professor no Complexo Jurídico Damásio de Jesus em São Paulo O selo Método desde a sua criação sempre teve como objetivo fornecer o melhor conteúdo aos estudantes e profissionais do Direito Para atingir esse propósito busca os autores mais capacitados e prestigiados do mercado voltados especialmente para a elaboração de conteúdo jurídico Considerando os avanços tecnológicos e os novos meios disponíveis de comunicação o selo Método imbuído de sua missão e compromisso de fornecer o conteúdo mais completo e as ferramentas de aprendizagem lançou videoaulas O conteúdo foi cuidadosamente preparado e adequado para a exposição de aulas ministradas pelo próprio autor da obra impressa Acreditando sempre na melhoria qualitativa e na evolução do processo de ensinoaprendizagem e busca pela informação nesta 13ª edição do Direito Penal Parte Geral Volume I o leitor terá acesso à Sala de Aula Virtual CLEBER MASSON com vídeos para complementar os temas mais relevantes e dicas com as novidades legislativas além de questões de concurso para treino e simulados A ideia da Sala de Aula é aproximar o leitor do autor proporcionando um espaço para interação por meio de webinars sobre temas diversos e fórum de discussão Esperamos que aproveitem ao máximo esses novos recursos Boa leitura e bons estudos Acesse o QR Code e assista ao vídeo do autor sobre a obra httpuqrtodjhz 11 12 13 14 15 16 161 162 163 164 165 17 171 172 173 174 175 176 177 SUMÁRIO PARTE I TEORIA GERAL DO DIREITO PENAL CAPÍTULO 1 DIREITO PENAL NOÇÕES INTRODUTÓRIAS Conceito de Direito Penal Alocação na Teoria Geral do Direito Nomenclatura Características do Direito Penal Criminalização primária e criminalização secundária Seletividade e vulnerabilidade no Direito Penal Relações do Direito Penal com outros ramos do Direito Com o Direito Processual Penal Com o Direito Constitucional Com o Direito Administrativo Com o Direito Civil Com o Direito Internacional Funções do Direito Penal Direito Penal como proteção de bens jurídicos Direito Penal como instrumento de controle social Direito Penal como garantia Função éticosocial do Direito Penal Função simbólica do Direito Penal Função motivadora do Direito Penal Função de redução da violência estatal 178 18 181 182 183 184 19 191 192 193 194 195 196 197 198 199 1910 110 1101 1102 1103 11031 11032 11033 11034 Função promocional do Direito Penal A ciência do Direito Penal Introdução Dogmática penal Política criminal Criminologia Divisões do Direito Penal Direito Penal fundamental ou Direito Penal primário Direito Penal complementar ou Direito Penal secundário Direito Penal comum Direito Penal especial Direito Penal geral Direito Penal local Direito Penal objetivo Direito Penal subjetivo Direito Penal material Direito Penal formal Fontes do Direito Penal Introdução Fontes materiais substanciais ou de produção Fontes formais cognitivas ou de conhecimento Constituição Federal Jurisprudência Doutrina Tratados e convenções internacionais 11035 11036 11037 21 22 221 2211 222 223 2231 2232 2233 2234 2235 2236 2237 2238 2239 224 225 sobre direitos humanos Costumes Princípios gerais do Direito Atos da Administração Pública CAPÍTULO 2 PRINCÍPIOS DO DIREITO PENAL Conceito Princípios em espécie Princípio da reserva legal ou da estrita legalidade Princípio da reserva legal e mandados de criminalização Princípio da anterioridade Princípio da insignificância ou da criminalidade de bagatela Introdução Finalidade Natureza jurídica Requisitos Aplicabilidade Princípio da insignificância e infrações penais de menor potencial ofensivo A questão do furto privilegiado Princípio da insignificância e sua valoração pela autoridade policial Princípio da insignificância imprópria ou da criminalidade de bagatela imprópria Princípio da individualização da pena Princípio da alteridade 226 227 228 2281 2282 229 2210 2211 2212 22121 22122 2213 2214 2215 2216 2217 2218 31 311 312 313 Princípio da confiança Princípio da adequação social Princípio da intervenção mínima Princípio da fragmentariedade ou caráter fragmentário do Direito Penal Princípio da subsidiariedade Princípio da proporcionalidade Princípio da humanidade Princípio da ofensividade ou da lesividade Princípio da exclusiva proteção do bem jurídico Eleição de bens jurídicos e a teoria constitucional do Direito Penal A espiritualização desmaterialização ou liquefação de bens jurídicos no Direito Penal Princípio da imputação pessoal Princípio da responsabilidade pelo fato Princípio da personalidade ou da intranscendência Princípio da responsabilidade penal subjetiva Princípio do ne bis in idem Princípio da isonomia CAPÍTULO 3 A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO DIREITO PENAL O Direito Penal dos povos primitivos Introdução Vingança divina Vingança privada 314 32 321 322 33 331 332 34 341 41 42 43 51 52 53 54 55 61 62 63 64 641 Vingança pública Idade antiga Direito Penal grego e Direito Penal romano Direito Penal grego Direito Penal romano Idade Média Direito Penal germânico Direito Penal canônico Idade Moderna Período humanitário O pensamento de Beccaria CAPÍTULO 4 A HISTÓRIA DO DIREITO PENAL BRASILEIRO Período Colonial Código Criminal do Império Período Republicano CAPÍTULO 5 ESCOLAS PENAIS Escola Clássica Escola Positiva Correcionalismo Penal Tecnicismo JurídicoPenal A defesa social CAPÍTULO 6 A EVOLUÇÃO DOUTRINÁRIA DO DIREITO PENAL Positivismo jurídico Neokantismo penal Garantismo penal Funcionalismo penal Posição de Claus Roxin Escola de Munique 642 65 651 652 653 654 6541 6542 6543 655 656 71 72 73 74 75 751 752 753 754 755 Posição de Günther Jakobs Escola de Bonn Novas propostas doutrinárias Direito Penal e enfrentamento da criminalidade moderna Introdução Direito intervencionista ou de intervenção As velocidades do Direito Penal Direito Penal do inimigo Noções preliminares Conceito de inimigo Efeitos da aplicação da teoria do Direito Penal do inimigo Neopunitivismo a quarta velocidade do Direito Penal Direito Penal como proteção de contextos da vida em sociedade CAPÍTULO 7 LEI PENAL Introdução Classificação Características da lei penal Lei penal em branco Interpretação da lei penal Introdução Quanto ao sujeito autêntica judicial ou doutrinária Quanto aos meios ou métodos gramatical e lógica Quanto ao resultado declaratória extensiva e restritiva Interpretação progressiva 756 76 761 762 77 771 772 7721 7722 7723 7724 7725 773 774 78 781 782 783 784 785 786 787 7871 7872 7873 Interpretação analógica Analogia Introdução Espécies Lei penal no tempo Introdução Direito Penal intertemporal e o conflito de leis penais no tempo Novatio legis incriminadora Lei penal mais grave ou lex gravior Abolitio criminis e lei posterior benéfica Combinação de leis penais lex tertia Lei penal intermediária Lei penal temporária e lei penal excepcional As leis penais em branco e o conflito de leis no tempo Conflito aparente de leis penais Conceito Requisitos Localização no Direito Penal Finalidade Diferença com o concurso de crimes Diferença com o conflito de leis penais no tempo Princípios para solução do conflito Princípio da especialidade Princípio da subsidiariedade Princípio da consunção ou da absorção 7874 788 79 710 7101 7102 71021 71022 7103 71031 71032 71033 71034 71035 711 7111 712 7121 7122 71221 71222 7123 Princípio da alternatividade Ausência de previsão legal Tempo do crime Lei penal no espaço Introdução Princípio da territorialidade Conceito de território Território brasileiro por extensão Outros princípios Princípio da personalidade ou da nacionalidade Princípio do domicílio Princípio da defesa real ou da proteção Princípio da justiça universal Princípio da representação Lugar do crime Não aplicação da teoria da ubiquidade em outras hipóteses Extraterritorialidade Introdução Extraterritorialidade incondicionada Extraterritorialidade incondicionada e o art 8º do Código Penal Proibição do bis in idem Extraterritorialidade incondicionada e a Lei de Tortura Extraterritorialidade condicionada 713 7131 7132 7133 71331 71332 71333 71334 71335 71336 71337 71338 714 7141 7142 7143 7144 7145 81 811 812 8121 Lei penal em relação às pessoas Introdução Imunidades diplomáticas e de chefes de governos estrangeiros Imunidades parlamentares Alocação Introdução Conceito e finalidade Imunidade material ou inviolabilidade Imunidade formal Pessoas abrangidas pela imunidade Suspensão e renúncia da imunidade Imunidades e estado de sítio Disposições finais acerca da aplicação da lei penal Introdução Eficácia da sentença estrangeira Contagem de prazo Frações não computáveis da pena Legislação especial PARTE II TEORIA GERAL DO CRIME CAPÍTULO 8 CRIME NOÇÕES INTRODUTÓRIAS Conceito de crime Critério material ou substancial Critério legal Crime e contravenção penal outras 8122 813 814 82 83 831 8311 832 84 91 911 912 913 914 915 916 917 918 919 9110 distinções Conceito legal de crime e o art 28 da Lei 113432006 Lei de Drogas Critério analítico Critério adotado pelo Código Penal Ilícito penal e outros ilícitos Sujeitos do crime Sujeito ativo A pessoa jurídica como sujeito ativo de crimes Sujeito passivo Objeto do crime CAPÍTULO 9 CLASSIFICAÇÃO DOS CRIMES Introdução Crimes comuns próprios e de mão própria Crimes simples e complexos Crimes materiais formais e de mera conduta Crimes instantâneos permanentes de efeitos permanentes e a prazo Crimes unissubjetivos plurissubjetivos e eventualmente coletivos Crimes de subjetividade passiva única e de dupla subjetividade passiva Crimes de dano e de perigo Crimes unissubsistentes e plurissubsistentes Crimes comissivos omissivos e de conduta mista Crimes de forma livre e de forma vinculada 9111 9112 9113 9114 9115 9116 9117 9118 9119 91191 91192 91193 91194 91195 91196 91197 91198 91199 911910 911911 911912 911913 911914 Crimes monoofensivos e pluriofensivos Crimes principais e acessórios Crimes transeuntes e não transeuntes Crimes à distância plurilocais e em trânsito Crimes independentes e conexos Crimes condicionados e incondicionados Crimes naturais plásticos e vazios Crimes de mínimo de menor de médio de elevado e de máximo potencial ofensivo Outras classificações Crime gratuito Crime de ímpeto Crime exaurido Crime de circulação Crime de atentado ou de empreendimento Crime de opinião ou de palavra Crime multitudinário Crime vago Crime internacional Crime de mera suspeita sem ação ou de mera posição Crime inominado Crime habitual Crime profissional Quasecrime 911915 911916 911917 911918 911919 911920 911921 911922 911923 911924 911925 911926 911927 911928 911929 911930 911931 911932 911933 911934 911935 911936 Crime subsidiário Crime hediondo Crime de expressão Crime de intenção ou de tendência interna transcendente Crime de tendência ou de atitude pessoal Crime mutilado de dois atos ou tipos imperfeitos de dois atos Crime de ação violenta Crime de ação astuciosa Crime falho Crime putativo imaginário ou erroneamente suposto Crime remetido Crimes de responsabilidade Crime obstáculo Crime progressivo Progressão criminosa Crimes de impressão Crimes militares Crimes falimentares Crimes funcionais ou delicta in officio Crimes parcelares Crimes de hermenêutica Crimes de rua crimes do colarinho branco e do colarinho azul 911937 911938 911939 911940 911941 911942 101 102 1021 1022 1023 1024 1025 1026 1027 1028 1029 10210 10211 103 1031 1032 1033 104 Crime liliputiano Crimes de catálogo Crimes de acumulação ou crimes de dano cumulativo Crimes de olvido Crimes aberrantes Crime achado CAPÍTULO 10 FATO TÍPICO Introdução Conduta Teoria clássica naturalística mecanicista ou causal Teoria final ou finalista Teoria cibernética Teoria social Teoria jurídicopenal Teoria da ação significativa Apontamentos gerais sobre a conduta Formas de conduta Teorias acerca da omissão Caracteres da conduta Exclusão da conduta Resultado Conceito Denominação Espécies Relação de causalidade ou nexo causal 1041 1042 1043 1044 1045 10451 1046 10461 10462 1047 10471 10472 10473 10474 10475 1048 1049 10491 10492 10493 10494 10495 105 1051 Denominação Dispositivo legal Conceito Âmbito de aplicação Teorias Teorias adotadas pelo Código Penal Concausas Introdução Causas dependentes e independentes Relevância da omissão Conceito e alcance Teoria adotada Dever de agir critérios existentes para sua definição Poder de agir Hipóteses de dever de agir A questão da dupla causalidade Teoria da imputação objetiva Evolução histórica Introdução Conceito e análise dos pressupostos A imputação objetiva para Jakobs e Roxin Conclusões Tipicidade Conceito 1052 10521 1053 1054 1055 111 112 113 114 1141 1142 1143 1144 1145 115 1151 116 1161 1162 1163 1164 1165 1166 Evolução doutrinária Tipicidade como indício da ilicitude e o art 386 inc VI do Código de Processo Penal Teoria dos elementos negativos do tipo Teoria da tipicidade conglobante Adequação típica conceito e espécies CAPÍTULO 11 TEORIA DO TIPO Conceito Espécies Tipo legal Funções do tipo legal Função de garantia Função fundamentadora Função indiciária da ilicitude Função diferenciadora do erro Função seletiva Estrutura do tipo legal Elementos modais Classificação doutrinária do tipo legal Tipo normal e tipo anormal Tipo fundamental e tipo derivado Tipo fechado e tipo aberto Tipo de autor e tipo de fato Tipo simples e tipo misto Tipo congruente e tipo incongruente 1167 1168 121 122 1221 123 124 125 1251 12511 1252 1253 1254 1255 1256 1257 1258 1259 126 127 131 132 133 Tipo complexo Tipo preventivo CAPÍTULO 12 CRIME DOLOSO Introdução Teorias do dolo Teorias adotadas pelo Código Penal Elementos do dolo Dolo natural e dolo normativo Espécies de dolo Dolo direto e dolo indireto Dolo eventual e os crimes de trânsito Dolus bonus e dolus malus Dolo de propósito e dolo de ímpeto ou repentino Dolo genérico e dolo específico Dolo presumido Dolo de dano e dolo de perigo Dolo de primeiro grau e dolo de segundo grau Dolo geral por erro sucessivo ou dolus generalis Dolo antecedente dolo atual e dolo subsequente O dolo nas contravenções penais Prova do dolo e teoria dos indicadores externos CAPÍTULO 13 CRIME CULPOSO Introdução Fundamento da punibilidade da culpa Conceito de crime culposo 134 1341 1342 13421 13422 1343 1344 1345 1346 1347 135 1351 1352 1353 1354 136 137 138 139 1310 141 142 143 144 Elementos do crime culposo Conduta voluntária Violação do dever objetivo de cuidado Apontamentos gerais Modalidades de culpa Resultado naturalístico involuntário Nexo causal Tipicidade Previsibilidade objetiva Ausência de previsão Espécies de culpa Culpa inconsciente e culpa consciente Culpa própria e culpa imprópria Culpa mediata ou indireta Culpa presumida Graus de culpa Compensação de culpas Concorrência de culpas Caráter excepcional do crime culposo Exclusão da culpa CAPÍTULO 14 CRIME PRETERDOLOSO Conceito Relação entre dolo e culpa Versari in re illicita Crimes qualificados pelo resultado 151 152 153 154 1541 155 156 157 158 159 1591 1510 15101 15102 15103 15104 15105 151051 15106 151061 1511 161 162 CAPÍTULO 15 ERRO DE TIPO Introdução Previsão legal Erro e ignorância distinção e tratamento Conceito Erro de tipo e crimes omissivos impróprios Espécies Efeitos Erro de tipo e crime putativo por erro de tipo Descriminantes putativas Erro determinado por terceiro Erro determinado por terceiro e concurso de pessoas Erro de tipo acidental Erro sobre a pessoa ou error in persona Erro sobre o objeto Erro sobre as qualificadoras Erro sobre o nexo causal ou aberratio causae Erro na execução ou aberratio ictus Espécies de erro na execução Resultado diverso do pretendido aberratio delicti ou aberratio criminis Espécies Gráfico conclusivo CAPÍTULO 16 ITER CRIMINIS Conceito Fase interna cogitação 163 1631 1632 1633 1634 164 171 172 173 174 175 176 177 1771 178 179 1710 17101 17102 17103 17104 1711 Fase externa Preparação Execução Transição dos atos preparatórios para os atos executórios Consumação O exaurimento CAPÍTULO 17 TENTATIVA Dispositivo legal Conceito Denominação Elementos Natureza jurídica Teorias sobre a punibilidade da tentativa Teoria adotada pelo Código Penal Critério para diminuição da pena Tentativa e crimes de competência dos Juizados Especiais Criminais Tentativa e diminuição da pena no Código Penal Militar Espécies de tentativa Tentativa branca ou incruenta Tentativa cruenta ou vermelha Tentativa perfeita acabada ou crime falho Tentativa imperfeita inacabada ou tentativa propriamente dita Tentativa e crimes de ímpeto 1712 1713 1714 181 182 183 184 185 186 187 188 189 1810 1811 1812 1813 1814 191 192 193 194 Tentativa e dolo eventual Inadmissibilidade da tentativa Crimes punidos somente na forma tentada CAPÍTULO 18 DESISTÊNCIA VOLUNTÁRIA E ARREPENDIMENTO EFICAZ Dispositivo legal Distinção com a tentativa Fundamento Natureza jurídica Desistência voluntária Arrependimento eficaz Requisitos Motivos Efeito Incompatibilidade com os crimes culposos Adiamento da prática do crime Comunicabilidade da desistência voluntária e do arrependimento eficaz Tentativa qualificada Desistência voluntária arrependimento eficaz e Lei de Terrorismo CAPÍTULO 19 ARREPENDIMENTO POSTERIOR Conceito Alocação do instituto Natureza jurídica Extensão do benefício 195 196 197 198 199 1910 19101 19102 19103 19104 201 202 203 204 205 206 207 2071 2072 2073 211 212 Fundamentos Requisitos Comunicabilidade do arrependimento posterior no concurso de pessoas Critério para redução da pena Recusa do ofendido em aceitar a reparação do dano ou a restituição da coisa Dispositivos especiais acerca da reparação do dano Peculato culposo Juizados Especiais Criminais Apropriação indébita previdenciária Súmula 554 do Supremo Tribunal Federal CAPÍTULO 20 CRIME IMPOSSÍVEL Conceito Natureza jurídica Teorias sobre o crime impossível Espécies de crime impossível Momento adequado para aferição da inidoneidade absoluta Aspectos processuais inerentes ao crime impossível Crime putativo e crime impossível Conceito de crime putativo Espécies de crime putativo Diferença entre crime impossível e crime putativo CAPÍTULO 21 ILICITUDE Conceito Ilicitude formal e ilicitude material 213 214 215 216 217 218 219 2191 2192 2193 2194 2195 21951 2196 21961 2197 2198 221 222 223 224 225 Concepção unitária Terminologia Ilícito e injusto Ilicitude genérica e ilicitude específica Ilicitude objetiva e ilicitude subjetiva Ilicitude penal e ilicitude extrapenal Causas de exclusão da ilicitude Introdução Nomenclatura Previsão legal Elementos objetivos e subjetivos das causas de exclusão da ilicitude Causas de exclusão da ilicitude e aspectos processuais Prisão provisória e as inovações promovidas pela Lei 124032011 Causas supralegais de exclusão da ilicitude Consentimento do ofendido Descriminante em branco ou excludente da ilicitude em branco Visão geral CAPÍTULO 22 ESTADO DE NECESSIDADE Dispositivo legal Conceito Natureza jurídica Teorias Requisitos 2251 22511 22512 22513 22514 2252 22521 22522 226 227 2271 2272 2273 2274 228 229 2210 2211 2212 2213 231 232 Situação de necessidade Perigo atual Perigo não provocado voluntariamente pelo agente Ameaça a direito próprio ou alheio Ausência do dever legal de enfrentar o perigo Fato necessitado Inevitabilidade do perigo por outro modo Proporcionalidade Causa de diminuição da pena Espécies de estado de necessidade Quanto ao bem sacrificado Quanto à titularidade do bem jurídico preservado Quanto à origem da situação de perigo Quanto ao aspecto subjetivo do agente Estado de necessidade recíproco Casos específicos de estado de necessidade Comunicabilidade do estado de necessidade Estado de necessidade e crimes permanentes e habituais Estado de necessidade e erro na execução Estado de necessidade e dificuldades econômicas CAPÍTULO 23 LEGÍTIMA DEFESA Fundamento Dispositivo legal 233 234 2341 2342 2343 2344 2345 235 236 237 2371 2372 2373 2374 2375 2376 238 239 2310 2311 2312 2313 2314 2315 Natureza jurídica e conceito Requisitos legais Agressão injusta Agressão atual ou iminente Agressão a direito próprio ou alheio Reação com os meios necessários Uso moderado dos meios necessários Legítima defesa e vingança Desafio e legítima defesa Espécies de legítima defesa Quanto à forma de reação Quanto à titularidade do bem jurídico protegido Quanto ao aspecto subjetivo de quem se defende Legítima defesa da honra Legítima defesa presumida Legítima defesa sucessiva Legítima defesa contra a multidão Legítima defesa contra pessoa jurídica Legítima defesa nas relações familiares Legítima defesa e aberratio ictus Legítima defesa de terceiro e consentimento do ofendido Diferença entre estado de necessidade e legítima defesa Existência simultânea de legítima defesa e de estado de necessidade Legítima defesa e relação com outras excludentes admissibilidade 2316 2317 241 242 243 244 245 246 247 248 249 251 252 253 254 255 256 257 258 259 2510 2511 Legítima defesa e relação com outras excludentes inadmissibilidade Legítima defesa e desobediência civil distinção CAPÍTULO 24 ESTRITO CUMPRIMENTO DE DEVER LEGAL Dispositivo legal Natureza jurídica Conceito Fundamento Dever legal Destinatários da excludente Limites da excludente Estrito cumprimento de dever legal e crimes culposos Comunicabilidade da excludente da ilicitude CAPÍTULO 25 EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO Dispositivo legal Natureza jurídica Conceito Limites da excludente Costumes Distinções entre estrito cumprimento de dever legal e exercício regular de direito Lesões em atividades esportivas Intervenções médicas ou cirúrgicas Ofendículas Meios mecânicos predispostos de defesa da propriedade Exercício regular dE direito e utilização de cadáver para estudos 261 262 263 264 2641 2642 265 266 271 272 273 274 275 2751 2752 2753 276 277 278 279 2791 2710 e pesquisas científicas CAPÍTULO 26 EXCESSO Introdução Dispositivo legal e alcance Conceito Espécies Doloso culposo acidental ou exculpante Intensivo e extensivo Legítima defesa e excesso Exemplo de quesitos em crime de competência do Tribunal do Júri incluindo o excesso CAPÍTULO 27 CULPABILIDADE Introdução Conceito Culpabilidade pelo fato Fundamento da culpabilidade Evolução do conceito de culpabilidade Teoria psicológica Teoria normativa ou psicológiconormativa Teoria normativa pura Teoria adotada pelo Código Penal Teoria funcional da culpabilidade Tipo positivo e tipo negativo de culpabilidade Coculpabilidade Coculpabilidade às avessas Culpabilidade formal e culpabilidade material 2711 2712 281 282 283 284 285 286 2861 2862 2863 2864 287 2871 288 289 2810 2811 2812 28121 28122 28123 28124 28125 Graus de culpabilidade Dirimentes CAPÍTULO 28 IMPUTABILIDADE PENAL Introdução Conceito Momento para constatação da imputabilidade Sistemas ou critérios para identificação da inimputabilidade Causas de inimputabilidade Menoridade Menor de 18 anos de idade e a emancipação civil Redução da maioridade penal Crimes permanentes e superveniência da maioridade penal Menoridade penal e crimes militares Inimputabilidade por doença mental Doente mental e intervalos de lucidez Inimputabilidade por desenvolvimento mental incompleto Inimputabilidade por desenvolvimento mental retardado A perícia médica Efeitos da inimputabilidade Imputabilidade diminuída ou restrita Dispositivo legal Nomenclatura Conceito Sistema adotado Natureza jurídica 28126 2813 28131 28132 28133 28134 28135 28136 28137 28138 2814 28141 28142 28143 28144 28145 281451 281452 28146 28147 281471 28148 291 Efeitos Emoção e paixão Apontamento histórico Introdução e critério utilizado pelo Código Penal Emoção e paixão conceitos e distinções Efeitos Emoção e paixão patológicas Espécies Disposições especiais no Código Penal A questão do homicídio passional Embriaguez Conceito Denominação Embriaguez crônica ou patológica ou alcoolismo crônico Períodos fases ou etapas da embriaguez Espécies de embriaguez Quanto à intensidade Quanto à origem Embriaguez acidental completa e medida de segurança Prova da embriaguez Prova da embriaguez e o Código de Trânsito Brasileiro A teoria da actio libera in causa CAPÍTULO 29 POTENCIAL CONSCIÊNCIA DA ILICITUDE Introdução 292 293 294 2941 29411 29412 29413 29414 29415 29416 29417 29418 29419 301 302 3021 3022 303 3031 Evolução Critérios para determinação do objeto da consciência da ilicitude Exclusão Erro de proibição Introdução Desconhecimento da lei ignorantia legis Conceito de erro de proibição Efeitos escusável e inescusável Critérios para identificação da escusabilidade ou inescusabilidade do erro de proibição Espécies de erro de proibição direto indireto e mandamental Erro de proibição e crime putativo por erro de proibição Diferença entre erro de tipo e erro de proibição O erro de tipo que incide sobre a ilicitude do fato CAPÍTULO 30 EXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA Conceito Causas supralegais de exclusão da culpabilidade Origem histórica Situação atual admissibilidade e fundamentos Coação moral irresistível Dispositivo legal e incidência 3032 3033 3034 3035 304 3041 3042 3043 3044 3045 311 312 313 314 3141 3142 3143 3144 3145 315 3151 3152 316 317 Fundamento Requisitos Efeitos Temor reverencial Obediência hierárquica Dispositivo legal Conceito Fundamentos Requisitos Efeitos CAPÍTULO 31 CONCURSO DE PESSOAS Tratamento legislativo Denominação Conceito Requisitos Pluralidade de agentes culpáveis Relevância causal das condutas para a produção do resultado Vínculo subjetivo Unidade de infração penal para todos os agentes Existência de fato punível Autoria Teorias Teoria adotada pelo Código Penal Punibilidade no concurso de pessoas Cooperação dolosamente distinta 318 3181 31811 31812 31813 31814 31815 31816 31817 31818 31819 3182 31821 31822 31823 31824 31825 31826 31827 31828 31829 319 3191 Modalidades de concurso de pessoas coautoria e participação Coautoria Coautoria crimes próprios e crimes de mão própria O executor de reserva Coautoria sucessiva Coautoria em crimes omissivos A autoria mediata Autoria por determinação Autoria de escritório A teoria do domínio da organização Autoria por convicção Participação Espécies Punição do partícipe teorias da acessoriedade Participação de menor importância Participação impunível Participação por omissão Conivência Participação sucessiva Participação em cadeia ou participação da participação Participação em ação alheia Circunstâncias incomunicáveis o art 30 do Código Penal Distinção entre elementares e circunstâncias 3192 3193 3194 3195 3110 3111 31111 31112 31113 3112 31121 3113 31131 31132 321 322 323 324 3241 3242 3243 Espécies de elementares e de circunstâncias Condições de caráter pessoal As regras do art 30 do Código Penal Elementares personalíssimas e a questão do estado puerperal no infanticídio O excesso no mandato criminal Questões diversas Autoria colateral Autoria incerta Autoria desconhecida Concurso de pessoas crimes de autoria coletiva e denúncia genérica Concurso de pessoas e crimes de autoria coletiva Concurso de pessoas e crimes culposos Coautoria e crimes culposos Participação e crimes culposos PARTE III TEORIA GERAL DA PENA CAPÍTULO 32 PENA ASPECTOS GERAIS Sanção penal Conceito Princípios Teorias e finalidades Teoria absoluta e finalidade retributiva Teoria relativa e finalidades preventivas Teoria mista ou unificadora e dupla finalidade 3244 325 326 327 328 3281 3282 3283 329 3210 3211 3212 331 332 333 334 3341 3342 335 336 retribuição e prevenção Teoria agnóstica Função social da pena Fundamentos da pena Cominação das penas Classificação das penas Quanto ao bem jurídico do condenado atingido pela pena Quanto ao critério constitucional Quanto ao critério adotado pelo Código Penal Abolicionismo penal Justiça restaurativa Justiça negociada Teoria das janelas quebradas Broken windows theory CAPÍTULO 33 PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE Conceito Espécies Regimes penitenciários Fixação do regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade Regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade e crimes hediondos ou equiparados Tráfico de drogas privilegiado e Lei dos Crimes Hediondos Competência para execução da pena privativa de liberdade Jurisdicionalização da execução penal 337 338 339 3310 3311 3312 3313 3314 33141 33142 33143 33144 33145 33146 33147 33148 33149 331410 331411 Pena de reclusão Pena de detenção Pena de prisão simples Diferenças entre reclusão e detenção Penabase aplicada no mínimo legal e regime prisional mais rigoroso Impossibilidade de modificação pelo juízo da execução do regime prisional equivocadamente fixado na decisão condenatória Obrigatoriedade de prévia execução das penas mais graves Progressão de regimes Progressão especial para mulher gestante ou que for mãe ou responsável por crianças ou pessoas com deficiência Proibição da progressão por saltos Progressão e crimes contra a Administração Pública Progressão e crimes hediondos ou equiparados Requisito temporal para progressão em caso de execução conjunta por crime hediondo e crime comum Progressão e nova condenação Processamento do pedido de progressão Progressão e prática de falta grave Progressão e habeas corpus Progressão e vinculação com o crime organizado Progressão de regime prisional condenado estrangeiro e processo de expulsão em trâmite 331412 331413 331414 331415 3315 33151 33152 33153 3316 33161 33162 331621 331622 331623 331624 331625 331626 33163 33164 Progressão de regime e prisão em unidade militar Progressão de regime colaboração premiada e Lei do Crime Organizado Progressão de regime e cumprimento da pena em penitenciária federal de segurança máxima Progressão de regime custódia cautelar e termo inicial Regressão Regressão por saltos Regressão a regime mais grave do que o fixado na sentença condenatória Regressão cautelar Execução provisória Execução provisória de réu preso Execução provisória de réu solto Introdução A execução provisória da pena no direito comparado A relatividade da presunção de inocência Presunção de inocência versus efetividade da Justiça penal As vantagens proporcionadas pela execução provisória Análise do art 283 do Código de Processo Penal Execução provisória de pena aplicada em ação penal originária Execução provisória da pena imposta pelo Tribunal do Júri 33165 33166 33167 3317 33171 33172 331721 331722 3318 33181 33182 3319 33191 33192 3320 33201 33202 33203 332031 332032 332033 Execução provisória da pena e desaforamento Execução provisória de penas restritivas de direitos Execução provisória e prisão especial Autorizações de saída Permissão de saída Saída temporária Saída temporária e monitoração eletrônica Saídas temporárias automatizadas Regras do regime fechado Local de cumprimento da pena Regime Disciplinar Diferenciado RDD Regras do regime semiaberto Falta de colônia agrícola ou industrial e cumprimento da pena em estabelecimento adequado Regime semiaberto e recurso da defesa Regras do regime aberto Regime aberto e prestação de serviços à comunidade Legislação local Prisão albergue domiciliar Prisão albergue domiciliar e prisão domiciliar distinção Habeas corpus coletivo gestantes e mães presas preventivamente e substituição por prisão domiciliar Prisão domiciliar e monitoração eletrônica 332034 33204 3321 3322 3323 33231 33232 3324 33241 33242 332421 332422 33243 33244 33245 3325 33251 3326 3327 33271 33272 Monitoração eletrônica e Resolução CNPCP nº 052015 Regime aberto e crimes militares A súmula vinculante 56 aplicabilidade aos regimes semiaberto e aberto Tabela comparativa entre os regimes Regime especial Execução penal mães presas e filhos recémnascidos Proibição ou não de revista íntima Direitos do preso A questão da visita íntima Limitação ao uso de algemas Uso de algemas pela polícia para apresentação do preso à imprensa Proibição de algemas durante o trabalho de parto A separação dos presos nos estabelecimentos penais Obras emergenciais em presídios a reserva do possível e a separação dos Poderes do Estado Superlotação carcerária e responsabilidade civil do Estado Trabalho do preso Política Nacional de Trabalho no sistema prisional Legislação especial Remição Remição pelo trabalho Remição pelo estudo 33273 33274 33275 33276 3328 33281 33282 33283 33284 33285 33286 341 342 343 344 3441 345 346 347 348 Regras comuns à remição Cumulatividade da remição pelo trabalho e pelo estudo Falta grave e perda dos dias remidos Ausência de trabalho ou de estudo por falta de condições no estabelecimento penal Detração penal Competência para aplicação da detração penal e reflexos no regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade Detração penal e penas restritivas de direitos Detração penal e pena de multa Detração penal e suspensão condicional da execução da pena privativa de liberdade sursis Detração penal e prescrição Detração penal e prisão provisória em outro processo CAPÍTULO 34 APLICAÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE Conceito Pressuposto Sistemas ou critérios para aplicação da pena Elementares e circunstâncias Classificação das circunstâncias Agravantes genéricas e causas de aumento da pena Causas de aumento da pena e qualificadoras Atenuantes genéricas e causas de diminuição da pena O critério trifásico 349 3491 3492 3493 3494 3495 3496 3497 3498 3410 34101 341011 341012 341013 341014 341015 341016 341017 341018 341019 3410110 3410111 A primeira fase da dosimetria da pena fixação da penabase Culpabilidade Antecedentes Conduta social Personalidade do agente Motivos do crime Circunstâncias do crime Consequências do crime Comportamento da vítima A segunda fase da dosimetria da pena atenuantes e agravantes Reincidência art 61 I do CP Introdução Conceito Requisitos Natureza jurídica Prova da reincidência Espécies Validade da condenação anterior para fins de reincidência Extinção da punibilidade do crime anterior Terminologias reincidente primário e tecnicamente primário Efeitos da reincidência Crimes militares próprios crimes políticos e a reincidência 3410112 3410113 34102 341021 341022 341023 341024 341025 341026 341027 341028 Reincidência e maus antecedentes Reconhecimento equivocado da reincidência prejuízo ao réu e indenização pelo erro judiciário Ter o agente cometido o crime art 61 II do CP Por motivo fútil ou torpe alínea a Para facilitar ou assegurar a execução a ocultação a impunidade ou a vantagem de outro crime alínea b À traição de emboscada ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificultou ou tornou impossível a defesa do ofendido alínea c Com emprego de veneno fogo explosivo tortura ou outro meio insidioso ou cruel ou de que possa resultar perigo comum alínea d Contra descendente ascendente irmão ou cônjuge alínea e Com abuso de autoridade ou prevalecendose de relações domésticas de coabitação ou de hospitalidade ou com violência contra a mulher na forma da lei específica alínea f Com abuso de poder ou violação de dever inerente a cargo ofício ministério ou profissão alínea g Contra criança maior de 60 sessenta anos enfermo ou mulher grávida alínea h 341029 3410210 3410211 34103 341031 341032 341033 341034 34104 341041 341042 341043 341044 34105 Quando o ofendido estava sob a imediata proteção da autoridade alínea i Em ocasião de incêndio naufrágio inundação ou qualquer calamidade pública ou de desgraça particular do ofendido alínea j Em estado de embriaguez preordenada alínea l Agravantes no concurso de pessoas art 62 do CP Promove ou organiza a cooperação no crime ou dirige a atividade dos demais agentes inciso I Coage ou induz outrem à execução material do crime inciso II Instiga ou determina a cometer o crime alguém sujeito à sua autoridade ou não punível em virtude de condição ou qualidade pessoal inciso III Executa o crime ou nele participa mediante paga ou promessa de recompensa inciso IV Atenuantes genéricas arts 65 e 66 do CP Ser o agente menor de 21 vinte e um na data do fato ou maior de 70 setenta anos na data da sentença inciso I O desconhecimento da lei inciso II Ter o agente inciso III Atenuantes inominadas art 66 do CP Concurso de circunstâncias agravantes e atenuantes 341051 341052 3411 351 352 353 354 355 3551 3552 356 3561 357 358 359 3510 3511 35111 35112 genéricas Concurso entre reincidência e confissão espontânea Concurso entre promessa de recompensa e confissão espontânea A terceira fase da dosimetria da pena causas de diminuição minorantes e de aumento majorantes CAPÍTULO 35 PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS Conceito Espécies Natureza jurídica Duração das penas restritivas de direitos Requisitos Requisitos objetivos Requisitos subjetivos Crimes hediondos e equiparados e penas restritivas de direitos A problemática relacionada ao tráfico de drogas Violência doméstica ou familiar contra a mulher e penas restritivas de direitos Penas restritivas de direitos e crimes militares Momento da substituição Regras da substituição Reconversão obrigatória da pena restritiva de direitos em privativa de liberdade Reconversão da pena restritiva de direitos em privativa de liberdade e princípio da boafé objetiva Impossibilidade de reconversão da pena restritiva de 3512 3513 35131 3514 3515 35151 35152 351521 35153 351531 35154 351541 351542 351543 351544 351545 direitos em privativa de liberdade a pedido do réu Reconversão facultativa da pena restritiva de direitos em privativa de liberdade Início da execução das penas restritivas de direitos Penas restritivas de direitos e execução provisória Política Nacional de Alternativas Penais Penas restritivas de direitos em espécie Classificação Prestação pecuniária Prestação pecuniária e pena de multa distinções Perda de bens e valores Perda de bens e valores e confisco como efeito da condenação distinções Prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas Execução da prestação de serviços à comunidade Prestação de serviços à comunidade e trabalhos forçados Prestação de serviços à comunidade e crimes ambientais Ausência de local adequado para execução da prestação de serviços à comunidade Prestação de serviços à comunidade e crimes previstos no Código de Trânsito Brasileiro 35155 351551 351552 351553 351554 351555 35156 361 362 363 364 365 366 367 368 369 3610 3611 Interdição temporária de direitos Proibição de exercício de cargo função ou atividade pública bem como de mandato eletivo Proibição do exercício de profissão atividade ou ofício que dependam de habilitação especial de licença ou autorização do poder público Suspensão de autorização ou habilitação para dirigir veículo Proibição de frequentar determinados lugares Proibição de inscreverse em concurso avaliação ou exame públicos Limitação de fim de semana CAPÍTULO 36 PENA DE MULTA Conceito Fundo Penitenciário Critério adotado para a pena de multa Aplicação da pena de multa Valor ineficaz da pena de multa Multa excessiva Multa irrisória Pagamento voluntário da multa Execução da pena de multa Causas suspensivas e interruptivas da prescrição da pena de multa Pena de multa e habeas corpus 3612 3613 3614 3615 3616 3617 371 372 373 3731 3732 3733 374 3741 3742 3743 3744 3745 3746 3747 375 3751 Multa e correção monetária Suspensão da execução da multa Multa substitutiva Súmula 171 do Superior Tribunal de Justiça Pena de multa na Lei de Drogas Pena de multa e violência doméstica e familiar contra a mulher CAPÍTULO 37 CONCURSO DE CRIMES Conceito Espécies Sistemas de aplicação da pena no concurso de crimes Sistema do cúmulo material Sistema da exasperação Sistema da absorção Concurso material Conceito e dispositivo legal Espécies Momento adequado para a soma das penas Imposição cumulativa de penas de reclusão e detenção Cumulação de pena privativa de liberdade com restritiva de direitos Cumprimento sucessivo ou simultâneo de penas restritivas de direitos Concurso material e suspensão condicional do processo art 89 da Lei 90991995 Concurso formal Conceito e dispositivo legal 3752 37521 37522 3753 3754 3755 376 3761 3762 3763 3764 37641 37642 37643 37644 37645 37646 37647 3765 3766 3767 3768 3769 37610 377 Espécies Homogêneo e heterogêneo Perfeito e imperfeito Teorias sobre o concurso formal Aplicação da pena no concurso formal Concurso material benéfico Crime continuado Conceito e dispositivo legal Origem histórica Natureza jurídica Requisitos do crime continuado Pluralidade de condutas Pluralidade de crimes da mesma espécie Conexão temporal Conexão espacial Conexão modal Conexão ocasional Crime continuado e unidade de desígnio Espécies de crime continuado e dosimetria da pena Concurso material benéfico Crime continuado e conflito de leis no tempo Crime continuado e prescrição Crime continuado e suspensão condicional do processo Crime continuado e crime habitual diferenças Multa no concurso de crimes 378 3781 3782 3783 3784 381 382 383 384 385 386 391 392 393 394 3941 395 3951 3952 396 397 398 Apontamentos diversos sobre o concurso de crimes Concurso de crimes moderado ou limitado Concurso de concursos de crimes ou concorrência de concursos Concurso de crimes e competência dos Juizados Especiais Criminais Concurso entre crimes e contravenções penais CAPÍTULO 38 LIMITE DAS PENAS Introdução Fundamentos Unificação de penas Competência para unificação das penas Nova condenação e unificação das penas Fuga do réu e cumprimento da pena unificada CAPÍTULO 39 SUSPENSÃO CONDICIONAL DA PENA Origem histórica Sistemas Conceito Natureza jurídica Política Nacional de Alternativas Penais Requisitos Requisitos objetivos Requisitos subjetivos Momento adequado para concessão do sursis Espécies de sursis Condições 399 3910 3911 3912 39121 39122 39123 3913 3914 3915 3916 3917 3918 3919 3920 3921 3922 3923 3924 3925 3926 3927 Sursis incondicionado Período de prova Fiscalização das condições impostas durante o período de prova Revogação Revogação obrigatória Revogação facultativa Revogação do sursis e do livramento condicional Revogação do sursis e prévia oitiva do condenado Revogação obrigatória do sursis pela condenação irrecorrível por crime doloso durante o curso do prazo e término do período de prova Cassação do sursis Sursis sucessivos Sursis simultâneos Prorrogação do período de prova Término do período de prova e possibilidade de sua prorrogação e revogação do benefício Extinção da pena Sursis e crimes hediondos ou equiparados Sursis para estrangeiro Sursis e suspensão dos direitos políticos Sursis e habeas corpus Sursis e detração penal Sursis e indulto Sursis e regime penitenciário CAPÍTULO 40 LIVRAMENTO CONDICIONAL 401 402 403 404 405 406 407 4071 4072 408 409 4010 40101 401011 401012 40102 4011 4012 4013 4014 40141 40142 40143 40144 40145 Evolução histórica Conceito Natureza jurídica Diferenças com o sursis Juízo competente para concessão do livramento condicional Egresso Requisitos Requisitos objetivos Requisitos subjetivos Rito do livramento condicional Condições Revogação do livramento condicional Revogação obrigatória Inciso I Inciso II Revogação facultativa Suspensão do livramento condicional Prorrogação do período de prova Extinção da pena Questões diversas sobre livramento condicional Livramento condicional insubsistente Livramento condicional e habeas corpus Livramento condicional humanitário Livramento condicional cautelar Livramento condicional para estrangeiro 411 412 413 4131 4132 41321 41322 414 4141 4142 4143 4144 4145 4146 4147 4148 415 421 422 423 424 4241 4242 CAPÍTULO 41 EFEITOS DA CONDENAÇÃO Introdução Pressuposto Divisão dos efeitos da condenação Efeitos principais Efeitos secundários Efeitos secundários de natureza penal Efeitos secundários de natureza extrapenal previstos no Código Penal Efeitos da condenação previstos fora do código penal Suspensão dos direitos políticos Rescisão contratual na Justiça do Trabalho Lei de Licitações Lei de Falências Lei de Tortura Lei de Drogas Crimes resultantes de preconceitos de raça e de cor Lavagem de capitais Quadro esquemático CAPÍTULO 42 REABILITAÇÃO Conceito Origem histórica Natureza jurídica Modalidades de reabilitação no Código Penal Sigilo das condenações art 93 caput parte final Efeitos secundários de natureza extrapenal e 42421 42422 42423 425 426 4261 4262 42621 42622 427 428 429 431 432 433 4331 4332 4333 434 435 436 437 específicos da condenação art 93 parágrafo único Perda de cargo função pública ou mandato eletivo Incapacidade para o exercício do pátrio poder da tutela ou da curatela Inabilitação para dirigir veículo Reabilitação e reincidência Pressuposto e requisitos da reabilitação Pressuposto Requisitos Requisitos objetivos Requisitos subjetivos Pedido de reabilitação Revogação da reabilitação Reabilitação e habeas corpus CAPÍTULO 43 MEDIDAS DE SEGURANÇA Conceito Distinções entre pena e medida de segurança Princípios das medidas de segurança Legalidade Anterioridade Jurisdicionalidade Requisitos para aplicação Conceito de periculosidade Espécies de periculosidade Aplicação da medida de segurança 438 439 4310 4311 4312 4313 4314 4315 4316 4317 4318 441 442 443 444 4441 4442 445 4451 44511 44512 44513 44514 4452 Espécies de medidas de segurança Prazo mínimo da medida de segurança Prazo máximo da medida de segurança Execução das medidas de segurança Medida de segurança provisória ou preventiva Conversão do tratamento ambulatorial para internação Desinternação progressiva Conversão da pena em medida de segurança Direitos do internado Medidas de segurança na Lei de Drogas Adolescente infrator e medidas de segurança CAPÍTULO 44 AÇÃO PENAL Introdução Conceito Características Classificação da ação penal Divisão com base na tutela jurisdicional invocada Divisão subjetiva Condições da ação penal Condições genéricas Possibilidade jurídica do pedido Legitimidade ad causam ou legitimidade para agir Interesse processual Justa causa Condições específicas ou condições de 446 4461 4462 4463 44631 44632 447 4471 4472 4473 44731 44732 44733 44734 448 449 4410 451 452 453 procedibilidade Ação penal pública Princípios Ação penal pública incondicionada Ação penal pública condicionada Representação do ofendido e requisição do Ministro da Justiça natureza jurídica Representação do ofendido Ação penal privada Prazo Princípios Espécies Ação penal exclusivamente privada ou ação penal privada propriamente dita Ação penal privada personalíssima Ação penal privada subsidiária da pública Ação penal privada concorrente Ação penal nos crimes complexos Ação penal nos crimes contra a dignidade sexual Ação penal e crime de lesão corporaL praticado com violência doméstica e familiar contra a mulher CAPÍTULO 45 EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE Introdução O art 107 do Código Penal Momento de ocorrência antes ou depois do trânsito em julgado da condenação 454 455 456 4561 4562 45621 45622 45623 4563 4564 45641 45642 45643 4565 45651 45652 4566 4567 4568 4569 45691 45692 45693 Efeitos Extinção da punibilidade nos crimes acessórios complexos e conexos Análise do art 107 do Código Penal Morte do agente inciso I Anistia graça e indulto inciso II Anistia Graça Indulto Abolitio criminis inciso III Prescrição decadência e perempção inciso IV Prescrição Decadência Perempção Renúncia ao direito de queixa ou perdão aceito nos crimes de ação privada inciso V Renúncia ao direito de queixa Perdão aceito Retratação do agente nos casos em que a lei a admite inciso VI Inciso VII Revogado pela Lei 111062005 Inciso VIII Revogado pela Lei 111062005 Perdão judicial inciso IX Introdução Natureza jurídica Aplicabilidade 45694 45695 45696 45697 461 462 463 464 465 466 467 468 469 4691 4692 4610 46101 461011 461012 461013 461014 Incomunicabilidade Natureza jurídica da sentença concessiva do perdão judicial Distinção entre perdão judicial e escusas absolutórias Distinção entre perdão judicial e perdão do ofendido CAPÍTULO 46 PRESCRIÇÃO Introdução Origem histórica Conceito Fundamentos Natureza jurídica Alocação Imprescritibilidade penal Diferenças entre prescrição e decadência Espécies de prescrição Introdução Efeitos da prescrição e competência para sua declaração Prescrição da pena privativa de liberdade Prescrição da pretensão punitiva propriamente dita ou prescrição da ação penal Dispositivo legal Fundamento Cálculo Termo inicial 461015 461016 461017 461018 461019 4610110 4610111 4610112 46102 461021 461022 461023 461024 461025 461026 Termo inicial da prescrição da pretensão punitiva e regra especial da Lei de Falências Causas interruptivas Comunicabilidade das causas interruptivas da prescrição da pretensão punitiva Causa especial de interrupção da prescrição da pretensão punitiva nos crimes falimentares Causas impeditivas Natureza do rol das causas impeditivas e suspensivas previstas no Código Penal Causas impeditivas e suspensivas da prescrição da pretensão punitiva previstas fora do Código Penal Recurso extraordinário com repercussão geral suspensão dos processos pendentes em todo o território nacional e suspensão da prescrição Prescrição superveniente intercorrente ou subsequente Conceito Cálculo Termo inicial Motivos para sua ocorrência Momento adequado para o seu reconhecimento Redução da pena imposta pela sentença 46103 461031 461032 461033 461034 46104 461041 461042 461043 461044 461045 461046 461047 46105 4611 4612 4613 4614 4615 e pendência de recurso da acusação Prescrição retroativa Origem Cálculo Termo inicial Momento adequado para o seu reconhecimento Prescrição da pretensão executória ou prescrição da condenação Conceito Forma de contagem Termo inicial Causas interruptivas Incomunicabilidade das causas interruptivas da prescrição da pretensão executória Causa impeditiva da prescrição da pretensão executória Prescrição da pretensão executória e indulto Prescrição virtual projetada antecipada prognostical ou retroativa em perspectiva Prescrição das penas restritivas de direitos Prescrição e detração penal Prescrição das medidas de segurança Prescrição e absorção de penas Prescrição no concurso de crimes 4616 4617 46171 46172 46173 4618 Prescrição da pena de multa Prescrição na legislação penal especial Lei de Drogas Lei 113432006 Código Penal Militar Decretolei 10011969 Prescrição e Estatuto da Criança e do Adolescente Falta grave na Lei de Execução Penal e prescrição de infração disciplinar BIBLIOGRAFIA PARTE I TEORIA GERAL DO DIREITO PENAL Direito Penal é o conjunto de princípios e regras destinados a combater o crime e a contravenção penal mediante a imposição de sanção penal Na lição de Aníbal Bruno O conjunto das normas jurídicas que regulam a atuação estatal nesse combate contra o crime através de medidas aplicadas aos criminosos é o Direito Penal Nele se definem os fatos puníveis e se cominam as respectivas sanções os dois grupos dos seus componentes essenciais tipos penais e sanções É um Direito que se distingue entre os outros pela gravidade das sanções que impõe e a severidade de sua estrutura bem definida e rigorosamente delimitada1 Cuidase de ramo do Direito Público por ser composto de regras indisponíveis e obrigatoriamente impostas a todas as pessoas Além disso o Estado é o titular exclusivo do direito de punir e figura como sujeito passivo constante nas relações jurídicopenais Discutese em seara doutrinária a terminologia mais adequada Devese falar em Direito Penal ou em Direito Criminal A expressão Direito Penal induz à ideia de pena de um direito inerente exclusivamente à pena Por outro lado Direito Criminal traz à tona um direito relativo ao crime Alegase a insuficiência da denominação Direito Penal uma vez que não abrangeria a medida de segurança uma das espécies de sanção penal Destarte seria mais coerente falar em Direito Criminal mais abrangente porque enfatiza o crime e não diretamente a pena Foi a opção adotada pelo Código Criminal do Império de 1830 Como crime e pena guardam estreita relação ambas as denominações são aceitáveis Contudo é manifesta a preferência por Direito Penal não só no Brasil mas também em outros países2 Atualmente todavia afigurase mais apropriado falar em Direito Penal pois o Decretolei 2848 de 7 de dezembro de 1940 recepcionado pela Constituição Federal de 1988 como lei ordinária instituiu o Código Penal em vigor3 Para Basileu Garcia E forte motivo de ordem prática nos submete ao critério dominante Possuímos um Código Penal não um Código Criminal Deve ser aceito pois para título da matéria o sugerido pela lei positiva4 Se não bastasse a Constituição Federal de 1988 em seu art 22 I adotou também a expressão Direito Penal Sustentava Magalhães Noronha é o Direito Penal ciência cultural normativa valorativa e finalista5 É em primeiro lugar uma ciência Suas regras compõem a dogmática jurídicopenal6 Além disso é cultural pois pertence à classe das ciências do dever ser ao contrário das ciências naturais que cultuam o ser É normativa porque tem como objeto o estudo da lei penal ou seja o Direito positivo Valorativa porque estabelece a sua própria escala de valores a qual varia em conformidade com o fato que lhe dá conteúdo O Direito Penal valoriza hierarquicamente as suas normas Ainda é finalista uma vez que se preocupa com a proteção de bens jurídicos fundamentais Sua missão é prática e não simplesmente teórica ou acadêmica Se não bastasse convém mencionar que o Direito Penal tem natureza constitutiva autônoma autonomista ou originária mas também sancionatória Ou como prefere Zaffaroni é predominantemente sancionador e excepcionalmente constitutivo7 Sancionador porque não cria bens jurídicos mas acrescenta uma proteção penal aos bens jurídicos disciplinados por outras áreas do Direito O Direito Administrativo por exemplo protege os bens públicos mas o Direito Penal cria diversos crimes contra a Administração Pública para reforçar esta tutela Nada obstante pode ser constitutivo ainda que excepcionalmente quando protege interesses não regulados em outras áreas do Direito tais como o uso indevido de drogas indicando a independência do Direito Penal no tocante às demais áreas do Direito Destacase ainda como característica do Direito Penal o seu caráter fragmentário pois não tutela todos os valores ou interesses mas somente os mais importantes para a manutenção e o desenvolvimento do indivíduo e da sociedade A atividade de criminalização desempenhada pelo Estado desenvolvese em duas etapas denominadas respectivamente de criminalização primária e criminalização secundária Criminalização primária é o ato e o efeito de sancionar de uma lei primária material que incrimina ou permite a punição de determinadas pessoas Tratase de ato formal fundamentalmente programático pois quando se estabelece que uma conduta deve ser punida enunciase um programa o qual deve ser cumprido pelos entes estatais polícias Ministério Público Poder Judiciário etc De seu turno criminalização secundária é a ação punitiva exercida sobre pessoas concretas Verificase quando os órgãos estatais detectam um indivíduo a quem se atribui a prática de um ato primariamente criminalizado sobre ele recaindo a persecução penal Para Zaffaroni a criminalização secundária possui duas características seletividade e vulnerabilidade pois há forte tendência de ser o poder punitivo exercido precipuamente sobre pessoas previamente escolhidas em face de suas fraquezas a exemplo dos moradores de rua prostitutas e usuários de drogas8 Este fenômeno guarda íntima relação com o movimento criminológico conhecido como labeling approach teoria da reação social da rotulação social ou do etiquetamento social aqueles que integram a população criminosa são estigmatizados rotulados ou etiquetados como sujeitos contra quem normalmente se dirige o poder punitivo estatal O Direito é uno O ordenamento jurídico com efeito é composto pelo conjunto de normas e princípios em vigor Sua divisão em blocos se dá estritamente para fins didáticos Dessa forma o Direito Penal se relaciona com todos os demais ramos jurídicos Interessamnos contudo somente aqueles mais úteis para o seu estudo técnico e a sua aplicação teórica Vejamos É pelo processo penal que as leis penais se concretizam servindo de suporte para a sua aplicação Praticada uma infração penal cabe ao Estado identificar o seu autor a fim de lhe impor a sanção penal correspondente por meio de regras preestabelecidas as quais compõem o Direito Processual Penal A finalidade precípua do Direito Processual Penal é portanto garantir a efetiva e justa incidência ao caso concreto das leis penais objetivas Com efeito as leis penais mormente as de índole incriminadora somente podem ser aplicadas com respeito ao devido processo legal nulla poena sine judicio CF art 5º LIV Em síntese o processo é o instrumento adequado para o exercício da jurisdição O Direito Penal precisa do direito processual porque este último permite verificar caso a caso se concorrem os requisitos genéricos do fato punível conduta tipicidade antijuricidade culpabilidade e punibilidade assim como os específicos de cada tipo penal9 São tão íntimas as suas relações que o Direito Penal e o Direito Processual Penal disciplinam em conjunto diversas matérias tais como ação penal decadência e reabilitação entre outras Em nosso sistema jurídico os princípios e regras processuais penais estão contidos na Constituição Federal no Código de Processo Penal e na legislação extravagante As regras e princípios constitucionais são os parâmetros de legitimidade das leis penais e delimitam o âmbito de sua aplicação O Direito Penal deve se harmonizar com as liberdades as garantias e os direitos estatuídos pela Constituição Federal pois nela encontram o seu fundamento de validade Dessa forma qualquer lei penal ou não elaborada ou aplicada em descompasso com o texto constitucional não goza de validade Exemplo o art 5º XLVII a da Constituição Federal proíbe em situação de normalidade a pena de morte Consequentemente o Direito Penal não pode criar ou impor a pena capital seja por apelo da população seja a pedido do próprio condenado O Direito Penal desempenha função complementar das normas constitucionais Destarte a tipificação penal do homicídio tem o propósito de resguardar o direito constitucional à vida o crime de calúnia protege a honra e assim por diante Concluise pois que a definição de condutas criminosas é válida apenas quando alberga valores constitucionalmente consagrados É o que se convencionou chamar de teoria constitucionalista do delito Direito Administrativo é o conjunto de normas e princípios que regulam a organização e o funcionamento da Administração Pública bem como as suas relações com os particulares no exercício das atividades de interesse público Os arts 312 a 359 do Código Penal disciplinam os crimes contra a Administração Pública Diversas outras leis também foram editadas para a tutela penal dos interesses da Administração Pública como é o caso da Lei 86661993 Lei de Licitações e da Lei 81371990 Crimes contra a Ordem Tributária O art 327 do Código Penal fornece o conceito de funcionário público para fins penais que não guarda necessária identidade com o conceito apresentado pelo Direito Administrativo Essa relação se evidencia com a tarefa de prevenção e investigação de crimes pelas Polícias bem como com a execução da sanção penal imposta ao condenado em estabelecimentos prisionais missões reservadas à Administração Pública E como lembra Aníbal Bruno Considerese ainda que à proporção que a pena for acentuando a sua finalidade de recuperação social do criminoso mais próximo da ciência da administração irá ficando o Direito Penal10 De outra banda o Direito Administrativo se socorre aos conceitos penais de dolo e culpa nas ocorrências dos ilícitos administrativos Por derradeiro merecem destaque as leis penais em branco heterogêneas em que o preceito primário deve ser complementado por atos administrativos tal como se dá nos crimes previstos na Lei 113432006 Lei de Drogas As leis civis há longa data se relacionam com as leis penais Nas civilizações antigas inclusive confundiamse entre si Separaramse em face da necessidade de especialização na medida em que as sociedades cresceram e se desenvolveram A relação do Direito Penal com o Direito Civil se torna mais nítida quando se trata de crimes contra o patrimônio em que conceitos como propriedade posse detenção e coisa são utilizados pelos dois ramos do Direito Também os crimes contra o casamento dependem de conhecimentos referentes a regras inerentes ao Direito de Família Se não bastasse a diferença entre o Direito Penal e o Direito Civil é de grau e não de essência é dizer se o ato ilícito merecer maior reprimenda por violar interesses indispensáveis ao indivíduo ou à sociedade será cabível a atuação do Direito Penal Se contudo a infração possuir menor gravidade reservase ao Direito Civil a reparação do dano Essa distinção justifica inclusive o princípio da insignificância ou da criminalidade de bagatela Anotese que um mesmo fato pode desencadear a atuação dos dois ramos do Direito Exemplo o crime de dano CP art 163 pode ensejar tanto uma sanção penal como também uma reprimenda civil CC art 186 Falase atualmente em Direito Penal Internacional e em crimes internacionais como corolário do desenvolvimento tecnológico e da globalização fatores modernos que permitem um contato próximo e acelerado entre pessoas que estão espacialmente distantes entre si É o caso do tráfico internacional de armas ou do tráfico internacional de pessoas Essa relação se acentua com o estudo do instituto da extradição pois não raras vezes os criminosos fogem para outro país com a finalidade de evitar a aplicação da lei penal permanecendo na impunidade bem como das imunidades diplomáticas e das penas cumpridas no estrangeiro O Direito Penal não se constitui em disciplina meramente acadêmica Cuidase ao contrário de importante instrumento para a convivência dos homens em sociedade Mas não é só Possui atualmente diversas funções Vejamos as principais O Direito Penal tem como função a proteção de bens jurídicos isto é valores ou interesses reconhecidos pelo Direito e imprescindíveis à satisfação do indivíduo ou da sociedade11 Apenas os interesses mais relevantes são erigidos à categoria de bens jurídicos penais em face do caráter fragmentário e da subsidiariedade do Direito Penal O legislador seleciona em um Estado Democrático de Direito os bens especialmente relevantes para a vida social e por isso mesmo merecedores da tutela penal Dessa forma a noção de bem jurídico acarreta na realização de um juízo de valor positivo acerca de determinado objeto ou situação social e de sua importância para o desenvolvimento do ser humano E para coibir e reprimir as condutas lesivas ou perigosas a bens jurídicos fundamentais a lei penal se utiliza de rigorosas formas de reação quais sejam penas e medidas de segurança A proteção de bens jurídicos é a missão precípua que fundamenta e confere legitimidade ao Direito Penal Em conformidade com a orientação do Superior Tribunal de Justiça O respeito aos bens jurídicos protegidos pela norma penal é primariamente interesse de toda a coletividade sendo manifesta a legitimidade do Poder do Estado para a imposição da resposta penal cuja efetividade atende a uma necessidade social12 Ao Direito Penal é também reservado o controle social ou a preservação da paz pública compreendida como a ordem que deve existir em determinada coletividade Dirigese a todas as pessoas embora nem todas elas se envolvam com a prática de infrações penais Ao contrário apenas a minoria envereda pelo caminho da criminalidade seja por questões morais seja pelo receio de aplicação da lei penal Essa função embora relevante não tem se mostrado plenamente eficaz13 Por mais paradoxal que possa parecer o Direito Penal tem a função de garantia De fato funciona como um escudo aos cidadãos uma vez que só pode haver punição caso sejam praticados os fatos expressamente previstos em lei como infração penal Por esse motivo Franz von Liszt dizia o Código Penal é a Magna Carta do delinquente Também conhecida como função criadora ou configuradora dos costumes tem origem na estreita vinculação existente tradicionalmente entre a matéria penal e os valores éticos fundamentais de uma sociedade Buscase um efeito moralizador almejando assegurar um mínimo ético que deve reinar em toda a comunidade Sua atuação prática é indiscutível É o caso das leis penais sobre crimes fiscais e contra o meio ambiente as quais sem dúvida alguma contribuíram para criar uma conscientização e reprovação moral e social acerca destes comportamentos O Direito Penal desempenha a função educativa em relação aos cidadãos fomentando valores éticosociais mesmo no tocante a bens que ainda não tenham sido assumidos pela sociedade como fundamentais Discutese em doutrina se o Estado tem legitimidade para proceder a tarefas educativas com o emprego do Direito Penal em face do radicalismo da intervenção punitiva Prevalece o entendimento de que o Estado deve educar seus cidadãos mas não com o emprego do Direito Penal pois a maturidade moral se alcança pela interação social e não com estruturas autoritárias de coação A função simbólica é inerente a todas as leis não dizendo respeito somente às de cunho penal Não produz efeitos externos mas somente na mente dos governantes e dos cidadãos Em relação aos primeiros acarreta a sensação de terem feito algo para a proteção da paz pública No tocante aos últimos proporciona a falsa impressão de que o problema da criminalidade se encontra sob o controle das autoridades buscando transmitir à opinião pública a impressão tranquilizadora de um legislador atento e decidido Manifestase comumente no direito penal do terror que se verifica com a inflação legislativa Direito Penal de emergência criandose exageradamente figuras penais desnecessárias ou então com o aumento desproporcional e injustificado das penas para os casos pontuais hipertrofia do Direito Penal A função simbólica deve ser afastada pois em curto prazo cumpre funções educativas e promocionais dos programas de governo tarefa que não pode ser atribuída ao Direito Penal Além disso em longo prazo resulta na perda de credibilidade do ordenamento jurídico bloqueando as suas funções instrumentais Como pontuado por Ney Moura Teles querer combater a criminalidade com o Direito Penal é querer eliminar a infecção com analgésico14 O Direito Penal motiva os indivíduos a não violarem suas normas mediante a ameaça de imposição cogente de sanção na hipótese de ser lesado ou colocado em perigo determinado bem jurídico É como se as leis penais dissessem não matar não roubar não furtar etc O Direito Penal moderno apresenta uma nova finalidade qual seja a de reduzir ao mínimo a própria violência estatal já que a imposição de pena embora legítima representa sempre uma agressão aos cidadãos Destarte devese buscar de forma constante a incriminação de condutas somente nos casos estritamente necessários em homenagem ao direito à liberdade constitucionalmente reservado a todas as pessoas15 Para essa teoria o Direito Penal não deve se preocupar em manter os valores da sociedade em que se insere Ao revés destinase a atuar como instrumento de transformação social Não deve o Direito Penal constituirse em empecilho ao progresso e sim em ferramenta que auxilie a dinamizar a ordem social e promover as mudanças estruturais necessárias para a evolução da comunidade O crime o criminoso e a sanção penal são objeto de estudo de diversas ciências também denominadas enciclopédia de ciências penais16 Não há consenso em doutrina sobre o número e a variedade dessas ciências penais pois se discute o caráter autônomo de cada uma delas Por tal motivo e também por serem as mais importantes para provas e concursos públicos estudaremos a dogmática a criminologia e a política criminal A palavra dogmática deriva de dogma pois para o intérprete os princípios e regras ordenados metodicamente pelo Direito Penal são normas absolutas a que deve se vincular A dogmática penal tem a missão de conhecer o sentido das normas e princípios jurídicopenais positivos e desenvolver de modo sistemático o conteúdo do Direito Penal Tem as normas positivas como ponto de partida para solução dos problemas O direito é parte componente da cultura humana e deve ser interpretado de modo que lhe permita cumprir as tarefas éticas sociais e econômicas da atualidade Nesse sentido a dogmática penal é a interpretação sistematização e aplicação lógicoracional do Direito Penal Não deve entretanto ser confundida com o dogmatismo é dizer aceitação cega e sem críticas de uma verdade absoluta e imutável incompatível com a própria ideia de ciência Cuidase de ciência independente que tem por objeto a apresentação de críticas e propostas para a reforma do Direito Penal em vigor Para Basileu Garcia constitui uma ponte entre a teoria jurídicopenal e a realidade17 Visa a análise crítica e metajurídica do direito positivo no sentido de ajustálo aos ideais jurídicopenais e de justiça Encontrase intimamente relacionada com a dogmática uma vez que na interpretação e aplicação da lei penal interferem critérios de política criminal Baseiase em considerações filosóficas sociológicas e políticas e também de oportunidade em sintonia com a realidade social para propor modificações no sistema penal vigente As leis penais são frutos de uma determinada vontade política manifestada pelos cidadãos por intermédio de seus representantes junto aos Poderes do Estado Na instituição ou adoção de princípios e regras refletidas pelo sistema penal de um povo estão as marcas sensíveis de sua civilização e cultura razão pela qual podese falar em leis que pegam e leis que não pegam como demonstração da afinidade ou do divórcio entre os interesses dos indivíduos e a vontade do Estado A política criminal é o filtro para revelar esses fenômenos Para Franz von Liszt compete à Política Criminal fornecer e avaliar os critérios para se apreciar o valor do Direito vigente e revelar qual deve vigorar Cabe também a ela ensinarnos a compreender o Direito à luz de considerações extraídas dos fins a que ele se dirige e a aplicálo nos casos singulares em atenção a esses fins Em suma essa ciência analisa de forma crítica a dinâmica dos fatos sociais e comparandoa com o sistema penal vigente propõe inclusões exclusões ou mudanças visando atender o ideal de justiça colaborando pois com a Dogmática Penal Para Antonio GarcíaPablos de Molina a criminologia é uma ciência empírica e interdisciplinar que se ocupa do estudo do crime da pessoa do infrator da vítima e do controle social do comportamento delitivo e trata de ministrar uma informação válida e contrastada sobre a gênese dinâmica e variações principais do crime contemplandoo como problema individual e social assim como sobre os programas para sua prevenção especial as técnicas de intervenção positiva no homem delinquente e os diversos modelos ou sistemas de resposta ao delito18 Ocupase das circunstâncias humanas e sociais relacionadas com o surgimento a prática e a maneira de evitar o crime assim como do tratamento dos criminosos Para a maioria dos autores Lombroso foi o fundador da criminologia moderna19 O Direito Penal se dedica ao estudo das consequências jurídicas do delito A Criminologia por seu turno preocupase com os aspectos sintomáticos individuais e sociais do crime e da criminalidade isto é aborda cientificamente os fatores que podem conduzir o homem ao crime Ao fornecer informações sobre o delinquente o delito a vítima e o controle social objetos da Criminologia ela contribui com o estudo das causas do crime O Direito Penal é uma disciplina normativa que declara o que deve ser Por sua vez a Criminologia é uma ciência empírica que estuda o que é Engloba o conjunto de normas e princípios gerais aplicáveis inclusive às leis penais especiais desde que estas não possuam disposição expressa em sentido contrário art 12 do Código Penal É composto pelas normas da Parte Geral do Código Penal e excepcionalmente por algumas de amplo conteúdo previstas na Parte Especial como é o caso do conceito de domicílio art 150 4º e 5º e de funcionário público art 327 Essa denominação amplamente aceita pela doutrina já foi utilizada inclusive pelo Superior Tribunal de Justiça O Direito Penal reúne o Código Penal e as leis especiais O Código por sua vez é a matriz dessa área jurídica denominado por isso de direito penal fundamental válido para todo o Direito Penal a não ser que lei especial disponha diferentemente20 É o conjunto de normas que integram o acervo da legislação penal extravagante Exemplos Lei 94551997 crimes de tortura Lei 81371990 crimes de sonegação fiscal Lei 48981965 crimes de abuso de autoridade Lei 74921986 crimes contra o sistema financeiro nacional entre tantas outras Aplicase indistintamente a todas as pessoas É o caso do Código Penal e também de diversas leis especiais tais como o Decretolei 36881941 Lei das Contravenções Penais a Lei 15211951 Crimes contra a Economia Popular e a Lei 113432006 Drogas etc sujeitos à aplicação pela Justiça Comum Aplicase apenas às pessoas que preenchem certas condições legalmente exigidas Exemplo Código Penal Militar Decretolei 10011969 Lei 10791950 crimes de responsabilidade do Presidente da República Ministros de Estado Ministros do Supremo Tribunal Federal Procurador Geral da República Governadores e Secretários dos Estados e Decretolei 2011967 crimes de responsabilidade de prefeitos Tem incidência em todo o território nacional É o produzido pela União ente federativo com competência legislativa privativa para tanto CF art 22 I Aplicase somente sobre parte delimitada do território nacional É o Direito Penal elaborado pelos Estadosmembros desde que autorizados por lei complementar a legislar sobre questões específicas CF art 22 parágrafo único É o conjunto de leis penais em vigor ou seja todas as já produzidas e ainda não revogadas É o direito de punir o ius puniendi exclusivo do Estado o qual nasce no momento em que é violado o conteúdo da lei penal incriminadora Também conhecido como substantivo por ele se entende a totalidade de leis penais em vigor É o Direito Penal propriamente dito Denominado ainda de adjetivo é o grupo de leis processuais penais em vigor É o Direito Processual Penal a b Fonte representa não só a origem mas também a forma de manifestação do Direito Penal Por tal motivo as fontes são divididas em formais ou materiais São os órgãos constitucionalmente encarregados de elaborar o Direito Penal Essa tarefa é precipuamente da União nos moldes do art 22 I da Constituição Federal Não se pode olvidar ainda que lei complementar da União pode autorizar os Estadosmembros a legislar sobre questões específicas de interesse local CF art 22 parágrafo único São os modos pelos quais o Direito Penal se revela Subdividemse em Fonte formal imediata é a lei regra escrita concretizada pelo Poder Legislativo em consonância com a forma determinada pela Constituição Federal Em obediência ao princípio da reserva legal ou da estrita legalidade CF art 5º XXXIX e CP art 1º constituise na única fonte formal imediata do Direito Penal pois somente ela pode criar crimes e contravenções penais e cominar penas Fontes formais mediatas ou secundárias a Constituição Federal a jurisprudência a doutrina os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos os costumes os princípios gerais do Direito e os atos administrativos são apontados como fontes formais mediatas do Direito Penal Passemos à análise de cada uma dessas hipóteses A Constituição Federal situada no ápice do ordenamento jurídico brasileiro não cria crimes nem comina penas Esta tarefa é por ela acometida à lei ao incluir entre os direitos e garantias fundamentais o princípio da reserva legal ou da estrita legalidade art 5º XXXIX Porém a Lei Suprema contém inúmeras disposições aplicáveis ao Direito Penal a exemplo dos princípios da irretroatividade da lei penal art 5º XL da intransmissibilidade ou da personalidade da pena art 5º XLV e da individualização da pena art 5º XLVI sem prejuízo da previsão de diversos mandados de criminalização21 A Constituição Federal de 1988 com visão democrática e protetiva do ser humano foi especialmente detalhista ao estabelecer um amplo rol de normas destinadas a limitar o poder punitivo do Estado Por esta razão é comum falarse em Constituição Penal expressão utilizada no tocante ao conjunto de princípios e regras de Direito Penal contidas no texto constitucional A jurisprudência revela o entendimento dos tribunais sobre determinado tema jurídico servindo como vetor ao aplicador do Direito Entretanto nem sempre se reveste de natureza cogente razão pela qual não pode ser automaticamente compreendida como fonte do Direito Penal As hipóteses em que a jurisprudência funciona como fonte formal mediata do Direito Penal estão previstas no art 927 do Código de Processo Civil Art 927 Os juízes e os tribunais observarão I as decisões do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade II os enunciados de súmula vinculante22 III os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos IV os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional V a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados A vinculação a tais decisões classificadas como precedentes obrigatórios é indispensável ao bom funcionamento da Justiça Na esfera penal os Tribunais Superiores STF e STJ devem ser compreendidos como centros irradiadores da jurisprudência em âmbito nacional Por sua vez o juiz isoladamente considerado independentemente do seu cargo ou instância é uma peça no sistema de distribuição da justiça Isso não importa em reconhecer o magistrado como um subalterno do Tribunal Superior e sim em visualizar o Poder Judiciário como um sistema no qual os órgãos judiciários têm competências distintas23 Nesse contexto os precedentes obrigatórios tutelam valores fundamentais do ordenamento jurídico destacandose Segurança jurídica um dos principais alicerces do Estado Democrático de Direito confere estabilidade e certeza nas relações jurídicas e proporciona a previsibilidade das consequências jurídicas das condutas praticadas pelos membros da coletividade Igualdade a igualdade de todos perante a lei acarreta na igualdade de todos diante da prestação jurisdicional Não se admite que pessoas em idêntica ou similar situação jurídica recebam tratamentos judiciais diametralmente opostos Unidade e coerência sistêmica é inaceitável que cada magistrado juiz desembargador ou ministro ou tribunal produza de forma arbitrária e desequilibrada seu próprio Direito Penal e Proteção da confiança casos iguais ou semelhantes devem receber tratamento jurídico de igual natureza para não gerar incredulidade da população acerca da imparcialidade e da lisura da prestação jurisdicional Os autores em geral nas variadas áreas do conhecimento jurídico e não somente no Direito Penal elevam a doutrina à categoria de fonte formal mediata do Direito Penal Essa afirmação a nosso ver deve ser encarada com cautela Em primeiro lugar a doutrina por mais abalizada e respeitada que seja representa um estudo científico e não se reveste de obrigatoriedade nada obstante funcione como instrumento útil na interpretação e na aplicação prática do Direito Penal Além disso o bom senso e a lógica não permitem visualizar qualquer escrito artigo ou mesmo livro como fonte inspiradora do Direito Penal Felizmente vivemos em um país que tem o pluralismo político como um dos seus fundamentos CF art 1º inc V e consagra a liberdade de manifestação do pensamento como direito fundamental CF art 5º inc IV Tais predicados indispensáveis à democracia podem abrir espaços para abusos Basta pensar em uma doutrina sustentando preconceituosamente a pena de morte para pessoas de determinada religião ou etnia para promover uma faxina social Evidentemente não se pode conceber uma manifestação desse jaez como fonte do Direito Penal Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos somente podem ser considerados fontes formais mediatas do Direito Penal depois de terem efetivamente ingressado em nosso ordenamento jurídico com respeito a procedimento complexo destinado a esta finalidade Depois de cumpridas as etapas perante os Poderes Legislativo e Executivo terão status constitucional se aprovados em cada Casa do Congresso Nacional em dois turnos por três quintos dos votos dos respectivos membros CF art 5º 3º ou supralegal se aprovados de forma diversa Costume é a reiteração de uma conduta de modo constante e uniforme por força da convicção de sua obrigatoriedade Possui dois elementos um objetivo relativo ao fato reiteração da conduta e outro subjetivo inerente ao agente convicção da obrigatoriedade Ambos devem estar simultaneamente presentes O costume não se confunde com o hábito Deveras o último ainda que praticado reiteradamente não impõe ao agente a convicção da sua obrigatoriedade Dirigir ao volante apenas com uma das mãos pode ser um hábito de diversos motoristas mas jamais um costume Ninguém certamente reputa tal conduta como obrigatória No Direito Penal o costume nunca pode ser empregado para criar delitos ou aumentar penas A lei é a sua única fonte formal imediata Os costumes se dividem em três blocos a secundum legem ou interpretativo auxilia o intérprete a esclarecer o conteúdo de elementos ou circunstâncias do tipo penal No passado pode ser lembrada a expressão mulher honesta a qual era compreendida de diversas formas ao longo do território nacional Exemplo atual é o conceito de ato obsceno previsto no art 233 do Código Penal e mutável de acordo com as condições regionais e culturais de cada sociedade Utilizar um biquíni de pequenas proporções em uma praia é atividade normal mas seria repudiada e até mesmo considerada criminosa caso uma mulher dele se valesse no interior de uma igreja em cidade interiorana extremamente conservadora24 b contra legem ou negativo também conhecido como desuetudo é aquele que contraria a lei mas não tem o condão de revogála É o caso da contravenção penal de jogo do bicho definida pelo art 58 do Decretolei 36881941 Como já decidido pelo Superior Tribunal de Justiça Jogo do bicho Impossibilidade de absolvição em razão do costume O sistema jurídico brasileiro não admite possa uma lei perecer pelo desuso porquanto assentado no princípio da supremacia da lei escrita fonte principal do direito sua obrigatoriedade só termina com sua revogação por outra lei Noutros termos significa que não pode ter existência jurídica o costume contra legem25 Com efeito uma lei somente pode ser revogada por outra lei nos termos do art 2º 1º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro É o que se denomina de princípio da continuidade das leis c praeter legem ou integrativo supre a lacuna da lei e somente pode ser utilizado na seara das normas penais não incriminadoras notadamente para possibilitar o surgimento de causas supralegais de exclusão da ilicitude ou da culpabilidade Mencionase frequentemente a circuncisão empregada como rito religioso pelos israelitas São os valores fundamentais que inspiram a elaboração e a preservação do ordenamento jurídico No campo penal em face do império da lei como fonte formal imediata exclusiva os princípios não podem em hipótese alguma ser utilizados para tipificação de condutas ou cominação de penas Sua atuação se reserva ao âmbito das normas penais não incriminadoras Os atos administrativos no Direito Penal funcionam como complemento de algumas normas penais em branco26 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 BRUNO Aníbal Direito penal parte geral 3 ed Rio de Janeiro Forense 1967 t I p 1112 É o caso de Derecho Penal na Espanha e na Argentina de Droit Pénal na França e de Diritto Penale na Itália O Código Penal é também chamado de pergaminho penal Essa denominação foi utilizada pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina nos autos da Apelação Criminal 20060091054 Rel José Carlos Carstens Köhlher j 20032007 GARCIA Basileu Instituições de direito penal 4 ed 37 tir São Paulo Max Limonad 1975 v 1 t I p 78 NORONHA Edgard Direito penal 33 ed São Paulo Saraiva 1998 v 1 p 5 Dogmática penal encarada como a visão das leis penais em vigor o Direito em vigor É o que ensina CERNICCHIARO Luiz Vicente Estrutura do direito penal 2 ed São Paulo José Bushatsky 1976 p 115 ZAFFARONI Eugenio Raúl Manual de derecho penal 6 ed Buenos Aires Ediar 1991 p 57 ZAFFARONI Eugenio Raúl Derecho penal Parte general 2 ed Buenos Aires Ediar 2002 p 08 GOMES Luiz Flávio PABLOS DE MOLINA Antonio García BIANCHINI Alice Direito penal introdução e princípios fundamentais São Paulo RT 2007 v 1 p 72 BRUNO Aníbal Direito penal parte geral 3 ed Rio de Janeiro Forense 1967 t I p 48 Para uma análise minuciosa do assunto ROXIN Claus A proteção de bens jurídicos como função do direito penal Org e trad André Luís Callegari e Nereu José Giacomolli Porto Alegre Livraria do Advogado 2006 AgRg no REsp 887240MG rel Min Hamilton Carvalhido 6ª Turma j 26042007 REALE Miguel Instituições de direito penal parte geral 2 ed Rio de Janeiro Forense 2004 v 1 p 11 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 TELES Ney Moura Direito penal parte geral São Paulo Atlas 2004 v 1 p 46 Por não ser a abordagem minuciosa de propostas internacionais o objetivo da presente obra indicamos aos interessados a leitura de SILVA SÁNCHEZ JesúsMaría Aproximación al derecho penal contemporáneo Reimpresión Barcelona Bosch 2002 p 241310 CEREZO MIR José Derecho penal parte geral São Paulo RT 2007 p 91 GARCIA Basileu Op cit p 37 PABLOS DE MOLINA Antonio García Criminología una introducción a sus fundamentos teóricos 6 ed Santiago LexisNexis 2008 p 1 ZAFFARONI Eugenio Raúl Criminología Aproximación desde um margen Tercera reimpresión Bogotá Temis 2003 p 99 REsp 71521MG rel Min Luiz Vicente Cernicchiaro 6ª Turma j 19121996 O estudo detalhado dos mandados de criminalização encontrase no Capítulo 2 mais especificamente no item 2211 Art 103A da Constituição Federal O Supremo Tribunal Federal poderá de ofício ou por provocação mediante decisão de dois terços dos seus membros após reiteradas decisões sobre matéria constitucional aprovar súmula que a partir de sua publicação na imprensa oficial terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta nas esferas federal estadual e municipal bem como proceder à sua revisão ou cancelamento na forma estabelecida em lei Um exemplo de aplicação prática dos precedentes obrigatórios ocorreu no cancelamento pelo Superior Tribunal de Justiça da Súmula 512 em razão do entendimento adotado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no julgamento do HC 118533MS no sentido da inaplicabilidade da Lei dos Crimes Hediondos ao tráfico de drogas privilegiado Lei 113432006 art 33 4º A moral vigente não se dissocia do costume vigente Assim quando os costumes mudam avançando contra os preconceitos os conceitos morais também mudam O conceito de obsceno hoje não é mais o mesmo da inspiração do legislador do Código Penal em 1940 STJ HC 7809SP rel Min José Arnaldo da Fonseca rel p acórdão Min Edson Vidigal 5ª 25 26 Turma j 24111998 STJ REsp 1435872MG rel Min Sebastião Reis Júnior rel p acórdão Min Rogério Schietti Cruz 6ª Turma j 03062014 Essa matéria será analisada no Capítulo 7 no item 74 21 22 221 CONCEITO Princípios são os valores fundamentais que inspiram a criação e a manutenção do sistema jurídico Na clássica definição de Celso Antônio Bandeira de Mello Princípio é por definição mandamento nuclear de um sistema verdadeiro alicerce dele disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondolhes o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico É o conhecimento dos princípios que preside a intelecção das diferentes partes componentes do todo unitário que há por nome sistema jurídico positivo1 Os princípios têm a função de orientar o legislador ordinário e também o aplicador do Direito Penal no intuito de limitar o poder punitivo estatal mediante a imposição de garantias aos cidadãos A quantidade e a denominação dos princípios penais variam entre os doutrinadores Vejamos os principais e de forte incidência em provas e concursos públicos PRINCÍPIOS EM ESPÉCIE Princípio da reserva legal ou da estrita legalidade Encontrase previsto no art 5º XXXIX da Constituição Federal bem como no art 1º do Código Penal Tratase de cláusula pétrea Portanto ainda que seja extirpado do Código Penal o princípio da reserva legal continuará atuando como vetor do sistema por força do mandamento constitucional Preceitua basicamente a exclusividade da lei para a criação de delitos e contravenções penais e cominação de penas possuindo indiscutível dimensão democrática pois revela a aceitação pelo povo representado pelo Congresso Nacional da opção legislativa no âmbito criminal De fato não há crime sem lei que o defina nem pena sem cominação legal nullum crimen nulla poena sine lege No Brasil os crimes e também as contravenções penais são instituídos por leis ordinárias Em tese nada impede o desempenho dessa função pela lei complementar Mas como se sabe a Constituição Federal indica expressamente as hipóteses de cabimento de tal espécie legislativa entre as quais não se encaixam a criação de crimes e a cominação de penas É vedada a edição de medidas provisórias sobre matéria relativa a Direito Penal CF art 62 1º I alínea b seja ela prejudicial ou mesmo favorável ao réu Nada obstante o Supremo Tribunal Federal historicamente firmou jurisprudência no sentido de que as medidas provisórias podem ser utilizadas na esfera penal desde que benéficas ao agente2 Seu mais seguro antecedente histórico é a Magna Carta de João sem Terra imposta pelos barões ingleses em 1215 ao estabelecer em seu art 39 que nenhum homem livre poderia ser submetido à pena sem prévia lei em vigor naquela terra Posteriormente o princípio da reserva legal foi desenvolvido nos moldes atuais por Paul Johan Anselm Ritter von Feuerbach com base em sua teoria da coação psicológica Para ele toda imposição de pena pressupõe uma lei penal Somente a ameaça de um mal por meio da lei fundamenta a noção e a possibilidade jurídica da pena3 Aplicase não somente ao crime mas também às contravenções penais Com efeito a palavra crime foi utilizada em sentido genérico tanto pelo Código Penal como pela Constituição Federal E ainda o art 1º do Decreto lei 36881941 Lei das Contravenções Penais diz que se aplicam às contravenções as regras gerais do Código Penal quando não houver disposição em sentido contrário a qual inexiste O princípio da reserva legal possui dois fundamentos um de natureza jurídica e outro de cunho político O fundamento jurídico é a taxatividade certeza ou determinação pois implica por parte do legislador a determinação precisa ainda que mínima4 do conteúdo do tipo penal e da sanção penal a ser aplicada bem como da parte do juiz na máxima vinculação ao mandamento legal inclusive na apreciação de benefícios legais Nesse sentido é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça O princípio da reserva legal atua como expressiva limitação constitucional ao aplicador judicial da lei cuja competência jurisdicional por tal razão não se reveste de idoneidade suficiente para lhe permita a ordem jurídica ao ponto de conceder benefícios proibidos pela norma vigente sob pena de incidir em domínio reservado ao âmbito de atuação do Poder Legislativo5 Como desdobramento lógico da taxatividade o Direito Penal não tolera a analogia in malam partem Se os crimes e as penas devem estar expressamente previstos em lei é vedada a utilização de regra análoga em prejuízo do ser humano nas situações de vácuo legislativo O fundamento político é a proteção do ser humano em face do arbítrio do Estado no exercício do seu poder punitivo Enquadrase destarte entre os direitos fundamentais de 1ª geração ou dimensão A denominação do princípio merece especial cautela nas provas e nos concursos públicos A doutrina consagrou corretamente as expressões reserva legal e estrita legalidade pois somente se admite lei em sentido material matéria constitucionalmente reservada à lei e formal lei editada em consonância com o processo legislativo previsto na Constituição Federal Contudo algumas provas adotam rotineiramente o termo legalidade o que não é correto pois nele se enquadram quaisquer das espécies normativas elencadas pelo art 59 da Constituição Federal e não apenas a lei 2211 De fato se tais denominações fossem sinônimas não existiria razão para o texto constitucional utilizar dois incisos do seu art 5º para se referir ao mesmo princípio Em verdade no inc II encontrase o princípio da legalidade ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei enquanto no inc XXXIX repousa o princípio da reserva legal atribuindo à lei em sentido estrito o monopólio na criação de crimes e na cominação das penas O melhor caminho a seguir é o da coerência Se as alternativas em provas objetivas apontarem somente o princípio da legalidade adote essa nomenclatura até mesmo por exclusão Por outro lado no confronto entre legalidade e reserva legal ou estrita legalidade fique com os últimos Se a prova for dissertativa ou oral argumente sobre o assunto sempre de forma equilibrada até porque geralmente não se conhecem as preferências da banca examinadora Em hipóteses de risco a posição fundada no equilíbrio sempre é a melhor a ser acolhida Princípio da reserva legal e mandados de criminalização A Constituição Federal brasileira seguindo o modelo de algumas constituições europeias como as da Alemanha Espanha Itália França e da própria Comunidade Europeia estabelece mandados expressos ou explícitos e tácitos ou implícitos de criminalização ou penalização Cuidase de hipóteses de obrigatória intervenção do legislador penal Com efeito os mandados de criminalização indicam matérias sobre as quais o legislador ordinário não tem a faculdade de legislar mas a obrigatoriedade de tratar protegendo determinados bens ou interesses de forma adequada e dentro do possível integral Os mandados de criminalização expressos contidos na Constituição Federal são encontrados nos artigos 5 incisos XLII racismo XLIII tortura tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins terrorismo e crimes hediondos e XLIV ação de grupos armados civis ou militares contra a ordem constitucional e o Estado democrático e 3 os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados em 222 cada Casa do Congresso Nacional em dois turnos por três quintos dos votos dos respectivos membros serão equivalentes às emendas constitucionais 7 inciso X retenção dolosa do salário dos trabalhadores 227 4 abuso violência e exploração sexual da criança ou adolescente 225 condutas lesivas ao meio ambiente Para o Supremo Tribunal Federal A Constituição de 1988 contém significativo elenco de normas que em princípio não outorgam direitos mas que antes determinam a criminalização de condutas CF art 5º XLI XLII XLIII XLIV art 7º X art 227 4º Em todas essas é possível identificar um mandado de criminalização expresso tendo em vista os bens e valores envolvidos Os direitos fundamentais não podem ser considerados apenas proibições de intervenção expressando também um postulado de proteção6 Há também mandados tácitos de criminalização podendo ser citado o exemplo do necessário e urgente combate eficaz à corrupção eleitoral Alguns dos mandados de criminalização já foram atendidos pelo legislador ordinário de modo satisfatório a exemplo da Lei 132602016 que regulamentou o art 5º inc XLIII da Constituição Federal para tipificar o terrorismo outros de forma insuficiente vários simplesmente ignorados Princípio da anterioridade Decorre também do art 5º XXXIX da Constituição Federal e do art 1º do Código Penal quando estabelecem que o crime e a pena devem estar definidos em lei prévia ao fato cuja punição se pretende A lei penal produz efeitos a partir da data em que entra em vigor Daí deriva a sua irretroatividade não se aplica a comportamentos pretéritos salvo se beneficiar o réu CF art 5º XL É proibida a aplicação da lei penal inclusive aos fatos praticados durante seu período de vacatio Embora já publicada e formalmente válida a lei ainda não estará em vigor e não alcançará as condutas praticadas em tal período 223 2231 2232 Princípio da insignificância ou da criminalidade de bagatela Introdução O princípio da insignificância surgiu no Direito Romano porém limitado ao direito privado Invocavase o brocardo de minimus non curat praetor ou seja os juízes e tribunais não devem se ocupar de assuntos irrelevantes Este princípio foi incorporado ao Direito Penal somente na década de 1970 pelos estudos de Claus Roxin Também conhecido como criminalidade de bagatela sustenta ser vedada a atuação penal do Estado quando a conduta não é capaz de lesar ou no mínimo de colocar em perigo o bem jurídico tutelado pela norma penal Finalidade O princípio da insignificância fundamentado em valores de política criminal aplicação do Direito Penal em sintonia com os anseios da sociedade destinase a realizar uma interpretação restritiva da lei penal Em outras palavras o tipo penal é amplo e abrangente e o postulado da criminalidade de bagatela serve para limitar sua incidência prática Para o Supremo Tribunal Federal O princípio da insignificância é vetor interpretativo do tipo penal tendo por escopo restringir a qualificação de condutas que se traduzam em ínfima lesão ao bem jurídico nele tipo penal albergado Tal forma de interpretação inserese num quadro de válida medida de política criminal visando para além da descarcerização ao 2233 descongestionamento da Justiça Penal que deve ocuparse apenas das infrações tidas por socialmente mais graves Numa visão humanitária do Direito Penal então é de se prestigiar esse princípio da tolerância que se bem aplicado não chega a estimular a ideia de impunidade Ao tempo que se verificam patentes a necessidade e a utilidade do princípio da insignificância é imprescindível que aplicação se dê de maneira criteriosa contribuindo sempre tendo em conta a realidade brasileira para evitar que a atuação estatal vá além dos limites do razoável na proteção do interesse público7 Exemplificativamente a redação do art 155 caput do Código Penal subtrair para si ou para outrem coisa alheia móvel abarca qualquer objeto material independentemente do seu valor e da importância para seu titular Mas é evidente o Direito Penal não presta a tutelar a subtração de um grampo de cabelo ou de uma folha de papel Não há falar em crime de furto em tais situações Em suma o princípio da insignificância destinase a diminuir a intervenção do Direito Penal não podendo em hipótese alguma ampliála Natureza jurídica O princípio da insignificância é causa de exclusão da tipicidade Sua presença acarreta na atipicidade do fato Com efeito a tipicidade penal é constituída pela união da tipicidade formal com a tipicidade material Na sua incidência operase tão somente a tipicidade formal juízo de adequação entre o fato praticado na vida real e o modelo de crime descrito na norma penal Falta a tipicidade material lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico Em síntese excluise a tipicidade pela ausência da sua vertente material Na linha da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal O princípio da insignificância qualificase como fator de descaracterização material da tipicidade penal O princípio da insignificância que deve ser analisado em conexão com os postulados da fragmentariedade e da intervenção mínima do Estado em matéria penal tem o sentido de excluir ou de afastar a própria tipicidade penal 2234 22341 examinada na perspectiva de seu caráter material8 Como corolário da atipicidade do fato nada impede a concessão de ofício de habeas corpus pelo Poder Judiciário9 quando caracterizado o princípio da insignificância Além disso o trânsito em julgado da condenação não impede seu reconhecimento10 Requisitos O reconhecimento do princípio da insignificância depende de requisitos objetivos relacionados ao fato e de requisitos subjetivos vinculados ao agente e à vítima Por esta razão seu cabimento deve ser analisado no caso concreto de acordo com as suas especificidades e não no plano abstrato11 Requisitos objetivos São quatro os requisitos objetivos exigidos pelo princípio da insignificância a mínima ofensividade da conduta b ausência de periculosidade social da ação c reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e d inexpressividade da lesão jurídica Estes vetores encontramse consolidados na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal Para a incidência do princípio da insignificância devem ser relevados o valor do objeto do crime e os aspectos objetivos do fato tais como a mínima ofensividade da conduta do agente a ausência de periculosidade social da ação o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e a inexpressividade da lesão jurídica causada12 Tais requisitos são muito próximos entre si O Supremo Tribunal Federal não faz distinção entre eles E na verdade é impossível diferenciálos A explicação para esse fenômeno é simples Mais do que um princípio a insignificância penal é um fator de política criminal Portanto é necessário conferir ampla flexibilidade ao operador do Direito para aplicálo ou então para negálo sempre levando em conta as peculiaridades do caso concreto É imprescindível analisar o contexto em que a conduta foi praticada para ao final concluir se é oportuna ou não a incidência do tipo penal Este é o motivo pelo qual a jurisprudência muitas 22342 vezes apresenta resultados diversos para casos aparentemente semelhantes No âmbito dos delitos patrimoniais é fácil notar o reduzido valor do objeto material não se revela como o único parâmetro para a configuração da criminalidade de bagatela Vale a pena conhecer um interessante caso apreciado pelo Superior Tribunal de Justiça Não se aplica o princípio da insignificância ao furto de bem de inexpressivo valor pecuniário de associação sem fins lucrativos com o induzimento de filho menor a participar do ato No caso em análise teria a paciente segundo a denúncia subtraído um cofrinho contendo R 480 quatro reais e oitenta centavos da Associação dos Voluntários de Combate ao Câncer AVCC induzindo seu filho de apenas 09 anos a pegar o objeto e colocálo na sua bolsa Nesse contexto verificase que o princípio da insignificância não se aplica ao caso porquanto as características dos fatos revelam reprovabilidade suficiente para a consumação do delito embora o ínfimo valor da coisa subtraída O referido princípio se aplica a fatos dotados de mínima ofensividade desprovidos de periculosidade social de reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e que a lesão jurídica provocada seja inexpressiva Observase assim que não há falar em mínima ofensividade nem em reduzido grau de reprovabilidade do comportamento porquanto foi subtraído o bem com o induzimento do próprio filho menor da ora paciente a pegálo e lamentavelmente contra uma instituição sem fins lucrativos que dá amparo a crianças com câncer Ainda que irrelevante a lesão pecuniária provocada porque inexpressivo o valor do bem a repulsa social do comportamento é evidente13 Requisitos subjetivos Os requisitos subjetivos não dizem respeito ao fato Ao contrário relacionamse ao agente e à vítima do fato descrito em lei como crime ou contravenção penal Vejamos Condições pessoais do agente Nessa seara três situações merecem análise reincidente criminoso habitual e militar a Reincidente Existem duas posições acerca da possibilidade de aplicação do princípio da insignificância ao reincidente 1ª posição É vedada a incidência do princípio da insignificância ao reincidente Cuidase de instituto de política criminal e nesse contexto não há interesse da sociedade no deferimento do benefício àquele que já foi definitivamente condenado pela prática de uma infração penal Como já decidido pelo Supremo Tribunal Federal No HC 123108MG o paciente fora condenado à pena de um ano de reclusão e dez diasmulta pelo crime de furto simples de chinelo avaliado em R 1600 Embora o bem tenha sido restituído à vítima o tribunal local não substituíra a pena privativa de liberdade por restritiva de direitos em razão da reincidência Nesse caso o Colegiado por decisão majoritária denegou a ordem14 2ª posição Admitese o princípio da insignificância em favor do reincidente Este postulado exclui a tipicidade do fato e a reincidência agravante genérica é utilizada somente na dosimetria da pena Em outras palavras não há relevância penal tanto para o primário como para o reincidente O Superior Tribunal de Justiça tem se pronunciado nesse sentido Adequada a incidência do postulado da insignificância porquanto se trata de bens cervejas e refrigerantes avaliados em R 9025 noventa reais e vinte e cinco centavos sendo portanto mínima a ofensividade da conduta O fato de o agravado ser reincidente por si só não afasta o princípio da insignificância15 A propósito é importante destacar que o Supremo Tribunal Federal já aceitou o princípio da insignificância ao reincidente genérico excluindoo unicamente no tocante à reincidência específica A 2ª Turma concedeu habeas corpus para restabelecer sentença de primeiro grau na parte em que reconhecera a aplicação do princípio da insignificância e absolvera o ora paciente da imputação de furto CP art 155 Na espécie ele fora condenado pela subtração de um engradado com 23 garrafas de cerveja e seis de refrigerante todos vazios avaliados em R 1600 haja vista que o tribunal de justiça local afastara a incidência do princípio da bagatela em virtude de anterior condenação com trânsito em julgado pela prática de lesão corporal CP art 129 Considerou então que seria inegável a presença no caso dos requisitos para aplicação do referido postulado mínima ofensividade da conduta ausência de periculosidade social da ação reduzida reprovabilidade do comportamento e inexpressividade da lesão jurídica Afirmou ademais que considerada a teoria da reiteração não cumulativa de condutas de gêneros distintos a contumácia de infrações penais que não têm o patrimônio como bem jurídico tutelado pela norma penal a exemplo da lesão corporal não poderia ser valorada como fator impeditivo à aplicação do princípio da insignificância porque ausente a séria lesão à propriedade alheia16 b Criminoso habitual Criminoso habitual é aquele que faz da prática de delitos o seu meio de vida A ele não se permite a incidência do princípio da insignificância pois a lei penal seria inócua se tolerada a reiteração do mesmo crime seguidas vezes em frações que isoladamente não superassem um determinado valor tido como irrelevante mas o excedesse em sua totalidade Pensemos em um exemplo A subtrai diariamente R 3000 do caixa do supermercado em que trabalha Ao final de um mês terá subtraído aproximadamente R 90000 Se cada conduta fosse considerada como insignificante o furto jamais se concretizaria mesmo com a dimensão do valor final Se não bastasse o entendimento em sentido contrário representaria um autêntico incentivo ao descumprimento do Direito Penal especialmente para aqueles que fazem da criminalidade um estilo de vida Para o Supremo Tribunal Federal Para se afirmar que a insignificância pode conduzir à atipicidade é indispensável portanto averiguar a adequação da conduta do agente em seu sentido social amplo a fim de apurar se o fato imputado que é formalmente típico tem ou não relevância penal Esse contexto social ampliado certamente comporta também juízo sobre a contumácia da conduta do agente Não se pode considerar atípica por irrelevante a conduta formalmente típica de delito contra o patrimônio praticada por paciente que é costumeiro na prática de crimes da espécie17 O Supremo Tribunal Federal entretanto já acolheu o princípio da insignificância em uma hipótese excepcional de habitualidade criminosa que na verdade contemplava uma situação de furto famélico ou seja praticado para saciar a fome do agente ou de pessoa a ele ligada por laços de parentesco ou de amizade A Segunda Turma deu provimento a agravo regimental para conceder a ordem de habeas corpus a fim de absolver paciente da acusação de furto qualificado CP art 155 4º IV em face da aplicação do princípio da insignificância Para o colegiado como regra a habitualidade delitiva específica é um parâmetro que afasta a análise do valor do bem jurídico tutelado para fins de aplicação do princípio da bagatela Excepcionalmente no entanto as peculiaridades do caso concreto podem justificar a exclusão dessa restrição com base na ideia da proporcionalidade em sentido concreto Essa é justamente a situação dos autos de furto de um galo quatro galinhas caipiras uma galinha garnisé e três quilos de feijão bens avaliados em pouco mais de cem reais O valor dos bens é inexpressivo e não houve emprego de violência Enfim é caso de mínima ofensividade ausência de periculosidade social reduzido grau de reprovabilidade e inexpressividade da lesão jurídica Mesmo que conste em desfavor do paciente outra ação penal instaurada por igual conduta ainda em trâmite a hipótese é de típico crime famélico A excepcionalidade também se justifica por se tratar de hipossuficiente Não é razoável que o Direito Penal e todo o aparelho do Estadopolícia e do Estadojuiz movimentese no sentido de atribuir relevância a estas situações18 c Militares É vedada a utilização do princípio da insignificância nos crimes cometidos por militares em face da elevada reprovabilidade da conduta da autoridade e da hierarquia que regulam a atuação castrense bem como do desprestígio ao Estado responsável pela segurança pública Na visão do Supremo Tribunal Federal A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal ressalvada a posição pessoal do relator não admite a aplicabilidade aos crimes militares do princípio da insignificância mesmo que se trate de crime de posse de substância entorpecente em quantidade ínfima para uso próprio cometido no interior de Organização Militar19 Condições da vítima A configuração do princípio da insignificância também depende das condições do ofendido Há que se conjugar a importância do objeto material para a vítima levandose em consideração a sua condição econômica o valor sentimental do bem como também as circunstâncias e o resultado do crime tudo de modo a determinar subjetivamente se houve relevante lesão Nas lições do Supremo Tribunal Federal Já do ângulo da vítima o exame da relevância ou irrelevância penal deve atentar para o seu peculiarmente reduzido sentimento de perda por efeito da conduta do agente a ponto de não experimentar revoltante sensação de impunidade ante a não incidência da norma penal que a princípio lhe favorecia20 Não há dúvida sobre a existência de uma relação diretamente proporcional para estabelecimento da importância do bem para a vítima entre a sua condição econômica e o valor do objeto material Vejamos um exemplo O agente subtrai uma bicicleta velha e repleta de defeitos quase sem nenhum valor econômico Certamente não se pode falar em lesão patrimonial a uma pessoa dotada de alguma riqueza e será cabível o princípio da insignificância Mas se a vítima é um servente de pedreiro pilar de família e pai de 5 filhos que utiliza a bicicleta para atravessar a cidade e trabalhar diariamente em uma construção estará caracterizado o furto sem espaço para a criminalidade de bagatela21 Portanto a análise da extensão do dano causado ao ofendido é imprescindível para aquilatar a pertinência do princípio da insignificância22 O valor sentimental do bem para a vítima impede a utilização da insignificância ainda que o objeto material do crime não apresente relevante 2235 aspecto econômico A propósito o Supremo Tribunal Federal afastou este princípio na subtração de um Disco de Ouro de músico brasileiro considerando também a infungibilidade da coisa23 Ainda em razão da dimensão do dano não se aplica o princípio da insignificância quando a conduta do agente atingir bem de grande relevância para a população a exemplo do dano em aparelho de telefone público Em situações desse jaez as consequências do ato perpetrado transcendem a esfera patrimonial da concessionária de serviço público em face da privação causada à coletividade especialmente das pessoas mais carentes no plano econômico as quais ficam alijadas do meio público de comunicação24 Aplicabilidade O princípio da insignificância é aplicável a qualquer delito que seja com ele compatível e não somente aos crimes patrimoniais Sua maior incidência prática ocorre no furto CP art 155 caput mas é evidente que a este não se limita25 A propósito é importante destacar que no âmbito dos crimes contra o patrimônio não há um valor máximo teto a limitar a incidência do princípio da insignificância Sua análise há de ser efetuada levandose em conta o contexto em que se deu a prática da conduta especialmente a importância do objeto material a condição econômica da vítima as circunstâncias do fato e o resultado produzido bem como as características pessoais do agente26 Porém há delitos que são logicamente incompatíveis com a criminalidade de bagatela É o que se verifica nos crimes hediondos e equiparados tráfico de drogas tortura e terrorismo no racismo e na ação de grupos armados civis ou militares contra a ordem constitucional e o Estado Democrático Tais crimes de máximo potencial ofensivo receberam um tratamento mais rigoroso do Poder Constituinte Originário CF art 5º XLII XLIII e XLIV Em outras palavras a Lei Suprema teve o cuidado de deixar inequívoca a sua intenção de punir com maior gravidade os responsáveis por delitos desta estirpe circunstância indicativa da relevância penal destes fatos e automaticamente impeditiva do princípio da insignificância Vejamos as principais situações em que se discute a incidência ou a proibição do reconhecimento da criminalidade de bagatela a Roubo e demais crimes cometidos com grave ameaça ou violência à pessoa Não há espaço para o princípio da insignificância pois os reflexos derivados destes crimes não podem ser considerados irrelevantes ainda que o objeto material apresente ínfimo valor econômico Especificamente no tocante ao roubo o Superior Tribunal de Justiça assim se pronunciou Não há como aplicar ao crime de roubo o princípio da insignificância pois tratandose de delito complexo em que há ofensa a bens jurídicos diversos o patrimônio e a integridade da pessoa é inviável a afirmação do desinteresse estatal à sua repressão27 b Crimes contra a Administração Pública Em uma visão tradicional o princípio da insignificância jamais foi admitido nos crimes contra a Administração Pública pois em tais delitos ainda que a lesão econômica seja irrisória há ofensa à moralidade administrativa e à probidade dos agentes públicos Este é o entendimento consagrado na Súmula 599 do Superior Tribunal de Justiça O princípio da insignificância é inaplicável aos crimes contra a Administração Pública O Supremo Tribunal Federal contudo já decidiu em sentido contrário admitindo o princípio da insignificância em hipóteses extremas28 É a posição a que nos filiamos29 Exemplificativamente não há falar em peculato CP art 312 quando o funcionário público se apropria de poucas folhas em branco ou de alguns clips de metal pertencentes a determinado órgão público Não é legítima a utilização do Direito Penal em tais hipóteses Eventuais ilícitos de baixíssima gravidade devem ser enfrentados na instância administrativa c Crimes previstos na Lei 113432006 Lei de Drogas Os crimes tipificados na Lei 113432006 Lei de Drogas são de perigo abstrato ou presumido e tutelam a saúde pública No tráfico de drogas delito constitucionalmente equiparado a hediondo é indiscutível a inadmissibilidade do princípio da insignificância E igual raciocínio deve ser utilizado na posse de droga para consumo pessoal pois entendimento diverso seria equivalente a descriminalizar contra o espírito da lei o porte de pequenas quantidades de drogas30 Na linha da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça Não é possível afastar a tipicidade material do porte de substância entorpecente para consumo próprio com base no princípio da insignificância ainda que ínfima a quantidade de droga apreendida A despeito da subsunção formal de determinada conduta humana a um tipo penal é possível se vislumbrar atipicidade material da referida conduta por diversos motivos entre os quais a ausência de ofensividade penal do comportamento em análise Isso porque além da adequação típica formal deve haver uma atuação seletiva subsidiária e fragmentária do Direito Penal conferindose maior relevância à proteção de valores tidos como indispensáveis à ordem social a exemplo da vida da liberdade da propriedade do patrimônio quando efetivamente ofendidos A par disso frisese que o porte ilegal de drogas é crime de perigo abstrato ou presumido visto que prescinde da comprovação da existência de situação que tenha colocado em risco o bem jurídico tutelado Assim para a caracterização do delito descrito no art 28 da Lei 113432006 não se faz necessária a ocorrência de efetiva lesão ao bem jurídico protegido bastando a realização da conduta proibida para que se presuma o perigo ao bem tutelado Isso porque ao adquirir droga para seu consumo o usuário realimenta o comércio ilícito contribuindo para difusão dos tóxicos Ademais após certo tempo e grau de consumo o usuário de drogas precisa de maiores quantidades para atingir o mesmo efeito obtido quando do início do consumo gerando assim uma compulsão quase incontrolável pela próxima dose Nesse passo não há como negar que o usuário de drogas ao buscar alimentar o seu vício acaba estimulando diretamente o comércio ilegal de drogas e com ele todos os outros crimes relacionados ao narcotráfico homicídio roubo corrupção tráfico de armas etc O consumo de drogas ilícitas é proibido não apenas pelo mal que a substância faz ao usuário mas também pelo perigo que o consumidor dessas gera à sociedade Essa ilação é corroborada pelo expressivo número de relatos de crimes envolvendo violência ou grave ameaça contra pessoa associados aos efeitos do consumo de drogas ou à obtenção de recursos ilícitos para a aquisição de mais substância entorpecente Portanto o objeto jurídico tutelado pela norma em comento é a saúde pública e não apenas a saúde do usuário visto que sua conduta atinge não somente a sua esfera pessoal mas toda a coletividade diante da potencialidade ofensiva do delito de porte de entorpecentes Além disso a reduzida quantidade de drogas integra a própria essência do crime de porte de substância entorpecente para consumo próprio visto que do contrário poderseia estar diante da hipótese do delito de tráfico de drogas previsto no art 33 da Lei 113432006 Vale dizer o tipo previsto no art 28 da Lei 113432006 esgotase simplesmente no fato de o agente trazer consigo para uso próprio qualquer substância entorpecente que possa causar dependência sendo por isso mesmo irrelevante que a quantidade de drogas não produza concretamente danos ao bem jurídico tutelado Por fim não se pode olvidar que o legislador ao editar a Lei 113432006 optou por abrandar as sanções cominadas ao usuário de drogas afastando a possibilidade de aplicação de penas privativas de liberdade e prevendo somente as sanções de advertência de prestação de serviços à comunidade e de medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo conforme os incisos do art 28 do referido diploma legal a fim de possibilitar a sua recuperação Dessa maneira a intenção do legislador foi a de impor ao usuário medidas de caráter educativo objetivando assim alertálo sobre o risco de sua conduta para a sua saúde além de evitar a reiteração do delito Nesse contexto em razão da política criminal adotada pela Lei 113432006 há de se reconhecer a tipicidade material do porte de substância entorpecente para consumo próprio ainda que ínfima a quantidade de droga apreendida31 O Supremo Tribunal Federal todavia já decidiu em sentido diverso acolhendo o princípio da insignificância no crime catalogado no art 28 da Lei 113432006 Ao aplicar o princípio da insignificância a 1ª Turma concedeu habeas corpus para trancar procedimento penal instaurado contra o réu e invalidar todos os atos processuais desde a denúncia até a condenação por ausência de tipicidade material da conduta imputada No caso o paciente fora condenado com fulcro no art 28 caput da Lei 113432006 à pena de 3 meses e 15 dias de prestação de serviços à comunidade por portar 06 g de maconha Destacouse que a incidência do postulado da insignificância de modo a tornar a conduta atípica exigiria o preenchimento concomitante dos seguintes requisitos mínima ofensividade da conduta do agente nenhuma periculosidade social da ação reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e inexpressividade da lesão jurídica provocada Consignouse que o sistema jurídico exigiria considerar a relevantíssima circunstância de que a privação da liberdade e a restrição de direitos do indivíduo somente se justificariam quando estritamente necessárias à própria proteção das pessoas da sociedade e de outros bens jurídicos que lhes fossem essenciais notadamente naqueles casos em que os valores penalmente tutelados se expusessem a dano efetivo ou potencial impregnado de significativa lesividade Deste modo o direito penal não deveria se ocupar de condutas que produzissem resultados cujo desvalor por não importar em lesão significativa a bens jurídicos relevantes não representaria por isso mesmo expressivo prejuízo seja ao titular do bem jurídico tutelado seja à integridade da própria ordem social32 d Descaminho e crimes tributários federais O princípio da insignificância também incide nos crimes federais de natureza tributária especialmente no descaminho CP art 334 quando o tributo devido não ultrapassa o valor de R 2000000 vinte mil reais Essa conclusão baseiase no art 20 da Lei 105222002 atualizado pelas Portarias do Ministério da Fazenda 752012 e 1302012 atinentes à inscrição de débitos na Dívida Ativa da União e ao ajuizamento de execuções fiscais pela ProcuradoriaGeral da Fazenda Nacional Art 2º O Procurador da Fazenda Nacional requererá o arquivamento sem baixa na distribuição das execuções fiscais de débitos com a Fazenda Nacional cujo valor consolidado seja igual ou inferior a R 2000000 vinte mil reais desde que não conste dos autos garantia integral ou parcial útil à satisfação do crédito Portaria MF 752012 com a redação alterada pela Portaria MF 1302012 Os Tribunais Superiores consequentemente firmaram jurisprudência no sentido de que não se admite seja uma conduta irrelevante no âmbito fiscal não cobrança do tributo pela União e simultaneamente típica no Direito Penal pois este somente deve atuar quando extremamente necessário para a tutela do bem jurídico protegido quando falharem os outros meios de proteção e não forem suficientes as tutelas estabelecidas nos demais ramos do Direito Na visão do Supremo Tribunal Federal Aplicase o princípio da insignificância ao crime de descaminho quando o montante do tributo não recolhido for inferior ao limite de R 2000000 valor estipulado pelo art 20 Lei 105222002 atualizado pelas portarias 75 e 1302012 do Ministério da Fazenda Com base nesse entendimento a Segunda Turma concedeu ordem de habeas corpus para declarar a atipicidade da conduta prevista no art 334 do Código Penal e trancar a ação penal No caso o paciente introduziu mercadorias estrangeiras no território nacional sem o recolhimento dos tributos devidos calculados em R 197504133 Entretanto é preciso consignar a existência de decisão do Supremo Tribunal Federal em sentido contrário pela inaplicabilidade do princípio da insignificância ao descaminho com o fundamento de que a legislação relativa à execução fiscal não produz reflexos no âmbito penal A Primeira Turma por maioria indeferiu habeas corpus em que se discutia a aplicação do princípio da insignificância ao crime de descaminho quando o montante do tributo não recolhido for inferior ao limite de R 2000000 valor fixado na Portaria 752012 do Ministério da Fazenda para o ajuizamento de ações fiscais No caso o paciente introduziu mercadorias estrangeiras no território nacional sem o recolhimento dos tributos devidos calculados em R 1436451 A Turma entendeu não incidir o princípio da insignificância Asseverou que a lei que disciplina o executivo fiscal não repercute no campo penal Tal entendimento com maior razão deve ser adotado em relação à portaria do Ministério da Fazenda O art 935 do Código Civil explicita a independência das esferas civil penal e administrativa A repercussão no âmbito penal se dá apenas quando decisão proferida em processocrime declarar a inexistência do fato ou da autoria34 Para quem admite o princípio da insignificância nos crimes tributários mais uma observação deve ser efetuada O limite imposto pela Lei 105222002 atualizado pelas Portarias MF 752012 e 1302012 alcança somente os tributos federais Com efeito para os tributos estaduais e municipais deve existir previsão específica por cada ente federativo no exercício da respectiva competência tributária De fato para a aplicação desse teto aos delitos tributários concernentes a tributos que não sejam da competência da União seria necessária a existência de lei do ente federativo competente porque a arrecadação da Fazenda Nacional não se equipara à dos demais entes federativos Ademais um dos requisitos indispensáveis à aplicação do princípio da insignificância é a inexpressividade da lesão jurídica provocada que pode se alterar de acordo com o sujeito passivo35 É curioso destacar que na apropriação indébita previdenciária CP art 168A a qual nada obstante capitulada entre os crimes contra o patrimônio apresenta indiscutível natureza tributária o Supremo Tribunal Federal já rechaçou o princípio da insignificância com fundamento no valor supraindividual do bem jurídico tutelado o que torna irrelevante o pequeno valor das contribuições sociais desviadas da Previdência Social36 e Contrabando O princípio da insignificância não é aplicável ao delito de contrabando tipificado no art 334A do Código Penal em face da natureza proibida da mercadoria importada ou exportada Este crime não tem natureza tributária Outros bens jurídicos são tutelados a exemplo da saúde da moralidade administrativa e da ordem pública Em síntese não se pode reputar insignificante a entrada ou saída ilícita do território nacional de produto classificado como proibido pelas autoridades brasileiras Para o Supremo Tribunal Federal A 2ª Turma denegou habeas corpus em que se requeria a aplicação do princípio da insignificância em favor de pacientes surpreendidos ao portarem cigarros de origem estrangeira desacompanhados de regular documentação Em seguida asseverouse que a conduta configuraria contrabando uma vez que o objeto material do delito em comento tratarseia de mercadoria proibida No entanto reputouse que não se cuidaria de tão somente sopesar o caráter pecuniário do imposto sonegado mas principalmente de tutelar entre outros bens jurídicos a saúde pública Por fim consignouse não se aplicar à hipótese o princípio da insignificância pois neste tipo penal o desvalor da ação seria maior37 O Superior Tribunal de Justiça contudo já admitiu o princípio na insignificância em situações excepcionais a exemplo da importação proibida de pequena quantidade de medicamento para uso próprio38 f Crimes ambientais Em uma primeira análise o princípio da insignificância soa como incompatível com os delitos ambientais em face da natureza difusa e da relevância do bem jurídico protegido reservado inclusive às futuras gerações39 Em situações excepcionais contudo há espaço para a criminalidade de bagatela Como já decidido pelo Supremo Tribunal Federal A Segunda Turma em conclusão de julgamento reputou improcedente acusação formulada contra deputado federal pela suposta prática do crime previsto no art 34 caput da Lei 96051998 Pescar em período no qual a pesca seja proibida ou em lugares interditados por órgão competente Pena detenção de um ano a três anos ou multa ou ambas as penas cumulativamente No caso de acordo com o relatório de fiscalização a autoridade ambiental abordara o deputado e outras duas pessoas em embarcação fundeada em área marítima pertencente à unidade de conservação federal de proteção integral Em seguida reputou não existir no caso concreto o requisito da justa causa a propiciar o prosseguimento da ação penal especialmente pela mínima ofensividade da conduta do agente pela ausência de periculosidade social da ação pelo reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e pela inexpressividade da lesão jurídica provocada Assim apesar de a conduta do denunciado amoldarse à tipicidade formal e subjetiva não haveria a tipicidade material consistente na relevância penal da conduta e no resultado típico em razão da insignificância da lesão produzida no bem jurídico tutelado A jurisprudência seria no sentido da aplicabilidade do princípio da insignificância aos crimes ambientais tanto com relação aos de perigo concreto em que haveria dano efetivo ao bem jurídico tutelado quanto aos de perigo abstrato como no art 34 caput da Lei 96051998 No processo em exame não se produzira prova material de qualquer dano efetivo ao meio ambiente Ademais mesmo diante de crime de perigo abstrato não seria possível dispensar a verificação in concreto do perigo real ou mesmo potencial da conduta praticada pelo acusado com relação ao bem jurídico tutelado Esse perigo real não se verificaria na espécie vertente Portanto seria imperioso assentar a atipicidade material da conduta pela completa ausência de ofensividade ao bem jurídico tutelado pela norma penal O acusado estaria em pequena embarcação quando teria sido surpreendido em contexto de pesca rústica com vara de pescar linha e anzol Não estaria em barco grande munido de redes arrasto nem com instrumentos de maior potencialidade lesiva ao meio ambiente40 g Crimes contra a fé pública Nos crimes contra a fé pública o bem jurídico tutelado é a credibilidade depositada nos documentos nos sinais e símbolos empregados nas relações indispensáveis à vida em sociedade Em face desta dimensão não há espaço para o princípio da insignificância41 A propósito o Supremo Tribunal Federal assim se manifestou no tocante ao crime de moeda falsa em situação envolvendo dez notas de pequeno valor A aplicação do princípio da insignificância de modo a tornar a conduta atípica depende de que esta seja a tal ponto despicienda que não seja razoável a imposição da sanção Mostrase todavia cabível na espécie a aplicação do disposto no art 289 1º do Código Penal pois a fé pública a que o Título X da Parte Especial do CP se refere foi vulnerada Em relação à credibilidade da moeda e do sistema financeiro o tipo exige apenas que estes bens sejam colocados em risco para a imposição da reprimenda42 h Tráfico internacional de arma de fogo O tráfico internacional de arma de fogo definido no art 18 da Lei 108262003 Estatuto do Desarmamento não comporta o princípio da insignificância pois se trata de crime de perigo abstrato e atentatório à segurança pública Para o Supremo Tribunal Federal A objetividade jurídica da norma penal transcende a mera proteção da incolumidade pessoal para alcançar também a tutela da liberdade individual e do corpo social como um todo asseguradas ambas pelo incremento dos níveis de segurança coletiva que a lei propicia No caso em exame a proibição da conduta pela qual o paciente está sendo processado visa especialmente combater e prevenir o tráfico internacional de armas e munições cuja maior clientela é o crime organizado transnacional que via de regra abastece o seu arsenal por meio do mercado ilegal nacional ou internacional de armas Mostrase irrelevante no caso cogitarse da mínima ofensividade da conduta em face da quantidade apreendida ou também da ausência de periculosidade da ação porque a hipótese é de crime de perigo abstrato para o qual não importa o resultado concreto da ação o que também afasta a possibilidade de aplicação do princípio da insignificância43 i Porte ilegal de munição Não se admite a incidência do princípio da insignificância ao delito de porte ilegal de munição de uso permitido Lei 108262003 Estatuto do Desarmamento art 14 caput independentemente do calibre da arma de fogo e do número de projéteis apreendidos Para o Supremo Tribunal Federal A Primeira Turma denegou a ordem em habeas corpus no qual se pretendia o reconhecimento da atipicidade material da conduta do paciente caracterizada pelo porte ilegal de munição de uso permitido art 14 caput da Lei 108632003 No caso o paciente foi condenado à pena de dois anos e dois meses de reclusão em regime aberto e ao pagamento de 11 diasmulta em razão do porte de projétil de arma de fogo A pena privativa foi substituída por duas restritivas de direito A defesa alegava ser irrelevante a conduta praticada pelo paciente bem como estarem presentes todos os requisitos exigidos pela Corte para a incidência do princípio da bagatela Destacava a existência de precedentes deste Tribunal nos quais assentada a aplicabilidade desse princípio a delitos de perigo abstrato porte de drogas para consumo desenvolvimento de atividade clandestina de telecomunicações pesca irregular e moeda falsa por exemplo Apontava ademais a desproporcionalidade entre a conduta do paciente e a reprimenda imposta Para o Colegiado porém a configuração da conduta tipificada no art 14 caput da Lei 108262003 Art 14 Portar deter adquirir fornecer receber ter em depósito transportar ceder ainda que gratuitamente emprestar remeter empregar manter sob guarda ou ocultar arma de fogo acessório ou munição de uso permitido sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar não depende do tipo ou da quantidade da munição portada pelo agente44 j Rádio pirata O Supremo Tribunal Federal não tem admitido o princípio da insignificância no desenvolvimento de atividade de radiofrequência sem autorização do órgão regulador ainda que sejam de baixa frequência as ondas de radiodifusão emitidas pela rádio clandestina por se tratar de delito formal e de perigo abstrato pois compromete a regularidade do sistema de telecomunicações independentemente da comprovação de qualquer prejuízo45 É também a posição estampada na Súmula 606 do Superior Tribunal de Justiça Não se aplica o princípio da insignificância a casos de transmissão clandestina de sinal de internet via radiofrequência que caracteriza o fato típico previsto no art 183 da Lei 94721997 k Atos infracionais Atos infracionais são os crimes e as contravenções penais cometidos por crianças ou adolescentes É o que se extrai do art 103 da Lei 80691990 Estatuto da Criança e do Adolescente E dependendo da natureza do ato infracional o Supremo Tribunal Federal aceita a incidência do princípio da insignificância46 O raciocínio é simples Se para um indivíduo maior de idade é cabível o reconhecimento da criminalidade de bagatela para um menor de 18 anos também o será l Evasão de divisas No crime de evasão de divisas praticado mediante operação da modalidade dólarcabo tipificado no art 22 parágrafo único 1ª parte da Lei 74921986 Crimes contra o Sistema Financeiro Nacional não se aplica o teto de R 1000000 previsto na Lei 105222002 como parâmetro para incidência do princípio da insignificância Na linha da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça Nos casos de evasão de divisas praticada mediante operação do tipo dólarcabo não é possível utilizar o valor de R 10 mil como parâmetro para fins de aplicação do princípio da insignificância Conforme entendimento adotado pelo STF na AP 470 as transações conhecidas como operações dólarcabo nas quais são efetuados pagamentos em reais no Brasil com o objetivo de disponibilizar por meio de quem recebe tal pagamento o respectivo montante em moeda estrangeira no exterior preenchem os elementos do delito de evasão de divisas na forma do art 22 parágrafo único primeira parte da Lei n 74921986 que tipifica a conduta daquele que a qualquer título promove sem autorização legal a saída de moeda ou divisa para o exterior As regras que disciplinam a transferência internacional de valores e que portanto estabelecem o significado de saída de divisa ou moeda sem autorização legal são diversas em relação à saída física e à saída eletrônica Para bem compreender tais diferenças transcrevese integralmente o art 65 da Lei n 90691995 com a redação vigente à época dos fatos Art 65 O ingresso no País e a saída do País de moeda nacional e estrangeira serão processados exclusivamente através de transferência bancária cabendo ao estabelecimento bancário a perfeita identificação do cliente ou do beneficiário 1º Excetuase do disposto no caput deste artigo o porte em espécie dos valores I quando em moeda nacional até R 1000000 dez mil reais II quando em moeda estrangeira o equivalente a R 1000000 dez mil reais III quando comprovada a sua entrada no País ou sua saída do País na forma prevista na regulamentação pertinente 2º O Conselho Monetário Nacional segundo diretrizes do Presidente da República regulamentará o disposto neste artigo dispondo inclusive sobre os limites e as condições de ingresso no País e saída do País da moeda nacional 3º A não observância do contido neste artigo além das sanções penais previstas na legislação específica e após o devido processo legal acarretará a perda do valor excedente dos limites referidos no 1º deste artigo em favor do Tesouro Nacional O referido dispositivo excetua apenas o porte em espécie do valor de até R 10 mil ou o equivalente em moeda estrangeira além de remeter ao estabelecimento de outras hipóteses na forma prevista na regulamentação pertinente Assim não prospera a tese de que deve ser considerado atípico o envio de moeda ou divisas ao exterior se o volume de cada operação não exceder a R 10 mil Isso porque em primeiro lugar ressalvada a hipótese do porte de valores em espécie o ingresso no país e a saída do país de moeda nacional e estrangeira serão processados exclusivamente através de transferência bancária cabendo ao estabelecimento bancário a perfeita identificação do cliente ou do beneficiário art 65 caput da Lei n 90691995 Ou seja a legislação excepcionou em relação ao valor inferior a R 10 mil ou seu equivalente em moeda estrangeira apenas a saída física de moeda No caso de transferência eletrônica saída meramente escritural da moeda a lei exige de forma exclusiva o processamento através do sistema bancário com perfeita identificação do cliente ou beneficiário Além disso no caso da transferência clandestina internacional por meio de operações do tipo dólarcabo ou equivalente existe uma facilidade muito grande na realização de centenas ou até milhares de operações fragmentadas sequenciais É muito mais simples do que a transposição física por diversas vezes das fronteiras do país com valores inferiores a R 10 mil Admitir a atipicidade das operações do tipo dólarcabo com valores inferiores a R 10 mil é fechar a janela mas deixar a porta aberta para a saída clandestina de divisas47 m Violência doméstica ou familiar contra a mulher Não se aplica o princípio da insignificância em qualquer dos crimes 2236 praticados com violência doméstica ou familiar contra a mulher Para o Supremo Tribunal Federal Inadmissível a aplicação do princípio da insignificância aos delitos praticados em situação de violência doméstica Com base nessa orientação a Segunda Turma negou provimento a recurso ordinário em habeas corpus no qual se pleiteava a incidência de tal princípio ao crime de lesão corporal cometido em âmbito de violência doméstica contra a mulher Lei 113402006 Lei Maria da Penha48 Esse entendimento também se encontra consolidado na Súmula 589 do Superior Tribunal de Justiça É inaplicável o princípio da insignificância nos crimes ou contravenções penais praticados contra a mulher no âmbito das relações domésticas Princípio da insignificância e infrações penais de menor potencial ofensivo Não se pode confundir a criminalidade de bagatela com as infrações penais de menor potencial ofensivo definidas pelo art 61 da Lei 90991995 a saber todas as contravenções penais e os crimes com pena privativa de liberdade em abstrato igual ou inferior a dois anos Nessas últimas não há falar em automática insignificância da conduta notadamente porque a situação foi expressamente prevista no art 98 I da Constituição Federal e regulamentada posteriormente pela legislação ordinária revelando a existência de gravidade suficiente para justificar a intervenção estatal Na dicção do Supremo Tribunal Federal Ao prever por exemplo a categoria de infrações de menor potencial ofensivo inciso I do art 98 a Constituição Federal logicamente nega a significância penal de tudo que ficar aquém desse potencial de logo rotulado de menor ou seja quando a Constituição Federal concebe a categoria das infrações de menor potencial ofensivo parece mesmo que o faz na perspectiva de uma conduta atenuadamente danosa para a vítima e a sociedade é certo mas ainda assim em grau suficiente de lesividade para justificar uma reação estatal punitiva Pelo que estabelece um vínculo operacional direto entre o efetivo dano ao bem jurídico tutelado 2237 2238 por menor que seja e a necessidade de uma resposta punitiva do Estado49 A questão do furto privilegiado No campo do furto é preciso distinguir o princípio da insignificância da figura privilegiada CP art 155 2º Nesta a coisa é de pequeno valor inferior a um salário mínimo enquanto naquele seu valor é irrelevante para o Direito Penal por não colocar em risco o bem jurídico penalmente tutelado Para o Supremo Tribunal Federal É necessário distinguir o furto insignificante daquele referente à subtração de bem de pequeno valor de modo a não estimular a prática de condutas criminosas e obstar a aplicação da figura do furto privilegiado previsto no art 155 2º do Código Penal No caso o valor dos bens subtraídos não pode ser considerado ínfimo de modo a caracterizar a conduta como minimamente ofensiva Conforme destacou o Superior Tribunal de Justiça os bens subtraídos foram avaliados em 22500 duzentos e vinte e cinco reais aproximadamente 65 do valor do salário mínimo vigente à época dos fatos R 35000 não havendo que se falar em irrelevância da conduta Precedentes50 Este raciocínio é igualmente aplicável aos demais delitos contra o patrimônio que admitem o privilégio a exemplo da apropriação indébita CP art 170 do estelionato CP art 171 1º e da receptação CP art 180 5º in fine Princípio da insignificância e sua valoração pela autoridade policial A quem compete valorar a incidência do princípio da insignificância Em outros termos a autoridade policial pode deixar de efetuar a prisão em flagrante por reputar presente a criminalidade de bagatela O Superior Tribunal de Justiça entende que somente o Poder Judiciário é dotado de poderes para efetuar o reconhecimento do princípio da insignificância Destarte a autoridade policial está obrigada a efetuar a prisão em flagrante cabendolhe submeter imediatamente a questão à autoridade 2239 judiciária competente Como já se decidiu no momento em que toma conhecimento de um delito surge para a autoridade policial o dever legal de agir e efetuar o ato prisional O juízo acerca da incidência do princípio da insignificância é realizado apenas em momento posterior pelo Poder Judiciário de acordo com as circunstâncias atinentes ao caso concreto51 Com o devido respeito ousamos discordar desta linha de pensamento por uma simples razão o princípio da insignificância afasta a tipicidade do fato Logo se o fato é atípico para a autoridade judiciária também apresenta igual natureza para a autoridade policial Não se pode conceber exemplificativamente a obrigatoriedade da prisão em flagrante no tocante à conduta de subtrair um único pãozinho avaliado em poucos centavos do balcão de uma padaria sob pena de banalização do Direito Penal e do esquecimento de outros relevantes princípios tais como o da intervenção mínima da subsidiariedade da proporcionalidade e da lesividade Para nós o mais correto é agir com prudência no caso concreto acolhendo o princípio da insignificância quando a situação fática efetivamente comportar sua incidência Princípio da insignificância imprópria ou da criminalidade de bagatela imprópria De acordo com esse princípio também sem previsão legal no Brasil inexiste legitimidade na imposição da pena nas hipóteses em que nada obstante a infração penal esteja indiscutivelmente caracterizada a aplicação da reprimenda desponte como desnecessária e inoportuna Em outras palavras infração crime ou contravenção penal de bagatela imprópria é aquela que surge como relevante para o Direito Penal pois apresenta desvalor da conduta e desvalor do resultado O fato é típico e ilícito o agente é dotado de culpabilidade e o Estado possui o direito de punir punibilidade Mas após a prática do fato a pena revelase incabível no caso concreto pois diversos fatores recomendam seu afastamento tais como sujeito com 224 personalidade ajustada ao convívio social primário e sem antecedentes criminais colaboração com a Justiça reparação do dano causado à vítima reduzida reprovabilidade do comportamento reconhecimento da culpa ônus provocado pelo fato de ter sido processado ou preso provisoriamente etc A análise da pertinência da bagatela imprópria há de ser realizada obrigatoriamente na situação fática e jamais no plano abstrato Nesse contexto o fato real deve ser confrontado com um princípio basilar do Direito Penal qual seja o da necessidade da pena consagrado no art 59 caput do Código Penal O juiz levando em conta as circunstâncias simultâneas e posteriores ao fato típico e ilícito cometido por agente culpável deixa de aplicar a pena pois falta interesse para tanto Exemplo A cometeu o crime furto privilegiado CP art 155 2º Dois anos depois do fato sem ter ainda se verificado a prescrição notase que ele não apresentou nenhum outro deslize em seu comportamento razão pela qual a pena quiçá revelese prescindível para atender às finalidades do Direito Penal Vejase que ao contrário do que se verifica no princípio da insignificância própria o sujeito é regularmente processado A ação penal precisa ser iniciada mas a análise das circunstâncias do fato submetido ao crivo do Poder Judiciário recomenda a exclusão da pena Destarte a bagatela imprópria funciona como causa supralegal de extinção da punibilidade Finalmente é de se observar que a bagatela imprópria tem como pressuposto inafastável a não incidência do princípio da insignificância própria Com efeito se o fato não era merecedor da tutela penal em decorrência da sua atipicidade descabe enveredar pela discussão acerca da necessidade ou não de pena Princípio da individualização da pena Expressamente indicado pelo art 5º XLVI da Constituição Federal repousa no princípio de justiça segundo o qual se deve distribuir a cada indivíduo o que lhe cabe de acordo com as circunstâncias específicas do seu comportamento o que em matéria penal significa a aplicação da pena levando em conta não a norma penal em abstrato mas especialmente os aspectos subjetivos e objetivos do crime52 225 O princípio da individualização da pena desenvolvese em três planos legislativo judicial e administrativo No prisma legislativo é respeitado quando o legislador descreve o tipo penal e estabelece as sanções adequadas indicando precisamente seus limites mínimo e máximo e também as circunstâncias aptas a aumentar ou diminuir as reprimendas cabíveis A individualização judicial ou jurisdicional complementa a legislativa pois esta não pode ser extremamente detalhista nem é capaz de prever todas as situações da vida concreta que possam aumentar ou diminuir a sanção penal É efetivada pelo magistrado mediante a aplicação da pena utilizando se de todos os instrumentais fornecidos pelos autos da ação penal em obediência ao sistema trifásico delineado pelo art 68 do Código Penal pena privativa de liberdade ou ainda ao sistema bifásico inerente à sanção pecuniária CP art 49 Finalmente a individualização administrativa é efetuada durante a execução da pena quando o Estado deve zelar por cada condenado de forma singular mediante tratamento penitenciário ou sistema alternativo no qual se afigure possível a integral realização das finalidades da pena retribuição prevenção geral e especial e ressocialização Princípio da alteridade Criado por Claus Roxin esse princípio proíbe a incriminação de atitude meramente interna do agente bem como do pensamento ou de condutas moralmente censuráveis incapazes de invadir o patrimônio jurídico alheio Em síntese ninguém pode ser punido por causar mal apenas a si próprio pois uma das características inerentes ao Direito Penal moderno repousa na necessidade de intersubjetividade nas relações penalmente relevantes53 Como já advertia Stuart Mill citado por Raúl Cervini Nenhuma lei criminal deve ser usada para obrigar as pessoas a atuar em seu próprio benefício o único propósito para o qual o poder público pode exercitarse com direito sobre qualquer membro da comunidade civilizada contra sua vontade é para prevenir danos a outros Seu 226 próprio bem seja físico ou moral não é uma razão suficiente54 Nesse princípio se fundamenta a impossibilidade de punição da autolesão bem como a atipicidade da conduta de consumir drogas uma vez que o crime tipificado pelo art 28 da Lei 113432006 tem a saúde pública como objetividade jurídica Princípio da confiança Bastante difundido no Direito Penal espanhol tratase de requisito para a existência do fato típico e se baseia na premissa de que todos devem esperar por parte das demais pessoas comportamentos responsáveis e em consonância com o ordenamento jurídico almejando evitar danos a terceiros Devese confiar que o comportamento dos outros se dará de acordo com as regras da experiência levandose em conta um juízo estatístico alicerçado naquilo que normalmente acontece id quod plerumque accidit Foi desenvolvido inicialmente pela jurisprudência para enfrentar os problemas resultantes dos crimes praticados na direção de veículo automotor Atualmente sua utilização é bastante ampla notadamente nos setores em que exista atuação conjunta de indivíduos entendendose por isso as atividades comunitárias ou em divisão de trabalho Para Juarez Tavares Segundo este princípio todo aquele que atende adequadamente ao cuidado objetivamente exigido pode confiar que os demais coparticipantes da mesma atividade também operem cuidadosamente A consequência da aplicação deste pensamento no direito penal será a de excluir a responsabilidade dos agentes em relação a fatos que se estendam para além do dever concreto que lhes é imposto nas circunstâncias e nas condições existentes no momento de realizar a atividade Como seria absolutamente impossível exigirse de cada pessoa uma atenção extraordinária que pudesse ir além daquela que lhe era atribuível segundo juízo concreto de adequação este princípio vigora como limitador do dever de cuidado precisamente no âmbito da atividade concreta55 227 228 Princípio da adequação social Não pode ser confundido com a teoria social da conduta idealizada por Johannes Wessels Capítulo 10 item 1024 De acordo com esse princípio que funciona como causa supralegal de exclusão da tipicidade pela ausência da tipicidade material não pode ser considerado criminoso o comportamento humano que embora tipificado em lei não afrontar o sentimento social de Justiça56 É o caso exemplificativamente dos trotes acadêmicos moderados e da circuncisão realizada pelos judeus Advirtase porém que a autorização legal para o exercício de determinada profissão não implica automaticamente na adequação social dos crimes praticados em seu bojo Já decidiu o Superior Tribunal de Justiça que em crime de descaminho praticado por camelô a existência de lei regulamentando tal atividade não conduz ao reconhecimento de que o descaminho é socialmente aceitável57 Princípio da intervenção mínima No campo penal o princípio da reserva legal não basta para salvaguardar o indivíduo O Estado respeitada a prévia legalidade dos delitos e das penas pode criar tipos penais iníquos e instituir penas vexatórias à dignidade da pessoa humana Para enfrentar esse problema estatuiu a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789 em seu art 8º que a lei somente deve prever as penas estrita e evidentemente necessárias Surgia o princípio da intervenção mínima ou da necessidade afirmando ser legítima a intervenção penal apenas quando a criminalização de um fato se constitui meio indispensável para a proteção de determinado bem ou interesse não podendo ser tutelado por outros ramos do ordenamento jurídico Nesse contexto já decidiu o Superior Tribunal de Justiça A missão do Direito Penal moderno consiste em tutelar os bens jurídicos mais relevantes Em decorrência disso a intervenção penal deve ter o caráter fragmentário protegendo apenas os bens jurídicos mais 2281 importantes e em casos de lesões de maior gravidade58 A intervenção mínima tem como destinatários principais o legislador e o intérprete do Direito Àquele recomenda moderação no momento de eleger as condutas dignas de proteção penal abstendose de incriminar qualquer comportamento Somente deverão ser castigados aqueles que não puderem ser contidos por outros ramos do Direito Como enfatiza Claus Roxin é evidente que nada favorece tanto a criminalidade como a penalização de qualquer bagatela59 Mas não é só Ao operador do Direito exige não proceder à operação de tipicidade quando constatar que a pendência pode ser satisfatoriamente resolvida com a atuação de outros ramos do sistema jurídico em que pese a criação pelo legislador do tipo penal incriminador É utilizado para amparar a corrente do direito penal mínimo Vale ressaltar contudo que a compreensão daquilo que se entende por intervenção mínima varia de acordo com as correntes penais e com a interpretação dos operadores do Direito Confirase o posicionamento do Supremo Tribunal Federal O sistema jurídico há de considerar a relevantíssima circunstância de que a privação da liberdade e a restrição de direitos do indivíduo somente se justificam quando estritamente necessárias à própria proteção das pessoas da sociedade e de outros bens jurídicos que lhes sejam essenciais notadamente naqueles casos em que os valores penalmente tutelados se exponham a dano efetivo ou potencial impregnado de significativa lesividade O direito penal não se deve ocupar de condutas que produzam resultado cujo desvalor por não importar em lesão significativa a bens jurídicos relevantes não represente por isso mesmo prejuízo importante seja ao titular do bem jurídico tutelado seja à integridade da própria ordem social60 Do princípio da intervenção mínima decorrem outros dois fragmentariedade e subsidiariedade Princípio da fragmentariedade ou caráter fragmentário do Direito Penal Estabelece que nem todos os ilícitos configuram infrações penais mas apenas os que atentam contra valores fundamentais para a manutenção e o progresso do ser humano e da sociedade Em resumo todo ilícito penal será também ilícito perante os demais ramos do Direito mas a recíproca não é verdadeira Imaginemos dois círculos e assim poderemos visualizar que um deles representando o Direito Penal de tamanho menor está envolto por outro maior Dessa forma todo conteúdo do ilícito penal estaria absorvido pelo círculo mais amplo representativo do ilícito genérico Entretanto parte da figura maior não teria contato com aquela que aloja o Direito Penal e estaria protegida pela fragmentariedade Tomemos como exemplo o crime de furto Agora raciocinemos levando em conta o gráfico acima apontado É fácil concluir que uma vez praticado o delito contra o patrimônio a conduta do agente também será considerada ilícita nos demais ramos do ordenamento jurídico notadamente perante o Direito Civil De outro lado nem todo ilícito civil como é o caso da violação da posse ou da propriedade sem subtração caracterizará o crime de furto Destarte podese afirmar que em razão de seu caráter fragmentário o Direito Penal é a última etapa de proteção do bem jurídico Esse princípio deve ser utilizado no plano abstrato para o fim de permitir a criação de tipos penais somente quando os demais ramos do Direito tiverem falhado na tarefa de proteção de um bem jurídico61 Referese assim 2282 à atividade legislativa Nas palavras de Luiz Luisi O direito penal como já notara Binding não encerra um sistema exaustivo de proteção e bens jurídicos mas um sistema descontínuo de ilícitos decorrentes da necessidade de criminalizálos por ser este o meio indispensável de tutela jurídica62 Portanto o Direito Penal preocupase unicamente com alguns comportamentos fragmentos contrários ao ordenamento jurídico tutelando somente os bens jurídicos mais importantes à manutenção e ao desenvolvimento do indivíduo e da coletividade Em conclusão a palavra fragmentariedade emana de fragmento no universo da ilicitude somente alguns blocos alguns poucos fragmentos constituemse em ilícitos penais Pensemos em uma visão noturna o céu representaria a ilicitude em geral as estrelas seriam os ilícitos penais Com a evolução da sociedade e a modificação dos seus valores nada impede a fragmentariedade às avessas nas situações em que um comportamento inicialmente típico deixa de interessar ao Direito Penal sem prejuízo da sua tutela pelos demais ramos do Direito Foi o que aconteceu a título ilustrativo com o adultério Esta conduta foi descriminalizada com a revogação do art 240 do Código Penal pela Lei 111062005 mas continua ilícita perante o Direito Civil Princípio da subsidiariedade De acordo com o princípio da subsidiariedade a atuação do Direito Penal é cabível unicamente quando os outros ramos do Direito e os demais meios estatais de controle social tiverem se revelado impotentes para o controle da ordem pública Em outras palavras o Direito Penal funciona como um executor de reserva entrando em cena somente quando outros meios estatais de proteção mais brandos e portanto menos invasivos da liberdade individual não forem suficientes para a proteção do bem jurídico tutelado Caso não seja necessário dele lançar mão ficará de prontidão aguardando ser chamado pelo operador do Direito para aí sim enfrentar uma conduta que coloca em risco a estrutura 229 da sociedade Nas palavras de Santiago Mir Puig O Direito Penal deixa de ser necessário para proteger a sociedade quando isto se pode conseguir por outros meios que serão preferíveis enquanto sejam menos lesivos para os direitos individuais Tratase de uma exigência de economia social coerente com a lógica do Estado social que deve buscar o maior bem social com o menor custo social O princípio da máxima utilidade possível para as possíveis vítimas deve combinarse com o de mínimo sofrimento necessário para os delinquentes Ele conduz a uma fundamentação utilitarista do Direito Penal no tendente à maior prevenção possível senão ao mínimo de prevenção imprescindível Entra em jogo assim o princípio da subsidiariedade segundo o qual o Direito Penal há de ser a ultima ratio o último recurso a utilizar à falta de outros menos lesivos63 Este princípio ao contrário do postulado da fragmentariedade se projeta no plano concreto isto é em sua atuação prática o Direito Penal somente se legitima quando os demais meios disponíveis já tiverem sido empregados sem sucesso para proteção do bem jurídico Guarda relação portanto com a tarefa de aplicação da lei penal Em outras palavras o crime já existe mas no plano da realidade o tipo penal não pode ser utilizado pois nesta hipótese não há legitimidade na atuação do Direito Penal Na ótica do Superior Tribunal de Justiça O paciente foi denunciado porque se constatou em imóvel de sua propriedade suposta subtração de água mediante ligação direta com a rede da concessionária do serviço público Anotese que à época dos fatos ele não residia no imóvel mas quitou o respectivo débito Dessarte é aplicável o princípio da subsidiariedade pelo qual a intervenção penal só é admissível quando os outros ramos do Direito não conseguem bem solucionar os conflitos sociais Daí que na hipótese em que o ilícito toma contornos meramente contratuais e tem equacionamento no plano civil não está justificada a persecução penal64 Princípio da proporcionalidade De acordo com o princípio da proporcionalidade também conhecido como princípio da razoabilidade ou da convivência das liberdades públicas a criação de tipos penais incriminadores deve constituirse em atividade vantajosa para os membros da sociedade eis que impõe um ônus a todos os cidadãos decorrente da ameaça de punição que a eles acarreta Sua origem normativa remonta aos itens 20 e 21 da Magna Carta do Rei João sem Terra de 121565 Nos moldes atuais foi desenvolvido inicialmente na Alemanha sob inspiração de pensamentos jusnaturalistas e iluministas com os quais se afirmaram as ideias de que a limitação da liberdade individual só se justifica para a concretização de interesses coletivos superiores66 O princípio da proporcionalidade funciona como forte barreira impositiva de limites ao legislador Por corolário a lei penal que não protege um bem jurídico é ineficaz por se tratar de intervenção excessiva na vida dos indivíduos em geral Se não bastasse incide também na dosimetria da penabase Como já decidido pelo Superior Tribunal de Justiça Na fixação da penabase além do respeito aos ditames legais e da avaliação criteriosa das circunstâncias judiciais deve ser observado o princípio da proporcionalidade para que a resposta penal seja justa e suficiente para cumprir o papel de reprovação do ilícito67 Em outras palavras o princípio da proporcionalidade possui três destinatários o legislador proporcionalidade abstrata o juiz da ação penal proporcionalidade concreta e os órgãos da execução penal proporcionalidade executória Na proporcionalidade abstrata ou legislativa são eleitas as penas mais apropriadas para cada infração penal seleção qualitativa bem como as respectivas graduações mínimo e máximo seleção quantitativa Na proporcionalidade concreta ou judicial orientase o magistrado no julgamento da ação penal promovendo a individualização da pena adequada ao caso concreto Finalmente na proporcionalidade executória ou administrativa incidem regras inerentes ao cumprimento da pena levandose em conta as condições pessoais e o mérito do condenado Vale destacar que modernamente o princípio da proporcionalidade deve ser analisado sobre uma dupla face Inicialmente constituise em proibição ao excesso pois é vedada a cominação e aplicação de penas em dose exagerada e desnecessária Um exemplo marcante disto encontrase na exagerada reprimenda cominada ao delito tipificado no art 273 do Código Penal falsificação de medicamentos Esta conclusão é compartilhada pelo Superior Tribunal de Justiça que inclusive já aplicou em substituição à sanção atribuída à modalidade contida no 1ºB inc V do citado dispositivo legal a pena prevista ao tráfico de drogas Lei 113432006 art 33 caput É inconstitucional o preceito secundário do art 273 1ºB V do CP reclusão de 10 dez a 15 quinze anos e multa devendose considerar no cálculo da reprimenda a pena prevista no caput do art 33 da Lei 113432006 Lei de Drogas com possibilidade de incidência da causa de diminuição de pena do respectivo 4º De fato é viável a fiscalização judicial da constitucionalidade de preceito legislativo que implique intervenção estatal por meio do Direito Penal examinando se o legislador considerou suficientemente os fatos e prognoses e se utilizou de sua margem de ação de forma adequada para a proteção suficiente dos bens jurídicos fundamentais Nesse sentido a Segunda Turma do STF HC 104410RS DJe 2732012 expôs o entendimento de que os mandatos constitucionais de criminalização impõem ao legislador o dever de observância do princípio da proporcionalidade como proibição de excesso e como proibição de proteção insuficiente A ideia é a de que a intervenção estatal por meio do Direito Penal como ultima ratio deve ser sempre guiada pelo princípio da proporcionalidade Abrese com isso a possibilidade do controle da constitucionalidade da atividade legislativa em matéria penal Sendo assim em atenção ao princípio constitucional da proporcionalidade e razoabilidade das leis restritivas de direitos CF art 5º LIV é imprescindível a atuação do Judiciário para corrigir o exagero e ajustar a pena de reclusão de 10 dez a 15 quinze anos e multa abstratamente cominada à conduta inscrita no art 273 1ºB V do CP referente ao crime de ter em depósito para venda produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais de procedência ignorada Isso porque se esse delito for comparado por exemplo com o crime de tráfico ilícito de drogas notoriamente mais grave e cujo bem jurídico também é a saúde pública percebese a total falta de razoabilidade do preceito secundário do art 273 1ºB do CP sobretudo após a edição da Lei 113432006 Lei de Drogas que apesar de ter aumentado a pena mínima de 3 para 5 anos introduziu a possibilidade de redução da reprimenda quando aplicável o 4º do art 33 de 16 a 23 Com isso em inúmeros casos o esporádico e pequeno traficante pode receber a exígua pena privativa de liberdade de 1 ano e 8 meses E mais é possível ainda sua substituição por restritiva de direitos De mais a mais constatase que a pena mínima cominada ao crime ora em debate excede em mais de três vezes a pena máxima do homicídio culposo corresponde a quase o dobro da pena mínima do homicídio doloso simples é cinco vezes maior que a pena mínima da lesão corporal de natureza grave enfim é mais grave do que a do estupro do estupro de vulnerável da extorsão mediante sequestro situação que gera gritante desproporcionalidade no sistema penal Além disso como se trata de crime de perigo abstrato que independe da prova da ocorrência de efetivo risco para quem quer que seja a dispensabilidade do dano concreto à saúde do pretenso usuário do produto evidencia ainda mais a falta de harmonia entre esse delito e a pena abstratamente cominada pela redação dada pela Lei 96771998 de 10 a 15 anos de reclusão Ademais apenas para seguir apontando a desproporcionalidade devese ressaltar que a conduta de importar medicamento não registrado na ANVISA considerada criminosa e hedionda pelo art 273 1ºB do CP a que se comina pena altíssima pode acarretar mera sanção administrativa de advertência nos termos dos arts 2º 4º 8º IV e 10 IV todos da Lei n 64371977 que define as infrações à legislação sanitária A ausência de relevância penal da conduta a desproporção da pena em ponderação com o dano ou perigo de dano à saúde pública decorrente da ação e a inexistência de consequência calamitosa do agir convergem para que se conclua pela falta de razoabilidade da pena prevista na lei tendo em vista que a 2210 restrição da liberdade individual não pode ser excessiva mas compatível e proporcional à ofensa causada pelo comportamento humano criminoso Quanto à possibilidade de aplicação para o crime em questão da pena abstratamente prevista para o tráfico de drogas reclusão de 5 cinco a 15 quinze anos e pagamento de 500 quinhentos a 1500 mil e quinhentos diasmulta art 33 da Lei de drogas a Sexta Turma do STJ REsp 915442SC DJe 1º022011 dispôs que A Lei 967798 ao alterar a pena prevista para os delitos descritos no artigo 273 do Código Penal mostrouse excessivamente desproporcional cabendo portanto ao Judiciário promover o ajuste principiológico da norma Tratando se de crime hediondo de perigo abstrato que tem como bem jurídico tutelado a saúde pública mostrase razoável a aplicação do preceito secundário do delito de tráfico de drogas ao crime de falsificação corrupção adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais68 Se de um lado o princípio da proporcionalidade impõe a proibição do excesso de outro lado este postulado também impede a proteção insuficiente de bens jurídicos pois não tolera a punição abaixo da medida correta Nas palavras de Paulo Queiroz Convém notar todavia que o princípio da proporcionalidade compreende além da proibição de excesso a proibição de insuficiência da intervenção jurídicopenal Significa dizer que se por um lado deve ser combatida a sanção desproporcional porque excessiva por outro lado cumpre também evitar a resposta penal que fique muito aquém do seu efetivo merecimento dado o seu grau de ofensividade e significação políticocriminal afinal a desproporção tanto pode darse para mais quanto para menos Exemplo disso de insuficiência da resposta penal são os crimes de abuso de autoridade previstos na Lei n 48981965 que comina para as graves infrações que define pena de detenção de dez dias a seis meses art 6º 3º b69 Princípio da humanidade Esse princípio apregoa a inconstitucionalidade da criação de tipos penais 2211 2212 ou a cominação de penas que violam a incolumidade física ou moral de alguém Dele resulta a impossibilidade de a pena passar da pessoa do condenado com exceção de alguns efeitos extrapenais da condenação como a obrigação de reparar o dano na esfera civil CF art 5º XLV Decorre da dignidade da pessoa humana70 consagrada no art 1º III da Constituição Federal como fundamento da República Federativa do Brasil Foi com base nesse princípio entre outros que o Supremo Tribunal Federal declarou inconstitucional o regime integralmente fechado para cumprimento da pena privativa de liberdade nos crimes hediondos e equiparados problema superado com a edição da Lei 114642007 Princípio da ofensividade ou da lesividade Não há infração penal quando a conduta não tiver oferecido ao menos perigo de lesão ao bem jurídico Este princípio atende a manifesta exigência de delimitação do Direito Penal tanto em nível legislativo como no âmbito jurisdicional De acordo com o clássico ensinamento de Francesco Palazzo Em nível legislativo o princípio da lesividade ou ofensividade enquanto dotado de natureza constitucional deve impedir o legislador de configurar tipos penais que já hajam sido construídos in abstracto como fatores indiferentes e preexistentes à norma Do ponto de vista pois do valor e dos interesses sociais já foram consagrados como inofensivos Em nível jurisdicionalaplicativo a integral atuação do princípio da lesividade deve comportar para o juiz o dever de excluir a subsistência do crime quando o fato no mais em tudo se apresenta na conformidade do tipo mas ainda assim concretamente é inofensivo ao bem jurídico específico tutelado pela norma71 Princípio da exclusiva proteção do bem jurídico O Direito Penal moderno é o Direito Penal do bem jurídico Nessa seara o princípio da exclusiva proteção do bem jurídico veda ao Direito Penal a preocupação com as intenções e pensamentos das pessoas do seu modo de 22121 viver ou de pensar ou ainda de suas condutas internas enquanto não exteriorizada a atividade delitiva O Direito Penal se destina à tutela de bens jurídicos não podendo ser utilizado para resguardar questões de ordem moral ética ideológica religiosa política ou semelhantes Com efeito a função primordial do Direito Penal é a proteção de bens jurídicos fundamentais para a preservação e o desenvolvimento do indivíduo e da sociedade Como já decidido pelo Supremo Tribunal Federal Pelo que é possível extrair do ordenamento jurídico brasileiro a premissa de que toda conduta penalmente típica só é penalmente típica porque significante de alguma forma para a sociedade e a própria vítima É falar em tema de política criminal a Constituição Federal pressupõe lesão significante a interesses e valores os chamados bens jurídicos por ela avaliados como dignos de proteção normativa72 O princípio da exclusiva proteção do bem jurídico não se confunde com o princípio da alteridade Neste há um bem jurídico a ser penalmente tutelado mas pertencente exclusivamente ao responsável pela conduta legalmente prevista razão pela qual o Direito Penal não está autorizado a intervir naquele por sua vez não há interesse legítimo a ser protegido pelo Direito Penal Eleição de bens jurídicos e a teoria constitucional do Direito Penal De acordo com a teoria constitucional do Direito Penal a tarefa de criação de crimes e cominação de penas somente se legitima quando são tutelados valores consagrados na Constituição Federal Em outras palavras a eleição dos bens jurídicos dignos de proteção penal deriva dos mandamentos constitucionais Exemplificativamente o fundamento de validade do delito de homicídio é o direito à vida CF art 5º caput assim como o arrimo dos crimes de calúnia difamação e injúria encontrase no art 5º X da Lei Suprema relativo à inviolabilidade da honra Como leciona Claus Roxin O ponto de partida correto consiste em reconhecer que a única restrição 22122 previamente dada para o legislador se encontra nos princípios constitucionais Portanto um conceito de bem jurídico vinculante políticocriminalmente só pode derivar dos valores garantidos na Lei Fundamental do nosso Estado de Direito baseado na liberdade do indivíduo através dos quais são marcados os limites da atividade punitiva do Estado73 A espiritualização desmaterialização ou liquefação de bens jurídicos no Direito Penal A ideia de bem jurídico sempre girou em torno da pessoa humana posteriormente vindo a alcançar também as pessoas jurídicas Nesse contexto somente se configurava uma infração penal quando presente uma lesão dano a interesses individuais das pessoas a exemplo da vida da integridade física do patrimônio da liberdade sexual etc Com a evolução dos tempos e visando a antecipação da tutela penal pois assim mostrouse possível a prevenção de lesões às pessoas o Direito Penal passou a também se preocupar com momentos anteriores ao dano incriminando condutas limitadas à causação do perigo crimes de perigo concreto e abstrato ou seja à exposição de bens jurídicos notadamente de natureza transindividual à probabilidade de dano Exemplificativamente surgiram crimes ambientais pois é sabido que a manutenção do meio ambiente sadio e equilibrado é imprescindível à boa qualidade de vida e do interesse das presentes e futuras gerações nos moldes do art 225 caput da Constituição Federal Para o Supremo Tribunal Federal A criação de crimes de perigo abstrato não representa por si só comportamento inconstitucional por parte do legislador penal A tipificação de condutas que geram perigo em abstrato muitas vezes acaba sendo a melhor alternativa ou a medida mais eficaz para a proteção de bens jurídicopenais supraindividuais ou de caráter coletivo como por exemplo o meio ambiente a saúde etc Portanto pode o legislador dentro de suas amplas margens de avaliação e de decisão definir quais as medidas mais adequadas e necessárias para a efetiva proteção de determinado bem jurídico o que lhe permite escolher 2213 2214 espécies de tipificação próprias de um direito penal preventivo74 A crescente incursão pela seara dos interesses metaindividuais e dos crimes de perigo especialmente os de índole abstrata definidos como os delitos em que a lei presume de forma absoluta a situação de risco ao bem jurídico penalmente tutelado tem sido chamada de espiritualização desmaterialização ou liquefação de bens jurídicos no Direito Penal75 Princípio da imputação pessoal O Direito Penal não pode castigar um fato cometido por agente que atue sem culpabilidade Em outras palavras não se admite a punição quando se tratar de agente inimputável sem potencial consciência da ilicitude ou de quem não se possa exigir conduta diversa O fundamento da responsabilidade penal pessoal é a culpabilidade nulla poena sine culpa Princípio da responsabilidade pelo fato Os tipos penais devem definir fatos associandolhes as penas respectivas e não estereotipar autores em razão de alguma condição específica Não se admite um Direito Penal do autor mas somente um Direito Penal do fato Ninguém pode ser punido exclusivamente por questões pessoais Ao contrário a pena se destina ao agente culpável condenado após o devido processo legal pela prática de um fato típico e ilícito Historicamente pode ser lembrado como Direito Penal do autor o da Alemanha nazista no qual não existiam propriamente crimes mas criminosos Em tempos atuais com ele guarda sintonia o Direito Penal do inimigo idealizado pelo alemão Günther Jakobs estudado mais adiante Capítulo 6 item 654 A tese que sustenta ser a agravante genérica da reincidência resquício de um Direito Penal do autor não pode ser acolhida Com efeito uma vez caracterizada a recidiva a agravação da pena é obrigatória por se constituir em elemento que representa maior reprovação da conduta pelo cometimento de novo crime depois da imposição definitiva de uma pena pela prática de um 2215 2216 1 2 crime anterior revelando que a sanção penal não atingiu suas finalidades de reprovação e prevenção de novos delitos Princípio da personalidade ou da intranscendência Ninguém pode ser responsabilizado por fato cometido por terceira pessoa Consequentemente a pena não pode passar da pessoa do condenado CF art 5º XLV Como reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal O postulado da intranscendência impede que sanções e restrições de ordem jurídica superem a dimensão estritamente pessoal do infrator76 Princípio da responsabilidade penal subjetiva Nenhum resultado penalmente relevante pode ser atribuído a quem não o tenha produzido por dolo ou culpa77 A disposição contida no art 19 do Código Penal Pelo resultado que agrava especialmente a pena só responde o agente que o houver causado ao menos culposamente exclui a responsabilidade penal objetiva O Direito penal moderno é Direito Penal da culpa Não se prescinde do elemento subjetivo É intolerável a responsabilidade pelo fato de outrem À sanção medida políticojurídica de resposta ao delinquente deve ajustarse a conduta delituosa Conduta é fenômeno ocorrente no plano da experiência É fato Fato não se presume Existe ou não existe Para o Supremo Tribunal Federal vige no ordenamento jurídicopenal pátrio o princípio da responsabilidade subjetiva como corolário do Direito Penal do fato adequado ao plexo de garantias vigente no Estado Democrático de Direito Tal sistemática impõe ao órgão acusatório o ônus da prova acerca dos elementos constitutivos do tipo penal incriminador nos termos do art 156 do CPP a ser exercido no seio do contraditório estabelecido em juízo em respeito à cláusula do devido processo legal78 Apontamse vestígios da responsabilidade objetiva em duas situações no Direito Penal brasileiro Seriam as seguintes Rixa qualificada art 137 parágrafo único do Código Penal e Punição das infrações penais praticadas em estado de embriaguez 2217 voluntária ou culposa decorrente da ação da teoria da actio libera in causa art 28 II do CP79 Princípio do ne bis in idem Este princípio derivado da dignidade da pessoa humana e consagrado no art 8º 4 do Pacto de São José da Costa Rica o qual foi ratificado no Brasil pelo Decreto 6781992 proíbe de forma absoluta a dupla punição pelo mesmo fato80 Com base nesse postulado foi editada a Súmula 241 do Superior Tribunal de Justiça A reincidência penal não pode ser considerada como circunstância agravante e simultaneamente como circunstância judicial A reincidência como agravante genérica quando da prática de novo crime contudo não importa em violação desse princípio A regra prevista no art 61 I do Código Penal encontrase em sintonia com o ordenamento jurídico em vigor Na visão do Supremo Tribunal Federal É constitucional a aplicação da reincidência como agravante da pena em processos criminais CP art 61 I Essa a conclusão do Plenário ao desprover recurso extraordinário em que alegado que o instituto configuraria bis in idem bem como ofenderia os princípios da proporcionalidade e da individualização da pena Registrouse que as repercussões legais da reincidência seriam múltiplas não restritas ao agravamento da pena Nesse sentido ela obstaculizaria a cumprimento de pena nos regimes semiaberto e aberto CP art 33 2º b e c b substituição de pena privativa de liberdade por restritiva de direito ou multa CP artigos 44 II e 60 2º c sursis CP art 77 I d diminuição de pena reabilitação e prestação de fiança e e transação e sursis processual em juizados especiais Lei 909995 artigos 76 2º I e 89 Além disso a recidiva seria levada em conta para a deslinde do concurso de agravantes e atenuantes CP art 67 b efeito de lapso temporal quanto ao livramento condicional CP art 83 I e II c interrupção da prescrição CP art 117 VI e d revogação de sursis e livramento condicional a impossibilitar em alguns casos a diminuição da pena a reabilitação e a prestação de fiança CP artigos 155 2º 170 171 1º 95 e CPP art 323 III Consignouse que a reincidência não contrariaria a individualização da pena Ao contrário levarseia em conta justamente o perfil do condenado ao distinguilo daqueles que cometessem a primeira infração penal Nesse sentido lembrouse que a Lei 113432006 preceituaria como causa de diminuição de pena o fato de o agente ser primário e detentor de bons antecedentes art 33 4º Do mesmo modo a recidiva seria considerada no cômputo do requisito objetivo para progressão de regime dos condenados por crime hediondo Nesse aspecto a lei exigiria o implemento de 25 da reprimenda se primário o agente e 35 se reincidente O instituto impediria também o livramento condicional aos condenados por crime hediondo tortura e tráfico ilícito de entorpecentes CP art 83 V Figuraria ainda como agravante da contravenção penal prevista no art 25 do DecretoLei 368841 Influiria na revogação do sursis processual e do livramento condicional assim como na reabilitação CP artigos 81 I e 1º 86 87 e 95 Considerouse que a reincidência comporia consagrado sistema de política criminal de combate à delinquência e que eventual inconstitucionalidade do instituto alcançaria todas as normas acima declinadas Asseverouse que sua aplicação não significaria duplicidade porquanto não alcançaria delito pretérito mas novo ilícito que ocorrera sem que ultrapassado o interregno do art 64 do CP Asseverouse que o julgador deveria ter parâmetros para estabelecer a pena adequada ao caso concreto Nesse contexto a reincidência significaria o cometimento de novo fato antijurídico além do anterior Reputouse razoável o fator de discriminação considerado o perfil do réu merecedor de maior repreensão porque voltara a delinquir a despeito da condenação havida que deveria ter sido tomada como advertência no que tange à necessidade de adoção de postura própria ao homem médio Explicouse que os tipos penais preveriam limites mínimo e máximo de apenação somente alijados se verificada causa de diminuição ou de aumento da reprimenda A definição da pena adequada levaria em conta particularidades da situação inclusive se o agente voltara a claudicar Estaria respaldado então o instituto constitucional da individualização da pena na medida em que se evitaria colocar o reincidente e o agente episódico no mesmo patamar Frisouse que a jurisprudência da Corte filiarseia predominantemente à corrente doutrinária segundo a qual o instituto encontraria fundamento constitucional porquanto atenderia ao princípio da individualização da pena Assinalouse que não se poderia a partir da exacerbação do garantismo penal desmantelar o sistema no ponto consagrador da cabível distinção ao se tratar os desiguais de forma igual A regência da matéria harmônica com a Constituição denotaria razoável política normativa criminal81 Vale ressaltar porém que a existência de duas ou mais ações penais em searas judiciais diversas pela suposta prática de fatos distintos não acarreta violação a esse princípio No trágico acidente envolvendo avião da empresa Gol Linhas Aéreas pronunciouse o Superior Tribunal de Justiça Não ofende o princípio do ne bis in idem o fato de os controladores de voo estarem respondendo a processo na Justiça Militar e na Justiça comum pelo mesmo fato da vida qual seja o acidente aéreo que ocasionou a queda do Boeing 737800 da Gol Linhas Aéreas no Município de Peixoto de Azevedo no Estado do Mato Grosso com a morte de todos os seus ocupantes uma vez que as imputações são distintas Solução que se encontra mutatis mutandis no enunciado da Súmula 90STJ Compete à Justiça Militar processar e julgar o policial militar pela prática do crime militar e à Comum pela prática do crime comum simultâneo àquele82 Na seara deste princípio pode ocorrer uma situação curiosa consistente na existência de duas condenações definitivas proferidas contra o mesmo agente e com base em idêntico fato a primeira lançada por juízo incompetente com pena maior e a segunda editada por juízo competente com pena mais branda Nesse caso a solução adequada é a anulação da primeira decisão judicial com a necessária relativização dos efeitos da coisa julgada Como já decidido pelo Superior Tribunal de Justiça Constatado o trânsito em julgado de duas decisões condenando o agente pela prática de um único crime a primeira proferida por juízo estadual absolutamente incompetente e a segunda proferida pelo juízo federal constitucionalmente competente a condenação anterior deve ser anulada caso se verifique que nela fora imposta pena maior do que a fixada posteriormente Em primeiro lugar fazse necessário asseverar que o STJ já se pronunciou no sentido de que A sentença proferida por juízo absolutamente incompetente impede o exame dos mesmos fatos ainda que pela justiça constitucionalmente competente pois ao contrário estarseia não só diante de vedado bis in idem como também na contramão da necessária segurança jurídica que a imutabilidade da coisa julgada visa garantir RHC 29775PI Quinta Turma DJe 25062013 Com efeito sopesando a garantia do juiz natural em face do princípio do ne bis in idem deve preponderar este último como decorrência do princípio fundamental da dignidade da pessoa humana princípio basilar do Estado Democrático de Direito consoante explicita o inciso III do art 1º da CF Cabe ressaltar a propósito que esse entendimento foi consolidado para dando efetividade ao princípio do favor rei impedir o início ou a continuidade de outro processo que tenha por objetivo discutir os mesmos fatos que já foram objeto de decisão anterior A situação em análise entretanto é peculiar Existem duas condenações transitadas em julgado sendo que a primeira foi proferida por juízo estadual absolutamente incompetente e a segunda pelo juízo constitucionalmente competente tendo este estabelecido inclusive quantum de pena inferior ao definido anteriormente Dessa forma nessa hipótese considerando a situação mais favorável ao réu bem como a existência de trânsito em julgado perante a justiça competente para análise do feito deve ser relativizada a coisa julgada de modo a tornar possível a prevalência do princípio fundamental da dignidade da pessoa humana83 Finalmente a vedação do bis in idem impede a imputação ao agente de um crime e de uma nova ação penal cometido no contexto fático de outro delito o qual era desconhecido na ação penal a este correspondente Para o Superior Tribunal de Justiça O agente que numa primeira ação penal tenha sido condenado pela prática de crime de roubo contra uma instituição bancária não poderá ser numa segunda ação penal condenado por crime de roubo supostamente cometido contra o gerente do banco no mesmo contexto fático considerado na primeira ação penal ainda que a conduta referente a este suposto roubo contra o gerente não tenha sido sequer levada ao conhecimento do juízo da primeira ação penal vindo à tona somente no segundo processo De fato conquanto o suposto roubo contra o gerente do banco não tenha sido sequer levado ao conhecimento do juízo da primeira ação penal ele se encontra sob o âmbito de incidência do princípio ne bis in idem na medida em que praticado no mesmo contexto fático da primeira ação Além disso do contrário ocorreria violação da garantia constitucional da coisa julgada Sobre o tema há entendimento doutrinário no sentido de que Com o trânsito em julgado da sentença condenatória o ato adquire a autoridade de coisa julgada tornandose imutável tanto no processo em que veio a ser proferida a decisão coisa julgada formal quanto em qualquer outro processo onde se pretenda discutir o mesmo fato criminoso objeto da decisão original coisa julgada material No direito brasileiro a sentença condenatória evita se instaure novo processo contra o réu condenado em razão do mesmo fato quer para impingir ao sentenciado acusação mais gravosa quer para aplicar lhe pena mais elevada Portanto não há se falar na hipótese em análise em arquivamento implícito inadmitido pela doutrina e pela jurisprudência tendo em vista que não se cuida de fatos diversos mas sim de um mesmo fato com desdobramentos diversos e apreciáveis ao tempo da instauração da primeira ação penal Ademais a doutrina sustenta que a proibição ne de imposição de mais de uma bis consequência jurídicorepressiva pela prática dos mesmos fatos idem ocorre ainda quando o comportamento definido espaçotemporalmente imputado ao acusado não foi trazido por inteiro para apreciação do juízo Isso porque o objeto do processo é informado pelo princípio da consunção pelo qual tudo aquilo que poderia ter sido imputado ao acusado em referência a dada situação histórica e não o foi jamais poderá vir a sêlo novamente E também se orienta pelos princípios da 2218 unidade e da indivisibilidade devendo o caso penal ser conhecido e julgado na sua totalidade unitária e indivisivelmente e mesmo quando não o tenha sido considerarseá irrepetivelmente decidido Assim em Direito Penal devese reconhecer a prevalência dos princípios do favor rei favor libertatis e ne bis in idem de modo a preservar a segurança jurídica que o ordenamento jurídico demanda HC 173397RS Sexta Turma DJe 1703201184 Princípio da isonomia Consagrouse o princípio da isonomia ou da igualdade como a obrigação de tratar igualmente aos iguais e desigualmente aos desiguais na medida de suas desigualdades Como acentua Celso Antônio Bandeira de Mello O preceito magno da igualdade é norma voltada quer para o aplicador da lei quer para o próprio legislador Deveras não só perante a norma posta se nivelam os indivíduos mas a própria edição dela assujeitase ao dever de dispensar tratamento equânime às pessoas85 No Direito Penal importa em dizer que as pessoas nacionais ou estrangeiras em igual situação devem receber idêntico tratamento jurídico e aquelas que se encontram em posições diferentes merecem um enquadramento diverso tanto por parte do legislador como também pelo juiz86 Exemplificativamente um traficante de drogas primário e com o qual foi apreendida a quantidade de dez gramas de cocaína deve ser apenado mais suavemente do que outro traficante reincidente e preso em flagrante pelo depósito de uma tonelada da mesma droga 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 BANDEIRA DE MELLO Celso Antônio Curso de direito administrativo 14 ed São Paulo Malheiros 2002 p 807808 RHC 117566SP rel Min Luiz Fux 1ª Turma j 24092013 FRAGOSO Heleno Cláudio Lições de direito penal parte geral 15 ed rev e atual por Fernando Fragoso Rio de Janeiro Forense 1994 p 92 Por esse motivo é perfeitamente compatível com as leis penais em branco com os tipos penais abertos e com os crimes culposos A Constituição Federal e o Código Penal não impõem ao tipo penal a definição de todos os elementos da conduta criminosa mas apenas dos mais relevantes podendo os demais ser transferidos a outras leis a atos administrativos ou finalmente à interpretação do magistrado HC 92010ES rel Min Napoleão Nunes Maia Filho 5ª Turma j 21022008 HC 102087MG rel Min Celso de Mello rel p acórdão Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 28022012 HC 104787RJ rel Min Ayres Britto 2ª Turma j 26102010 RHC 122464BA rel Min Celso de Mello 2ª Turma j 10062014 STF HC 97836RS rel Min Celso de Mello 2ª Turma j 19052009 noticiado no Informativo 547 HC 95570SC rel Min Dias Toffoli 1ª Turma j 01062010 noticiado no Informativo 589 STF HC 123108MG rel Min Roberto Barroso Plenário j 03082015 noticiado no Informativo 793 e STJ AgRg no RHC 44461RS rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 27052014 noticiado no Informativo 542 RHC 118972MG rel Min Gilmar Mendes rel p acórdão Min Cármen Lúcia 2ª Turma j 03062014 RHC 93472Ms rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 15032018 noticiado no Informativo 622 HC 123108MG rel Min Roberto Barroso Plenário j 03082015 noticiado no Informativo 793 E também No caso sob exame a conduta do paciente não pode ser considerada minimamente ofensiva pois além 15 16 17 18 19 20 21 22 23 de apresentar elevado grau de reprovabilidade por ser contumaz na prática incriminada verificase que ele é reincidente HC 120489MG rel Min Ricardo Lewandowski 2ª Turma j 10122013 AgRg no AREsp 490599RS rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 23092014 E também HC 299185SP rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 09092014 noticiado no Informativo 548 HC 114723MG rel Min Teori Zavascki 2ª Turma j 26082014 noticiado no Informativo 756 RHC 118014ES rel Min Gilmar Mendes rel p acórdão Min Teori Zavascki 2ª Turma j 12112013 No STJ EREsp 1217514RS rel Min Reynaldo Soares da Fonseca 3ª Seção j 09122015 noticiado no Informativo 575 RHC 31612PB rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 20052014 noticiado no Informativo 541 e HC 241713DF rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 10122013 noticiado no Informativo 534 HC 141440 AgRMG rel Min Dias Toffoli 2ª Turma j 14082018 noticiado no Informativo 911 HC 114194 AgRSP rel Min Celso de Mello 2ª Turma j 06082013 No mesmo sentido HC 118255PR rel Min Ricardo Lewandowski 2ª Turma j 19112013 e HC 114097PA rel Min Teori Zavascki 2ª Turma j 01042014 HC 111017RS rel Min Ayres Britto 2ª Turma j 07022012 Na ótica do STJ Consoante a jurisprudência do STJ a verificação da lesividade mínima da conduta apta a tornála atípica deve levar em consideração não só o valor econômico e a importância do objeto material subtraído mas também a condição econômica da vítima e as circunstâncias e consequências do delito cometido a fim de se determinar se houve ou não relevante lesão ao bem jurídico tutelado STJ HC 247349MS rel Min Assusete Magalhães 6ª Turma j 19022013 HC 96003MS rel Min Ricardo Lewandowski 1ª Turma j 02062009 noticiado no Informativo 549 Não se aplica o princípio da insignificância ao furto de uma máquina de cortar cerâmica avaliada em R 130 que a vítima utilizava usualmente para exercer seu trabalho STJ HC 241713DF rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 10122013 noticiado no Informativo 534 HC 107615MG rel Min Dias Toffoli 1ª Turma j 06092011 24 25 26 27 28 29 30 noticiado no Informativo 639 O Superior Tribunal de Justiça compartilha deste raciocínio HC 190002MG rel Min Og Fernandes 6ª Turma j 03022011 noticiado no Informativo 461 STF HC 115383RS rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 25062013 noticiado no Informativo 712 O STF não admite a incidência do princípio da insignificância no furto qualificado HC 123108MG rel Min Roberto Barroso Plenário j 03082015 noticiado no Informativo 793 STJ REsp 1218765MG rel Min Gilson Dipp 5ª Turma j 01032011 noticiado no Informativo 465 No furto simples o STJ reconheceu a exclusão da tipicidade material pelo princípio da insignificância na subtração de bem móvel de valor equivalente a pouco mais de 23 do salário mínimo vigente no tempo do fato AgRg no HC 254651PE rel Min Jorge Mussi 5ª Turma j 12032013 noticiado no Informativo 516 HC 60185MG rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 03042007 E ainda REsp 1159735MG rel Min Arnaldo Esteves Lima 5ª Turma j 15062010 noticiado no Informativo 439 É também a jurisprudência consolidada no âmbito do STF HC 97190GO rel Min Dias Toffoli 1ª Turma j 1082010 noticiado no Informativo 595 HC 107370SP rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 26042011 noticiado no Informativo 624 O STJ já decidiu nesse sentido admitindo a mitigação da Súmula 599 A despeito do teor do teor do enunciado sumular n 599 no sentido de que O princípio da insignificância é inaplicável aos crimes contra a administração pública as peculiaridades do caso concreto réu primário com 83 anos na época dos fatos e avaria de um cone avaliado em menos de R 2000 ou seja menos de 3 do salário mínimo vigente à época dos fatos justificam a mitigação da referida súmula haja vista que nenhum interesse social existe na onerosa intervenção estatal diante da inexpressiva lesão jurídica provocada RHC 85272RS rel Min Nefi Cordeiro 6ª Turma j 14082018 É pacífica a jurisprudência desta Corte Suprema no sentido de não ser aplicável o princípio da insignificância ou bagatela aos crimes relacionados a entorpecentes seja qual for a qualidade do condenado STF HC 91759MG rel Min Menezes Direito 1ª Turma j 09102007 31 32 33 34 35 36 37 38 39 40 41 RHC 35920DF rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 20052014 noticiado no Informativo 541 HC 110475SC rel Min Dias Toffoli 1ª Turma j 14022012 noticiado no Informativo 655 HC 155374PR rel Min Dias Tóffoli 2ª Turma j 17042018 noticiado no Informativo 898 É também o entendimento do STJ REsp 1688878SP rel Min Sebastião Reis Júnior 3ª Seção j 28022018 noticiado no Informativo 622 HC 128063PR rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 10042018 noticiado no Informativo 897 STJ HC 165003SP rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 20032014 noticiado no Informativo 540 HC 107331RS rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 28052013 e HC 110124SP rel Min Cármen Lúcia 1ª Turma j 14022012 HC 110964SC rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 07022012 noticiado no Informativo 654 É também a posição consolidada no STJ REsp 1427796RS rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 14102014 noticiado no Informativo 551 e AgRg no AREsp 348048RR rel Min Regina Helena Costa 5ª Turma j 18022014 noticiado no Informativo 536 EDcl no AgRg no REsp 1708371PR rel Min Joel Ilan Paciornik 5ª Turma j 24042018 STF HC 122560SC rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 08052018 noticiado no Informativo 901 e RHC 125566PR e HC 127926SC rel Min Dias Toffoli 2ª Turma j 26102016 noticiados no Informativo 845 Inq 3788DF rel Min Cármen Lúcia 2ª Turma j 01032016 noticiado no Informativo 816 Em igual sentido HC 112563SC rel orig Min Ricardo Lewandowski red p o acórdão Min Cezar Peluso 2ª Turma j 21082012 noticiado no Informativo 676 No STJ HC 93859SP rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 13082009 noticiado no Informativo 402 Com conclusão oposta vedando o princípio da insignificância nos crimes ambientais STJ HC 192696SC rel Min Gilson Dipp 5ª Turma j 17032011 noticiado no Informativo 466 STF HC 117638RJ rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 11032014 42 43 44 45 46 47 48 49 50 51 52 53 54 55 56 HC 93251DF rel Min Ricardo Lewandowski 1ª Turma j 05082008 noticiado no Informativo 514 E também HC 96153MG rel Min Cármen Lúcia 1ª Turma j 26052009 noticiado no Informativo 548 O STJ compartilha deste entendimento HC 132614MG rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 01062010 noticiado no Informativo 437 HC 97777MS rel Min Ricardo Lewandowski 1ª Turma j 26102010 noticiado no Informativo 606 HC 131771RJ rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 19102016 noticiado no Informativo 844 HC 131591 AgRAL rel Min Luiz Fux 1ª Turma j 02052017 HC 112400RS rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 22052012 noticiado no Informativo 667 e HC 102655RS rel Min Celso de Mello 2ª Turma j 22062010 noticiado no Informativo 592 REsp 1535956RS rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 01032016 noticiado no Informativo 578 RHC 133043MT rel Min Cármen Lúcia 2ª Turma j 10052016 noticiado no Informativo 825 HC 111017RS rel Min Ayres Britto 2ª Turma j 07022012 HC 120083SC rel Min Teori Zavascki 2ª Turma j 03062014 HC 154949MG rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 03082010 noticiado no Informativo 441 SILVA José Afonso da Comentário contextual à Constituição 4 ed São Paulo Malheiros 2007 p 145 STJ HC 81175SC rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 09112010 noticiado no Informativo 455 CERVINI Raúl Los procesos de descriminalización 2 ed Montevidéu Ed Universidad 1993 p 87 TAVARES Juarez Direito penal da negligência uma contribuição à teoria do crime culposo 2 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 p 294 É incabível a aplicação do princípio da adequação social segundo o qual dada a natureza subsidiária e fragmentária do direito penal não se pode reputar como criminosa uma ação ou uma omissão aceita e tolerada pela sociedade ainda que formalmente subsumida a um tipo legal incriminador STJ RHC 60611DF rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª 57 58 59 60 61 62 63 64 65 66 67 68 69 Turma j 15092015 HC 45153SC rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 30102007 HC 50863PE Rel Min Hélio Quaglia Barbosa 6ª Turma j 04042006 ROXIN Claus Problemas fundamentais de direito penal Trad Ana Paula dos Santos e Luís Natscheradetz 3 ed Lisboa Vega 2004 p 29 HC 92463RS rel Min Celso de Mello 2ª Turma j 16102007 Nesse sentido STF HC 86553SC rel Min Joaquim Barbosa 2ª Turma j 07032006 LUISI Luiz Os princípios constitucionais penais 2 ed Porto Alegre Sergio Fabris 2003 p 40 MIR PUIG Santiago Derecho penal Parte general 5 ed Barcelona Reppertor 1998 p 89 HC 197601RJ rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 28062011 noticiado no Informativo 479 E também AgRg no REsp 928851RS rel Min Jane Silva Desembargadora convocada do TJMG 6ª Turma j 14102008 FELDENS Luciano A Constituição penal a dupla face da proporcionalidade no controle de normas penais Porto Alegre Livraria do Advogado 2005 p 157 FERNANDES Antonio Scarance Processo penal constitucional 4 ed São Paulo RT 2005 p 54 HC 84427RJ rel Min Napoleão Nunes Maia Filho 5ª Turma j 28022008 AI no HC 239363PR rel Min Sebastião Reis Júnior Corte Especial j 26022015 noticiado no Informativo 559 QUEIROZ Paulo Direito penal Parte geral 3 ed São Paulo Saraiva 2006 p 45 Na dicção do STF Os direitos fundamentais não podem ser considerados apenas proibições de intervenção Eingriffsverbote expressando também um postulado de proteção Schutzgebote Podese dizer que os direitos fundamentais expressam não apenas uma proibição do excesso Übermassverbote como também podem ser traduzidos como proibições de proteção insuficiente ou imperativos de tutela Untermassverbote HC 102087MG rel Min Celso de Mello rel p 70 71 72 73 74 75 76 77 78 79 acórdão Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 28022012 A dignidade da pessoa humana deve ser entendida como corolário da natureza humana pois o ser humano deve ser sempre tratado de modo diferenciado em face da sua natureza racional Manifestase em todas as pessoas já que cada um ao respeitar o outro tem a visão do outro A dignidade humana existe em todos os indivíduos e impõe o respeito mútuo entre as pessoas Nesse sentido SILVA Marco Antonio Marques da Acesso à justiça penal e Estado Democrático de Direito São Paulo Juarez de Oliveira 2001 p 1 PALAZZO Francesco C Valores constitucionais e direito penal Trad Gérson Pereira dos Santos Porto Alegre Fabris 1989 p 80 HC 111017RS rel Min Ayres Britto 2ª Turma j 07022012 ROXIN Claus Derecho penal Parte general Fundamentos La estructura de la teoría del delito Trad espanhola DiegoManuel Luzón Peña Miguel Díaz y García Conlledo e Javier de Vicente Remensal Madrid Civitas 2006 t I p 5556 HC 102087MG rel Min Celso de Mello rel p acórdão Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 28022012 Cf ROXIN Claus Derecho penal Parte general Fundamentos La estructura de la teoría del delito Trad espanhola DiegoManuel Luzón Peña Miguel Díaz y García Conlledo e Javier de Vicente Remensal Madrid Civitas 2006 t I p 410 AgrQO 1033DF rel Min Celso de Mello Tribunal Pleno j 25052006 Há doutrinadores que denominam esse postulado de princípio da culpabilidade É o caso de LUISI Luiz Os princípios constitucionais penais 2 ed Porto Alegre Fabris 2003 p 32 Com o devido respeito essa posição não nos parece adequada Culpabilidade dependendo da estrutura do crime e da teoria da conduta que se adotem deve ser entendida como elemento do delito ou pressuposto de aplicação da pena Não se confunde com os elementos subjetivos do delito os quais na teoria clássica da conduta funcionam como requisitos da culpabilidade Inq 4483 AgRsegundoDF e Inq 4327 AgRsegundoDF rel Min Edson Fachin Plenário j 14122017 e 19122017 noticiados no Informativo 888 Falavase também em violação ao princípio em estudo na 80 81 82 83 84 85 86 responsabilidade penal sucessiva ou responsabilidade penal em cascata nos crimes previstos na Lei de Imprensa arts 37 a 39 da Lei 52501967 Esta Lei entretanto não foi recepcionada pela Constituição Federal como restou decidido pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 1307DF ajuizada pelo PDT Partido Democrático Trabalhista STF ADPF 130 7DF rel Min Carlos Britto Plenário j 30042009 O STF fundamentou sua decisão especialmente na incompatibilidade entre os dispositivos da Lei de Imprensa perante os valores do Estado Democrático de Direito acolhidos pela Constituição Federal notadamente a liberdade de expressão e o princípio da isonomia Para um estudo aprofundado do tema vide ANDRADE Manuel da Costa Liberdade de imprensa e inviolabilidade pessoal Coimbra Coimbra Editora 1996 STF HC 112776MS rel Min Teori Zavascki Plenário j 19122013 noticiado no Informativo 733 RE 453000RS rel Min Marco Aurélio Plenário j 04042013 noticiado no Informativo 700 CC 91016MT rel Min Paulo Gallotti 3ª Seção j 27022008 HC 297482CE rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 12052015 noticiado no Informativo 562 HC 285589MG rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 04082015 noticiado no Informativo 569 BANDEIRA DE MELLO Celso Antônio Conteúdo jurídico do princípio da igualdade 3 ed São Paulo Malheiros 1993 p 9 STF HC 103311PR rel Min Luiz Fux 1ª Turma j 07062011 noticiado no Informativo 630 Podese afirmar com segurança que a história da pena e consequentemente do Direito Penal embora não sistematizado se confunde com a história da própria humanidade De fato o ponto de partida da história da pena coincide com o ponto de partida da história da humanidade Em todos os tempos em todas as raças vislumbrase a pena como uma ingerência na esfera do poder e da vontade do indivíduo que ofendeu e porque ofendeu as esferas de poder e da vontade de outrem É correto pois reconhecer a existência da pena como um fato histórico primitivo bem como considerar o Direito Penal a primeira e mais antiga camada da história da evolução do Direito Além disso as diversas fases da evolução da vingança penal deixam evidente que não se trata de uma progressão sistemática com princípios períodos e épocas capazes de distinguir cada um de seus estágios mas algo que foi se desenvolvendo para atender as necessidades de seu tempo Por tal razão pode ser adotada uma tríplice divisão representada pelas seguintes fases 1 vingança divina 2 vingança privada e 3 vingança pública Todas essas etapas foram marcadas por forte sentimento religioso e espiritual Vale ressaltar ser essa divisão meramente didática haja vista uma fase se interligar e conviver com outra durante os tempos primitivos O homem primitivo não regulava sua conduta pelos princípios da causalidade e da consciência em torno de sua essência e circunstância mas sim no temor religioso ou mágico sobretudo em relação com o culto dos antepassados cumpridores das normas e com certas instituições de fundo mágico ou religioso1 Essa visão mágica e contraditória do homem e do mundo era nutrida pelos totens e tabus os quais marcavam presença nas diversas modalidades da pena com nítido e singular caráter expiatório Os totens assumiam as mais variadas formas de animais vegetais ou qualquer outro objeto considerado como ancestral ou símbolo de uma coletividade caracterizandose como seu protetor e objetos de tabus e deveres particulares Para Freud o totem via de regra é um animal comível e inofensivo ou perigoso e temido e mais raramente um vegetal ou um fenômeno natural como a chuva e a água que mantém relação peculiar com todo o clã Em primeiro lugar o totem é o passado comum do clã ao mesmo tempo é o seu espírito guardião e auxiliar que lhe envia oráculos e embora perigoso para os outros reconhece e poupa seus próprios filhos Em compensação os integrantes estão na obrigação sagrada sujeita a sanções automáticas de não matar nem destruir seu totem e evitar comer sua carne ou tirar proveito dele de outras maneiras2 O tabu consistia na proibição dos profanos de se relacionarem com pessoas objetos ou lugares determinados ou dele se aproximarem em virtude do caráter sagrado que possuíam e a sua violação acarretava ao culpado ou ao seu grupo o castigo da divindade Pelo fato de que para esses povos a lei tinha origem divina e como tal sua violação consistia numa ofensa aos deuses puniase o infrator para desagravar a divindade bem como para purgar o seu grupo das impurezas trazidas pelo crime Uma das reações contra o criminoso era a expulsão do grupo desterro medida que se destinava além de eliminar aquele que se tornara um inimigo da comunidade e dos seus deuses e forças mágicas a evitar que a classe social fosse contagiada pela mácula que impregnava o agente bem como as reações vingativas dos seres sobrenaturais a que o grupo estava submetido Destarte o castigo consistia no sacrifício de sua vida Castigavase com rigor com notória crueldade eis que o castigo deveria estar em consonância com a grandeza do deus ofendido a fim de amenizar sua cólera e reconquistar sua benevolência para com o seu povo Destacavase a pena de perda da paz como a paz está sob a proteção dos deuses a vingança tem o seu fundamento no preceito divino Uma vez perdida a paz o delinquente perdia a proteção do clã ficando exposto à sua própria sorte Surge posteriormente à vingança divina a fase da vingança privada em decorrência principalmente do crescimento dos povos e da complexidade social daí resultante Era uma vingança entre os grupos eis que encaravam a infração como uma ofensa não relacionada diretamente à vítima mas sobretudo ao grupo a que pertencia O homem primitivo tinha forte laço com sua comunidade uma vez que fora dela sentiase desprotegido ante sua imaginação mágica Fica nítida a interrelação entre a vingança divina e a privada Desse modo imperava a lei do mais forte a vingança de sangue em que o próprio ofendido ou outra pessoa do seu grupo exercia o direito de voltarse contra o agressor fazendo justiça pelas próprias mãos cometendo na maioria dos casos excessos e demasias o que culminava com a disseminação do ódio e consequentes guerras entre grupos Para demonstrar a intensa ligação do homem primitivo com sua comunidade se uma pessoa de determinado grupo era atingida por um grupo estrangeiro a vingança era coletiva e incidia sobre todo o grupo agressor3 Portanto inexistia qualquer proporção entre o delito praticado e a pena imposta e nesse sentido envolvia desde o indivíduo isoladamente considerado até o seu grupo social com sangrentas batalhas causando muitas vezes a completa eliminação das tribos Tamanha era a desproporção da vingança que um crime praticado por um indivíduo não raras vezes atingia como retribuição crianças e pessoas doentes integrantes do grupo do infrator Recaía inclusive sobre animais ou coisas Com o propósito de evitar a dizimação dos grupos surge a Lei do Talião do latim talis tal qual Pagará a vida com a vida mão com mão pé por pé olho por olho queimadura por queimadura Êxodo XXI versículos 23 a 25 Por mais impressionante que essa afirmação possa se revelar cuidase da pioneira manifestação do princípio da proporcionalidade por representar tratamento igualitário entre autor e vítima Foi a primeira tentativa de humanização da sanção penal apesar de nos dias atuais revelarse como brutal e cruel e restou acolhida pelo Código de Hamurabi Babilônia pelo Êxodo hebreus e na Lei das XII Tábuas romanos A título de exemplificação dispunha o Código de Hamurabi Art 209 Se alguém bate numa mulher livre e a faz abortar deverá pagar dez siclos pelo feto4 E também Art 210 Se essa mulher morre então deverá matar o filho dele No Êxodo dos hebreus Aquele que ferir mortalmente um homem será morto E na Lei das XII Tábuas Se alguém difama outrem com palavras ou cânticos que seja fustigado Ainda Se alguém profere um falso testemunho que seja precipitado da rocha Tarpeia E também Se alguém matou o pai ou a mãe que se lhe envolva a cabeça e seja colocado em um saco costurado e lançado ao rio Com o passar do tempo diante do elevado número de infratores as populações ficavam deformadas motivo pelo qual se evoluiu para o sistema da composição forma de conciliação entre o ofensor e o ofendido ou seus familiares pela prestação pecuniária como forma de reparar o dano dinheiro da paz O ofensor comprava sua liberdade evitando o castigo Por exemplo dispunha a norma das Leis Mosaicas Se um homem furtar um boi ou um carneiro e o matar ou vender pagará cinco bois pelo boi e quatro carneiros pelo carneiro A composição largamente aceita em sua época constitui um dos antecedentes da moderna reparação do dano do Direito Civil e das penas pecuniárias Com a evolução política da sociedade e melhor organização comunitária o Estado avocou o poderdever de manter a ordem e a segurança social conferindo a seus agentes a autoridade para punir em nome de seus súditos A pena assume nítido caráter público Os ofendidos não mais necessitam recorrer às suas próprias forças A finalidade dessa fase era garantir a segurança do soberano por meio da aplicação da sanção penal ainda dominada pela crueldade e desumanidade característica do direito penal então vigente Cabia a uma terceira pessoa no caso o Estado representante da coletividade e em tese sem interesse no conflito existente decidir impessoalmente a questão posta à sua análise ainda que de maneira arbitrária Nessa época as penas ainda eram largamente intimidatórias e cruéis destacandose o esquartejamento a roda a fogueira a decapitação a forca os castigos corporais e amputações entre outras Na Grécia Antiga em seus primórdios o crime e a pena se inspiravam no sentimento religioso Governavase em nome de Zeus A civilização grega produziu filósofos historiadores escritores e grandes pensadores que iniciaram o estudo da ciência política Como expoentes podem ser lembrados Sócrates Platão Aristóteles Ésquilo Sófocles e Eurípedes Com a Ciência Política iniciaramse as grandes discussões sobre política ética liberdade e justiça bem como noções e fundamento do direito de punir e da finalidade da pena influenciando profundamente a Ciência do Direito Em que pesem os estudos democráticos e filosóficos então reinantes os gregos pouco se preocuparam com os direitos fundamentais De fato todas as questões da vida seja no campo social ou político giravam em torno da cidade polis O homem não era concebido em sua individualidade A própria noção de democracia estava ligada à integração do homem ao Estado e por essa razão a escravidão era plenamente justificada Contribuíram ao colocar em pauta discussões relevantes acerca do fundamento do direito de punir e a finalidade da pena que no futuro e até nos dias de hoje atormentam as mentes dos juristas Na justiça ateniense as penas passaram a ser dotadas de certa dose de humanidade Autorizavase exemplificativamente a absolvição do culpado quando a sua eliminação fosse capaz de prejudicar os inocentes dele dependentes para sobreviver Pensavase no caso no desenvolvimento da sociedade e não propriamente no acusado A história do Direito Romano dividese em várias etapas as quais percorreram 22 séculos de 753 aC a 1453 dC de grandes transformações Em matéria penal o poder dos magistrados intitulado coercitio era totalmente discricionário e limitado apenas pela apelação ao povo provocatio ad populum direito exclusivo do cidadão romano Portanto dele não se podiam valer as mulheres os escravos e os estrangeiros Por força da possibilidade de apelação ao povo mesmo não existindo o princípio da reserva legal as decisões passaram a se revestir de fundamentação proporcionando maior segurança jurídica aos cidadãos romanos A elaboração da Lei das XII Tábuas foi fundamental para a evolução do Direito Romano já que disciplinou a utilização da vingança privada Com o passar do tempo a administração da justiça foi transferida do particular para um poder estatal central De igual modo o Direito Romano passou por um período de laicização deixando a lei de ser uma mensagem dos deuses Prescrevia a Lei das XII Tábuas O que os sufrágios do povo ordenaram em último lugar essa é a lei Em toda a sua existência o Império Romano teve como prioridade a busca pelo poder e pela prosperidade Por tal motivo não se ateve à proteção dos direitos fundamentais em face do arbítrio estatal O que se garantia eram os direitos das classes privilegiadas como os imperadores e patrícios Somente com o Cristianismo houve maior percepção da importância pelo respeito aos direitos fundamentais do homem que passou a ser concebido como imagem e semelhança de Deus Em Roma surgiu a distinção entre crimes públicos e crimes privados Crimes públicos envolviam a traição ou a conspiração política contra o Estado e o assassinato enquanto os demais eram crimes privados critério residual O julgamento dos crimes públicos era atribuição do Estado por meio de um magistrado e realizado por tribunais especiais A sanção aplicada era a pena capital Já o julgamento dos crimes privados era confiado ao particular ofendido interferindo o Estado apenas para regular o seu exercício Tais delitos pertenciam ao Direito privado e não passavam de meras fontes de obrigações Na visão de Sêneca àquela época as finalidades atribuídas à pena eram castigo emenda satisfação à vítima prevenção geral pela intimidação e segurança social Ao final da República foram publicadas as leges corneliae e juliae as quais criaram uma verdadeira tipologia de crimes para a época catalogando os comportamentos criminosos Foi a primeira manifestação ainda que tímida do princípio da reserva legal Os romanos também conheceram alguns institutos importantes nexo causal dolo e culpa caso fortuito inimputabilidade menoridade concurso de pessoas legítima defesa penas e sua dosagem Não procuraram definilos Ao contrário os utilizavam casuisticamente sem o apego à criação de uma teoria geral do Direito Penal O Direito Penal da Idade Média compreende principalmente o Direito Penal germânico e o Direito Penal canônico Não tinha leis escritas Caracterizavase como direito consuetudinário concebido como uma ordem de paz Sua transgressão poderia assumir caráter público ou privado se público impunhase a perda da paz consistente na ausência de proteção jurídica podendo o agressor ser perseguido e morto por qualquer pessoa se privado o crime o infrator era entregue à vítima ou a seus familiares para que exercessem o direito de vingança Havia penas de morte corporais mutilação exílio etc Mais tarde por influência do Direito Romano e do Cristianismo foram adotadas a Lei do Talião e a composição demonstrando traços de proporcionalidade no Direito Penal germânico Em decorrência da instituição de um poder público representante da vontade do povo a pena de morte passou a poder ser substituída por um preço da paz semelhante a uma fiança em que o violador da lei pagava uma pecúnia em troca de sua liberdade Como destaca Aníbal Bruno A porção penal das leis germânicas Leges barbarorum da época franca e outras posteriores a essa compilação tornouse na sua maior parte um minucioso tabelamento de taxas penais variáveis segundo a gravidade das lesões e também a categoria do ofendido ou a sua idade ou sexo5 Era o sistema da composição pecuniária Vehgeld que muito bem substituía a vingança privada no qual predominava a responsabilidade penal objetiva Em relação às provas acolhiamse as ordálias ou juízos de deus caracterizadas por superstições e atos cruéis sem chances de defesa para os réus que deveriam por exemplo caminhar sobre o fogo ou mergulhar em água fervente sem suportar ferimentos para que fosse provada a sua inocência razão pela qual quase nunca se livravam das bárbaras punições É o ordenamento jurídico da Igreja Católica Apostólica Romana e a primeira consolidação de suas normas e regras se deu por volta do ano de 1140 por decreto de Graciano Inicialmente teve caráter meramente disciplinar destinandose apenas aos seus membros Aos poucos com a crescente influência da Igreja e enfraquecimento do Estado estendeuse a religiosos e leigos desde que os fatos tivessem conotação religiosa Serviuse do procedimento de inquisição início de ofício utilização de tortura e penas cruéis Nada obstante predominasse à época o caráter retributivo da pena no Direito Penal canônico a pena se dirigia à cura do delinquente à sua recuperação pois se destinavam ao seu arrependimento perante a divindade poenas medicinales Nas palavras de Aníbal Bruno Era natural que nesse Direito a pena tivesse caráter sacral mas embora fosse em princípio de base retribucionista vingança divina vingança zelo justitiae et bono animo e não vingança amore ipsius vindictae dirigiase também à correção do criminoso Apesar da rudeza dos tempos e dos excessos e crueldades dos hereges devese à Igreja ter contribuído para a disciplina da repressão anticriminal e o fortalecimento da autoridade pública pelo combate à prática da vingança privada com a instituição das tréguas de Deus e do asilo religioso Reagiu assim contra o espírito individualista do Direito germânico apressando a marcha do Direito punitivo para a pena pública como única sanção justa e regular6 Diferentemente dos germanos aqui preponderava o elemento subjetivo para a incriminação de alguém A jurisdição eclesiástica era dividida em dois grupos em razão da pessoa a b c ratione personae e em razão da matéria ratione materiae Na primeira o religioso era sempre julgado por um Tribunal da Igreja independentemente do crime praticado Na segunda por seu turno a competência eclesiástica era fixada ainda que o crime fosse cometido por um leigo Os delitos se dividiam em Delicta eclesiastica ofendiam o direito divino eram da competência dos tribunais eclesiásticos e punidos com penitências Delicta mera secularia ofendiam apenas a ordem jurídica laica eram julgados pelos tribunais do Estado e suportavam as penas comuns Eventualmente sofriam punição eclesiástica com as poena medicinales e Delicta mixta violavam as ordens religiosa e laica e eram julgados pelo Tribunal que primeiro tivesse conhecimento da ofensa Pela Igreja eram punidos com as poena vindicativae Contribuiu consideravelmente para o surgimento da prisão moderna principalmente no tocante à reforma do criminoso Do vocábulo penitência derivam os termos penitenciária e penitenciário O cárcere como instrumento espiritual de castigo foi desenvolvido pelo Direito Canônico uma vez que pelo sofrimento e pela solidão a alma do homem se depura e purga o pecado A penitência visava aproximar o criminoso de Deus Como informa João Bernardino Gonzaga De acordo com o pensamento da Igreja a prisão penal não se destinava a castigar o condenado mas a leválo ao isolamento propício à reflexão salvadora bem como servia para impedir que ele continuasse a exercer más influências no rebanho cristão7 Com a doutrina da Igreja a prática das ordálias ou juízos de Deus comum ao povo germânico decaiu significativamente Ainda na Idade Média havia o Direito comum produto da reunião do Direito Romano do Direito germânico e do Direito Canônico com os direitos locais Importante ressaltar que essa época foi palco de grandes injustiças e horrores caracterizada pela arbitrariedade do Judiciário o qual criava e extinguia definições de crimes ao seu belprazer de acordo com seus interesses bem como pela crueldade na execução das penas que aliás eram diferentes para nobres e plebeus muito mais brutais para os últimos Podem ser apontadas como penas desse tempo forca fogueira arrancamento das vísceras enterramento com vida afogamento esquartejamento mutilações pés mãos lábios orelhas e castração entre outras de semelhante natureza Os condenados eram julgados mediante o arbítrio do Estado intimamente vinculado com a ordem cristã sem a possibilidade de defesa ou de um devido processo legal Torturavase para a obtenção de confissões e da verdade mormente em relação às feiticeiras mulheres que detinham conhecimentos medicinais A razão da vingança social ou divina e o objetivo da intimidação e exemplaridade justificavam os excessos amparados pelas leis confusas e indeterminadas normalmente prolixas e interpretadas em conformidade com o arbítrio da Igreja e dos juízes por ela doutrinados Sob o influxo do iluminismo destacase a clássica obra Dos delitos e das penas de Cesare Bonesana Marquês de Beccaria O Absolutismo impunha atos de punição crudelíssimos e arbitrários por meio de graves suplícios A sociedade não mais suportava tal forma de agir do Estado e a filosofia iluminista do século XVIII orientava a evolução da humanidade Preparavase o espírito dos indivíduos para a eclosão da Revolução Francesa De forma impressionante para a época Cesare Bonesana Marquês de Beccaria antecipa as ideias posteriormente consagradas na Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789 pugnando de maneira universal pela abolição da pena de morte Publica em Milão no ano de 1764 a famosa obra Dei delitti e delle pene que abre caminho ao movimento da Escola Clássica8 Baseia seu pensamento no contrato social de Rousseau de forma que o criminoso passa a ser reputado como violador do pacto social sendo então considerado adversário da sociedade A pena perdia seu caráter religioso predominando a razão sobre questões espirituais Surge a questão do livrearbítrio ou seja o homem pratica um crime consciente de sua conduta antissocial Como consequência do controle do indivíduo sobre os seus atos decorre que a pena deve ser sempre legalmente prevista para que todos saibam diferenciar o vedado do permitido e escolher o caminho a trilhar devendo ainda a sanção penal guardar proporcionalidade com o crime praticado na medida exata da retribuição necessária No pensamento de Beccaria a pena deve ser proporcional uma vez que os gritos de horror como consequências das torturas não retiram a realidade da ação já praticada revelando a inutilidade dos tormentos Dessa forma à medida da crueldade dos tormentos enrijecese a alma pelo espetáculo da barbárie e quanto maiores os castigos mais o indivíduo se dispõe a praticar novos crimes para subtrairse da pena que por primeiro mereceu Para ele a pena deveria ser imposta somente para que o condenado não voltasse a cometer crimes servindo de exemplo à sociedade Com efeito no sistema então reinante a prática de infrações penais era um negócio de risco no qual compensava assumir desafios e lucrar com a prática de delitos já que se qualquer um deles viesse a ser descoberto idêntica e desproporcional seria a punição Ademais quanto mais atrozes os tormentos mais graves por consequência serão os crimes praticados e o mal causado pela punição vai sempre além do proveito obtido com a prática delitiva Destarte conclui que outros meios mais eficazes existem para prevenir os crimes Inicialmente as leis devem ser certas claras e precisas uma vez que a incerteza das normas faz crescer a inatividade e a estupidez Com efeito o legislador sábio busca impedir o mal antes de reparálo com a elaboração de leis já que um cidadão de alma sensível constata que protegido por boas leis de simples compreensão perde a iníqua liberdade de praticar o mal e os crimes são prevenidos compensandose a virtude Se não bastasse uma autoridade severa produz obediência hipócrita e passageira e apenas com o aperfeiçoamento da educação estarseiam criando homens menos propensos ao cometimento do mal Somente poderia o magistrado aplicar penas previstas em lei É o princípio da legalidade Finalmente para que cada pena não seja uma violência de um ou de muitos contra um cidadão privado deve ser essencialmente pública rápida necessária a mínima possível nas circunstâncias dadas proporcional aos delitos e ditadas pelas leis 1 2 3 4 5 6 7 8 BRUNO Aníbal Direito penal parte geral 3 ed Rio de Janeiro Forense 1967 t I p 54 FREUD Sigmund Totem e tabu Trad Órizon Carneiro Muniz 2 ed Rio de Janeiro Imago 1995 v 13 p 22 Obras completas de Sigmund Freud MARQUES Oswaldo Henrique Duek Fundamentos da pena São Paulo Juarez de Oliveira 2000 p 3 Siclos é uma antiga moeda dos hebreus de prata cujo peso equivalia a seis gramas BRUNO Aníbal Direito penal parte geral 3 ed Rio de Janeiro Forense 1967 t I p 6970 Idem ibidem t I p 72 GONZAGA João Bernardino A inquisição em seu mundo 4 ed São Paulo Saraiva 1993 p 135 Consultamos a obra BECCARIA Cesare Dos delitos e das penas Trad Lucia Guidicini e Alessandro Berti Contessa São Paulo Martins Fontes 1991 41 PERÍODO COLONIAL Antes do descobrimento do Brasil enquanto dominava a civilização primitiva adotavase a vingança privada sem uniformidade nas reações penais Informam os historiadores que nossos silvícolas não desconheceram o sistema do talião e ainda que empiricamente sem qualquer fonte teórica se depararam com a composição e a expulsão da tribo No tocante às formas punitivas predominavam as penas corporais sem o emprego da tortura Não havia uma autêntica organização jurídicosocial mas apenas regras consuetudinárias tabus comuns ao mínimo convívio social transmitidas verbalmente e quase sempre dominadas pelo misticismo A partir de 1500 com o descobrimento do Brasil passou a vigorar o Direito lusitano aplicandose sucessivamente 1 Ordenações Afonsinas1 Promulgadas em 1446 por D Afonso V vigoraram até 1514 e apresentavam conteúdo do Direito Romano de Justiniano e do Direito Canônico Tinham como traços marcantes a crueldade das penas a inexistência de princípios sagrados como o da legalidade e o da ampla defesa predominando a arbitrariedade dos juízes quando da fixação da pena A prisão tinha caráter preventivo Mantinhase o delinquente preso para evitar sua fuga até ser julgado ou para obrigálo ao pagamento da pena pecuniária 42 2 Ordenações Manuelinas Editadas em 1514 por Dom Manuel o Venturoso Pouco se diferenciavam das Ordenações Afonsinas em que as penas também eram crudelíssimas Correspondiam ainda à fase da vingança pública Como no território pátrio existiam as denominadas capitanias hereditárias o Direito era aplicado pelos respectivos donatários 3 Ordenações Filipinas Datadas de 1603 em razão de medida do Rei Filipe II subsistiram até o ano de 1830 Mantiveram as características das Ordenações anteriores penas cruéis e desproporcionais arbitrariedade dos julgadores inexistência do princípio da legalidade e da defesa etc A matéria penal era regulamentada pelo Livro V e foi sob a égide desse ordenamento que Tiradentes foi executado estendendo as consequências penais de seu comportamento também aos seus descendentes Não se respeitava o princípio da personalidade da pena ficando ao arbítrio do julgador a escolha da sanção penal a ser aplicada bem como sequer tinha o delinquente direito de defesa e predominava a desigualdade de classes em relação ao tratamento punitivo fidalgos cavaleiros escravos etc Marcadas pela fase da vingança pública todas se orientavam no sentido de uma ampla e generalizada criminalização com severas punições as quais objetivavam infundir o temor pela punição Além do predomínio da pena de morte eram usadas outras sanções bárbaras e infamantes como o açoite a amputação de membros o confisco de bens as galés eram aplicadas como comutação da pena de morte ou em grau mínimo para os crimes de perjuro pirataria ou de ofensa física irreparável da qual resultasse aleijão ou deformidade Os punidos pelas galés deviam andar com calceta no pé e corrente de ferro além de serem obrigados a trabalhos públicos e ao degredo consiste na fixação de residência em local determinado pela sentença CÓDIGO CRIMINAL DO IMPÉRIO O art 179 XVIII da Constituição de 1824 determinou a urgente e necessária elaboração de um Código Criminal fundado nas solidas bases da justiça e equidade 43 Em 1827 Bernardo Pereira de Vasconcellos apresentou o seu projeto o qual foi sancionado em 1830 pelo imperador Dom Pedro I destacandose como o primeiro código autônomo da América Latina Com a elaboração desses dois ordenamentos Constituição e Código Criminal do Império o Direito Penal deu nítidos sinais de evolução em prol da humanização Dispunha a Constituição de 1824 em seu art 179 XIX Desde já ficam abolidos os açoites a tortura a marca de ferro quente e todas as mais penas cruéis E no item XX do mesmo dispositivo Nenhuma pena passará da pessoa do delinquente Por tanto não haverá em caso algum confiscação de bens nem a infamia do Réo se transmittirá aos parentes em qualquer gráo que seja Foi a primeira manifestação do princípio da personalidade da pena no Brasil Apesar disso eram permitidas as penas de morte na forca de galés de trabalhos forçados de banimento degredo e desterro Entre as grandes inovações consagrouse no art 55 do Código Criminal do Império o sistema do diamulta Nada obstante as características positivas não foi definida a figura da culpa e imperava a desigualdade principalmente em relação aos escravos que aliás eram equiparados a animais e portanto considerados como bens semoventes PERÍODO REPUBLICANO Com o advento da República João Baptista Pereira foi encarregado de elaborar um projeto de Código Penal que restou aprovado e publicado em 1890 antes portanto da Constituição de 1891 Esse Código criado às pressas desapontou pelas suas inúmeras falhas Ignorou os avanços e tendências mundiais que se faziam sentir em razão do positivismo bem como os exemplos de códigos estrangeiros notadamente o Código Zanardelli Seus equívocos e deficiências acabaram transformandoo em verdadeira colcha de retalhos Era enorme a quantidade de leis extravagantes que finalmente se concentraram na Consolidação das Leis Penais de Vicente Piragibe promulgada em 1932 Durante o Estado Novo em 1937 Alcântara Machado apresentou um projeto de Código Penal brasileiro o qual foi sancionado em 1940 passando a vigorar desde 1942 até os dias atuais alterado por diversas leis contemporâneas tais como a Lei 64141977 atualizando as sanções penais e a Lei 72091984 Reforma da Parte Geral do Código Penal A reforma da Parte Geral humanizou as sanções penais e adotou penas alternativas à prisão além de reintroduzir o sistema de diasmulta Em 1969 foi aprovado o Projeto de Nélson Hungria para criação de um novo Código Penal Entretanto deuse sua revogação quando ainda se encontrava em vacatio legis 1 As Ordenações Afonsinas foram consideradas o primeiro código completo da Europa Destaquese Portugal foi o primeiro país da Europa a possuir um Código completo dispondo sobre quase todas as matérias da administração de um Estado as Ordenações Afonsinas O Código Afonsino é por si só um acontecimento notável na Legislação dos Povos Cristãos Foi um incontestável progresso e revela os adiantamentos que Portugal tinha em Jurisprudência PINHO Ruy Rebello História do direito penal brasileiro Período Colonial São Paulo Bushatsky Editora da Universidade de São Paulo 1973 p 5 1 A nomenclatura Escola Clássica foi desenvolvida pejorativamente pelos positivistas em face da divergência de pensamentos sobre os conceitos estruturais do Direito Penal A Escola Clássica nasceu entre o final do século XVIII e a metade do século XIX como reação ao totalitarismo do Estado Absolutista filiandose ao movimento revolucionário e libertário do Iluminismo Viviase o século das luzes Seus fundamentos tiveram origem nos estudos de Beccaria e foram lapidados e desenvolvidos principalmente pelos italianos Francesco Carrara autor da obra Programa del corso di diritto criminale publicada em 1859 Carmignani que escreveu Elementa juris criminalis publicado em 1847 e Rossi que contribuiu com o Trattato di diritto penale de 1859 Outros famosos representantes da Escola Clássica foram Mittermaier e Birkmeyer na Alemanha Ortolan e Tissot na França e F Pacheco e J Montes na Espanha Todos eles tinham em comum a utilização do método racionalista e dedutivo lógico e eram em regra jusnaturalistas ou seja aceitavam que normas absolutas e naturais prevalecessem sobre as normas do direito posto Basicamente suas notas fundamentais eram entendiam o crime como um conceito meramente jurídico tendo como sustentáculo o direito natural Para Francesco Carrara crime é a infração da lei do Estado promulgada para proteger a segurança dos cidadãos resultante de um ato externo do homem positivo ou 2 3 negativo moralmente imputável e politicamente danoso predominava a concepção do livrearbítrio isto é o homem age segundo a sua própria vontade tem a liberdade de escolha independentemente de motivos alheios autodeterminação Logo por ser possuidor da faculdade de agir o homem é moralmente responsável pelos seus atos e por ser responsável àquele que infringiu a norma penal deve ser imposta uma pena como forma de retribuição pelo crime cometido Se ao contrário o agente não estava em suas perfeitas condições psíquicas ausência da faculdade de agir inimputabilidade não pode ser punido Foi sob a influência dos pensamentos de Kant e Hegel que a concepção retribucionista do Direito Penal se desenvolveu Ou seja a única finalidade da pena consistia na aplicação de um mal ao infrator da lei penal A sanção penal era na verdade um castigo necessário para o restabelecimento do Direito e da justiça Para Moniz Sodré em relação ao condenado a pena Não lhe é imposta somente como um meio eficaz de defesa social senão também e muito principalmente como um castigo devido a todo culpado não é considerada um remédio contra o crime mas uma punição merecida em vista do mal que voluntariamente fez Ela é aplicada não em nome da conservação da sociedade mas para a satisfação da justiça1 Em decorrência do ideal iluminista prevaleceu a tendência de eliminar as penas corporais e os suplícios Além disso outra contribuição dessa escola referese à passagem do caráter de vingança real ou religioso da pena para aquela tida como uma resposta da própria sociedade a fim de manter sua própria segurança A Escola Clássica havia conseguido enfrentar com êxito as barbáries do Absolutismo e o respeito do indivíduo como ser humano já despontava nos países civilizados Entretanto os ambientes político e filosófico em meados do século XIX revelavam grande preocupação com a luta eficiente contra a crescente criminalidade Manifestavase a necessidade de defesa da sociedade e os estudos biológicos e sociológicos assumiam relevante importância principalmente com as doutrinas evolucionistas de Darwin e Lamarck e sociológicas de Comte e Spencer Nasce então a Escola Positiva também denominada Positivismo Criminológico despontando os estudos dos três mosqueteiros2 Cesare Lombroso Enrico Ferri e Rafael Garofalo Chamouse positiva pelo método e não por aceitar a filosofia do positivismo de Augusto Comte Cesare Lombroso médico representou a fase antropológica da Escola Positiva Autor das obras O cretinismo na Lombardia 1859 e O homem delinquente 1876 a ele se imputa o ensinamento de que o homem não é livre em sua vontade Ao contrário sua conduta é determinada por forças inatas Com ele se iniciou de forma científica a aplicação do método experimental no estudo da criminalidade Também ofereceu à comunidade jurídica a teoria do criminoso nato predeterminado à prática de infrações penais por características antropológicas nele presentes de modo atávico Em seguida acrescentou ao atavismo como causas do crime também a loucura moral e a epilepsia larvada e finalmente por influência de Ferri alia às causas antropológicas também os fatores físicos e sociais Enrico Ferri empunha a bandeira da fase sociológica no Positivismo Criminológico destacandose suas obras Sociologia criminal 1892 e Princípios de direito criminal 1926 Com seus estudos contribuiu para a reafirmação e defesa da tese negativa do livrearbítrio determinismo biológicosocial fundamentando a responsabilidade penal na responsabilidade social De suas posições surge a mais nítida concepção da pena como mecanismo de defesa social Em suas palavras Porque a sociedade humana nação pode ser ameaçada e prejudicada no exterior e internamente o Estado tem duas funções supremas de defesa social que são a defesa militar contra as agressões externas e a justiça penal contra as agressões internas quando estas já se verificaram e a polícia de segurança antes que se venham a cometer3 Finalmente Rafael Garofalo é o baluarte da fase jurídica da Escola Positiva Empregou e imortalizou a expressão Criminologia título de sua principal obra publicada em 1885 conferindo aspectos estritamente jurídicos ao movimento Atribuise a ele o conceito de delito natural compreendido como ação prejudicial e que fere ao mesmo tempo alguns desses sentimentos que se convencionou chamar o senso moral de uma agregação humana Influenciado pela teoria da seleção natural sustentava que os criminosos não assimiláveis deveriam ser eliminados pela deportação ou pela morte Na Escola Positiva destacouse o método experimental no qual o crime e o criminoso deveriam ser estudados individualmente inclusive com o auxílio de outras ciências Ganhou relevo o determinismo negandose o livre arbítrio haja vista que a responsabilidade penal se fundamentava na responsabilidade social no papel que cada ser humano desempenhava na coletividade O Correcionalismo Penal também chamado de Escola Correcionalista surgiu na Alemanha em 1839 com a publicação da obra Comentatio na poena malum esse debeat de Karl David August Röeder professor da Universidade de Heidelberg Esse posicionamento surgiu de forma inovadora e revolucionária em relação às tendências da época submetendo a uma detalhada análise as teorias fundamentais sobre o delito e a pena Para Röeder a pena tem a finalidade de corrigir a injusta e perversa vontade do criminoso e dessa forma não pode ser fixa e determinada como na visão da Escola Clássica Ao contrário a sanção penal deve ser indeterminada e passível de cessação de sua execução quando se tornar prescindível Este foi o grande mérito do jurista ter lançado no Direito Penal a semente da sentença indeterminada Com efeito o fim da pena jamais seria a repressão ou a punição afastando destarte as teorias absolutistas Também não seria a prevenção geral mas apenas a prevenção especial Destacase a célebre frase de Concépcion Arenal não há criminosos incorrigíveis e sim incorrigidos Buscase assim a emenda de todos os delinquentes Curioso anotar que o penalista alemão não ganhou asseclas em seu país Contudo sua teoria disseminouse pela Europa principalmente na Espanha com importantes cultores destacandose Pedro Dorado Montero El derecho protector de los criminales El derecho y sus sacerdotes Concepción Arenal El visitador del pobre Estudios penintenciarios entre outros Alfredo Calderón Giner de los Rios Romero y Girón e Rafael Salillas Dorado Montero pugnou pela implementação de métodos corretivos e tutelares que sem a índole de castigo redimissem o criminoso tido como um ser incapaz para o Direito e a pena como um meio para a realização do bem social Daí a razão de sustentar que o criminoso tem o direito de exigir a execução da pena e não o dever de cumprila Somente assim acentua a função penal de hoje perderá o caráter odioso que inevitavelmente a acompanha De repressiva tornarseá preventiva de punitiva passará a ser correicional educativa e protetora de certos indivíduos a quem se dá o nome de delinquentes4 Deveras a Escola Correcionalista sustenta que o direito de reprimir os delitos deve ser utilizado pela sociedade com fim terapêutico isto é reprimir curando Não se deve pretender castigar punir infligir o mal mas apenas regenerar o criminoso Nas palavras de Basileu Garcia O Direito Penal visa converter o criminoso em homem de bem É preciso subtraílo à esfera das causas perversoras que o rodeiam e o conduzem à prática do mal Devem serlhe aplicados os meios ressocializadores adequados às suas tendências às falhas da sua personalidade Ao Estado cabe amparálo tal qual faz com outros deficientes porquanto dá curador ao louco e tutor ao menor a que falta a assistência dos pais5 Toda esta orientação da Escola Correcionalista encontrase inserida no ideário humanista reinante nas civilizações modernas Cumpre consignar que o natimorto Código Penal de 1969 estabeleceu a pena relativamente indeterminada para os criminosos habituais e por tendência6 Modernamente podese dizer que o correcionalismo idealizado por Röeder transfundido e divulgado nas obras de Dorado Montero e Concépcion Arenal teve em Luis Jiménez de Asúa seu maior entusiasta e o mais eficiente dos expositores ao defender a ressocialização como finalidade precípua da sanção penal7 O Tecnicismo Jurídico iniciouse na Itália quando em aula histórica sobre Il problema e il metodo della scienza del diritto penalle proferida na Universidade de Sassari em 15 de janeiro de 1910 Arturo Rocco delimitou o método de estudo do Direito Penal como o positivo restrito às leis vigentes dele abstraindo o conteúdo causalexplicativo inerente à antropologia sociologia e filosofia O mérito do movimento atualmente dominante na Itália e abraçado pela maioria das nações foi excluir do Direito Penal toda carga de investigação filosófica limitandoo aos ditames legais Com efeito o jurista deve valerse da exegese para concentrarse no estudo do direito positivo As preocupações causaisexplicativas pertencem a outros campos filosóficos sociológicos e antropológicos que se valem do método experimental Por sua vez o Direito Penal tem conteúdo dogmático razão pela qual seu intérprete deve utilizar apenas o método técnicojurídico cujo objeto é o estudo da norma jurídica em vigor Em sua origem o tecnicismo jurídico liderado por Arturo Rocco Vicenzo Manzini Massari e Delitala entre outros todos eles inspirados nos estudos de dogmática jurídicopenal elaborados por Karl Binding negava a abordagem do livrearbítrio bem como a existência do direito natural sustentando ser a sanção penal mero meio de defesa do Estado contra a periculosidade do agente Tais razões levaram Aníbal Bruno a concluir que o tecnicismo jurídico é uma forma de classicismo grandemente influenciada pela doutrina alemã sobretudo depois de Binding8 Todavia em uma segunda etapa mais moderna capitaneada por Maggiore Giuseppe Bettiol Petrocelli e Giulio Battaglini o tecnicismo jurídico acabou acolhendo a existência do direito natural admitindo o livre arbítrio como fundamento do direito punitivo voltando a pena a assumir sua índole retributiva No estudo do Direito Penal há três ordens de pesquisa e investigação A primeira delas é a exegese na opinião de Rocco utilizada sempre de forma restrita e limitada ao aspecto gramatical ao passo que se deveriam buscar o alcance e a vontade da lei A segunda é a dogmática que responsável pela exposição dos princípios fundamentais do direito positivo oferece critérios para a integração e criação do Direito pela sistematização dos princípios Constituise na conjunção sistemática das normas jurídicas postas em relações recíprocas abstraindo conceitos até o mais geral retornando em seguida ao particular Por último a terceira ordem de pesquisa e investigação apontada é a crítica que estuda o Direito como ele deveria ser buscando a sua construção e apresentando propostas de reforma Atua em dois âmbitos quais sejam direito penal positivo vigente e política criminal com os contornos da filosofia do Direito Para Arturo Rocco o tecnicismo jurídico seria o equilíbrio resultante do embate entre a lenta evolução da Escola Clássica e a violenta reação da Escola Positiva O tecnicismo jurídico representou um movimento de restauração metodológica sobre o estudo do Direito Penal Dessa forma não constituiu uma nova Escola Penal haja vista que não se preocupou com as questões inerentes à etiologia do delito à natureza da criminalidade e ao fundamento da responsabilidade penal nem com o conceito acerca da pessoa do delinquente Cumpre ressaltar que essa corrente posicionase da mesma forma que os clássicos diante dos principais problemas do Direito Penal é dizer o conceito do crime a persistência da ideia de responsabilidade moral com a diferenciação entre imputáveis e inimputáveis além da pena com índole retributiva e expiatória A verdadeira ideia de defesa social surgiu no início do século XX em decorrência dos pensamentos da Escola Positiva do Direito Penal Em outras palavras não é possível conceber uma teoria da defesa social sem considerar a revolta positivista Todavia a defesa social não se confunde com a doutrina positivista e como teoria autônoma não se inclui nos ensinamentos do Positivismo Em verdade surge como uma reação anticlássica reforçada pelas ideias delineadas pelos representantes do Positivismo Lombroso Ferri e Garofalo Era uma doutrina preocupada unicamente com a proteção da sociedade contra o crime Nesse sentido os positivistas falam em movimento da defesa social Essa função de defesa social deveria ser garantida da forma mais eficaz e integral possível repudiando a imposição de penas insuficientes rotineiramente abrandadas pela indulgência dos tribunais O combate à periculosidade tornarase a principal finalidade do Direito Penal Deveras surgiu apenas no século XX com a União Internacional de Direito Penal fundada por Von Liszt Van Hamel e Adolphe Prins este último seu maior estudioso tendo seus ideais posteriormente sido consolidados por Fillipo Gramatica e Marc Ancel O primeiro estatuto da União Internacional desprezava os postulados tradicionais sustentando ser a missão do Direito Penal a luta contra a criminalidade vista como fenômeno social Desejava com os esforços de seus membros que a ciência penal e a legislação da época acolhessem os resultados dos estudos antropológicos e sociológicos O fim único da justiça penal é garantir da melhor maneira possível a proteção da pessoa da vida do patrimônio e da honra dos cidadãos Para tanto faziase imprescindível a substituição da noção da responsabilidade moral pelo critério da periculosidade do delinquente Aplicamse com frequência os institutos das medidas de segurança e das penas indeterminadas as quais devem subsistir enquanto durar a periculosidade possibilitando a proteção eficaz e refletida da sociedade finalidade precípua mesmo sabendose que com elas poderá ser tolhido o interesse individual do condenado9 Como ideia principal extraise a reclamação de segregação dos delinquentes perigosos com intuito de submetêlos a um regime de rigor Ao mesmo tempo buscavase uma medida de neutralização de tais pessoas privandoas da eliminação radical com o emprego da pena capital considerando que o ser antissocial apesar de tudo continua sendo um homem merecendo tratamento coerente com uma política criminal humanista e racional Já no período compreendido entre as duas grandes Guerras Mundiais desenvolveuse a profilaxia criminal baseada na assistência educativa e na organização de uma prevenção calcada no estudo completo da personalidade do delinquente não se esquecendo do respeito pela pessoa humana Entretanto regimes autoritários que eclodiram na Europa começaram a imprimir ao Direito Penal nova dinâmica marcada pelo retorno ofensivo e brutal das ideias de castigo e intimidação Iniciase então uma nova fase da defesa social que ante os horrores dos regimes autoritários impõe importantes manifestações a prevenção do crime e o tratamento do menor delinquente bem como a reforma penitenciária Começava assim a aproximarse das ciências criminológicas e penitenciárias buscando uma política criminal alicerçada na dignidade da pessoa humana Para Gramatica grande expoente da Escola a defesa social tinha por principal objetivo o aprimoramento da sociedade mais inclusive do que a sua defesa e tal aprimoramento somente seria obtido por um progresso por uma adaptação do indivíduo Nesses termos a sociedade não passava de uma necessidade de fato de forma que as suas regras da vida não eram mais do que convenções o que demonstrava a relatividade das leis e impunha limites ao Estado no estabelecimento de uma ordem jurídica No seu pensamento um direito de defesa social deveria substituir o Direito Penal então existente pois a finalidade daquele era a adaptação do indivíduo à ordem social e não a sanção de seus atos ilícitos Delineavamse os dois critérios essenciais para Gramatica subjetivação e antissocialidade Sua teoria de defesa social encerra as seguintes conclusões o Estado não deve punir pois sua função é melhorar o indivíduo A causa da antissocialidade está na organização social Contra ela o Estado deve operar preventivamente e não somente pela repressão Os cárceres são inúteis e prejudiciais devendo ser abolidos As penas devem ser substituídas por medidas educativas e curativas O violador da lei não perigoso pode ser perdoado não necessitando sanção A pena como medida de defesa social deve ser fixa ou dosada não na base do dano mas segundo a personalidade do agente Gramatica diz não uma pena para todo crime um provimento para cada pessoa A noção objetiva do crime é substituída pela noção subjetiva da antissocialidade pessoal Deve ser portanto aprofundado o estudo da personalidade humana Os direitos fundamentais da pessoa devem ser sempre respeitados10 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 SODRÉ Moniz As três escolas penais 5 ed Rio de Janeiro Freitas Bastos 1952 p 262 ANCEL Marc A nova defesa social um movimento de política criminal humanista Trad Osvaldo Melo Rio de Janeiro Forense 1979 p 84 FERRI Enrico Princípios de direito criminal Trad Paolo Capitanio 2 ed Campinas Bookseller 1999 p 123 DORADO MONTERO Pedro Bases para um nuevo derecho penal Buenos Aires Depalma 1973 p 12 GARCIA Basileu Instituições de direito penal 4 ed 37 tir São Paulo Max Limonad 1975 v 1 t I p 72 Cf Itens 26 27 e 28 da Exposição de Motivos do Decretolei 1004 de 21 de outubro de 1969 JIMENEZ DE ASÚA Luis Tratado de derecho penal 5 ed Buenos Aires Losada 1992 t II p 5660 BRUNO Aníbal Direito penal cit p 116 PRINS Adolphe Ciência penal e direito positivo Trad de Henrique de Carvalho Lisboa Livraria Clássica 1915 p 753 LYRA Roberto Novíssimas escolas penais Rio de Janeiro Borsoi 1956 p 7677 61 POSITIVISMO JURÍDICO Encontra sua origem na Alemanha com os estudos de Binding em sua obra Die Normen und ihre Ubertretung maior expoente do positivismo jurídico que triunfou na década de 70 do século XIX O positivismo jurídico tinha nítida preferência pela cientificidade excluindo os juízos de valor e limitando seu objeto ao direito positivo Devese a esta doutrina que não se confunde com a Escola Positiva o conceito clássico de delito afastado de qualquer contribuição filosófica psicológica ou sociológica Conferiu tratamento exageradamente formal ao comportamento humano definido como delituoso de forma que a conduta seria um mero movimento corporal que produz uma modificação no mundo exterior A conduta portanto era meramente objetiva vinculada ao resultado pela relação de causalidade Pretendeu aplicar ao direito os mesmos métodos de observação e investigação que eram utilizados nas ciências experimentais o que rapidamente se percebeu inaplicável no tocante a algo tão circunstancial como a norma jurídica Para Luiz Flávio Gomes Antonio GarcíaPablos de Molina e Alice Bianchini O Direito positivo estudase em si mesmo separado do resto da realidade isolado desta como se fosse uma realidade independente Com o que acaba por se transformar em um formalismo normativista 62 que se ocupa exclusivamente da norma afastandose o jurista completamente do social e do valorativo Em um mimetismo fiel aos métodos próprios das ciências da natureza procurase apenas a ligação formal dos conceitos jurídicopositivos com base neles por indução constróise o sistema depois podem ser extraídos novos conceitos e se obter as lógicas consequências por via dedutiva fechandose assim o ciclo induçãodedução que caracteriza todos os métodos das ciências experimentais1 Constituíase em posição extremamente normativista e formal assim justificada por seus partidários por respeitar excessivamente o princípio da legalidade e a segurança jurídica NEOKANTISMO PENAL Esse sistema tem bases idênticas às do Positivismo surgindo no fim do século XIX Teve como principais representantes Rudolf Stammler e Gustav Radbruch Entretanto os positivistas atribuíam prioridade ao ser do direito ao passo que os neokantistas propunham um conceito que supervaloriza o dever ser mediante a introdução de considerações axiológicas e materiais Desta forma o neokantismo substitui o método puramente jurídicoformal do positivismo acolhendo como objetivo fundamental a compreensão do conteúdo dos fenômenos e categorias jurídicas muito além de sua simples definição formal ou explicação causal A Ciência do Direito ao contrário da ciência natural preocupase com os fins e não com as causas por isso há uma independência entre elas Assim ao lado das ciências naturais mas separadamente delas o Direito deve promover e construir uma ciência de fins humanos Consequentemente esta teoria permitiu graduar o injusto de acordo com a gravidade da lesão produzida A conduta passou a ter um significado social e já não mais era considerada como mero movimento corporal Permitiu ainda a introdução de elementos normativos e subjetivos nos 63 tipos penais A ilicitude passou a ter uma concepção material sendo aceita como lesividade social com o auxílio do conceito de bem jurídico Por sua vez adotouse a teoria psicológiconormativa revestindo a culpabilidade com o juízo de reprovabilidade Como bem destaca JesúsMaría Silva Sánchez acerca do neokantismo penal No marco estrito da teoria do delito permite fundamentar a introdução de elementos valorativos na causalidade antes física de elementos subjetivos no tipo antes objetivo de considerações materiais na ilicitude antes basicamente formal e normativa na culpabilidade antes entendida como relação de causalidade psicológica Uma teoria dogmática que conseguiu elaborar os princípios materiais regulatórios da ilicitude no Direito Penal e deles extrair a fundamentação de possíveis causas supralegais de justificação uma teoria que construiu o princípio da inexigibilidade no âmbito da culpabilidade constitui provavelmente algo mais que um mero complemento do positivismo2 GARANTISMO PENAL A doutrina do garantismo penal tem em Luigi Ferrajoli a figura do seu principal entusiasta Surge com a obra Direito e razão considerada por muitos a bíblia dos estudos garantistas Tratase de modelo universal e por essa razão se transforma em uma meta a ser alcançada pelos operadores do Direito destinado a contribuir com a moderna crise que assola os sistemas penais desde o nascedouro da lei até o final do cumprimento da sanção penal atingindo inclusive particularidades inerentes ao acusado depois da execução penal Engloba assim diversas fases criação da lei penal com eleição dos bens jurídicos tutelados validade das normas e princípios do direito e do processo penal respeito pelas regras e garantias inerentes à atividade jurisdicional a regular função dos sujeitos processuais as peculiaridades da execução penal etc Ferrajoli assenta seu sistema garantista também chamado de cognitivo ou de legalidade estrita em dez axiomas ou princípios axiológicos 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 fundamentais a saber Nulla poena sine crimine princípio da retributividade ou da consequencialidade da pena em relação ao delito Nullum crimen sine lege princípio da reserva legal Nulla lex poenalis sine necessitate princípio da necessidade ou da economia do direito penal Nulla necessitas sine injuria princípio da lesividade ou da ofensividade do resultado Nulla injuria sine actione princípio da materialidade ou da exterioridade da ação Nulla actio sine culpa princípio da culpabilidade ou da responsabilidade pessoal Nulla culpa sine judicio princípio da jurisdicionalidade Nullum judicium sine accusatione princípio acusatório ou da separação entre juiz e acusação Nulla accusatio sine probatione princípio do ônus da prova ou da verificação e Nulla probatio sine defensione princípio do contraditório ou da defesa ou da falseabilidade Esses princípios de índole penal e processual penal compõem um modelolimite apenas tendencialmente e jamais perfeitamente capazes de atender todos os direitos e garantias do ser humano Irradiam reflexos em todo o sistema alterando as regras do jogo fundamental do Direito Penal3 A doutrina moderna divide o garantismo penal em monocular e binocular ou integral O primeiro preocupase unicamente com os interesses do acusado Em situações extremas caracterizadas pelo favorecimento exagerado aos anseios do agente é rotulado como hiperbólico monocular O segundo binocular ou integral volta sua atenção igualmente às pretensões do acusado e da sociedade 64 FUNCIONALISMO PENAL Iniciouse na Alemanha a partir dos idos de 1970 uma forte revolução entre os penalistas com o intuito de submeter a dogmática penal aos fins específicos do Direito Penal Como esse movimento é posterior ao finalismo e aproveitou muitos dos seus fundamentos é também chamado de pós finalismo Pretendiase abandonar o tecnicismo jurídico no enfoque da adequação típica possibilitando ao tipo penal desempenhar sua efetiva função de mantenedor da paz social e aplicador da política criminal Essa é a razão do nome desse sistema funcional O funcionalismo penal questiona a validade do conceito de conduta desenvolvido pelos sistemas clássico e finalista E ao conceber o Direito como regulador da sociedade delimita o âmbito das expectativas normativas de conduta vinculandose à teoria da imputação objetiva Buscase o desempenho pelo Direito Penal de sua tarefa primordial qual seja possibilitar o adequado funcionamento da sociedade Isso é mais importante do que seguir à risca a letra fria da lei sem desconsiderála totalmente sob pena de autorizar o arbítrio da atuação jurisdicional O intérprete deve almejar a real vontade da lei e empregála de forma máxima a fim de desempenhar com esmero o papel que lhe foi atribuído pelo ordenamento jurídico No entanto essa mitigação do texto legal encontra limites e neste ponto o funcionalismo apresenta duas concepções 1 funcionalismo moderado dualista ou de política criminal capitaneado por Claus Roxin Escola de Munique e 2 funcionalismo radical monista ou sistêmico liderado por Günther Jakobs Escola de Bonn Com efeito o funcionalismo de Roxin preocupase com os fins do Direito Penal ao passo que a concepção de Jakobs se satisfaz com os fins da pena ou seja a vertente de Roxin norteiase por finalidades políticocriminais priorizando valores e princípios garantistas enquanto a orientação de Jakobs leva em consideração apenas necessidades sistêmicas e o Direito Penal é que deve se ajustar a elas Em suma sustenta o funcionalismo que a dogmática penal deve ser direcionada à finalidade precípua do Direito Penal ou seja à política criminal Essa finalidade seria a reafirmação da autoridade do Direito que não encontra limites externos mas somente internos Günther Jakobs ou então a proteção de bens jurídicos indispensáveis ao desenvolvimento do indivíduo e da sociedade respeitando os limites impostos pelo ordenamento jurídico Claus Roxin E justamente nesse ponto o funcionalismo recebe sua maior crítica consistente na opção de conferir elevado destaque à política criminal resultando em sua fusão com a dogmática penal e por corolário confundindo a missão do legislador com a do aplicador da lei Com essa introdução básica é válido discorrer um pouco mais acerca dessa moderna orientação penal cada vez mais aceita e difundida em âmbito doutrinário Dividiremos o tema entre as duas vertentes levando em conta o pensamento de seus autores Claus Roxin e Günther Jakobs Suas ideias alcançaram amplo destaque a partir da publicação em 1970 da monografia intitulada Política criminal e sistema de direito penal que parte de um ponto de vista teleológico do Direito Penal almejando superar as visões ontológicas do causalismo e do finalismo bem como a análise puramente sistemática da teoria do delito introduzindo como critério norteador para uma melhor solução dos problemas dogmáticos a política criminal A formação do sistema jurídicopenal não pode vincularse a realidades ontológicas prévias devendo guiarse única e exclusivamente pelas finalidades do Direito Penal4 Desenvolveu novas posições sobre a teoria da pena e a sua concepção preventiva geral positiva prevenção de integração e especialmente acerca do âmbito da relação entre o fato e o seu autor como ao reintroduzir o conceito de imputação objetiva no campo da tipicidade Na seara da autoria sistematizou e desenvolveu a teoria do domínio do fato Contudo a principal contribuição de Roxin reside na circunstância de ter a b c chamado a atenção sobre a necessidade que a construção dogmática está a serviço da resolução dos problemas que apresentam a realidade da vida social tarefa que parecia já olvidada em favor da mera elucubração teórica Para ele o tipo objetivo não pode ser reduzido à conexão de condições entre comportamentos e resultados senão que os resultados conforme as regras políticocriminais teriam que ser imputados ao autor como sua obra Claus Roxin elaborou sua teoria calcada na política criminal vinculando aos elementos do delito individualmente diversos valores predominantes5 Para a tipicidade associase a determinação da lei penal em conformidade com o princípio da reserva legal Aqui se realiza uma das mais significativas contribuições da tendência doutrinária liderada por Roxin que se reflete no redescobrimento e dotação funcional da teoria da imputação objetiva no marco da tipicidade Com efeito enquanto para as doutrinas clássica neoclássica e finalista os problemas de relação nos delitos de resultado entre este e a ação se reduziriam na maioria dos casos a uma questão de relação de causalidade a nova tendência utiliza como critério decisivo de imputação do resultado no tipo objetivo a regra em virtude da qual se examina a criação por meio da ação de um risco não permitido dentro do fim de proteção da norma Para a ilicitude se assinala o âmbito de soluções sociais dos conflitos Roxin concebe a ilicitude como uma espécie de elemento negativo do tipo Para a culpabilidade associase a necessidade de pena com uma finalidade predominantemente preventiva Claus Roxin privilegia um conceito bipartido do delito em que se consideram seus elementos fundamentais dois juízos de valor o injusto penal fato típico ilicitude e a responsabilidade que inclui a culpabilidade A Günther Jakobs se atribui a responsabilidade de ter adaptado o Direito 65 Penal à teoria dos sistemas sociais de Luhmann com a sua teoria da imputação normativa Para ele o Direito Penal está determinado pela função que cumpre no sistema social e inclusive o próprio Direito Penal é considerado um sistema autônomo autorreferente e autopoiético dentro do sistema mais amplo da sociedade Tem suas regras próprias e a elas se submete Jakobs reconhece estar correto o que fora afirmado por Hans Welzel seu mestre no sentido de que o Direito Penal tem como função assegurar os valores éticos e sociais da ação Todavia separase da doutrina do pai do finalismo penal com uma mudança no enfoque metodológico que parte da missão do Direito Penal e não da essência dos objetos da dogmática levando aos extremos de uma renormatização dos conceitos perante o naturalismo psicológico de Welzel Para ele um sujeito não é aquele que pode ocasionar ou impedir um sucesso senão aquele que pode ser responsável por este Os dois pilares básicos de sua perspectiva normativista estão constituídos pela função preventiva geral positiva atribuída à pena e pelas normas jurídicopenais como objeto de proteção Destarte quando descumpre sua função na sociedade o sujeito deve ser eficazmente punido inclusive porque a autoridade da lei penal somente é obtida com sua rígida e constante aplicação6 Em suma a função do Direito Penal é aplicar o comando contido na norma penal pois somente sua reiterada incidência lhe confere o merecido respeito Como consectário de seu funcionalismo sistêmico Günther Jakobs desenvolveu a teoria do direito penal do inimigo NOVAS PROPOSTAS DOUTRINÁRIAS DIREITO PENAL E ENFRENTAMENTO DA CRIMINALIDADE MODERNA As modificações introduzidas na humanidade ao longo dos últimos anos com fenômenos como a globalização a massificação dos problemas e principalmente a configuração de uma sociedade de risco implicaram em profundas alterações no Direito Penal Criouse um direito penal do risco Nas palavras de Luis Gracia Martín O direito penal moderno é próprio e característico da sociedade de risco O controle a prevenção e a gestão de riscos gerais são tarefas que o Estado deve assumir e assume efetivamente de modo relevante Para a realização de tais objetivos o legislador recorre ao tipo penal de perigo abstrato como instrumento técnico adequado por excelência Por ele o direito penal moderno ou ao menos uma parte considerável dele se denomina como direito penal do risco7 Nesse contexto a sociedade moderna destacase por ser uma sociedade de massas o que no contexto atual significa que se tem de administrar comportamentos de massa distintos mas também uniformes dos cidadãos O comportamento uniforme acarreta especiais dificuldades8 Com efeito o fato de o Direito Penal ser frequentemente convocado a controlar os novos problemas sociais acarretou mudanças na sua estrutura clássica deturpandose inclusive conceitos arraigados ao longo da história O poder por ele transmitido mostrase necessário para enfrentar os novos riscos da sociedade na qual desponta a sensação de insegurança profundamente institucionalizada o delineamento de uma classe de sujeitos passivos dos recentes problemas a identificação da maioria dos membros da comunidade com a vítima do delito e o descrédito de outras instâncias de proteção Daí resultou de modo quase natural a expansão do Direito Penal9 entrando essa disciplina em profundo dilema Como enfrentar todas essas novas complicações Com intervenção máxima incriminando o maior número possível de condutas mesmo sabendo ser seu arsenal insuficiente para tanto Ou deveria limitarse somente aos casos extremos de afronta a bens jurídicos individuais relegando para outros ramos do Direito a proteção de interesses diversos Em suma deveria o Direito Penal manter seu perfil clássico ou então seria mais coerente adaptarse aos novos tempos com todas as alterações exigidas para alcançar esse patamar É óbvio que em qualquer das hipóteses não se pode olvidar a subsidiariedade do Direito Penal muito menos o seu caráter fragmentário destinandose exclusivamente à proteção de bens jurídicos Como se sabe o caráter subsidiário do Direito Penal resulta também da função limitadora instituída pelo Estado Democrático de Direito ao ordenamento penal qual seja a proteção de bens jurídicos fundamentais à coexistência em sociedade promovendo o livre desenvolvimento da personalidade humana Além disso referese também à necessidade da tutela penal pois sua fundamentação teórica remete ao conceito de Estado que na acepção sob a qual foi instituído pela Constituição obriga a intervenção punitiva a ter a menor intensidade possível eis que impregnada de elevado índice de restrição e violação de direitos De fato deve o Poder Público interferir o mínimo possível na vida do cidadão garantindolhe a máxima liberdade Intrinsecamente relacionado à subsidiariedade desponta o caráter fragmentário do Direito Penal ou seja nem toda categoria de ilícitos constituise em infração penal mas todo crime ou contravenção necessariamente representa um ato ilícito perante o ordenamento jurídico Dessa forma o Direito Penal somente se legitima quando todos os demais ramos se mostrarem impotentes uma vez que nele está contida a mais forte agressão estatal contra os direitos do cidadão Como ensina JesúsMaría Silva Sánchez Há pois ataques contra bens jurídicos penais que não dão lugar à punibilidade da conduta correspondente A ele se refere o princípio da fragmentariedade na proteção dos bens jurídicos penais segundo o qual apenas podem constituir fatos penalmente relevantes as modalidades de ataques mais graves contra tais bens jurídicos penais10 A análise da legislação moderna indica que o Direito Penal tem preferido um meiotermo buscando a sua adaptação aos novos tempos sem entretanto relegar a outros ramos do Direito a relevante missão de combate à criminalidade e garantia da paz pública Possivelmente como afirma Paulo da Silva Fernandes em razão da badalada fuga para o direito penal fruto do aumento da insegurança e do medo Aquele é tido por muitos dada a natureza e o âmbito da panóplia de sanções ao seu dispor como o garante par excelénce do repor da segurança11 Daí surgem inexoravelmente alguns problemas Devemse evitar a funcionalização e a desformalização do Direito Penal A expansão incontrolável pode provocar o esquecimento de sua função precípua qual seja a proteção exclusiva de bens jurídicos indispensáveis para o desenvolvimento do indivíduo e da sociedade em face de sua administrativização e consequentemente com a criação de leis penais meramente simbólicas e de tipos penais de perigo abstrato em prejuízo de crimes de dano e de perigo concreto12 Essa desmedida funcionalização acarretaria ainda na opção constante ao recurso às leis penais em branco a conceitos indeterminados e a cláusulas gerais flexibilizando ou até mesmo eliminando conceitos sólidos acerca da tentativa em face da antecipação da tutela penal do dolo e da culpa permitindo em alguns casos a responsabilidade objetiva além das definições de autoria e participação Como destaca Manuel da Costa Andrade almejase dessa forma conferir à sociedade o efeito analgésico ou tranquilizante13 do Direito Penal Para solucionar esse impasse e todos os problemas daí decorrentes a doutrina estrangeira apresenta algumas formas de solução para o mergulho do Direito Penal nas turbulentas águas do risco14 o direito intervencionista as velocidades do Direito Penal o Direito Penal do inimigo e o Direito Penal como proteção de contextos da vida em sociedade Passemos à análise de cada uma das teorias Ao contrário do que a mera análise gramatical da expressão quer indicar o direito intervencionista ou de intervenção não se contrapõe ao princípio da intervenção mínima consagrado pelas legislações modernas desde que foi previsto originariamente no art 8º da Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão datada de 1789 O direito intervencionista respeita o princípio da intervenção mínima mais inclusive do que o Direito Penal clássico Nem poderia ser diferente por força da finalidade a que se propõe Seu criador e principal defensor é o alemão Winfried Hassemer Para ele o Direito Penal não oferece resposta satisfatória para a criminalidade oriunda das sociedades modernas Além disso o poder punitivo estatal deveria limitarse ao núcleo do Direito Penal isto é à estrutura clássica dessa disciplina sendo os problemas resultantes dos riscos da modernidade resolvidos pelo direito de intervenção única solução apta a enfrentar a atual criminalidade15 E o direito de intervenção consiste na eliminação de uma parte da atual modernidade do Direito Penal mediante a busca de uma dupla tarefa Inicialmente reduzindoo ao Direito Penal básico fazendo parte deste cerne somente as lesões de bens jurídicos individuais e sua colocação concreta em perigo Em segundo plano concedendo aos bens jurídicos universais objetos dos maiores riscos e ameaças da atualidade de natureza difusa e relativamente controláveis um tratamento jurídico diverso do conferido aos bens individuais Abrase espaço para o discurso da resistência à tutela penal de bens jurídicos difusos e coletivos Deveras Hassemer afirma que deve ser almejada a criação de um direito intervencionista que possibilite tratar adequadamente os problemas que apenas de modo forçado podem ser tratados no âmbito do Direito Penal clássico já que este não tem vocação para lidar com as questões inerentes à modernidade Assim cabe aos aplicadores optar pela sequência na modernização do Direito Penal ou então por libertálo das modernas exigências Em sua opinião a primeira opção importa no aumento de custos esvaziando as instituições centrais do Direito Penal que passaria a ter função meramente simbólica Destarte para não o sobrecarregar com o peso da modernização deveriam ser regulamentados os problemas por ela causados com um direito de intervenção situado entre o Direito Penal e o Contravencional entre o Direito Civil e o Direito Público dotado de garantias menos amplas das que regem o Direito Penal clássico com a consequente imposição de sanções menos drásticas Ademais como observado por Alberto Silva Franco essa nova faceta se situaria fora do âmbito do Direito Penal nas vizinhanças do direito administrativo sancionador16 Em síntese portanto o direito de intervenção na forma proposta por Winfried Hassemer consiste na manutenção no âmbito do Direito Penal somente das condutas lesivas aos bens jurídicos individuais e também daquelas que causam perigo concreto As demais de índole difusa ou coletiva e causadoras de perigo abstrato por serem apenadas de maneira mais branda seriam reguladas por um sistema jurídico diverso com garantias materiais e processuais mais flexíveis possibilitando um tratamento mais célere e amplo dessas questões sob pena de tornar o Direito Penal inócuo e simbólico Além disso não seria tarefa do Poder Judiciário aplicálas e sim da Administração Pública Cumpre consignar que o direito de intervenção para ser efetivo teria de contemplar preceitos que atualmente encontramse no Direito Penal como os ilícitos econômicos e ambientais Não se destina a ampliar a intervenção punitiva do Estado mas a diminuíla Exemplificativamente seria muito melhor a retirada do Direito Penal das condutas que hoje constituem crimes ambientais transportandoas para o direito de intervenção em que os ilícitos seriam combatidos com sanções diversas mais céleres tais como a multa a suspensão e a interdição de atividades etc Como afirma o penalista germânico os limites do Direito de Intervenção ainda não estão muito detalhados e a sua própria aplicação revelase por ora um tanto quanto temerária São suas palavras a não intervenção pressupõe o aperfeiçoamento e a complementação do saber criminológico com isso ela torna em prática o interesse preventivoindividual a relação com os problemas concretos do caso Dificilmente se pode aceitar que essas alternativas à execução da pena privativa de liberdade se tornem possíveis para os delitos e os delinquentes em um tempo previsível Portanto para isso depende de que se reúnam o mais rápido possível experiências seguras sobre os meios não interventivos face a determinadas situações17 Sua proposta contudo recebe fortes críticas A propósito Jorge de Figueiredo Dias assim se refere a essa construção doutrinária Outra coisa em minha opinião inexacta é pensar que o sancionamento das ofensas hoc sensu inadmissíveis possa ser atribuído a sanções administrativas ainda que intensificadas Não falta quem a propósito lembre a velha crítica da burla de etiquetas com razão até a um ponto em que eu me atreveria a falar de nada menos que de um pôr o princípio jurídicopenal da subsidiariedade de pernas para o ar ao subtrair à tutela penal precisamente as condutas socialmente tão gravosas que põem simultaneamente em causa a vida planetária a dignidade das pessoas e a solidariedade com as outras pessoas as que existem e as que hãose de vir18 Para Figueiredo Dias o direito de intervenção seria uma inversão temerária dos princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade uma vez que relegaria a seara mais suave do ordenamento jurídico justamente as infrações que colocam em maior risco a estrutura da sociedade ao mesmo tempo em que para elas de grave repercussão difusa estariam previstas sanções muito brandas e insuficientes para a punição e ressocialização de seus autores Em primeira análise de maneira parecida com o direito intervencionista mas bastante diversa quando estudada em sua essência JesúsMaría Silva Sánchez professor catedrático da Universidade Pompeu Fabra apresenta a teoria das velocidades do Direito Penal revelando uma nítida preocupação com a consolidação de um único Direito Penal moderno ou seja busca evitar a modernização generalizada caracterizada pela expansão e flexibilização dos princípios políticocriminais e regras de imputação inerentes às penas privativas de liberdade Parte do pressuposto de que o Direito Penal no interior de sua unidade substancial contém dois grandes blocos distintos de ilícitos o primeiro das infrações penais às quais são cominadas penas de prisão direito penal nuclear e o segundo daquelas que se vinculam aos gêneros diversos de sanções penais direito penal periférico Aquele é o modelo padrão vigente no âmbito cultural da grande maioria das nações Ademais a pena privativa de liberdade não pode em um Estado que é e precisa manterse democrático e de direito ser imposta pela Administração Pública Consequentemente Seria razoável que em um Direito Penal mais distante do núcleo do criminal e no qual se impusessem penas mais próximas das sanções administrativas privativas de direitos multas sanções que recaem sobre pessoas jurídicas se flexibilizassem os critérios de imputação e as garantias políticocriminais A característica essencial de tal setor continuaria sendo a judicialização e a consequente imparcialidade máxima da mesma forma que a manutenção do significado penal dos ilícitos e das sanções sem que estas contudo tivessem a repercussão pessoal da pena de prisão19 Dessa forma haveria manifesta distinção entre um Direito Penal amplo e flexível e um Direito Penal mínimo e rígido Somente essa separação seria apta a impedir que a modernização acabe apoderandose ainda que paulatinamente de todos os espaços do Direito Penal clássico Notese que ao contrário da doutrina apregoada por Winfried Hassemer todos os ilícitos guardam natureza penal e devem ser processados e julgados pelo Poder Judiciário Não se fala portanto em retirada de infrações penais para serem cuidadas pelo chamado direito administrativo sancionador E quais seriam especificamente as duas velocidades do Direito Penal Invoquemos uma vez mais os ensinamentos de Jesús María Silva Sánchez Uma primeira velocidade representada pelo Direito Penal da prisão na qual haverseiam de manter rigidamente os princípios político criminais clássicos as regras de imputação e os princípios processuais e uma segunda velocidade para os casos em que por não se tratar já de prisão senão de penas de privação de direitos ou pecuniárias aqueles princípios e regras poderiam experimentar uma flexibilização proporcional à menor intensidade da sanção20 Em outras palavras exigese um procedimento amplo e garantista para os crimes nos quais possa resultar a imposição de pena privativa de liberdade Por outro turno quando a sanção penal possível de ser aplicada no caso concreto se limitar às restrições de direitos ou à multa a ação penal pode ser mais ágil eis que a disputa entre o acusado e o Estado não envolve tão relevante bem jurídico a liberdade do ser humano A teoria do Direito Penal do inimigo foi desenvolvida por Günther Jakobs professor catedrático de Direito Penal e Filosofia do Direito na Universidade de Bonn Alemanha reconhecido mundialmente como um dos maiores criminalistas da atualidade A ele é também atribuída a criação de uma nova teoria da ação jurídico penal o funcionalismo radical monista ou sistêmico ou seja o pensamento que reserva elevado valor à norma jurídica como fator de proteção social Para ele apenas a aplicação constante da norma penal é que imprime à sociedade as condutas aceitas e os comportamentos indesejados Na década de 1980 Jakobs traçou os primeiros lineamentos da teoria em análise voltando ao seu estudo no final dos anos 1990 mas em 2003 de maneira corajosa assumiu postura inequívoca na defesa da adoção do Direito Penal do inimigo justificando com toda uma obra doutrinária21 a necessidade de revolucionar conceitos clássicos arraigados na mente dos doutrinadores Seu pensamento coloca em discussão a real efetividade do Direito Penal existente pugnando pela flexibilização ou mesmo supressão de diversas garantias materiais e processuais até então reputadas em uníssono como absolutas e intocáveis Em seu aspecto léxico extraise o seguinte significado INIMIGO adj Do lat inimicus 1 Não amigo hostil adverso contrário 2 Malquistado indisposto 3 De ou pertencente a partido facção ou grupo oposto sm 1 Aquele que tem inimizade ódio a alguém 2 Aquele com o qual se entra em guerra 3 O que é prejudicial oposto contrário 4 Aquele que experimenta aversão antipatia por certas coisas Inimigo alugado pessoa a quem se mata por mandado de outrem Inimigo declarado jurado pessoa que jurou agir contra alguém ou alguma coisa Inimigo público indivíduo nocivo à sociedade22 Constatase em qualquer das hipóteses acima mencionadas que o termo inimigo representa aquele que em situação de confronto deve ser enfrentado e a qualquer custo vencido Sempre que se pretende um duelo uma disputa ou de modo geral iniciar um movimento de inquietação devese escolher alguém ou alguma entidade para mostrar inconformismo com a situação que se pretende modificar No pensamento de Jakobs não é diferente Inimigo para ele é o indivíduo que afronta a estrutura do Estado pretendendo desestabilizar a ordem nele reinante ou quiçá destruílo É a pessoa que revela um modo de vida contrário às normas jurídicas não aceitando as regras impostas pelo Direito para a manutenção da coletividade Agindo assim demonstra não ser um cidadão e por consequência todas as garantias inerentes às pessoas de bem não podem ser a ele aplicadas Em síntese tratase de um indivíduo que não apenas de maneira incidental em seu comportamento ou em sua ocupação profissional ou principalmente por meio de vinculação a uma organização criminosa vale dizer em qualquer caso de forma presumivelmente permanente abandonou o direito e por conseguinte não garante o mínimo de segurança cognitiva do comportamento pessoal e o manifesta por meio de sua conduta Para Silva Sánchez a transição do cidadão ao inimigo seria produzida mediante a reincidência a habitualidade a delinquência profissional e finalmente a integração em organizações delitivas estruturadas23 Günther Jakobs fundamenta filosoficamente sua teoria nas ideias de Jean Jacques Rousseau já que o inimigo ao desrespeitar o contrato social guerreando com o Estado deixa de ser um de seus membros e também em Johann Gottlieb Fichte teoria do contrato cidadão Ademais abeberando se em Immanuel Kant sustenta que uma pessoa ameaçadora contumaz da comunidade e do Estado que não acolhe o Estado comunitáriolegal deve ser tratada como inimiga Como exemplos de pessoas identificadas como inimigas após citar o ataque às torres gêmeas de Nova York em 11 de setembro de 2001 como conduta inequívoca de indivíduos de tal estirpe aponta os integrantes de organizações criminosas delinquentes econômicos terroristas autores de crimes contra a liberdade sexual e residualmente os responsáveis pela prática de infrações penais graves e perigosas24 Vêse claramente portanto que na contramão das ideias penais hodiernamente reinantes nas mais diversas partes do mundo Jakobs abraça um Direito Penal do autor rotulando indivíduos em oposição a um Direito Penal do fato preocupado com a ofensividade de ações e omissões relevantes Inicialmente o Estado não deve reconhecer os direitos do inimigo por ele não se enquadrar no conceito de cidadão Consequentemente não pode ser tratado como pessoa pois entendimento diverso colocaria em risco o direito à segurança da comunidade O inimigo assim não pode gozar de direitos processuais como o da ampla defesa e o de constituir defensor haja vista que sendo uma ameaça à ordem pública desconsiderase sua posição de sujeito na relação jurídico processual Possível inclusive a sua incomunicabilidade Em uma guerra o importante é vencer ainda que para isso haja deslealdade com o adversário Como representa grande perigo à sociedade deixase de lado o juízo de culpabilidade para a fixação da reprimenda imposta ao inimigo privilegiandose sua periculosidade Em síntese as penas são substituídas por medidas de segurança De fato a pena teria duração determinada ao contrário da medida de segurança possibilitando sua retirada do convívio público por todo o tempo em que persistir sua situação de perigo compreendida como a probabilidade de tornar a cometer infrações penais Dessa forma tratase de um Direito Penal prospectivo com visão para o futuro encontrando amparo no positivismo criminológico de Cesare Lombroso Enrico Ferri e Rafael Garofalo que clamava por um sistema penal em consonância com a real necessidade de defesa social mormente quando estava assombrado por criminosos revestidos de indissociáveis aspectos endógenos Deve ainda o Direito Penal do inimigo antecipar a esfera de proteção da norma jurídica adiantando a tutela penal para atingir inclusive atos preparatórios sem redução quantitativa da punição25 Ora se o inimigo é um ser manifestamente voltado para os crimes e se a sua condição pessoal revela a ilicitude de sua atuação não se pode esperar que ele pratique infrações penais para posteriormente cobrarse repressão pelo Estado como se dá com cidadãos comuns Ao contrário para a manutenção da ordem deve ser combatida a sua periculosidade impondose uma medida de segurança com a mera demonstração da futura e eventual prática de um crime Essa antecipação não se importa com a quantidade da sanção penal a ser aplicada pois o que se tem em mente é a garantia da sociedade O inimigo não tem direitos e assim seu sacrifício se impõe para a proteção do interesse público No caso do fatídico atentado de 11 de setembro de 2001 inúmeras vidas seriam salvas se a atuação inimiga tivesse sido interceptada previamente Para viabilizar esse adiantamento deve o Estado valerse abundantemente da ação controlada para retardar a prisão em flagrante ao momento em que possa ser capturado o maior número de inimigos Compete providenciar também a infiltração de agentes policiais nas organizações criminosas para eficaz desbaratamento Medidas preventivas e cautelares têm seu campo de incidência alargado autorizandose mais facilmente interceptações telefônicas e quebras de sigilos bancário e fiscal Se não bastasse na investigação dos inimigos o Estado está legitimado a aplicar medidas processuais e penais às pessoas que exercem atividades lícitas em razão de alguns membros da classe guardarem íntima relação com organizações criminosas grupos de traficantes e responsáveis por lavagem de dinheiro como se dá com bancos joalheiros e leiloeiros Cuidase de meios de defesa contra agressões futuras Dele decorre também a mitigação do princípio da reserva legal ou estrita legalidade pois a periculosidade do inimigo impede a previsão de todos os atos que possam ser por ele praticados Reclamase assim uma narrativa vaga e pouco precisa dos crimes e das penas que devem variar no caso concreto dependendo da ameaça representada pelo combatente da guerra Mesmo nos crimes minuciosamente tipificados as penas devem ser severamente majoradas com o intuito de intimidar o inimigo mantendo em estado latente todo o perigo que pode ser por ele causado Autorizase também a criação artificial de delitos inflacionando a legislação penal ainda que os bens juridicamente tutelados não sejam muito claros e até mesmo não reconhecidos pela sociedade Como corolário deve ser mais rigorosa a execução penal na tentativa de emendar o inimigo e evitar a proliferação de outros que deverão sentir a força e o poder do Estado legalizado Possível assim a eliminação de direitos e garantias individuais uma vez que não paira necessidade de obediência ao devido processo legal mas a um procedimento de guerra de intolerância e repúdio ao inimigo A propósito é cabível inclusive a utilização da tortura como meio de prova e também para desbaratar as atividades ilícitas do criminoso e dos seus comparsas26 O inimigo arrependido disposto a auxiliar o Estado no combate de seus antigos companheiros contudo deve receber benefícios desde que os delate permitindo o desmantelamento de quadrilhas prisões em massa e recuperação dos produtos e proveitos dos crimes Nitidamente enxergase na concepção de Jakobs a convivência de dois direitos em um mesmo ordenamento jurídico Em primeiro lugar um direito penal do cidadão amplo e dotado de todas as garantias constitucionais processuais e penais típico de um Estado Democrático de Direito Sem prejuízo em parcela menor e restrita a grupos determinados com ele coexiste o Direito Penal do inimigo no qual o seu sujeito deve ser enfrentado como fonte de perigo e portanto a sua eliminação da sociedade é o fim último do Estado E nesse contexto o Direito Penal do inimigo seria definido por Silva Sánchez como a terceira velocidade do Direito Penal privação da liberdade e suavização ou eliminação de direitos e garantias penais e processuais27 Como não poderia ser diferente essa proposta recebe inúmeras críticas fundadas principalmente na violação de direitos e garantias constitucionais e legais28 Na sequência da teoria das velocidades do Direito Penal apresentada por Jesús María Silva Sánchez item 653 e do Direito Penal do Inimigo rotulado como a terceira velocidade do Direito Penal de Günther Jakobs item 654 o argentino Daniel Pastor desenvolve o neopunitivismo também conhecido como a quarta velocidade do Direito Penal29 O neopunitivismo relacionase ao Direito Penal Internacional caracterizado pelo alto nível de incidência política e pela seletividade escolha dos criminosos e do tratamento dispensado com elevado desrespeito às regras básicas do poder punitivo a exemplo dos princípios da reserva legal do juiz natural e da irretroatividade da lei penal No conflito entre países os vencedores são os julgadores dos Estados derrotados como aconteceu nos tribunais internacionais ad hoc para Ruanda e para a antiga Iugoslávia Nessa linha de raciocínio o neopunitivismo se destaca como um movimento do panpenalismo que busca a todo custo o aumento do arsenal punitivo do Estado inclusive de forma mais arbitrária e abusiva do que o Direito Penal do Inimigo Criase em outras palavras um direito penal absoluto De fato o panpenalismo promove a diminuição ou eliminação de garantias penais e processuais o aumento desordenado das forças policiais e a inflação legislativa mediante o aumento das penas com finalidades altamente retributivas e intimidatórias Para quem se filia a esta concepção doutrinária a defesa social legitima o Direito Penal visualizando o delito como uma problemática vinculada exclusivamente ao Direito Penal Cuidase de proposta formulada por Günter Stratenwerth e com a finalidade de garantir o futuro da sociedade deixa em segundo plano a proteção dos interesses individuais para salvaguardar imediatamente os bens jurídicos inerentes a toda a coletividade Ao contrário portanto da teoria proposta por Winfried Hassemer busca de modo precípuo a proteção dos bens jurídicos difusos pois considera mais importante a salvaguarda do todo social para secundariamente assegurar o patrimônio jurídico de cada indivíduo isoladamente considerado Como explica Paulo Silva Fernandes pronunciandose contra um direito penal que segundo esse autor demasiado arraigado a uma protecção de bens jurídicos de natureza essencialmente antropocêntrica deveria caminhar no sentido de uma chamada protecção de relações ou contextos da vida enquanto tais sem que fosse necessário reconduzir a necessidade de protecção a interesses pessoais de qualquer dos participantes num dado contexto nomeadamente nos domínios do ambiente ou da genética Por isso propõe proteger jurídicopenalmente normas de conduta referidas ao futuro sem retroreferência a interesses individuais podendose segundo o autor chegar a bons resultados30 Corolário desse entendimento operase uma antecipação das fronteiras da tutela penal com rápida transição do modelo tradicional de criação de infrações penais proteção de bens individuais contra lesões efetivas para o de crimes de perigo abstrato para bens jurídicos transindividuais passando por todas as modalidades intermediárias Interesses até há pouco desconhecidos são imediatamente consagrados ao status de penalmente protegidos como se verifica no tocante aos crimes ambientais e econômicos Após ser estabelecido um perfil de gestão dos interesses difusos e coletivos a ser seguido protegese o contexto que passa a legitimar a intervenção do Direito Penal quando determinado modelo de comportamento é desrespeitado Antecipase de maneira sensível a tutela penal ainda que sirva apenas para a proteção do ambiente desejado pelo legislador Nas palavras de Jesús María Silva Sánchez De fato essa orientação à proteção de contextos cada vez mais genéricos no espaço e no tempo da fruição dos bens jurídicos clássicos leva o Direito Penal a relacionarse com fenômenos de dimensões estruturais globais ou sistêmicas no que as aportações individuais autonomamente contempladas são ao contrário de intensidade baixa Com isso tem se produzido certamente a culminação do processo o Direito Penal que reagia a posteriori contra um fato lesivo individualmente delimitado quanto ao sujeito ativo e ao passivo se converte em um direito de gestão punitiva de riscos gerais e nessa medida está administrativizado31 Desse modo imaginando a aplicação da referida teoria ao Direito Penal pátrio poderíamos concluir ser mais relevante a proteção do meio ambiente contra a poluição na forma prevista na Lei 96051998 do que a simples punição de um crime de ameaça pois a sociedade estaria garantida imediatamente com a preservação do meio ambiente ao passo que com a segunda incriminação somente um indivíduo teria seu bem jurídico liberdade individual resguardado o que coletivamente não seria de elevada importância Sem dúvida cuidase de proposta audaciosa que ganhará importância ao longo do século XXI para o enfrentamento dos riscos da sociedade moderna Como afirma Claus Roxin conduzirá a uma certa relativização e não a um abandono da ideia de bem jurídico32 sempre considerado ao longo da história principalmente em face do patrimônio jurídico de cada indivíduo isoladamente 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 GOMES Luiz Flávio GARCÍAPABLOS DE MOLINA Antonio BIANCHINI Alice Direito penal introdução e princípios fundamentais São Paulo RT 2007 v 1 p 131 SILVA SÁNCHEZ JesúsMaría Aproximación al derecho penal contemporáneo Reimpresión Barcelona JM Bosch 2002 p 57 FERRAJOLI Luigi Direito e razão teoria do garantismo penal Trad Ana Paula Zomer Sica Fauzi Hassan Choukr Juarez Tavarez e Luiz Flávio Gomes 2 ed São Paulo RT 2006 p 91 ROXIN Claus Derecho penal Parte geral Fundamentos La estructura de la teoria del delito Trad espanhola DiegoManuel Luzón Peña Miguel Díaz y García Conlledo e Javier de Vicente Remensal Madrid Civitas 2006 t I p 203 ROXIN Claus Política criminal e sistema jurídicopenal Trad Luís Greco Rio de Janeiro Renovar 2002 p 32 e ss JAKOBS Günther Derecho penal Parte general Fundamentos y teoría de la imputación Trad espanhola Joaquin Cuello Contreras e Jose Luis Serrano Gonzales de Murillo 2 ed Madrid Marcial Pons 1997 p 167 e ss GRACIA MARTÍN Luis Modernización del derecho penal y derecho penal del enemigo Lima IDEMSA 2007 p 45 JAKOBS Günther Ciência do direito e ciência do direito penal Trad Maurício Antonio Ribeiro Lopes Barueri Manole 2003 p 44 SILVA SÁNCHEZ JesúsMaría A expansão do direito penal aspectos da política criminal nas sociedades pósindustriais Trad Luiz Otávio de Oliveira Rocha São Paulo RT 2002 SILVA SÁNCHEZ JesúsMaría Aproximación al derecho penal contemporáneo Reimpresión Barcelona Bosch 2002 p 290 FERNANDES Paulo Silva Globalização sociedade de risco e o futuro do direito penal Coimbra Almedina 2001 p 75 SILVA SÁNCHEZ JesúsMaría A expansão do direito penal aspectos da política criminal nas sociedades pósindustriais Trad Luiz Otávio de Oliveira Rocha São Paulo RT 2002 p 127 ANDRADE Manuel da Costa Liberdade de imprensa e inviolabilidade 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 pessoal Uma perspectiva jurídicocriminal Coimbra Coimbra Editora 1996 p 37 FERNANDES Paulo Silva Globalização sociedade de risco e o futuro do direito penal Coimbra Almedina 2001 p 70 HASSEMER Winfried Persona mundo y responsabilidad penal Bases para una teoría de la imputación en derecho penal Trad Francisco Munõz Conde e Maria del Mar Díaz Pita Valencia Tirant lo Blanch 1999 p 67 73 FRANCO Alberto Silva Globalização e criminalidade dos poderosos Revista Portuguesa de Ciência Criminal Coimbra ano 10 fascículo 2 p 224 abrjun 2000 HASSEMER Winfried Introdução aos fundamentos do direito penal Trad Pablo Rodrigo Alflen da Silva Porto Alegre Fabris 2005 p 398 DIAS Jorge de Figueiredo Direito penal Coimbra João Abrantes 1975 p 15 SILVA SÁNCHEZ JesúsMaría A expansão do direito penal aspectos da política criminal nas sociedades pósindustriais Trad Luiz Otávio de Oliveira Rocha São Paulo RT 2002 p 145 Idem ibidem p 148 JAKOBS Günther Derecho penal del enemigo Trad Manuel Cancio Meliá Madrid Civitas 2003 LAROUSSE Cultural Grande dicionário da língua portuguesa São Paulo Nova Cultural 1999 p 526 SILVA SÁNCHEZ JesúsMaría A expansão do direito penal aspectos da política criminal nas sociedades pósindustriais Trad Luiz Otávio de Oliveira Rocha São Paulo RT 2002 p 149 JAKOBS Günther Derecho penal del enemigo Trad Manuel Cancio Meliá Madrid Civitas 2003 p 39 A Lei 132602016 Lei de Terrorismo contém em seu art 5º um tipo incriminador que guarda alguma relação com essa característica do Direito Penal do inimigo uma vez que admite a punição de atos preparatórios de terrorismo porém com diminuição da pena Art 5º Realizar atos preparatórios de terrorismo com o propósito inequívoco de consumar tal delito Pena a correspondente ao delito consumado diminuída de um quarto até a metade 26 27 28 29 30 31 32 Nos Estados Unidos da América desenvolveuse a teoria do cenário da bomba relógio com a finalidade de justificar o uso da tortura em situações excepcionais em que não exista outra maneira eficaz de conter uma atividade terrorista O raciocínio é o seguinte uma ameaça de grandes proporções está na iminência de ser concretizada a bomba vai explodir e somente a tortura contra um prisioneiro constituise em meio idôneo para preservar a vida ou outro bem jurídico de pessoas de bem SILVA SÁNCHEZ Jesús María A expansão do direito penal aspectos da política criminal nas sociedades pósindustriais Trad Luiz Otávio de Oliveira Rocha São Paulo RT 2002 p 55 Conferir a propósito MASSON Cleber Rogério O direito penal do inimigo In SILVA Marco Antonio Marques da Coord Processo penal e garantias constitucionais São Paulo Quartier Latin 2006 e ZAFFARONI Eugenio Raúl O inimigo no direito penal Trad Sérgio Lamarão Rio de Janeiro Revan 2007 Para o estudo aprofundado do tema PASTOR Daniel R Neopunitivismo y neoinquisición un análisis de políticas y práticas penales violatorias de los derechos fundamentales del imputado Buenos Aires AdHoc 2008 FERNANDES Paulo Silva Globalização sociedade de risco e o futuro do direito penal Coimbra Almedina 2001 p 81 SILVA SÁNCHEZ Jesús María A expansão do direito penal aspectos da política criminal nas sociedades pósindustriais Trad Luiz Otávio de Oliveira Rocha São Paulo RT 2002 p 114 ROXIN Claus Problemas fundamentais de direito penal Trad Ana Paula dos Santos Luís Natscheradetz 3 ed Lisboa Vega 2004 p 62 É a fonte formal imediata do Direito Penal uma vez que por expressa determinação constitucional tem a si reservado exclusivamente o papel de criar infrações penais e cominarlhes as penas respectivas Sua estrutura apresenta dois preceitos um primário conduta e outro secundário pena No crime de homicídio simples tipificado pelo art 121 do Código Penal o preceito primário é matar alguém enquanto a pena de reclusão de 6 a 20 anos desempenha a função de preceito secundário Devese observar que a lei penal não é proibitiva mas descritiva Não proíbe a conduta de matar alguém e sim descreve tal comportamento como criminoso impondo a pena a ser aplicada caso seja ele praticado A legislação penal brasileira não contém como outrora mandamentos diretos a exemplo de não furtar não roubar etc Optou pela proibição indireta descrevendo o fato como pressuposto da sanção Essa técnica legislativa foi desenvolvida por Karl Binding por ele chamada de teoria das normas segundo a qual é necessária a distinção entre norma e lei penal A norma cria o ilícito a lei cria o delito A conduta criminosa viola a norma mas não a lei pois o agente realiza exatamente a a b b1 b2 b3 b4 ação que esta descreve As leis penais apresentam diversas divisões Podem ser incriminadoras são as que criam crimes e cominam penas Estão contidas na Parte Especial do Código Penal e na legislação penal especial não incriminadoras são as que não criam crimes nem cominam penas Subdividemse em permissivas autorizam a prática de condutas típicas ou seja são as causas de exclusão da ilicitude Em regra estão previstas na Parte Geral CP art 23 mas algumas são também encontradas na Parte Especial tal como ocorre nos arts 128 aborto legal e 142 exclusão da ilicitude nos crimes contra a honra do Código Penal exculpantes estabelecem a não culpabilidade do agente ou ainda a impunidade de determinados delitos Exemplos doença mental menoridade prescrição e perdão judicial Encontramse comumente na Parte Geral mas também podem ser identificadas na Parte Especial do Código Penal tais como nos arts 312 3º 1ª parte reparação do dano antes da sentença no crime de peculato e art 342 2º retratação antes da sentença no processo em que ocorreu o ilícito no crime de falso testemunho ou falsa perícia interpretativas esclarecem o conteúdo e o significado de outras leis penais Exemplos arts 150 4º conceito de domicílio e 327 conceito de funcionário público para fins penais do Código Penal de aplicação finais ou complementares delimitam o campo de validade das leis incriminadoras Exemplos arts 2º e 5º do Código Penal b5 b6 c d a b c diretivas são as que estabelecem os princípios de determinada matéria Exemplo princípio da reserva legal CP art 1º integrativas ou de extensão são as que complementam a tipicidade no tocante ao nexo causal nos crimes omissivos impróprios à tentativa e à participação CP arts 13 2º 14 II e 29 caput respectivamente completas ou perfeitas apresentam todos os elementos da conduta criminosa É o caso do art 157 caput do Código Penal incompletas ou imperfeitas reservam a complementação da definição da conduta criminosa a uma outra lei a um ato da Administração Pública ou ao julgador São as leis penais em branco nos dois primeiros casos e os tipos penais abertos no último Exclusividade só a lei pode criar delitos e penas CF art 5º XXXIX e CP art 1º Imperatividade o seu descumprimento acarreta a imposição de pena ou de medida de segurança tornando obrigatório o seu respeito Generalidade dirigese indistintamente a todas as pessoas inclusive aos inimputáveis Destinase a todas as pessoas que vivem sob a jurisdição do Brasil estejam no território nacional ou no exterior Justificase pelo caráter de coercibilidade que devem ter todas as leis em vigor com efeito imediato e geral Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro art 6º d e Impessoalidade projeta os seus efeitos abstratamente a fatos futuros para qualquer pessoa que venha a praticálos Há duas exceções relativas às leis que preveem anistia e abolitio criminis as quais alcançam fatos concretos Anterioridade as leis penais incriminadoras apenas podem ser aplicadas se estavam em vigor quando da prática da infração penal salvo no caso da retroatividade da lei benéfica Para Franz von Liszt leis penais em branco são como corpos errantes em busca de alma Existem fisicamente no universo jurídico mas não podem ser aplicadas em razão de sua incompletude A lei penal em branco é também denominada de cega ou aberta e pode ser definida como a espécie de lei penal cuja definição da conduta criminosa reclama complementação seja por outra lei seja por ato da Administração Pública1 O seu preceito secundário é completo o que não se verifica no tocante ao primário carente de implementação Dividese em a Lei penal em branco em sentido lato ou homogênea o complemento tem a mesma natureza jurídica e provém do mesmo órgão que elaborou a lei penal incriminadora Vejase o art 169 parágrafo único I do Código Penal complementado pelo Código Civil pois lá está a definição de tesouro art 1264 Além disso tanto a lei civil como a penal têm como fonte de produção o Poder Legislativo federal CF art 22 inc I Pode ser homovitelina quando a lei incriminadora e seu complemento outra lei encontramse no mesmo diploma legislativo ou heterovitelina se estiverem alocadas em diplomas diversos b Lei penal em branco em sentido estrito ou heterogênea o complemento tem natureza jurídica diversa e emana de órgão distinto daquele que elaborou a lei penal incriminadora É o caso dos crimes previstos na Lei 113432006 Lei de Drogas editada pelo Poder Legislativo federal mas complementada por portaria da Agência Nacional de Vigilância Sanitária Portaria SVSMS 3441998 pertencente ao Poder Executivo pois nela está a relação das drogas Vejase também o julgado do Superior Tribunal de Justiça O art 1º I da Lei 817691 ao proibir o comércio de combustíveis em desacordo com as normas estabelecidas na forma da lei é norma penal em branco em sentido estrito porque não exige a complementação mediante lei formal podendo sêlo por normas administrativas infralegais estas sim estabelecidas na forma da lei2 c Lei penal em branco inversa ou ao avesso o preceito primário é completo mas o secundário reclama complementação Nesse caso o complemento deve ser obrigatoriamente uma lei sob pena de violação ao princípio da reserva legal Exemplos dessa espécie de lei penal em branco são encontrados nos artigos 1 a 3 da Lei 28891956 relativos ao crime de genocídio d Lei penal em branco de fundo constitucional o complemento do preceito primário constituise em norma constitucional É o que se verifica no crime de abandono intelectual definido no art 246 do Código Penal pois o conceito de instrução primária encontrase no art 208 inc I da Constituição Federal e também no homicídio praticado contra integrantes dos órgãos de segurança pública uma vez que o art 121 2º inc VII do Código Penal é complementado pelos arts 142 e 144 da Lei Suprema e Lei penal em branco ao quadrado é aquela cujo complemento também depende de complementação Em síntese o tipo penal é duplamente complementado Um exemplo marcante encontrase no art 38 da Lei 96051998 Crimes Ambientais cuja redação é a seguinte Destruir ou danificar floresta considerada de preservação permanente mesmo que em formação ou utilizála com infringência das normas de proteção Este dispositivo é complementado pelo art 6º da Lei 126512012 Código 751 752 Florestal que apresenta uma relação de áreas de preservação permanente e reclama nova complementação por ato do chefe do Poder Executivo Introdução Interpretação é a tarefa mental que procura estabelecer a vontade da lei ou seja o seu conteúdo e significado Na insuperável lição de Carlos Maximiliano Interpretar é explicar esclarecer dar o significado de vocábulo atitude ou gesto reproduzir por outras palavras um pensamento exteriorizado mostrar o sentido verdadeiro de uma expressão extrair de frase sentença ou norma tudo o que na mesma se contém3 Deve buscar a vontade da lei mens legis isto é o sentido normativo nela contido e não de quem a fez mens legislatoris4 A ciência que disciplina este estudo é a hermenêutica jurídica A atividade prática de interpretação da lei é chamada de exegese A interpretação sempre é necessária ainda que a lei se mostre inicialmente inteiramente clara pois podem surgir dúvidas quanto ao seu efetivo alcance O que ela abrange de modo imediato eventualmente não é tudo quanto pode incidir no seu campo de atuação Pode a interpretação ser classificada levandose em conta o sujeito responsável pela sua realização os meios de que se serve o intérprete e por último os resultados obtidos Quanto ao sujeito autêntica judicial ou doutrinária Cuidase do sujeito ou órgão que realiza a interpretação classificandose em autêntica judicial e doutrinária Autêntica também chamada de legislativa é aquela de que se incumbe o próprio legislador quando edita uma lei com o propósito de esclarecer o alcance e o significado de outra É chamada de interpretativa e tem natureza 753 cogente obrigatória dela não podendo se afastar o intérprete É o caso do conceito de causa fornecido pelo art 13 caput do Código Penal e também do conceito legal de funcionário público para fins penais previsto no art 327 do citado diploma legislativo Por se limitar à interpretação tem eficácia retroativa ex tunc ainda que seja mais gravosa ao réu Em respeito à força e à autoridade da coisa julgada por óbvio não atinge os casos já definitivamente julgados Pode ser contextual quando se situa no próprio corpo da lei a ser interpretada ou posterior quando surge ulteriormente Doutrinária ou científica é a interpretação exercida pelos doutrinadores escritores e articulistas enfim comentadores do texto legal Não tem força obrigatória e vinculante em hipótese alguma A Exposição de Motivos do Código Penal deve ser encarada como interpretação doutrinária e não autêntica por não fazer parte da estrutura da lei Judicial ou jurisprudencial é interpretação executada pelos membros do Poder Judiciário na decisão dos litígios que lhes são submetidos Sua reiteração constitui a jurisprudência Em regra não tem força obrigatória salvo em três casos a na situação concreta em virtude da formação da coisa julgada material b quando constituir súmula vinculante CF art 103 A e c nas demais hipóteses previstas no art 927 do Código de Processo Civil5 Quanto aos meios ou métodos gramatical e lógica Cuidase do meio de que se serve o intérprete para descobrir o significado da lei penal Classificase em gramatical e lógica Gramatical também denominada literal ou sintática é a que flui da acepção literal das palavras contidas na lei Despreza quaisquer outros elementos que não os visíveis na singela leitura do texto legal É a mais precária em face da ausência de técnica científica Lógica ou teleológica é aquela realizada com a finalidade de desvendar a genuína vontade manifestada na lei nos moldes do art 5º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro É mais profunda e 754 consequentemente merecedora de maior grau de confiabilidade Servese o intérprete de todos os elementos que tem à sua disposição quais sejam histórico evolução histórica da lei e do objeto nela tratado sistemático análise da lei em compasso com o sistema em que se insere direito comparado tratamento do assunto em outros países e inclusive de elementos extrajurídicos quando o significado de determinados institutos se encontra fora do âmbito do Direito exemplo conceito de veneno relacionado à química Quanto ao resultado declaratória extensiva e restritiva Referese à conclusão extraída pelo intérprete classificandose em declaratória extensiva e restritiva Declaratória declarativa ou estrita é aquela que resulta da perfeita sintonia entre o texto da lei e a sua vontade Nada resta a ser retirado ou acrescentado Extensiva é a que se destina a corrigir uma fórmula legal excessivamente estreita A lei disse menos do que desejava minus dixit quam voluit Amplia se o texto da lei para amoldálo à sua efetiva vontade Por se tratar de mera atividade interpretativa buscando o efetivo alcance da lei é possível a sua utilização até mesmo em relação àquelas de natureza incriminadora Exemplo disso é o art 159 do Código Penal legalmente definido como extorsão mediante sequestro que também abrange a extorsão mediante cárcere privado É a posição consagrada em sede doutrinária Deve ser utilizada em concursos que esperam do candidato uma posição mais rigorosa tais como do Ministério Público Polícia Civil e Polícia Federal Em concursos de tendência mais liberal como é o caso da Defensoria Pública razoável empregar uma posição favorável ao réu Nesse contexto já decidiu o Supremo Tribunal Federal O princípio da legalidade estrita de observância cogente em matéria penal impede a interpretação extensiva ou analógica das normas penais6 755 756 761 Restritiva é a que consiste na diminuição do alcance da lei concluindose que a sua vontade manifestada de forma ampla não permite seja atribuído à sua letra todo o sentido que em tese poderia ter A lei disse mais do que desejava plus dixit quam voluit Interpretação progressiva Interpretação progressiva adaptativa ou evolutiva é a que busca amoldar a lei à realidade atual Evita a constante reforma legislativa e se destina a acompanhar as mudanças da sociedade É o caso do conceito de ato obsceno diferente atualmente do que era há algumas décadas Interpretação analógica Interpretação analógica ou intra legem é a que se verifica quando a lei contém em seu bojo uma fórmula casuística seguida de uma fórmula genérica É necessária para possibilitar a aplicação da lei aos inúmeros e imprevisíveis casos que as situações práticas podem apresentar Imaginese na fase oral de um concurso público e toda a natural e inevitável tensão que a acompanha O examinador faz a primeira pergunta Doutor Doutora apresente um exemplo de motivo torpe como qualificadora do crime de homicídio Nessa hora a memória pode falhar a ansiedade e o nervosismo podem atrapalhar por mais preparado ou preparada que você esteja Lembrese então da interpretação analógica Abra o Código Penal que estará à sua frente e leia o art 121 2º I respondendo em seguida Excelência o homicídio praticado mediante paga ou promessa de recompensa7 É isso Paga e promessa de recompensa são motivos torpes que não excluem outros Introdução Não se trata de interpretação da lei penal De fato sequer há lei a ser interpretada Cuidase portanto de integração ou colmatação do 762 ordenamento jurídico A lei pode ter lacunas mas não o ordenamento jurídico Também conhecida como integração analógica ou suplemento analógico é a aplicação ao caso não previsto em lei de lei reguladora de caso semelhante No Direito Penal somente pode ser utilizada em relação às leis não incriminadoras em respeito ao princípio da reserva legal Seu fundamento repousa na exigência de igual tratamento aos casos semelhantes Por razões de justiça fatos similares devem ser tratados da mesma maneira ubi eadem ratio ibi eadem iuris dispositio Espécies A analogia se apresenta pelas seguintes espécies a Analogia in malam partem é aquela pela qual aplicase ao caso omisso uma lei maléfica ao réu disciplinadora de caso semelhante Não é admitida no Direito Penal em homenagem ao princípio da reserva legal Consoante a posição do Supremo Tribunal Federal Não se pode pretender a aplicação da analogia para abarcar hipótese não mencionada no dispositivo legal analogia in malam partem Devese adotar o fundamento constitucional do princípio da estrita legalidade na esfera penal Por mais reprovável que seja a lamentável prática da cola eletrônica a persecução penal não pode ser legitimamente instaurada sem o atendimento mínimo dos direitos e garantias constitucionais vigentes em nosso Estado Democrático de Direito8 b Analogia in bonam partem é aquela pela qual se aplica ao caso omisso uma lei favorável ao réu reguladora de caso semelhante É possível no Direito Penal exceto no que diz respeito às leis excepcionais que não admitem analogia justamente por seu caráter extraordinário Imagine uma adolescente de 13 anos de idade vítima de estupro de vulnerável CP art 217A caput com a redação conferida pela Lei 121052009 crime do qual resultou sua gravidez Questionase Seria 771 possível o aborto A lei nada diz Entretanto o art 128 II do Código Penal autoriza a interrupção da gravidez resultante de estupro aborto sentimental sem mencionar o estupro de vulnerável crime inexistente à época em que foi redigido o art 128 do Código Penal Ora a situação é semelhante a gravidez é indesejada pois originária de um delito contra a dignidade sexual Ademais o fundamento da autorização legal do aborto é evitar que a presença do filho traga à mãe recordações de um ato covarde contra ela praticado Perfeitamente cabível assim a analogia c Analogia legal ou legis é aquela em que se aplica ao caso omisso uma lei que trata de caso semelhante d Analogia jurídica ou juris é aquela em que se aplica ao caso omisso um princípio geral do direito Introdução Depois de cumprir todas as fases do processo legislativo previsto na Constituição Federal a lei penal ingressa no ordenamento jurídico e assim como as demais leis em geral vigora até ser revogada por outro ato normativo de igual natureza É o que se convencionou chamar de princípio da continuidade das leis A revogação é a retirada da vigência de uma lei Essa é a regra geral uma lei somente é revogada por outra lei Há exceções no Direito Penal As leis temporárias e excepcionais são autorrevogáveis ou seja não precisam ser revogadas por outra lei Toda e qualquer lei por mais relevante e conhecida que seja pode ser revogada A atividade legislativa como decorrência da soberania popular é irrenunciável Os costumes por mais consagrados que sejam em dada sociedade não revogam leis Dessa forma a contravenção penal do jogo do bicho continua em vigor embora muitas vezes indevidamente tolerada pela sociedade e pior pelos órgãos estatais responsáveis pela segurança pública 772 Da mesma forma uma lei jamais é revogada por decisão judicial ainda que oriunda do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade Como se sabe a declaração de inconstitucionalidade limitase a retirar a eficácia da lei em contrariedade com o texto constitucional sem revogála função exclusiva do Poder Legislativo A revogação da lei dependendo do seu alcance pode ser absoluta ou total conhecida como abrogação abrogação absoluta ou parcial denominada derrogação No tocante ao modo pelo qual se verifica a revogação pode ser expressa tácita ou global a Expressa ocorre quando uma lei indica em seu corpo os dispositivos legais revogados O art 75 da Lei 113432006 revogou expressamente as Leis 63681976 e 114092002 de modo que o tratamento legal da repressão ao uso e tráfico de drogas passou a ser por ela regulado b Tácita ocorre no caso em que a lei nova se revela incompatível com a anterior apesar de não haver menção expressa à revogação e c Global ocorre quando a nova lei regula inteiramente a matéria disciplinada pela lei anterior que passa a ser ultrapassada e desnecessária Em obediência às regras de hermenêutica e observando o campo de incidência das leis a lei de natureza geral não revoga a especial da mesma forma pela qual a especial também não revoga a geral Não se trata de hierarquia e sim de matérias diversas e diferentes âmbitos de atuação uma não influindo sobre a outra Direito Penal intertemporal e o conflito de leis penais no tempo Como a lei pode ser revogada instauramse situações de conflito Nesse sentido verificase o conflito de leis no tempo quando uma lei nova entra em vigor revogando a anterior De fato situações problemáticas inevitavelmente surgirão eis que a lei nova sempre tem conteúdo ao menos relativamente diverso da sua antecessora mesmo porque se fossem idênticas não haveria razão lógica para a sua edição a b c d e 7721 As regras e princípios que buscam solucionar o conflito de leis penais no tempo constituem o direito penal intertemporal A análise do art 5º XL da Constituição Federal e dos arts 2º e 3º do Código Penal permite a conclusão de que uma vez criada a eficácia da lei penal no tempo deve obedecer a uma regra geral e a várias exceções A regra geral é a da prevalência da lei que se encontrava em vigor quando da prática do fato vale dizer aplicase a lei vigente quando da prática da conduta tempus regit actum Dessa forma resguardase a reserva legal bem como a anterioridade da lei penal em cumprimento às diretrizes do texto constitucional As exceções se verificam por outro lado na hipótese de sucessão de leis penais que disciplinem total ou parcialmente a mesma matéria E se o fato tiver sido praticado durante a vigência da lei anterior cinco situações podem ocorrer a lei cria uma nova figura penal novatio legis incriminadora a lei posterior se mostra mais rígida em comparação com a lei anterior lex gravior a lei posterior extingue o crime abolitio criminis a lei posterior é benigna em relação à sanção penal ou à forma de seu cumprimento lex mitior ou a lei posterior contém alguns preceitos mais rígidos e outros mais brandos Vejamos cada uma delas Novatio legis incriminadora É a lei que tipifica como infrações penais comportamentos até então considerados irrelevantes A neocriminalização somente pode atingir situações consumadas após sua entrada em vigor Não poderá retroagir em hipótese alguma conforme determina o art 5º XL da Constituição Federal 7722 7723 A novatio legis incriminadora portanto somente tem eficácia para o futuro Jamais para o passado Lei penal mais grave ou lex gravior Lei penal mais grave é a que de qualquer modo implicar tratamento mais rigoroso às condutas já classificadas como infrações penais A expressão de qualquer modo deve ser considerada de forma ampla para atingir todo tipo de situação prejudicial ao réu Exemplos aumento de pena criação de qualificadora agravante genérica ou causa de aumento da pena imposição de regime prisional mais rígido aumento do prazo prescricional supressão de atenuante genérica ou causa de diminuição da pena etc Se mais grave a lei terá aplicação apenas a fatos posteriores à sua entrada em vigor Jamais retroagirá conforme expressa determinação constitucional Essa regra tem incidência sobre todas as leis com conteúdo material estejam alocadas tanto no Código Penal Parte Geral ou Parte Especial ou na legislação penal extravagante sejam incriminadoras ou reguladoras da imputabilidade das causas excludentes da ilicitude da aplicação da pena ou de qualquer outra classe jurídica atentatória do poder punitivo Abolitio criminis e lei posterior benéfica Abolitio criminis é a nova lei que exclui do âmbito do Direito Penal um fato até então considerado criminoso Encontra previsão legal no art 2º caput do Código Penal e tem natureza jurídica de causa de extinção da punibilidade art 107 III9 Alcança a execução e os efeitos penais da sentença condenatória não servindo como pressuposto da reincidência e também não configura maus antecedentes Sobrevivem entretanto os efeitos civis de eventual condenação quais sejam a obrigação de reparar o dano provocado pela infração penal e constituição de título executivo judicial A configuração da abolitio criminis reclama revogação total do preceito penal e não somente de uma norma singular referente a um fato que sem ela se contém numa incriminação penal Com efeito são necessários dois requisitos para a caracterização da abolitio criminis a revogação formal do tipo penal e b supressão material do fato criminoso Em outras palavras não basta a simples revogação do tipo penal É necessário que o fato outrora incriminado tornese irrelevante perante o ordenamento jurídico a exemplo do que aconteceu com o antigo crime de adultério cuja definição encontrava se no art 240 do Código Penal De fato não há falar em abolitio criminis nas hipóteses em que nada obstante a revogação formal do tipo penal o fato criminoso passa a ser disciplinado perante dispositivo legal diverso Nesses casos verificase a incidência do princípio da continuidade normativa ou da continuidade típiconormativa10 operandose simplesmente a alteração geográfica ou topográfica da conduta ilícita Esse fenômeno foi constatado no campo do atentado violento ao pudor pois o art 214 do Código Penal foi revogado pela Lei 120152009 mas o fato passou a ser alcançado pelo art 213 do Estatuto Repressivo agora sob o rótulo estupro Na visão do Superior Tribunal de Justiça Cabe registrar que diante do princípio da continuidade normativa não há falar em abolitio criminis quanto ao crime de atentado violento ao pudor cometido antes da alteração legislativa conferida pela Lei 120152009 A referida norma não descriminalizou a conduta prevista na antiga redação do art 214 do CP que tipificava a conduta de atentado violento ao pudor mas apenas a deslocou para o art 213 do CP formando um tipo penal misto com condutas alternativas estupro e atentado violento ao pudor11 Nada impede por opção política do legislador que um fato alcançado pela abolitio criminis venha a ser no futuro novamente incriminado É evidente que essa lei somente será aplicável aos fatos cometidos após a sua entrada em vigor em obediência ao princípio da anterioridade um dos vetores do Direito Penal moderno e democrático É cabível o reconhecimento da abolitio criminis temporária nas situações em que a lei prevê a descriminalização transitória de uma conduta Esse fenômeno foi constatado nos arts 30 a 32 da Lei 108262003 Estatuto 1ª 2ª 3ª do Desarmamento ao autorizar a extinção da punibilidade no tocante aos responsáveis pelos crimes de posse e de porte ilegal de arma de fogo que efetuaram voluntariamente a entrega de armas de fogo de uso permitido dentro dos prazos neles estabelecidos12 Lei penal benéfica também conhecida como lex mitior ou novatio legis in mellius é a que se verifica quando ocorrendo sucessão de leis penais no tempo o fato previsto como crime ou contravenção penal tenha sido praticado na vigência da lei anterior e o novel instrumento legislativo seja mais vantajoso ao agente favorecendoo de qualquer modo A lei mais favorável deve ser obtida no caso concreto aplicandose a que produzir o resultado mais vantajoso ao agente teoria da ponderação concreta13 Aqui também a expressão de qualquer modo deve ser compreendida na acepção mais ampla possível Nos termos do art 5º XL da Constituição Federal a abolitio criminis e a novatio legis in mellius devem retroagir por configurar nítido benefício ao réu A retroatividade é automática dispensa cláusula expressa e alcança inclusive os fatos já definitivamente julgados14 E qual é o juízo competente para aplicar a abolitio criminis e a nova lei mais favorável A resposta é simples Guarde o seguinte raciocínio a lei será sempre aplicada pelo órgão do Poder Judiciário em que a ação penal ou inquérito policial estiver em trâmite Extraemse as seguintes ilações Tratandose de inquérito policial ou de ação penal que se encontre em 1º grau de jurisdição ao juiz natural compete a aplicação da lei mais favorável Exemplo crime praticado na comarca de São Paulo com inquérito policial distribuído e ação penal ajuizada na 10ª Vara Criminal O juiz de Direito responsável por esta Vara deverá aplicar a lei mais favorável No caso de ação penal em grau de recurso ou ainda na hipótese de crime de competência originária dos Tribunais tal mister será tarefa do Tribunal respectivo Se a condenação já tiver sido alcançada pelo trânsito em julgado a competência será do juízo da Vara das Execuções Criminais É o 77231 que se extrai do art 66 I da Lei de Execução Penal e da Súmula 611 do Supremo Tribunal Federal15 Atenção para um detalhe vimos que a lei mais favorável é retroativa Portanto somente se pode falar em retroatividade quando a lei posterior for mais benéfica ao agente em comparação àquela que estava em vigor quando o crime foi praticado Pode ocorrer ainda ultratividade da lei mais benéfica Tal se verifica quando o crime foi praticado durante a vigência de uma lei posteriormente revogada por outra prejudicial ao agente Subsistem no caso os efeitos da lei anterior mais favorável Isso porque como já abordado a lei penal mais grave jamais retroagirá16 Lei penal posterior e vacatio legis 7724 Durante o período de vacatio legis a lei penal não pode ser aplicada mesmo que ela seja mais favorável ao réu Com efeito se a lei já foi publicada mas ainda não entrou em vigor ela ainda não tem eficácia sendo impossível sua incidência no caso prático É preciso manter coerência Se a lei em período de vacância não pode ser utilizada para prejudicar o réu porque ainda não está apta a produzir seus regulares efeitos também não pode beneficiálo A propósito basta recordar do Código Penal de 1969 Decretolei 10041969 que possuía diversas disposições mais favoráveis ao réu se comparado à época com o Código Penal de 1940 O Código Penal de 1969 originário do Anteprojeto Nélson Hungria é notoriamente apontado como exemplo do período de mais longa vacatio legis já existente no ordenamento jurídico pátrio Seu texto final foi publicado em 1963 e posteriormente sancionado em 21 de outubro de 1969 pelo Governo Militar Comando Supremo da Revolução com fulcro no art 3º do Ato Institucional 161969 combinado com o 1º do art 2º do Ato Institucional 051968 Nada obstante o Código Penal de 1969 nunca entrou em vigor Originariamente o Código Penal de 1969 deveria ter entrado em vigor no dia 1º081970 Seu texto entretanto foi revisto pela Lei 60161973 Após sucessivos prolongamentos das datas estipuladas para o início da sua aplicabilidade cf Lei 60631974 e suas alterações o diploma concebido por Nélson Hungria acabou revogado pela Lei 65781978 quando ainda estava em período de vacatio razão pela qual nenhuma de suas disposições favoráveis ou prejudiciais ao réu foi aplicada no lugar no Código Penal de 1940 ainda em vigor Combinação de leis penais lex tertia Pode ocorrer o conflito entre duas leis penais sucessivas no tempo cada qual com partes favoráveis e desfavoráveis ao réu Exemplo A Lei X comina a certo crime as penas de reclusão de um a quatro anos e multa Posteriormente tal lei é revogada por outra Y a qual prevê ao mesmo delito a pena de reclusão de dois a seis anos sem multa A discussão reside na possibilidade ou não de o juiz na determinação da lei penal mais branda acolher os preceitos favoráveis da primitiva e ao mesmo tempo os da posterior combinandoos para utilizálos no caso concreto de modo a extrair o máximo benefício resultante da aplicação conjunta dos aspectos mais interessantes ao réu O cerne da discussão reside em definir se cabe ou não ao Poder Judiciário a formação de uma lex tertia ou seja de uma lei híbrida Em nosso exemplo poderia o magistrado combinar as leis X e Y da forma mais favorável ao réu daí resultando a pena de um a quatro anos da primeira sem multa da segunda A doutrina se divide acerca do assunto Nélson Hungria revelava sua incredulidade nessa possibilidade de o membro do Poder Judiciário se arvorar em legislador sob pena de violação da regra constitucional da separação dos Poderes17 Compartilham desse entendimento Heleno Cláudio Fragoso e Aníbal Bruno Com opinião diametralmente oposta José Frederico Marques pugnava pela admissibilidade da combinação de leis São suas as palavras Dizer que o juiz está fazendo lei nova ultrapassando assim suas funções constitucionais é argumento sem consistência pois o julgador em obediência a princípios de equidade consagrados pela própria Constituição está apenas movimentandose dentro dos quadros legais para uma tarefa de integração perfeitamente legítima O órgão judiciário não está tirando ex nihilo a regulamentação eclética que deve imperar hic et nunc A norma do caso concreto é construída em função de um princípio constitucional com o próprio material fornecido pelo legislador Se ele pode escolher para aplicar o mandamento da Lei Magna entre duas séries de disposições legais a que lhe pareça mais benigna não vemos porque se lhe vede a combinação de ambas para assim aplicar mais retamente a Constituição Se lhe está afeto escolher o todo para que o réu tenha o tratamento mais favorável e benigno nada há que lhe obste selecionar parte de um todo e parte de outro para cumprir uma regra constitucional que deve sobrepairar a pruridos de lógica formal18 Historicamente o Supremo Tribunal Federal sempre se posicionou pela impossibilidade de combinação de leis penais com o argumento de que extrair alguns dispositivos de forma isolada de um diploma legal e outro preceito de outro diploma legal implica alterar por completo o seu espírito normativo criando um conteúdo diverso do previamente estabelecido pelo legislador19 Entretanto em alguns julgados o Supremo Tribunal Federal rompeu com seu posicionamento clássico e decidiu pelo cabimento a autor de crime de tráfico de drogas cometido sob a égide da Lei 63681976 do benefício introduzido pelo artigo 33 4º da nova Lei de Drogas Lei 113432006 Concluiu que aplicar a causa de diminuição não significa baralhar e confundir normas uma vez que o juiz ao assim proceder não cria lei nova mas apenas se movimenta dentro dos quadros legais para uma tarefa de integração perfeitamente possível Enfatizouse também que a vedação de junção de dispositivos de leis diversas é apenas produto de interpretação da doutrina e da jurisprudência sem apoio direto em texto constitucional20 Destarte o Supremo Tribunal Federal abandonou a teoria da ponderação unitária ou global a lei na sua totalidade na globalidade das suas disposições deve ser aplicada e filiouse à teoria da ponderação diferenciada pela qual considerada a complexidade de cada uma das leis em conflito no tempo e a relativa autonomia de cada uma das disposições é preciso procederse ao confronto de cada uma das disposições de cada lei podendo portanto acabar por se aplicar ao caso sub iudice disposições de ambas as leis21 Entretanto a inovação jurisprudencial não foi unânime pois o Supremo Tribunal Federal rapidamente retomou sua posição tradicional voltando a acolher a teoria da ponderação unitária ou global de modo a repelir a combinação de leis penais em homenagem aos princípios da reserva legal e da separação dos Poderes do Estado sob o argumento de ser vedada ao Poder Judiciário a criação de uma terceira pena Este é o entendimento atualmente adotado pela Corte Suprema contrário à combinação de leis penais É vedada a incidência da causa de diminuição do art 33 4º da Lei 7725 113432006 4º Nos delitos definidos no caput e no 1º deste artigo as penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços desde que o agente seja primário de bons antecedentes não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa combinada com as penas previstas na Lei 636876 no tocante a crimes praticados durante a vigência desta norma Essa a conclusão do Plenário que por maioria proveu parcialmente recurso extraordinário para determinar o retorno dos autos à origem instância na qual deverá ser realizada a dosimetria de acordo com cada uma das leis para aplicarse na íntegra a legislação mais favorável ao réu Prevaleceu o voto do Ministro Ricardo Lewandowski relator Inicialmente o relator frisou que o núcleo teleológico do princípio da retroatividade da lei penal mais benigna consistiria na estrita prevalência da lex mitior de observância obrigatória para aplicação em casos pretéritos Afirmou que se trataria de garantia fundamental prevista no art 5º XL da CF e que estaria albergada pelo Pacto de São José da Costa Rica art 9º Frisou que a Constituição disporia apenas que a lei penal deveria retroagir para beneficiar o réu mas não faria menção sobre a incidência do postulado para autorizar que algumas partes de diversas leis pudessem ser aplicadas separadamente para favorecer o acusado22 Com igual orientação o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula 501 É cabível a aplicação retroativa da Lei n 113432006 desde que o resultado da incidência das suas disposições na íntegra seja mais favorável ao réu do que o advindo da aplicação da Lei n 63681976 sendo vedada a combinação de leis Finalmente o Código Penal Militar Decretolei 10011969 em seu art 2º 2º proíbe expressamente a combinação de leis Lei penal intermediária É possível em caso de sucessão de leis penais a aplicação de uma lei intermediária mais favorável ao réu ainda que não seja a lei em vigor quando da prática da infração penal ou a lei vigente à época do julgamento Exemplo Ao tempo da conduta estava em vigor a lei A sucedida pela lei B 773 encontrandose em vigor ao tempo da sentença a lei C Nada impede a aplicação da lei B desde que se trate entre todas da mais favorável ao agente23 Essa é a posição consagrada no Supremo Tribunal Federal Lei penal no tempo incidência da norma intermediária mais favorável Dada a garantia constitucional de retroatividade da lei penal mais benéfica ao réu é consensual na doutrina que prevalece a norma mais favorável que tenha tido vigência entre a data do fato e a da sentença o contrário implicaria retroação da lei nova mais severa de modo a afastar a incidência da lei intermediária cuja prevalência sobre a do tempo do fato o princípio da retroatividade in mellius já determinara24 Em síntese a lei penal intermediária é simultaneamente dotada de retroatividade e de ultratividade Lei penal temporária e lei penal excepcional Lei penal temporária é aquela que tem a sua vigência predeterminada no tempo isto é o seu termo final é explicitamente previsto em data certa do calendário É o caso da Lei 126632012 conhecida como Lei Geral da Copa do Mundo de Futebol de 2014 cujo art 36 contém a seguinte redação Os tipos penais previstos neste Capítulo terão vigência até o dia 31 de dezembro de 2014 Lei penal excepcional por outro lado é a que se verifica quando a sua duração está relacionada a situações de anormalidade Exemplo É editada uma lei que diz ser crime punido com reclusão de seis meses a dois anos tomar banho com mais de dez minutos de duração durante o período de racionamento de energia Essas leis são autorrevogáveis Não precisam de outra lei que as revogue Basta a superveniência do dia nela previsto lei temporária ou o fim da situação de anormalidade lei excepcional para que deixem automaticamente de produzir efeitos jurídicos Por esse motivo são classificadas como leis intermitentes Se não bastasse possuem ultratividade pois se aplicam ao fato praticado 774 durante sua vigência embora decorrido o período de sua duração temporária ou cessadas as circunstâncias que a determinaram excepcional É o que consta do art 3º do Código Penal25 Em outras palavras ultratividade significa a aplicação da lei mesmo depois de revogada Imagine no exemplo mencionado que alguém tomou banho por mais de dez minutos durante o período de racionamento de energia Configurouse o crime tipificado pela lei excepcional A pena será aplicada mesmo após ser superada a situação de economia de força elétrica O fundamento da ultratividade é simples e foi suficientemente explicado pelo item 8 da Exposição de Motivos da antiga Parte Geral do Código Penal26 É especialmente decidida a hipótese da lei excepcional ou temporária reconhecendose a sua ultraatividade Esta ressalva visa impedir que tratandose de leis previamente limitadas no tempo possam ser frustradas as suas sanções por expedientes astuciosos no sentido do retardamento dos processos penais Buscase com a ultratividade impedir injustiças Sem essa característica da lei penal alguns réus seriam inevitavelmente condenados e outros não Seriam punidos somente aqueles que tivessem praticado crimes em período muito anterior ao fim de sua vigência As leis penais em branco e o conflito de leis no tempo Lei penal em branco é aquela cujo preceito secundário é completo mas o preceito primário necessita de complementação Há previsão precisa da sanção mas a narrativa da conduta criminosa é incompleta O complemento pode constituirse em outra lei ou ainda em ato da Administração Pública O problema relativo ao assunto consiste em saber se uma vez alterado o complemento da lei penal em branco posteriormente à realização da conduta criminosa ou seja com a infração penal já consumada e beneficiando o agente deve operarse a retroatividade A descrição do tipo penal continua a mesma mas a conduta praticada pelo agente não mais encontra adequação típica em face de não mais se enquadrar no complemento a que anteriormente se sujeitava Não há consenso entre os estudiosos do Direito Penal Basileu Garcia era favorável à retroatividade em oposição a Magalhães Noronha e José Frederico Marques entre outros Em que pese a acirrada discussão a questão é simples Para sua compreensão basta encarála em sintonia com o art 3º do Código Penal Com efeito o complemento da lei penal em branco pode assumir duas faces distintas normalidade e anormalidade Quando o complemento se revestir de situação de normalidade a sua modificação favorável ao réu revela a alteração do tratamento penal dispensado ao caso Em outras palavras a situação que se buscava incriminar passa a ser irrelevante Nesse caso a retroatividade é obrigatória Vejamos um exemplo Suponhamos que alguém seja preso em flagrante por ter sido encontrada em seu poder relevante quantidade de determinada droga O crime de tráfico tipificado pelo art 33 caput da Lei 113432006 constituise em lei penal em branco pois a sua descrição fala somente em droga e a classificação de determinada substância nessa categoria depende de enquadramento em relação constante de Portaria editada pelo Poder Executivo Federal Se ao tempo em que a conduta foi praticada a droga apreendida com o agente era definida como ilícita e se após o oferecimento de denúncia pelo Ministério Público ou mesmo depois de proferida a condenação inclusive com trânsito em julgado a Portaria é modificada e de seu rol deixa de constar a substância com que estava o agente deve operarse a retroatividade uma vez que não havia situação de anormalidade O que era crime deixou de ser Aplicase ao caso portanto a regra delineada pelo art 5º XL da Constituição Federal Por seu turno quando o complemento se inserir em um contexto de anormalidade de excepcionalidade a sua modificação ainda que benéfica ao réu não pode retroagir Fundamentase essa posição na ultratividade das leis penais excepcionais alicerçada no art 3º do Código Penal Se no momento em que estava em vigor o complemento havia algo de anormal ou seja se se tratava de situação que naquele momento e não necessariamente no futuro deveria ser reprimida a modificação do complemento não pode produzir efeitos aos casos anteriormente praticados ou seja cometidos em período de anormalidade Como exemplo podemos recordar a famosa passagem de tabelamento de preços de produtos e mercadorias em geral O art 2º VI da Lei 15211951 preceitua ser crime contra a economia popular transgredir tabelas oficiais de gêneros e mercadorias Imagine que em razão de problemas nas plantações de trigo e visando controlar acentuada inflação seja editada tabela pela qual o quilo do pão francês não possa ser vendido por valor superior a cinco reais enquanto não for normalizada a situação Nesse período um comerciante ávido por lucros vende pães por sete reais o quilo Sua conduta é descoberta e ele vem a ser condenado Em seguida a situação é normalizada e deixa de existir o preço tabelado liberandose os valores por parte dos comerciantes Nada obstante a pena deverá ser cumprida A modificação não poderá retroagir Ao contrário será ultrativa isto é produzirá efeitos mesmo depois de cessada a situação de excepcionalidade Essa é a posição do Supremo Tribunal Federal lançada na análise de caso relativo ao art 269 do Código Penal por ter ocorrido alteração na relação de doenças de notificação compulsória pelo médico 781 Em princípio o art 3º do Código Penal se aplica à norma penal em branco na hipótese de o ato normativo que a integra ser revogado ou substituído por outro mais benéfico ao infrator não se dando portanto a retroatividade Essa aplicação só não se faz quando a norma que complementa o preceito penal em branco importa real modificação da figura abstrata nele prevista ou se assenta em motivo permanente insusceptível de modificarse por circunstâncias temporárias ou excepcionais como sucede quando do elenco de doenças contagiosas se retira uma por se haver demonstrado que não tem ela tal característica27 Finalmente nas leis penais em branco ao avesso aquelas em que o preceito primário é completo mas o preceito secundário depende de complementação a revogação do complemento inviabiliza a punibilidade Embora a conduta criminosa tenha perfeita descrição normativa não será possível a imposição de pena diante da lacuna legislativa a seu respeito Conceito Dáse o conflito aparente de leis penais quando a um único fato se revela possível em tese a aplicação de dois ou mais tipos legais ambos instituídos por leis de igual hierarquia e originárias da mesma fonte de produção e também em vigor ao tempo da prática da infração penal Na clássica lição de Oscar Stevenson Tratase da sistemática dos princípios mercê dos quais determinada norma repressiva tem exclusividade de aplicação diante de outras que também definem como delito o mesmo fato correspondente ao comportamento no todo ou em parte O conflito de preceitos penais se resolve na unicidade de delito pela aplicação de uma só norma28 Percebese assim a existência de um único fato punível Ao contrário despontam diversos tipos legais aptos a serem aplicados ao caso concreto Mas tratandose de conduta singular afigurase injusta e desproporcional a incidência de mais de uma sanção penal razão pela qual deve ser escolhido o dispositivo legal que na vida real apresenta melhor adequação típica 782 783 784 O conflito é aparente pois desaparece com a correta interpretação da lei penal que se dá com a utilização de princípios adequados Requisitos São três 1 unidade de fato 2 pluralidade de leis penais e 3 vigência simultânea de todas elas29 Localização no Direito Penal O ponto de estudo do conflito aparente de leis penais é variável Enquanto alguns autores preferem analisálo com o concurso de crimes30 outros o situam perante a teoria da lei penal31 passando inclusive pelo poder de punir do Estado em face da proibição do bis in idem32 Mais acertado contudo é o seu enquadramento na interpretação da lei penal33 Não sem motivo Beling conceituou o instituto como a relação que medeia entre duas leis penais pela qual enquanto uma é excluída a outra é aplicada34 De fato cuidase de problema ligado à interpretação da lei solucionável com o emprego dos princípios apresentados pela dogmática penal A antinomia subsiste até o verdadeiro descobrimento da finalidade da lei penal o que se dá com a correta análise do seu alcance e conteúdo Finalidade A solução do conflito aparente de leis penais dedicase a manter a coerência sistemática do ordenamento jurídico bem como a preservar a inaceitabilidade do bis in idem Para Nélson Hungria Não é admissível que duas ou mais leis penais ou dois ou mais dispositivos da mesma lei penal se disputem com igual autoridade exclusiva aplicação ao mesmo fato Para evitar a perplexidade ou a intolerável solução pelo bis in idem o direito penal como o direito em geral dispõe de regras explícitas ou implícitas que previnem a possibilidade de competição em seu seio35 Inicialmente portanto o conflito aparente de leis penais prestase a evitar 785 1 2 o repudiável bis in idem implicitamente vedado pelo sistema jurídico como exigência de justiça Ora se um de seus requisitos é a unidade de fato em relação aos quais duas ou mais leis podem ser aplicadas resta clara a inadmissibilidade de sua dupla punição Não pode uma conduta ser duplamente castigada Em síntese não se admite pelo mesmo fato mais de uma punição Se não bastasse busca o instituto a manutenção da unidade e da coerência do ordenamento jurídico Não se olvida que no sistema penal afloram leis incompatíveis entre si tanto em face da imprecisão técnica do legislador como em virtude da variedade de situações que podem surgir na vida real impossibilitando a previsão antecipada de todos os casos merecedores de regulamentação expressa Entretanto se existem leis incompatíveis o sistema deve apresentar uma solução para que tal incompatibilidade desapareça A incompatibilidade entre elas deve ser tolhida mediante a exclusão de uma delas pelo Poder Judiciário Em síntese o Direito não tolera antinomias36 Diferença com o concurso de crimes Concurso de crimes é a situação que ocorre quando mediante uma ou mais condutas o agente pratica dois ou mais crimes idênticos ou não Está disciplinado pelos arts 69 a 72 do Código Penal São duas as diferenças fundamentais entre os institutos O conflito aparente não possui regramento legislativo tratandose atualmente de construção doutrinária e jurisprudencial ao passo que o concurso de crimes foi regulamentado à risca pelo Código Penal No concurso de crimes todas as leis violadas serão aplicadas no caso concreto implicando a soma ou majoração das penas previstas para cada uma delas Em suma tudo o que foi praticado será imputado ao agente Ao contrário no conflito aparente de leis a incidência de uma delas impede a aplicabilidade da outra Como um de seus requisitos é a unidade de fato restaria configurado o bis in 786 787 7871 idem se houvesse mais de uma punição A um fato corresponde igualmente uma pena As diversas leis buscam espaço concorrem mas ao final superado o processo exegético apenas uma será utilizada acarretando a incidência da sanção penal a ela destinada Diferença com o conflito de leis penais no tempo No conflito de leis penais no tempo regulado pelo direito intertemporal duas ou mais leis disputam a aplicação a um fato típico e ilícito praticado por agente culpável Somente uma delas poderá ser empregada já que a outra não mais existe não goza de vigência não produz efeitos válidos no mundo fenomênico Dessa forma e não se olvidando que um dos elementos do conflito aparente é a vigência simultânea de duas ou mais disposições inicialmente aplicáveis a um único fato a diferença entre os institutos é flagrante Enquanto no conflito de leis no tempo somente uma delas existe e está em vigor no conflito aparente ambas vigoram mas apenas a adequada surtirá efeitos no caso real sob pena de configuração do bis in idem sem prejuízo da quebra de unidade lógica do sistema jurídicopenal Princípios para solução do conflito A doutrina indica em geral quatro princípios para solucionar o conflito aparente de leis penais São eles 1 especialidade 2 subsidiariedade 3 consunção e 4 alternatividade Princípio da especialidade Com origem no Direito Romano é aceito de forma unânime Não se questiona que a lei especial prevalece sobre a lei geral lex specialis derogat generali semper specialia generalibus insunt generi per speciem derogatur A lei especial também chamada de específica possui sentido diferenciado particularizado Cuidase daquela cuja previsão reproduz de modo expresso ou elíptico a da lei geral tornandoa especial pelo acréscimo de outros elementos Em outras palavras lei especial é a que contém todos os dados típicos de uma lei geral e também outros denominados especializantes A primeira prevê o crime genérico ao passo que a última traz em seu bojo o crime específico Exemplo O crime de infanticídio previsto no art 123 do Código Penal tem núcleo idêntico ao do crime de homicídio tipificado pelo art 121 caput qual seja matar alguém Tornase entretanto figura especial ao exigir elementos especiais diferenciadores a autora deve ser a genitora e a vítima deve ser o seu próprio filho nascente ou neonato cometendose o delito durante o parto ou logo após sob a influência do estado puerperal É o que também se verifica entre as mais diversas infrações penais em suas formas simples quando comparadas com as modalidades derivadas sejam estas qualificadoras ou instituidoras de figuras privilegiadas Visualizase na especialidade uma relação lógica de dependência própria de uma situação de subordinação legislativa37 eis que toda conduta que atende ao tipo especial realiza também necessariamente e de forma simultânea o crime previsto na lei geral o que não ocorre em sentido diverso Em suma quem pratica o crime específico também o faz perante o crime genérico mas quem executa este não obrigatoriamente realiza aquele Há entre as leis relação de gênero e espécie ou seja todos os elementos descritos pela lei geral são reproduzidos pela lei especial Por tal razão a primeira é excluída quando comparada com a última De fato as diversas disposições têm por objeto o mesmo fato mas a aplicação de uma delas diferenciada específica e mais adequada além de ser dotada de elementos qualitativos ilide a incidência da outra de natureza residual e genérica Devese atentar contudo que entra em cena o critério da especialidade não só quando um crime se encontra expressamente compreendido em outro tal como acontece entre infanticídio e homicídio mas também nas situações em que a cuidadosa interpretação revela que um tipo penal acarreta em uma descrição mais próxima ou minuciosa para determinado fato punível38 É o que se verifica entre os crimes de calúnia e difamação tipificados respectivamente pelos arts 138 e 139 do Código Penal ambos atentam contra honra objetiva e exigem a imputação de fato determinado consumandose no instante em que terceira pessoa toma conhecimento do teor da ofensa No primeiro todavia a imputação referese ao cometimento de um crime que o agente sabe não ter sido praticado pela vítima seja porque outra pessoa foi seu autor seja porque jamais existiu Por sua vez na difamação a imputação diz respeito a um fato desabonador de índole criminosa ou não pouco importando seja verdadeiro ou falso Cumpre frisar que o princípio da especialidade impõe sejam os delitos genérico e específico praticados em absoluta contemporaneidade isto é no mesmo contexto fático Com efeito deve tratarse de fato único isolado e não de reiteração criminosa Exemplificativamente temos a situação da mãe que tenta matar o próprio filho durante o próprio parto sob a influência do estado puerperal mas não obtém êxito por circunstâncias alheias à sua vontade e depois vem a matálo em outro momento já com o desaparecimento do puerpério caso em que responderá pelos dois crimes em concurso material tentativa de infanticídio e homicídio doloso consumado As disposições genérica e específica podem ser integrantes de um mesmo diploma legal como se dá entre os crimes previstos no Código Penal ou ainda constar de leis distintas podendo ser lembrada a relação existente entre os crimes previstos no art 334A do Código Penal contrabando e pelo art 33 caput da Lei 113432006 tráfico de drogas aquele que importa clandestinamente qualquer produto incidirá na regra geral prevista no Código Penal de sua vez se o produto importado for alguma droga o crime será o de tráfico internacional de drogas tipificado na lei extravagante Ademais as leis podem ter sido promulgadas ao mesmo tempo ou em épocas diversas e nesse caso tanto pode ser posterior a lei geral como a especial Nesse contexto decidiu o Supremo Tribunal Federal que as novas disposições da Lei 113432006 Lei de Drogas não alteraram o art 290 do Código Penal Militar39 Vejamos O art 290 do Código Penal Militar não sofreu alteração pela superveniência da Lei n 1134306 por não ser o critério adotado na espécie o da retroatividade da lei penal mais benéfica mas sim o da especialidade O fundamento constitucional do crime militar é o art 124 parágrafo único da Constituição da República tratamento diferenciado do crime militar de posse de entorpecente definido no art 290 do Código Penal Militar Jurisprudência predominante do Supremo Tribunal Federal reverencia a especialidade da legislação penal militar e da justiça castrense sem a submissão à legislação penal comum do crime militar devidamente caracterizado40 O conflito aparente de leis penais tem como requisito inafastável portanto a existência de duas leis penais concorrentes sobre o mesmo fato e uma delas está contida na outra parcialmente da qual é diferenciada por um ou mais elementos especializantes Uma vez configurada a especialidade a sua utilização é peremptória De fato se fosse aplicada sempre a lei genérica não haveria sentido na atuação do legislador ao contemplar mais especificamente um preceito penal perante outro qualquer Sua aferição se estabelece em abstrato ou seja para saber qual lei é geral e qual é especial prescindese da análise do fato praticado É suficiente a comparação em tese das condutas definidas nos tipos penais Destarte para determinar a configuração da especialidade deve o intérprete formular um juízo hipotético negativo no qual se suprime mentalmente a existência do delito específico Caso todo o fato sem exceções dos ali contemplados seja suscetível de ser qualificado perante o crime genérico há de afirmarse a sua presença41 Se não bastasse pouco importa a quantidade de sanção penal reservada para as infrações penais A comparação entre as leis não se faz da mais grave para a menos grave pois a lei específica pode narrar um ilícito penal mais rigoroso ou mais brando Em síntese o critério da especialidade reclama duas leis penais em concurso caracterizadas pela relação de gênero e espécie na qual esta prefere àquela excluindo a sua aplicação para fins de tipicidade A lei específica deve abrigar todos os elementos da genérica apresentando ainda outras particulares características que podem ser denominadas elementos especializantes constituindo uma subespécie agravada ou atenuada daquela 7872 Em virtude de tais elementos a lei especial abarca um âmbito de aplicação mais restrito captando um menor número de condutas típicas e ilícitas Pode então ser efetuada a comparação entre os tipos penais como dois círculos concêntricos de diferentes raios sendo maior o especial mais elementares e menor o geral menos elementares razão pela qual quando o tipo especial não restar caracterizado pela ausência dos elementos especializantes que formam a sua peculiar estrutura abstrata a conduta poderá ser subsumida no tipo genérico de natureza residual Princípio da subsidiariedade Estabelece que a lei primária tem prevalência sobre a lei subsidiária lex primaria derogat legi subsidiarie Esta é a que define como crime um fato incluído por aquela na previsão de delito mais grave como qualificadora agravante causa de aumento de pena ou inclusive modo de execução Portanto há subsidiariedade entre duas leis penais quando se trata de estágios ou graus diversos de ofensa a um mesmo bem jurídico de forma que a ofensa mais ampla e dotada de maior gravidade descrita pela lei primária engloba a menos ampla contida na subsidiária ficando a aplicabilidade desta condicionada à não incidência da outra42 O crime tipificado pela lei subsidiária além de menos grave do que o narrado pela lei primária dele também difere quanto à forma de execução já que corresponde a uma parte deste Em outras palavras a figura subsidiária está inserida na principal O roubo por exemplo contém em seu arquétipo os crimes de furto e de ameaça ou lesão corporal Não por outra razão a lei subsidiária exerce função complementar diante da principal De fato somente se aplica quando esta última lei principal não puder incidir no tocante ao fato punível Corolário disso ao contrário do que se opera na especialidade aqui o fato tem de ser apreciado em concreto para aferir qual a disposição legal em que se enquadra Para Oscar Stevenson A aplicabilidade da norma subsidiária e a inaplicabilidade da principal não resultam da relação lógica e abstrata de uma com a outra mas do juízo de valor do fato em face delas43 Além disso na subsidiariedade não existem elementos especializantes mas descrição típica de fato mais abrangente e mais grave Na hipótese de restar configurada a lei primária instituidora de fato apenado mais gravemente jamais terá incidência a lei subsidiária com conduta sancionada mais levemente Esta somente será utilizada na impossibilidade daquela atuando como verdadeiro soldado de reserva44 Em suma as diferenças entre os princípios da especialidade e da subsidiariedade são manifestas No princípio da especialidade a lei especial é aplicada mesmo se for mais branda do que a lei geral No caso do princípio da subsidiariedade ao contrário a lei subsidiária menos grave sempre será excluída pela lei principal mais grave Ainda no princípio da especialidade a aferição do caráter geral ou especial das leis se estabelece em abstrato ou seja prescinde da análise do caso concreto enquanto no princípio da subsidiariedade a comparação sempre deve ser efetuada no caso concreto buscando a aplicação da lei mais grave Finalmente no princípio da especialidade ocorre relação de gênero e espécie entre as leis em conflito ao passo que no da subsidiariedade a lei subsidiária não deriva da principal A subsidiariedade pode ser expressa ou tácita Verificase a subsidiariedade expressa ou explícita nas situações em que é declarada formalmente na lei mediante o emprego de locuções como se as circunstâncias evidenciam que o agente não quis o resultado nem assumiu o risco de produzilo CP art 129 3º se o fato não constitui crime mais grave CP art 132 se o fato não constitui elemento de outro crime CP 7873 art 249 entre outras análogas De outro lado dáse a subsidiariedade tácita ou implícita quando a lei residual não condiciona taxativamente a sua aplicação em caso de impossibilidade de incidência da primária Possível assim a sua presença sem o apelo expresso do legislador deduzindose da finalidade almejada e dos meios que se relacionam entre as diversas disposições ou seja concluise pela sua existência diante da circunstância de encontrarse o fato implicado na lei primária como elemento constitutivo qualificadora causa de aumento da pena agravante genérica ou meio de execução Exemplo Constrangimento ilegal CP art 146 subsidiário diante do estupro CP art 213 Princípio da consunção ou da absorção De acordo com o princípio da consunção ou da absorção o fato mais amplo e grave consome absorve os demais fatos menos amplos e graves os quais atuam como meio normal de preparação ou execução daquele ou ainda como seu mero exaurimento Por tal razão aplicase somente a lei que o tipifica lex consumens derogat legi consumptae A lei consuntiva prefere a lei consumida Como prefere Magalhães Noronha na consunção o crime consuntivo é como que o vértice da montanha que se alcança passando pela encosta do crime consumido Pressupõe entre as leis penais em conflito relação de magis para minus ou seja de continente para conteúdo de forma que a lei instituidora de fato de mais longo espectro consome as demais45 Como decorrência da sanção penal prevista para a violação do bem jurídico mais extenso tornase prescindível e inaceitável a pena atribuída à violação do bem jurídico mais restrito evitandose a configuração do bis in idem daí decorrendo a sua indiscutível finalidade prática Seus fundamentos são claros o bem jurídico resguardado pela lei penal menos vasta já está protegido pela lei penal mais ampla e a prática do ilícito por aquela definido é indispensável para a violação desta última Como ressalta Jiménez de Asúa46 A maior amplitude da lei ou da disposição legal pode derivar do bem jurídico tutelado que compreende também o tutelado por outra lei ou da natureza dos meios adotados ou dos efeitos produzidos ou bem de que aquela assuma como elemento constitutivo ou circunstância qualificadora de algum fato previsto por outra lei tradução livre Ao contrário do que se dá no princípio da especialidade aqui não se reclama a comparação abstrata entre as leis penais Comparamse os fatos inferindose que o mais grave consome os demais sobrando apenas a lei penal que o disciplina O cotejo se dá entre fatos concretos de modo que o mais completo o inteiro prevalece sobre a fração Não há um único fato buscando se abrigar em uma ou outra lei penal caracterizada por notas especializantes mas uma sucessão de fatos todos penalmente tipificados na qual o mais amplo consome o menos amplo evitandose seja este duplamente punido como parte de um todo e como crime autônomo Não por outro motivo o crime consumado absorve o crime tentado ocorrendo idêntico fenômeno entre os delitos de dano e os delitos de perigo A distinção com o princípio da subsidiariedade também é evidente Na regra da subsidiariedade em função do fato concreto praticado comparamse as leis para saber qual é a aplicável Por seu turno na consunção sem buscar auxílio nas leis comparamse os fatos apurandose que o mais amplo completo e grave consome os demais O fato principal absorve o acessório sobrando apenas a lei que o disciplina Em oposição ao que se visualiza nos princípios da especialidade e da subsidiariedade na consunção não há um fato único buscando amoldarse em uma ou outra lei mas uma sucessão de fatos em que o mais amplo e mais grave absorve os menos amplos e menos graves Afastase assim o bis in idem já que o fato menos amplo e menos grave seria duplamente punido como parte do todo e como crime autônomo A consunção pode ter sua origem tanto em virtude da expressa declaração da lei47 como também na sua zelosa interpretação utilizandose para tanto de elementos de ordem gramatical lógica histórica e sistemática na apreciação jurídica do caso concreto 78731 787311 Hipóteses em que se aplica o princípio da consunção O princípio da consunção se concretiza em quatro situações crime complexo crime progressivo progressão criminosa e atos impuníveis Crime complexo Também conhecido como crime composto é a modalidade que resulta da fusão de dois ou mais crimes que passam a desempenhar a função de elementares ou circunstâncias daquele tal como se dá no roubo originário da união entre os delitos de furto e ameaça ou lesão corporal dependendo do meio de execução empregado pelo agente Para Jorge de Figueiredo Dias48 Se na maior parte dos tipos de crime tipos simples está em causa a proteção de apenas um bem jurídico vg a vida no art 131º a honra no art 180º nos tipos complexos pretendese alcançar a protecção de vários bens jurídicos Por exemplo no roubo art 210º é tutelada não só a propriedade mas também a integridade física e a liberdade individual de decisão e acção O relevo normativoprático desta distinção reside em que ela pode mostrarse essencial para uma correcta interpretação e aplicação do tipo Indicado por relevante parcela doutrinária como hipótese da consunção49 parecenos não ser esta a melhor escolha Em apertada síntese alegam seus defensores que o crime complexo absorve os delitos autônomos que compõem a sua estrutura típica razão pela qual prevalece a lei responsável pela sua definição Na verdade o crime complexo constitui verdadeiro concurso de crimes ainda que pela escolha técnicolegislativa exista a opção de castigar a atuação do agente pela figura final que deverá prevalecer por estabelecer uma valoração conjunta dos fatos em concurso Destarte não se desnatura o concurso de crimes existente no complexo delitivo convertendoo em conflito aparente de leis penais É óbvio contudo que o conflito aparente se realizará entre a figura complexa de um lado e as figuras simples do outro Além disso é fundamental que no conflito aparente todas as leis penais 787312 787313 devem qualificar os mesmos fatos atentatórios do mesmo bem jurídico permitindose a aplicação da mais pertinente entre elas coisa que aqui não sucede Crime progressivo É o que se opera quando o agente almejando desde o início alcançar o resultado mais grave pratica mediante a reiteração de atos crescentes violações ao bem jurídico50 Pressupõe necessariamente a existência de um crime plurissubsistente isto é uma única conduta orientada por um só propósito mas fracionável em diversos atos O ato final gerador do evento originariamente desejado consome os anteriores que produziram violações mais brandas ao bem jurídico finalmente atacado denominados de crimes de ação de passagem51 Possui como requisitos portanto a unidade de elemento subjetivo e de conduta composta de vários atos e a progressividade no dano ao bem jurídico Desde o início de sua empreitada o crime mais grave é desejado pelo sujeito que vem a praticar uma única conduta decomposta em vários executórios lesando gradativamente o bem jurídico que se propôs a lesionar Imaginese a hipótese em que alguém desejando eliminar um desafeto começa a golpeálo em várias regiões do corpo iniciando o processo de matá lo vindo finalmente a atingilo na cabeça ceifando sua vida As diversas lesões corporais necessárias para a execução do homicídio ficam por este absorvidas Progressão criminosa Dáse quando o agente pretende inicialmente produzir um resultado e depois de alcançálo opta por prosseguir na prática ilícita e reinicia outra conduta produzindo um evento mais grave52 Exemplo O agente que após praticar vias de fato opta por produzir lesões corporais na vítima e ainda não satisfeito acaba por matála responde exclusivamente pelo homicídio O sujeito é guiado por uma pluralidade de desígnios havendo alteração em seu dolo razão pela qual executa uma diversidade de fatos mais de um 787314 crime cada um correspondente a uma vontade destacandose a crescente lesão ao bem jurídico Por tal motivo a resposta penal se dará somente para o fato final mais grave ficando absorvidos os demais Com a punição do crime final o Estado também sanciona os anteriores efetuados no mesmo contexto fático A penalização autônoma constituiria indisfarçável bis in idem tendo em vista que seriam castigados como parte do resultado final e também de maneira independente Fatos impuníveis São divididos em três grupos53 anteriores simultâneos e posteriores todos previstos como crimes ou contravenções penais por outras leis as quais o agente realiza em virtude da mesma e única finalidade qual seja praticar o fato principal ou então como consequência deste o seu exaurimento por força do id quod plerumque accidit isto é de acordo com o que normalmente acontece aquilatandose a sua conduta com as máximas da experiência cotidiana Atos anteriores prévios ou preliminares impuníveis são os que funcionam como meios de execução do tipo principal ficando por este absorvidos No caso do roubo da bolsa da vítima que se encontra no interior de um automóvel eventual destruição do vidro não acarreta na imputação ao agente do crime contido no art 163 caput do Código Penal54 Em conformidade com a definição do princípio da consunção o fato anterior componente dos atos preparatórios ou de execução apenas será absorvido quando apresentar menor ou igual gravidade quando comparado ao principal para que este goze de força suficiente para consumir os demais englobandoos em seu raio de atuação Nesse contexto é manifesto o equívoco técnico da Súmula 17 do Superior Tribunal de Justiça Quando o falso se exaure no estelionato sem mais potencialidade lesiva é por este absorvido O enunciado jurisprudencial destinase precipuamente às hipóteses em que o sujeito com o escopo de praticar estelionato falsifica materialmente uma cártula de cheque documento particular equiparado a documento público por expressa determinação legal nos termos do art 297 2º do Código Penal Ora tal crime é punido com reclusão de dois a seis anos e multa Sendo o fato mais amplo e grave não pode ser consumido pelo estelionato sancionado de forma mais branda Mas não para por aí Os delitos apontados atingem bens jurídicos diversos Enquanto o estelionato constitui crime contra o patrimônio o falso agride a fé pública Não há falar tecnicamente em conflito aparente de leis mas em autêntico concurso material de delitos55 Portanto se no rigor científico a súmula deve ser rejeitada resta acreditar que a sua criação e manutenção se devem exclusivamente a motivos de política criminal tornando a conduta cada vez mais próxima do âmbito civil à medida que a pena pode ser inclusive reduzida pelo arrependimento posterior benefício vedado ao crime de falso É importante ressaltar que o ante factum impunível e o crime progressivo não se confundem No último há incursão obrigatória pela infração penal menos grave não se podendo exemplificativamente matar sem antes ferir O primeiro todavia pode ser cometido sem violação da lei penal menos grave Na hipótese aventada não se discute que a bolsa da vítima pode ser roubada sem a destruição do vidro do veículo Já os atos concomitantes ou simultâneos não puníveis são aqueles praticados no instante em que se executa o fato principal É o caso dos ferimentos leves suportados pela mulher violentada sexualmente os quais restam consumidos pelo crime de estupro Finalmente os fatos posteriores não puníveis são visualizados quando depois de realizada a conduta o sujeito pratica nova ofensa contra o mesmo bem jurídico buscando alguma vantagem com o crime anterior56 O exaurimento deve ser aferido em consonância com a lógica do razoável pois não há dúvida de que exemplificativamente o larápio usualmente vende os bens subtraídos visando lucro financeiro Se o furto ou roubo se deu por força de ânimo de lucro não seria correto punilo mais uma vez por ter lucrado57 Cuidase de previsível exaurimento ficando consumidos os atos posteriores 7873141 Fatos anteriores e posteriores impuníveis e o crime conexo A palavra conexão é utilizada para dirigirse ao elo objetivo ou subjetivo entre duas ou mais infrações penais Definese então o crime conexo como aquele ligado a outro delito A conexão pode ser teleológica quando o crime é praticado para assegurar a execução de outro ou consequencial se visar garantir a ocultação impunidade ou vantagem de delito anterior Funciona como qualificadora no homicídio e agravante genérica nos demais casos como se infere dos arts 121 2º V e 61 II alínea b respectivamente ambos do Código Penal Entre os crimes há autêntico concurso material Assim quem mata o segurança de um empresário e priva este último da liberdade para obter vantagem como condição ou preço do resgate responde por homicídio e extorsão mediante sequestro somandose as penas Se o último delito todavia não se produz nem na forma tentada por ele não responde o agente mas o crime contra a vida subsiste na forma qualificada Levase em conta o tempo do crime considerandose a teoria da atividade encampada pelo art 4º do Código Penal Há assim certa semelhança entre o crime conexo e os fatos anteriores e posteriores não puníveis os primeiros relacionados com a conexão teleológica e os últimos com a consequencial Mas a diferença é nítida Na conexão a prática do crimemeio e do crimefim não é o que normalmente acontece na vida cotidiana ao passo que no ante factum e no post factum impuníveis o crime principal e os demais são consequências naturais no sentido de que o desrespeito de uma lei tem por resultado normal a posterior violação da outra Nesses termos o agente que mata alguém e depois destrói o cadáver deve suportar a responsabilização do crime de homicídio em concurso com o de destruição de cadáver tipificado no art 211 do Código Penal Cuidase de conexão consequencial e não de post factum impunível haja vista não ser a violação do mencionado tipo penal consequência normal da prática do crime 7874 contra a vida Por seu turno o sujeito que falsifica documento público e depois dele faz uso somente responde pelo crime de falso material pois o delito tipificado no art 304 do Código Penal é corolário lógico do previsto no art 297 do citado diploma legal Não se deve portanto equiparar as situações A forma de interpretação é bastante diversa justificando a distinção no tocante ao tratamento penal dispensado Princípio da alternatividade Seu conceito em consonância com as posições fornecidas pela doutrina deve levar em conta dois pontos de partida distintos Inicialmente a alternatividade é definida como a situação em que duas ou mais disposições legais se repetem diante do mesmo fato Para Luis Jiménez de Asúa Há alternatividade quando os dois artigos ou leis se comportam como dois círculos secantes O que interessa é definir qual deles deve ser eleito para a subsunção Os autores se pronunciam pelo preceito que contém penas mais severas fórmula que aceitamos porque mede a maior importância do bem jurídico protegido mas se forem iguais as sanções impostas apenas por via interpretativa segundo disse Fontecilla pode descobrirse o maior valor do bem jurídico tutelado58 tradução livre Oscar Stevenson compartilha desse entendimento Pelo princípio da alternatividade a aplicação de uma norma a um fato exclui a aplicabilidade de outra que também o prevê como delito59 Exemplo Se no caso concreto restar reconhecido que a conjunção carnal se enquadra na figura da violação sexual mediante fraude CP art 215 descabe atribuir ao agente o crime de estupro CP art 213 De outro campo notamse também autores que entendem configurada a alternatividade na hipótese em que o tipo penal contém em seu corpo vários fatos alternativamente como modalidades de uma mesma infração penal Assim praticados pelo mesmo sujeito um ou mais núcleos sucessivamente restará configurado crime único60 São os chamados tipos mistos alternativos de ação múltipla ou de conteúdo variado identificados assim quanto à conduta ex Lei 113432006 art 33 caput ao modo de execução ex CP art 121 2º inc IV ao resultado naturalístico ex CP art 129 2º inc III ao objeto material ex CP art 234 aos meios de execução ex CP art 121 2º inc III às circunstâncias de tempo ex CP art 123 às circunstâncias de lugar ex CP art 233 ou ainda perante outras situações apontadas pelo legislador O princípio da alternatividade não é aceito por relevante parcela da doutrina como útil para a solução do conflito aparente de leis penais61 Isto porque teria a sua função esvaziada pelo princípio da consunção Deveras a variante inicial denominada alternatividade imprópria a qual se verifica quando o legislador disciplina o mesmo fato mediante o emprego de duas ou mais leis penais deve ser rechaçada de plano Com efeito nada mais é do que hipótese de inadmissível equívoco legislativo solucionável pela abrogação tácita pois uma lei posterior estaria versando integralmente acerca de matéria tratada por lei anterior de igual natureza e hierarquia Por seu turno a outra variante conhecida como alternatividade própria existente entre dois ou mais tipos penais protetores de único bem jurídico contra diversas ofensas não tem espaço por questão de lógica é dizer a ausência de um dos requisitos basilares do instituto Inexiste propriamente conflito entre leis penais mas sim conflito interno na própria lei penal Ademais o critério da consunção resolve com vantagens os problemas acaso surgidos nos tipos mistos alternativos Vejase a hipótese em que o indivíduo exemplificativamente importa transporta guarda expõe à venda e finalmente vende a mesma droga Estará configurado um único crime tipificado pelo art 33 caput da Lei 113432006 não por aplicação do princípio da alternatividade mas da consunção 788 Contudo se o mesmo sujeito importa cocaína transporta ópio e vende heroína responderá por três crimes distintos em concurso material na forma prevista no art 69 do Código Penal somandose as penas Destarte entendemos ser a alternatividade a consunção que se instrumentaliza no interior de um mesmo tipo penal entre condutas integrantes de leis de conteúdo variado Em síntese nada mais é do que a consunção que resolve o conflito entre condutas previstas na mesma lei penal Por tal razão o princípio da alternatividade não é tolerado pela doutrina dominante como válido para solução do conflito aparente de leis penais Ausência de previsão legal O conflito aparente de leis penais não tem previsão legal O Código Penal não disciplinou expressamente o assunto Em que pesem alguns entendimentos em contrário nem mesmo o princípio da especialidade foi tratado pelo Código Penal De fato o art 12 cuida na verdade do princípio da convivência das esferas autônomas relacionase à solução do conflito entre as regras previstas na Parte Geral do Código Penal e a legislação penal extravagante o que não se confunde com o instituto em apreço Exemplificativamente o art 12 do Código Penal soluciona conflitos entre as regras inerentes à prescrição diferenciando a sua aplicação entre os crimes previstos no Código Penal e outros delitos consagrados pela legislação especial que possuam um sistema prescricional diferenciado Não se presta todavia para cuidar da especialidade entre crimes de homicídio e de infanticídio por exemplo ou entre outros delitos delineados pelo Código Penal Repitase o art 12 do Código Penal fala em regras gerais deste Código motivo pelo qual não é apto a tratar da especialidade entre os diversos crimes os quais se encontram tipificados na Parte Especial Seria oportuno contudo fosse o tema disciplinado expressamente pelo Código Penal com o propósito de apresentar regras sistemáticas e a b principalmente possibilitar segurança jurídica em um assunto tão tormentoso nos âmbitos doutrinário e jurisprudencial Mas infelizmente o legislador ainda não conferiu ao instituto a merecida atenção É necessária a identificação do momento em que se considera praticado o crime para que se opere a aplicação da lei penal ao seu responsável Três teorias buscam explicar o momento em que o crime é cometido Pela teoria da atividade considerase praticado o crime no momento da conduta ação ou omissão pouco importando o momento do resultado A teoria do resultado ou do evento reputa praticado o crime no momento em que ocorre a consumação É irrelevante a ocasião da conduta Por fim a teoria mista ou da ubiquidade busca conciliar as anteriores Para ela momento do crime tanto é o da conduta como também o do resultado O art 4º do Código Penal acolheu a teoria da atividade Considerase praticado o crime no momento da ação ou da omissão ainda que outro seja o momento do resultado62 Dessa forma a identificação do tempo do crime leva em conta a prática da conduta Exemplo A com a idade de 17 anos 11 meses e 20 dias efetua disparos de arma de fogo contra B nele provocando diversos ferimentos A vítima vem a ser socorrida e internada em hospital falecendo 15 dias depois Não se aplicará ao autor o Código Penal em face de sua inimputabilidade ao tempo do crime mas sim as disposições do Estatuto da Criança e do Adolescente Lei 80691990 A adoção da teoria da atividade apresenta relevantes consequências tais como aplicase a lei em vigor ao tempo da conduta exceto se a do tempo do resultado for mais benéfica a imputabilidade é apurada ao tempo da conduta c d e 7101 no crime permanente em que a conduta tenha se iniciado durante a vigência de uma lei e prossiga durante o império de outra aplicase a lei nova ainda que mais severa Fundamentase o raciocínio na reiteração de ofensa ao bem jurídico já que a conduta criminosa continua a ser praticada depois da entrada em vigor da lei nova mais gravosa63 no crime continuado em que os fatos anteriores eram punidos por uma lei operandose o aumento da pena por lei nova aplicase esta última a toda a unidade delitiva desde que sob a sua vigência continue a ser praticada O crime continuado em que pese ser constituído de vários delitos parcelares é considerado crime único para fins de aplicação da pena teoria da ficção jurídica No tocante a estes dois casos dispõe a Súmula 711 do Supremo Tribunal Federal A lei penal mais grave aplicase ao crime continuado ou ao crime permanente se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da permanência no crime habitual em que haja sucessão de leis deve ser aplicada a nova ainda que mais severa se o agente insistir em reiterar a conduta criminosa Cuidado Em matéria de prescrição o art 111 I do Código Penal preferiu a teoria do resultado uma vez que a causa extintiva da punibilidade tem por termo inicial a data da consumação da infração penal Introdução 7102 71021 O Código Penal brasileiro limita o campo de validade da lei penal com observância de dois vetores fundamentais a territorialidade art 5º e a extraterritorialidade art 7º Com base neles se estabelecem princípios que buscam solucionar os conflitos de leis penais no espaço A territorialidade é a regra64 Excepcionalmente admitemse outros princípios para o caso de extraterritorialidade que são os da personalidade do domicílio da defesa da justiça universal e da representação A matéria se relaciona ao Direito Penal Internacional ramo do Direito Internacional Público que estabelece as regras de determinação da lei penal aplicável na hipótese de a conduta criminosa violar o sistema jurídico de mais de um país Princípio da territorialidade Cuidase da principal forma de delimitação do espaço geopolítico de validade da lei penal nas relações entre Estados soberanos A soberania do Estado nota característica do princípio da igualdade soberana de todos os membros da comunidade internacional art 2º 1º da Carta da ONU fundamenta o exercício de todas as competências sobre crimes praticados em seu território Nesse sentido dispõe o art 5º do Código Penal Aplicase a lei brasileira sem prejuízo de convenções tratados e regras de direito internacional ao crime cometido no território nacional Essa é a regra geral Aplicase a lei brasileira aos crimes cometidos no território nacional Há exceções que ocorrem quando brasileiro pratica crime no exterior ou um estrangeiro comete delito no Brasil Falase assim que o Código Penal adotou o princípio da territorialidade temperada ou mitigada Conceito de território Em termos jurídicos território é o espaço em que o Estado exerce sua soberania política O território brasileiro compreende a b c d e f g o espaço territorial delimitado pelas fronteiras sem solução de continuidade inclusive rios lagos mares interiores e ilhas bem como o respectivo subsolo o mar territorial ou marginal que corre ao longo da costa como parte integrante do território brasileiro e que tem uma faixa de doze milhas marítimas de largura medidas a partir da baixamar do litoral continental e insular brasileiro na forma definida pela Lei 86171993 A soberania brasileira alcança também o leito e o subsolo do mar territorial O conceito de território não obsta contudo o direito de passagem inocente isto é a prerrogativa de navios mercantes ou militares de qualquer Estado de transitarem livremente pelo mar territorial embora sujeitos ao poder de polícia do Brasil65 a plataforma continental medindo 200 milhas marítimas a partir do litoral brasileiro ou 188 milhas deduzidas as 12 milhas do mar territorial como zona econômica exclusiva instituída pela Lei 86171993 que incorporou a Convenção da ONU de 1982 sobre o direito do mar o espaço aéreo compreendido como a dimensão estatal da altitude Em relação ao domínio aéreo adotouse a teoria da absoluta soberania do país subjacente pela qual o Brasil exerce completa e exclusiva soberania sobre o espaço aéreo acima de seu território e mar territorial art 11 da Lei 75651986 os navios e aeronaves de natureza particular em altomar ou no espaço aéreo correspondente ao altomar os navios e aeronaves de natureza pública onde quer que se encontrem os rios e lagos internacionais que são aqueles que atravessam mais de um Estado Se forem sucessivos ou seja passarem por dois ou mais países mas sem separálos considerase o trecho que atravessa o Brasil Caso sejam simultâneos ou fronteiriços isto é separarem os territórios de dois ou mais países a delimitação da 71022 7103 71031 parte pertencente ao Brasil é fixada por tratados ou convenções internacionais entre os Estados interessados Território brasileiro por extensão Na forma definida pelo art 5º 1º do CP consideramse como extensão do território nacional as embarcações e aeronaves brasileiras de natureza pública ou a serviço do governo brasileiro onde quer que se encontrem bem como as aeronaves e embarcações brasileiras mercantes ou de propriedade privada que se achem respectivamente no espaço aéreo correspondente ou em altomar Outros princípios Estudamos há pouco que o Código Penal adotou como regra geral o princípio da territorialidade Há entretanto exceções motivo pelo qual se fala em territorialidade temperada ou mitigada66 Vejamos quais são elas Princípio da personalidade ou da nacionalidade Esse princípio autoriza a submissão à lei brasileira dos crimes praticados no estrangeiro por autor brasileiro ativa ou contra vítima brasileira passiva De acordo com a personalidade ativa o agente é punido de acordo com a lei brasileira independentemente da nacionalidade do sujeito passivo e do bem jurídico ofendido É previsto no art 7º I alínea d quando o agente for brasileiro e também pelo inciso II alínea b do Código Penal Seu fundamento constitucional é a relativa proibição de extradição de brasileiros art 5º LI da Constituição Federal evitando a impunidade de nacionais que após praticarem crimes no exterior fogem para o Brasil A propósito confirase o seguinte julgado do Supremo Tribunal Federal envolvendo o assunto Se a extradição não puder ser concedida por inadmissível em face de a pessoa reclamada ostentar a condição de brasileira nata legitimarseá a possibilidade de o Estado brasileiro mediante aplicação extraterritorial de sua própria lei penal CP art 7º II b e respectivo 2º fazer 71032 71033 a b c 71034 instaurar perante órgão judiciário nacional competente CPP art 88 a concernente persecutio criminis em ordem a impedir por razões de caráter éticojurídico que práticas delituosas supostamente cometidas no exterior por brasileiros natos ou naturalizados fiquem impunes67 Por sua vez aplicase o princípio da personalidade passiva nos casos em que a vítima é brasileira O autor do delito que se encontrar em território brasileiro embora seja estrangeiro deverá ser julgado de acordo com a nossa lei penal É adotado pelo art 7º 3º do Código Penal Princípio do domicílio De acordo com esse princípio o autor do crime deve ser julgado em consonância com a lei do país em que for domiciliado pouco importando sua nacionalidade Previsto no art 7º I alínea d domiciliado no Brasil do Código Penal no tocante ao crime de genocídio no qual o agente não é brasileiro mas apenas domiciliado no Brasil Princípio da defesa real ou da proteção Permite submeter à lei penal brasileira os crimes praticados no estrangeiro que ofendam bens jurídicos pertencentes ao Brasil qualquer que seja a nacionalidade do agente e o local do delito Adotado pelo Código Penal em seu art 7º I alíneas a b e c compreendendo os crimes contra a vida ou a liberdade do Presidente da República o patrimônio ou a fé pública da União do Distrito Federal de Estado de Território de Município de empresa pública sociedade de economia mista autarquia ou fundação instituída pelo Poder Público e a administração pública por quem está a seu serviço Princípio da justiça universal Conhecido também como princípio da justiça cosmopolita da 71035 competência universal da jurisdição universal da jurisdição mundial da repressão mundial ou da universalidade do direito de punir é característico da cooperação penal internacional porque todos os Estados da comunidade internacional podem punir os autores de determinados crimes que se encontrem em seu território de acordo com as convenções ou tratados internacionais pouco importando a nacionalidade do agente o local do crime ou o bem jurídico atingido Fundamentase no dever de solidariedade na repressão de certos delitos cuja punição interessa a todos os povos Exemplos tráfico de drogas comércio de seres humanos genocídio etc É adotado no art 7º II a do Código Penal os crimes que por tratado ou convenção o Brasil se obrigou a reprimir Princípio da representação Também denominado princípio do pavilhão da bandeira subsidiário ou da substituição Segundo esse princípio deve ser aplicada a lei penal brasileira aos crimes cometidos em aeronaves ou embarcações brasileiras mercantes ou de propriedade privada quando estiverem em território estrangeiro e aí não sejam julgados É adotado pelo art 7º II c do Código Penal E se a aeronave ou embarcação brasileira for pública ou estiver a serviço do governo brasileiro Essa questão simples mas capciosa já foi formulada em diversos concursos federais Não incide no caso o princípio da representação mas sim o da territorialidade Lembrese aeronaves e embarcações brasileiras públicas ou a serviço do governo brasileiro constituem extensão do território nacional art 5º 1º do Código Penal A aplicação do princípio da territorialidade da lei penal no espaço depende da identificação do lugar do crime Nesse diapasão várias teorias buscam estabelecer o lugar do crime Destacamse três 1ª Teoria da atividade ou da ação Lugar do crime é aquele em que foi praticada a conduta ação ou omissão 2ª Teoria do resultado ou do evento Lugar do crime é aquele em que se produziu ou deveria produzirse o resultado pouco importando o local da prática da conduta e 3ª Teoria mista ou da ubiquidade Lugar do crime é tanto aquele em que foi praticada a conduta ação ou omissão quanto aquele em que se produziu ou deveria produzirse o resultado Foi adotada pelo Código Penal em seu art 6º Considerase praticado o crime no lugar em que ocorreu a ação ou omissão no todo ou em parte bem como onde se produziu ou deveria produzirse o resultado68 A discussão acerca do local do crime tem pertinência somente em relação aos crimes a distância também conhecidos como crimes de espaço máximo isto é aqueles em que a conduta é praticada em um país e o resultado vem a ser produzido em outro Não se trata assim de comarcas distintas Exigese a pluralidade de países69 Como exemplo imagine que o agente efetue disparos de arma de fogo contra a vítima em solo brasileiro com a intenção de matála mas esta consegue fugir e morre depois de atravessar a fronteira com o Paraguai A adoção da teoria da ubiquidade permite a conclusão de que o lugar do crime tanto pode ser o Brasil como o Paraguai Não poderia ser diferente em obediência às soberanias dos países envolvidos Para a incidência da lei brasileira é suficiente que um único ato executório atinja o território nacional ou então que o resultado ocorra no Brasil A teoria não se importa contudo com os atos preparatórios nem com os atos realizados pelo agente após a consumação Em relação à tentativa o lugar do crime abrange aquele em que se desenvolveram os atos executórios bem como aquele em que deveria 7111 a b produzirse o resultado No tocante ao coautor e ao partícipe operandose o concurso de pessoas no território brasileiro aplicase a lei penal nacional ainda que o crime tenha sido integralmente executado no exterior Não aplicação da teoria da ubiquidade em outras hipóteses A teoria da ubiquidade não se aplica nos seguintes casos Crimes conexos São aqueles que de algum modo estão relacionados entre si Não se aplica a teoria da ubiquidade eis que os diversos crimes não constituem unidade jurídica Deve cada um deles portanto ser processado e julgado no país em que foi cometido Crimes plurilocais São aqueles em que a conduta e o resultado ocorrem em comarcas diversas mas no mesmo país Exemplo A em determinada cidade e com a intenção de produzir lesões corporais de natureza grave efetua disparos de arma de fogo contra B o qual se encontra do lado oposto de uma ponte que faz a divisa com outra cidade Aplicase a regra delineada pelo art 70 caput do Código de Processo Penal ou seja a competência será determinada pelo lugar em que se consumar a infração ou no caso de tentativa pelo local em que for praticado o último ato de execução Na hipótese de crimes dolosos contra a vida aplicase a teoria da atividade segundo pacífica jurisprudência em razão da conveniência para a instrução criminal em juízo possibilitando a descoberta da verdade real De fato é mais fácil e seguro produzir provas no local em que o crime se realizou Além disso não é possível obrigar as testemunhas do fato a comparecerem ao plenário do Júri em outra comarca Se não bastasse um dos pilares que fundamenta o Tribunal do Júri é permitir a pacificação da sociedade perturbada pelo crime mediante o julgamento pelos seus membros Nesse sentido A competência para julgar 7121 7122 os crimes dolosos contra a vida e os que lhe são conexos é em princípio do Conselho de Sentença da comarca em que os fatos criminosos ocorreram salvo excepcional motivação70 c Infrações penais de menor potencial ofensivo O art 63 da Lei 90991995 adotou a teoria da atividade A competência do Juizado será determinada pelo lugar em que foi praticada a infração penal d Crimes falimentares Será competente o foro do local em que foi decretada a falência concedida a recuperação judicial ou homologado o plano de recuperação extrajudicial art 183 da Lei 111012005 e Atos infracionais Para os crimes ou contravenções penais praticados por crianças e adolescentes será competente a autoridade do lugar da ação ou da omissão Lei 80691990 ECA art 147 1º Introdução Extraterritorialidade é a aplicação da legislação penal brasileira aos crimes cometidos no exterior Justificase pelo fato de o Brasil ter adotado relativamente à lei penal no espaço o princípio da territorialidade temperada ou mitigada CP art 5º o que autoriza excepcionalmente a incidência da lei penal brasileira a crimes praticados fora do território nacional A extraterritorialidade pode ser incondicionada ou condicionada Não se admite a aplicação da lei penal brasileira às contravenções penais praticadas no estrangeiro de acordo com a regra estabelecida pelo art 2º do Decretolei 36881941 Lei das Contravenções Penais Extraterritorialidade incondicionada Não está sujeita a nenhuma condição A mera prática do crime em território estrangeiro autoriza a incidência da lei penal brasileira independentemente de qualquer outro requisito 71221 71222 As hipóteses de extraterritorialidade incondicionada encontram previsão no art 7º I do Código Penal e no tocante a esses crimes o agente é punido segundo a lei brasileira ainda que absolvido ou condenado no estrangeiro art 7º 1º A lei brasileira é extraterritorial em relação aos crimes Extraterritorialidade incondicionada e o art 8º do Código Penal Proibição do bis in idem Em face da detração penal determinada pelo art 8º do Código Penal no caso de extraterritorialidade incondicionada a pena cumprida no estrangeiro atenua a pena imposta no Brasil pelo mesmo crime quando diversas ou nela é computada quando idênticas Se o agente praticou um crime contra a vida do Presidente da República do Brasil em solo argentino e lá foi condenado à pena de dez anos de reclusão dos quais já cumpriu oito anos e posteriormente fugiu para o Brasil vindo aqui a ser condenado a doze anos de reclusão não precisará cumprir toda a pena imposta em nosso país Faltará o cumprimento de outros quatro anos em consonância com a regra prevista no art 8º do Código Penal Extraterritorialidade incondicionada e a Lei de Tortura Sem prejuízo dos casos previstos no Código Penal o art 2º da Lei 94551997 estatuiu mais uma situação de extraterritorialidade incondicionada nos seguintes termos O disposto nesta Lei aplicase ainda quando o crime não tenha sido cometido em território nacional sendo a vítima brasileira ou encontrandose o agente em local sob jurisdição brasileira 7123 Extraterritorialidade condicionada Relacionase aos crimes indicados pelo art 7º II e 3º do Código Penal A aplicação da lei penal brasileira aos crimes cometidos no exterior se sujeita às condições descritas pelo art 7º 2º alíneas a b c d e e e 3º do Código Penal Tratandose de extraterritorialidade condicionada a lei penal brasileira é subsidiária em relação aos crimes praticados fora do território nacional elencados pelo art 7º II e 3º do Código Penal No que diz respeito aos crimes previstos no art 7º II e 3º do Código Penal a aplicação da lei brasileira depende das seguintes condições cumulativas De outro lado no caso de crime cometido por estrangeiro contra brasileiro fora do Brasil exigemse outras duas condições além das anteriormente indicadas quais sejam a b 7131 7132 não ter sido pedida ou ter sido negada a extradição e ter havido requisição do Ministro da Justiça Introdução O princípio da territorialidade adotado pelo Brasil não é absoluto A territorialidade é temperada ou mitigada O art 5º caput do Código Penal é claro ao determinar que aplicase a lei brasileira sem prejuízo de convenções tratados e regras de direito internacional ao crime cometido no território nacional A parte final sem prejuízo de convenções tratados e regras de direito internacional autoriza a criação das imunidades diplomáticas e de chefes de governos estrangeiros Por sua vez as regras constitucionais instituem as imunidades parlamentares Imunidades diplomáticas e de chefes de governos estrangeiros O deferimento de tratamento especial a representantes diplomáticos e a chefes de governos estrangeiros no tocante a atos ilícitos por eles praticados é medida aceita desde longa data pelo direito internacional em respeito ao Estado representado e também pela necessidade de garantir meios suficientes para o perfeito desempenho de seus misteres por tais pessoas As imunidades se fundam no princípio da reciprocidade ou seja o Brasil concede imunidade aos agentes dos países que também conferem iguais privilégios aos nossos representantes Não há violação ao princípio da isonomia eis que a imunidade não é pessoal mas funcional Levase em conta a relevância da função pública exercida pelo representante estrangeiro teoria do interesse da função A Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas incorporada ao direito pátrio pelo Decreto 564351965 assegura ao diplomata imunidade de jurisdição penal sujeitandoo à jurisdição do Estado que representa71 Abrange toda e qualquer espécie de delito A imunidade de jurisdição em sentido amplo subdividese em imunidade de jurisdição cognitiva isto é imunidade ao processo de conhecimento e imunidade à jurisdição executiva referente ao cumprimento da pena72 A garantia se estende aos agentes diplomáticos e funcionários das organizações internacionais quando em serviço incluindo seus familiares A essas pessoas é assegurada inviolabilidade pessoal já que não podem ser presas nem submetidas a qualquer procedimento sem autorização de seu país Por óbvio aos chefes de governos estrangeiros e aos ministros das Relações Exteriores asseguramse idênticas imunidades concedidas aos agentes diplomáticos A imunidade é irrenunciável por parte do seu destinatário Nada impede por outro lado a renúncia por meio do Estado acreditante com fundamento no art 32 da Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas 1961 e art 45 da Convenção de Viena sobre Relações Consulares 196373 Nesse contexto já decidiu o Supremo Tribunal Federal de acordo com a Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas do qual o Brasil é signatário os agentes diplomáticos estrangeiros estão imunes à jurisdição penal do Estado perante o qual estão acreditados Assim o chefe da missão diplomática e os membros do pessoal diplomático gozam nos termos dos arts 29 a 42 da Convenção de Viena de 1961 dos direitos da inviolabilidade pessoal e de sua residência da totalidade das imunidades de jurisdição penal etc Tais privilégios e imunidades podem ser renunciados pelo Estado acreditante a quem tais direitos pertencem mediante declarações especiais e em cada caso particular ajuizado perante autoridades judiciais do Estado acreditado ie o Brasil74 As imunidades não se aplicam aos empregados particulares dos diplomatas ainda que oriundos do Estado representado 7133 71331 71332 Os cônsules por seu turno são funcionários públicos de carreira ou honorários e indicados para a realização de determinadas funções em outros países com imunidades e privilégios inferiores aos dos diplomatas A imunidade penal é limitada aos atos de ofício podendo ser processados e condenados por outros crimes75 De acordo com a Convenção de Viena as sedes diplomáticas não admitem busca e apreensão requisição embargo ou qualquer tipo de medida de execução de natureza penal Malgrado opiniões em contrário cada vez em maior declínio podese afirmar que as sedes das embaixadas não são extensões de territórios estrangeiros no Brasil De fato localizamse em território nacional e se alguém que não goza da imunidade praticar algum crime em seu âmbito inevitavelmente será processado nos termos da legislação penal brasileira Imunidades parlamentares Alocação Essa disciplina encontra seu nascedouro na Constituição Federal razão pela qual seu estudo é aprofundado nas obras de Direito Constitucional Contudo sua sistemática produz inúmeros reflexos na aplicação da lei penal justificando a cobrança frequente do tema em concursos públicos nas provas de Direito Penal motivo que nos autoriza a abordálo no presente trabalho Introdução O Poder Legislativo constituído no âmbito da União pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal tem suas funções típicas tratadas nos arts 44 e seguintes da Constituição Federal consistindo precipuamente na atividade legislativa e na função fiscalizadora do Poder Executivo No exercício desses misteres os representantes do povo e dos Estados necessitam de uma série de regras específicas que estabeleçam os seus direitos deveres e notadamente prerrogativas Consagrouse denominar de estatuto dos congressistas o conjunto de 71333 a b 71334 normas constitucionais que estatui o regime jurídico dos membros do Congresso Nacional prevendo suas prerrogativas e direitos seus deveres e incompatibilidades76 Entre as prerrogativas previstas na Constituição de 1988 estão a inviolabilidade e a imunidade de natureza penal e também o privilégio de foro e a isenção do serviço militar previstas nas constituições anteriores bem como a limitação ao dever de testemunhar todas de caráter processual Abordaremos somente as imunidades parlamentares por produzirem relevantes consequências na aplicação da lei penal Conceito e finalidade As imunidades parlamentares são prerrogativas ou garantias inerentes ao exercício do mandato parlamentar preservandose a instituição de ingerências externas A Constituição Federal prevê duas espécies de imunidades imunidade absoluta material real substantiva ou inviolabilidade art 53 caput e imunidade processual formal adjetiva ou imunidade propriamente dita art 53 1º a 5º A imunidade formal por sua vez pode referirse à prisão do parlamentar ou ao ajuizamento da ação penal Imunidade material ou inviolabilidade De acordo com o art 53 caput da Constituição Federal com a redação determinada pela Emenda Constitucional 352001 os Deputados e Senadores são invioláveis civil e penalmente por quaisquer de suas opiniões palavras e votos A imunidade material protege o parlamentar em suas opiniões palavras e votos desde que relacionadas às suas funções não abrangendo manifestações desarrazoadas e desprovidas de conexão com os seus deveres constitucionais77 Funciona portanto como um complemento constitucional à liberdade de expressão reservada a todas as pessoas Não se faz necessário contudo que o parlamentar se manifeste no recinto do Congresso Nacional para a incidência da inviolabilidade Nesse sentido já decidiu o Supremo Tribunal Federal A imunidade parlamentar é uma proteção adicional ao direito fundamental de todas as pessoas à liberdade de expressão previsto no art 5º IV e IX da Constituição Assim mesmo quando desbordem e se enquadrem em tipos penais as palavras dos congressistas desde que guardem alguma pertinência com suas funções parlamentares estarão cobertas pela imunidade material do art 53 caput da Constituição Art 53 Os Deputados e Senadores são invioláveis civil e penalmente por quaisquer de suas opiniões palavras e votos Com base nessa orientação a Primeira Turma em julgamento conjunto e por maioria rejeitou a queixacrime oferecida em face de senador a quem fora imputado a prática dos delitos de calúnia injúria e difamação Na espécie parlamentar teria postado na rede social Facebook que ex Presidente da República teria cometido crimes e ainda teria impetrado habeas corpus preventivo relativo a atos de corrupção ocorrido no âmbito da Petrobrás De início a Turma assentou o caráter reprovável e lamentável com o qual as críticas à suposta conduta de um exPresidente da República teriam sido feitas Na sequência ressaltou que a imunidade material conferida aos parlamentares não seria uma prerrogativa absoluta Restringirseia a opiniões e palavras externadas dentro ou fora do recinto do Congresso Nacional mas no exercício do mandato ou em razão dele Prevaleceria portanto a compreensão de que a imunidade parlamentar não se estenderia para opiniões ou palavras que pudessem malferir a honra de alguém quando essa manifestação estivesse dissociada do exercício do mandato Para o Colegiado a Constituição teria garantido uma tolerância com o uso que normalmente fosse considerado abusivo do direito de expressar livremente suas opiniões quando proveniente de parlamentar no exercício de seus respectivos mandatos Essa condescendência se justificaria para assegurar um bem maior a própria democracia Entre um parlamentar acuado pelo eventual receio de um processo criminal e um parlamentar livre para 713341 expor as suspeitas que pairassem sobre outros homens públicos mesmo que de forma que pudesse ser considerada abusiva e portanto criminosa o caminho trilhado pela Constituição seria o de conferir liberdade ao congressista Assim a regra da imunidade deveria prevalecer nas situações limítrofes em que não fosse delineada a conexão entre a atividade parlamentar e as ofensas irrogadas a pretexto de exercêla mas que igualmente não se pudesse de plano dizer que exorbitassem do exercício do mandato78 O Supremo Tribunal Federal reforçando esse entendimento assim se pronunciou no polêmico caso em que um Deputado Federal afirmou que sua colega de parlamento não merecia ser estuprada A Turma assinalou que a garantia constitucional da imunidade material protege o parlamentar qualquer que seja o âmbito espacial em que exerça a liberdade de opinião sempre que suas manifestações guardem conexão com o desempenho da função legislativa ou tenham sido proferidas em razão dela Para que as afirmações feitas pelo parlamentar possam ser relacionadas ao exercício do mandato devem revelar teor minimamente político referido a fatos que estejam sob debate público sob investigação em CPI ou em órgãos de persecução penal ou ainda sobre qualquer tema que seja de interesse de setores da sociedade do eleitorado de organizações ou quaisquer grupos representados no parlamento ou com pretensão à representação democrática Consequentemente não há como relacionar ao desempenho da função legislativa ou de atos praticados em razão do exercício de mandato parlamentar as palavras e opiniões meramente pessoais sem relação com o debate democrático de fatos ou ideias e portanto sem vínculo com o exercício das funções cometidas a um parlamentar Na hipótese tratase de declarações que não guardam relação com o exercício do mandato79 Natureza jurídica da imunidade material Há grande controvérsia doutrinária e jurisprudencial acerca da natureza jurídica da inviolabilidade Destacamse os seguintes entendimentos a b c d e f 71335 713351 causa de atipicidade Celso Ribeiro Bastos80 causa excludente de crime Nélson Hungria José Afonso da Silva81 e Pontes de Miranda causa que se opõe à formação do crime Basileu Garcia causa pessoal e funcional de isenção de pena Aníbal Bruno causa de irresponsabilidade Heleno Cláudio Fragoso e causa de incapacidade penal por razões políticas José Frederico Marques O Supremo Tribunal Federal tem considerado a manifestação parlamentar nas hipóteses abrangidas pela inviolabilidade como fato atípico As declarações proferidas pelo querelado na qualidade de Presidente da Comissão de Direitos Humanos do Senado Federal alusivas a denúncias de tortura sob investigação do Ministério Público são palavras absolutamente ligadas ao exercício do mandato donde estarem cobertas pela imunidade parlamentar material Não é cabível indagar sobre nenhuma qualificação penal do fato objetivo se ele está compreendido na área da inviolabilidade parlamentar Inq 2282DF rel Min Sepúlveda Pertence j 30062006 Informativo 43382 Qualquer que seja o posicionamento adotado a inviolabilidade acarretará sempre a irresponsabilidade do agente por suas opiniões palavras e votos se presentes os demais elementos do instituto Imunidade formal A imunidade formal processual adjetiva ou imunidade propriamente dita envolve a disciplina da prisão e do processo contra Deputados Federais e Senadores e tem previsão no art 53 1º a 5º da Constituição Federal O instituto foi bastante alterado com o advento da Emenda Constitucional 352001 que buscou evitar o desvirtuamento da prerrogativa tal qual estabelecida pela sua redação originária Imunidade formal para a prisão Dispõe o art 53 2º da Constituição Federal com a redação dada pela Emenda Constitucional 352001 Desde a expedição do diploma os membros do Congresso Nacional não poderão ser presos salvo em flagrante de crime inafiançável Nesse caso os autos serão remetidos dentro de vinte e quatro horas à Casa respectiva para que pelo voto da maioria de seus membros resolva sobre a prisão Assim extraise a regra geral de que os parlamentares não poderão ser presos A regra abrange tanto a prisão provisória de cunho penal em qualquer de suas modalidades e também a prisão civil uma vez que o texto constitucional não faz qualquer distinção Essa imunidade foi denominada de relativa incoercibilidade pessoal dos congressistas freedom from arrest pelo Supremo Tribunal Federal Inquérito 510DF j 01022001 Tribunal Pleno e evidentemente não engloba a prisão definitiva ou seja decorrente de decisão judicial condenatória com trânsito em julgado Em princípio a única exceção admitida pela Constituição Federal é a hipótese de prisão em flagrante pela prática de crime inafiançável Mas a Corte Suprema no famoso caso Delcídio do Amaral decretou a prisão preventiva de Senador da República no exercício do mandato Vale a pena acompanhar um trecho do julgado a decisão ora referendada teria como um de seus principais fundamentos a garantia da instrução criminal das investigações aliado à higidez de eventuais ações penais vindouras tendo em vista a concreta ocorrência e a possibilidade de interferência no depoimento de testemunhas e na produção de provas circunstâncias que autorizariam a decretação da custódia cautelar nos termos da jurisprudência da Corte Assim a necessidade de resguardar a ordem pública seja pelos constantes atos praticados pelo grupo cooptação de colaborador tentativa de obtenção de decisões judiciais favoráveis obtenção de documentos judiciais sigilosos pela fundada suspeita de reiteração delitiva pela atualidade dos delitos reuniões ocorridas no corrente mês ou ainda pela gravidade em concreto dos crimes que atentariam diretamente contra os poderes constitucionalmente estabelecidos da República não haveria outra medida cautelar suficiente para inibir a continuidade das práticas criminosas que não a prisão preventiva83 Na hipótese de prisão em flagrante de Deputado Federal ou Senador por crime inafiançável os autos deverão ser remetidos à Casa Parlamentar respectiva no prazo de vinte e quatro horas para que pelo voto da maioria absoluta de seus membros resolva sobre a prisão CF art 53 2º A votação será aberta Nos casos em que for verificada a impossibilidade de apreciação da custódia cautelar pela Casa respectiva a prisão será mantida independentemente desta manifestação Vejase a seguinte situação de excepcional gravidade já apreciada pelo Supremo Tribunal Federal Os elementos contidos nos autos impõem interpretação que considere mais que a regra proibitiva da prisão de parlamentar isoladamente como previsto no art 53 2º da Constituição da República Há de se buscar interpretação que conduza à aplicação efetiva e eficaz do sistema constitucional como um todo A norma constitucional que cuida da imunidade parlamentar e da proibição de prisão do membro de órgão legislativo não pode ser tomada em sua literalidade menos ainda como regra isolada do sistema constitucional Os princípios determinam a interpretação e aplicação corretas da norma sempre se considerando os fins a que ela se destina A Assembleia Legislativa do Estado de Rondônia composta de vinte e quatro deputados dos quais vinte e três estão indiciados em diversos inquéritos afirma situação excepcional e por isso não se há de aplicar a regra constitucional do art 53 2º da Constituição da República de forma isolada e insujeita aos princípios fundamentais do sistema jurídico vigente84 Apesar de a decisão referirse à esfera estadual o entendimento é válido para os deputados federais e senadores uma vez que a imunidade em ambos os casos possui idêntica disciplina Por outro lado José Afonso da Silva afirma que convém ponderar sobre a questão da afiançabilidade do crime diante do disposto no art 5º LXVI da Constituição Federal pois se o crime for daqueles que admitem liberdade 713352 provisória o tratamento a ser dado ao congressista teria de ser idêntico aos dos crimes afiançáveis ou seja vedada a prisão85 A imunidade persiste desde a diplomação até o encerramento definitivo do mandato independentemente do motivo incluindo a não reeleição Imunidade formal para o processo A disciplina da imunidade formal para o processo foi substancialmente alterada pela Emenda Constitucional 352001 que retirou a necessidade de prévia licença da Casa para a instauração da ação penal contra o parlamentar De acordo com a nova regra prevista no art 53 3º do Código Político Recebida a denúncia contra o Senador ou Deputado por crime ocorrido após a diplomação o Supremo Tribunal Federal dará ciência à Casa respectiva que por iniciativa de partido político nela representado e pelo voto da maioria de seus membros poderá até a decisão final sustar o andamento da ação Destarte uma vez oferecida a denúncia contra o parlamentar por crime ocorrido após a diplomação o Ministro do Supremo Tribunal Federal poderá recebêla independentemente de prévia licença Nesse caso o Tribunal dará ciência à Casa respectiva que por iniciativa de partido político nela representado e pelo voto da maioria absoluta de seus membros poderá até a decisão final sustar o andamento da ação penal O pedido de sustação será apreciado pela Casa respectiva no prazo improrrogável de 45 dias do seu recebimento pela Mesa diretora e a sustação do processo suspende a prescrição enquanto durar o mandato CF art 53 3º a 5º O pedido de sustação poderá ser feito contudo até a decisão final da ação penal movida contra o parlamentar86 E atenção pela nova regra não haverá necessidade de o Supremo Tribunal Federal dar ciência à respectiva Casa em caso de ação penal por crime praticado antes da diplomação87 Nessas hipóteses não é possível pelo mesmo motivo a suspensão da ação penal por iniciativa do partido político Nos crimes praticados após a diplomação se houver sustação da ação penal e o crime tiver sido praticado em concurso com agente não 71336 71337 congressista o processo deve ser desmembrado em razão do regime de prescrição diferenciado que só alcança o parlamentar88 Pessoas abrangidas pela imunidade As imunidades acima abordadas abrangem os Deputados Federais e Senadores Não são extensíveis aos suplentes embora a Constituição de 1934 tenha incluído o primeiro suplente na garantia89 De acordo com o art 27 1º da Constituição Federal aos deputados estaduais serão aplicadas as mesmas regras sobre sistema eleitoral inviolabilidade imunidades remuneração perda de mandato licença impedimentos e incorporação às forças armadas aplicáveis aos deputados federais e senadores Ademais é assegurada a imunidade material dos deputados estaduais que são invioláveis civil e penalmente por quaisquer de suas opiniões palavras e votos No tocante ao Poder Legislativo Municipal dispõe o art 29 VIII da Constituição Federal que os municípios serão regidos por lei orgânica que deverá obedecer entre outras regras a da inviolabilidade dos vereadores por suas opiniões palavras e votos no exercício do mandato e na circunscrição do Município Destarte a Constituição Federal não consagra a imunidade formal ou processual para vereadores ou de foro por prerrogativa de função não podendo a legislação local prever tais garantias90 Suspensão e renúncia da imunidade Os parlamentares afastados para o exercício de cargo de Ministro da República Secretário de Estado ou de Município não mantêm as imunidades Como esclarece Michel Temer citado por Luiz Alberto David Araújo e Vidal Serrano Nunes Júnior Temse discutido se continua inviolável o parlamentar que se licencia para exercer cargo executivo Secretário de Estado Ministro de Estado Se continua ou não exercendo mandato O Supremo Tribunal Federal 71338 decidiu que o licenciado não está no exercício do mandato e por isso dispensase a licença aqui referida Parecenos que o art 56 da CF responde a essa indagação ao prescrever que não perderá o mandato o deputado ou senador investido na função de Ministro de Estado Governador do Distrito Federal Governador de Território Secretário de Estado etc Não perderá o mandato Significa quando cessarem suas funções executivas o parlamentar que não perdeu o mandato pode voltar a exercêlo O que demonstra que quando afastado não se encontra no exercício do mandato Harmonizase com a prescrição da impossibilidade de exercício simultâneo em poderes diversos91 De outro lado por ser inerente ao cargo parlamentar e não ao congressista propriamente não é possível a renúncia a tais prerrogativas92 Imunidades e estado de sítio As imunidades de Deputados e Senadores subsistirão durante o estado de sítio somente podendo ser suspensas pelo voto de dois terços dos membros da Casa respectiva nos casos de atos praticados fora do recinto do Congresso Nacional que sejam incompatíveis com a execução da medida CF art 53 8º Vale dizer se os atos forem praticados no recinto do Congresso Nacional a imunidade é absoluta não comportando a suspensão pela Casa respectiva É uma garantia importante porque se harmoniza com o disposto no art 139 parágrafo único da Lei Suprema e porque afasta qualquer pretensão de aplicar a parlamentares as restrições previstas nos incisos desse artigo93 Quadro geral das imunidades 7141 7142 Introdução Os arts 9º 10 e 11 do Código Penal apresentam as disposições finais do Título I do Código Penal relativas à eficácia da sentença estrangeira à contagem do prazo de natureza penal às frações não computáveis da pena e à aplicação da legislação penal especial Eficácia da sentença estrangeira A sentença judicial emanada de Poder Constituído do Estado é ato representativo de sua soberania Para uma real valoração da sua autoridade contudo deve ser executada E essa execução deveria ser feita sempre no país em que foi proferida Todavia para enfrentar com maior eficiência no âmbito de seus limites a prática de infrações penais o Estado se vale excepcionalmente de atos de soberania de outras nações aos quais atribui efeitos certos e determinados Para atingir essa finalidade homologa a sentença penal estrangeira mediante o procedimento constitucionalmente previsto a fim de constituíla em título executivo com validade em território nacional94 Na tradição brasileira sempre se entendeu que a homologação da sentença estrangeira dependia de prova do trânsito em julgado95 Atualmente entretanto o art 963 inc III do Código de Processo Civil reclama somente a eficácia da sentença no país em que foi proferida não exigindo seu trânsito em julgado96 Nos termos do art 9º do Código Penal Art 9º A sentença estrangeira quando a aplicação da lei brasileira produz na espécie as mesmas consequências pode ser homologada no Brasil para I obrigar o condenado à reparação do dano a restituições e a outros efeitos civis II sujeitálo a medida de segurança Parágrafo único A homologação depende a para os efeitos previstos no inciso I de pedido da parte interessada b para os outros efeitos da existência de tratado de extradição com o país de cuja autoridade judiciária emanou a sentença ou na falta de tratado de requisição do Ministro da Justiça Vejase que a análise conjunta desse dispositivo com o art 63 do Código Penal revela que não há necessidade de homologação da sentença estrangeira condenatória para caracterização da reincidência no Brasil Basta sua existência 7143 A teor do art 105 I alínea i da Constituição Federal compete ao Superior Tribunal de Justiça a homologação de sentenças estrangeiras e a concessão de exequatur às cartas rogatórias Convém ainda apontar que a sentença estrangeira homologada pelo Superior Tribunal de Justiça constituise em título executivo judicial na forma definida pelo art 515 VIII do Código de Processo Civil Contagem de prazo Dispõe o art 10 do Código Penal O dia do começo incluise no cômputo do prazo Contamse os dias os meses e os anos pelo calendário comum O dispositivo legal apresenta duas partes 1ª parte O dia do começo incluise no cômputo do prazo Prazo é o intervalo de tempo dentro do qual se estabelece a prática de determinado ato Deve ser calculado entre dois termos o inicial a quo e o final ad quem No Direito Penal incluise no cômputo do prazo o dia do começo Assim o dia em que tiver início a prática de determinado ato deve ser descontado do período total Exemplo Um sujeito reincidente é condenado à pena de um mês de reclusão em regime fechado O mandado de prisão é cumprido no dia 10 de outubro às 23 horas Sua pena estará extinta no dia 9 de novembro Qualquer que seja a fração do dia do começo deve ser computada integralmente como um dia inteiro Isso porque como diz o Código Penal o dia do começo incluise no cômputo do prazo Para facilitar os cálculos em provas é importante observar a seguinte regra deve ser considerada na operação sempre a diminuição de um dia em razão de ser computado o dia do começo Dessa forma se a pena é de um ano e teve início em 10 de outubro de determinado ano estará integralmente cumprida no dia 9 de outubro do ano seguinte Os prazos de natureza penal são improrrogáveis mesmo que terminem em sábados domingos ou feriados Assim se o prazo decadencial para o oferecimento de queixacrime encerrar em um domingo o titular do direito de queixa ou de representação deverá exercêlo até a sextafeira anterior O fato de serem improrrogáveis não impede contudo a suspensão ou a interrupção dos prazos penais Exemplos marcantes são as causas suspensivas e interruptivas da prescrição No Direito Processual Penal por outro lado a contagem dos prazos obedece fórmula diversa Estabelece o art 798 1º do Código de Processo Penal que não se computará no prazo o dia do começo incluindose porém o do vencimento Percebese assim ser o prazo processual penal mais amplo do que o penal Exemplo o prazo para interposição de apelação no processo penal comum é de cinco dias Se o condenado for intimado na sextafeira de carnaval o prazo terá início somente na quartafeira de cinzas uma vez que não se inclui o dia do começo fluindo a partir do primeiro dia útil posterior à intimação para o exercício do ato processual Incide a Súmula 310 do Supremo Tribunal Federal Quando a intimação tiver lugar na sextafeira ou a publicação com efeito de intimação for feita nesse dia o prazo judicial terá início na segundafeira imediata salvo se não houver expediente caso em que começará no primeiro dia útil que se seguir O fundamento da distinção é manifesto beneficiar o réu e possibilitar a ele o efetivo exercício da ampla defesa No Direito Processual Penal o prazo favorecerá o réu quando maior for a sua duração ou tiver mais retardado o seu início Ao contrário no Direito Penal o prazo se relaciona diretamente com o poder punitivo do Estado razão pela qual quanto mais curto mais favorável será ao réu Vale lembrar que o prazo sempre terá natureza penal quando guardar pertinência com o ius puniendi ainda que esteja previsto no Código de Processo Penal Portanto embora tenha a norma caráter híbrido ou misto prevalecerá a sua face penal É o caso da decadência prevista no art 38 do Código de Processo Penal Como a sua ocorrência importa na extinção da punibilidade retirando do Estado o direito de punir obedece às regras do Código Penal 7144 2ª parte Contamse os dias os meses e os anos pelo calendário comum Calendário comum também denominado gregoriano é aquele em que se entende por dia o hiato temporal entre a meianoite e a meianoite Os meses são calculados em consonância com o número correspondente a cada um deles e não como o período de 30 dias Exemplo Se o réu foi condenado à pena de um mês com início no dia 10 de fevereiro o seu cumprimento integral ocorrerá no dia 9 de março seguinte Pouco importa o número de dias do mês de fevereiro Tenha o mês 28 29 30 ou 31 dias será sempre considerado como um mês O mês é calculado até a véspera do mesmo dia do mês subsequente encerrando o prazo às 24 horas Por seu turno o ano é contado até o mesmo mês do ano seguinte terminando o prazo às 24 horas da véspera do dia idêntico ao do início Na prática o critério acolhido pelo Código Penal provoca injustiças tratando diversamente pessoas que se encontram em igual situação jurídica Exemplo A e B são condenados a um mês de reclusão A é capturado no dia 10 de dezembro e sua pena se encerra em 9 de janeiro B foge sendo capturado somente em 20 de fevereiro do ano seguinte Sua pena estará cumprida em 19 de março É evidente que nessa situação B teve privada sua liberdade por período inferior ao de A O inconveniente contudo é preferível à confusão e até mesmo à impossibilidade física que a adoção de um critério diverso provocaria Basta imaginar uma pena de 30 anos de reclusão na qual precisasse ser contado cada dia isoladamente levando em consideração as peculiaridades de todos os meses e anos Frações não computáveis da pena 7145 Preceitua o art 11 do Código Penal Desprezamse nas penas privativas de liberdade e nas restritivas de direitos as frações de dia e na pena de multa as frações de cruzeiro Para fins didáticos o dispositivo deve ser analisado em partes distintas pois contém duas regras 1ª Desprezamse nas penas privativas de liberdade e nas restritivas de direitos as frações de dia Frações de dia são as horas as quais devem ser descontadas da pena final Exemplo Pena de 10 dias 13 13 dias As horas restantes são desprezadas A expressão e nas restritivas de direitos é desnecessária Com efeito as penas restritivas de direitos possuem a nota da substitutividade isto é primeiro o juiz fixa a privativa de liberdade e depois se presentes os requisitos legais procede à substituição pela restritiva de direitos Destarte as frações de dia são desprezadas no momento de aplicação da pena privativa de liberdade 2ª Desprezamse na pena de multa as frações de cruzeiro A palavra cruzeiro deve ser atualmente substituída por real e sua fração é composta pelos centavos os quais são desprezados na liquidação da sanção patrimonial Exemplo Não há pena de multa com o valor de R 9056 noventa reais e cinquenta e seis centavos mas sim de R 9000 noventa reais E como anota Damásio E de Jesus Na fixação da pena pecuniária deve ser desprezada a fração do diamulta Assim uma pena de dez diasmulta acrescida de um terço perfaz treze diasmulta e não 1333 diasmulta97 Legislação especial É a redação do art 12 do Código Penal As regras gerais deste Código aplicamse aos fatos incriminados por lei especial se esta não dispuser de modo diverso Regras gerais são as normas não incriminadoras previstas no Código Penal Estão previstas na Parte Geral mas também há hipóteses que se encontram na Parte Especial É o caso do conceito de funcionário público art 327 Acolheuse o princípio da convivência das esferas autônomas segundo o qual as regras gerais do Código Penal convivem em sintonia com as previstas na legislação especial Todavia caso a lei especial contenha algum preceito geral também disciplinado pelo Código Penal prevalece a orientação da legislação especial em face do seu específico campo de atuação Exemplo A Lei 96051998 não prevê regras especiais para a prescrição no tocante aos crimes ambientais nela previstos Aplicamse consequentemente as disposições do Código Penal Por outro lado o Código Penal Militar tem regras especiais para a prescrição nos crimes que tipifica É aplicado e não incide o Código Penal 1 2 3 4 5 6 7 8 9 Utilizase a expressão lei penal em preto para se referir à lei penal completa ou seja aquela que não depende de nenhum tipo de complementação RHC 21624 rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 07022008 MAXIMILIANO Carlos Hermenêutica e aplicação do direito 19 ed Rio de Janeiro Forense 2004 p 7 LARENZ Karl Metodologia da ciência do direito 3 ed Lisboa Fundação Calouste Gulbenkian 1997 p 445 Art 927 Os juízes e os tribunais observarão I as decisões do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade II os enunciados de súmula vinculante III os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos IV os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional V a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados RHC 852173SP rel Min Eros Grau 1ª Turma j 02082005 Paga e promessa de recompensa caracterizam a cupidez O crime que tem essa motivação é chamado de mercenário ou por mandato remunerado Inq 1145PB rel Min Maurício Corrêa Tribunal Pleno j 19122006 É também o entendimento do Superior Tribunal de Justiça Não cabe ao Julgador aplicar uma norma por assemelhação em substituição a outra validamente existente simplesmente por entender que o legislador deveria ter regulado a situação de forma diversa da que adotou não se pode por analogia criar sanção que o sistema legal não haja determinado sob pena de violação do princípio da reserva legal REsp 956876RS rel Min Napoleão Nunes Maia Filho 5ª Turma j 23082007 Em igual sentido REsp 1244377PR rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 03042014 e REsp 1201880RS rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 07052013 Na verdade a abolitio criminis funciona como causa de exclusão da tipicidade pois o crime deixa de existir O legislador contudo preferiu alocála entre as causas extintivas da punibilidade 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 HC 101035RJ rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 26102010 noticiado no Informativo 606 HC 213305DF rel Min Marilza Maynard Desembargadora Convocada do TJSE 6ª Turma j 24042014 noticiado no Informativo 543 STF HC 120077RS rel Min Rosa Weber 1ª Turma j 13052014 TAIPA DE CARVALHO Américo A Sucessão de leis penais 3 ed Coimbra Coimbra Editora 2008 p 246 STJ AgRg no REsp 199687MS rel Min Jorge Mussi 5ª Turma j 04022014 Transitada em julgado a sentença condenatória compete ao Juízo das execuções a aplicação de lei mais benigna Na seara da lei penal no tempo retroatividade e ultratividade são espécies do gênero extratividade consistente em sua aptidão de mesmo depois de revogada ser aplicável aos fatos praticados quando estava em vigor ultratividade ou então de voltar no tempo para alcançar fatos cometidos antes da sua entrada em vigor retroatividade HUNGRIA Nélson Comentários ao Código Penal Rio de Janeiro Forense 1949 v 1 p 110 MARQUES José Frederico Tratado de direito penal Campinas Bookseller 1997 v 2 p 256257 Compartilham desse entendimento entre outros Basileu Garcia E Magalhães Noronha e Damásio E de Jesus HC 68416DF rel Min Paulo Brossard 2ª Turma j 08091992 E também HC 86459RJ rel Min Joaquim Barbosa 2ª Turma j 05122006 HC 95435RS rel orig Min Ellen Gracie rel p o acórdão Min Cezar Peluso 2ª Turma j 21102008 noticiado no Informativo 525 Na mesma direção HC 101511MG rel Min Eros Grau 2ª Turma j 09022010 noticiado no Informativo 574 TAIPA DE CARVALHO Américo A Sucessão de leis penais 3 ed Coimbra Coimbra Editora 2008 p 248 RE 600817MS rel Min Ricardo Lewandowski Plenário j 07112013 noticiado no Informativo 727 Em igual sentido HC 104193RS rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 09082011 noticiado no Informativo 635 e HC 97221SP rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 19102010 23 24 25 26 27 28 29 30 31 noticiado no Informativo 605 É também o entendimento de MIRABETE Julio Fabbrini Manual de direito penal Parte geral 24 ed São Paulo Atlas 2007 v 1 p 50 STF RE 418876MT rel Min Sepúlveda Pertence 1ª Turma j 30032004 Lei excepcional ou temporária não tem retroatividade Tem ultratividade em face da regra do art 3º do Código Penal STF RE 768494GO rel Min Luiz Fux Plenário j 19092013 O texto do art 3º do Código Penal de 1940 anteriormente à Reforma da Parte Geral pela Lei 72091984 era idêntico ao atual A lei excepcional ou temporária embora decorrido o período de sua duração ou cessadas as circunstâncias que a determinaram aplicase ao fato praticado durante sua vigência E como a Exposição de Motivos funciona como interpretação doutrinária do Código Penal os fundamentos então indicados permanecem válidos e adequados para a compreensão do assunto HC 731686SP rel Min Moreira Alves 1ª Turma j 21111995 É também a orientação do STJ RHC 16172SP rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 23082005 e REsp 474989RS rel Min Gilson Dipp 5ª Turma j 10062003 STEVENSON Oscar Concurso aparente de normas penais Estudos de direito e processo penal em homenagem a Nélson Hungria Rio de Janeiro Forense 1962 p 28 Salientese que o conflito aparente de normas ocorre quando há a incidência de mais de uma norma repressiva numa única conduta delituosa sendo que tais normas possuem entre si relação de hierarquia ou dependência de forma que somente uma é aplicável STJ REsp 1639723PR rel Min Nefi Cordeiro 6ª Turma j 07022017 noticiado no Informativo 597 É o caso de CARNELUTTI Francesco Leciones de derecho penal El delito Buenos Aires 1952 p 241 e de STRATENWERTH Günter Derecho penal Parte general El hecho punible Trad espanhola Gladys Romero Madrid Edersa 1976 p 343 Nesse sentido ANTOLISEI Francesco Manual de derecho penal Parte general Trad espanhola Juan Del Rosal e Ángel Tório Buenos Aires Uteha 1960 p 113 e MORILLAS CUEVA Luís Curso de derecho penal español Parte general Madrid Marcial Pons 1996 p 98 32 33 34 35 36 37 38 39 40 41 42 43 44 HUNGRIA Nélson Comentários ao Código Penal Rio de Janeiro Forense 1949 v 1 p 118 Compartilham desse entendimento BRUNO Aníbal Op cit p 260 e CORREIA Eduardo Henriques da Silva A teoria do concurso em direito criminal Coimbra Almedina 1996 p 34 BELING Ernst von Esquema de derecho penal La doctrina del delito tipo Trad Sebastian Soler Buenos Aires Depalma 1944 p 135 Comentários ao Código Penal p 118 BOBBIO Norberto Teoria do ordenamento jurídico Trad Maria Celeste Cordeiro Leite dos Santos 10 ed Brasília Editora Universidade de Brasília 1999 p 81 Para o autor para que possa ocorrer antinomia são necessárias duas condições que embora óbvias devem ser explicitadas 1 As duas normas devem pertencer ao mesmo ordenamento 2 As duas normas devem ter o mesmo âmbito de validade Distinguemse quatro âmbitos de validade de uma norma temporal espacial pessoal e material Expressão empregada por JESCHECK HansHeinrich Tratado de derecho penal Parte general 5 ed Trad espanhola Miguel Olmedo Cardenete Granada Comares 2002 p 790 Cf SOLER Sebastian Derecho penal argentino Buenos Aires La Ley 1945 t II p 190191 Art 290 Receber preparar produzir vender fornecer ainda que gratuitamente ter em depósito transportar trazer consigo ainda que para uso próprio guardar ministrar ou entregar de qualquer forma a consumo substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica em lugar sujeito à administração militar sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar Pena reclusão até cinco anos HC 92462RS rel Min Cármen Lúcia 1ª Turma j 23102007 Cf GARCÍA ALBERO Ramón Non bis in idem material y concurso de leyes penales Barcelona Marcial Pons 1995 p 321 JIMÉNEZ DE ASÚA Luis Tratado de derecho penal Filosofia y ley penal 5 ed Buenos Aires Losada 1992 t II p 550 Concurso aparente de normas penais p 39 Expressão de HUNGRIA Nélson Comentários ao Código Penal p 121 45 46 47 48 49 50 51 52 53 Crime tipificado no Código Penal não pode ser absorvido por infração descrita na Lei de Contravenções Penais STF HC 121652SC rel Min Dias Toffoli 2ª Turma j 22042014 noticiado no Informativo 743 JIMÉNEZ DE ASÚA Luis La ley y el delito Principios de derecho penal 13 ed Buenos Aires Sudamericana 1984 p 147 É o que ocorre no art 61 do Código Penal São circunstâncias que sempre agravam a pena quando não constituem ou qualificam o crime DIAS Jorge de Figueiredo Direito penal Parte geral Questões fundamentais A doutrina geral do crime Coimbra Coimbra Editora 2004 t I p 294 Os dispositivos citados pelo autor referemse ao Código Penal português Podem ser lembrados STEVENSON Oscar Concurso aparente de normas penais p 40 JIMÉNEZ DE ASÚA Luis Tratado de derecho penal p 561565 e CASTELLÓ NICÁS Nuria El concurso de normas penales Granada Comares 2000 p 168 Na definição de Nélson Hungria Ocorre quando da conduta inicial que realiza um tipo de crime o agente passa a ulterior atividade realizando outro tipo de crime de que aquele é elemento constitutivo reconhecida a unidade jurídica segundo a regra do ubi major minor cessat Comentários ao Código Penal p 232233 Expressão originária do Direito Penal italiano referida por SABINO JÚNIOR Vicente Direito penal São Paulo Sugestões Literárias 1967 v 1 p 188 A única diferença conceitual que se pode estabelecer entre ambos os institutos situase no aspecto mutativo existente na progressão criminosa no tocante ao elemento subjetivo e não presente no crime progressivo De fato no crime progressivo o agente desde o início desejava o resultado mais grave Na progressão criminosa o agente de início pretendia apenas o crime menos grave alterando porém a sua intenção no desenrolar dos fatos até decidir produzir o resultado mais grave No crime progressivo o dolo do agente é um só do começo ao fim na progressão criminosa o dolo passa por uma série de mutações Cf BARBOSA Marcelo Fortes Concurso de normas penais São Paulo RT 1976 p 100 Maggiore admite apenas a consunção do fato anterior referindose ao posterior como um indiferente para a lei penal ou então como concurso real de crimes Cf MAGGIORE Giuseppe Derecho penal Bogotá Temis 1971 v 1 p 186 54 55 56 57 58 59 60 61 62 É também o que se verifica no porte ilegal de arma de fogo voltado à prática de homicídio STJ HC 104455ES rel Min Og Fernandes 6ª Turma j 21102010 noticiado no Informativo 452 Em sintonia com a posição consagrada no Supremo Tribunal Federal É pacífica de resto a jurisprudência desta Corte no sentido de não ser admissível a absorção do crime de uso de documento falso pelo de estelionato HC 98526RS rel Min Ricardo Lewandowski 1ª Turma j 29062010 O crime de sonegação fiscal absorve o de falsidade ideológica e o de uso de documento falso praticados posteriormente àquele unicamente para assegurar a evasão fiscal STJ EREsp 1154361MG rel Min Laurita Vaz 3ª Seção j 26022014 noticiado no Informativo 535 Com igual orientação STJ HC 309939SP rel Min Newton Trisotto Desembargador convocado do TJSC 5ª Turma j 28042015 noticiado no Informativo 562 BETTIOL Giuseppe Direito penal Trad Paulo José da Costa Jr e Alberto Silva Franco São Paulo RT 1971 v 2 p 568 Existe fato posterior não punível quando um comportamento que realiza uma tipicidade prevista por determinada norma penal deve considerarse como implicitamente apreciado e valorado para todos seus fins pela norma que prevê pena para um comportamento precedente como na hipótese em que o segundo fato sem lesionar um novo bem jurídico consiste na realização do fim em virtude do qual em correspondência com a tipicidade legal devia estar dominada a primeira ação JIMÉNEZ DE ASÚA Luis Tratado de derecho penal p 541 STEVENSON Oscar Concurso aparente de normas penais p 43 É o caso de DOTTI René Ariel Curso de direito penal Parte geral 2 ed Rio de Janeiro Forense 2004 p 290 Podem ser citados entre aqueles que não o recepcionam MERKEL Adolf Derecho penal Parte general Trad espanhola Pedro Dorado Montero Buenos Aires Julio César Faria 2004 p 280 e ss JESCHECK HansHeinrich Tratado de derecho penal p 791 HUNGRIA Nélson Comentários ao Código Penal p 119 SIQUEIRA Galdino Tratado de direito penal Parte geral Rio de Janeiro José Konfino 1947 t I p 151 BRUNO Aníbal Direito penal p 161 Esta teoria interessa somente aos crimes materiais ou causais pois a consumação depende da produção do resultado naturalístico Nos crimes 63 64 65 66 67 68 formais de consumação antecipada ou de resultado cortado e também nos crimes de mera conduta ou de simples atividade a consumação se verifica no momento da prática da conduta STJ HC 202048RN rel originário Min Sebastião Reis rel para o acórdão Min Og Fernandes 6ª Turma j 15052012 noticiado no Informativo 497 STF Ext 1354DF rel orig Min Teori Zavascki red p o acórdão Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 30062015 noticiado no Informativo 792 É o que se extrai do art 3º da Lei 86171993 Art 3º É reconhecido aos navios de todas as nacionalidades o direito de passagem inocente no mar territorial brasileiro 1º A passagem será considerada inocente desde que não seja prejudicial à paz à boa ordem ou à segurança do Brasil devendo ser contínua e rápida 2º A passagem inocente poderá compreender o parar e o fundear mas apenas na medida em que tais procedimentos constituam incidentes comuns de navegação ou sejam impostos por motivos de força ou por dificuldade grave ou tenham por fim prestar auxílio a pessoas a navios ou aeronaves em perigo ou em dificuldade grave 3º Os navios estrangeiros no mar territorial brasileiro estarão sujeitos aos regulamentos estabelecidos pelo Governo brasileiro A extraterritorialidade da lei penal não constitui fenômeno estranho aos diversos sistemas jurídicos existentes nos Estados nacionais pois o direito comparado com apoio em princípios como o da nacionalidade ou da personalidade ativa eou passiva o da proteção o da universalidade e o da representação ou da bandeira reconhece legítima a possibilidade de incidência em territórios estrangeiros do ordenamento penal de outros Estados STF ExtEUA 1151 rel Min Celso de Mello Plenário j 17032011 HCQO 83113DF rel Min Celso de Mello Pleno j 26062003 No mesmo sentido STF HC 83113DF rel Min Celso de Mello decisão monocrática j 21052003 É comum a formulação de questões em provas objetivas e orais sobre as teorias adotadas pelo Código Penal em relação ao lugar e ao tempo do crime Não há dificuldade no assunto mas podem ocorrer os terríveis brancos na memória que tanto assustam e atrapalham os candidatos Lembrese então da palavra LUTA Veja Lugar Ubiquidade Tempo Atividade Se a aprovação no tão sonhado concurso é uma luta certamente há meios para facilitar nossa missão 69 70 71 72 73 74 75 76 77 78 79 80 81 82 Por sua vez crimes de espaço mínimo são aqueles em que conduta e resultado ocorrem na mesma comarca Exemplo A furta um determinado bem na cidade de Niterói local em que também se concretiza a consumação do delito STJ HC 73451PE rel Min Jane Silva Desembargadora convocada do TJMG 5ª Turma j 04102007 E também REsp 1195265MT rel Min Gilson Dipp 5ª Turma j 06092011 noticiado no Informativo 482 Como destaca o item 4 do art 31 a imunidade de jurisdição de um agente diplomático no Estado acreditado não o isenta da jurisdição do Estado acreditante STJ RHC 87825ES rel Min Nefi Cordeiro 6ª Turma j 05122017 noticiado no Informativo 618 STJ HC 149481DF rel Min Haroldo Rodrigues Desembargador convocado do TJCE 6ª Turma j 19102010 noticiado no Informativo 452 Pet 3698PR rel Min Cármen Lúcia decisão monocrática j 05102006 MELLO Celso D Albuquerque Curso de direito internacional público Rio de Janeiro Forense 2001 p 13371340 SILVA José Afonso da Curso de direito constitucional positivo 26 ed São Paulo Malheiros 2006 p 534 STF AP 926AC rel Min Rosa Weber 1ª Turma j 06092016 noticiado no Informativo 838 Inq 4088DF rel Min Edson Fachin 1ª Turma j 01122015 noticiado no Informativo 810 Em igual sentido AI 473092AC rel Min Celso de Mello Plenário j 07032005 e Inq 2297DF rel Min Carmen Lúcia Plenário j 20092007 Inq 3932DF e Pet 5243DF rel Min Luiz Fux 1ª Turma j 21062016 noticiados no Informativo 831 BASTOS Celso Ribeiro Dicionário de direito constitucional São Paulo Saraiva 1994 p 82 SILVA José Afonso da Curso de direito constitucional positivo São Paulo Malheiros 2006 p 534535 Inq 2297DF rel Min Cármen Lúcia j 20092007 considerando os deputados federais e senadores isentos de enquadramento penal por suas 83 84 85 86 87 88 89 90 91 92 opiniões palavras e votos Em igual sentido Inq 2674DF rel Min Carlos Britto Plenário j 26112009 AC 4036 ReferendoMCDF rel Min Teori Zavascki 2ª Turma j 25112015 noticiado no Informativo 509 A natureza desta decisão causou celeuma doutrinária pois o STF criou uma figura híbrida ao decretar a prisão preventiva fazendo referência à situação de flagrância do crime permanente tipificado no art 2º da Lei 128502013 Crime Organizado HC 89417RO rel Min Cármen Lúcia 1ª Turma j 22082006 SILVA José Afonso da Curso de direito constitucional positivo São Paulo Malheiros 2006 p 535 SILVA José Afonso da Curso de direito constitucional positivo São Paulo Malheiros 2006 p 533 STF AI 769798RO rel Min Cármen Lúcia 1ª Turma j 01022011 Cf STF Inq 961SP rel Min Celso de Mello j 16081995 Nesse sentido STF Inq AgRg 2453MS rel Min Ricardo Lewandowski j 17052007 Não se cuida de prerrogativa intuitu personae vinculandose ao cargo ainda que ocupado interinamente razão pela qual se admite a sua perda ante o retorno do titular ao exercício daquele A diplomação do suplente não lhe estende automaticamente o regime políticojurídico dos congressistas por constituir mera formalidade anterior e essencial a possibilitar à posse interina ou definitiva no cargo na hipótese de licença do titular ou vacância permanente Agravo desprovido STF ADIn 371SE rel Min Maurício Côrrea j 05092002 No mesmo sentido HC 74201MG rel Min Celso de Mello j 12111996 ARAÚJO Luiz Alberto David NUNES JÚNIOR Vidal Serrano Curso de direito constitucional São Paulo Saraiva 1999 p 269 O instituto da imunidade parlamentar atua no contexto normativo delineado por nossa Constituição como condição e garantia de independência do Poder Legislativo seu real destinatário em face dos outros poderes do Estado Estendese ao congressista embora não constitua uma prerrogativa de ordem subjetiva deste Tratase de prerrogativa de caráter institucional inerente ao Poder Legislativo que só é conferida ao parlamentar ratione muneris em função do cargo e do mandato que exerce É por essa razão que não se reconhece ao 93 94 95 96 97 congressista em tema de imunidade parlamentar a faculdade de a ela renunciar Tratase de garantia institucional deferida ao Congresso Nacional O congressista isoladamente considerado não tem sobre ela qualquer poder de disposição O exercício do mandato parlamentar recebeu expressiva tutela jurídica da ordem normativa STF Inq 510DF rel Min Celso de Mello Pleno j 01021991 SILVA José Afonso da Curso de direito constitucional positivo p 536 STF Ext 1223DF rel Min Celso de Mello 2ª Turma j 22112011 O Supremo Tribunal Federal chegou inclusive a editar a Súmula 420 Não se homologa sentença proferida no estrangeiro sem prova do trânsito em julgado STJ SEC 14812EX Rel Min Nancy Andrighi Corte Especial j 16052018 noticiado no Informativo 626 JESUS Damásio E de Direito penal Parte geral 28 ed 2 tir São Paulo Saraiva 2006 p 145 PARTE II TEORIA GERAL DO CRIME 81 CONCEITO DE CRIME O conceito de crime é o ponto de partida para a compreensão dos principais institutos do Direito Penal Embora aparentemente simples a sua definição completa e pormenorizada apresenta questões complexas que acarretam várias consequências ao estudo dos pontos mais exigidos em provas e concursos públicos Qualquer operador do Direito iniciante ou avançado ainda que não muito versado na área penal se considera apto a fornecer o conceito de crime Diz se frequentemente Crime é o fato típico ilícito sem maior preocupação científica Assim não deve ser Quando lhe for indagado o conceito de crime uma resposta mais técnica e minuciosa deve ser apresentada De fato o crime pode ser conceituado levando em conta três aspectos material legal e formal ou analítico De acordo com esse critério crime é toda ação ou omissão humana que lesa ou expõe a perigo de lesão bens jurídicos penalmente tutelados Essa fórmula leva em conta a relevância do mal produzido aos interesses e valores selecionados pelo legislador como merecedores da tutela penal Destinase a orientar a formulação de políticas criminais funcionando como vetor ao legislador incumbindolhe a tipificação como infrações penais exclusivamente das condutas que causarem danos ou ao menos colocarem em perigo bens jurídicos penalmente relevantes assim reconhecidos pelo ordenamento jurídico Com efeito esse conceito de crime serve como fator de legitimação do Direito Penal em um Estado Democrático de Direito O mero atendimento do princípio da reserva legal se mostra insuficiente Não basta uma lei para qualquer conduta ser considerada penalmente ilícita Imagine um tipo penal com o seguinte conteúdo Sorrir por mais de 10 minutos ininterruptamente Pena reclusão de 2 a 8 anos e multa Nesta situação o princípio da reserva legal ou estrita legalidade seria obedecido Contudo somente se legitima o crime quando a conduta proibida apresentar relevância jurídicopenal mediante a provocação de dano ou ao menos exposição à situação de perigo em relação a bens jurídicos penalmente relevantes Segundo esse critério o conceito de crime é o fornecido pelo legislador Em que pese o Código Penal não conter nenhum dispositivo estabelecendo o que se entende por crime tal tarefa ficou a cargo do art 1º da Lei de Introdução ao Código Penal Decretolei 3914 de 9 de dezembro de 1941 assim redigido Considerase crime a infração penal a que a lei comina pena de reclusão ou de detenção quer isoladamente quer alternativa ou cumulativamente com a pena de multa contravenção a infração penal a que a lei comina isoladamente pena de prisão simples ou de multa ou ambas alternativa ou cumulativamente A diferenciação portanto é nítida Quando o preceito secundário cominar pena de reclusão ou detenção teremos um crime Tais modalidades de pena podem estar previstas isoladamente ou ainda alternativa ou cumulativamente com a pena pecuniária Em resumo se constarem as palavras reclusão ou detenção será crime pouco importa a lei em que estiver inserida a figura penal Ainda que de forma incorreta nada impediria a inserção de um crime na Lei das Contravenções Penais caso a conduta criminosa fosse apenada com reclusão ou detenção Por outro lado se o preceito secundário não apresentar as palavras reclusão ou detenção estará se referindo a uma contravenção penal uma vez que a lei a ela comina pena de prisão simples ou de multa isoladas alternativa ou cumulativamente Da mesma forma uma contravenção penal pode ser inserida em qualquer lei até mesmo no Código Penal embora essa medida seja esdrúxula e desprovida de técnica Destarte a distinção entre crime e contravenção penal é de grau quantitativa quantidade da pena e também qualitativa qualidade da pena e não ontológica Daí não nos parece correto denominar esta última de crimeanão inclusive pela ausência de critérios para tanto Se tal terminologia fosse correta não seria equivocado considerar que o homicídio é um superdelito e a injúria é um crime pequenino Cuidase em essência de espécies do gênero infração penal diferenciandose quanto à gravidade da sanção penal mediante valores escolhidos pelo legislador Notese que tais valores decisivos para a distinção não são absolutos e pacificamente aceitos Exemplo A conduta de praticar ato obsceno em local público constitui crime Por sua vez o jogo do bicho configura contravenção penal E certamente caminhar nu em via pública ato obsceno revestese de menor lesividade quando comparada com a conduta de chefiar bancas do jogo do bicho em uma comunidade jogo do bicho com todas as mazelas daí decorrentes E o valor eleito pelo legislador para tipificar uma conduta como crime ou contravenção penal pode variar ao longo do tempo Foi o que aconteceu com o porte ilegal de arma de fogo Até 19 de fevereiro de 1997 a conduta era definida como contravenção penal art 19 do Decretolei 36881941 qualquer que fosse a natureza da arma de fogo Do dia 20 de fevereiro de 1997 até o dia 21 de dezembro de 2003 foi tipificada como crime pelo art 10 da Lei 94371997 sujeito às penas de detenção de um a dois anos e multa A partir do dia 23 de dezembro de 2003 entrou em vigor o Estatuto do Desarmamento Lei 108262003 punindo de forma ainda mais rigorosa o porte ilegal podendo a sanção penal ser aumentada em razão da natureza e da qualidade da arma de fogo Ainda nesse ponto o Direito Penal brasileiro acolheu um sistema dicotômico ao fracionar o gênero infração penal em duas espécies crime ou delito e contravenção penal Os termos crime e delito se equivalem embora em algumas situações a Constituição Federal e a legislação ordinária utilizem a palavra delito impropriamente como sinônima de infração penal tal como se verifica no art 5º XI da Lei Suprema e nos arts 301 e 302 do Código de Processo Penal Crime ou delito Contravenção penal Pena de reclusão ou de detenção isolada alternativa ou cumulativamente com a pena de multa Pena de prisão simples ou multa isolada alternativa ou cumulativamente Outros países como Alemanha e França adotaram um sistema tricotômico crimes seriam as infrações mais graves delitos as intermediárias e por último as contravenções penais albergariam as de menor gravidade Sem prejuízo da distinção quantitativa e qualitativa entre crime e contravenção penal estas espécies de infração também apresentam outras distinções previstas no Código Penal e na Lei das Contravenções Penais1 Vejamos Crimes Contravenções Aplicação da lei penal a lei penal brasileira é aplicável via de regra aos crimes cometidos no território nacional CP art 5º a lei brasileira somente incide no tocante às contravenções penais praticadas no território nacional LCP art 2º Tentativa é punível a tentativa de crimes CP art 14 II não se pune a tentativa de contravenção LCP art 4º Elemento subjetivo os crimes podem ser dolosos culposos ou preterdolosos CP arts 18 e 19 basta para as contravenções penais a ação ou omissão voluntária LCP art 3º Culpabilidade os crimes são compatíveis com o erro de tipo CP art 20 e com o erro de proibição CP art 21 as contravenções penais admitem unicamente a ignorância ou a errada compreensão da lei se escusáveis LCP art 8º Tempo de cumprimento das penas nos crimes o tempo de cumprimento das penas privativas de liberdade não pode ser superior a 30 trinta anos CP art 75 nas contravenções penais a duração da pena de prisão simples não pode em caso algum ser superior a 5 cinco anos Período de prova do nos crimes o período de prova do varia entre dois a quatro anos e excepcionalmente de quatro a seis anos CP art 77 e 2º nas contravenções penais o período de prova do é de um a três anos LCP art 11 Prazo mínimo das medidas de segurança nos crimes o prazo mínimo das medidas de segurança é de um a três nas contravenções penais o prazo mínimo é de seis meses LCP art a b c anos CP art 97 1º 16 Ação penal2 nos crimes a ação penal pode ser pública incondicionada ou condicionada ou de iniciativa privada CP art 100 nas contravenções penais a ação penal é pública incondicionada LCP art 17 O art 28 da Lei 113432006 define o crime de posse de droga para consumo pessoal a ele cominando as penas de advertência sobre os efeitos das drogas prestação de serviços à comunidade e medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo Com isso surgiram algumas discussões A primeira delas atinente à natureza jurídica do ato no sentido de ser crime ou não Há posicionamento no sentido de que como não foram previstas penas de reclusão ou de detenção não se trata de crime e estando ausentes as penas de prisão simples ou multa também não configura contravenção penal com fundamento no art 1º da Lei de Introdução ao Código Penal Seria residualmente um ilícito penal sui generis3 Uma segunda corrente que nos parece acertada sustenta a manutenção do caráter criminoso da conduta com a cominação das penas previstas em lei Cuidase da posição amplamente dominante e a ela nos filiamos4 Essa vertente apresenta diversos argumentos para justificar a existência de crime no art 28 da Lei de Drogas quais sejam A lei ao tratar do tema classificou a conduta como crime O processo e julgamento devem observar o rito do Juizado Especial Criminal Lei 90991995 reservado para as infrações penais de menor potencial ofensivo No tocante à prescrição o art 30 da Lei de Drogas determina a d e f aplicação das regras estabelecidas pelos arts 107 e seguintes do Código Penal reservadas às infrações penais A finalidade do art 1º da Lei de Introdução ao Código Penal era apenas diferenciar os crimes das contravenções penais uma vez que tais diplomas legais passaram a vigorar simultaneamente em 1º de janeiro de 1942 A Lei de Introdução ao Código Penal pode ser modificada por outra lei ordinária como aconteceu com a Lei de Drogas e Não existiam penas alternativas quando foi editada a Lei de Introdução ao Código Penal Nesse contexto o Supremo Tribunal Federal com argumentos semelhantes aos que acolhemos decidiu não ter havido descriminalização da conduta existe crime e sim despenalização em face da supressão da pena privativa de liberdade Posse de droga para consumo pessoal art 28 da Lei 113432006 Nova Lei de Drogas natureza jurídica de crime O art 1º da LICP que se limita a estabelecer um critério que permite distinguir quando se está diante de um crime ou de uma contravenção não obsta a que lei ordinária superveniente adote outros critérios gerais de distinção ou estabeleça para determinado crime como o fez o art 28 da Lei 113432006 pena diversa da privação ou restrição da liberdade a qual constitui somente uma das opções constitucionais passíveis de adoção pela lei incriminadora CF1988 art 5º XLVI e XLVII Não se pode na interpretação da Lei 113432006 partir de um pressuposto desapreço do legislador pelo rigor técnico que o teria levado inadvertidamente a incluir as infrações relativas ao usuário de drogas em um capítulo denominado Dos Crimes e das Penas só a ele referentes Lei 113432006 Título III Capítulo III arts 2730 Ao uso da expressão reincidência também não se pode emprestar um sentido popular especialmente porque em linha de princípio somente disposição expressa em contrário na Lei 113432006 afastaria a regra geral do C Penal C Penal art 12 Somase a tudo a previsão como regra geral ao processo de infrações atribuídas ao usuário de drogas do rito estabelecido para os crimes de menor potencial ofensivo possibilitando até mesmo a proposta de aplicação imediata da pena de que trata o art 76 da Lei 90991995 art 48 1º e 5º bem como a disciplina da prescrição segundo as regras dos arts 107 e seguintes do C Penal Lei 113432006 art 30 Ocorrência pois de despenalização entendida como exclusão para o tipo das penas privativas de liberdade5 Concluise que a Lei de Introdução ao Código Penal fornece um conceito genérico de crime aplicável sempre que não existir disposição especial em sentido contrário Além disso a sua finalidade precípua não é dizer sempre o que se entende por crime mas diferenciálo da contravenção penal O art 1º da Lei de Introdução ao Código Penal permite assim a definição de conceito diverso de crime por leis extravagantes reservandose a sua aplicação para casos omissos Destarte o conceito geral ou genérico de crime sob o aspecto legal continua a ser aquele constante do art 1º da Lei de Introdução ao Código Penal ao passo que o art 28 da Lei 113432006 criou nova definição exclusivamente para o crime de posse de droga para consumo pessoal conceito específico Em relação aos demais delitos tráfico associação para o tráfico financiamento ao tráfico etc a Lei de Drogas segue o conceito geral apresentado pela Lei de Introdução ao Código Penal Esse critério também chamado de formal ou dogmático se funda nos elementos que compõem a estrutura do crime Basileu Garcia sustentava ser o crime composto por quatro elementos fato típico ilicitude culpabilidade e punibilidade6 Essa posição quadripartida é claramente minoritária e deve ser afastada pois a punibilidade não é elemento do crime mas consequência da sua prática Não é porque se operou a prescrição de determinado crime por exemplo que ele desapareceu do mundo fático Portanto o crime existe independentemente da punibilidade Outros autores adotam uma posição tripartida pela qual seriam elementos do crime fato típico ilicitude e culpabilidade Perfilham desse entendimento entre outros Nélson Hungria Aníbal Bruno E Magalhães Noronha Francisco de Assis Toledo Cezar Roberto Bitencourt e Luiz Regis Prado Muito cuidado nesse ponto Diversas pessoas inadvertidamente alegam que o acolhimento de um conceito tripartido de crime importa obrigatoriamente na adoção da teoria clássica ou causal da conduta Não é verdade Quem aceita um conceito tripartido de crime tanto pode ser clássico como finalista De fato Hans Welzel criador do finalismo penal definia o crime como o fato típico ilícito e culpável O conceito de culpabilidade acrescenta ao de ação antijurídica tratandose de uma ação dolosa ou não dolosa um novo elemento que a transforma em delito7 A distinção entre os perfis clássico e finalista reside principalmente na alocação do dolo e da culpa e não em um sistema bipartido ou tripartido relativamente à estrutura do delito como veremos na análise da conduta Por fim há autores que entendem o crime como fato típico e ilícito Constam desse rol René Ariel Dotti Damásio E de Jesus e Julio Fabbrini Mirabete entre outros Para os seguidores dessa teoria bipartida a culpabilidade deve ser excluída da composição do crime uma vez que se trata de pressuposto de aplicação da pena Destarte para a configuração do delito bastam o fato típico e a ilicitude ao passo que a presença ou não da culpabilidade importará na possibilidade ou não de a pena ser imposta A teoria bipartida relacionase intimamente com a teoria finalista da conduta Como já abordado nada impede a adoção de um conceito tripartido de crime por uma pessoa vinculada ao finalismo penal Todavia ao se adotar a teoria bipartida do crime necessariamente será aceito o conceito finalista de conduta Isso porque na teoria clássica o dolo e a culpa situamse na culpabilidade E se fosse possível um sistema clássico e bipartido consagrarseia a responsabilidade objetiva É usual a seguinte pergunta Em uma visão analítica qual foi o conceito de crime adotado pelo Código Penal Não há resposta segura para esta questão O Código Penal de 1940 em sua redação original acolhia um conceito tripartido de crime relacionado com o sistema clássico Eram portanto elementos do crime o fato típico a ilicitude e a culpabilidade A situação mudou com a edição da Lei 72091984 responsável pela redação da nova Parte Geral do Código Penal A partir de então fica a impressão de ter sido adotado um conceito bipartido de crime ligado obrigatoriamente à teoria finalista da conduta Vejamos quais são os indicativos dessa posição Em primeiro lugar no Título II da Parte Geral o Código Penal trata Do Crime enquanto logo em seguida no Título III cuida Da Imputabilidade Penal Dessa forma crime é o fato típico e ilícito independentemente da culpabilidade que tem a imputabilidade penal como um dos seus elementos O crime existe sem a culpabilidade bastando seja o fato típico e revestido de 82 ilicitude Em igual sentido ao tratar das causas de exclusão da ilicitude determina o Código Penal em seu art 23 que não há crime Ao contrário ao relacionarse às causas de exclusão da culpabilidade arts 26 caput e 28 1º por exemplo diz que o autor é isento de pena Assim sendo é necessário que o fato típico seja ilícito para a existência do crime Ausente a ilicitude não há crime Por outro lado subsiste o crime com a ausência da culpabilidade Sim o fato é típico e ilícito mas o agente é isento de pena Em suma há crime sem a imposição de pena O crime se refere ao fato típico e ilícito enquanto a culpabilidade guarda relação com o agente merecedor ou não de pena Mas não é só O art 180 4º do Código Penal preceitua A receptação é punível ainda que desconhecido ou isento de pena o autor do crime de que proveio a coisa Concluise que nada obstante a isenção de pena do agente e portanto da falta de culpabilidade isenção da pena exclusão da culpabilidade ainda assim existe o crime do qual proveio a coisa Em outras palavras diz o Código Penal tratarse o crime de fato típico e ilícito pois subsiste mesmo com a isenção da pena em relação ao autor do crime anterior Em que pesem tais argumentos há respeitados penalistas que adotam posições contrárias no sentido de ter o Código Penal se filiado a um sistema tripartido motivo que justifica o conhecimento de todos os enfoques por parte dos candidatos a concursos públicos ILÍCITO PENAL E OUTROS ILÍCITOS Ilicitude é a relação de contrariedade entre o fato praticado por alguém e o ordenamento jurídico como um todo Há nesse contexto ilícitos de natureza penal civil tributária administrativa ambiental etc não existindo diferença entre eles quanto à origem O ilícito penal se separa dos demais em relação à sua gravidade por força 83 da relevância da conduta praticada e da importância do bem jurídico tutelado E o critério para essa distinção é meramente político O que hoje se entende por ilícito tributário no futuro poderá ser compreendido como ilícito penal dependendo da vontade do legislador e da conveniência para o interesse público pois o Direito Penal somente deve se preocupar com os interesses e valores mais importantes para o desenvolvimento e manutenção do indivíduo e da sociedade deixando os demais a cargo dos outros ramos do Direito princípio da fragmentariedade E por corolário o ilícito penal se distingue de todos quanto à consequência Enquanto se reserva a ele uma pena até mesmo privativa de liberdade as outras disciplinas jurídicas preveem sanções mais brandas SUJEITOS DO CRIME Sujeitos do crime são as pessoas ou entes relacionados à prática e aos efeitos da empreitada criminosa Dividemse em sujeito ativo e sujeito passivo Sujeito ativo é a pessoa que realiza direta ou indiretamente a conduta criminosa seja isoladamente seja em concurso Autor e coautor realizam o crime de forma direta ao passo que o partícipe e o autor mediato o fazem indiretamente O sujeito ativo pode receber variadas denominações dependendo do momento processual e do critério posto em exame tais como agente geral indiciado no inquérito policial acusado com o oferecimento da denúncia ou queixa réu após o recebimento da inicial acusatória sentenciado com a prolação da sentença condenado após o trânsito em julgado da condenação reeducando durante a execução penal egresso após o cumprimento da pena criminoso e delinquente objeto de estudo das ciências penais como na criminologia A regra é a de que apenas o ser humano pode ser sujeito ativo de infrações penais mas também se discute a possibilidade de responsabilidade penal da pessoa jurídica Em que pesem as reminiscências históricas8 os animais podem funcionar como instrumento do crime como no caso do cão bravio que cumpre ordem de ataque emanada de seu dono mas jamais serão sujeito ativo de uma infração penal Discutese se a pessoa jurídica pode ser considerada sujeito ativo de crimes Para melhor compreensão do assunto é necessário inicialmente abordar a natureza jurídica de tais entes Para a teoria da ficção jurídica idealizada por Savigny a pessoa jurídica não tem existência real não tem vontade própria Apenas o homem possui aptidão de ser sujeito de direitos Essa teoria não pode subsistir Com efeito se a pessoa jurídica é uma ficção o Direito também o é porque provém do Estado pessoa jurídica de direito público interno Para os adeptos dessa corrente é impossível a prática de crimes por pessoas jurídicas Não há como imaginar uma infração penal cometida por um ente fictício De outro lado a teoria da realidade orgânica organicista ou da personalidade real de Otto Gierke sustenta ser a pessoa jurídica um ente autônomo e distinto de seus membros dotado de vontade própria É assim sujeito de direitos e obrigações tais como uma pessoa física É a teoria mais aceita no Direito Pode ser extraída até aqui uma primeira conclusão Essas teorias guardam estreita relação com o Direito Civil e se for adotada a da ficção jurídica é impossível a prática de crimes por pessoas jurídicas Entretanto com a preferência pela teoria orgânica passase ao debate acerca da sujeição criminal ativa da pessoa jurídica Nesse ponto há duas correntes A primeira no sentido da impossibilidade de a pessoa jurídica ser sujeito ativo de infrações penais Destacamse seus argumentos 1 2 3 4 5 6 7 1 2 3 4 Desde o Direito Romano já se sustentava o postulado societas delinquere non potest isto é a sociedade não pode delinquir A pessoa jurídica não tem vontade própria e portanto não pode praticar condutas A pessoa jurídica não é dotada de consciência própria para compreender o caráter intimidativo da pena A pessoa jurídica não é imputável pois somente o ser humano adquire capacidade de entender o caráter ilícito de um fato e de determinarse de acordo com esse entendimento A pessoa jurídica tem a sua atuação vinculada aos atos relacionados com o seu estatuto social aí não se incluindo a prática de crimes A punição da pessoa jurídica alcançaria ainda que indiretamente seus integrantes ofendendo o princípio constitucional da personalidade da pena e Não se pode aplicar pena privativa de liberdade característica indissociável do Direito Penal à pessoa jurídica A segunda corrente pugna pela possibilidade de a pessoa jurídica figurar como sujeito ativo de crimes com os seguintes fundamentos A pessoa jurídica constituise em ente autônomo dotado de consciência e vontade razão pela qual pode realizar condutas e assimilar a natureza intimidatória da pena A pessoa jurídica deve responder por seus atos adaptandose o juízo de culpabilidade às suas características A pessoa jurídica possui vontade própria razão pela qual o Direito Penal a ela reserva tratamento isonômico ao dispensado à pessoa física É óbvio que o estatuto social de uma pessoa jurídica não prevê a prática de crimes como uma de suas finalidades Da mesma forma não contém em seu bojo a realização de atos ilícitos o que não os impede de serem realizados inadimplência por exemplo 5 6 A punição da pessoa jurídica não viola o princípio da personalidade da pena Devese distinguir a pena dos efeitos da condenação os quais também se verificam com a punição da pessoa física e O Direito Penal não se limita à pena de prisão Ao contrário cada vez mais a pena privativa de liberdade deve ser entendida como medida excepcional ultima ratio preferindose a aplicação de penas alternativas Com a opção pela segunda corrente podese dizer que a Constituição Federal admitiu a responsabilidade penal da pessoa jurídica nos crimes contra a ordem econômica e financeira contra a economia popular e contra o meio ambiente autorizando o legislador ordinário a cominar penas compatíveis com sua natureza independentemente da responsabilidade individual dos seus dirigentes CF arts 173 5º e 225 3º Já foi editada a Lei 96051998 no tocante aos crimes contra o meio ambiente e o seu art 3º parágrafo único dispõe expressamente sobre a responsabilização penal da pessoa jurídica O posicionamento atual do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça é pela admissibilidade da responsabilidade penal da pessoa jurídica em todos os crimes ambientais dolosos ou culposos9 Em relação aos crimes contra a economia popular e a ordem econômica e financeira ainda não sobreveio lei definidora dos crimes da pessoa jurídica10 Destarte mesmo para quem admite a responsabilidade penal da pessoa jurídica deve ser ressaltado que somente podem ser praticados os crimes previstos na Constituição Federal desde que regulamentados por lei ordinária a qual deverá instituir expressamente sua responsabilidade penal É esse o entendimento atualmente dominante no sentido de que a pessoa jurídica pode ser responsabilizada penalmente pela prática de crimes ambientais posição que tende cada vez mais a se consolidar seja por interpretação do texto constitucional seja por opção de política criminal capaz de proporcionar eficiente resultado prático em tema tão em evidência Nas palavras de Fernando Galvão a sanção de natureza penal oferece um contraestímulo muito mais eficiente na proteção do meio ambiente justamente por trabalhar em harmonia com a lógica do mercado capitalista A pena criminal possui efeito estigmatizante que para a pessoa física sempre foi considerado um ponto negativo A pessoa física tem maiores dificuldades para a reinserção após receber a marcação oficial de criminoso No caso da pessoa jurídica a marca da responsabilidade criminal dificulta os negócios da pessoa jurídica e na defesa de seus interesses econômicos os dirigentes da pessoa jurídica são estimulados a evitar o processo penal11 Salientese que mesmo com o texto constitucional há entendimentos no sentido de que não foi prevista a responsabilidade penal da pessoa jurídica Os defensores desta linha de pensamento interpretam o art 225 3º da Constituição Federal12 da seguinte maneira pessoas físicas suportam sanções penais ao passo que pessoas jurídicas suportam sanções administrativas Agora ao se aceitar a responsabilidade penal da pessoa jurídica deve destacarse que esse reconhecimento não exclui a responsabilidade da pessoa física coautora ou partícipe do delito É o que se denomina de sistema paralelo de imputação teoria da dupla imputação previsto no art 3º parágrafo único da Lei 96051998 e com amparo nos arts 13 caput e 29 caput ambos do Código Penal É de se observar entretanto que a condenação da pessoa jurídica não acarreta automaticamente em igual medida no tocante à pessoa física pelo mesmo crime Exigemse provas seguras da autoria e da materialidade do fato delituoso relativamente a todos os envolvidos na infração penal De fato nada impede a absolvição das pessoas físicas às quais se imputou a responsabilidade pelo crime ambiental simultaneamente à condenação da pessoa jurídica beneficiada pelo delito Na linha da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal É admissível a condenação de pessoa jurídica pela prática de crime ambiental ainda que absolvidas as pessoas físicas ocupantes de cargo de presidência ou de direção do órgão responsável pela prática criminosa Com base nesse entendimento a 1ª Turma por maioria conheceu em parte de recurso extraordinário e nessa parte deulhe provimento para a cassar o acórdão recorrido Neste a imputação aos dirigentes responsáveis pelas condutas incriminadas Lei 960598 art 54 teria sido excluída e por isso trancada a ação penal relativamente à pessoa jurídica Sublinhouse que ao se condicionar a imputabilidade da pessoa jurídica à da pessoa humana estarseia quase que a subordinar a responsabilização jurídicocriminal do ente moral à efetiva condenação da pessoa física Ressaltouse que ainda que se concluísse que o legislador ordinário não estabelecera por completo os critérios de imputação da pessoa jurídica por crimes ambientais não haveria como pretender transpor o paradigma de imputação das pessoas físicas aos entes coletivos13 O Superior Tribunal de Justiça compartilha deste entendimento É possível a responsabilização penal da pessoa jurídica por delitos ambientais independentemente da responsabilização concomitante da pessoa física que agia em seu nome Conforme orientação da Primeira Turma do STF O art 225 3º da Constituição Federal não condiciona a responsabilização penal da pessoa jurídica por crimes ambientais à simultânea persecução penal da pessoa física em tese responsável no âmbito da empresa A norma constitucional não impõe a necessária dupla imputação RE 548181 Primeira Turma DJe 29102014 Diante dessa interpretação o STJ modificou sua anterior orientação de modo a entender que é possível a responsabilização penal da pessoa jurídica por delitos ambientais independentemente da responsabilização concomitante da pessoa física que agia em seu nome14 Para os defensores da tese da pessoa jurídica como sujeito ativo de crimes surge uma nova indagação É possível a responsabilidade penal da pessoa jurídica de direito público Existem duas posições sobre o assunto Sim é possível pois a Constituição Federal e a Lei 96051998 Crimes Ambientais não fazem distinção entre a pessoa jurídica de direito privado e a pessoa jurídica de direito público e b Não é possível pois a sanção penal acabaria prejudicando a própria coletividade seja em face da lesão ao patrimônio público pena de multa seja com a suspensão ou extinção de serviço de interesse público nas demais penas É o titular do bem jurídico protegido pela lei penal violada por meio da conduta criminosa Pode ser denominado de vítima ou de ofendido e divide se em duas espécies 1 Sujeito passivo constante mediato formal geral genérico ou indireto é o Estado pois a ele pertence o direito público subjetivo de exigir o cumprimento da legislação penal Figura como sujeito passivo de todos os crimes pois qualquer violação da lei penal transgride interesse a ele reservado pelo ordenamento jurídico Exemplo em um crime de homicídio ainda que a vítima direta seja a pessoa privada da sua vida o Estado também foi ofendido haja vista que a ele convém não sejam praticados crimes 2 Sujeito passivo eventual imediato material particular acidental ou direto é o titular do bem jurídico especificamente tutelado pela lei penal Exemplo o proprietário do carro subtraído no crime de furto O Estado sempre figura como sujeito passivo constante Além disso pode ser sujeito passivo eventual tal como ocorre nos crimes contra a Administração Pública A pessoa jurídica pode ser vítima de diversos delitos desde que compatíveis com a sua natureza Da mesma forma há diversos crimes que podem ser praticados contra incapazes e inclusive contra o nascituro como é o caso do aborto É também possível a existência de sujeito passivo indeterminado É o que ocorre nos crimes vagos aqueles que têm como vítima um ente destituído de personalidade jurídica Os mortos e os animais não podem ser sujeitos passivos de crimes 84 Perguntase E o crime previsto no art 138 2º do Código Penal E os crimes contra a fauna tipificados pelos arts 29 a 37 da Lei 96051998 No caso da figura definida pelo art 138 2º do Código Penal não é o morto o sujeito passivo do crime Os ofendidos são os seus familiares preocupados em zelar pelo respeito reservado às suas recordações Daí falar Damásio E de Jesus em calúnia contra a memória dos mortos15 Em relação aos crimes contra a fauna é a coletividade que figura como vítima De fato ela é a titular do interesse de ver preservado todo o patrimônio ambiental Anotese ainda que ninguém pode praticar um crime contra si próprio Em consonância com o princípio da alteridade do Direito Penal inexiste delito na conduta maléfica somente a quem a praticou Exemplos No crime previsto no art 171 2º V do Código Penal fraude para recebimento de indenização ou valor de seguro a vítima é a seguradora que se pretende ludibriar Na hipótese da autoacusação falsa art 341 do Código Penal a vítima é o Estado ofendido em sua função de administrar a Justiça Por último não se deve confundir o sujeito passivo com o prejudicado pelo crime Ainda que muitas vezes tais características se reúnam na mesma pessoa as situações são diversas Sujeito passivo como já analisado é o titular do bem jurídico protegido pela lei penal violada Prejudicado pelo crime por outro lado é qualquer pessoa a quem o crime traga danos patrimoniais ou não Exemplo sujeito passivo do homicídio é o ser humano de quem foi tirada a vida ao passo que prejudicado pelo crime é a esposa da vítima OBJETO DO CRIME É o bem ou objeto contra o qual se dirige a conduta criminosa Pode ser jurídico ou material Objeto jurídico é o bem jurídico isto é o interesse ou valor protegido pela norma penal No art 121 do Código Penal a título ilustrativo a objetividade jurídica recai na vida humana Objeto material de seu turno é a pessoa ou a coisa que suporta a conduta criminosa No homicídio exemplificativamente é o ser humano que teve sua vida ceifada pelo comportamento do agente 1 2 3 4 5 6 7 8 9 Existem outras diferenças disciplinadas em leis especiais exemplo sursis em crimes ambientais art 16 da Lei 96051998 as quais serão abordadas ao longo desta obra Nada obstante firmouse na doutrina e na jurisprudência o entendimento no sentido de que a contravenção penal de vias de fato LCP art 21 é de ação penal pública condicionada utilizandose analogicamente as regras inerentes à lesão corporal de natureza leve art 129 caput do Código Penal cc art 88 da Lei 90991995 É o que sustentam GOMES Luiz Flávio BIANCHINI Alice CUNHA Rogério Sanches OLIVEIRA William Terra de Nova Lei de Drogas comentada São Paulo RT 2006 p 126 No mesmo sentido GRECO FILHO Vicente RASSI João Daniel Lei de Drogas anotada São Paulo Saraiva 2007 p 43 RE 430105 QORJ rel Min Sepúlveda Pertence 1ª Turma j 13022007 É também o entendimento consolidado no STJ HC 65242MG rel Min Nefi Cordeiro 6ª Turma j 07082014 Com idêntica posição BATTAGLINI Giulio Direito penal Parte geral Trad Paulo José da Costa Jr e Arminda Bergamini Miotto São Paulo Saraiva Ed Universidade de São Paulo 1973 v 1 p 339 WELZEL Hans O novo sistema jurídicopenal Uma introdução à doutrina da ação finalista Tradução de Luiz Regis Prado São Paulo RT 2001 p 87 Citase o caso do elefante Charlie que foi absolvido por legítima defesa é notável o exemplo de um galo condenado à morte por haver bicado os olhos de uma criança recordase também o processo instaurado contra o papagaio que dava vivas ao rei infringindo assim as novas concepções revolucionárias assinalamse exemplos por igual de cavalos homicidas veados infanticidas e de cachorros acusados de crimen bestialitatis LINHARES Marcello Jardim Legítima defesa 4 ed São PauloRio de Janeiro SaraivaForense 1994 p 167 STF HCMC 91591MG rel Min Marco Aurélio Pleno j 21062007 e HC 92921BA rel Min Ricardo Lewandowski 1ª Turma j 19082008 No STJ REsp 889528SC rel Felix Fischer 5ª Turma j 17042007 e HC 92822SP rel originário Min Arnaldo Esteves Lima rel para acórdão Min Napoleão Nunes Maia Filho 5ª Turma j 10 11 12 13 14 15 17062008 noticiado no Informativo 360 As Leis 15211951 crimes contra a economia popular 74921986 crimes contra o sistema financeiro nacional e 81761991 crimes contra a ordem econômica cuidaram apenas da responsabilidade penal das pessoas físicas GALVÃO Fernando Responsabilidade penal da pessoa jurídica 2 ed Belo Horizonte Del Rey 2003 p 16 As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores pessoas físicas ou jurídicas a sanções penais e administrativas independentemente da obrigação de reparar os danos causados RE 548181PR rel Min Rosa Weber 1ª Turma j 06082013 noticiado no Informativo 714 E ainda É possível a condenação de pessoa jurídica pela prática de crime ambiental ainda que haja absolvição da pessoa física relativamente ao mesmo delito Com base nesse entendimento a 1ª Turma manteve decisão de turma recursal criminal que absolvera gerente administrativo financeiro diante de sua falta de ingerência da imputação da prática do crime de licenciamento de instalação de antena por pessoa jurídica sem autorização dos órgãos ambientais Reputouse que a Constituição respaldaria a cisão da responsabilidade das pessoas física e jurídica para efeito penal RE 628582 AgRRS rel Min Dias Toffoli 1ª Turma j 06092011 noticiado no Informativo 639 RMS 39173BA rel Min Reynaldo Soares da Fonseca 5ª Turma j 06082015 noticiado no Informativo 566 JESUS Damásio E de Direito penal Parte especial 27 ed São Paulo Saraiva 2005 v 2 p 216 911 A classificação dos crimes pode ser legal ou doutrinária Classificação legal é a qualificação ou seja o nome atribuído ao delito pela lei penal A conduta de matar alguém é denominada pelo art 121 do Código Penal de homicídio Na Parte Especial do Código Penal em regra os crimes são acompanhados por sua denominação legal nomen iuris também chamada de rubrica marginal Classificação doutrinária é o nome dado pelos estudiosos do Direito Penal às infrações penais Será doravante objeto do nosso estudo Crimes comuns próprios e de mão própria Essa divisão se baseia na qualidade do sujeito ativo Crimes comuns ou gerais são aqueles que podem ser praticados por qualquer pessoa O tipo penal não exige em relação ao sujeito ativo nenhuma condição especial Exemplos homicídio furto extorsão mediante sequestro crimes contra a honra etc Falase também em crimes bicomuns compreendidos como aqueles que podem ser cometidos por qualquer pessoa e contra qualquer pessoa isto é não se reclama nenhuma situação especial seja em relação ao sujeito ativo seja no tocante ao sujeito passivo É o caso da lesão corporal e do estelionato entre tantos outros delitos Crimes próprios ou especiais são aqueles em que o tipo penal exige uma situação fática ou jurídica diferenciada por parte do sujeito ativo Exemplos peculato só pode ser praticado por funcionário público e receptação qualificada pelo exercício de atividade comercial ou industrial delito previsto no art 180 1º do Código Penal somente pode ser praticado pelo comerciante ou industrial Admitem coautoria e participação1 Os crimes próprios dividemse em puros e impuros Naqueles a ausência da condição imposta pelo tipo penal leva à atipicidade do fato exemplo prevaricação pois excluída a elementar funcionário público não subsiste crime algum enquanto que nestes a exclusão da especial posição do sujeito ativo acarreta na desclassificação para outro delito exemplo peculato doloso pois afastandose a elementar funcionário público o fato passará a constituir crime de furto ou apropriação indébita conforme o caso Falase ainda em crimes próprios com estrutura inversa classificação relativa aos crimes praticados por funcionários públicos contra a Administração em geral crimes funcionais Como lecionam Antonio Pagliaro e Paulo José da Costa Junior Os delitos funcionais dispõem entretanto entre os crimes próprios de uma característica de todo particular Neles a qualificação subjetiva não precede o fato mas deriva do sujeito por uma atividade que ele exercita no momento do fato Em outras palavras o prius lógico dos crimes funcionais é que o sujeito na situação concreta esteja exercitando uma função pública Desse dado de fato deriva a qualificação de funcionário público necessária à configuração dos crimes Logo os delitos funcionais podem ser classificados como delitos próprios com estrutura inversa no sentido de que é necessário indagar sobre o fato antes de concluir que a qualificação subjetiva de funcionário público subsista realmente2 Existem também os chamados crimes bipróprios é dizer delitos que exigem uma peculiar condição fática ou jurídica no tocante ao sujeito ativo e ao sujeito passivo É o caso do infanticídio que somente pode ser praticado pela mãe contra o próprio filho nascente ou recémnascido3 Crimes de mão própria de atuação pessoal ou de conduta infungível 912 913 são aqueles que somente podem ser praticados pela pessoa expressamente indicada no tipo penal É o caso do falso testemunho CP art 342 Tais crimes não admitem coautoria mas somente participação eis que a lei não permite delegar a execução do crime a terceira pessoa No caso do falso testemunho o advogado do réu pode por exemplo induzir instigar ou auxiliar a testemunha a faltar com a verdade mas jamais poderá em juízo mentir em seu lugar ou juntamente com ela4 Crimes simples e complexos A classificação se refere à estrutura da conduta delineada pelo tipo penal Crime simples é aquele que se amolda em um único tipo penal É o caso do furto CP art 155 Crime complexo é aquele que resulta da união de dois ou mais tipos penais Falase nesse caso em crime complexo em sentido estrito O crime de roubo CP art 157 por exemplo é oriundo da fusão entre furto e ameaça no caso de ser praticado com emprego de grave ameaça CP art 147 ou furto e lesão corporal se praticado mediante violência contra a pessoa CP art 129 Denominamse famulativos os delitos que compõem a estrutura unitária do crime complexo5 De seu turno crime complexo em sentido amplo é o que deriva da fusão de um crime com um comportamento por si só penalmente irrelevante a exemplo da denunciação caluniosa CP art 339 originária da união da calúnia CP art 138 com a conduta lícita de noticiar à autoridade pública a prática de uma infração penal e sua respectiva autoria Crimes materiais formais e de mera conduta A divisão diz respeito à relação entre a conduta e o resultado naturalístico compreendido como a modificação do mundo exterior provocada pela conduta do agente Crimes materiais ou causais são aqueles em que o tipo penal aloja em seu interior uma conduta e um resultado naturalístico sendo a ocorrência deste último necessária para a consumação É o caso do homicídio CP art 914 121 A conduta é matar alguém e o resultado naturalístico ocorre com o falecimento da vítima operandose com ele a consumação Crimes formais de consumação antecipada ou de resultado cortado são aqueles nos quais o tipo penal contém em seu bojo uma conduta e um resultado naturalístico mas este último é desnecessário para a consumação Em síntese malgrado possa se produzir o resultado naturalístico o crime estará consumado com a mera prática da conduta Na extorsão mediante sequestro CP art 159 basta a privação da liberdade da vítima com o escopo de obter futura vantagem patrimonial indevida como condição ou preço do resgate Ainda que a vantagem não seja obtida pelo agente o crime estará consumado com a realização da conduta No caso da ameaça CP art 147 a vítima pode até sentirse amedrontada com a promessa de mal injusto e grave mas isso não é necessário para a consumação do crime Na injúria CP art 140 a pessoa contra quem foi dirigida a ofensa pode considerarse menosprezada Não se exige contudo que isso ocorra Basta que as palavras proferidas tenham potencialidade para violar a honra subjetiva isto é a dignidade e o decoro que a pessoa tem no tocante a si própria Outro exemplo é o crime de extorsão CP art 158 Nos moldes da Súmula 96 do Superior Tribunal de Justiça O crime de extorsão consumase independentemente da obtenção da vantagem indevida Crimes de mera conduta ou de simples atividade são aqueles em que o tipo penal se limita a descrever uma conduta ou seja não contém resultado naturalístico razão pela qual ele jamais poderá ser verificado É o caso do ato obsceno CP art 233 e do porte de munição de uso permitido Lei 108262003 Estatuto do Desarmamento art 146 Na definição de Manoel Pedro Pimentel Crime de mera conduta é aquele em que a ação ou a omissão bastam para constituir o elemento material objetivo da figura típica penal7 Crimes instantâneos permanentes de efeitos a b permanentes e a prazo A classificação se refere ao momento em que o crime se consuma Crimes instantâneos ou de estado são aqueles cuja consumação se verifica em um momento determinado sem continuidade no tempo É o caso do furto CP art 155 Crimes permanentes são aqueles cuja consumação se prolonga no tempo por vontade do agente O ordenamento jurídico é agredido reiteradamente razão pela qual a prisão em flagrante é cabível a qualquer momento enquanto perdurar a situação de ilicitude Como decidido pelo Superior Tribunal de Justiça Os tipos penais previstos nos arts 12 e 16 da Lei nº 108262003 Estatuto do Desarmamento são crimes permanentes e de acordo com o art 303 do CPP o estado de flagrância nesse tipo de crime persiste enquanto não cessada a permanência8 Os crimes permanentes se subdividem em necessariamente permanentes para a consumação é imprescindível a manutenção da situação contrária ao Direito por tempo juridicamente relevante É o caso do sequestro CP art 148 eventualmente permanentes em regra são instantâneos mas no caso concreto a situação de ilicitude pode ser prorrogada no tempo pela vontade do agente Como exemplo pode ser indicado o furto de energia elétrica CP art 155 3º Crimes instantâneos de efeitos permanentes são aqueles cujos efeitos subsistem após a consumação independentemente da vontade do agente tal como ocorre na bigamia CP art 235 e no estelionato previdenciário CP art 171 caput quando praticado por terceiro não beneficiário9 Crimes a prazo são aqueles cuja consumação exige a fluência de determinado período É o caso da lesão corporal de natureza grave em decorrência da incapacidade para as ocupações habituais por mais de 30 dias CP art 129 1º I e do sequestro em que a privação da liberdade dura mais de 15 dias CP art 148 1º III 915 a b b1 b2 Crimes unissubjetivos plurissubjetivos e eventualmente coletivos Diz respeito ao número de agentes envolvidos com a conduta criminosa Crimes unissubjetivos unilaterais monossubjetivos ou de concurso eventual são praticados por um único agente Admitem entretanto o concurso de pessoas É o caso do homicídio CP art 121 Crimes plurissubjetivos plurilaterais ou de concurso necessário são aqueles em que o tipo penal reclama a pluralidade de agentes que podem ser coautores ou partícipes imputáveis ou não conhecidos ou desconhecidos e inclusive pessoas em relação às quais já foi extinta a punibilidade Subdividemse em crimes bilaterais ou de encontro o tipo penal exige dois agentes cujas condutas tendem a se encontrar É o caso da bigamia CP art 235 crimes coletivos ou de convergência o tipo penal reclama a existência de três ou mais agentes Podem ser de condutas contrapostas os agentes devem atuar uns contra os outros É o caso da rixa CP art 137 de condutas paralelas os agentes se auxiliam mutuamente com o objetivo de produzirem o mesmo resultado É o caso da associação criminosa CP art 288 Não se devem confundir todavia os crimes plurissubjetivos com os de participação necessária Estes podem ser praticados por uma única pessoa nada obstante o tipo penal reclame a participação necessária de outra pessoa que atua como sujeito passivo e por esse motivo não é punido ex rufianismo CP art 230 Crimes eventualmente coletivos são aqueles em que não obstante o seu caráter unilateral a diversidade de agentes atua como causa de majoração da pena tal como se dá no furto qualificado CP art 155 4º IV e no roubo circunstanciado CP art 157 2º II 916 917 a b Crimes de subjetividade passiva única e de dupla subjetividade passiva A classificação se relaciona com o número de vítimas Crimes de subjetividade passiva única são aqueles em que consta no tipo penal uma única vítima É o caso da lesão corporal CP art 129 Crimes de dupla subjetividade passiva são aqueles em que o tipo penal prevê a existência de duas ou mais vítimas tal como se dá no aborto sem o consentimento da gestante em que se ofendem a gestante e o feto CP art 125 e na violação de correspondência na qual são vítimas o remetente e o destinatário CP art 151 Crimes de dano e de perigo Essa classificação se refere ao grau de intensidade do resultado almejado pelo agente como consequência da prática da conduta Crimes de dano ou de lesão são aqueles cuja consumação somente se produz com a efetiva lesão do bem jurídico Como exemplos podem ser lembrados os crimes de homicídio CP art 121 lesões corporais CP art 129 e dano CP art 163 Crimes de perigo são aqueles que se consumam com a mera exposição do bem jurídico penalmente tutelado a uma situação de perigo ou seja basta a probabilidade de dano Subdividemse em crimes de perigo abstrato presumido ou de simples desobediência consumamse com a prática da conduta automaticamente Não se exige a comprovação da produção da situação de perigo Ao contrário há presunção absoluta iuris et de iure de que determinadas condutas acarretam perigo a bens jurídicos É o caso do tráfico de drogas Lei 113432006 art 33 caput Esses crimes estão em sintonia com a Constituição Federal mas devem ser instituídos pelo legislador com parcimônia evitandose a desnecessária inflação legislativa10 crimes de perigo concreto consumamse com a efetiva comprovação no caso concreto da ocorrência da situação de c d e f g 918 perigo É o caso do crime de perigo para a vida ou saúde de outrem CP art 132 crimes de perigo individual atingem uma pessoa ou um número determinado de pessoas tal como no perigo de contágio venéreo CP art 130 crimes de perigo comum ou coletivo atingem um número indeterminado de pessoas como no caso da explosão criminosa CP art 251 crimes de perigo atual o perigo está ocorrendo como no abandono de incapaz CP art 133 crimes de perigo iminente o perigo está prestes a ocorrer crimes de perigo futuro ou mediato a situação de perigo decorrente da conduta se projeta para o futuro como no porte ilegal de arma de fogo de uso permitido ou restrito Lei 108262003 arts 14 e 16 autorizando a criação de tipos penais preventivos Crimes unissubsistentes e plurissubsistentes Dizem respeito ao número de atos executórios que integram a conduta criminosa Crimes unissubsistentes são aqueles cuja conduta se revela mediante um único ato de execução capaz de por si só produzir a consumação tal como nos crimes contra a honra praticados com o emprego da palavra Não admitem a tentativa pois a conduta não pode ser fracionada e uma vez realizada acarreta automaticamente na consumação Crimes plurissubsistentes são aqueles cuja conduta se exterioriza por meio de dois ou mais atos os quais devem somarse para produzir a consumação É o caso do crime de homicídio praticado por diversos golpes de faca É possível a tentativa justamente em virtude da pluralidade de atos executórios 919 1 2 Crimes comissivos omissivos e de conduta mista A divisão se relaciona com a forma pela qual é praticada a conduta criminosa Crimes comissivos ou de ação são os praticados mediante uma conduta positiva um fazer tal como se dá no roubo CP art 157 Nessa categoria se enquadra a ampla maioria dos crimes Crimes omissivos ou de omissão são os cometidos por meio de uma conduta negativa de uma inação de um não fazer Subdividemse em a Crimes omissivos próprios ou puros a omissão está contida no tipo penal ou seja a descrição da conduta prevê a realização do crime por meio de uma conduta negativa Não há previsão legal do dever jurídico de agir de forma que o crime pode ser praticado por qualquer pessoa que se encontre na posição indicada pelo tipo penal Nesses casos o omitente não responde pelo resultado naturalístico eventualmente produzido mas somente pela sua omissão Exemplo típico é o crime de omissão de socorro definido pelo art 135 do Código Penal Deixar de prestar assistência quando possível fazêlo sem risco pessoal à criança abandonada ou extraviada ou à pessoa inválida ou ferida ao desamparo ou em grave e iminente perigo ou não pedir nesses casos o socorro da autoridade pública A leitura do tipo penal permite algumas conclusões A conduta omissiva está descrita na lei seja na modalidade deixar de prestar seja na variante não pedir O agente responde penalmente pela sua inação pois deixou de fazer algo determinado por lei Qualquer pessoa pode praticar o crime de omissão de socorro Basta se omitir quando presente a possibilidade de prestar assistência sem risco pessoal à criança abandonada ou extraviada ou à pessoa inválida ou ferida ao desamparo ou em grave e iminente perigo E mediatamente qualquer indivíduo pode se 3 4 5 omitir quando não for possível prestar assistência sem risco pessoal deixando de pedir o socorro da autoridade pública Os crimes omissivos próprios são unissubsistentes isto é a conduta é composta de um único ato Dessa forma ou o agente presta assistência e não há crime ou deixa de prestála e o crime estará consumado Enquadramse via de regra no rol dos crimes de mera conduta11 Como decorrência da conclusão anterior os crimes omissivos próprios ou puros não admitem a forma tentada e Os delitos omissivos próprios normalmente são dolosos mas existem infrações desta natureza punidas a título de culpa a exemplo das figuras típicas contidas no art 63 2º da Lei 80781990 Código de Defesa do Consumidor e no art 13 caput da Lei 108262003 Estatuto do Desarmamento b Crimes omissivos impróprios espúrios ou comissivos por omissão o tipo penal aloja em sua descrição uma ação uma conduta positiva mas a omissão do agente que descumpre seu dever jurídico de agir acarreta a produção do resultado naturalístico e a sua consequente responsabilização penal As hipóteses do dever de agir12 foram previstas no art 13 2º do Código Penal a dever legal b posição de garantidor e c ingerência O crime de homicídio foi tipificado por uma conduta positiva Matar alguém Questionase É possível praticar homicídio por omissão Depende Se presente o dever de agir a resposta é positiva Não se admite a responsabilização do agente pelo delito contra a vida contudo se ele não se encontrar em tal posição jurídica A título ilustrativo uma mãe pode matar o próprio filho de tenra idade seja ministrandolhe veneno seja deixando dolosamente de alimentálo ceifandolhe a vida Notese que tais crimes entram também na categoria dos próprios uma vez que somente podem ser cometidos por quem possui o dever jurídico de agir São ainda crimes materiais pois o advento do resultado naturalístico é imprescindível à consumação do delito Ademais estes delitos admitem a tentativa No exemplo citado a genitora poderia abandonar a casa e fugir lá deixando o filho esfomeado Entretanto o choro da criança poderia ser notado por um vizinho o qual arrombaria a porta do imóvel e prestaria socorro à criança alimentandoa e a ela dispensando os cuidados necessários O resultado teria deixado de ocorrer por circunstâncias alheias à vontade da mãe configurando a tentativa de homicídio Finalmente os crimes omissivos impróprios são compatíveis com o dolo e também com a culpa c Crimes omissivos por comissão nestes crimes há uma ação provocadora da omissão Exemplo o funcionário público responsável por uma repartição impede que uma funcionária subalterna com problemas de saúde seja socorrida e ela vem a falecer Essa categoria não é reconhecida por grande parte da doutrina d Crimes omissivos quase impróprios esta classificação ignorada pelo direito penal brasileiro diz respeito aos crimes em que a omissão não produz uma lesão ao bem jurídico como nos crimes omissivos próprios mas apenas um perigo que pode ser abstrato ou concreto Nas hipóteses de perigo concreto tutelase um bem jurídico naturalístico exemplo a vida humana ao passo que nos casos de perigo abstrato buscase a proteção de um bem jurídico normativo exemplo uma obrigação jurídica Alberto Cadoppi citado por Fabio Roberto DAvila assim se pronuncia ao discorrer sobre tais bens jurídicos Bens esses que em termos de ofensividade detêm uma diferença substancial a vida como um bem negativo ou absoluto somente pode ser ofendida através da produção de um evento danoso e nesta medida por um crime comissivo ou omissivo impróprio enquanto a obrigação creditícia como um bem positivo ou relativo somente pode ser ofendida pela ausência de produção de um evento vantajoso e 9110 9111 desta forma por um crime omissivo próprio Os crimes omissivos quase impróprios são nessa medida nada mais que crimes omissivos próprios postos na tutela de um interesse absoluto estando por isso limitados às hipóteses de perigo abstrato ou concreto13 Crimes de conduta mista são aqueles em que o tipo penal é composto de duas fases distintas uma inicial e positiva outra final e omissiva É o exemplo do crime de apropriação de coisa achada definido pelo art 169 parágrafo único II do Código Penal quem acha coisa alheia perdida e dela se apropria total ou parcialmente deixando de restituíla ao dono ou legítimo possuidor ou de entregála à autoridade competente dentro no prazo de 15 dias Inicialmente o agente encontra uma coisa perdida e dela se apropria conduta positiva Depois deixa de restituíla a quem de direito ou de entregála à autoridade competente no prazo de 15 dias conduta negativa Crimes de forma livre e de forma vinculada Essa divisão se relaciona ao modo de execução admitido pelo crime Crimes de forma livre são aqueles que admitem qualquer meio de execução É o caso da ameaça CP art 147 que pode ser cometida com emprego de gestos palavras escritos símbolos etc Crimes de forma vinculada são aqueles que apenas podem ser executados pelos meios indicados no tipo penal É o caso do crime de perigo de contágio venéreo CP art 130 que somente admite a prática mediante relações sexuais ou atos libidinosos Crimes monoofensivos e pluriofensivos Essa divisão é atinente ao número de bens jurídicos atingidos pela conduta criminosa e guarda íntima relação com a estrutura do crime crimes simples ou complexos Crimes monoofensivos são aqueles que ofendem um único bem jurídico É o caso do furto CP art 155 que viola o patrimônio 9112 9113 9114 Crimes pluriofensivos são aqueles que atingem dois ou mais bens jurídicos tal como no latrocínio CP art 157 3º inc II que afronta a vida e o patrimônio Crimes principais e acessórios Referese à existência autônoma ou não do crime Crimes principais são os que possuem existência autônoma isto é independem da prática de um crime anterior É o caso do estupro CP art 213 Crimes acessórios de fusão ou parasitários dependem da prática de um crime anterior tal como na receptação CP art 180 nos crimes de favorecimento pessoal e real CP arts 348 e 349 e na lavagem de dinheiro Lei 96131998 art 1º Nos termos do art 108 do Código Penal a extinção da punibilidade do crime principal não se estende ao crime acessório Crimes transeuntes e não transeuntes Essa divisão se relaciona à necessidade ou não da elaboração de exame de corpo de delito para atuar como prova da existência do crime Crimes transeuntes ou de fato transitório são aqueles que não deixam vestígios materiais como no caso dos crimes praticados verbalmente ameaça desacato injúria calúnia difamação etc Crimes não transeuntes ou de fato permanente são aqueles que deixam vestígios materiais tais como o homicídio CP art 121 e as lesões corporais CP art 129 Nos crimes não transeuntes a falta de exame de corpo de delito leva à nulidade da ação penal salvo quando impossível a sua realização exemplo cadáver não encontrado no delito de homicídio14 enquanto nos delitos transeuntes não se realiza a perícia CPP arts 158 e 564 III b Crimes à distância plurilocais e em trânsito 9115 a b Coadunase com o local em que se produz o resultado Crimes à distância também conhecidos como crimes de espaço máximo são aqueles cuja conduta e resultado ocorrem em países diversos Como analisado na parte relativa ao lugar do crime o art 6º do Código Penal acolheu a teoria mista ou da ubiquidade Crimes plurilocais são aqueles cuja conduta e resultado se desenvolvem em comarcas diversas sediadas no mesmo país No tocante às regras de competência o art 70 do Código de Processo Penal dispõe que nesse caso será competente para o processo e julgamento do crime o juízo do local em que se operou a consumação Há contudo exceções Crimes em trânsito são aqueles em que somente uma parte da conduta ocorre em um país sem lesionar ou expor a situação de perigo bens jurídicos de pessoas que nele vivem Exemplo A da Argentina envia para os Estados Unidos uma missiva com ofensas a B e essa carta passa pelo território brasileiro Crimes independentes e conexos A classificação se importa com o vínculo existente entre dois ou mais crimes Crimes independentes são aqueles que não apresentam nenhuma ligação com outros delitos Crimes conexos são os que estão interligados entre si Essa conexão pode ser penal ou processual penal A conexão material ou penal que nos interessa dividese em teleológica ou ideológica o crime é praticado para assegurar a execução de outro delito É o caso de matar o segurança para sequestrar o empresário consequencial ou causal o crime é cometido para assegurar a ocultação impunidade ou vantagem de outro delito Exemplos matar uma testemunha para manter impune o delito e assassinar o comparsa para ficar com todo o produto do crime c 9116 9117 Essas duas espécies de conexão têm previsão legal Funcionam como qualificadoras no crime de homicídio CP art 121 2º V e como agravantes genéricas nos demais crimes CP art 61 II alínea b ocasional o crime é praticado como consequência da ocasião da oportunidade proporcionada por outro delito Exemplo um ladrão após praticar o roubo decide estuprar a vítima que estava no interior da loja assaltada O agente responde por ambos os crimes em concurso material Tratase de criação doutrinária e jurisprudencial sem amparo legal Crimes condicionados e incondicionados O critério reside na liberdade ou não para iniciar a persecução penal contra o responsável pela prática de um crime Crimes condicionados são aqueles em que a inauguração da persecução penal depende de uma condição objetiva de procedibilidade É o caso do crime de ameaça de ação penal pública condicionada à representação do ofendido ou de seu representante legal CP art 147 Anotese que a legislação penal indica expressamente a condição de procedibilidade quando necessária pois a ausência de menção direta acarreta a conclusão de tratarse de crime de ação penal pública incondicionada Crimes incondicionados são aqueles em que a instauração da persecução penal é livre Constituem a ampla maioria de delitos no Brasil O Estado pode iniciála sem nenhuma autorização como ocorre no crime de homicídio de ação penal pública incondicionada Crimes naturais plásticos e vazios15 Crimes naturais ou mala per se são aqueles que violam valores éticos absolutos e universais a exemplo do homicídio o qual atenta contra a vida humana Plásticos ou mala prohibita de seu turno são os delitos que embora previstos em leis penais não ofendem valores universais éticos e absolutos É o que se dá com os crimes contra a Administração Pública e contra a ordem 9118 tributária criados como meios de defesa do Estado contra o cidadão em oposição à lógica do Direito Penal Finalmente crimes vazios são modalidades específicas de delitos plásticos porém caracterizados pela ausência de proteção a qualquer bem jurídico Para os adeptos desta categoria que não admitimos um exemplo seria o delito de embriaguez ao volante Lei 95031997 Código de Trânsito Brasileiro art 306 notadamente nas hipóteses em que o condutor do veículo automotor encontrase em via pública deserta sem colocar em risco nenhuma outra pessoa além dele próprio Crimes de mínimo de menor de médio de elevado e de máximo potencial ofensivo Crimes de mínimo potencial ofensivo são os que não comportam a pena privativa de liberdade No Brasil enquadrase nesse grupo a posse de droga para consumo pessoal tipificada no art 28 da Lei 113432006 ao qual são cominadas as penas de advertência sobre os efeitos das drogas prestação de serviços à comunidade e medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo Crimes de menor potencial ofensivo por sua vez são aqueles cuja pena privativa de liberdade em abstrato não ultrapassa dois anos cumulada ou não com multa São assim definidos pelo art 61 da Lei 90991995 e ingressam na competência do Juizado Especial Criminal obedecendo ao rito sumaríssimo e admitindo a transação penal e a composição dos danos civis O art 98 I da Constituição Federal faz menção às infrações penais de menor potencial ofensivo expressão que também abrange todas as contravenções penais Crimes de médio potencial ofensivo de seu turno são aqueles cuja pena mínima não ultrapassa um ano independentemente do máximo da pena privativa de liberdade cominada Tais delitos admitem a suspensão condicional do processo na forma delineada pelo art 89 da Lei 90991995 Crimes de elevado potencial ofensivo são os que apresentam pena mínima superior a um ano ou seja pelo menos de dois anos e consequentemente pena máxima acima de dois anos Tais delitos não se 9119 91191 91192 91193 compatibilizam com quaisquer dos benefícios elencados pela Lei 90991995 Finalmente classificamse como crimes de máximo potencial ofensivo os que recebem tratamento diferenciado pela Constituição Federal São os hediondos e equiparados tráfico de drogas tortura e o terrorismo CF art 5º XLIII bem como os delitos cujas penas não se submetem à prescrição quais sejam racismo CF art 5º XLII e ação de grupos armados civis ou militares contra a ordem constitucional e o Estado Democrático CF art 5º XLIV16 Outras classificações Crime gratuito É o praticado sem motivo conhecido porque todo crime tem uma motivação Não se confunde com o motivo fútil definido como aquele de menor importância desproporcional ao resultado provocado pelo crime Com efeito a ausência de motivo conhecido não deve ser equiparada ao motivo fútil Destarte o desconhecimento acerca do móvel do agente não deve ser colocado no mesmo nível do motivo de somenos importância Há todavia adeptos de posição contrária os quais alegam que se um motivo ínfimo justifica a elevação da pena com maior razão deve ser punida mais gravemente a infração penal imotivada Crime de ímpeto É o cometido sem premeditação como decorrência de reação emocional repentina tal como no homicídio privilegiado cometido pelo agente sob o domínio de violenta emoção logo em seguida a injusta provocação da vítima CP art 121 1º Esses crimes são normalmente passionais movidos pela paixão Crime exaurido É aquele em que o agente depois de já alcançada a consumação insiste na agressão ao bem jurídico Não caracteriza novo crime constituindose em desdobramento de uma conduta perfeita e acabada 91194 91195 91196 91197 91198 Em outras palavras é o crime que depois de consumado alcança suas consequências finais as quais podem configurar um indiferente penal como no falso testemunho CP art 342 que se torna exaurido com o encerramento do julgamento relativo a este crime ou então condição de maior punibilidade como ocorre na resistência CP art 329 em que a não execução do ato dá ensejo à forma qualificada do crime Crime de circulação É o praticado com o emprego de veículo automotor a título de dolo ou de culpa com a incidência do Código Penal ou do Código de Trânsito Brasileiro Lei 95031997 Crime de atentado ou de empreendimento É aquele em que a lei pune de forma idêntica o crime consumado e a forma tentada isto é não há diminuição da pena em face da tentativa É o caso do crime de evasão mediante violência contra a pessoa CP art 352 Evadirse ou tentar evadirse o preso ou o indivíduo submetido a medida de segurança detentiva usando de violência contra a pessoa Crime de opinião ou de palavra É o cometido pelo excesso abusivo na manifestação do pensamento seja pela forma escrita seja pela forma verbal tal como ocorre na injúria CP art 140 Crime multitudinário É aquele praticado pela multidão em tumulto A lei não diz o que se entende por multidão razão pela qual sua configuração deve ser examinada no caso concreto Exemplo agressões praticadas em um estádio por torcedores de um time de futebol No Direito Canônico da Idade Média exigiamse ao menos 40 pessoas Crime vago 91199 911910 911911 911912 É aquele em que figura como sujeito passivo uma entidade destituída de personalidade jurídica como a família ou a sociedade Exemplo tráfico de drogas Lei 113432006 art 33 caput no qual o sujeito passivo é a coletividade Crime internacional É aquele que por tratado ou convenção devidamente incorporado ao ordenamento jurídico pátrio o Brasil se comprometeu a evitar e punir tal como o tráfico internacional de pessoa CP art 149A Crime de mera suspeita sem ação ou de mera posição O agente não realiza conduta penalmente relevante Ao contrário ele é punido em razão da suspeita despertada pelo seu modo de agir Essa modalidade idealizada na Itália por Vicenzo Manzini não encontrou amparo seguro na doutrina No Brasil pode ser apresentada como exemplo a contravenção penal tipificada pelo art 25 do Decretolei 36881941 Lei das Contravenções Penais posse não justificada de instrumento de emprego usual na prática de furto17 Crime inominado Delineado pelo uruguaio Salvagno Campos é o que ofende regra ética ou cultural consagrada pelo Direito Penal embora não definido em lei como infração penal Não pode ser aceito haja vista que o princípio da reserva legal veda a analogia in malam partem em âmbito criminal Crime habitual Crime habitual próprio é o que somente se consuma com a prática reiterada e uniforme de vários atos que revelam um criminoso estilo de vida do agente Cada ato isoladamente considerado é atípico Com efeito se cada ato fosse típico restaria configurado o crime continuado Exemplos exercício ilegal da medicina e curandeirismo CP arts 282 e 284 respectivamente 911913 911914 911915 911916 911917 911918 De seu turno crime habitual impróprio é aquele em que uma só ação tem relevância para configurar o tipo ainda que a sua reiteração não configure pluralidade de crimes a exemplo do que se verifica no delito de gestão fraudulenta previsto no art 4º caput da Lei 74921986 Crimes contra o Sistema Financeiro Nacional18 Crime profissional É o crime habitual quando cometido com finalidade lucrativa Exemplo rufianismo CP art 230 Quasecrime É o nome doutrinário atribuído ao crime impossível CP art 17 e à participação impunível CP art 31 Na verdade inexiste crime Crime subsidiário É o que somente se verifica se o fato não constitui crime mais grave É o caso do dano CP art 163 subsidiário em relação ao crime de incêndio CP art 250 Para Nélson Hungria o crime subsidiário funciona como soldado de reserva Crime hediondo É todo aquele que se enquadra no rol do artigo 1º da Lei 80721990 na forma consumada ou tentada Adotouse um critério legal crime hediondo é aquele que a lei define como hediondo19 Crime de expressão É o que se caracteriza pela existência de um processo intelectivo interno do autor Exemplo falso testemunho CP art 342 no qual a conduta tipificada não se funda na veracidade ou na falsidade objetiva da informação mas na desconformidade entre a informação e a convicção pessoal do seu autor Crime de intenção ou de tendência interna transcendente 911919 911920 911921 911922 É aquele em que o agente quer e persegue um resultado que não necessita ser alcançado para a consumação como se dá na extorsão mediante sequestro CP art 159 Crime de tendência ou de atitude pessoal É aquele em que a tendência afetiva do autor delimita a ação típica ou seja a tipicidade pode ou não ocorrer em razão da atitude pessoal e interna do agente Exemplos toque do ginecologista na realização do diagnóstico que pode configurar mero agir profissional ou então algum crime de natureza sexual dependendo da tendência libidinosa ou não bem como as palavras dirigidas contra alguém que podem ou não caracterizar o crime de injúria em razão da intenção de ofender a honra ou de apenas criticar ou brincar Crime mutilado de dois atos ou tipos imperfeitos de dois atos É aquele em que o sujeito pratica um delito com a finalidade de obter um benefício posterior Ex falsidade documental para cometer estelionato Nas palavras de Juarez Cirino dos Santos O resultado pretendido exige uma ação complementar a falsificação do documento e a circulação do documento no tráfego jurídico A intenção como característica psíquica especial do tipo aparece geralmente nas conjunções subordinativas finais para a fim de com o fim de etc indicativas de finalidades transcendentes do tipo como ocorre com a maioria dos crimes patrimoniais20 Crime de ação violenta É o cometido mediante o emprego de violência contra a pessoa ou grave ameaça como no caso do roubo CP art 157 Crime de ação astuciosa É o praticado por meio de fraude engodo tal como no estelionato CP art 171 911923 911924 911925 911926 Crime falho É a denominação doutrinária atribuída à tentativa perfeita ou acabada ou seja aquela em que o agente esgota os meios executórios que tinha à sua disposição e mesmo assim o crime não se consuma por circunstâncias alheias à sua vontade Exemplo A desfere os seis tiros do revólver contra B que mesmo ferido consegue fugir e vem a ser eficazmente socorrido Crime putativo imaginário ou erroneamente suposto É aquele em que o agente acredita realmente ter praticado um crime quando na verdade cometeu um indiferente penal Exemplo A vende um pó branco acreditando tratarse de cocaína Na verdade era talco Tratase de um não crime que se divide em três espécies a crime putativo por erro de tipo b crime putativo por erro de proibição também conhecido como delito de alucinação ou crime de loucura e c crime putativo por obra do agente provocador Crime remetido É o que se verifica quando sua definição típica se reporta a outro crime que passa a integrálo como no uso de documento falso fazer uso de qualquer dos papéis falsificados ou alterados a que se referem os arts 297 a 302 CP art 304 Crimes de responsabilidade Dividemse em próprios são na verdade crimes comuns e impróprios infrações políticoadministrativas Esses últimos são apreciados pelo Poder Legislativo e a sua prática redunda na imposição de sanções políticas 911927 911928 911929 911930 a b Crime obstáculo É aquele que retrata atos preparatórios tipificados como crime autônomo pelo legislador É o caso da associação criminosa CP art 288 e dos petrechos para falsificação de moeda CP art 291 Crime progressivo É aquele que para ser cometido deve o agente violar obrigatoriamente outra lei penal a qual tipifica crime menos grave chamado de crime de ação de passagem Em síntese o agente pretendendo desde o início produzir o resultado mais grave pratica sucessivas violações ao bem jurídico Com a adoção do princípio da consunção para solução do conflito aparente de leis penais o crime mais grave absorve o menos grave Exemplo relação entre homicídio e lesão corporal Progressão criminosa Verificase quando ocorre mutação no dolo do agente que inicialmente realiza um crime menos grave e após quando já alcançada a consumação decide praticar outro delito de maior gravidade Há dois crimes mas o agente responde por apenas um deles o mais grave em face do princípio da consunção Exemplo A decide lesionar B com chutes e pontapés Em seguida com B já bastante ferido vem a matálo Responde apenas pelo homicídio pois uma vez punido pelo todo morte será também punido pela parte lesões corporais Crimes de impressão Nos dizeres de Mário O Folchi são aqueles que provocam determinado estado de ânimo na vítima Dividemse em crimes de inteligência são praticados mediante o engano do sujeito passivo como o estelionato CP art 171 crimes de vontade recaem na vontade da vítima no tocante à sua esfera de autodeterminação a exemplo do sequestro ou cárcere c 911931 privado CP art 148 e crimes de sentimento são os que incidem nas faculdades emocionais do ofendido tal como a injúria CP art 14021 Crimes militares O Decretolei 10011969 Código Penal Militar prevê crimes militares em tempo de paz e em tempo de guerra Os crimes militares em tempo de paz estão definidos no art 9º Consideramse crimes militares em tempo de paz I os crimes de que trata este Código quando definidos de modo diverso na lei penal comum ou nela não previstos qualquer que seja o agente salvo disposição especial II os crimes previstos neste Código e os previstos na legislação penal quando praticados a por militar em situação de atividade ou assemelhado contra militar na mesma situação ou assemelhado b por militar em situação de atividade ou assemelhado em lugar sujeito à administração militar contra militar da reserva ou reformado ou assemelhado ou civil c por militar em serviço ou atuando em razão da função em comissão de natureza militar ou em formatura ainda que fora do lugar sujeito à administração militar contra militar da reserva ou reformado ou civil d por militar durante o período de manobras ou exercício contra militar da reserva ou reformado ou assemelhado ou civil e por militar em situação de atividade ou assemelhado contra o patrimônio sob a administração militar ou a ordem administrativa militar III os crimes praticados por militar da reserva ou reformado ou por civil contra as instituições militares considerandose como tais não só os compreendidos no inciso I como os do inciso II nos seguintes casos a contra o patrimônio sob a administração militar ou contra a ordem administrativa militar b em lugar sujeito à administração militar contra militar em situação de atividade ou assemelhado ou contra funcionário de Ministério militar ou da Justiça Militar no exercício de função inerente ao seu cargo c contra militar em formatura ou durante o período de prontidão vigilância observação exploração exercício acampamento acantonamento ou manobras d ainda que fora do lugar sujeito à administração militar contra militar em função de natureza militar ou no desempenho de serviço de vigilância garantia e preservação da ordem pública administrativa ou judiciária quando legalmente requisitado para aquele fim ou em obediência a determinação legal superior De seu turno os crimes militares em tempo de guerra encontramse no art 10 Consideramse crimes militares em tempo de guerra I os especialmente previstos neste Código para o tempo de guerra II os crimes militares previstos para o tempo de paz III os crimes previstos neste Código embora também o sejam com igual definição na lei penal comum ou especial quando praticados qualquer que seja o agente a em território nacional ou estrangeiro militarmente ocupado b em qualquer lugar se comprometem ou podem comprometer a preparação a eficiência ou as operações militares ou de qualquer outra forma atentam contra a segurança externa do País ou podem expôla a perigo IV os crimes definidos na lei penal comum ou especial embora não previstos neste Código quando praticados em zona de efetivas operações militares ou em território estrangeiro militarmente ocupado Além disso os crimes militares também se subdividem em próprios e 911932 911933 911934 impróprios Crimes militares próprios ou puramente militares são os definidos exclusivamente pelo Código Penal Militar pois ofendem apenas as instituições e valores militares22 Exemplos deserção CPM art 187 e amotinamento CPM art 182 Por outro lado crimes militares impróprios são os que encontram previsão legislativa tanto no Código Penal Militar como também na legislação comum a exemplo do furto do roubo do estupro e do homicídio Crimes falimentares São os tipificados pela Lei de Falências Lei 111012005 Podem ser ante ou pósfalimentares conforme sejam praticados antes ou depois da sentença declaratória da falência ou ainda próprios ou impróprios se forem cometidos pelo falido ou por outra pessoa exemplo administrador judicial contador etc Crimes funcionais ou delicta in officio São aqueles cujo tipo penal exige seja o autor funcionário público23 Dividemse em próprios e impróprios Crimes funcionais próprios são aqueles em que a condição de funcionário público no tocante ao sujeito ativo é indispensável à tipicidade do fato A ausência desta condição conduz à atipicidade absoluta tal como ocorre na corrupção passiva e na prevaricação CP arts 317 e 319 respectivamente Nos crimes funcionais impróprios ou mistos se ausente a qualidade funcional operase a desclassificação para outro delito Exemplo no peculatofurto CP art 312 1º se desaparecer a condição de funcionário público no tocante ao autor subsiste o crime de furto CP art 155 Crimes parcelares São os crimes da mesma espécie que compõem a série da continuidade delitiva desde que presentes os demais requisitos exigidos pelo art 71 caput 911935 911936 do Código Penal Com efeito o ordenamento penal brasileiro filiouse no campo do crime continuado à teoria da ficção jurídica razão pela qual os diversos delitos parcelares são considerados para fins de aplicação da pena como um único crime Crimes de hermenêutica São os que resultam unicamente da interpretação dos operadores do Direito pois na situação concreta não existem provas nem sequer indícios consistentes da prática de um fato legalmente descrito como criminoso24 Esta expressão crimes de hermenêutica foi idealizada por Rui Barbosa Crimes de rua crimes do colarinho branco e do colarinho azul Crimes de rua são os praticados pelas pessoas de classes sociais desfavorecidas a exemplo dos furtos executados por miseráveis andarilhos e mendigos Esses delitos são cometidos aos olhos da sociedade em locais supervisionados pelo Estado praças parques favelas etc e por essa razão são frequentemente objeto das instâncias de proteção Polícia Ministério Público e Poder Judiciário Quando ficam alheios ao conhecimento do Poder Público integram as cifras negras do Direito Penal25 Os crimes de rua se contrapõem aos crimes do colarinho branco white collar crime26 cometidos por aqueles que gozam e abusam da elevada condição econômica e do poder daí decorrente como é o caso dos delitos contra o sistema financeiro nacional Lei 74921986 de lavagem de capitais Lei 96131998 e contra a ordem econômica Lei 81761991 entre tantos outros Nesses crimes socioeconômicos surgem as cifras douradas do Direito Penal indicativas da diferença apresentada entre a criminalidade real e a criminalidade conhecida e enfrentada pelo Estado Raramente existem registros envolvendo delitos dessa natureza inviabilizando a persecução penal e acarretando a impunidade das pessoas privilegiadas no âmbito econômico De fato em tais crimes o Poder Público pouco interfere pois são praticados em locais privados escritórios restaurantes de luxo casas 911937 911938 911939 apartamentos etc resultando no desconhecimento pelo Estado e consequentemente na ausência do correspondente registro para viabilizar a persecução penal Se os crimes econômicos são etiquetados como crimes do colarinho branco os crimes de rua são rotulados como crimes do colarinho azul27 aqueles fazem alusão às finas camisas utilizadas pelos executivos das grandes empresas enquanto estes se referem à cor dos macacões utilizados pelos operários norteamericanos da década de 1940 Crime liliputiano Crime liliputiano também chamado de crime anão ou crime vagabundo é o nome doutrinário reservado às contravenções penais28 Esta terminologia tem origem no livro Viagens de Gulliver do inglês Jonathan Swift no qual o personagem principal viaja por um mundo imaginário e em sua primeira jornada vai a Liliput terra em que os habitantes medem apenas 15 quinze centímetros de altura Na verdade não há crime ou delito em face da regra contida no art 1º do Decretolei 39141941 Lei de Introdução ao Código Penal Considera se crime a infração penal que a lei comina pena de reclusão ou de detenção quer isoladamente quer alternativa ou cumulativamente com a pena de multa contravenção a infração penal a que a lei comina isoladamente pena de prisão simples ou de multa ou ambas alternativa ou cumulativamente Crimes de catálogo Esta classificação surgiu em Portugal e diz respeito aos delitos compatíveis com a interceptação telefônica disciplinada pela Lei 92961996 como meio de investigação ou de produção de provas durante a instrução em juízo29 Crimes de acumulação ou crimes de dano cumulativo Esta classificação tem origem na Dinamarca kumulations delikte e parte da seguinte premissa determinadas condutas são incapazes isoladamente de ofender o valor ou interesse protegido pela norma penal 911940 911941 911942 Contudo a repetição delas cumulativamente consideradas constitui crime em face da lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico Exemplo Embora o comportamento seja imoral e ilícito quem joga lixo uma única vez e em quantidade pequena às margens de um riacho não comete o crime de poluição Contudo se esta conduta for reiterada surgirá o delito tipificado no art 54 da Lei 96051998 Lei dos Crimes Ambientais Crimes de olvido A palavra olvido deriva de olvidar ou seja esquecer Por esta razão os delitos de olvido são também conhecidos como delitos de esquecimento Cuidase de modalidade de crime omissivo impróprio espúrio ou comissivo por omissão caracterizado pela natureza culposa mais especificamente pela culpa inconsciente ou sem previsão Em outras palavras a omissão culposa do agente acarreta no descumprimento do seu dever de agir CP art 13 2º daí decorrendo a produção do resultado naturalístico Exemplo O pai estaciona seu automóvel em via pública em um dia de muito calor e dirigese ao supermercado porém esquece seu filho de tenra idade no interior do veículo Como o genitor demora a retornar a criança acaba falecendo em consequência da insolação e da asfixia a que foi submetida Não há falar em responsabilidade penal objetiva em face da presença da culpa inconsciente Crimes aberrantes Nessa classificação ingressam a aberratio causae erro sobre o nexo causal a aberratio ictus erro na execução e a aberratio delicti resultado diverso do pretendido modalidades de erro de tipo acidental Crime achado Essa classificação guarda íntima relação com o encontro fortuito de provas no processo penal princípio da serendipidade Para o Supremo Tribunal Federal crime achado é aquele desconhecido e não investigado até o momento em que vem a ser descoberto em face da apuração de outro delito a exemplo do que se verifica quando no bojo de uma interceptação telefônica voltada a investigar a prática de tráfico de drogas acaba por se revelar a autoria de um crime de homicídio30 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 STJ REsp 975962CE rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 19022009 PAGLIARO Antonio e COSTA JÚNIOR Paulo José da Dos crimes contra a administração pública 4 ed São Paulo Atlas 2009 p 24 Atentese para um dado interessante o estupro na redação original do Código Penal era crime bipróprio pois somente podia ser praticado por homem contra mulher entretanto após a entrada em vigor da Lei 120152009 passou a ser delito bicomum pois qualquer pessoa homem ou mulher pode figurar como seu sujeito ativo ou passivo Há somente uma exceção a esta regra consistente no crime de falsa perícia CP art 342 praticado em concurso por dois peritos contadores tradutores ou intérpretes Tratase de crime de mão própria cometido em coautoria Entretanto para a teoria do domínio do fato os crimes de mão própria admitem coautoria o sujeito pode ser autor do delito sem realizar o núcleo do tipo Basta que tenha o controle final do fato STF HC 71069SP rel Min Celso de Mello 1ª Turma j 10051994 STJ AgRg no REsp 1398837SC rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 05082014 PIMENTEL Manoel Pedro Crimes de mera conduta 3 ed São Paulo RT 1975 p 64 HC 244016ES rel Min Jorge Mussi 5ª Turma j 16102012 noticiado no Informativo 506 STJ AgRg no Resp 1347082RS rel Min Moura Ribeiro 5ª Turma j 21082014 STF HC 102087MG rel Min Celso de Mello rel p acórdão Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 28022013 O Supremo Tribunal Federal contudo já decidiu que a apropriação indébita previdenciária CP art 168A é delito omissivo próprio e material Inq 2537 AgRGO rel Min Marco Aurélio Plenário j 10032008 noticiado no Informativo 528 A matéria será minuciosamente estudada por ocasião da análise da relação de causalidade DAVILA Fabio Roberto Ofensividade e crimes omissivos próprios Coimbra Coimbra Editora 2005 p 291292 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 STJ HC 72661PE rel Min Og Fernandes rel p acórdão Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 24042012 Esta classificação é apresentada por FÜHRER Maximiliano Roberto Ernesto História do Direito Penal crime material e crime de plástico São Paulo Malheiros 2005 p 114115 STF HC 111017RS rel Min Ayres Britto 2ª Turma j 07022012 Para o STF esta contravenção penal não foi recepcionada pela Constituição Federal RE 583523RS rel Min Gilmar Mendes Plenário j 03102013 noticiado no Informativo 722 STJ HC 39908PR rel Min Arnaldo Esteves Lima 5ª Turma j 06122005 O fato de não ter sido consumado o crime não afasta a hediondez do delito STJ HC 220978RJ rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 16102012 noticiado no Informativo 506 SANTOS Juarez Cirino dos Direito penal parte geral 2 ed Curitiba ICPC Lumen Juris 2007 p 163 FOLCHI Mário O La importancia de la tipicidade en derecho penal Buenos Aires Depalma 1960 p 87 Há posição específica da Justiça castrense que coloca em destaque um critério processual Nesse sentido crime militar próprio é aquele cuja ação penal possa ser proposta somente em face de um militar NEVES Cícero Robson Coimbra STREIFINGER Marcelo Apontamentos de direito penal militar Parte geral São Paulo Saraiva 2005 v 1 p 50 Lembrese que aos processos relativos a crimes funcionais afiançáveis aplicase a regra prevista no art 514 do Código de Processo Penal E com a entrada em vigor da Lei 124032011 todos os crimes funcionais são afiançáveis a teor da regra disciplinada no art 323 do Código de Processo Penal STF Inq 2424RJ rel Min Cezar Peluso Plenário j 20112008 noticiado no Informativo 529 Acerca das cifras negras e do abolicionismo penal recomendase a leitura do Capítulo 32 item 329 Essa expressão foi idealizada em 1939 pelo sociólogo americano Edwin Sutherland Essa nomenclatura foi utilizada no STF pelo Min Luiz Fux no 28 29 30 julgamento do Mensalão Ap 470DF rel Min Joaquim Barbosa Plenário j 27082012 É da competência da Justiça estadual o julgamento de contravenções penais mesmo que conexas com delitos de competência da Justiça Federal A Constituição Federal expressamente excluiu em seu art 109 IV a competência da Justiça Federal para o julgamento das contravenções penais ainda que praticadas em detrimento de bens serviços ou interesse da União Tal orientação está consolidada na Súm n 38STJ STJ CC 120406RJ rel Min Alderita Ramos de Oliveira Desembargadora convocada do TJPE 3ª Seção j 12122012 noticiado no Informativo 511 STF HC 100524PR rel Min Joaquim Barbosa 2ª Turma j 27032012 HC 129678 rel orig Min Marco Aurélio red p o ac Min Alexandre de Moraes 1ª Turma j 13062017 noticiado no Informativo 869 101 INTRODUÇÃO Fato típico é o fato humano1 que se enquadra com perfeição aos elementos descritos pelo tipo penal A conduta de subtrair dolosamente para si coisa alheia móvel caracteriza o crime de furto uma vez que se amolda ao modelo delineado pelo art 155 caput do Código Penal Em sentido contrário fato atípico é a conduta que não encontra correspondência em nenhum tipo penal Por exemplo a ação do pai consistente em manter relação sexual consentida com sua filha maior de idade e plenamente capaz é atípica pois o incesto ainda que imoral não é crime São quatro os elementos do fato típico conduta resultado naturalístico relação de causalidade nexo causal e tipicidade Tais elementos estarão presentes simultaneamente nos crimes materiais consumados Com efeito se o crime material é aquele em que o tipo penal aloja em seu interior uma conduta e um resultado naturalístico modificação do mundo exterior provocada pelo comportamento do agente exigindo a produção deste último para a consumação os quatro elementos estarão presentes 102 quando consumado o delito De fato a conduta produz o resultado naturalístico ligados entre si pela relação de causalidade E finalmente para ter relevância penal deve operarse o juízo de tipicidade isto é subsunção entre a ação ou omissão do agente e o modelo previsto no tipo penal Em caso de tentativa suprimemse o resultado naturalístico não produzido por circunstâncias alheias à vontade do agente e o nexo causal limitandose o fato típico aos elementos conduta e tipicidade Nos crimes formais e de mera conduta os componentes do fato típico também são a conduta e a tipicidade Vale recordar que nos crimes de mera conduta jamais haverá resultado naturalístico razão pela qual se subtrai a relação de causalidade enquanto nos crimes formais o resultado naturalístico pode até ocorrer mas não é necessário para a consumação Passemos à análise de cada um dos elementos do fato típico CONDUTA Na delimitação do conceito de conduta reside uma das maiores discussões do Direito Penal Não é exagerado afirmar que a forma como atualmente se encontra desenvolvida a teoria geral do crime se deve à evolução do conceito doutrinário de conduta Várias teorias buscam definila e a adoção de cada uma delas importa em modificações estruturais na forma de encarar o Direito Penal Vejamos as mais importantes Conduta é o comportamento humano voluntário que produz modificação no mundo exterior Essa teoria foi idealizada no século XIX por Liszt Beling e Radbruch e foi recepcionada no Brasil por diversos penalistas de destaque tais como Aníbal Bruno Costa e Silva E Magalhães Noronha José Frederico Marques Basileu Garcia Manoel Pedro Pimentel e Nélson Hungria Submete o Direito Penal às regras inerentes às ciências naturais orientadas pelas leis da causalidade A vontade humana engloba duas partes diversas uma externa objetiva correspondente ao processo causal isto é ao movimento corpóreo do ser humano e outra interna subjetiva relacionada ao conteúdo final da ação Em síntese a vontade é a causa da conduta e a conduta é a causa do resultado Não há vontade no tocante à produção do resultado O elemento volitivo interno acarreta em um movimento corporal do agente o qual objetivamente produz o resultado A caracterização da conduta criminosa depende somente da circunstância de o agente produzir fisicamente um resultado previsto em lei como infração penal independentemente de dolo ou culpa Em outras palavras para a configuração da conduta basta apenas uma fotografia do resultado Imaginese o seguinte exemplo A trafega cautelosamente com seu carro em via pública a 40 kmh O limite da pista é de 60 kmh e o veículo reúne perfeitas condições de uso De repente uma criança se solta dos braços da mãe passa por trás de um ônibus que estava estacionado em local permitido e impedia a visibilidade de A e inesperadamente lançase na direção do automóvel chocandose contra ele A criança morre O agente não tinha dolo nem culpa Qual é a fotografia do evento Resposta A na direção do seu veículo automotor uma criança morta à sua frente e o parachoque do carro amassado Para a teoria clássica A teria praticado uma conduta penalmente relevante Com efeito a sua ação dirigir o automóvel ensejou um resultado no mundo exterior morte da criança Tratase de mera relação de causa e efeito Daí o nome teoria causal ou mecanicista Presentes assim conduta e resultado naturalístico bem como o nexo causal eis que a criança morreu em consequência do suposto atropelamento Além disso há tipicidade pois a conduta de matar alguém encontra correspondência no art 121 do Código Penal Configurado portanto o fato típico do crime de homicídio Em decorrência questionase A teoria clássica consagra a responsabilidade penal objetiva A resposta é negativa Porém o examinador vai insistir Mas como fica o elemento subjetivo dolo ou culpa E respondemos Na teoria clássica dolo e culpa se alojam no interior da culpabilidade momento em que se procede à análise do querer interno do agente Por essa razão já dissemos ao abordar o conceito analítico de crime que para os adeptos da teoria clássica crime é necessariamente o fato típico e ilícito praticado por agente culpável sob pena de restar caracterizada a responsabilidade penal objetiva No exemplo citado não haveria crime por ausência de culpabilidade O fato seria típico e ilícito pois não se encontra presente nenhuma causa de exclusão da ilicitude mas não existiria a culpabilidade pela falta de um dos seus elementos dolo ou culpa O principal defeito dessa teoria é separar a conduta praticada no mundo exterior movimento corporal objetivo da relação psíquica do agente conteúdo volitivo deixando de analisar a sua vontade Fica claro portanto que a teoria clássica não distingue a conduta dolosa da conduta culposa pois ambas são analisadas objetivamente uma vez que não se faz nenhuma indagação sobre a relação psíquica do agente para com o resultado Da mesma forma não explica de modo idôneo os crimes omissivos próprios nem os formais nem os de mera conduta Ainda não convence no que diz respeito aos crimes tentados pois em todos eles não há resultado naturalístico apto a possibilitar a fotografia do delito Bastante consagrada em décadas passadas essa teoria foi ao longo do tempo cada vez mais abandonada encontrando atualmente poucos seguidores Foi criada por Hans Welzel jusfilósofo e penalista alemão no início da década de 30 do século passado Posteriormente teve grande acolhida no Brasil compartilhando de seus ideais ilustres penalistas como Heleno Cláudio Fragoso René Ariel Dotti Damásio E de Jesus Julio Fabbrini Mirabete e Miguel Reale Júnior Tem como ponto de partida a concepção do homem como ser livre e responsável pelos seus atos Consequentemente as regras do Direito não podem ordenar ou proibir meros processos causais mas apenas atos dirigidos finalisticamente ou então a omissão de tais atos2 Para essa teoria conduta é o comportamento humano consciente e voluntário dirigido a um fim Daí o seu nome finalista levando em conta a finalidade do agente Não desprezou todos os postulados da teoria clássica Ao contrário preservouos a eles acrescentando a nota da finalidade Uma conduta pode ser contrária ou conforme ao Direito dependendo do elemento subjetivo do agente Destarte dolo e culpa que na teoria clássica residiam na culpabilidade foram deslocados para o interior da conduta e portanto para o fato típico Formouse assim uma culpabilidade vazia desprovida do dolo e da culpa Desta forma o partidário do finalismo penal pode adotar um conceito analítico de crime tripartido ou bipartido conforme repute a culpabilidade como elemento do crime ou pressuposto de aplicação da pena Welzel sustentava que a causalidade exterior é cega pois não analisa o querer interno do agente Por seu turno a finalidade por ser guiada é vidente No exemplo adotado em relação à teoria clássica a resposta seria diversa no tocante à teoria finalista Com efeito o comportamento de A não poderia ser considerado conduta penalmente relevante em face da ausência de dolo ou culpa Não haveria crime desde já pela inexistência do fato típico matar alguém O Código Penal em vigor com a Reforma da Parte Geral pela Lei 72091984 parece ter manifestado preferência pelo finalismo penal Uma forte evidência se encontra no art 20 caput O erro sobre o elemento constitutivo do tipo legal de crime exclui o dolo mas permite a punição por crime culposo se previsto em lei Ora se a ausência de dolo acarreta na exclusão do fato típico ainda que somente na forma dolosa é porque o dolo está na conduta do agente que deixa de ser dolosa para ser culposa A teoria finalista foi bastante criticada no tocante aos crimes culposos pois não se sustentava a finalidade da ação concernente ao resultado naturalístico involuntário Alegase todavia que no crime culposo também há vontade dirigida a um fim Mas esse fim será conforme ou não ao Direito de maneira que a reprovação nos crimes culposos não incide na finalidade do agente mas nos meios por ele escolhidos para atingir a finalidade desejada indicativos da imprudência da negligência ou da imperícia Entretanto parece que nem mesmo Welzel conseguiu adequar com precisão a teoria finalista aos crimes culposos Na última etapa de seus estudos vislumbrou ainda que superficialmente substituir a teoria finalista por uma outra teoria denominada cibernética Essa teoria também conhecida como ação biociberneticamente antecipada3 leva em conta o controle da vontade presente tanto nos crimes dolosos como nos crimes culposos Como já mencionado busca compatibilizar o finalismo penal com os crimes culposos Na explicação de Everardo da Cunha Luna Welzel informa que ao tomar do campo da filosofia de Nicolai Hartmann pela primeira vez e em 1935 o termo finalidade outra expressão não existia que se adequasse ao seu pensamento sobre a ação humana Ao surgir porém em 1948 com Norbert Wiener o termo cibernética seria melhor talvez preferilo ao termo finalidade para designar a ação como fato dirigido e orientado pela vontade Como porém o termo cibernética tem uma significação precisa no campo da matemática deve ser mantido o uso linguístico jurídicopenal finalidade sabendose desde já que ocasiona malentendidos ao ser interpretado de uma maneira estreita e literal Se não fora o inconveniente indicado a ação cibernética compreenderia com clareza o dolo e a culpa abrangendo em ambos o que existe de juridicamente relevante ou seja a direção4 Destarte pelo fato de ter sido consagrada no âmbito jurídico e mostrarse mais pertinente ao estudo do Direito Penal mantevese a denominação finalismo penal Para essa teoria os ideais clássico e finalista são insuficientes para disciplinar a conduta porque desconsiderariam uma nota essencial do comportamento humano o seu aspecto social Nesse contexto Johannes Wessels na tentativa de equacionar esse problema criou a teoria social da ação HansHeinrich Jescheck partidário dessa teoria define a conduta como o comportamento humano com transcendência social5 Por comportamento devese entender a resposta do homem a exigências situacionais mediante a concretização da possibilidade de reação que lhe é autorizada pela sua liberdade Assim socialmente relevante seria a conduta capaz de afetar o relacionamento do agente com o meio social em que se insere Essa teoria não exclui os conceitos causal e final de ação Deles se vale acrescentandolhes o caráter da relevância social Para os seus defensores a vantagem dessa teoria consiste no fato de o elemento sociológico cumprir a missão de permitir ao Poder Judiciário a supressão do vácuo criado pelo tempo entre a realidade jurídica e a realidade social Um fato não pode ser tipificado pela lei como infração penal e simultaneamente ser tolerado pela sociedade caso em que estaria ausente um elemento implícito do tipo penal presente em todo modelo descritivo legal consistente na repercussão social da conduta Por corolário para que o agente pratique uma infração penal é necessário que além de realizar todos os elementos previstos no tipo penal tenha também a intenção de produzir um resultado socialmente relevante A principal crítica que se faz a essa teoria repousa na extensão do conceito de transcendência ou relevância social que se presta a tudo inclusive a fenômenos acidentais e da natureza A morte de uma pessoa provocada por uma enchente por exemplo possui relevância social na medida em que enseja o nascimento modificação e extinção de direitos e obrigações Com efeito ao mesmo tempo em que não se pode negar relevância social a b c d e ao delito também se deve recordar que tal qualidade é inerente a todos os fatos jurídicos e não apenas aos pertencentes ao Direito Penal É a teoria sustentada por Francisco de Assis Toledo para superar os entraves travados entre as vertentes clássica finalista e social Em suas palavras essa definição almeja conciliar os pontos positivos extraídos de cada uma delas Nesse sentido Ação é o comportamento humano dominado ou dominável pela vontade dirigido para a lesão ou para a exposição a perigo de um bem jurídico ou ainda para a causação de uma previsível lesão a um bem jurídico6 Deve ser lembrado que a palavra ação é empregada por Assis Toledo em sentido amplo como sinônimo de conduta englobando assim a ação propriamente dita e a omissão Essa teoria coloca em destaque segundo seu autor o comportamento humano englobando a ação e a omissão a vontade exclusiva do ser humano o poder de outromodo poder agir de outro modo que permite ao homem o domínio da vontade o aspecto causalteleológico do comportamento e a lesão ou perigo a um bem jurídico Com base nas lições filosóficas de Ludwig Wittgenstein e Jürgen Habermas o penalista espanhol Tomás Salvador Vives Antón desenvolveu a teoria da ação significativa ou conceito significativo de ação com substrato normativo apresentando uma nova definição de conduta penalmente relevante Essa proposta doutrinária tem como pilares fundamentais os conceitos de ação e norma unidos pela ideia central de liberdade de ação compreendida como aquela que permite identificar a ação como obra do agente e não do acaso Vives Antón questiona o entendimento da ação no Direito Penal como consequência de uma concepção meramente cartesiana ou seja compreendida como um fato composto de um aspecto físico movimento corporal e de um aspecto mental vontade o qual possibilita tão somente distinguir os fatos humanos dos fatos naturais e dos fatos dos animais A ação deve ser visualizada de forma diversa não como o que as pessoas fazem mas como o significado do que fazem As ações não são meros acontecimentos têm um sentido significado e por isso não basta descrevê las é necessário entendêlas interpretálas Diante dos fatos que podem explicarse segundo as leis físicas químicas biológicas ou matemáticas as ações humanas devem ser interpretadas de acordo com as regras ou normas Como destaca Paulo César Busato As ações não sendo meros acontecimentos exigem interpretação Vale dizer não basta mais que as ações sejam meramente descritas senão que é necessário que elas sejam interpretadas e compreendidas Enquanto os meros fatos da vida podem ser explicados por regras imutáveis como as leis da física da química ou da biologia conquanto ainda nessas ciências o componente da indeterminação já foi identificado as ações humanas têm a característica diferenciadora de que somente podem ser identificadas classificadas e interpretadas conforme regras ou normas Por exemplo não se pode afirmar que um tapa no rosto seja uma lesão corporal uma injúria um comportamento rude ou até mesmo um ato reflexo sem uma análise das circunstâncias em que ocorre para verificação de como deve ser interpretado e compreendido referido tapa até mesmo para a definição de se pode mesmo ser considerado um tapa7 Portanto não existe um conceito universal e ontológico de ação Não há um modelo matemático ou uma fórmula lógica que permita oferecer um conceito de ação humana válido para todas as diferentes espécies de ações que o ser humano pode realizar Em outras palavras as ações não existem previamente às regras que as definem Nesse contexto falase na ação de matar porque antes existe uma norma art 121 do Código Penal definindo essa conduta O conceito de ação resumese à ideia de conduta típica Logo não há um conceito geral de ação mas tantos conceitos de ação como espécies de condutas relevantes para o Direito Penal segundo as diversas características com as que são descritas normativamente Nesse contexto somente se pode perguntar se houve ação humana relevante para o Direito Penal quando se puder relacionála a determinado tipo penal homicídio furto estupro etc Apenas se houver a reunião dos elementos exigidos pela norma tipificadora teremos o significado jurídico do que denominamos crime de homicídio furto estupro etc Destarte a teoria significativa da ação sustenta que os fatos humanos somente podem ser compreendidos por meio das normas ou seja o seu significado existe somente em virtude das normas as quais lhes são preexistentes O tipo incriminador passa a ser entendido como tipo de ação um dos grandes marcos dessa proposta doutrinária Adotamos uma posição finalista indiscutivelmente a mais aceita em provas e concursos públicos Desse modo conduta é a ação ou omissão humana consciente e voluntária dirigida a um fim consistente em produzir um resultado tipificado em lei como crime ou contravenção penal Não há crime sem conduta pois o Direito Penal ao contrário do sugerido por Vicenzo Manzini não aceita os crimes de mera suspeita isto é aqueles em que o agente não é punido por sua conduta e sim pela suspeita despertada pelo seu modo de agir Nesse contexto a contravenção penal prevista no art 25 do Decretolei 36881941 Lei das Contravenções Penais Ter alguém em seu poder depois de condenado por crime de furto ou roubo ou enquanto sujeito à liberdade vigiada ou quando conhecido como vadio ou mendigo gazuas chaves falsas ou alteradas ou instrumentos empregados usualmente na prática de crime de furto desde que não prove destinação legítima não foi recepcionada pela Constituição Federal de 1988 Constituise em resquício do direito penal do autor pois o agente é punido em virtude da sua condição pessoal independentemente da prática de um fato concreto capaz de lesar ou expor a perigo de lesão um bem jurídico penalmente tutelado Na ótica do Supremo Tribunal Federal O art 25 da Lei de Contravenções Penais LCP Decretolei 368841 Art 25 Ter alguém em seu poder depois de condenado por crime de furto ou roubo ou enquanto sujeito à liberdade vigiada ou quando conhecido como vadio ou mendigo gazuas chaves falsas ou alteradas ou instrumentos empregados usualmente na prática de crime de furto desde que não prove destinação legítima Pena prisão simples de dois meses a um ano e multa de duzentos mil réis a dois contos de réis não é compatível com a Constituição de 1988 por violar os princípios da dignidade da pessoa humana CF art 1º III e da isonomia CF art 5º caput e I Essa a conclusão do Plenário que deu provimento a recursos extraordinários julgados em conjunto e absolveu os recorrentes nos termos do art 386 III do CPP Discutiase a temática relativa à recepção do mencionado art 25 da LCP pelo novo ordenamento constitucional No caso os recorrentes foram condenados pela posse injustificada de instrumento de emprego usual na prática de furto tendo em conta condenação anterior pelo aludido crime CP art 155 4º No mérito destacouse que o princípio da ofensividade deveria orientar a aplicação da lei penal de modo a permitir a aferição do grau de potencial ou efetiva lesão ao bem jurídico protegido pela norma Observouse que não obstante a contravenção impugnada ser de mera conduta exigiria para a sua configuração que o agente tivesse sido condenado anteriormente por furto ou roubo ou que estivesse em liberdade vigiada ou que fosse conhecido como vadio ou mendigo Assim salientouse que o legislador teria se antecipado a possíveis e prováveis resultados lesivos o que caracterizaria a presente contravenção como uma infração de perigo abstrato Frisouse que a LCP fora concebida durante o regime ditatorial e por isso o anacronismo do tipo contravencional Asseverou se que a condição especial ser conhecido como vadio ou mendigo atribuível ao sujeito ativo criminalizaria em verdade qualidade pessoal e econômica do agente e não fatos objetivos que causassem relevante lesão a bens jurídicos importantes ao meio social Consignouse no ponto a inadmissão pelo sistema penal brasileiro do direito penal do autor em detrimento do direito penal do fato No que diz respeito à consideração da vida pregressa do agente como elementar do tipo afirmouse o não cabimento da presunção de que determinados sujeitos teriam maior potencialidade de cometer novas infrações penais Por fim registrouse que sob o enfoque do princípio da proporcionalidade a norma em questão não se mostraria adequada e necessária bem como afrontaria o subprincípio da proporcionalidade em sentido estrito8 Quando pratica uma infração penal o ser humano viola o preceito proibitivo crimes comissivos ou preceptivo crimes omissivos contido na lei penal a qual pode ser proibitiva ou preceptiva Leis penais proibitivas são as que proíbem determinados comportamentos e correspondem aos crimes comissivos Quando o tipo penal descreve uma ação a lei penal contém um preceito proibitivo No art 121 do Código Penal o preceito proibitivo é não matar Por seu turno leis penais preceptivas são as que impõem a realização de uma ação isto é reclamam um comportamento positivo Quando o tipo penal descreve uma omissão a lei penal contém um preceito preceptivo e o seu descumprimento se verifica com a omissão de um comportamento devido por lei No art 135 do CP o mandamento é prestar assistência A conduta pode se exteriorizar por ação ou por omissão A ação consiste em um movimento corporal exterior Reclama do ser humano uma postura positiva um fazer Relacionase com a maioria dos delitos por meio de uma norma proibitiva Por outro lado a omissão não se constitui em um mero comportamento estático É sim a conduta de não fazer aquilo que podia e devia ser feito em termos jurídicos e se refere às normas preceptivas A omissão pode ser vislumbrada tanto quando o agente nada faz bem 1 como quando faz algo diferente daquilo que lhe impunha o dever jurídico de agir Exemplo pratica o crime de omissão de socorro definido pelo art 135 do Código Penal o agente que permanece inerte diante da pessoa necessitada assim como aquele que se afasta do local sem prestarlhe assistência A teoria naturalística sustenta ser a omissão um fenômeno causal que pode ser constatado no mundo fático pois em vez de ser considerada uma inatividade caracterizase como verdadeira espécie de ação Portanto quem se omite efetivamente faz alguma coisa Já para a teoria normativa a omissão é um indiferente penal pois o nada não produz efeitos jurídicos Destarte o omitente não responde pelo resultado pois não o provocou Essa teoria contudo aceita a responsabilização do omitente pela produção do resultado desde que seja a ele atribuído por uma norma o dever jurídico de agir Essa é a razão de sua denominação normativa norma A omissão é assim não fazer o que a lei determinava que se fizesse Foi a teoria acolhida pelo Código Penal9 Em verdade nos crimes omissivos próprios ou puros a norma impõe o dever de agir no próprio tipo penal preceito preceptivo Já nos crimes omissivos impróprios espúrios ou comissivos por omissão o tipo penal descreve uma ação preceito proibitivo mas a omissão do agente que descumpre o dever jurídico de agir definido pelo art 13 2º do Código Penal acarreta a sua responsabilidade penal pela produção do resultado naturalístico A conduta se reveste das seguintes características O ser humano e apenas ele pode praticar condutas penalmente relevantes Os acontecimentos naturais e os atos dos seres irracionais produzidos sem a interferência do homem não interessam ao Direito Penal É possível também para quem se filia 2 3 4 a essa posição a prática de condutas por pessoas jurídicas relativamente aos crimes ambientais Somente a conduta voluntária interessa ao Direito Penal A vontade qualquer que seja a teoria adotada é elemento constitutivo da conduta O Direito Penal se alicerça na evitabilidade razão pela qual só são pertinentes as condutas que poderiam ser evitadas Apenas os atos lançados ao mundo exterior ingressam no conceito de conduta O simples querer interno do agente cogitação é desprezado pelo Direito Penal pois ainda não há sequer perigo de lesão ao bem jurídico protegido pela norma Enquanto a vontade não for libertada do claustro psíquico não produz efeitos jurídicos10 A conduta é composta de dois elementos um ato de vontade dirigido a um fim e a manifestação da vontade no mundo exterior por meio de uma ação ou omissão dominada ou dominável pela vontade Esse é o elemento mecânico que concretiza no mundo fático o querer interno do agente Apontamse as seguintes hipóteses como de exclusão da conduta 1 Caso fortuito e força maior são os acontecimentos imprevisíveis e inevitáveis que fogem do domínio da vontade do ser humano E se não há vontade não há dolo nem culpa Consequentemente como dolo e culpa integram a conduta não se configura esse elemento do fato típico Em que pese a ampla divergência doutrinária podese entender o caso fortuito como o acontecimento imprevisível e inevitável provocado pelo homem ex greve de ônibus e por força maior o evento com iguais predicados mas decorrente da natureza ex inundação provocada por uma tempestade 2 Atos ou movimentos reflexos consistem em reação motora ou secretora em consequência de uma excitação dos sentidos O movimento corpóreo não se deve ao elemento volitivo mas sim ao fisiológico Ausente a vontade estará ausente também a conduta É o caso do ortopedista que bate o martelinho contra o joelho do paciente Se em razão do reflexo seu chute atingir o médico não se poderá falar em lesões corporais ou na contravenção de vias de fato Não houve vontade penalmente relevante mas resposta fisiológica à provocação médica Os atos reflexos entretanto não se confundem com as ações em curto circuito derivadas dos atos impulsivos fundamentados em emoções ou paixões violentas Nesses casos há o elemento volitivo que estimula a conduta criminosa Exemplo A passa na direção de B e dele zomba motivandoo a repentinamente desferir socos no provocador Há vontade e por corolário conduta penalmente relevante Os movimentos reflexos devem ser diferenciados ainda dos atos habituais mecânicos ou automáticos que consistem na reiteração de um comportamento É o caso de conduzir veículo automotor com apenas uma das mãos ao volante Caso o agente atropele e mate alguém responderá pelo crime tipificado pelo art 302 da Lei 95031997 Código de Trânsito Brasileiro pois tal hábito era dominável pela vontade 3 Coação física irresistível também chamada de vis absoluta ocorre quando o coagido não tem liberdade para agir Não lhe resta nenhuma outra opção a não ser praticar um ato em conformidade com a vontade do coator Imagine a situação em que um homem muito forte obriga fisicamente outra pessoa bastante franzina a apertar o gatilho de um revólver municiado na direção de seu desafeto Em suma pressiona o dedo do coagido contra o gatilho A vítima é atingida e morre O coagido serviu como instrumento do crime Não agiu de forma voluntária excluindose sua conduta Nesse caso não se pode falar em hipótese alguma em concurso de agentes por falta do elemento subjetivo convergência de vontades exigível para tanto Por outro lado na coação moral irresistível ou vis compulsiva o coagido pode escolher o caminho a ser seguido obedecer ou não a ordem do coator Como a sua vontade existe porém de forma viciada excluise a culpabilidade em face da inexigibilidade de conduta diversa 103 Em suma enquanto a coação física irresistível exclui a conduta e portanto o fato típico a coação moral irresistível funciona como causa excludente da culpabilidade em face da inexigibilidade de conduta diversa 4 Sonambulismo e hipnose também não há conduta por falta de vontade nos comportamentos praticados em completo estado de inconsciência Anotese que a embriaguez voluntária ou culposa embora completa não exclui a conduta Subsiste a imputabilidade e consequentemente a culpabilidade CP art 28 II RESULTADO Resultado é a consequência provocada pela conduta do agente Nada obstante algumas poucas divergências as palavras resultado e evento podem ser utilizadas como sinônimas Anotese porém existir no Brasil a preferência por resultado Essa distinção terminológica é irrelevante Importa considerar somente o que ambas significam11 Em Direito Penal o resultado pode ser jurídico ou naturalístico Resultado jurídico ou normativo é a lesão ou exposição a perigo de lesão do bem jurídico protegido pela lei penal É simplesmente a violação da lei penal mediante a agressão do valor ou interesse por ela tutelado 104 Resultado naturalístico ou material é a modificação do mundo exterior provocada pela conduta do agente É comum a seguinte indagação Existe crime sem resultado E a resposta mais uma vez é Depende Não há crime sem resultado jurídico pois todo delito agride bens jurídicos protegidos pelo Direito Penal Recordese do conceito material de crime segundo o qual não há crime quando a ação ou omissão humana não lesa ou expõe a perigo de lesão bens jurídicos penalmente tutelados Entretanto é possível um crime sem resultado naturalístico O resultado naturalístico estará presente somente nos crimes materiais consumados Se tentado o crime ainda que material não haverá resultado naturalístico Nos crimes formais ainda que possível sua ocorrência é dispensável o resultado naturalístico E finalmente nos crimes de mera conduta ou de simples atividade jamais se produzirá tal espécie de resultado Em síntese todo crime tem resultado jurídico embora não se possa apresentar igual afirmativa em relação ao resultado naturalístico RELAÇÃO DE CAUSALIDADE OU NEXO CAUSAL Empregase comumente a expressão nexo causal para referirse à ligação entre a conduta e o resultado O art 13 do Código Penal todavia preferiu falar em relação de causalidade Essa portanto é a denominação legal Estabelece o art 13 do Código Penal Art 13 O resultado de que depende a existência do crime somente é imputável a quem lhe deu causa Considerase causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido 1º A superveniência de causa relativamente independente exclui a imputação quando por si só produziu o resultado os fatos anteriores entretanto imputamse a quem os praticou 2º A omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para evitar o resultado O dever de agir incumbe a quem a tenha por lei obrigação de cuidado proteção ou vigilância b de outra forma assumiu a responsabilidade de impedir o resultado c com seu comportamento anterior criou o risco da ocorrência do resultado Relação de causalidade é o vínculo formado entre a conduta praticada por seu autor e o resultado por ele produzido É por meio dela que se conclui se o resultado foi ou não provocado pela conduta autorizando se presente a tipicidade a configuração do fato típico Prevalece na doutrina brasileira o entendimento de que a expressão o resultado constante no início do art 13 caput do Código Penal alcança somente o resultado naturalístico isto é a modificação externa provocada pela conduta praticada por alguém Destarte o estudo da relação de causalidade tem pertinência apenas aos crimes materiais Nesses delitos o tipo penal descreve uma conduta e um resultado naturalístico exigindo a produção desse último para a consumação É aí que entra em cena o nexo causal para ligar a conduta do agente ao resultado material Nos crimes de atividade o resultado naturalístico pode ocorrer formais ou não de mera conduta De qualquer forma é dispensável pois se consumam com a simples prática da conduta ilícita Destacamse três teorias na busca de definir a relação de causalidade 1ª teoria Equivalência dos antecedentes também chamada de teoria da equivalência das condições teoria da condição simples teoria da condição generalizadora ou finalmente teoria da conditio sine qua non foi criada por Glaser12 e posteriormente desenvolvida por Von Buri e Stuart Mill em 1873 Para essa teoria causa é todo fato humano sem o qual o resultado não teria ocorrido quando ocorreu e como ocorreu 2ª teoria Teoria da causalidade adequada também chamada de teoria da condição qualificada ou teoria individualizadora originouse dos estudos de Von Kries um fisiólogo e não jurista Causa nesse contexto é o antecedente não só necessário mas adequado à produção do resultado Para que se possa atribuir um resultado à determinada pessoa é necessário que ela além de praticar um antecedente indispensável realize uma atividade adequada à sua concretização Considerase a conduta adequada quando é idônea a gerar o efeito A idoneidade baseiase na regularidade estatística Descarte concluise que a conduta adequada humana e concreta fundase no id quod plerumque accidit excluindo os acontecimentos extraordinários fortuitos excepcionais anormais Não são levadas em conta todas as circunstâncias necessárias mas somente aquelas que além de indispensáveis sejam idôneas à produção do resultado13 Portanto a causa adequada é aferida de acordo com o juízo do homem médio e com a experiência comum Não basta contribuir de qualquer modo para o resultado a contribuição deve ser eficaz 3ª teoria Teoria da imputação objetiva será estudada em tópico separado Acolheuse como regra a teoria da equivalência dos antecedentes É o que se extrai do art 13 caput in fine Considerase causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido Causa pois é todo o comportamento humano comissivo ou omissivo que de qualquer modo concorreu para a produção do resultado naturalístico Pouco importa o grau de contribuição Basta que tenha contribuído para o resultado material na forma e quando ocorreu Não há diferença entre causa condição fator que autoriza à causa a produção de seu efeito ou ocasião circunstância acidental que estimula favoravelmente a produção da causa E para se constatar se algum acontecimento inserese ou não no conceito de causa empregase o processo hipotético de eliminação desenvolvido em 1894 pelo sueco Thyrén Suprimese mentalmente determinado fato que compõe o histórico do crime se desaparecer o resultado naturalístico é porque era também sua causa todavia se com a sua eliminação permanecer íntegro o resultado material não se pode falar que aquele acontecimento atuou como sua causa Confirase o famoso exemplo de Damásio E de Jesus Suponhase que A tenha matado B A conduta típica do homicídio possui uma série de fatos alguns antecedentes dentre os quais podemos sugerir os seguintes 1º a produção do revólver pela indústria 2º aquisição da arma pelo comerciante 3º compra do revólver pelo agente 4º refeição tomada pelo homicida 5º emboscada 6º disparo de projéteis na vítima 7º resultado morte Dentro dessa cadeia de fatos excluindose os fatos sob nos números 1º a 3º 5º e 6º o resultado não teria ocorrido Logo são considerados causa Excluindose o fato sob o número 4º refeição ainda assim o evento teria acontecido Logo a refeição tomada pelo sujeito não é considerada causa14 Contra essa teoria foram endereçadas algumas críticas A principal delas consistiria na circunstância de ser uma teoria cega porque possibilitaria a regressão ao infinito regressus ad infinitum Como causa é todo acontecimento que de qualquer modo contribui para o resultado poderia operarse o retorno ao início dos tempos A matou B Consequentemente poderiam ser seus pais responsabilizados pois sem a concepção do filho a vítima não teria morrido E assim sucessivamente até o primeiro dos seus antepassados Essa crítica contudo é despropositada Para que um acontecimento ingresse na relação de causalidade não basta a mera dependência física Exigese ainda a causalidade psíquica imputatio delicti é dizer reclamase a presença do dolo ou da culpa por parte do agente em relação ao resultado De fato a falta do dolo ou da culpa afasta a conduta a qual por seu turno obsta a configuração do nexo causal A título ilustrativo a venda lícita de uma arma de fogo por si só não ingressa no nexo causal de um homicídio com ela praticado Entretanto se o vendedor sabia da intenção do comprador e desejando a morte do ofendido facilitou de qualquer modo a alienação do produto sua conduta será considerada causa do crime posteriormente cometido Excepcionalmente o Código Penal adota no 1º do art 13 a teoria da causalidade adequada Em síntese o art 13 do Código Penal acolheu como regra a teoria da equivalência dos antecedentes caput in fine e excepcionalmente a teoria da causalidade adequada 1º o que nos remete ao estudo das concausas A palavra concausa diz respeito à concorrência de causas ou seja há mais de uma causa contribuindo para o resultado final Em outras palavras concausa é a convergência de uma causa externa à vontade do autor da conduta e que influi na produção do resultado naturalístico por ele desejado Causa dependente é a que precisa da conduta do agente para provocar o resultado ou seja não é capaz de produzilo por si própria razão pela qual não exclui a relação de causalidade Exemplo A tem a intenção de matar B Após espancálo coloca uma corda em seu pescoço amarrandoa ao seu carro Em seguida dirige o automóvel arrastando a vítima ao longo da estrada circunstância que provoca a sua morte A estrada a corda e o carro não são capazes de matar a vítima se isoladamente consideradas De fato tais acontecimentos somente levaram ao óbito porque o agente havia previamente espancado a vítima e depois a amarrou com uma corda ao carro e arrastou o corpo pela via pública Causa independente por sua vez é aquela capaz de produzir por si só o resultado15 Pode ser de natureza absoluta ou relativa dependendo da sua origem São aquelas que não se originam da conduta do agente isto é são absolutamente desvinculadas da sua ação ou omissão ilícita E por serem independentes produzem por si sós o resultado naturalístico Constituem a chamada causalidade antecipadora16 pois rompem o nexo causal Dividemse em preexistentes ou estado anterior concomitantes e supervenientes É aquela que existe anteriormente à prática da conduta O resultado naturalístico teria ocorrido da mesma forma mesmo sem o comportamento ilícito do agente Exemplo A efetua disparos de arma de fogo contra B atingindoo em regiões vitais O exame necroscópico todavia conclui ter sido a morte provocada pelo envenenamento anterior efetuado por C É a que incide simultaneamente à prática da conduta Surge no mesmo instante em que o agente realiza seu comportamento criminoso Exemplo A efetua disparos de arma de fogo contra B no momento em que o teto da casa deste último desaba sobre sua cabeça É a que se concretiza posteriormente à conduta praticada pelo agente Exemplo A subministra dose letal de veneno a B mas antes que se produzisse o efeito almejado surge C antigo desafeto de B que nele efetua inúmeros disparos de arma de fogo por todo o corpo matandoo Em todas as modalidades preexistentes concomitantes e supervenientes o resultado naturalístico ocorre independentemente da conduta do agente As causas surgem de forma autônoma isto é não se ligam ao comportamento criminoso do agente E por serem independentes produzem por si sós o resultado material17 Por corolário devem ser imputados ao agente somente os atos praticados e não o resultado naturalístico em face da quebra da relação de causalidade De fato suprimindo mentalmente sua conduta ainda assim o resultado teria ocorrido como ocorreu Respeitase a teoria da equivalência dos antecedentes ou conditio sine qua non adotada pelo art 13 caput in fine do Código Penal Nos exemplos mencionados o agente responde somente por tentativa de homicídio e não por homicídio consumado Originamse da própria conduta efetuada pelo agente Daí serem relativas pois não existiriam sem a atuação criminosa Como entretanto tais causas são independentes têm idoneidade para produzir por si sós o resultado já que não se situam no normal trâmite do desenvolvimento causal Classificamse em preexistentes ou estado anterior concomitantes e supervenientes Existe previamente à prática da conduta do agente Antes de seu agir ela já estava presente Exemplo A com ânimo homicida efetua disparos de arma de fogo contra B atingindoa de raspão Os ferimentos contudo são agravados pela diabete da vítima que vem a falecer É a que ocorre simultaneamente à prática da conduta Exemplo A aponta uma arma de fogo contra B o qual assustado corre em direção a movimentada via pública No momento em que é alvejado pelos disparos é atropelado por um caminhão morrendo Em obediência à teoria da equivalência dos antecedentes ou conditio sine qua non adotada pelo art 13 caput in fine do Código Penal nas duas hipóteses o agente responde pelo resultado naturalístico Com efeito suprimindose mentalmente a sua conduta o resultado material que nos exemplos acima seria a morte da vítima não teria ocorrido quando e como ocorreu Em face da regra prevista no art 13 1º do Código Penal as causas supervenientes relativamente independentes podem ser divididas em dois grupos 1 as que produzem por si sós o resultado e 2 as que não produzem por si sós o resultado Incide a teoria da equivalência dos antecedentes ou da conditio sine qua non adotada como regra geral no tocante à relação de causalidade CP art 13 caput in fine O agente responde pelo resultado naturalístico pois suprimindose mentalmente a sua conduta o resultado não teria ocorrido como e quando ocorreu Exemplo A com a intenção de matar efetua disparos de arma de fogo contra B Por má pontaria atingeo em uma das pernas não oferecendo risco de vida Contudo B é conduzido a um hospital e por imperícia médica vem a morrer Nesse caso B não teria morrido ainda que por imperícia médica sem a conduta inicial de A De fato somente pode falecer por falta de qualidade do profissional da medicina aquele que foi submetido ao seu exame no exemplo justamente pela conduta homicida que redundou no encaminhamento da vítima ao hospital A imperícia médica por si só não é capaz de matar qualquer pessoa mas somente aquela que necessita de cuidados médicos Nesse sentido é a orientação do Superior Tribunal de Justiça O fato de a vítima ter falecido no hospital em decorrência das lesões sofridas ainda que se alegue eventual omissão no atendimento médico encontrase inserido no desdobramento físico do ato de atentar contra a vida da vítima não caracterizando constrangimento ilegal a responsabilização criminal por homicídio consumado em respeito à teoria da equivalência dos antecedentes causais adotada no Código Penal e diante da comprovação do animus necandi do agente18 É a situação tratada pelo 1º do art 13 do Código Penal A superveniência de causa relativamente independente exclui a imputação quando por si só produziu o resultado os fatos anteriores entretanto imputamse a quem os praticou grifamos Nesse dispositivo foi acolhida a teoria da causalidade adequada Logo causa não é mais o acontecimento que de qualquer modo concorre para o resultado Muito pelo contrário passa a ser causa apenas a conduta idônea com base em um juízo estatístico e nas regras de experiência id quod plerumque accidit a provocar a produção do resultado naturalístico Não basta qualquer contribuição Exigese uma contribuição adequada Os exemplos famosos são 1 pessoa atingida por disparos de arma de fogo que internada em um hospital falece não em razão dos ferimentos e sim queimada por um incêndio que destrói toda a área dos enfermos e 2 ferido que morre durante o trajeto para o hospital em face de acidente de tráfego que atinge a ambulância que o transportava Em ambos os casos a incidência da teoria da equivalência dos antecedentes acarretaria a imputação do resultado naturalístico ao responsável pelos ferimentos pois eliminandose em abstrato sua conduta certamente a morte não teria ocorrido quando e como ocorreu Todavia repitase não foi em vão a redação do 1º do art 13 do Código Penal pelo legislador Essa regra foi ali expressamente colocada por força da preferência nesse caso pela teoria da causalidade adequada A expressão por si só revela a autonomia da causa superveniente que embora relativa não se encontra no mesmo curso do desenvolvimento causal da conduta praticada pelo autor Em outras palavras depois do rompimento da relação de causalidade a concausa manifesta a sua verdadeira eficácia produzindo o resultado por sua própria força ou seja invoca para si a tarefa de concretizar o resultado naturalístico Nos exemplos acima mencionados concluise que qualquer pessoa que estivesse na área da enfermaria do hospital ou no interior da ambulância poderia morrer em razão do acontecimento inesperado e imprevisível e não somente a ferida pela conduta praticada pelo agente Portanto a simples concorrência de qualquer modo não é suficiente para a imputação do resultado material produzido anotese por uma causa idônea e adequada por si só para fazêlo O art 13 1º cuidou exclusivamente das causas supervenientes relativamente independentes que produzem por si sós o resultado Não falou das preexistentes nem das concomitantes o que é alvo de crítica por parte da doutrina especializada A propósito aduz Paulo José da Costa Júnior Não vemos motivo para que se levante uma barreira tão rígida entre causas que apresentam estrutura idêntica e eficiência equivalente Consequentemente teria sido preferível que a nova lei penal houvesse contemplado no 1º do art 13 a par da superveniência a preexistência ou a intercorrência de causa relativamente independente É com base em uma aplicação analógica que se pode coerentemente fazer semelhante extensão Desde que o dispositivo em foco se destina a favorecer a posição do agente tratandose de uma analogia in bonam partem é ela admissível em direito penal19 O gráfico abaixo bem sintetiza tudo o que foi dito A omissão penalmente relevante encontrase disciplinada pelo art 13 2º do Código Penal A omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para evitar o resultado O dispositivo é aplicável somente aos crimes omissivos impróprios espúrios ou comissivos por omissão isto é aqueles em que o tipo penal descreve uma ação mas a inércia do agente que podia e devia agir para impedir o resultado naturalístico conduz à sua produção São crimes materiais como é o caso do homicídio cometido em regra por ação mas passível também de ser praticado por inação desde que o agente ostente o poder e o dever de agir De fato os crimes omissivos próprios ou puros não alojam em seu bojo um resultado naturalístico A omissão é descrita pelo próprio tipo penal e o crime se consuma com a simples inércia do agente Não são assim compatíveis com a figura da tentativa É o que se dá na omissão de socorro CP art 135 ou o sujeito presta assistência ao necessitado e não há crime ou omitese consumando automaticamente o delito Esse é o significado da expressão penalmente relevante a omissão que não é típica por não estar descrita pelo tipo penal somente se torna penalmente relevante quando presente o dever de agir Nos crimes omissivos impróprios a omissão pode com o dever de agir ser penalmente relevante Por outro lado nos crimes omissivos próprios a omissão sempre é penalmente relevante pois se encontra descrita pelo tipo penal tal como nos arts 135 e 269 do Código Penal O art 13 2º do Código Penal no tocante à natureza jurídica da omissão acolheu a teoria normativa pela qual a omissão é um nada e do nada nada surge Não é punível de forma independente ou seja não se pune alguém pelo simples fato de ter se omitido Só tem importância jurídicopenal quando presente o dever de agir Daí a preferência pela teoria normativa A omissão somente interessa ao Direito Penal quando diante da inércia do agente o ordenamento jurídico lhe impunha uma ação um fazer Há dois critérios acerca da fixação do dever de agir legal e judicial Para o critério legal é a lei que deve arrolar taxativamente as hipóteses do dever de agir Cuidase de critério mais seguro por afastar incertezas e impedir variantes indesejadas que poderiam surgir na interpretação da situação submetida à análise do Poder Judiciário Por ele optou o legislador pátrio ao indicar nas alíneas a b e c do 2º do art 13 do Código Penal as pessoas a quem incumbe o dever de agir Além disso esse ônus precisa ser especificamente dirigido a pessoa ou pessoas determinadas e não genericamente a todos os indivíduos Na linha do entendimento do Superior Tribunal de Justiça Nos termos do art 13 2º do Código Penal a omissão é penalmente relevante quando o agente devia e podia agir para evitar o resultado o que não é a hipótese dos autos A obrigação genérica atribuída a todos os cidadãos de preservar o meio ambiente para as gerações futuras consoante o art 225 da Constituição Federal não se amolda ao dever imposto por lei de cuidar proteger eou vigiar exigido na hipótese de crime omissivo impróprio20 Por sua vez o critério judicial permite ao magistrado no caso concreto decidir pela presença ou não do dever de agir É defendido por Alberto Silva Franco e Rui Stoco para quem É evidente que a inserção do dever ético resultante da solidariedade social como fonte geradora do dever de atuar ao lado da lei do contrato e da ingerência torna cada vez mais amplo o tipo comissivo por omissão aumentando a área de manobra do juiz na definição de quem deva ocupar a posição de garante do bem jurídico tutelado Diante da alternativa ou enumerar em artigo de lei as fontes geradoras do dever de atuar ou compor figuras típicas de omissão imprópria não há dúvida de que a opção que melhor atende ao direito de liberdade do cidadão é a segunda21 O art 13 2º do Código Penal é cristalino não é suficiente o dever de agir Exigese mais A omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para evitar o resultado Quem tem o dever de agir não pratica automaticamente uma conduta penalmente reprovável É necessário que tenha se omitido quando devia e podia agir de forma a impedir o resultado Por essa razão a possibilidade de agir tem sido considerada elemento ou pressuposto do conceito de omissão que surge como a não realização de conduta possível e esperada22 Poder de agir é a possibilidade real e efetiva de alguém na situação concreta e em conformidade com o padrão do homem médio evitar o resultado penalmente relevante Exemplo Um bombeiro tem o dever de impedir o afogamento de uma criança em uma praia Não pode agir contudo se acidentalmente quebra suas duas pernas ao pisar em um buraco cavado por crianças quando corria em direção à infante que afundava Estão disciplinadas pelas alíneas a a c do 2º do art 13 do Código Penal23 pelo qual o dever de agir incumbe a quem a Tenha por lei obrigação de cuidado proteção ou vigilância Tratase do dever legal relativo às pessoas que por lei têm a obrigação de impedir o resultado É o que se dá com os pais em relação aos filhos menores bem como com os policiais no tocante aos indivíduos em geral O Código Penal utilizou a palavra lei em sentido amplo valendose da teoria das fontes Engloba os deveres impostos pela ordem jurídica considerada em sua totalidade Nas palavras de Luiz Luisi Neste dispositivo o nosso legislador se referiu não apenas à lei mas especificou os deveres de cuidado proteção e de vigilância e adotando essa redação não se limitou à chamada teoria formal mas acolheu a teoria das fontes Tratase de deveres que são impostos pela ordem jurídica lato sensu Não são apenas obrigações decorrentes de lei em sentido estrito mas de qualquer disposição que tenha eficácia de forma a poder constituir um vínculo jurídico É o caso dos decretos dos regulamentos das portarias e mesmo das sentenças judiciais e provimentos judiciários em geral e até de ordem legítima de autoridade hierarquicamente superior Podem tais deveres outrossim derivar de norma penal como de norma extrapenal tanto de direito público como de direito privado24 b De outra forma assumiu a responsabilidade de impedir o resultado A expressão de outra forma significa qualquer obrigação de impedir o resultado que não seja decorrente da lei versada pela alínea a É o que se convencionou chamar de garante ou dever de garantidor da não produção do resultado naturalístico Antes da Reforma da Parte Geral do Código Penal pela Lei 72091984 apontavase em sede doutrinária a relação contratual como fonte do dever de agir Alargouse posteriormente à modificação legislativa o conceito de garantidor visando abranger além dos negócios jurídicos em geral as relações advindas da vida cotidiana independentemente de vinculação jurídica entre os envolvidos Cuidase de conceito a ser extensivamente compreendido Nesse sentido incumbe o dever de agir tanto ao professor de natação contratado para ensinar uma pessoa a nadar negócio jurídico como ao nadador experiente que convida um amigo iniciante a atravessar um canal de águas correntes e geladas situação concreta da vida Nos dois casos se o principiante enfrentar problemas o garantidor se possível fazêlo deverá impedir o resultado sob pena de têlo a si imputado Com igual entendimento sustenta Francisco de Assis Toledo O Código todavia não definiu o modo ou os casos em que o obrigado assume a posição de garante Nem se deve restringir esta hipótese às obrigações de índole puramente contratual de sorte a permitirse o transplante para a área penal de infindáveis discussões sobre questões prejudiciais em torno da validade ou da eficácia do contrato gerador da obrigação a posição de garante surge para todo aquele que por ato voluntário promessas veiculação publicitária ou mesmo contratualmente capta a confiança dos possíveis afetados por resultados perigosos assumindo com estes a título oneroso ou não a responsabilidade de intervir quando necessário para impedir o resultado lesivo25 A responsabilidade do garantidor subsiste enquanto ele estiver no local em que tem a obrigação de impedir o resultado Durante o tempo em que lá permanecer estará vinculado ao dever de agir porque dele ainda não se desvencilhou Exemplo a enfermeira contratada para cuidar da pessoa idosa e doente mesmo com encerramento da sua jornada é obrigada a cuidar da sua paciente enquanto não tiver deixado o local de trabalho transmitindo legitimamente a outra pessoa o nobre encargo No campo processual é preciso destacar que a omissão penalmente relevante precisa ser expressamente descrita na inicial acusatória sob pena de inépcia da denúncia ou da queixacrime Para o Superior Tribunal de Justiça É inepta denúncia que impute a prática de homicídio na forma omissiva imprópria quando não há descrição clara e precisa de como a acusada médica cirurgiã de sobreaviso poderia ter impedido o resultado morte sendo insuficiente a simples menção do não comparecimento da denunciada à unidade hospitalar quando lhe foi solicitada a presença para prestar imediato atendimento a paciente que foi a óbito Com efeito o legislador estabeleceu alguns requisitos essenciais para a formalização da acusação a fim de que seja assegurado ao acusado o escorreito exercício do contraditório e da ampla defesa pois a higidez da denúncia é uma garantia do denunciado Neste contexto quando se imputa a alguém crime comissivo por omissão art 13 2º b do CP é necessário que se demonstre o nexo normativo entre a conduta omissiva e o resultado normativo porque só se tem por constituída a relação de causalidade se baseado em elementos empíricos for possível concluir com alto grau de probabilidade que o resultado não ocorreria se a ação devida fosse efetivamente realizada26 c Com seu comportamento anterior criou o risco da ocorrência do resultado Cuidase da ingerência ou situação precedente Em suma aquele que com o seu comportamento anterior criou uma situação de perigo tem o dever de agir para impedir o resultado lesivo ao bem jurídico Exemplo O marinheiro que lança ao mar um tripulante do navio tem o dever de salválo da morte Se não o fizer responde pelo homicídio A dupla causalidade é de difícil ocorrência prática o que não impede a sua formulação no plano teórico Cuidase da situação em que duas ou mais condutas independentes entre si e praticadas por pessoas diversas que não se encontram subjetivamente ligadas produzem simultaneamente o resultado naturalístico por elas desejado Exemplo A ministra veneno na comida de B enquanto almoçavam em um restaurante Ao mesmo tempo C que também estava sentado à mesa coloca veneno na comida de B A e C não têm ciência do propósito criminoso alheio As doses subministradas produzem por si sós efeito imediato matando B Questionase Qual crime deve ser imputado aos agentes Poderseia alegar que suprimindo mentalmente a conduta de A mesmo assim B teria morrido Da mesma forma eliminada hipoteticamente a ação de C subsistiria a morte da vítima Seria então correto falar que nem A nem C mataram B Se sim quem matou Inclinase a doutrina pela punição de ambos os autores por homicídio consumado No Brasil o crime seria inclusive qualificado pelo emprego de meio insidioso veneno A resposta seria diversa se o veneno ministrado por algum deles tivesse ainda que por pouco tempo apressado a morte porque a conduta do outro poderia ser suprimida que ainda assim ocorreria o resultado naturalístico27 Em 1927 Karl Larenz introduz no Direito o conceito de imputação na obra intitulada A teoria da imputação de Hegel e o conceito de imputação objetiva com a finalidade de distinguir as consequências de atos que podem ser atribuídos ao acaso e atos que são obras do ser humano Richard Honig em 1930 no livro Causalidade e imputação objetiva traz para o Direito Penal as ideias de Larenz buscando delinear um critério seguro para a atribuição de um resultado ilícito a alguém Finalmente Claus Roxin em 1970 no ensaio Reflexões sobre a problemática da imputação no direito penal desenvolve a moderna teoria da imputação objetiva Em uma perspectiva clássica o tipo penal apresentava apenas aspectos objetivos representados na relação de causalidade Consideravase realizado o tipo toda vez que alguém causava o resultado nele previsto de acordo com a teoria da equivalência dos antecedentes A causalidade gerava assim o problema do regressus ad infinitum cuja restrição só podia ser efetuada no âmbito da ilicitude ou na maior parte das vezes da culpabilidade que englobava o dolo e a culpa Para resolver esse problema o sistema finalista conferiu ao tipo penal também uma feição subjetiva com a inclusão na conduta do dolo e da culpa Exemplo Se A fabricante de armas de fogo produz aquela que posteriormente foi adquirida por B para matar C não poderá ser penalmente responsabilizado Para a teoria clássica por ausência de culpabilidade para a teoria finalista porque o fato é atípico uma vez ausente o dolo ou a culpa Para os adeptos da teoria da imputação objetiva contudo o sistema finalista ao limitar o tipo objetivo à relação de causalidade de acordo com a teoria da equivalência dos antecedentes não resolve todos os problemas inerentes à imputação Vejamos o exemplo apresentado por Claus Roxin Imaginemos que A venda heroína a B Os dois sabem que a injeção de certa quantidade de tóxico gera perigo de vida mas assumem o risco de que a morte ocorra A o faz porque o que lhe interessa é principalmente o dinheiro e B por considerar sua vida já estragada e só suportável sob estado de entorpecimento Deve A ser punido por homicídio cometido com dolo eventual na hipótese de B realmente injetar em si o tóxico e em decorrência disso morrer A causalidade de A para a morte de B bem como seu dolo eventual encontramse fora de dúvida Se considerarmos a causalidade suficiente para a realização do tipo objetivo teremos que concluir pela punição28 Assim para resolver o caso narrado entre outros sem solução possível pelo sistema finalista a teoria da imputação objetiva insere duas novas elementares29 no tipo objetivo que deixa de ser só causalidade Logo com a adoção da teoria da imputação objetiva a relação de causalidade somente estaria caracterizada quando ultrapassadas três etapas Ao contrário do que seu nome parece em princípio indicar não se confunde com a responsabilidade penal objetiva Sua função é completamente diversa limitar a responsabilidade penal pois a atribuição de um resultado a uma pessoa não é determinada pela relação de causalidade mas é necessário outro nexo de modo que esteja presente a realização de um risco proibido pela norma30 Seria mais apropriado portanto falar em teoria da não imputação objetiva pois a sua missão precípua é evitar a atribuição indevida e objetiva de um resultado típico a alguém Essa teoria é aplicável exclusivamente aos crimes materiais nos quais pode ser produzido um resultado naturalístico cuja imputação deve ser cautelosamente atribuída ao agente Não tem cabimento nos crimes formais e de mera conduta já que neles inexiste resultado naturalístico ligado à conduta Portanto sequer é necessária a utilização da teoria da equivalência dos antecedentes Para Luís Greco a imputação objetiva enuncia o conjunto de pressupostos genéricos que fazem da causação uma causação objetivamente típica e estes pressupostos são a criação de um risco juridicamente desaprovado e a realização deste risco no resultado31 Assim de acordo com a teoria não basta a relação de causalidade para imputação do resultado devendo estar presentes 1 A criação ou o aumento de um risco a b Em face da sua função de proteção de bens jurídicos o Direito Penal deveria limitarse a proibir ações perigosas que coloquem em risco esses mesmos bens No entanto o que é risco Podem ser consideradas como risco aquelas ações que por meio de uma prognose póstuma objetiva geram uma possibilidade de lesão ao bem jurídico Prognose pois se refere à situação do agente no momento da ação póstuma porque será feita pelo magistrado depois da prática do fato e objetiva pois parte do conhecimento de um homem prudente homo medius na mesma hipótese analisada Como no exemplo clássico em que um sobrinho manda um tio em uma viagem de avião com a intenção de que o avião caia e o tio morra não haveria responsabilidade do sobrinho se a sua intenção se concretizasse pois viajar de avião não gera real possibilidade de dano No entanto a situação será diferente se o sobrinho tiver conhecimento de que haverá um ataque terrorista naquele determinado voo Em síntese será perigosa a ação que aos olhos de um observador objetivo dotado dos conhecimentos especiais do autor situado no momento da prática da ação gere real possibilidade de dano para um determinado bem32 Por outro lado afirmase não haver ação perigosa quando o risco for juridicamente irrelevante a ação não gera uma possibilidade real de dano ou há diminuição do risco avaliado antes da ação pelo agente como no exemplo de Roxin quem convence o ladrão a furtar não 1000 mas somente 100 marcos alemães não é punível por participação no furto pois sua conduta não elevou mas diminuiu o risco de lesão33 2 O risco criado deve ser proibido pelo Direito Nem toda ação perigosa é proibida pelo Direito Devese fazer uma ponderação entre a necessidade de proteção de determinado bem jurídico e o interesse geral de liberdade Exemplificativamente embora dirigir um veículo automotor possa eventualmente causar acidentes permitese tal conduta Da mesma forma são regulamentados alguns esportes como o automobilismo e o boxe que podem causar lesões aos seus praticantes Vejase que pela teoria finalista na lesão provocada em uma luta de boxe haveria uma causa de justificação exclusão da ilicitude enquanto para a imputação objetiva o fato é atípico por se tratar de um risco permitido Como esclarece Günther Jakobs Um comportamento que gera um risco permitido é considerado socialmente normal não porque no caso concreto esteja tolerado em virtude do contexto em que se encontra mas porque nessa configuração é aceito de modo natural Portanto os comportamentos que criam riscos permitidos não são comportamentos que devam ser justificados mas que não realizam tipo algum34 Dentro do conceito de risco permitido se insere o princípio da confiança De acordo com esse princípio não pratica conduta típica quem agindo de acordo com as regras legais envolvese em situação em que terceiro descumprindo com o seu dever de cuidado permite a produção do resultado Por exemplo se estamos dirigindo e vemos à distância um cidadão aguardando um momento oportuno para cruzar a rua confiamos que ele não vai tentar a travessia na frente do veículo em movimento Da mesma forma se entregamos nosso automóvel para o conserto dos freios que apresentam deficiência ao sair da oficina acreditamos que o defeito esteja sanado Assim o risco de certos comportamentos não depende somente de nós mas também dos outros cidadãos35 Destarte há confiança de que a conduta de terceiros realizada na sequência bem como a conduta anterior será conforme ao Direito de forma que se essa expectativa não se realizar será atípica a conduta daquele que age corretamente Há algumas decisões do Superior Tribunal de Justiça adotando a teoria da imputação objetiva a b c De acordo com a Teoria Geral da Imputação Objetiva o resultado não pode ser imputado ao agente quando decorrer da prática de um risco permitido ou de uma ação que visa a diminuir um risco não permitido o risco permitido não realize o resultado concreto e o resultado se encontre fora da esfera de proteção da norma O risco permitido deve ser verificado dentro das regras do ordenamento social para o qual existe uma carga de tolerância genérica É o risco inerente ao convívio social e portanto tolerável Hipótese em que o agente agiu em desconformidade com as regras de trânsito criou um risco não permitido causando resultado jurídico abrangido pelo fim de proteção da norma de cuidado morte da vítima atraindo a incidência da imputabilidade objetiva36 Ainda que se admita a existência de relação de causalidade entre a conduta dos acusados e a morte da vítima à luz da teoria da imputação objetiva necessária é a demonstração da criação pelos agentes de uma situação de risco não permitido não ocorrente na hipótese porquanto é inviável exigir de uma Comissão de Formatura um rigor na fiscalização das substâncias ingeridas por todos os participantes de uma festa Associada à teoria da imputação objetiva sustenta a doutrina que vigora o princípio da confiança as pessoas se comportarão em conformidade com o direito o que não ocorreu in casu pois a vítima veio a afogarse segundo a denúncia em virtude de ter ingerido substâncias psicotrópicas comportandose portanto de forma contrária aos padrões esperados afastando assim a responsabilidade dos pacientes diante da inexistência de previsibilidade do resultado acarretando a atipicidade da conduta37 A doutrina aponta ainda como causas de exclusão do risco proibido o comportamento exclusivo da vítima que se coloca em perigo autocolocação da vítima em situação de perigo as contribuições socialmente neutras como no exemplo de Jakobs em que o padeiro vende o pão ao autor consciente de que este o usará para envenenar alguém os comportamentos socialmente adequados princípio da adequação social e d a b c a proibição de regresso Pela proibição de regresso não haveria criação de um risco proibido nos casos em que a ação não dolosa de alguém precedesse a ação dolosa de um terceiro Assim aquele que esquece a sua arma que vem a ser encontrada por outrem posteriormente e utilizada para a prática de um crime de homicídio não seria responsabilizado Quanto aos últimos dois aspectos comportamentos socialmente adequados e proibição de regresso não há consenso doutrinário acerca de serem causas de exclusão do risco de forma que qualquer afirmação nesse sentido deve ser feita com redobrada cautela38 3 O risco foi realizado no resultado A norma de proibição visa evitar que um certo bem jurídico seja afetado de uma determinada maneira Assim só haverá realização do risco se a proibição da conduta for justificada para evitar a lesão de determinado bem jurídico por meio de determinado curso causal os quais venham efetivamente a ocorrer39 É o fim de proteção da norma a que aludem os doutrinadores modernos Com o mesmo fundamento apontase ainda a hipótese do aumento do risco pelo comportamento proibido em comparação com o comportamento hipotético correto Tanto na realização do risco como no seu aumento há exclusão da imputação na lesão ou curso causal sem relação com o risco proibido nos danos tardios relacionados à lesão anterior causada ao bem jurídico ex a vítima de lesões corporais alguns anos depois perde o equilíbrio em razão da lesão nunca completamente curada e cai sofrendo várias fraturas nos danos causados a outrem resultantes de choque causado pelo fato criminoso praticado ex mãe cardíaca falece ao saber do assassinato do filho d e nas ações perigosas de salvamento ex A ateia fogo na casa de B na ausência deste mas B reentra para salvar sua coleção de CDs de playstation 2 não piratas falecendo e no comportamento indevido posterior de um terceiro ex vítima de lesões que necessitando de uma cirurgia vem a falecer em razão de erro médico grosseiro40 As ideias até aqui expostas podem ser resumidas pelo seguinte quadro Apresentadas as linhas mestras da teoria da imputação objetiva mister se faz analisar as variantes de seus maiores defensores na atualidade Claus Roxin e Günther Jakobs Claus Roxin visa com o desenvolvimento da teoria determinar um critério de imputação capaz de concretizar a finalidade da norma penal41 Para ele um resultado só deve ser imputado como sua obra e preenche o tipo objetivo unicamente quando 1 o comportamento do autor cria um risco não permitido para o objeto da ação 2 o risco se realiza no resultado concreto e 3 este resultado se encontra dentro do alcance do tipo42 Günther Jakobs acrescenta ao conceito de imputação o elemento da imputação objetiva do comportamento Nessa linha de raciocínio 1 Os seres humanos encontramse em um mundo social na condição de portadores de um papel isto é como pessoas que devem administrar um determinado segmento do acontecer social conforme um determinado padrão 2 Entre autor vítima e terceiros segundo os papéis que desempenhem deve determinarse a quem compete por si só ou junto com outros o acontecer relevante é dizer quem por ter violado seu papel administrandoo de modo deficiente responde jurídico penalmente ou se foi a vítima quem violou seu papel deve assumir o dano por si mesma Se todos se comportam conforme o papel só fica a possibilidade de explicar o ocorrido como fatalidade ou acidente 3 Isto vale tanto para os fatos dolosos como para os fatos culposos só que no âmbito dos fatos dolosos frequentemente a violação do papel é tão evidente que não necessita maior explicação a qual é menos habitual nos fatos culposos43 O penalista alemão entende pela ausência de imputação em quatro hipóteses 1 risco permitido 2 princípio da confiança 3 proibição do regresso e 4 competência ou capacidade da vítima Sustenta a permanência da causalidade natural na aferição da responsabilidade criminal funcionando a imputação como critério de restrição do nexo causal a b c d e 105 Concluise que a proposta dos defensores da teoria da imputação objetiva é a inclusão de novas elementares no tipo objetivo criandose o conceito de causalidade normativa em oposição à causalidade natural presente na teoria finalista Consequentemente algumas vozes sustentam a íntima relação no campo da causalidade da teoria da imputação objetiva com as regras da física quântica Não basta a mera relação de causa e efeito causalidade física entre conduta e resultado naturalístico Falase por essa razão em direito penal quântico caracterizado pela presença da relação de causalidade normativa e da tipicidade material44 A inclusão de tais elementos visa resolver no âmbito do fato típico certos casos que para as demais teorias seriam solucionados em outros aspectos como a ilicitude e a culpabilidade Rogério Greco faz uma compilação de conclusões acerca da teoria em análise que podem ser aproveitadas no presente estudo a imputação objetiva é uma análise que antecede à imputação subjetiva a imputação objetiva pode dizer respeito ao resultado ou ao comportamento do agente a expressão mais apropriada seria teoria da não imputação uma vez que a teoria visa com as suas vertentes evitar a imputação objetiva do resultado ou do comportamento do tipo penal a alguém a teoria da imputação foi criada inicialmente para se contrapor aos dogmas da teoria da equivalência erigindo uma relação de causalidade jurídica ou normativa ao lado daquela outra de natureza material uma vez concluída pela não imputação objetiva afastase o fato típico45 TIPICIDADE A tipicidade elemento do fato típico dividese em formal e material Tipicidade formal é o juízo de subsunção entre a conduta praticada pelo agente no mundo real e o modelo descrito pelo tipo penal adequação ao catálogo46 É a operação pela qual se analisa se o fato praticado pelo agente encontra correspondência em uma conduta prevista em lei como crime ou contravenção penal A conduta de matar alguém tem amparo no art 121 do Código Penal Há portanto tipicidade entre tal conduta e a lei penal De seu turno tipicidade material ou substancial é a lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico penalmente tutelado em razão da prática da conduta legalmente descrita A tipicidade material relacionase intimamente com o princípio da ofensividade ou lesividade do Direito Penal pois nem todas as condutas que se encaixam nos modelos abstratos e sintéticos de crimes tipicidade formal acarretam dano ou perigo ao bem jurídico É o que se dá a título ilustrativo nas hipóteses de incidência do princípio da insignificância nas quais nada obstante a tipicidade formal não se verifica a tipicidade material A presença simultânea da tipicidade formal e da tipicidade material caracteriza a tipicidade penal A definição atual da tipicidade deriva das ideias do alemão Ernst von Beling datadas de 1906 Abandonouse o corpus delicti denominado em alemão de Tatbestand o qual subsistia desde o Direito Romano com origem processual para abarcar todas as características e elementos do delito abrangendo a materialidade do fato delituoso a ilicitude e a culpabilidade para se criar a concepção objetiva do tipo penal operandose a distinção entre a tipicidade e a ilicitude Na Alemanha atualmente ainda se fala em Tatbestand hipótese de fato termo traduzido para o italiano como fattispecie e para o português como tipo Antes de 1906 contudo não era destinado à palavra qualquer conteúdo sistemático semelhante ao atual Antes de Beling pois o crime se dividia em dois blocos ilicitude de ordem objetiva e culpabilidade de natureza subjetiva Não se falava em tipicidade Posteriormente à criação de Beling o delito passou a possuir três partes tipicidade e ilicitude ambas objetivas e culpabilidade de ordem subjetiva Assim o tipo englobava apenas os aspectos exteriores da conduta dispensando os elementos internos do agente Beling definiu a tipicidade como mero processo de adequação do fato concreto ao tipo penal Iniciavase assim a fase da independência do tipo desvinculandose completamente a tipicidade da ilicitude com função meramente descritiva sem nenhum conteúdo valorativo Essa fase intimamente relacionada com a teoria mecanicista clássica naturalista ou causal da conduta perdeu espaço com o surgimento da teoria finalista da conduta e com o descobrimento dos elementos subjetivos do tipo Em 1915 Max Ernst Mayer retomando os estudos de Beling publica seu Tratado de Direito Penal e nele revela seu objetivo de aprimorar a teoria da tipicidade conferindo a ela a função de indício da ilicitude teoria indiciária ou da ratio cognoscendi A tipicidade autoriza a presunção relativa de ilicitude a qual cede diante de prova em sentido contrário com a comprovação da ocorrência de alguma eximente Nascia a fase da tipicidade como indício da ilicitude Além disso Mayer também contribuiu ao Direito Penal com a introdução de elementos normativos no tipo penal contrariando a proposta de Beling que não admitia na tipicidade qualquer elemento relativo à ilicitude ou à culpabilidade É desde então a teoria mais aceita no Direito Penal Consagrase um sistema tripartido dependendo a análise do crime de três fases distintas e sucessivas tipicidade ilicitude e culpabilidade47 Sua utilidade prática repousa na inversão do ônus da prova no tocante às causas de exclusão da ilicitude Em outras palavras à acusação basta demonstrar a tipicidade do fato pois desponta como a sua ilicitude Em síntese o fato típico presumese igualmente ilícito Mas esta presunção é relativa e se a defesa invocar uma descriminante estado de necessidade legítima defesa etc a ela competirá o ônus de provar a sua tese Em 1931 porém Edmund Mezger apresenta novos conceitos iniciando a fase da tipicidade como essência da ilicitude teoria da ratio essendi ou da identidade O tipo penal é transformado em tipo de injusto ou seja o tipo passa a ser conceituado como a ilicitude tipificada Destarte tipo e ilicitude fundiramse de modo indissociável embora seus conceitos não se confundam Essa teoria foi alvo de inúmeras críticas eis que veda a correta separação entre os juízos da tipicidade e da ilicitude Como estabelece o art 386 inc VI do Código de Processo Penal com a redação conferida pela Lei 116902008 Art 386 O juiz absolverá o réu mencionando a causa na parte dispositiva desde que reconheça VI existirem circunstâncias que excluam o crime ou isentem o réu de pena arts 20 21 22 23 26 e 1º do art 28 todos do Código Penal ou mesmo se houver fundada dúvida sobre sua existência A parte final do dispositivo legal ou mesmo se houver fundada dúvida sobre sua existência encontrase em sintonia com a teoria da tipicidade como indício da ilicitude De fato a tipicidade do fato funciona como presunção da ilicitude uma vez que a absolvição reclama fundada dúvida acerca da causa excludente da ilicitude Cuidase na verdade de manifestação do princípio in dubio pro reo a dúvida favorece o réu pois o ônus da prova da imputação é da acusação há muito consagrado nos ordenamentos jurídicos dos povos civilizados Preconizada pelo alemão Hellmuth von Weber propõe o tipo total de injusto por meio do qual os pressupostos das causas de exclusão da ilicitude compõem o tipo penal como seus elementos negativos Tipicidade e ilicitude integram o tipo penal tipo total Consequentemente se presente a tipicidade automaticamente também estará delineada a ilicitude Ao reverso ausente a ilicitude o fato será atípico Não há distinção entre os juízos da tipicidade e da ilicitude Crime assim não é o fato típico e ilícito e sim um tipo total de injusto em uma única análise Operase um sistema bipartido com duas fases para aferição do crime tipo total tipicidade ilicitude e culpabilidade Portanto identificada a tipicidade resultará identificada a ilicitude Por outro lado afastada a tipicidade restará também afastada a ilicitude Se fosse adotada a referida teoria o art 121 caput do Código Penal ficaria assim redigido Matar alguém salvo em legítima defesa estado de necessidade exercício regular do direito ou estrito cumprimento de dever legal Não foi acolhida pelo nosso sistema penal que distinguiu explicitamente os tipos incriminadores Parte Especial do Código Penal e legislação especial dos tipos permissivos ou causas de exclusão da ilicitude em regra na Parte Geral do Código Penal mais precisamente em seu art 23 Criada pelo penalista argentino Eugenio Raúl Zaffaroni essa teoria sustenta que todo fato típico se reveste de antinormatividade pois muito embora o agente atue em consonância com o que está descrito no tipo incriminador na verdade contraria a norma entendida como o conteúdo do tipo legal O nome conglobante deriva da necessidade de que a conduta seja contrária ao ordenamento jurídico em geral conglobado e não apenas ao Direito Penal Não basta a violação da lei penal Exigese a ofensa a todo o ordenamento jurídico Em suma para a aferição da tipicidade reclamase a presença da antinormatividade Assim ou o fato praticado pelo agente contrário à lei penal desrespeita todo o ordenamento normativo e há tipicidade ou ainda que em desconformidade com a lei penal esteja em consonância com a ordem normativa e ausente estará a tipicidade Para essa teoria a tipicidade penal resulta da junção da tipicidade legal com a tipicidade conglobante tipicidade penal tipicidade legal tipicidade conglobante Tipicidade legal adequação à fórmula legal do tipo é a individualização que a lei faz da conduta mediante o conjunto dos elementos objetivos e normativos de que se vale o tipo penal Já a tipicidade conglobante antinormatividade é a comprovação de que a conduta legalmente típica está também proibida pela norma o que se afere separando o alcance da norma proibitiva conglobada com as demais normas do sistema jurídico Finalmente a tipicidade penal adequação penal antinormatividade é a fusão da tipicidade legal com a tipicidade conglobante Não basta pois a mera tipicidade legal isto é a contrariedade do fato à lei penal É necessário mais A conduta do agente contrária à lei penal deve violar todo o sistema normativo Em suma deve ser antinormativa Vale a pena citar a explicação de Zaffaroni e de Pierangeli bastante elucidativa acerca do assunto Suponhamos que somos juízes e que é levada a nosso conhecimento a conduta de uma pessoa que na qualidade de oficial de justiça recebeu uma ordem emanada por juiz competente de penhora e sequestro de um quadro de propriedade de um devedor a quem se executa em processo regular por seu legítimo credor para a cobrança de um crédito vencido e que em cumprimento desta ordem judicial e das funções que por lei lhe competem solicita o auxílio da força pública e com todas as formalidades requeridas efetivamente sequestra a obra colocandoa à disposição do Juízo O mais elementar senso comum indica que esta conduta não pode ter qualquer relevância penal que de modo algum pode ser delito mas por quê Receberemos a resposta de que essa conduta enquadrase nas previsões do art 23 III do CP Não há crime quando o agente pratica o fato em estrito cumprimento de dever legal É indiscutível que ela aí se enquadra mas que caráter do delito desaparece quando um sujeito age em cumprimento de um dever Para boa parte da doutrina o oficial de justiça teria atuado ao amparo de uma causa de justificação isto é que faltaria a antijuridicidade da conduta mas que ela seria típica Para nós esta resposta é inadmissível porque tipicidade implica antinormatividade contrariedade à norma e não podemos admitir que na ordem normativa uma norma ordena o que a outra proíbe Uma ordem normativa na qual uma norma possa ordenar o que a outra pode proibir deixa de ser ordem e de ser normativa e tornase uma desordem arbitrária As normas jurídicas não vivem isoladas mas num entrelaçamento em que umas limitam as outras e não podem ignorarse mutuamente48 Esta teoria embora ainda se apresente como uma proposta doutrinária com resistência no Brasil já foi acolhida pelo Superior Tribunal de Justiça Queixacrime oferecida por Juíza contra Desembargador que durante processo de promoção por merecimento de magistrado proferiu voto com expressões tidas por difamatórias pela querelante O querelado em sessão pública proferiu seu voto consoante previsto na Resolução 1062010 do CNJ não se extraindo da sua manifestação conduta que se amolde na figura típica do art 139 do Código Penal Ausência de animus diffamandi O querelado agiu no estrito cumprimento do dever legal de fundamentação do voto restando afastada a tipicidade conglobante do crime de difamação nos termos do art 142 III do Código Penal e do art 41 da LC 351979 LOMAN Queixacrime rejeitada49 Adequação típica é o procedimento pelo qual se enquadra uma conduta individual e concreta na descrição genérica e abstrata da lei penal É o meio pelo qual se constata se existe ou não tipicidade entre a conduta praticada na vida real e o modelo definido pela lei penal A adequação típica pode se apresentar sob duas espécies subordinação imediata e subordinação mediata Na adequação típica de subordinação imediata a conduta humana se enquadra diretamente na lei penal incriminadora sem necessidade de interposição de qualquer outro dispositivo legal A ação ou omissão se transforma em fato típico com o encaixe adequado de todos os elementos do fato externo no modelo contido no preceito primário da lei incriminadora A conduta de subtrair coisa alheia móvel para si mediante emprego de violência contra a pessoa encontra correspondência direta no art 157 caput do Código Penal Verificase na hipótese adequação típica de subordinação imediata Por sua vez na adequação típica de subordinação mediata ampliada ou por extensão a conduta humana não se enquadra prontamente na lei penal incriminadora reclamandose para complementar a tipicidade a interposição de um dispositivo contido na Parte Geral do Código Penal É o que se dá na tentativa na participação e nos crimes omissivos impróprios Na tentativa operase uma ampliação temporal da figura típica pois com a utilização da regra prevista no art 14 II do Código Penal o alcance do tipo penal não se limita ao momento da consumação do crime mas também aos períodos que o antecedem Antecipase a tutela penal para abarcar os atos executórios prévios à consumação Na participação há uma ampliação espacial e pessoal do tipo penal que em consequência do disposto pelo art 29 caput do Código Penal passa a alcançar não só o sujeito que praticou os atos executórios do crime como também outras pessoas que de qualquer modo concorreram para a realização do delito sem contudo executálo50 Finalmente nos crimes omissivos impróprios espúrios ou comissivos por omissão ocorre uma ampliação da conduta criminosa a qual com o emprego do art 13 2º do Código Penal passa a englobar também a omissão daquele que indevidamente não cumpriu o seu dever jurídico de agir Esses dispositivos legais arts 13 2º 14 II e 29 caput do Código Penal são denominados de normas integrativas de extensão ou complementares da tipicidade 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Ou também o fato praticado por pessoa jurídica em relação aos crimes ambientais definidos pela Lei 96051998 para quem admite essa possibilidade Reportamonos porém ao fato humano por corresponder a pessoa física como sujeito ativo da quase totalidade das infrações penais O ser humano é o ser que atua Não está fixado isto é continua sendo para si mesmo um compromisso é também em outras palavras o ser que toma postura Os atos de tomada de postura em direção externa chamamos de ações e precisamente na medida em que continua sendo um compromisso para si mesmo toma postura diante de si mesmo e convertese em algo O ser humano é previsor Necessita do que está distante do que não está presente no espaço e tempo vive ao contrário do animal no futuro e não no presente Esta determinação faz parte das circunstâncias de uma existência na qual se atua e o que no ser humano é consciência humana em sentido próprio deve ser entendido sob esta perspectiva JAKOBS Günther Fundamentos de direito penal Trad André Luís Callegari São Paulo RT 2003 p 5354 ZAFFARONI Eugenio Raúl Derecho penal Parte general 2 ed Buenos Aires Ediar 2002 p 407 LUNA Everardo da Cunha Capítulos de direito penal Parte geral São Paulo Saraiva 1985 p 108 JESCHECK HansHeinrich Tratado de derecho penal Parte general Trad espanhola Miguel Olmedo Cardenete 5 ed Granada Comares 2002 p 239 TOLEDO Francisco de Assis Princípios básicos de direito penal 5 ed 13 tir São Paulo Saraiva 2007 p 109 BUSATO Paulo César Direito Penal parte geral 2 ed São Paulo Atlas 2015 p 273 RE 583523RS rel Min Gilmar Mendes Plenário j 03102013 noticiado no Informativo 722 STJ HC 68871PR rel Min Maria Thereza de Assis Moura rel p acórdão Min Og Fernandes 6ª Turma j 06082009 Surge nesse ponto o direito à perversão as pessoas ao menos em seus pensamentos podem ser más perversas idealizando mentalmente 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 diversos ilícitos penais sem que haja qualquer tipo de represália da parte do Estado Para um estudo aprofundado PIMENTEL Manoel Pedro Crimes de mera conduta 3 ed São Paulo RT 1975 p 2426 É comum olvidarse de Glaser mencionando Von Buri e Stuart Mill como os idealizadores dessa teoria COSTA JR Paulo José Nexo causal 2 ed São Paulo Malheiros 1996 p 88 JESUS Damásio E de Direito penal Parte geral 28 ed 2 tir São Paulo Saraiva 2006 v 1 p 248 Toda causa independente tem força suficiente para produzir por conta própria o resultado A diferença entre a qualidade de absoluta ou relativa referese exclusivamente à sua origem BAUMANN Jürgen Derecho penal conceptos fundamentales y sistema Trad espanhola Conrado A Finzi Buenos Aires Depalma 1973 p 126 BATTAGLINI Giulio A interrupção do nexo causal Trad Ricardo Rodrigues Gama Campinas LZN 2003 p 102104 HC 42559PE rel Min Arnaldo Esteves Lima 5ª Turma j 04042006 E também AgRg no AREsp 173804MG rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 19092013 COSTA JR Paulo José Nexo causal 2 ed São Paulo Malheiros 1996 p 108109 REsp 897426SP rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 27032008 FRANCO Alberto Silva STOCO Rui Código Penal e sua interpretação jurisprudencial parte geral 7 ed São Paulo RT 2001 v 1 p 228 FRAGOSO Heleno Cláudio Conduta punível São Paulo José Bushatsky 1961 p 5455 O art 2º da Lei 96051998 prevê na esfera dos crimes ambientais uma outra hipótese de dever de agir Quem de qualquer forma concorre para a prática dos crimes previstos nesta Lei incide nas penas a estes cominadas na medida da sua culpabilidade bem como o diretor o administrador o membro de conselho e de órgão técnico o auditor o gerente o preposto ou mandatário de pessoa jurídica que sabendo da conduta criminosa de outrem deixar de impedir a sua prática quando podia agir para evitála 24 25 26 27 28 29 30 31 32 33 34 35 36 37 38 LUISI Luiz Os princípios constitucionais penais 2 ed Porto Alegre Fabris 2003 p 143 TOLEDO Francisco de Assis Princípios básicos de direito penal 5 ed 13 tir São Paulo Saraiva 2007 p 117118 RHC 39627RJ rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 08042014 noticiado no Informativo 538 Cf BAUMANN Jürgen Derecho penal conceptos fundamentales y sistema Trad espanhola de Conrado A Finzi Buenos Aires Depalma 1973 p 127 ROXIN Claus Estudos de direito penal Trad Luís Greco Rio de Janeiro Renovar 2006 p 103 A análise das duas elementares traduzse no que a doutrina denomina de causalidade normativa em oposição à causalidade natural CAMARGO Antonio Luís Chaves Imputação objetiva e direito penal brasileiro São Paulo Cultural Paulista 2002 p 70 GRECO Luís Um panorama da teoria da imputação objetiva Rio de Janeiro Lumen Juris 2007 p 59 GRECO Luís Um panorama da teoria da imputação objetiva Rio de Janeiro Lumen Juris 2007 p 2527 ROXIN Claus Estudos de direito penal Trad Luís Greco Rio de Janeiro Renovar 2006 p 109110 JAKOBS Günther A imputação objetiva no direito penal São Paulo RT 2000 p 38 JESUS Damásio E de Jesus A imputação objetiva 2 ed São Paulo Saraiva 2002 p 4647 REsp 822517DF rel Min Gilson Dipp 5ª Turma j 12062007 HC 46525MT rel Min Arnaldo Esteves Lima 5ª Turma j 21032006 No mesmo sentido HC 68871PR rel Min Maria Thereza de Assis Moura rel p acórdão Min Og Fernandes 6ª Turma j 06082009 Jakobs por exemplo critica a adequação social por ser muito ampla não permitindo a concretização do risco permitido JAKOBS Günther A imputação objetiva no direito penal São Paulo RT 2000 p 117118 Contra a aplicação da proibição de regresso como excludente GRECO Luís Um panorama da teoria da imputação objetiva Rio de Janeiro 39 40 41 42 43 44 45 46 47 Lumen Juris 2007 p 7577 GRECO Luís Um panorama da teoria da imputação objetiva Rio de Janeiro Lumen Juris 2007 p 95 Os exemplos são de GRECO Luís Um panorama da teoria da imputação objetiva Rio de Janeiro Lumen Juris 2007 p 109125 Vide a discussão sobre o funcionalismo tratada quando do estudo sobre a evolução doutrinária do Direito Penal ROXIN Claus Estudos de direito penal Trad Luís Greco Rio de Janeiro Renovar 2006 p 104 Ainda o autor em igual sentido Em consequência o primeiro empenho da imputação no tipo objetivo é indicar quais as circunstâncias que fazem de uma causação como limite extremo da possível imputação uma ação típica ou seja p ex de uma causação de morte uma ação homicida relevante Na doutrina científica cada vez mais se impõe a concepção de que a imputação do tipo objetivo se produz conforme dois princípios sucessivamente estruturados a um resultado causado por um agente somente se pode imputar ao tipo objetivo se a conduta do autor houver criado um perigo para o bem jurídico não coberto por um risco permitido e esse perigo tenha se realizado no resultado concreto b se o resultado se apresenta como realização de um perigo criado pelo autor pela regra geral é imputado de modo que se cumpre o tipo objetivo Derecho penal Parte geral Fundamentos La estructura de la teoria del delito Trad espanhola de DiegoManuel Luzón Peña Miguel Díaz y García Conlledo e Javier de Vicente Remensal Madrid Civitas 2006 t I p 363364 JAKOBS Günther A imputação objetiva no direito penal São Paulo RT 2000 p 22 Para um estudo aprofundado do assunto GONDIM Reno Feitosa Epistemologia Quântica Direito Penal Fundamentos para uma Teoria da Imputação Objetiva do Direito Penal Curitiba Juruá 2005 GRECO Rogério Curso de direito penal parte geral 10 ed Rio de Janeiro Impetus 2008 p 246 BELING Ernst von Esquema de derecho penal La doctrina del delito tipo Trad de Sebástian Soler Buenos Aires Depalma 1944 p 59 Isso não impede entretanto a definição analítica do crime como fato típico e ilícito A teoria de Mayer remonta ao início do século XX e naquele contexto deve ser analisada O conceito bipartido de delito como 48 49 50 se sabe surgiu no Brasil após a Reforma da Parte Geral do Código Penal efetuada pela Lei 72091984 ZAFFARONI Eugenio Raúl PIERANGELI José Henrique Manual de direito penal brasileiro Parte geral 7 ed São Paulo RT 2007 v 1 p 395 AP 683AP rel Min Eliana Calmon Corte Especial j 21112012 REsp 944676RS rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 21062011 noticiado no Informativo 478 Tipo penal é o modelo genérico e abstrato formulado pela lei penal descritivo da conduta criminosa ou da conduta permitida Portanto não é somente o conjunto dos elementos da infração penal descrito pela lei mas também a indicação legal das hipóteses em que se autoriza a prática de um fato típico Tipo e tipicidade não se confundem Como explica Zaffaroni tipo é uma figura que resulta da imaginação do legislador enquanto o juízo de tipicidade é a averiguação que sobre uma conduta se efetua para saber se apresenta os caracteres imaginados pelo legislador1 O tipo penal apresenta duas categorias incriminadores e permissivos Tipos incriminadores ou legais são os tipos penais propriamente ditos consistentes na síntese legal da definição da conduta criminosa Tipos permissivos ou justificadores são os que contêm a descrição legal da conduta permitida isto é as situações em que a lei considera lícito o cometimento de um fato típico São as causas de exclusão da ilicitude também denominadas eximentes ou justificativas Os tipos legais ou incriminadores estão definidos na Parte Especial do Código Penal e na legislação penal especial Não há tipo incriminador na Parte Geral do Código Penal 1141 1142 Tipo legal é o modelo sintético genérico e abstrato da conduta definida em lei como crime ou contravenção penal O tipo legal não se destina simplesmente a criar infrações penais Ao contrário possui outras relevantes funções Função de garantia Como decorrência da previsão constitucional do princípio da reserva legal ou da estrita legalidade somente a lei em sentido material e formal pode criar um tipo incriminador Nesse sentido o tipo penal funciona como garantia do indivíduo2 De fato ao conhecer as condutas reputadas ilícitas pelo Direito Penal o ser humano pode praticar livremente todas as demais não incriminadas Sobralhe liberdade para gerir sua vida ficando vedada somente a atuação em desconformidade com a lei penal já que os casos de incriminação são taxativos princípio da taxatividade Cuidase destarte de direito fundamental de 1ª geração na medida em que limita o poder punitivo estatal Não por outro motivo proclamava Franz von Liszt ser o Código Penal a Magna Carta do delinquente Função fundamentadora A previsão de uma conduta criminosa por um tipo penal fundamenta o direito de punir do Estado quando o indivíduo viola a lei penal 1143 1144 A existência de uma lei penal incriminadora é o fundamento da persecução penal exercida pelo Estado Para Rogério Greco Se por um lado o tipo exerce essa função garantista também é certo afirmar que o Estado por intermédio do tipo penal fundamenta suas decisões fazendo valer o seu ius puniendi A relação entre essas funções do tipo garantista e fundamentadora é como se fosse duas faces da mesma moeda Numa das faces está o tipo garantista vedando qualquer responsabilização penal que não seja por ele expressamente prevista na outra a função fundamentadora por ele exercida abrindose a possibilidade ao Estado de exercitar o seu direito de punir sempre que o seu tipo penal for violado3 Função indiciária da ilicitude O tipo penal delimita a conduta penalmente ilícita Por corolário a circunstância de uma ação ou omissão ser típica autoriza a presunção de ser também ilícita contrária ao ordenamento jurídico Essa presunção é relativa iuris tantum pois admite prova em sentido contrário Dessa forma caso o agente sustente em juízo como tese defensiva a licitude do fato deverá provar a existência de uma das excludentes indicadas pelo art 23 do Código Penal Operase a inversão do ônus da prova Todo fato típico se presume ilícito até prova em contrário a ser apresentada e confirmada pelo responsável pela infração penal Exemplificativamente se A efetuou disparos de arma de fogo contra B eliminando sua vida presumese automaticamente a ilicitude do fato Se entretanto A alegar sua inocência por ter agido acobertado pela legítima defesa deverá provar sua ocorrência pois caso contrário será condenado Função diferenciadora do erro O dolo do agente deve alcançar todas as elementares do tipo legal razão pela qual o autor de um fato típico somente poderá ser responsabilizado pela prática de um crime doloso quando conhecer todas as circunstâncias de fato 1145 que o compõem Eventual ignorância acerca de alguma elementar do tipo penal configura erro de tipo afastando o dolo nos termos do art 20 do Código Penal Assim delineado o tipo penal com a presença do dolo não há falar em erro Ao contrário sem o fato típico por ausência de dolo restará caracterizado o erro de tipo Função seletiva Cabe ao tipo penal a tarefa de selecionar as condutas que deverão ser proibidas crimes comissivos ou ordenadas crimes omissivos pela lei penal levando em conta os princípios vetores do Direito Penal em um Estado Democrático de Direito O tipo penal qualquer que seja ele é composto por um núcleo e elementos Nas figuras qualificadas e privilegiadas são acrescentadas circunstâncias Esta é a fórmula do tipo incriminador O núcleo representado pelo verbo é a primeira etapa para a construção de um tipo incriminador No furto é subtrair no estupro constranger e assim por diante Toda infração penal contém um núcleo No art 121 caput do Código Penal em que se define o crime de homicídio simples fórmula incriminadora mais sintética da legislação penal brasileira há um núcleo matar e apenas um elemento alguém Em torno do núcleo se agregam elementos ou elementares que visam proporcionar a perfeita descrição da conduta criminosa Esses elementos podem ser de três espécies distintas objetivos subjetivos e normativos Elementos objetivos ou descritivos são os dados da conduta criminosa que não pertencem ao mundo anímico do agente Possuem validade exterior que não se limita ao sujeito que o pratica Ao contrário podem ser constatados por qualquer pessoa uma vez que exprimem um juízo de certeza Na identificação desses elementos se prescinde de valoração cultural ou jurídica É o caso de alguém nos crimes de homicídio CP art 121 e estupro CP art 213 entre tantos outros Elementos normativos por seu turno são aqueles para cuja compreensão não pode o sujeito se limitar a uma mera atividade cognitiva Reclamam para perfeita aferição uma interpretação valorativa isto é necessitam de um juízo de valor acerca da situação de fato por parte do destinatário da lei penal Na definição de Luís Luisi Não são portanto elementos que se limitam a descrever o natural mas que dão à ação ao seu objeto ou mesmo às circunstâncias uma significação um valor As expressões honesto indevidamente sem justa causa e mesmo cruel insidioso para qualificar os meios são exemplos de elementos típicos normativos4 Os elementos normativos podem ser jurídicos ou culturais Elementos normativos jurídicos são os que traduzem conceitos próprios do Direito relativos à ilicitude indevidamente e sem justa causa por exemplo ou então atinentes a termos ou expressões jurídicas tais como documento funcionário público e duplicata Os elementos normativos que dizem respeito a termos ou expressões jurídicas são também denominados elementos normativos impróprios Por sua vez elementos normativos culturais morais ou extrajurídicos são os que envolvem conceitos próprios de outras disciplinas do 1151 conhecimento artísticas literais científicas ou técnicas São seus exemplos ato obsceno ato libidinoso arte etc Elementos subjetivos são os que dizem respeito à esfera anímica do agente isto é à sua especial finalidade de agir e às demais tendências e intenções Sempre que o tipo penal alojar em seu bojo um elemento subjetivo será necessário que o agente além do dolo de realizar o núcleo da conduta possua ainda a finalidade especial indicada expressamente pela descrição típica No crime de furto CP art 155 não basta a subtração da coisa alheia móvel esta deve ser realizada pelo agente para si ou para outrem ou seja exigese o ânimo de assenhoreamento definitivo animus rem sibi habendi Diversos estudiosos do Direito Penal utilizam a expressão elementos subjetivos do injusto Na pureza da técnica essa terminologia normalmente empregada como sinônima de elementos subjetivos do tipo deve ser reservada somente àqueles que sustentam a identidade entre a tipicidade e a ilicitude no sentido de que uma não existe sem a outra Como bem explica Damásio E de Jesus Na verdade as expressões se equivalem A adoção de uma ou de outra depende da doutrina que se adote em relação à teoria do tipo e da antijuridicidade Para aqueles que como Mezger acreditam numa ilicitude tipificada isto é afirmar que a antijuridicidade se encontra no tipo a expressão é elementos subjetivos do injusto elementos subjetivos da antijuridicidade Significa que a antijuridicidade o injusto concretizada no tipo possui um elemento subjetivo que condiciona a sua existência Para os que adotam o princípio de que a tipicidade constitui mero indício da antijuridicidade como Mayer separando a tipicidade da ilicitude a expressão é elementos subjetivos do tipo Significa que o tipo possui um elemento subjetivo referente à situação anímica do sujeito que condiciona a tipicidade do fato5 Elementos modais Ao lado dos elementos objetivos normativos e subjetivos aceitos por 1161 1162 toda a doutrina alguns autores ainda apontam um quarto grupo relativo aos elementos modais Elementos modais seriam os que expressam no tipo penal condições específicas de tempo local ou modo de execução indispensáveis para a caracterização do crime Apontase como exemplo o crime de infanticídio CP art 123 em que a mãe deve matar o próprio filho nascente ou recémnascido sob a influência do estado puerperal durante o parto ou logo após Há portanto a exigência de que o delito seja praticado em condições de tempo previamente fixadas pelo legislador É o que também ocorre no crime de violação de domicílio CP art 150 no qual o agente deve entrar ou permanecer clandestina ou astuciosamente ou contra a vontade expressa ou tácita de quem de direito em casa alheia ou em suas dependências Nesse caso a lei se refere a condições de locais indispensáveis para o aperfeiçoamento do ilícito penal Tipo normal e tipo anormal Tipo normal é o que prevê apenas elementos de ordem objetiva Fala se no caso em tipicidade normal6 Tipo anormal é o que prevê além de elementos objetivos também elementos subjetivos eou normativos acarretando na tipicidade anormal Vale ressaltar que para os adeptos do finalismo penal todo tipo é anormal De fato dolo elemento subjetivo e culpa elemento normativo compõem a estrutura da conduta a qual integra o fato típico e consequentemente o tipo penal Tipo fundamental e tipo derivado Tipo fundamental ou básico é aquele que retrata a forma mais simples da conduta criminosa É denominado crime simples e em regra está situado no caput do dispositivo legal Exemplo homicídio simples CP art 121 1163 1164 1165 caput Há uma exceção no Código Penal o crime de excesso de exação se encontra no 1º do art 316 do Código Penal Tratase da modalidade simples básica e fundamental do crime sem estar no caput Tipo derivado é aquele que se estrutura com base no tipo fundamental a ele se somando circunstâncias que aumentam ou diminuem a pena Dividem se em tipos qualificados qualificadoras ou circunstanciados causas de aumento da pena e privilegiados também chamados de exceptum causas de diminuição da pena Exemplos homicídio privilegiado CP art 121 1º e homicídio qualificado CP art 121 2º Tipo fechado e tipo aberto Tipo fechado ou cerrado é o que possui descrição minuciosa da conduta criminosa É o caso do furto Tipo aberto é o que não possui descrição minuciosa da conduta criminosa Cabe ao Poder Judiciário na análise do caso concreto complementar a tipicidade mediante um juízo de valor É o caso da rixa CP art 137 pois somente na situação prática poderá se dizer se alguém participou da rixa ou nela ingressou para separar os contendores No Código Penal os crimes culposos estão previstos em tipos penais abertos salvo no caso da receptação em que o art 180 3º apresenta detalhadamente a descrição típica Tipo de autor e tipo de fato Tipo de autor é o que se relaciona ao Direito Penal do autor É aquele felizmente cada vez mais extirpado do Direito Penal em que não se pune uma conduta e sim uma determinada pessoa em razão de suas condições pessoais Tipo de fato é o que tem por objeto a incriminação de uma conduta criminosa Representa as infrações penais do ordenamento jurídico brasileiro em vigor Tipo simples e tipo misto 1166 Tipo simples é o que abriga em seu interior um único núcleo Define assim uma única conduta típica caracterizando os crimes de ação única É o caso do roubo CP art 157 em que existe apenas o núcleo subtrair Tipo misto é o que tem na sua descrição típica dois ou mais núcleos representando os crimes de ação múltipla ou de conteúdo variado Subdivide se em duas espécies tipo misto alternativo e tipo misto cumulativo No tipo misto alternativo a lei penal descreve duas ou mais condutas como hipóteses de realização de um mesmo crime de maneira que a prática sucessiva dos diversos núcleos caracteriza um único delito São os chamados crimes de ação múltipla de condutas variáveis ou fungíveis Na receptação simples CP art 180 caput por exemplo pratica crime único o agente que adquire um veículo roubado e ciente dessa origem ilícita depois o conduz para sua casa local em que finalmente vem a ocultálo No tipo misto cumulativo a prática de mais de uma conduta leva ao concurso material respondendo o agente por todos os delitos praticados tal como se dá no de abandono material CP art 244 É importante não confundir os tipos mistos cumulativos com os crimes de condutas conjugadas ou seja delitos em que o tipo penal prevê somente um núcleo associado com diversas condutas e se o sujeito realizar mais de uma delas responderá por vários crimes em concurso material ou formal impróprio ou imperfeito dependendo do caso concreto É o que se dá no crime de abandono moral tipificado no art 247 do Código Penal Tipo congruente e tipo incongruente Tipo congruente é aquele em que há perfeita coincidência entre a vontade do autor e o fato descrito na lei penal O agente realiza aquilo que efetivamente desejava É o que ocorre nos crimes dolosos consumados Tipo incongruente é aquele em que não há coincidência entre a vontade do autor e o fato descrito na lei penal ou seja a conduta do agente provoca algo diverso do que era por ele desejado tal como se dá na tentativa nos crimes culposos e nos crimes preterdolosos 1167 1168 Tipo complexo O tipo penal possui uma parte objetiva consistente na descrição da conduta criminosa Para a teoria clássica da conduta é o que basta uma vez que o dolo e a culpa estão alojados no interior da culpabilidade Em uma visão finalista entretanto os elementos anímicos foram transferidos da culpabilidade para a conduta O tipo penal passa então a conter elementos de dois grupos objetivos modelo típico e subjetivos dolo e culpa Falase assim que para os finalistas o tipo penal é complexo o que se justifica pela fusão dos elementos objetivos situados no mundo exterior com os elementos subjetivos situados internamente no psiquismo do agente7 Tipo preventivo O tipo penal preventivo inerente aos crimesobstáculo é aquele de que se vale o legislador para antecipar a tutela do Direito Penal no tocante a determinados bens jurídicos incriminando de forma autônoma atos que por si sós representariam a preparação de outros delitos Como já se pronunciou o Superior Tribunal de Justiça A Turma acompanhando recente assentada quando do julgamento por maioria do REsp 1193805SP manteve o entendimento de que o porte ilegal de arma de fogo é crime de perigo abstrato cuja consumação se caracteriza pelo simples ato de alguém levar consigo arma de fogo sem autorização ou em desacordo com determinação legal sendo irrelevante a demonstração de efetivo caráter ofensivo Isso porque nos termos do disposto no art 16 parágrafo único IV da Lei n 108262003 o legislador teve como objetivo proteger a incolumidade pública transcendendo a mera proteção à incolumidade pessoal bastando assim para a configuração do delito em discussão a probabilidade de dano e não sua ocorrência Segundo se observou a lei antecipa a punição para o ato de portar arma de fogo é portanto um tipo penal preventivo que busca minimizar o risco de comportamentos que vêm produzindo efeitos danosos à sociedade na tentativa de garantir aos cidadãos o exercício do direito à segurança e à própria vida Concluise assim ser irrelevante aferir a eficácia da arma para a configuração do tipo penal que é misto alternativo em que se consubstanciam justamente as condutas que o legislador entendeu por bem prevenir seja ela o simples porte de munição ou mesmo o porte de arma desmuniciada8 1 2 3 4 5 6 7 8 ZAFFARONI Eugenio Raúl Tratado de derecho penal Parte general Buenos Aires Ediar 1982 v 2 p 172 STF Inq 1145PB rel Min Maurício Corrêa Tribunal Pleno j 19122006 GRECO Rogério Curso de direito penal Parte geral 10 ed Rio de Janeiro Impetus 2008 p 181 LUISI Luís O tipo penal a teoria finalista e a nova legislação penal Porto Alegre Fabris 1987 p 57 É importante observar que atualmente a única hipótese em que o Código Penal emprega a palavra honesto está no art 83 III atinente ao livramento condicional Todas as demais outrora existentes foram revogadas pela Lei 111062005 JESUS Damásio E de Direito penal Parte geral 28 ed 2 tir São Paulo Saraiva 2006 v 1 p 275 O tipo normal é também conhecido como neutro acromático ou avalorado em razão de não guardar nenhuma vinculação com a ilicitude ZAFFARONI Eugenio Raúl Derecho penal Parte general 2 ed Buenos Aires Ediar 2002 p 433 HC 211823SP rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 22032012 noticiado no Informativo 493 121 122 INTRODUÇÃO O dolo no sistema finalista integra a conduta e consequentemente o fato típico Cuidase do elemento psicológico do tipo penal implícito e inerente a todo crime doloso Dentro de uma concepção causal por outro lado o dolo funciona como elemento da culpabilidade Em consonância com a orientação finalista por nós adotada o dolo consiste na vontade e consciência de realizar os elementos do tipo incriminador TEORIAS DO DOLO Existem três teorias acerca do dolo a Teoria da representação Para essa teoria a configuração do dolo exige apenas a previsão do resultado Privilegia o lado intelectual não se preocupando com o aspecto volitivo pois pouco importa se o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzilo Basta que o resultado tenha sido antevisto pelo sujeito Em nosso sistema penal tal teoria deve ser afastada por confundir o dolo com a culpa consciente b Teoria da vontade Essa teoria se vale da teoria da representação ao exigir a previsão do resultado Contudo vai mais longe Além da representação reclama ainda a vontade de produzir o resultado 123 c Teoria do assentimento Também chamada de teoria do consentimento ou da anuência complementa a teoria da vontade recepcionando sua premissa Para essa teoria há dolo não somente quando o agente quer o resultado mas também quando realiza a conduta assumindo o risco de produzilo Dispõe o art 18 inciso I do Código Penal Art 18 Dizse o crime I doloso quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzilo O dispositivo legal revela que foram duas as teorias adotadas pelo Código Penal a da vontade ao dizer quis o resultado e a do assentimento no tocante à expressão assumiu o risco de produzilo Dolo é sobretudo vontade de produzir o resultado Mas não é só Também há dolo na conduta de quem após prever e estar ciente de que pode provocar o resultado assume o risco de produzilo ELEMENTOS DO DOLO O dolo é composto por consciência e vontade A consciência é seu elemento cognitivo ou intelectual ao passo que a vontade desponta como seu elemento volitivo Como já se pronunciou o Superior Tribunal de Justiça A doutrina penal brasileira instrui que o dolo conquanto constitua elemento subjetivo do tipo deve ser compreendido sob dois aspectos o cognitivo que traduz o conhecimento dos elementos objetivos do tipo e o volitivo configurado pela vontade de realizar a conduta típica O elemento cognitivo consiste no efetivo conhecimento de que o resultado poderá ocorrer isto é o efetivo conhecimento dos elementos integrantes do tipo penal objetivo A mera possibilidade de conhecimento o chamado conhecimento potencial não basta para caracterizar o elemento cognitivo do dolo No elemento volitivo por seu turno o 124 agente quer a produção do resultado de forma direta dolo direto ou admite a possibilidade de que o resultado sobrevenha dolo eventual1 Tais elementos se relacionam em três momentos distintos e sucessivos Em primeiro lugar operase a consciência da conduta e do resultado Depois o sujeito manifesta sua consciência sobre o nexo de causalidade entre a conduta a ser praticada e o resultado que em decorrência dela será produzido Por fim o agente exterioriza a vontade de realizar a conduta e produzir o resultado Basta para a verificação do dolo que o resultado se produza em conformidade com a vontade esboçada pelo agente no momento da conduta Exemplo A queria matar B Efetua contra ele disparos de arma de fogo Erra os tiros mas B durante a fuga despenca de um barranco bate a cabeça ao solo e morre em decorrência de traumatismo craniano A queria matar e matou Nessa situação A responderá pelo resultado Destarte no tocante ao nexo causal não é preciso que o iter criminis transcorra na forma idealizada pelo agente Subsiste o dolo se o objetivo almejado for alcançado ainda que de modo diverso O dolo deve englobar todas as elementares e circunstâncias do tipo penal Se restar constatada a sua ausência acerca de qualquer parte do crime entra em cena o instituto do erro de tipo Assim no crime de homicídio é necessário que o agente possua consciência de que com sua conduta mata alguém e tenha vontade de fazêlo Como sustentava Hans Welzel para o seu aperfeiçoamento o dolo precisa abranger o objetivo que o agente deseja alcançar os meios que emprega para tanto bem como as consequências secundárias necessariamente vinculadas com o emprego dos meios2 DOLO NATURAL E DOLO NORMATIVO A divisão do dolo em natural e normativo relacionase ao sistema penal clássico ou finalista e à teoria adotada para definição da conduta No sistema clássico em que imperava a teoria causalista ou 125 mecanicista da conduta o dolo e a culpa estava alojado no interior da culpabilidade a qual era composta por três elementos imputabilidade dolo ou culpa e exigibilidade de conduta diversa O dolo ainda abrigava em seu bojo a consciência da ilicitude do fato Esse dolo revestido da consciência da ilicitude do fato era chamado de dolo normativo também conhecido como dolo colorido ou valorado Com o surgimento do sistema finalista no qual vigora a teoria finalista da conduta o dolo foi transferido da culpabilidade para a conduta Passou portanto a integrar o fato típico A culpabilidade continuou a ser composta de três elementos porém distintos imputabilidade potencial consciência da ilicitude e exigibilidade de conduta diversa O dolo abandonou a culpabilidade para residir no fato típico A consciência da ilicitude que era atual passou a ser potencial e deixou de habitar o interior do dolo para ter existência autônoma como elemento da culpabilidade Tal dolo livre da consciência da ilicitude é chamado de dolo natural incolor ou avalorado3 Em síntese o dolo normativo está umbilicalmente ligado ao sistema penal clássico ao passo que o dolo natural se vincula ao sistema finalista ESPÉCIES DE DOLO Dolo direto também denominado dolo determinado intencional imediato ou ainda dolo incondicionado é aquele em que a vontade do agente é voltada a determinado resultado Ele dirige sua conduta a uma finalidade precisa É o caso do assassino profissional que desejando a morte da vítima dispara contra ela um único tiro certeiro e fatal Dolo indireto ou indeterminado por sua vez é aquele em que o agente não tem a vontade dirigida a um resultado determinado Subdividese em dolo alternativo e em dolo eventual Dolo alternativo é o que se verifica quando o agente deseja indistintamente um ou outro resultado Sua intenção se destina com igual intensidade a produzir um entre vários resultados previstos como possíveis É o caso do sujeito que atira contra o seu desafeto com o propósito de matar ou ferir Se matar responderá por homicídio Mas e se ferir responderá por tentativa de homicídio ou por lesões corporais Em caso de dolo alternativo o agente sempre responderá pelo resultado mais grave Justificase esse raciocínio pelo fato de o Código Penal ter adotado em seu art 18 I a teoria da vontade E assim sendo se teve a vontade de praticar um crime mais grave por ele deve responder ainda que na forma tentada Dolo eventual é a modalidade em que o agente não quer o resultado por ele previsto mas assume o risco de produzilo É possível a sua existência em decorrência do acolhimento pelo Código Penal da teoria do assentimento na expressão assumiu o risco de produzilo contida no art 18 I do Código Penal Imagine o exemplo de um fazendeiro colecionador de armas de fogo que treina tiro ao alvo em sua propriedade rural Certo dia ele decide atirar com um fuzil de longo alcance Sabe que os projéteis têm capacidade para chegar até uma estrada próxima com pequeno fluxo de transeuntes Prevê que assim agindo pode matar alguém Nada obstante assume o risco de produzir o resultado e insiste em sua conduta Acaba atingindo um pedestre que vem a falecer Responde por homicídio doloso pois presente se encontra o dolo eventual Devese ao alemão Reinhart Frank a formulação de um princípio rotulado de teoria positiva do conhecimento4 que é útil como critério prático para identificar o dolo eventual Para esse postulado há dolo eventual quando o agente diz a si mesmo seja assim ou de outra maneira suceda isto ou aquilo em qualquer caso agirei revelando a sua indiferença em relação resultado Na esteira do entendimento do Supremo Tribunal Federal Salientouse que no Direito Penal contemporâneo além do dolo direto em que o agente quer o resultado como fim de sua ação e o considera unido a esta última há o dolo eventual em que o sujeito não deseja diretamente a realização do tipo penal mas a aceita como possível ou provável CP art 18 I in fine Relativamente a este ponto aduziuse que dentre as várias teorias que buscam justificar o dolo eventual destacase a do assentimento ou da assunção consoante a qual o dolo exige que o agente aquiesça em causar o resultado além de reputálo como possível Assim esclareceuse que na espécie a questão principal diz respeito à distinção entre dolo eventual e culpa consciente ambas apresentando em comum a previsão do resultado ilícito Observouse que para a configuração do dolo eventual não é necessário o consentimento explícito do agente nem sua consciência reflexiva em relação às circunstâncias do evento sendo imprescindível isso sim que delas circunstâncias se extraia o dolo eventual e não da mente do autor5 O dolo eventual é admitido em todo e qualquer crime que seja com ele compatível e deve ser detalhadamente descrito na inicial acusatória denúncia ou queixacrime6 Há casos entretanto em que o tipo penal exige expressamente o dolo direto afastando o cabimento do dolo eventual É o que se verifica no crime de receptação dolosa no qual o art 180 caput do Código Penal utiliza a expressão coisa que sabe ser produto de crime indicativa de dolo direto Da mesma forma o crime de denunciação caluniosa CP art 339 exige a imputação de crime de que o sabe inocente Alguns autores criticam o dolo eventual dizendo ser inócuo pois a sua prova residiria exclusivamente na mente do autor Não procedem tais alegações pois o dolo eventual assim como o dolo direto não tem a sua comprovação limitada ao psiquismo interno do agente Extraise ao contrário das circunstâncias do caso concreto tais como os meios empregados a apreciação da situação precedente o comportamento do agente posteriormente ao crime e sua personalidade entre tantos outros que somente a vida real pode esgotar Como já decidido pelo Superior Tribunal de Justiça O dolo eventual na prática não é extraído da mente do autor mas isto sim das circunstâncias Nele não se exige que o resultado seja aceito como tal o que seria adequado ao dolo direto mas isto sim que a aceitação se mostre no plano do possível provável7 O dolo eventual não tem por si só reprovabilidade inferior ao dolo direto O Código Penal os colocou em idêntica posição jurídica A penabase será fixada levandose em conta as circunstâncias judiciais previstas no art 59 não se incluindo nesse rol a modalidade do dolo A jurisprudência posicionase no sentido de existir dolo eventual na conduta do agente responsável por graves crimes praticados na direção de veículo automotor Esta escolha fundamentase nas diversas campanhas educativas realizadas nas últimas décadas demonstrando os inúmeros riscos da direção ousada e perigosa como se dá no racha e no excesso de velocidade em via pública Tais advertências são suficientes para esclarecer os motoristas da vedação legal de tais comportamentos bem como dos resultados danosos que em razão delas são rotineiramente produzidos E se mesmo assim continua o condutor de veículo automotor a agir de forma imprudente revela inequivocamente sua indiferença com a vida e a integridade corporal alheia devendo responder pelo crime doloso a que der causa Na visão do Supremo Tribunal Federal O réu ao lançarse em prática de altíssima periculosidade em via pública e mediante alta velocidade teria consentido com que o resultado se produzisse de sorte a incidir em dolo eventual CP art 18 I Dizse o crime I doloso quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzilo No ponto assentouse que o Supremo firmara jurisprudência no sentido de que o homicídio cometido na direção de veículo automotor em virtude de pega seria doloso8 No tocante ao homicídio cometido na direção de veículo automotor encontrandose o condutor em estado de embriaguez a análise da situação concreta é fundamental para a tipificação da conduta Exemplificativamente pode ser reconhecida a culpa consciente na atividade daquele que atropelou e matou um pedestre por ter perdido levemente o controle do automóvel após a ingestão de uma taça de vinho durante o almoço em família mas certamente estará presente o dolo eventual no comportamento de quem atropela e mata alguém ao invadir uma calçada com seu veículo automotor em excesso de velocidade depois de ter bebido um litro de vodka em uma festa durante a madrugada Na linha da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal A Primeira Turma por maioria denegou a ordem de habeas corpus em que se pleiteava a reforma da decisão que reconheceu a ocorrência de dolo eventual em relação a homicídio cometido por motorista embriagado na direção de veículo automotor firmada a competência do tribunal do júri O impetrante apontava equívoco no enquadramento legal realizado na origem Pleiteava a desclassificação da conduta para o crime previsto no art 302 do Código de Trânsito Brasileiro O Colegiado considerou legítima a tipificação da conduta como crime doloso de competência do tribunal do júri ante o reconhecimento da evolução jurisprudencial na análise do que vem a ser dolo eventual e culpa consciente No caso verificase a existência de dolo eventual no ato de dirigir veículo automotor sob a influência de álcool além de fazêlo na contramão Esse é portanto um caso específico que evidencia a diferença entre a culpa consciente e o dolo eventual O condutor assumiu o risco ou no mínimo não se preocupou com o risco de eventualmente causar lesões ou mesmo a morte de outrem9 Com efeito a conclusão pelo dolo direto ou eventual acarreta na incidência do crime definido no art 121 do Código Penal de competência do Tribunal do Júri ao passo que a presença da culpa resulta no delito previsto no art 302 da Lei 95031997 Código de Trânsito Brasileiro cujo processo e julgamento é reservado ao juízo singular10 Essa divisão diz respeito aos motivos do crime que podem aumentar a pena como no caso do motivo torpe ou diminuíla tal como se dá no motivo de relevante valor social ou moral É mencionada pela doutrina mas guarda maior intimidade com o Direito Civil Dolo de propósito ou refletido é o que emana da reflexão do agente ainda que pequena acerca da prática da conduta criminosa Verificase nos crimes premeditados Dolo de ímpeto ou repentino é o que se caracteriza quando o autor pratica o crime motivado por paixão violenta ou excessiva perturbação de ânimo Não há intervalo entre a cogitação do crime e a execução da conduta penalmente ilícita Ocorre geralmente nos crimes passionais Essa classificação ganhou destaque na teoria clássica da conduta Falavase em dolo genérico quando a vontade do agente se limitava à prática da conduta típica sem nenhuma finalidade específica tal como no crime de homicídio em que é suficiente a intenção de matar alguém pouco importando o motivo para a configuração da modalidade básica do crime Por outro lado o dolo específico existia nos crimes em que a referida vontade era acrescida de uma finalidade especial No caso da injúria por exemplo não basta a atribuição à vítima de uma qualidade negativa Exigese também tenha a conduta a finalidade de macular a honra subjetiva da pessoa ofendida Atualmente com a superveniência da teoria finalista utilizase o termo dolo para referirse ao antigo dolo genérico A expressão dolo específico por sua vez foi substituída por elemento subjetivo do tipo ou ainda elemento subjetivo do injusto Dolo presumido ou dolo in re ipsa seria a espécie que dispensa comprovação no caso concreto Não pode ser admitido no Direito Penal moderno que não aceita a responsabilidade penal objetiva11 Com efeito vigora em nosso ordenamento jurídicopenal o princípio da responsabilidade subjetiva como corolário do Direito Penal do fato adequado ao plexo de garantias vigente no Estado Democrático de Direito Tal sistemática impõe ao órgão acusatório o ônus da prova acerca dos elementos constitutivos do tipo penal incriminador inclusive do dolo e também na culpa nos termos do art 156 do Código de Processo Penal a ser exercido no seio do contraditório estabelecido em juízo em respeito à clausula do devido processo legal12 Dolo de dano ou de lesão é o que se dá quando o agente quer ou assume o risco de lesionar um bem jurídico penalmente tutelado É exigido para a prática de um crime de dano Na lesão corporal por exemplo exigemse a consciência e a vontade de ofender a saúde ou a integridade corporal de outrem Dolo de perigo é o que ocorre quando o agente quer ou assume o risco de expor a perigo de lesão um bem jurídico penalmente tutelado No crime tipificado pelo art 130 do Código Penal exemplificativamente o dolo do agente se circunscreve à exposição de alguém por meio de relações sexuais ou de ato libidinoso a contágio de moléstia venérea de que sabe ou deve saber que está contaminado O dolo de primeiro grau consiste na vontade do agente direcionada a determinado resultado efetivamente perseguido englobando os meios necessários para tanto Há a intenção de atingir um único bem jurídico Exemplo o matador de aluguel que persegue e mata com golpes de faca a vítima indicada pelo mandante Dolo de segundo grau ou de consequências necessárias é a vontade do agente dirigida a determinado resultado efetivamente desejado em que a utilização dos meios para alcançálo inclui obrigatoriamente efeitos colaterais de verificação praticamente certa O agente não deseja imediatamente os efeitos colaterais mas tem por certa a sua superveniência caso se concretize o resultado pretendido Citase o exemplo do assassino que desejando eliminar a vida de determinada pessoa que se encontra em lugar público instala ali uma bomba a qual quando detonada certamente matará outras pessoas ao seu redor Mesmo que não queira atingir essas outras vítimas tem por evidente o resultado se a bomba explodir como planejado13 Não nos parece correto falar em dolo de terceiro grau o qual funcionaria como consequência inevitável do dolo de segundo grau No exemplo mencionado se uma das pessoas mortas pela explosão da bomba fosse uma mulher grávida o assassino também deveria responder pelo aborto em face do seu dolo de terceiro grau Em nossa opinião eventual responsabilização penal pelo aborto decorre do dolo de segundo grau pois todo e qualquer crime praticado naquele contexto figura como consequência necessária da conduta do agente voltada ao resultado determinado qual seja a explosão da bomba para matar a pessoa por ele diretamente visada É o erro no tocante ao meio de execução do crime relativamente à forma pela qual se produz o resultado inicialmente desejado pelo agente Ocorre quando o sujeito acreditando já ter alcançado o resultado almejado pratica uma nova conduta com finalidade diversa e ao final se constata que foi esta última que produziu o que se buscava desde o início Esse erro é irrelevante no Direito Penal de natureza acidental pois o que importa é que o agente queria um resultado e o alcançou O dolo é geral e envolve todo o desenrolar da ação típica do início da execução até a consumação do delito Vejamos um exemplo A encontra seu desafeto B em uma ponte Após conversa enganosa oferecelhe uma bebida misturada com veneno B inocente ingere o líquido Em seguida cai ao solo e o autor acredita estar ele morto Com o propósito de ocultar o cadáver A coloca o corpo de B em um saco plástico e o lança ao mar Dias depois o cadáver é encontrado em uma praia e submetido a exame necroscópico concluise ter a morte ocorrido por força de asfixia provocada por afogamento Nesse caso o autor deve responder por homicídio consumado Queria a morte de B e a ela deu causa Há perfeita congruência entre sua vontade e o resultado naturalístico produzido Há polêmica no tocante à incidência da qualificadora Para uma primeira corrente deve ser considerado o meio de execução que o agente desejava empregar para a consumação em nosso exemplo o veneno e não aquele que acidentalmente permitiu a eclosão do resultado naturalístico asfixia provocada pelo afogamento Entretanto para uma segunda corrente é preciso levar em conta o meio que efetivamente levou à consumação do crime asfixia e não aquele visado pelo agente veneno14 Dolo antecedente também conhecido como inicial ou preordenado é o que existe desde o início da execução do crime É suficiente para fixar a responsabilidade penal do agente Com efeito não é necessário que o dolo subsista durante o integral desenvolvimento dos atos executórios Há quem não concorde com essa espécie de dolo A propósito discorre Guilherme de Souza Nucci Tratase de elemento subjetivo inadequado para a teoria do crime O autor deve agir sempre com dolo atual isto é concomitante à conduta desenvolvese a sua intenção de realização do tipo penal15 Dolo atual ou concomitante é aquele em que persiste a vontade do agente durante todo o desenvolvimento dos atos executórios Dolo subsequente ou sucessivo finalmente é o que se verifica quando o agente depois de iniciar uma ação com boafé passa a agir de forma ilícita e por corolário pratica um crime ou ainda quando conhece posteriormente a ilicitude de sua conduta e ciente disso não procura evitar suas consequências 126 A diferença entre dolo antecedente e dolo subsequente é relevante para a distinção dos crimes de apropriação indébita CP art 168 e estelionato CP art 171 Na apropriação indébita o agente comportase como proprietário de uma coisa da qual tinha a posse ou detenção Recebeu o bem licitamente de boa fé mas posteriormente surge o dolo e ele não mais restitui a coisa como se seu dono fosse O dolo é subsequente Exemplo A vai a uma locadora da qual é filiado e toma emprestado um DVD de forma correta Após assistir ao filme do qual gosta muito e aproveitandose que está se mudando de país decide ficar com o bem para si e não mais o devolve dolosamente Já no estelionato o agente desde o início tem a intenção de obter ilicitamente para si o bem utilizandose de meio fraudulento para induzir a vítima a erro alcançando vantagem pessoal em prejuízo alheio O dolo é inicial Exemplo B vai à mesma locadora da qual não é sócio Apresenta documentos falsos e cria uma ficha para locação Pega um DVD levao embora e não mais retorna para devolvêlo O DOLO NAS CONTRAVENÇÕES PENAIS O art 3º do Decretolei 36881941 Lei das Contravenções Penais com a rubrica Voluntariedade Dolo e culpa estabelece Para a existência da contravenção basta a ação ou omissão voluntária Devese todavia ter em conta o dolo ou a culpa se a lei faz depender de um ou de outra qualquer efeito jurídico A primeira parte do dispositivo dizendo que para a existência da contravenção penal basta a ação ou omissão voluntária revela a íntima ligação entre a Lei das Contravenções Penais com a teoria clássica ou causal da conduta De fato o diploma legal foi promulgado na década de 40 do século passado mesma época em que entrou em vigor o Código Penal Entretanto a Lei 72091984 modificou substancialmente a Parte Geral do Código Penal a ele conferindo uma sensível orientação finalista A Lei das Contravenções Penais por sua vez foi mantida e com ela a concepção 127 clássica então reinante Por tal motivo consta do texto de lei ser suficiente para a existência da contravenção a ação ou omissão voluntária Como se sabe na teoria clássica o dolo e a culpa figuravam como elementos da culpabilidade Por corolário para a conduta seria suficiente a ação ou omissão Mas a regra deve ser interpretada levandose em conta que as contravenções penais são geralmente infrações penais de mera conduta sem produção de resultado naturalístico Assim basta efetivamente a ação ou omissão voluntária pois o dolo em consonância com o art 18 do Código Penal ocorre quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzilo E diz a segunda parte do dispositivo devese ter em conta o dolo ou a culpa se a lei faz depender de um ou de outra qualquer efeito jurídico Destarte quando a contravenção penal não se enquadrar como de mera conduta aí sim a lei exige expressamente o dolo e a culpa Concluise assim que o dispositivo não consagra a responsabilidade penal objetiva Quando se fala em ação ou omissão voluntária referese à vontade elemento da conduta e também do dolo Não há assim diferença entre o tipo subjetivo do crime e o tipo subjetivo da contravenção penal Nos dois casos exigese o dolo ainda que sem apontálo expressamente mas chamandoo apenas de ação ou omissão voluntária consistente na vontade de realizar os elementos do tipo colocandose o sujeito consciente e deliberadamente em situação ilícita PROVA DO DOLO E TEORIA DOS INDICADORES EXTERNOS O dolo seja qual for a sua espécie é um fenômeno interno do agente Mas isso não impossibilita seja provado no caso concreto Para essa finalidade Winfried Hassemer desenvolveu a teoria dos indicadores externos caracterizada pela união dos aspectos material e processual do dolo Para essa teoria é necessário analisar todas as circunstâncias ligadas à atuação do agente em três etapas distintas e sucessivas a demonstração do perigo ao bem jurídico b visão do agente acerca desse perigo e c decisão do agente sobre a realização do perigo atacando o bem jurídico16 Em síntese o dolo é um fenômeno interno do agente mas para sua afirmação reclama prova de indicadores externos Em última instância o dolo nada mais é do que a sua própria demonstração concreta 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 AgRg no REsp 1043279PR rel Min Jane Silva Desembargadora convocada do TJMG 6ª Turma j 14102008 WELZEL Hans La teoría de la acción finalista Buenos Aires Depalma 1951 p 21 ZAFFARONI Eugenio Raúl Derecho penal Parte general 2 ed Buenos Aires Ediar 2002 p 731 Seja como for dê no que der em qualquer caso não deixo de agir HC 91159MG rel Min Ellen Gracie 2ª Turma j 02092008 noticiado no Informativo 518 É inepta a denúncia que ao descrever a conduta do acusado como sendo dolosa o faz de forma genérica a ponto de ser possível enquadrála tanto como culpa consciente quanto como dolo eventual Com efeito o elemento psíquico que caracteriza o injusto penal em sua forma dolosa ou culposa deve estar bem caracterizado desde a denúncia pois é tênue a linha entre o dolo eventual e a culpa consciente STJ RHC 39267RJ rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 08042014 noticiado no Informativo 538 REsp 247263MG rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 05042001 E também AgRg no REsp 1043279PR rel Min Jane Silva Desembargadora convocada do TJMG 6ª Turma j 14102008 HC 101698RJ rel Min Luiz Fux 1ª Turma j 18102011 noticiado no Informativo 645 HC 124687MS rel Min Marco Aurélio red p o ac Min Roberto Barroso 1ª Turma j 29052018 noticiado no Informativo 904 O STJ compartilha deste entendimento REsp 1689173SC rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 21112017 noticiado no Informativo 623 Para o Superior Tribunal de Justiça na primeira fase do Tribunal do Júri ao juiz togado cabe apreciar a existência de dolo eventual ou culpa consciente do condutor do veículo que após a ingestão de bebida alcoólica ocasiona acidente de trânsito com resultado morte O legislador criou um procedimento bifásico para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida em que a primeira fase se encerra com uma avaliação técnica empreendida por um juiz togado o qual se socorre da dogmática penal e da prova dos autos e mediante devida fundamentação 11 12 13 14 15 16 portanto não se pode desprezar esse filtro de proteção para o acusado e submetêlo ao julgamento popular sem que se façam presentes as condições necessárias e suficientes para tanto REsp 1689173SC rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 21112017 noticiado no Informativo 623 o prefeito foi incluído entre os acusados unicamente em razão da função pública hierarquicamente superior à dos demais envolvidos sem indicação mínima de sua participação em prática ilícita o que evidencia por conseguinte violação à responsabilidade penal subjetiva em contraposição à objetiva cuja demonstração repele a responsabilidade presumida STF AP 912PB rel Min Luiz Fux 1ª Turma j 07032017 noticiado no Informativo 856 Inq 4483 AgRsegundoDF e Inq 4327 AgRsegundoDF rel Min Edson Fachin Plenário j 14122017 e 19122017 noticiados no Informativo 888 ROXIN Claus Derecho penal Parte general Fundamentos La estructura de la teoria del delito Trad espanhola DiegoManuel Luzón Peña Miguel Díaz y García Conlledo e Javier de Vicente Remensal Madrid Civitas 2006 p 423424 É a posição de COSTA JR Paulo José da O crime aberrante Belo Horizonte Del Rey 1996 p 7879 NUCCI Guilherme de Souza Código Penal comentado 6 ed São Paulo RT 2006 p 191 HASSEMER Winfried Los elementos característicos del dolo In Anuario de Derecho Penal y Ciencias penales Tradução de María del Mar Diaz Pita Centro de Publicaciones del Ministerio de Justicia 1990 p 931 Dentro de uma concepção finalista culpa é o elemento normativo da conduta pois a sua aferição depende da valoração do caso concreto Somente após minucioso juízo de valor poderá o intérprete afirmar se ela ocorreu ou não Os crimes culposos em regra são previstos por tipos penais abertos pois a lei não diz expressamente no que consiste o comportamento culposo reservando tal missão ao magistrado na apreciação da lide posta à sua análise Geralmente o tipo penal descreve a modalidade dolosa e quando a ele também atribui variante culposa menciona expressamente a fórmula se o crime é culposo Nada impede entretanto a definição de um crime culposo em um tipo penal fechado tal como ocorre na receptação culposa CP art 180 3º na qual o legislador aponta expressamente as formas pelas quais a culpa pode se manifestar 1 natureza ou desproporção entre o valor e o preço da coisa adquirida ou recebida pelo agente 2 condição de quem a oferece ou 3 no caso de se tratar de coisa que deve presumirse obtida por meio criminoso A opção legislativa pela descrição de crimes culposos por meio de tipos fechados seria indiscutivelmente mais segura e precisa De outro lado essa escolha logo se revelaria insuficiente pois seria impossível à lei prever antecipadamente todas as situações culposas que podem ocorrer na vida cotidiana No passado diversos autores se manifestaram pela inutilidade da aplicação da pena ao crime culposo Na Itália Puglia e Vanini sustentavam que essa modalidade de delito não provém de um impulso contrário ao Direito e consequentemente a pena se mostraria ineficaz já que a sua função seria a de afastar temporariamente do convívio social os indivíduos que revelam periculosidade fator inexistente no sujeito que praticou uma lesão por não a ter previsto quando a deveria prever Com o advento da Escola Positiva a punição da culpa passou a ser reclamada por necessidade social por ser a sanção penal uma reação constante e independente da vontade O homem seria responsável tanto pelo crime culposo como pelo crime doloso porque vive em sociedade Atualmente encontrase encerrada a discussão acerca da obrigatoriedade de punição do crime culposo O interesse público impõe consequências penais àqueles que agem culposamente visando a preservação de bens indispensáveis ou relevantes à vida em sociedade Oportuna a lição de E Magalhães Noronha ainda mais forte na modernidade em que ora vivemos com exemplos constantes de acidentes aéreos desabamentos de construções e estádios de futebol crateras de metrôs que tiram a vida de inúmeras pessoas e tantos outros casos que infelizmente vêm se tornando cada vez mais rotineiros É indiscutível pois a necessidade da repressão e prevenção do delito culposo Este é sobretudo o delito dos tempos atuais do progresso e da civilização Com o desenvolvimento da indústria com o advento da era da máquina multiplicaramse os crimes culposos Basta confrontarse o Código Penal vigente com o do Império para se verificar o chocante contraste entre eles em matéria de culpa A consciência social hoje não mais suportaria o olvido do delito culposo Os grandes sinistros desastres ferroviários aéreos marítimos incêndios de arranhacéus etc produzindo numerosas vítimas e danos patrimoniais vultosos exigem sempre a apuração da causa que não é tolerável quando se demonstra ter sido gerada pela imprudência negligência ou imperícia de uma ou outra pessoa Em situações tais confrangenos a ideia de que nunca tantos pagaram por tão poucos1 Em respeito ao menor desvalor da conduta porém os crimes culposos são apenados de modo mais brando do que os dolosos Lembremos a propósito do crime de homicídio culposo na direção de veículo automotor CTB art 302 no qual mesmo com a eliminação da vida humana por força da falta de atenção no emprego de meio de transporte indispensável nos dias em que vivemos a pena máxima é de detenção por quatro anos de rara aplicação prática Em outro polo um crime de furto praticado em concurso de pessoas ainda que o bem subtraído seja de pequeno valor pode ter a pena máxima de oito anos de reclusão sem prejuízo da multa Para possibilitar a integral assimilação do crime culposo apresentaremos um conceito posteriormente fracionado em diversos elementos Com seus elementos e também com o exame das espécies de crimes culposos será mais didática a compreensão do assunto frequente em concursos públicos e alvo de inúmeras provas dissertativas Crime culposo é o que se verifica quando o agente deixando de observar o dever objetivo de cuidado por imprudência negligência ou imperícia realiza voluntariamente uma conduta que produz resultado naturalístico não previsto nem querido mas objetivamente previsível e excepcionalmente previsto e querido que podia com a devida atenção ter evitado O crime culposo possui em regra os seguintes elementos assim representados 1341 Conduta voluntária No crime culposo a vontade do agente se limita à prática de uma conduta perigosa por ele aceita e desejada2 É importante destacar que a vontade do agente circunscrevese à realização da conduta e não à produção do resultado naturalístico Caso contrário ou seja desejando concretizar o resultado a hipótese é de crime doloso Ninguém duvida por exemplo que o motorista que conduz o seu automóvel a 180 quilômetros por hora em via pública movimentada e atropela um pedestre matandoo quis dirigir seu veículo em excesso de velocidade O crime culposo pode ser praticado por ação ou omissão Há culpa tanto quando a mãe coloca a criança para ser aquecida próxima ao fogo vindo a ser queimada ação como quando a mãe desidiosa dorme em excesso e não ministra ao bebê medicamentos no horário adequado prejudicando a sua saúde omissão A conduta todavia é penalmente lícita ou quando ilícita não se destina à produção do resultado naturalístico integrante do crime culposo É o caso da pessoa que trafega em velocidade incompatível com a segurança na proximidade de uma escola Ainda que se subsuma ao modelo típico previsto no art 311 da Lei 95031997 Código de Trânsito Brasileiro não se relaciona ao homicídio culposo na direção de veículo automotor CTB art 302 enquanto não for retirada a vida de alguém 1342 13421 13422 134221 Violação do dever objetivo de cuidado Apontamentos gerais A vida em sociedade retira do homem o direito de fazer tudo o que desejar quando e onde o desejar Os interesses de terceiras pessoas e da própria comunidade lhe impõem barreiras instransponíveis Nesse diapasão o dever objetivo de cuidado é o comportamento imposto pelo ordenamento jurídico a todas as pessoas visando o regular e pacífico convívio social No crime culposo tal dever é desrespeitado pelo agente com a prática de uma conduta descuidada a qual fundada em injustificável falta de atenção emana de sua imprudência negligência ou imperícia Em razão de existir em todo delito culposo essa violação ao dever objetivo de cuidado alguns doutrinadores referemse a ele como o objeto central do estudo do Direito Penal da Negligência o gênero que teria como espécies a imprudência a negligência propriamente dita e a imperícia3 Modalidades de culpa Imprudência negligência e imperícia são modalidades e não espécies de culpa É por meio delas que o crime culposo se manifesta por tais modos ele se realiza no mundo exterior Imprudência É a forma positiva da culpa in agendo consistente na atuação do agente sem observância das cautelas necessárias É a ação intempestiva e irrefletida Tem forma ativa Desenvolvese sempre de modo paralelo à ação ou seja surge e se manifesta enquanto o seu autor pratica a conduta No caso em que o motorista dirige seu veículo automotor enquanto ele respeitar as leis de trânsito a sua conduta é correta A partir do momento em que passa por exemplo a dirigir em excesso de velocidade surge a imprudência E quanto mais ele insistir e agravar essa conduta mais duradoura e perceptível será essa modalidade de 134222 134223 culpa Negligência É a inação a modalidade negativa da culpa in omitendo consistente na omissão em relação à conduta que se devia praticar Negligenciar é omitir a ação cuidadosa que as circunstâncias exigem Ocorre previamente ao início da conduta É o caso do agente que deixa a arma de fogo municiada em local acessível a menor de idade inabilitado para manuseála que dela se apodera vindo a matar alguém O responsável foi negligente e depois da sua omissão e em razão dela a conduta criminosa foi praticada Imperícia É também chamada de culpa profissional pois somente pode ser praticada no exercício de arte profissão ou ofício Sempre ocorre no âmbito de uma função na qual o agente em que pese esteja autorizado a desempenhá la não possui conhecimentos práticos ou teóricos para fazêla a contento Toda profissão arte ou ofício são regidas por princípios e regras que devem ser do conhecimento e do domínio de todos que a elas se dedicam Se tais pessoas ultrapassarem os seus limites conscientes ou inconscientes de sua incapacidade violam a lei e respondem pelas consequências A imperícia somente pode acontecer no exercício de arte profissão ou ofício Pode até ocorrer fora destas mas sob o ponto de vista jurídico deverá então ser tratada como imprudência ou negligência Assim por exemplo se um médico realizando um parto causa a morte da gestante será imperito Entretanto se a morte for provocada pelo parto mal efetuado por um curandeiro não há falar em imperícia mas em imprudência E ainda os erros cometidos no desempenho de arte profissão ou ofício não serão sempre frutos da imperícia pois podem ser ordenados por negligência ou imprudência Negligente seria por exemplo o médico que ao receitar trocasse o nome do medicamento provocando a morte do doente Por seu turno imprudente 134224 seria exemplificativamente o cirurgião que podendo realizar a operação por um método simples e conhecido decide utilizar por vaidade profissional outro mais complexo e difícil daí resultando a morte do paciente Anotese porém que nem toda falha no exercício de arte profissão ou ofício constituise em imperícia A lei ao determinar os requisitos necessários ao exercício de determinada atividade não pode exigir de todas as pessoas o mesmo talento igual cultura ou idêntica habilidade Nesse passo a imperícia não se confunde com o erro profissional Erro profissional é o que resulta da falibilidade das regras científicas O agente conhece e observa as regras da sua atividade as quais todavia por estarem em constante evolução mostramse imperfeitas e defasadas para a solução do caso concreto Exemplo Um paciente com câncer no cérebro é internado em hospital especializado e seu tratamento fica a cargo de determinado médico Todos os procedimentos para combate e eliminação da doença são realizados da melhor forma possível Nada obstante o paciente morre Questionase Nesse caso há imperícia por parte do médico É claro que não pois ele realizou com zelo todos os procedimentos e protocolos que tinha à sua disposição A culpa não é dele mas da própria ciência da medicina que não se mostra capacitada para enfrentar com sucesso o problema que lhe foi apresentado Destarte o erro profissional exclui a culpa uma vez que o resultado ocorre não em razão da conduta do agente e sim pelas deficiências da própria ciência Modalidades de culpa e descrição fática Qualquer das modalidades da culpa imprudência negligência ou 1343 imperícia deve ser detalhadamente descrita na inicial acusatória denúncia ou queixacrime sob pena de inépcia em face da violação do direito à ampla defesa e da caracterização da responsabilidade penal objetiva Na lúcida visão do Superior Tribunal de Justiça É inepta a denúncia que imputa a prática de homicídio culposo na direção de veículo automotor art 302 da Lei 95031997 sem descrever de forma clara e precisa a conduta negligente imperita ou imprudente que teria gerado o resultado morte sendo insuficiente a simples menção de que o suposto autor estava na direção do veículo no momento do acidente Isso porque é ilegítima a persecução criminal quando comparandose o tipo penal apontado na denúncia com a conduta atribuída ao denunciado não se verificar o preenchimento dos requisitos do art 41 do CPP necessários ao exercício do contraditório e da ampla defesa De fato não se pode olvidar que o homicídio culposo se perfaz com a ação imprudente negligente ou imperita do agente modalidades de culpa que devem ser descritas na inicial acusatória sob pena de se punir a mera conduta de envolverse em acidente de trânsito algo irrelevante para o Direito Penal A imputação sem a observância dessas formalidades representa a imposição de indevido ônus do processo ao suposto autor ante a ausência da descrição de todos os elementos necessários à responsabilização penal decorrente da morte da vítima Configura ademais responsabilização penal objetiva derivada da mera morte de alguém em razão de acidente causado na direção de veículo automotor4 Resultado naturalístico involuntário No crime culposo o resultado naturalístico modificação do mundo exterior provocada pela conduta do agente funciona como elementar do tipo penal Em consequência todo crime culposo integra o grupo dos crimes materiais O sistema penal brasileiro não admite crimes culposos de mera conduta ao contrário do que ocorre em outros países como na Itália5 O resultado naturalístico é obrigatoriamente involuntário salvo na culpa 1344 1345 1346 imprópria adiante analisada Concluise assim ser o crime culposo incompatível com a tentativa É óbvio que não se pode aceitar o início da execução de um crime que não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente na hipótese em que o resultado não é desejado Portanto ou o resultado se produz e o crime está consumado ou da conduta perigosa não sobrevém o resultado e o fato é um irrelevante penal ao menos para a tipificação do crime culposo6 Nexo causal Por se tratar de crime material a perfeição do crime culposo depende da produção do resultado naturalístico E como ocorre nos demais crimes materiais exigese o nexo causal isto é a relação de causa e efeito entre a conduta voluntária perigosa e o resultado involuntário Em consonância com a teoria da conditio sine qua non adotada pelo art 13 caput do Código Penal deve ser provado por exemplo que a morte da vítima foi produzida pela conduta do agente No âmbito jurídico a afirmação da causalidade deve estar respaldada em elementos empíricos demonstrativos que o resultado não ocorreria com um grau de probabilidade nos limites da certeza se a ação devida fosse efetivamente evitada ou realizada tal como o contexto o determinava Caso essa relação não seja empiricamente comprovada é de se negar a causalidade7 Tipicidade A tipicidade é elemento do fato típico em todos os crimes Dessa forma precisa estar presente para a configuração do crime culposo Reclamase o juízo de subsunção de adequação entre a conduta praticada pelo agente no mundo real e a descrição típica contida na lei penal para o aperfeiçoamento do delito culposo Previsibilidade objetiva É a possibilidade de uma pessoa comum com inteligência mediana prever o resultado Esse indivíduo comum de atenção diligência e perspicácia normais à generalidade das pessoas é o que se convencionou chamar de homem médio homo medius Não se trata de pessoa brilhante e genial nem de um ser humano indolente e desleixado É uma pessoa normal de comportamento padrão quando comparado aos indivíduos em geral Falase também em homem standard Existe a previsibilidade do resultado quando mediante um juízo de valor se conclui que o homem médio nas condições em que se encontrava o agente teria antevisto o resultado produzido Nas lições de Nélson Hungria Existe previsibilidade quando o agente nas circunstâncias em que se encontrou podia segundo a experiência geral terse representado como possíveis as consequências do seu ato Previsível é o fato cuja possível superveniência não escapa à perspicácia comum Por outras palavras é previsível o fato sob o prisma penal quando a previsão do seu advento no caso concreto podia ser exigida do homem normal do homo medius do tipo comum de sensibilidade éticosocial8 Em suma por ser a culpa o elemento normativo do tipo penal o magistrado deve valorar a situação inserindo hipoteticamente o homem médio no lugar do agente no caso concreto Se concluir que o resultado era previsível àquele estará configurada a previsibilidade a este Daí falarse em previsibilidade objetiva por levar em conta o fato concreto e um elemento padrão para a sua aferição e não o agente9 Embora existam valiosos entendimentos nesse sentido deve ser refutada a proposta de apreciar a previsibilidade de forma subjetiva isto é sob o prisma subjetivo do autor do fato a qual leva em consideração os dotes intelectuais sociais econômicos e culturais do agente O Direito Penal não pode ficar submisso aos interesses de pessoas incautas e despreparadas para o convívio social Ademais a previsibilidade subjetiva fomentaria a impunidade pois por se cuidar de questão que habita o aspecto interno do homem jamais poderia ser fielmente provada a compreensão do agente acerca do resultado que a sua conduta era capaz de produzir 1347 Lembrese de uma regra que irá ajudar no estudo de toda a teoria do crime O estudo do crime qualquer que seja o conceito analítico que se adote se divide em três grandes grupos 1 fato típico 2 ilicitude e 3 culpabilidade O fato é típico e ilícito O agente é culpável Em outras palavras a tipicidade e a ilicitude pertencem ao fato e a culpabilidade ao agente Disso se infere que sempre que se estudam o fato típico e a ilicitude leva se em conta a figura do homem médio um paradigma utilizado para análise do caso concreto Por outro lado quando se aborda a culpabilidade levase em conta o perfil subjetivo do agente Peço desculpa por ser repetitivo mas o que vale é a sua compreensão Lembrese o fato é típico e ilícito logo como o que interessa é o fato desprezamse as condições do agente pois valem somente as circunstâncias do fato O agente todavia é culpável Na análise da culpabilidade portanto levase em conta sempre o perfil subjetivo do agente Em compasso com a questão em epígrafe concluise que na constatação da previsibilidade do resultado naturalístico no crime culposo a análise é objetiva fundada no homem médio O perfil subjetivo do agente não é desprezado pois sua análise fica reservada ao juízo da culpabilidade dentro de um de seus elementos a potencial consciência da ilicitude E nesse caso a falta de previsibilidade subjetiva importa no afastamento da potencial consciência da ilicitude elemento da culpabilidade e consequentemente na exclusão da própria culpabilidade Ausência de previsão Em regra o agente não prevê o resultado objetivamente previsível Não enxerga aquilo que o homem médio conseguiria ver 1351 Excepcionalmente todavia há previsão do resultado culpa consciente Culpa inconsciente e culpa consciente Essa divisão tem como fator distintivo a previsão do agente acerca do resultado naturalístico provocado pela sua conduta Culpa inconsciente sem previsão ou ex ignorantia é aquela em que o agente não prevê o resultado objetivamente previsível Culpa consciente com previsão ou ex lascivia é a que ocorre quando o agente após prever o resultado objetivamente previsível realiza a conduta acreditando sinceramente que ele não ocorrerá Representa o estágio mais avançado da culpa pois se aproxima do dolo eventual Dele todavia se diferencia Na culpa consciente o sujeito não quer o resultado nem assume o risco de produzilo Apesar de sabêlo possível acredita sinceramente ser capaz de evitálo o que apenas não acontece por erro de cálculo ou por erro na execução No dolo eventual o agente não somente prevê o resultado naturalístico como também apesar de tudo o aceita como uma das alternativas possíveis Examinemos a seguinte situação A sai atrasado de casa em uma motocicleta e se dirige para uma entrevista que provavelmente lhe garantirá um bom emprego No caminho fica parado em um congestionamento Ao perceber que a hora combinada se aproxima e se continuar ali inerte não chegará em tempo decide trafegar um quarteirão pela calçada com o propósito de em seguida rumar por uma via alternativa descongestionada Na calçada deparase com inúmeros pedestres mas mesmo assim insiste em sua escolha Certamente lhe é previsível que assim agindo pode atropelar pessoas e consequentemente ferilas e inclusive matálas Mas vai em frente e acaba por colidir com uma senhora de idade matandoa Questionase tratase de homicídio culposo na direção de veículo 1352 automotor CTB art 302 ou de homicídio doloso CP art 121 Se A após prever o resultado acreditar honestamente que ele não irá ocorrer até mesmo porque fará de tudo para evitálo estará desenhada a culpa consciente Contudo se após a previsão do resultado assumir o risco de produzilo responderá pelo dolo eventual A distinção é tênue e somente pode ser feita no caso concreto mediante a análise das provas exteriores ao fato Na visão do Supremo Tribunal Federal A diferença entre o dolo eventual e a culpa consciente encontrase no elemento volitivo que ante a impossibilidade de penetrarse na psique do agente exige a observação de todas as circunstâncias objetivas do caso concreto sendo certo que em ambas as situações ocorre a representação do resultado pelo agente Deveras tratandose de culpa consciente o agente pratica o fato ciente de que o resultado lesivo embora previsto por ele não ocorrerá A cognição empreendida nas instâncias originárias demonstrou que o paciente ao lançarse em práticas de expressiva periculosidade em via pública mediante alta velocidade consentiu em que o resultado se produzisse incidindo no dolo eventual previsto no art 18 inciso I segunda parte verbis Dizse o crime I doloso quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi lo10 O Código Penal dispensa igual tratamento à culpa consciente e à culpa inconsciente A previsão do resultado por si só não representa maior grau de reprovabilidade da conduta Culpa própria e culpa imprópria Essa classificação se baseia na intenção de produzir o resultado naturalístico Culpa própria é a que se verifica quando o agente não quer o resultado nem assume o risco de produzilo É por assim dizer a culpa propriamente dita De sua parte culpa imprópria também denominada culpa por extensão por equiparação ou por assimilação é aquela em que o sujeito após prever o resultado e desejar sua produção realiza a conduta por erro inescusável quanto à ilicitude do fato O resultado vem então a ser concretizado O agente incide em erro inescusável inaceitável injustificável quanto à ilicitude do fato Supõe uma situação fática que se existisse tornaria a sua ação legítima Como entretanto esse erro poderia ter sido evitado pelo emprego da prudência inerente ao homem médio responde a título de culpa Cuidase em verdade de dolo eis que o agente quer a produção do resultado Por motivos de política criminal no entanto o Código Penal aplica a um crime doloso a punição correspondente a um crime culposo O erro quanto à ilicitude do fato embora inescusável proporciona esse tratamento diferenciado E diante do caráter misto ou híbrido da culpa imprópria dolo tratado como culpa revelase como a única modalidade de crime culposo que comporta a tentativa Vejamos um exemplo que bem elucida toda a problemática atinente à culpa imprópria Uma garota de 15 anos de idade e pertencente a uma família conservadora é proibida pelos pais de namorar Ela desobediente namora um rapaz Os pais para evitar os encontros trancam todas as portas e janelas da casa e escondem as chaves O único meio de sair do imóvel é pela janela do quarto do casal Depois de constatar que os pais estavam em sono profundo a garota entra no dormitório dos genitores pula a janela que dá acesso ao quintal habitado por dois cães bravios sobe no muro e o ultrapassa encontrando seu precoce amado Saem de carro sem que sejam notados e horas depois durante a madrugada a jovem retorna à sua casa já saciada em seu amor Pula o muro passa pelos ferozes cães que sequer latem e ingressa no quarto dos pais pela janela Já no interior do dormitório seu pai um militar reformado nota a presença de um vulto com corpo franzino e cabelos compridos e ordena sua parada Como a sua determinação não é cumprida persegue o vulto e contra ele efetua seis certeiros disparos de arma de fogo O corpo cai ao solo Ao acender a luz nota que sua filha foi alvejada mas 1353 1354 está viva A descrição retrata um típico caso de culpa imprópria O agente efetuou disparos com arma de fogo com intenção de matar animus necandi ou animus occidendi Tinha dolo direto Agiu contudo com erro inescusável quanto à ilicitude do fato pois foi imprudente Poderia ter sido mais cauteloso já que o vulto não lhe trazia qualquer ameaça e com o silêncio dos cachorros somente poderia ser pessoa da casa Responde assim por homicídio culposo com fundamento no art 20 1º do Código Penal E mais na forma tentada em que pese se tratar de crime culposo Culpa mediata ou indireta Cuidase da espécie que se verifica quando o agente produz o resultado naturalístico indiretamente a título de culpa É o caso por exemplo da vítima que acabara de ser torturada no interior de um veículo parado no acostamento de movimentada via pública Quando conseguiu fugir ela buscou atravessar a pista foi atropelada e morreu O agente responde pela tortura e também pelo resultado morte provocado indiretamente por sua atuação culposa pois lhe era objetivamente previsível a fuga da pessoa torturada na direção da via pública É preciso destacar que a culpa mediata punível consiste em fato com relação estreita e realmente eficiente no tocante à causação do resultado naturalístico não se podendo confundila com a mera condição ou ocasião do ocorrido Culpa presumida Também denominada de culpa in re ipsa tratavase de espécie de culpa admitida pela legislação penal existente no Brasil antes da entrada em vigor do Código Penal de 1940 e consistia na simples inobservância de uma disposição regulamentar Foi abolida do sistema penal pátrio por constituirse em verdadeira responsabilidade penal objetiva retrocesso a tempos pretéritos em que o homem pagava pelo que fizera sem nenhuma preocupação com o elemento subjetivo Não se presume a culpa Ao contrário sempre deve ser provada por quem alega sua ocorrência pois a responsabilidade penal é de caráter subjetivo11 No passado buscouse distinguir a culpa quanto à sua intensidade em grave leve e levíssima A culpa grave ou lata ocorreria quando qualquer pessoa fosse capaz de prever o resultado Por sua vez a culpa leve estaria presente somente nos casos em que um homem de inteligência mediana pudesse antever o resultado Finalmente a culpa levíssima seria aquela em que o resultado se afigurasse perceptível somente às pessoas de excepcional cautela e inteligência aproximandose bastante do caso fortuito O Direito Penal brasileiro refuta a divisão da culpa em graus Ou há culpa e está configurada a responsabilidade do agente ou não existe culpa e o fato é penalmente irrelevante De fato o art 59 caput do Código Penal não elenca os graus de culpa como circunstâncias judiciais que influem na dosimetria da pena Diante do que foi abordado é importante destacar as diferenças entre modalidades espécies e graus de culpa que podem ser ilustradas no seguinte gráfico Não se admite a compensação de culpas no Direito Penal uma vez que prevalece o caráter público da sanção penal como fundamento para a sua proibição Nesses termos a culpa do agente não é anulada pela culpa da vítima Se A ultrapassou com seu carro o semáforo no sinal vermelho vindo a colidir com o automóvel de B que trafegava na contramão da direção daí resultando lesões corporais em ambos cada qual responde pelo resultado a que deu causa A compensação de culpas tem incidência apenas no direito privado com a função de reduzir ou excluir o valor da indenização pelo ilícito praticado No âmbito penal vale ressaltar que a culpa da vítima embora não afaste a culpa do agente funciona como circunstância judicial favorável ao acusado a ser sopesada pelo magistrado por ocasião da dosimetria da penabase É o que se extrai do art 59 caput do Código Penal Por último se é correto afirmar que não há compensação de culpas no Direito Penal também é certo dizer que a culpa exclusiva da vítima exclui a culpa do agente Basta a mera interpretação literal da expressão em destaque para concluir que se a culpa é exclusiva da vítima certamente o agente atuou de forma correta é dizer livre de imprudência negligência ou imperícia É o que se verifica quando duas ou mais pessoas concorrem contribuem culposamente para a produção de um resultado naturalístico Todos os envolvidos que tiveram atuação culposa respondem pelo resultado produzido Fundamentase essa posição na teoria da conditio sine qua non acolhida pelo art 13 caput do Código Penal o resultado de que depende a existência do crime somente é imputável a quem lhe deu causa E como é fácil perceber se o resultado foi provocado pela pluralidade de condutas culposas por ele respondem aqueles que as realizaram Vejamos um exemplo No cruzamento entre duas ruas o veículo de A ultrapassa o semáforo quando o sinal vermelho determinava sua parada momento em que vem a colidir com o automóvel de B o qual além de trafegar em velocidade acima da permitida também havia desrespeitado o sinal de trânsito que estava com passagem livre para pedestres Entre os carros surge um transeunte que desavisado atravessou a via pública e foi atropelado não resistindo aos ferimentos No caso mencionado tanto A como B agiram de forma culposa Concorreram para a produção do resultado naturalístico e por ele deverão responder Mas não há concurso de pessoas coautoria ou participação em face da ausência de vínculo subjetivo entre os envolvidos Preceitua corretamente o art 18 parágrafo único do Código Penal consagrando o princípio da excepcionalidade do crime culposo Salvo nos casos expressos em lei ninguém pode ser punido por fato previsto como crime senão quando o pratica dolosamente A modalidade culposa de um crime deve ser expressamente declarada pela lei No silêncio desta quanto ao elemento subjetivo sua punição apenas se verifica a título de dolo Como destaca Magalhães Noronha É excepcional a punibilidade da culpa Geralmente a norma penal pressupõe no destinatário uma vontade diretamente contrária ao preceito ou seja vontade dirigida ao evento proibido ou a um resultado imposto e obrigatório A derrogação há de ser expressamente indicada isto é devem ser declarados taxativamente os casos em que a vontade seja punível conquanto não dirigida nem ao evento interditado nem ao imposto Noutros termos assentada a normalidade do dolo resulta a excepcionalidade da culpa donde a necessidade de declaração expressa12 No campo dos crimes contra o patrimônio tipificados pelo Código Penal anotese que o único delito punido a título de culpa é a receptação CP art 180 3 O dano culposo é fato atípico embora encontre previsão no Código Penal Militar Excluise a culpa nos seguintes casos 1 Caso fortuito e força maior São acontecimentos imprevistos imprevisíveis e inevitáveis que escapam do controle da vontade do homem Se não há previsibilidade e também não existe vontade elemento indispensável à conduta não há falar em culpa nos resultados que deles se originam 2 Erro profissional A culpa pelo resultado naturalístico não é do agente mas da ciência que se mostra inapta para enfrentar determinadas situações Não se confunde com a imperícia uma vez que nesta a falha é do próprio agente que deixa de observar as regras recomendadas pela profissão arte ou ofício 3 Risco tolerado Karl Binding ao estudar o crime culposo dizia que quanto mais imprescindível for um tipo de comportamento humano maior será o risco que em relação a ele se deverá enfrentar sem que disso possa resultar qualquer espécie de reprovação jurídica Delimitase dessa forma a linha divisória entre o crime culposo e os fatos impuníveis resultantes do risco juridicamente tolerado O médico que opera um doente em estado grave em condições precárias sabe que poderá causarlhe a morte E ainda que o resultado venha a ocorrer não terá agido com culpa pois a sua intervenção cirúrgica na situação em que foi realizada era indispensável como a única forma para tentar salvar a vida do paciente A modernidade fomenta ainda mais o risco tolerado como exclusão da culpa Por diversas maneiras necessárias para a evolução do homem e da própria humanidade podem ser efetuadas atividades que proporcionam riscos calculados para bens jurídicos penalmente protegidos O piloto que testa pela primeira vez uma aeronave certamente é colocado em risco de vida mas a possibilidade de morte é tolerada e aceita para colaborar com o progresso da ciência aeronáutica indispensável na sociedade atual 4 Princípio da confiança Como o dever objetivo de cuidado se dirige a todas as pessoas podese esperar que cada um se comporte de forma prudente e razoável necessária para a coexistência pacífica em sociedade E por se presumir a boafé de todo indivíduo aquele que cumpre as regras jurídicas impostas pelo Direito pode confiar que o seu semelhante também agirá de forma acertada Assim agindo não terá culpa nos crimes eventualmente produzidos pela conduta ilícita praticada por outrem Exemplo Aquele que conduz seu carro dentro dos limites de velocidade e de forma correta pode confiar que ao cruzar o sinal verde terá o trânsito livre de modo que se um motociclista desrespeitar o semáforo e colidir com o seu carro não responderá pelas lesões eventualmente produzidas13 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 MAGALHÃES NORONHA E Do crime culposo 2 ed São Paulo Saraiva 1966 p 147148 Toda a culpa é culpa da vontade Só aquilo contra o que o homem pode do ponto de vista da vontade alguma coisa lhe pode ser censurado como culpa DIAS Jorge de Figueiredo Liberdade Culpa Direito Penal 3 ed Coimbra Coimbra Editora 1995 p 5758 Nesse sentido TAVARES Juarez Direito penal da negligência Uma contribuição à teoria do crime culposo 2 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2003 HC 305194PB rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 11112014 noticiado no Informativo 533 O art 527 do Código Penal italiano prevê a modalidade culposa do crime de ato obsceno Pode até concretizarse um crime mas sempre diferente do culposo que restaria caracterizado com a produção do resultado naturalístico Exemplo Aquele que dirige veículo automotor embriagado expondo a perigo a incolumidade de outrem responde pelo crime tipificado pelo art 306 do Código de Trânsito Brasileiro Se em razão da imprudência ao volante o agente matar alguém estará tipificado o crime delineado pelo art 302 do CTB homicídio culposo na direção do veículo automotor que absorve o de embriaguez ao volante STJ RHC 35883PE rel Min Og Fernandes 6ª Turma j 01102013 HUNGRIA Nélson Comentários ao Código Penal Rio de Janeiro Forense 1949 v 1 p 357 A par disso frisese que segundo a doutrina no momento de se determinar se a conduta do autor se ajusta ao tipo de injusto culposo é necessário indagar sob a perspectiva ex ante se no momento da ação ou da omissão era possível para qualquer pessoa no lugar do autor identificar o risco proibido e ajustar a conduta ao cuidado devido cognoscibilidade ou conhecimento do risco proibido e previsibilidade da produção do resultado típico STJ REsp 1388440ES rel Min Nefi Cordeiro 6ª Turma j 05032015 noticiado no Informativo 557 STF HC 101698RJ rel Min Luiz Fux 1ª Turma j 18102011 STF Inq 4483 AgRsegundoDF e Inq 4327 AgRsegundoDF rel Min 12 13 Edson Fachin Plenário j 14122017 e 19122017 noticiados no Informativo 888 MAGALHÃES NORONHA E Do crime culposo 2 ed São Paulo Saraiva 1966 p 101 A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e a do Supremo Tribunal Federal convergem em relação à aceitação do princípio da confiança para excluir a tipicidade penal STJ REsp 1115641MG rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 27032012 DJe 09052012 141 142 CONCEITO Preterdolo emana do latim praeter dolum ou seja além do dolo Destarte crime preterdoloso ou preterintencional é o que se verifica quando a conduta dolosa acarreta a produção de um resultado mais grave do que o desejado pelo agente O propósito do autor era praticar um crime doloso mas por culpa sobreveio resultado mais gravoso O crime preterdoloso é uma figura híbrida Há dolo do antecedente minus delictum e culpa no consequente majus delictum Não se trata de um terceiro elemento anímico nem de nova espécie de dolo ou de culpa Como define Manoel Pedro Pimentel É somente a combinação de dois elementos dolo e culpa que se apresentam sucessivamente no decurso do fato delituoso a conduta inicial é dolosa enquanto o resultado final dela advindo é culposo1 Nesse tipo de delito o agente produz resultado diverso do pretendido Há pois divergência entre a sua vontade e o resultado maior produzido Exemplo típico é apresentado pelo art 129 3º do Código Penal lesão corporal seguida de morte no qual o legislador após definir o crime de lesão corporal no caput lhe adiciona um resultado agravador a morte da vítima produzida a título de culpa O dolo em relação ao resultado agravador direto ou eventual afasta o caráter preterdoloso do crime RELAÇÃO ENTRE DOLO E CULPA 143 144 Em decorrência do misto de dolo e culpa o preterdolo é classificado como elemento subjetivonormativo do tipo penal Com efeito o dolo é o elemento subjetivo do tipo enquanto a culpa é entendida como elemento normativo pois a sua constatação depende de um prévio juízo de valor Em face da proibição da responsabilidade penal objetiva pelo resultado que agrava especialmente a pena só responde o agente que o houver causado ao menos culposamente conforme dispõe o art 19 do Código Penal Destarte o resultado mais grave deve ser objetivamente previsível ou seja previsível ao homem médio No tocante à recidiva deve o reincidente em crime preterdoloso receber idêntico tratamento destinado ao reincidente em crime doloso pois antes de sobrevir o resultado culposo mais grave já havia se aperfeiçoado um delito menos grave de natureza dolosa2 VERSARI IN RE ILLICITA A culpa que agrava especialmente o resultado deve ser provada Não se presume seja de forma absoluta iuris et de iure seja de forma relativa iuris tantum cabendo o ônus da prova a quem alega sua ocorrência Não se admite a figura da versari in re illicita originária do direito canônico e que serviu como ponto de transição entre a responsabilidade penal objetiva e a responsabilidade penal subjetiva Proclamava o brocardo Qui in re illicita versatur tenetur etiam pro casu isto é quem se envolve com coisa ilícita é responsável também pelo resultado fortuito Na hipótese de lesão corporal seguida de morte não é porque o agente desejou produzir ferimentos na vítima que automaticamente deve responder por sua morte O resultado mais grave precisa ser derivado de culpa a ser demonstrada no caso concreto CRIMES QUALIFICADOS PELO RESULTADO Crime qualificado pelo resultado é aquele que possui uma conduta básica a b c definida e apenada como delito de forma autônoma nada obstante ainda ostente um resultado que o qualifica majorandolhe a pena por força de sua gravidade objetiva desde que exista entre eles relação causal física e subjetiva Física por guardar vínculo de causa e efeito com a primeira e subjetiva por referirse ao mesmo agente Todo crime qualificado pelo resultado representa um único crime e complexo pois resulta da junção de dois ou mais delitos O crime preterdoloso é qualificado pelo resultado Mas nem todo crime qualificado pelo resultado é preterdoloso Esse é espécie daquele seu gênero Além do crime preterdoloso existem três outras espécies de crimes qualificados pelo resultado quais sejam Dolo na conduta antecedente e dolo no resultado agravador dolo no antecedente e dolo no consequente o crimebase é doloso bem como o resultado agravador Como exemplo pode ser indicado o crime de latrocínio CP art 157 3º inc II em que o roubo é doloso e a morte pode sobrevir a título de dolo mas também culposamente Culpa na conduta antecedente e culpa no resultado agravador culpa no antecedente e culpa no consequente a conduta básica e o resultado mais gravoso são legalmente previstos na forma culposa É o caso dos crimes culposos de perigo comum resultando lesão corporal grave ou morte CP art 258 in fine Culpa na conduta antecedente e dolo no resultado agravador culpa no antecedente e dolo no consequente o fato original é tipificado culposamente ao contrário do resultado agravador doloso Vejase o crime tipificado pelo art 303 parágrafo único da Lei 95031997 Código de Trânsito Brasileiro na hipótese em que o motorista de um veículo automotor em excesso de velocidade atropela um pedestre ferindoo culposamente e em seguida dolosamente deixa de prestar socorro à vítima do acidente quando era possível fazêlo sem risco pessoal Cezar Roberto Bitencourt também distingue os crimes preterdolosos dos qualificados pelo resultado mas com fundamento diverso e deveras sucinto São suas palavras Têmse utilizado a nosso juízo equivocadamente as expressões crime preterdoloso e crime qualificado pelo resultado como sinônimas No entanto segundo a melhor corrente especialmente na Itália no crime qualificado pelo resultado ao contrário do preterdoloso o resultado ulterior mais grave derivado involuntariamente da conduta criminosa lesa um bem jurídico que por sua natureza não contém o bem jurídico precedentemente lesado Assim enquanto a lesão corporal seguida de morte art 129 3º seria preterintencional o aborto seguido da morte da gestante arts 125 e 126 combinados com o 127 in fine seria crime qualificado pelo resultado O raciocínio é simples nunca se conseguirá matar alguém sem ofender sua saúde ou integridade corporal enquanto para matar alguém não se terá necessariamente de fazêlo abortar3 1 2 3 PIMENTEL Manoel Pedro O crime e a pena na atualidade São Paulo RT 1983 p 87 STJ REsp 1254749SC rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 06052014 BITENCOURT Cezar Roberto Tratado de direito penal Parte geral 11 ed São Paulo Saraiva 2007 v 1 p 290 Na redação original do Código Penal de 1940 o art 17 caput cuidava do erro de fato É isento de pena quem comete o crime por erro quanto ao fato que o constitui ou quem por erro plenamente justificado pelas circunstâncias supõe situação de fato que se existisse tornaria a ação legítima Esse dispositivo era muito menos abrangente pois se referia unicamente aos elementos objetivos do tipo penal Com a reforma da Parte Geral pela Lei 72091984 o erro de fato foi substituído pelo erro de tipo que além dos elementos objetivos engloba também os elementos subjetivos e normativos eventualmente descritos na conduta criminosa Com a rubrica erro sobre elementos do tipo dispõe o art 20 caput do Código Penal O erro sobre elemento constitutivo do tipo legal de crime exclui o dolo mas permite a punição por crime culposo se previsto em lei A expressão tipo legal de crime deixa claro que o legislador somente se preocupou com o tipo penal incriminador isto é aquele que define uma conduta criminosa cominandolhe a pena respectiva Erro é a falsa percepção da realidade ou o falso conhecimento de determinado objeto Exemplo O sujeito erra ao confundir um cavalo com um jumento Por seu turno ignorância é o completo desconhecimento da realidade ou de algum objeto Exemplo O sujeito nascido em uma casa urbana e trancado no interior de um quarto até os 18 anos de idade não tem a mínima ideia do que seja um cavalo O Código Penal trata de forma idêntica o erro e a ignorância Ambos podem ensejar a aplicação do instituto do erro de tipo Destarte quando fala em erro utiliza essa palavra em sentido amplo compreendendo o erro propriamente dito e a ignorância Erro de tipo é a falsa percepção da realidade acerca dos elementos constitutivos do tipo penal Extraise essa conclusão do art 20 caput do Código Penal que somente menciona as elementares É o chamado erro de tipo essencial Exemplo A no estacionamento de um shopping center aperta um botão inserido na chave do seu automóvel com a finalidade de desativar o alarme Escuta o barulho abre a porta do carro coloca a chave na ignição ligao e vai para casa Percebe posteriormente que o carro não lhe pertencia mas foi confundido com outro de propriedade de terceira pessoa Nesse caso A não praticou o crime de furto assim definido Subtrair para si ou para outrem coisa alheia móvel Reputava sua a coisa móvel pertencente a outrem Errou portanto sobre a elementar alheia pois o instituto impede o agente de compreender o aspecto ilícito do fato por ele praticado Para Damásio E de Jesus contudo erro de tipo é o que incide sobre elementares e circunstâncias da figura típica tais como qualificadoras e agravantes genéricas1 Em sua ótica também estaria configurado o erro de tipo quando por exemplo o sujeito desconhecendo a relação de parentesco induz a própria filha a satisfazer a lascívia de outrem Responderia no caso pela forma típica fundamental do art 227 do Código Penal sem a qualificadora do 1º Consequentemente para essa posição o erro de tipo não se limita a impedir o agente de compreender o caráter ilícito do fato praticado mas também das circunstâncias que com o fato se relacionam Nos crimes omissivos impróprios também chamados de crimes omissivos espúrios ou comissivos por omissão o dever de agir disciplinado no art 13 2º do Código Penal funciona como elemento constitutivo do tipo Destarte nada impede a incidência do erro de tipo em relação ao dever de agir para evitar o resultado levandose em conta a relação de normalidade ou perigo do caso concreto Em síntese é cabível o erro de tipo na seara dos crimes omissivos impróprios Exemplo O salvavidas avista um banhista se debatendo em águas rasas de uma praia e imaginando que ele não estava se afogando e sim dançando brincando com outra pessoa etc nada faz Posteriormente tal banhista é retirado do mar sem vida por terceiros Nessa hipótese é possível o reconhecimento do instituto previsto no art 20 caput do Código Penal aplicandose os efeitos que lhe são inerentes O erro de tipo essencial pode ser escusável ou inescusável 1 Escusável inevitável invencível ou desculpável é a modalidade de erro que não deriva de culpa do agente ou seja mesmo que ele tivesse agido com a cautela e a prudência de um homem médio ainda assim não poderia evitar a falsa percepção da realidade sobre os elementos constitutivos do tipo penal 2 Inescusável evitável vencível ou indesculpável é a espécie de erro que provém da culpa do agente é dizer se ele empregasse a cautela e a prudência do homem médio poderia evitálo uma vez que seria capaz de compreender o caráter criminoso do fato A natureza do erro escusável ou inescusável deve ser aferida na análise do caso concreto levandose em consideração as condições em que o fato foi praticado O erro de tipo seja escusável ou inescusável sempre exclui o dolo De fato como o dolo deve abranger todas as elementares do tipo penal resta afastado pelo erro de tipo pois o sujeito não possui a necessária vontade de praticar integralmente a conduta tipificada em lei como crime ou contravenção penal Por essa razão Zaffaroni denomina o erro de tipo de cara negativa do dolo2 Nada obstante os efeitos variam conforme a espécie do erro de tipo O escusável exclui o dolo e a culpa acarretando na impunidade total do fato enquanto o inescusável exclui o dolo mas permite a punição por crime culposo se previsto em lei excepcionalidade do crime culposo Nesse último o agente age de forma imprudente negligente ou imperita ao contrário do que faz no primeiro Excepcionalmente todavia pode acontecer de o erro de tipo ainda que escusável não excluir a criminalidade do fato Esse fenômeno ocorre quando se opera a desclassificação para outro crime O exemplo típico é o do particular que ofende um indivíduo desconhecendo a sua condição de funcionário público Em face da ausência de dolo quanto a essa elementar afastase o crime de desacato CP art 331 mas subsiste o de injúria CP art 140 pois a honra do particular também é tutelada pela lei penal Em que pese a proximidade terminológica os institutos não se confundem No erro de tipo o indivíduo desconhecendo um ou vários elementos constitutivos não sabe que pratica um fato descrito em lei como infração penal quando na verdade o faz Já o crime putativo por erro de tipo ou delito putativo por erro de tipo é o imaginário ou erroneamente suposto que existe exclusivamente na mente do agente Ele quer praticar um crime mas por erro acaba por cometer um fato penalmente irrelevante Exemplo A deseja praticar o crime de tráfico de drogas Lei 113432006 art 33 caput mas por desconhecimento comercializa talco Descriminante é a causa que exclui o crime retirando o caráter ilícito do fato típico praticado por alguém Essa palavra é sinônima portanto de causa de exclusão da ilicitude Putativa provém de parecer aparentar É algo imaginário erroneamente suposto É tudo aquilo que parece mas não é o que aparenta ser Destarte descriminante putativa é a causa de exclusão da ilicitude que não existe concretamente mas apenas na mente do autor de um fato típico É também chamada de descriminante erroneamente suposta ou descriminante imaginária O art 23 do Código Penal prevê as causas de exclusão da ilicitude e em todas elas é possível que o agente por erro as considere presentes estado de necessidade putativo legítima defesa putativa estrito cumprimento de dever legal putativo e exercício regular do direito putativo Basta que incidindo em erro o agente suponha situação que se realmente existisse tornaria a sua ação legítima Em síntese o sujeito reputa encontrar se em razão dos fatos que o cercam no contexto de uma causa de exclusão da ilicitude Imaginase em legítima defesa ou em estado de necessidade quando na verdade os requisitos legais de tais institutos não estão presentes As descriminantes putativas relacionamse intrinsecamente com a figura a b c do erro e podem ser de três espécies erro relativo aos pressupostos de fato de uma causa de exclusão da ilicitude É o caso daquele que ao encontrar seu desafeto e notando que tal pessoa coloca a mão no bolso saca seu revólver e o mata Descobre depois que a vítima fora acometida por cegueira por ele desconhecida e não poderia sequer ter visto o seu agressor Ausente portanto um dos requisitos da legítima defesa qual seja a agressão injusta erro relativo à existência de uma causa de exclusão da ilicitude Imaginese o sujeito que depois de encontrar sua mulher com o amante em flagrante adultério mata a ambos por crer que assim possa agir acobertado pela legítima defesa da honra Nessa situação o agente errou quanto à existência desta descriminante não acolhida pelo ordenamento jurídico em vigor erro relativo aos limites de uma causa de exclusão da ilicitude Temos como exemplo o fazendeiro que reputa adequado matar todo e qualquer posseiro que invada a sua propriedade Cuidase da figura do excesso pois a defesa da propriedade não permite esse tipo de reação desproporcional A grande celeuma repousa na natureza jurídica das descriminantes putativas No tocante às duas últimas hipóteses erro relativo à existência de uma causa de exclusão da ilicitude e erro relativo aos limites de uma causa de exclusão da ilicitude é pacífico o entendimento de que se trata de uma modalidade de erro de proibição Cuidase do denominado erro de proibição indireto Falase então em descriminante putativa por erro de proibição Subsiste o dolo e também a culpa excluindose a culpabilidade se o erro for inevitável ou escusável Caso o erro seja evitável ou inescusável não se afasta a culpabilidade e o agente responde por crime doloso diminuindose a pena de 16 um sexto a 13 um terço na forma definida pelo art 21 caput do Código Penal Com efeito no sistema finalista o dolo é natural ou seja não aloja em seu bojo a consciência da ilicitude funcionando esta última como elemento da culpabilidade E em relação à primeira hipótese erro relativo aos pressupostos de fato de uma causa de exclusão da ilicitude a natureza jurídica da descriminante putativa depende da teoria da culpabilidade adotada3 Para a teoria normativa pura em sua vertente limitada constituise em erro de tipo permissivo Surgem então as descriminantes putativas por erro de tipo No exemplo acima indicado item a se escusável o erro excluise o dolo e a culpa acarretando na atipicidade do fato pois no finalismo o dolo e a culpa compõem a estrutura da conduta Sem eles não há conduta e sem conduta o fato é atípico Mas se inescusável o erro afastase o dolo subsistindo a responsabilidade por crime culposo se previsto em lei CP art 20 1º Filiamse a essa posição entre outros Damásio E de Jesus4 e Francisco de Assis Toledo5 A Lei 72091984 acolheu essa teoria como se extrai do item 19 da Exposição de Motivos da Nova Parte Geral do Código Penal Repete o Projeto as normas do Código de 1940 pertinentes às denominadas descriminantes putativas Ajustase assim o Projeto à teoria limitada da culpabilidade que distingue o erro incidente sobre os pressupostos fáticos de uma causa de justificação do que incide sobre a norma permissiva grifamos De outro lado para a teoria normativa pura em sua variante extremada extrema ou estrita tratase também de hipótese de erro de proibição Logo constitui descriminante putativa por erro de proibição com todos os seus efeitos subsiste o dolo e também a culpa excluindose a culpabilidade se o erro for inevitável ou escusável Se evitável ou inescusável o erro não se afasta a culpabilidade e o agente responde por crime doloso diminuindose a pena de 16 um sexto a 13 um terço nos moldes do art 21 caput do Código Penal Partilham desse entendimento que consagra em sede de descriminantes putativas a teoria unitária do erro Cezar Roberto Bitencourt6 e Guilherme de Souza Nucci7 entre outros Enfim a natureza jurídica das descriminantes putativas varia conforme a teoria da culpabilidade adotada Em uma visão esquemática Estabelece o art 20 2º do Código Penal Responde pelo crime o terceiro que determina o erro Cuidase da hipótese na qual quem pratica a conduta tem uma falsa percepção da realidade no que diz respeito aos elementos constitutivos do tipo penal em decorrência da atuação de terceira pessoa chamada de agente provocador O agente não erra por conta própria erro espontâneo mas de forma provocada isto é determinada por outrem O erro provocado pode ser doloso ou culposo dependendo do elemento subjetivo do agente provocador Quando o provocador atua dolosamente a ele deve ser imputado na forma dolosa o crime cometido pelo provocado Exemplo A apressado para não perder o ônibus pede na saída da aula para B lhe arremessar seu aparelho de telefone celular que esquecera na mesa B dolosamente entrega o telefone pertencente a C seu desafeto O provocado que no caso seria A nesse caso ficará impune sendo escusável seu erro Mas se o seu erro for inescusável responderá por crime culposo se previsto em lei No exemplo acima escusável ou inescusável o erro nenhum crime seria imputado a A em face da inexistência do crime de furto culposo Pode ainda o provocador agir culposamente por imprudência negligência ou imperícia situação na qual a ele será imputado o crime culposo praticado pelo provocado se previsto em lei Exemplo Sem tomar maiores cautelas o vendedor entrega para teste um veículo sem freios que ainda estava na oficina mecânica da concessionária O pretenso comprador ao dirigir o automóvel atropela e mata um transeunte Nessa situação o provocado também poderá responder pelo crime culposo desde que o seu erro seja inescusável Ao contrário tratandose de erro escusável permanecerá impune É possível que o agente provocador e o provocado pelo erro atuem dolosamente quanto à produção do resultado Imaginese o seguinte exemplo A pede emprestado a B um pouco de açúcar para adoçar excessivamente o café de C Entretanto B desafeto de C entrega veneno no lugar do açúcar com a intenção de matálo A famoso químico percebe a manobra de B e mesmo assim coloca veneno no café de C que o ingere e morre em seguida Ambos respondem por homicídio qualificado CP art 121 2º inc III A como autor e B na condição de partícipe E se no exemplo anterior A age dolosamente e B culposamente Não há erro provocado pois A atuou dolosamente E também não há participação culposa por parte de B pois inexiste participação culposa em crime doloso Enfim não há concurso de pessoas A responde por homicídio doloso e B por homicídio culposo Como apontava Basileu Garcia a norma atinente ao erro determinado por terceiro permite situações curiosas Exemplificativamente vejase o caso do indivíduo que induza ao casamento pessoa casada convencendoa com artifícios da cessação do impedimento O autor das manobras iludentes sem ter contraído matrimônio será responsabilizado por bigamia a cuja acusação se subtrairá o nubente Em suma o terceiro não casado responde por bigamia o que não se verifica com a pessoa casada que contrai novo matrimônio8 Erro de tipo acidental é o que recai sobre dados diversos dos elementos constitutivos do tipo penal ou seja sobre as circunstâncias qualificadoras agravantes genéricas e causas de aumento da pena e fatores irrelevantes da figura típica A infração penal subsiste íntegra e esse erro não afasta a responsabilidade penal Pode ocorrer nas seguintes situações 1 erro sobre a pessoa 2 erro sobre o objeto 3 erro quanto às qualificadoras 4 erro sobre o nexo causal 5 erro na execução e 6 resultado diverso do pretendido Esses três últimos são denominados de crimes aberrantes É o que se verifica quando o agente confunde a pessoa visada contra a qual desejava praticar a conduta criminosa com pessoa diversa Exemplo A com a intenção de matar B efetua disparos de arma de fogo contra C irmão gêmeo de B confundindoo com aquele que efetivamente queria matar Esse erro é irrelevante em face da teoria da equivalência do bem jurídico atingido Nesse contexto o art 121 do Código Penal protege a vida humana independentemente de se tratar de B ou de C O crime consiste em matar alguém e no exemplo mencionado a conduta de A eliminou a vida de uma pessoa A propósito estabelece o art 20 3º do Código Penal O erro quanto à pessoa contra a qual o crime é praticado não isenta de pena Não se consideram neste caso as condições ou qualidades da vítima senão as da pessoa contra quem o agente queria praticar o crime A regra portanto consiste em levar em conta para a aplicação da pena as condições da vítima virtual isto é aquela que o sujeito pretendia atingir mas que no caso concreto não sofreu perigo algum e não a vítima real que foi efetivamente atingida Nesses termos se no exemplo acima A queria matar seu pai mas acabou causando a morte de seu tio incide a agravante genérica relativa ao crime praticado contra ascendente CP art 61 inc II alínea e embora não tenha sido cometido o parricídio Nessa espécie de erro de tipo acidental o sujeito crê que a sua conduta recai sobre um determinado objeto mas na verdade incide sobre coisa diversa Exemplo A acredita que subtrai um relógio Rolex avaliado em R 3000000 quando realmente furta uma réplica de tal bem a qual custa R 50000 Esse erro é irrelevante de natureza acidental e não interfere na tipicidade penal O art 155 caput do Código Penal tipifica a conduta de subtrair para si ou para outrem coisa alheia móvel e no exemplo houve a subtração do patrimônio alheio pouco importando o seu efetivo valor A coisa alheia móvel saiu da esfera de vigilância da vítima para ingressar no patrimônio do ladrão A análise do caso concreto entretanto pode autorizar a incidência do princípio da insignificância excluindo a tipicidade do fato quando todos os seus requisitos objetivos e subjetivos estiverem presentes É o que se dá a título ilustrativo na hipótese em que o agente primário e sem antecedentes criminais subtrai de uma grande joalheira uma imitação de um relógio de alto valor porém avaliada em somente R 1000 O sujeito age com falsa percepção da realidade no que diz respeito a uma qualificadora do crime Exemplo O agente furta um carro depois de conseguir por meio de fraude a chave verdadeira do automóvel Acredita praticar o crime de furto qualificado pelo emprego de chave falsa CP art 155 4º inc III quando na verdade não incide o tipo derivado por se tratar de chave verdadeira Esse erro não afasta o dolo nem a culpa relativamente à modalidade básica do delito9 Desaparece a qualificadora por falta de dolo mas se mantém intacto o tipo fundamental ou seja subsiste o crime efetivamente praticado o qual deve ser imputado ao seu responsável10 É o engano relacionado à causa do crime o resultado buscado pelo agente ocorreu em razão de um acontecimento diverso daquele que ele inicialmente idealizou Não há erro quanto às elementares do tipo bem como no tocante à ilicitude do fato Com efeito esse erro é penalmente irrelevante de natureza acidental pois o sujeito queria um resultado naturalístico e o alcançou O dolo abrange todo o desenrolar da ação típica do início da execução até a consumação Exemplo A no alto de uma ponte empurra B que não sabia nadar ao mar para matálo afogado A vítima falece não por força da asfixia derivada do afogamento e sim por traumatismo crânioencefálico pois se chocou em uma pedra antes de ter contato com a água O agente deve responder pelo delito em sua modalidade consumada Ele queria a morte de B e efetivamente a produziu Há perfeita congruência entre a sua vontade e o resultado naturalístico produzido No âmbito da qualificadora há duas posições a deve ser considerado o meio de execução que o agente desejava empregar para a consumação asfixia e não aquele que acidentalmente permitiu a eclosão do resultado naturalístico e b é preciso levar em conta o meio de execução que efetivamente provocou o resultado e não aquele idealizado pelo agente Por fim surge uma indagação Qual é a diferença entre o erro sobre o nexo causal aberratio causae e o dolo geral ou por erro sucessivo A resposta é simples Naquele há um único ato no exemplo acima empurrar a vítima do alto da ponte neste por sua vez há dois atos distintos exemplo A atira em B que cai ao solo Como ele acredita na morte da vítima lança o corpo ao mar para ocultar o cadáver mas posteriormente se constata que a morte foi produzida pelo afogamento e não pelo disparo de arma de fogo Encontra previsão no art 73 do Código Penal Art 73 Quando por acidente ou erro no uso dos meios de execução o agente ao invés de atingir a pessoa que pretendia ofender atinge pessoa diversa responde como se tivesse praticado o crime contra aquela atendendose ao disposto no 3º do art 20 deste Código No caso de ser também atingida pessoa que o agente pretendia ofender aplicase a regra do art 70 deste Código Erro na execução é a aberração no ataque em relação à pessoa a ser atingida pela conduta criminosa O agente não se engana quanto à pessoa que desejava atacar mas age de modo desastrado errando o seu alvo e acertando pessoa diversa Queria praticar um crime determinado e o fez Errou quanto à pessoa queria atingir uma mas acaba ofendendo outra A 1ª parte do art 73 do Código Penal é taxativa a relação no erro na execução é de pessoa x pessoa e não crime x crime Exemplo A nota que B seu inimigo está parado em um ponto de ônibus Saca sua arma mirao e efetua o disparo para matálo mas por falha na pontaria acerta C que também aguardava o coletivo matandoo O crime que queria praticar e o crime que praticou são idênticos mas a pessoa morta é diversa da visada Além disso determina o dispositivo legal que no erro na execução deve atenderse ao disposto pelo art 20 3º do Código Penal isto é observamse as regras inerentes ao erro sobre a pessoa Assim levamse em conta as condições da vítima que o agente desejava atingir vítima virtual desprezandose as condições pessoais da vítima efetivamente ofendida vítima real Entretanto erro na execução e erro sobre a pessoa são institutos diversos No erro sobre a pessoa o agente confunde a pessoa que queria atingir com pessoa diversa Existem portanto somente duas pessoas envolvidas agente e vítima real Exemplo O sujeito queria matar seu pai mas mata seu tio irmão gêmeo acreditando tratarse do seu genitor Além disso a vítima virtual não sofre perigo pois a conduta é direcionada à vítima real na confusão entre pai e tio o primeiro sequer estava no local dos fatos ao alcance do homicida Por outro lado no erro na execução o agente não confunde a pessoa que desejava atingir com outra mas por aberração no ataque acaba por acertar pessoa diversa Há três pessoas envolvidas agente vítima virtual e vítima real No exemplo do ponto ônibus A sabia que era seu desafeto que ali estava e o mirou mas matou pessoa diversa que se encontrava nas proximidades E ainda a vítima virtual é exposta à situação de perigo poderia ter sido alvejada o que somente não ocorreu por falha na pontaria O erro na execução pode ser de duas espécies com unidade simples ou com unidade complexa 1 Com unidade simples ou com resultado único é a situação descrita pelo art 73 1ª parte do Código Penal na qual o agente atinge unicamente a pessoa diversa da desejada A vítima virtual não suporta qualquer tipo de lesão No exemplo do ponto de ônibus o sujeito deveria responder por tentativa de homicídio contra B em concurso formal com homicídio culposo contra C Mas em consonância com a regra legal responde de forma idêntica ao que se dá no erro sobre a pessoa A lei faz de conta que a vítima real era a vítima virtual Logo tratase de erro de tipo acidental e irrelevante 2 Com unidade complexa ou com resultado duplo é a situação descrita pelo art 73 in fine do Código Penal na qual o sujeito além de atingir a pessoa inicialmente desejada ofende também pessoa ou pessoas diversas Sua conduta enseja dois resultados o originariamente pretendido e o involuntário É como se no exemplo acima indicado A matasse B dolosamente e também C a título de culpa como na hipótese em que o projétil perfura o corpo de uma vítima para alojarse no corpo da outra vítima Nessa hipótese determina o Código Penal a aplicação da regra do concurso formal próprio ou perfeito CP art 70 caput 1ª parte o magistrado utiliza a pena do crime mais grave aumentandoa de um 16 um sexto até a 12 metade O percentual de aumento varia de acordo com o número de crimes produzidos a título de culpa Cuidado admitese o erro na execução com unidade complexa apenas quando as demais pessoas forem atingidas culposamente Nesse caso aplica se o sistema do concurso formal próprio ou perfeito sistema da exasperação com a imposição da pena de um dos crimes aumentada de 16 um sexto até 12 metade Se houver dolo eventual no tocante às demais pessoas ofendidas não há falar propriamente em erro na execução e incide a regra do concurso formal impróprio ou imperfeito sistema do cúmulo material Somamse as penas pois a pluralidade de resultados deriva de desígnios autônomos ou seja dolos diversos para a produção dos resultados naturalísticos11 Encontrase previsto no art 74 do Código Penal Fora dos casos do artigo anterior quando por acidente ou erro na execução do crime sobrevém resultado diverso do pretendido o agente responde por culpa se o fato é previsto como crime culposo se ocorre também o resultado pretendido aplicase a regra do art 70 deste Código O referido dispositivo disciplina a situação em que por acidente ou erro na execução do crime sobrevém resultado diverso do pretendido Em outras palavras o agente desejava cometer um crime mas por erro na execução acaba por cometer crime diverso Ao contrário do erro na execução no resultado diverso do pretendido a relação é crime x crime Daí o nome resultado crime diverso do pretendido Não por outro motivo o dispositivo legal é peremptório ao dizer que essa regra se aplica fora dos casos do artigo anterior isto é nas situações que não envolvam o erro na execução relativo à pessoa x pessoa O clássico exemplo formulado por Giuseppe Maggiore é o do sujeito que atira uma pedra para quebrar uma vidraça CP art 163 dano mas por erro na execução atinge uma pessoa que passava pela rua lesionandoa CP art 129 lesões corporais O resultado diverso do pretendido pode revelarse sob duas espécies com unidade simples ou com unidade complexa 1 Com unidade simples ou com resultado único prevista no art 74 1ª parte do Código Penal Nessa situação o agente atinge somente bem jurídico diverso do pretendido É o que se dá no exemplo acima mencionado O dispositivo legal é claro o agente responde por culpa se o fato é previsto como crime culposo Assim será imputado apenas o crime de lesão corporal culposa 2 Com unidade complexa ou resultado duplo prevista no art 74 2ª parte do Código Penal Nessa situação a conduta do agente atinge o bem jurídico desejado e também bem jurídico diverso culposamente No exemplo o sujeito quebra a vidraça e também fere a pessoa Utilizase a regra do concurso formal aplicandose a pena do crime mais grave aumentada de 16 um sexto até 12 metade variando o aumento de acordo com o número de crimes produzidos a título de culpa Mas atenção se o resultado previsto como crime culposo for menos grave ou se o crime não admitir a modalidade culposa devese desprezar a regra contida no art 74 do Código Penal Exemplificativamente se A efetua disparos de arma de fogo contra B para matálo mas não o acerta e quebra uma vidraça a sistemática do resultado diverso do pretendido implicaria a absorção da tentativa branca ou incruenta de homicídio pelo dano culposo Como no Código Penal o dano não admite a modalidade culposa a conduta seria atípica E ainda que o legislador tivesse incriminado o dano culposo tal delito não seria capaz de absorver o homicídio tentado Deve ser imputada ao agente a tentativa de homicídio Em face do que foi analisado e buscando sintetizar o instituto do erro de tipo afigurase pertinente apresentar o seguinte gráfico 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 JESUS Damásio E de Direito penal Parte geral 28 ed 2 tir São Paulo Saraiva 2006 v 1 p 309 ZAFFARONI Eugenio Raúl Derecho penal Parte general 2 ed Buenos Aires Ediar 2002 p 532 DIAS Jorge de Figueiredo O problema da consciência da ilicitude em direito penal 5 ed Coimbra Coimbra Editora 2000 p 416 JESUS Damásio E de Direito penal Parte geral 28 ed 2 tir São Paulo Saraiva 2006 v 1 p 316317 TOLEDO Francisco de Assis Princípios básicos de direito penal 5 ed 13 tir São Paulo Saraiva 2007 p 272277 BITENCOURT Cezar Roberto Erro de tipo e erro de proibição Uma análise comparativa 4 ed São Paulo Saraiva 2007 p 101 NUCCI Guilherme de Souza Código Penal comentado 6 ed São Paulo RT 2006 p 205206 GARCIA Basileu Instituições de direito penal 4 ed 37 tir São Paulo Max Limonad 1975 v 1 t I p 281 PEÑARANDA RAMOS Enrique Concurso de leyes error y participación en el delito Madrid Civitas 1991 p 78 Recordese que alguns autores como Damásio E de Jesus consideram o erro sobre as qualificadoras como erro de tipo essencial STJ REsp 1250950DF rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 19062012 161 162 CONCEITO O iter criminis ou caminho do crime corresponde às etapas percorridas pelo agente para a prática de um fato previsto em lei como infração penal Compreende duas fases uma interna e outra externa A fase interna é representada pela cogitação Por sua vez a fase externa se divide em outras três preparação execução e consumação O exaurimento não integra o iter criminis O gráfico abaixo bem representa o que foi dito FASE INTERNA COGITAÇÃO A cogitação repousa na mente do agente nela se formando a ideia de enveredar pela empreitada criminosa Seu propósito ilícito encontrase preso em um claustro psíquico É sempre interna não se revelando em atos externos Por se tratar de mera ideia sem qualquer possibilidade de ofensa ao bem jurídico não pode ser alcançada pelo Direito Penal Não é punível inexiste 1 2 3 163 1631 crime ainda que na forma tentada De fato conduta penalmente relevante é somente aquela praticada por seres humanos e projetada no mundo exterior1 Já no Direito Romano proclamava Ulpiano cogitationis poenam nemo patitur isto é ninguém pode ser punido exclusivamente pelos seus pensamentos É possível a divisão da cogitação em três momentos distintos Idealização o sujeito tem a ideia de cometer uma infração penal Deliberação o agente sopesa as vantagens e desvantagens de seu eventual comportamento contrário ao Direito Penal e Resolução o sujeito se decide pelo cometimento da infração penal2 FASE EXTERNA Preparação A etapa da preparação ou dos atos preparatórios corresponde aos atos indispensáveis à prática da infração penal municiandose o agente dos elementos necessários para a concretização da sua conduta ilícita É o caso por exemplo da aquisição de um revólver para a prática de um homicídio ou da construção de um cativeiro para a ocultação da vítima de uma extorsão mediante sequestro Ato preparatório é em verdade a forma de atuar que cria as condições prévias adequadas para a realização de um delito planejado Precisa ir além do simples projeto interno mínimo sem que se deva contudo iniciar a imediata realização tipicamente relevante da vontade delitiva máximo3 Os atos preparatórios geralmente não são puníveis nem na forma tentada uma vez que não se iniciou a realização do núcleo do tipo penal De fato o art 14 inc II do Código Penal vinculou a tentativa à prática de atos executórios Em casos excepcionais é possível a punição de atos preparatórios nas hipóteses em que a lei optou por incriminálos de forma autônoma São os 1632 chamados crimesobstáculo Nesses casos o legislador transforma o ato preparatório de um determinado delito em crime diverso e independente ou seja passa a tratálo como ato de execução a exemplo do que se dá com os delitos de fabrico fornecimento aquisição posse ou transporte de explosivos ou gás tóxico ou asfixiante CP art 253 incitação ao crime CP art 286 associação criminosa CP art 288 e petrechos para a falsificação de moeda CP art 291 Uma exceção a esta regra encontrase no art 5º da Lei 132602016 que antecipou a tutela do Direito Penal para efetivamente punir meros atos preparatórios de terrorismo Não se exige a prática de nenhum ato de execução Basta a realização de um ato preparatório para autorizar a punição do responsável pela violação da norma penal4 Execução A fase da execução ou dos atos executórios é aquela em que se inicia a agressão ao bem jurídico por meio da realização do núcleo do tipo penal O agente começa a realizar o verbo núcleo do tipo constante da definição legal tornando o fato punível É o caso da conduta de efetuar disparos de arma de fogo contra uma pessoa Há incidência do Direito Penal configurando no mínimo um crime tentado Com efeito o art 14 II do Código Penal vinculou a tentativa ao início da execução do crime ou seja à prática de atos executórios O ato de execução deve ser idôneo e inequívoco Ato idôneo é o que se reveste de capacidade suficiente para lesar o bem jurídico penalmente tutelado Essa idoneidade deve ser constatada no caso concreto e não em abstrato Exemplo um tiro de revólver é idôneo para praticar um homicídio ao contrário de um tiro de festim Por sua vez ato inequívoco é o que se direciona ao ataque do bem jurídico almejando a consumação da infração penal e fornecendo certeza acerca da vontade ilícita Exemplo um disparo de arma de fogo efetuado na direção da vítima é unívoco para a prática de um homicídio diferente de um disparo efetuado para o alto 1633 Concluise pois que um ato de execução deve obrigatoriamente possuir essas características simultaneamente Não basta apenas uma delas Também não é suficiente em face da rejeição da teoria subjetiva notadamente pela insegurança por ela proporcionada a vontade firme e consciente de cometer uma infração penal quando não exteriorizado um ato idôneo e inequívoco A propósito confirase o elucidativo exemplo de Nélson Hungria Tício tendo recebido uma bofetada de Caio corre a um armeiro adquire um revólver carregao com seis balas e volta ato seguido à procura do seu adversário que entretanto por cautela ou casualmente já não se acha no local da contenda Tício porém não desistindo de encontrar Caio vai postarse dissimulado atrás de uma moita junto ao caminho onde ele habitualmente passa rumo de casa e ali espera em vão pelo seu inimigo que desconfiado tomou direção diversa Não se pode conceber uma série de atos mais inequivocadamente reveladores da intenção de matar embora todos eles sejam meramente preparatórios5 Transição dos atos preparatórios para os atos executórios Um dos mais árduos problemas do Direito Penal é diferenciar com precisão um ato preparatório de um ato executório Não é simples estabelecer o momento exato em que se opera a transição de uma fase para outra do iter criminis em face do caráter fronteiriço de tais atos E como ainda não se construiu um método infalível para distinguir entre uns e outros nos casos de irredutível dúvida sobre se o ato constitui um ataque ao bem jurídico ou apenas uma predisposição para esse ataque o magistrado deverá pronunciar o non liquet a falta de provas negando a existência da tentativa Inúmeras teorias apresentam propostas para a solução do impasse Dividemse inicialmente em subjetiva e objetiva Esta última se ramifica em diversas outras Vejamos as mais importantes 1 Teoria subjetiva não há transição dos atos preparatórios para os atos executórios O que interessa é o plano interno do autor a vontade criminosa existente em quaisquer dos atos que compõem o iter criminis Logo tanto a fase da preparação como a fase da execução importam na punição do agente 2 Teoria objetiva os atos executórios dependem do início de realização do tipo penal O agente não pode ser punido pelo seu mero querer interno É imprescindível a exteriorização de atos idôneos e inequívocos para a produção do resultado lesivo Essa teoria todavia se divide em outras 21 Teoria da hostilidade ao bem jurídico atos executórios são aqueles que atacam o bem jurídico enquanto os atos preparatórios não caracterizam afronta ao bem jurídico mantendo inalterado o estado de paz Foi idealizada por Max Ernst Mayer e tem como principais partidários Nélson Hungria e José Frederico Marques 22 Teoria objetivoformal ou lógicoformal ato executório é aquele em que se inicia a realização do verbo contido na conduta criminosa Exige tenha o autor concretizado efetivamente uma parte da conduta típica penetrando no núcleo do tipo Exemplo em um homicídio o sujeito com golpes de punhal inicia a conduta de matar alguém Surgiu dos estudos de Franz von Liszt É a preferida pela doutrina pátria6 23 Teoria objetivomaterial atos executórios são aqueles em que se começa a prática do núcleo do tipo e também os imediatamente anteriores ao início da conduta típica de acordo com a visão de terceira pessoa alheia aos fatos O juiz deve se valer do critério do terceiro observador para impor a pena Exemplo aquele que está no alto de uma escada portando um pé de cabra pronto para pular um muro e ingressar em uma residência na visão de um terceiro observador iniciou a execução de um crime de furto Essa teoria foi criada por Reinhart Frank e adotada pelo art 22 do Código Penal Português 24 Teoria objetivoindividual atos executórios são os relacionados ao início da conduta típica e também os que lhe são imediatamente anteriores em conformidade com o plano concreto do autor Portanto diferenciase da anterior por não se preocupar com o terceiro observador mas sim com a prova do plano concreto do autor independentemente de análise externa Exemplo A com uma faca em punho aguarda atrás de uma moita a 1634 passagem de B seu desafeto para matálo desejo já anunciado para diversas pessoas Quando este se encontra a 200 metros de distância A fica de pé segura firme a arma branca e aguarda em posição de ataque seu adversário Surge a polícia e o aborda Para essa teoria poderia haver a prisão em flagrante em face da caracterização da tentativa de homicídio o que não se dá na teoria objetivoformal Essa teoria que remonta a Hans Welzel tem como principais defensores Eugenio Raúl Zaffaroni e José Henrique Pierangeli Consumação Dáse a consumação também chamada de crime consumado crime pleno7 ou summatum opus quando nele se reúnem todos os elementos de sua definição legal CP art 14 I É por isso um crime completo ou perfeito pois a conduta criminosa se realiza integralmente Verificase quando o autor concretiza todas as elementares descritas pelo preceito primário de uma lei penal incriminadora No homicídio em que a conduta é matar alguém a consumação ocorre com a morte de um ser humano provocada por outra pessoa8 Nos crimes materiais ou causais aí se inserindo os culposos e omissivos impróprios espúrios ou comissivos por omissão aperfeiçoase a consumação com a superveniência do resultado naturalístico De seu turno nos crimes formais de resultado cortado ou de consumação antecipada e nos crimes de mera conduta ou de simples atividade a consumação ocorre com a mera prática da conduta Nos crimes qualificados pelo resultado incluindo os preterdolosos a 164 consumação se verifica com a produção do resultado agravador doloso ou culposo Exemplo o crime tipificado pelo art 129 3º do Código Penal se consuma com a morte do ofendido Os crimes de perigo concreto se consumam com a efetiva exposição do bem jurídico a uma probabilidade de dano Exemplo o crime de direção de veículo automotor sem habilitação Lei 95031997 art 309 se aperfeiçoa com a exposição a dano potencial da incolumidade de outrem Já os crimes de perigo abstrato ou presumido se consumam com a mera prática da conduta definida pela lei como perigosa Exemplo o porte ilegal de arma de fogo de uso permitido Lei 108262003 art 14 se consuma com o simples ato de portar arma de fogo de uso permitido sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar independentemente da efetiva comprovação da situação de perigo Em relação aos crimes permanentes a consumação se arrasta no tempo com a manutenção da situação contrária ao Direito autorizando a prisão em flagrante a qualquer momento enquanto não encerrada a permanência Por outro lado nos crimes habituais a consumação se dá com a reiteração de atos que revelam o estilo de vida do agente pois cada um deles isoladamente considerado representa um indiferente penal O EXAURIMENTO Também chamado de crime exaurido ou crime esgotado é o delito em que posteriormente à consumação subsistem efeitos lesivos derivados da conduta do autor É o caso do recebimento do resgate no crime de extorsão mediante sequestro desnecessário para fins de tipicidade eis que se consuma com a privação da liberdade destinada a ser trocada por indevida vantagem econômica Por guardar estreita relação com os crimes formais é chamado por Zaffaroni e Pierangelli de consumação material9 No terreno da tipicidade o exaurimento não compõe o iter criminis que se encerra com a consumação Influi contudo na dosimetria da pena notadamente na aplicação da pena base pois o art 59 caput do Código Penal erigiu as consequências do crime à condição de circunstância judicial Em alguns casos o exaurimento pode funcionar como qualificadora como se dá na resistência CP art 329 1º ou como causa de aumento da pena tal como na corrupção passiva CP art 317 1º 1 2 3 4 5 6 7 8 9 É o que se convencionou chamar de direito à perversão as pessoas ao menos em seus pensamentos podem ser más perversas ou seja têm liberdade para arquitetar mentalmente diversos ilícitos penais sem que haja qualquer tipo de sanção penal FRIAS CABALLERO Jorge El processo ejecutivo del delito 2 ed Buenos Aires Bibliográfica Argentina 1956 p 18 MAURACH Reinhart Tratado de Derecho Penal Trad espanhola Juan Córdoba Roda Barcelona Ariel 1962 v 2 p 168 Art 5º Realizar atos preparatórios de terrorismo com o propósito inequívoco de consumar tal delito Pena a correspondente ao delito consumado diminuída de um quarto até a metade HUNGRIA Nélson Comentários ao código penal Rio de Janeiro Forense 1949 v I p 252 STJ HC 112639RS rel Min Og Fernandes 6ª Turma j 25082009 noticiado no Informativo 404 STJ HC 297551MG rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 05032015 noticiado no Informativo 557 Com a edição da Lei 94341997 podese afirmar que a consumação do homicídio se produz com a morte encefálica art 3 caput ZAFFARONI Eugenio Raúl PIERANGELI José Henrique Da tentativa 4 ed São Paulo RT 1995 p 26 Proclama o art 14 II do Código Penal Art 14 Dizse o crime II tentado quando iniciada a execução não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente Parágrafo único Salvo disposição em contrário punese a tentativa com a pena correspondente ao crime consumado diminuída de 1 um a 23 dois terços Como bem define o art 14 II do Código Penal tentativa é o início de execução de um crime que somente não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente Destarte o ato de tentativa é necessariamente um ato de execução Exigese tenha o sujeito praticado atos executórios daí não sobrevindo a consumação por forças estranhas ao seu propósito o que acarreta em tipicidade não finalizada sem conclusão A tentativa é também conhecida por outros rótulos conatus crime imperfeito crime manco1 ou na preferência de Zaffaroni crime incompleto2 em oposição ao crime consumado reconhecido como completo ou perfeito Três elementos compõem a estrutura da tentativa 1 início da execução do crime 2 ausência de consumação por circunstâncias alheias à vontade do agente e 3 dolo de consumação O dolo da tentativa é igual ao dolo da consumação O Código Penal foi peremptório nesse sentido ao dizer que o crime somente não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente tinha a intenção de alcançar a consumação mas por circunstâncias alheias à sua vontade não conseguiu atingir seu objetivo A resolução do indivíduo é idêntica no crime consumado e no crime tentado Este último em verdade é perfeito na esfera subjetiva do agente embora imperfeito no campo objetivo relacionado ao resultado que deveria ser produzido com a conduta criminosa3 O art 14 II do Código Penal não goza de autonomia pois não existe a tentativa por si só isoladamente Sua aplicação reclama a realização de um tipo incriminador previsto na Parte Especial do Código Penal ou pela legislação penal especial O Código Penal e a legislação extravagante não preveem para cada crime a figura da tentativa nada obstante a maioria deles seja com ela compatível Exemplificativamente a tentativa de furto simples não encontra correspondência imediata no art 155 do Código Penal Utilizase a definição do crime consumado em conjunto com a regra prevista no art 14 II A tentativa de furto nesses termos é a combinação de subtrair para si ou para outrem coisa alheia móvel com iniciada a execução não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente Portanto furto tentado é art 155 caput cc o art 14 II ambos do Código Penal A adequação típica de um crime tentado é de subordinação mediata ampliada ou por extensão já que a conduta humana não se enquadra prontamente na lei penal incriminadora reclamandose para complementar a tipicidade a interposição do dispositivo contido no art 14 II do Código Penal Logo a norma definidora da tentativa é uma norma de extensão ou de ampliação da conduta Operase uma ampliação temporal da figura típica pois com a utilização da regra prevista no art 14 II do Código Penal o alcance do tipo penal não se limita apenas ao momento da consumação do crime mas também a períodos anteriores Antecipase a tutela penal para abarcar os atos executórios prévios à consumação Dentre as diversas teorias que buscam fundamentar a punibilidade da tentativa quatro se destacam 1ª Teoria subjetiva voluntarística ou monista ocupase exclusivamente da vontade criminosa que pode se revelar tanto na fase dos atos preparatórios como também durante a execução O sujeito é punido por sua intenção pois o que importa é o desvalor da ação sendo irrelevante o desvalor do resultado 2ª Teoria sintomática idealizada pela Escola Positiva de Ferri Lombroso e Garofalo sustenta a punição em razão da periculosidade subjetiva isto é do perigo revelado pelo agente Possibilita a punição de atos preparatórios pois a mera manifestação de periculosidade já pode ser enquadrada como tentativa em consonância com a finalidade preventiva da pena4 3ª Teoria objetiva realística ou dualista a tentativa é punida em face do perigo proporcionado ao bem jurídico tutelado pela lei penal Sopesamse o desvalor da ação e o desvalor do resultado a tentativa deve receber punição inferior à do crime consumado pois o bem jurídico não foi atingido integralmente 4ª Teoria da impressão ou objetivosubjetiva representa um limite à teoria subjetiva evitando o alcance desordenado dos atos preparatórios A punibilidade da tentativa só é admissível quando a atuação da vontade ilícita do agente seja adequada para comover a confiança na vigência do ordenamento normativo e o sentimento de segurança jurídica dos que tenham conhecimento da conduta criminosa5 A punibilidade da tentativa é disciplinada pelo art 14 parágrafo único E nesse campo o Código Penal acolheu como regra a teoria objetiva realística ou dualista ao determinar que a pena da tentativa deve ser correspondente à pena do crime consumado diminuída de 1 um a 23 dois terços Como o desvalor do resultado é menor quando comparado ao do crime consumado o conatus deve suportar uma punição mais branda Excepcionalmente entretanto é aceita a teoria subjetiva voluntarística ou monista consagrada pela expressão salvo disposição em contrário Há casos restritos em que o crime consumado e o crime tentado comportam igual punição são os delitos de atentado ou de empreendimento Podem ser citados como exemplos 1 evasão mediante violência contra a pessoa CP art 352 em que o preso ou indivíduo submetido a medida de segurança detentiva usando de violência contra a pessoa recebe igual punição quando se evade ou tenta evadirse do estabelecimento em que se encontra privado de sua liberdade e 2 Lei 47371965 Código Eleitoral art 309 no qual se sujeita a igual pena o eleitor que vota ou tenta votar mais de uma vez ou em lugar de outrem A tentativa constituise em causa obrigatória de diminuição da pena Incide na terceira fase de aplicação da pena privativa de liberdade e sempre a reduz A liberdade do magistrado repousa unicamente no quantum da diminuição balizandose entre os limites legais de 1 um a 23 dois terços Deve reduzila podendo somente escolher o montante da diminuição E para navegar entre tais parâmetros o critério decisivo é a maior ou menor proximidade da consumação é dizer a distância percorrida do iter criminis Para o Supremo Tribunal Federal A quantificação da causa de diminuição de pena relativa à tentativa art 14 II CP há de ser realizada conforme o iter criminis percorrido pelo agente a redução será inversamente proporcional à maior proximidade do resultado almejado6 Exemplo em uma tentativa de homicídio na qual a vítima foi atingida por diversos disparos de arma de fogo resultando em sua internação por vários dias em hospital a redução da pena deve operarse no patamar mínimo Ao contrário se os tiros sequer a atingiram afigurase razoável a diminuição da pena no máximo legal Não interfere na diminuição da pena a maior ou menor gravidade do crime bem como os meios empregados para sua execução ou ainda as condições pessoais do agente tais como antecedentes criminais e a circunstância de ser primário ou reincidente Em caso de crime tentado para analisar se o seu responsável deve ou não ser processado e julgado no Juizado Especial Criminal isto é para verificar o enquadramento ou não no conceito de infração penal de menor potencial ofensivo a causa de diminuição de pena deve ser aplicada em sua fração mínima sobre a pena máxima cominada Se o resultado daí advindo for superior a dois anos o Juizado não é o competente para o julgamento da causa7 O Código Castrense orientase também no tocante à punibilidade da tentativa pela teoria objetiva Admite todavia uma exceção ao critério da obrigatória diminuição da pena do crime tentado ao dispor em seu art 30 parágrafo único Punese a tentativa com a pena correspondente ao crime diminuída de um a dois terços podendo o juiz no caso de excepcional gravidade aplicar a pena do crime consumado grifamos A tentativa comporta a seguinte divisão branca ou incruenta vermelha ou cruenta perfeita ou acabada ou crime falho e imperfeita ou inacabada Nesta espécie de tentativa o objeto material não é atingido pela conduta criminosa8 Exemplo A efetua disparos de arma de fogo contra B sem acertálo Recebe essa denominação ao relacionarse com a tentativa de homicídio em que não se produzem ferimentos na vítima não acarretando no derramamento de sangue Nesta espécie de tentativa o objeto material é alcançado pela atuação do agente Exemplo A com intenção de matar atira em B provocandolhe ferimentos Porém a vítima é socorrida prontamente e sobrevive Na tentativa perfeita o agente esgota todos os meios executórios que estavam à sua disposição e mesmo assim não sobrevém a consumação por circunstâncias alheias à sua vontade Pode ser cruenta ou incruenta Exemplo A dispara contra B todos os seis cartuchos do tambor do seu revólver com a intenção de matálo A vítima gravemente ferida é socorrida por policiais e sobrevive Na tentativa imperfeita o agente inicia a execução sem contudo utilizar todos os meios que tinha ao seu alcance e o crime não se consuma por circunstâncias alheias à sua vontade Exemplo A com o propósito de matar B sai à sua procura portando um revólver municiado com 6 seis cartuchos intactos Ao encontrálo efetua três disparos atingindoo Quando contudo iria efetuar outros disparos é surpreendido pela Polícia Militar e foge A vítima é socorrida pelos milicianos e sobrevive Crimes de ímpeto são os cometidos sem premeditação como decorrência de reação emocional repentina Há argumentos no sentido de que o ímpeto do agente afasta a viabilidade de análise do iter criminis pois a sua atuação repentina impossibilita o fracionamento dos atos executórios O acesso excessivo de emoção ou paixão não seria compatível com o propósito de praticar determinado crime Vejase o exemplo do homem que ao chegar a sua casa encontra sua esposa mantendo relações sexuais com terceira pessoa Revoltado saca sua arma de fogo e efetua disparos contra a adúltera não a acertando embora desejasse matála Para aqueles que não aceitam o conatus nos crimes de ímpeto seria impossível estabelecer no plano concreto se o traído não matou sua mulher por erro na pontaria ou pelo fato de não desejar alvejála efetivamente Nélson Hungria com sua peculiar competência repele essa posição Não se deve levar para a doutrina do dolo e da tentativa o que apenas representa a solução de uma dificuldade prática no terreno da prova A tentativa tanto existe nos crimes de ímpeto quanto nos crimes refletidos É tudo uma questão de prova posto que a indagação do animus não pode deixar de ser feita ab externo diante das circunstâncias objetivas A maior dificuldade de tal prova nos crimes de ímpeto nada tem a ver com a possibilidade conceitual da tentativa9 E arremata Se se verifica em face das circunstâncias que nada obstante a instantaneidade da resolução o agente empregando os meios que empregou ou por sua atitude teve a consciência de que com a sua ação podia atingir o evento típico do crime não há outra solução na hipótese de não superveniência de tal evento senão a de imputarlhe o fato a título de tentativa10 Prevalece no Brasil o entendimento favorável ao cabimento da tentativa nos crimes cometidos com dolo eventual equiparado pelo art 18 I do Código Penal no tocante ao seu tratamento ao dolo direto11 A dificuldade de prova do início da execução de um crime que não se consuma por circunstâncias alheias ao consentimento do agente é questão de natureza processual em nada interferindo na tipicidade do fato Invoquemos uma vez mais as lições de Nélson Hungria Se o agente aquiesce no advento do resultado específico do crime previsto como possível é claro que este entra na órbita de sua volição logo se por circunstâncias fortuitas tal resultado não ocorre é inegável que o agente deve responder por tentativa É verdade que na prática será difícil identificarse a tentativa no caso de dolo eventual notadamente quando resulta totalmente improfícua tentativa branca Mas repitase a dificuldade de prova não pode influir na conceituação da tentativa12 Todavia existem posições pela inadmissibilidade da tentativa nos crimes praticados com dolo eventual com fundamento na redação do art 14 II do Código Penal se o legislador definiu o crime tentado como aquele em que iniciada a execução não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente limitou o instituto ao dolo direto para o qual adotou a teoria da vontade art 18 I 1ª parte excluindoa do alcance do dolo eventual em que se acolheu a teoria do consentimento ou do assentimento art 18 I in fine13 Em geral os crimes dolosos são compatíveis com a tentativa pouco importando sejam materiais formais ou de mera conduta De fato a admissibilidade ou não da tentativa tem a ver com o caráter plurissubsistente do delito isto é com a composição da conduta em diversos atos executórios podendo consequentemente ser fracionada Crimes formais e de mera conduta comportam o conatus desde que sejam plurissubsistentes Na seara dos crimes formais tomemos como exemplo uma extorsão mediante sequestro CP art 159 na qual o agente aponta uma arma de fogo para a vítima dizendo para ela se render porque seria privada de sua liberdade para futura troca por vantagem econômica indevida junto aos seus familiares A vítima contudo consegue fugir e é perseguida Aciona a Polícia que aborda o criminoso e efetua sua prisão em flagrante antes da privação da liberdade da pessoa visada Tratase de tentativa de extorsão mediante sequestro exemplo clássico de crime formal de consumação antecipada ou de resultado cortado Em relação aos crimes de mera conduta ou de simples atividade ilustremos com o ato obsceno CP art 233 um casal em praça pública anuncia que realizará dentro de instantes um show de sexo explícito Quando começam a se despir são presos em flagrante por policiais que ali se encontravam As condutas se enquadram como tentativas de crimes de ato obsceno Concluise assim que a possibilidade de tentativa se relaciona com a ausência de aperfeiçoamento de todos os elementos do tipo penal e não com a falta de superveniência do resultado naturalístico obrigatório apenas para a consumação dos crimes materiais A regra portanto é a compatibilidade dos crimes com o conatus 1 2 3 4 5 Algumas espécies de infrações penais todavia não admitem a tentativa Vejamos quais são Crimes culposos nestes crimes o resultado naturalístico é involuntário contrário à intenção do agente Por corolário seria no mínimo contraditório admitirse em um crime não desejado pelo seu autor o início da execução de um delito que somente não se consuma por circunstâncias alheias à sua vontade Essa regra se excepciona no que diz respeito à culpa imprópria compatível com a tentativa pois nela há a intenção de se produzir o resultado Cuidase em verdade de dolo punido por razões de política criminal a título de culpa em face de ser a conduta realizada pelo agente com amparo em erro inescusável quanto à ilicitude do fato Crimes preterdolosos nestes crimes o resultado agravador é culposo não desejado pelo agente Por esse motivo não se compactuam com a tentativa Exemplo só se configura o crime de lesão corporal seguida de morte quando se produz o resultado agravador pois caso contrário o agente responde unicamente pelas lesões corporais dolosamente praticadas Crimes unissubsistentes são aqueles em que a conduta é exteriorizada mediante um único ato suficiente para alcançar a consumação Não é possível a divisão do iter criminis razão pela qual é incabível a tentativa Exemplo desacato CP art 331 cometido verbalmente proferida a palavra apta a menosprezar a função pública exercida por determinada pessoa consumado estará o crime Crimes omissivos próprios ou puros ingressam no grupo dos crimes unissubsistentes Em uma omissão de socorro CP art 135 o sujeito tem duas opções ou presta assistência ao necessitado e não há crime ou deixa de prestála e o crime estará consumado Os crimes omissivos impróprios espúrios ou comissivos por omissão de seu turno admitem a tentativa Crimes de perigo abstrato também se enquadram no bloco dos 6 7 8 9 10 crimes unissubsistentes No porte ilegal de arma de fogo ou o agente porta a arma de fogo em situação irregular e o crime estará consumado ou não o faz e o fato será atípico Os crimes de perigo concreto por sua vez comportam a tentativa Contravenções penais embora no plano fático seja em tese possível a tentativa de contravenção penal é juridicamente irrelevante em face da regra contida no art 4º do Decretolei 36881941 Lei das Contravenções Penais Não é punível a tentativa de contravenção Crimes condicionados são aqueles cuja punibilidade está sujeita à produção de um resultado legalmente exigido tal qual a participação em suicídio CP art 122 em que só há punição se resultar morte ou lesão corporal de natureza grave Crimes subordinados a condição objetiva de punibilidade tal como ocorre em relação aos falimentares Lei 111012005 Lei de Falências art 180 pois se o próprio delito completo não é punível se não houver aquela condição muito menos o será a sua tentativa14 Crimes de atentado ou de empreendimento não há tentativa uma vez que a figura tentada recebe igual pena destinada ao crime consumado É o que se dá por exemplo no delito tipificado pelo art 352 do Código Penal evadirse ou tentar evadirse Crimes com tipo penal composto de condutas amplamente abrangentes em relação a estes crimes no caso concreto é impossível dissociar a tentativa da consumação Vejase o exemplo do crime de parcelamento ou desmembramento irregular do solo para fins urbanos tipificado pelo art 50 I da Lei 67661979 Dar início de qualquer modo ou efetuar loteamento ou desmembramento do solo para fins urbanos sem autorização do órgão público competente ou em desacordo com as disposições desta Lei ou das normas pertinentes do Distrito Federal Estados e Municípios grifamos A expressão de qualquer modo na 11 12 prática inviabiliza a tentativa pois qualquer que seja a conduta adotada pelo agente implicará na consumação Crimes habituais são aqueles compostos pela reiteração de atos que demonstram um estilo de vida do agente Cada ato isoladamente considerado representa um indiferente penal É o caso do curandeirismo CP art 284 I em que o ato de prescrever uma única vez qualquer substância é conduta atípica pois a lei reclama a habitualidade Mirabete faz uma adequada ressalva suscitando divergência há tentativa do crime previsto no art 282 do Código Penal na conduta do sujeito que sem ser médico instala um consultório e é detido quando de sua primeira consulta15 Não se devem confundir crimes habituais entretanto com crimes permanentes nos quais a tentativa é perfeitamente cabível Exemplo tentativa de sequestro CP art 148 na qual o autor tenta de modo forçado prender uma pessoa no quarto de uma casa mas esta reage e foge Crimesobstáculo são os que retratam atos preparatórios tipificados de forma autônoma pelo legislador a exemplo do crime de substância destinada à falsificação CP art 277 De fato não há sentido em punir a preparação de um crime que normalmente não é punível como delito autônomo prevendose para este também a figura do conatus Haveria incompatibilidade lógica de punir a tentativa de preparação de um crime que somente é objeto de punição porque excepcionalmente o legislador construiu um tipo penal específico Exemplificativamente ter em depósito substância destinada à falsificação de um produto medicinal não fosse a figura típica do art 277 representaria conduta penalmente irrelevante não podendo ser considerada ato executório do crime previsto no art 273 pois tratase de mera fase preparatória Como se sabe o intérprete não pode ampliar a exceção criada pelo legislador A regra vigente no sistema penal brasileiro é a punição dos crimes nas modalidades consumada e tentada Mas em algumas situações não se admite o conatus seja pela natureza da infração penal seja em obediência a determinado mandamento legal razão pela qual apenas é possível a imposição de sanção penal para a forma consumada do delito ou da contravenção penal É o que se verifica a título ilustrativo nos crimes culposos salvo na culpa imprópria e nos crimes unissubsistentes Entretanto em hipóteses raríssimas somente é cabível a punição de determinados delitos na forma tentada pois nesse sentido orientouse a previsão legislativa quando da elaboração do tipo penal Exemplos disso encontramse nos arts 9º e 11 da Lei 71701983 Crimes contra a Segurança Nacional Art 9º Tentar submeter o território nacional ou parte dele ao domínio ou à soberania de outro país Pena reclusão de 4 a 20 anos Parágrafo único Se do fato resulta lesão corporal grave a pena aumenta se até um terço se resulta morte aumentase até a metade Art 11 Tentar desmembrar parte do território nacional para constituir país independente Pena reclusão de 4 a 12 anos 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 FRANCO Alberto Silva STOCO Rui Código penal e sua interpretação jurisprudencial Parte geral 7 ed São Paulo RT 2001 p 152 v1 ZAFFARONI Eugenio Raúl Manual de derecho penal Parte general 2 ed Buenos Aires Ediar 2002 p 809 a tentativa não é uma figura autônoma pois a vontade contrária ao direito existente na tentativa é igual à do delito consumado STJ HC 297551MG rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 05032015 noticiado no Informativo 557 PUGLIA Fernando Da tentativa Trad Octavio Mendes 2 ed Lisboa Clássica 1907 p 116 ZAFFARONI Eugenio Raúl Manual de derecho penal Parte general 2 ed Buenos Aires Ediar 2002 p 814 STF HC 118203MT rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 15102013 No STJ HC 190214DF rel Min Gilson Dipp 5ª Turma j 15022011 STJ HC 94927SP rel Min Jane Silva desembargadora convocada do TJMG 6ª Turma j 01042008 Considerase tentativa branca aquela na qual o bem tutelado pelo tipo penal não sofre qualquer dano STJ HC 265189RJ rel Min Regina Helena Costa 5ª Turma j em 17122013 HUNGRIA Nélson Comentários ao Código Penal Rio de Janeiro Forense 1949 v I p 261 Idem ibidem p 262 Esta Corte Superior de Justiça já se posicionou no sentido da compatibilidade entre o dolo eventual e o crime tentado STJ AgRg no REsp 1199947DF rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 11122012 HUNGRIA Nélson Comentários ao código penal Rio de Janeiro Forense 1949 v I p 262 No mesmo sentido MUNHOZ NETTO Alcides Da tentativa no código penal brasileiro Curitiba Lítero Técnica 1958 p 58 É dentre outros o entendimento de GRECO Rogério Curso de direito penal Parte geral 10 ed Rio de Janeiro Impetus 2008 p 263267 NORONHA E Magalhães Questões acerca da tentativa Estudos de 15 direito e processo penal em homenagem a Nélson Hungria Rio de Janeiro Forense 1962 p 247 MIRABETE Julio Fabbrini Manual de direito penal Parte geral 24 ed São Paulo Atlas 2007 v 1 p 153 181 182 183 DISPOSITIVO LEGAL Estabelece o art 15 do Código Penal O agente que voluntariamente desiste de prosseguir na execução ou impede que o resultado se produza só responde pelos atos já praticados DISTINÇÃO COM A TENTATIVA Desistência voluntária e arrependimento eficaz são formas de tentativa abandonada1 assim rotulados porque a consumação do crime não ocorre em razão da vontade do agente que não chega ao resultado inicialmente desejado por interromper o processo executório do delito ou esgotada a execução emprega diligências eficazes para impedir o resultado Diferemse portanto da tentativa ou conatus em que iniciada a execução de um delito a consumação não ocorre por circunstâncias alheias à vontade do agente2 FUNDAMENTO 184 1 2 3 O fundamento políticocriminal da desistência voluntária e do arrependimento eficaz é o estímulo ao agente para evitar a produção do resultado de um crime cuja execução já se iniciou em relação ao qual lhe é perfeitamente possível alcançar a consumação Por esse motivo Franz von Liszt a eles se referia como a ponte de ouro3 do Direito Penal isto é a forma capaz de se valer o agente para retornar à seara da licitude De fato os institutos têm origem no direito premial pelo qual o Estado concede ao criminoso um tratamento penal mais favorável em face da voluntária não produção do resultado Em suas palavras No momento em que o agente transpõe a linha divisória entre os atos preparatórios impunes e o começo da execução punível incorre na pena cominada contra a tentativa Semelhante fato não pode mais ser alterado suprimido ou anulado retroativamente Pode porém a lei por considerações de política criminal construir uma ponte de ouro para a retirada do agente que já se tornara passível de pena4 NATUREZA JURÍDICA Há três correntes sobre a natureza jurídica da desistência voluntária e do arrependimento eficaz Causa pessoal de extinção da punibilidade embora não prevista no art 107 do Código Penal a desistência voluntária e o arrependimento eficaz retiram o ius puniendi estatal no tocante ao crime inicialmente desejado pelo agente É a posição de Nélson Hungria E Magalhães Noronha Aníbal Bruno e Eugenio Raúl Zaffaroni entre outros Causa de exclusão da culpabilidade se o agente não produziu voluntariamente o resultado inicialmente desejado afastase em relação a este o juízo de reprovabilidade Responde entretanto pelo crime cometido mais brando Comungam desse entendimento Hans Welzel e Claus Roxin Causa de exclusão da tipicidade para essa vertente afastase a tipicidade do crime inicialmente desejado pelo agente subsistindo 185 apenas a tipicidade dos atos já praticados A ela se filiaram José Frederico Marques Heleno Cláudio Fragoso Basileu Garcia e Damásio E de Jesus É a posição dominante na jurisprudência5 DESISTÊNCIA VOLUNTÁRIA Na desistência voluntária o agente por ato voluntário interrompe o processo executório do crime abandonando a prática dos demais atos necessários e que estavam à sua disposição para a consumação Assemelha se mas não se confunde com a tentativa imperfeita ou inacabada compreendida como aquela em que não se esgotaram os meios de execução que o autor tinha ao seu alcance Conforme a clássica fórmula de Frank a desistência voluntária se caracteriza quando o responsável pela conduta diz a si próprio posso prosseguir mas não quero Estaremos diante da tentativa entretanto se o raciocínio for outro quero prosseguir mas não posso Em regra caracterizase por uma conduta negativa pois o agente desiste da execução do crime deixando de realizar outros atos que estavam sob o seu domínio Exemplo A dispara um projétil de arma de fogo contra B Com a vítima já caída ao solo em local ermo e com mais cinco cartuchos no tambor de seu revólver A desiste de efetuar outros tiros quando podia fazêlo para ceifar a vida de B Nos crimes omissivos impróprios todavia a desistência voluntária reclama uma atuação positiva um fazer pelo qual o autor de um delito impede a produção do resultado Exemplo a mãe desejando eliminar o pequeno filho deixa de alimentálo por alguns dias Quando o infante está à beira da morte a genitora muda de ideia e passa a nutrilo recuperando a sua saúde A desistência voluntária não é admitida nos crimes unissubsistentes pois se a conduta não pode ser fracionada exteriorizandose por um único ato é impossível desistir da sua execução que já se aperfeiçoou com a atuação do agente 186 187 ARREPENDIMENTO EFICAZ No arrependimento eficaz ou resipiscência6 depois de já praticados todos os atos executórios suficientes à consumação do crime o agente adota providências aptas a impedir a produção do resultado Exemplo depois de ministrar veneno à vítima que o ingeriu ao beber o café preparado pelo agente este lhe oferece o antídoto impedindo a eficácia causal de sua conduta inicial Fica claro que o arrependimento eficaz apresenta um ponto em comum com a tentativa perfeita ou acabada pois o agente esgota todos os meios de execução que se encontravam à sua disposição O art 15 do Código Penal revela ser o arrependimento eficaz possível somente no tocante aos crimes materiais pela análise da expressão impede que o resultado se produza Esse resultado naturalístico é exigido somente para a consumação dos crimes materiais consumados Além disso nos crimes formais a realização da conduta implica na automática consumação do delito aperfeiçoandose a tipicidade do fato muito embora no caso concreto seja possível porém dispensável para a consumação a produção do resultado naturalístico Nos crimes de mera conduta por sua vez jamais ocorrerá o resultado naturalístico motivo pelo qual não se admite a sua interrupção Além disso com a simples atividade o delito já estará consumado com a tipicidade concluída e imutável REQUISITOS São comuns os requisitos da desistência voluntária e do arrependimento eficaz voluntariedade e eficácia Devem ser voluntários isto é livres de coação física ou moral pouco importando sejam espontâneos ou não A iniciativa pode emanar de terceira pessoa ou mesmo da própria vítima bastando o pensamento posso prosseguir mas não quero Com efeito a espontaneidade reclama tenha sido a ideia originada da 188 189 1810 mente do agente como fruto de sua mais honesta vontade Exigese ainda a eficácia ou seja é necessário que a atuação do agente seja capaz de evitar a produção do resultado Se embora o agente tenha buscado impedir sua ocorrência ainda assim o resultado se verificou subsiste a sua responsabilidade pelo crime consumado Incide todavia a atenuante genérica prevista no art 65 III alínea b 1ª parte do Código Penal MOTIVOS São irrelevantes os motivos que levaram o agente a optar pela desistência voluntária ou pelo arrependimento eficaz Não precisam ser éticos piedosos valorativos ou admiráveis Podem decorrer de questões religiosas por conselho do advogado ou mesmo pelo receio de suportar a sanção penal O Código Penal se contenta com a voluntariedade e a eficácia para a exclusão da tipicidade EFEITO Na desistência voluntária e no arrependimento eficaz o efeito é o mesmo o agente não responde pela forma tentada do crime inicialmente desejado mas somente pelos atos já praticados Assim nos exemplos indicados disparos de arma de fogo e inoculação de veneno não há tentativa mas somente lesões corporais com grau definido em razão do prejuízo proporcionado à vítima INCOMPATIBILIDADE COM OS CRIMES CULPOSOS A desistência voluntária e o arrependimento eficaz são incompatíveis com os crimes culposos salvo na culpa imprópria O motivo é simples nessa modalidade de delito o resultado naturalístico é involuntário não sendo lógico imaginar portanto um resultado que o agente desejava produzir para em seguida abandonar a execução que a ele conduziria ou impedir a sua 1811 1812 1ª 2ª produção ADIAMENTO DA PRÁTICA DO CRIME Prevalece o entendimento de que há desistência voluntária no adiamento da empreitada criminosa com o propósito de repetila em ocasião mais adequada Exemplo A famoso homicida de uma pequena cidade por sempre utilizar armas brancas com ponta ou gume trajando capuz para não ser reconhecido e somente com uma faca à sua disposição depois de efetuar um golpe na vítima atingindoa de raspão decide interromper a execução do homicídio para no futuro sem despertar suspeitas atingila com disparos de arma de fogo Não existe desistência voluntária porém na hipótese de execução retomada em que a pessoa deseja dar sequência no futuro à atividade criminosa que precisou adiar utilizandose dos atos anteriormente praticados Exemplo a vítima privada de sua liberdade é torturada pelo agente que assim age para matála Como nasce o filho do criminoso e ele se ausenta para visitálo desiste de matar o ofendido naquele dia deixando para fazêlo no futuro mediante novas torturas sem libertálo COMUNICABILIDADE DA DESISTÊNCIA VOLUNTÁRIA E DO ARREPENDIMENTO EFICAZ Imagine a seguinte situação A contrata B para matar C Na data ajustada e depois de amarrála a uma árvore B desiste de matála mantendoa incólume contra a vontade de A Com base nessa situação questionase os efeitos da desistência voluntária e do arrependimento eficaz são comunicáveis no concurso de pessoas A doutrina não é unânime dividindose em duas correntes corrente Heleno Cláudio Fragoso e Costa e Silva sustentando o caráter subjetivo dos institutos defendem a manutenção da responsabilidade do partícipe no tocante à tentativa abandonada pelo autor corrente Nélson Hungria apregoa o caráter misto objetivo e 1813 a b subjetivo da desistência voluntária e do arrependimento eficaz com a consequente aplicação da regra prevista no art 30 do Código Penal excluindo a responsabilidade penal do partícipe Essa última posição é dominante pois a conduta do partícipe é acessória dependendo sua punição da prática de um crime consumado ou tentado pelo autor responsável pela conduta principal E se este não comete nenhum crime impossível a punição do partícipe Na hipótese de o partícipe A no exemplo acima desistir da empreitada criminosa sua atuação embora voluntária será inútil se ele não conseguir impedir a consumação do delito Exigese assim que o partícipe convença o autor a não consumar a infração penal pois em caso contrário responderá pelo delito em face da ineficácia de sua desistência TENTATIVA QUALIFICADA A tentativa é chamada de qualificada quando contém em seu bojo outro delito de menor gravidade já consumado Na desistência voluntária e no arrependimento eficaz operase a exclusão da tipicidade do crime inicialmente desejado pelo agente Resta contudo a responsabilidade penal pelos atos já praticados os quais configuram um crime autônomo e já consumado Daí falarse em tentativa qualificada Vejamos alguns exemplos aquele que deseja matar e para tanto efetua disparo de arma de fogo contra a vítima sem atingila abandonando em seguida o propósito criminoso responde apenas pelo crime autônomo de disparo de arma de fogo Lei 108262003 art 15 e aquele que no interior de uma residência que ingressou para furtar desiste voluntariamente da execução do delito responde somente pelo crime de violação de domicílio CP art 150 Nos dois casos excluiuse a tipicidade do delito inicial restando um crime menos grave e já consumado É possível ainda que os atos já praticados pelo agente não configurem 1814 crime autônomo É o caso do indivíduo que desiste do furto de uma motocicleta da qual se apoderou em um estacionamento sem danificála Em situações desse nível ficará impune DESISTÊNCIA VOLUNTÁRIA ARREPENDIMENTO EFICAZ E LEI DE TERRORISMO Na sistemática do Código Penal é imprescindível o ingresso na fase de execução do crime para ensejar o reconhecimento da desistência voluntária e do arrependimento eficaz De fato o agente deve interromper o processo executório do crime desistência voluntária ou depois do encerramento deste adotar alguma providência impeditiva da consumação arrependimento eficaz O art 10 da Lei 132602016 Lei de Terrorismo contudo apresenta uma regra diversa Mesmo antes de iniciada a execução do crime de terrorismo na hipótese do art 5º desta Lei aplicamse as disposições do art 15 do DecretoLei nº 2848 de 7 de dezembro de 1940 Código Penal Esse dispositivo encontrase em sintonia com o art 5º do citado diploma legal7 Com efeito se a Lei 132602016 pune de forma independente os atos preparatórios de terrorismo é preciso adaptar a desistência voluntária e o arrependimento eficaz à fase de preparação do delito inclusive com a finalidade de seduzir o terrorista a evitar seu propósito ilícito e preservar os bens jurídicos ameaçados pela conduta criminosa 1 2 3 4 5 6 7 Daí falarse na configuração do dolo abandonado nesses dois institutos A resposta afirmativa dos jurados à indagação sobre a ocorrência de tentativa afasta automaticamente a hipótese de desistência voluntária Esclareceuse que o conselho de sentença após responder positivamente ao primeiro quesito inerente à autoria também o fizera de forma assertiva quanto ao segundo a fim de reconhecer a prática de homicídio tentado Reputouse que assim fora rejeitada a tese de desistência voluntária STF HC 112197SP rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 05062012 noticiado no Informativo 669 Alguns autores em alusão a esta expressão também têm utilizado outras terminologias a ponte de prata para se referir ao arrependimento posterior CP art 16 pois acarreta somente na diminuição da pena b ponte de bronze seria a atenuante da confissão espontânea CP art 65 inc III d e c ponte de diamante em correspondência à colaboração premiada quando o Ministério Público deixa de oferecer denúncia Lei 128502013 art 4º 4º LISZT Franz von Tratado de direito penal alemão Trad José Hygino Duarte Pereira Rio de Janeiro F Briguiet 1889 t I p 342 Embora a criação da expressão ponte de ouro seja atribuída a von Liszt sua origem remonta aos estudos de Feuerbach e à sua teoria políticocriminal JESCHECK HansHeinrich Tratado de derecho penal Parte general 5 ed Trad espanhola Miguel Olmedo Cardenete Granada Comares 2002 p 578 STJ HC 110504RJ rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 07022012 JESUS Damásio E de Direito penal Parte geral 28 ed 2 tir São Paulo Saraiva 2006 v 1 p 344 Art 5º Realizar atos preparatórios de terrorismo com o propósito inequívoco de consumar tal delito Pena a correspondente ao delito consumado diminuída de um quarto até a metade Arrependimento posterior é a causa obrigatória de diminuição da pena que ocorre quando o responsável pelo crime praticado sem violência à pessoa ou grave ameaça voluntariamente e até o recebimento da denúncia ou queixa restitui a coisa ou repara o dano provocado por sua conduta Conforme dispõe o art 16 do Código Penal Nos crimes cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa reparado o dano ou restituída a coisa até o recebimento da denúncia ou da queixa por ato voluntário do agente a pena será reduzida de 1 um a 23 dois terços Com o propósito de distinguir o arrependimento posterior do arrependimento eficaz disciplinado pelo art 15 do Código Penal o legislador foi infeliz ao tratar do instituto no âmbito da teoria do crime De fato o assunto deveria ter sido disciplinado na seara da teoria da pena por influir na sua dosagem em nada alterando a adequação típica do fato concreto ao contrário do que se dá no arrependimento eficaz Tratase de causa obrigatória de diminuição da pena Tem incidência portanto na terceira fase de aplicação da pena privativa de liberdade O arrependimento posterior alcança qualquer crime que com ele seja compatível e não apenas os delitos contra o patrimônio Raciocínio diverso levaria à conclusão de que essa figura penal deveria estar prevista no título dos crimes contra o patrimônio e não na Parte Geral do Código Penal Basta em termos genéricos que exista um dano causado em razão da conduta penalmente ilícita É o caso por exemplo do crime de peculato doloso em suas diversas modalidades CP art 312 Cuidase de crime contra a Administração Pública que admite o arrependimento posterior Embora com alguma controvérsia prevalece o entendimento de que a reparação do dano moral enseja a aplicação do arrependimento posterior Nos crimes contra a honra a título ilustrativo a indenização pelos prejuízos causados autorizaria a diminuição da pena8 Evidentemente este instituto é inaplicável nos delitos em que não há dano a ser reparado ou coisa a ser restituída Em outras palavras o arrependimento posterior é cabível nos crimes patrimoniais e também em delitos diversos desde que apresentem efeitos de índole patrimonial Para o Superior Tribunal de Justiça Em homicídio culposo na direção de veículo automotor art 302 do CTB ainda que realizada composição civil entre o autor do crime e a família da vítima é inaplicável o arrependimento posterior art 16 do CP O STJ possui entendimento de que para que seja possível aplicar a causa de diminuição de pena prevista no art 16 do Código Penal fazse necessário que o crime praticado seja patrimonial ou possua efeitos patrimoniais HC 47922PR Quinta Turma DJ 10122007 e REsp 1242294PR Sexta Turma DJe 322015 Na hipótese em análise a tutela penal abrange o bem jurídico o direito fundamental mais importante do ordenamento jurídico a vida que uma vez ceifada jamais poderá ser restituída reparada Não se pode assim falar que o delito do art 302 do CTB é um crime patrimonial ou de efeito patrimonial Além disso não se pode reconhecer o arrependimento posterior pela impossibilidade de reparação do dano cometido contra o bem jurídico vida e por conseguinte pela impossibilidade de aproveitamento pela vítima da composição financeira entre a agente e a sua família Sendo assim inviável o reconhecimento do arrependimento posterior na hipótese de homicídio culposo na direção de veículo automotor9 O arrependimento posterior tem raízes em questões de política criminal fundadas em duplo aspecto 1 proteção da vítima que deve ser amparada em relação aos danos sofridos e 2 fomento do arrependimento por parte do agente que se mostra mais preocupado com as consequências de seu ato reduzindo as chances de reincidência A leitura do art 16 do Código Penal fornece os requisitos do arrependimento posterior a Natureza do crime O crime deve ter sido praticado sem violência ou grave ameaça à pessoa Destarte em se tratando de crime com violência ou grave ameaça à pessoa pouco importa a quantidade e a natureza da pena bem como o regime prisional fixado é impossível a aplicação do arrependimento posterior A violência contra a coisa não exclui o benefício Em caso de violência culposa é cabível o arrependimento posterior Não houve violência na conduta mas sim no resultado É o que se dá por exemplo na lesão corporal culposa crime de ação penal pública condicionada em que a reparação do dano pode inclusive acarretar na renúncia ao direito 1 2 de representação se celebrada a composição civil na forma do art 74 e parágrafo único da Lei 90991995 No tocante aos crimes perpetrados com violência imprópria duas posições se destacam é possível o arrependimento posterior pois a lei só o excluiu no que diz respeito à violência própria Se quisesse afastálo o teria feito expressamente tal como no art 157 caput do Código Penal e não se admite o benefício Violência imprópria é violência dolosa e nela a vítima é reduzida à impossibilidade de resistência A situação é tão grave que a subtração de coisa alheia móvel assim praticada deixa de ser furto e se torna roubo crime muito mais grave b Reparação do dano ou restituição da coisa Deve ser voluntária pessoal e integral Voluntária no sentido de ser realizada sem coação física ou moral Pode se dar assim em razão de orientação de familiares do advogado ou mesmo por receio de suportar rigorosa sanção penal Não se exige contudo espontaneidade É prescindível tenha surgido a ideia livremente na mente do agente Pessoal salvo na hipótese de comprovada impossibilidade como quando o agente se encontra preso ou internado em hospital e terceira pessoa representandoo procede à reparação do dano ou restituição da coisa Não pode advir de terceiros exceto em situações que justifiquem a impossibilidade de ser feita diretamente pelo autor do crime Por óbvio também não pode ser resultante da atuação policial ao apreender o produto do crime pois essa circunstância excluiria a voluntariedade Integral pois a reparação ou restituição de modo parcial não se encaixa no conceito apresentado pelo art 16 do Código Penal A completude entretanto deve ser analisada no caso concreto ficando ao encargo da vítima principalmente a sua constatação O Supremo Tribunal Federal todavia já admitiu o arrependimento posterior na reparação parcial do dano Nessa linha de raciocínio o percentual de diminuição da pena um a dois terços existe para ser sopesado em razão da extensão da reparação ou do ressarcimento e da presteza com que ela ocorre10 c Limite temporal A reparação do dano ou restituição da coisa voluntária pessoal e integral nos crimes cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa deve ser efetuada até o recebimento da denúncia ou da queixa É irrelevante destarte o momento do oferecimento da denúncia ou da queixa A barreira temporal que viabiliza o benefício é o juízo de admissibilidade da petição inicial Se a reparação do dano for concretizada após o recebimento da denúncia ou da queixa mas antes do julgamento aplicase a atenuante genérica prevista no art 65 III b parte final do Código Penal11 A reparação do dano ou restituição da coisa tem natureza objetiva Consequentemente comunicase aos demais coautores e partícipes do crime na forma definida pelo art 30 do Código Penal Como destacado pelo Superior Tribunal de Justiça Uma vez reparado o dano integralmente por um dos autores do delito a causa de diminuição de pena do arrependimento posterior prevista no art 16 do CP estendese aos demais coautores cabendo ao julgador avaliar a fração de redução a ser aplicada conforme a atuação de cada agente em relação à reparação efetivada De fato tratase de circunstância comunicável em razão de sua natureza objetiva Devese observar portanto o disposto no art 30 do CP segundo o qual não se comunicam as circunstâncias e as condições de caráter pessoal salvo quando elementares do crime12 Nas infrações penais em que a reparação do dano ou restituição da coisa por um dos agentes inviabiliza igual atuação por parte dos demais a todos se estende o benefício Na receptação CP art 180 a propósito entendimento diverso prejudicaria o autor do crime antecedente que estaria impossibilitado de reparar um dano já satisfeito A redução da pena dentro dos parâmetros legais um a dois terços deve ser calculada com base na celeridade e na voluntariedade da reparação do dano ou da restituição da coisa Quanto mais rápida e mais verdadeira maior será a diminuição da pena 23 quanto mais lenta desde que até o recebimento da denúncia ou queixa e menos sincera menor a diminuição 13 Contudo ao admitir a reparação parcial do dano ou a restituição parcial da coisa o Supremo Tribunal Federal firmou entendimento no sentido de que a diminuição da pena leva em conta a extensão do ato reparador do agente Nesse contexto se a reparação do dano ou a restituição da coisa for total a pena será reduzida de 23 se parcial a diminuição incidirá em menor percentual13 Seja qual for o motivo que leve a vítima a agir dessa forma o agente não pode ser privado da diminuição da pena se preencher os requisitos legalmente previstos para a concessão do benefício Pertinente assim a entrega da coisa à autoridade policial que deverá lavrar auto de apreensão para a remessa ao juízo competente e posterior entrega ao ofendido ou ainda em casos extremos o depósito em juízo determinado em ação de consignação em pagamento Estabelece o art 312 3º do Código Penal que no peculato culposo a reparação do dano se anterior à sentença irrecorrível extingue a punibilidade e se lhe for posterior reduz de metade a pena imposta Essa regra de caráter especial afasta a incidência do art 16 do Código Penal em relação ao peculato culposo A composição dos danos civis entre o autor do fato e o ofendido em se tratando de crimes de ação penal privada ou ação penal pública condicionada à representação acarreta na renúncia ao direito de queixa ou de representação com a consequente extinção da punibilidade Lei 90991995 art 74 parágrafo único No crime tipificado pelo art 168A do Código Penal dispõe seu 2º É extinta a punibilidade se o agente espontaneamente declara confessa e efetua o pagamento das contribuições importâncias ou valores e presta as informações devidas à previdência social na forma definida em lei ou regulamento antes do início da ação fiscal Estatui o verbete sumular O pagamento de cheque emitido sem provisão de fundos após o recebimento da denúncia não obsta ao prosseguimento da ação penal Sua interpretação autoriza a ilação a contrario sensu que o pagamento de cheque sem provisão de fundos até o recebimento da denúncia impede o prosseguimento da ação penal Em termos técnicos essa súmula criada anteriormente à Lei 72091984 para o crime de fraude no pagamento por meio de cheque CP art 171 2º VI perdeu eficácia com a redação conferida ao art 16 pela Reforma da Parte Geral do Código Penal A jurisprudência todavia é dominante no sentido de considerar válida a súmula em apreço com a justificativa de não se referir ao arrependimento posterior e sim à falta de justa causa para a denúncia por ausência de fraude É o atual entendimento do Superior Tribunal de Justiça que limita a sua aplicação exclusivamente ao crime de estelionato na modalidade emissão de cheque sem fundos CP art 171 2º VI Esta Corte Superior de Justiça já sufragou o entendimento de que o agente que realiza pagamento através da emissão de cheque sem fundos de terceiro que chegou ilicitamente a seu poder incide na figura prevista no caput do art 171 do Código Penal não em seu 2º inciso IV Tipificada a conduta da paciente como estelionato na sua forma fundamental o fato de ter ressarcido o do prejuízo à vítima antes do recebimento da denúncia não impede a ação penal não havendo falar pois em incidência do disposto no Enunciado 554 da Súmula do Supremo Tribunal Federal que se restringe ao estelionato na modalidade de emissão de cheques sem suficiente provisão de fundo prevista no art 171 2º VI CP Se no curso da ação penal restar devidamente comprovado ressarcimento integral do dano à vítima antes do recebimento da peça de acusação tal fato pode servir como causa de diminuição de pena nos termos do disposto no art 16 do Estatuto Repressivo14 Confundese com o argumento de se tratar de política criminal um crime de natureza pública e indisponível com questões civilistas de cunho privado 8 9 10 11 12 13 14 conferindo ao Direito Penal função de cobrança que não lhe pertence Confirase a propósito o trabalho de GARCIA Waléria Garcelan Loma Arrependimento posterior Belo Horizonte Del Rey 1997 p 81 e ss REsp 1561276BA rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 28062016 noticiado no Informativo 590 Em igual sentido REsp 1242294PR rel originário Min Sebastião Reis Júnior rel para acórdão Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 18112014 noticiado no Informativo 554 HC 98658PR rel orig Min Cármen Lúcia rel p o acórdão Min Marco Aurélio 1ª Turma j 09112010 noticiado no Informativo 608 STF HC 99803RJ rel Min Ellen Gracie 2ª Turma j 22062010 REsp 1187976SP rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 07112013 noticiado no Informativo 531 HC 98658PR rel Min Cármen Lúcia rel p acórdão Min Marco Aurélio 1ª Turma j 09112010 HC 280089SP rel Min Jorge Mussi 5ª Turma j 18022014 noticiado no Informativo 537 201 202 CONCEITO Crime impossível nos termos do art 17 do Código Penal é o que se verifica quando por ineficácia absoluta do meio ou por absoluta impropriedade do objeto jamais ocorrerá a consumação NATUREZA JURÍDICA O crime impossível guarda afinidade com o instituto da tentativa Em ambos o agente inicia em seu plano interno a execução da conduta criminosa que não alcança a consumação As diferenças entretanto são nítidas Na tentativa é possível atingir a consumação pois os meios empregados pelo agente são idôneos e o objeto material contra o qual se dirige a conduta é um bem jurídico suscetível de sofrer lesão ou perigo de lesão Há portanto exposição do bem a dano ou perigo No crime impossível também conhecido como crime oco o emprego de meios ineficazes ou o ataque a objetos impróprios inviabilizam a produção do resultado inexistindo situação de perigo ao bem jurídico penalmente tutelado Em suma na tentativa é em tese possível a consumação a qual somente não ocorre por circunstâncias alheias à vontade do agente enquanto no crime impossível a consumação nunca pode ocorrer seja em razão da ineficácia absoluta do meio seja por força da impropriedade absoluta do objeto Nada obstante a redação do art 17 do Código Penal causa confusão acerca da natureza jurídica do crime impossível 203 Com efeito consta do dispositivo que não se pune a tentativa transmitindo a impressão equivocada de tratarse de causa de isenção de pena no crime tentado Na verdade o crime impossível é causa de exclusão da tipicidade eis que o fato praticado pelo agente não se enquadra em nenhum tipo penal Entretanto em razão da aparente similaridade entre os institutos a doutrina convencionou também chamálo de tentativa inadequada tentativa inidônea1 tentativa impossível tentativa irreal ou tentativa supersticiosa No regime da Parte Geral do Código Penal de 1940 antes da reforma pela Lei 72091984 falavase em quase crime pois os arts 76 parágrafo único e 94 III impunham ao autor do crime impossível a medida de segurança de liberdade vigiada No atual sistema convém não mais usar essa expressão como sinônima de crime impossível embora parcela doutrinária ainda o faça TEORIAS SOBRE O CRIME IMPOSSÍVEL 1 Teoria objetiva Apregoa que a responsabilização de alguém pela prática de determinada conduta depende de elementos objetivos e subjetivos dolo e culpa Elemento objetivo é no mínimo o perigo de lesão para bens jurídicos penalmente tutelados E quando a conduta não tem potencialidade para lesar o bem jurídico seja em razão do meio empregado pelo agente seja pelas condições do objeto material não se configura a tentativa É o que se chama de inidoneidade que conforme o seu grau pode ser de natureza absoluta ou relativa Inidoneidade absoluta é aquela em que o crime jamais poderia chegar à consumação relativa por seu turno aquela em que a conduta poderia ter consumado o delito o que somente não ocorreu em razão de circunstâncias estranhas à vontade do agente Essa teoria se subdivide em outras duas objetiva pura e objetiva temperada 11 Teoria objetiva pura Para essa vertente o Direito Penal somente pode proibir condutas lesivas a bens jurídicos devendo apenas se preocupar com os resultados produzidos no mundo fenomênico Portanto quando a conduta é incapaz por qualquer razão de provocar a lesão o fato há de permanecer impune Essa impunidade ocorrerá independentemente do grau da inidoneidade da ação pois nenhum bem jurídico foi lesado ou exposto a perigo de lesão Assim seja a inidoneidade do meio ou do objeto absoluta ou relativa em nenhum caso estará caracterizada a tentativa 12 Teoria objetiva temperada ou intermediária Para a configuração do crime impossível e por corolário para o afastamento da tentativa os meios empregados e o objeto do crime devem ser absolutamente inidôneos a produzir o resultado idealizado pelo agente Se a inidoneidade for relativa haverá tentativa Foi a teoria consagrada pelo art 17 do Código Penal 2 Teoria subjetiva Leva em conta a intenção do agente manifestada por sua conduta pouco importando se os meios por ele empregados ou o objeto do crime eram ou não idôneos para a produção do resultado Assim seja a inidoneidade absoluta ou relativa em qualquer hipótese haverá tentativa pois o que vale é a vontade do agente seu aspecto psíquico 3 Teoria sintomática Preocupase com a periculosidade do autor e não com o fato praticado A tentativa e o crime impossível são manifestações exteriores de uma personalidade temerária do agente incapaz de obedecer às regras jurídicas a todos impostas Destarte justificase em qualquer caso a aplicação de medida de segurança 204 ESPÉCIES DE CRIME IMPOSSÍVEL A leitura do art 17 do Código Penal revela a existência de duas espécies de crime impossível por ineficácia absoluta do meio e por impropriedade absoluta do objeto 1 Crime impossível por ineficácia absoluta do meio A palavra meio se refere ao meio de execução do crime Dáse a ineficácia absoluta quando o meio de execução utilizado pelo agente é por sua natureza ou essência incapaz de produzir o resultado por mais reiterado que seja seu emprego É o caso daquele que decide matar seu desafeto com uma arma de brinquedo ou então com munição de festim A inidoneidade do meio deve ser analisada no caso concreto e jamais em abstrato O emprego de açúcar no lugar de veneno para matar alguém pode constituirse em meio absolutamente ineficaz em relação à ampla maioria das pessoas É capaz todavia de eliminar a vida de um diabético ainda quando ministrado em pequena dose Se a ineficácia for relativa estará caracterizada a tentativa Exemplo A desejando matar seu desafeto nele efetua disparos de arma de fogo O resultado naturalístico morte somente não se produz porque a vítima trajava um colete de proteção eficaz 2 Crime impossível por impropriedade absoluta do objeto Objeto para o Código Penal é o objeto material compreendido como a pessoa ou a coisa sobre a qual recai a conduta do agente O objeto material é absolutamente impróprio quando inexistente antes do início da prática da conduta ou ainda quando nas circunstâncias em que se encontra torna impossível a sua consumação como nas situações em que se 205 tenta matar pessoa já falecida ou se procura abortar o feto de mulher que não está grávida A mera existência do objeto material é suficiente por si só para configurar a tentativa O conatus estará ainda presente no caso de impropriedade relativa do objeto Exemplo o larápio mediante destreza coloca a mão no bolso direito da calça da vítima com o propósito de furtar o aparelho de telefonia celular Não obtém êxito uma vez que o bem estava no bolso esquerdo Em caso de roubo assim já entendeu o Superior Tribunal de Justiça O Código Penal adotou em seu art 17 a teoria objetivatemperada para fins de reconhecimento do crime impossível Necessário para fins de reconhecimento da impropriedade absoluta do objeto que o bem jurídico não exista ou pelas circunstâncias do caso seja impossível ser atingido A existência de qualquer bem com a vítima impede o reconhecimento da impropriedade absoluta do objeto Nos termos da jurisprudência desta Corte ainda que não exista nenhum bem com a vítima o crime de roubo por ser delito complexo tem iniciada sua execução quando o agente visando a subtração de coisa alheia móvel realiza o núcleo da conduta meio constrangimento ilegallesão corporal ou vias de fato ainda que não consiga atingir o crime fim subtração da coisa almejada2 MOMENTO ADEQUADO PARA AFERIÇÃO DA INIDONEIDADE ABSOLUTA A ineficácia absoluta do meio e a impropriedade absoluta do objeto devem ser analisadas depois da prática da conduta com a qual se deseja consumar o crime Uma vez realizada a conduta e só então deve ser diferenciada a situação em que tal conduta caracteriza tentativa punível ou crime impossível A regra não pode ser estabelecida em abstrato previamente e sim no caso concreto após a realização da conduta Nas palavras de Marcelo Semer Devese privilegiar a aferição ex post desde que se pretenda a incorporação na aferição da idoneidade dos meios ou do objeto das 206 circunstâncias que concretamente atuaram no desenrolar dos fatos o que aliás é mais consentâneo com a própria noção de tipicidade Bem ainda analisarse a idoneidade dos meios ou objeto de acordo com o plano concreto do agente vale dizer em relação ao propósito a que se lançara na empreitada delituosa3 Se o agente está em um supermercado repleto de instrumentos eletrônicos de filmagem com diversos seguranças monitorando seus passos e depois de colocar suas compras em um carrinho esconde uma garrafa de vinho sob suas vestes para passar pelo caixa sem pagar por ela podese desde já falarse em crime impossível É evidente que não De fato é possível que ele consiga fugir dos seguranças ou entregar o bem disfarçadamente para outra pessoa leválo embora ou então se valer de qualquer outro meio capaz de consumar o furto Só depois do momento em que o agente estiver efetivamente preso portanto seria autorizado discutir a caracterização ou não do crime impossível Como estabelece a Súmula 567 do Superior Tribunal de Justiça Sistema de vigilância realizado por monitoramento eletrônico ou por existência de segurança no interior de estabelecimento comercial por si só não torna impossível a configuração do crime de furto É também o entendimento do Supremo Tribunal Federal A existência de sistema de vigilância em estabelecimento comercial não constitui óbice para a tipificação do crime de furto4 ASPECTOS PROCESSUAIS INERENTES AO CRIME IMPOSSÍVEL A comprovação do crime impossível acarreta na ausência de tipicidade do fato Em verdade não há crime Consequentemente o Ministério Público deve requerer o arquivamento do inquérito policial Se não o fizer oferecendo denúncia deve esta ser rejeitada com fulcro no art 395 III do Código de Processo Penal com a redação alterada pela Lei 117192008 pois o fato evidentemente não constitui crime faltando condição para o exercício da ação penal Se a denúncia for recebida com a instauração do processo penal o juiz 207 2071 2072 deve ao final absolver o réu nos termos do art 386 III do Código de Processo Penal pelo motivo de o fato não constituir infração penal Em se tratando de crime da competência do Tribunal do Júri ao final da primeira fase judicium accusationis deverá o acusado ser absolvido sumariamente em conformidade com o art 415 inciso III do Código de Processo Penal com a redação alterada pela Lei 116892008 em face de o fato não constituir infração penal O habeas corpus não é instrumento adequado para trancamento de ação penal que tenha como objeto um crime impossível pois nessa ação constitucional não é cabível a produção de provas para demonstrar a ineficácia absoluta do meio ou a impropriedade absoluta do objeto Excetuase essa regra em hipóteses teratológicas Exemplo denúncia de homicídio pelo fato de alguém ter matado um macaco CRIME PUTATIVO E CRIME IMPOSSÍVEL Conceito de crime putativo Putativo deriva do latim putativus isto é imaginário Tratase de algo que aparenta ser real mas que na verdade não existe Crime putativo também chamado de imaginário ou erroneamente suposto é o que existe apenas na mente do agente que acredita violar a lei penal quando na verdade o fato por ele concretizado não possui adequação típica ou seja não encontra correspondência em um tipo penal Espécies de crime putativo São três as espécies de crime putativo 1 por erro de tipo 2 por erro de proibição delito de alucinação ou crime de loucura e 3 por obra do agente provocador 1 Crime putativo por erro de tipo É o crime imaginário que se verifica quando o autor acredita ofender uma lei penal incriminadora efetivamente existente mas à sua conduta faltam elementos da definição típica Exemplo A acredita praticar tráfico de drogas art 33 caput da Lei 113432006 ao vender um pó branco que reputa ser cocaína mas na verdade é farinha 2 Crime putativo por erro de proibição delito de alucinação ou crime de loucura A equivocada crença do agente recai sobre a ilicitude do fato pois supõe violar uma lei penal que não existe Exemplo B cidadão comum perde o controle de seu automóvel vindo a se chocar com outro veículo automotor que estava estacionado em via pública Foge em seguida com receio de ser preso em flagrante pela prática de dano culposo não tipificado como infração penal pela legislação comum5 3 Crime putativo por obra do agente provocador Também denominado de crime de ensaio crime de experiência ou flagrante provocado verificase quando alguém insidiosamente induz outra pessoa a cometer uma conduta criminosa e simultaneamente adota medidas para impedir a consumação A consumação deve ser absolutamente impossível sob pena de configuração da tentativa Compõese pois de dois atos um de indução pois o agente é provocado por outrem a cometer o delito e outro de impedimento eis que a pretensa vítima adota providências aptas a obstar a consumação Como exemplo podemos ilustrar com a situação da patroa que desconfiada de furtos supostamente praticados por sua empregada doméstica simula sua saída de casa e o esquecimento de cédulas de dinheiro sobre um móvel atraindo a suspeita a subtraílos Ao mesmo tempo instala uma câmera de filmagem no local e solicita a presença de policiais militares para acompanharem a atuação da serviçal Quando ela se apodera do dinheiro e o coloca em sua bolsa os milicianos prontamente ingressam na residência e efetuam a prisão em flagrante Na clássica lição de Nélson Hungria Somente na aparência é que ocorre um crime exteriormente perfeito Na realidade o seu autor é apenas o protagonista inconsciente de uma comédia O elemento subjetivo do crime existe é certo em violação toda a sua plenitude mas sob o aspecto objetivo não há violação da lei penal senão uma inciente cooperação para a ardilosa averiguação da autoria dos crimes anteriores ou uma simulação embora ignorada do agente da exterioridade de um crime O desprevenido sujeito ativo opera dentro de uma pura ilusão pois ab initio a vigilância da autoridade policial ou do suposto paciente torna impraticável a real consumação do crime Um crime que além de astuciosamente sugerido e ensejado ao agente tem suas consequências frustradas por medidas tomadas de antemão não passa de um crime imaginário Não há lesão nem efetiva exposição a perigo de qualquer interesse público ou privado6 grifamos Caracterizado o crime putativo por obra do agente provocador o fato resta impune pois o seu autor por nada responde nem mesmo pela tentativa Aplicase analogicamente a regra prevista no art 17 do Código Penal pois a situação em muito se assemelha ao crime impossível Sobre o assunto o Supremo Tribunal Federal editou a Súmula 145 Não há crime quando a preparação do flagrante pela polícia torna impossível a sua consumação Deve ser feita a distinção todavia entre essa modalidade de crime putativo também conhecido como flagrante preparado e o flagrante esperado No flagrante preparado a iniciativa do delito é do agente provocador A vontade do provocado é viciada o que contamina de nulidade toda a conduta Nesta situação sequer existe tentativa No flagrante esperado por sua vez a deflagração do processo executório do crime é responsabilidade do agente razão pela qual é lícito É válido quando a polícia informada sobre a possibilidade de ocorrer um delito dirigese ao local aguardando a sua execução Iniciada esta a pronta intervenção dos agentes policiais prendendo o autor configura o flagrante7 É regular por exemplo a atuação da polícia que resulta na prisão de pessoas além da apreensão de drogas e armas depois de aguardar o pouso de uma aeronave utilizada para a prática de crimes objeto de prévia denúncia 2073 anônima Em relação ao tráfico de drogas já decidiu o Superior Tribunal de Justiça O flagrante preparado apresentase quando existe a figura do provocador da ação dita por criminosa que se realiza a partir da indução do fato e não quando já estando o sujeito compreendido na descrição típica a conduta se desenvolve para o fim de efetuar o flagrante Na espécie inexiste patente violação da lei pois o crime de tráfico de drogas estava consumado desde a realização dos verbos nucleares ter em depósito guardar ou transportar entorpecentes condutas que não foram estimuladas pelos policiais sendo despicienda eventual indução da mercancia pelos agentes8 No tocante aos crimes em geral o Supremo Tribunal Federal assim se pronunciou Não configura situação de flagrante preparado o contexto em que a Polícia tendo conhecimento prévio do fato delituoso vem a surpreender em sua prática o agente que espontaneamente iniciara o processo de execução do iter criminis A ausência por parte dos organismos policiais de qualquer medida que traduza direta ou indiretamente induzimento ou instigação à prática criminosa executada pelo agente descaracteriza a alegação de flagrante preparado não obstante sobrevenha a intervenção ulterior da Polícia lícita e necessária destinada a impedir a consumação do delito9 Diferença entre crime impossível e crime putativo Diante do que foi abordado fica clara a distinção entre as figuras do crime impossível e do crime putativo Crime impossível é a situação em que o autor com a intenção de cometer o delito não consegue fazêlo por ter se utilizado de meio de execução absolutamente ineficaz impotente para lesar o bem jurídico ou então em decorrência de ter direcionado a sua conduta a objeto material absolutamente impróprio inexistente antes do início da execução ou no caso concreto inadequado à consumação Portanto o erro do agente recai sobre a idoneidade do meio ou do objeto material De seu turno crime putativo é aquele em que o agente embora acredite praticar um fato típico realiza um indiferente penal seja pelo fato de a conduta não encontrar previsão legal crime putativo por erro de proibição seja pela ausência de um ou mais elementos da figura típica crime putativo por erro de tipo ou ainda por ter sido induzido à prática do crime ao mesmo tempo em que foram adotadas providências eficazes para impedir sua consumação crime putativo por obra do agente provocador 1 2 3 4 5 6 7 8 9 SAUER GUILLERMO Derecho Penal Parte General Trad de Juan del Rosal Barcelona Bosch Casa Editorial 1956 p 173 REsp 1340747RJ rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 13052014 SEMER Marcelo Crime impossível e a proteção de bens jurídicos São Paulo Malheiros 2002 p 89 STF HC 111278MG rel orig Min Marco Aurélio red p o ac Min Luís Roberto Barroso 1ª Turma j 10042018 noticiado no Informativo 897 O dano culposo é crime perante o Código Penal Militar Decretolei 10011969 art 259 cc o art 266 HUNGRIA Nélson Comentários ao código penal Rio de Janeiro Forense 1949 v I p 279 BONFIM Edilson Mougenot Curso de processo penal São Paulo Saraiva 2006 p 374 HC 214235SP rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 15052014 HC 70076SP rel Min Celso de Mello 1 Turma j 30031993 Ilicitude é a contrariedade entre o fato típico praticado por alguém e o ordenamento jurídico capaz de lesionar ou expor a perigo de lesão bens jurídicos penalmente tutelados O juízo de ilicitude é posterior e dependente do juízo de tipicidade de forma que todo fato penalmente ilícito também é necessariamente típico Ilicitude formal é a mera contradição entre o fato praticado pelo agente e o sistema jurídico em vigor É a característica da conduta que se coloca em oposição ao Direito Ilicitude material ou substancial é o conteúdo material do injusto a substância da ilicitude que reside no caráter antissocial do comportamento na sua contradição com os fins colimados pelo Direito na ofensa aos valores necessários à ordem e à paz no desenvolvimento da vida social1 Em sede doutrinária prevalece o entendimento de que a ilicitude é formal pois consiste no exame da presença ou ausência das suas causas de exclusão Nesses termos o aspecto material se reserva ao terreno da tipicidade Cumpre ressaltar porém que somente a concepção material autoriza a criação de causas supralegais de exclusão da ilicitude De fato em tais casos há relação de contrariedade entre o fato típico e o ordenamento jurídico sem contudo revelar o caráter antissocial da conduta Com o escopo de encerrar a discussão acerca do caráter formal ou material da ilicitude surgiu uma concepção unitária inicialmente na Alemanha que depois se irradiou para fora dela apregoando ser a ilicitude uma só Nesse diapasão um comportamento humano que se coloca em relação de antagonismo com o sistema jurídico não pode deixar de ofender ou expor a perigo de lesão bens jurídicos protegidos por esse mesmo sistema jurídico Na lição de Francisco de Assis Toledo Pensarse em uma antijuridicidade puramente formal desobediência à norma e em outra material lesão ao bem jurídico tutelado por essa mesma norma só teria sentido se a primeira subsistisse sem a segunda Correta pois a afirmação de BETTIOL de que a contraposição dos conceitos em exame antijuridicidade formal e material não tem razão de ser mantida viva porque só é antijurídico aquele fato que possa ser considerado lesivo a um bem jurídico Fora disso a antijuridicidade não existe2 Em geral utilizamse como sinônimos os termos ilicitude e antijuridicidade Isso é correto Parecenos que não com o devido respeito aos entendimentos em contrário Com efeito no universo da teoria geral do direito a infração penal crime e contravenção penal constituise em um fato jurídico já que a sua ocorrência provoca efeitos no campo jurídico Logo é incoerente imaginar que um crime fato jurídico seja revestido de antijuridicidade A contradição é óbvia um fato jurídico seria ao mesmo tempo antijurídico Por tal razão mais acertado falarse em ilícito e em ilicitude em vez de antijurídico e antijuridicidade Foi a opção preferida pelo legislador pátrio O Código Penal no art 23 valeuse da rubrica marginal exclusão de ilicitude e em momento algum se referiu à antijuridicidade Nada obstante muitos autores ainda utilizam ambos os termos como sinônimos O gráfico a seguir bem ilustra a distinção O ilícito é a oposição entre um fato típico e o ordenamento jurídico A relação é lógica e de mera constatação não comportando graus Logo um crime de injúria revestese de ilicitude tal como um delito de extorsão mediante sequestro com resultado morte Ambos são ilícitos sem qualquer distinção De seu turno injusto é o antagonismo entre o fato típico e a compreensão social acerca da justiça Por corolário um fato típico pode ser ilícito mas considerado justo e quiçá admitido pela sociedade como se dá na receptação relativa à aquisição de discos musicais derivados de pirataria com violação de direitos autorais CP art 184 Se não bastasse o injusto se reveste de graus vinculados à intensidade de reprovação social causada pelo comportamento penalmente ilícito É comum a confusão entre tais vocábulos muitas vezes considerados sinônimos Confirase entretanto a lúcida explicação de Luiz Regis Prado amparado em Hans Welzel Quadra aqui distinguir entre as noções de ilicitude e injusto a primeira é uma relação de oposição da conduta do autor com a norma jurídica É um predicado uma qualidade um estímulo de determinadas formas de açãoomissão O injusto por sua vez é a própria ação valorada como ilícita Tem cunho substantivo quer dizer algo substancial O conceito de injusto engloba a ação típica e ilícita Tão somente o injusto é mensurável em qualidade e quantidade ex homicídio e lesão corporal O injusto penal é específico como o injusto civil ao passo que a ilicitude é unitária diz respeito ao ordenamento jurídico como um todo3 Ilicitude genérica é a que se posiciona externamente ao tipo penal incriminador O fato típico se encontra em contradição com o ordenamento jurídico No homicídio por exemplo é típica a conduta de matar alguém não autorizada pelo Direito salvo se presente uma causa de justificação A ilicitude se situa fora do tipo penal De fato em um sistema finalista o dolo é natural isto é para sua caracterização bastam consciência e vontade independentemente do caráter ilícito do fato Na ilicitude específica por sua vez o tipo penal aloja em seu interior elementos atinentes ao caráter ilícito do comportamento do agente É o que se dá exemplificativamente nos crimes de violação de correspondência CP art 151 indevidamente divulgação de segredo e violação do segredo profissional CP arts 153 e 154 sem justa causa e exercício arbitrário das próprias razões CP art 345 salvo quando a lei o permite Em tais hipóteses unemse em um mesmo juízo a tipicidade e a ilicitude pois esta última situase no corpo do tipo penal funcionando como elemento normativo do tipo cujo significado pode ser obtido por um procedimento de valoração do intérprete da lei penal Consequentemente as causas de exclusão da ilicitude afastam a tipicidade Em sentido contrário Cezar Roberto Bitencourt emprega as expressões antijuridicidade genérica e antijuridicidade específica para distinguir a ilicitude penal da ilicitude extrapenal4 Essa classificação diz respeito ao caráter da ilicitude Para a ilicitude subjetiva a proibição ou o mandamento da lei penal dirigese apenas às pessoas imputáveis eis que somente elas têm capacidade mental para compreender as vedações e as ordens emitidas pelo legislador Essa teoria peca ao confundir ilicitude e culpabilidade basta a prática de um fato típico e ilícito para a configuração de uma infração penal reservandose à culpabilidade o juízo de reprovabilidade para a imposição de uma pena Para a ilicitude objetiva é suficiente a contrariedade entre o fato típico praticado pelo autor da conduta e o ordenamento jurídico apto a causar dano ou expor a perigo bens jurídicos penalmente protegidos As notas pessoais do agente especialmente sua imputabilidade ou não em nada afetam a ilicitude a qual se mantém independentemente da culpabilidade analisada em momento posterior Em nosso sistema penal a ilicitude é claramente objetiva os inimputáveis qualquer que seja a causa da ausência de culpabilidade praticam condutas ilícitas Exemplo um deficiente mental que mata outra pessoa realiza um comportamento ilícito contrário ao Direito muito embora não possa ser a ele imposta uma pena em face de sua inculpabilidade Essa divisão se relaciona intimamente com o caráter fragmentário do Direito Penal pelo qual todo ilícito penal também é um ato ilícito perante os demais ramos do Direito mas nem todo ato ilícito também guarda esta natureza no campo penal Exemplificativamente a sonegação fiscal calcada em fraude para exclusão do tributo é crime definido pela Lei 81371990 e também ato ilícito perante o Direito Tributário Contudo o mero inadimplemento de um tributo não admitido perante o direito fiscal é um fato atípico perante o Direito Penal Vejamos a explicação de Francisco de Assis Toledo ao diferenciar a ilicitude penal da ilicitude extrapenal Poderíamos representar graficamente essa distinção através de dois círculos concêntricos o menor o do injusto penal mais concentrado de exigências o maior o do injusto extrapenal civil administrativo etc com exigências mais reduzidas para sua configuração O fato ilícito situado dentro do círculo menor não pode deixar de estar situado também dentro do maior por localizarse em uma área comum a ambos os círculos que possuem o mesmo centro Já o mesmo não ocorre com os fatos ilícitos situados fora de tipificação penal o círculo menor mas dentro do círculo maior na sua faixa periférica e exclusiva Assim um ilícito civil ou administrativo pode não ser um ilícito penal mas a recíproca não é verdadeira5 Em face do acolhimento da teoria da tipicidade como indício da ilicitude uma vez praticado o fato típico isto é o comportamento humano previsto em lei como crime ou contravenção penal presumese o seu caráter ilícito A tipicidade não constitui a ilicitude apenas a revela indiciariamente6 Essa presunção é relativa iuris tantum pois um fato típico pode ser lícito desde que o seu autor demonstre ter agido acobertado por uma causa de exclusão da ilicitude Presente uma excludente da ilicitude estará excluída a infração penal Crime e contravenção penal deixam de existir pois o fato típico não é contrário ao Direito Ao contrário a ele se amolda Várias são as denominações empregadas pela doutrina para se referir às causas de exclusão da ilicitude destacandose causas de justificação justificativas descriminantes tipos penais permissivos e eximentes Cuidado a palavra dirimente nada tem a ver com a área da ilicitude Em verdade significa causa de exclusão da culpabilidade Para a identificação de uma causa de exclusão da ilicitude o art 23 do Código Penal utiliza a expressão não há crime enquanto para se reportar a uma causa de exclusão da culpabilidade o legislador se vale de expressões como não é punível é isento de pena e outras semelhantes7 Essa regra é tranquila na Parte Geral alterada pela Lei 72091994 Todavia há na Parte Especial situações em que se utiliza a expressão isento de pena ou análoga para fazer menção à exclusão do crime É o que se verifica exemplificativamente nos arts 128 e 142 do Código Penal O Código Penal possui em sua íntegra causas genéricas e específicas de exclusão da ilicitude Causas genéricas ou gerais são as previstas na Parte Geral do Código Penal Aplicamse a qualquer espécie de infração penal e encontramse no art 23 e seus incisos estado de necessidade legítima defesa estrito cumprimento do dever legal e exercício regular do direito Causas específicas ou especiais podem ser definidas como as previstas na Parte Especial do Código Penal e na legislação especial com aplicação unicamente a determinados crimes ou seja somente àqueles delitos a que expressamente se referem a exemplo dos arts 128 aborto 142 injúria e difamação8 146 3º I e II constrangimento ilegal 150 3º I e II violação de domicílio e 156 2º furto de coisa comum todos do Estatuto Repressivo Há também excludentes da ilicitude contidas fora do Código Penal tais como a b c art 10 da Lei 65381978 exercício regular de direito consistente na possibilidade de o serviço postal abrir carta com conteúdo suspeito art 1210 1º do Código Civil legítima defesa do domínio pois o proprietário pode retomar o imóvel esbulhado logo em seguida à invasão e art 37 I da Lei 96051998 estado de necessidade mediante o abatimento de um animal protegido por lei para saciar a fome do agente ou de sua família Essa relação legal contudo não impede a formulação de causas supralegais de exclusão da ilicitude adiante analisadas Discutese em doutrina se o reconhecimento de uma causa de exclusão da ilicitude depende somente dos requisitos legalmente previstos relacionados ao aspecto exterior do fato ou se está condicionado também a um requisito subjetivo atinente ao psiquismo interno do agente que deve ter consciência de que atua sob a proteção da justificativa Pensemos na seguinte situação hipotética A efetua disparos de arma de fogo contra B seu desafeto com o propósito de eliminar sua vida por vingança Descobrese posteriormente que naquele exato instante B iria acionar uma bomba e lançála em direção à casa de C para matálo Vejamos agora cada uma das propostas doutrinárias com a respectiva solução para o caso apresentado A concepção objetiva mais antiga alega não exigir o direito positivo a presença do requisito subjetivo A esse entendimento aderiram dentre outros José Frederico Marques e E Magalhães Noronha Na explanação de Enrique Cury Urzúa À lei só interessa que a finalidade atual do agente seja conforme à norma jurídica A formação da vontade com sua rica gama de afetos tendências sentimentos convicções etc permanece à margem da valoração O Direito aspira unicamente a que o agente se comporte conforme as suas prescrições não lhe interessa por que o faz Por isso para que atue uma causa de justificação basta que o agente tenha conhecido e querido a situação de fato em que esta consiste os motivos que acompanhavam a vontade de concreção adequada à norma permanecem irrelevantes9 Logo no caso acima narrado estaria configurada a legítima defesa de terceiro com a exclusão do crime de A Essa posição entretanto foi aos poucos perdendo espaço para uma concepção subjetiva pela qual o reconhecimento de uma causa de exclusão da ilicitude reclama o conhecimento da situação justificante pelo agente Filiamse a ela dentre outros Heleno Cláudio Fragoso Julio Fabbrini Mirabete Francisco de Assis Toledo e Damásio E de Jesus Um dos pioneiros a representar esse entendimento foi Aníbal Bruno que assim se manifestou sobre a legítima defesa Apesar do caráter objetivo da legítima defesa é necessário que exista em quem reage a vontade de defenderse O ato do agente deve ser um gesto de defesa uma reação contra ato agressivo de outrem e esse caráter de reação deve existir nos dois momentos da sua situação o subjetivo e o objetivo O gesto de quem defende precisa ser determinado pela consciência e vontade de defenderse10 Sob essa ótica no caso apresentado estaria excluída a legítima defesa de terceiro e A responderia pelo homicídio praticado contra B Se restar suficientemente comprovada a presença de uma causa de exclusão da ilicitude estará ausente uma condição da ação penal e o Ministério Público deverá requerer o arquivamento dos autos do inquérito policial Se não o fizer no tocante aos crimes diversos dos dolosos contra a vida o magistrado poderá rejeitar a denúncia com fundamento no art 395 II do Código de Processo Penal O fato narrado evidentemente não constitui infração penal e por consequência falta uma condição para o exercício da ação penal Na hipótese de a denúncia ter sido recebida o juiz poderá após a apresentação da resposta escrita absolver sumariamente o acusado em face da existência manifesta da causa de exclusão da ilicitude do fato nos moldes do art 397 I do Código de Processo Penal Mas assim não agindo restará por ocasião da sentença absolvêlo com fulcro no art 386 VI do Código de Processo Penal Por outro lado nos crimes de competência do Tribunal do Júri dolosos contra a vida consumados ou tentados e os que sejam a ele conexos o magistrado não poderá pronunciar o réu Deverá em verdade absolvêlo sumariamente com fulcro no art 415 IV do Código de Processo Penal diante da existência de circunstância que exclui o crime A Lei 124032011 responsável pela alteração de diversos dispositivos do Código de Processo Penal no tocante à prisão provisória fiança liberdade provisória e demais medidas cautelares gerou reflexos no tocante às causas de exclusão da ilicitude A primeira questão a ser analisada diz respeito ao art 310 parágrafo único do Código de Processo Penal cuja redação é a seguinte Art 310 Ao receber o auto de prisão em flagrante o juiz deverá fundamentadamente Parágrafo único Se o juiz verificar pelo auto de prisão em flagrante que o agente praticou o fato nas condições constantes dos incisos I a III do caput do art 23 do DecretoLei nº 2848 de 7 de dezembro de 1940 Código Penal poderá fundamentadamente conceder ao acusado liberdade provisória mediante termo de comparecimento a todos os atos processuais sob pena de revogação Em resumo o apontado dispositivo legal impõe ao juiz a obrigação de tão a b logo receba o auto de prisão em flagrante conceder liberdade provisória ao agente que praticou o fato típico em estado de necessidade legítima defesa estrito cumprimento do dever legal ou exercício regular do direito Este dispositivo há de ser interpretado com cautela Sua incidência limita se às situações em que o magistrado compulsando o auto de prisão em flagrante concluir pela fundada suspeita probabilidade da prática do fato típico sob o manto de alguma causa excludente da ilicitude Nesses casos como medida de cautela é prudente a concessão da liberdade provisória visando uma dupla finalidade a o agente responde em liberdade à ação penal e b abrese espaço para apuração a fundo durante a instrução criminal da presença ou não da eximente11 Com efeito se o juiz se deparar com um quadro fático de certeza acerca da prática do fato amparado por uma causa de exclusão da ilicitude exemplo A matou B porque este gratuitamente partiu em sua direção portando um machado para golpeálo em região vital deverá relaxar a prisão em flagrante em face da sua ilegalidade com fulcro no art 5º LXV da Constituição Federal e no art 310 I do Código de Processo Penal Sem dúvida alguma a ilegalidade da prisão em flagrante repousa na ausência de crime E se nada obstante a presença manifesta de uma causa excludente da ilicitude o Ministério Público ou querelante oferecer a inicial acusatória o juiz deverá rejeitar a denúncia ou queixa em razão da falta de justa causa para o exercício da ação penal a teor da regra inserida no art 395 III do Código de Processo Penal Entretanto se malgrado a presença inequívoca da causa excludente da ilicitude a denúncia ou queixa tenha sido recebida pelo Poder Judiciário surgem duas novas alternativas nos crimes em geral procedimento comum após a citação do acusado e apresentação da resposta escrita o juiz deverá absolvêlo sumariamente na forma do art 397 inc I do Código de Processo Penal e nos crimes de competência do Tribunal do Júri após a citação do acusado com a consequente apresentação de resposta escrita e o regular processamento da ação penal CPP arts 406 a 411 o juiz também deverá ao final da audiência de instrução debates e julgamento absolvêlo sumariamente nos termos do art 415 IV in fine do Código de Processo Penal em face da presença de causa de exclusão do crime Igual raciocínio deve ser empregado na interpretação do art 314 do Código de Processo Penal relacionado à prisão preventiva e assim redigido Art 314 A prisão preventiva em nenhum caso será decretada se o juiz verificar pelas provas constantes dos autos ter o agente praticado o fato nas condições previstas nos incisos I II e III do caput do art 23 do DecretoLei nº 2848 de 7 de dezembro de 1940 Código Penal De fato a prudência determina a manutenção em liberdade do agente sem decretação da prisão preventiva nas hipóteses de fundada suspeita da prática do fato em situação caracterizadora de qualquer das causas de exclusão da ilicitude Por outro lado se estiver cabalmente demonstrada a presença de alguma eximente não há falar em crime e muito menos na admissibilidade desta modalidade de prisão provisória O Brasil não seguiu a sistemática do Código Penal Português que dispõe em seu art 31 1 O facto não é criminalmente punível quando a sua ilicitude for excluída pela ordem jurídica considerada na sua totalidade Mas embora tenha se omitido prevalece na doutrina e na jurisprudência o entendimento de que as causas de exclusão da ilicitude não se limitam às hipóteses previstas em lei Abrangem tais situações é evidente mas se estendem também àquelas que necessariamente resultam do direito em vigor e de suas fontes Nas lições de Mezger Nenhuma lei esgota a totalidade do direito A teoria do caráter lógico cerrado do ordenamento jurídico legal é somente uma sedutora fábula Em realidade tal caráter cerrado não existe O mero positivismo legal deixa sem resposta inumeráveis questões da vida prática do direito12 Com efeito seria impossível exigir do legislador a regulamentação expressa e exaustiva de todas as causas de justificação seja porque algumas delas resultam de novas construções doutrinárias seja porque derivam de valores éticosociais cujas modificações constantes podem acarretar no desenho de novas causas ainda não previstas em lei mas que em determinada sociedade se revelam imprescindíveis à adequada e justa aplicação da lei penal E como essas eximentes não fundamentam nem agravam o poder punitivo estatal operando exatamente em sentido contrário a criação de causas supralegais não ofende o princípio da reserva legal inseparável do Direito Penal moderno Para quem admite essa possibilidade a causa supralegal de exclusão da ilicitude por todos aceita é o consentimento do ofendido13 Anotese porém ser vedado o reconhecimento de causas supralegais para os partidários do caráter formal da ilicitude se esta é compreendida como a mera contrariedade entre o fato praticado e o ordenamento jurídico posição legalista somente esse mesmo ordenamento jurídico pode taxativamente afastar a ilicitude legalmente configurada Nélson Hungria anota ter a Comissão Revisora do Projeto que se transformou no Código Penal de 1940 excluído do texto aprovado qualquer referência ao consentimento do ofendido como causa de exclusão da ilicitude por reputar um dispositivo deste naipe evidentemente supérfluo14 O consentimento do ofendido entendido como a anuência do titular do bem jurídico ao fato típico praticado por alguém é atualmente aceito como supralegal de exclusão da ilicitude Três teorias buscam fundamentar o consentimento do ofendido como causa supralegal de exclusão da ilicitude a b c Ausência de interesse não há interesse do Estado quando o próprio titular do bem jurídico de cunho disponível não tem vontade na aplicação do Direito Penal Essa teoria é criticada por não se poder outorgar o poder de decisão a uma pessoa que pode se equivocar acerca do seu real interesse Renúncia à proteção do Direito Penal em algumas situações excepcionais o sujeito passivo de uma infração penal pode renunciar em favor do sujeito ativo a proteção do Direito Penal Essa teoria entra em manifesto conflito com o caráter público desse ramo do ordenamento jurídico Ponderação de valores tratase da teoria mais aceita no direito comparado O consentimento funciona como causa de justificação quando o Direito concede prioridade ao valor da liberdade de atuação da vontade frente ao desvalor da conduta e do resultado causado pelo delito que atinge bem jurídico disponível O consentimento do ofendido como tipo penal permissivo tem aplicabilidade restrita aos delitos em que o único titular do bem ou interesse juridicamente protegido é a pessoa que aquiesce acordo ou consentimento e que pode livremente dele dispor De uma maneira geral estes delitos podem ser incluídos em quatro grupos diversos a delitos contra bens patrimoniais b delitos contra a integridade física c delitos contra a honra e d delitos contra a liberdade individual15 Nos crimes contra o patrimônio por óbvio somente se aceita a disponibilidade se não houver o emprego de violência à pessoa ou grave ameaça durante a execução do delito E nos crimes contra a integridade física nas hipóteses em que a lei condiciona a persecução penal à iniciativa do ofendido ou de quem o represente seja com o oferecimento de representação seja com o ajuizamento de queixacrime Em síntese é cabível unicamente em relação a bens jurídicos disponíveis Se indisponível o bem jurídico há interesse privativo do Estado e o particular dele não pode renunciar Para diferenciar um bem disponível de 1 2 3 a b c d outro indisponível Pierangeli apresenta três etapas há que se percorrer não só um ramo do Direito mas todos os princípios que formam a base do ordenamento jurídico estatal na realização desse trabalho o intérprete deve reportarse a todas as fontes imediatas e mediatas e a partir daí examinar os decretos atos administrativos regulamentos portarias e pesquisar o direito consuetudinário e o critério adotado pelo legislador para a fixação da natureza da ação penal é arbitrário e por consequência inseguro mas sempre servirá ao intérprete desde que não seja usado com exclusividade16 Ademais é correto afirmar que o consentimento do ofendido somente pode afastar a ilicitude nos delitos em que o titular do bem jurídico tutelado pela lei penal é uma pessoa física ou jurídica Não tem o condão de excluir o crime quando se protegem bens jurídicos metaindividuais ou então pertencentes à sociedade ou ao Estado Para ser eficaz o consentimento do ofendido há de preencher os seguintes requisitos17 deve ser expresso ou real pouco importando sua forma oral ou por escrito solene ou não Entretanto também tem sido admitido o consentimento presumido ou ficto nas hipóteses em que se possa com razoabilidade concluir que o agente atuou supondo que o titular do bem jurídico teria consentido se conhecesse as circunstâncias em que a conduta foi praticada não pode ter sido concedido em razão de coação ou ameaça nem de paga ou promessa de recompensa Em suma há de ser livre é necessário ser moral e respeitar os bons costumes deve ser manifestado previamente à consumação da infração penal A anuência posterior à consumação do crime não afasta a ilicitude e e o ofendido deve ser plenamente capaz para consentir ou seja deve ter completado 18 anos de idade e não padecer de nenhuma anomalia suficiente para retirar sua capacidade de entendimento e autodeterminação No campo dos crimes contra a dignidade sexual especificamente no tocante aos delitos previstos nos arts 217A 218 218A e 218B todos do Código Penal a situação de vulnerabilidade funciona como instrumento legal de proteção à liberdade sexual da pessoa menor de 14 quatorze anos de idade em face de sua incapacidade volitiva sendo irrelevante o consentimento do vulnerável para a formação do crime sexual Não produz efeitos o consentimento prestado pelo representante legal de um menor de idade ou incapaz Não há obstáculo à exclusão da ilicitude nos crimes culposos como decorrência do consentimento do ofendido Evidentemente assim como nos crimes dolosos o bem jurídico deve ser disponível Ademais o consentimento referese não ao resultado naturalístico por ser involuntário mas à conduta imprudente negligente ou imperita No crime de lesão corporal culposa na direção de veículo automotor Lei 95031997 art 303 por exemplo afastase a ilicitude quando a vítima aquiesce ao excesso de velocidade do motorista daí resultando um acidente e a produção dos ferimentos A doutrina alemã aceita paralelamente ao consentimento expresso o consentimento presumido nos casos urgentes em que o ofendido ou seu representante legal não possam prestar a anuência mas poderia se esperar que se possível agiriam dessa forma Apontamse os exemplos do aborto necessário para salvar a vida da gestante bem como a amputação de um membro de um ferido de guerra desacordado para preservar partes relevantes de seu corpo e até mesmo livrá a lo da morte O Código Penal português em seu art 39º também disciplina expressamente o consentimento presumido 1 Ao consentimento efectivo é equiparado o consentimento presumido 2 Há consentimento presumido quando a situação em que o agente actua permitir razoavelmente supor que o titular do interesse juridicamente protegido teria eficazmente consentido no facto se conhecesse as circunstâncias em que este é praticado Essa posição favorável ao consentimento presumido tem sido adotada no Brasil Na hipótese de bem jurídico disponível é possível que o consentimento do ofendido afaste a tipicidade da conduta relativamente aos tipos penais em que se revela como requisito expresso ou tácito que o comportamento humano se realize contra ou sem a vontade do sujeito passivo É o que ocorre nos crimes de sequestro ou cárcere privado CP art 148 violação de domicílio CP art 150 e estupro CP art 213 entre outros É a modalidade de causa de exclusão da ilicitude em que o conteúdo depende de complementação a ser encontrada em outra lei em um ato administrativo ou até mesmo no enunciado de Súmula Vinculante Vejamos dois exemplos Um cidadão comum ao presenciar a prática de um roubo efetua a prisão em flagrante do ladrão imobilizandoo até a chegada da Polícia Militar Sua conduta é lícita em face da regra contida no art 301 do Código de Processo Penal Qualquer do povo poderá e as autoridades policiais e seus agentes deverão prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito Não há como se imputar a ele b o crime de constrangimento ilegal pois sua atuação encontrase acobertada pelo exercício regular de direito expressamente assegurado pelo art 301 do Código de Processo Penal e Um policial civil dirigese à casa de condenado pela Justiça para efetuar o cumprimento de mandado de prisão Lá chegando é recebido a socos e pontapés razão pela qual decide algemar o agressor Nesse caso não se pode falar na configuração do crime de abuso de autoridade uma vez que o funcionário público encontrase no estrito cumprimento de dever legal e a Súmula Vinculante 11 claramente autoriza o uso de algemas em casos de resistência Em face do que foi dito as causas de exclusão da ilicitude podem ser representadas pelo gráfico a seguir 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 QUEIROZ FILHO Antonio Lições de direito penal São Paulo RT 1966 p 157 TOLEDO Francisco de Assis Ilicitude penal e causas de sua exclusão Rio de Janeiro Forense 1984 p 11 PRADO Luiz Regis Curso de direito penal brasileiro parte geral 2 ed São Paulo RT 2000 p 242 BITENCOURT Cezar Roberto Tratado de direito penal Parte geral 11 ed São Paulo Saraiva 2007 v 1 p 296 TOLEDO Francisco de Assis Ilicitude penal e causas de sua exclusão Rio de Janeiro Forense 1984 p 14 REALE JÚNIOR Miguel Antijuridicidade concreta São Paulo José Bushatsky 1974 p 36 Confirase a propósito o teor dos arts 21 caput 22 26 caput e 28 1 todos do Código Penal STF HC 104385SP rel orig Min Marco Aurélio red p o acórdão Min Ricardo Lewandowski 1ª Turma j 28062011 noticiado no Informativo 633 CURY URZÚA Enrique Derecho penal Parte general Santiago Juridica de Chile 1982 t I p 315316 BRUNO Aníbal Direito penal Parte geral 3 ed Rio de Janeiro Forense 1967 t I p 366367 Nos crimes de competência do Tribunal do Júri a dúvida acerca da presença ou não das causas excludentes da ilicitude deve ser submetida ao Conselho de Sentença juízo natural para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida em sintonia com o mandamento veiculado pelo art 5º XXXVIII d da Constituição Federal MEZGER Edmund Tratado de derecho penal Trad espanhola José Arturo Rodrigues Muñoz Madrid Revista de Derecho Privado 1955 t I p 405 BARROS Flávio Augusto Monteiro de Op cit p 310312 apresenta outras causas supralegais 1 Princípio da adequação social ação realizada dentro do âmbito da normalidade admitida pelas regras de cultura Essa posição é isolada pois tal princípio funciona como causa de 14 15 16 17 exclusão da tipicidade 2 Princípio do balanço dos bens exclusão da ilicitude quando o sacrifício de um bem tem por fim preservar outro mais valioso Assemelhase ao estado de necessidade mas dele se diferencia por não exigir principalmente a atualidade do perigo e 3 Princípio da insignificância ou da bagatela atualmente compreendido de forma unânime como excludente da tipicidade inclusive pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal HUNGRIA Nélson Comentários ao código penal Rio de Janeiro Forense 1949 v I p 433 PIERANGELI José Henrique O consentimento do ofendido na teoria do delito 3 ed São Paulo RT 2001 p 98 PIERANGELI José Henrique O consentimento do ofendido na teoria do delito 3 ed São Paulo RT 2001 p 121 A propósito dispõe o art 38º do Código Penal Português disciplinando o consentimento 1 Além dos casos especialmente previstos na lei o consentimento exclui a ilicitude do facto quando se referir a interesses jurídicos livremente disponíveis e o facto não ofender os bons costumes 2 O consentimento pode ser expresso por qualquer meio que traduza uma vontade séria livre e esclarecida do titular do interesse juridicamente protegido e pode ser livremente revogado até à execução do facto 3 O consentimento só é eficaz se for prestado por quem tiver mais de 14 anos e possuir o discernimento necessário para avaliar o seu sentido e alcance no momento em que o presta 4 Se o consentimento não for conhecido do agente este é punível com a pena aplicável à tentativa 221 222 223 DISPOSITIVO LEGAL Em consonância com o art 24 do Código Penal Art 24 Considerase em estado de necessidade quem pratica o fato para salvar de perigo atual que não provocou por sua vontade nem podia de outro modo evitar direito próprio ou alheio cujo sacrifício nas circunstâncias não era razoável exigirse 1º Não pode alegar estado de necessidade quem tinha o dever legal de enfrentar o perigo 2º Embora seja razoável exigirse o sacrifício do direito ameaçado a pena poderá ser reduzida de 1 um a 23 dois terços CONCEITO Estado de necessidade é a causa de exclusão da ilicitude que depende de uma situação de perigo caracterizada pelo conflito de interesses lícitos ou seja uma colisão entre bens jurídicos pertencentes a pessoas diversas que se soluciona com a autorização conferida pelo ordenamento jurídico para o sacrifício de um deles para a preservação do outro NATUREZA JURÍDICA O art 23 I do Código Penal deixa claro tratarse de causa de exclusão da ilicitude Com efeito não há crime quando o agente pratica o fato típico em estado de necessidade A doutrina diverge contudo acerca da essência do estado de necessidade direito ou faculdade 224 Para Nélson Hungria cuidase de faculdade Com o conflito entre bens ou interesses que merecem igualmente a proteção jurídica é concedida a faculdade da própria ação violenta para preservar qualquer deles São suas palavras Faculdade e não propriamente direito porque a este deve corresponder necessariamente uma obrigação jus et obligatio sunt correlata e no caso nenhum dos titulares dos bens ou interesses em colisão está obrigado a suportar o sacrifício do seu A lei aqui assume uma atitude de neutralidade e declara sem crime o vencedor seja este o mais forte ou o mais feliz1 De outro lado Aníbal Bruno entende tratarse de um direito a ser exercido não contra aquele que suporta o fato necessitado mas frente ao Estado que tem o dever de reconhecer a exclusão da ilicitude e por corolário o afastamento do crime Não se pode impor como dever jurídico uma atitude de renúncia que muitas vezes precisaria tornarse heroica Seria um direito alheio às realidades da vida o que tentasse ignorar tais fatos ou deixar de prevêlos com a solução humana e justa Esta solução é a que exclui da hipótese o caráter de ilícito2 Com o devido respeito a questão deve ser encarada por outro prisma frente ao qual a doutrina é pacífica O estado de necessidade constituise em faculdade entre os titulares dos bens jurídicos em colisão uma vez que um deles não está obrigado a suportar a ação alheia e simultaneamente em direito diante do Estado que deve reconhecer os efeitos descritos em lei Mais do que um mero direito portanto consiste em direito subjetivo do réu pois o juiz não tem discricionariedade para concedêlo Presentes os requisitos legais tem o magistrado a obrigação de decretar a exclusão da ilicitude TEORIAS Sobre a natureza jurídica do estado de necessidade existem as seguintes teorias 1 Teoria unitária o estado de necessidade é causa de exclusão de ilicitude desde que o bem jurídico sacrificado seja de igual valor ou de valor inferior ao bem jurídico preservado Exige apenas a razoabilidade na conduta do agente Foi a teoria adotada pelo Código Penal como se extrai da expressão prevista no art 24 caput cujo sacrifício nas circunstâncias não era razoável exigirse Além disso o 2º do art 24 foi peremptório ao estatuir Embora seja razoável exigirse o sacrifício do direito ameaçado a pena poderá ser reduzida de um a dois terços A análise conjunta dos dispositivos autoriza um raciocínio bastante simples se o bem em perigo é igual ou superior a outro sacrificase este e restará consagrada a licitude do fato Nesse caso há razoabilidade na conduta do agente o qual para preservar interesse próprio ou de terceiro pode sacrificar interesse alheio desde que igual ou menos valioso do que o preservado CP art 24 caput Não há crime Todavia se o interesse sacrificado for superior ao preservado sendo razoável exigirse o sacrifício do direito ameaçado CP art 24 2º subsiste o crime autorizandose a diminuição da pena de um a dois terços Em síntese essa teoria admite somente o estado de necessidade justificante excludente da ilicitude quando o bem jurídico sacrificado apresenta valor igual ou inferior ao bem jurídico preservado Se contudo o bem jurídico sacrificado revestese de valor superior ao bem jurídico preservado não se caracteriza o estado de necessidade há crime admitindo se a redução da pena de um a dois terços 2 Teoria diferenciadora derivada do direito penal alemão e alicerçada no princípio da ponderação de bens e deveres diferencia o estado de necessidade justificante excludente da ilicitude do estado de necessidade exculpante excludente da culpabilidade Para essa teoria há estado de necessidade justificante no sacrifício de bem jurídico de valor igual ou inferior ao do bem jurídico preservado Por sua vez configurase o estado de necessidade exculpante nas hipóteses em que o bem jurídico sacrificado for de valor superior ao do bem jurídico protegido 225 Não se caracteriza a excludente da ilicitude e sim uma causa de exclusão da culpabilidade em face da inexigibilidade de conduta diversa É o caso da mãe que perdeu seu único filho e tem como recordação somente uma fotografia com um incêndio acidental em sua residência e impedida de lá entrar por um bombeiro matao para resgatar sua preciosa lembrança Não há exclusão da ilicitude pois um objeto em hipótese alguma pode prevalecer sobre a vida humana No caso concreto entretanto o desespero da mãe lhe retirou a possibilidade de cotejar adequadamente os bens em conflito e em relação a ela era inexigível conduta diversa No Brasil essa teoria não foi acolhida pelo Código Penal mas encontra amparo no Decretolei 10011969 Código Penal Militar em seu art 39 o que não obsta ainda a previsão castrense do estado de necessidade como excludente da ilicitude art 43 Em outras palavras o Código Penal Militar admite tanto o estado de necessidade justificante excludente da ilicitude como também o estado de necessidade exculpante excludente da culpabilidade 3 Teoria da equidade originária de Immanuel Kant prega a manutenção da ilicitude e da culpabilidade A ação realizada em estado de necessidade não é juridicamente correta mas não pode ser castigada por questões de equidade calcadas na coação psicológica que move o sujeito3 4 Teoria da escola positiva alicerçada nos pensamentos de Ferri e Florián pugna também pela manutenção da ilicitude Todavia o ato extremamente necessário e sem móvel antissocial deve permanecer impune por ausência de perigo social e de temibilidade do agente4 REQUISITOS O art 24 caput e seu 1º do Código Penal elencam requisitos cumulativos para a configuração do estado de necessidade como causa legal de exclusão da ilicitude A análise dos dispositivos revela a existência de dois momentos distintos para a verificação da excludente 1 situação de necessidade a qual depende de a perigo atual b perigo não provocado voluntariamente pelo agente c 2251 22511 ameaça a direito próprio ou alheio e d ausência do dever legal de enfrentar o perigo e 2 fato necessitado é dizer fato típico praticado pelo agente em face do perigo ao bem jurídico que tem como requisitos a inevitabilidade do perigo por outro modo e b proporcionalidade Vejamos detalhadamente cada um deles Situação de necessidade Perigo atual Perigo é a exposição do bem jurídico a uma situação de probabilidade de dano Sua origem pode vir de um fato da natureza ex uma inundação subtraindo o agente um barco para sobreviver de seres irracionais ex ataque de um cão bravio ou mesmo de uma atividade humana ex motorista que dirige em excesso de velocidade e atropela um transeunte com o objetivo de chegar rapidamente a um hospital e socorrer um enfermo que se encontra no interior do veículo Deve ser efetivo ou real a sua existência deve ter sido comprovada no caso concreto O Código Penal exige seja o perigo atual deve estar ocorrendo no momento em que o fato é praticado Sua presença é imprescindível Em relação ao perigo iminente aquele prestes a se iniciar há controvérsia Prevalece o entendimento de que equivale ao perigo atual excluindo o crime Há posições porém no sentido de que o perigo iminente não autoriza o estado de necessidade pois se fosse esta a vontade da lei o teria incluído expressamente no art 24 caput do Código Penal tal como fez em seu art 25 relativamente à legítima defesa 22512 O perigo remoto ou futuro normalmente imaginário ou seja aquele que pode ocorrer em momento ulterior ao da prática do fato típico bem como o perigo pretérito ou passado que já se verificou e encontrase superado não caracterizam o estado de necessidade Perigo não provocado voluntariamente pelo agente Foi mencionado que a situação de perigo pode se originar de uma atividade humana lícita ou não O Código Penal contudo é claro ao negar o estado de necessidade àquele que voluntariamente provocou o perigo A discussão reside na extensão da palavra voluntariamente Qual é o seu alcance Abrange apenas o perigo provocado dolosamente Ou também engloba o perigo causado pelo agente a título de culpa O panorama é tranquilo sobre o perigo dolosamente provocado não é possível invocar a causa de justificação em apreço Em relação ao perigo culposamente criado pelo agente entretanto a doutrina revela divergências Aníbal Bruno Basileu Garcia Bento de Faria Damásio E de Jesus e Heleno Cláudio Fragoso aduzem ser a palavra vontade um sinal indicativo de dolo Logo aquele que culposamente provoca uma situação de perigo pode se valer do estado de necessidade para excluir a ilicitude do fato típico praticado Na Alemanha Claus Roxin informa ser unânime o entendimento no sentido de que a provocação culposa do perigo não afasta a possibilidade de invocar o estado de necessidade5 Por outro lado E Magalhães Noronha Francisco de Assis Toledo José Frederico Marques e Nélson Hungria sustentam que a atuação culposa também é voluntária em sua origem a imprudência a negligência e a imperícia derivam da vontade do autor da conduta Consequentemente não pode suscitar o estado de necessidade a pessoa que culposamente produziu a situação perigosa É também o entendimento de Guilherme de Souza Nucci A letra da lei fala em perigo não provocado por vontade do agente não nos parecendo tenha aí o significado de dolo ou seja causar um perigo intencionalmente O sujeito que provoca um incêndio culposo criou um perigo que jamais poderá deixar de ser considerado fruto da sua vontade o contrário seria admitir que nos delitos culposos não há voluntariedade na conduta6 Essa segunda posição nos parece a mais adequada Com efeito além de a culpa também ser voluntária em sua origem involuntário é somente o resultado naturalístico o Direito não pode ser piedoso com os incautos e imprudentes autorizando o sacrifício de bens jurídicos alheios em regra de terceiros inocentes para acobertar com o manto da impunidade fatos típicos praticados por quem deu causa a uma situação de perigo Se não bastasse o Código Penal deve ser interpretado sistematicamente E nesse ponto entra em cena o art 13 2º c Art 13 O resultado de que depende a existência do crime somente é imputável a quem lhe deu causa Considerase causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido 2º A omissão é penalmente relevante quando o omitente podia e devia agir para evitar o resultado O dever de agir incumbe a quem c com seu comportamento anterior criou o risco da ocorrência do resultado A conclusão é simples se quem cria a situação de perigo dolosa ou culposamente tem o dever jurídico de impedir o resultado igual raciocínio deve ser utilizado no tocante ao estado de necessidade é dizer quem cria o perigo dolosa ou culposamente não pode invocar a causa de justificação Seria incoerente por exemplo incriminar o nadador profissional que convida um amigo iniciante no esporte a atravessar a nado um rio e durante 22513 22514 o trajeto este vem a morrer e simultaneamente reconhecer o estado de necessidade com a automática exclusão do crime àquele que culposamente incendeia uma lancha e para se salvar afoga o seu companheiro para ficar com a única boia que se encontrava na embarcação Ameaça a direito próprio ou alheio O perigo deve ser direcionado a bem jurídico pertencente ao autor do fato típico ou ainda a terceira pessoa No Brasil qualquer bem jurídico próprio ou de terceiro pode ser protegido quando enfrentar um perigo capaz de configurar o estado de necessidade extraindose essa conclusão do art 24 caput do Código Penal direito próprio ou alheio Exigese todavia a legitimidade do bem que deve ser reconhecido e protegido pelo ordenamento jurídico Exemplificativamente o preso não pode matar o carcereiro sob o pretexto de exercício do seu direito à liberdade É o que se dá também no art 34 do Código Penal alemão Ao contrário o Código Penal italiano reconhece a excludente somente quando o bem em disputa for a vida humana ou o corpo humano Para a proteção de bem jurídico de terceiro a lei não reclama a existência de uma relação de parentesco ou intimidade pois a eximente se funda na solidariedade que deve reinar entre os indivíduos em geral Destarte é possível o estado de necessidade para a defesa de bens jurídicos pertencentes a pessoas desconhecidas e inclusive de pessoas jurídicas que também são titulares de direitos Ausência do dever legal de enfrentar o perigo Nos termos do art 24 1º do Código Penal Não pode alegar estado de necessidade quem tinha o dever legal de enfrentar o perigo O fundamento da norma é evitar que pessoas que têm o dever legal de enfrentar situações perigosas se esquivem de fazêlo injustificadamente Aquele que por mandamento legal tem o dever de se submeter a situações de perigo não está autorizado a sacrificar bem jurídico de terceiro ainda que para salvar outro bem jurídico devendo suportar os riscos inerentes à sua função Exemplificativamente não pode um bombeiro para salvar um morador de uma casa em chamas destruir a residência vizinha quando possível fazêlo de forma menos lesiva ainda que mais arriscada à sua pessoa Essa regra evidentemente deve ser interpretada com bom senso não se pode exigir do titular do dever legal de enfrentar o perigo friamente atitudes heroicas ou sacrifício de direitos básicos de sua condição humana Nesse sentido a lei não tem o condão por exemplo de obrigar um bombeiro a entrar no mar em pleno tsunami para salvar um surfista que lá se encontra Há celeuma doutrinária em relação ao significado da expressão dever legal de enfrentar o perigo Para uma primeira corrente a expressão deve ser interpretada restritivamente Portanto dever legal abrange somente o dever decorrente da lei em sentido amplo lei medida provisória decreto regulamento portaria etc É o entendimento de Nélson Hungria Tratase de dever imposto pela lei O texto do Código não permite extensão ao dever resultante simplesmente de contrato Ora onde o Código fala apenas em lei não se pode ler também contrato O dever de que aqui se cogita é tão somente o que se apresenta diretamente imposto ex lege Dever legal é somente aquele que o Estado impõe normativamente em matéria de serviço de utilidade pública ou na defesa de interesse da comunhão social7 Uma segunda corrente por sua vez afirma que a expressão há de ser interpretada extensivamente compreendendo além do dever legal qualquer espécie de dever jurídico tal como o dever contratual É entre outros o entendimento de Bento de Faria Costa e Silva e Galdino Siqueira que assim se manifesta Esse dever jurídico pode também resultar de uma relação contratual como a do enfermeiro que se obriga a cuidar de um demente e que não pode para escapar do perigo de seus acessos praticar fato em prejuízo de terceiro8 2252 22521 Essa última posição nos parece mais acertada De fato não pode invocar o estado de necessidade quem tem o dever jurídico de enfrentar o perigo E uma vez mais nos socorremos do art 13 2º do Código Penal Em verdade se quem tem o dever jurídico de agir responde pelo crime quando se omite com maior razão não pode invocar estado de necessidade diante de sua inércia É o caso do salvavidas de um clube proibido de alegar a causa excludente quando sem ação assiste a uma criança morrer afogada na piscina sob a alegação de que a água estava muito gelada e podia contrair pneumonia Se não bastasse o dever resultante de contrato e outros mais como o decorrente da posição de garantidor e da situação de ingerência foram previstos expressamente no art 13 2º do Código Penal merecendo ser tratados como deveres legais Finalmente a Exposição de Motivos da Parte Geral do Código Penal de 1940 não alterada pela Reforma da Parte Geral em 1984 como se extrai do item 21 da atual Exposição preceitua A abnegação em face do perigo só é exigível quando corresponde a um especial dever jurídico Fato necessitado Preenchidos os requisitos já abordados restando configurada a situação de necessidade o agente pode praticar o fato necessitado isto é a conduta lesiva a outro bem jurídico Esse fato contudo deve obedecer a dois outros requisitos inevitabilidade do perigo por outro modo e proporcionalidade Inevitabilidade do perigo por outro modo O fato necessitado deve ser absolutamente imprescindível para evitar a lesão ao bem jurídico Se o caso concreto permitir o afastamento do perigo por qualquer outro meio commodus discessus a ser aferido de acordo com o juízo do homem médio e diverso da prática do fato típico por ele deve optar o agente Exemplo se para fugir do ataque de um boi bravio o agente pode facilmente pular uma cerca não estará autorizado a matar o animal Em suma o estado de necessidade apresenta nítido caráter subsidiário 22522 226 quando possível a fuga por ela deve optar o agente que também deve sempre proporcionar a qualquer bem jurídico o menor dano possível Proporcionalidade Também conhecido como razoabilidade referese ao cotejo de valores ou seja à relação de importância entre o bem jurídico sacrificado e o bem jurídico preservado no caso concreto Não se pode previamente estabelecer um quadro de valores salvo em casos excepcionais ex a vida humana evidentemente vale mais do que o patrimônio Deve o magistrado decidir na situação real que lhe for apresentada utilizando como vetor o juízo do homem médio Em face da teoria unitária adotada pelo art 24 do Código Penal o bem preservado no estado de necessidade deve ser de valor igual ou superior ao bem jurídico sacrificado CAUSA DE DIMINUIÇÃO DA PENA Estabelece o art 24 2º do Código Penal Embora seja razoável exigirse o sacrifício do direito ameaçado a pena poderá ser reduzida de um a dois terços Cuidase de causa de diminuição da pena que ocorre quando o agente visando proteger bem jurídico próprio ou de terceiro sacrifica outro bem jurídico de maior valor Não há exclusão do crime É mantida a tipicidade mas é possível a diminuição da pena dependendo das condições concretas em que o fato foi praticado Essa norma só se aplica nos casos de estado de necessidade exculpante desde que não tenha restado configurada uma situação de inexigibilidade de conduta diversa excludente da culpabilidade Em suma foi sacrificado um bem de maior relevância e o agente poderia ter agido de forma diversa Nada obstante considerase a sua conduta menos reprovável de forma a ser agraciado com a diminuição da pena 227 2271 a b 2272 a b 2273 a b ESPÉCIES DE ESTADO DE NECESSIDADE A divisão do estado de necessidade leva em conta diversos critérios Quanto ao bem sacrificado No que tange ao valor do bem sacrificado o estado de necessidade pode ser Justificante o bem sacrificado é de valor igual ou inferior ao preservado Exclui a ilicitude Exculpante o bem sacrificado é de valor superior ao preservado A ilicitude é mantida mas no caso concreto pode afastar a culpabilidade em face da inexigibilidade de conduta diversa9 Quanto à titularidade do bem jurídico preservado Em relação ao titular do bem jurídico preservado pela lei penal o estado de necessidade pode ser Próprio protegese bem jurídico pertencente ao autor do fato necessitado De terceiro o autor do fato necessitado tutela bem jurídico alheio Quanto à origem da situação de perigo Quanto à pessoa que suporta o fato típico o estado de necessidade pode ser Agressivo é aquele em que o agente para preservar bem jurídico próprio ou de terceira pessoa pratica o fato necessitado contra bem jurídico pertencente a terceiro inocente ou seja pessoa que não provocou a situação de perigo O autor do fato necessitado embora não seja responsável pelo perigo deve indenizar o dano suportado pelo terceiro CC art 929 reservandolhe porém ação regressiva contra o causador do perigo CC art 930 caput Defensivo é aquele em que o agente visando a proteção de bem jurídico próprio ou de terceiro pratica o fato necessitado contra 2274 a b 228 bem jurídico pertencente àquele que provocou o perigo Obviamente não há obrigação de ressarcir os danos causados como se extrai da análise a contrario sensu do art 929 do Código Civil Quanto ao aspecto subjetivo do agente Essa classificação diz respeito à ciência ao conhecimento da situação de perigo por parte do autor do fato necessitado O estado de necessidade se divide em Real a situação de perigo efetivamente existe e dela o agente tem conhecimento Exclui a ilicitude Putativo não existe a situação de necessidade mas o autor do fato típico a considera presente O agente por erro isto é falsa percepção da realidade que o cerca supõe situação de fato que se existisse tornaria sua ação legítima É mantida a ilicitude e seus efeitos variam conforme a teoria adotada no tocante às descriminantes putativas Capítulo 15 item 158 ESTADO DE NECESSIDADE RECÍPROCO É perfeitamente admissível que duas ou mais pessoas estejam simultaneamente em estado de necessidade umas contra as outras É o que se convencionou chamar de estado de necessidade recíproco hipótese em que deve ser afastada a ilicitude do fato sem a interferência do Estado que ausente permanece neutro nesse conflito A literatura é farta ao indicar acontecimentos em que fática ou hipoteticamente se concretizou essa espécie de estado de necessidade destacandose a famosa obra O caso dos exploradores de cavernas Confira se ainda o clássico exemplo de Basileu Garcia tábua de salvação Dois náufragos disputam uma tábua que só servirá a um homem É preciso que um deles pereça Apresentase mais tarde ao tribunal o sobrevivente invocando a justificativa do estado de necessidade Não será punido O Estado não teria razão para tomar partido em favor de um ou de outro indivíduo cujos interesses igualmente legítimos se acharam 229 2210 em antagonismo Estáse diante de um fato consumado e irremediável não cabendo castigar o que ofendeu o direito alheio em favor do próprio direito desde que tenham ocorrido os requisitos legais10 CASOS ESPECÍFICOS DE ESTADO DE NECESSIDADE Além da regra geral delineada pelo art 24 o Código Penal em sua Parte Especial prevê outros casos de estado de necessidade É o que se dá no art 128 I permitindo o aborto necessário ou terapêutico praticado por médico quando não há outro meio para salvar a vida da gestante De igual modo o art 146 3º preceitua em seus incisos não configurar constrangimento ilegal a intervenção médica ou cirúrgica sem o consentimento do paciente ou de seu representante legal se justificada por iminente perigo de vida bem como a coação exercida para impedir suicídio Em relação ao crime de violação de domicílio é possível o estado de necessidade quando algum crime em seu interior está sendo praticado ou na iminência de o ser e também na hipótese de desastre ou para socorrer alguém CP art 150 3º II e CF art 5º XI Apontase ainda o estado de necessidade implicitamente nos crimes de violação de correspondência divulgação de segredo e violação de segredo profissional CP arts 151 153 e 154 nas situações em que alguém pratica o fato típico para proteger direito próprio ou alheio Exemplo A réu em ação penal abre uma carta endereçada a B cujo conteúdo prova sua inocência no tocante ao crime contra si imputado COMUNICABILIDADE DO ESTADO DE NECESSIDADE O estado de necessidade justificante exclui a ilicitude do fato típico afastando consequentemente a infração penal E desaparecendo o crime ou a contravenção penal em relação a algum 2211 2212 2213 dos envolvidos o estado de necessidade se comunica a todos os coautores e partícipes da infração penal pois no tocante a eles o fato também será lícito ESTADO DE NECESSIDADE E CRIMES PERMANENTES E HABITUAIS Em regra não se aplica a justificativa no campo dos crimes permanentes e habituais uma vez que no fato que os integra não há os requisitos da atualidade do perigo e da inevitabilidade do fato necessitado A jurisprudência já reconheceu o estado de necessidade contudo no crime habitual de exercício ilegal de arte dentária CP art 282 em caso atinente à zona rural longínqua e carente de profissional habilitado11 ESTADO DE NECESSIDADE E ERRO NA EXECUÇÃO O estado de necessidade é compatível com a aberratio ictus CP art 73 na qual o agente por acidente ou erro no uso dos meios de execução atinge pessoa ou objeto diverso do desejado com o propósito de afastar a situação de perigo a bem jurídico próprio ou de terceiro Exemplificativamente configurase o estado de necessidade no caso em que alguém no momento em que vai ser atacado por um cão bravio efetua disparos de arma de fogo contra o animal e por erro na execução atinge pessoa que passava nas proximidades do local ferindoa Não poderá ser responsabilizado pelas lesões corporais produzidas em face da exclusão da ilicitude ESTADO DE NECESSIDADE E DIFICULDADES ECONÔMICAS Deve ser diferenciado o estado de necessidade como causa de exclusão da ilicitude da dificuldade econômica relacionada à debilidade da capacidade aquisitiva No estado de necessidade o agente é compelido a praticar o fato típico para afastar a situação de perigo atual ou iminente involuntário e inevitável capaz de afetar bem jurídico próprio ou de terceiro cujo sacrifício é inexigível Por sua vez na dificuldade econômica supõese ou que o indivíduo deva conformarse com a privação porque não se cuida do suprimento de necessidade vital ou primária ou ainda que disso se trate que lhe seja possível satisfazer a carência por meio de atividade lícita Em uma ou outra hipótese não se justifica a lesão ao interesse de outrem Destarte a dificuldade econômica inclusive com a miserabilidade do agente não constitui estado de necessidade Em casos excepcionais admitese a prática de um fato típico como medida inevitável ou seja para satisfação de necessidade estritamente vital que a pessoa nada obstante seu empenho não conseguiu superar de forma lícita a exemplo do furto famélico12 em que o agente subtrai alimentos básicos para saciar sua fome ou de pessoa a ele ligada por laços de parentesco ou de amizade Mas repitase se o sujeito podia laborar honestamente ou então quando se apodera de bens supérfluos ou em quantidade exagerada afastase a justificativa 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 HUNGRIA Nélson Comentários ao código penal Rio de Janeiro Forense 1949 v I p 436 BRUNO Aníbal Direito penal Parte geral 3 ed Rio de Janeiro Forense 1967 t I p 380 GARCIA SOTO Maria Paulina El estado de necesidad en materia penal Santiago Jurídica Conosur 1999 p 76 GARCIA SOTO Maria Paulina Op cit p 77 ROXIN Claus Derecho penal Parte general Fundamentos La estructura de la teoría del delito Trad espanhola DiegoManuel Luzón Peña Miguel Díaz y García Conlledo e Javier de Vicente Remensal Madrid Civitas 2006 t I p 698 NUCCI Guilherme de Souza Código penal comentado 6 ed São Paulo RT 2006 p 237238 HUNGRIA Nélson Comentários ao código penal Rio de Janeiro Forense 1949 v I p 442 SIQUEIRA Galdino Tratado de direito penal Parte geral Rio de Janeiro José Konfino 1947 t I p 358 O estado de necessidade exculpante é compatível apenas com a teoria diferenciadora que não foi adotada pelo Código Penal mas encontra amparo no art 39 do Código Penal Militar GARCIA Basileu Instituições de direito penal 4 ed 37 tir São Paulo Max Limonad 1975 t I v I JESUS Damásio E de Código Penal anotado 15 ed São Paulo Saraiva 2004 p 112 STJ HC 267447MG rel Min Jorge Mussi 5ª Turma j 25062013 O instituto da legítima defesa é inerente à condição humana Acompanha o homem desde o seu nascimento subsistindo durante toda a sua vida por lhe ser natural o comportamento de defesa quando injustamente agredido por outra pessoa Como argumenta Galdino Siqueira Tão visceralmente ligada à pessoa se manifesta a defesa isto é a faculdade de repelir pela força o ataque no momento em que se produz que CÍCERO na sua oração Pro Milone a reputa como um direito natural derivado da necessidade non scripta sed nata lex proposição verdadeira se considerarmos o substratum fisiológico e psicológico da defesa como reação do instinto de conservação que brota e se desenvolve independente de qualquer regulamentação1 Em razão da sua compreensão como direito natural a legítima defesa sempre foi aceita por praticamente todos os sistemas jurídicos ainda que muitas vezes não prevista expressamente em lei constituindose dentre todas na causa de exclusão da ilicitude mais remota ao longo da história das civilizações De fato o Estado avocou para si a função jurisdicional proibindo as pessoas de exercerem a autotutela impedindoas de fazerem justiça pelas próprias mãos Seus agentes não podem contudo estar presentes simultaneamente em todos os lugares razão pela qual o Estado autoriza os indivíduos a defenderem direitos em sua ausência pois não seria correto deles exigir a instantânea submissão a um ato injusto para somente depois buscar a reparação do dano perante o Poder Judiciário Nos termos do art 25 do Código Penal Entendese em legítima defesa quem usando moderadamente dos meios necessários repele injusta agressão atual ou iminente a direito seu ou de outrem Como se extrai do art 23 II do Código Penal a legítima defesa é causa de exclusão da ilicitude Destarte o fato típico praticado em legítima defesa é lícito Não configura crime O conceito decorre do art 25 do Código Penal tratase da causa de justificação consistente em repelir injusta agressão atual ou iminente a direito próprio ou alheio usando moderadamente dos meios necessários A análise do art 25 do Código Penal revela a dependência da legítima defesa aos seguintes requisitos cumulativos 1 agressão injusta 2 atual ou iminente 3 contra direito próprio ou alheio 4 reação com os meios necessários e 5 uso moderado dos meios necessários Esses requisitos podem ser divididos em dois blocos Agressão é toda ação ou omissão humana consciente e voluntária que lesa ou expõe a perigo de lesão um bem ou interesse consagrado pelo ordenamento jurídico Tratase de atividade exclusiva do ser humano Não pode ser efetuada por um animal ou por uma coisa por faltarlhes a consciência e a voluntariedade ínsitas ao ato de agredir Portanto animais que atacam e coisas que oferecem riscos às pessoas podem ser sacrificados ou danificados com fundamento no estado de necessidade e não na legítima defesa reservada a agressões emanadas do homem Nada impede entretanto a utilização de animais como instrumentos do crime como nos casos em que são ordenados por alguém ao ataque de determinada pessoa Funcionam como verdadeiras armas autorizando a legítima defesa Exemplo A determina ao seu cão bravio o ataque contra B Esse último poderá matar o animal acobertado pela legítima defesa A agressão pode emanar de um inimputável O inimputável pratica conduta consciente e voluntária apta a configurar a agressão O fato previsto em uma lei incriminadora por ele cometido é típico e ilícito Faltalhe apenas a culpabilidade A agressão é tomada em sentido meramente objetivo não guardando vínculo nenhum com o subjetivismo da culpabilidade É pacífico na doutrina entretanto que a condição de inimputável do agressor se conhecida do agredido impõe a este maior diligência no evitar e maior moderação no repelir o ataque Assim não haveria desonra na fuga e a esta se possível e capaz de afastar a agressão deve recorrer o agredido2 Há posições em sentido contrário É o caso de Nélson Hungria que equiparava os inimputáveis aos seres irracionais A defesa contra o ataque deles originado consequentemente não caracterizava legítima defesa mas estado de necessidade Em regra a agressão é praticada por meio de uma ação mas nada impede a sua veiculação por omissão quando esta se apresenta idônea a causar danos e o omitente tinha no caso concreto o dever jurídico de agir Mezger fornece o exemplo do carcereiro que tem o dever de liberar o recluso cuja pena já foi integralmente cumprida Com a sua omissão ilícita inevitavelmente agride um bem jurídico do preso autorizando a reação em legítima defesa3 Além disso a agressão deve ser injusta Agressão injusta é a de natureza ilícita isto é contrária ao Direito Pode ser dolosa ou culposa É obtida com uma análise objetiva consistindo na mera contradição com o ordenamento jurídico Não se exige para ser injusta que a agressão seja prevista como infração penal Basta que o agredido não esteja obrigado a suportála Exemplo pode agir em legítima defesa o proprietário do bem atingido por um furto de uso A agressão injusta deve ser atual ou iminente Ao contrário do estado de necessidade em que o legislador previu expressamente somente o perigo atual na legítima defesa admitese seja a agressão atual ou iminente Não pode o homem de bem ser obrigado a ceder ao injusto Seria equivocado exigir fosse ele agredido efetivamente para somente depois defenderse Exemplificativamente não está ele obrigado a ser atingido por um disparo de arma de fogo para após defenderse matando o seu agressor Ao contrário com a iminência da agressão é permitida a reação imediata contra o agressor desde que presente o justo receio quanto ao ataque a ser contra ele perpetrado Atual é a agressão presente isto é já se iniciou e ainda não se encerrou a lesão ao bem jurídico Exemplo a vítima é atacada com golpes de faca Iminente é a agressão prestes a acontecer ou seja aquela que se torna atual em um futuro imediato Exemplo o agressor anuncia à vítima a intenção de matála vindo à sua direção com uma faca em uma das mãos A agressão futura ou remota e a agressão passada ou pretérita não abrem espaço para a legítima defesa O medo e a vingança não autorizam a reação mas apenas a necessidade de defesa urgente e efetiva do interesse ameaçado Com efeito admitirse a legítima defesa contra agressão futura seria um verdadeiro convite para o duelo desestimulando a pessoa de recorrer à autoridade pública para a tutela de seus direitos E a agressão pretérita caracterizaria nítida vingança A agressão injusta atual ou iminente deve ameaçar bem jurídico próprio ou de terceiro Qualquer bem jurídico pode ser protegido pela legítima defesa pertencente àquele que se defende ou a terceira pessoa Em compasso com o auxílio mútuo que deve reinar entre os indivíduos o Código Penal admite expressamente a legítima defesa de bens jurídicos alheios com amparo no princípio da solidariedade humana E na legítima defesa de terceiro a reação pode atingir inclusive o titular do bem jurídico protegido O terceiro funciona como agredido e defendido simultaneamente Exemplo A percebendo que B se droga compulsivamente e não aceita conselhos para parar decide agredilo para que desmaie e assim deixe de ingerir mais cocaína que o levaria à morte Não mais existem as limitações antigas que autorizavam a legítima defesa apenas em relação à vida ou ao corpo Vige atualmente a mais larga amplitude de defesa dos bens jurídicos pois o Direito não pode distinguilos em mais ou menos valiosos amparando os primeiros e relegando os últimos ao abandono Em suma é todo o patrimônio jurídico do indivíduo que se deve ter por inviolável e no qual ninguém poderá penetrar pela força sem o risco de se ver repelido com a força necessária4 É possível o emprego da excludente para a tutela de bens pertencentes às pessoas jurídicas inclusive do Estado pois atuam por meio de seus representantes e não podem defenderse sozinhas Vejase o exemplo da pessoa que percebendo uma empresa ser furtada luta com o ladrão e o imobiliza até a chegada da força policial Admitese também a legítima defesa do feto Deveras o art 2º do Código Civil resguarda os direitos do nascituro que podem ser defendidos por terceiros É o caso do agente que percebendo estar a gestante na iminência de praticar um autoaborto a impede internandoa posteriormente em um hospital para que o parto transcorra normalmente Embora com alguma controvérsia podese ainda falar em legítima defesa do cadáver Nada obstante não seja titular de direitos a utilização da causa justificativa encontra amparo no reconhecimento que o Estado lhe confere em respeito à sociedade e aos seus familiares criando inclusive crimes destinados a esse desiderato como se dá com a destruição subtração ou ocultação e também com o vilipêndio a cadáver CP arts 211 e 2125 Meios necessários são aqueles que o agente tem à sua disposição para repelir a agressão injusta atual ou iminente a direito seu ou de outrem no momento em que é praticada A legítima defesa não é desforço desnecessário mas medida que se destina à proteção de bens jurídicos Não tem por fim punir razão pela qual deve ser concretizada da forma menos lesiva possível O calor do momento da agressão todavia impede sejam calculados os meios necessários de forma rígida e matemática Seu cabimento deve ser analisado de modo flexível e não em doses milimétricas A escolha dos meios deve obedecer aos reclamos da situação concreta de perigo não se podendo exigir uma proporção mecânica entre os bens em conflito6 O meio necessário desde que seja o único disponível ao agente para repelir a agressão pode ser desproporcional em relação a ela se empregado moderadamente Imaginese um agente que ao ser atacado com uma barra de ferro por um desconhecido utiliza uma arma de fogo meio de defesa que estava ao seu alcance Estará caracterizada a excludente Acerca desse tema curial a leitura de Bento de Faria O homem que é subitamente agredido não pode na perturbação e na impetuosidade da sua defesa proceder a operação de medir a sangue frio e com exatidão se há algum outro recurso para o qual possa apelar que não o de infligir um mal ao seu agressor se há algum meio menos violento a empregar na defesa se o mal que inflige excede ou não o que seria necessário à mesma defesa É preciso considerar os fatos como eles ordinariamente se apresentam e reconhecer as fraquezas inerentes à natureza humana não se exigindo dela o que ela não pode dar reconhecer mesmo as exigências sociais que podem justificar o emprego de certos meios de defesa suposto não seja absoluta a necessidade desse emprego7 Se o meio empregado for desnecessário estará configurado o excesso doloso culposo ou exculpante sem dolo ou culpa dependendo das condições em que ocorrer Ao contrário do que ocorre no estado de necessidade a possibilidade de fuga ou o socorro pela autoridade pública não impedem a legítima defesa Não se impõe o commodus discessus isto é o agredido não está obrigado a procurar a saída mais cômoda e menos lesiva para escapar do ataque injusto O Direito não pode se curvar a uma situação ilícita Ademais lhe é vedado obrigar que alguém seja pusilânime ou covarde fugindo de um ataque injusto quando pode legitimamente se defender Há situações entretanto em que a fuga do local se mostra a medida mais coerente não acarretando vergonha ou humilhação Exemplo o agente agredido injustamente por sua mãe que deseja ferilo em um acesso inesperado de fúria provocado por fatores até então ignorados age corretamente ao fugir quando em tese poderia até mesmo lesionála para fazer cessar o ataque8 Caracterizase pelo emprego dos meios necessários na medida suficiente para afastar a agressão injusta Utilizase o perfil do homem médio ou seja para aferir a moderação dos meios necessários o magistrado compara o comportamento do agredido com aquele que em situação semelhante seria adotado por um ser humano de inteligência e prudência comuns à maioria da sociedade Essa análise não é rígida baseada em critérios matemáticos ou científicos Comporta ponderação a ser aferida no caso concreto levando em conta a natureza e a gravidade da agressão a relevância do bem ameaçado o perfil de cada um dos envolvidos e as características dos meios empreendidos para a defesa O art 25 do Código Penal não a exige expressamente mas firmaramse doutrina e jurisprudência no sentido de que assim como no estado de necessidade a legítima defesa reclama também proporcionalidade entre os bens jurídicos em conflito9 O bem jurídico preservado deve ser de valor igual ou superior ao sacrificado sob pena de configuração do excesso Exemplo não pode invocar legítima defesa aquele que mata uma pessoa pelo simples fato de ter sido por ela ofendido verbalmente Nada obstante o caráter objetivo da legítima defesa exigese a existência naquele que reage da vontade de defenderse Seu ato deve ser uma resposta à agressão de outrem e esse caráter de reação precisa estar presente nos dois momentos de sua atuação o objetivo e o subjetivo Entretanto não exclui a legítima defesa a circunstância de o agente unir ao fim de defenderse uma finalidade diversa tal como a vingança desde que objetivamente não exceda os requisitos da necessidade uso dos meios necessários e da moderação emprego moderado de tais meios Exemplo A com o desejo antigo de matar B em razão de brigas pretéritas aproveitase do ataque injustificado de seu desafeto para eliminar a sua vida Não há legítima defesa no desafio no duelo no convite para a luta Os contendores respondem pelos crimes praticados A divisão da legítima defesa tem como parâmetros a forma de reação a a b a b titularidade do bem jurídico protegido e o aspecto subjetivo daquele que se defende Adotandose como parâmetro a forma de reação a legítima defesa pode ser a Agressiva ou ativa é aquela em que a reação contra a agressão injusta configura um fato previsto em lei como infração penal Exemplo provocar lesões corporais no agressor b Defensiva ou passiva é a legítima defesa na qual aquele que reage limitase a impedir os atos agressivos sem praticar um fato típico Exemplo segurar os braços do agressor para que ele não desfira socos Na hipótese em que o parâmetro for a titularidade do bem jurídico protegido a legítima defesa pode ser própria e de terceiro Própria é aquela em que o agente defende bens jurídicos de sua titularidade De terceiro é aquela em que o agente protege bens jurídicos alheios No que tange ao aspecto subjetivo daquele que se defende a legítima defesa pode ser Real é a espécie de legítima defesa em que se encontram todos os requisitos previstos no art 25 do Código Penal Exclui a ilicitude do fato CP art 23 II Putativa ou imaginária é aquela em que o agente por erro acredita existir uma agressão injusta atual ou iminente a direito seu ou de outrem Exemplo A foi jurado de morte por B Em determinada noite em uma rua escura encontramse B coloca a c mão no bolso e A acreditando que ele iria pegar uma arma matao Descobrese posteriormente que B tinha a intenção de oferecerlhe um charuto para selar a paz O fato típico praticado permanece revestido de ilicitude e seus efeitos variam em conformidade com a teoria adotada no tocante às descriminantes putativas Capítulo 15 item 158 Subjetiva ou excessiva é aquela em que o agente por erro de tipo escusável excede os limites da legítima defesa É também denominada de excesso acidental Exemplo A de porte físico avantajado parte para cima de B para agredilo Este entretanto consegue acertar um golpe violento fazendo seu inimigo desmaiar Não percebe contudo que A estava inconsciente e com medo de ser agredido continua a desferir socos desnecessários Não responde pelo excesso em face de sua natureza acidental Embora diminuída ainda subsiste polêmica acerca da admissibilidade da legítima defesa da honra A honra direito fundamental do homem é inviolável por expressa disposição constitucional art 5º X E como o art 25 do Código Penal não faz distinção entre os bens jurídicos também pode ser alcançada pela legítima defesa Mas a honra não pode ser isoladamente considerada Deve ser analisada em determinado contexto pois pode ser dividida em três aspectos distintos respeito pessoal liberdade sexual e infidelidade conjugal O respeito pessoal que engloba a dignidade e o decoro é ofendido pelos crimes contra a honra calúnia difamação e injúria Para a sua tutela admite se o emprego de força física necessária e moderada visando impedir a reiteração das ofensas E a propósito no campo da injúria a retorsão imediata que consiste em outra injúria é passível de perdão judicial CP art 140 1º No âmbito da liberdade sexual livre disposição do corpo para fins sexuais também se autoriza a legítima defesa É o caso da pessoa que pode ferir ou até mesmo matar quem tenta lhe estuprar Há finalmente a infidelidade conjugal Aí reside a maior celeuma relativa à legítima defesa da honra na órbita do adultério No passado admitiase a exclusão da culpabilidade para os crimes passionais motivados pelo adultério Atualmente depois de muita discussão e notadamente com a evolução da sociedade e com o respeito aos direitos da mulher prevalece o entendimento de que a traição conjugal não humilha o cônjuge traído mas sim o próprio traidor que não se mostra preparado para o convívio familiar Além disso respeitase o caráter fragmentário e a subsidiariedade do Direito Penal que não deve ser chamado para resolver o impasse pois o ordenamento jurídico prevê outras formas menos gravosas para essa finalidade Com efeito admitese a separação e também o divórcio litigioso fundados na violação dos deveres do matrimônio E ainda no campo civil temse aceitado até mesmo a indenização por danos morais ao cônjuge prejudicado pela traição Essa posição se reforça com a descriminação do crime de adultério revogado pela Lei 111062005 Deveras se não se admite sequer a responsabilidade penal de quem trai o seu cônjuge com maior razão inferese que o Direito Penal não autoriza a legítima defesa da honra principalmente com o derramamento de sangue do traidor A tipicidade funciona como indício da ilicitude Portanto todo fato típico presumese ilícito Invertese o ônus da prova quem alega qualquer excludente da ilicitude aí se inserindo a legítima defesa deve provar a sua ocorrência Por esse motivo não se admite a legítima defesa presumida No Êxodo XXII 23 constava Se um ladrão for encontrado forçando a porta ou escavando a parede da casa e sendo ferido morrer aquele que o feriu não será réu de morte Se porém fez isto depois de ter nascido o sol cometeu um homicídio e ele mesmo morrerá No direito romano falavase expressamente em legítima defesa presumida Como lembra Jorge Alberto Romeiro A noite autorizava ainda para os romanos a presunção de legítima defesa em favor daquele que matasse um ladrão quando surpreendido furtando pelo justo receio do ataque10 Constituise na espécie de legítima defesa em que alguém reage contra o excesso de legítima defesa Exemplo A profere palavras de baixo calão contra B o qual para calálo desferelhe um soco Em seguida com A já em silêncio B continua a agredilo fisicamente autorizando o emprego de força física pelo primeiro para defenderse É possível essa legítima defesa pois o excesso sempre representa uma agressão injusta Prevalece o entendimento pela sua admissibilidade pois o instituto da legítima defesa reclama tão somente uma agressão injusta atual ou iminente a direito próprio ou alheio emanada de seres humanos pouco importando sejam eles individualizados ou não11 Em sentido contrário a opinião de Vincenzo La Medica para quem o comportamento de defesa contra a multidão configura estado de necessidade12 É possível a legítima defesa contra pessoa jurídica uma vez que esta exterioriza a sua vontade por meio da conduta de seres humanos permitindo a prática de agressões injustas13 Exemplo o funcionário de uma empresa escuta pelo sistema de som ofensas à sua honra Para impedir a reiteração da conduta pode destruir o altofalante que transmite as palavras inadequadas Duas situações distintas podem ser visualizadas 1 agressões dos pais contra os filhos e 2 agressões entre os cônjuges Na relação entre pais e filhos os castigos moderados inseremse no campo do exercício regular de direito impedindo a intervenção de terceiras pessoas Se entretanto os castigos forem imoderados e excessivos caracterizam agressão injusta autorizando a legítima defesa pelo descendente por outro familiar ou mesmo por pessoa estranha14 No tocante às relações entre os cônjuges não tem qualquer deles mando ou hierarquia sobre o outro em face da regra contida no art 226 5º da Constituição Federal Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher Nesses termos se o marido agredir injustamente a mulher ou viceversa será cabível a legítima defesa por qualquer deles ou mesmo por outro familiar ou terceira pessoa15 Se repelindo uma agressão injusta atual ou iminente a direito seu ou de outrem o agente atinge pessoa inocente por erro no emprego dos meios de execução subsiste em seu favor a legítima defesa Exemplo A se defende de tiros de B revidando disparos de arma de fogo em sua direção Acerta todavia C que nada tinha a ver com o incidente matandoo Incidirá ainda a justificativa se o agente atingir a pessoa almejada e também pessoa inocente No exemplo acima A mataria B e C De fato o art 73 do Código Penal é peremptório ao estabelecer que o crime considerase praticado contra a pessoa visada permitindo a conclusão de que essa regra aplicase inclusive para efeito de exclusão da ilicitude A questão que se coloca é para o exercício da legítima defesa de terceiro é necessário o seu consentimento para ser protegido de uma agressão injusta A resposta pode ser negativa ou positiva dependendo da natureza do bem jurídico atacado Em se tratando de bem jurídico indisponível será prescindível o consentimento do ofendido Exemplo um homem agride cruelmente sua esposa com o propósito de matála Aquele que presenciar o ataque poderá sem a anuência da mulher protegêla ainda que para isso tenha que lesionar ou mesmo eliminar a vida do covarde marido Diversa será a conclusão quando tratarse de bem jurídico disponível Nessa hipótese impõese o consentimento do ofendido se for possível a sua obtenção Exemplo um homem ofende com impropérios a honra de sua mulher Por mais inconformado que um terceiro possa ficar com a situação não poderá protegêla sem o seu assentimento Não se olvide porém que mesmo no caso de bem jurídico disponível estará caracterizada a legítima defesa putativa quando o terceiro atuar sem o consentimento do ofendido Estado de necessidade e legítima defesa são causas legais de exclusão da ilicitude CP art 23 I e II Além disso ambos têm em comum o perigo a um bem jurídico próprio ou de terceiro Mas diferenciamse claramente Na legítima defesa o perigo provém de uma agressão ilícita do homem e a reação se dirige contra seu autor Por outro lado no estado de necessidade agressivo o perigo é originário da natureza de seres irracionais ou mesmo de um ser humano mas para dele se safar o agente sacrifica bem jurídico pertencente a quem não provocou a situação de perigo Exemplo A para salvarse de uma enchente subtrai o barco de B No estado de necessidade defensivo o agente sacrifica bem jurídico de titularidade de quem causou a situação de perigo Exemplo A mata um touro bravio de seu vizinho que não consertou a cerca da fazenda e por esse motivo estava o animal pronto a atacar crianças que nadavam em um pequeno riacho A reação dirigese contra a coisa da qual resulta o perigo e não contra a pessoa que provocou a situação perigosa Em alguns casos contudo a situação de perigo ao bem jurídico é provocada por uma agressão lícita do ser humano que atua em estado de necessidade Como o ataque é lícito eventual reação caracterizará estado de necessidade e não legítima defesa Exemplo A e B estão perdidos no deserto e a água que carregam somente saciará a sede de um deles A em estado de necessidade furta a água de B o qual para salvarse mata em estado de necessidade seu companheiro É possível que uma mesma pessoa atue simultaneamente acobertada pela legítima defesa e pelo estado de necessidade quando para repelir uma agressão injusta praticar um fato típico visando afastar uma situação de perigo contra bem jurídico próprio ou alheio Exemplo A para defenderse de B que injustamente desejava matálo subtrai uma arma de fogo pertencente a C estado de necessidade utilizandoa para matar o seu agressor legítima defesa Os requisitos previstos no art 25 do Código Penal revelam a admissibilidade da legítima defesa nos seguintes casos a Legítima defesa real contra legítima defesa putativa A legítima defesa real pressupõe uma agressão injusta E essa agressão injusta estará presente na legítima defesa putativa pois aquele que assim atua atacando terceira pessoa o faz de maneira ilícita permitindo a reação defensiva Exemplo A caminha em área perigosa De repente visualiza B colocando a mão no interior de sua blusa e acreditando que seria assaltado A saca uma arma de fogo para matar B Este último entretanto que iria apenas pegar um cigarro consegue se esquivar dos tiros e em seguida mata A para se defender A legítima defesa real é o revide contra agressão efetivamente injusta enquanto a legítima defesa putativa é a reação imaginária erroneamente suposta pois existe apenas na mente de quem a realiza No exemplo mencionado A agiu em legítima defesa putativa ensejando a legítima defesa real por parte de B Esse raciocínio é também aplicável a todas as demais excludentes da ilicitude putativas estado de necessidade exercício regular de direito e estrito cumprimento de dever legal b Legítima defesa putativa recíproca legítima defesa putativa contra legítima defesa putativa Ocorre na hipótese em que dois ou mais agentes acreditam erroneamente que um irá praticar contra o outro uma agressão injusta quando na verdade o ataque ilícito não existe Exemplo A e B velhos desafetos encontramse em local ermo Ambos colocam as mãos nos bolsos ao mesmo tempo e em razão disso partem um para cima do outro lutando até o momento em que desmaiam Posteriormente apurase que A iria oferecer a B um cigarro enquanto este que havia perdido a fala em um acidente entregaria àquele um pedido escrito de desculpas pelos desentendimentos pretéritos c Legítima defesa real contra legítima defesa subjetiva Legítima defesa subjetiva ou excessiva é aquela em que o indivíduo por erro escusável ultrapassa os limites da legítima defesa Daí ser também chamada de excesso acidental No momento em que se configura o excesso a outra pessoa que de agressor passou a ser agredido pode agir em legítima defesa real uma vez que foi praticada contra ele uma agressão injusta Veja o exemplo A de porte físico avantajado parte para cima de B para agredi lo Este entretanto consegue acertar um golpe violento fazendo seu inimigo desistir da contenda B não nota todavia que A já estava imóvel e continua a atacálo desnecessariamente A partir daí essa agressão se torna injusta e A poderá agir em legítima defesa real contra o excesso de B d Legítima defesa real contra legítima defesa culposa Tal situação é possível pois para a legítima defesa importa somente o caráter injusto da agressão objetivamente considerado independente do elemento subjetivo do agente Exemplo A sem adotar maior cautela confunde B com uma pessoa que havia prometido matálo tão logo o encontrasse e passa a efetuar disparos de arma de fogo para atingilo B poderá contra essa agressão injusta culposamente perpetrada agir acobertado pela legítima defesa real e Legítima defesa contra conduta amparada por causa de exclusão da culpabilidade Será sempre cabível a legítima defesa contra uma agressão que embora injusta esteja acobertada por qualquer causa de exclusão da culpabilidade Exemplo A chega ao Brasil vindo de um país em que não há proteção sobre a propriedade de bens móveis Não possui pois conhecimento acerca do caráter ilícito da conduta de furtar erro de proibição Dirigese à residência de B para subtrair diversos de seus pertences Assim agindo autoriza B a repelir a agressão injusta em legítima defesa do seu patrimônio a Legítima defesa real recíproca legítima defesa real contra legítima defesa real Não é cabível pois o pressuposto da legítima defesa é a existência de uma agressão injusta E se a agressão de um dos envolvidos é injusta automaticamente a reação do outro será justa pois constituirá uma simples atitude de defesa Consequentemente apenas este último estará protegido pela causa de exclusão da ilicitude b Legítima defesa real contra outra excludente real Por idênticos motivos aos ligados à não aceitação da legítima defesa real recíproca é inadmissível a relação da legítima defesa real com o estado de necessidade real com o exercício regular de direito real e finalmente com o estrito cumprimento de dever legal real O fundamento vale ressaltar é simples se a outra excludente é real não haverá a agressão injusta da qual depende a legítima defesa real Desobediência civil é a resistência do cidadão à atividade estatal em razão de reputála abusiva e contrária ao interesse público16 No campo penal consiste na prática de um fato típico contra bem jurídico pertencente ao Poder Público como no exemplo daquele que destrói uma porta para transitar em prédio municipal fechado em razão de greve no setor público Nos ensinamentos de Günther Jakobs Se o sacrifício do bem consiste em lesão de um bem jurídico penalmente típica que se executa como protesto contra determinado comportamento estatal reconhecendo sem embargo a legitimidade deste Estado e do Direito que se vulnera este modo de proceder se denomina desobediência civil quando a infração do Direito não deixa de ser moderada e somente afeta a bens de natureza pública17 Em nossa opinião a desobediência civil não importa na configuração da legítima defesa De fato a todos é assegurado o direito de não se conformar com as posturas estatais mas de forma pacífica e ordenada A lesão a bens jurídicos mediante a prática de condutas penalmente típicas não pode ser tolerada sob pena de acarretar em anarquia e desordem pública 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 SIQUEIRA Galdino Tratado de direito penal Parte geral Rio de Janeiro José Konfino 1947 t I p 314 BRUNO Aníbal Direito penal Parte geral 3 ed Rio de Janeiro Forense 1967 t I p 362 MEZGER Edmund Tratado de derecho penal Trad espanhola José Arturo Rodrigues Muñoz Madrid Revista de Derecho Privado 1955 t I p 453 BRUNO Aníbal Direito penal Parte geral 3 ed Rio de Janeiro Forense 1967 t I p 365 É a posição de MANZINI Vicenzo Trattato di diritto penale italiano 5 ed Torino Torinese 1981 v II p 388 Nesse sentido LINHARES Marcello Jardim Legítima defesa 4 ed São Paulo Saraiva 1994 p 344 FARIA Bento Código penal brasileiro comentado Rio de Janeiro Distribuidora Record 1961 v II p 192 É também o entendimento de GARCIA Basileu Instituições de direito penal 4 ed 37ª tiragem São Paulo Max Limonad 1975 t I v I p 306 STJ RE 1459909MS rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 14082014 ROMEIRO Jorge Alberto A noite no direito e no processo penal Estudos de direito e processo penal em homenagem a Nélson Hungria Rio de Janeiro Forense 1962 p 183 LINHARES Marcello Jardim Legítima defesa 4 ed São Paulo Saraiva 1994 p 166 LA MEDICA Vincenzo O direito de defesa Trad Fernando de Miranda São Paulo Saraiva 1942 p 4849 MARSICO Alfredo de Diritto penale Parte generale Napoli Jovene 1937 p 105 A Lei 130102014 também conhecida como lei da palmada ou lei menino Bernardo modificou a Lei 80691990 Estatuto da Criança e do Adolescente com a finalidade de proibir expressamente qualquer tipo de 15 16 17 castigo físico ou tratamento cruel ou degradante como forma de correção Assim também LA MEDICA Vincenzo O direito de defesa Trad Fernando de Miranda São Paulo Saraiva 1942 p 116119 Para um estudo aprofundado do assunto GARCIA Maria Desobediência civil direito fundamental 2 ed São Paulo Editora Revista dos Tribunais 2004 JAKOBS Günther Derecho penal Parte general Fundamentos y teoría de la imputación 2 ed Trad espanhola Joaquin Cuello Contreras e Jose Luis Serrano Gonzales de Murillo Madrid Marcial Pons 1997 241 242 243 244 DISPOSITIVO LEGAL Dispõe o art 23 III 1ª parte do Código Penal Não há crime quando o agente pratica o fato em estrito cumprimento de dever legal NATUREZA JURÍDICA Cuidase de causa de exclusão da ilicitude o que se extrai tanto pela rubrica marginal do art 23 do Código Penal exclusão de ilicitude como também pela redação do dispositivo legal não há crime CONCEITO Ao contrário do que fez em relação ao estado de necessidade e à legítima defesa o Código Penal não apresentou o conceito de estrito cumprimento de dever legal nem seus elementos característicos Podese definilo contudo como a causa de exclusão da ilicitude que consiste na prática de um fato típico em razão de cumprir o agente uma obrigação imposta por lei de natureza penal ou não FUNDAMENTO Seria despropositado a lei impor a determinadas pessoas a prática de um ato e ao mesmo tempo sujeitála em face de seu cumprimento a uma sanção penal em razão de consistir o seu mandamento em um fato descrito em lei como crime ou contravenção penal Se no Brasil por exemplo fosse rotineira 245 a aplicação da pena de morte não poderia ser o executor responsabilizado pelos homicídios eventualmente praticados Com efeito na eximente em apreço a lei não determina apenas a faculdade a escolha do agente em obedecer ou não a regra por ela estabelecida Há em verdade o dever legal de agir É o caso por exemplo do cumprimento de mandado de busca domiciliar em que o morador ou quem o represente desobedeça à ordem de ingresso na residência autorizando o arrombamento da porta e a entrada forçada CPP art 245 2º Em decorrência do estrito cumprimento do dever legal o funcionário público responsável pelo cumprimento da ordem judicial não responde pelo crime de dano e sequer pela violação de domicílio1 O Superior Tribunal de Justiça nos fornece outro exemplo na seara dos crimes contra a honra Queixacrime oferecida por Juiz contra Desembargadora que durante processo de promoção por merecimento de magistrados proferiu voto com expressões tidas por caluniosas difamatórias e injuriosas pelo querelante A querelada em sessão pública proferiu seu voto em cumprimento ao previsto na Resolução 1062010 do CNJ com considerações que entendeu pertinentes não se extraindo da sua manifestação atividade delituosa que se amolde às figuras típicas dos arts 138 139 e 140 cc o art 141 II do Código Penal visto que ausente o elemento subjetivo dos tipos penais a inexistência de animus caluniandi diffamandi vel injuriandi Manifestação da querelada no estrito cumprimento do dever legal de fundamentação do voto relatando informações que possuía não se configurando a tipicidade dos crimes a ela imputados pelo querelante nos termos do art 142 III do Código Penal e do art 41 da LC 351979 LOMAN Queixacrime rejeitada2 DEVER LEGAL O dever legal engloba qualquer obrigação direta ou indiretamente resultante de lei em sentido genérico isto é preceito obrigatório e derivado da autoridade pública competente para emitilo Compreende assim decretos regulamentos e também decisões judiciais as quais se limitam a aplicar a 246 247 letra da lei ao caso concreto submetido ao exame do Poder Judiciário O dever legal pode também originarse de atos administrativos desde que de caráter geral pois se tiverem caráter específico o agente não estará agindo sob o manto da excludente do estrito cumprimento de dever legal mas sim protegido pela obediência hierárquica causa de exclusão da culpabilidade se presentes os requisitos exigidos pelo art 22 do Código Penal Destarte o cumprimento de dever social moral ou religioso ainda que estrito não autoriza a aplicação dessa excludente da ilicitude Exemplo comete crime de violação de domicílio o padre ou pastor que a pretexto de espantar os maus espíritos que lá se encontram ingressa sem permissão na residência de alguém DESTINATÁRIOS DA EXCLUDENTE Para Julio Fabbrini Mirabete a excludente pressupõe no executor um funcionário público ou agente público que age por ordem da lei não se excluindo o particular que exerça função pública jurado perito mesário da Justiça Eleitoral etc3 Prevalece contudo o entendimento de que o estrito cumprimento de dever legal como causa de exclusão da ilicitude também se estende ao particular quando atua no cumprimento de um dever imposto por lei Nesse sentido não há crime de falso testemunho na conduta do advogado que se recusa a depor sobre fatos que tomou conhecimento no exercício da sua função acobertados pelo sigilo profissional Lei 89061994 Estatuto da OAB arts 2º 3º e 7º XIX LIMITES DA EXCLUDENTE O cumprimento deve ser estritamente dentro da lei ou seja deve obedecer à risca os limites a que está subordinado De fato todo direito apresenta duas características fundamentais é limitado e disciplinado em sua execução Fora dos limites traçados pela lei surge o excesso ou o abuso de autoridade O fato tornase ilícito e além de livrar do cumprimento aquele a quem se dirigia a ordem abrelhe ainda espaço para a utilização da legítima 248 249 defesa ESTRITO CUMPRIMENTO DE DEVER LEGAL E CRIMES CULPOSOS A excludente é incompatível com os crimes culposos pois a lei não obriga ninguém funcionário público ou não a agir com imprudência negligência ou imperícia A situação geralmente é resolvida pelo estado de necessidade Exemplo o bombeiro que dirige a viatura em excesso de velocidade para salvar uma pessoa queimada em incêndio e em razão disso atropela alguém matandoo não responde pelo homicídio culposo na direção de veículo automotor em face da exclusão do crime pelo estado de necessidade de terceiro COMUNICABILIDADE DA EXCLUDENTE DA ILICITUDE Em caso de concurso de pessoas o estrito cumprimento de dever legal configurado em relação a um dos agentes estendese aos demais envolvidos no fato típico sejam eles coautores ou partícipes É evidente que um fato típico não pode ser lícito para um dos agentes e simultaneamente ilícito para os demais Exemplo o policial militar auxiliado por um particular arromba a porta de uma residência durante o cumprimento de mandado de busca e apreensão Inexistem crimes de dano e de violação de domicílio para ambos os sujeitos policial militar e particular 1 2 3 Outro exemplo de estrito cumprimento de dever legal encontrase no art 190C da Lei 80691990 Estatuto da Criança e do Adolescente Não comete crime o policial que oculta a sua identidade para por meio da internet colher indícios de autoria e materialidade dos crimes previstos nos arts 240 241 241A 241B 241C e 241D desta Lei e nos arts 154A 217A 218 218A e 218B do DecretoLei nº 2848 de 7 de dezembro de 1940 Código Penal AP 720BA rel Min Sidnei Beneti Corte Especial j 07082013 MIRABETE Julio Fabbrini Manual de direito penal Parte geral 24 ed São Paulo Atlas 2007 v 1 p 185 Dispõe o art 23 III parte final do Código Penal Não há crime quando o agente pratica o fato no exercício regular de direito Tratase de causa de exclusão da ilicitude o que se extrai tanto pela rubrica marginal do art 23 do Código Penal exclusão de ilicitude como também pela redação do dispositivo legal não há crime O direito é um só e a sua repartição em diversos ramos tem fins essencialmente didáticos Dessa forma um ato lícito para qualquer área do direito não pode ser ilícito perante o Direito Penal e viceversa evitandose a contradição e a falta de unidade sistemática do ordenamento jurídico Para Graf zu Dohna Uma ação juridicamente permitida não pode ser ao mesmo tempo proibida pelo direito Ou em outras palavras o exercício de um direito nunca é antijurídico1 Assim sendo a palavra direito é utilizada em sentido amplo pelo art 23 III do Código Penal Quem está autorizado a praticar um ato reputado pela ordem jurídica como o exercício de um direito age licitamente Exemplificativamente ao particular que diante da prática de uma infração penal corajosamente efetua a prisão em flagrante de seu autor não pode ser imputado o crime de constrangimento ilegal em razão da permissão contida no art 301 do Código de Processo Penal Na esteira do raciocínio de Nélson Hungria O direito é um complexo harmônico de normas não sendo admissível um real conflito entre estas Assim se uma norma penal incrimina tal ou qual fato que entretanto em determinados casos outra norma jurídica penal ou extrapenal permite ou impõe não há reconhecer em tais casos a existência de crime Esta ilação é inquestionável ainda quando a norma de excepcional licitude seja de direito privado2 Essa causa de exclusão da ilicitude assim como todas as demais deve obedecer aos limites legais Quem tem um direito dele não pode abusar O excesso ou abuso enseja além do afastamento da excludente a utilização da legítima defesa por parte do prejudicado pelo exercício irregular e abusivo do direito Além disso pode ocorrer até mesmo a prática de um crime De fato os arts 1566 IV e 1634 I do Código Civil preceituam ser dever dos pais a educação dos filhos facultandolhes o uso de meios moderados para correção e disciplina quando necessário O abuso ou excesso desse direito entretanto tipificará o crime de maustratos delineado pelo art 136 do Código Penal Na hipótese em que o advogado constituído se apropria de valores pertencentes ao cliente para o pagamento de seus honorários quando o contrato de prestação de serviços não contém cláusula com essa finalidade entendese configurado o crime de apropriação indébita em face da inexistência da excludente do exercício regular de direito Anotese ainda que quando o exercício regular de um direito tem seu nascedouro no Direito Penal o fato pode ser ilícito na seara extrapenal nada obstante não configure infração penal É o caso do advogado que durante debates em audiência judicial ofende um colega em razão de suas funções Não há injúria por força do art 7º 2º da Lei 89061994 Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil o que não obsta a sua punição administrativa pela violação da ética profissional Deve respeitar todavia os limites legais sob pena de configuração do excesso3 Costume é a reiteração uniforme de uma conduta em face da convicção de sua obrigatoriedade Não se trata de direito assegurado em lei mas de prática consagrada em determinada coletividade por ser considerada cogente Predomina o entendimento de que o direito cujo exercício regular autoriza a exclusão da ilicitude deve estar previsto em lei José Frederico Marques contudo sustenta a possibilidade de o fato típico ser justificado pelo direito consuetudinário São suas palavras O costume legitima também certas ações ou fatos típicos É disto um exemplo o trote acadêmico em que as violências injúrias e constrangimentos que os veteranos praticam contra os noviços não se consideram atos antijurídicos em face do direito penal porque longo e reiterado costume consagra o trote como instituição legítima4 Em que pese serem causas legais de exclusão da ilicitude as diferenças são nítidas e podem ser assim apresentadas A prática de determinadas atividades esportivas pode resultar em lesões corporais e excepcionalmente até mesmo na morte de seus praticantes É o que ocorre em vários esportes tais como futebol boxe artes marciais etc O fato típico decorrente da realização de um esporte desde que respeitadas as regras regulamentares emanadas de associações legalmente constituídas e autorizadas a emitir provisões internas configura exercício regular de direito afastando a ilicitude porque o esporte é uma atividade que o Estado não somente permite mas incentiva a sua prática Todavia se o fato típico cometido pelo agente resultar da violação das regras esportivas notadamente por ultrapassar seus limites o excesso implicará na responsabilidade pelo crime doloso ou culposo Exemplo o jogador de futebol que depois de sofrer uma falta do adversário passa a agredilo com inúmeros socos e pontapés matandoo deve suportar ação penal por homicídio doloso A atividade médica ou cirúrgica é indispensável para a sociedade e por esse motivo regulamentada pelo Poder Público exigindose habilitação técnica atestada por órgãos oficiais para o seu adequado exercício Exemplificativamente o médico que efetua uma cirurgia plástica está acobertado pelo exercício regular de direito Contudo para caracterização da excludente é indispensável o consentimento do paciente ou quando incapaz ou impossibilitado de fazêlo de quem tenha qualidade para representálo pois em caso contrário estará delineado o crime de constrangimento ilegal CP art 146 No caso de cirurgia para salvar o paciente de iminente risco de vida estará o médico resguardado tanto pelo exercício regular de direito como pelo estado de necessidade dispensandose nesse último caso o consentimento da pessoa submetida ao serviço cirúrgico Flávio Augusto Monteiro de Barros explica que a intervenção médica ou cirúrgica caracteriza estado de necessidade em duas hipóteses 1 quando o leigo na ausência absoluta do médico realiza ato de medicina para salvar a vida ou saúde de outrem de perigo atual e inevitável e 2 quando o médico executa a medicina contra a vontade do paciente ou de seu representante legal para salválo de iminente perigo de vida art 146 3º I do CP5 No tocante às pessoas que se filiam à religião testemunhas de Jeová e analisando a questão sob o prisma estritamente jurídico é legítima a atuação do médico que independentemente de autorização judicial efetua a transfusão de sangue para salvar a vida do paciente ainda que sem a sua autorização se consciente e plenamente capaz ou contra a vontade de seus familiares se inconsciente ou incapaz Com efeito o direito à vida deve sobreporse às posições religiosas A propósito dispõe a deliberação do Conselho Regional de Medicina de São Paulo de 1974 a se paciente grave inconsciente e desacompanhado de familiares precisar de transfusão de sangue ela deve ser feita sem demora b se paciente grave inconsciente e acompanhado de parente que impeça a transfusão o médico deve esclarecêlo de sua necessidade e havendo relutância recorrer à autoridade policial e judicial e c se paciente lúcido se negar à transfusão deve assinar termo de responsabilidade perante autoridade policial ou judicial e o médico deve tentar tratamento alternativo Nesse caso portanto coexiste o estado de necessidade de terceiro proteção da vida humana o exercício regular de direito desempenho de profissão autorizada e incentivada pelo Estado e o estrito cumprimento de dever legal o médico precisa cumprir a deliberação emanada do Conselho a que pertence Também chamadas de ofendículos ou ofensáculas têm origem nos práticos do Direito que utilizaram a palavra para indicar a prevenção de qualquer ordem apta para ofender Apontamse comumente alguns engenhos mecânicos como o arame farpado a cerca elétrica e cacos de vidro sobre muros Cuidase de meios defensivos utilizados para a proteção da propriedade e de outros bens jurídicos tais como a segurança familiar e a inviolabilidade do domicílio O titular do bem jurídico prepara previamente o meio de defesa quando o perigo ainda é remoto e incerto e o seu funcionamento somente se dá em face de uma agressão atual ou iminente Devem ser visíveis funcionam como meio de advertência e não como forma oculta para ofender terceiras pessoas Há duas posições em doutrina acerca da espécie de excludente configurada pelas ofendículas 1 Sebastián Soler Vicenzo Manzini Giuseppe Bettiol e Aníbal Bruno se filiam à tese que sustenta tratarse de exercício regular de direito Nesse sentido é importante destacar o art 1210 1º do Código Civil O possuidor turbado ou esbulhado poderá manterse ou restituirse por sua própria força contanto que o faça logo os atos de defesa ou de desforço não podem ir além do indispensável à manutenção ou restituição da posse 2 José Frederico Marques Magalhães Noronha e Costa e Silva situam o assunto como legítima defesa preordenada alegando o último que se o aparelho está disposto de modo que só funcione no momento necessário e com a proporcionalidade a que o proprietário era pessoalmente obrigado nada impede a aplicação da legítima defesa6 São assim compreendidos os aparelhos ocultos que possuem a mesma finalidade das ofendículas Exemplo espingarda com barbante ligando seu gatilho à fechadura de uma porta a qual se aberta acarreta no disparo da arma de fogo Por serem escondidos normalmente acarretam em excesso punível doloso ou culposo A Lei 85011992 permite a utilização de cadáver não reclamado junto às autoridades públicas para estudos e pesquisas científicas desde que respeitados os requisitos por ela previstos deve ter transcorrido o prazo mínimo de 30 dias entre a data da morte e a do pedido de uso a utilização do cadáver deve ser realizada por escolas de medicina o cadáver não pode resultar de ação criminosa e o cadáver não pode ter qualquer tipo de documentação ou quando identificado não existirem informações sobre parentes ou responsáveis legais Nesse caso estará afastado eventual crime de vilipêndio ou destruição de cadáver por parte dos responsáveis pelas escolas de medicina bem como dos estudiosos em razão do exercício regular de direito 1 2 3 4 5 6 DOHNA Alexander Graf zu La estructura de la teoría del delito Trad espanhola Carlos Fontán Balestra Buenos Aires AbeledoPerrot 1958 p 47 HUNGRIA Nélson Comentários ao Código Penal Rio de Janeiro Forense 1949 v I p 469 STJ REsp 1306443SP rel Min Maria Isabel Gallotti 4ª Turma j 19112013 MARQUES José Frederico Tratado de direito penal Campinas Bookseller 1997 v II p 179 BARROS Flávio Augusto Monteiro de Direito penal Parte geral 5 ed São Paulo Saraiva 2006 p 343 COSTA E SILVA A J da Código penal anotado São Paulo RT 1943 v I p 171172 261 262 INTRODUÇÃO O Código Penal atendendo a princípios de bomsenso e de justiça estabelece em seu art 23 causas gerais de exclusão da ilicitude colocando em relação a cada uma delas os seus exatos limites Quando porém o agente ultrapassar as barreiras necessárias na prática do fato típico cuja ilicitude a eximente apaga há excesso seja no tocante à situação de necessidade à agressão repelida ao dever legal ou ainda ao exercício do direito DISPOSITIVO LEGAL E ALCANCE Depois de apresentar as causas de exclusão da ilicitude estatui o art 23 do Código Penal em seu parágrafo único O agente em qualquer das hipóteses deste artigo responderá pelo excesso doloso ou culposo A expressão em qualquer das hipóteses deste artigo indica a penalização do excesso doloso ou culposo em todas as causas legais genéricas de exclusão da ilicitude No estado de necessidade o excesso recai na expressão nem podia de outro modo evitar CP art 24 age com excesso aquele que para afastar a situação de perigo utiliza meios dispensáveis e sacrifica bem jurídico alheio Exemplo A para fugir do ataque de um cão que o persegue destrói o vidro de um veículo para nele se abrigar quando podia simplesmente homiziarse em uma casa que tinha à sua disposição Na legítima defesa o excesso se consubstancia no emprego de meios desnecessários para repelir a injusta agressão atual ou iminente ou quando 263 264 necessários os emprega imoderadamente No estrito cumprimento do dever legal o excesso resulta da não observância pelo agente dos limites determinados pela lei que lhe impõe a conduta consistente em um fato típico Exemplo o policial que cumpre um mandado de prisão pode se valer da força física para conter o sujeito procurado pela Justiça Age em excesso contudo quando agride quem já se encontra preso e não mais representa perigo à sua atuação No exercício regular de direito finalmente o excesso decorre do exercício abusivo do direito consagrado pelo ordenamento jurídico Exemplo o pai tem o direito de corrigir o comportamento do filho menor de idade inclusive com castigos moderados Se ultrapassar os limites legais responde pelo excesso nas lesões causadas à criança ou ao adolescente Antes da Reforma da Parte Geral pela Lei 72091984 o Código Penal no antigo art 21 parágrafo único admitia somente o excesso culposo na legítima defesa CONCEITO Excesso é a desnecessária intensificação de um fato típico inicialmente amparado por uma causa de justificação Pressupõe portanto uma excludente da ilicitude a qual desaparece em face de o agente desrespeitar os seus limites legalmente previstos suportando a punição pelas abusivas e inúteis lesões provocadas ao bem jurídico penalmente tutelado Exemplo a pessoa que agredida fisicamente sem risco de vida defendese moderadamente provocando lesões no ofensor age em legítima defesa e fica livre da atuação do Direito Penal Se todavia matar o seu agressor desnecessariamente por não usar moderadamente os meios necessários para a defesa responde por homicídio excesso ESPÉCIES Doloso ou consciente é o excesso voluntário e proposital O agente quer ultrapassar os parâmetros legais sabendo que assim agindo praticará um delito de natureza dolosa e por ele responderá como crime autônomo Culposo ou inconsciente é o excesso resultante de imprudência negligência ou imperícia modalidades de culpa O agente responde pelo crime culposo praticado Acidental ou fortuito é a modalidade que se origina de caso fortuito ou força maior eventos imprevisíveis e inevitáveis Cuidase de excesso penalmente irrelevante1 Exculpante é o excesso decorrente da profunda alteração de ânimo do agente isto é medo ou susto provocado pela situação em que se encontra Exemplo depois de tomar conhecimento de que está jurado de morte em sua faculdade A começa a andar armado visando se defender em caso de eventual agressão injusta Em determinada ocasião é abordado em local ermo e escuro por duas pessoas desconhecidas e assustado contra elas efetua repentinamente disparos de arma de fogo matandoas Essa espécie de excesso encontra certa dose de rejeição pela doutrina e pela jurisprudência Os concursos para ingresso no Ministério Público em geral não reconhecem essa tese sob a alegação de que não possui amparo legal e por ser vaga levaria muitas vezes à impunidade Há entendimentos contudo no sentido de que o excesso exculpante exclui a culpabilidade em razão da inexigibilidade de conduta diversa A propósito com a rubrica excesso escusável dispõe o art 45 parágrafo único do Decretolei 10011969 Código Penal Militar Não é punível o excesso quando resulta de escusável surpresa ou perturbação de ânimo em face da situação Vejase também que o art 20 6º do Código Penal Espanhol eleva o medo dependendo da situação à condição de causa de exclusão da culpabilidade Excesso intensivo ou próprio é o que se verifica quando ainda estão presentes os pressupostos das causas de exclusão da ilicitude É o caso do agente que no contexto de uma agressão injusta defendese de forma desproporcional Há superação dos limites traçados pela lei para a justificativa e o excesso assume um perfil ilícito São desse posicionamento a título ilustrativo Francisco de Assis Toledo Nélson Hungria e Alberto Silva Franco para quem citando Mir Puig Assim enquanto no excesso intensivo há um excesso em sua virtualidade lesiva ou melhor um excesso no qual o agente sobrepassa os limites impostos pela necessariedade ou pela proporcionalidade no excesso extensivo há um excesso na duração da defesa isto é a defesa se prolonga por mais tempo do que o da duração da atualidade da agressão reagese frente a uma agressão que a rigor deixou de existir2 Para os adeptos desse posicionamento o excesso extensivo é em verdade um crime autônomo situado fora do contexto fático da excludente da ilicitude A situação pode ser dividida em duas etapas 1 aquela em que estavam presentes os pressupostos da justificativa e 2 uma posterior na qual a excludente já estava encerrada em que o agente pratica outro delito desvencilhado da situação anterior Excesso extensivo ou impróprio ao contrário é aquele em que não estão mais presentes os pressupostos das causas de exclusão da ilicitude não mais existe a agressão ilícita encerrouse a situação de perigo o dever legal foi cumprido e o direito foi regularmente exercido Em seguida o agente ofende bem jurídico alheio respondendo pelo resultado dolosa ou culposamente produzido Filiamse a essa vertente dentre outros E Magalhães Noronha e Celso Delmanto que exemplifica Ao defenderse de injusta agressão o sujeito põe seu contendor desacordado e gravemente ferido após este estar caído ao solo ainda lhe causa mais uma lesão leve Embora a lesão grave esteja acobertada pela justificativa a posterior lesão leve foi excessiva e será punida por dolo caso a intenção tenha sido provocála ou por culpa se decorrente da falta de cuidado do agente3 265 1 2 3 266 1 2 3 LEGÍTIMA DEFESA E EXCESSO Nada obstante seja admitido em relação a todas as causas genéricas de exclusão da ilicitude CP art 23 parágrafo único é mais comum a configuração do excesso na legítima defesa E nessa eximente com a adoção do excesso intensivo ou próprio a intensificação desnecessária da conduta inicialmente justificada pode ocorrer em três hipóteses a teor do previsto no art 25 do Código Penal o agente usa meio desnecessário o agente usa imoderadamente o meio necessário ou o agente usa imoderadamente meios desnecessários EXEMPLO DE QUESITOS EM CRIME DE COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO JÚRI INCLUINDO O EXCESSO No julgamento dos crimes de competência do Tribunal do Júri e aqui tomaremos como exemplo um homicídio simples CP art 121 caput em que se alega como tese absolutória a legítima defesa os quesitos serão formulados da seguinte forma4 Os ferimentos descritos no exame necroscópico de fls 30 foram a causa da morte de José Carlos da Silva O acusado Pedro dos Santos no dia 10 de janeiro de 2011 por volta das 22 horas na Rua 15 de novembro n 18 Centro na cidade e comarca de São Paulo efetuou disparos de arma de fogo contra a vítima provocandolhe esses ferimentos O jurado absolve o acusado O primeiro quesito relacionase com a materialidade do fato e o segundo diz respeito à autoria ou participação no crime CPP art 483 I e II A resposta negativa de mais de 3 três jurados a qualquer desses quesitos encerra a votação e implica a absolvição do acusado CPP art 483 1º Respondidos afirmativamente por mais de 3 três jurados os dois primeiros quesitos será formulado um terceiro com a seguinte redação O jurado absolve o acusado CPP art 483 2º Destarte todas as teses defensivas pertinentes à absolvição exceto as relativas à materialidade do fato e à autoria ou participação devem ser sopesadas pelos jurados quando da votação do terceiro quesito aí se incluindo as causas de exclusão da ilicitude tal como a legítima defesa Portanto se os jurados desejarem reconhecer a excludente é necessária a resposta sim absolvendo o réu Nesse caso ao contrário do que ocorria anteriormente à reforma do rito do Tribunal do Júri pela Lei 116892008 somente será permitida a quesitação do excesso culposo e desde que requerido expressamente pela defesa Com efeito atualmente os jurados se limitam a absolver o acusado terceiro quesito não se sabendo por qual motivo isto é se pelas razões alegadas pela defesa ou por outro fundamento qualquer exemplo absolvição por piedade ou por não acreditar na ressocialização pelo sistema prisional E se responderem afirmativamente ao terceiro quesito o réu estará definitivamente absolvido Em outras palavras decidiram os jurados que o acusado deve ficar livre da punição estatal não se podendo falar em excesso doloso Logo o excesso doloso não poderá ser objeto de um quarto quesito Se foi absolvido é porque não houve excesso Além disso estatui o art 483 3º do Código de Processo Penal com a redação dada pela Lei 116892008 Decidindo os jurados pela condenação o julgamento prossegue Fica claro portanto que se os jurados decidirem pela condenação será possível a indagação do excesso culposo Como diz a lei o julgamento prossegue Em síntese o Conselho de Sentença acolheu a tese sustentada pela acusação inclusive o excesso doloso que jamais será alegado pela defesa Por outro lado se os jurados decidirem pela absolvição a votação estará encerrada isto é a eles não poderá ser endereçado mais nenhum outro quesito nem mesmo no tocante ao excesso doloso De fato a interpretação do dispositivo legal permite a conclusão de que nessa hipótese o julgamento não prossegue O réu está absolvido e nada mais há a discutir Na linha da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça Suscitada a legítima defesa como única tese defensiva perante o Conselho de Sentença caso mais de três jurados respondam afirmativamente ao terceiro quesito O jurado absolve o acusado o Juiz Presidente do Tribunal do Júri deve encerrar o julgamento e concluir pela absolvição do réu não podendo submeter à votação quesito sobre eventual excesso doloso alegado pela acusação Na atual sistemática do Tribunal do Júri o CPP não prevê quesito específico sobre a legítima defesa Após a Lei 116892008 foram unificadas teses defensivas em um único quesito obrigatório art 483 inciso III do CPP Ao concentrar diversas teses absolutórias nesta questão O jurado absolve o acusado o legislador buscou impedir que os jurados fossem indagados sobre aspectos técnicos Nessa perspectiva declarada a absolvição pelo Conselho de Sentença prosseguir no julgamento para verificar se houve excesso doloso constituiu constrangimento manifestamente ilegal ao direito ambulatorial do acusado Caracteriza ademais ofensa à garantia da plenitude de defesa pois o novo sistema permite justamente que o jurado possa absolver o réu baseado unicamente em sua livre convicção e de forma independente das teses defensivas5 Se porém a defesa sustentar a legítima defesa como tese principal e subsidiariamente o excesso culposo e o réu for condenado no terceiro quesito isto é restar rejeitada a legítima defesa o juiz deverá continuar a votação para que o júri decida se houve ou não excesso culposo o julgamento prossegue Essa indagação deverá ser feita logo após o terceiro quesito uma vez que o acolhimento da referida tese importa desclassificação para crime culposo Exemplo 4 Ao efetuar os disparos de arma de fogo quando a vítima já se encontrava caída o acusado excedeu culposamente os limites da legítima defesa Negada pelos jurados a ocorrência de excesso culposo será o caso de condenação por crime doloso passandose à votação dos demais quesitos se for o caso na forma prevista no art 483 3º do Código de Processo Penal De fato se os jurados não absolveram o acusado quando alegada a legítima defesa e também afastaram o excesso culposo é porque entenderam tratarse de crime praticado a título de dolo 1 2 3 4 5 FRANCO Alberto Silva STOCO Rui MARREY Adriano Teoria e prática do júri 6 ed São Paulo RT 1997 p 489 FRANCO Alberto Silva STOCO Rui Código penal e sua interpretação jurisprudencial Parte geral 7 ed São Paulo RT 2001 v 1 p 372 DELMANTO Celso Código penal comentado 3 ed 8ª tiragem Rio de Janeiro Renovar 1994 p 45 A sistemática do Tribunal do Júri incluindo todo o seu procedimento foi substancialmente alterada pela Lei 116892008 HC 190264PB rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 26082014 noticiado no Informativo 545 1 Em uma concepção clássica causalista causal ou mecanicista da conduta dolo e culpa se alojam no interior da culpabilidade Destarte com a finalidade de evitar a responsabilidade penal objetiva a culpabilidade é elemento do crime Portanto em um sistema causalista o conceito analítico do crime é necessariamente tripartido Em suma crime na visão clássica da conduta é obrigatoriamente Fato típico e ilícito praticado por agente culpável Em uma ótica finalista por outro lado o dolo e a culpa foram retirados da culpabilidade culpabilidade vazia e transferidos para o interior da conduta Esse fenômeno possibilitou analisar o crime no campo analítico por dois critérios distintos tripartido e bipartido No conceito tripartido crime é também o fato típico e ilícito praticado por agente culpável A culpabilidade continua a constituirse em elemento do crime Diferese todavia da visão clássica porque agora o dolo e a culpa vale repetir encontramse na conduta e não mais na culpabilidade Por sua vez de acordo com o conceito bipartido crime é o fato típico e ilícito A culpabilidade deixa de funcionar como elemento constitutivo do crime e passa a ser compreendida como pressuposto de aplicação da pena Logo no sistema finalista o crime pode ser definido como Conceito tripartido fato típico e ilícito praticado por agente culpável sendo a culpabilidade elemento do crime ou 2 Conceito bipartido fato típico e ilícito a culpabilidade não integra o crime mas funciona como pressuposto para aplicação da pena Fica claro pois que somente para a teoria finalista da conduta o conceito analítico de crime pode ser tripartido ou bipartido Para os seguidores do sistema clássico ou causal o crime deve ser analisado obrigatoriamente em um conceito tripartido sob pena de configuração da responsabilidade penal objetiva Culpabilidade é o juízo de censura o juízo de reprovabilidade que incide sobre a formação e a exteriorização da vontade do responsável por um fato típico e ilícito com o propósito de aferir a necessidade de imposição de pena A culpabilidade pode ser encarada como elemento do crime tanto para um simpatizante do sistema clássico como também para um partidário do sistema finalista desde que se adote um conceito tripartido de crime Para os adeptos do finalismo bipartido contudo a culpabilidade funciona como pressuposto de aplicação da pena e não como elemento do crime Em um Estado Democrático de Direito deve imperar um direito penal do fato e jamais um direito penal do autor conforme mencionamos no capítulo 2 item 2216 desta obra Com efeito o Direito Penal deve se preocupar com a punição de autores de fatos típicos e ilícitos e não em rotular pessoas Assim sendo o juízo de culpabilidade recai sobre o autor para analisar se ele deve ou não suportar uma pena em razão do fato cometido isto é como decorrência da prática de uma infração penal O agente é punido em razão do comportamento que realizou ou deixou de realizar e não pela condição de ser quem ele é 2751 É a culpabilidade que diferencia a conduta do ser humano normal e apto ao convívio social dotado de conhecimento do caráter ilícito do fato típico livremente cometido do comportamento realizado por portadores de doenças mentais bem como de pessoas com desenvolvimento mental incompleto ou retardado e também dos atos de seres irracionais ou de pessoas que não possuem consciência do caráter ilícito do fato típico praticado ou não têm como agir de forma diversa Aqueles devem ser punidos pois tinham a possibilidade de respeitar o sistema jurídico e evitar resultados ilícitos estes não Consequentemente a análise da presença ou não da culpabilidade leva em conta o perfil subjetivo do agente e não a figura do homem médio reservado ao fato típico e à ilicitude O Código Penal não apresenta e jamais apresentou o conceito de culpabilidade Essa tarefa é da doutrina que ao longo dos tempos formulou diversas teorias Vejamos Teoria psicológica Para essa teoria idealizada por Franz von Liszt e Ernst von Beling e intimamente relacionada ao desenvolvimento da teoria clássica da conduta o pressuposto fundamental da culpabilidade é a imputabilidade compreendida como a capacidade do ser humano de entender o caráter ilícito do fato e de determinarse de acordo com esse entendimento A culpabilidade que tem como pressuposto a imputabilidade é definida como o vínculo psicológico entre o sujeito e o fato típico e ilícito por ele praticado Esse vínculo pode ser representado tanto pelo dolo como pela culpa Dolo e culpa são espécies da culpabilidade pois são as formas concretas pelas quais pode se revelar o vínculo psicológico entre o autor e a conduta praticada Além disso o dolo é normativo ou seja guarda em seu interior a 1 2 consciência da ilicitude ver capítulo 12 item 124 E se a imputabilidade é pressuposto da culpabilidade somente se analisa a presença do dolo ou da culpa se o agente for imputável isto é maior de 18 anos de idade e mentalmente sadio Essa teoria somente é aplicável no campo da teoria clássica da conduta em que o dolo e a culpa integram a culpabilidade Dentre as principais críticas a ela endereçadas podem ser destacadas a impossibilidade em resolver as situações de inexigibilidade de conduta diversa notadamente a coação moral irresistível e a obediência hierárquica à ordem não manifestamente ilegal Nesses casos o sujeito age com dolo mas o crime não pode ser a ele imputado pois somente é punido o autor da coação ou da ordem CP art 22 Também não consegue explicar a culpa inconsciente sem previsão pois aqui não existe nenhum vínculo psicológico entre o autor e o fato por ele praticado que sequer foi previsto Essa teoria não é atualmente aceita pois a culpabilidade não pode ser um mero e frágil vínculo psicológico Existem outros fatores que devem ser utilizados para a sua constatação o que não se admite no contexto da teoria psicológica Confiramse dois clássicos exemplos fornecidos por Reinhart Frank1 Um carteiro assolado pela custosa enfermidade de sua esposa reforçada pelas necessidades vitais insatisfeitas de sua numerosa prole apropriase de valores alheios e O caixa de um banco se apropria de igual numerário com o objetivo de agradar suas amantes consumistas já habituadas a receber presentes luxuosos Com a aplicação da teoria psicológica seria forçoso reconhecer que ambos são imputáveis e atuaram dolosamente E configurada a culpabilidade ao carteiro e ao caixa bancário devem ser impostas iguais penas conclusão que imediatamente deve ser rechaçada por postulados de equidade e de justiça pois enquanto o último agiu por mero luxo e prazer do primeiro era 2752 inexigível conduta diversa São elementos do crime na órbita da teoria psicológica da culpabilidade Teoria normativa ou psicológiconormativa Surge em 1907 com a proposta de Reinhart Frank a teoria normativa relacionando a culpabilidade com a exigibilidade de conduta diversa A culpabilidade deixa de ser um fenômeno puramente natural de cunho psicológico pois a ela se atribui um novo elemento estritamente normativo inicialmente chamado de normalidade das circunstâncias concomitantes e posteriormente de motivação normal atualmente definido como exigibilidade de conduta diversa O conceito de culpabilidade assume um perfil complexo constituído por elementos naturalísticos vínculo psicológico representado pelo dolo ou pela culpa e normativos normalidade das circunstâncias concomitantes ou motivação normal Sua estrutura passa a ser composta por três elementos imputabilidade dolo ou culpa e exigibilidade de conduta diversa A imputabilidade deixa de ser pressuposto da culpabilidade para funcionar como seu elemento Em resumo somente é culpável o agente maior de 18 anos de idade e mentalmente sadio imputabilidade que age com dolo ou com culpa e que no caso concreto podia comportarse em conformidade com o Direito é dizer praticou o crime quando tinha a faculdade de agir licitamente Afastase a culpabilidade quando não se podia exigir do sujeito um comportamento conforme o ordenamento jurídico Nesse sentido a culpabilidade pode ser definida como o juízo de 2753 reprovabilidade que recai sobre o autor de um fato típico e ilícito que poderia ter sido evitado Essa teoria não eliminou da culpabilidade o vínculo psicológico dolo ou culpa que une o autor imputável ao fato por ele praticado Mas a reforçou com a exigibilidade de conduta diversa O dolo permanece normativo aloja em seu bojo a consciência da ilicitude isto é o conhecimento acerca do caráter ilícito do fato Essa teoria representou à época um grande avanço frente à teoria psicológica Soçobrou com a superveniência da teoria finalista que a fulminou por duas razões principais 1 manutenção do dolo e da culpa como elementos da culpabilidade e 2 tratamento do dolo normativo possuindo em seu interior a consciência atual da ilicitude Sua aplicação é restrita ao âmbito da teoria causal causalista ou mecanicista da conduta pois nela o dolo e a culpa compõem a culpabilidade Mas como houve uma profunda alteração na estrutura da culpabilidade e consequentemente do conceito analítico de crime alguns autores sustentam que a teoria normativa ou psicológiconormativa inaugurou o sistema neoclássico no Direito Penal substituindo o sistema clássico caracterizado principalmente pela teoria psicológica da culpabilidade2 Para essa teoria a estrutura do crime é a seguinte Teoria normativa pura Essa teoria surge nos idos de 1930 com o finalismo penal de Hans Welzel e dele é inseparável Em outras palavras a adoção da teoria normativa pura da culpabilidade somente é possível em um sistema finalista É chamada de normativa pura porque os elementos psicológicos dolo e culpa que existiam nas teorias psicológica e psicológiconormativa da culpabilidade foram transferidos pelo finalismo penal para o fato típico alojandose no interior da conduta Dessa forma a culpabilidade se transforma em um simples juízo de reprovabilidade que incide sobre o responsável pela prática de um fato típico e ilícito O dolo passa a ser natural isto é sem a consciência da ilicitude Com efeito o dolo é levado para a conduta deixando a consciência da ilicitude na culpabilidade Aquele vai para o fato típico esta permanece no local em que estava Além disso a consciência da ilicitude que no sistema clássico era atual isto é deveria estar efetivamente presente no caso concreto passa a ser potencial ou seja bastava tivesse o agente na situação real a possibilidade de conhecer o caráter ilícito do fato praticado com base em um juízo comum Portanto com o acolhimento da teoria normativa pura possível somente em um sistema finalista o conceito analítico de crime passa a ser composto pelos seguintes elementos Esses elementos constitutivos da culpabilidade estão ordenados hierarquicamente de tal modo que o segundo pressupõe o primeiro e o terceiro depende dos anteriores De fato se o indivíduo é inimputável não pode ter a potencial consciência da ilicitude E se não tem a potencial consciência da ilicitude não lhe pode ser exigível conduta diversa A teoria normativa pura da culpabilidade subdividese em outras duas a saber a extremada extrema ou estrita e b limitada Em ambas as vertentes a estrutura da culpabilidade é idêntica ou seja seus elementos são a imputabilidade a potencial consciência da ilicitude e a exigibilidade de conduta diversa A distinção entre elas repousa unicamente no tratamento dispensado às descriminantes putativas Nas descriminantes putativas o agente incidindo em erro supõe situação fática ou jurídica que se existisse tornaria sua ação legítima Para a teoria normativa pura em sua variante extremada extrema ou estrita as descriminantes putativas sempre caracterizam erro de proibição Por sua vez para a teoria normativa pura em sua faceta limitada as descriminantes putativas podem caracterizar erro de proibição ou erro de tipo a depender das peculiaridades do caso concreto3 Em que pese ferrenha discussão doutrinária acerca do assunto é possível afirmar que o Código Penal em vigor acolheu a teoria normativa pura em sua vertente limitada É o que se extrai do tratamento do erro arts 20 e 214 Confirase a propósito o item 19 da Exposição de Motivos da Nova Parte Geral do Código Penal Repete o Projeto as normas do Código de 1940 pertinentes às denominadas descriminantes putativas Ajustase assim o Projeto à teoria limitada da culpabilidade que distingue o erro incidente sobre os pressupostos fáticos de uma causa de justificação do que incide sobre a norma permissiva grifamos Uma corrente doutrinária capitaneada por Günther Jakobs sustenta um conceito funcional de culpabilidade Tratase de proposta consistente em substituir a culpabilidade fundada em um juízo de reprovabilidade por necessidades reais ou supostas de prevenção5 Pretendese que em vez de questionar se o autor do fato podia atuar de outro modo perguntese em face das finalidades da pena é necessário ou não tornálo responsável pela violação do ordenamento jurídico Essa teoria portanto retira o elevado valor atribuído ao livre arbítrio do ser humano e busca vincular o conceito de culpabilidade ao fim de prevenção geral da pena e também à política criminal do Estado A culpabilidade representa uma falta de fidelidade do sujeito no tocante ao ordenamento jurídico que deve ser a qualquer custo respeitado Sua autoridade somente se atinge com a reiterada aplicação da norma penal necessária para alcançar a finalidade de prevenção geral do Direito Penal Nas palavras de Jakobs Punese para manter a confiança geral na norma para exercitar o reconhecimento geral da norma Com relação a este fim da pena o conceito de culpabilidade não deve ser orientado tendo em vista o futuro mas sim o presente na medida em que o Direito Penal funciona é dizer contribui para estabilizar o ordenamento6 São terminologias também criadas por Günther Jakobs com o escopo de justificar um tipo total de culpabilidade em sintonia com o seu conceito funcional Para ele a culpabilidade pressupõe o injusto fato típico e ilícito e seu autor só é responsável pelo déficit de motivação jurídica se ao tempo do fato era imputável É o que chama de tipo positivo de culpabilidade7 Por sua vez o tipo negativo de culpabilidade referese à inexigibilidade do comportamento Assim ao fato típico e ilícito praticado apenas será atribuída a culpabilidade ao agente quando não tiver atuado com ânimo exculpante ou então em um contexto exculpante Para o penalista alemão a obediência à norma é inexigível quando a motivação ilícita do autor imputável e que não respeita o fundamento de validade da norma se pode explicar por uma situação que para o autor constituise em uma desgraça e que também em geral se pode definir como desgraça ou então se pode imputála a terceira pessoa8 Todo ser humano atua em sociedade em circunstâncias determinadas e com limites de comportamento também determinados Como há desigualdades sociais a personalidade do agente é moldada em consonância com as oportunidades oferecidas a cada indivíduo para orientar se ou não em sintonia com o ordenamento jurídico Entra em cena a chamada coculpabilidade assim definida por Zaffaroni e Pierangeli Todo sujeito age numa circunstância determinada e com um âmbito de autodeterminação também determinado Em sua própria personalidade há uma contribuição para esse âmbito de autodeterminação posto que a sociedade por melhor organizada que seja nunca tem a possibilidade de brindar a todos os homens com as mesmas oportunidades Em consequência há sujeitos que têm um menor âmbito de autodeterminação condicionado desta maneira por causas sociais Não será possível atribuir estas causas sociais ao sujeito e sobrecarregálo com elas no momento de reprovação de culpabilidade Costumase dizer que há aqui uma coculpabilidade com a qual a própria sociedade deve arcar9 Para esses autores essa carga de valores sociais negativos deve ser considerada em prol do réu uma atenuante inominada na forma prevista no art 66 do Código Penal Com efeito a teoria da coculpabilidade aponta a parcela de responsabilidade social do Estado pela não inserção social e portanto devendo também suportar o ônus do comportamento desviante do padrão normativo por parte dos atores sociais sem cidadania plena que possuem uma menor autodeterminação diante das concausas socioeconômicas da criminalidade urbana e rural O art 66 do Código Penal brasileiro dá ao juiz uma ferramenta para atenuar a resposta penal à desigualdade social de oportunidades a pena poderá ser ainda atenuada em razão de circunstância relevante anterior ou posterior ao crime embora não prevista expressamente em lei10 O Superior Tribunal de Justiça não tem admitido a aplicação da teoria da coculpabilidade A teoria da coculpabilidade invocada pelo impetrante no lugar de explicitar a responsabilidade moral a reprovação da conduta ilícita e o louvor à honestidade fornece uma justificativa àqueles que apresentam inclinação para a vida delituosa estimulandoos a afastar da consciência 2791 mesmo que em parte a culpa por seus atos11 Coculpabilidade às avessas Na sequência da teoria da coculpabilidade surgiu a coculpabilidade às avessas desenvolvida em duas perspectivas fundamentais12 Vejamos Em primeiro lugar esta linha de pensamento diz respeito à identificação crítica da seletividade do sistema penal e à incriminação da própria vulnerabilidade Em outras palavras o Direito Penal direciona seu arsenal punitivo contra os indivíduos mais frágeis normalmente excluídos da vida em sociedade e das atividades do Estado Por esta razão estas pessoas se tornam as protagonistas da aplicação da lei penal a maioria dos acusados em ações penais são homens e mulheres que não tiveram acesso ao lazer à cultura à educação eles também compõem com intensa densidade o ambiente dos estabelecimentos penais No entanto não é só A coculpabilidade às avessas também envolve a reprovação penal mais severa no tocante aos crimes praticados por pessoas dotadas de elevado poder econômico e que abusam desta vantagem para a execução de delitos tributários econômicos financeiros contra a Administração Pública etc em regra prevalecendose das facilidades proporcionadas pelo livre trânsito nas redes de controle político e econômico Cuidase da face inversa da coculpabilidade se os pobres excluídos e marginalizados merecem um tratamento penal mais brando porque o caminho da ilicitude lhes era mais atrativo os ricos e poderosos não têm razão nenhuma para o cometimento de crimes São movidos pela vaidade por desvios de caráter e pela ambição desmedida justificando a imposição da pena de modo severo Contudo é importante destacar que se de um lado a coculpabilidade poderia ao menos em tese ser admitida como atenuante genérica inominada com fundamento no art 66 do Código Penal a coculpabililidade às avessas não pode ser compreendida como agravante genérica por duas razões a falta de previsão legal e b em se tratando de matéria prejudicial ao acusado não há espaço para a analogia in malam partem Destarte a punição mais rígida deverá ser alicerçada unicamente na pena base levando em conta as circunstâncias judiciais desfavoráveis conduta social personalidade do agente motivos circunstâncias e consequências do crime com fulcro no art 59 caput do Código Penal Culpabilidade formal é a definida em abstrato ou seja o juízo de reprovabilidade realizado em relação ao provável autor de um fato típico e ilícito se presentes os elementos da culpabilidade no momento em que o legislador incrimina uma conduta Serve pois para o legislador cominar os limites mínimo e máximo da pena atribuída a determinada infração penal Assim quando criados dois tipos incriminadores um crime contra a honra e um crime doloso contra a vida por exemplo o legislador considera formalmente duas culpabilidades uma maior para o crime mais grave doloso contra a vida e outra mais branda para o crime contra a honra Já a culpabilidade material é estabelecida em concreto dirigida a um agente culpável que cometeu um fato típico e ilícito Destinase portanto ao magistrado colaborando com a aplicação concreta da pena A maior ou menor culpabilidade do autor da infração penal constituise em circunstância judicial destinada à dosimetria da pena em compasso com as regras estatuídas pelo art 59 caput do Código Penal Influem portanto na quantidade da pena a ser concretamente aplicada São assim chamadas as causas de exclusão da culpabilidade Podem ser sintetizadas pelo gráfico a seguir Excludentes dos elementos da culpabilidade Imputabilidade Potencial consciência da ilicitude Exigibilidade de conduta diversa Doença mental Desenvolvimento mental retardado Desenvolvimento mental incompleto Embriaguez acidental completa Erro de proibição inevitável ou escusável Coação moral irresistível Obediência hierárquica à ordem não manifestamente ilegal 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 FRANK Reinhart Sobre la estructura del concepto de culpabilidad Buenos Aires B de F 2004 p 28 Embora esse período tenha se iniciado com os estudos de Reinhart Frank em 1907 também se atribui grande importância aos trabalhos de Max Ernst Mayer e Edmund Mezger A propósito este último penalista alemão é apontado como o grande nome do sistema neoclássico em face da publicação do seu Tratado de Direito Penal Nesse sentido Derecho penal Parte general Fundamentos La estructura de la teoría del delito Trad espanhola DiegoManuel Luzón Peña Miguel Díaz y García Conlledo e Javier de Vicente Remensal Madrid Civitas 2006 t I 9198 Essa matéria encontrase detalhadamente abordada no item 158 TOLEDO Francisco de Assis Princípios básicos de direito penal 5 ed 13 tir São Paulo Saraiva 2007 p 230 STRATENWERTH Günter Derecho penal Parte general I El hecho punible Trad Manuel Cancio Meliá e Marcelo A Sancinetti Buenos Aires 2005 p 275 JAKOBS Günther Derecho penal Parte general Fundamentos y teoría de la imputación Trad espanhola de Joaquin Cuello Contreras e Jose Luis Serrano Gonzales de Murillo 2 ed Madrid Marcial Pons 1997 p 581 Idem ibidem p 598 Idem p 601 ZAFFARONI Eugenio Raúl PIERANGELI José Henrique Manual de direito penal brasileiro Parte geral 7 ed São Paulo RT 2007 v 1 p 525 COSTA Álvaro Mayrink da Direito penal volume 1 parte geral 8 ed Rio de Janeiro Forense 2009 p 12051206 HC 172505MG rel Min Gilson Dipp 5ª Turma j 31052011 Em igual sentido HC 187132MG rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 05022013 Para o estudo aprofundado do tema é recomendável a leitura de MOURA Grégore Moreira de Do princípio da coculpabilidade no direito penal Niterói Impetus 2006 281 282 INTRODUÇÃO A Parte Geral do Código Penal de 1940 antes da entrada em vigor da Lei 72091984 cuidava dessa disciplina dentro do título Da responsabilidade Essa opção sempre foi muito criticada pois a responsabilidade penal não é elemento da culpabilidade e sim sua consequência ou seja um sujeito culpável envolvido em um fato típico e ilícito deve ser punido pelo Estado Atualmente o Título III da Parte Geral do Código Penal cuida nos arts 26 a 28 da imputabilidade penal CONCEITO A imputabilidade penal é um dos elementos da culpabilidade Mas qual é o seu conceito O Código Penal acompanhou a tendência da maioria das legislações modernas e optou por não definila Limitouse a apontar as hipóteses em que a imputabilidade está ausente ou seja os casos de inimputabilidade penal art 26 caput art 27 e art 28 1º Contudo as notas características da inimputabilidade fornecem ainda que indiretamente o conceito de imputabilidade é a capacidade mental inerente ao ser humano de ao tempo da ação ou da omissão entender o caráter ilícito do fato e de determinarse de acordo com esse entendimento Dessa forma a imputabilidade penal depende de dois elementos 1 intelectivo é a integridade biopsíquica consistente na perfeita saúde mental que permite ao indivíduo o entendimento do caráter ilícito do fato e 2 volitivo é o domínio da vontade é dizer o agente controla e comanda seus 283 284 1 impulsos relativos à compreensão do caráter ilícito do fato determinandose de acordo com esse entendimento Esses elementos devem estar simultaneamente presentes pois na falta de um deles o sujeito será tratado como inimputável O Brasil adotou um critério cronológico Toda pessoa a partir do início do dia em que completa 18 anos de idade presumese imputável MOMENTO PARA CONSTATAÇÃO DA IMPUTABILIDADE O art 26 caput do Código Penal é claro a imputabilidade deve ser analisada ao tempo da ação ou da omissão Considerase portanto a prática da conduta Qualquer alteração posterior nela não interfere produzindo apenas efeitos processuais1 Esta imposição constituise em desdobramento lógico da teoria da atividade adotada pelo art 4º do Código Penal no tocante ao tempo do crime Consequentemente se ao tempo da conduta o réu era imputável a superveniência de doença mental não altera esse quadro O réu deve ser tratado como imputável limitandose a nova causa a suspender o processo até o seu restabelecimento É o que dispõe o art 152 caput do Código de Processo Penal SISTEMAS OU CRITÉRIOS PARA IDENTIFICAÇÃO DA INIMPUTABILIDADE Como já mencionado ao completar 18 anos de idade todo ser humano presumese imputável Essa presunção todavia é relativa iuris tantum pois admite prova em contrário E para a aferição da inimputabilidade existem três sistemas ou critérios Biológico basta para a inimputabilidade a presença de um problema mental representado por uma doença mental ou então por desenvolvimento mental incompleto ou retardado É irrelevante tenha o sujeito no caso concreto se mostrado lúcido ao tempo da prática da infração penal para entender o caráter ilícito do fato e determinarse de 2 3 acordo com esse entendimento O decisivo é o fator biológico a formação e o desenvolvimento mental do ser humano Esse sistema atribui demasiado valor ao laudo pericial pois se o auxiliar da Justiça apontasse um problema mental o magistrado nada poderia fazer Seria presumida a inimputabilidade de forma absoluta iuris et de iure Psicológico para esse sistema pouco importa se o indivíduo apresenta ou não alguma deficiência mental Será inimputável ao se mostrar incapacitado de entender o caráter ilícito do fato ou de determinarse de acordo com esse entendimento Seu inconveniente é abrir espaço para o desmedido arbítrio do julgador pois competiria exclusivamente ao magistrado decidir sobre a imputabilidade do réu Biopsicológico resulta da fusão dos dois anteriores é inimputável quem ao tempo da conduta apresenta um problema mental e em razão disso não possui capacidade para entender o caráter ilícito do fato ou determinarse de acordo com esse entendimento Esse sistema conjuga as atuações do magistrado e do perito Este perito trata da questão biológica aquele juiz da psicológica A presunção de imputabilidade é relativa iuris tantum após os 18 anos todos são imputáveis salvo prova pericial em sentido contrário revelando a presença de causa mental deficiente bem como o reconhecimento de que por tal motivo o agente não tinha ao tempo da conduta capacidade para entender o caráter ilícito do fato ou de determinarse de acordo com esse entendimento O Código Penal em seu art 26 caput acolheu como regra o sistema biopsicológico ao estabelecer que Art 26 É isento de pena o agente que por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado era ao tempo da ação ou da omissão inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinarse de acordo com esse entendimento Excepcionalmente entretanto foi adotado o sistema biológico no tocante aos menores de 18 anos CF art 228 e CP art 27 bem como o sistema psicológico em relação à embriaguez completa proveniente de caso fortuito 285 286 ou força maior CP art 28 1º CAUSAS DE INIMPUTABILIDADE O Código Penal apresenta como causas de inimputabilidade menoridade art 27 doença mental art 26 caput desenvolvimento mental incompleto arts 26 caput e 27 desenvolvimento mental retardado art 26 caput e embriaguez completa proveniente de caso fortuito ou força maior art 28 1º MENORIDADE Em relação aos menores de 18 anos de idade adotouse o sistema biológico para a constatação da inimputabilidade Tais pessoas independentemente da inteligência da perspicácia e do desenvolvimento mental são tratadas como inimputáveis Podem inclusive ter concluído uma faculdade ou já trabalharem com anotação em carteira de trabalho e previdência social A presunção de inimputabilidade é absoluta iuris et de iure decorrente do art 228 da Constituição Federal2 e do art 27 do Código Penal3 e não admite prova em sentido contrário Nos termos da Súmula 74 do Superior Tribunal de Justiça a prova da menoridade deve ser feita por documento hábil Esse documento pode mas não deve ser necessariamente a certidão de nascimento Serve qualquer documento de identidade certidão de batismo carteira escolar etc4 O menor de 18 anos civilmente emancipado continua no campo penal inimputável A capacidade ou incapacidade civil não se confunde com a imputabilidade penal5 1 2 Muito se discute sobre a possibilidade da diminuição da maioridade penal e qual seria o instrumento necessário para tanto visando considerar imputáveis as pessoas a partir de idade inferior a 18 anos Recordese que os menores de 18 anos são inimputáveis por expressa determinação constitucional art 228 Sobre o assunto há duas posições A redução da maioridade penal somente seria possível com o advento de uma nova Constituição Federal fruto do Poder Constituinte Originário A maioridade penal constituise em cláusula pétrea implícita referente ao direito fundamental de todo menor de 18 anos de não ser processado julgado e condenado pela Justiça comum É suficiente uma emenda constitucional por não se tratar de cláusula pétrea mas de norma constitucional inserida no capítulo inerente à família à criança ao adolescente e ao idoso A propósito já foram apresentadas diversas propostas de Emenda Constitucional nesse sentido mas até agora nenhuma delas foi aprovada Crimes permanentes são aqueles em que a consumação se prolonga no tempo por vontade do agente Nesses casos é possível seja uma conduta iniciada quando a pessoa ainda é menor de 18 anos de idade e somente se encerre quando atingida a maioridade penal Exemplo A com 17 anos de idade pratica extorsão mediante sequestro contra B mantendoo em cativeiro por diversos meses período no qual completa 18 anos de idade6 O agente poderá ser responsabilizado criminalmente pelos atos praticados após o início da sua imputabilidade penal Se o adolescente entretanto praticou um ato infracional equiparado a delito de natureza instantânea a superveniência da maioridade não autoriza sua responsabilização na esfera penal Nada obstante admitese a imposição 287 de medida socioeducativa pela justiça especializada Vara da Infância e da Juventude Como estabelece a Súmula 605 do STJ A superveniência da maioridade penal não interfere na apuração de ato infracional nem na aplicabilidade de medida socioeducativa em curso inclusive na liberdade assistida enquanto não atingida a idade de 21 anos Dispõe o art 50 do Código Penal Militar Art 50 O menor de 18 dezoito anos é inimputável salvo se já tendo completado 16 dezesseis anos revela suficiente desenvolvimento psíquico para entender o caráter ilícito do fato e determinarse de acordo com esse entendimento Neste caso a pena aplicável é diminuída de 13 um terço até a 12 metade A ressalva relativa aos maiores de 16 anos não foi recepcionada pela Constituição Federal a teor do seu art 228 INIMPUTABILIDADE POR DOENÇA MENTAL A expressão doença mental deve ser interpretada em sentido amplo englobando os problemas patológicos e também os de origem toxicológica Ingressam nesse rol doença mental todas as alterações mentais ou psíquicas que suprimem do ser humano a capacidade de entender o caráter ilícito do fato e de determinarse de acordo com esse entendimento A doença mental pode ser permanente ou transitória como é o caso do delírio febril Deve contudo existir ao tempo da prática da conduta para acarretar no afastamento da imputabilidade Além disso não é necessário que emane de enfermidade mental pois há enfermidades físicas que atingem o aspecto psicológico do indivíduo São exemplos disso os surtos dos tifoides e os delírios decorrentes de graves pneumonias A inimputabilidade penal é aferida com base em um critério 288 a b c 289 biopsicológico Não basta a presença de um problema mental Exigese ainda que em razão dele o sujeito seja incapaz ao tempo da conduta de entender o caráter ilícito do fato ou de determinarse de acordo com esse entendimento Logo se ao tempo da conduta o indivíduo nada obstante seja portador de problema mental apresentar lucidez será tratado como imputável Concluise pois que os doentes mentais durante os intervalos de lucidez são penalmente imputáveis INIMPUTABILIDADE POR DESENVOLVIMENTO MENTAL INCOMPLETO O desenvolvimento mental incompleto abrange os menores de 18 anos e os indígenas Para os menores de 18 anos de idade a regra é inócua pois deles já cuidam o art 228 da Constituição Federal e o art 27 do Código Penal Os índios por outro lado nem sempre serão inimputáveis Essa situação depende do grau de assimilação dos valores sociais a ser revelado pelo exame pericial Destarte dependendo da conclusão da perícia o indígena pode ser imputável se integrado à vida em sociedade semiimputável no caso de estar dividido entre o convívio na tribo e na sociedade e inimputável quando completamente incapaz de viver em sociedade desconhecendo as regras que lhe são inerentes INIMPUTABILIDADE POR DESENVOLVIMENTO MENTAL RETARDADO Desenvolvimento mental retardado é o que não se compatibiliza com a fase da vida em que se encontra determinado indivíduo resultante de alguma condição que lhe seja peculiar A pessoa não se mostra em sintonia com os demais indivíduos que possuem sua idade cronológica De fato o retardo mental é uma condição de desenvolvimento a b c 2810 interrompido ou incompleto da mente especialmente caracterizada por um comprometimento de habilidades manifestadas durante o período de desenvolvimento as quais contribuem para o nível global da inteligência isto é aptidões cognitivas de linguagem motoras e sociais7 A expressão desenvolvimento mental retardado compreende as oligofrenias em suas mais variadas manifestações idiotice imbecilidade e debilidade mental propriamente dita bem como as pessoas que por ausência ou deficiência dos sentidos possuem deficiência psíquica como se dá com o surdomudo O surdomudo não é automaticamente inimputável Pelo contrário pois completados 18 anos de idade todos se presumem imputáveis Compete à perícia indicar o grau de prejuízo a ele causado por essa falha biológica Podem ocorrer três situações distintas se ao tempo da ação ou da omissão era capaz de entender o caráter ilícito do fato e de determinarse de acordo com esse entendimento será considerado imputável se ao tempo da ação ou da omissão não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinarse de acordo com esse entendimento será considerado semiimputável CP art 26 parágrafo único e se ao tempo da ação ou da omissão era inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinarse de acordo com esse entendimento será considerado inimputável CP art 26 parágrafo único A PERÍCIA MÉDICA Salvo no tocante aos menores de 18 anos critério biológico o Direito Penal brasileiro acolheu o sistema biopsicológico para verificação da inimputabilidade o juiz afere a parte psicológica reservandose à perícia o exame biológico existência de problema ou anomalia mental Há uma junção de tarefas de forma que o magistrado não pode decidir sobre a imputabilidade ou inimputabilidade do acusado sem a colaboração técnica do perito Exigese o laudo médico para a comprovação da doença mental do desenvolvimento mental incompleto ou do desenvolvimento mental retardado Cuidase de meio legal de prova da inimputabilidade imprescindível que sequer pode ser substituído pela inspeção judicial pois o julgador não possui conhecimentos médicos para identificar deficiências na saúde psíquica do réu Portanto a perícia é fundamental para a aferição da inimputabilidade Mas obviamente o juiz não pode ser subserviente à conclusão médica ou seja não fica vinculado aos peritos O magistrado é o peritum peritorum é dizer o perito dos peritos como destaca o art 182 do CPP O juiz não ficará adstrito ao laudo podendo aceitálo ou rejeitálo no todo ou em parte Surge então a questão O que deve fazer o magistrado quando discordar da conclusão do laudo pericial Pode decidir em sentido contrário do médico Embora não esteja adstrito ao laudo o juiz não pode substituir o perito Cabe a ele rejeitar a conclusão técnica ordenando em seguida a realização de novo exame pericial Não lhe é facultado todavia atuar como se médico fosse pois a ele a lei impõe a valoração da parte psicológica assegurando a biológica às pessoas com formação técnica específica Para a instauração do incidente de insanidade mental não basta a alegação defensiva no sentido da presença da anomalia ou enfermidade mental Com efeito o exame a que se refere o art 149 do Código de Processo Penal é imprescindível apenas quando houver dúvida fundada a respeito da higidez mental do acusado em face da presença de indícios plausíveis de que ao tempo do fato era incapaz de entender o caráter ilícito da conduta ou de determinarse de acordo com esse entendimento8 O incidente de insanidade mental tramita em autos apartados CPP art 153 e suspende o processo CPP art 149 2º mas não suspende a prescrição9 Como a imputabilidade é presumida a partir do dia em que o agente completa 18 anos de idade o réu não pode ser submetido à perícia médica contra a sua vontade uma vez que se trata de prova que se destina 2811 exclusivamente a favorecêlo Como já decidido pelo Supremo Tribunal Federal O incidente de insanidade mental é prova pericial constituída em favor da defesa Logo não é possível determinálo compulsoriamente na hipótese em que a defesa se oponha à sua realização Essa é a conclusão da Segunda Turma ao conceder a ordem em habeas corpus que discutiu a legitimidade de decisão judicial que deferira pedido formulado pelo Ministério Público Militar determinando a instauração de incidente de insanidade mental com fundamento no art 156 do Código de Processo Penal Militar CPPM a ser realizado por peritos médicos de hospital castrense A Segunda Turma afirmou que o Código Penal Militar CPM e o Código Penal CP teriam adotado o critério biopsicológico para a análise da inimputabilidade do acusado Assim a circunstância de o agente ter doença mental provisória ou definitiva ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado critério biológico não seria suficiente para ele ser considerado penalmente inimputável sem análise específica dessa condição para aplicação da legislação penal Havendo dúvida sobre a imputabilidade seria indispensável que por meio de procedimento médico se verificasse que ao tempo da ação ou da omissão o agente era totalmente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinarse de acordo com esse entendimento critério psicológico Contudo no caso em comento a defesa não solicitara a realização do mencionado exame Tendo isso em conta o Colegiado asseverou que o paciente não estaria obrigado a se submeter a esse exame10 EFEITOS DA INIMPUTABILIDADE Os menores de 18 anos sujeitamse à legislação especial CF art 228 Lei 80691990 Estatuto da Criança e do Adolescente Os demais inimputáveis submetemse à justiça penal São processados e julgados como qualquer outra pessoa mas não podem ser condenados Com efeito a culpabilidade é pressuposto de aplicação da pena Sem a imputabilidade elemento da culpabilidade não pode ser imposta uma pena 2812 Assim os inimputáveis embora demonstrado o envolvimento em um fato típico e ilícito são absolvidos Tratase da chamada sentença de absolvição imprópria pois o réu é absolvido mas contra ele é aplicada uma medida de segurança na forma definida pelo art 386 parágrafo único III do Código de Processo Penal Isso se justifica pelo fato de em relação aos inimputáveis o juízo de culpabilidade necessário para a pena ser substituído pelo juízo de periculosidade necessário para a medida de segurança Além disso o art 97 caput do Código Penal presume de forma absoluta a periculosidade dos inimputáveis ordenando a imposição de medida de segurança IMPUTABILIDADE DIMINUÍDA OU RESTRITA Nos termos do art 26 parágrafo único do Código Penal Parágrafo único A pena pode ser reduzida de 1 um a 23 dois terços se o agente em virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinarse de acordo com esse entendimento O Código Penal não rotulou o instituto Preferiu falar somente em redução da pena Em sede doutrinária e jurisprudencial foram consagradas como sinônimas diversas terminologias destacandose imputabilidade diminuída imputabilidade reduzida imputabilidade restrita e semiimputabilidade11 Vale registrar contudo a posição de Cezar Roberto Bitencourt que utiliza a expressão culpabilidade diminuída As expressões comumente utilizadas pela doutrina imputabilidade diminuída ou semiimputabilidade são absolutamente impróprias pois na verdade soam mais ou menos com algo parecido como semivirgem semigrávida ou então como uma pessoa de cor semibranca Em realidade a pessoa nessas circunstâncias tem diminuída sua capacidade de censura de valoração consequentemente a censurabilidade de sua conduta antijurídica deve sofrer redução Enfim nas hipóteses de inimputabilidade o agente é inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinarse de acordo com esse entendimento Ao passo que nas hipóteses de culpabilidade diminuída em que o Código fala em redução de pena o agente não possui a plena capacidade de entender a ilicitude do fato ou de determinarse de acordo com esse entendimento12 É de se destacar entretanto a utilização do termo semiimputável derivado de semiimputabilidade pelo art 319 inc VII do Código de Processo Penal com a redação conferida pela Lei 124032011 O art 26 parágrafo único do Código Penal fala em perturbação da saúde mental A perturbação da saúde mental também é uma doença mental embora mais suave Não elimina totalmente mas reduz por parte do agente a capacidade de entender o caráter ilícito do fato e de determinarse de acordo com esse entendimento o que igualmente ocorre em relação ao desenvolvimento mental incompleto e ao desenvolvimento mental retardado A diferença em relação à inimputabilidade pois é de grau O agente tem diminuída a sua capacidade de entendimento e de autodeterminação a qual permanece presente embora em grau menor Por esse motivo subsiste a imputabilidade e por corolário a culpabilidade13 Como entretanto o sujeito encontrase em posição biológica e psicológica inferior a um imputável a reprovabilidade da conduta é menor determinando a lei a redução da pena de 1 um a 23 dois terços Assim como na inimputabilidade nesse ponto o Código Penal também 1 2 acolheu o sistema biopsicológico Há dois fenômenos decisivos para aferição da semiimputabilidade biológico é a causa consistente em perturbação da saúde mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado e psicológico é o efeito pois em razão da anomalia mental o agente não era ao tempo da conduta inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinarse de acordo com esse entendimento A imputabilidade diminuída ou semiimputabilidade constituise em causa obrigatória de diminuição da pena Demonstrado pericialmente nos autos que o réu é fronteiriço isto é limítrofe entre a imputabilidade e a inimputabilidade o magistrado na terceira fase de aplicação da pena deve obrigatoriamente reduzila de 1 um a 23 dois terços A diminuição é obrigatória reservandose ao juiz discricionariedade unicamente em relação ao seu percentual dentro dos limites legais O montante da redução maior ou menor há de levar em conta o grau de diminuição da capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinarse de acordo com esse entendimento Para o Superior Tribunal de Justiça A diminuição da pena nessa situação deve ser avaliada de acordo com o grau de deficiência intelectiva do réu vale dizer de sua capacidade de autodeterminação Nesse contexto a ausência da justificativa para aplicação do redutor em seu grau mínimo viola o princípio do livre convencimento motivado malferindo o disposto no art 93 IX da CF14 Assim se o fronteiriço estiver mais próximo da imputabilidade a redução é menor 13 mas se estiver mais próximo dos limites da inimputabilidade a diminuição deve alcançar o patamar máximo 23 1 2 3 2813 Vimos que na inimputabilidade o responsável pelo cometimento de um fato típico e ilícito é absolvido em face da ausência de culpabilidade Porém a absolvição é imprópria pois é imposta medida de segurança em face da sua periculosidade presumida Na semiimputabilidade contudo subsiste a culpabilidade O réu deve ser condenado mas por se tratar de pessoa com menor grau de censurabilidade a pena há de ser obrigatoriamente reduzida de 1 um a 23 dois terços O semiimputável por outro lado pode necessitar de especial tratamento curativo por ser dotado de periculosidade Nesse caso se o exame pericial assim recomendar e concordando o magistrado a pena pode ser substituída por medida de segurança nos moldes do art 98 do Código Penal Cuidado a sentença endereçada ao semiimputável responsável pela prática de um fato típico e ilícito sempre é condenatória A operação é realizada em três etapas juiz condena em seguida diminui a pena de 1 um a 23 dois terços e finalmente se o réu necessitar de especial tratamento curativo o magistrado substitui a pena diminuída por medida de segurança Em síntese o semiimputável cumpre pena diminuída ou medida de segurança Com a Reforma da Parte Geral do Código Penal Lei 72091984 adotouse o sistema vicariante ou unitário pelo qual o réu somente cumpre uma das sanções penais as quais é importante repetir não são cumuláveis A primitiva Parte Geral do Código Penal consagrava o sistema do duplo binário também chamado de dois trilhos dualista ou de dupla via o semi imputável cumpria a pena e depois se ainda necessitasse de especial tratamento curativo era submetido à medida de segurança EMOÇÃO E PAIXÃO No Código Penal de 1890 a perturbação dos sentidos e da inteligência afastava a culpabilidade Por esse motivo era bastante comum a absolvição de autores de crimes passionais notadamente de homicídios sob a alegação de legítima defesa da honra o que ora não mais se admite O Código Penal dispõe em seu art 28 I que a emoção ou a paixão não excluem a imputabilidade penal Utilizouse pois de um critério legal ao estatuir taxativamente que tais estados de ânimo não elidem o apontado elemento da culpabilidade Essa escolha entretanto não é isenta de críticas Bise penalista suíço observou que se devia deixar ao magistrado critério judicial nessa matéria certa liberdade pois podia acontecer que emoções violentas muitas vezes instantâneas fizessem com que o réu perdesse momentaneamente o domínio de si mesmo e o arrastassem a cometer por efeito da cólera levada ao paroxismo do sentimento de honra ultrajada da dignidade ferida ou de qualquer provocação um ato que não teria cometido se estivesse de sangue frio15 Emoção e paixão são perturbações da psique humana Emoção é o estado afetivo que acarreta na perturbação transitória do equilíbrio psíquico tal como na ira medo alegria cólera ansiedade prazer erótico surpresa e vergonha Paixão é a emoção mais intensa ou seja a perturbação duradoura do equilíbrio psíquico Dela são exemplos entre outros o amor a inveja a avareza o ciúme a vingança o ódio o fanatismo e a ambição Enrico Altavilla sob a ótica da psicologia judiciária diz que é o estudo das emoções e das paixões que principalmente nos convence de que bem poucos homens podem afirmar terem sido durante toda a sua existência completamente normais E em seguida invoca as palavras de Kant para quem A emoção é a água que rompe com violência o dique e se espalha rapidamente a paixão é a torrente que escava o seu leito e nele se incrusta A emoção é uma embriaguez a paixão é uma doença16 Para Nélson Hungria Pode dizerse que a paixão é a emoção que se protrai no tempo incubandose introvertendose criando um estado contínuo e duradouro de perturbação afetiva em torno de uma ideia fixa de um pensamento obsidente A emoção dá e passa a paixão permanece alimentandose de si própria Mas a paixão é como o borralho que a um sopro mais forte pode chamejar de novo voltando a ser fogo crepitante retornando a ser estado emocional agudo17 Portanto a diferença entre a emoção e a paixão repousa fundamentalmente na duração Aquela é um sentimento transitório enquanto a paixão é duradoura uma emoção em câmera lenta Ainda que sejam de elevada intensidade a emoção e a paixão como visto não excluem a imputabilidade penal Porém o Código Penal implicitamente permite duas exceções a essa regra coação moral irresistível em face da inexigibilidade de conduta diversa a ser estudada um pouco adiante e estado patológico no qual se constituem autênticas formas de doença mental Em seu art 28 I o Código Penal referese à condição de normalidade isto é emoção ou paixão incapaz de retirar do agente a capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinarse de acordo com esse entendimento Quando contudo a emoção ou paixão configurar um estado mórbido ou a b patológico deverá ser compreendida como uma verdadeira psicose indicativa de doença mental Logo se comprovada pericialmente a situação encontrará respaldo no art 26 caput inimputabilidade ou em seu parágrafo único imputabilidade restrita ou semiimputabilidade A emoção e a paixão podem ser sociais como é o caso do amor ou antissociais tendo como exemplo o ódio funcionado como circunstância judicial na aplicação da penabase em conformidade com o art 59 caput do Código Penal Falase ainda em emoções astênicas são as resultantes daquele que sofre de debilidade orgânica gerando situações de medo desespero pavor e estênicas são aquelas decorrentes da pessoa que é vigorosa forte e ativa provocando situações de cólera irritação destempero e ira18 O art 65 III c parte final diz que se o crime foi cometido sob a influência de violenta emoção provocada por ato injusto da vítima a pena será atenuada Estará presente destarte uma atenuante genérica funcionando na segunda fase de aplicação da pena Por sua vez os arts 121 1º e 129 4º preveem no tocante ao homicídio e à lesão corporal respectivamente a figura do privilégio causa especial de diminuição da pena quando o crime é cometido sob o domínio de violenta emoção e logo em seguida a injusta provocação da vítima O Código Penal Republicano de 1890 dispunha em seu art 27 4º Não são criminosos os que se acharem em estado de completa privação de sentidos e de inteligência no ato de cometer o crime19 Com base nesse dispositivo legal os criminosos passionais eram 2814 comumente absolvidos sob o pretexto de que ao encontrarem o cônjuge em flagrante adultério ou movidos por elevado ciúme restavam privados da inteligência e dos sentidos Com a regra ora prevista no art 28 I do Código Penal essa interpretação não pode ser admitida Emoção e paixão não excluem a imputabilidade penal mormente quando o crime foi motivado por um suposto amor Roberto Lyra com a autoridade de quem foi apelidado de o príncipe dos promotores pelo fato de ter sido um dos maiores tribunos do júri combatia veementemente a impunidade dos passionais assim se pronunciando O verdadeiro passional não mata O amor é por natureza e por finalidade criador fecundo solidário generoso Ele é cliente das pretorias das maternidades dos lares e não dos necrotérios dos cemitérios dos manicômios O amor o amor mesmo jamais desceu ao banco dos réus Para os fins da responsabilidade a lei considera apenas o momento do crime E nele o que atua é o ódio O amor não figura nas cifras da mortalidade e sim nas da natalidade não tira põe gente no mundo Está nos berços e não nos túmulos20 Nada obstante vez ou outra se constata a absolvição de homicidas passionais confessos Isso se dá notadamente pela circunstância de serem julgados pelo Tribunal do Júri composto por juízes leigos e que decidem pela íntima convicção sem fundamentação dos seus votos muitas vezes movidos pela piedade pela farsa proporcionada pelo acusado ou mesmo por se identificarem com a figura do réu EMBRIAGUEZ É a intoxicação aguda produzida no corpo humano pelo álcool ou por substância de efeitos análogos apta a provocar a exclusão da capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinarse de acordo com esse entendimento Como exemplos de substâncias de efeitos análogos podem ser apontados o éter a morfina o clorofórmio e quaisquer outras substâncias entorpecentes ainda que não previstas na Portaria do Ministério da Saúde responsável por essa tarefa dependendo nesse caso de perícia A embriaguez acima definida que não exclui a imputabilidade penal CP art 28 II é chamada de embriaguez aguda embriaguez simples ou embriaguez fisiológica Cuidase da embriaguez que compromete total ou parcialmente a imputabilidade penal e caracterizase pela desproporcional intensidade ou duração dos efeitos inerentes à intoxicação alcoólica O efeito da embriaguez no organismo humano é contínuo e as consequências do álcool ou da substância de efeitos análogos subsistem no sistema nervoso depois de sua eliminação Por esse motivo a embriaguez patológica é equiparada às doenças mentais Logo aplicase o art 26 caput e seu parágrafo único do Código Penal e não o art 28 II O ébrio é considerado inimputável ou semiimputável em conformidade com a conclusão do laudo pericial São cientificamente reconhecidas três fases da embriaguez21 1ª fase Eufórica as funções intelectuais mostramse excitadas e o indivíduo particularmente eufórico A vontade e a autocrítica afiguramse rebaixadas A capacidade de julgamento se compromete Há certo grau de erotismo O ébrio fala acima do normal apresenta desinibição e comportase de forma cômica e indecorosa É conhecida como fase do macaco 2ª fase Agitada caracterizase por perturbações psicossensoriais profundas Alteramse as funções intelectuais o juízo crítico a atenção e a memória Os propósitos são desordenados ou absurdos Há abolição da crítica Os delitos normalmente são praticados com agressões ou contra a liberdade sexual o que não impede crimes de outras espécies Há perda do equilíbrio e a pessoa marcha de forma desordenada ou se desequilibra Ocorrem perturbações visuais O sujeito fica agitado e agressivo razão pela qual é chamada de fase do leão Nessas duas fases eufórica e agitada é possível a prática de crimes comissivos e omissivos 3ª fase Comatosa do coma inicialmente há sono e o coma se instala progressivamente Daí ser chamada de fase do porco O estado comatoso pode até se tornar irreversível com a morte do ébrio o que pode ser facilitado com a exposição ao frio Nessa terceira fase comatosa o ébrio somente pode praticar crimes omissivos próprios ou impróprios comissivos por omissão A embriaguez aguda simples ou fisiológica classificase quanto à intensidade e quanto à origem Pode ser completa ou incompleta Completa total ou plena é a embriaguez que chegou à segunda agitada ou à terceira fase comatosa Incompleta parcial ou semiplena é a embriaguez que se limitou à primeira fase eufórica Pode ser voluntária culposa preordenada ou acidental Voluntária ou intencional é aquela em que o indivíduo ingere bebidas alcoólicas com a intenção de embriagarse Não quer praticar infrações penais Sua vontade restringese a exceder aos limites permitidos para a ingestão do álcool ou substância de efeitos análogos Culposa é a espécie de embriaguez em que a vontade do agente é somente beber e não embriagarse Por exagero no consumo do álcool todavia acaba embriagado Essas duas espécies de embriaguez voluntária e culposa não excluem a imputabilidade penal CP art 28 II sejam completas ou incompletas Preordenada ou dolosa é aquela em que o sujeito propositadamente se embriaga para cometer uma infração penal A embriaguez funciona como fator de encorajamento para a prática do crime ou da contravenção penal A embriaguez preordenada além de não excluir a imputabilidade penal funciona como agravante genérica CP art 61 II l incidindo na segunda fase do critério trifásico para o fim de exasperar a pena Acidental ou fortuita é a embriaguez que resulta de caso fortuito ou força maior No caso fortuito o indivíduo não percebe ser atingido pelo álcool ou substância de efeitos análogos ou desconhece uma condição fisiológica que o torna submisso às consequências da ingestão do álcool Exemplos 1 o sujeito mora ao lado de uma destilaria de aguardente e aos poucos acaba embriagado pelos vapores da bebida que inala sem perceber e 2 o agente faz tratamento com algum tipo de remédio o qual potencializa os efeitos do álcool Na força maior o sujeito é obrigado a beber ou então por questões profissionais necessita permanecer em recinto cercado pelo álcool ou substância de efeitos análogos Exemplos 1 o agente é amarrado e injetam em seu sangue elevada quantidade de álcool e 2 o indivíduo trabalha na manutenção de uma destilaria de aguardente e em determinado dia cai em um tonel cheio da bebida a b A embriaguez acidental ou fortuita se completa capaz de ao tempo da conduta tornar o agente inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinarse de acordo com esse entendimento exclui a imputabilidade penal CP art 28 1º Por outro lado a embriaguez acidental ou fortuita incompleta isto é aquela que ao tempo da conduta retira do agente parte da capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinarse de acordo com esse entendimento autoriza a diminuição da pena de 1 um a 23 dois terços Equivale portanto à semiimputabilidade CP art 28 2º Nada obstante acarrete ao agente a isenção da pena nos mesmos moldes da inimputabilidade penal a embriaguez acidental ou fortuita e completa não autoriza a aplicação de medida de segurança por um motivo muito simples O sujeito é imputável e não inimputável Não é portador de doença mental nem apresenta desenvolvimento mental incompleto ou retardado na forma exigida pelo art 26 caput do Código Penal Além disso o tratamento curativo inerente à medida de segurança seria totalmente inócuo e desnecessário A embriaguez admite qualquer meio probatório mormente em face do sistema da livre apreciação da prova da persuasão racional ou do livre convencimento motivado adotado pelo art 155 caput do Código de Processo Penal Destacamse contudo três formas probatórias para a comprovação da embriaguez exame laboratorial é o que revela a quantidade de álcool no sangue de alguém O agente não é obrigado a ele se submeter pois ninguém é obrigado a produzir prova contra si mesmo nemo tenetur se detegere exame clínico é a análise pessoal do indivíduo evidenciandose c dados característicos da embriaguez tais como o hálito o controle emocional o equilíbrio físico a fala etc prova testemunhal pessoas que relatem deponham acerca da alteração de comportamento de quem se submeteu ao álcool ou substância de efeitos análogos A conduta de dirigir sob a influência de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência física com qualquer concentração de álcool por litro de sangue ou por litro de ar alveolar constitui infração de trânsito gravíssima sujeita a multa e suspensão do direito de dirigir por 12 meses sem prejuízo da medida de recolhimento do documento de habilitação e retenção do veículo a teor das regras contidas nos arts 165 e 276 da Lei 95031997 Código de Trânsito Brasileiro E estabelece o seu art 277 Art 277 O condutor de veículo automotor envolvido em acidente de trânsito ou que for alvo de fiscalização de trânsito poderá ser submetido a teste exame clínico perícia ou outro procedimento que por meios técnicos ou científicos na forma disciplinada pelo Contran permita certificar influência de álcool ou outra substância psicoativa que determine dependência 1º Revogado 2º A infração prevista no art 165 também poderá ser caracterizada mediante imagem vídeo constatação de sinais que indiquem na forma disciplinada pelo Contran alteração da capacidade psicomotora ou produção de quaisquer outras provas em direito admitidas 3º Serão aplicadas as penalidades e medidas administrativas estabelecidas no art 165 deste Código ao condutor que se recusar a se submeter a qualquer dos procedimentos previstos no caput deste artigo Portanto ao motorista abordado pela autoridade pública é facultado recusarse ao exame de sangue ou ao teste do etilômetro bafômetro nada obstante seu estado de embriaguez possa ser aferido por outros meios de prova22 Essa recusa no entanto importará em consequências jurídicas Buscase justificar a legitimidade desse dispositivo com o argumento de tratarse de infração administrativa Destarte se o Estado autoriza alguém a conduzir veículos automotores tem o direito de imporlhe as condições necessárias para a manutenção dessa prerrogativa destacandose entre elas a submissão aos exames para comprovação de eventual uso de álcool ou substância de efeitos análogos Logo àquele que não se submeter aos testes será aplicada a infração administrativa prevista no art 165A do Código de Trânsito Brasileiro com a redação conferida pela Lei 132812016 Art 165A Recusarse a ser submetido a teste exame clínico perícia ou outro procedimento que permita certificar influência de álcool ou outra substância psicoativa na forma estabelecida pelo art 277 Infração gravíssima Penalidade multa dez vezes e suspensão do direito de dirigir por 12 doze meses Medida administrativa recolhimento do documento de habilitação e retenção do veículo observado o disposto no 4º do art 270 Parágrafo único Aplicase em dobro a multa prevista no caput em caso de reincidência no período de até 12 doze meses Contudo sempre existiram vozes sustentando a inaceitabilidade desta regra pois o motorista seria obrigado a produzir prova contra si mesmo uma vez que serão provocados reflexos na seara criminal relativamente ao delito tipificado pelo art 306 da Lei 95031997 Código de Trânsito Brasileiro Art 306 Conduzir veículo automotor com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência Penas detenção de seis meses a três anos multa e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor 1º As condutas previstas no caput serão constatadas por I concentração igual ou superior a 6 decigramas de álcool por litro de sangue ou igual ou superior a 03 miligrama de álcool por litro de ar alveolar ou II sinais que indiquem na forma disciplinada pelo Contran alteração da capacidade psicomotora 2º A verificação do disposto neste artigo poderá ser obtida mediante teste de alcoolemia ou toxicológico exame clínico perícia vídeo prova testemunhal ou outros meios de prova em direito admitidos observado o direito à contraprova 3º O Contran disporá sobre a equivalência entre os distintos testes de alcoolemia ou toxicológicos para efeito de caracterização do crime tipificado neste artigo Este delito inserese no rol dos crimes de perigo abstrato e sua descrição legal não atenta contra princípios constitucionais porque é científica e estatisticamente comprovado que a condução de veículo automotor por quem ingeriu álcool ou substâncias psicoativas em determinado patamar coloca em risco a incolumidade física e a vida de terceiros dada a diminuição dos reflexos da percepção sensorial e da habilidade motora23 Antes das Leis 127602012 e 129712014 todavia a configuração do delito dependia de prova pericial exame de sangue ou método equivalente etilômetro ou teste em aparelho de ar alveolar popularmente conhecido como bafômetro Em síntese a prova da materialidade do crime tipificado no art 306 do Código de Trânsito Brasileiro restringiase a estes dois meios não admitindo outra forma qualquer pois eram os únicos recursos idôneos a indicar cientificamente a alcoolemia uma vez que o legislador havia incluído o nível de dosagem alcoólica como elemento do tipo penal incriminador Consequentemente um motorista embriagado não poderia ser condenado sem submeterse voluntariamente a tais exames pois ninguém é obrigado a produzir prova contra si mesmo nemo tenetur se detegere No entanto era possível aplicarlhe as sanções administrativas pertinentes Este cenário foi profundamente alterado pelas Leis 127602012 e 129712014 Atualmente o tipo penal não se reporta à quantidade de álcool por litro de sangue O legislador preferiu utilizar uma fórmula mais ampla consistente em capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência E nesse ponto surge uma importante indagação Como se prova a alteração da capacidade psicomotora em decorrência do consumo do álcool ou de substância psicoativa Por duas formas distintas Vejamos Em primeiro lugar a alteração da capacidade psicomotora será demonstrada pela concentração igual ou superior a 6 decigramas de álcool por litro de sangue ou igual ou superior a 03 miligrama de álcool por litro de ar alveolar CTB art 306 1º I24 Nesse caso o exame pericial exame de sangue ou teste do etilômetro continua imprescindível pois a comprovação da embriaguez reclama a precisa dosagem de álcool no sangue Mas a grande novidade recai no inc II do 1º do art 306 do Código de Trânsito Brasileiro A alteração da capacidade psicomotora em face da influência do álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência pode ser constatada por sinais que indiquem na forma disciplinada pelo Contran alteração da capacidade psicomotora É de se observar que a presença destes sinais deve produzir efeitos equivalentes à concentração igual ou superior a 6 decigramas de álcool por litro de sangue ou igual ou superior a 03 miligrama de álcool por litro de ar alveolar raciocínio facilmente extraído da análise do 3º do art 306 do Código de Trânsito Brasileiro O Contran disporá sobre a equivalência entre os distintos testes de alcoolemia ou toxicológicos para efeito de caracterização do crime tipificado neste artigo Para reforçar esta sistemática o 2º do art 306 do Código de Trânsito Brasileiro preconiza que a verificação do disposto neste artigo poderá ser obtida mediante teste de alcoolemia ou toxicológico exame clínico perícia vídeo prova testemunhal ou outros meios de prova em direito admitidos observado o direito à contraprova Embora o dispositivo dependa de regulamentação pelo Conselho Nacional de Trânsito efetivada pela Resolução 4322013 fica nítida a opção pelo sistema da liberdade da prova no tocante ao crime de embriaguez ao volante Em outras palavras se o condutor de veículo automotor envolverse a b em acidente de trânsito ou for alvo de fiscalização de trânsito e o agente público de trânsito suspeitar de eventual alteração de sua capacidade psicomotora em razão da influência do álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência duas situações podem ocorrer se o motorista concordar será submetido a teste de alcoolemia ou toxicológico mediante exame de sangue ou etilômetro se ele não concordar a alteração da sua capacidade psicomotora poderá ser comprovada por sinais indicativos obtidos por diversos meios a exemplo do exame clínico da perícia de vídeo e da prova testemunhal entre outros Exemplo O motorista capota seu automóvel na estrada e abordado pelo policial rodoviário este vem a constatar o estado de embriaguez do condutor evidenciado pelo hálito de álcool pelo pronunciamento confuso das palavras bem como pelos depoimentos de testemunhas no sentido de que o motorista acabara de consumir um litro de aguardente A nova sistemática confere maiores poderes aos agentes de trânsito Com efeito se o condutor do veículo recusarse ao teste de alcoolemia ou toxicológico o funcionário público poderá valerse de outros meios inclusive das suas próprias palavras para concluir pela materialidade do crime tipificado no art 306 da Lei 95031997 Código de Trânsito Brasileiro Evidentemente o motorista não ficará submisso à convicção do agente público De fato caso venha a se posicionar pela alteração da capacidade psicomotora do condutor este terá à sua disposição o direito à contraprova ou seja poderá valerse do teste de alcoolemia ou toxicológico para demonstrar a ausência de concentração igual ou superior a 6 decigramas de álcool por litro de sangue ou igual ou superior a 03 miligrama de álcool por litro de ar alveolar ou ainda de outra substância psicoativa que determina dependência Em síntese o motorista não está obrigado a submeterse à perícia o que não afasta a conclusão pela alteração da sua capacidade psicomotora diante do consumo do álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência Mas se o agente de trânsito concluir com base em sinais diversos pela embriaguez do condutor a este será assegurado o direito de passar pela perícia com a finalidade de comprovar a integridade da sua capacidade psicomotora no âmbito penal O Código Penal dispõe em seu art 28 II que a embriaguez voluntária ou culposa não exclui a imputabilidade penal Já em relação à embriaguez preordenada estatui em seu art 61 II l ser essa circunstância uma agravante genérica Destarte além de subsistir a imputabilidade funciona como exasperação da pena Colocase então a seguinte indagação Como é possível a punição do agente em caso de embriaguez não acidental No momento em que ele pratica o crime embriagado não estaria privado da capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinarse de acordo com esse entendimento Para responder essa questão entra em cena a teoria da actio libera in causa Em claro e bom português teoria da ação livre em sua causa Fundamentase no princípio segundo o qual a causa da causa também é a causa do que foi causado isto é para aferirse a imputabilidade penal no caso da embriaguez desprezase o tempo em que o crime foi praticado De fato nesse momento o sujeito estava privado da capacidade de entendimento e de autodeterminação por vontade própria pois bebeu e embriagouse livre de qualquer coação Por esse motivo considerase como marco da imputabilidade penal o período anterior à embriaguez em que o agente espontaneamente decidiu consumir bebida alcoólica ou de efeitos análogos Nas palavras de Sebastian Soler A imputação do fato realizado durante o tempo de inimputabilidade retroage ao estado anterior e conforme seja o conteúdo subjetivo desse ato será imputado a título de dolo ou de culpa Se um sujeito se embriaga até a inconsciência para não temer e atreverse contra determinada pessoa que quer matar é plenamente imputável quanto ao homicídio ainda quando o crime tenha sido cometido no estado atual de inconsciência25 E de acordo com o item 21 da Exposição de Motivos do Código Penal de 1940 preservada nesse ponto pela Lei 72091984 Ao resolver o problema da embriaguez pelo álcool ou substância de efeitos análogos do ponto de vista da responsabilidade penal o projeto aceitou em toda a sua plenitude a teoria da actio libera in causa ad libertatem relata que modernamente não se limita ao estado de inconsciência preordenado mas se estende a todos os casos em que o agente se deixou arrastar ao estado de inconsciência Invocase essa teoria portanto para justificar a punição do sujeito que ao tempo da conduta encontravase em estado de inconsciência Possibilitase a análise do dolo ou da culpa revelados no momento em que se embriagou São os casos em que alguém no estado de não imputabilidade é causador por ação ou omissão de algum resultado punível tendo se colocado naquele estado ou propositadamente com a intenção de produzir o evento lesivo ou sem essa intenção mas tendo previsto a possibilidade do resultado ou ainda quando a podia ou devia prever26 Essa teoria foi desenvolvida para a embriaguez preordenada e para ela se encaixa perfeitamente O agente embriagase com a intenção de cometer um crime em estado de inconsciência e assim o faz O dolo estava presente quando arquitetou o crime e por esse elemento subjetivo deve ser punido Vale lembrar o clássico exemplo do guardachaves que se embriaga com a intenção de não acionar as chaves à chegada do trem produzindo a catástrofe No momento de beber era ele imputável mas já não o era no momento do desastre27 Na embriaguez preordenada o fundamento da punição é a causalidade mediata O agente atua como mandante na fase anterior da imputabilidade e faz executar o mandato criminoso por si mesmo como instrumento em estado de inimputabilidade28 Posteriormente entretanto a aplicabilidade da teoria da actio libera in causa estendeuse à embriaguez voluntária e à embriaguez culposa bem como aos demais estados de inconsciência Nessa última hipótese pode ser citado o exemplo da mãe que conhecedora dos sonhos noturnos que lhe deixam agitada e a fazem rolar na cama esquece de levar o filho recém nascido ao berço e o deixa dormir ao seu lado vindo a sonhar e ao rolar na cama acaba por esmagar e matar a criança29 E nesses casos o sujeito ao colocarse em estado de inconsciência não possuía dolo ou culpa para a prática do crime Surge assim a crítica no sentido de que o Código Penal teria consagrado a responsabilidade objetiva pois por motivo de política criminal acolheu do direito italiano uma ficção para construir a figura do crime praticado em situação de embriaguez não fortuita relativamente ao tratamento do ébrio voluntário ou culposo como imputável30 Para Paulo José da Costa Júnior que critica veementemente o acolhimento da teoria da actio libera in causa para as situações de embriaguez voluntária ou culposa O legislador penal ao considerar imputável aquele que em realidade não o era fez uso de uma ficção jurídica Ou melhor adotou a responsabilidade objetiva sem querer confessálo No direito penal português confessouse que embora a ingestão de bebidas alcoólicas ou substâncias tóxicas possa criar em muitos casos um verdadeiro estado de inimputabilidade por outro as necessidades de política criminal não consentem na impunidade do delinquente O legislador pátrio não teve igual coragem Preferiu tapar o sol com a peneira adotando a responsabilidade anômala Seria preferível ter confessado que com base na defesa social fora compelido a adotar nesse passo a responsabilidade objetiva para evitar que criminosos fossem buscar no álcool a escusa absolutória31 Existem porém posições diversas sustentando a não caracterização da responsabilidade penal objetiva no tocante à incidência da teoria da actio libera in causa na embriaguez voluntária e na embriaguez culposa Vicenzo Manzini na Itália há muito falava em vontade residual é dizer ainda que embriagado o sujeito mantém em seu íntimo um resquício de consciência e de autodeterminação suficiente para legitimar a imputabilidade penal Nessa linha de raciocínio Giulio Battaglini rebate as críticas à teoria da actio libera in causa sustentando que uma solução legislativa não pode basearse rigorosamente em deduções lógicas o que é necessário é que forneça a melhor tutela dos valores morais e nacionais de que trata Em seguida arremata o ébrio com inteligência suprimida e vontade inexistente é uma criação da fantasia ninguém jamais o viu no banco dos réus32 Nélson Hungria também defende a adoção da teoria da actio libera in causa Para ele a ameaça penal constituise em motivo inibitório a mais no sentido de prevenir a embriaguez com os seus eventuais efeitos maléficos Além disso afirma que a embriaguez quase sempre revela o indivíduo na sua verdadeira personalidade e precisamente o objetivo da teoria da culpabilidade é tornar responsável o indivíduo pelos atos que são expressão de sua personalidade E para sustentar que um ébrio voluntário ou culposo não pode de forma alguma ser equiparado ao inimputável portador de doença mental busca ainda na doutrina alemã a seguinte lição Cumpre notar além disso que segundo a lição da experiência a vontade do ébrio não é tão profundamente conturbada que exclua por completo o poder de inibição como acontece nas perturbações psíquicas de fundo patológico É o que justamente acentua MEZGER A experiência ensina que na embriaguez é possível e pode ser exigido um grau mais alto de autocontrole do que por exemplo nas alterações da consciência de índole orgânica As perturbações por intoxicação de álcool acrescente se et similia sempre ficam em maior ou menor medida na superfície33 Cumpre destacar que no tocante à embriaguez acidental ou fortuita não se aplica a teoria da actio libera in causa porque o indivíduo não tinha a opção de ingerir ou não o álcool ou substância de efeitos análogos Espécies de embriaguez Não acidental Voluntária Completa ou incompleta não exclui a imputabilidade Culposa Completa Exclui a imputabilidade Incompleta Não exclui a imputabilidade mas diminui a pena de 13 a 23 equivale a semiimputabilidade Acidental ou fortuita Patológica Equiparase à doença mental e o agente pode ser considerado inimputável ou semiimputável conforme conclusão do laudo pericial Preordenada Não exclui a imputabilidade e ainda agrava a pena art 61 II I do CP 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 SILVEIRA V César da Tratado da responsabilidade criminal São Paulo Saraiva 1955 v I p 126 São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos sujeitos às normas da legislação especial Os menores de 18 dezoito anos são penalmente inimputáveis ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação especial O documento hábil ao qual a Súmula 74STJ faz referência não se restringe à certidão de nascimento ou seja outros documentos dotados de fé pública portanto igualmente hábeis para comprovar a menoridade também podem atestar a referida situação jurídica como por exemplo a identificação realizada pela polícia civil AgRg no REsp 1396837MG rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 27062014 E também STJ AgRg no REsp 1423997SC rel Min Moura Ribeiro 5ª Turma j 20022014 STF HC 101930MG rel Min Cármen Lúcia 1ª Turma j 27042010 noticiado no Informativo 584 Os crimes descritos no art 159 1º e art 288 parágrafo único do Código Penal são permanentes Em consequência se o menor atingir a idade de 18 dezoito anos enquanto os delitos se encontrarem em plena consumação será por eles responsabilizado STJ HC 169510SP rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 07022012 MARANHÃO Odon Ramos Curso básico de medicina legal 8 ed 5 tir São Paulo Malheiros 2000 p 349 HC 60977ES rel Min Og Fernandes 6ª Turma j 25102011 noticiado no Informativo 486 As causas suspensivas da prescrição prejudiciais ao acusado devem estar expressamente previstas em lei pois dificultam a extinção da punibilidade E nesse ponto o legislador ficou silente HC 133078RJ rel Min Cármen Lúcia 2ª Turma j 06092016 noticiado no Informativo 838 Essas denominações são normalmente aceitas em provas e concursos públicos BITENCOURT Cezar Roberto Tratado de direito penal Parte geral 11 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 ed São Paulo Saraiva 2007 v 1 p 355356 Contra este argumento vale destacar que o art 319 VII do Código de Processo Penal com a redação conferida pela Lei 124032011 utiliza expressamente a palavra semiimputável Evidentemente o semiimputável já atingiu a maioridade penal Os menores de 18 anos de idade são inimputáveis CF art 228 e CP art 27 HC 167376SP rel Min Gurgel de Faria 5ª Turma j 23092014 noticiado no Informativo 547 COSTA E SILVA A J da Código penal anotado São Paulo RT 1943 v I p 189190 ALTAVILLA Enrico Psicologia judiciária O processo psicológico e a verdade judicial Tradução de Fernando Miranda Coimbra Armênio Amado Editor 1981 v I p 104105 HUNGRIA Nélson Comentários ao código penal Rio de Janeiro Forense 1949 v I p 523 NUCCI Guilherme de Souza Código penal comentado 6 ed São Paulo RT 2006 p 261 PIERANGELI José Henrique Códigos penais do Brasil evolução histórica Bauru Jalovi 1980 p 271 LYRA Roberto Como julgar como defender como acusar Rio de Janeiro José Konfino 1975 p 97 Adotamos os conceitos apresentados por MARANHÃO Odon Ramos Curso básico de medicina legal 8 ed 5ª tiragem São Paulo Malheiros 2000 p 390393 É a posição do Superior Tribunal de Justiça REsp 1308779CE rel Min Humberto Martins 2ª Turma j 25032014 Na visão do Supremo Tribunal Federal seria irrelevante indagar se o comportamento do agente atingira ou não algum bem juridicamente tutelado Consignouse ainda legítima a opção legislativa por objetivar a proteção da segurança da própria coletividade HC 109269MG rel Min Ricardo Lewandowski 2ª Turma j 27092011 noticiado no Informativo 642 Para o Superior Tribunal de Justiça O crime do art 306 do Código de Trânsito Brasileiro é de perigo abstrato pois o tipo penal em questão apenas descreve a conduta de dirigir veículo sob a influência de álcool acima do limite permitido legalmente sendo 24 25 26 27 28 29 30 31 32 33 desnecessária a demonstração da efetiva potencialidade lesiva do condutor HC 175385MG rel Min Laurita Vaz 6ª Turma j 17032011 noticiado no Informativo 466 O conceito de ar alveolar é fornecido pelo Anexo I do Código de Trânsito Brasileiro Ar expirado pela boca de um indivíduo originário dos alvéolos pulmonares Este teste é realizado com a utilização do etilômetro aparelho destinado à medição do teor alcoólico no ar aveolar SOLER Sebastian Derecho penal argentino Buenos Aires La Ley 1945 t II p 46 QUEIROZ Narcelio de Teoria da actio libera in causa Rio de Janeiro Livraria Jacintho 1936 p 40 SILVEIRA V César da Tratado da responsabilidade criminal São Paulo Saraiva 1955 v I p 401 BRUNO Aníbal Direito penal Parte geral Rio de Janeiro Forense 1967 t 2 p 151 SOLER Sebastian Derecho penal argentino Buenos Aires La Ley 1945 t II p 47 BRUNO Aníbal Direito penal Parte geral Rio de Janeiro Forense 1967 t 2 p 154 COSTA JR Paulo José da Direito penal curso completo 6 ed São Paulo Saraiva 1999 p 100 BATTAGLINI Giulio Direito penal Parte geral Tradução de Paulo José da Costa Jr e Arminda Bergamini Miotto São Paulo Saraiva Editora da Universidade de São Paulo 1973 v 1 p 263265 HUNGRIA Nélson Comentários ao Código Penal Rio de Janeiro Forense 1949 v I p 528 A aplicação da pena ao autor de uma infração penal somente é justa e legítima quando ele no momento da conduta era dotado ao menos da possibilidade de compreender o caráter ilícito do fato praticado Exigese pois tivesse o autor o conhecimento ou no mínimo a potencialidade de entender o aspecto criminoso do seu comportamento isto é os aspectos relativos ao tipo penal e à ilicitude O sistema clássico ou causal alocava o dolo na culpabilidade e considerava a consciência da ilicitude como integrante do dolo que era normativo No sistema finalista porém o dolo e também a culpa foi transferido para a conduta passando a compor a estrutura do fato típico Mas o dolo é natural isto é desprovido da consciência da ilicitude que permanece na culpabilidade Além disso o finalismo penal transforma a consciência da ilicitude então real em potencial Não mais reclama o efetivo conhecimento do agente acerca do caráter ilícito do fato típico cometido É suficiente tenha ele a possibilidade a potencialidade de compreender o caráter ilícito do fato Sistema Clássico Sistema Finalista 1 2 situada na culpabilidade no interior do dolo de cunho normativo inserida na culpabilidade mas separada do dolo o qual foi transferido para a conduta fato típico e passou a ser a natural isto é sem a consciência da ilicitude No sistema clássico a falta de consciência da ilicitude excluía o dolo normativo Por outro lado no sistema finalista a ausência da potencial consciência da ilicitude preserva íntegro o dolo natural e afasta a culpabilidade É o que se dá no erro de proibição escusável entendimento que foi expressamente acolhido pelo art 21 do Código Penal Art 21 O desconhecimento da lei é inescusável O erro sobre a ilicitude do fato se inevitável isenta de pena se evitável poderá diminuíla de um sexto a um terço Parágrafo único Considerase evitável o erro se o agente atua ou se omite sem a consciência da ilicitude do fato quando lhe era possível nas circunstâncias ter ou atingir essa consciência grifamos Juan Córdoba Roda em trabalho específico sobre o assunto1 aponta três critérios para determinação do objeto da consciência da ilicitude Critério formal desenvolvido por Binding Beling e von Liszt proclama ser necessário o conhecimento do agente sobre a violação de alguma norma penal Critério material defendido por Max Ernst Mayer e Kaufmann baseiase em uma concepção material do injusto a qual exige o conhecimento da antissocialidade da injustiça e imoralidade de uma conduta ou da violação de um interesse e 3 2941 29411 Critério intermediário originário dos estudos de Hans Welzel sustenta que o conhecimento da ilicitude não importa em conhecimento da punibilidade da conduta nem em conhecimento do dispositivo legal que contém a proibição do seu comportamento O sujeito embora não seja obrigado a proceder a uma valoração de ordem técnicojurídica deve conhecer ou poder conhecer com o esforço devido de sua consciência com um juízo geral de sua própria esfera de pensamentos o caráter ilícito do seu modo de agir Basta portanto a valoração paralela da esfera do profano2 O critério formal não encontrou acolhimento pois somente os juristas os técnicos em Direito Penal poderiam cometer crimes ou contravenções penais O critério material bem mais rebuscado esbarra na existência de infrações penais de pura criação legislativa que não correspondem ao conceito de injusto material e inversamente em condutas reconhecidamente danosas embora não tipificadas pelo Direito Penal Por esses motivos o critério de maior aceitação é o intermediário É suficiente um juízo geral acerca do caráter ilícito do fato e também a possibilidade de se atingir esse juízo mediante um simples e exigível esforço da consciência Em suma basta o esforço normal da inteligência do agente para aferição da potencial consciência da ilicitude A potencial consciência da ilicitude é afastada pelo erro de proibição escusável CP art 21 caput Erro de proibição Introdução Falavase no Direito Romano em erro de direito para se referir à ignorância ou falsa interpretação da lei Essa opção foi acolhida pela redação original do Código Penal de 1940 que sob a rubrica ignorância ou erro de direito dispunha A ignorância 29412 ou a errada compreensão da lei não eximem de pena Com a Reforma da Parte Geral do Código Penal pela Lei 72091984 o panorama mudou o erro de direito então tratado pelo art 16 cedeu espaço ao erro sobre a ilicitude do fato disciplinado pelo art 21 e denominado erro de proibição mais técnico e diverso da mera ignorância ou errada compreensão da lei Desconhecimento da lei ignorantia legis É peremptório o art 21 caput 1ª parte do Código Penal O desconhecimento da lei é inescusável Em igual sentido estabelece o art 3º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro Ninguém se escusa de cumprir a lei alegando que não a conhece Em princípio o desconhecimento da lei é irrelevante no Direito Penal Com efeito para possibilitar a convivência de todos em sociedade com obediência ao ordenamento jurídico impõese uma ficção a presunção legal absoluta acerca do conhecimento da lei Considerase ser a lei de conhecimento geral com a sua publicação no Diário Oficial Mas a ciência da existência da lei é diferente do conhecimento do seu conteúdo Aquela se obtém com a publicação da norma escrita este inerente ao conteúdo lícito ou ilícito da lei somente se adquire com a vida em sociedade E é justamente nesse ponto conhecimento do conteúdo da lei do seu caráter ilícito que entra em cena o instituto do erro de proibição Há duas situações diversas desconhecimento da lei inaceitável e desconhecimento do caráter ilícito do fato capaz de afastar a culpabilidade isentando o agente de pena Como define Cezar Roberto Bitencourt A ignorantia legis é matéria de aplicação da lei que por ficção jurídica se presume conhecida por todos enquanto o erro de proibição é matéria de culpabilidade num aspecto inteiramente diverso Não se trata de derrogar ou não os efeitos da lei em função de alguém conhecêla ou desconhecêla A incidência é exatamente esta a relação que existe entre a lei em abstrato e o conhecimento que alguém possa ter de que seu a b 29413 comportamento esteja contrariando a norma legal E é exatamente nessa relação de um lado a norma em abstrato plenamente eficaz e válida para todos e de outro lado o comportamento concreto e individualizado que se estabelecerá ou não a consciência da ilicitude que é matéria de culpabilidade e nada tem que ver com os princípios que informam a estabilidade do ordenamento jurídico3 Embora estabeleça o art 21 caput do Código Penal ser inescusável o desconhecimento da lei o elevado número de complexas normas que compõem o sistema jurídico permite a sua eficácia em duas hipóteses no campo penal atenuante genérica seja escusável ou inescusável o desconhecimento da lei CP art 65 II e autoriza o perdão judicial nas contravenções penais desde que escusável Lei das Contravenções Penais Decretolei 36881941 art 8º Conceito de erro de proibição O erro de proibição foi disciplinado pelo art 21 caput do Código Penal que o chama de erro sobre a ilicitude do fato Varia a natureza jurídica do instituto em razão da sua admissibilidade funciona como causa de exclusão da culpabilidade quando escusável ou como causa de diminuição da pena quando inescusável O erro de proibição pode ser definido como a falsa percepção do agente acerca do caráter ilícito do fato típico por ele praticado de acordo com um juízo profano isto é possível de ser alcançado mediante um procedimento de simples esforço de sua consciência O sujeito conhece a existência da lei penal presunção legal absoluta mas desconhece ou interpreta mal seu conteúdo ou seja não compreende adequadamente seu caráter ilícito A simples omissão ou mesmo conivência do Poder Público no que diz respeito ao combate da criminalidade não autoriza o reconhecimento do erro de proibição Como já decidido pelo Superior Tribunal de Justiça 29414 A simples manutenção de espaço destinado à prática de prostituição traduzse em conduta penalmente reprovável sendo que a possível condescendência dos órgãos públicos e a localização da casa comercial não autorizam por si só a aplicação da figura do erro de proibição com vistas a absolver o réu4 Efeitos escusável e inescusável Na redação original da Parte Geral do Código Penal o erro de direito era considerado pelo art 48 III uma mera atenuante genérica Atualmente porém o erro de proibição relacionase com a culpabilidade podendo ou não excluíla se for escusável ou inescusável Erro de proibição escusável inevitável ou invencível o sujeito ainda que no caso concreto tivesse se esforçado não poderia evitálo O agente nada obstante o emprego das diligências ordinárias inerentes à sua condição pessoal não tem condições de compreender o caráter ilícito do fato Nesse caso excluise a culpabilidade em face da ausência de um dos seus elementos a potencial consciência da ilicitude Nos termos do art 21 caput O erro sobre a ilicitude do fato se inevitável isenta de pena Erro de proibição inescusável evitável ou vencível poderia ser evitado com o normal esforço de consciência por parte do agente Se empregasse as diligências normais seria possível a compreensão acerca do caráter ilícito do fato Subsiste a culpabilidade mas a pena deve ser diminuída de um sexto a um terço em face da menor censurabilidade da conduta O grau de reprovabilidade do comportamento do agente é o vetor para a maior ou menor diminuição E embora o art 21 caput disponha que o juiz poderá diminuir a pena a redução é obrigatória pois não se pode reconhecer a menor censurabilidade e não diminuir a sanção5 O critério para decidir se o erro de proibição é escusável ou inescusável é o perfil subjetivo do agente e não a figura do homem médio De fato em se tratando de matéria inerente à culpabilidade levamse em 29415 conta as condições particulares do responsável pelo fato típico e ilícito cultura localidade em que reside inteligência e prudência etc com a finalidade de se alcançar sua responsabilidade individual que não guarda relação com um standard de comportamento desejado pelo Direito Penal Lembrese quando se fala em fato típico e ilicitude e em todos os institutos a eles relacionados considerase a posição do homem médio pois se analisa o fato típico ou atípico ilícito ou lícito Questionase O fato é típico O fato é ilícito O que vale é o fato pouco importando a pessoa do agente Por outro lado o tema culpabilidade e todas as matérias a ele ligadas considera a figura concreta do responsável pelo fato típico e ilícito para o fim de aferir se ele com base em suas condições pessoais é ou não merecedor de uma pena Questionase O agente é culpável Deve suportar uma pena Critérios para identificação da escusabilidade ou inescusabilidade do erro de proibição O caráter escusável ou inescusável do erro de proibição deve ser calculado com base na pessoa do agente6 O parágrafo único do art 21 do Código Penal consagra esse entendimento ao estabelecer que considerase evitável o erro se o agente atua ou se omite sem a consciência da ilicitude do fato quando lhe era possível nas circunstâncias ter ou atingir essa consciência Esse é o erro de proibição inescusável A contrario sensu concluise que o erro de proibição escusável em consonância com o legislador é aquele em que o agente atua ou se omite sem a consciência da ilicitude do fato quando não lhe era possível nas circunstâncias ter ou atingir essa consciência Porém ainda é pouco Podemos então indagar Há critérios mais seguros e específicos para a identificação do erro de proibição inescusável vencível ou evitável Sim existem critérios precisos fornecidos por Francisco de Assis Toledo7 que nos permitem a elaboração de um quadro esquemático 1 2 3 4 29416 1 2 ERRO DE PROIBIÇÃO INESCUSÁVEL VENCÍVEL OU EVITÁVEL O agente atua com uma consciência profana acerca do caráter ilícito do fato O agente atua sem a mencionada consciência profana quando lhe era fácil atingila nas circunstâncias em que se encontrava isto é com o próprio esforço de inteligência e com os conhecimentos hauridos da vida comunitária de seu próprio meio O agente atua sem a consciência profana sobre o caráter ilícito do fato por ter na dúvida deixado propositadamente de informarse para não ter que evitar uma possível conduta proibida O agente atua sem essa consciência por não ter procurado informarse convenientemente mesmo sem má intenção para o exercício de atividades regulamentadas Espécies de erro de proibição direto indireto e mandamental O erro de proibição pode ser direto indireto e mandamental No erro de proibição direto o agente desconhece o conteúdo de uma lei penal proibitiva ou se o conhece interpretao de forma equivocada Exemplos O credor ao ser avisado que seu devedor está de mudança para outro país ingressa clandestinamente em sua residência e subtrai bens no valor da dívida acreditando ser lícito fazer justiça pelas próprias mãos e O pescador que intencionalmente em águas jurisdicionais brasileiras molesta um cetáceo baleia por exemplo não sabe que comete o crime tipificado pelo art 1º da Lei 76431987 sujeito à pena de reclusão de 2 a 5 anos e multa Por sua vez no erro de proibição indireto também chamado de 29417 29418 descriminante putativa por erro de proibição o agente conhece o caráter ilícito do fato mas no caso concreto acredita erroneamente estar presente uma causa de exclusão da ilicitude ou se equivoca quanto aos limites de uma causa de exclusão da ilicitude efetivamente presente Exemplo A voltando antecipadamente de viagem e sem prévio aviso encontra a esposa em flagrante adultério Saca seu revólver e mata a mulher acreditando estar autorizado a assim agir pela legítima defesa da honra Finalmente no erro de proibição mandamental o agente envolvido em uma situação de perigo a determinado bem jurídico erroneamente acredita estar autorizado a livrarse do dever de agir para impedir o resultado nas hipóteses previstas no art 13 2º do Código Penal Só é possível nos crimes omissivos impróprios Exemplo o pai de família válido para o trabalho mas em situação de pobreza abandona o filho de pouca idade à sua própria sorte matandoo por acreditar que nesse caso não tem a obrigação de por ele zelar Em todas essas modalidades incidem os efeitos previstos no art 21 caput do Código Penal se inevitável o erro de proibição isenta de pena se evitável autoriza a sua diminuição de um sexto a um terço Erro de proibição e crime putativo por erro de proibição Erro de proibição e crime putativo por erro de proibição não se confundem No erro de proibição o sujeito age acreditando na licitude do seu comportamento quando na verdade pratica uma infração penal por não compreender o caráter ilícito do fato Já no crime putativo por erro de proibição delito de alucinação ou crime de loucura o agente atua acreditando que seu comportamento constitui crime ou contravenção penal mas na realidade é penalmente irrelevante Exemplo o pai mantém relações sexuais consentidas com a filha maior de 18 anos de idade e plenamente capaz acreditando cometer o crime de incesto fato atípico no Direito Penal pátrio Diferença entre erro de tipo e erro de proibição 29419 No erro de tipo disciplinado pelo art 20 do Código Penal o sujeito desconhece a situação fática que o cerca não constatando em sua conduta a presença das elementares de um tipo penal Exemplo A leva para casa por engano um livro de B seu colega de faculdade Por acreditar que o bem lhe pertencia desconhecendo a elementar coisa alheia móvel não comete o crime de furto CP art 155 O erro de tipo escusável ou inescusável exclui o dolo Mas se inescusável subsiste a punição por crime culposo se previsto em lei No erro de proibição o sujeito conhece perfeitamente a situação fática em que se encontra mas desconhece a ilicitude do seu comportamento Consequentemente não afeta o dolo natural Quanto aos seus efeitos o erro de proibição se escusável exclui a culpabilidade diante da ausência da potencial consciência da ilicitude um dos seus elementos E se inescusável subsiste o crime e também a culpabilidade incidindo uma causa de diminuição da pena de um sexto a um terço CP art 21 caput Erro de tipo Erro de proibição Causa O agente desconhece a situação fática o que lhe impede o conhecimento de um ou mais elementos do tipo penal Não sabe o que faz O agente conhece a realidade fática mas não compreende o caráter ilícito da sua conduta Sabe o que faz mas não sabe que viola a lei penal Efeitos Escusável exclui o dolo e a culpa e Inescusável exclui o dolo mas permite a punição por crime culposo se previsto em lei Escusável exclui a culpabilidade e Inescusável não afasta a culpabilidade mas permite a diminuição da pena de 16 a 13 O erro de tipo que incide sobre a ilicitude do fato O erro sobre a ilicitude do fato caracteriza erro de proibição relacionandose com o terreno da culpabilidade Essa é a regra adotada pelo Código Penal Excepcionalmente todavia o preceito primário de um tipo penal inclui na descrição da conduta criminosa elementos normativos de índole jurídica ou mesmo palavras ou expressões atinentes à ilicitude É o que se dá exemplificativamente nos crimes de violação de correspondência CP art 151 indevidamente divulgação de segredo violação do segredo profissional abandono material e abandono intelectual CP arts 153 caput e 2º 154 244 caput e 246 sem justa causa Em tais hipóteses o erro sobre a ilicitude do fato caracteriza erro de tipo com todos os seus efeitos e não erro de proibição porque a ilicitude funciona como elemento do tipo penal O erro portanto incide sobre os elementos do tipo 1 2 3 4 5 6 7 CÓRDOBA RODA Juan El conocimiento de la antijuridicidad en la teoría del delito Barcelona Bosch 1962 p 89 e ss DIAS Jorge de Figueiredo O problema da consciência da ilicitude em direito penal 5 ed Coimbra Coimbra Editora 2000p 469 BITENCOURT Cezar Roberto Erro de tipo e erro de proibição Uma análise comparativa 4 ed São Paulo Saraiva 2007 p 9293 REsp 870055SC rel Min Gilson Dipp 5ª Turma j 27022007 MIRABETE Julio Fabbrini Manual de direito penal Parte geral 24 ed São Paulo Atlas 2007 v 1 p 201 STF AP 481PA rel Min Dias Toffoli Plenário j 08092011 TOLEDO Francisco de Assis O erro no direito penal São Paulo Saraiva 1977 p 97 301 302 CONCEITO A exigibilidade de conduta diversa é o elemento da culpabilidade consistente na expectativa da sociedade acerca da prática de uma conduta diversa daquela que foi deliberadamente adotada pelo autor de um fato típico e ilícito Em síntese é necessário tenha o crime sido cometido em circunstâncias normais isto é o agente podia comportarse em conformidade com o Direito mas preferiu violar a lei penal Destarte quando o caso concreto indicar a prática da infração penal em decorrência de inexigibilidade de conduta diversa estará excluída a culpabilidade pela ausência de um dos seus elementos Atribuise a Reinhart Frank a inserção da exigibilidade de conduta conforme ao Direito no juízo da culpabilidade ao desenvolver em 1907 sua teoria da normalidade das circunstâncias concomitantes1 criando a teoria psicológiconormativa da culpabilidade No Código Penal de 1940 com a Parte Geral alterada pela Lei 72091984 o tratamento normativo da culpabilidade restou manifesto nos institutos da coação moral irresistível e da obediência hierárquica art 22 causas legais de exclusão da culpabilidade motivadas pela inexigibilidade de conduta diversa CAUSAS SUPRALEGAIS DE EXCLUSÃO DA CULPABILIDADE a b Os pioneiros acontecimentos que resultaram no reconhecimento da inexigibilidade de conduta diversa como dirimente se deram na Alemanha no início do século XX 1 cavalo bravio e 2 parteira dos filhos de mineradores Como narra Odin Americano2 Cavalo bravio O proprietário de um cavalo indócil ordenou ao cocheiro que o montasse e saísse a serviço O cocheiro prevendo a possibilidade de um acidente se o animal disparasse quis resistir à ordem O dono o ameaçou de dispensa caso não cumprisse o mandado O cocheiro então obedeceu e uma vez na rua o animal tomoulhe às rédeas e causou lesões em um transeunte O Tribunal alemão absolveu o cocheiro sob o fundamento de que se houve previsibilidade do evento não seria justo todavia exigirse outro proceder do agente Sua recusa em sair com o animal importaria a perda do emprego logo a prática da ação perigosa não foi culposa mercê da inexigibilidade de outro comportamento Parteira dos filhos de mineradores A empresa exploradora de uma mina acordou com os seus empregados que no dia do parto da esposa de um operário este ficaria dispensado do serviço sem prejuízo de seus salários Os operários solicitaram da parteira encarregada dos partos que no caso de nascimento verificado em domingo declarasse no Registro Civil que o parto se verificara em dia de serviço ameaçandoa de não procurar seu mister se não os atendesse Temerosa de ficar sem trabalho a parteira acabou em situação difícil por atender à exigência e tornouse autora de uma série de declarações falsas no Registro de Nascimento Foi absolvida por inexigibilidade de conduta diversa Modernamente tem sido sustentada a possibilidade de formulação de causas excludentes da culpabilidade não previstas em lei ou seja supralegais e distintas da coação moral irresistível e da obediência hierárquica Essas causas supralegais se fundamentam em dois pontos 1 2 a exigibilidade de conduta diversa constituise em princípio geral da culpabilidade que dela não pode se desvencilhar Em verdade não se admite a responsabilização penal de comportamentos inevitáveis e a aceitação se coaduna com a regra nullum crimen sine culpa acolhida pelo art 19 do Código Penal Na precisa lição de Francisco de Assis Toledo A inexigibilidade de outra conduta é pois a primeira e mais importante causa de exclusão da culpabilidade E constitui um verdadeiro princípio de direito penal Quando aflora em preceitos legislados é uma causa legal de exclusão Se não deve ser reputada causa supralegal erigindo se em princípio fundamental que está intimamente ligado com o problema da responsabilidade pessoal e que portanto dispensa a existência de normas expressas a respeito3 São cabíveis nos crimes culposos e também nos dolosos nada obstante sejam mais frequentes nos primeiros Exemplificativamente a mãe viúva que deixa em casa sozinho o filho de pouca idade para trabalhar pois não tem pessoas de confiança para cuidar do menino e não pode contar com o serviço público de creche que se encontra em greve sabe que a criança fatalmente subirá em móveis abrirá armários e praticará outras atividades perigosas sendo previsível que em virtude da sua ausência venha a se machucar Ainda que se fira gravemente não deverá a mãe ser responsabilizada pela lesão corporal culposa em face da inexigibilidade de conduta diversa Com efeito seria inadequado impor a ela comportamento diverso pois em tal caso poderiam faltar os recursos mínimos necessários para o sustento e a sobrevivência própria e de sua prole Essa conclusão também é alicerçada no entendimento do Superior Tribunal de Justiça acerca do assunto A exigibilidade de conduta diversa apesar de apresentar muita polêmica é no entendimento predominante elemento da culpabilidade Por via de consequência sem adentrar na questão dos seus limites a tese da inexigibilidade de conduta diversa pode ser apresentada como causa de exclusão da culpabilidade4 303 COAÇÃO MORAL IRRESISTÍVEL Estabelece o art 22 do Código Penal Se o fato é cometido sob coação irresistível só é punível o autor da coação Esse dispositivo legal nada obstante mencione somente coação irresistível referese exclusivamente à coação moral irresistível Com efeito estabelece em sua parte final ser punível só o autor da coação Em outras palavras diz que o coagido está isento de pena expressão que se coaduna com as dirimentes ou seja causas de exclusão da culpabilidade Na coação moral o coator para alcançar o resultado ilícito desejado ameaça o coagido e este por medo realiza a conduta criminosa Essa intimidação recai sobre sua vontade viciandoa de modo a retirar a exigência legal de agir de maneira diferente Excluise a culpabilidade em face da inexigibilidade de conduta diversa5 Por sua vez na coação física irresistível eliminase por completo a vontade do coagido Seu aspecto volitivo não é meramente viciado mas suprimido e ele passa a atuar como instrumento do crime a serviço do coator Excluise a conduta e consequentemente o próprio fato típico praticado pelo coagido A lei não pode impor às pessoas o dever de atuar de modo heroico Destarte se presente uma ameaça séria grave e irresistível não é razoável exigir o cumprimento literal pelo coagido do direito positivo sob pena de suportar riscos que o Direito não será hábil a reparar A coação moral irresistível depende dos seguintes requisitos 1 Ameaça do coator ou seja promessa de mal grave e iminente o qual o coagido não é obrigado a suportar se o mal é atual com maior razão estará excluída a culpabilidade Essa ameaça deve ser direcionada à pessoa do coagido ou ainda a indivíduos com ele intimamente relacionados Se for dirigida a pessoa estranha pode até ser excluída a culpabilidade em face de causa supralegal fundada na inexigibilidade de conduta diversa Se não bastasse essa ameaça precisa ser séria e ligada a ofensa certa Em suma deve ser passível de realização pouco importando se o coator realmente deseja ou não concretizála 2 Inevitabilidade do perigo na posição em que se encontra o coagido se o perigo puder por outro meio ser evitado seja pela atuação do próprio coagido seja pela força policial não há falar na dirimente 3 Caráter irresistível da ameaça além de grave o mal prometido deve ser irresistível A gravidade e a irresistibilidade da ameaça devem ser aferidas no caso concreto levando em conta as condições pessoais do coagido Tratase em verdade de instituto relacionado com a culpabilidade razão pela qual não se considera a figura imaginária do homem médio voltada ao fato típico e ilícito mas o perfil subjetivo do agente que será então considerado culpável ou não Nada obstante há entendimentos no sentido de que a gravidade e a irresistibilidade da coação devem ser calculadas com base nas características do homo medius 4 Presença de ao menos três pessoas envolvidas devem estar presentes o coator o coagido e a vítima do crime por este praticado No caso do diretor de uma empresa que é obrigado por criminosos a entregar todos os valores que se encontram guardados em um cofre que apenas ele pode abrir sob a ameaça de seu filho em poder de outra pessoa ligada aos assaltantes ser morto os envolvidos são os delinquentes coatores o diretor da empresa coagido e a própria empresa lesada em seu patrimônio vítima Admitese contudo a configuração da dirimente em análise com apenas duas pessoas envolvidas coator e coagido Nesse caso o coator funcionaria também como vítima Exemplo em razão de tão grave e irresistível ameaça para praticar crime no futuro o coagido premido pelo medo e sem outra forma de agir mata o próprio coator Essa situação não se confunde com a legítima defesa De fato estaria afastada a excludente da ilicitude em face da inexistência de agressão atual ou iminente A coação moral irresistível afasta a culpabilidade do coagido autor de um fato típico e ilícito Não há contudo impunidade pelo crime responde somente o coator Tratase de manifestação da autoria mediata pois o coator valeuse de uma pessoa sem culpabilidade inexigibilidade de conduta diversa para realizar uma infração penal Não se pode olvidar ainda que o coator responde além do crime praticado pelo coagido pelo crime de tortura definido pelo art 1º I b da Lei 945519976 em concurso material Inexiste concurso de pessoas entre coator e coagido em face da ausência de vínculo subjetivo Não há por parte do coagido a intenção de contribuir para o crime praticado pelo coator Se entretanto a coação moral for resistível remanesce a culpabilidade do coagido operandose autêntico concurso de agentes entre ele e o coator Frisese todavia que na coação moral resistível enquanto a pena do coator será agravada CP art 62 II a do coagido será atenuada CP art 65 III c 1ª parte 304 É o fundado receio de decepcionar pessoa a quem se deve elevado respeito Exemplo filho que falsifica as notas lançadas no boletim da faculdade com o propósito de esconder as avaliações negativas do conhecimento dos pais que arduamente custeiam seus estudos Não se equipara à coação moral Não há ameaça mas apenas receio Além disso na seara do Direito Civil o temor reverencial sequer permite a anulação dos negócios jurídicos não podendo no campo criminal elidir a culpabilidade OBEDIÊNCIA HIERÁRQUICA Estabelece o art 22 do Código Penal Se o fato é cometido em estrita obediência a ordem não manifestamente ilegal de superior hierárquico só é punível o autor da ordem Obediência hierárquica é a causa de exclusão da culpabilidade fundada na inexigibilidade de conduta diversa que ocorre quando um funcionário público subalterno pratica uma infração penal em decorrência do cumprimento de ordem não manifestamente ilegal emitida pelo superior hierárquico Essa regra se fundamenta em dois pilares 1 impossibilidade no caso concreto de conhecer a ilegalidade da ordem e 2 inexigibilidade de conduta diversa A caracterização da dirimente em apreço depende da verificação dos seguintes requisitos 1 Ordem não manifestamente ilegal é a de aparente legalidade em face da crença de licitude que tem um funcionário público subalterno ao obedecer ao mandamento de superior hierárquico colocado nessa posição em razão de possuir maiores conhecimentos técnicos ou por encontrarse há mais tempo no serviço público Daí falarse que a obediência hierárquica representa uma fusão do erro de proibição acarreta no desconhecimento do caráter ilícito do fato com a inexigibilidade de conduta diversa não se pode exigir do subordinado comportamento diferente Se a ordem for legal não há crime seja por parte do superior hierárquico seja por parte do subalterno Em verdade a atuação deste último estará acobertada pelo estrito cumprimento do dever legal causa de exclusão da ilicitude prevista no art 23 III do Código Penal 2 Ordem originária de autoridade competente o mandamento emana de funcionário público legalmente competente para fazêlo O cumprimento de ordem advinda de autoridade incompetente pode no caso concreto resultar no reconhecimento de erro de proibição invencível ou escusável 3 Relação de Direito Público a posição de hierarquia que autoriza o reconhecimento da excludente da culpabilidade somente existe no Direito Público Não é admitida no campo privado por falta de suporte para punição severa e injustificada àquele que descumpre ordem não manifestamente ilegal emanada de seu superior Essa hierarquia exclusiva da área pública é mais frequente entre os militares O descumprimento de ordem do superior na seara castrense caracteriza motivo legítimo para prisão disciplinar ou até mesmo crime tipificado pelo art 163 do Código Penal Militar 4 Presença de pelo menos três pessoas envolve o mandante da ordem superior hierárquico seu executor subalterno e a vítima do crime por este praticado 5 Cumprimento estrito da ordem o executor não pode ultrapassar por conta própria os limites da ordem que lhe foi endereçada sob pena de afastamento da excludente A propósito dispõe o art 38 2º do Código Penal Militar Se a ordem do superior tem por objeto a prática de ato manifestamente criminoso ou há excesso nos atos ou na forma de execução é punível também o inferior O estrito cumprimento de ordem não manifestamente ilegal de superior hierárquico exclui a culpabilidade do executor subalterno com fulcro na inexigibilidade de conduta diversa O fato contudo não permanece impune pois por ele responde o autor da ordem Imagine a hipótese de um Delegado de Polícia com larga experiência em sua atividade que determina a um investigador de Polícia de sua equipe recém ingressado na instituição a prisão em flagrante de um desafeto autor de um crime de roubo ocorrido há mais de uma semana em relação ao qual não houve perseguição fato desconhecido pelo subordinado O subalterno no caso seja em face do restrito conhecimento do caso concreto seja em respeito ao superior hierárquico em quem muito confia não pode ser responsabilizado devendo o crime ser atribuído exclusivamente ao autor da ordem Inexiste na obediência hierárquica concurso de pessoas entre o mandante e o executor da ordem não manifestamente ilegal por falta da unidade de elemento subjetivo relativamente à produção do resultado Se entretanto a ordem for manifestamente ilegal mandante e executor respondem pela infração penal pois se caracteriza o concurso de agentes Ambos sabem do caráter ilícito da conduta e contribuem para o resultado Para o superior hierárquico incide a agravante genérica descrita pelo art 62 III 1ª parte do Código Penal E no tocante ao subalterno aplicase a atenuante genérica delineada pelo art 65 III c em cumprimento de ordem de autoridade superior do Código Penal Na análise da legalidade ou ilegalidade da ordem deve ser considerado o perfil subjetivo do executor e não os dados comuns ao homem médio porque se trata de questão afeta à culpabilidade na qual sempre se consideram as condições pessoais do agente para se concluir se é ou não culpável 1 2 3 4 5 6 FRANK Reinhart Sobre la estructura del concepto de culpabilidad Buenos Aires B de F 2004 p 28 e ss AMERICANO Odin Da culpabilidade normativa Estudos de direito e processo penal em homenagem a Nélson Hungria Rio de Janeiro Forense 1962 p 348349 TOLEDO Francisco de Assis Princípios básicos de direito penal 5 ed 13 tir São Paulo Saraiva 2007 p 328 HC 16865PE rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 09102001 a inexigibilidade de conduta diversa somente funciona como causa de exclusão da culpabilidade quando proceder de forma contrária à lei se mostrar como única alternativa possível diante de determinada situação Se há outros meios de solução do impasse a exculpante não se caracteriza STJ REsp 1456633RS rel Min Reynaldo Soares da Fonseca 5ª Turma j 05042016 noticiado no Informativo 581 Art 1º Constitui crime de tortura I constranger alguém com emprego de violência ou grave ameaça causandolhe sofrimento físico ou mental b para provocar ação ou omissão de natureza criminosa grifamos As regras inerentes ao concurso de pessoas encontramse disciplinadas pelos arts 29 a 31 do Código Penal Na redação original da Parte Geral do Código Penal isto é anteriormente à entrada em vigor da Lei 72091984 o instituto era denominado simplesmente de coautoria de forma pouco abrangente e imprecisa por desprezar a figura da participação Atualmente o Código Penal fala em concurso de pessoas Várias outras nomenclaturas são também encontradas na doutrina concurso de agentes codelinquência concurso de delinquentes cumplicidade bem como coautoria e participação ambas em sentido lato É a colaboração empreendida por duas ou mais pessoas para a realização de um crime ou de uma contravenção penal O concurso de pessoas depende de cinco requisitos 3141 Pluralidade de agentes culpáveis O concurso de pessoas depende de pelo menos duas pessoas e consequentemente de ao menos duas condutas penalmente relevantes Essas condutas podem ser principais no caso da coautoria ou então uma principal e outra acessória praticadas pelo autor e pelo partícipe respectivamente Os coautores ou partícipes entretanto devem ser culpáveis ou seja dotados de culpabilidade Com efeito a teoria do concurso de pessoas desenvolveuse para solucionar os problemas envolvendo os crimes unissubjetivos ou de concurso eventual que são aqueles em regra cometidos por uma única pessoa mas que admitem o concurso de agentes Nesses delitos a culpabilidade dos envolvidos é fundamental sob pena de caracterização da autoria mediata Como veremos em seguida outro requisito do concurso de pessoas é o vínculo subjetivo entre os agentes exigindo assim que sejam todos culpáveis pois quem não goza desse juízo não tem capacidade para aderir à conduta alheia Exemplificativamente se um maior de 18 anos penalmente capaz encomenda a morte de sua sogra a um menor de idade não há por que falar em concurso de pessoas mas em autoria mediata Nos ensinamentos de Esther de Figueiredo Ferraz a teoria do concurso de pessoas tem por objeto o concurso eventual ou contingente que representa no dizer de ANTOLISEI a hipótese comum ou seja a dos crimes que abstratamente considerados podem ser praticados indiferentemente por um só ou por vários indivíduos Nessa hipótese que corresponde à regra geral se enquadra a maioria dos crimes definidos nas leis penais7 Vale recordar que no tocante aos crimes plurissubjetivos plurilaterais ou de concurso necessário é dizer aqueles em que o tipo penal exige a realização da conduta por dois ou mais agentes a culpabilidade de todos os coautores ou partícipes é prescindível Admitese a presença de um único agente culpável podendo os demais enquadrarse em categoria diversa De fato não se faz necessária a utilização da norma de extensão prevista no art 29 caput do Código Penal uma vez que a presença de duas ou mais pessoas é garantida pelo próprio tipo penal Nessas espécies de crimes não se diz quem de qualquer modo concorre para o crime incide nas penas a este cominadas na medida de sua culpabilidade pois é a própria lei penal incriminadora que por si só reclama a pluralidade de pessoas É o que se dá por exemplo nos crimes de rixa CP art 137 e associação criminosa CP art 288 nos quais o crime estará perfeitamente caracterizado quando existir entre os rixosos ou quadrilheiros pessoas sem culpabilidade desde que algum dos envolvidos seja culpável Da mesma forma nos crimes eventualmente plurissubjetivos aqueles geralmente praticados por uma única pessoa mas que têm a pena aumentada quando praticados em concurso a capacidade de culpa de um dos envolvidos é dispensável Nesses termos incide relativamente ao furto praticado por um maior de idade na companhia de um adolescente a qualificadora prevista no art 155 4º IV do Código Penal Nesses crimes necessariamente plurissubjetivos ou eventualmente plurissubjetivos há portanto um pseudoconcurso concurso impróprio ou concurso aparente de pessoas É o que se extrai da lição de Manzini Não se pode juridicamente falar em participação criminosa se pelo menos dois dentre os concorrentes não forem capazes em termos de direito penal e imputáveis Quando o fato tenha sido cometido por duas pessoas uma das quais não sejam imputável esta não será copartícipe daquela mas um simples instrumento da primeira non agid sed agitur a qual responde sozinha pelo delito cometido8 Concluise pois que para o concurso de pessoas não basta a mera pluralidade de agentes Exigese sejam todos culpáveis 3142 3143 Relevância causal das condutas para a produção do resultado Concorrer para a infração penal importa em dizer que cada uma das pessoas deve fazer algo para que a empreitada tenha vida no âmbito da realidade Em outras palavras a conduta deve ser relevante pois sem ela a infração penal não teria ocorrido como e quando ocorreu O art 29 caput do Código Penal fala em de qualquer modo expressão que precisa ser compreendida como uma contribuição pessoal física ou moral direta ou indireta comissiva ou omissiva anterior ou simultânea à execução Deve a conduta individual influir efetivamente no resultado9 Destarte não pode ser considerado coautor ou partícipe quem assume em relação à infração penal uma atitude meramente negativa quem não dá causa ao crime quem não realiza qualquer conduta sem a qual o resultado não teria se verificado De fato a participação inócua que em nada concorre para a realização do crime é irrelevante para o Direito Penal Anotese que esse requisito relevância causal depende de uma contribuição prévia ou concomitante à execução isto é anterior à consumação A concorrência posterior à consumação configura crime autônomo receptação favorecimento real ou pessoal por exemplo mas não concurso de pessoas Em tema de concurso de pessoas a contribuição pode até ser concretizada após a consumação desde que tenha sido ajustada anteriormente Exemplo A se compromete perante B a auxiliálo a fugir e a escondêlo depois de matar C Será partícipe do homicídio Contudo se somente depois da morte de C se dispuser a ajudálo a subtrairse da ação da autoridade pública não será partícipe do homicídio mas autor do crime de favorecimento pessoal CP art 348 Vínculo subjetivo Esse requisito também chamado de concurso de vontades impõe estejam todos os agentes ligados entre si por um vínculo de ordem subjetiva um nexo psicológico pois caso contrário não haverá um crime praticado em concurso mas vários crimes simultâneos De fato na ausência desta condição estará caracterizada a autoria colateral10 Os agentes devem revelar vontade homogênea visando a produção do mesmo resultado É o que se convencionou chamar de princípio da convergência Logo não é possível a contribuição dolosa para um crime culposo nem a concorrência culposa para um delito doloso O vínculo subjetivo não depende contudo do prévio ajuste entre os envolvidos pactum sceleris Basta a ciência por parte de um agente no tocante ao fato de concorrer para a conduta de outrem scientia sceleris ou scientia maleficii chamada pela doutrina de consciente e voluntária cooperação vontade de participar vontade de coparticipar adesão à vontade de outrem ou concorrência de vontades11 Imagine o seguinte exemplo A fala pelo telefone celular a um amigo que na saída do trabalho irá matar B com golpes de faca C desafeto de B escuta a conversa No final do expediente B percebe que será atacado por A e mais rápido consegue fugir A todavia o persegue e consegue alcançálo provocando sua morte graças à ajuda de C que derrubou B dolosamente circunstância ignorada por A Nesse caso C será partícipe do crime de homicídio praticado por A Fica claro que para a caracterização do vínculo subjetivo é suficiente a atuação consciente do partícipe no sentido de contribuir para a conduta do autor ainda que esta desconheça a colaboração Não se reclama o prévio ajuste muito menos estabilidade na união o que acarretaria a caracterização da associação criminosa CP art 288 se presentes pelo menos três pessoas e o fim específico de cometer crimes Nessa linha decidiu o Supremo Tribunal Federal no famoso caso do mensalão Não procede a alegação da defesa no sentido de que teria havido mero concurso de agentes para a prática em tese dos demais crimes narrados na denúncia lavagem de dinheiro e em alguns casos corrupção passiva Os fatos como narrados pelo ProcuradorGeral da República 3144 a b demonstram a existência de uma associação prévia consolidada ao longo tempo reunindo os requisitos estabilidade e finalidade voltada para a prática de crimes além da união de desígnios entre os acusados12 Unidade de infração penal para todos os agentes Estabelece o art 29 caput do Código Penal Quem de qualquer modo concorre para o crime incide nas penas a este cominadas na medida de sua culpabilidade grifamos Para a caracterização do concurso de pessoas adotouse como regra a teoria unitária monística ou monista quem concorre para um crime por ele responde13 Todos os coautores e partícipes se sujeitam a um único tipo penal há um único crime com diversos agentes Assim se 10 dez pessoas com unidade de desígnios esfaqueiam alguém temse um crime de homicídio nada obstante existam 10 dez coautores A propósito consta do item 25 da Exposição de Motivos da Parte Geral do Código Penal O Código de 1940 rompeu a tradição originária do Código Criminal do Império e adotou neste particular a teoria unitária ou monística do Código italiano como corolário da teoria da equivalência das causas Excepcionalmente contudo o Código Penal abre espaço para a teoria pluralista pluralística da cumplicidade do crime distinto ou autonomia da cumplicidade pela qual se separam as condutas com a criação de tipos penais diversos para os agentes que buscam um mesmo resultado É o que se dá por exemplo nos seguintes crimes aborto provocado por terceiro com o consentimento da gestante ao terceiro executor imputase o crime tipificado no art 126 enquanto para a gestante incide o crime previsto no art 124 in fine bigamia quem já é casado pratica a conduta narrada no art 235 caput ao passo que aquele que não sendo casado contrai casamento com pessoa casada conhecendo essa circunstância incide na figura típica prevista no 1º do citado dispositivo legal c d 3145 3151 corrupção passiva e ativa o funcionário público pratica corrupção passiva art 317 e o particular corrupção ativa art 333 e falso testemunho ou falsa perícia testemunha perito contador tradutor ou intérprete que faz afirmação falsa nega ou cala a verdade em processo judicial ou administrativo inquérito policial ou em juízo arbitral pratica o crime delineado pelo art 342 caput e quem dá oferece ou promete dinheiro ou qualquer outra vantagem a tais pessoas almejando aquela finalidade incide no art 343 caput Em sede doutrinária ainda despontam outras duas teorias dualista e mista Para a teoria dualista idealizada por Vicenzo Manzini no caso de pluralidade de agentes e de condutas diversas provocando um mesmo resultado há dois crimes distintos um para os coautores e outro para os partícipes Por fim para a teoria mista proposta por Francesco Carnelutti O delito concursal é uma soma de delitos singulares cada um dos quais pode ser chamado delito em concurso Entre o delito em concurso e o concursal há a mesma diferença que existe entre a parte e o todo E o traço característico do primeiro reside em que ele não constitui uma entidade autônoma mas elemento de um delito complexo que é o concursal14 Existência de fato punível O concurso de pessoas depende da punibilidade de um crime a qual requer em seu limite mínimo o início da execução Tal circunstância constitui o princípio da exterioridade Nessa linha de raciocínio dispõe o art 31 do Código Penal O ajuste a determinação ou instigação e o auxílio salvo disposição expressa em contrário não são puníveis se o crime não chega pelo menos a ser tentado Teorias Existem diversas teorias que buscam fornecer o conceito de autor a teoria subjetiva ou unitária não diferencia o autor do partícipe Autor é aquele que de qualquer modo contribuir para a produção de um resultado penalmente relevante Seu fundamento repousa na teoria da equivalência dos antecedentes ou conditio sine qua non pois qualquer colaboração para o resultado independente do seu grau a ele deu causa Essa teoria foi adotada pelo Código Penal em sua redação primitiva datada de 1940 Uma evidência dessa posição ainda existe no art 349 do Código Penal não alterado pela Lei 72091984 Prestar a criminoso fora dos casos de coautoria ou de receptação auxílio destinado a tornar seguro o proveito do crime grifamos b teoria extensiva também se fundamenta na teoria da equivalência dos antecedentes não distinguindo o autor do partícipe É todavia mais suave porque admite causas de diminuição da pena para estabelecer diversos graus de autoria Aparece nesse âmbito a figura do cúmplice autor que concorre de modo menos importante para o resultado c teoria objetiva ou dualista opera nítida distinção entre autor e partícipe Foi adotada pela Lei 72091984 Reforma da Parte Geral do Código Penal como se extrai do item 25 da Exposição de Motivos Sem completo retorno à experiência passada curvase contudo o Projeto aos críticos desta teoria ao optar na parte final do art 29 e em seus dois parágrafos por regras precisas que distinguem a autoria da participação Distinção aliás reclamada com eloquência pela doutrina em face de decisões reconhecidamente injustas Essa teoria subdividese em outras três c1 teoria objetivoformal autor é quem realiza o núcleo verbo do tipo penal ou seja a conduta criminosa descrita pelo preceito primário da norma incriminadora Por sua vez partícipe é quem de qualquer modo concorre para o crime sem praticar o núcleo do tipo Exemplo quem efetua disparos de revólver em alguém matandoo é autor do crime de homicídio Por sua vez aquele que empresta a arma de fogo para essa finalidade é partícipe de tal crime Destarte a atuação do partícipe seria impune no exemplo fornecido a conduta de auxiliar a matar não encontra correspondência imediata no crime de homicídio se não existisse a norma de extensão pessoal prevista no art 29 caput do Código Penal A adequação típica na participação é de subordinação mediata Nesse contexto o autor intelectual é dizer aquele que planeja mentalmente a conduta criminosa é partícipe e não autor eis que não executa o núcleo do tipo penal Essa teoria é a preferida pela doutrina nacional e tem o mérito de diferenciar precisamente a autoria da participação Falha todavia ao deixar em aberto o instituto da autoria mediata Autoria mediata é a modalidade de autoria em que o autor realiza indiretamente o núcleo do tipo valendose de pessoa sem culpabilidade ou que age sem dolo ou culpa c2 teoria objetivomaterial autor é quem presta a contribuição objetiva mais importante para a produção do resultado e não necessariamente aquele que realiza no núcleo do tipo penal De seu turno partícipe é quem concorre de forma menos relevante ainda que mediante a realização do núcleo do tipo c3 teoria do domínio do fato criada em 1939 por Hans Welzel com o propósito de ocupar posição intermediária entre as teorias objetiva e subjetiva Para essa concepção autor é quem possui controle sobre o domínio final do fato domina finalisticamente o trâmite do crime e decide acerca da sua prática suspensão interrupção e condições De fato autor é aquele que tem a capacidade de fazer continuar e de impedir a conduta penalmente ilícita15 Nas lições do pai do finalismo penal Senhor do fato é aquele que o realiza em forma final em razão de sua decisão volitiva A conformação do fato mediante a vontade de realização que dirige em forma planificada é o que transforma o autor em senhor do fato16 a b c d A teoria do domínio do fato amplia o conceito de autor definindoo como aquele que tem o controle final do fato ainda que não realize o núcleo do tipo penal Por corolário o conceito de autor compreende o autor propriamente dito é aquele que pratica o núcleo do tipo penal o autor intelectual é aquele que planeja mentalmente a empreitada criminosa É autor e não partícipe pois tem poderes para controlar a prática do fato punível Exemplo o líder de uma organização criminosa pode do interior de um presídio determinar a prática de um crime por seus seguidores Se e quando quiser pode interromper a execução do delito e retomála quando melhor lhe aprouver o autor mediato é aquele que se vale de um inculpável ou de pessoa que atua sem dolo ou culpa para cometer a conduta criminosa e os coautores a coautoria ocorre nas hipóteses em que o núcleo do tipo penal é realizado por dois ou mais agentes Coautor portanto é aquele que age em colaboração recíproca e voluntária com o outro ou os outros para a realização da conduta principal o verbo do tipo penal Essa teoria também admite a figura do partícipe Partícipe no campo da teoria do domínio do fato é quem de qualquer modo concorre para o crime desde que não realize o núcleo do tipo penal nem possua o controle final do fato Dentro de uma repartição estratificada de tarefas o partícipe seria um simples concorrente acessório Em suma o partícipe só possui o domínio da vontade da própria conduta tratandose de um colaborador uma figura lateral não tendo o domínio finalista do crime O delito não lhe pertence ele colabora no crime alheio17 Em face de sua finalidade a teoria do domínio do fato somente tem aplicação nos crimes dolosos Com efeito essa teoria não se encaixa no perfil dos crimes culposos pois 3152 não se pode conceber o controle final de um fato não desejado pelo autor da conduta18 A teoria do domínio do fato portanto é acometida da mesma deficiência da teoria finalista da conduta criticada por não se encaixar nesses delitos Como destaca José Cerezo Mir Mas tropeça com dificuldades nos delitos imprudentes porque neles não se pode falar de domínio do fato já que o resultado se produz de modo cego causal não finalista Por este motivo Welzel se viu obrigado a desdobrar o conceito de autor Nos delitos imprudentes é autor todo aquele que contribui para a produção do resultado com uma conduta que não responde ao cuidado objetivamente devido Nos delitos dolosos é autor quem tem o domínio finalístico do fato19 É preciso destacar para afastar a responsabilidade penal objetiva que a teoria do domínio do fato não preceitua que a mera posição de um agente na escala hierárquica sirva para demonstrar ou reforçar seu dolo e também não permite a condenação de quem quer que seja com base em meras conjecturas desprovidas de suporte probatório É indispensável a individualização da conduta de todos os envolvidos na empreitada criminosa inclusive com a demonstração do dolo de cada um deles20 Teoria adotada pelo Código Penal O art 29 caput do Código Penal acolheu a teoria restritiva no prisma objetivoformal Em verdade diferencia autor e partícipe Aquele é quem realiza o núcleo do tipo penal este é quem de qualquer modo concorre para o crime sem executar a conduta criminosa A teoria deve todavia ser complementada pela teoria da autoria mediata21 Contudo é preciso destacar que no julgamento da Ação Penal 470 o famoso caso do mensalão alguns ministros do STF se filiaram à teoria do domínio do fato Essa teoria também ganhou força com a edição da Lei 128502013 Lei do Crime Organizado mais especificamente em seu art 2º 3º A pena é agravada para quem exerce o comando individual ou coletivo da organização criminosa ainda que não pratique pessoalmente atos de execução O art 29 caput do Código Penal filiouse à teoria unitária ou monista Todos os que concorrem para um crime por ele respondem Há pluralidade de agentes e unidade de crime Assim sendo todos os envolvidos em uma infração penal por ela são responsáveis Exemplo quatro indivíduos cometeram em concurso um crime de homicídio simples CP art 121 caput Sujeitarseão às penas de 6 seis a 20 vinte anos de reclusão A identidade de crime contudo não importa automaticamente em identidade de penas O art 29 caput do Código Penal curvouse ao princípio da culpabilidade ao empregar em sua parte final a expressão na medida de sua culpabilidade Nesses termos as penas devem ser individualizadas no caso concreto levandose em conta o sistema trifásico delineado pelo art 68 do Código Penal Exemplificativamente um reincidente e portador de péssimos antecedentes deve suportar uma reprimenda mais elevada do que a imposta a um réu primário e sem antecedentes criminais Para o Supremo Tribunal Federal A circunstância judicial culpabilidade disposta no art 59 do CP atende ao critério constitucional da individualização da pena Com base nessa orientação o Plenário indeferiu habeas corpus em que se pleiteava o afastamento da mencionada circunstância judicial Consignouse que a previsão do aludido dispositivo legal atinente à culpabilidade mostrarse ia afinada com o princípio maior da individualização porquanto a análise judicial das circunstâncias pessoais do réu seria indispensável à adequação temporal da pena em especial nos crimes perpetrados em concurso de pessoas nos quais se exigiria que cada um respondesse tão somente na medida de sua culpabilidade CP art 29 Afirmouse que o dimensionamento desta quando cotejada com as demais circunstâncias descritas no art 59 do CP revelaria ao magistrado o grau de censura pessoal do réu na prática do ato delitivo Aduziuse que ao contrário do que sustentado a ponderação acerca das circunstâncias judiciais do crime atenderia ao princípio da proporcionalidade e representaria verdadeira limitação da discricionariedade judicial na tarefa individualizadora da penabase22 Ademais é importante destacar que um autor ou coautor não necessariamente deverá ser punido mais gravemente do que um partícipe O fator decisivo para tanto é o caso concreto levandose em conta a culpabilidade de cada agente Nesse sentido um autor intelectual partícipe normalmente deve ser punido de forma mais severa do que o autor do delito pois sem a sua vontade sem a sua ideia o crime não ocorreria O próprio Código Penal revela filiarse a esse entendimento no tocante ao autor intelectual ao dispor no art 62 I A pena será ainda agravada em relação ao agente que promove ou organiza a cooperação no crime ou dirige a atividade dos demais agentes Em suma o autor intelectual além de responder pelo mesmo crime imputado ao autor tem contra si por mandamento legal uma agravante genérica Também chamada de desvios subjetivos entre os agentes ou participação em crime menos grave está descrita pelo art 29 2º do Código Penal Se algum dos concorrentes quis participar de crime menos grave serlheá aplicada a pena deste essa pena será aumentada até a 12 metade na hipótese de ter sido previsível o resultado mais grave Esse dispositivo pode ser fracionado em duas partes 1ª parte Se algum dos concorrentes quis participar de crime menos grave serlheá aplicada a pena deste Essa regra constituise em corolário lógico da teoria unitária ou monista adotada pelo art 29 caput do Código Penal Destinase ainda a afastar a responsabilidade objetiva no concurso de pessoas A interpretação a ser dada é a seguinte dois ou mais agentes cometeram dois ou mais crimes Em relação a algum deles o mais grave entretanto não estavam ligados pelo vínculo subjetivo isto é não tinham unidade de propósitos quanto à produção do resultado Vejamos um exemplo A e B combinam a prática do furto de um automóvel que estava estacionado em via pública Chegam ao local e quando tentavam abrir a porta do veículo surge seu proprietário A foge mas B que trazia consigo um revólver circunstância que não havia comunicado ao seu comparsa atira na vítima matandoa Nesse caso A deve responder por tentativa de furto CP art 155 cc o art 14 II e B por latrocínio consumado CP art 157 3º II Se um dos concorrentes quis participar de crime menos grave diz a lei penal é porque em relação a ele não há concurso de pessoas O vínculo subjetivo existia somente no tocante ao crime menos grave Vedase destarte a responsabilidade penal objetiva pois não se permite a punição de um agente por crime praticado exclusivamente por outrem frente ao qual não agiu com dolo ou culpa Finalmente o Código Penal empregou a palavra concorrente de forma genérica com o escopo de englobar tanto o autor como o partícipe ou seja a pessoa que de qualquer modo concorra para o crime 2ª parte Essa pena será aumentada até a 12 metade na hipótese de ter sido previsível o resultado mais grave Diz o Código Penal que o crime mais grave não pode ser imputado em hipótese alguma àquele que apenas quis participar de um crime menos grave Esse mandamento legal deve ser interpretado em sintonia com o anterior Quando o crime mais grave não era previsível a algum dos concorrentes ele responde somente pelo crime menos grave sem qualquer majoração da pena É o que ocorre no exemplo já mencionado Agora ainda que fosse o crime mais grave previsível àquele que concorreu exclusivamente ao crime menos grave subsistirá apenas em relação a este a responsabilidade penal Por se tratar contudo de conduta mais reprovável a pena do crime menos grave poderá ser aumentada até a 12 metade Muita atenção o agente continua a responder somente pelo crime menos grave embora com a pena aumentada até a metade A ele não pode ser imputado o crime mais grave pois em relação a este delito não estava ligado com a terceira pessoa pelo vínculo subjetivo Imaginemos que no exemplo indicado A tivesse agido da mesma forma isto é queria cometer um furto e evadiuse com a chegada da vítima Era objetivamente previsível contudo o resultado mais grave latrocínio pois tinha ciência de que B andava armado com frequência e já tinha matado diversas pessoas Se não concorreu para o resultado mais grave pois não quis dele participar responde pela tentativa de furto com a pena aumentada da metade em face da previsibilidade do latrocínio Vale a pena acompanhar uma situação real enfrentada pelo Superior Tribunal de Justiça Se a intenção do agravante era a de praticar o crime de furto sendo que o emprego de grave ameaça por um dos corréus ocorreu fora do âmbito de sua atuação na prática criminosa uma vez que estava em local diverso quando houve a aludida ameaça não lhe pode ser estendida esta elementar mas deve responder na medida da sua culpabilidade segundo a cooperação dolosamente distinta prevista no art 29 2º do Código Penal Situação concreta em que segundo expresso no acórdão recorrido a intenção dos coautores entre eles o agravante era a de praticar um crime de furto Quando da execução do crime o agravante não entrou no local de onde foram subtraídos os bens mas ficou aguardando numa motocicleta para que pudessem empreender fuga No curso da ação criminosa perpetrada diretamente pelos outros dois corréus um deles ao se deparar com a caseira no interior da propriedade utilizouse de grave ameaça para garantir a detenção das coisas subtraídas Hipótese em que deve incidir a causa de aumento prevista no referido dispositivo tendo em vista a afirmação contida no julgado combatido de que em razão da presença de uma pessoa na propriedade onde estavam os bens a serem subtraídos era previsível a possibilidade de ocorrência de resultado mais grave23 3181 Essa previsibilidade deve ser aferida de acordo com o juízo do homem médio ou seja o resultado mais grave será previsível quando a sua visão prévia era possível a um ser humano dotado de prudência razoável e inteligência comum Coautoria É a forma de concurso de pessoas que se caracteriza pela existência de dois ou mais autores unidos entre si pela busca do mesmo resultado Exemplo A e B por motivo torpe efetuam disparos de arma de fogo contra C causando a morte deste São coautores do crime tipificado pelo art 121 2º I do Código Penal A coautoria pode ser parcial ou direta Coautoria parcial ou funcional é aquela em que os diversos agentes praticam atos diversos os quais somados produzem o resultado almejado Exemplo A segura a vítima enquanto B a esfaqueia acarretando na sua morte Por sua vez na coautoria direta ou material os agentes realizam atos iguais visando a produção do resultado previsto em lei Exemplo A e B golpeiam C com uma faca matandoo Crimes próprios ou especiais são aqueles em que o tipo penal exige uma situação de fato ou de direito diferenciada por parte do sujeito ativo Apenas quem reúne as condições especiais previstas na lei pode praticálo É o caso do peculato CP art 312 cujo sujeito ativo deve ser funcionário público e também do infanticídio CP art 123 que precisa ser praticado pela mãe durante o parto ou logo após sob a influência do estado puerperal Crimes de mão própria de atuação pessoal ou de conduta infungível de outro lado são os que somente podem ser praticados pelo sujeito expressamente indicado pelo tipo penal Podese apontar o exemplo do falso testemunho CP art 342 Os crimes próprios podem ser praticados em coautoria É possível que duas ou mais pessoas dotadas das condições especiais reclamadas pela lei executem conjuntamente o núcleo do tipo É o caso de dois funcionários públicos que juntos subtraem bens pertencentes à Administração Pública Mas não é só Nada impede seja um crime próprio cometido por uma pessoa que preencha a situação fática ou jurídica exigida pela lei em concurso com terceira pessoa sem essa qualidade Exemplo A funcionário público convida B particular para lhe ajudar a subtrair um computador que se encontra no gabinete da repartição pública em que trabalha B ciente da condição de funcionário público de A ajudao a ingressar no local e a transportar o bem até a sua casa Ambos respondem por peculato Essa conclusão se coaduna com a regra traçada pelo art 30 do Código Penal por ser a condição de funcionário público elementar do peculato comunicase a quem participa do crime desde que dela tenha conhecimento Os crimes de mão própria por sua vez são incompatíveis com a coautoria Com efeito podem ser praticados exclusivamente pela pessoa taxativamente indicada pelo tipo penal Por corolário ninguém mais pode com ela executar o núcleo do tipo Em um falso testemunho proferido em ação penal a título ilustrativo o advogado ou membro do Ministério Público não têm como negar ou calar a verdade juntamente com a testemunha Apenas ela poderá fazêlo Existe somente uma exceção a esta regra relativa ao crime de falsa perícia CP art 342 praticado em concurso por dois ou mais peritos contadores tradutores ou intérpretes como na hipótese em que dois peritos subscrevem dolosamente o mesmo laudo falso Tratase de crime de mão própria cometido em coautoria24 Executor de reserva é o agente que acompanha presencialmente a execução da conduta típica ficando à disposição se necessário para nela intervir Se intervier será tratado como coautor e em caso negativo como partícipe Exemplo A munido de uma faca e B com um revólver aguardam em tocaia a passagem de C Quando este passa pela emboscada A parte em sua direção para matálo enquanto B de arma em punho aguarda eventual e necessária atuação Se agir será coautor se não partícipe É a espécie de coautoria que ocorre quando a conduta iniciada em autoria única se consuma com a colaboração de outra pessoa com forças concentradas mas sem prévio e determinado ajuste Marcello Jardim Linhares apresenta o seguinte exemplo Se um dos agentes em situação de imoderação dolosa golpeou a vítima com socos e pontapés na cabeça jogandoa ao chão e mais adiante seu companheiro também em estado de excesso doloso atingea outra vez na cabeça com a coronha de uma espingarda respondem ambos em coautoria sucessiva pelo resultado de lesões corporais graves25 Esse assunto também não é pacífico Há duas posições 1ª posição É possível a coautoria em crimes omissivos sejam eles próprios ou puros ou ainda impróprios espúrios ou comissivos por omissão Para o aperfeiçoamento da coautoria basta que dois ou mais agentes vinculados pela unidade de propósitos prestem contribuições relevantes para a produção do resultado realizando atos de execução previstos na lei penal Filiamse a essa corrente dentre outros Cezar Roberto Bitencourt26 e Guilherme de Souza Nucci que exemplifica Duas pessoas podem caminhando pela rua depararse com outra ferida em busca de ajuda Associadas uma conhecendo a conduta da outra e até havendo incentivo recíproco resolvem ir embora São coautoras do crime de omissão de socorro art 135 CP27 2ª posição Não se admite a coautoria em crimes omissivos qualquer que seja a sua natureza De acordo com essa posição a coautoria não é possível nos crimes omissivos porque cada um dos sujeitos detém o seu dever de agir imposto pela lei a todos nos próprios ou pertencente a pessoas determinadas CP art 13 2º nos impróprios ou comissivos por omissão de modo individual indivisível e indelegável Nilo Batista defende com veemência esse entendimento O dever de atuar a que está adstrito o autor do delito omissivo é indecomponível Por outro lado como diz Bacigalupo a falta de ação priva de sentido o pressuposto fundamental da coautoria que é a divisão do trabalho assim no es concebible que alguien omita una parte mientras otros omiten el resto Quando dois médicos omitem ainda que de comum acordo denunciar moléstia de notificação compulsória de que tiveram ciência art 269 CP temos dois autores diretos individualmente consideráveis A inexistência do acordo que de resto não possui qualquer relevância típica deslocaria para uma autoria colateral sem alteração substancial na hipótese No famoso exemplo de Kaufmann dos cinquenta nadadores que assistem passivamente ao afogamento do menino temos cinquenta autores diretos da omissão de socorro A solução não se altera se se transferem os casos para a omissão imprópria pai e mãe que deixam o pequeno filho morrer à míngua de alimentação são autores diretos do homicídio a omissão de um não completa a omissão do outro o dever de assistência não é violado em 50 por cada qual28 O Código Penal em vigor não disciplinou expressamente a autoria mediata Cuidase assim de construção doutrinária Tratase da espécie de autoria em que alguém o sujeito de trás29 se utiliza para a execução da infração penal de uma pessoa inculpável ou que atua sem dolo ou culpa Há dois sujeitos nessa relação 1 autor mediato quem ordena a prática do crime e 2 autor imediato aquele que executa a a b c d e conduta criminosa Exemplo A desejando matar sua esposa entrega uma arma de fogo municiada a B criança de pouca idade dizendolhe que se apertar o gatilho na cabeça da mulher esta lhe dará balas Quando se fala em pessoa sem culpabilidade aí se insere qualquer um dos seus elementos imputabilidade potencial consciência da ilicitude e exigibilidade de conduta diversa Ausente um deles ausente a culpabilidade A pessoa que atua sem discernimento seja por ausência de culpabilidade seja pela falta de dolo ou culpa funciona como mero instrumento do crime Inexiste vínculo subjetivo requisito indispensável para a configuração do concurso de agentes Não há portanto concurso de pessoas Somente ao autor mediato pode ser atribuída a propriedade do crime30 Em suma o autor imediato não é punível A infração penal deve ser imputada apenas ao autor mediato Nada impede todavia a coautoria mediata e participação na autoria mediata Exemplos A e B pedem a C inimputável que mate alguém coautoria mediata ou então A induz B ambos imputáveis a pedir a C menor de idade a morte de outra pessoa participação na autoria mediata O Código Penal possui cinco situações em que pode ocorrer a autoria mediata inimputabilidade penal do executor por menoridade penal embriaguez ou doença mental CP art 62 III coação moral irresistível CP art 22 obediência hierárquica CP art 22 erro de tipo escusável provocado por terceiro CP art 20 2º e erro de proibição escusável provocado por terceiro CP art 21 caput E além delas outros casos podem ocorrer nas hipóteses em que o agente atua sem dolo ou culpa tais como na coação física irresistível no sonambulismo e na hipnose 318151 318152 Autoria mediata e crimes culposos A autoria mediata é incompatível com os crimes culposos por uma razão bastante simples nesses crimes o resultado naturalístico é involuntariamente produzido pelo agente Consequentemente não se pode conceber a utilização de um inculpável ou de pessoa sem dolo ou culpa para funcionar como instrumento de um crime cujo resultado o agente não quer nem assume o risco de produzir É da essência da autoria mediata portanto a prática de um crime doloso31 Autoria mediata crimes próprios e de mão própria Crimes próprios ou especiais são aqueles em que o tipo penal exige uma situação fática ou jurídica específica por parte do sujeito ativo Somente quem reúne condições diferenciadas pode praticálo É o caso do peculato CP art 312 cujo sujeito ativo deve ser funcionário público e também do infanticídio CP art 123 que precisa ser praticado pela mãe Por outro lado crimes de mão própria de atuação pessoal ou de conduta infungível são aqueles que somente podem ser praticados pelo sujeito expressamente indicado pelo tipo penal Podese apontar o exemplo do falso testemunho CP art 342 que deve ser executado apenas pela testemunha Entendese pela admissibilidade da autoria mediata nos crimes próprios desde que o autor mediato detenha todas as qualidades ou condições pessoais reclamadas pelo tipo penal Nesse sentido um funcionário público pode se valer de um subalterno sem culpabilidade em decorrência da obediência hierárquica para praticar um peculato subtraindo bens que se encontram sob a custódia da Administração Pública Todavia prevalece o entendimento de que a autoria mediata é incompatível com os crimes de mão própria porque a conduta somente pode ser praticada pela pessoa diretamente indicada pelo tipo penal A infração penal não pode ter a sua execução delegada a outrem No exemplo do falso testemunho uma testemunha não poderia colocar terceira pessoa para negar a verdade em seu lugar Essa regra contudo comporta exceções que podem surgir no caso concreto Confirase o raciocínio de Rogério Greco imaginese a hipótese em que a testemunha seja coagida irresistivelmente a prestar um depoimento falso para beneficiar o autor da coação Nesse caso de acordo com a norma constante do art 22 do Código Penal somente será punido o autor da coação sendo este portanto um caso de autoria mediata32 É assim definida por Zaffaroni É autor por determinação o sujeito que determina outro ao fato mas que conserva seu domínio posto que se o perde como no caso em que o determinado comete um delito já não é autor mas instigador33 Esse conceito foi mais precisamente definido pelo penalista argentino na obra publicada no Brasil em conjunto com José Henrique Pierangeli Zaffaroni e Pierangeli não admitem a figura da autoria mediata nos crimes próprios e de mão própria E apresentam o seguinte exemplo para elucidar o instituto da autoria por determinação Por tratarse de delicta propria tampouco pode ser autor aquele que sem ser funcionário valese de um funcionário público para cometer um delito de corrupção passiva quando o funcionário age em erro de tipo porque crê que aquilo que lhe é entregue não tem valor econômico por exemplo Mas também não pode ser punido como instigador porque o funcionário age atipicamente e portanto falta o injusto de que a instigação deve ser acessória No caso acima narrado as regras inerentes à autoria ou à participação implicariam na impunidade do particular Os ilustres penalistas então questionam O agente não concorre de qualquer modo para o delito Respondem afirmativamente concluindo que o particular não é autor nem partícipe do delito mas sim autor da determinação para o crime e essa autoria de determinação é uma forma de concorrer para o crime Em seguida encerram o raciocínio da seguinte maneira Deve ficar claro que não se trata de autoria do delito mas de um tipo especial de concorrência em que o autor só pode ser apenado como autor da determinação em si e não do delito a que tenha determinado o sujeito não é apenado como autor de corrupção passiva mas como autor da determinação à corrupção passiva34 Autor por determinação é portanto quem se vale de outro que não realiza conduta punível por ausência de dolo em um crime de mão própria ou ainda o sujeito que não reúne as condições legalmente exigidas para a prática de um crime próprio quando se utiliza de quem possui tais qualidades e se comporta de forma atípica ou acobertado por uma causa de exclusão da ilicitude ou da culpabilidade Deve ser imputado ao autor de determinação o resultado produzido pois a ele de qualquer modo concorreu em consonância com a regra prevista no art 29 caput do Código Penal Cuidase de categoria oriunda da doutrina alemã e intimamente relacionada com a teoria do domínio do fato constituindose em autoria mediata particular ou autoria mediata especial Nessa linha de raciocínio é autor de escritório o agente que transmite a ordem a ser executada por outro autor direto dotado de culpabilidade e passível de ser substituído a qualquer momento por outra pessoa no âmbito de uma organização ilícita de poder Exemplo o líder do PCC Primeiro Comando da Capital em São Paulo ou do CV Comando Vermelho no Rio de Janeiro dá as ordens a serem seguidas por seus comandados É ele o autor de escritório com poder hierárquico sobre seus soldados essa modalidade de autoria também é muito comum nos grupos terroristas Assim se manifestam Zaffaroni e Pierangeli sobre a autoria de escritório Esta forma de autoria mediata pressupõe uma máquina de poder que pode ocorrer tanto num Estado em que se rompeu com toda a legalidade como numa organização paraestatal um Estado dentro do Estado ou como uma máquina de poder autônoma mafiosa por exemplo Não se trata de qualquer associação para delinquir e sim de uma organização caracterizada pelo aparato de seu poder hierarquizado e pela fungibilidade de seus membros se a pessoa determinada não cumpre a ordem outro a cumprirá o próprio determinador faz parte da organização35 Esta teoria é apresentada por Claus Roxin e funciona como a base do conceito de autoria de escritório fornecido por Eugenio Raúl Zaffaroni para solucionar as questões inerentes ao concurso de pessoas nas estruturas organizadas de poder compreendidas como aparatos à margem da legalidade Nas organizações criminosas não raras vezes é difícil punir os detentores do comando situados no ápice da pirâmide hierárquica pois tais pessoas não executam as condutas típicas Ao contrário utilizamse de indivíduos dotados de culpabilidade para a prática dos crimes Nesse contexto o penalista alemão tem como ponto de partida a teoria do domínio do fato e amplia o alcance da autoria mediata para legitimar a responsabilização do autor direto do crime bem como do seu mandante quando presente uma relação de subordinação entre eles no âmbito de uma estrutura organizada de poder ilícito situada às margens do Estado São suas palavras Aqui se vai a tratar inicialmente de outra manifestação do domínio mediato do fato que até agora não tem sido nem sequer mencionada pela doutrina e pela jurisprudência o domínio da vontade em virtude de estruturas organizadas de poder Assim se alude às hipóteses em que o sujeito de trás autor mediato tem à sua disposição uma indústria de pessoas e com cuja ajuda pode cometer seus crimes sem ter que delegar sua realização à decisão autônoma do executor Cabe afirmar pois que quem é empregado em uma indústria organizada em qualquer lugar de uma maneira tal que pode impor ordens aos seus subordinados é autor mediato em virtude do domínio da vontade que lhe 3182 corresponde se utiliza suas competências para que se cometam delitos É irrelevante se o faz por sua própria iniciativa ou no interesse de instâncias superiores pois à sua autoria o ponto decisivo é a circunstância de que pode dirigir a parte da organização que lhe é conferida sem ter que deixar a critério de outros indivíduos a realização do crime36 Verificase quando o agente tem conhecimento da norma penal mas decide transgredila por questões de consciência política religiosa filosófica ou de qualquer outra natureza É o que se dá na hipótese em que a mãe de uma criança de pouca idade por motivos religiosos impede a transfusão de sangue capaz de salvar a vida do seu filho acarretando sua responsabilização pelo crime de homicídio em face da omissão penalmente relevante CP art 13 2º alínea a Participação É a modalidade de concurso de pessoas em que o sujeito não realiza diretamente o núcleo do tipo penal mas de qualquer modo concorre para o crime É portanto qualquer tipo de colaboração desde que não relacionada à prática do verbo contido na descrição da conduta criminosa Exemplo é partícipe de um homicídio aquele que ciente do propósito criminoso do autor e disposto a com ele colaborar empresta uma arma de fogo municiada para ser utilizada na execução do delito Portanto a participação reclama dois requisitos 1 propósito de colaborar para a conduta do autor principal e 2 colaboração efetiva por meio de um comportamento acessório que concorra para a conduta principal Inicialmente a participação pode ser moral ou material Participação moral é aquela em que a conduta do agente restringese a induzir ou instigar terceira pessoa a cometer uma infração penal Não há colaboração com meios materiais mas apenas com ideias de natureza penalmente ilícitas Induzir é fazer surgir na mente de outrem a vontade criminosa até então inexistente Exemplo A narra a B sua inimizade com C criada em razão de uma rivalidade esportiva antiga B o induz a matar seu desafeto dizendo ser o único meio adequado para se livrar desse problema Instigar é reforçar a vontade criminosa que já existe na mente de outrem No exemplo citado A diz a B que deseja matar C sendo por ele estimulado a prosseguir em seu intento O induzimento e a instigação devem ser relacionados à prática de crime determinado e direcionados a pessoa ou pessoas determinadas Em suma o partícipe deve criar ou reforçar frente a um indivíduo determinado o cometimento de uma infração penal também determinada Assim sendo se alguém induzir ou instigar pessoas indeterminadas à realização de um crime necessariamente determinado não será tratado como partícipe mas como autor de incitação ao crime figura delineada pelo art 286 do Código Penal Além disso como o induzimento e a instigação se limitam ao aspecto moral da pessoa normalmente ocorrem na fase da cogitação Nada impede entretanto sejam efetivados durante os atos preparatórios E relativamente à instigação é possível a sua verificação até mesmo durante a execução principalmente para impedir a desistência voluntária e o arrependimento eficaz Exemplo A atinge B em uma de suas pernas com um tiro Para e reflete se prossegue ou não na execução do crime Nesse instante surge C para reforçar o propósito criminoso já existente encorajando o autor a consumar o delito Frisese ser o induzimento incompatível com os atos executórios Com efeito se o autor já iniciou a execução é porque já tinha em mente a ideia criminosa Por sua vez na participação material a conduta do sujeito consiste em prestar auxílio ao autor da infração penal a b Auxiliar consiste em facilitar viabilizar materialmente a execução da infração penal sem realizar a conduta descrita pelo núcleo do tipo Exemplo levar o autor ao local da emboscada com a finalidade de assegurar a prática de um crime de homicídio O partícipe que presta auxílio é chamado de cúmplice O auxílio pode ser efetuado durante os atos preparatórios ou executórios mas nunca após a consumação salvo se ajustado previamente Deveras o auxílio posterior à consumação mas objeto de ajusto prévio entre os agentes caracteriza participação De seu turno o auxílio posterior à consumação porém não ajustado antecipadamente não configura participação e sim o crime autônomo de favorecimento pessoal definido no art 348 do Código Penal Vejamos dois exemplos João e Maria convencionam a morte de Pedro No horário e local acertados aquele atira contra a vítima e sua comparsa o encontra de carro instantes após a execução do crime e fogem juntos para outra cidade João é autor do homicídio no qual Maria figura como partícipe e Paulo mata Antonio Fernanda que não estava ciente do crime encontra o homicida logo após a prática do fato e o leva para outra cidade com a finalidade de evitar a sua prisão João é autor do homicídio e Maria responde pelo delito de favorecimento pessoal A conduta do partícipe tem natureza acessória pois sua existência pressupõe a conduta do autor de natureza principal Sem a conduta principal praticada pelo autor a atuação do partícipe em regra é penalmente irrelevante Exemplificativamente não há crime na simples conduta de mandar matar alguém se a ordem não for cumprida pelo seu destinatário Nesses termos a conduta acessória do partícipe somente adquire eficácia penal quando adere à conduta principal do autor A adequação típica tem subordinação mediata por força da norma de extensão pessoal prevista no art 29 caput do Código Penal37 A acessoriedade da conduta do partícipe é consagrada pelo art 31 do Código Penal O ajuste a determinação ou instigação e o auxílio salvo disposição expressa em contrário não são puníveis se o crime não chega pelo menos a ser tentado grifamos Para a punição do partícipe portanto deve ser iniciada a execução do crime pelo autor Exigese pelo menos a figura da tentativa Há diversas teorias acerca da acessoriedade formuladas com base em seus graus a acessoriedade mínima para a punibilidade da participação é suficiente tenha o autor praticado um fato típico Exemplo A contrata B para matar C Depois do acerto B caminha em via pública e gratuitamente é atacado por C vindo por esse motivo a matálo em legítima defesa Para essa teoria A deveria ser punido como partícipe Essa concepção deve ser afastada por implicar na equivocada punição do partícipe quando o autor agiu acobertado por uma causa de exclusão da ilicitude ou seja quando não praticou uma infração penal b acessoriedade limitada é suficiente para a punição do partícipe tenha o autor praticado um fato típico e ilícito Exemplo A contrata B inimputável para matar C O contratado cumpre sua missão Estaria presente o concurso de pessoas figurando B como autor e A como partícipe do homicídio Como se percebe essa posição não resolve os problemas inerentes à autoria mediata No exemplo inexiste concurso entre A e B inimputável em face da ausência de vínculo subjetivo Conforme explica Flávio Augusto Monteiro de Barros sobre a teoria da acessoriedade limitada Sua dificuldade é a compatibilização com a autoria mediata Realmente são incompatíveis Na autoria mediata a execução do crime é feita por pessoa que atua sem culpabilidade Aquele que induziu instigou ou auxiliou não é partícipe e sim autor mediato A teoria da acessoriedade limitada só tem cabimento entre os que repudiam a autoria mediata 318221 considerandoa uma modalidade de participação38 c acessoriedade máxima ou extrema reclama para a punição do partícipe tenha sido o fato típico e ilícito praticado por um agente culpável Exemplo A contrata B imputável para dar cabo à vida de C o que vem a ser fielmente concretizado B é autor do crime de homicídio e A partícipe Para Beatriz Vargas Ramos O grau de acessoriedade da participação é portanto o grau máximo é preciso que a conduta principal seja típica ilícita e também culpável Sempre que faltar um desses atributos na ação empreendida pelo agente imediato desaparecerá a participação surgindo a figura do autor mediato39 d hiperacessoriedade para a punição do partícipe é necessário que o autor revestido de culpabilidade pratique um fato típico e ilícito e seja efetivamente punido no caso concreto Destarte se A contratou B para matar C no que foi atendido mas o executor logo após o crime suicidouse não há falar em participação em decorrência da aplicação da causa de extinção da punibilidade contida no art 107 I do Código Penal Essa teoria faz exigência descabida permitindo em diversas hipóteses a impunidade do partícipe embora o autor com ele vinculado pela unidade de elemento subjetivo tenha praticado uma infração penal Teoria adotada O Código Penal não adotou expressamente nenhuma dessas teorias De acordo com a sua sistemática porém devem ser afastadas a acessoriedade mínima e a hiperacessoriedade O intérprete deve optar entre a acessoriedade limitada e a acessoriedade máxima dependendo do tratamento dispensado ao instituto da autoria mediata E vai aí um conselho a doutrina nacional tradicionalmente se inclinava pela acessoriedade limitada normalmente esquecendose de confrontála com a autoria mediata Todavia em provas e concursos públicos a acessoriedade máxima afigurase como a mais coerente por ser a autoria mediata aceita de forma praticamente unânime entre os penalistas brasileiros Estabelece o art 29 1º do Código Penal Se a participação for de menor importância a pena pode ser diminuída de 16 um sexto a 13 um terço Cuidase de causa de diminuição da pena É aplicável pois na terceira fase da fixação da pena Em que pesem posições em contrário tratase de direito subjetivo do réu Assim se provada sua participação de menor importância o magistrado deve diminuir a pena Sua discricionariedade reservase apenas no que diz respeito ao montante da redução dentro dos limites legais Participação de menor importância ou mínima é a de reduzida eficiência causal Contribui para a produção do resultado mas de forma menos decisiva razão pela qual deve ser aferida exclusivamente no caso concreto Nessa linha de raciocínio o melhor critério para constatar a participação de menor importância é uma vez mais o da equivalência dos antecedentes ou conditio sine qua non Anotese que a diminuição da pena se relaciona à participação isto é ao comportamento adotado pelo sujeito e não à sua pessoa Portanto suas condições pessoais primário ou reincidente perigoso ou não não impedem a redução da reprimenda se tiver contribuído minimamente para a produção do resultado Como a lei fala em participação não é possível a diminuição da pena ao coautor A propósito não há como se conceber uma coautoria de menor importância ou seja a prática de atos de execução de pouca relevância O coautor sempre tem papel decisivo no deslinde da infração penal40 Além disso prevalece na doutrina o entendimento de que o dispositivo legal não se aplica ao autor intelectual embora seja partícipe pois se arquitetou o crime evidentemente a sua participação não se compreende como de menor importância Não se deve confundir participação de menor importância com participação inócua Participação inócua é aquela que em nada contribuiu para o resultado É penalmente irrelevante pois se não deu causa ao crime é porque a ele não concorreu Exemplo A empresta uma faca para B matar C Precavido contudo B compra uma arma de fogo e no dia do crime sequer leva consigo a faca emprestada por A cuja participação foi assim inócua Preceitua o art 31 do Código Penal O ajuste a determinação ou instigação e o auxílio salvo disposição expressa em contrário não são puníveis se o crime não chega pelo menos a ser tentado A impunibilidade prevista no dispositivo legal não deve ser atribuída ao agente mas ao fato Cuidase de causa de atipicidade da conduta do partícipe e não de causa de isenção da pena Ajuste é o acordo traçado entre duas ou mais pessoas Determinação é o que foi decidido por alguém almejando uma finalidade específica Instigação é o reforço para a realização de algo a que uma pessoa já estava determinada a fazer E por fim auxílio é a colaboração material prestada a alguém para atingir um objetivo O ajuste a determinação a instigação e o auxílio devem se dirigir a pessoa ou pessoas determinadas visando a prática de um crime ou de crimes também determinados Essa regra decorre do caráter acessório da participação o comportamento do partícipe só adquire relevância penal se o autor conduta principal iniciar a execução do crime princípio da executividade da participação E para fazêlo deve ingressar na esfera da tentativa pois o art 14 II do Código Penal a ela condicionou a punição dos atos praticados pelo agente Destarte não é punível exemplificativamente o simples ato de contratar um pistoleiro profissional para matar alguém A conduta do partícipe encomendar a morte somente será punível se o contratado praticar atos de execução do homicídio pois caso contrário estará configurado o quase crime Antes da Reforma da Parte Geral do Código Penal na Lei 72091984 era prevista a aplicação de medida de segurança ao partícipe ligado ao quase crime Atualmente nenhuma sanção penal pode ser imposta Acertou o legislador por se tratar de causa de atipicidade do fato Destacase porém a locução salvo disposição expressa em contrário O Código Penal assim agiu para ressaltar que em situações taxativamente previstas em lei é possível a punição do ajuste da determinação da instigação e do auxílio como crime autônomo Reclama evidentemente expressa previsão legal É o que se dá nos delitos de incitação ao crime CP art 286 e de associação criminosa CP art 288 Na associação criminosa por exemplo a lei tipificou de forma independente a conduta de associaremse três ou mais pessoas para o fim específico de cometer crimes Existe o delito com a associação estável e permanente ainda que os agentes não venham efetivamente a praticar nenhum delito E não fosse a exceção apontada pelo art 31 do Código Penal seria vedado punir o ato associativo enquanto não se praticasse um crime para o qual o agrupamento fora idealizado A participação por omissão é possível desde que o omitente além de poder agir no caso concreto tivesse ainda o dever de agir para evitar o resultado por se enquadrar em alguma das hipóteses delineadas pelo art 13 2º do Código Penal Exemplo é partícipe do furto o policial militar que presencia a subtração de bens de uma pessoa e nada faz porque estava fumando um cigarro e não queria apagálo Também chamada de participação negativa crime silente ou concurso absolutamente negativo é a participação que ocorre nas situações em que o sujeito não está vinculado à conduta criminosa e não possui o dever de agir para impedir o resultado Exemplo um transeunte assiste ao roubo de uma pessoa desconhecida e nada faz Não é partícipe Portanto o mero conhecimento de um fato criminoso não confere ao indivíduo a posição de partícipe por força de sua omissão salvo se presente o dever de agir para impedir a produção do resultado A participação sucessiva é possível nos casos em que um mesmo sujeito é instigado induzido ou auxiliado por duas ou mais pessoas cada qual desconhecendo o comportamento alheio para executar uma infração penal Exemplo A sugere a B a prática de um roubo para quitar suas dívidas bancárias Depois de refletir sobre a ideia e sem contar a sua origem consulta C o qual o estimula a assim agir B pratica o roubo A e C são partícipes do crime pois para ele concorreram A participação sucessiva deve ter sido capaz de influir no propósito criminoso pois se a ideia já estava perfeitamente sedimentada na mente do agente será inócua a participação posterior impedindo a punição do seu responsável A participação em cadeia é possível e punível pelas regras estabelecidas pelo Código Penal Verificase nos casos em que alguém induz ou instiga uma pessoa para que esta posteriormente induza instigue ou auxilie outro indivíduo a cometer um crime determinado Exemplo A induz B a instigar C a emprestar uma arma de fogo auxiliar a D para que este mate E devedor e desafeto de todos A B e C respondem pelo homicídio na condição de partícipes pois concorreram para o crime que teve D como seu autor Vimos que o partícipe deve necessariamente estar subjetivamente vinculado à conduta do autor Exigese a homogeneidade de elemento subjetivo pois se todos os que concorrem para um crime por ele respondem como decorrência da teoria unitária ou monista acolhida pelo art 29 caput do Código Penal não se admite a participação culposa em crime doloso nem a participação dolosa em crime culposo Mas é possível o envolvimento em ação alheia de terceira pessoa com elemento subjetivo distinto quando a lei cria para a situação dois crimes diferentes mas ligados um ao outro Aquele que colabora culposamente para a conduta alheia responde por delito culposo enquanto ao autor que age com consciência e vontade deve ser imputado um crime doloso Repitase são dois crimes autônomos embora dependentes entre si É o que ocorre em relação ao crime tipificado pelo art 312 2º do Código Penal Imaginemos que um funcionário público estadual ao término de seu expediente esqueça aberta a janela do seu gabinete Aproveitandose dessa facilidade um particular que passava pela via pública ingressa na repartição pública e de lá subtrai um computador pertencente ao Estado O funcionário público desidioso responde por peculato culposo e o particular por furto Não há concurso de pessoas em face da ausência do liame subjetivo Circunstâncias incomunicáveis são as que não se estendem isto é não se transmitem aos coautores ou partícipes de uma infração penal pois se referem exclusivamente a determinado agente incidindo apenas em relação a 3191 ele Nesse sentido estabelece o art 30 do Código Penal Não se comunicam as circunstâncias e as condições de caráter pessoal salvo quando elementares do crime A compreensão desse dispositivo depende inicialmente da diferenciação entre elementares e circunstâncias Distinção entre elementares e circunstâncias Elementares são os dados fundamentais de uma conduta criminosa São os fatores que integram a definição básica de uma infração penal No homicídio simples CP art 121 caput por exemplo as elementares são matar e alguém Circunstâncias por sua vez são os fatores que se agregam ao tipo fundamental para o fim de aumentar ou diminuir a pena Exemplificativamente no homicídio que tem como elementares matar e alguém são circunstâncias o relevante valor moral 1º o motivo torpe 2º I e o motivo fútil 2º II dentre outras O critério que melhor possibilita a distinção é o da exclusão ou da eliminação Com efeito excluindose uma elementar o fato se torna atípico ou então se opera a desclassificação para outra infração penal Assim é atípica sem correspondência em um tipo penal a conduta de matar um objeto e não alguém E tomando como ponto de partida um desacato CP art 331 a eliminação da elementar funcionário público desclassifica a conduta para o crime de injúria CP art 140 Por outro lado a exclusão de uma circunstância tem o condão de apenas aumentar ou diminuir a pena de uma infração penal Não lhe altera a denominação jurídica incidindo somente na quantidade da reprimenda a ser aplicada O crime ou contravenção penal contudo são mantidos Por exemplo a eliminação do motivo torpe diminui a pena do homicídio que de qualificado passa a ser simples mas de qualquer modo subsiste o crime definido pelo art 121 do Código Penal 3192 3193 3194 Em suma as elementares compõem a definição da conduta típica enquanto as circunstâncias são exteriores ao tipo fundamental funcionando como qualificadoras ou causas de aumento ou de diminuição da pena Espécies de elementares e de circunstâncias O art 30 do Código Penal é claro há elementares e circunstâncias de caráter pessoal ou subjetivo Consequentemente também existem elementares e circunstâncias de caráter real ou objetivo Subjetivas ou de caráter pessoal são as que se relacionam à pessoa do agente e não ao fato por ele praticado Exemplos a condição de funcionário público no peculato é uma elementar de caráter pessoal CP art 312 E os motivos do crime são circunstâncias de igual natureza no tocante ao homicídio CP art 121 1º e 2º I II e V Objetivas ou de caráter real são as elementares e circunstâncias que dizem respeito ao fato à infração penal cometida e não ao agente Exemplos o emprego de violência contra a pessoa no roubo é uma elementar objetiva CP art 157 caput e desse naipe é também o meio cruel como circunstância para a execução do homicídio CP art 121 2º III Condições de caráter pessoal Paralelamente às elementares e circunstâncias o art 30 do Código Penal trata ainda das condições de caráter pessoal Condições pessoais são as qualidades os aspectos subjetivos inerentes a determinado indivíduo que o acompanham em qualquer situação isto é independem da prática da infração penal É o caso da reincidência e da condição de menor de 21 anos As regras do art 30 do Código Penal Com base nos conceitos e espécies de elementares circunstâncias e condições acima analisados é possível extrair três regras do art 30 do Código Penal 1ª As circunstâncias e condições de caráter pessoal ou subjetivas não se comunicam pouco importa se tais dados ingressaram ou não na esfera de conhecimento dos demais agentes Exemplo A ao chegar à sua casa constata que sua filha foi estuprada por B Imbuído por motivo de relevante valor moral contrata C pistoleiro profissional para matar o estuprador O serviço é regularmente executado Nesse caso A responde por homicídio privilegiado CP art 121 1º enquanto a C é imputado o crime de homicídio qualificado pelo motivo torpe CP art 121 2º I O relevante valor moral é circunstância pessoal exclusiva de A e jamais se transfere a C por mais que este não concorde com o estupro 2ª Comunicamse as circunstâncias de caráter real ou objetivas é necessário porém que tenham ingressado na esfera de conhecimento dos demais agentes para evitar a responsabilidade penal objetiva Exemplo A contrata B para matar C seu inimigo B informa a A que fará uso de meio cruel e este último concorda com essa circunstância Ambos respondem pelo crime tipificado pelo art 121 2º III do Código Penal Tratase de circunstância objetiva que a todos se estende Se todavia B fizesse uso de meio cruel sem a ciência de A somente a ele seria imputada a qualificadora sob pena de caracterização da responsabilidade penal objetiva 3ª Comunicamse as elementares sejam objetivas ou subjetivas mais uma vez exigese que as elementares tenham entrado no âmbito de conhecimento de todos os agentes para afastar a responsabilidade penal objetiva Exemplo A funcionário público convida B seu amigo para em concurso subtraírem um computador que se encontra na repartição pública em que trabalha valendose das facilidades proporcionadas pelo seu cargo Ambos respondem por peculatofurto ou peculato impróprio CP art 312 1º pois a elementar funcionário público transmitese a B Entretanto se B não conhecesse a condição funcional de A responderia por furto evitando a responsabilidade penal objetiva 3195 Elementares personalíssimas e a questão do estado puerperal no infanticídio Nélson Hungria sustentou após a entrada em vigor do Código Penal de 1940 a existência de elementares personalíssimas que não se confundiam com as pessoais Estas seriam transmissíveis aquelas não Em síntese seriam fatores que embora integrassem a descrição fundamental de uma infração penal jamais se transmitiriam aos demais coautores ou partícipes Confira se Devese notar porém que a ressalva do art 2641 não abrange as condições personalíssimas que informam os chamados delicta excepta Importam elas um privilegium em favor da pessoa a quem concernem São conceitualmente inextensíveis e impedem quando haja cooperação com o beneficiário a unidade do título do crime Assim a influência do estado puerperal no infanticídio e a causa honoris no crime do art 134 embora elementares não se comunicam aos cooperadores que responderão pelo tipo comum do crime42 Para ele na hipótese em que o pai ou qualquer outra pessoa auxiliasse a mãe abalada pelo estado puerperal a matar o próprio filho durante o parto ou logo após não seria justo nem correto que o terceiro fosse beneficiado pelo crime de infanticídio pois o puerpério não lhe atinge Portanto somente a mãe responderia pelo crime previsto no art 123 do Código Penal imputandose ao terceiro coautor ou partícipe a figura do homicídio43 Humilde porém Nélson Hungria posteriormente constatou seu equívoco e alterou o seu entendimento levando em consideração a redação do Código Penal salvo quando elementares do crime Concluiu então que todos os terceiros que concorrem para um infanticídio por ele também respondem44 Destarte justa ou não a situação a lei fala em elementares e seja qual for sua natureza é necessário que se estendam a todos os coautores e partícipes Essa é a posição atualmente pacífica que somente será modificada com eventual alteração legislativa 31111 O mandato guarda íntima relação com a figura do autor intelectual em que alguém partícipe delibera sobre a prática de uma infração penal e transmite a outrem autor a tarefa de executálo Nesse contexto pode ocorrer falta de coincidência entre a vontade do partícipe e o comportamento do autor O art 19 do Código Penal de 1890 assim dispunha Aquelle que mandar ou provocar alguem a commeter crime é responsável como autor 1º Por qualquer outro crime que o executor commeter para executar o de que se encarregou 2º Por qualquer outro crime que daquelle resultar45 Essa regra que na prática permitia a responsabilidade penal objetiva foi repelida pela sistemática em vigor Atualmente a questão deve ser solucionada com base nas regras inerentes à cooperação dolosamente distinta e à comunicabilidade das elementares e circunstâncias desde que tenham ingressado na esfera de conhecimento de todos os agentes CP arts 29 2º e 30 Autoria colateral Também chamada de coautoria imprópria ou autoria parelha ocorre quando duas ou mais pessoas intervêm na execução de um crime buscando igual resultado embora cada uma delas ignore a conduta alheia Exemplo A portando um revólver e B uma espingarda escondemse atrás de árvores um do lado direito e outro do lado esquerdo de uma mesma rua Quando C inimigo de ambos por ali passa ambos os agentes contra ele efetuam disparos de armas de fogo C morre revelando o exame necroscópico terem sido os ferimentos letais produzidos pelos disparos originários da arma de A Não há concurso de pessoas pois estava ausente o vínculo subjetivo entre A e B Portanto cada um dos agentes responde pelo crime a que deu causa A por homicídio consumado e B por tentativa de homicídio Se ficasse demonstrado que os tiros de B atingiram o corpo de C 31112 quando já estava morto A responderia pelo homicídio enquanto B ficaria impune por força da caracterização do crime impossível impropriedade absoluta do objeto CP art 17 Autoria incerta Surge no campo da autoria colateral quando mais de uma pessoa é indicada como autora do crime mas não se apura com precisão qual foi a conduta que efetivamente produziu o resultado Conhecemse os possíveis autores mas não se conclui em juízo de certeza qual comportamento deu causa ao resultado Suponhase que A e B com armas de fogo e munições idênticas escondamse atrás de árvores para eliminar a vida de C Quando este passa pelo local contra ele atiram e C morre O exame pericial aponta ferimentos produzidos por um único disparo de arma de fogo como causa mortis Os demais tiros não atingiram a vítima e o laudo não afirma categoricamente quem foi o autor do disparo fatal Há no caso dois crimes praticados por A e B um homicídio consumado e uma tentativa de homicídio Qual é a solução Como não se apurou quem produziu a morte não se pode imputar o resultado naturalístico para A e B Um deles matou mas o outro não E como não há concurso de pessoas ambos devem responder por tentativa de homicídio Com efeito ambos praticaram atos de execução de um homicídio Tentaram matar mas somente um deles incerto o fez Para eles será imputada a tentativa pois a ela deram causa Quanto a isso não há dúvida E por não se saber quem de fato provocou a morte da vítima não se pode responsabilizar qualquer deles pelo homicídio consumado aplicandose o princípio in dubio pro reo Há casos todavia que causam estranheza ainda maior Imaginese que João casado com Maria seja amante de Tereza Todas as manhãs juntamente com a esposa toma café em casa Em seguida antes de ingressar no trabalho passa na residência da amante que não sabe 31113 ser ele casado para com ela também fazer o desjejum Em determinado dia a esposa e a amante descobrem sobre a existência de outra mulher na vida de João Revoltadas compram venenos para matálo Na manhã seguinte o adúltero bebe uma xícara de café envenenado em sua casa Parte para a residência da amante e também bebe uma xícara de café com veneno Morre algumas horas depois Realizase perícia e o laudo conclui pela existência de duas substâncias no sangue de João veneno de rato e talco Maria e Tereza orgulhosas confessam ter colocado veneno no café do falecido traidor A situação é a seguinte uma das mulheres praticou homicídio e a outra crime impossível por ineficácia absoluta do meio CP art 17 As provas colhidas durante o inquérito policial não apontam qual foi a conduta de cada uma delas O que deve fazer o representante do Ministério Público ao receber o inquérito policial relatado Deve denunciálas A única solução é o arquivamento do inquérito policial Há um homicídio João está morto mas às vingativas mulheres aplicase o crime impossível Uma matou mas a outra nada fez Como não há concurso de pessoas por ausência do vínculo subjetivo ambas devem ser beneficiadas pela dúvida Em resumo se no bojo de uma autoria incerta todos os envolvidos praticaram atos de execução devem responder pela tentativa do crime Mas se um deles incidiu em crime impossível a causa de atipicidade a todos se estende Autoria desconhecida Cuidase de instituto ligado ao processo penal que ocorre quando um crime foi cometido mas não se sabe quem foi seu autor Exemplo A foi vítima de furto pois todos os bens de sua residência foram subtraídos enquanto viajava Não há provas todavia do responsável pelo delito É nesse ponto que se diferencia da autoria incerta de interesse do Direito Penal pois nela conhecemse os envolvidos em um crime mas não se pode com precisão afirmar quem a ele realmente deu causa A relação entre o concurso de pessoas e os crimes de autoria coletiva especialmente quando praticados pelas multidões ganha força a cada dia pois este fenômeno encontrase presente em diversos casos inerentes à vida moderna tais como a violência comumente praticada pelas torcidas organizadas nos estádios de futebol rebeliões em presídios e invasões de propriedades rurais por movimentos criados para esta finalidade Em situações deste nível o concurso de pessoas inexoravelmente se reveste de maior gravidade pois o resultado criminoso além de ser facilmente alcançado assume maiores proporções por ser a incitação à violência transmitida velozmente entre os indivíduos situados à sua volta Como pontua René Ariel Dotti Falase então do fenômeno conhecido como a multidão criminosa que constitui uma espécie de alma nova dos movimentos de massa que em momentos de grande excitação anulam ou restringem sensivelmente o autocontrole e a capacidade individual de se governar segundo padrões éticos ou sociais46 O Código Penal atento a essas peculiaridades cuidou de regular o assunto quem provoca o tumulto tem a pena agravada enquanto quem age sob o influxo da multidão se não a iniciou merece o abrandamento da punição Com efeito dispôs em seu art 65 III e que a pena será atenuada em relação ao agente que cometeu o crime sob a influência da multidão em tumulto se não o provocou Por outro lado estabeleceu no art 62 I uma agravante genérica para o sujeito que promove ou organiza a cooperação no crime ou dirige a atividade dos demais agentes Mas a doutrina discorda sobre um ponto qual seja se a integração a uma multidão criminosa é por si só suficiente para demonstrar o vínculo subjetivo entre os agentes caracterizando o concurso de pessoas 31121 Para Mirabete todos respondem pelo resultado produzido47 É também a posição de Cezar Roberto Bitencourt A prática coletiva de delito nessas circunstâncias apesar de ocorrer em situação normalmente traumática não afasta a existência de vínculos psicológicos entre os integrantes da multidão caracterizadores do concurso de pessoas Nos crimes praticados por multidão delinquente é desnecessário que se descreva minuciosamente a participação de cada um dos intervenientes sob pena de inviabilizar a aplicação da lei48 De outro lado sustenta Rogério Greco que os crimes multitudinários dependem para a configuração do concurso de pessoas da comprovação efetiva da contribuição causal de cada envolvido no tumulto São suas palavras somos da opinião de que nos crimes multitudinários não podemos presumir o vínculo psicológico entre os agentes Tal liame deverá ser demonstrado no caso concreto a fim de que todos possam responder pelo resultado advindo da soma das condutas49 Denúncia geral processo penal kafikiano criptoimputação Temse entendido que nos crimes de autoria coletiva embora a vestibular acusatória não possa ser de todo genérica é válida quando apesar de não descrever minuciosamente as atuações individuais dos acusados demonstra um liame entre o seu agir e a suposta prática delituosa estabelecendo a plausibilidade da imputação e possibilitando o exercício da ampla defesa50 Nesse contexto não é inepta a denúncia geral que apresenta narrativa fática congruente de modo a permitir o devido processo legal descrevendo conduta típica que atentando aos ditames do art 41 do CPP qualifica os acusados descreve o fato criminoso e suas circunstâncias O fato por si só de o Ministério Público ter imputado ao recorrente a mesma conduta dos demais denunciados não torna a denúncia genérica indeterminada ou imprecisa51 É imprescindível distinguir a denúncia genérica da denúncia geral A denúncia genérica é aquela cuja imputação é gravemente contaminada por situação de deficiência na narração do fato imputado quando não contém os elementos mínimos de sua identificação como crime como às vezes ocorre com a simples alusão aos elementos do tipo penal abstrato52 A denúncia genérica sofre com a pecha da criptoimputação53 imputação truncada criptografada por consagrar um sistema processual kafkiano por meio do qual o denunciado não tem ideia do que se defende54 De seu turno a denúncia geral é largamente admitida na jurisprudência porquanto nessa modalidade há a descrição dos fatos e da atuação ainda que de maneira geral de cada um dos imputados Como já decidido pelo Superior Tribunal de Justiça Nos chamados crimes de autoria coletiva defrontase o órgão acusatório no momento de oferecer a denúncia com uma pluralidade de acusados envolvidos na prática delituosa Nessa situação a narrativa minudente de cada uma das condutas atribuídas aos vários agentes é tarefa bastante dificultosa muitas vezes impraticável sobretudo diante de organizações numerosas Nesse contexto a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça vem admitindo excepcionalmente em crimes de autoria coletiva possa o titular da ação penal descrever os fatos de forma geral tendo em vista a incapacidade de se mensurar com precisão em detalhes o modo de participação de cada um dos acusados na empreitada criminosa Portanto será regular a peça acusatória quando a despeito de não delinear as condutas individuais dos corréus anunciar o liame entre a atuação do denunciado e a prática delituosa demonstrando a plausibilidade da imputação e garantindo o pleno exercício do direito de defesa55 Crime culposo é o que se verifica quando o agente deixando de observar o dever objetivo de cuidado por imprudência negligência ou imperícia realiza voluntariamente uma conduta que produz um resultado naturalístico indesejado não previsto nem querido mas objetivamente previsível e excepcionalmente previsto e querido que podia com a devida atenção ter evitado Para facilitar o estudo do assunto é razoável abordar o cabimento do 31131 31132 concurso de pessoas nessa categoria de delitos com amparo em suas duas modalidades coautoria e participação Coautoria e crimes culposos A doutrina nacional é tranquila ao admitir a coautoria em crimes culposos quando duas ou mais pessoas conjuntamente agindo por imprudência negligência ou imperícia violam o dever objetivo de cuidado a todos imposto produzindo um resultado naturalístico56 Imaginese o exemplo em que dois indivíduos em treinamento efetuam disparos de arma de fogo em uma propriedade rural situada próxima a uma estrada de terra pouco movimentada Atiram simultaneamente atingindo um pedestre que passava pela via pública o qual vem a morrer pelos ferimentos provocados pelas diversas munições Há coautoria em um homicídio culposo Vejase a propósito o clássico exemplo de E Magalhães Noronha Suponhase o caso de dois pedreiros que numa construção tomam uma trave e a atiram à rua alcançando um transeunte Não há falar em autor principal e secundário em realização e instigação em ação e auxílio etc Oficiais do mesmo ofício incumbialhes aquela tarefa só realizável pela conjugação das suas forças Donde a ação única apanhar e lançar o madeiro e o resultado lesões ou morte da vítima também uno foram praticados por duas pessoas que uniram seus esforços e vontades resultando assim coautoria Para ambos houve vontade atuante e ausência de previsão57 Participação e crimes culposos Firmouse a doutrina pátria no sentido de rejeitar a possibilidade de participação em crimes culposos Com efeito o crime culposo é normalmente definido por um tipo penal aberto e nele se encaixa todo o comportamento que viola o dever objetivo de cuidado Por corolário é autor todo aquele que desrespeitando esse dever contribui para a produção do resultado naturalístico Nos ensinamentos de Damásio E de Jesus 7 8 9 10 11 12 13 Todo grau de causação a respeito do resultado típico produzido não dolosamente mediante uma ação que não observa o cuidado requerido no âmbito de relação fundamenta a autoria do respectivo delito culposo Por essa razão não existe diferença entre autores e partícipes nos crimes culposos Toda classe de causação do resultado típico culposo é autoria58 Frisese por oportuno que a unidade de elemento subjetivo exigida para a caracterização do concurso de pessoas impede a participação dolosa em crime culposo Na hipótese em que alguém dolosamente concorre para que outrem produza um resultado naturalístico culposo há dois crimes um doloso e outro culposo Exemplo A com a intenção de matar B convence C a acelerar seu carro em uma curva pois sabe que naquele instante B por ali passará de bicicleta O motorista atinge velocidade excessiva e atropela o ciclista matandoo A responde por homicídio doloso CP art 121 e C por homicídio culposo na direção de veículo automotor Lei 95031997 CTB art 302 FERRAZ Esther de Figueiredo A codelinquência no direito penal brasileiro São Paulo José Bushatsky 1976 p 1819 MANZINI Vicenzo Instituzoni di diritto penale italiano parte generale Padova Cedam 1946 v I p 148 No entanto uma vez demonstrada a efetiva colaboração no caso concreto não se reclama a identificação de todos os envolvidos na empreitada criminosa Exemplo A vítima da tentativa de homicídio afirma que dois homens de comum acordo efetuaram disparos de arma de fogo em sua direção para matála mas somente reconhece um deles Está caracterizado o concurso de pessoas STJ REsp 1306731RJ rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 22102013 FERRAZ Esther de Figueiredo A codelinquência no direito penal brasileiro São Paulo José Bushatsky 1976 p 25 Inq 2245MG rel Min Joaquim Barbosa Tribunal Pleno j 28082007 É também o entendimento do STJ HC 85883SP rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 07022008 STF HC 104314PR rel Min Ellen Gracie 2ª Turma j 16112010 noticiado no Informativo 609 e HC 97652RS rel Min Joaquim 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 Barbosa 2ª Turma j 04082009 noticiado no Informativo 554 No STJ REsp 1306731RJ rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 22102013 Apud FERRAZ Esther de Figueiredo A codelinquência no direito penal brasileiro São Paulo José Bushatsky 1976 p 31 ROXIN Claus Autoria y domínio del hecho en derecho penal 7 ed Madrid Marcial Pons 1999 p 342 WELZEL Hans Derecho penal alemán Tradução de Juan Busto Ramirez e Sergio Yañes Peréz Santiago Editorial Jurídica del Chile 1987 p 120 JESUS Damásio E de Teoria do domínio do fato no concurso de pessoas 3 ed São Paulo Saraiva 2002 p 26 STF HC 138637SP rel Min Celso de Mello 2ª Turma j 18052017 noticiado no Informativo 864 CEREZO MIR José Derecho penal Parte geral São Paulo RT 2007 p 1080 STF AP 975AL rel Min Edson Fachin 2ª Turma j 03102017 noticiado no Informativo 880 No Brasil em 1940 quando foi elaborado o Código Penal e mesmo no ano de 1984 na ocasião em que a Parte Geral foi reformada pela Lei 72091984 sequer se falava na teoria do domínio do fato Esse assunto na verdade era praticamente desconhecido pela nossa doutrina e pela nossa jurisprudência HC 105674RS rel Min Marco Aurélio Plenário j 17102013 noticiado no Informativo 724 STJ AgRg no REsp 1245570SP rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 20032014 Para a teoria do domínio do fato os crimes de mão própria admitem a coautoria o sujeito pode ser autor do delito sem realizar o núcleo do tipo Basta que tenha o controle final do fato LINHARES Marcello Jardim Coautoria Rio de Janeiro Aide 1987 p 104 BITENCOURT Cezar Roberto Tratado de direito penal Parte geral 11 ed São Paulo Saraiva 2007 v 1 p 426 27 28 29 30 31 32 33 34 35 36 37 38 NUCCI Guilherme de Souza Código Penal comentado 6 ed São Paulo RT 2006 p 275 BATISTA Nilo Concurso de agentes uma investigação sobre os problemas da autoria e da participação no direito penal brasileiro 2 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2004 p 65 SILVA Germano Marques da Direito penal português Parte geral Lisboa Verbo 1998 v II p 285 MIR PUIG Santiago Derecho penal Parte general 5 ed Barcelona Reppertor 1998 p 401 Nesse sentido WESSELS Johannes Derecho penal Parte general Buenos Aires Depalma 1980 p 159 GRECO Rogério Curso de direito penal Parte geral 10 ed Rio de Janeiro Impetus 2008 p 442 ZAFFARONI Eugenio Raúl Derecho penal Parte general 2 ed Buenos Aires Ediar 2002 p 780 ZAFFARONI E Raúl PIERANGELI José Henrique Manual de direito penal brasileiro Parte geral 7 ed São Paulo RT 2007 v 1 p 579581 ZAFFARONI E Raúl PIERANGELI José Henrique Manual de direito penal brasileiro Parte geral 7 ed São Paulo RT 2007 v 1 p 582583 ROXIN Claus Autoria y dominio del hecho em derecho penal 7 ed Madrid Marcial Pons 1999 p 270 e 275276 Convém recordar o teor do art 2º 3º da Lei 128502013 Lei do Crime Organizado A pena é agravada para quem exerce o comando individual ou coletivo da organização criminosa ainda que não pratique pessoalmente atos de execução Por esse motivo o art 29 caput do Código Penal deve ser inserido no pedido de uma denúncia ou de uma queixacrime exclusivamente nos casos de participação Exemplo homicídio qualificado pelo motivo torpe executado por um pistoleiro profissional a mando de outrem art 121 2 I cc o art 29 caput do Código Penal Em se tratando de coautoria todos os agentes praticam o núcleo do tipo No caso do homicídio por exemplo todos matam dispensando a incidência da norma de extensão pessoal BARROS Flávio Augusto Monteiro de Direito penal Parte geral 5 ed São Paulo Saraiva 2006 p 420 39 40 41 42 43 44 45 46 47 48 49 50 51 52 53 54 RAMOS Beatriz Vargas Do concurso de pessoas Belo Horizonte Del Rey 1996 p 42 STF HC 72893SP rel Min Sydney Sanches 1ª Turma j 24101995 Atual art 30 após a reforma da Parte Geral do Código Penal pela Lei 72091984 HUNGRIA Nélson Comentários ao Código Penal Rio de Janeiro Forense 1949 v I p 574 Essa posição foi à época seguida por diversos autores destacandose Aníbal Bruno Bento de Faria Heleno Cláudio Fragoso e Vicente Sabino HUNGRIA Nélson Comentários ao Código Penal 5 ed Rio de Janeiro Forense 1979 v 5 p 226 GARCIA Basileu Instituições de direito penal 4 ed 37 tir São Paulo Max Limonad 1975 t I v I p 370 DOTTI René Ariel Curso de direito penal Parte geral 2 ed Rio de Janeiro Forense 2004 p 363 MIRABETE Julio Fabbrini Manual de direito penal Parte Geral 24 ed São Paulo Atlas 2007 v 1 p 242 BITENCOURT Cezar Roberto Tratado de direito penal Parte geral 11 ed São Paulo Saraiva 2007 v 1 p 428 GRECO Rogério Curso de direito penal parte geral 10 ed Rio de Janeiro Impetus 2008 p 472 STJ RHC 68903RJ rel Min Jorge Mussi 5ª Turma j 20052016 STJ HC 311571SP rel Min Gurgel de Faria 5ª Turma j 15122015 FERNANDES Antonio Scarance A reação defensiva à imputação São Paulo RT 2002 p 184 No exemplo de Hugo Nigro Mazzilli ocorre a criptoimputação quando o Ministério Público atribui ao réu uma conduta culposa por ter sido imprudente porque não teve cautela Mas qual precisamente a cautela que o réu omitiu É como se a denúncia dissesse que o réu teve culpa porque foi imprudente foi imprudente porque não teve cautela e porque não teve cautela teve culpa Um círculo vicioso MAZZILLI Hugo Nigro A descrição do fato típico na acusação penal Disponível em httpwwwmazzillicombr Acesso em 01112016 O ordenamento positivo brasileiro repudia as imputações criminais 55 56 57 58 genéricas e não tolera porque ineptas as acusações que não individualizam nem especificam de maneira concreta a conduta penal atribuída ao denunciado A pessoa sob investigação tem o direito de não ser acusada com base em denúncia inepta STF HC 80084PE rel Celso de Mello 2ª Turma j 11122012 RHC 68848RN rel Min Antonio Saldanha Palheiro 6ª Turma j 13102016 Para o STF Não há abuso de acusação na denúncia que ao tratar de crimes de autoria coletiva deixa por absoluta impossibilidade de esgotar as minúcias do suposto cometimento do crime Há diferença entre denúncia genérica e geral Enquanto naquela genérica se aponta fato incerto e imprecisamente descrito na última geral há acusação da prática de fato específico atribuído a diversas pessoas ligadas por circunstâncias comuns mas sem a indicação minudente da responsabilidade interna e individual dos imputados não há que se falar em inépcia quando a acusação descreve minimamente o fato tido como criminoso HC 118891SP rel Min Edson Fachin 1ª Turma j 20102015 A doutrina majoritária admite a coautoria em crime culposo Para tanto devem ser preenchidos os requisitos do concurso de agentes a pluralidade de agentes b relevância causal das várias condutas c liame subjetivo entre os agentes e d identidade de infração penal STJ HC 235827SP rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 03092013 NORONHA E Magalhães Do crime culposo 2 ed São Paulo Saraiva 1966 p 103 JESUS Damásio E de Direito penal Parte geral 28 ed 2ª tiragem São Paulo Saraiva 2006 v 1 p 422 PARTE III TEORIA GERAL DA PENA 321 322 SANÇÃO PENAL Sanção penal é a resposta estatal no exercício do ius puniendi e após o devido processo legal ao responsável pela prática de um crime ou de uma contravenção penal Dividese em duas espécies penas e medidas de segurança As penas reclamam a culpabilidade do agente e destinamse aos imputáveis e aos semiimputáveis sem periculosidade Já as medidas de segurança têm como pressuposto a periculosidade e dirigemse aos inimputáveis e aos semiimputáveis dotados de periculosidade pois necessitam no lugar da punição de especial tratamento curativo Destarte o Direito Penal é um sistema de dupla via pois admite as penas 1ª via e as medidas de segurança 2ª via como respostas estatais aos violadores das suas regras1 Falase também na terceira via do Direito Penal consubstanciada nas situações em que embora tenha sido cometida uma infração penal não se impõe pena ou medida de segurança pois a punibilidade estatal cede espaço à reparação do dano causado à vítima a exemplo do que se verifica na composição dos danos civis nos crimes de menor potencial ofensivo de ação penal privada e de ação pública condicionada à representação do ofendido na forma delineada pelo art 74 parágrafo único da Lei 90991995 CONCEITO Pena é a reação que uma comunidade politicamente organizada opõe a um fato que viola uma das normas fundamentais da sua estrutura e assim é 323 a b definido na lei como crime Como reação contra o crime isto é contra uma grave transgressão das normas de convivência ela aparece com os primeiros agregados humanos Violenta e impulsiva nos primeiros tempos exprimindo o sentimento natural de vingança do ofendido ou a revolta de toda a comunidade social ela se vai disciplinando com o progresso das relações humanas abandonando os seus apoios extrajurídicos e tomando o sentido de uma instituição de Direito posta nas mãos do poder público para a manutenção da ordem e segurança social2 Destarte pena é a espécie de sanção penal consistente na privação ou restrição de determinados bens jurídicos do condenado aplicada pelo Estado em decorrência do cometimento de uma infração penal com as finalidades de castigar seu responsável readaptálo ao convívio em comunidade e mediante a intimidação endereçada à sociedade evitar a prática de novos crimes ou contravenções penais O bem jurídico de que o condenado pode ser privado ou sofrer limitação varia liberdade pena privativa de liberdade patrimônio multa prestação pecuniária e perda de bens e valores vida pena de morte na excepcional hipótese prevista no art 5º XLVII a da CF ou outro direito qualquer em conformidade com a legislação em vigor penas restritivas de direitos PRINCÍPIOS Aplicamse às penas os seguintes princípios Princípio da reserva legal ou da estrita legalidade emana do brocardo nulla poena sine lege ou seja somente a lei pode cominar a pena Foi previsto como cláusula pétrea no art 5º XXXIX da Constituição Federal e também encontra amparo no art 1º do Código Penal Princípio da anterioridade a lei que comina a pena deve ser anterior ao fato que se pretende punir Não basta assim o nulla poena sine lege Exigese um reforço a lei deve ser prévia ao fato praticado nulla poena sine praevia lege CF art 5º XXXIX e CP art 1º c d e f g Princípio da personalidade intransmissibilidade intranscendência ou responsabilidade pessoal a pena não pode em hipótese alguma ultrapassar a pessoa do condenado CF art 5º XLV É vedado alcançar portanto familiares do acusado ou pessoas alheias à infração penal Em síntese esse postulado impede que sanções e restrições de ordem jurídica superem a dimensão estritamente pessoal do infrator3 É possível porém que a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens compreendidos como efeitos da condenação sejam nos termos da lei estendidas aos sucessores e contra eles executadas até o limite do valor do patrimônio transferido CF art 5º XLV A pena de multa não poderá ser cobrada dos sucessores do condenado Princípio da inderrogabilidade ou inevitabilidade esse princípio é consectário lógico da reserva legal e sustenta que a pena se presentes os requisitos necessários para a condenação não pode deixar de ser aplicada e integralmente cumprida É contudo mitigado por alguns institutos penais dos quais são exemplos a prescrição o perdão judicial o sursis o livramento condicional etc Princípio da intervenção mínima a pena é legítima unicamente nos casos estritamente necessários para a tutela de um bem jurídico penalmente reconhecido Dele resultam dois outros princípios fragmentariedade ou caráter fragmentário do Direito Penal e subsidiariedade ver Capítulo 2 itens 228 229 e 2210 Princípio da humanidade ou humanização das penas a pena deve respeitar os direitos fundamentais do condenado enquanto ser humano Não pode assim violar a sua integridade física ou moral CF art 5º XLIX Da mesma forma o Estado não pode dispensar nenhum tipo de tratamento cruel desumano ou degradante ao preso Com esse propósito o art 5º XLVII da Constituição Federal proíbe as penas de morte de trabalhos forçados de banimento e cruéis bem como a prisão perpétua Princípio da proporcionalidade a resposta penal deve ser justa e suficiente para cumprir o papel de reprovação do ilícito bem como h para prevenir novas infrações penais Concretizase na atividade legislativa funcionando como barreira ao legislador e também ao magistrado orientandoo na dosimetria da pena De fato tanto na cominação como na aplicação da pena deve existir correspondência entre o ilícito cometido e o grau da sanção penal imposta levando se ainda em conta o aspecto subjetivo do condenado CF art 5º XLVI Princípio da individualização foi inicialmente previsto pelo Código Criminal do Império de 1830 A individualização da pena tem o significado de eleger a justa e adequada sanção penal quanto ao montante ao perfil e aos efeitos pendentes sobre o sentenciado tornandoo único e distinto dos demais infratores ainda que coautores ou partícipes do delito Sua finalidade e importância residem na fuga da padronização da pena da mecanizada ou computadorizada aplicação da sanção penal que prescinda da figura do juiz como ser pensante adotandose em seu lugar qualquer programa ou método que leve à pena preestabelecida segundo um modelo unificado empobrecido e sem dúvida injusto4 Esse princípio que foi expressamente indicado pelo art 5º XLVI da Constituição Federal repousa no ideal de justiça segundo o qual se deve distribuir a cada indivíduo o que lhe cabe de acordo com as circunstâncias específicas do seu comportamento o que em matéria penal significa a aplicação da pena levando em conta não a norma penal em abstrato mas especialmente os aspectos subjetivos e objetivos do crime5 Na célebre definição de Nélson Hungria A fórmula unitária foi assim fixada retribuir o mal concreto do crime com o mal concreto da pena na concreta personalidade do criminoso Ao ser cominada in abstracto a pena é individualizada objetivamente mas ao ser aplicada in concreto não prescinde da sua individualização subjetiva Após a individualização convencional da lei a individualização experimental do juiz ao mesmo tempo objetiva e subjetiva É conservada a prefixação de minima e maxima especiais 324 mas suprimida a escala legal de graus intermédios o juiz pode moverse livremente entre aqueles para realizar a justiça do caso concreto6 Desenvolvese em três planos legislativo judicial e administrativo No prisma legislativo o princípio é respeitado quando o legislador descreve o tipo penal e estabelece as sanções adequadas indicando precisamente os seus limites mínimo e máximo e também as circunstâncias aptas a aumentar ou diminuir as reprimendas cabíveis A individualização judicial complementa a legislativa pois esta não pode ser extremamente detalhista nem é capaz de prever todas as situações da vida concreta que possam aumentar ou diminuir a sanção penal É efetivada pelo juiz quando aplica a pena utilizandose de todos os instrumentais fornecidos pelos autos da ação penal em obediência ao sistema trifásico delineado pelo art 68 do Código Penal pena privativa de liberdade ou ainda ao sistema bifásico inerente à sanção pecuniária CP art 49 Finalmente a individualização administrativa é efetuada durante a execução da pena quando o Estado deve zelar por cada condenado de forma singular mediante tratamento penitenciário ou sistema alternativo no qual se afigure possível a integral realização das finalidades da pena TEORIAS E FINALIDADES O estudo das teorias relacionase intimamente com as finalidades da pena Podemos ir ainda mais longe Na verdade as teorias inerentes aos fins da pena relacionamse com a própria origem do Direito Penal Nas palavras de Jorge de Figueiredo Dias O problema do fins rectius das finalidades da pena criminal é tão velho quanto a própria história do direito penal e no decurso desta já longa história ele tem sido discutido vivamente e sem soluções de continuidade pela filosofia tanto pela filosofia geral como pela filosofia do direito pela doutrina do Estado e pela ciência global do direito penal A razão de um tal interesse e da sua persistência ao longo dos tempos está em que à sombra dos problemas dos fins das penas é no fundo toda a teoria do direito penal que se discute e com particular incidência as questões fulcrais da legitimação fundamentação justificação e função da intervenção penal estatal Por isso se pode dizer sem exagero que a questão dos fins da pena constitui no fundo a questão do destino do direito penal e na plena acepção do termo do seu paradigma7 Para a teoria absoluta a finalidade da pena é retributiva Por sua vez para a teoria relativa os fins da pena são estritamente preventivos E finalmente para a teoria mista ou unificadora a pena tem dupla finalidade retributiva e preventiva A pena desponta como a retribuição estatal justa ao mal injusto provocado pelo condenado consistente na prática de um crime ou de uma contravenção penal punitur quia peccatum est É chamada de absoluta porque esgotase em si mesma ou seja a pena independe de qualquer finalidade prática não se vincula a nenhum fim pois não se preocupa com a readaptação social do infrator da lei penal Pune se simplesmente como retribuição à prática do ilícito penal Em outras palavras a pena funciona meramente como um castigo assumindo nítido caráter expiatório A pena atua como instrumento de vingança do Estado contra o criminoso com a finalidade única de castigálo fator esse que proporciona a justificação moral do condenado e o restabelecimento da ordem jurídica8 A teoria absoluta e a finalidade retributiva da pena ganharam destaque com os estudos de Georg Wilhelm Friedrich Hegel e de Emmanuel Kant que exemplificava O que se deve acrescer é que se a sociedade civil chega a dissolverse por consentimento de todos os seus membros como se por exemplo um povo que habitasse uma ilha se decidisse a abandonála e se dispersar o último assassino preso deveria ser morto antes da dissolução a fim de que cada um sofresse a pena de seu crime e para que o crime de homicídio não recaísse sobre o povo que descuidasse da imposição dessa punição porque então poderia ser considerada como cúmplice de tal violação pública da Justiça9 Para essa variante a finalidade da pena consiste em prevenir isto é evitar a prática de novas infrações penais punitur ne peccetur É irrelevante a imposição de castigo ao condenado Adotase uma posição absolutamente contrária à teoria absoluta Destarte a pena não está destinada à realização da justiça sobre a terra servindo apenas para a proteção da sociedade A pena não se esgota em si mesma despontando como meio cuja finalidade é evitar futuras ações puníveis10 A prevenção de novas infrações penais atende a um aspecto dúplice geral e especial A prevenção geral é destinada ao controle da violência na medida em que busca diminuíla e evitála Pode ser negativa ou positiva A prevenção geral negativa idealizada por J P Anselm Feuerbach com arrimo em sua teoria da coação psicológica tem o propósito de criar no espírito dos potenciais criminosos um contraestímulo suficientemente forte para afastálos da prática do crime11 Busca intimidar os membros da coletividade acerca da gravidade e da imperatividade da pena retirandolhes eventual incentivo quanto à prática de infrações penais Demonstrase que o crime não compensa pois ao seu responsável será inevitavelmente imposta uma pena assim como aconteceu em relação ao condenado punido Nas palavras de Anabela Miranda Rodrigues Os motivos pelos quais a pena deve ser aplicada quia peccatum est são pois em Feuerbach de duas ordens de razões da exigência de tornar séria isto é portadoras de consequências efetivas a ameaça contida na lei penal de tornar operante a coação psicológica que deve ser o efeito daquela ameaça e da exigência de garantir a legalidade e a certeza do direito12 Atualmente a finalidade de prevenção geral negativa manifestase rotineiramente pelo direito penal do terror Instrumentalizase o condenado na medida em que serve ele de exemplo para coagir outras pessoas do corpo social com a ameaça de uma pena grave implacável e da qual não se pode escapar Em verdade o ponto de partida da prevenção geral possui normalmente uma tendência para o terror estatal Quem pretende intimidar mediante a pena tenderá a reforçar esse efeito castigando tão duramente quanto possível13 Prevenção geral positiva de outro lado consiste em demonstrar e reafirmar a existência a validade e a eficiência do Direito Penal Almejase demonstrar a vigência da lei penal O efeito buscado com a pena é romper com a ideia de vigência de uma lei particular que permite a prática criminosa demonstrando que a lei geral que impede tal prática e a compreende como conduta indesejada está em vigor14 Em suma o aspecto positivo da prevenção geral repousa na conservação e no reforço da confiança na firmeza e poder de execução do ordenamento jurídico A pena tem a missão de demonstrar a inviolabilidade do Direito diante da comunidade jurídica e reforçar a confiança jurídica do povo15 Mas não para por aí A pena ainda é dotada de prevenção especial direcionada exclusivamente à pessoa do condenado Subdividese também a prevenção especial em negativa e positiva Para a prevenção especial negativa o importante é intimidar o condenado para que ele não torne a ofender a lei penal Busca portanto evitar a reincidência Finalmente a prevenção especial positiva preocupase com a ressocialização do condenado para que no futuro possa ele com o integral cumprimento da pena ou se presentes os requisitos legais com a obtenção do livramento condicional retornar ao convívio social preparado para respeitar as regras a todos impostas pelo Direito A pena é legítima somente quando é capaz de promover a ressocialização do criminoso16 E como tem se sustentado atualmente antes de ser socializadora a execução da pena de prisão deve ser não dessocializadora Isto num duplo sentido por um lado não se deve amputar o recluso dos direitos que a sua qualidade de cidadão lhe assegura por outro lado devese reduzir ao mínimo a marginalização de fato que a reclusão implica e os efeitos criminógenos que lhe estão associados Só a incorporação da não dessocialização no conceito de socialização permitirá cumprir a Constituição e dissolver o paradoxo de se pretender preparar a reinserção social em um contexto por definição antissocial17 A pena deve simultaneamente castigar o condenado pelo mal praticado e evitar a prática de novos crimes tanto em relação ao criminoso como no tocante à sociedade Em síntese fundemse as teorias e finalidades anteriores A pena assume um tríplice aspecto retribuição prevenção geral e prevenção especial Foi a teoria acolhida pelo art 59 caput do Código Penal quando dispõe que a pena será estabelecida pelo juiz conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime É também chamada de teoria da união eclética intermediária conciliatória ou unitária E se não bastasse o direito penal brasileiro aponta em diversos dispositivos a sua opção pela teoria mista ou unificadora De fato o Código Penal aponta o acolhimento da finalidade retributiva nos arts 121 5º e 129 8º quando institui o perdão judicial para os crimes de homicídio culposo e lesões corporais culposas Nesses casos é possível a extinção da punibilidade quando as consequências da infração atingirem o próprio agente de forma tão grave que a sanção penal se torne desnecessária Fica claro pois ser cabível o perdão judicial quando o agente já foi punido quando já foi castigado pelas consequências do crime por ele praticado Já houve portanto a retribuição Por sua vez em diversos dispositivos a Lei 72101984 Lei de Execução Penal dá ênfase à finalidade preventiva da pena em suas duas vertentes geral e especial Nesse sentido estabelece o seu art 10 caput A assistência ao preso e ao internado é dever do Estado objetivando prevenir o crime e orientar o retorno à convivência em sociedade E ainda o art 22 A assistência social tem por finalidade amparar o preso e o internado e preparálos para o retorno à liberdade O trabalho do preso tem finalidade educativa art 28 E finalmente a Convenção Americana de Direitos Humanos de 1969 conhecida como Pacto de San José da Costa Rica incorporada ao direito pátrio pelo Decreto 6781992 estatui em seu art 5º item 6 no tocante ao direito à integridade pessoal que as penas privativas de liberdade devem ter por finalidade essencial a reforma e a readaptação social dos condenados No sistema penal brasileiro as finalidades da pena devem ser buscadas pelo condenado e pelo Estado com igual ênfase à retribuição e à prevenção Na linha da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal Se é assim vale dizer se a Constituição mesma parece conferir à execução das penalidades em foco uma paralela função de reabilitação individual na perspectiva de um saneado retorno do apenado à vida societária esse mister reeducativo é de ser desempenhado pelo esforço conjunto da pessoa encarcerada e do Estadocarcereiro Esforço conjunto que há de se dar segundo pautas adrede fixadas naquilo que é o próprio cerne do regime que a lei designa como de execuções penais Um regime necessariamente concebido para fazer da efetiva constrição da liberdade topográfica de ir e vir um mecanismo tão eficiente no plano do castigo mesmo quanto no aspecto regenerador que a ela é consubstancial18 325 A teoria agnóstica também chamada de teoria negativa coloca em destaque a descrença nas finalidades da pena e no poder punitivo do Estado notadamente na ressocialização prevenção especial positiva a qual jamais pode ser efetivamente alcançada em nosso sistema penal Essa teoria portanto sustenta que a única função efetivamente desempenhada pela pena seria a neutralização do condenado especialmente quando a prisão acarreta em seu afastamento da sociedade19 FUNÇÃO SOCIAL DA PENA Falase atualmente em função social da pena e consequentemente em função social do Direito Penal direcionada eficazmente à sociedade a qual se destina pois no tocante a ela a pena tem as tarefas de protegêla e pacificar seus membros após a prática de uma infração penal 326 a b Não basta a retribuição pura e simples pois nada obstante a finalidade mista acolhida pelo sistema penal brasileiro a crise do sistema prisional transforma a pena em castigo e nada mais A pena deve atender aos anseios da sociedade consistentes na tutela dos bens jurídicos indispensáveis para a manutenção e o desenvolvimento do indivíduo e da coletividade pois só assim será legítima e aceita por todos em um Estado Democrático de Direito combatendo a impunidade e recuperando os condenados para o convívio social Em sua aplicação prática a pena necessita passar pelo crivo da racionalidade contemporânea impedindo se torne o delinquente instrumento de sentimentos ancestrais de represália e castigo Só assim o Direito Penal poderá cumprir a sua função preventiva e socializadora com resultados mais produtivos para a ordem social e para o próprio transgressor20 FUNDAMENTOS DA PENA Fundamentos da pena não se confundem com finalidades da pena Aqueles se relacionam com os motivos que justificam a existência e a imposição de uma pena estas dizem respeito ao objetivo que se busca alcançar com sua aplicação Apontamse seis principais fundamentos da pena retribuição reparação denúncia incapacitação reabilitação e dissuasão Retribuição conferese ao condenado uma pena proporcional e correspondente à infração penal na qual ele se envolveu É a forma justa e humana que tem a sociedade para punir os criminosos com proporção entre o ilícito penal e o castigo O mal que a pena transmite ao condenado deve ser equivalente ao mal produzido por ele à coletividade O crime deve ter a pena que merece desvalor do criminoso semelhante ao desvalor social da conduta Reparação consiste em conferir algum tipo de recompensa à vítima do delito Relacionase com a vitimologia notadamente com a assistência à vítima e à reparação do dano como forma de recompor o mal social causado pela infração penal c d e f 327 Denúncia é a reprovação social à prática do crime ou da contravenção penal A necessidade de aplicação da pena justificase para exercer a prevenção geral por meio da intimidação coletiva e não para desfazer o desequilíbrio causado pelo crime Incapacitação privase a liberdade do condenado retirandoo do convívio social para a proteção das pessoas de bem Para Garofalo a pena é um mal necessário à reparação do dano provocado pela conduta criminosa E embora na aparência o fim da pena seja a vingança social ou o desejo de fazer sofrer ao culpado um mal análogo ao que ele produziu na realidade o que se deseja é isto em primeiro lugar excluir do meio coletivo os delinquentes inassimiláveis depois constranger o autor de um mal a reparálo tanto quanto possível21 Reabilitação deve recuperarse o penalmente condenado A pena precisa restaurar o criminoso tornandoo útil à sociedade Funciona como meio educativo de reinserção social e não punitivo Dissuasão busca convencer as pessoas em geral e também o condenado de que o crime é uma tarefa desvantajosa e inadequada A pena inserese como atividade destinada a impedir o culpado de tornarse nocivo à sociedade bem como instrumento para afastar os demais indivíduos de práticas ilícitas perante o Direito Penal COMINAÇÃO DAS PENAS Nos moldes do art 53 do Código Penal As penas privativas de liberdade têm seus limites estabelecidos na sanção correspondente a cada tipo legal de crime Esse dispositivo é desnecessário no tocante às penas privativas de liberdade pois já são cominadas por cada tipo legal de crime ou contravenção penal nos limites mínimo e máximo Exemplificativamente o art 155 do Código Penal prevê para o furto simples o limite mínimo de 1 um e máximo de 4 quatro anos de reclusão Entretanto a função substitutiva atribuída às penas restritivas de direitos e a b c d 328 a a cominação indeterminada das penas de multa explicam a introdução no Código Penal dessas regras de cominação evitando uma cansativa e indevida repetição em cada tipo legal22 Em nosso sistema penal as penas podem ser cominadas previstas em abstrato por diversas modalidades isoladamente cuidase da cominação única de uma pena prevista com exclusividade pelo preceito secundário do tipo incriminador Exemplo art 121 caput do Código Penal com pena de reclusão cumulativamente o tipo penal prevê em conjunto duas espécies de penas Exemplo art 157 caput do Código Penal com penas de reclusão e multa paralelamente cominamse alternativamente duas modalidades da mesma pena Exemplo art 235 1º do Código Penal com penas de reclusão ou detenção pois ambas são privativas de liberdade alternativamente a lei coloca à disposição do magistrado a aplicação única de duas espécies de penas Há duas opções mas o julgador somente pode aplicar uma delas Exemplo art 140 caput do Código Penal com penas de detenção ou multa CLASSIFICAÇÃO DAS PENAS As penas podem ser classificadas com base em variados critérios quanto ao bem jurídico do condenado atingido pela reação estatal pena quanto ao critério constitucional e quanto ao critério adotado pelo Código Penal A pena pode ser dividida em cinco espécies Pena privativa de liberdade retira do condenado o seu direito de locomoção em razão da prisão por tempo determinado Não se admite a privação perpétua da liberdade CF art 5º XLVII b b c d e mas somente a de natureza temporária pelo período máximo de 30 trinta anos para crimes CP art 75 ou de 5 cinco anos para contravenções penais LCP art 10 Pena restritiva de direitos limita um ou mais direitos do condenado em substituição à pena privativa de liberdade Está prevista no art 43 do Código Penal e por alguns dispositivos da legislação extravagante Pena de multa incide sobre o patrimônio do condenado Pena restritiva da liberdade restringe o direito de locomoção do condenado sem priválo da liberdade isto é sem submetêlo à prisão É o caso da pena de banimento consistente na expulsão de brasileiro do território nacional vedada pelo art 5º XLVII d da Constituição Federal É possível a instituição por lei de pena restritiva da liberdade em face de autorização constitucional art 5º XLVI a Exemplo proibir o condenado por crime sexual de aproximarse da residência da vítima A deportação a expulsão e a extradição de estrangeiros são admissíveis uma vez que têm natureza administrativa e não penal e encontramse previstas nos arts 50 a 60 e 81 a 99 da Lei 134452017 Lei de Migração Pena corporal viola a integridade física do condenado tal como ocorre nas penas de açoite de mutilações e de marcas de ferro quente Essas penas são vedadas pelo art 5º XLVII e da Constituição Federal em face da crueldade de que se revestem Admitese excepcionalmente a pena de morte em caso de guerra declarada contra agressão estrangeira CF art 5º XLVII a nas hipóteses previstas no Decretolei 10011969 Código Penal Militar Essa classificação das penas encontrase no art 5º XLVI e XLVII da Constituição Federal No inc XLVI o art 5º contempla as penas permitidas O rol é 329 exemplificativo pois se admitem entre outras as penas de privação ou restrição da liberdade perda de bens multa prestação social alternativa e suspensão ou interdição de direitos Por outro lado o inc XLVII do art 5º enumera as penas proibidas a saber de morte salvo em caso de guerra declarada de caráter perpétuo23 de trabalhos forçados de banimento e cruéis As penas previstas no Código Penal em seu art 32 são privativas de liberdade restritivas de direitos e multa ABOLICIONISMO PENAL O movimento abolicionista encontra sua origem na Holanda nos estudos de Louk Hulsman e na Noruega nos pensamentos de Nils Christie e Thomas Mathiesen Consiste em uma nova forma de pensar o Direito Penal mediante o debate crítico do fundamento das penas e das instituições responsáveis pela aplicação desse ramo do Direito Para enfrentar a crise penitenciária que cresce a cada dia nos mais variados cantos do mundo propõese a descriminalização de determinadas condutas o crime deixa de existir e a despenalização de outros comportamentos subsiste o crime mas desaparece a pena Em casos residuais atenuamse consideravelmente as sanções penais dirigidas às condutas ilícitas de maior gravidade O abolicionismo penal parte da seguinte reflexão a forma atual de punição escolhida pelo Direito Penal é falha pois a reincidência aumenta diariamente Além disso a sociedade não sucumbe à prática de infrações penais mormente se forem consideradas as cifras negras da justiça penal ou seja os crimes efetivamente praticados porém ignorados pelos operadores do Direito24 E dentre os apurados somente alguns resultam em condenações e mesmo no grupo dos condenados poucos indivíduos cumprem integralmente a pena imposta Portanto a sociedade ao contrário do que comumente se sustenta tem capacidade para suportar a maioria das infrações penais sem submeterse a prejuízos irreparáveis Para os defensores desse movimento é o que já ocorre nos dias atuais embora informalmente Assim sendo o problema penal poderia ser adequadamente solucionado por outros meios notadamente com o atendimento prioritário à vítima pois seria mais eficaz empregar os valores utilizados com a construção de prisões e manutenção de detentos para reparar os danos a ela proporcionados Defendese ainda a legalização das drogas e a mudança do tratamento do criminoso que não pode ser marginalizado e encarado diversamente das demais pessoas É importante ressaltar que o abolicionismo penal possui variantes entre seus partidários Louk Hulsman apregoa um abolicionismo fenomenológico e ampara suas ideias no entendimento de que o sistema penal constituise como um 3210 problema em si mesmo Cuidase de uma inutilidade incapaz de resolver os problemas que se propõe a solucionar Destarte sustenta a sua abolição total por tratarse de um sistema que causa sofrimentos desnecessários e mais ainda acarreta em uma distribuição de justiça socialmente injusta pois produz inúmeros efeitos negativos nas pessoas a ele submetidas apresentando completa ausência de controle por parte do Estado O penalista holandês prega então a abolição imediata do sistema penal afastando o Poder Público de todo e qualquer conflito solucionandose os problemas sociais por instâncias intermediárias sem natureza penal25 Além disso propõe a eliminação de nomenclaturas utilizadas na justiça penal eliminando dentre outros os termos crime e criminoso Trata o fenômeno crime como um problema social o que enseja a pacificação dos conflitos em um ambiente diverso do atualmente existente Já Thomas Mathiesen e Nils Christie compartilham de um abolicionismo fenomenológicohistoricista Vinculam o sistema penal à estrutura do sistema capitalista razão pela qual além da sua eliminação defendem o fim de todo e qualquer método de repressão existente na sociedade Destarte a luta pelo direito deve se concentrar num esforço de limitação da dor26 Em face de sua proposta central eliminar o sistema penal descriminalizar condutas e acabar com penas o abolicionismo penal é considerado uma utopia até mesmo pelos representantes do direito penal mínimo e do garantismo penal27 Nada obstante esse movimento recebeu na América Latina a simpatia de Eugenio Raúl Zaffaroni levandoo inclusive a escrever toda uma obra sobre o assunto28 JUSTIÇA RESTAURATIVA Desde sua origem o Direito Penal sempre se pautou pelo castigo da conduta criminosa praticada por alguém com a imposição de uma pena Buscouse e buscase incansavelmente a retribuição do mal praticado com a aplicação concreta de outro mal embora legítimo representado pela pena Daí falarse que o Direito Penal enseja a configuração de uma justiça retributiva Atualmente entretanto surge uma nova proposta consistente na justiça restaurativa fundada basicamente na restauração do mal provocado pela infração penal Essa vertente parte da seguinte premissa o crime e a contravenção penal não necessariamente lesam interesses do Estado difusos e indisponíveis Tutelase com maior intensidade a figura da vítima historicamente relegada a um segundo plano no Direito Penal Dessa forma relativizamse os interesses advindos com a prática da infração penal que de difusos passam a ser tratados como individuais e consequentemente disponíveis A partir daí o litígio antes entre a justiça pública e o responsável pelo ilícito penal passa a ter como protagonistas o ofensor e o ofendido e a punição deixa de ser o objetivo imediato da atuação do Direito Penal Surge a possibilidade de conciliação entre os envolvidos autor coautor ou partícipe e vítima mitigandose a persecução penal uma vez que não é mais obrigatório o exercício da ação penal A justiça restaurativa tem como principal finalidade portanto não a imposição da pena mas o reequilíbrio das relações entre agressor e agredido contando para tanto com o auxílio da comunidade inicialmente atacada mas posteriormente desempenhando papel decisivo na restauração da paz social Nesse contexto vislumbrase a justiça com ênfase na reparação do mal proporcionado pelo crime compreendido como uma violação às pessoas e aos relacionamentos coletivos e não como uma ruptura com o Estado Em verdade o crime deixa de constituirse em ato contra o Estado para ser ato contra a comunidade contra a vítima e ainda contra o seu próprio autor pois ele também é agredido com a violação do ordenamento jurídico E se na justiça retributiva há interesse público na atuação do Direito Penal na justiça restaurativa tal interesse pertence às pessoas envolvidas no episódio criminoso29 Não mais se imputa a responsabilidade pelo crime pessoalmente ao seu autor coautor ou partícipe Ao contrário todos os membros da sociedade são 1 responsáveis pelo fato praticado já que falharam na missão de viverem pacificamente em grupo Os procedimentos formais e rígidos da justiça retributiva cedem espaço na justiça restaurativa a meios informais e flexíveis prevalecendo a disponibilidade da ação penal Proporciona coragem ao agressor para responsabilizarse pela conduta danosa refletindo sobre as causas e os efeitos do seu comportamento em relação aos seus pares para então modificar o seu modo de agir e ser posteriormente aceito de volta na comunidade Como resultado a justiça restaurativa pode acarretar em perdão recíproco entre os envolvidos bem como em reparação à vítima em dinheiro ou até mesmo com prestação de serviços em geral a ela ou à sociedade Esse método tende a criar um ambiente seguro no qual o ofendido pode aproximarse do autor da conduta ilícita Além disso a justiça restaurativa oferece à comunidade uma oportunidade de articular seus valores e expectativas acerca do entendimento das causas subjacentes do crime e determinar o que pode ser feito para reparar o mal provocado e restabelecer a tranquilidade outrora existente Assim agindo contribui para o bem coletivo e colabora potencialmente para a diminuição do índice de criminalidade E se a todos incumbe a restauração da paz pública as penas privativas de liberdade abrem passagem para a reparação do dano e para as medidas substitutivas da pena privativa de liberdade como decorrência da incessante atividade conciliatória característica da justiça restaurativa Seu foco principal é a assistência à vítima Um primeiro passo no Brasil para a implantação da justiça restaurativa operouse com a Lei 90991995 notadamente quando se dispõe a evitar a aplicação da pena privativa de liberdade seja com a composição dos danos civis seja com o instituto da transação penal Mas os seus partidários desejam ampliar seu raio de incidência e a amoldam a alguns princípios básicos e regras procedimentais de segurança quais sejam A participação da vítima e do agressor na justiça restaurativa depende do consentimento válido de ambas as partes devendo cada uma delas receber explicações claras acerca da natureza do procedimento e de 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 suas consequências Em qualquer momento os envolvidos podem desistir da participação na justiça restaurativa A vítima e o agressor precisam aceitar como verdadeiro o episódio criminoso e o agressor deve reconhecer sua responsabilidade pela prática do fato debatido As partes têm o direito de aconselharemse juridicamente em todas as etapas do procedimento O encaminhamento de um caso iniciado na justiça retributiva à justiça restaurativa pode ocorrer em qualquer momento desde a investigação criminal até o trânsito em julgado da condenação O trâmite do procedimento deve considerar as diferenças eventualmente existentes entre a vítima e o agressor causadas por motivos de idade de maturidade de capacidade intelectual situação econômica etc Todas as discussões salvo as eminentemente públicas devem ser confidenciais exceto se as partes convencionarem de outro modo ou se a publicidade para os agentes públicos responsáveis pela persecução penal for exigida por lei ou se as discussões revelarem ameaça potencial ou real à segurança ou à vida de qualquer dos envolvidos A aceitação da responsabilidade penal pelo agressor não pode ser utilizada como prova contra ele em futuro e possível processo judicial Todos os acordos devem ser voluntários e livres de qualquer tipo de coação e precisam conter apenas termos claros e facilmente compreensíveis por qualquer pessoa de inteligência mediana O descumprimento de um acordo alcançado na justiça restaurativa não pode ser usado em ação penal em juízo seja para reconhecimento de culpa seja para fundamentar punição mais severa ao ofensor O procedimento deve ser conduzido por pessoa preparada aceita pela coletividade e revestida de imparcialidade Todo programa de justiça restaurativa deve ser constantemente 3211 3212 avaliado e aperfeiçoado visando satisfazer aos interesses sociais de restabelecimento do mal causado pelo crime e proporcionar o reequilíbrio da paz pública JUSTIÇA NEGOCIADA Com origem no direito anglosaxão notadamente no sistema norte americano da plea bargaining esse modelo de justiça penal diferenciase da tradicional justiça retributiva na qual se busca a imposição da pena a quem violou a norma penal sem qualquer espaço para transação entre as partes Na justiça negociada por sua vez o sujeito que ofendeu a norma penal e o órgão acusatório celebram acordo envolvendo as consequências jurídicas da conduta criminosa com a imprescindível admissão de culpa Essa negociação pode recair tanto sobre a imputação formulada contra o réu como também sobre a pena a ser aplicada e os demais efeitos jurídicos do delito a exemplo do perdimento de bens e da reparação dos danos causados pela conduta criminosa ou ainda sobre ambas Uma importante manifestação desse modelo de justiça penal encontrase no instituto da colaboração premiada na forma definida pelos arts 4º e seguintes da Lei 128502013 Lei do Crime Organizado e também no acordo de não persecução penal instituído no âmbito do Ministério Público pelo art 18 da Resolução CNMP Conselho Nacional do Ministério Público 1812017 TEORIA DAS JANELAS QUEBRADAS BROKEN WINDOWS THEORY Em 1969 na Universidade de Stanford nos Estados Unidos da América Phillip Zimbardo acompanhado de sua equipe realizou uma experiência inédita no campo da psicologia social Seu estudo consistiu em abandonar dois automóveis idênticos em vias públicas um no Bronx zona pobre e problemática de New York e outra em Palo Alto local rico e tranquilo da Califórnia Carros iguais mas populações culturas e realidades sociais diversas O automóvel abandonado no Bronx foi rapidamente destruído pela ação de vândalos e subtraíramse vários dos seus componentes Por sua vez o carro deixado em Palo Alto permaneceu intacto Concluiuse em análise inicial ser a pobreza um fator determinante da criminalidade Os pesquisadores então decidiram quebrar uma das janelas do automóvel que se encontrava íntegro Rapidamente instalouse idêntico processo ao ocorrido no Bronx com a completa destruição do veículo Logo percebeuse não ser a pobreza por si só a causa fomentadora de infrações penais e sim a sensação de impunidade De fato uma janela quebrada em um automóvel transmite o sentimento de desinteresse de deterioração de despreocupação com as regras de convivência com a ausência do Estado E cada novo ataque reafirma e multiplica essa ideia até que a prática de atos ilícitos se torna incontrolável No ano de 1982 James Q Wilson e George L Kelling desenvolveram agora no terreno da criminologia a teoria das janelas quebradas broken windows theory30 sustentando a maior incidência de crimes e contravenções penais nos locais em que o descuido e a desordem são mais acentuados Com efeito quando se quebra a janela de uma casa e nada se faz implicitamente se estimula a destruição do imóvel como um todo De igual modo se uma comunidade demonstra sinais de deterioração e isto parece não importar a ninguém ali a criminalidade irá se instalar Nesse sentido se são cometidos pequenos delitos lesões corporais leves furtos etc sem a imposição de sanções adequadas pelo Estado abrese espaço para o cometimento de crimes mais graves tais como homicídios roubos latrocínios e tráfico de drogas A teoria das janelas quebradas foi inicialmente aplicada na década de 1980 no metrô de New York que havia se convertido no ponto mais perigoso da cidade mediante o combate às pequenas infrações a exemplo das pichações deteriorando as paredes e os vagões sujeira nas estações consumo de álcool pelos usuários e não pagamento de passagens A estratégia foi certeira e eficaz e em pouco tempo constatouse profunda melhora convertendose o metrô em local limpo e seguro Em 1994 Rudolph Giuliani então prefeito de New York acolhendo as premissas da teoria das janelas quebradas e a experiência do metrô implantou a política de tolerância zero com a finalidade de vedar qualquer violação da lei independentemente do seu grau Os adeptos dessa linha de pensamento destacam que não se trata de tolerância zero no tocante à pessoa do responsável pelo delito mas em relação ao próprio delito Na criminologia é frequente a relação da teoria das janelas quebradas com a teoria dos testículos quebrados ou despedaçados breaking balls theory Essa linha de raciocínio originase da experiência policial e parte da premissa de que os responsáveis pelos delitos de pouca gravidade quando perseguidos com eficácia pela polícia normalmente se dão por vencidos e fogem para locais distantes para que possam violar a lei penal sem serem frequentemente molestados pelos agentes do Estado 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 ROXIN Claus Derecho penal Parte general Fundamentos La estructura de la teoría del delito Trad espanhola DiegoManuel Luzón Peña Miguel Díaz y García Conlledo e Javier de Vicente Remensal Madrid Civitas 2006 t I p 43 e JESCHECK HansHeinrich Tratado de derecho penal Parte general 5 ed Trad espanhola Miguel Olmedo Cardenete Granada Comares 2002 p 89 BRUNO Aníbal Das penas Rio de Janeiro Editora Rio 1976 p 10 STF AgRQO 1033DF rel Min Celso de Mello Plenário j 25052006 NUCCI Guilherme de Souza Individualização da pena 2 ed São Paulo RT 2007 p 30 SILVA José Afonso da Comentário contextual à Constituição 4 ed São Paulo Malheiros 2007 p 145 HUNGRIA Nélson Comentários ao Código Penal Rio de Janeiro Forense 1949 v I p 86 DIAS Jorge de Figueiredo Temas básicos da doutrina penal Coimbra Coimbra Editora 2001 p 6566 Dizem uns que a justiça penal não podendo desinteressarse da falta moral deve aplicar a todo delinquente com capacidade para compreender as disposições da lei uma pena aflitiva isto é um castigo que importe em retribuição proporcional à falta moral A consciência pública sente a sua necessidade e o legislador não pode deixar de levar em conta esse estado de alma coletivo LYRA Roberto Comentários ao Código Penal Rio de Janeiro Forense 1942 v II p 43 KANT Emmanuel Doutrina do direito Trad Edson Bini São Paulo Ícone 1993 p 178179 JESCHECK HansHeinrich Tratado de derecho penal Parte general 5 ed Trad espanhola Miguel Olmedo Cardenete Granada Comares 2002 p 77 DIAS Jorge de Figueiredo Questões fundamentais de direito penal revisitadas São Paulo RT 1999 p 99 RODRIGUES Anabela Miranda A determinação da pena privativa de liberdade Coimbra Coimbra Editora 1995 p 170 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 ZAFFARONI Eugenio Raúl Derecho penal Parte general 2 ed Buenos Aires Ediar 2002 p 5859 JUNQUEIRA Gustavo Octaviano Diniz Finalidades da pena BarueriSP Manole 2004 p 69 ROXIN Claus Derecho penal Parte geral Fundamentos La estructura de la teoría del delito Tradução para o espanhol de DiegoManuel Luzón Peña Miguel Díaz y García Conlledo e Javier de Vicente Remensal Madrid Civitas 2006 t I p 91 HASSEMER Winfried Direito penal libertário Trad Regina Greve Belo Horizonte Del Rey 2007 p 104 RODRIGUES Anabela Miranda Novo olhar sobre a questão penitenciária 2 ed Coimbra Coimbra Editora 2002 p 52 HC 91874RS decisão monocrática do Min Carlos Britto j 31082007 ZAFFARONI Eugenio Raúl Derecho penal Parte general 2 ed Buenos Aires Ediar 2002 p 44 MARQUES Oswaldo Henrique Duek Fundamentos da pena São Paulo Juarez de Oliveira 2000 p 110 GAROFALO Raffaele Criminologia estudo sobre o delicto e a repressão penal São Paulo Teixeira e Irmão 1893 p 114 SANTOS Juarez Cirino dos Direito penal Parte geral 2 ed Curitiba ICPC Lumen Juris 2007 p 549 Nos Estados Unidos da América em alusão às regras do beisebol existem defensores do modelo three strikes and youre out a terceira condenação definitiva leva à exclusão social do indivíduo mediante a imposição da pena de prisão perpétua Falase também no direito penal subterrâneo composto pelos crimes decorrentes do exercício arbitrário do direito de punir por determinados agentes públicos a exemplo de torturas e homicídios cometidos por policiais Este fenômeno surge e ganha corpo notadamente em face da ineficácia dos órgãos estatais Polícias Ministério Público Poder Judiciário etc HULSMAN Louk Sistema penal y seguridad ciudadana hacia una alternativa Trad espanhola Sergio Politoff Barcelona Ariel 1984 p 31 SHECAIRA Sérgio Salomão CORRÊA JUNIOR Alceu Teoria da pena finalidades direito positivo jurisprudência e outros estudos de ciência 27 28 29 30 criminal São Paulo RT 2002 p 140 Cf FERRAJOLI Luigi Direito e razão teoria do garantismo penal 2 ed Trad Ana Paula Zomer Sica Fauzi Hassan Choukr Juarez Tavarez e Luiz Flávio Gomes São Paulo RT 2006 p 317318 ZAFFARONI Eugenio Raúl Em busca das penas perdidas 5 ed Rio de Janeiro Revan 2001 Daí falase que na justiça restaurativa operase uma privatização do Direito Penal WILSON James Q e KELLING George L Broken windows The police and neighborhood safety Atlantic Monthly Magazine Washington DC março de 1982 a b c Pena privativa de liberdade é a modalidade de sanção penal que retira do condenado seu direito de locomoção em razão da prisão por tempo determinado O direito penal brasileiro admite três espécies de penas privativas de liberdade reclusão e detenção relativas a crimes CP art 33 caput e prisão simples inerente às contravenções penais LCP art 5º I Regime ou sistema penitenciário é o meio pelo qual se efetiva o cumprimento da pena privativa de liberdade O art 33 1º do Código Penal elenca três regimes fechado a pena privativa de liberdade é executada em estabelecimento de segurança máxima ou média semiaberto a pena privativa de liberdade é executada em colônia agrícola industrial ou estabelecimento similar e aberto a pena privativa de liberdade é executada em casa de albergado ou estabelecimento adequado 3341 A leitura do art 33 2º e 3º do Código Penal revela que três fatores são decisivos na escolha do regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade reincidência quantidade da pena e circunstâncias judiciais Na visão do Superior Tribunal de Justiça O regime inicial de cumprimento da pena deve considerar a quantidade de pena imposta e a análise das circunstâncias judiciais assim como eventual reincidência A gravidade abstrata do crime por si só não pode levar à determinação do regime fechado inicialmente pois esta já foi considerada na escala penal a ele cominada1 É o juiz sentenciante quem fixa o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade CP art 59 III E na hipótese de concurso de crimes levase em conta o total das penas impostas somadas concurso material e concurso formal imperfeito ou exasperadas de determinado percentual concurso formal perfeito e crime continuado Mas se durante a execução penal surgirem outras condenações criminais transitadas em julgado o juízo da execução deverá somar o restante da pena objeto da execução com as novas penas estabelecendo em seguida o regime de cumprimento para o total das reprimendas Regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade e crimes hediondos ou equiparados Nos crimes hediondos previstos taxativamente no art 1º da Lei 80721990 e nos delitos a estes equiparados pela determinação expressa contida no art 5º XLIII da Constituição Federal tráfico de drogas tortura e terrorismo o art 2º 1º do citado diploma legislativo determina seja a pena privativa de liberdade cumprida em regime inicialmente fechado independentemente da sua quantidade e do perfil subjetivo do réu primariedade ou reincidência e circunstâncias judiciais favoráveis ou desfavoráveis2 Em outras palavras a Lei dos Crimes Hediondos não reserva ao magistrado discricionariedade no tocante à fixação do regime prisional O Supremo Tribunal Federal entretanto declarou a inconstitucionalidade desta regra por violação aos princípios da individualização da pena e da proporcionalidade É inconstitucional o 1º do art 2º da Lei 80721990 Art 2º Os crimes hediondos a prática da tortura o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e o terrorismo são insuscetíveis de 1º A pena por crime previsto neste artigo será cumprida inicialmente em regime fechado Com base nesse entendimento o Plenário por maioria deferiu habeas corpus com a finalidade de alterar para semiaberto o regime inicial de pena do paciente o qual fora condenado por tráfico de drogas com reprimenda inferior a 8 anos de reclusão e regime inicialmente fechado por força da Lei 114642007 que instituíra a obrigatoriedade de imposição desse regime a crimes hediondos e assemelhados v Informativo 670 Destacouse que a fixação do regime inicial fechado se dera exclusivamente com fundamento na lei em vigor Observouse que não se teriam constatado requisitos subjetivos desfavoráveis ao paciente considerado tecnicamente primário Ressaltouse que assim como no caso da vedação legal à substituição de pena privativa de liberdade por restritiva de direitos em condenação pelo delito de tráfico já declarada inconstitucional pelo STF a definição de regime deveria sempre ser analisada independentemente da natureza da infração Ademais seria imperioso aferir os critérios de forma concreta por se tratar de direito subjetivo garantido constitucionalmente ao indivíduo Consignouse que a Constituição contemplaria as restrições a serem impostas aos incursos em dispositivos da Lei 80721990 e dentre elas não se encontraria a obrigatoriedade de imposição de regime extremo para início de cumprimento de pena Salientouse que o art 5º XLIII da CF afastaria somente a fiança a graça e a anistia para no inciso XLVI assegurar de forma abrangente a individualização da pena3 Nessa linha de raciocínio o Supremo Tribunal Federal já aplicou os regimes semiaberto e aberto a réus condenados pelo crime de tráfico de drogas levando em conta as penas aplicadas e as circunstâncias judiciais reveladas em cada caso concreto4 De forma curiosa todavia a Corte Suprema reconheceu a constitucionalidade do art 1º 7º da Lei 94551997 o qual impõe o regime inicial fechado para o condenado pelo crime de tortura O condenado por crime de tortura iniciará o cumprimento da pena em regime fechado nos termos do disposto no 7º do art 1º da Lei 94551997 Lei de Tortura Com base nessa orientação a Primeira Turma denegou pedido formulado em habeas corpus no qual se pretendia o reconhecimento de constrangimento ilegal consubstanciado na fixação em sentença penal transitada em julgado do cumprimento das penas impostas aos pacientes em regime inicialmente fechado Alegavam os impetrantes a ocorrência de violação ao princípio da individualização da pena uma vez que desrespeitados os artigos 33 3º e 59 do CP Apontavam a existência de similitude entre o disposto no artigo 1º 7º da Lei de Tortura e o previsto no art 2º 1º da Lei de Crimes Hediondos dispositivo legal que já teria sido declarado inconstitucional pelo STF no julgamento do HC 111840ES DJe de 17122013 Salientavam por fim afronta ao Enunciado 719 da Súmula do STF O Ministro Marco Aurélio relator denegou a ordem Considerou que no caso a dosimetria e o regime inicial de cumprimento das penas fixadas atenderiam aos ditames legais Asseverou não caber articular com a Lei de Crimes Hediondos pois a regência específica Lei 94551997 prevê expressamente que o condenado por crime de tortura iniciará o cumprimento da pena em regime fechado o que não se confundiria com a imposição de regime de cumprimento da pena integralmente fechado Assinalou que o legislador ordinário em consonância com a CF1988 teria feito uma opção válida ao prever que considerada a gravidade do crime de tortura a execução da pena ainda que fixada no mínimo legal deveria ser cumprida inicialmente em regime fechado sem prejuízo de posterior progressão5 O Supremo Tribunal Federal criou uma situação inusitada ao conferir valores diversos a crimes que receberam igual tratamento pelo art 5º inc 3342 XLIII da Constituição Federal Em síntese a Corte classifica como inconstitucional o regime inicial fechado nos delitos hediondos no tráfico de drogas e no terrorismo e simultaneamente o reputa constitucional no crime de tortura Tráfico de drogas privilegiado e Lei dos Crimes Hediondos O tráfico de drogas privilegiado encontrase tipificado no art 33 4º da Lei 113432006 A diminuição da pena de 16 um sexto a 23 dois terços aplicase aos crimes definidos no caput e no 1º do art 33 do citado diploma legal desde que estejam presentes 4 quatro requisitos cumulativos relacionados ao agente a primariedade b bons antecedentes c não se dedicar a atividades criminosas e d não integrar organizações criminosas É fácil notar que tal delito nada mais é do que um tráfico de drogas sobre o qual incide uma causa de diminuição da pena Em outras palavras tratase de um crime constitucionalmente equiparado a hediondo porém acompanhado de uma minorante O Supremo Tribunal Federal entretanto decidiu que o tráfico privilegiado não se submete às disposições da Lei dos Crimes Hediondos pois não é assemelhado aos delitos desta estirpe O crime de tráfico privilegiado de drogas não tem natureza hedionda Por conseguinte não são exigíveis requisitos mais severos para o livramento condicional Lei 113432006 art 44 parágrafo único e tampouco incide a vedação à progressão de regime Lei 80721990 art 2º 2º para os casos em que aplicada a causa de diminuição prevista no art 33 4 Lei 113432006 Com base nessa orientação o Plenário por maioria concedeu a ordem de habeas corpus para afastar a natureza hedionda de tal delito No caso os pacientes foram condenados pela prática de tráfico privilegiado e a sentença de 1º grau afastara a natureza hedionda do delito Posteriormente o STJ entendera caracterizada a hediondez o que impediria a concessão dos referidos benefícios O Tribunal superou a jurisprudência que se firmara no sentido da hediondez do tráfico privilegiado Sublinhou que a previsão legal seria indispensável para qualificar um crime como hediondo ou equiparado Assim a partir da leitura dos preceitos legais pertinentes apenas as modalidades de tráfico de entorpecentes definidas no art 33 caput e 1º da Lei 113432006 seriam equiparadas a crimes hediondos Entendeu que para alguns delitos e seus autores ainda que se tratasse de tipos mais gravemente apenados deveriam ser reservadas algumas alternativas aos critérios gerais de punição A legislação alusiva ao tráfico de drogas por exemplo prevê a possibilidade de redução da pena desde que o agente seja primário e de bons antecedentes não se dedique a atividades criminosas e nem integre organização criminosa Essa previsão legal permitiria maior flexibilidade na gestão da política de drogas pois autorizaria o juiz a avançar sobre a realidade pessoal de cada autor Além disso teria inegável importância do ponto de vista das decisões de política criminal A Corte observou que no caso do tráfico privilegiado a decisão do legislador fora no sentido de que o agente deveria receber tratamento distinto daqueles sobre os quais recairia o alto juízo de censura e de punição pelo tráfico de drogas As circunstâncias legais do privilégio demonstrariam o menor juízo de reprovação e em consequência de punição dessas pessoas Não se poderia portanto chancelarse a hediondez a essas condutas por exemplo Assim a imposição de pena não deveria estar sempre tão atrelada ao grau de censura constante da cominação abstrata dos tipos penais O juiz deveria ter a possibilidade de exame quanto à adequação da sanção imposta e o respectivo regime de cumprimento a partir do exame das características específicas na execução de determinados fatos cujo contexto em que praticados apresentasse variantes socialmente relevantes em relação ao juízo abstrato de censura cominada na regra geral De outro lado o art 33 4º da Lei 113432006 mereceria crítica na medida em que proíbe a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito Assentou ainda que a etiologia do crime privilegiado seria incompatível com a natureza hedionda Além disso os Decretos 67062008 e 70492009 beneficiaram com indulto os condenados pelo tráfico de entorpecentes privilegiado a demonstrar inclinação no sentido de que esse delito não seria hediondo Demais disso cumpre assinalar que o crime de associação para o tráfico que reclama liame subjetivo estável e habitual direcionado à consecução da traficância não seria equiparado a hediondo Dessa forma afirmar que o tráfico minorado fosse considerado hediondo significaria que a lei ordinária conferiria ao traficante ocasional tratamento penal mais severo que o dispensado ao agente que se associa de forma estável para exercer a traficância de modo habitual a escancarar que tal inferência consubstanciaria violação aos limites que regem a edição legislativa penal6 Em um primeiro momento o Superior Tribunal de Justiça acolheu entendimento diverso e editou a Súmula 512 A aplicação da causa de diminuição de pena prevista no art 33 4º da Lei 113432006 não afasta a hediondez do crime de tráfico de drogas Com a superveniência da posição adotada pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal todavia essa súmula foi cancelada no dia 23 de novembro de 2016 É do juízo das execuções penais LEP art 1º Nos termos da Súmula 192 do Superior Tribunal de Justiça Compete ao Juízo das Execuções Penais do Estado a execução das penas impostas a sentenciados pela Justiça Federal Militar ou Eleitoral quando recolhidos a estabelecimentos sujeitos à administração estadual A execução da pena privativa de liberdade tem índole jurisdicional Não se pode esquecer porém que também guarda em diversos momentos um aspecto administrativo Em face da sua cada vez mais crescente jurisdicionalização as decisões proferidas pelo juízo da execução comportam o recurso de agravo normalmente sem efeito suspensivo previsto no art 197 da Lei 72101984 Lei de Execução Penal Esse agravo segue o rito do recurso em sentido estrito disciplinado no art a b c d 581 e seguintes do Código de Processo Penal notadamente pela identidade de prazos para a interposição de ambos Como preceitua a Súmula 700 do Supremo Tribunal Federal É de 5 cinco dias o prazo para interposição de agravo contra decisão do juiz da execução penal A pena de reclusão deve ser cumprida inicialmente em regime fechado semiaberto ou aberto CP art 33 caput 1ª parte Os critérios para a determinação do regime são os seguintes a teor das alíneas a b e c do 2º do art 33 do Código Penal o reincidente inicia o cumprimento da pena privativa de liberdade no regime fechado independentemente da quantidade da pena aplicada Para amenizar essa regra o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula 269 É admissível a adoção do regime prisional semiaberto aos reincidentes condenados a pena igual ou inferior a 4 quatro anos se favoráveis as circunstâncias judiciais o primário cuja pena seja superior a 8 oito anos deverá começar a cumprila no regime fechado7 o primário cuja pena seja superior a 4 quatro anos e não exceda a 8 oito poderá desde o princípio cumprila em regime semiaberto e o primário cuja pena seja igual ou inferior a 4 quatro anos poderá desde o início cumprila em regime aberto É possível todavia seja imposto em relação ao condenado primário um regime inicial mais rigoroso do que o permitido exclusivamente pela quantidade da pena aplicada8 Com efeito dispõe o art 33 3º do Código Penal A determinação do regime inicial de cumprimento da pena farseá com observância dos critérios previstos no art 59 deste Código Destarte nada impede exemplificativamente a fixação do regime fechado a condenado primário condenado a 5 cinco anos de reclusão se as circunstâncias judiciais do art 59 caput do Código Penal lhe forem desfavoráveis9 Não basta para tanto o julgador reportarse apenas à gravidade abstrata do crime pois como estatui a Súmula 718 do Supremo Tribunal Federal A opinião do julgador sobre a gravidade em abstrato do crime não constitui motivação idônea para a imposição de regime mais severo do que o permitido segundo a pena aplicada Para aplicar o regime mais severo portanto o magistrado necessita fundamentar exaustivamente sua escolha com base em elementos sólidos e amparados pelo ordenamento jurídico Como preceitua a Súmula 719 do Supremo Tribunal Federal A imposição de regime de cumprimento mais severo do que a pena aplicada permitir exige motivação idônea Confirase a propósito o seguinte julgado do Supremo Tribunal Federal Inexistência de direito subjetivo a regime de cumprimento penal mais brando Possibilidade de imposição de regime mais gravoso Réu primário e de bons antecedentes condenado a pena não superior a 08 oito anos CP art 33 2º b Estipulação do cumprimento da pena em regime inicialmente fechado Fundamentação baseada apenas nos aspectos inerentes ao tipo penal no reconhecimento da gravidade objetiva do delito e na formulação de juízo negativo em torno da reprovabilidade da conduta delituosa Revelase inadmissível na hipótese de condenação a pena não superior a 08 oito anos de reclusão impor ao sentenciado em caráter inicial o regime penal fechado com base unicamente na gravidade objetiva do delito cometido especialmente se se tratar de réu que ostente bons antecedentes e que seja comprovadamente primário O discurso judicial que se apoia exclusivamente no reconhecimento da gravidade objetiva do crime e que se cinge para efeito de exacerbação punitiva a tópicos sentenciais meramente retóricos eivados de pura generalidade destituídos de qualquer fundamentação substancial e reveladores de linguagem típica dos partidários do direito penal simbólico ou até mesmo do direito penal do inimigo culmina por infringir os princípios liberais consagrados pela ordem democrática na qual se estrutura o Estado de Direito expondo com esse comportamento em tudo colidente com os parâmetros delineados na Súmula 719STF uma visão autoritária e a b c nulificadora do regime das liberdades públicas em nosso país10 A pena de detenção deve ser cumprida inicialmente em regime semiaberto ou aberto CP art 33 caput in fine Não se admite o início de cumprimento da pena privativa de liberdade no fechado nada obstante seja possível a regressão a esse regime Os critérios para fixação do regime inicial de cumprimento da pena de detenção são os seguintes o condenado reincidente inicia o cumprimento da pena privativa de liberdade no regime semiaberto seja qual for a quantidade da pena aplicada o primário cuja pena seja superior a 4 quatro anos deverá cumprila no regime semiaberto e o primário cuja pena seja igual ou inferior a 4 quatro anos poderá desde o início cumprila no regime aberto11 No mais aplicase o que foi dito no item anterior relativamente à possibilidade de determinação do regime semiaberto quando a pena imposta for igual ou inferior a 4 quatro anos A pena de prisão simples cabível unicamente para as contravenções penais deve ser cumprida sem rigor penitenciário em estabelecimento especial ou seção especial de prisão comum em regime semiaberto ou aberto O condenado à prisão simples fica sempre separado dos condenados à pena de reclusão ou de detenção LCP art 6º caput e 1º Não há regime fechado seja inicialmente seja em decorrência de regressão Além disso o trabalho é facultativo se a pena aplicada não excede a 15 quinze dias nos termos do art 6º 2º do Decretolei 36881941 Lei das Contravenções Penais No Código Penal extraemse quatro diferenças fundamentais entre as penas de reclusão e as de detenção Inicialmente a reclusão pode ser cumprida nos regimes fechado semiaberto ou aberto Já a detenção somente nos regimes semiaberto e aberto Em segundo lugar no caso de aplicação cumulativa de penas de reclusão e de detenção executase aquela por primeiro CP art 69 caput in fine Posteriormente isto é depois de executada integralmente a pena de reclusão será cumprida a pena de detenção Em terceiro lugar a reclusão pode ter como efeito da condenação a incapacidade para o exercício do poder familiar da tutela ou da curatela nos crimes dolosos cometidos contra outrem igualmente titular do mesmo poder familiar contra filho filha ou outro descendente ou contra o tutelado ou curatelado CP art 92 II Esse efeito não é possível na pena de detenção Finalmente a reclusão acarreta na internação em caso de imposição de medida de segurança enquanto na detenção o juiz pode aplicar o tratamento ambulatorial CP art 97 caput Além disso cumpre destacar a regra veiculada pelo art 2º III da Lei 92961996 autorizando a interceptação de comunicações telefônicas de qualquer natureza como meio de prova somente nos crimes punidos com reclusão Colocase a seguinte indagação Quando a penabase for fixada no mínimo legal é possível a aplicação de regime prisional inicial mais severo do que o admitido pela quantidade da pena Vimos que a determinação do regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade além da reincidência e da quantidade da pena aplicada também depende das circunstâncias judiciais que incidem no cálculo da pena base É o que consta do art 33 3º do Código Penal Qual é então a resposta adequada Formaramse duas posições sobre o assunto 1ª posição se a penabase foi aplicada no mínimo legal por serem favoráveis as circunstâncias judiciais previstas no art 59 caput do Código Penal não pode ser aplicado regime prisional mais gravoso Situação contrária seria ilógica e incoerente Tratase de posição amplamente dominante e inclusive consagrada na Súmula 440 do Superior Tribunal de Justiça Fixada a penabase no mínimo legal é vedado o estabelecimento de regime prisional mais gravoso do que o cabível em razão da sanção imposta com base apenas na gravidade abstrata do delito12 2ª posição o cálculo da penabase no piso legal não induz obrigatoriamente à fixação do regime prisional mais suave uma vez que as circunstâncias judiciais previstas no art 59 caput do Código Penal devem ser analisadas em dois momentos distintos inicialmente para a dosimetria da pena e em seguida para determinação do regime prisional Justificase esta proibição pelo respeito à coisa julgada e pela inadmissibilidade de revisão criminal contra o réu mormente ex officio Se exemplificativamente o juízo da condenação fixar ao autor de latrocínio condenado a 20 anos de reclusão o regime prisional aberto embora seja correto o regime fechado em decorrência da pena imposta e esta decisão transitar em julgado o juízo da execução nada poderá fazer13 A execução penal tem início com a expedição de guia de recolhimento incumbência conferida ao juiz em relação ao réu que estiver ou vier a ser preso após o trânsito em julgado da sentença que aplicar pena privativa de liberdade LEP art 105 Mas independentemente da ordem de expedição das guias de recolhimento e também da data da chegada de cada uma delas ao juízo da execução as penas mais graves devem ser executadas previamente às penas menos graves Nesse contexto se o réu possui mais de uma condenação e se uma delas for consequência da prática de crime hediondo ou equiparado deve ser a pena resultante dessa condenação executada em primeiro lugar por ser mais grave o que se extrai da natureza do delito e dos prazos mais dilatados para a progressão de regime e para a concessão de livramento condicional Existem três sistemas clássicos que disciplinam a progressão de regime de cumprimento da pena privativa de liberdade Pelo sistema da Filadélfia o preso fica isolado em sua cela sem dela sair salvo esporadicamente para passeios em pátios fechados Para o sistema de Auburn por sua vez o condenado em silêncio trabalha durante o dia com outros presos e submetese a isolamento no período noturno Finalmente o sistema inglês ou progressivo baseiase no isolamento do condenado no início do cumprimento da pena privativa de liberdade mas em um segundo momento é autorizado a trabalhar na companhia de outros presos E na última etapa é colocado em liberdade condicional No Brasil o Código Penal e a Lei de Execução Penal adotaram o sistema progressivo ou inglês De fato o art 33 2º do Código Penal diz que as penas privativas de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva E o art 112 da Lei de Execução Penal preceitua que a pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso14 Mas esse sistema não foi integralmente acolhido pois a legislação brasileira lhe impôs algumas modificações Com efeito no regime fechado o condenado fica sujeito a trabalho no período diurno e a isolamento durante o repouso noturno O trabalho será em comum dentro do estabelecimento na conformidade das aptidões ou ocupações anteriores do condenado desde que compatíveis com a execução da pena CP art 34 1º e 2º Em seguida se cumpridos os requisitos legais passa ao regime semiaberto com trabalho em comum durante o período diurno em colônia agrícola industrial ou estabelecimento similar CP art 35 1º É possível o alojamento do condenado em compartimento coletivo LEP art 92 caput Por fim e se novamente satisfeitos os requisitos legais o condenado é transferido ao regime aberto fundado na autodisciplina e no senso de responsabilidade no qual deverá fora do estabelecimento e sem vigilância trabalhar frequentar curso ou exercer outra atividade autorizada permanecendo recolhido durante o período noturno e nos dias de folga CP art 36 caput e 1º A progressão de regime prisional integra a individualização da pena em sua fase executória e destinase ao cumprimento de sua finalidade de prevenção especial mediante a busca da preparação do condenado para a sua reinserção na sociedade Esse benefício depende de dois requisitos cumulativos um objetivo e outro subjetivo previstos no art 112 caput da Lei de Execução Penal O requisito objetivo é o cumprimento de ao menos 16 da pena no regime anterior15 Exemplo A condenado a 12 doze anos de reclusão no regime inicial fechado pode depois de preso por 2 dois anos pleitear a progressão para o regime semiaberto Se a execução da pena foi iniciada no regime fechado para a segunda progressão do regime semiaberto para o aberto deve ser cumprido ao menos 16 do restante da pena pois pena cumprida é pena extinta16 ou seja o percentual já pago ao Estado não pode mais servir como parâmetro para o cálculo do período legalmente exigido Como já decidido pelo Supremo Tribunal Federal a nova progressão no regime de cumprimento da pena se fará ante o critério considerado o percentual de um sexto a incidir sobre os anos que restam a cumprir e não sobre a totalidade resultante do somatório das penas das diversas condenações impostas ao paciente17 O termo inicial para a segunda progressão de regime prisional é a data em que o condenado efetivamente preencheu os requisitos do art 112 da Lei de Execução Penal e não a data em que ele ingressou no regime anterior Para o Superior Tribunal de Justiça A database para subsequente progressão de regime é aquela em que o reeducando preencheu os requisitos do art 112 da Lei de Execução Penal Ambas as Turmas que compõem a Terceira Seção do STJ eram firmes em assinalar que o termo inicial para obtenção de nova progressão pelo apenado era a data do seu efetivo ingresso no regime anterior e não a data da decisão judicial concessiva do benefício ou aquela em que houve o preenchimento dos requisitos do art 112 da LEP No entanto a Quinta Turma recentemente modificou o entendimento sobre o tema e alinhandose à posição adotada pelo Supremo Tribunal Federal passou a considerar como database para concessão de nova progressão aquela em que o apenado preencheu os requisitos do art 112 da LEP O STJ em casos de punição disciplinar determina que a database para nova progressão de regime será contada a partir do dia da falta grave e não do dia em que for publicada decisão que a reconhece judicialmente Na situação de progressão de regime a regra deverá ser a mesma O sistema progressivo da execução penal não pode ser erigido em detrimento do apenado em casos específicos de mora judiciária A teor de julgados do Supremo Tribunal Federal a decisão do Juízo das Execuções que defere a progressão de regime é meramente declaratória e não constitutiva Primeiramente o reeducando preenche os requisitos objetivo e subjetivo e depois pronunciamento judicial reconhece seu direito ao benefício Embora a análise célere do pedido seja o ideal é cediço que a providência jurisdicional não ocorre dessa forma e por vezes pode demorar meses ou anos para ser implementada Por tais motivos o período de permanência no regime mais gravoso por mora do Judiciário em analisar requerimento de progressão ao modo intermediário de cumprimento da pena deverá ser considerado para o cálculo de futuro benefício sob pena de ofensa ao princípio da dignidade do apenado como pessoa humana art 1º III CF e prejuízo ao seu direito de locomoção Assim o entendimento da Sexta Turma alinhase à jurisprudência do Supremo Tribunal Federal para estabelecer como marco para a subsequente progressão a data em que o reeducando preencheu os requisitos legais do art 112 da LEP18 Nas condenações superiores a 30 trinta anos o montante de 16 deve ser calculado sobre o total da pena imposta pois esse limite destinase exclusivamente ao efetivo cumprimento da pena privativa de liberdade Nos termos da Súmula 715 do Supremo Tribunal Federal A pena unificada para atender ao limite de 30 trinta anos de cumprimento determinado pelo art 75 do Código Penal não é considerada para a concessão de outros benefícios como o livramento condicional ou regime mais favorável de execução Assim se alguém foi condenado a 60 sessenta anos de reclusão a progressão somente será possível depois do cumprimento de pelo menos 10 dez anos no regime fechado19 Já o requisito subjetivo é o mérito presente quando o condenado ostentar bom comportamento carcerário LEP art 112 caput Esse requisito deve ser demonstrado pelo condenado no curso da execução para merecer a progressão O mérito nos termos do item 29 da Exposição de Motivos da Lei de Execução Penal é o critério que comanda a execução progressiva É necessário que se reconheça a capacidade provável do condenado de adaptarse ao regime menos rigoroso Nesse contexto o comportamento mau ou sofrível indica normalmente uma inaptidão para o regime mais suave Não deve ser concedida a progressão quando se verificar que o apenado não apresenta condições para se ajustar ao novo regime20 Se foram aplicadas ao condenado cumulativamente penas privativas de liberdade e de multa o inadimplemento voluntário desta impede a progressão de regime prisional em face da ausência do requisito subjetivo legalmente exigido mérito Na dicção do Supremo Tribunal Federal O inadimplemento deliberado da pena de multa cumulativamente aplicada ao sentenciado impede a progressão no regime prisional Essa regra somente é excepcionada pela comprovação da absoluta impossibilidade econômica do apenado em pagar o valor ainda que parceladamente Essa a conclusão do Plenário que por maioria negou provimento a agravo regimental interposto em face de decisão monocrática que indeferira o pedido de progressão de regime prisional tendo em vista o inadimplemento da multa imposta de condenado nos autos da AP 470MG à pena de seis anos e seis meses de reclusão em regime inicial semiaberto bem assim à sanção pecuniária de 330 dias multa pela prática de corrupção passiva e lavagem de dinheiro Alegava se que o prévio pagamento da pena de multa não seria requisito legal para a progressão de regime porquanto inexistente prisão por dívida CF art 5º LXVII bem assim que o art 51 do CP proibiria a conversão da multa em detenção O não recolhimento da multa por condenado que tivesse condições econômicas de pagála sem sacrifício dos recursos indispensáveis ao sustento próprio e de sua família constituiria deliberado descumprimento de decisão judicial e deveria impedir a progressão de regime Além disso admitirse o não pagamento da multa configuraria tratamento privilegiado em relação ao sentenciado que espontaneamente pagasse a sanção pecuniária Ademais a passagem para o regime aberto exigiria do sentenciado autodisciplina e senso de responsabilidade LEP art 114 II a pressupor o cumprimento das decisões judiciais aplicadas a ele Essa interpretação seria reforçada pelo art 36 2º do CP e pelo art 118 1º da LEP que estabelecem a regressão de regime para o condenado que não pagar podendo a multa cumulativamente imposta Assim o deliberado inadimplemento da multa sequer poderia ser comparado à vedada prisão por dívida CF art 5º LXVII configurando apenas óbice à progressão no regime prisional Ressalvou que a exceção admissível ao dever de pagar a multa seria a impossibilidade econômica absoluta de fazêlo Seria cabível a progressão se o sentenciado veraz e comprovadamente demonstrasse sua total insolvabilidade a ponto de impossibilitar até mesmo o pagamento parcelado da quantia devida como autorizado pelo art 50 do CP Ressaltou que o acórdão exequendo fixara o quantum da sanção pecuniária especialmente em função da situação econômica do réu CP art 60 de modo que a relativização dessa resposta penal dependeria de prova robusta por parte do sentenciado No caso entretanto não houvera 33141 mínima comprovação de insolvabilidade incabível portanto a exceção admissível ao dever de pagar a multa21 Progressão especial para mulher gestante ou que for mãe ou responsável por crianças ou pessoas com deficiência O art 112 3º da Lei de Execução Penal incluído pela Lei 137692018 contempla uma modalidade especial de progressão de regime prisional para a mulher gestante e também para a mulher que for mãe ou responsável por crianças22 ou pessoas com deficiência23 A gravidez qualquer que seja seu estágio deve ser provada por exame pericial ultrassonografia ou meio equivalente e diante do silêncio da lei pode ser anterior ou posterior ao início de cumprimento da pena Destarte nada impede que a mulher já presa em virtude de condenação definitiva venha propositalmente a engravidar durante uma visita íntima com a finalidade de ser beneficiada pela progressão especial Por sua vez a comprovação da filiação e da idade do filho é realizada pela certidão de nascimento ou documento similar da criança enquanto a condição de pessoa com deficiência há de ser provada por laudo médico ou outro documento idôneo a exemplo de sentença de interdição civil Se a mulher não for mãe da criança ou da pessoa com deficiência a situação de responsável deve ser interpretada ampliativamente abrangendo a guarda a tutela e a curatela bem como situações informais em que a condenada era a única pessoa que cuidava da criança ou da pessoa com deficiência exemplo vizinha que assumiu os cuidados de criança cujos pais foram assassinados Evidentemente a condenada não terá direito à progressão especial se tiver sido judicialmente decretada sua suspensão ou destituição do poder familiar por qualquer motivo diverso do cumprimento da pena Nada obstante o dispositivo fale impropriamente em crianças ou pessoas com deficiência é evidente que o benefício não depende da maternidade ou responsabilidade plural Basta um filho ou pessoa sob os cuidados da mulher menor de 12 anos ou com deficiência Esta progressão especial depende de requisitos cumulativos objetivos e subjetivos São requisitos objetivos não ter cometido o crime com violência ou grave ameaça a pessoa inc I não ter cometido o crime contra seu filho ou dependente inc II e ter cumprido ao menos 18 um oitavo da pena no regime anterior inc III Os requisitos subjetivos de seu turno consistem em ser primária e ter bom comportamento carcerário comprovado pelo diretor do estabelecimento inc IV e não ter integrado organização criminosa inc V Em relação ao último requisito de natureza subjetiva a lei não impõe limite temporal Destarte se existir prova segura de que a condenada já integrou organização criminosa na forma definida pelo art 1º 1º da Lei 12850201324 ainda que antes ou depois do crime pelo qual está cumprindo a pena privativa de liberdade será incabível a progressão especial O benefício será revogado se a condenada praticar novo crime doloso ou falta grave LEP art 112 4º Tal revogação depende de decisão judicial com respeito à ampla defesa e não exclui a regressão a qualquer dos regimes mais rigorosos com fundamento no art 118 inc I da Lei de Execução Penal A Lei 137692018 em seu propósito de conferir tratamento diferenciado às condenadas gestantes ou mães ou responsáveis por crianças ou pessoas com deficiência estendeu a progressão especial inclusive aos crimes hediondos e equiparados Com efeito em tais casos a progressão de regime será possível com o cumprimento de apenas 18 um oitavo da pena privativa de liberdade no regime anterior e não de 25 da pena se primária ou de 35 se reincidente É o que se extrai do art 2º 2º da Lei 80721990 A progressão de regime no caso dos condenados pelos crimes previstos neste artigo darseá após o cumprimento de 25 dois quintos da pena se o apenado for primário e de 35 três quintos se reincidente observado o disposto nos 3º e 4º do art 112 da Lei nº 7210 de 11 de julho de 1984 33142 33143 Lei de Execução Penal Proibição da progressão por saltos O sistema progressivo acolhido pelo direito brasileiro é incompatível com a progressão por saltos consistente na passagem direta do regime fechado para o aberto Não se pode pular o estágio no regime semiaberto em atenção à necessidade de recuperação gradativa do condenado para retorno à sociedade Como bem acentua o item 120 da Exposição de Motivos da Lei de Execução Penal Se o condenado estiver no regime fechado não poderá ser transferido diretamente para o regime aberto Esta progressão depende do cumprimento mínimo de um sexto da pena no regime semiaberto além da demonstração do mérito compreendido tal vocábulo como aptidão capacidade e merecimento demonstrados no curso da execução25 Para afastar qualquer controvérsia acerca do assunto o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula 491 É inadmissível a chamada progressão per saltum de regime prisional Somente se admite essa passagem direta em hipóteses teratológicas tais como quando o condenado depois de já ter cumprido 16 da pena no regime fechado e conseguido progressão para o regime semiaberto não obtém vaga nesse regime permanecendo mais 16 no regime fechado Será possível então por ineficiência do Estado o salto para o regime aberto Progressão e crimes contra a Administração Pública Nos crimes contra a Administração Pública a progressão está condicionada além do cumprimento de 16 da pena no regime anterior e do mérito do condenado a um requisito específico consistente na reparação do dano causado ou na devolução do produto do ilícito praticado com os acréscimos legais É o que consta do art 33 4º do Código Penal Este dispositivo é constitucional e não se constitui em prisão civil por dívida Além disso destinase a atuar como instrumento eficaz para a prevenção de novos delitos envolvendo a apropriação de bens públicos Na 33144 ótica do Supremo Tribunal Federal É constitucional o 4º do art 33 do CP que condiciona a progressão de regime de cumprimento da pena de condenado por crime contra a administração pública à reparação do dano que causou ou à devolução do produto do ilícito praticado facultado o parcelamento da dívida Com base nessa orientação o Plenário por maioria negou provimento a agravo regimental interposto em face de decisão que indeferira pedido de progressão de regime a condenado nos autos da AP 470MG DJe de 2242013 pela prática dos crimes de peculato e corrupção passiva Quanto à alegada inconstitucionalidade do referido dispositivo legal a Corte destacou que em matéria de crimes contra a administração pública como também nos crimes de colarinho branco em geral a parte verdadeiramente severa da pena a ser executada com rigor haveria de ser a de natureza pecuniária Esta sim teria o poder de funcionar como real fator de prevenção capaz de inibir a prática de crimes que envolvessem apropriação de recursos públicos Por outro lado a imposição da devolução do produto do crime não constituiria sanção adicional mas apenas a devolução daquilo que fora indevidamente apropriado ou desviado Ademais não seria o direito fundamental à liberdade do condenado que estaria em questão mas tão somente se a pena privativa de liberdade a ser cumprida deveria se dar em regime mais favorável ou não o que afastaria a alegação quanto à suposta ocorrência no caso de prisão por dívida Outrossim a norma em comento não seria a única prevista na legislação penal a ter na reparação do dano uma importante medida de política criminal Ao contrário bastaria uma rápida leitura dos principais diplomas penais brasileiros para constatar que a falta de reparação do dano a pode ser causa de revogação obrigatória do sursis b impede a extinção da punibilidade ou mesmo a redução da pena em determinadas hipóteses c pode acarretar o indeferimento do livramento condicional e do indulto d afasta a atenuante genérica do art 65 III b do CP entre outros26 Progressão e crimes hediondos ou equiparados Na redação original da Lei 80721990 Lei dos Crimes Hediondos o seu art 2º 1º dispunha que a pena privativa de liberdade imposta pela prática de qualquer crime hediondo ou equiparado tráfico de drogas tortura e terrorismo deveria ser cumprida em regime integralmente fechado Tratava se portanto de exceção legal ao sistema progressivo pois o condenado iniciava e encerrava o cumprimento da pena privativa de liberdade no regime fechado sem possibilidade de passagem para regime mais brando Muito se discutiu sobre eventual inconstitucionalidade desse dispositivo E com a edição da Lei 94551997 definindo os crimes de tortura acentuou se o debate em razão de estatuir o seu art 1º 7º que o condenado por crime nela previsto iniciará o cumprimento da pena em regime fechado Efetuouse uma clara distinção A pena privativa de liberdade obrigatoriamente deveria ser executada inicialmente no regime fechado mas era possível a progressão Reforçouse o argumento da inconstitucionalidade da proibição de progressão nos crimes hediondos no tráfico de drogas e no terrorismo pois se a todos esses crimes incluindose a tortura a Constituição Federal determinou igual tratamento art 5º XLIII o legislador ordinário não poderia estabelecer distinção O Supremo Tribunal Federal então encerrou o conflito editando a Súmula 698 Não se estende aos demais crimes hediondos a admissibilidade de progressão no regime de execução da pena aplicada ao crime de tortura Fundamentou essa posição no princípio da especialidade o crime de tortura gozava de regra específica progressão e aos crimes hediondos ao tráfico de drogas e ao terrorismo incidia a regra geral regime integralmente fechado Mas no dia 20 de março de 2006 no julgamento do HC 82959SP rel Min Marco Aurélio o Supremo Tribunal Federal alterou o seu entendimento e declarou a inconstitucionalidade da regra então prevista no art 2º 1º da Lei 80721990 que ao instituir um regimepadrão violava o princípio constitucional da individualização da pena Criouse destarte um impasse Com efeito se o regime integralmente fechado para crimes hediondos e equiparados era inconstitucional os condenados por tais delitos teriam direito à progressão desde que respeitados os requisitos exigidos pelo art 112 caput da Lei de Execução Penal cumprimento de ao menos 16 da pena no regime anterior e mérito Mas então o que tais crimes teriam de hediondos se estavam na mesma vala dos crimes comuns De fato a Constituição Federal estabeleceu nitidamente dois polos distintos De um lado no art 98 I determinou aos entes federativos a criação de juizados especiais competentes para a conciliação o julgamento e a execução de infrações penais de menor potencial ofensivo mediante os procedimentos oral e sumaríssimo permitidos nas hipóteses previstas em lei a transação e o julgamento de recursos por turmas de juízes de primeiro grau no polo oposto o art 5º XLIII previu os crimes hediondos e equiparados inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia Em suma em um extremo a Lei Suprema dispensou tratamento amplamente favorável ao réu buscando impedir a aplicação da pena privativa de liberdade nos moldes da Lei 90991995 Já no extremo oposto a Constituição Federal exigiu tratamento mais rigoroso aos condenados por crimes hediondos e equiparados O que restar entre esses extremos encaixase na criminalidade comum E aí estava o problema O regime integralmente fechado foi declarado inconstitucional e consequentemente inaplicável Restava pois dispensar aos crimes hediondos e assemelhados o tratamento reservado aos crimes comuns o que era inaceitável por contrariar o espírito da Constituição Federal Felizmente o legislador agiu com celeridade e em 29 de março de 2007 entrou em vigor a Lei 114642007 alterando a redação do art 2º 1º da Lei 80721990 para estabelecer que a pena por crime hediondo ou equiparado será cumprida inicialmente em regime fechado Desapareceu o regime integralmente fechado entrando em seu lugar o regime inicialmente fechado é dizer a pena privativa de liberdade começa obrigatoriamente no regime fechado mas é possível a progressão ao semiaberto e posteriormente ao aberto E em seguida dispôs o seu 2º que a progressão darseá após o cumprimento de 25 dois quintos da pena se o apenado for primário e de 35 três quintos se reincidente qualquer que seja a modalidade da recidiva genérica ou específica27 O requisito objetivo de natureza temporal é diferente e mais severo do que o previsto na Lei de Execução Penal em atenção à sistemática instituída pela Constituição Federal Não dispensa todavia o requisito subjetivo mérito do condenado28 Importante destacar entretanto que essa nova regra aparentemente benéfica ao condenado foi considerada mais gravosa pela jurisprudência Nada obstante a decisão do Supremo Tribunal Federal tenha sido proferida em sede de controle difuso de constitucionalidade com eficácia inter partes é pacífico atualmente o entendimento de que a progressão com 25 ou 35 da pena tem aplicação unicamente aos crimes hediondos ou equiparados cometidos a partir do dia 29 de março de 2007 data da entrada em vigor da Lei 114642007 Para os delitos anteriores a progressão obedece ao requisito temporal de cumprimento de 16 da pena com fulcro no art 112 caput da Lei de Execução Penal Justificase essa posição com o seguinte raciocínio o art 2º 1º da Lei 80721990 em sua redação original foi declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal Logo como não havia outra regra para disciplinar a progressão os crimes anteriores à vigência da Lei 114642007 seguem a sistemática da Lei de Execução Penal bastando o cumprimento de 16 da pena e o mérito do condenado Como decidido pelo Supremo Tribunal Federal Asseverouse que o reconhecimento da inconstitucionalidade do óbice à progressão de regime contido na redação original do 1º do art 2º da Lei 80721990 impediria que esse dispositivo legal fosse utilizado como parâmetro de comparação para o exame da norma penal aplicável ao caso Assim afirmouse que essa verificação deveria ocorrer a partir da apreciação das demais normas validamente existentes no ordenamento jurídico e que tiveram vigência desde a prática do fato pelo qual o paciente fora condenado a saber a LEP e a Lei 114642007 que entrou em vigor posteriormente em 29032007 Aduziuse entretanto que esta última no ponto em que disciplinou a progressão de regime estabeleceu lapsos temporais mais gravosos do que os anteriormente fixados na LEP constituindose pois verdadeira novatio legis in pejus Concluiuse nesse sentido que se o fato ocorreu antes de 29032007 como na espécie incidem as regras previstas na LEP exigindose para a progressão o cumprimento de ao menos 16 da pena LEP art 11229 Com o propósito de afastar qualquer embate doutrinário ou jurisprudencial sobre o assunto o Supremo Tribunal Federal editou a Súmula Vinculante 26 cuja redação é a seguinte Para efeito de progressão de regime no cumprimento de pena por crime hediondo ou equiparado o juízo da execução observará a inconstitucionalidade do art 2º da Lei n 8072 de 25 de julho de 1990 sem prejuízo de avaliar se o condenado preenche ou não os requisitos objetivos e subjetivos do benefício podendo determinar para tal fim de modo fundamentado a realização de exame criminológico Igual raciocínio encontrase estampado na Súmula 471 do Superior Tribunal de Justiça Os condenados por crimes hediondos ou assemelhados cometidos antes da vigência da Lei n 114642007 sujeitamse ao disposto no art 112 da Lei n 72101984 Lei de Execução Penal para a progressão de regime prisional Finalmente é importante destacar que no julgamento do HC 111840ES o Plenário do Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade do art 2º 1º da Lei 80721990 por ofensa ao princípio da individualização da pena CF art 5º XLVI Em síntese o regime inicialmente fechado para o cumprimento da pena privativa de liberdade nos crimes hediondos e equiparados foi reputado inconstitucional razão pela qual o magistrado tem 33145 liberdade para estabelecer no caso concreto o regime prisional adequado levando em conta os dados do agente e do fato criminoso Requisito temporal para progressão em caso de execução conjunta por crime hediondo e crime comum Em face dos requisitos temporais diversos 25 ou 35 da pena para crimes hediondos ou equiparados e 16 da pena para crimes comuns a progressão de regime prisional em execução conjunta de penas impostas pela prática de crime hediondo ou equiparado e crime comum obedece a uma sistemática específica Para possibilitar a progressão é preciso calcular no tocante ao delito hediondo ou equiparado os 25 para primários ou 35 para reincidentes para somandose ao restante da pena imposta aferir se já foi cumprido 16 do total A conta é simples deve ter sido cumprido 25 primário ou 35 reincidente no tocante ao crime hediondo ou equiparado e 16 do total da pena relativamente ao delito comum Exemplo A primário foi condenado a 12 doze anos de reclusão por um homicídio qualificado hediondo e a mais 6 seis anos por um roubo totalizando a pena de 18 dezoito anos Depois de 5 cinco anos de prisão pleiteia a progressão que será possível se comprovado o mérito pois terá cumprido mais de 25 da pena do crime hediondo e mais de 16 da pena total 33146 A decisão será sempre motivada e procedida de manifestação do Ministério Público e do defensor art 112 1º da LEP Progressão e nova condenação A superveniência de condenação criminal impede a progressão de regime prisional ainda que já deferida pelo juízo da execução quando a nova pena tiver que ser cumprida em regime mais rigoroso Exemplificativamente se ao condenado já havia sido concedida a transferência para o regime semiaberto mas surgiu nova pena a ser cumprida no regime fechado estará inviabilizada a progressão Na linha da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal A unificação de penas decorrente de condenação transitada em julgado durante o cumprimento de reprimenda atinente a outro crime altera a database para a obtenção de benefícios executórios e progressão de regime a qual passa a ser contada a partir da soma da nova condenação e tem por parâmetro o restante de pena a ser cumprido30 Entretanto é preciso destacar o entendimento do Superior Tribunal de Justiça acerca da inadmissibilidade por falta de previsão legal de alteração da database para a concessão de benefícios durante a execução penal inclusive a progressão de regime prisional em face da superveniência do trânsito em julgado de sentença condenatória A alteração da database para concessão de novos benefícios executórios em razão da unificação das penas não encontra respaldo legal As Turmas que compõem a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça em consonância com a compreensão do Supremo Tribunal Federal acerca do tema possuíam o entendimento pacificado de que sobrevindo condenação definitiva ao apenado por fato anterior ou posterior ao início da execução penal a contagem do prazo para concessão de futuros benefícios seria interrompida de modo que o novo cálculo realizado com base no somatório das penas teria como termo a quo a data do trânsito em julgado da última sentença condenatória Entretanto da leitura dos artigos 111 parágrafo único e 118 II da Lei de Execução Penal invocados para sustentar o posicionamento mencionado apenas se conclui que diante da superveniência do trânsito em julgado de sentença condenatória caso o quantum de pena obtido após o somatório não permita a preservação do regime atual de cumprimento da pena o novo regime será então determinado por meio do resultado da soma de forma que estará o sentenciado sujeito à regressão Assim sequer a regressão de regime é consectário necessário da unificação das penas porquanto será forçosa a regressão de regime somente quando a pena da nova execução somada à reprimenda ainda não cumprida torne incabível o 33147 regime atualmente imposto Portanto da leitura dos artigos supra não se infere que efetuada a soma das reprimendas impostas ao sentenciado é mister a alteração da database para concessão de novos benefícios Por conseguinte deduzse que a alteração do termo a quo referente à concessão de novos benefícios no bojo da execução da pena constitui afronta ao princípio da legalidade e ofensa à individualização da pena motivo pelo qual se faz necessária a preservação do marco interruptivo anterior à unificação das penas31 Processamento do pedido de progressão O pedido de progressão é endereçado ao juízo da Vara das Execuções Penais E consoante o art 112 1º da Lei de Execução Penal a decisão será sempre motivada e precedida de manifestação do Ministério Público e do defensor Entretanto a questão a ser enfrentada é a seguinte Se a progressão depende além do cumprimento de determinado percentual da pena também do mérito do condenado esse procedimento é suficiente para a comprovação do requisito subjetivo De acordo com o art 112 caput da Lei de Execução Penal com redação dada pela Lei 107922003 o mérito é constatado pelo diretor do estabelecimento Sua prova é feita por simples atestado de boa conduta carcerária emitido pelo diretor do estabelecimento prisional Essa alteração legislativa porém é alvo de diversas críticas Vejamos A Lei 107922003 em vigor desde o dia 2 de dezembro de 2003 foi editada com o propósito de aperfeiçoar a execução penal mediante a criação do Regime Disciplinar Diferenciado para combater o crime organizado e tolher sua atuação no interior dos estabelecimentos prisionais bem como para restringir a participação da Comissão Técnica de Classificação na progressão de regimes Essa última parte é a que ora nos interessa De fato antes da entrada em vigor da Lei 107922003 estabelecia o art 112 parágrafo único da Lei de Execução Penal A decisão será motivada e precedida de parecer da Comissão Técnica de Classificação e do exame criminológico quando necessário E o art 6º da LEP atribui à Comissão Técnica de Classificação a tarefa de elaborar o programa individualizador da pena privativa de liberdade adequada ao condenado ou preso provisório Nítida portanto a diferença antes da entrada em vigor da Lei 107922003 exigiase a elaboração de parecer da Comissão Técnica de Classificação e quando necessário exame criminológico para a demonstração do mérito Agora basta a comprovação do mérito pelo diretor do estabelecimento e decisão motivada do juiz da execução depois da manifestação do Ministério Público e do defensor O Ministério Público deve necessariamente manifestarse acerca da progressão sob pena de nulidade por ser sua função a fiscalização da execução da pena A maior falha da Lei 107922003 foi transferir a prova do mérito ao diretor do estabelecimento prisional pois em diversas ocasiões especialmente em crimes de elevada gravidade o atestado de boa conduta carcerária é insuficiente para assegurar o preparo do condenado para ingressar em regime mais brando Por esse motivo firmouse o entendimento no sentido de que nada obstante a atual redação do art 112 1º da Lei de Execução Penal não mais reclame o exame criminológico para a progressão pode ser ele realizado por 33148 33149 determinação judicial quando for considerado necessário pelo magistrado em razão das peculiaridades do caso concreto Para espancar qualquer controvérsia foi editada pelo Superior Tribunal de Justiça a Súmula 439 Admitese o exame criminológico pelas peculiaridades do caso desde que em decisão motivada32 Porém se o exame criminológico for realizado sua conclusão não vincula o juízo da execução que pode livremente decidir em sentido contrário desde que fundamentadamente É o que se extrai relativamente às perícias em geral da simples leitura do art 182 do Código de Processo Penal O juiz não ficará adstrito ao laudo podendo aceitálo ou rejeitálo no todo ou em parte Progressão e prática de falta grave A contagem do tempo para progressão de regime prisional é zerada se o preso comete falta grave ou seja deve reiniciarse novo prazo para a contagem do benefício da progressão do regime prisional uma vez que exclui o mérito legalmente exigido para a passagem ao regime mais brando33 Destarte o condenado precisa cumprir no mínimo mais 16 crime comum ou ao menos mais 25 ou 35 da pena imposta crime hediondo ou equiparado dependendo da condição de primário ou de reincidente iniciandose o prazo a partir da falta grave pois seu cometimento interrompe o prazo anterior É o que consta da Súmula 534 do Superior Tribunal de Justiça A prática de falta grave interrompe a contagem do prazo para a progressão de regime de cumprimento de pena o qual se reinicia a partir do cometimento dessa infração Contudo a contagem do novo período aquisitivo do requisito objetivo quantidade da pena a ser cumprida deverá incidir sobre o remanescente da pena e não sobre a totalidade dela34 Progressão e Em face da necessidade de produção de provas para aferição do requisito subjetivo mérito do condenado não é possível postular a progressão de regime prisional por meio da via célere e estreita do habeas corpus 331410 331411 331412 Progressão e vinculação com o crime organizado Não é possível a progressão por ausência do requisito subjetivo mérito quando existentes fundadas suspeitas consubstanciadas em relato da autoridade policial dando conta que o condenado comanda organização criminosa do interior do estabelecimento penal35 Progressão de regime prisional condenado estrangeiro e processo de expulsão em trâmite É possível a progressão de regime prisional para cumprimento de pena privativa de liberdade imposta a estrangeiro que responde a processo de expulsão do território nacional pela prática de crime comum em face da regra contida no art 54 3º da Lei 134452017 Lei de Migração Art 54 A expulsão consiste em medida administrativa de retirada compulsória de migrante ou visitante do território nacional conjugada com o impedimento de reingresso por prazo determinado 3º O processamento da expulsão em caso de crime comum não prejudicará a progressão de regime o cumprimento da pena a suspensão condicional do processo a comutação da pena ou a concessão de pena alternativa de indulto coletivo ou individual de anistia ou de quaisquer benefícios concedidos em igualdade de condições ao nacional brasileiro Progressão de regime e prisão em unidade militar O benefício da progressão de regime prisional é aplicável aos militares independentemente do local de cumprimento da pena privativa de liberdade Cuidase na verdade de manifestação do princípio da individualização da pena direito fundamental assegurado a todas as pessoas pelo art 5º XLVI da Constituição Federal como já decidido pelo Supremo Tribunal Federal Em conclusão a 2ª Turma deferiu em parte habeas corpus para assegurar a militar progressão de regime para o semiaberto em igualdade de condições com os civis Aduziuse que o princípio ou a garantia da individualização da pena seria um direito fundamental uma 331413 331414 situação jurídica subjetiva do indivíduo militar ou civil e que ante a omissão ou falta de previsão da lei castrense seriam aplicáveis a LEP e o CP que conjugadamente dispõem à saciedade sobre o regime de progressão de pena36 Progressão de regime colaboração premiada e Lei do Crime Organizado Na hipótese de colaboração premiada posterior à sentença condenatória com trânsito em julgado o art 4º 5º da Lei 128502013 Lei do Crime Organizado autoriza a progressão de regime prisional mesmo se ausente o requisito objetivo ou seja ainda que o condenado não tenha efetuado o cumprimento de parte da pena legalmente exigido 16 para os crimes em geral ou então 25 ou 35 na hipótese de crimes hediondos ou equiparados O requisito subjetivo consistente no mérito do condenado não é dispensado embora muitas vezes esta circunstância reste evidenciada pela própria colaboração Progressão de regime e cumprimento da pena em penitenciária federal de segurança máxima O cumprimento da pena em penitenciária federal de segurança máxima obsta a progressão de regime prisional em face da ausência do requisito subjetivo mérito legalmente exigido notadamente quando o condenado integra alguma organização criminosa Para o Supremo Tribunal Federal O cumprimento de pena em penitenciária federal de segurança máxima por motivo de segurança pública não é compatível com a progressão de regime prisional Com base nesse entendimento a Segunda Turma por maioria não conheceu de habeas corpus em que se discutia a possibilidade da concessão do benefício em face de seu deferimento por juiz federal sem que houvesse a impugnação da decisão pela via recursal No caso o juízo da execução penal suscitou conflito de competência ao ser comunicado de que a benesse da progressão de regime fora concedida ao paciente O Superior Tribunal de Justiça STJ ao resolver o conflito cassou a progressão A Segunda Turma afirmou que a 331415 transferência do apenado para o sistema federal tem em regra como fundamento razões que atestam que naquele momento o condenado não tem mérito para progredir de regime Observou que a transferência seria cabível no interesse da segurança pública ou do próprio preso Lei 116712008 art 3º Frisou que o paciente seria líder de organização criminosa Ademais mesmo sem cometer infrações disciplinares o preso que pertencesse à associação criminosa não satisfaria aos requisitos subjetivos para a progressão de regime A pertinência à sociedade criminosa seria crime e também circunstância reveladora da falta de condições de progredir a regime prisional mais brando A Segunda Turma ainda registrou que a manutenção do condenado em regime fechado com base na falta de mérito do apenado não seria incompatível com a jurisprudência do STF37 Progressão de regime custódia cautelar e termo inicial Na hipótese de custódia cautelar ou seja se o acusado foi preso preventivamente e nessa condição respondeu à ação penal o termo inicial para contagem do percentual de cumprimento da pena necessário para progressão de regime prisional 16 nos crimes comuns e 25 ou 35 nos delitos hediondos e equiparados é a data do cumprimento do mandado de prisão preventiva e não a data da publicação da sentença condenatória Na linha da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal A Primeira Turma deu provimento a recurso ordinário em habeas corpus em que discutido o marco inicial para fins de obtenção de progressão de regime No caso o recorrente foi preso cautelarmente por força de mandado de prisão preventiva mas foi fixada como termo inicial para a obtenção do benefício da progressão a data da publicação da sentença condenatória A Turma entendeu que a custódia cautelar necessariamente deve ser computada para fins de obtenção de progressão de regime e demais benefícios executórios desde que não ocorra condenação posterior apta a configurar falta grave Partindose da premissa de que diante da execução de uma única condenação o legislador não impôs qualquer requisito adicional impende considerar a data da prisão preventiva como marco inicial para a obtenção de benefícios em sede de execução penal38 É a transferência do condenado para regime prisional mais severo do que aquele em que se encontra É o que se dá exemplificativamente quando o preso estava no regime semiaberto e é removido para o regime fechado As hipóteses em que se autoriza a regressão constam do art 118 I e II e 1º da Lei de Execução Penal Passemos à análise de cada uma delas a Prática de fato definido como crime doloso ou falta grave art 118 I A relação de faltas graves inerentes à pena privativa de liberdade está prevista no art 50 caput da Lei de Execução Penal em rol taxativo incompatível com a interpretação extensiva39 Art 50 Comete falta grave o condenado à pena privativa de liberdade que I incitar ou participar de movimento para subverter a ordem ou a disciplina II fugir40 III possuir indevidamente instrumento capaz de ofender a integridade física de outrem IV provocar acidente de trabalho V descumprir no regime aberto as condições impostas VI inobservar os deveres previstos nos incisos II e V do art 39 desta Lei41 VII tiver em sua posse utilizar ou fornecer aparelho telefônico de rádio ou similar que permita a comunicação com outros presos ou com o ambiente externo Praticada a falta grave deverá ser instaurado o procedimento para sua apuração conforme o regulamento do estabelecimento prisional assegurado o direito de defesa nele inserida a prévia oitiva do condenado Como dispõe a Súmula 533 do Superior Tribunal de Justiça Para o reconhecimento da prática de falta disciplinar no âmbito da execução penal é imprescindível a instauração de procedimento administrativo pelo diretor do estabelecimento prisional assegurado o direito de defesa a ser realizado por advogado constituído ou defensor público nomeado42 E será motivada a decisão do responsável pelo local em que é cumprida a pena LEP arts 59 e 118 2º No que concerne ao crime doloso basta a sua prática para autorizarse a regressão não se reclamando a existência de condenação definitiva Aliás a prática de crime doloso constitui por si só falta grave LEP art 52 caput Esta também é a orientação consagrada na Súmula 526 do Superior Tribunal de Justiça O reconhecimento de falta grave decorrente do cometimento de fato definido como crime doloso no cumprimento da pena prescinde do trânsito em julgado de sentença penal condenatória no processo penal instaurado para apuração do fato43 Em respeito à ampla defesa constitucionalmente assegurada deve ser ouvido o condenado previamente à decisão judicial LEP art 118 2º Nessas duas hipóteses prática de fato definida como crime doloso e falta grave é importante destacar exigese a instauração de procedimento administrativo disciplinar a ser acompanhado por defensor para aferir a necessidade de regressão do condenado para regime prisional mais gravoso em homenagem aos princípios constitucionais do devido processo legal do contraditório e da ampla defesa CF art 5º LIV e LV Com efeito não incide a Súmula Vinculante 5 do Supremo Tribunal Federal aplicável somente aos procedimentos de natureza extrapenal Como já se decidiu Asseverouse que não obstante a aprovação do texto da Súmula Vinculante 5 A falta de defesa técnica por advogado no processo administrativo disciplinar não ofende a Constituição tal verbete seria aplicável apenas em procedimentos de natureza cível e não em procedimento administrativo disciplinar promovido para averiguar o cometimento de falta grave tendo em vista estar em jogo a liberdade de ir e vir Assim neste caso asseverouse que o princípio do contraditório deve ser observado amplamente com a presença de advogado constituído ou defensor público nomeado impondo serlhe apresentada defesa em obediência às regras específicas contidas na Lei de Execução Penal no Código de Processo Penal e na Constituição44 Em face da vedação de analogia in malam partem no Direito Penal o cometimento de crime culposo ou de contravenção penal não permite a regressão de regime prisional b Sofrer condenação por crime anterior cuja pena somada ao restante da pena em execução torne incabível o regime art 118 II Esse dispositivo resulta do teor do art 111 parágrafo único da Lei de Execução Penal Sobrevindo condenação no curso da execução somarseá a pena ao restante da que está sendo cumprida para determinação do regime Imaginese um réu que condenado a 6 seis anos de reclusão iniciou o cumprimento da pena no regime semiaberto e logo em seguida a ele sobreveio em razão de outro crime condenação a nova pena de 4 quatro anos de reclusão Em face do total da pena resultante da soma 10 anos será obrigatória a regressão para o regime fechado Nessa situação a regressão independe da prévia oitiva do condenado pois nada de útil poderia ele apresentar em sua defesa Com efeito já foi condenado por sentença transitada em julgado fruto de ação penal em que se respeitou o devido processo legal e lhe foram asseguradas a ampla defesa e o contraditório Não poderia agora pois alterar a coisa julgada c O condenado será transferido do regime aberto se além das hipóteses referidas nos incisos anteriores frustrar os fins da execução ou não pagar podendo a multa cumulativamente imposta art 118 1º Extraise rapidamente uma importante conclusão os incisos I e II do art 118 da Lei de Execução Penal são aplicáveis às penas privativas de liberdade cumpridas em qualquer regime fechado semiaberto ou aberto enquanto o seu 1º tem incidência exclusivamente ao regime aberto Em primeiro lugar é possível a regressão quando o condenado frustrar os fins da execução O condenado assume conduta indicativa de sua incompatibilidade com o regime aberto calcado na autodisciplina e no senso de responsabilidade CP art 36 caput Exemplo condenado que abandona 33151 33152 injustificadamente seu trabalho Permitese ainda a regressão quando o condenado não pagar podendo a multa cumulativamente imposta Essa hipótese somente é possível quando foi aplicada pena pecuniária simultaneamente com a pena privativa de liberdade É imprescindível comprovar a solvência do condenado compreendida como a capacidade para quitar de uma só vez ou mediante parcelas a pena de multa sem privarse dos recursos indispensáveis ao sustento do condenado e de sua família CP art 50 2º Existem entretanto vozes que alegam ter sido revogada tacitamente essa parte do dispositivo pela Lei 92681996 que ao alterar o art 51 do Código Penal vedou a conversão da pena de multa para pena privativa de liberdade motivo pelo qual a sua inadimplência também não poderia ensejar restrições à liberdade do condenado Em qualquer desses casos exigese previamente à regressão a oitiva do condenado LEP art 118 2º Para o Supremo Tribunal Federal se a progressão de regime foi condicionada ao pagamento da pena de multa e para obter esse direito o condenado parcelou o valor devido mas posteriormente não honrou o acordo celebrado o inadimplemento injustificado das parcelas atinentes à sanção pecuniária autoriza a regressão de regime prisional45 Regressão por saltos É possível a regressão por saltos isto é a passagem direta do regime aberto para o fechado uma vez que o art 118 caput da Lei de Execução Penal referese à transferência para qualquer dos regimes mais rigorosos Regressão a regime mais grave do que o fixado na sentença condenatória A sentença condenatória no âmbito penal transita em julgado com a cláusula rebus sic stantibus Logo a mudança da situação de fato no curso da execução comparativamente ao substrato fático existente no início impõe ao juiz da execução a adoção de medidas necessárias de modo a adaptar a decisão à nova realidade 33153 Entendese portanto que nos termos do art 33 caput do Código Penal A pena de reclusão deve ser cumprida em regime fechado semiaberto ou aberto A de detenção em regime semiaberto ou aberto salvo necessidade de transferência a regime fechado se em matéria de condenação e execução da pena de detenção revelase possível a regressão para o regime fechado esse raciocínio com maior razão deve ser seguido nas hipóteses de condenação e execução de pena de reclusão Dessa forma a regra do art 118 I da Lei de Execução Penal A execução da pena privativa de liberdade ficará sujeita à forma regressiva com a transferência para qualquer dos regimes mais rigorosos quando o condenado I praticar fato definido como crime doloso ou falta grave não é obstáculo à alteração do regime de cumprimento de pena privativa de liberdade para regime mais gravoso do que aquele fixado na sentença condenatória desde que verificado algum dos pressupostos lá previstos46 Regressão cautelar Nada obstante a omissão legislativa acerca do assunto desponta como possível a regressão cautelar isto é a suspensão judicial do regime semiaberto ou aberto até que em obediência ao art 118 2º da Lei de Execução Penal o condenado seja ouvido e possa defenderse acerca do descumprimento das condições do regime Esta suspensão cautelar acarreta no recolhimento do condenado ao regime fechado até decisão judicial definitiva Se as suas explicações forem idôneas o magistrado restabelecerá o regime prisional anterior em caso contrário a regressão será convertida em definitiva47 Execução provisória ou antecipada é o cumprimento da pena antes do trânsito em julgado da condenação Não há pena definitiva Na história do direito penal brasileiro sempre foram diferenciadas duas situações a execução provisória de réu preso e b a execução provisória de réu solto Vejamos cada uma delas separadamente 33161 Execução provisória de réu preso Se o acusado foi condenado em 1ª instância ou pelo Tribunal e encontra se preso preventivamente admitese a execução antecipada da pena Esse instituto é benéfico ao réu pois lhe permite pleitear a progressão de regime prisional e outros benefícios antes do trânsito em julgado da decisão judicial proferida em seu desfavor A execução provisória tem como pressuposto inafastável o trânsito em julgado para a acusação em relação à pena aplicada Com efeito pode ocorrer de o Ministério Público ou o querelante ter interposto recurso contra parte da sentença condenatória diversa da pena imposta regime prisional substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos ou concessão de sursis etc Também é cabível quando a pena tiver sido fixada no patamar máximo legalmente previsto Nesses casos a pena determinada na decisão contra a qual a defesa recorreu não poderá ser aumentada seja em face da proibição da reformatio in pejus CPP art 617 seja pelo fato de já ter sido aplicada no limite máximo cominado Portanto a situação do réu não poderá ser agravada no julgamento do recurso será ele favorecido ou na pior das hipóteses sua posição processual ficará como já estava Vejamos um exemplo A foi preso em flagrante pela prática de roubo em concurso de pessoas CP art 157 2º II e nessa situação permaneceu durante a ação penal Depois de um ano foi proferida sentença resultando em sua condenação à pena de 6 seis anos de reclusão em regime inicialmente fechado O Ministério Público intimado da sentença não recorreu enquanto a defesa interpôs apelação postulando a absolvição Anotese A já está preso há um ano isto é já cumpriu 16 da pena imposta CP art 42 Está presente portanto o requisito objetivo da progressão Se comprovado o seu mérito poderá progredir desde já para o regime semiaberto sendo desnecessário aguardar para essa finalidade o trânsito em julgado da condenação Por outro lado se a acusação tiver recorrido postulando a majoração da reprimenda será inviável a execução provisória pois a pena poderá ser aumentada no julgamento do seu recurso Essa medida é extremamente favorável ao réu pois ressaltese se for absolvido em grau recursal não terá sofrido prejuízo algum Pelo contrário uma vez que já estará no regime semiaberto ou quiçá no aberto ao passo que para os que refutam a execução provisória teria ele aguardado o deslinde do recurso em posição mais gravosa no tocante à privação de sua liberdade E se for negado provimento ao recurso já terá deixado para trás a parte mais severa do cumprimento da pena privativa de liberdade Aqueles que não admitem a execução provisória buscam amparo no princípio da presunção de não culpabilidade CF art 5º LVII alegando que se o acusado deve ser tratado como inocente até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória não se poderia executar previamente a pena Essa posição entretanto é contraditória e insustentável pois utiliza um direito fundamental justamente para prejudicar o réu e não para protegêlo da atuação estatal O juízo da execução é competente para a execução provisória como se extrai dos arts 2º e seu parágrafo único 65 e 66 da Lei de Execução Penal Destarte após a condenação e desde que presente o trânsito em julgado para a acusação ou se a pena tiver sido fixada no máximo legal o juiz da ação penal expede guia de recolhimento provisório encaminhandoa à vara das execuções penais48 Além da doutrina e da jurisprudência que se posicionam majoritariamente em direção favorável à execução provisória o ordenamento jurídico também lhe fornece suficiente embasamento De fato o art 2º parágrafo único da Lei de Execução Penal dispõe serem as suas disposições aplicáveis ao preso provisório Nesse sentido uma das regras da LEP é a progressão Se é aplicável ao preso provisório a figura da progressão desponta como correto falarse em execução provisória Em igual sentido o Supremo Tribunal Federal criou a Súmula 716 Admitese a progressão de regime de cumprimento da pena ou a aplicação imediata de regime menos severo nela determinada antes do trânsito em julgado da sentença condenatória Se não bastasse o Conselho Nacional de Justiça editou a Resolução 33162 331621 1132010 cujo art 8º admite expressamente a execução provisória Tratandose de réu preso por sentença condenatória recorrível será expedida guia de recolhimento provisória da pena privativa de liberdade ainda que pendente recurso sem efeito suspensivo devendo nesse caso o juízo da execução definir o agendamento dos benefícios cabíveis Execução provisória de réu solto No plano histórico a execução provisória ou antecipada da pena imposta a réu solto sempre foi admitida no direito brasileiro inclusive após a vigência da Constituição Federal de 1988 Esse entendimento foi alterado no dia 5 de fevereiro de 2009 com o julgamento proferido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no HC 84078MG relatado pelo então Ministro Eros Grau Mas no dia 17 de fevereiro de 2016 o Plenário da Suprema Corte nos autos do HC 126292SP relatado pelo Min Teori Zavascki optou por restabelecer a antiga jurisprudência em acórdão com a seguinte ementa A execução provisória de acórdão penal condenatório proferido em grau de apelação ainda que sujeito a recurso especial ou extraordinário não compromete o princípio constitucional da presunção de inocência afirmado pelo artigo 5º inciso LVII da Constituição Federal49 Nada obstante existam respeitadas vozes em sentido contrário compartilhamos do atual entendimento do Excelso Pretório Em nossa opinião a nova orientação jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal confere racionalidade e coerência ao sistema penal que não pode se autodestruir em decorrência da sua inércia e da inutilidade causada por condenações que nunca são efetivamente cumpridas A discussão sobre eventual inconstitucionalidade da execução antecipada da pena não existe em nenhum outro país Não há regime democrático que repute tal instituto como incompatível com qualquer direito fundamental a b notadamente a presunção de inocência ou de não culpabilidade A propósito no julgamento pelo STF do HC 85866RJ a então Ministra Ellen Gracie incisivamente destacou Em país nenhum do mundo depois de observado o duplo grau de jurisdição a execução de uma condenação fica suspensa aguardando o referendo da Corte Suprema Aqui não pode ser diferente A presunção de inocência ou de não culpabilidade encontrase consagrada no art 5º LVII da Constituição Federal Seu caráter relativo é indiscutível por duas razões nenhum direito fundamental é absoluto De fato uma das características mais marcantes de todo e qualquer direito fundamental é a relatividade Portanto na hipótese de colisão um direito fundamental deve necessariamente conformarse com outro direito de igual natureza cuidase de princípio e não de regra Destarte a presunção de inocência comporta variações é dizer pode e deve ser aplicada com maior ou menor intensidade quando confrontada com outros princípios igualmente constitucionais Se a presunção de inocência fosse absoluta é preciso destacar sequer poderia ser ajuizada uma ação penal contra quem ofendeu a lei penal Mais do que isso jamais seria decretada qualquer medida restritiva da liberdade a exemplo da prisão preventiva e da prisão temporária antes do trânsito em julgado da condenação Na verdade nunca existiria uma sentença condenatória definitiva pois seria inviável a persecução penal Não se pode enveredar por extremos ou concepções ideológicas exageradas A Constituição Federal acertadamente consagrou o princípio da presunção de inocência Isso contudo não resulta em presunção absoluta de desconfiança no tocante às decisões provenientes das instâncias ordinárias Os juízos de 1º grau e os Tribunais de Justiça e Regionais Federais não podem ser menosprezados à categoria de meras instâncias de passagem Nessa linha de raciocínio em todos os países democráticos a inocência do ser humano é presumida até o momento em que a culpa é provada de acordo com o direito A Declaração Universal dos Direitos Humanos editada pela Organização das Nações Unidas em 1948 preceitua em seu artigo XI 1 Todo ser humano acusado de um ato delituoso tem o direito de ser presumido inocente até que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei em julgamento público no qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa Na Convenção Americana de Direito Humanos Pacto de San José da Costa Rica incorporada ao direito pátrio pelo Decreto 6781992 a presunção de inocência encontrase prevista em seu art 8 2 Toda pessoa acusada de um delito tem direito a que se presuma sua inocência enquanto não for legalmente comprovada a sua culpa De seu turno a Convenção Europeia dos Direitos do Homem estatui em seu art 6º 2 Qualquer pessoa acusada de uma infração presumese inocente enquanto a sua culpabilidade não tiver sido legalmente provada A Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789 contempla disposição semelhante em seu art 9º Em síntese todos os diplomas escolhem como limite para o término da presunção de inocência o momento em que se dá a comprovação da culpa Não há necessidade de trânsito em julgado da condenação A questão central está em apurar no Brasil o momento em que isso ocorre versus A presunção de inocência não pode ser analisada isoladamente Faltalhe caráter absoluto É preciso confrontála com outros valores constitucionais notadamente a efetividade da Justiça penal CF art 5º XXXV indispensável para a segurança de todas as pessoas inclusive daquela investigada ou acusada pela prática de uma infração penal Com efeito a segurança individual também é direito fundamental CF art 5º caput A segurança pública por sua vez representa dever do Estado direito e responsabilidade de todos e é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio CF art 144 caput Há muito tempo o princípio da proporcionalidade um dos vetores do Direito Penal democrático vem sendo encarado por uma dupla face De um lado representa a proibição do excesso pois não se pode punir mais do que o necessário para a proteção do bem jurídico garantismo negativo Mas de outro lado a proporcionalidade revela a proibição da proteção insuficiente de bens jurídicos pois não se tolera o tratamento penal impotente ou meramente simbólico garantismo positivo Há de se buscar um garantismo integral capaz de atender com equilíbrio tanto as necessidades do acusado como também os reclamos da sociedade Quando um acusado vem a ser condenado em segundo grau de jurisdição ou seja a imputação contra ele lançada foi comprovada perante um juízo colegiado integrado por magistrados em estágios avançados das suas carreiras com respeito ao devido processo legal e ao duplo grau de jurisdição fica evidente a demonstração concreta da sua responsabilidade penal A acusação ganha consistência e se inicialmente indicava uma dúvida acerca da materialidade do fato e da sua respectiva autoria passa a aproximarse do juízo de certeza A partir desse momento a presunção de inocência deve ser flexibilizada diante do interesse público na efetividade da lei penal Essa conclusão compatibiliza o respeito ao direito fundamental consagrado no art 5º LVII da Lei Suprema com a eficácia da Justiça penal sem prejuízo do respeito ao nosso complexo sistema processual penal Em síntese é inerente à presunção de não culpabilidade a evolução em conformidade com o estágio da ação penal Quanto mais a persecução em juízo avança mais gravoso deve ser o tratamento dispensado ao réu Essa conclusão decorre da lógica do sistema jurídico e é permitida pela Constituição Federal que em nenhum momento impõe o mesmo tratamento ao réu durante todo o processo Cabe aqui uma rápida incursão envolvendo o desenvolvimento do processo penal em suas variadas etapas Depois de iniciada a ação penal a condenação em 1º grau representa um juízo de culpa embora em tese provisório pois submetese à apelação à instância superior50 Com o julgamento do recurso e a condenação em 2ª instância esgotase o exame fático e probatório da demanda51 Além disso atendese ao duplo grau de jurisdição com o reexame integral da decisão singular com ampla devolutividade da matéria versada na ação penal pouco importando se ela foi ou não apreciada pelo juízo de origem Ao réu fica normalmente assegurado o direito de acesso ao Tribunal em liberdade salvo se decretada a sua prisão cautelar Com exceção da via estreita da revisão criminal portanto é nas instâncias ordinárias que se encerra a análise dos fatos e das provas e consequentemente a definição da responsabilidade penal do acusado Como se sabe os recursos especial e extraordinário não têm efeito devolutivo pois não se destinam ao reexame da matéria fática e probatória A finalidade desses instrumentos consiste na uniformização da jurisprudência e na correta interpretação da lei federal recurso especial ou da Constituição Federal recurso extraordinário Em outros termos com o julgamento efetuado pelo Tribunal de apelação Tribunal de Justiça ou Tribunal Regional Federal operase uma autêntica preclusão da matéria inerente aos fatos submetidos ao Poder Judiciário Dessa forma é fácil perceber que a execução da pena na pendência de recursos de natureza extraordinária não viola o núcleo fundamental da presunção de inocência concentrado especialmente no campo probatório Como corolário da sua natureza jurídica direito fundamental processual de âmbito negativo ligado ao ônus da prova o réu deve ser tratado como inocente durante toda a fase ordinária do processo criminal com os direitos e garantias que lhe são inerentes com respeito às regras probatórias e ao sistema acusatório Com a condenação pelo Tribunal em grau de apelação e na pendência de recurso de natureza extraordinária ainda que não se possa falar em réu definitivamente culpado é inegável a existência de justa causa para legitimar o início do cumprimento da pena Como destacado pelo Supremo Tribunal Federal A finalidade que a Constituição persegue não é outorgar uma terceira ou quarta chance para a revisão de um pronunciamento jurisdicional com o qual o sucumbente não se conforma e considera injusto O acesso individual às instâncias extraordinárias visa a propiciar ao STF e ao STJ o exercício de seus papéis de estabilizadores uniformizadores e pacificadores da interpretação das normas constitucionais e do direito infraconstitucional Por isso o art 102 3º da Constituição Federal exige demonstração de repercussão geral das questões constitucionais debatidas no recurso extraordinário Portanto ao recorrente cabe demonstrar que no julgamento de seu caso concreto malferiuse um preceito constitucional e que há necessariamente a transcendência e relevância da tese jurídica a ser afirmada pela Suprema Corte É a Constituição que alça o STF primordialmente a serviço da ordem jurídica constitucional e igualmente eleva o STJ a serviço da ordem jurídica Isso está claro no art 105 III da CF quando se observam as hipóteses de cabimento do recurso especial todas direta ou indiretamente vinculadas à tutela da ordem jurídica infraconstitucional Nem mesmo o excessivo apego à literalidade da regra do art 5º LVII da CF a qual nessa concepção imporia sempre o trânsito em julgado seria capaz de conduzir à solução diversa52 Em verdade há nítida diferença entre a posição de definitivamente culpado a qual somente se concretiza após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória e a de condenado apta a ensejar a execução antecipada da pena que se verifica com a prolação de acórdão condenatório com obediência ao duplo grau de jurisdição Nesse contexto é imperioso destacar que a Constituição Federal não condiciona a prisão ao trânsito em julgado da condenação e sim à ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente a teor do mandamento contido em seu art 5º LXI Logo basta ao Poder Judiciário emitir uma ordem escrita e fundamentada para iniciar a título provisório o cumprimento da pena O embasamento dessa ordem recai nos elementos constantes do acórdão condenatório Com efeito se nosso ordenamento jurídico admite a prisão cautelar antes de qualquer édito condenatório com maior razão há de admiti la quando já existe um título executivo proveniente de juízo colegiado reconhecendo a responsabilidade penal do acusado A execução provisória da pena privativa de liberdade não se constitui em prisão de natureza cautelar Ao contrário exige a formação de juízo de culpabilidade embasado em título judicial condenatório proferido em respeito ao duplo grau de jurisdição Para o Supremo Tribunal Federal O Colegiado pontuou que a execução em debate diz respeito a acórdão penal condenatório proferido em segundo grau Dessa forma seguindo a orientação jurisprudencial do STF ainda que não transitada em julgado a condenação do agravante a prisão não mais se reveste de natureza cautelar mas sim das características de prisãopena a qual exige a formulação de juízo de culpabilidade em título judicial condenatório53 É inegável que podem ocorrer equívocos nos juízos condenatórios proferidos pelas instâncias ordinárias54 Isso decorre da falibilidade humana inclusive nas instâncias extraordinárias Mas para tais infelicidades sempre está reservado o habeas corpus ou então as medidas cautelares voltadas à obtenção de efeito suspensivo no recurso especial ou no recurso extraordinário Em resumo o acusado jamais estará abandonado da tutela jurisdicional frente a decisões teratológicas e nitidamente violadoras dos seus direitos E mais a última causa interruptiva da prescrição da pretensão punitiva é a publicação da sentença ou acórdão condenatórios recorríveis CP art 117 IV Essa opção do legislador deixa claro que além de os recursos às cortes superiores não se destinarem ao exame de fatos e provas também não interrompem o prazo prescricional Como desdobramento dessa escolha legislativa na prática tais recursos antes de representarem instrumentos de proteção da presunção de inocência constituemse em verdadeiros mecanismos contrários à efetividade da jurisdição penal A execução antecipada da pena atende aos anseios da coletividade que não mais suporta a prestação jurisdicional tardia e muitas vezes inútil bem como a impunidade causada pelos infindáveis casos de prescrição inclusive em crimes de elevada gravidade O instituto almeja colocar em prática na esfera penal o direito à razoável duração do processo CF art 5o inc LXXVIII o qual interessa a todas as pessoas e principalmente aos acusados de boafé e dotados de lealdade processual que não se valem de expedientes protelatórios para tumultuar o andamento da ação penal e atrasar a prestação jurisdicional banalizando a atuação do Poder Judiciário e aniquilando a credibilidade da sociedade na sua eficácia A prática judiciária não raras vezes confunde a ampla defesa direito fundamental e conquistado a duras penas com defesa fácil baseada notadamente na morosidade da Justiça penal e nas facilidades de que se aproveitam alguns acusados dotados de elevado poder econômico para arrastar no tempo suas ações penais aproveitandose das falhas do sistema e do invencível volume de serviço que acomete os órgãos do Poder Judiciário Esse expediente indevido favorece a seletividade negativa e discriminatória do Direito Penal pois proporciona a fuga da pena aos réus dotados de recursos suficientes para enfrentar as lacunas da Justiça criminal Igual sorte não assiste aos economicamente mais frágeis muitas vezes amparados pela Defensoria Pública instituição que em face do gigantesco volume de serviço e da falta de estrutura humana não consegue conferir igual tratamento àqueles que a procuram Se não bastasse a lentidão da Justiça penal estimula a prática de delitos econômicos pois a quem tem recursos financeiros e almeja o enriquecimento ilícito o baixo risco de punição realmente compensa As cifras douradas do Direito Penal ganham corpo com o cometimento de crimes do colarinho branco contra a ordem tributária contra a Administração Pública e de lavagem de capitais entre tantos outros que escapam da justa retribuição A finalidade preventiva da pena geral e especial igualmente deixa de ser alcançada É triste constatar que no sistema recursal brasileiro o trânsito em julgado da condenação depende em algum momento da inércia ou da anuência da parte derrotada Sempre existe um recurso agravos embargos etc oponível contra uma decisão ainda que sem nenhum fundamento válido e os instrumentos legais para coibir tais comportamentos são insuficientes Não raras vezes portanto a condenação definitiva somente ocorre quando o réu se conforma com seu destino e então deixa de valerse de algum recurso Em outras palavras nosso sistema jurídico lamentavelmente condiciona o fim do processo à anuência do acusado e o poder punitivo do Estado fica à mercê dos malabarismos defensivos que são apresentados no caso concreto Quem não admite a execução provisória de réu solto invoca o art 283 do Código de Processo Penal cuja redação é a seguinte Art 283 Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou no curso da investigação ou do processo em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva Esse dispositivo legal preceitua que com exceção da custódia cautelar prisão em flagrante prisão temporária ou preventiva somente será possível a prisão por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado Exigese portanto o trânsito em julgado da condenação Surge aqui uma indagação o art 283 do CPP funciona como fator impeditivo da execução provisória quando o acusado nada obstante a existência de acórdão condenatório em que foi respeitado o duplo grau de jurisdição não teve contra si decretada a prisão preventiva55 A resposta evidentemente é negativa Com efeito o Código de Processo Penal tem status de lei ordinária Suas normas devem guardar compatibilidade vertical com a Constituição Federal e não o contrário E como se sabe a Lei 33163 Suprema admite a execução provisória em face da relatividade da presunção de inocência ou de não culpabilidade e da sua conformação com a efetividade da prestação jurisdicional e com a razoável duração do processo O Superior Tribunal de Justiça já decidiu nesse sentido Atentase ainda à previsão contida no art 283 do CPP Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou no curso da investigação ou do processo em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva cuja redação dada pela Lei 124032011 veio encampar a jurisprudência até então consolidada do STF no sentido de que toda prisão antes do trânsito em julgado teria natureza cautelar Ora é fato que a redação desse artigo encontra sua essência no princípio constitucional da presunção de não culpabilidade Logo se o próprio Pretório Excelso ao interpretar esse princípio constitucional entendeu pela possibilidade de execução provisória da pena após a prolação de acórdão condenatório não se verifica como uma interpretação da regra infraconstitucional possa contraditar o alcance de sentido que foi emprestado ao princípio que dá sustentação a essa própria regra infraconstitucional porquanto sob a perspectiva kelseniana as normas inscritas na Carta Maior se encontram no topo da pirâmide normativa à qual todo o sistema jurídico deve se conformar Diante disso não há como pretender que sejam sobrepostas a interpretação e o alcance do art 283 do CPP à espécie de modo a afastar o entendimento manifestado pelo STF porquanto ao fim e ao cabo as normas infraconstitucionais é que devem se harmonizar com a Constituição e não o contrário56 Execução provisória de pena aplicada em ação penal originária Se a pena foi aplicada em decorrência da prática de crime de competência originária de Tribunal não é possível a imediata execução provisória Exemplo A juiz de direito pratica um determinado crime e vem a ser condenado diretamente pelo Tribunal de Justiça do seu estado 33164 Essa conclusão decorre da interpretação da atual jurisprudência do Supremo Tribunal Federal De fato não basta o acórdão condenatório para legitimar o cumprimento antecipado da pena Exigese mais um requisito consistente no respeito ao princípio do duplo grau de jurisdição57 Execução provisória da pena imposta pelo Tribunal do Júri Se a pena privativa de liberdade foi aplicada pelo Tribunal de Júri em resposta à prática de crime doloso contra a vida ou delito que lhe seja conexo a execução provisória independe do julgamento de recurso em segundo grau de jurisdição em face da soberania dos veredictos assegurada pelo art 5º XXXVIII c da Constituição Federal Na dicção do Supremo Tribunal Federal Nas condenações pelo tribunal do júri não é necessário aguardar julgamento de recurso em segundo grau de jurisdição para a execução da pena Com base nesse entendimento a Primeira Turma por maioria não conheceu da impetração de habeas corpus e revogou liminar que suspendia a execução da pena privativa de liberdade O paciente foi condenado pelo tribunal do júri a doze anos cinco meses e dez dias de reclusão em regime inicial fechado pela tentativa de homicídio qualificado O Conselho de Sentença porém o absolveu da imputação do delito de homicídio consumado Em sede de apelação o tribunal de justiça afastou a redução de 23 da pena e estabeleceu o patamar de 13 para cada uma das condenações fixando a pena definitiva em dezenove anos cinco meses e dez dias de reclusão Determinou a realização de novo júri no tocante à absolvição do crime de homicídio bem como o início da execução provisória da pena reportandose ao decidido pelo Supremo no exame do HC 126292 A defesa argumentou que a execução da pena dependeria de novo julgamento pelo tribunal do júri e que fundamentar a decisão exclusivamente no entendimento firmado no HC 126292 ofenderia o princípio da fundamentação das decisões jurídicas previsto no art 93 IX da CF A Turma asseverou que as decisões do tribunal do júri são soberanas Por isso o tribunal de justiça pode eventualmente anulálas mas não pode substituílas58 33165 Contra essa posição entretanto milita um forte argumento embora a condenação emane de órgão colegiado Conselho de Sentença não houve obediência ao duplo grau de jurisdição Execução provisória da pena e desaforamento Na hipótese em que houve desaforamento no trâmite de ação penal atinente a crime de competência do Tribunal do Júri com posterior condenação pelo Conselho de Sentença a qual vem a ser confirmada pela instância superior em grau de recurso a execução provisória da pena será promovida pelo juízo da comarca em que o feito foi desaforado O deslocamento de foro operase tão somente para a realização do julgamento popular Na visão do Superior Tribunal de Justiça A execução provisória da decisão proferida pelo Tribunal do Júri oriunda de julgamento desaforado nos termos do art 427 do CPP compete ao Juízo originário da causa e não ao sentenciante Entre outras insurgências aventadas no habeas corpus importa analisar a competência para execução provisória de pena estabelecida em decisão proferida pelo Tribunal do Júri se do Juízo sentenciante ou do Juízo em que o processo foi desaforado no intuito de garantir a imparcialidade do Conselho de Sentença Sobre o tema sabese que de acordo com o teor dos arts 70 e 69 I ambos do CPP via de regra a competência darseá pelo local da infração pois presumese que no lugar dos fatos isto é no distrito da culpa o acervo probatório será construído com maior robustez adotandose nesse campo a expressão latina do forum delicti comissi que prepondera ainda mais no procedimento dos crimes dolosos contra a vida submetidos ao Tribunal do Júri haja vista que os jurados do local dos fatos frisese leigos sob a ótica jurídica decidirão com base em razões pessoais influenciadas pela cultura circunscrita àquela localidade Contudo excepcionando a regra supracitada o art 427 do CPP estabelece que nas hipóteses em que o interesse da ordem pública o reclamar ou houver dúvidas sobre a imparcialidade do júri ou a segurança pessoal do acusado poderá ser determinado o desaforamento do feito para comarca distinta da mesma região onde não existam 33166 aqueles motivos preferindose as mais próximas Cabe salientar sob a ótica hermenêutica e da aplicação do Direito no Tribunal do Júri o seguinte destaque da doutrina cuidase o desaforamento portanto de decisão jurisdicional que altera a competência inicialmente fixada pelos critérios constantes do art 70 do CPP com aplicação estrita à sessão de julgamento propriamente dita De igual modo não se verifica violação ao artigo 668 do CPP tendo em vista tratarse de norma afeta aos julgamentos originariamente designados ao Júri o que não se revela quando da ocorrência do instituto do desaforamento Diante de tais elucidações concluise que o art 427 do CPP não comporta interpretação ampliativa de modo que o deslocamento de competência darseá tão somente quanto ao Tribunal Popular ao passo que uma vez realizado esgotase a competência da comarca destinatária inexistindo no caso violação quanto à execução provisória determinada pelo juízo originário da causa em observância à exegese do art 70 do mesmo diploma legal59 Execução provisória de penas restritivas de direitos O Supremo Tribunal Federal em pronunciamento anterior ao decidido pelo Plenário no julgamento do HC 126292SP já admitiu a execução provisória de penas restritivas de direitos nas hipóteses excepcionais em que seja comprovado o intuito meramente protelatório do réu ou do seu defensor no exercício do direito recursal buscando o retardamento do trânsito em julgado da condenação60 Essa posição é acertada Não há razão legítima para admitirse a execução provisória da pena privativa de liberdade cujo cumprimento é mais gravoso ao acusado e negarse tal instituto nas penas restritivas de direitos O Superior Tribunal de Justiça entretanto tem se posicionado pela impossibilidade de execução provisória no âmbito das penas restritivas de direitos seja pela falta de pronunciamento recente do Supremo Tribunal sobre o assunto seja pela interpretação literal do art 147 da Lei de Execução Penal Não é possível a execução da pena restritiva de direitos antes do trânsito em julgado da condenação A divergência tratada nos embargos envolve 33167 a possibilidade de se executar provisoriamente penas restritivas de direito O acórdão embargado da Quinta Turma decidiu que nos termos do art 147 da Lei de Execução Penal as penas restritivas de direitos só podem ser executadas após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória A tese paradigma foi apresentada com base no entendimento firmado no AgRg no REsp 1627367SP segundo o qual É cabível a determinação de execução provisória de pena privativa de liberdade convertida em restritivas de direitos Sobre o tema o STF já se manifestara expressamente a respeito da impossibilidade da execução das reprimendas restritivas de direitos antes do trânsito em julgado por força na norma prevista no art 147 da LEP Recentemente o Supremo Tribunal Federal por meio do HC n 126292SP não considerou a possibilidade de se executar provisoriamente a pena restritiva de direitos mas restringiuse à reprimenda privativa de liberdade na medida em que dispôs tão somente sobre a prisão do acusado condenado em segundo grau antes do trânsito em julgado Em vista da ausência de apreciação pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal quanto à possibilidade de executar a reprimenda restritiva de direitos antes do trânsito em julgado da condenação somado ao texto expresso do art 147 da Lei de Execução Penal deve prevalecer o entendimento firmado no acórdão embargado61 Execução provisória e prisão especial Não é impeditiva da execução provisória a circunstância de ter sido o acusado recolhido em prisão especial durante a prisão provisória Como estatui a Súmula 717 do Supremo Tribunal Federal Não impede a progressão de regime de execução da pena fixada em sentença não transitada em julgado o fato de o réu se encontrar em prisão especial A Lei de Execução Penal ao disciplinar a execução das penas privativas de liberdade prevê as autorizações de saída do estabelecimento prisional consistentes em benefícios aplicáveis aos condenados inseridos nos regimes 33171 33172 fechado ou semiaberto62 Dividemse em permissão de saída com fulcro na dignidade do condenado e saída temporária endereçada à reinserção social do preso Permissão de saída Nos termos do art 120 da Lei de Execução Penal cuidase de benefício destinado aos condenados que cumprem pena em regime fechado ou semiaberto e também aos presos provisórios A saída do estabelecimento se dará sempre mediante escolta quando ocorrer um dos seguintes fatos I falecimento ou doença grave do cônjuge companheira ascendente descendente ou irmão e II necessidade de tratamento médico nos casos em que o estabelecimento penal não estiver aparelhado para prover a assistência médica necessária A permissão de saída será concedida pelo diretor do estabelecimento onde se encontra o preso LEP art 120 parágrafo único É possível a sua concessão pelo juízo da execução se o pedido for recusado injustificadamente pela autoridade administrativa Saída temporária É cabível aos condenados que cumprem pena em regime semiaberto para saída do estabelecimento penal sem vigilância direta nos seguintes casos I visita à família II frequência a curso supletivo profissionalizante bem como de instrução do segundo grau ou superior na comarca do Juízo da Execução e III participação em atividades que concorram para o retorno ao convívio social LEP art 12263 Nos termos do art 122 parágrafo único da Lei de Execução Penal a ausência de vigilância direta não impede a utilização de equipamento de monitoração eletrônica pelo condenado quando assim determinar o juiz da execução O benefício da saída temporária não pode ser aplicado ao preso provisório por dois motivos a não é condenado e b não cumpre pena privativa de liberdade em regime semiaberto Será concedida por ato motivado do juiz da execução64 ouvidos o Ministério Público e a administração penitenciária e dependerá da satisfação dos seguintes requisitos cumulativos I comportamento adequado II cumprimento mínimo de 16 um sexto da pena se o condenado for primário e 14 um quarto se reincidente e III compatibilidade do benefício com os objetivos da pena LEP art 123 No tocante ao percentual de cumprimento da pena 16 ou 14 o período já descontado no regime fechado se era o regime inicial da pena privativa de liberdade será computado para fins de saída temporária É o que estabelece a Súmula 40 do Superior Tribunal de Justiça Para obtenção dos benefícios de saída temporária e trabalho externo considerase o tempo de cumprimento da pena no regime fechado A autorização será concedida por prazo não superior a 7 sete dias podendo ser renovada por mais quatro vezes durante o ano E quando se tratar de frequência a curso supletivo ou profissionalizante de instrução de nível médio ou superior o tempo de saída será o necessário para o cumprimento das atividades discentes LEP art 124 2º Nos demais casos visita à família e participação em atividades que concorram para o retorno ao convívio social as autorizações de saída somente poderão ser concedidas com prazo mínimo de 45 quarenta e cinco dias de intervalo entre uma e outra LEP art 124 3º E como estatui o art 124 1º da Lei de Execução Penal Ao conceder a saída temporária o juiz imporá ao beneficiário as seguintes condições entre outras que entender compatíveis com as circunstâncias do caso e a situação pessoal do condenado I fornecimento do endereço onde reside a família a ser visitada ou onde poderá ser encontrado durante o gozo do benefício II recolhimento à residência visitada no período noturno e III proibição de frequentar bares casas noturnas e estabelecimentos congêneres O benefício será automaticamente revogado quando o condenado praticar fato definido como crime doloso for punido por falta grave desatender as condições impostas na autorização ou revelar baixo grau de aproveitamento do curso Se revogado a recuperação do direito à saída temporária dependerá da absolvição no processo penal do cancelamento da punição disciplinar ou da demonstração do merecimento do condenado LEP art 125 e parágrafo único O art 146B inc II da Lei 72101984 Lei de Execução Penal autorizou o juiz a definir a fiscalização do condenado mediante monitoração eletrônica quando autorizar a saída temporária no regime semiaberto Tratase de recurso excepcional não podendo ser utilizado como regra O juiz deverá fundamentar sua decisão e baseála sobretudo em questões de necessidade adequação e proporcionalidade da medida pois a regra é a saída temporária sem vigilância direta LEP art 122 caput Nesse caso o condenado será instruído acerca dos cuidados que deverá adotar com o equipamento eletrônico e dos seguintes deveres I receber visitas do servidor responsável pela monitoração eletrônica responder aos seus contatos e cumprir suas orientações II absterse de remover de violar de modificar de danificar de qualquer forma o dispositivo de monitoração eletrônica ou de permitir que outrem o faça LEP art 146C incs I e II A violação comprovada de tais deveres poderá acarretar a critério do juiz da execução ouvidos o Ministério Público e a defesa a a regressão do regime b a revogação da autorização de saída temporária ou c advertência por escrito se o juiz decidir não aplicar qualquer das sanções anteriores LEP art 146C parágrafo único incs I II e VII Exigese portanto respeito à ampla defesa para imposição da sanção cabível A monitoração eletrônica poderá ser revogada quando se tornar desnecessária ou inadequada ou se o condenado violar os deveres a que estiver sujeito durante sua vigência ou cometer falta grave LEP art 146D sem prejuízo nessa última hipótese da imposição das sanções disciplinares previstas no art 53 da Lei de Execução Penal O Supremo Tribunal Federal admite as saídas temporárias automatizadas nas situações em que o juízo da execução elabora um calendário anual para a concessão do benefício ao condenado dispensandose a repetição do procedimento em cada oportunidade É legítima a decisão judicial que estabelece calendário anual de saídas temporárias para que o preso possa visitar a família Esse o entendimento da Primeira Turma que concedeu a ordem em habeas corpus para restabelecer ato do Juízo das Execuções Penais do Estado do Rio de Janeiro que concedera autorização de saída temporária para visita periódica à família do paciente Essa decisão mantida em grau de recurso fora no entanto reformada pelo STJ que assentara o descabimento da concessão de saídas automatizadas Segundo aquela Corte seria necessária a manifestação motivada do juízo da execução com intervenção do Ministério Público em cada saída temporária A Turma afirmou que a saída temporária autorizada repercutiria sobre outras saídas desde que não houvesse cometimento de falta grave pelo custodiado65 a b c d O Superior Tribunal de Justiça que inicialmente era contrário às saídas temporárias automatizadas modificou sua jurisprudência e passou a adotar as seguintes diretrizes É recomendável que cada autorização de saída temporária do preso seja precedida de decisão judicial motivada Entretanto se a apreciação individual do pedido estiver por deficiência exclusiva do aparato estatal a interferir no direito subjetivo do apenado e no escopo ressocializador da pena deve ser reconhecida excepcionalmente a possibilidade de fixação de calendário anual de saídas temporárias por ato judicial único observadas as hipóteses de revogação automática do art 125 da Lei 72101984 Lei de Execução Penal O calendário prévio das saídas temporárias deverá ser fixado obrigatoriamente pelo juízo das execuções não se lhe permitindo delegar à autoridade prisional a escolha das datas específicas nas quais o apenado irá usufruir os benefícios A propósito estatui a Súmula 520 do Superior Tribunal de Justiça O benefício de saída temporária no âmbito da execução penal é ato jurisdicional insuscetível de delegação à autoridade administrativa do estabelecimento prisional Respeitado o limite anual de 35 dias estabelecido pelo art 124 da Lei de Execução Penal é cabível a concessão de maior número de autorizações de curta duração pois o fracionamento do benefício é coerente com o processo reeducativo e com a reinserção gradativa do apenado ao convívio social As autorizações de saída temporária para visita à família e para participação em atividades que concorram para o retorno ao convívio social se limitadas a cinco vezes durante o ano deverão observar o prazo mínimo de 45 dias de intervalo entre uma e outra Na hipótese de maior número de saídas temporárias de curta duração já intercaladas durante os doze meses do ano e muitas vezes sem pernoite não se exige o intervalo previsto no art 124 3 da Lei de Execução Penal qual seja 45 dias entre cada uma das saídas66 O local adequado para o cumprimento da pena privativa de liberdade em regime fechado é a Penitenciária LEP art 87 Pelo sistema legislativo o condenado deve ser alojado em cela individual que conterá dormitório aparelho sanitário e lavatório Cada unidade celular depende dos seguintes requisitos básicos a salubridade do ambiente pela concorrência dos fatores de aeração insolação e condicionamento térmico adequado à existência humana e b área mínima de seis metros quadrados LEP art 88 A Penitenciária de homens será construída em local afastado do centro urbano à distância que não restrinja a visitação LEP art 90 Embora na realidade ocorra fenômeno diverso a Cadeia Pública destinase exclusivamente ao recolhimento de presos provisórios LEP art 102 Esta também é a determinação contida no art 300 caput do Código de Processo com a redação determinada pela Lei 124032011 As pessoas presas provisoriamente ficarão separadas das que já estiverem definitivamente condenadas nos termos da lei de execução penal No início do cumprimento da pena o condenado será obrigatoriamente submetido a exame criminológico de classificação para individualização da execução CP art 34 caput e LEP art 8º caput Esse exame é realizado pela Comissão Técnica de Classificação com vistas a definir o programa individualizador da pena privativa de liberdade adequada ao condenado LEP art 6º O condenado fica sujeito a trabalho no período diurno e a isolamento durante o repouso noturno É o que se convencionou chamar de período de silêncio67 O trabalho será em comum dentro do estabelecimento na conformidade das aptidões ou ocupações anteriores do condenado desde que compatíveis com a execução da pena CP art 34 1º e 2º Esse trabalho é obrigatório LEP art 31 caput Ressaltese que na atribuição do trabalho deverão ser levadas em conta a habilitação a condição pessoal e as necessidades futuras do preso bem como as oportunidades oferecidas pelo mercado Deverá ser limitado tanto quanto possível o artesanato sem expressão econômica salvo nas regiões de turismo Os maiores de 60 sessenta anos poderão solicitar ocupação adequada à sua idade e os doentes ou deficientes físicos somente exercerão atividades apropriadas ao seu estado LEP art 32 e 1º a 3º O Código Penal somente admite o trabalho externo em serviços ou obras públicas art 34 3º Porém o art 36 caput da Lei de Execução Penal é mais amplo abrindo espaço ao labor extramuros também em entidades particulares O trabalho externo será admissível para os presos em regime fechado somente em serviço ou obras públicas realizadas por órgãos da Administração Direta ou Indireta ou entidades privadas desde que tomadas as cautelas contra a fuga e em favor da disciplina Devem ser observadas algumas regras quanto ao trabalho externo a o limite máximo do número de presos será de 10 dez por cento do total de empregados na obra b caberá ao órgão da administração à entidade ou à empresa empreiteira a remuneração desse trabalho e c a prestação de trabalho a entidade privada depende do consentimento expresso do preso LEP art 36 1º a 3º Além disso a prestação de trabalho externo a ser autorizada pela direção do estabelecimento dependerá de aptidão disciplina e responsabilidade além do cumprimento mínimo de 16 um sexto da pena E será revogada a autorização de trabalho externo ao preso que vier a praticar fato definido como crime for punido por falta grave ou faltar com aptidão disciplina ou responsabilidade LEP art 37 caput e parágrafo único É admissível o trabalho externo do condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado pois não há restrições legais Logo por cumprir parte da pena em regime fechado aplicamse as regras a ele inerentes Deve ser tomada porém redobrada cautela no tocante à vigilância68 O trabalho externo em entidades privadas desde que cumpridos todos os requisitos legais pode ser prestado inclusive em empresa pertencente à família do condenado A boafé tanto da empregadora quanto também do preso é presumida e eventuais abusos devem ser comprovados no caso concreto Na dicção do Superior Tribunal de Justiça O fato de o irmão do apenado ser um dos sócios da empresa empregadora não constitui óbice à concessão do benefício do trabalho externo ainda que se argumente sobre o risco de ineficácia da realização do trabalho externo devido à fragilidade na fiscalização Com efeito a execução criminal visa ao retorno do condenado ao convívio em sociedade com o escopo de reeducálo e ressocializálo sendo que o trabalho é essencial para esse processo Nesse contexto é importante considerar que os riscos de ineficácia da realização de trabalho externo em empresa familiar sob o argumento de fragilidade na fiscalização não podem ser óbice à concessão do referido benefício Em primeiro lugar porque é muito difícil para o apenado conseguir emprego Impedir que o preso seja contratado por parente é medida que reduz ainda mais a possibilidade de vir a conseguir uma ocupação lícita e em consequência sua perspectiva de reinserção na sociedade Em segundo lugar porque o Estado deve envidar todos os esforços possíveis no sentido de ressocializar os transgressores do Direito Penal a fim de evitar novas agressões aos bens jurídicos da coletividade Ademais o Estado possui a atribuição de fiscalizar o efetivo cumprimento do trabalho extramuros estando autorizado a revogar a benesse nas hipóteses elencadas no parágrafo único do art 37 da LEP Além disso não há qualquer vedação na LEP quanto à concessão de trabalho externo em empresa da família do sentenciado69 A jornada normal de trabalho não será inferior a 6 seis nem superior a 8 oito horas com descanso nos domingos e feriados Aos presos designados para os serviços de conservação e manutenção do estabelecimento penal poderá ser atribuído horário especial de trabalho LEP art 33 O preso que desempenha atividade laborativa tem direito à remuneração que não pode ser inferior a 34 do salário mínimo CP art 39 e LEP art 29 caput Assistelhe ainda direito aos benefícios da Previdência Social CP art 39 e LEP art 41 III A recusa injustificada do preso à execução do trabalho caracteriza falta 33181 grave LEP arts 31 39 V e 50 VI acarretando na impossibilidade de obter a progressão de regime prisional ou o livramento condicional Entretanto o trabalho não é obrigatório ao preso provisório e ao preso político LEP arts 31 parágrafo único e 200 No tocante às contravenções penais o trabalho é facultativo se a pena de prisão simples aplicada não exceder a 15 quinze dias Decretolei 36881941 LCP art 6º 2º Local de cumprimento da pena O condenado à pena privativa de liberdade não tem o direito de cumprila na sua comarca até porque nela não existe obrigatoriamente estabelecimento prisional70 Com efeito é preferível que a pessoa processada ou condenada fique custodiada em presídio no local em que reside inclusive para facilitar o exercício de seu direito à assistência familiar e promover sua ressocialização71 Porém se a permanência do apenado em presídio local evidenciase impraticável ou inconveniente por qualquer motivo tal como em razão do seu comportamento ou das suas desavenças com os demais detentos é mister pôr em ressalto a preponderância ao interesse social da segurança e da própria eficácia da segregação individual Em regra a execução da pena deve ocorrer na mesma comarca em que se consumou o crime Entretanto o art 86 da Lei de Execução Penal admite exceções a essa regra ou seja a transferência de condenado para sistema penitenciário de outra unidade federativa em estabelecimento local ou da União desde que fundamentada a decisão pelo juiz por motivação idônea e válida para justificála Destarte ainda que seus parentes e as pessoas do seu convívio social residam em outra comarca ou mesmo em outro Estado o condenado não tem direito à remoção do estabelecimento prisional quando preso em local diverso especialmente quando ligado a organizações criminosas hipótese em que a supremacia do interesse público indica ser o Estado em que se deu a condenação o menos apropriado para cumprimento da pena72 Destaquese ainda que a União está autorizada a construir estabelecimento penal em local distante da condenação para recolher os condenados quando a medida se justifique no interesse da segurança pública ou do próprio condenado LEP art 86 1º E cabe ao juiz competente a requerimento da autoridade administrativa definir o estabelecimento prisional adequado para abrigar o preso provisório ou condenado em atenção ao regime e aos requisitos estabelecidos LEP art 86 3º A transferência de condenado para estabelecimento prisional da União depende de decisão prévia fundamentada da Justiça Federal nos termos da Lei 116712008 Nesse caso encontrandose o preso em estabelecimento prisional pertencente à União a execução das penas é da competência do juízo federal em que se encontram os apenados transferidos ou seja o juízo do lugar onde a pena está sendo cumprida de acordo com o disposto no art 1º 1º da Res n 5572007 do Conselho da Justiça Federal que tem redação similar ao art 4º 1º da Lei n 116712008 o que está de acordo com o art 66 da LEP73 Se comprovada uma situação de emergência essa transferência prescinde da prévia oitiva do preso Como destacado pelo Supremo Tribunal Federal A transferência de preso para presídio federal de segurança máxima sem a sua prévia oitiva desde que fundamentada em fatos caracterizadores de situação emergencial não configura ofensa aos princípios do devido processo legal da ampla defesa da individualização da pena e da dignidade da pessoa humana Com base nesse entendimento a 1ª Turma denegou habeas corpus em que se pleiteava a anulação de transferência de preso recolhido em penitenciária estadual para estabelecimento federal por suposta inobservância de requisitos legais Aludiuse ao que contido no 6º do art 5º da Lei 116712008 que dispõe sobre a transferência e inclusão de presos em estabelecimentos penais federais de segurança máxima e dá outras providências 6º Havendo extrema necessidade o juiz federal poderá autorizar a imediata transferência do preso e após a instrução dos autos na forma do 2º deste artigo decidir pela manutenção ou revogação da medida adotada Consignouse a possibilidade de postergação da oitiva dos agentes envolvidos no 33182 processo de transferência cuja formalidade estaria prevista no 2º do mesmo preceito Instruídos os autos do processo de transferência serão ouvidos no prazo de 5 cinco dias cada quando não requerentes a autoridade administrativa o Ministério Público e a defesa bem com o Departamento Penitenciário Nacional DEPEN a quem é facultado indicar o estabelecimento penal mais adequado Aduziuse que no caso estariam demonstrados os fatos ensejadores da situação emergencial a rebeliões ocorridas em determinado período com a morte de vários detentos b julgamento pela Corte Interamericana de Direitos Humanos do Brasil e do estadomembro em que localizada a penitenciária na qual inicialmente recluso o paciente c interdição do presídio e d periculosidade do paciente Ressaltouse ademais a inexistência de direito subjetivo do reeducando de cumprir a pena em penitenciária específica74 A renovação do prazo de permanência do condenado em presídio federal de segurança máxima é possível se persistirem os motivos que fundamentaram a sua transferência ainda que não tenha ocorrido fato novo Com efeito a Lei nº 116712008 dispõe que o período de permanência é renovável excepcionalmente quando solicitado motivadamente pelo juízo de origem prescindindo de novos argumentos Nessa hipótese não cabe ao juízo federal discutir as razões do juízo estadual ao solicitar a transferência ou renovação do prazo em presídio federal pois este é o único habilitado a declarar a excepcionalidade da medida75 Finalmente é legítima a transferência de presos em face do superpovoamento e de problemas estruturais no estabelecimento prisional em atenção à dignidade da pessoa humana e ao princípio da humanidade da pena bem como aos direitos dos presos expressamente assegurados no art 5º XLIX da Constituição Federal é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral76 Regime Disciplinar Diferenciado RDD O Regime Disciplinar Diferenciado foi inserido no art 52 da Lei de Execução Penal pela Lei 107922003 É aplicável ao preso provisório e ao 1 2 3 a b c d condenado nacionais ou estrangeiros e tem cabimento em três hipóteses com a prática de fato previsto como crime doloso que constitui falta grave desde que ocasione subversão da ordem ou disciplina internas sem prejuízo da sanção penal correspondente LEP art 52 caput quando o preso apresentar alto risco para a ordem e a segurança do estabelecimento penal ou da sociedade LEP art 52 1º e quando existirem fundadas suspeitas de envolvimento ou participação do preso provisório ou condenado a qualquer título em organizações criminosas quadrilha ou bando77 LEP art 52 2º Suas características são as seguintes LEP art 52 I a IV duração máxima de 360 trezentos e sessenta dias sem prejuízo da repetição da sanção por nova falta grave de mesma espécie até o limite de 16 da pena aplicada recolhimento em cela individual visitas semanais de duas pessoas sem contar as crianças com duração de 2 duas horas e direito do preso de sair da cela por 2 duas horas diárias para banho de sol A inserção do preso no regime disciplinar diferenciado depende de prévio e fundamentado despacho do juiz da execução competente mediante requerimento circunstanciado elaborado pelo diretor do estabelecimento ou outra autoridade administrativa exemplo Secretário de Estado da Administração Penitenciária A decisão judicial sobre a inclusão de preso em regime disciplinar será precedida de manifestação do Ministério Público e da defesa e prolatada no prazo máximo de 15 quinze dias LEP art 54 e 1º e 2º Destarte para que haja a colocação do preso no Regime Disciplinar Diferenciado RDD é necessário ocorrer ao menos uma das hipóteses previstas no art 52 da Lei de Execução Penal caput 1º ou 2º Ademais a decisão judicial sobre a inclusão do preso no regime disciplinar diferenciado depende de requerimento minucioso do diretor do estabelecimento ou outra autoridade administrativa Deverá ser fundamentada pelo juiz das execuções criminais e determinada no processo de execução penal bem como precedida de manifestação do Ministério Público e da defesa78 Nos termos do art 60 da Lei de Execução Penal a autoridade administrativa poderá decretar o isolamento preventivo do faltoso pelo prazo de até 10 dez dias Tratase de medida antecedente à inclusão do preso no RDD e esse período será abatido do total do período de inserção do preso no regime disciplinar diferenciado Como mencionado o regime disciplinar diferenciado foi introduzido na Lei de Execução Penal pela Lei 107922003 que ainda determina em seu art 4º que os estabelecimentos penitenciários especialmente os destinados ao regime disciplinar diferenciado disporão dentre outros equipamentos de segurança de bloqueadores de telecomunicação para telefones celulares radiotransmissores e outros meios Ainda o art 3º da Lei 107922003 com o objetivo de combater cerradamente a criminalidade organizada estatui que os estabelecimentos penitenciários disporão de aparelho detector de metais aos quais devem se submeter todos que queiram ter acesso ao referido estabelecimento ainda que exerçam qualquer cargo ou função pública O Regime Disciplinar Diferenciado tem sido alvo de críticas alegandose sua inconstitucionalidade notadamente por suposta violação à dignidade da pessoa humana e por se tratar de pena cruel Essa posição tende a ser adotada em concursos públicos da Defensoria Pública por ser mais favorável ao réu Entretanto não nos parece seja esse o caminho correto O regime é severo rígido eficaz ao combate do crime organizado mas nunca desumano Muito ao contrário a determinação de isolamento em cela individual antes de ofender assegura a integridade física e moral do preso evitando contra ele violências ameaças promiscuidade sexual e outros males que assolam o sistema penitenciário O tratamento legal mais rigoroso está em sintonia com a maior periculosidade social do seu destinatário Quem busca destruir o Estado criando governos paralelos tendentes ao controle da sociedade deve ser enfrentado de modo mais contundente Não se pode tratar de igual maneira um preso comum e um preso ligado a organizações criminosas Além disso o interesse público exige a proteção das pessoas de bem mediante a efetiva segregação de indivíduos destemidos e incrédulos com a força dos poderes constituídos pelo Estado O preso não tem direito à fuga O Regime Disciplinar Diferenciado tem se mostrado seguro sem rebeliões e sem evasões e justamente por esse motivo se apregoa a sua justiça A Constituição Federal assegura a todos o direito à segurança art 5º caput e o legislador andou acertadamente ao instituir um regime capaz de efetivar esse direito inerente a todas as pessoas Embora longo é válido citar julgado do Superior Tribunal de Justiça que de modo exauriente rebateu os argumentos da inconstitucionalidade do regime disciplinar diferenciado Considerandose que os princípios fundamentais consagrados na Carta Magna não são ilimitados princípio da relatividade ou convivência das liberdades públicas vislumbrase que o legislador ao instituir o regime disciplinar diferenciado atendeu ao princípio da proporcionalidade Legítima a atuação estatal tendo em vista que a Lei 107922003 que alterou a redação do art 52 da Lei de Execuções Penais busca dar efetividade à crescente necessidade de segurança nos estabelecimentos penais bem como resguardar a ordem pública que vem sendo ameaçada por criminosos que mesmo encarcerados continuam comandando ou integrando facções criminosas que atuam no interior do sistema prisional liderando rebeliões que não raro culminam com fugas e mortes de reféns agentes penitenciários eou outros detentos e também no meio social Assim não há falar em violação ao princípio da dignidade da pessoa humana art 1º III da CF à proibição da submissão à tortura a tratamento desumano e degradante art 5º III da CF e ao princípio da humanidade das penas art 5º XLVIII da CF na medida em que é certo que a inclusão no RDD agrava o cerceamento à liberdade de locomoção já restrita pelas próprias circunstâncias em que se encontra o custodiado contudo não representa per si a submissão do encarcerado a padecimentos físicos e psíquicos impostos de modo vexatório o que somente restaria caracterizado nas hipóteses em que houvesse por exemplo em celas insalubres escuras ou sem ventilação Ademais o sistema penitenciário em nome da ordem e da disciplina bem como da regular execução das penas há que se valer de medidas disciplinadoras e o regime em questão atende ao primado da proporcionalidade entre a gravidade da falta e a severidade da sanção Outrossim a inclusão no RDD não traz qualquer mácula à coisa julgada ou ao princípio da segurança jurídica como quer fazer crer o impetrante uma vez que transitada em julgado a sentença condenatória surge entre o condenado e o Estado na execução da pena uma nova relação jurídica e consoante consignado o regime instituído pela Lei 107922003 visa propiciar a manutenção da ordem interna dos presídios não representando portanto uma quarta modalidade de regime de cumprimento de pena em acréscimo àqueles previstos no Código Penal art 33 do CP Pelo mesmo fundamento a possibilidade de inclusão do preso provisório no RDD não representa qualquer ofensa ao princípio da presunção de inocência tendo em vista que nos termos do que estabelece o parágrafo único do art 44 da Lei de Execução Penal estão sujeitos à disciplina o condenado à pena privativa de liberdade e o preso provisório79 A pena privativa de liberdade em regime prisional semiaberto deve ser cumprida em colônia agrícola industrial ou estabelecimento similar LEP art 91 O condenado poderá ser alojado em compartimento coletivo com salubridade do ambiente pela concorrência dos fatores de aeração insolação e condicionamento térmico adequado à existência humana Além disso as dependências coletivas devem ser dotadas dos seguintes requisitos básicos a seleção adequada dos presos e b o limite de capacidade máxima que atenda os objetivos de individualização da pena LEP art 92 e parágrafo único 33191 De acordo com o art 35 caput do Código Penal o exame criminológico a exemplo do que ocorre no regime fechado é obrigatório no início do cumprimento da pena no semiaberto Prevalece contudo o entendimento de que esse exame é facultativo nada obstante a posição contrária permita uma mais adequada individualização da pena em face da regra prevista no art 8º parágrafo único da Lei de Execução Penal princípio da especialidade Ao exame de que trata este artigo poderá ser submetido o condenado ao cumprimento da pena privativa de liberdade em regime semiaberto destacamos O condenado fica sujeito a trabalho em comum durante o período diurno É admissível o trabalho externo bem como a frequência a cursos supletivos profissionalizantes de instrução de segundo grau ou superior CP art 35 1º e 2º Assim como no regime fechado o trabalho externo deve ser efetuado sob vigilância porém não depende do prévio cumprimento de no mínimo 16 da pena80 Falta de colônia agrícola ou industrial e cumprimento da pena em estabelecimento adequado Se o condenado ao regime semiaberto em face da ausência de vaga em colônia agrícola ou industrial cumpre a pena em estabelecimento adequado em local destinado exclusivamente aos presos do regime intermediário e com direito a todos os benefícios a este inerentes não há falar em constrangimento ilegal e inserção do reeducando no regime aberto ou em prisão domiciliar Esse raciocínio é igualmente válido para a ausência de vagas em casas de albergado destinadas a condenados ao regime aberto Na dicção do Supremo Tribunal Federal A Segunda Turma julgou improcedente reclamação ajuizada para garantir a observância pela instância de origem da Súmula Vinculante 56 O reclamante cumpre pena em regime semiaberto Em razão de não estar recolhido em colônia penal pleiteou lhe fosse concedida prisão domiciliar ou antecipação do regime aberto o que foi negado O Colegiado ressaltou o direito de o apenado cumprir a reprimenda em estabelecimento adequado ao regime imposto Ponderou que a concessão 33192 de prisão domiciliar ou regime aberto é inviável diante do regramento previsto na Lei de Execução Penal Informou que o reclamante cumpre pena em ala de penitenciária destinada exclusivamente a internos do regime semiaberto e que todos os benefícios inerentes ao regime lhe são assegurados A Turma deliberou no sentido de serem aceitáveis estabelecimentos não qualificados como colônia agrícola ou industrial regime semiaberto ou casa de albergado ou estabelecimento adequado regime aberto Entretanto não é permitido o alojamento conjunto de presos dos regimes semiaberto e aberto com presos do regime fechado81 Regime semiaberto e recurso da defesa Se a sentença fixou o regime semiaberto para início de cumprimento da pena privativa de liberdade mas a defesa apelou e não há vaga na colônia agrícola industrial ou estabelecimento similar o réu deve aguardar em liberdade o julgamento do recurso mesmo se tiver sido decretada a prisão preventiva ou então optado o magistrado pela sua manutenção Para o Superior Tribunal de Justiça O acusado tem direito de aguardar o julgamento do recurso de apelação em liberdade na hipótese em que fixado o regime inicial semiaberto para o cumprimento da pena ainda que a sentença condenatória tenha fundamentado a necessidade de manutenção da prisão preventiva O acusado não pode aguardar o julgamento do recurso em regime mais gravoso do que aquele estabelecido na sentença condenatória82 O regime aberto baseiase na autodisciplina e senso de responsabilidade do condenado CP art 36 caput Com o trânsito em julgado da sentença penal o juízo expede mandado de prisão para encaminhar o condenado ao regime aberto A pena é cumprida na Casa do Albergado cujo prédio necessita situarse em centro urbano separado dos demais estabelecimentos e caracterizarse pela ausência de obstáculos físicos contra a fuga Em cada região haverá pelo 1 2 menos uma Casa do Albergado a qual deverá conter além dos aposentos para acomodar os presos local adequado para cursos e palestras O estabelecimento terá instalações para os serviços de fiscalização e orientação dos condenados LEP arts 93 a 95 O condenado deverá fora do estabelecimento e sem vigilância trabalhar frequentar curso ou exercer outra atividade autorizada permanecendo recolhido durante o período noturno e nos dias de folga CP art 36 1º O ingresso do condenado em regime aberto supõe a aceitação de seu programa e das condições impostas pelo juiz Somente poderá ingressar no regime aberto o condenado que estiver trabalhando ou comprovar a possibilidade de fazêlo imediatamente e apresentar pelos seus antecedentes ou pelo resultado dos exames a que foi submetido fundados indícios de que irá ajustarse com autodisciplina e senso de responsabilidade ao novo regime LEP arts 113 e 11483 Algumas pessoas em virtude de sua condição especial podem ser dispensadas do trabalho maiores de 70 setenta anos de idade portadores de doença grave aqueles que possuam filho menor ou portador de deficiência física ou mental e gestante LEP art 114 parágrafo único O regime aberto depende da obediência de condições divididas em dois blocos gerais ou legais previstas no art 115 da Lei de Execução Penal São elas a permanecer no local em que for designado durante o repouso e nos dias de folga b sair para o trabalho e retornar nos horários fixados c não se ausentar da cidade onde reside sem autorização judicial e d comparecer a juízo para informar e justificar suas atividades quando for determinado especiais ou judiciais são as que podem ser estabelecidas discricionariamente pelo juízo da execução sem prejuízo das condições gerais O juiz poderá modificar as condições estabelecidas para o regime aberto de ofício a requerimento do Ministério Público da autoridade administrativa ou do condenado desde que as circunstâncias assim o recomendem LEP art 33201 33202 33203 116 Regime aberto e prestação de serviços à comunidade A prestação de serviços à comunidade bem como qualquer outra pena restritiva de direitos não pode ser imposta como condição para cumprimento da pena privativa de liberdade no regime aberto Este é o teor da Súmula 493 do Superior Tribunal de Justiça É inadmissível a fixação de pena substitutiva art 44 do CP como condição especial ao regime aberto Como se sabe as penas restritivas de direitos aplicamse alternativamente às privativas de liberdade mas não podem ser cumuladas com elas pois sequer há previsão legal nesse sentido A intenção do legislador ao facultar a estipulação de condições especiais para o cumprimento do regime aberto foi englobar circunstâncias inerentes ao próprio regime que não constavam das condições obrigatórias previstas no art 115 da Lei de Execução Penal e não fixar outra pena o que resultaria em dupla punição pelo mesmo fato bis in idem84 Legislação local Em se tratando o direito penitenciário de matéria de competência concorrente entre a União os Estados e o Distrito Federal CF art 24 I estatui o art 119 da Lei de Execução Penal que a legislação local poderá estabelecer normas complementares para o cumprimento da pena privativa de liberdade em regime aberto Prisão albergue domiciliar O art 117 da Lei 72101984 Lei de Execução Penal é peremptório ao admitir o recolhimento do condenado à pena privativa de liberdade no regime aberto85 em residência particular exclusivamente nas hipóteses ali previstas em rol taxativo86 Art 117 Somente se admitirá o recolhimento do beneficiário de regime aberto em residência particular quando se tratar de I condenado maior de 70 setenta anos II condenado acometido de doença grave III condenada com filho menor ou deficiente físico ou mental IV condenada gestante No inciso I a idade deve ser aferida ao tempo da execução da pena privativa de liberdade independentemente do momento da infração penal ou mesmo da condenação Portanto nada impede o início do cumprimento da pena em casa do albergado e ultrapassados os 70 setenta anos de idade seja concedida a prisão domiciliar Assim como em outras hipóteses exemplo CP arts 65 I 77 2º e 115 o legislador concede tratamento mais brando à pessoa que alcançou a senilidade tendo em vista sua menor periculosidade e sua menor resistência em suportar os efeitos da pena O Estatuto do Idoso em nada alterou essa regra No tocante ao inciso II do art 117 entendese por doença grave a moléstia de difícil cura dependente de longo tratamento ou que coloca em risco a vida do doente como o câncer e a AIDS Entretanto não basta a simples constatação da doença Para a incidência da benesse legal é imprescindível não possa ser o condenado devidamente assistido pelo serviço médico da rede pública no estabelecimento prisional além de se encontrar no estágio terminal da doença87 Em relação ao inciso III é possível aplicálo analogicamente ao homem se possuir filho menor ou portador de deficiência física ou mental Esse benefício é deferido em prol da criança ou da pessoa portadora de deficiência que precisam do amparo da mãe ou do pai Finalmente a prisão domiciliar à gestante inc IV serve ao propósito de a ela proporcionar condições mais dignas saudáveis e adequadas durante a gestação O Superior Tribunal de Justiça alargando a incidência do dispositivo legal já reconheceu o benefício a uma condenada para fins de proteção do seu filho de tenra idade e desamparado A Turma prosseguindo o julgamento por maioria excepcionando por analogia a aplicação do art 117 da Lei n 72101984 concedeu prisão 332031 domiciliar para exercício da maternidade embora a paciente responda a vários processos em curso e já tenha sido superada a fase de amamentação Malgrado não possa ser solucionada a questão social dada a peculiaridade do caso o writ foi concedido mormente devido à impossibilidade de transferência da ré para a comarca mais próxima de onde reside o filho de tenra idade a exigir a proteção materna por falta de parentes para cuidarem da criança o avô faleceu e a avó estaria impossibilitada de ficar com a criança88 A prisão albergue domiciliar prevista no art 117 da Lei 72101984 Lei de Execução Penal representa uma forma especial de cumprimento da pena privativa de liberdade Destarte não se confunde com a prisão domiciliar inserida no Código de Processo Penal pela Lei 124032011 e ampliada pela Lei 132572016 Marco Legal da Primeira Infância De fato a prisão domiciliar constituise em medida cautelar e consiste no recolhimento do indiciado ou acusado em sua residência só podendo dela ausentarse com autorização judicial CPP art 317 Tratase de modalidade de prisão provisória definida como medida substitutiva da prisão preventiva e como determina o art 318 do Código de Processo Penal o juiz somente poderá aplicála quando o agente for I maior de 80 oitenta anos II extremamente debilitado por motivo de doença grave89 III imprescindível aos cuidados especiais de pessoa menor de 6 seis anos de idade ou com deficiência IV gestante V mulher com filho de até 12 doze anos de idade incompletos90 ou VI homem caso seja o único responsável pelos cuidados do filho de até 12 doze anos de idade incompletos91 Habeas corpus De forma inovadora e polêmica o Supremo Tribunal Federal concedeu habeas corpus coletivo para determinar a substituição da prisão preventiva pela prisão domiciliar sem prejuízo da aplicação concomitante das medidas a b alternativas previstas no art 319 do Código de Processo Penal em favor de todas as mulheres presas gestantes puérperas ou mães de crianças e deficientes sob sua guarda nos termos do art 2º da Lei 80691990 Estatuto da Criança e do Adolescente e da Convenção sobre Direitos das Pessoas com Deficiência abrangendo o Decreto Legislativo 1862008 e o Estatuto da Pessoa com Deficiência enquanto perdurar tal condição excetuados os casos de crimes praticados por elas mediante violência ou grave ameaça contra seus descendentes ou ainda em situações excepcionalíssimas as quais deverão ser devidamente fundamentadas pelos juízes que denegarem o benefício A ordem foi estendida às adolescentes sujeitas a medidas socioeducativas em idêntica situação no território nacional Na hipótese de reincidência da presa o juiz deverá analisar as circunstâncias do caso concreto sempre levando em conta os princípios e as regras acima enunciadas bem como o caráter excepcional da prisão Se o magistrado concluir que a prisão domiciliar se mostra inviável ou inadequada em determinadas situações poderá substituíla pelas medidas cautelares contidas no art 319 do Código de Processo Penal Para apurar a situação de guardiã dos filhos da mulher presa deverseá dar credibilidade à palavra da mãe Também se faculta ao juiz a requisição de laudo social para eventual reanálise do benefício A ordem não será aplicável se constatada a suspensão ou destituição do poder familiar por motivos diversos da prisão a exemplo dos maustratos contra a criança ou filho portador de deficiência Para chegar a esta conclusão a Corte Suprema baseouse nos seguintes fundamentos existe grave deficiência estrutural no sistema carcerário que faz com que mulheres grávidas e mães de crianças bem como as próprias crianças sejam submetidas a situações degradantes resultantes da privação de cuidados prénatal e pósparto e da carência de berçários e creches somente o Supremo Tribunal Federal é capaz de superar os c d e bloqueios políticos e institucionais que vêm impedindo o avanço de soluções o que significa cumprir à Corte o papel de retirar os demais Poderes da inércia catalisar os debates e novas políticas públicas coordenar ações e monitorar os resultados impera no Brasil a cultura do encarceramento que se revela pela imposição exagerada de prisões provisórias a mulheres pobres e vulneráveis resultando em situações que ferem a dignidade de gestantes e mães com prejuízos para as respectivas crianças nosso país não tem conseguido garantir sequer o bemestar de gestantes e mães que não estão inseridas no sistema prisional e as crianças em especial sofrem as consequências desse quadro em flagrante violação aos arts 227 e 5º inc XLV da Constituição Federal acarretando em impactos ao seu bemestar físico e psíquico e em danos ao seu desenvolvimento92 Na carona da decisão do Supremo Tribunal Federal a Lei 137692018 acrescentou ao Código de Processo Penal os arts 318A e 318B Art 318A A prisão preventiva imposta à mulher gestante ou que for mãe ou responsável por crianças ou pessoas com deficiência será substituída por prisão domiciliar desde que I não tenha cometido crime com violência ou grave ameaça a pessoa II não tenha cometido o crime contra seu filho ou dependente Art 318B A substituição de que tratam os arts 318 e 318A poderá ser efetuada sem prejuízo da aplicação concomitante das medidas alternativas previstas no art 319 deste Código É importante destacar a aplicabilidade da prisão domiciliar somente em substituição à prisão preventiva ou seja sua incidência é vedada às mulheres privadas da liberdade em decorrência de condenação transitada em julgado Durante a execução penal contudo é cabível a progressão especial de regime prisional disciplinada pelo art 112 3º e 4º da Lei 72101984 Lei de Execução Penal 33204 O art 146B IV da Lei de Execução Penal admite a fiscalização por meio da monitoração eletrônica quando o juiz determinar a prisão domiciliar E como o art 146D II da Lei de Execução Penal autoriza a revogação da monitoração eletrônica quando o acusado violar os deveres a que estiver sujeito durante a sua vigência ou cometer falta grave abriuse espaço a esta forma de vigilância indireta no tocante aos presos provisórios É de se observar por oportuno ser cabível a revogação da prisão domiciliar na hipótese de violação comprovada nos deveres inerentes à monitoração eletrônica LEP art 146C I e II e parágrafo único VI93 A Resolução nº 5 de 10 de novembro de 2017 editada pelo Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária dispõe sobre a política de implantação de monitoração eletrônica no âmbito de medidas protetivas de urgência procedimentos investigatórios processo penal de conhecimento e de execução penal Como estabelece seu art 2º Considerase monitoração eletrônica a vigilância telemática posicional à distância de pessoas submetidas a medida cautelar condenadas por sentença transitada em julgado ou em medidas protetivas Por sua vez o art 20 dessa Resolução estatui que O uso do monitoramento eletrônico no âmbito da execução penal deve privilegiar os casos de progressão antecipada livramento condicional antecipado ou prisão domiciliar deferida em substituição à pena privativa de liberdade na hipótese de ausência de vagas no regime semiaberto ou fechado bem assim quando se estabeleça na modalidade de regime semiaberto porquanto na condição de alocação similar nos termos do art 91 da Lei 721084 Regime aberto e crimes militares A pena aplicada em razão da condenação por crime militar será cumprida em estabelecimento militar adequado Além disso a hierarquia e a disciplina inerentes às instituições militares impõem tratamento diferenciado e por esse motivo as disposições da Lei de Execução Penal serão aplicáveis apenas subsidiariamente aos condenados por crimes militares ou seja exclusivamente nas situações em que a legislação for omissa acerca de determinado assunto94 No dia 29 de junho de 2016 o Plenário do Supremo Tribunal Federal aprovou a Súmula Vinculante 56 A falta de estabelecimento penal adequado não autoriza a manutenção do condenado em regime prisional mais gravoso devendose observar nessa hipótese os parâmetros fixados no RE 641320RS O enunciado vinculante foi criado com a finalidade de evitar o cumprimento da pena privativa de liberdade em regime prisional mais gravoso do que o determinado na sentença ou no acórdão ou do que o autorizado por lei em face da ausência de vagas ou de condições específicas que o possibilitem As reconhecidas deficiências estruturais do sistema penitenciário e a incapacidade do Estado de prover recursos materiais que viabilizem a implementação de determinações impostas pela Lei de Execução Penal que constitui exclusiva obrigação do Poder Público não podem frustrar o exercício pelo condenado de direitos subjetivos que lhe foram conferidos pelo ordenamento positivo sob risco de se caracterizar o excesso de execução vedado pelo art 185 da Lei 72101984 Lei de Execução Penal Com efeito a realidade do sistema prisional brasileiro revela a violação do sistema progressivo pois os regimes semiaberto e em especial o aberto foram praticamente abandonados no âmbito da execução penal e não raras vezes a reprimenda é cumprida em sua integralidade no regime fechado misturandose os detentos que corretamente nele se encontram com aqueles que já deveriam e mereciam estar em regimes menos gravosos Essa situação fática afronta os princípios constitucionais da a b c individualização da pena que também abrange o cumprimento da pena e da legalidade uma vez que a pena é cumprida em regime diverso daquele previsto em lei O precedente jurisprudencial expressamente citado no enunciado da súmula vinculante foi o Recurso Extraordinário 641320 no qual a Corte Suprema fixou os seguintes parâmetros a falta de estabelecimento penal adequado não autoriza a manutenção do condenado em regime prisional mais gravoso os juízes da execução penal podem avaliar os estabelecimentos destinados aos regimes semiaberto e aberto para qualificação como adequados a tais regimes São aceitáveis estabelecimentos que não se qualificassem como colônia agrícola ou industrial regime semiaberto ou casa de albergado ou estabelecimento adequado regime aberto art 33 1º b e c havendo déficit de vagas deve ser determinada 1 a saída antecipada de sentenciado no regime com falta de vagas 2 a liberdade eletronicamente monitorada ao sentenciado que saia antecipadamente ou seja posto em prisão domiciliar por falta de vagas 3 o cumprimento de penas restritivas de direito eou estudo ao sentenciado que obtenha a progressão ao regime aberto95 É de se observar que no regime semiaberto a pena não precisa obrigatoriamente ser cumprida em colônia agrícola ou industrial e no regime aberto também não se afigura indispensável a execução da pena em casa de albergado De fato o art 33 1º b e c do Código Penal admite o cumprimento da pena em estabelecimento similar ou em estabelecimento adequado e essa posição foi reforçada pelo Supremo Tribunal Federal ao deixar claro que os magistrados da execução penal podem avaliar os estabelecimentos penais sob sua jurisdição para concluir se existe ou não o enquadramento na abertura permitida pelo Código Penal Finalmente há de se fazer uma importante observação A inexistência de estabelecimento penal adequado ao regime prisional determinado para o cumprimento da pena não autoriza a concessão imediata do benefício da prisão domiciliar porquanto nos termos da Súmula Vinculante 56 é imprescindível que a adoção de tal medida seja precedida das providências estabelecidas no julgamento do RE 641320RS quais sejam 1 saída antecipada de outro sentenciado no regime com falta de vagas abrindose assim vagas para os reeducandos que acabaram de progredir 2 a liberdade eletronicamente monitorada ao sentenciado que sai antecipadamente ou é posto em prisão domiciliar por falta de vagas e 3 cumprimento de penas restritivas de direitos eou estudo aos sentenciados em regime aberto96 As mulheres cumprem pena em estabelecimento próprio observandose os deveres e direitos inerentes à sua condição pessoal CP art 37 Os estabelecimentos penais destinados a mulheres deverão possuir exclusivamente agentes do sexo feminino na segurança de suas dependências internas LEP art 83 3º com a redação dada pela Lei 121212009 Essa regra coadunase com o art 5º XLVIII da Constituição Federal pela qual a pena será cumprida em estabelecimentos distintos de acordo com a natureza do delito a idade e o sexo do apenado Na mesma direção estabelece o art 82 1º da Lei de Execução Penal que a mulher e o maior 33231 a b c d de 60 sessenta anos separadamente serão recolhidos a estabelecimento próprio e adequado à sua condição pessoal A Lei Suprema também determina em seu art 5º L que às presidiárias serão asseguradas condições para que possam permanecer com seus filhos durante o período de amamentação E diz o art 89 caput da Lei de Execução Penal a penitenciária de mulheres será dotada de seção para gestante e parturiente e de creche para abrigar crianças maiores de 6 seis meses e menores de 7 sete anos com a finalidade de assistir a criança desamparada cuja responsável estiver presa Execução penal mães presas e filhos recémnascidos A Lei 119422009 em compasso com as determinações contidas no art 5º XLVIII e L da Constituição Federal introduziu diversas modificações na Lei 72101984 Lei de Execução Penal com a finalidade de assegurar às mães presas e aos recémnascidos condições mínimas de assistência Destacamse entre tais alterações as seguintes será assegurado acompanhamento médico à mulher principalmente no prénatal e no pósparto extensivo ao recémnascido LEP art 14 3º os estabelecimentos penais destinados a mulheres serão dotados de berçário onde as condenadas possam cuidar de seus filhos inclusive amamentálos no mínimo até 6 seis meses de idade LEP art 83 2º a penitenciária de mulheres será dotada de seção para gestante e parturiente e de creche para abrigar crianças maiores de 6 seis meses e menores de 7 sete anos com a finalidade de assistir criança desamparada cuja responsável estiver presa LEP art 89 caput e a seção e a creche mencionadas devem possuir como requisitos básicos I atendimento por pessoal qualificado de acordo com as diretrizes adotadas pela legislação educacional e em unidades autônomas e II horário de funcionamento que garanta a melhor 33232 assistência à criança e à sua responsável LEP art 89 parágrafo único Proibição ou não de revista íntima A Lei 132712016 foi editada com a finalidade de proibir a revista íntima em mulheres Seu art 1º contém a seguinte redação Art 1º As empresas privadas os órgãos e entidades da administração pública direta e indireta ficam proibidos de adotar qualquer prática de revista íntima de suas funcionárias e de clientes do sexo feminino O art 2º por sua vez impõe multa para quem descumprir a vedação legal sem prejuízo da indenização por danos morais e materiais e sanções de ordem penal A questão que surge diz respeito à proibição ou não da revista íntima em presas e nas demais mulheres que ingressam nos estabelecimentos penais tais como as esposas companheiras namoradas mães filhas ou irmãs dos detentos ou detentas De fato o art 1º da Lei 132712016 estende a vedação da revista íntima aos órgãos e entidades da Administração Pública mas restringe sua proteção às funcionárias e clientes do sexo feminino Esse foi o problema criado pelo legislador As presas e as demais mulheres que comparecem a qualquer título ao sistema prisional não são funcionárias muito menos clientes dos órgãos e entidades da Administração Pública O art 3º da Lei 132712016 foi vetado pela Presidência da República Seu texto era o seguinte Nos casos previstos em lei para revistas em ambientes prisionais e sob investigação policial a revista será unicamente realizada por funcionários servidores femininos Em primeira análise fica a impressão de que a proibição legal não alcança os ambientes prisionais e policiais Mas nas razões do veto a Presidência da República assim se pronunciou A redação do dispositivo possibilitaria interpretação no sentido de ser permitida a revista íntima nos estabelecimentos prisionais Além disso permitiria interpretação de que quaisquer revistas seriam realizadas unicamente por servidores femininos tanto em pessoas do sexo masculino quanto do feminino Em outras palavras o veto foi lançado justamente para evitar qualquer interpretação no sentido do cabimento da revista íntima em mulheres ou seja a finalidade da Lei 132712016 consistiu exatamente em proibir de forma absoluta o questionado procedimento Ousamos discordar da opção legislativa e também da Presidência da República A proibição da revista íntima pode e deve ser a regra no Brasil especialmente quando abusiva e desnecessária mas precisa comportar exceções Com efeito o direito da mulher de se opor à revista íntima há de ser analisado em cada caso de forma individualizada e cotejado com o princípio da proporcionalidade Na colisão de direitos fundamentais é preciso conformar o direito à privacidade da mulher com o direito da coletividade e também da própria mulher à segurança pública expressamente consagrado nos arts 5º caput e 144 caput da Constituição Federal Como se sabe a segurança pública além de figurar como dever do Estado é direito e responsabilidade de todos indistintamente Não se pode utilizar da fórmula legal para permitir a impunidade de quem optou por violar as normas penais e também não é razoável abrir uma brecha para a prática de crimes e para a facilitação de outros delitos a exemplo do que se dá quando mulheres escondem drogas aparelhos de telefonia celular e até mesmo armas lâminas canivetes etc em suas regiões íntimas para levá las ao interior de estabelecimentos penais A Lei 132712016 como qualquer outro diploma normativo busca proteger as mulheres contra atuações inoportunas e excessivas e nesse ponto merece ser louvada Entretanto deve ser interpretada com bom senso e coerência harmonizandose com as regras e princípios que norteiam nosso ordenamento jurídico Nos termos do art 38 do Código Penal O preso conserva todos os direitos não atingidos pela perda da liberdade impondose a todas as 33241 autoridades o respeito à sua integridade física e moral Esse dispositivo encontrase em sintonia com o art 5º XLIX da Constituição Federal é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral Os arts 40 e 41 da Lei de Execução Penal arrolam diversos direitos dos presos tais como alimentação suficiente e vestuário atribuição de trabalho e sua remuneração assistência material jurídica educacional social religiosa e à saúde entrevista direta com o advogado chamamento nominal avistarse com o diretor do presídio contato com o mundo exterior por meio de correspondência escrita da leitura e de outros meios de informação que não comprometam a moral e os bons costumes atestado de pena a cumprir emitido anualmente etc Nos termos do art 83 5º da Lei de Execução Penal com redação atribuída pela Lei 123132010 nos estabelecimentos penais existirá obrigatoriamente instalação destinada à Defensoria Pública instituição que entre outras atribuições velará pela regular execução da pena e da medida de segurança oficiando no processo executivo e nos incidentes da execução para a defesa dos necessitados em todos os graus e instâncias de forma individual e coletiva LEP art 81A A Resolução Conjunta 01 de 15 de abril de 2014 editada pelo CNPCP Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária e pelo CNCDLGBT Conselho Nacional de Combate à Discriminação estabelece os parâmetros de acolhimento da população LGBT lésbicas gays bissexuais travestis e transexuais em privação de liberdade no Brasil A questão da visita íntima O art 41 X da Lei de Execução Penal assegura ao preso o direito de visita do cônjuge da companheira de parentes e amigos em dias determinados Cuidase de medida destinada a preparar o retorno do condenado ao convívio social bem como a manter seus laços de matrimônio parentesco e amizade Todavia a Lei de Execução Penal não previu o direito à visita íntima isto 33242 é o encontro reservado no interior do estabelecimento penal com o cônjuge companheira ou namorada para a realização de atos sexuais Esta prática contudo é habitual nos presídios e tem sido autorizada pela direção dos estabelecimentos com a finalidade de controlar as sevícias sexuais entre os internos bem como a preservar os laços de relacionamento afetivo entre casais separados pelo cumprimento da pena97 No tocante aos presídios federais o Decreto 60492007 art 95 caput e parágrafo único previu expressamente o direito à visita íntima Com a finalidade de regulamentar esse decreto a Portaria 718 de 28 de agosto de 2017 do Ministério da Justiça e Segurança Pública disciplina a visita íntima no interior das Penitenciárias Federais Por sua vez a Resolução 4 de 29 de junho de 2011 editada pelo Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária órgão do Ministério da Justiça recomenda aos departamentos penitenciários estaduais ou órgãos congêneres seja assegurado o direito à visita íntima a pessoa presa recolhida nos estabelecimentos prisionais no tocante às relações heteroafetivas ou homoafetivas Limitação ao uso de algemas Nos termos da Súmula Vinculante 11 do Supremo Tribunal Federal Só é lícito o uso de algemas em caso de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia por parte do preso ou de terceiros justificada a excepcionalidade por escrito sob pena de responsabilidade disciplinar civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado98 Para a Corte Suprema o uso de algemas como regra encontrase em confronto com a ordem jurídicoconstitucional O princípio da presunção de não culpabilidade impõe aos acusados em geral o tratamento devido aos seres humanos aos que vivem em um Estado Democrático de Direito Além disso o art 1º III da Constituição Federal aponta como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil a dignidade da pessoa humana e da leitura do rol das garantias constitucionais previstas no art 5º incs XIX LXI XLIX LXI LXIII LXIV LXV LXVI XLVIII depreendese a preocupação em se resguardar a figura do preso repousando tais preceitos no inafastável tratamento humanitário do cidadão na imprescindibilidade de lhe ser preservada a dignidade E nos palcos forenses a manutenção do acusado algemado implicaria em colocar a defesa antecipadamente em patamar inferior especialmente no Tribunal do Júri composto por pessoas leigas que tiram ilações diversas acerca do contexto indicativo da periculosidade do réu Para fundamentar a Súmula Vinculante o Supremo Tribunal Federal registrou que a proibição do uso de algemas e do uso da força já era prevista nos tempos do Império Decreto de 2351821 e Código de Processo Criminal do Império de 29111832 art 180 e que houve manutenção dessas normas no ordenamento jurídico brasileiro subsequente Lei 2611841 Lei 20331871 regulamentada pelo Decreto 48241871 Código de Processo Penal de 1941 arts 284 e 292 Lei de Execução Penal LEP 72101984 art 159 Código de Processo Penal Militar arts 234 1º e 242 Citouse ademais o disposto no item 3 das regras da Organização das Nações Unidas ONU para o tratamento de prisioneiros no sentido de que o emprego de algemas jamais poderá se dar como medida de punição Destarte concluiuse ser excepcional o uso de algemas o qual somente pode ocorrer nos casos em que realmente se mostre indispensável para impedir ou evitar a fuga do preso ou quando se cuidar comprovadamente de perigoso prisioneiro circunstâncias que devem ser objeto de decisão judicial fundamentada99 Além disso o Supremo Tribunal Federal mencionou que a Lei 116892008 ao promover profundas reformas no Código de Processo Penal tornou estreme de dúvidas a excepcionalidade do uso de algemas Art 474 3º Não se permitirá o uso de algemas no acusado durante o período em que permanecer no plenário do júri salvo se absolutamente necessário à ordem dos trabalhos à segurança das testemunhas ou à garantia da integridade física dos presentes A propósito a Corte Suprema já rejeitou pedido de cancelamento da Súmula Vinculante 11 com a seguinte fundamentação O Plenário rejeitou proposta de cancelamento do Enunciado 11 da Súmula Vinculante Só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia por parte do preso ou de terceiros justificada a excepcionalidade por escrito sob pena de responsabilidade disciplinar civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado No caso a proponente Confederação Brasileira dos Trabalhadores Policiais Civis Cobrapol afirmava que a edição do enunciado em questão teria usurpado a função do Poder Legislativo Ressaltava ademais o quanto disposto no art 199 da Lei de Execução Penal O emprego de algemas será disciplinado por decreto federal apontando então que se ainda não há decreto federal que regulamente a utilização de algemas caberia aos interessados ajuizar mandado de injunção A Corte asseverou que para admitirse a revisão ou o cancelamento de súmula vinculante seria necessário demonstrar a a evidente superação da jurisprudência do STF no trato da matéria b a alteração legislativa quanto ao tema ou ainda c a modificação substantiva de contexto político econômico ou social A proponente porém não teria comprovado a existência dos aludidos pressupostos assim como não teria se desincumbido do ônus de apresentar decisões reiteradas do STF que demonstrassem a desnecessidade de vigência do enunciado em questão o que impossibilitaria o exame da presente proposta de cancelamento Por fim cumpriria destacar que o mero descontentamento ou eventual divergência quanto ao conteúdo de verbete vinculante não autorizariam a rediscussão da matéria100 No dia 26 de setembro de 2016 foi editado o Decreto 8858 com a finalidade de regulamentar o art 199 da Lei 72101984 Lei de Execução cuja redação é a seguinte Art 199 O emprego de algemas será disciplinado por decreto federal A partir de então o emprego de algemas deve observar as seguintes diretrizes I art 1º inc III e o art 5º inc III ambos da Constituição Federal que dispõem sobre a dignidade da pessoa humana e a proibição de tratamento desumano ou degradante II a Resolução 20102016 da Organização das Nações Unidas sobre o tratamento de mulheres presas e medidas não privativas de liberdade para mulheres infratoras Regras de Bangkok e III o Pacto de San José da Costa Rica incorporado ao direito brasileiro pelo Decreto 6781992 que determina o tratamento humanitário dos presos e em especial das mulheres em condição de vulnerabilidade Além disso o Decreto 88582016 acompanhou a sistemática da Súmula Vinculante 11 e no seu art 2º admitiu o uso de algemas apenas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia causado pelo preso ou por terceiros justificada a sua excepcionalidade por escrito Finalmente o art 3º do Decreto 88582016 veda o emprego de algemas em mulheres presas em qualquer unidade do sistema penitenciário nacional durante o trabalho de parto no trajeto da parturiente entre a unidade prisional e a unidade hospitalar e após o parto durante o período em que se encontrar hospitalizada A análise conjunta da Súmula Vinculante 11 e do Decreto 88582016 autoriza as seguintes conclusões O Supremo Tribunal Federal já decidiu pela inaplicabilidade da Súmula Vinculante 11 à situação em que a autoridade policial apresentou um preso algemado à imprensa no dia seguinte à prisão Como corolário da não incidência do enunciado vinculante a eventual responsabilização do Estado ou dos agentes públicos envolvidos no ato deve ser buscada pelas vias adequadas A apresentação do custodiado algemado à imprensa pelas autoridades policiais não afronta o Enunciado 11 da Súmula Vinculante Só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia por parte do preso ou de terceiros justificada a excepcionalidade por escrito sob pena de responsabilidade disciplinar civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado Com base nessa orientação a Primeira Turma julgou improcedente reclamação ajuizada por custodiado que preso preventivamente por ordem judicial fora apresentado algemado à imprensa por policiais civis estaduais A Turma asseverou que a decisão judicial que determinara a segregação do reclamante não determinara o uso de algemas Destacou que embora evidenciado o emprego injustificado do referido artefato seu manuseio decorrera de ato administrativo da autoridade policial situação não abarcada pelo verbete que se refere à prática de ato processual As algemas teriam sido utilizadas um dia após a prisão quando o reclamante já se encontrava na delegacia de polícia tão somente no momento da exibição dos presos à imprensa Assim eventual responsabilização do Estado ou dos agentes envolvidos decorrente dos fatos noticiados na inicial deve ser buscada na via apropriada101 A Corte Suprema todavia possui entendimento diverso no sentido da nulidade do ato processual e da responsabilidade disciplinar civil e penal do agente ou autoridade quando a utilização indevida de algemas ocorre em atividade relacionada à persecução penal Por fim a Turma ressaltou que durante o transporte o paciente foi exibido às câmeras de televisão algemado por pés e mãos a despeito de sua aparente passividade em afronta ao Enunciado 11 da Súmula Vinculante O uso infundado de algemas é causa suficiente para invalidar o ato processual Considerou ainda que o abuso no uso de algemas também enseja a responsabilidade disciplinar civil e penal do agente ou da autoridade102 33243 O parágrafo único do art 292 do Código de Processo Penal com a redação dada pela Lei 134342017 estatui ser vedado o uso de algemas em mulheres grávidas durante os atos médicohospitalares preparatórios para a realização do parto e durante o trabalho de parto bem como em mulheres durante o período de puerpério imediato A bem da verdade essa regra sequer precisaria estar prevista no Código de Processo Penal ou em outra lei qualquer Tratase de imposição humanista em sintonia com o especial e sagrado momento do nascimento de um novo ser A separação dos presos nos estabelecimentos penais A Lei 131672015 efetuou mudanças na Lei de Execução Penal com o propósito de estabelecer critérios para a separação de presos nos estabelecimentos penais Inicialmente os presos provisórios ou seja aqueles indivíduos sujeitos à privação da liberdade antes do trânsito em julgado da condenação em virtude de prisão em flagrante prisão temporária ou prisão preventiva devem ficar separados dos presos definitivamente condenados Porém isso não basta É necessária a distinção entre os presos provisórios e também entre os presos definitivos De fato os presos provisórios ficarão separados de acordo com os seguintes critérios I os acusados pela prática de crimes hediondos ou equiparados tráfico de drogas tortura e terrorismo II os acusados pela prática de delitos cometidos com violência à pessoa ou grave ameaça e III os acusados pela prática de crimes diversos ou de contravenções penais LEP art 84 1º Por sua vez os presos definitivamente condenados serão separados levando em conta os seguintes parâmetros I condenados pela prática de crimes hediondos ou equiparados pouco importa se primários ou reincidentes II reincidentes condenados pela prática de delitos cometidos com violência à pessoa ou grave ameaça III primários condenados pela prática de crimes cometidos com violência à pessoa ou grave ameaça e IV 33244 demais condenados pela prática de outros crimes ou contravenções penais LEP art 84 3º De seu turno o preso que ao tempo do fato era funcionário da Administração da Justiça Criminal a exemplo dos carcereiros agentes penitenciários e diretores de presídios ficará em dependência separada LEP art 84 2º Finalmente o preso que tiver sua integridade física moral ou psicológica ameaçada pela convivência com os demais presos ficará segregado em local próprio ou seja isolado dos demais detentos LEP art 84 4º Obras emergenciais em presídios a reserva do possível e a separação dos Poderes do Estado O sistema prisional brasileiro enfrenta um verdadeiro caos estrutural Isso é notório e está fora de qualquer discussão jurídica Falase inclusive na configuração de um estado de coisas inconstitucional103 expressão utilizada pela Corte Constitucional da Colômbia para se referir ao quadro problemático dotado das seguintes características a violação generalizada e sistêmica de direitos fundamentais b inércia ou incapacidade reiterada e persistente das autoridades públicas em modificar a conjuntura e c transgressões a exigir a atuação não apenas de um órgão e sim de uma pluralidade de autoridades Nesse contexto o Poder Judiciário pode e deve determinar à Administração Pública a adoção de providências eficazes para promover medidas ou efetuar obras emergenciais em estabelecimentos prisionais visando o respeito à dignidade da pessoa humana e à integridade física e moral dos presos na forma determinada pela Constituição Federal de modo a evitar a inaceitável coisificação dos detentos os quais jamais podem ser tratados como meros objetos em decorrência da simples e indestrutível condição de seres humanos Esta postura ativa do Poder Judiciário não afronta o princípio da separação dos Poderes CF art 2º e não pode ser limitada pela cláusula da reserva do possível pela qual a Administração Pública deve cumprir suas obrigações na medida das suas possibilidades Vale a pena acompanhar um lúcido julgado do Supremo Tribunal Federal sobre o tema É lícito ao Poder Judiciário impor à Administração Pública obrigação de fazer consistente na promoção de medidas ou na execução de obras emergenciais em estabelecimentos prisionais para dar efetividade ao postulado da dignidade da pessoa humana e assegurar aos detentos o respeito à sua integridade física e moral nos termos do que preceitua o art 5º XLIX da CF não sendo oponível à decisão o argumento da reserva do possível nem o princípio da separação dos poderes Essa a conclusão do Plenário que proveu recurso extraordinário em que discutida a possibilidade de o Poder Judiciário determinar ao Poder Executivo estadual obrigação de fazer consistente na execução de obras em estabelecimentos prisionais a fim de garantir a observância dos direitos fundamentais dos presos O Colegiado assentou tratarse na espécie de estabelecimento prisional cujas condições estruturais seriam efetivamente atentatórias à integridade física e moral dos detentos Pontuou que a pena deveria ter caráter de ressocialização e que impor ao condenado condições subhumanas atentaria contra esse objetivo Entretanto o panorama nacional indicaria que o sistema carcerário como um todo estaria em quadro de total falência tendo em vista a grande precariedade das instalações bem assim episódios recorrentes de sevícias torturas execuções sumárias revoltas superlotação condições precárias de higiene entre outros problemas crônicos Esse evidente caos institucional comprometeria a efetividade do sistema como instrumento de reabilitação social Além disso a questão afetaria também estabelecimentos destinados à internação de menores O quadro revelaria desrespeito total ao postulado da dignidade da pessoa humana em que haveria um processo de coisificação de presos a indicar retrocesso relativamente à lógica jurídica atual A sujeição de presos a penas a ultrapassar mera privação de liberdade prevista na lei e na sentença seria um ato ilegal do Estado e retiraria da sanção qualquer potencial de ressocialização A temática envolveria a violação de normas constitucionais infraconstitucionais e internacionais Dessa forma caberia ao Judiciário intervir para que o conteúdo do sistema constitucional fosse assegurado a qualquer jurisdicionado de acordo com o postulado da inafastabilidade da jurisdição Os juízes seriam 33245 assegurados do poder geral de cautela mediante o qual lhes seria permitido conceder medidas atípicas sempre que se mostrassem necessárias para assegurar a efetividade do direito buscado No caso os direitos fundamentais em discussão não seriam normas meramente programáticas sequer se trataria de hipótese em que o Judiciário estaria ingressando indevidamente em campo reservado à Administração Não haveria falar em indevida implementação de políticas públicas na seara carcerária à luz da separação dos poderes Ressalvou que não seria dado ao Judiciário intervir de ofício em todas as situações em que direitos fundamentais fossem ameaçados Outrossim não caberia ao magistrado agir sem que fosse provocado transmudandose em administrador público O juiz só poderia intervir nas situações em que se evidenciasse um não fazer comissivo ou omissivo por parte das autoridades estatais que colocasse em risco de maneira grave e iminente os direitos dos jurisdicionados104 Superlotação carcerária e responsabilidade civil do Estado A superlotação carcerária no Brasil é inegável e caracterizada principalmente pela falta de investimentos do Poder Público para proporcionar o atendimento dos mandamentos impostos pela Lei 72101984 Lei de Execução Penal Para o Supremo Tribunal Federal o Estado tem o dever de indenizar os detentos pelos danos materiais e morais suportados e não se aplica para elidir sua responsabilidade civil a cláusula da reserva do possível O julgado nada obstante longo é de leitura obrigatória Considerando que é dever do Estado imposto pelo sistema normativo manter em seus presídios os padrões mínimos de humanidade previstos no ordenamento jurídico é de sua responsabilidade nos termos do art 37 6º da Constituição a obrigação de ressarcir os danos inclusive morais comprovadamente causados aos detentos em decorrência da falta ou insuficiência das condições legais de encarceramento Consoante o acórdão restabelecido estaria caracterizado o dano moral porque após laudo de vigilância sanitária no presídio e decorrido lapso temporal não teriam sido sanados os problemas de superlotação e de falta de condições mínimas de saúde e de higiene do estabelecimento penal Além disso não sendo assegurado o mínimo existencial seria inaplicável a teoria da reserva do possível Registrou de início a inexistência de controvérsia a respeito dos fatos da causa e da configuração do dano moral haja vista o reconhecimento pelo próprio acórdão recorrido da precariedade do sistema penitenciário estadual que lesou direitos fundamentais do recorrente quanto à dignidade intimidade higidez física e integridade psíquica Portanto sendo incontroversos os fatos da causa e a ocorrência do dano afirmou que a questão jurídica desenvolvida no recurso ficou restrita à reparabilidade ou seja à existência ou não da obrigação do Estado de ressarcir os danos morais verificados nas circunstâncias enunciadas Em seguida consignou que a matéria jurídica está no âmbito da responsabilidade civil do Estado de responder pelos danos até mesmo morais causados por ação ou omissão de seus agentes nos termos do art 37 6º da CF preceito normativo autoaplicável que não se sujeita a intermediação legislativa ou a providência administrativa de qualquer espécie Ocorrido o dano e estabelecido o seu nexo causal com a atuação da Administração ou dos seus agentes nasce a responsabilidade civil do Estado Sendo assim e tendo em conta que no caso a configuração do dano é matéria incontroversa não há como acolher os argumentos que invocam para negar o dever estatal de indenizar o princípio da reserva do possível na dimensão reducionista de significar a insuficiência de recursos financeiros Frisou que o Estado é responsável pela guarda e segurança das pessoas submetidas a encarceramento enquanto ali permanecerem detidas e que é seu dever mantêlas em condições carcerárias com mínimos padrões de humanidade estabelecidos em lei bem como se for o caso ressarcir os danos que daí decorrerem Ademais asseverou que as violações a direitos fundamentais causadoras de danos pessoais a detentos em estabelecimentos carcerários não poderiam ser relevadas ao argumento de que a indenização não teria o alcance para eliminar o grave problema prisional globalmente considerado dependente da definição e da implantação de políticas públicas específicas providências de atribuição legislativa e administrativa não de provimentos judiciais Sustentou que admitir essa assertiva significaria justificar a perpetuação da desumana situação constatada em presídios como aquele onde cumprida a pena do recorrente Relembrou que a garantia mínima de segurança pessoal física e psíquica dos detentos constitui dever estatal que tem amplo lastro não apenas no ordenamento nacional CF art 5º XLVII e XLVIII XLIX Lei 72101984 LEP arts 10 11 12 40 85 87 88 Lei 94551997 crime de tortura Lei 128742013 Sistema Nacional de Prevenção e Combate à Tortura como também em fontes normativas internacionais adotadas pelo Brasil Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos das Nações Unidas Convenção Americana de Direitos Humanos Princípios e Boas Práticas para a Proteção de Pessoas Privadas de Liberdade nas Américas contida na Resolução 12008 aprovada pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos Convenção da Organização das Nações Unidas contra Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis Desumanos ou Degradantes Regras Mínimas para o Tratamento de Prisioneiros adotadas no 1º Congresso das Nações Unidas para a Prevenção ao Crime e Tratamento de Delinquentes A criação de subterfúgios teóricos como a separação dos Poderes a reserva do possível e a natureza coletiva dos danos sofridos para afastar a responsabilidade estatal pelas calamitosas condições da carceragem afronta não apenas o sentido do art 37 6º da CF mas também determina o esvaziamento das inúmeras cláusulas constitucionais e convencionais citadas O descumprimento reiterado dessas cláusulas se transforma em mero e inconsequente ato de fatalidade o que não pode ser tolerado105 O trabalho do preso será sempre remunerado sendolhe garantidos os benefícios da Previdência Social CP art 39 O trabalho do preso além de remunerado é obrigatório Sua negativa 33251 injustificada caracteriza falta grave LEP art 51 III cc o art 39 V e impede a progressão de regime prisional e o livramento condicional Revela se como uma das principais formas de ressocialização do condenado retirandolhe do ócio e motivandoo à reinserção social mediante atividade honesta O fato de ser obrigatório todavia não equivale a dizer que o trabalho é forçado Trabalho forçado terminantemente proibido pelo art 5º XLVII c da Constituição Federal é o não remunerado e obtido do preso com o uso de castigos físicos Como destacado pelo Superior Tribunal de Justiça Constitui falta grave na execução penal a recusa injustificada do condenado ao exercício de trabalho interno O art 31 da Lei 72101984 LEP determina a obrigatoriedade do trabalho ao apenado condenado à pena privativa de liberdade na medida de suas aptidões e capacidades sendo sua execução nos termos do art 39 V da referida Lei um dever do apenado O art 50 VI da LEP por sua vez classifica como falta grave a inobservância do dever de execução do trabalho Ressaltese a propósito que a pena de trabalho forçado vedada no art 5º XLVIII c da CF não se confunde com o dever de trabalho imposto ao apenado ante o disposto no art 6º 3 da Convenção Americana de Direitos Humanos Pacto San José da Costa Rica segundo o qual os trabalhos ou serviços normalmente exigidos de pessoa reclusa em cumprimento de sentença ou resolução formal expedida pela autoridade judiciária competente não constituem trabalhos forçados ou obrigatórios vedados pela Convenção106 Política Nacional de Trabalho no sistema prisional O Decreto 94502018 instituiu a Política Nacional de Trabalho no âmbito do sistema prisional voltada à ampliação e qualificação da oferta de vagas de trabalho ao empreendedorismo e à formação profissional das pessoas presas e egressas do sistema prisional De acordo com o art 40 do Código Penal a legislação especial regulará 33271 a matéria prevista nos arts 38 e 39 deste Código bem como especificará os deveres e direitos do preso os critérios para revogação e transferência dos regimes e estabelecerá as infrações disciplinares e correspondentes sanções Essa lei especial é a Lei 72101984 Lei de Execução Penal A remição é o benefício de competência do juízo da execução consistente no abatimento de parte da pena privativa de liberdade pelo trabalho ou pelo estudo Na tradição brasileira da execução penal a remição sempre foi atrelada ao trabalho do preso Com a evolução dos tempos e almejando especialmente a ressocialização do condenado doutrina e jurisprudência passaram a inclinarse pelo seu reconhecimento também nas hipóteses do estudo posição que ganhou força com a edição da Súmula 341 do Superior Tribunal de Justiça A frequência a curso de ensino formal é causa de remição de parte do tempo de execução de pena sob regime fechado ou semiaberto Esta linha de pensamento se consolidou agora no plano normativo com a entrada em vigor da Lei 124332011 responsável pela alteração da Lei 72101984 Lei de Execução Penal conferindo nova disciplina jurídica ao instituto Por razões didáticas analisaremos separadamente a remição pelo trabalho e a remição pelo estudo Remição pelo trabalho Em relação ao trabalho a remição consiste no desconto de 1 um dia de pena a cada 3 três dias de trabalho exclusivamente em favor do preso que cumpre pena no regime fechado ou semiaberto LEP art 126 1º inc II A atividade laborativa do condenado pode ser realizada no estabelecimento penal em que a pena é cumprida ou então em local externo É o que se extrai da Súmula 562 do Superior Tribunal de Justiça É possível a remição de parte do tempo de execução da pena quando o condenado em regime fechado ou semiaberto desempenha atividade laborativa ainda que extramuros Esse entendimento fundamentase em duas razões a a Lei de Execução Penal não faz distinção entre os trabalhos intra ou extramuros e b nos dois casos operase a ressocialização do condenado O instituto não pode ser aplicado ao condenado que cumpre pena no regime aberto Com efeito além de ter o art 126 caput da Lei de Execução Penal limitado seu campo de abrangência aos regimes fechado e semiaberto o regime aberto pressupõe o trabalho do preso e sua recusa autoriza até mesmo a regressão de regime prisional CP art 36 1º e 2º Em verdade o condenado deverá fora do estabelecimento carcerário e sem vigilância trabalhar frequentar curso ou exercer outra atividade autorizada permanecendo preso durante o período noturno e nos dias de folga Destarte atuando como seu pressuposto não pode lhe proporcionar benefícios Na linha da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal O apenado que cumpre pena em regime aberto não tem jus à remição pelo trabalho nos termos do art 126 da Lei de Execução Penal Asseverouse que a racionalidade disso estaria no art 36 1º do CP que aduz ser necessário que o apenado que cumpre pena em regime aberto trabalhe frequente curso ou exerça outra atividade autorizada Evidenciouse destarte que a realização de atividade laboral nesse regime de cumprimento de pena não seria como nos demais estímulo para que o condenado trabalhando tivesse direito à remição da pena na medida em que nesse regime o labor não seria senão pressuposto da nova condição de cumprimento de pena107 Somente pode ser considerada para fins de remição a jornada completa de trabalho ou seja quem laborar menos de 6 seis horas em um dia não terá direito ao abatimento E não é possível ao condenado aproveitar o excedente às 8 oito horas de trabalho na mesma data De fato estabelece o art 33 da Lei de Execução Penal que a jornada normal de trabalho não será inferior a 6 seis nem superior a 8 oito horas com descanso nos domingos e feriados Como já decidido pelo Supremo Tribunal Federal O cálculo da remição da pena será efetuado pelos dias trabalhados pelo condenado e não pelas horas nos termos da Lei de Execução Penal Lei 721084 Com base nesse entendimento a 2ª Turma denegou habeas corpus em que se discutia a possibilidade de se adotar o critério de dezoito horas para um dia remido com o mínimo de seis horas como correspondente a uma jornada de trabalho Enfatizouse que nos termos dos artigos 33 e 126 da LEP a contagem é feita pelos dias trabalhados pelo apenado à razão de 1 um dia de pena a cada 3 três dias de trabalho LEP art 126 1º II108 A Suprema Corte contudo já autorizou a remição na hipótese de jornada de trabalho diária inferior a seis horas quando isso ocorreu em virtude de cumprimento de determinação da administração do estabelecimento prisional A Segunda Turma deu provimento a recurso ordinário em habeas corpus e concedeu a ordem para que seja considerado para fins de remição da pena o total de horas trabalhadas em jornada diária inferior a seis horas O Colegiado anotou que o condenado cumpria jornada de quatro horas diárias de trabalho por determinação da administração do presídio Ponderou que nos termos da Lei de Execução Penal LEP a jornada diária não deve ser inferior a seis nem superior a oito horas Afirmou que para computar os dias de remição a administração penitenciária somou as horas trabalhadas e as dividiu por seis A Turma concluiu que ao fazer a conversão matemática do cálculo da remição a administração penitenciária agiu dentro dos limites previstos na LEP Asseverou que o condenado não poderia ser apenado por um limite de horas imposto pelo próprio estabelecimento penitenciário na execução de sua pena Por fim deliberou que a obrigatoriedade do cômputo de tempo de trabalho deve ser aplicada às hipóteses em que o sentenciado por determinação da administração cumpra jornada inferior ao mínimo de seis horas ou seja em que a jornada de trabalho não derive de ato voluntário nem de indisciplina ou insubmissão do preso109 No cálculo da remição devem ser considerados os dias efetivamente trabalhados ainda que nos domingos e feriados e sem autorização do juízo da execução ou da direção do estabelecimento prisional O que importa é a busca pela ressocialização a qual fica mais próxima com o desempenho da 33272 atividade laborativa Como destacado pelo Superior Tribunal de Justiça Se o preso ainda que sem autorização do juízo ou da direção do estabelecimento prisional efetivamente trabalhar nos domingos e feriados esses dias deverão ser considerados no cálculo da remição da pena A remição da pena pelo trabalho se perfaz à razão de 1 dia de pena a cada 3 dias de trabalho conforme o regramento do art 126 1º II da LEP E nos termos do art 33 do mesmo estatuto considerase dia trabalhado aquele em que cumprida jornada não inferior a 6 nem superior a 8 horas Assim a remição da pena pelo trabalho nos termos do art 33 cc o art 126 1º é realizada à razão de um dia de pena a cada três dias de trabalho cuja jornada diária não seja inferior a 6 nem superior a 8 horas o que impõe para fins de cálculo a consideração dos dias efetivamente trabalhados110 Poderá ser atribuído horário especial de trabalho aos presos designados para os serviços de conservação e manutenção do estabelecimento penal LEP art 33 parágrafo único O trabalho do preso deve ser descrito em relatório detalhado indicando as atividades desempenhadas e seus respectivos horários LEP art 129 caput Remição pelo estudo No tocante ao estudo111 a remição representa o abatimento de 1 um dia de pena a cada 12 doze horas de frequência escolar divididas em no mínimo 3 três dias em atividade de ensino fundamental médio inclusive profissionalizante ou superior ou ainda de requalificação profissional LEP art 126 1º I O limite máximo para o estudo do preso é de 4 quatro horas diárias As atividades superiores a esta quantidade não podem ser reconhecidas para fins de remição mas nada impede o acúmulo de 12 doze horas de estudo em período mais dilatado a exemplo daquele que estuda duas horas diárias ao longo de seis dias Portanto embora inovando com o estudo a Lei 124332011 manteve a tradição de permitir o desconto de um dia de pena para no mínimo três de aprendizado E há uma regra importante a ser destacada estimulante e representativa de autêntico prêmio ao sujeito dedicado que conduziu com seriedade as atividades que lhe foram atribuídas O tempo a remir em função das horas de estudo será acrescido de 13 um terço no caso de conclusão do ensino fundamental médio ou superior durante o cumprimento da pena desde que certificada pelo órgão competente do sistema de educação LEP art 126 5º112 É fácil notar pela leitura da lei que este plus somente terá cabimento para a conclusão verificada durante a execução da pena e não incide na seara das atividades profissionalizantes e de requalificação profissional A propósito o Superior Tribunal de Justiça reconheceu o cabimento desse prêmio na hipótese de aprovação no ENEM diante do aproveitamento do estudo realizado durante a execução da pena 2 Esta Corte possui orientação no sentido de que a norma do art 126 da LEP ao possibilitar a abreviação da pena tem por objetivo a ressocialização do condenado sendo possível o uso da analogia in bonam partem que admita o benefício em comento em razão de atividades que não estejam expressas no texto legal REsp n 744032SP Ministro Felix Fischer Quinta Turma DJe 562006 3 No caso a aprovação da paciente no ENEM Exame Nacional do Ensino Médio configura aproveitamento dos estudos realizados durante a execução da pena conforme o art 126 da LEP e Recomendação nº 442013 do CNJ 4 Essa particular forma de parametrar a interpretação da lei no caso a LEP é a que mais se aproxima da Constituição Federal que faz da cidadania e da dignidade da pessoa humana dois de seus fundamentos incisos II e III do art 1º Mais Constituição que tem por objetivos fundamentais erradicar a marginalização e construir uma sociedade livre justa e solidária incisos I e III do art 3º Tudo na perspectiva da construção do tipo ideal de sociedade que o preâmbulo de nossa Constituição caracteriza como fraterna HC 94163 Relatora Min Carlos Britto Primeira Turma julgado em 02122008 5 Com efeito a interpretação dada ao art 126 da LEP pelo Superior Tribunal de Justiça decorre indiscutivelmente desse resgate constitucional do princípio da fraternidade113 Na linha da evolução tecnológica dos sistemas de educação as atividades de estudo poderão ser desenvolvidas de forma presencial ou por metodologia de ensino a distância no interior do estabelecimento penal ou fora dele Em qualquer hipótese deverão ser certificadas pelas autoridades educacionais competentes dos cursos frequentados LEP art 126 2º Se a instituição de ensino se situar fora dos limites do recinto penal o preso deverá obter autorização do diretor do estabelecimento para comparecer às aulas Nesse caso o reeducando terá que comprovar mensalmente por meio de declaração da respectiva unidade de ensino a frequência e o aproveitamento escolar LEP art 129 1º A Lei 124332011 além de assegurar a remição da pena privativa de liberdade pelo estudo aos presos alocados nos regimes fechado e semiaberto inovou ao permitir o benefício aos condenados que cumprem pena no regime aberto bem como àqueles que se encontram no período de prova do livramento condicional pela frequência a curso de ensino regular ou de educação profissional LEP art 126 6º No regime aberto e no livramento condicional é importante frisar a admissibilidade da remição unicamente pelo estudo Como se sabe em tais situações o trabalho é obrigatório CP arts 36 1º e 83 III Em síntese o condenado deve trabalhar para permanecer no regime aberto ou no livramento condicional e se desejar abreviar sua pena ou período de prova poderá estudar na razão de 12 doze horas de frequência escolar divididas em no mínimo 3 três dias para cada dia da sanção penal ou do período de prova Na esfera da União a Portaria Conjunta 2762012 do Conselho da Justiça Federal CJF e da DiretoriaGeral do Departamento Penitenciário Nacional DEPEN do Ministério da Justiça disciplinou a remição pela leitura para os presos de regime fechado custodiados em penitenciárias federais de segurança máxima Na seara do Poder Judiciário a Resolução CNJ 442013 dispõe sobre atividades educacionais complementares para fins de remição da pena pelo estudo e estabelece critérios para a admissão pela leitura Com fundamento na sua íntima relação com o estudo e também em sua capacidade de colaborar para a ressocialização do apenado a remição pela leitura tem sido admitida pelo Superior Tribunal de Justiça A atividade de leitura pode ser considerada para fins de remição de parte do tempo de execução da pena O art 126 da LEP redação dada pela Lei 124332011 estabelece que o condenado que cumpre a pena em regime fechado ou semiaberto poderá remir por trabalho ou por estudo parte do tempo de execução da pena De fato a norma não prevê expressamente a leitura como forma de remição No entanto antes mesmo da alteração do art 126 da LEP que incluiu o estudo como forma de remir a pena o STJ em diversos julgados já previa a possibilidade Em certa oportunidade salientou que a norma do art 126 da LEP ao possibilitar a abreviação da pena tem por objetivo a ressocialização do condenado sendo possível o uso da analogia in bonam partem que admita o benefício em comento em razão de atividades que não estejam expressas no texto legal REsp 744032SP Quinta Turma DJe 562006 O estudo está estreitamente ligado à leitura e à produção de textos atividades que exigem dos indivíduos a participação efetiva enquanto sujeitos ativos desse processo levandoos à construção do conhecimento A leitura em si tem a função de propiciar a cultura e possui caráter ressocializador até mesmo por contribuir na restauração da autoestima Além disso a leitura diminui consideravelmente a ociosidade dos presos e reduz a reincidência criminal Sendo um dos objetivos da LEP ao instituir a remição incentivar o bom comportamento do sentenciado e sua readaptação ao convívio social impõese a interpretação extensiva do mencionado dispositivo o que revela inclusive a crença do Poder Judiciário na leitura como método factível para o alcance da harmônica reintegração à vida em sociedade Além do mais em 2062012 a Justiça Federal e o Departamento Penitenciário Nacional do Ministério da Justiça Depen já haviam assinado a Portaria Conjunta 276 a qual disciplina o Projeto da Remição pela Leitura no Sistema Penitenciário Federal E em 26112013 o CNJ considerando diversas disposições normativas inclusive os arts 126 a 129 da LEP com a redação dada pela Lei 124332011 a Súmula 341 do STJ e a referida portaria conjunta editou a Recomendação 44 tratando das atividades educacionais complementares para fins de remição da pena pelo estudo e estabelecendo critérios para a admissão pela leitura114 Nesse contexto o Superior Tribunal de Justiça tem admitido a remição pelo estudo baseada na leitura e resenha de livros mesmo quando o estabelecimento penal permite o acesso a atividades laborativas e à educação formal nesses casos a leitura será computada a título de remição de forma concomitante e complementar De fato também nessa hipótese existe a recuperação para a vida em sociedade como meta a ser atingida pelo apenado O fato de o estabelecimento penal assegurar acesso a atividades laborais e a educação formal não impede a remição por leitura e resenha de livros Inicialmente consignese que a jurisprudência do STJ tem admitido que a norma do art 126 da LEP ao possibilitar a abreviação da pena tem por objetivo a ressocialização do condenado sendo possível o uso da analogia in bonam partem que admita o benefício em comento em razão de atividades que não estejam expressas no texto legal como no caso a leitura e resenha de livros nos termos da Recomendação n 442013 do CNJ Ademais o fato de o estabelecimento penal onde se encontra o paciente assegurar acesso a atividades laborais e a educação formal não impede que se obtenha também a remição pela leitura que é atividade complementar mas não subsidiária podendo ocorrer concomitantemente Assim as horas dedicadas à leitura e resenha de livros como forma da remição pelo estudo são perfeitamente compatíveis com a participação em atividades laborativas fornecidas pelo estabelecimento penal nos termos do art 126 3º da LEP uma vez que a leitura pode ser feita a qualquer momento do dia e em qualquer local diferentemente da maior parte das ofertas de trabalho e estudo formal115 O art 83 4º da Lei de Execução Penal impõe ao Estado o dever de instalar nos estabelecimentos penais salas de aulas destinadas a cursos do ensino básico e profissionalizante Finalmente a Lei 131632015 incluiu na Lei de Execução Penal os arts 18A e 21A com a finalidade de instituir nos presídios o ensino médio regular ou supletivo com formação geral ou educação profissional de nível médio bem como de acrescentar no censo penitenciário a apuração do nível de escolaridade dos presos e das presas além de verificar a implementação de cursos profissionais em nível de iniciação ou aperfeiçoamento técnico e o número de presos e presas atendidas a existência de bibliotecas e as condições de seu acervo e outros dados relevantes para o aprimoramento educacional de presos e presas O Superior Tribunal de Justiça tem gradativamente alargado o alcance da remição de modo a autorizar o benefício sempre que a atividade do preso puder ser rotulada como trabalho ou estudo sob o fundamento da ressocialização do condenado Nesse sentido já se autorizou o desconto da pena privativa de liberdade mediante a atividade musical realizada em coral O reeducando tem direito à remição de sua pena pela atividade musical realizada em coral O ponto nodal da discussão consiste em analisar se o canto em coral pode ser considerado como trabalho ou estudo para fins de remição da pena Inicialmente consignase que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça como resultado de uma interpretação analógica in bonam partem da norma prevista no art 126 da LEP firmou o entendimento de que é possível remir a pena com base em atividades que não estejam expressas no texto legal Concluiuse portanto que o rol do art 126 da Lei de Execução Penal não é taxativo pois não descreve todas as atividades que poderão auxiliar no abreviamento da reprimenda Aliás o caput do citado artigo possui uma redação aberta referindose apenas ao estudo e ao trabalho ficando a cargo do inciso I do primeiro parágrafo a regulação somente no que se refere ao estudo atividade de ensino fundamental médio inclusive profissionalizante ou superior ou ainda de requalificação profissional Na mesma linha consignase que a intenção do legislador ao permitir a remição pelo trabalho ou pelo estudo é incentivar o aprimoramento do reeducando afastandoo assim do ócio e da prática de novos delitos e por outro lado proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado art 1º da LEP Ao fomentar o estudo e o trabalho pretendese a inserção do reeducando ao mercado de trabalho a fim de que ele obtenha o seu próprio sustento de forma lícita após o 33273 cumprimento de sua pena Nessa toada observase que o meio musical satisfaz todos esses requisitos uma vez que além do aprimoramento cultural proporcionado ao apenado ele promove sua formação profissional nos âmbitos cultural e artístico A atividade musical realizada pelo reeducando profissionaliza qualifica e capacita o réu afastandoo do crime e reintegrandoo na sociedade No mais apesar de se encaixar perfeitamente à hipótese de estudo vêse também que a música já foi regulamentada como profissão pela Lei n 38571960116 Regras comuns à remição Não há limite para a remição Quanto mais o condenado trabalhar ou estudar maior será o desconto da pena ou do período de prova do livramento condicional no tocante ao estudo Se não bastasse este benefício é passível de aplicação a todas as modalidades de crimes inclusive aos hediondos e equiparados pois inexiste qualquer restrição legal A remição também é cabível para os presos provisórios nas situações decorrentes da imposição de prisão cautelar ou seja antes do trânsito em julgado da condenação LEP art 126 7º Cuidase de corolário da regra contida no art 2º parágrafo único da Lei de Execução Penal Esta Lei aplicarseá igualmente ao preso provisório em harmonia com a execução provisória da pena privativa de liberdade117 De fato seria equivocado permitir o cumprimento da sanção penal antes do trânsito em julgado da condenação para fins de progressão de regime e simultaneamente impedir o trabalho ou estudo do preso como forma de diminuir a duração da reprimenda Aliás o art 31 parágrafo único da Lei de Execução Penal admite o trabalho do preso provisório desde que no interior do estabelecimento Ora se é possível seu trabalho causa não há como ser negada a remição efeito Se o preso estava laborando ou estudando e ficou impossibilitado por acidente de prosseguir nos trabalhos ou nos estudos continuará a beneficiarse com a remição LEP art 126 4º Vejamos um exemplo A cumprindo pena no regime fechado foi autorizado a trabalhar fora do presídio na construção de uma ponte Em determinado dia no desempenho 33274 das suas atividades foi acometido por grave acidente que o deixou tetraplégico impossibilitando seu labor Durante o restante da pena deverá ser computada a remição como se continuasse trabalhando ininterruptamente118 A autoridade administrativa diretor do estabelecimento penal ou responsável pela fiscalização da pena encaminhará mensalmente ao juízo da execução cópia do registro de todos os condenados que estejam trabalhando ou estudando com informação dos dias de trabalho ou das horas de frequência escolar ou de atividades de ensino de cada um deles LEP art 129 caput E também é dever da autoridade administrativa dar ao condenado a relação dos seus dias remidos LEP art 129 2º Cuidase de direito subjetivo do apenado reforçado pela regra prevista no art 41 inc XVI da Lei de Execução Penal Art 41 Constituem direitos do preso XVI atestado de pena a cumprir emitido anualmente sob pena da responsabilidade da autoridade judiciária competente Em face da sua natureza jurídica relacionada ao cumprimento e à extinção da pena a remição será declarada pelo juiz da execução ouvidos o Ministério Público fiscal da execução penal e a defesa LEP art 126 8º em homenagem aos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa Finalmente o tempo remido será computado como pena cumprida para todos os efeitos LEP art 128 a exemplo do percentual exigido de pena privativa de liberdade cumprida para progressão de regime prisional e obtenção de livramento condicional119 Consagrouse o princípio do Direito Penal segundo o qual pena cumprida é pena extinta Cumulatividade da remição pelo trabalho e pelo estudo Como estatui o art 126 3º da Lei de Execução Penal Para fins de cumulação dos casos de remição as horas diárias de trabalho e de estudo serão definidas de forma a se compatibilizarem Admitese portanto a cumulatividade da remição pelo trabalho e pelo 33275 estudo desde que compatíveis entre si como medida apta a abreviar ainda mais o período de cumprimento da pena Esta compatibilidade significa a ausência de prejuízo a qualquer das atividades é dizer o estudo não pode inviabilizar o trabalho e viceversa Nada impede o preso de exemplificativamente trabalhar durante o dia durante 6 seis a 8 horas e estudar no período noturno pelo prazo de 4 quatro horas Ao final de 3 três dias ele terá direito ao desconto de 2 dois dias da pena um pelo trabalho e outro pelo estudo Esta cumulatividade vale ressaltar somente será cabível nos regimes fechado e semiaberto pois no regime aberto e no livramento condicional o trabalho do condenado é obrigatório Falta grave e perda dos dias remidos120 Na sistemática original da Lei de Execução Penal assim dispunha o antigo art 127 O condenado que for punido por falta grave perderá o direito ao tempo remido começando o novo período a partir da data da infração disciplinar Esse dispositivo durante muito tempo foi alvo de intensa discussão doutrinária e jurisprudencial Muitos sustentavam sua inconstitucionalidade pois a perda dos dias já remidos em razão da prática de falta grave violaria o princípio da proporcionalidade além de desconsiderar o direito adquirido e a coisa julgada CF art 5º XXXVI Para espancar esta controvérsia no dia 12 de junho de 2008 o Supremo Tribunal Federal aprovou a Súmula Vinculante 9 a primeira medida dessa natureza em matéria penal com a seguinte redação O disposto no artigo 127 da Lei 72101984 Lei de Execução Penal foi recebido pela ordem constitucional vigente e não se lhe aplica o limite temporal previsto no caput do artigo 58 Em resumo o Excelso Pretório reconheceu a constitucionalidade da perda de todos os dias remidos em decorrência da punição pela prática de falta grave Mas o próprio Supremo Tribunal Federal rapidamente suavizou a extensão da súmula decidindo que a decretação da perda dos dias remidos deveria observar o princípio da proporcionalidade entre a infração do condenado e a decisão a esta correspondente121 Este panorama jurídico foi alterado com a entrada em vigor da Lei 124332011 Com efeito estabelece o atual art 127 da Lei de Execução Penal Em caso de falta grave o juiz poderá revogar até 13 um terço do tempo remido observado o disposto no art 57 recomeçando a contagem a partir da data da infração disciplinar Destarte o limite máximo para a perda dos dias remidos na hipótese de falta grave é de 13 um terço Note que a lei não fala em um terço e sim em até 13 um terço Consequentemente o percentual da perda dos dias remidos pode ser inclusive inferior mas é vedado ao juízo da execução ultrapassar este patamar Como destacado pelo Superior Tribunal de Justiça A prática de falta grave impõe a decretação da perda de até 13 dos dias remidos devendo a expressão poderá contida no art 127 da Lei 72101984 com a redação que lhe foi conferida pela Lei 124322011 ser interpretada como verdadeiro poderdever do magistrado ficando no juízo de discricionariedade do julgador apenas a fração da perda que terá como limite máximo 13 dos dias remidos122 Para encontrar o quantum correto o magistrado deve se basear em decisão fundamentada nos vetores elencados pelo art 57 caput da Lei de Execução Penal a natureza os motivos as circunstâncias e as consequências do fato bem como a pessoa do faltoso e seu tempo de prisão123 Com a entrada em vigor da Lei 124332011 a Súmula Vinculante 9 do Supremo Tribunal Federal perdeu eficácia Não pode mais ser aplicada pois o dispositivo legal que lhe fundamentava deixou de existir Incide na hipótese o fenômeno da superação sumular normativa também conhecido como overruling124 Portanto agora o condenado perde parte dos dias remidos até 13 recomeçando a contagem a partir da data da infração disciplinar E nada impede a partir desta nova contagem isto é de novo período de trabalho ou estudo para fins de remição seja decretada mais uma vez a perda de até 13 um terço dos dias remidos A perda dos dias remidos pode incidir sobre dias de trabalho anteriores à falta grave se ainda não foram declarados pelo juízo da execução no cálculo da remição Nunca poderá recair contudo sobre dias de labor posteriores à infração disciplinar Como destacado pelo Superior Tribunal de Justiça Reconhecida falta grave a perda de até 13 do tempo remido art 127 da LEP pode alcançar dias de trabalho anteriores à infração disciplinar e que ainda não tenham sido declarados pelo juízo da execução no cômputo da remição A remição na execução da pena constitui benefício submetido à cláusula rebus sic stantibus Assim o condenado possui apenas a expectativa do direito de abater os dias trabalhados do restante da pena a cumprir desde que não venha a ser punido com falta grave Nesse sentido quanto aos dias de trabalho a serem considerados na compensação se por um lado é certo que a perda dos dias remidos não pode alcançar os dias trabalhados após o cometimento da falta grave sob pena de criar uma espécie de contacorrente contra o condenado desestimulando o trabalho do preso por outro lado não se deve deixar de computar os dias trabalhados antes do cometimento da falta grave ainda que não tenham sido declarados pelo juízo da execução sob pena de subverter os fins da pena culminando por premiar a indisciplina carcerária125 O condenado não tem direito pleno à remição de todos os dias de trabalho ou estudo mas somente uma expectativa de direito a qual será concretizada se cumpridos integralmente os requisitos legais A remição é um benefício contabilizado à medida que o apenado trabalha ou estuda Essa contabilização deve operar no subjetivismo dele apenado como um estímulo para persistir enquadrado em boa conduta É dizer à medida que visualiza os dias que lhe são contabilizados favoravelmente o condenado vai se convencendo de que não interessa transgredir as regras inerentes à execução da pena sob o risco de perder parte daquilo que já acumulou O reconhecimento total da remição da pena constitui expectativa de direito condicionada ao preenchimento dos requisitos legais Em poucas palavras a concessão da remição no tocante a todos os dias de trabalho ou estudo se sujeita à cláusula rebus sic stantibus Assim sendo ocorrendo a falta grave o condenado perde até 13 um terço do tempo já remido E atenção Para a perda de até 13 um terço dos dias remidos não basta a prática da falta grave É imprescindível a efetiva punição pela falta grave imposta ao final de sindicância instaurada no âmbito do estabelecimento penal como forma de assegurar ao condenado o exercício da ampla defesa Como estabelece a Súmula 533 do Superior Tribunal de Justiça Para o reconhecimento da prática de falta disciplinar no âmbito da execução penal é imprescindível a instauração de procedimento administrativo pelo diretor do estabelecimento prisional assegurado o direito de defesa a ser realizado por advogado constituído ou defensor público nomeado E mais Na sindicância apurase a prática da falta grave Mas é somente o juízo da execução que declara a perda dos dias remidos126 De acordo com a jurisprudência consolidada no Supremo Tribunal Federal é necessária a oitiva da defesa técnica em juízo antes da decretação da perda dos dias remidos mesmo com a conclusão da sindicância em desfavor do reeducando Vale a pena conferir Entendeuse que o procedimento administrativo não seria suficiente para desencadear uma sanção penal e que o fato de o paciente ter sido ouvido na instância administrativa não dispensaria a manifestação da defesa no processo de execução Assim enfatizouse que em que pese ser prescindível a inquirição em juízo do próprio assistido a manifestação de sua defesa no processo de execução após o procedimento administrativo é indispensável o que não ocorrera na espécie tendo em conta o caráter penal e processual da perda dos dias remidos127 Aliás embora a sindicância tenha caráter administrativo seus reflexos penais afastam a incidência da Súmula Vinculante n 5 do Supremo Tribunal Federal A falta de defesa técnica por advogado no processo administrativo disciplinar não ofende a Constituição Na linha da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça Foi instaurada sindicância para apuração do cometimento de falta grave imputada ao paciente em sede de execução penal ao final reconheceuse o cometimento da falta grave posse de aparelho celular dentro do presídio contudo sem a presença do defensor quando da oitiva do acusado A Turma entendeu não aplicável a Súmula vinculante n 5 do STF pois os precedentes que a embasam estão vinculados ao Direito Administrativo Não se está a tratar de um mero procedimento administrativo disciplinar em que um sujeito sobre o qual recai a suspeita de uma falta pode investido de plenos poderes exercer seus direitos e prerrogativas e demonstrar sua inocência Diante das condições a que submetidos os detentos qualquer tentativa de equiparação com os sujeitos que do lado de cá das grades podem per si fazer valer a dignidade da pessoa humana soa descontextualizado Daí a Turma concedeu a ordem para cassando o acórdão atacado anular a sindicância128 É preciso observar que a Lei 124332011 limita a 13 um terço a perda dos dias remidos como corolário da falta grave Subsiste contudo a possibilidade de regressão de regime prisional com fulcro no art 118 I da Lei de Execução Penal Finalmente esta limitação não interfere em outros benefícios prisionais vinculados à contagem do tempo tais como o livramento condicional e a comutação de pena Na dicção do Supremo Tribunal Federal A 2ª Turma denegou habeas corpus em que se pleiteava fosse declarado que a prática de falta grave estaria limitada ao máximo de 13 do lapso temporal no desconto da pena para todos os benefícios da execução da reprimenda que exigissem a contagem de tempo Na situação dos autos o STJ concedera parcialmente a ordem postulada para afastar o reinício da contagem do prazo decorrente do cometimento de falta grave necessário à aferição do requisito objetivo quanto aos benefícios de livramento condicional e comutação de pena Enfatizouse que o art 127 da LEP com a redação conferida pela Lei 124332011 imporia ao juízo da execução ao decretar a perda dos dias remidos que se ativesse ao limite de 13 do tempo remido e levasse em conta na aplicação dessa sanção a natureza os motivos as circunstâncias e as consequências do fato bem como a pessoa do faltoso e seu tempo de prisão LEP Art 127 Em caso de falta grave o juiz poderá revogar até 13 um terço do 33276 tempo remido observado o disposto no art 57 recomeçando a contagem a partir da data da infração disciplinar Na sequência observouse que embora a impetrante postulasse a incidência da referida norma à espécie verificarseia que o juízo da execução não decretara a perda do tempo remido a impedir a concessão da ordem para esse fim Assinalouse que da leitura do dispositivo legal inferirseia que o legislador pretendera restringir somente a revogação dos dias remidos ao patamar de 13 motivo pelo qual não mereceria acolhida pretensão de estender o referido limite aos demais benefícios da execução129 Ausência de trabalho ou de estudo por falta de condições no estabelecimento penal Se não há condições adequadas para o desempenho de atividade laborativa ou de ensino no estabelecimento penal não se pode conceder ao condenado a remição pois a Lei de Execução Penal condiciona o benefício ao efetivo e concreto trabalho ou estudo para abatimento da pena privativa de liberdade Não se admite portanto a remição ficta ou virtual Para o Supremo Tribunal Federal A Primeira Turma em conclusão de julgamento e por maioria denegou a ordem de habeas corpus em que se discutia a possibilidade de remição ficta da pena na hipótese em que o Estado não proporciona atividade laboral ou educacional aos internos do sistema penitenciário a fim de obterem a remição da pena O Colegiado enfatizou que embora o Estado tenha o dever de prover trabalho aos internos que desejem laborar reconhecer a remição ficta da pena nesse caso faria com que todas as pessoas do sistema prisional obtivessem o benefício fato que causaria substancial mudança na política pública do sistema carcerário além de invadir a esfera do Poder Executivo Destacou que o instituto da remição exige necessariamente a prática de atividade laboral ou educacional Tratase de reconhecimento pelo Estado do direito à diminuição da pena em virtude de trabalho efetuado pelo detento Na espécie não foi realizado trabalho estudo ou leitura em razão de o paciente estar submetido ao Regime Disciplinar Diferenciado Portanto não há que se falar em direito à remição130 33281 Como determina o art 42 do Código Penal Computamse na pena privativa de liberdade e na medida de segurança o tempo de prisão provisória no Brasil ou no estrangeiro o de prisão administrativa e o de internação em qualquer dos estabelecimentos referidos no artigo anterior Detração penal é o desconto na pena privativa de liberdade ou na medida de segurança do tempo de prisão provisória ou de internação já cumprido pelo condenado Evitase o bis in idem na execução da pena privativa de liberdade Exemplificativamente se alguém foi preso em flagrante pela prática de estupro e permaneceu segredado por 2 dois anos até o trânsito em julgado da sentença condenatória que lhe impôs pena de 8 oito anos restará a ele cumprir mais 6 seis anos em face da regra prevista no art 42 do Código Penal Na expressão prisão provisória compreendese toda e qualquer prisão cautelar e processual prisão em flagrante prisão temporária e prisão preventiva ou seja não decorrente de pena consistente na privação da liberdade antes do trânsito em julgado da condenação Na medida de segurança o tempo de prisão processual ou de internação provisória CPP art 319 VII deve ser subtraído do prazo mínimo da internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico ou do tratamento ambulatorial que varia de um a três anos como se extrai do art 97 1º do Código Penal Exemplo A depois de ser preso em flagrante foi internado provisoriamente e mantido nessa situação por um ano Durante a instrução criminal restou comprovada sua inimputabilidade motivo pelo qual o magistrado o absolveu e impôs medida de segurança de internação pelo prazo mínimo de três anos Com a aplicação do instituto da detração penal a perícia médica de cessação da periculosidade será realizada depois de dois anos da internação do agente no hospital de custódia e tratamento psiquiátrico Competência para aplicação da detração penal e reflexos no regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade Na sistemática da Lei de Execução Penal especialmente da regra contida 33282 em seu art 66 III c a detração era reconhecida exclusivamente pelo juízo da execução Consequentemente este instituto não produzia qualquer efeito na fixação do regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade Destarte se a título ilustrativo um réu primário havia permanecido preso por 2 dois anos antes da condenação definitiva e ao final fora aplicada pena de 5 cinco anos de reclusão deveria em tese começar a cumprila no regime semiaberto e não em regime aberto por força da inaplicabilidade do instituto previsto no art 42 do Código Penal Além disso os momentos de tais acontecimentos eram completamente distintos Enquanto o regime inicial de cumprimento da pena sempre foi estipulado pelo juiz da ação penal processo de conhecimento a detração penal era matéria de competência do juiz da execução e deveria ser apreciada somente após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória processo de execução Mas este panorama foi profundamente alterado pela Lei 127362012 responsável pela inclusão do 2º do art 387 do Código de Processo Penal com a seguinte redação 2º O tempo de prisão provisória de prisão administrativa ou de internação no Brasil ou no estrangeiro será computado para fins de determinação do regime inicial de pena privativa de liberdade Agora a detração penal é matéria de competência do juiz de 1ª instância ou do Tribunal a ser reconhecida na fase de conhecimento e não somente na esfera da execução Exemplificativamente se o acusado permaneceu preso preventivamente por 1 um ano e ao final do processo foi condenado à pena de 9 nove anos de reclusão o magistrado deverá aplicar a detração na própria sentença fixando o regime inicial semiaberto para início de cumprimento da pena privativa de liberdade correspondente ao restante da pena 8 anos e não o regime fechado relativo ao total da pena imposta O legislador consagrou explicitamente o princípio segundo o qual pena cumprida é pena extinta Detração penal e penas restritivas de direitos É possível a incidência da detração penal nas penas restritivas de direitos de prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas interdição 33283 33284 33285 temporária de direitos e limitação de fim de semana pois são aplicáveis em substituição às penas privativas de liberdade pelo mesmo tempo de sua duração CP art 55 Detração penal e pena de multa Não se admite a detração penal no campo da pena de multa diante da vedação legal da conversão desta última em pena privativa de liberdade Ademais o art 42 do Código Penal excluiu a incidência do instituto para a sanção pecuniária Finalmente a pena privativa de liberdade e a pena pecuniária têm finalidades diferentes e não há um critério legal capaz de expressar em diasmulta o tempo de prisão provisória131 Detração penal e suspensão condicional da execução da pena privativa de liberdade Não tem cabimento a detração penal no período de prova do sursis que em regra varia de 2 dois a 4 quatro anos Assim se a pena privativa de liberdade de 2 dois foi suspensa condicionalmente por outros 2 dois anos a circunstância de ter o condenado permanecido preso provisoriamente por 1 um ano por exemplo em nada interferirá no período de prova que subsistirá pelo tempo de 2 dois anos A propósito esse prazo poderia ser fixado ainda que fosse menor a sanção imposta Mas será aplicável esse instituto na hipótese de ser revogado o sursis pois aí restará ao condenado a obrigação de cumprir integralmente a pena que lhe foi imposta No exemplo acima faltaria somente 1 um ano para a satisfação total da pena privativa de liberdade Detração penal e prescrição Discutese se a detração penal influencia ou não no cálculo do prazo prescricional Para quem admite essa possibilidade amparada na aplicação analógica do art 113 do Código Penal a prescrição deveria ser computada com base no tempo restante da pena ou seja somente com o tempo ainda não cumprido pelo condenado Exemplo A foi condenado a seis anos Provisoriamente 33286 antes do trânsito em julgado contudo ficou preso por três anos Logo a prescrição deveria ser calculada sobre a pena faltante isto é três anos e não sobre a pena total O Supremo Tribunal Federal fundado no princípio da estrita legalidade de observância cogente em matéria penal tem posição diversa O art 113 do Código Penal tem aplicação vinculada às hipóteses de evasão do condenado ou de revogação do livramento condicional não se referindo ao tempo de prisão cautelar para efeito do cálculo da prescrição CP Art 113 No caso de evadirse o condenado ou de revogarse o livramento condicional a prescrição é regulada pelo tempo que resta da pena132 Detração penal e prisão provisória em outro processo A questão que se coloca é a seguinte Quando a prisão provisória operase em um processo no qual o réu é absolvido é possível utilizar esse período para fins de detração penal em outro processo em que foi condenado A doutrina não é pacífica sobre o assunto Ora se exige a conexão ou continência entre a infração penal a prisão provisória e a pena imposta ora esse requisito afigurase como dispensável Em qualquer caso porém é necessário tenha sido praticada a infração penal pela qual o agente foi condenado anteriormente à infração penal em que houve a prisão provisória e posterior absolvição Para o Supremo Tribunal Federal Não é possível creditarse ao réu para fins de detração tempo de encarceramento anterior à prática do crime que deu origem à condenação atual Com base nessa jurisprudência a Turma indeferiu habeas corpus em que se pretendia abater da pena aplicada ao paciente período em que este estivera anteriormente custodiado Asseverouse que se acolhida a tese da defesa considerando esse período como crédito em relação ao Estado estarseia concedendo ao paciente um bill de indenidade133 O Superior Tribunal de Justiça também adota esta posição A detração por sua vez é decorrência do princípio constitucional da não culpabilidade A CF estabelece que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória Ocorre que mesmo antes do trânsito em julgado em algumas situações fazse necessária a constrição provisória do acusado Essa no entanto é uma prisão cautelar E por vezes ao final do julgamento pode ocorrer a absolvição do agente ou a prescrição da pretensão punitiva Dessa forma a detração visa impedir que o Estado abuse do poderdever de punir impondo ao agente uma fração desnecessária da pena quando houver a perda da liberdade ou a internação em momento anterior à sentença condenatória Nessa linha intelectiva a detração é uma operação matemática em que se subtrai da pena privativa de liberdade ou medida de segurança aplicada ao réu ao final do processo o tempo de prisão provisória prisão administrativa ou internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico que o sentenciado já cumpriu anteriormente Frisese que em razão da equidade admitese a detração inclusive em processos que não guardem relação entre si desde que a segregação indevida seja posterior ao crime em que se requer a incidência do instituto Nestes casos embora a prisão processual fosse necessária no momento em que foi realizada ao final do julgamento do processo a conduta do agente não resultou em uma punição efetiva Dessa forma é possível utilizar esse período para descontar a pena referente a crime praticado em data anterior134 Essa conclusão além de sintonizarse com o art 111 da Lei de Execução Penal impede a ocorrência da chamada conta corrente penal isto é a constituição de saldo credor em favor do condenado que lhe daria um cheque em branco para cometer crimes e contravenções penais e abrigarse sob o manto da impunidade 1 2 3 4 5 6 7 8 HC 97656SP rel Min Jane Silva Desembargadora convocada do TJMG 6ª Turma j 03042008 Vale a pena mencionar o art 394A do Código de Processo Penal com a redação conferida pela Lei 132852016 Os processos que apurem a prática de crime hediondo terão prioridade de tramitação em todas as instâncias Embora o dispositivo legal mencione apenas os crimes hediondos é indiscutível que tal regra também se aplica aos delitos equiparados a hediondos tráfico de drogas tortura e terrorismo em face da igualdade de tratamento jurídico imposta pelo art 5º inc XLIII da Constituição Federal HC 111840ES rel Min Dias Toffoli Plenário j 27062012 noticiado no Informativo 672 E também HC 107107SP rel Min Roberto Barroso 1ª Turma j 19082014 No STJ HC 286925RR rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 13052014 noticiado no Informativo 540 HC 133308SP rel Min Cármen Lúcia 2ª Turma j 29032016 noticiado no Informativo 819 e HC 129714SP rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 11102016 noticiado no Informativo 843 HC 123316SE rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 09062015 noticiado no Informativo 789 HC 118533MS rel Min Cármen Lúcia Plenário j 23062016 noticiado no Informativo 831 O Código Penal presume de forma absoluta a incompatibilidade de execução de pena privativa de liberdade superior a 8 oito anos com os regimes semiaberto e aberto independentemente da gravidade do crime e das condições pessoais do condenado Inexiste ilegalidade na escolha do regime inicial fechado quando apontados dados fáticos suficientes a indicar a gravidade concreta do crime o emprego de arma de fogo a restrição de liberdade da vítima e o concurso de agentes com periculosidade e destemor exacerbados ainda que o agente seja primário e o quantum da pena 5 anos e 8 meses de reclusão seja inferior a oito anos art 33 3º do CP STJ HC 282211SP rel Min Rogério Schietti Cruz 6ª Turma j 18032014 Em igual sentido STF HC 124876SP rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 24022015 noticiado no Informativo 775 e STJ HC 294803SP rel Min Newton Trisotto Desembargador convocado do TJSC 5ª Turma 9 10 11 12 13 14 15 16 17 j 18092014 noticiado no Informativo 548 Diversos penalistas sustentam que o reincidente condenado a pena de reclusão igual ou inferior a 4 quatro anos pode iniciar o seu cumprimento no regime aberto desde que a condenação anterior tenha sido exclusivamente à pena de multa Aplicase analogicamente o art 77 1º do Código Penal se a condenação anterior à pena de multa não impede o sursis também não pode vedar o regime inicial aberto HC 85531SP rel Min Celso de Mello 2ª Turma j 14112007 noticiado no Informativo 488 A jurisprudência do STJ caminha na mesma direção A gravidade genérica do delito por si só é insuficiente para justificar a imposição do regime inicial fechado para o cumprimento da pena É indispensável a criteriosa observação dos preceitos inscritos nos arts 33 2º b e 3º do CP HC 131655SP rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 09032010 noticiado no Informativo 426 Já decidiu o Supremo Tribunal Federal entretanto que não existe direito subjetivo ao cumprimento da pena no regime aberto HC 84306PR rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 06032007 O STF compartilha deste entendimento RHC 135298SP rel Min Ricardo Lewandowski red p o ac Min Teori Zavascki 2ª Turma j 18102016 noticiado no Informativo 844 STJ HC 176320AL rel originário Min Napoleão Nunes Maia Filho rel para acórdão Min Jorge Mussi 5ª Turma j 17052011 noticiado no Informativo 473 Existe uma hipótese na qual jamais será possível a progressão quando for aplicado o regime inicial aberto e não for decretada a regressão durante a execução da pena Como veremos adiante o percentual de cumprimento da pena privativa de liberdade é distinto no caso de condenada gestante ou que for mãe ou responsável por crianças ou pessoas com deficiência e também em relação aos condenados por crimes hediondos ou equiparados MIRABETE Julio Fabbrini Execução penal 8 ed São Paulo Atlas 1997 p 262 RHC 89031RS rel orig Min Marco Aurélio rel p o acórdão Min Carlos Britto 1ª Turma j 28112006 noticiado no Informativo 450 Em igual sentido HC 100499RJ rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 26102010 noticiado no Informativo 606 18 19 20 21 22 23 24 STJ HC 369774RS rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 22112016 noticiado no Informativo 595 A defesa do impetrante condenado a pena unificada de 79 anos e 6 meses de reclusão em regime inicial fechado alegou que no cômputo para concessão de benefícios na execução deve ser levado em conta o limite de 30 anos versado no artigo 75 do Código Penal Articulou que considerar no cálculo do benefício da progressão de regime pena unificada maior que o teto estabelecido pelo CP violaria o princípio da individualização da pena e a vedação constitucional à aplicação de sanções perpétuas O Colegiado em consonância com o Enunciado 715 da Súmula do Supremo Tribunal Federal entendeu inaplicável no cômputo para a concessão de regime mais benéfico em relação a penas unificadas o limite imposto pelo art 75 do CP devendo ser considerada a reprimenda total STF HC 112182RJ rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 03042018 noticiado no Informativo 896 MIRABETE Julio Fabbrini Execução penal 8 ed São Paulo Atlas 1997 p 264 O STF já decidiu que a existência de ação penal em curso não pode ser considerada para afastar a progressão de regime de cumprimento da pena HC 99141SP rel Min Luiz Fux 1ª Turma j 2932011 noticiado no Informativo 621 EP 12 ProgRegAgRDF rel Min Roberto Barroso Plenário j 08042015 noticiado no Informativo 780 Art 2º caput da Lei 80691990 Estatuto da Criança e do Adolescente Considerase criança para os efeitos desta Lei a pessoa com até doze anos de idade incompletos Art 2º caput da Lei 131462015 Estatuto da Pessoa com Deficiência Considerase pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física mental intelectual ou sensorial o qual em interação com uma ou mais barreiras pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas Na hipótese de pessoa com deficiência pouco importa a sua idade é dizer não precisa tratarse de criança ou adolescente Considerase organização criminosa a associação de 4 quatro ou mais pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas ainda que informalmente com objetivo de obter direta ou indiretamente vantagem de qualquer natureza mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4 quatro anos ou que sejam de 25 26 27 28 29 30 31 32 caráter transnacional Esta também é posição consolidada no Superior Tribunal de Justiça Quanto à pretendida progressão diretamente para o regime aberto observouse que a jurisprudência deste Superior Tribunal não admite a progressão per saltum HC 168588SP rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 14122010 noticiado no Informativo 460 EP 22 ProgRegAgRDF rel Min Roberto Barroso Plenário j 17122014 noticiado no Informativo 772 A progressão de regime para os condenados por crime hediondo darseá se o sentenciado for reincidente após o cumprimento de 35 da pena ainda que a reincidência não seja específica em crime hediondo ou equiparado Isso porque conforme o entendimento adotado pelo STJ a Lei dos Crimes Hediondos não faz distinção entre a reincidência comum e a específica Desse modo havendo reincidência ao condenado deverá ser aplicada a fração de 35 da pena cumprida para fins de progressão do regime STJ HC 301481SP rel Min Ericson Maranho Desembargador convocado do TJSP 6ª Turma j 02062015 noticiado no Informativo 563 Tais percentuais 25 ou 35 não incidem na hipótese de progressão especial para mulher gestante ou que for mãe ou responsável por crianças ou pessoas com deficiência a teor da regra contida no art 2º 2º da Lei 80721990 desde que presentes os requisitos elencados pelo art 112 3º da Lei 72101984 Lei de Execução Penal Para o estudo detalhado do tema remetemos à leitura do item 33141 HC 91631SP rel Min Cármen Lúcia 1ª Turma j 16102007 noticiado no Informativo 484 No mesmo sentido RHC 91300DF rel Min Ellen Gracie Tribunal Pleno j 05032009 noticiado no Informativo 537 É também o entendimento assentado no Superior Tribunal de Justiça AgRg no HC 96226SP rel Min Nilson Naves 6ª Turma j 29042008 noticiado no Informativo 354 HC 100499RJ rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 26102010 noticiado no Informativo 606 No mesmo sentido HC 96824RS rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 12042011 noticiado no Informativo 623 REsp 1557461SC rel Min Rogerio Schietti Cruz 3ª Seção j 22022018 noticiado no Informativo 621 Igual conclusão pode ser extraída da parte final da Súmula Vinculante 33 34 35 36 37 38 39 40 26 do Supremo Tribunal Federal Para efeito de progressão de regime no cumprimento de pena por crime hediondo ou equiparado o juízo da execução observará a inconstitucionalidade do art 2º da Lei n 8072 de 25 de julho de 1990 sem prejuízo de avaliar se o condenado preenche ou não os requisitos objetivos e subjetivos do benefício podendo determinar para tal fim de modo fundamentado a realização de exame criminológico STF HC 102652RS rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 29062010 noticiado no Informativo 593 e HC 100729RS rel Min Ricardo Lewandowski 1ª Turma j 16032010 noticiado no Informativo 579 No STJ A prática de falta grave interrompe o prazo para a progressão de regime acarretando a modificação da database e o início de nova contagem do lapso necessário para o preenchimento do requisito objetivo REsp 1364192RS rel Min Sebastião Reis Júnior 3ª Seção j 12022014 noticiado no Informativo 546 STJ HC 122860RS rel Min Napoleão Nunes Maia Filho 5ª Turma j 12052009 noticiado no Informativo 394 STJ HC 89851RJ rel Min Jane Silva Desembargadora convocada do TJMG 6ª Turma j 22042008 HC 104174RJ rel Min Ayres Britto 2ª Turma j 29032011 noticiado no Informativo 621 É também a posição do Superior Tribunal de Justiça HC 215765RS rel Min Gilson Dipp 5ª Turma j 08112011 noticiado no Informativo 487 HC 131649RJ rel orig Min Cármen Lúcia rel p ac Min Dias Toffoli 2ª Turma j 06092016 noticiado no Informativo 838 RHC 142463MG rel Min Luiz Fux 1ª Turma j 12092017 noticiado no Informativo 877 A conduta de o paciente durante a execução da pena de reclusão não ter comparecido perante o oficial de Justiça para ser citado não pode ser considerada como falta grave uma vez que referida conduta não está propriamente ligada aos deveres do preso durante a execução penal As faltas graves devem ser expressamente dispostas na Lei de Execução Penal não cabendo interpretação extensiva quer do art 39 quer do art 50 para que sejam aplicadas STJ HC 108616SP rel Min Jane Silva Desembargadora convocada do TJMG 6ª Turma j 06022009 noticiado no Informativo 382 Na visão do STF o condenado em regime semiaberto contemplado pelo 41 42 43 44 45 46 47 48 benefício da permissão de saída para tratamento de dependência química continua sob a custódia do Estado Consequentemente subsiste a condição de preso razão pela qual sua fuga da clínica caracteriza falta grave com todos os efeitos daí decorrentes perda dos dias remidos regressão no regime de pena reinício da contagem do prazo para futuros benefícios e cassação de saídas temporárias HC 97980RS rel orig Min Marco Aurélio red p o acórdão Min Dias Toffoli 1ª Turma j 23022010 noticiado no Informativo 576 São eles obediência ao servidor e respeito a qualquer pessoa com quem deve relacionarse e execução do trabalho das tarefas e das ordens recebidas O STJ já decidiu ser obrigatória a prévia oitiva do condenado somente na regressão definitiva Em outras palavras a prática de falta grave pode ensejar a regressão cautelar ou provisória independentemente da prévia oitiva do apenado HC 184988RJ rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 05022013 É também o entendimento consagrado no STF EP 8 ProgRegAgRDF rel Min Roberto Barroso Plenário j 01072016 e EP 16 Agr terceiroDF rel Min Roberto Barroso Plenário j 01072016 noticiados no Informativo 832 STF RE 398269RS rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 15122009 noticiado no Informativo 572 No STJ Para o reconhecimento da prática de falta disciplinar no âmbito da execução penal é imprescindível a instauração de procedimento administrativo pelo diretor do estabelecimento prisional assegurado o direito de defesa a ser realizado por advogado constituído ou defensor público nomeado REsp 1378557RS rel Min Marco Aurélio Bellizze 3ª Seção j 23102013 EP 8 ProgRegAgRDF rel Min Roberto Barroso Plenário j 01072016 e EP 16 AgrterceiroDF rel Min Roberto Barroso Plenário j 01072016 noticiados no Informativo 832 STF HC 93761RS rel Min Eros Grau 2ª Turma j 10062008 noticiado no Informativo 510 STJ HC 184988RJ rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 05022013 Em execução provisória de pena fixada em ação penal originária a expedição de guia de recolhimento de réu cabe ao tribunal competente para processála e julgála STJ EDcl no REsp 1484415DF rel Min 49 50 51 52 53 54 55 Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 03032016 noticiado no Informativo 581 Esse julgamento encontrase sintetizado no Informativo 814 e sua conclusão foi reforçada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento das medidas cautelares ajuizadas nas ações declaratórias de constitucionalidade 43 e 44 ADC 43 MCDF rel Min Marco Aurélio Plenário j 05102016 e ADC 44 MCDF rel Min Marco Aurélio Plenário j 05102016 noticiadas no Informativo 842 bem como no HC 152752PR impetrado pela defesa do exPresidente da República Luiz Inácio Lula da Silva julgado pelo Plenário em 04 de abril de 2018 A propósito nosso arrazoado está em sintonia com o parecer que elaboramos a pedido da ProcuradoriaGeral de Justiça de São Paulo para juntada aos autos das citadas medidas cautelares representando o Ministério Público brasileiro A decisão de 1ª instância é mais robusta nos crimes de competência do Tribunal do Júri norteado pela soberania dos veredictos CF art 5º XXXVIII c É preciso destacar que a execução provisória da pena reclama o exaurimento completo da instância ordinária ou seja não pode existir espaço para nenhum recurso notadamente embargos de declaração perante o Tribunal de Justiça nos Estados ou junto ao Tribunal Regional Federal na esfera da União STJ HC 366907PR rel Min Rogério Schietti Cruz 6ª Turma j 06122016 noticiado no Informativo 595 e STJ HC 371870SP rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 13122016 noticiado no Informativo 597 ADC 43 MCDF rel Min Marco Aurélio Plenário j 05102016 e ADC 44 MCDF rel min Marco Aurélio Plenário j 05102016 noticiadas no Informativo 842 Rcl 2511 AgRPR rel Min Dias Toffoli 2ª Turma j 16052017 noticiado no Informativo 865 Os dados estatísticos têm revelado felizmente que tais equívocos são raros Como se extrai do voto proferido pelo Min Roberto Barroso no HC 126292SP os dados oficiais da assessoria de gestão estratégica do STF revelam que no período de 01012009 até 19042016 somente 0035 de absolvições foram proferidas pelo STF em grau de recurso A prisão em flagrante deve ser convertida em prisão preventiva se presentes os requisitos contidos no art 312 do CPP e se revelarem 56 57 58 59 60 61 62 63 64 inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares da prisão CPP art 310 inc I e a prisão temporária somente pode ser decretada na fase investigatória Lei 79601989 art 1º inc I EDcl no REsp 1484415DF rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 03032016 noticiado no Informativo 581 O Superior Tribunal de Justiça contudo já decidiu em sentido contrário EDcl no REsp 1484415DF rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 03032016 noticiado no Informativo 581 HC 140449RJ rel orig Min Marco Aurélio red p o ac Min Roberto Barroso 1ª Turma j 06112018 noticiado no Informativo 622 HC 374713RS rel Min Antônio Saldanha Palheiro 6ª Turma noticiado no Informativo 605 HC 88500RS rel Min Joaquim Barbosa 2ª Turma j 20102009 noticiado no Informativo 564 EREsp 1619087SC rel Min Maria Thereza de Assis Moura rel para acórdão Min Jorge Mussi 3ª Seção j 14062017 noticiado no Informativo 609 Na linha da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal O ingresso no regime prisional semiaberto é apenas um pressuposto que pode eventualmente legitimar a concessão de autorizações de saídas em qualquer de suas modalidades permissão de saída ou saída temporária mas não garante necessariamente o direito subjetivo de obtenção dessas benesses Asseverouse cumprir ao juízo das execuções criminais avaliar em cada caso a pertinência e a razoabilidade da pretensão observando os requisitos objetivos e subjetivos do paciente HC 102773RJ rel Min Ellen Gracie 2ª Turma j 22062010 noticiado no Informativo 592 Com apoio no art 122 III da Lei de Execução Penal o Superior Tribunal de Justiça já concedeu a saída temporária para autorizar a visita do preso a conselheiro religioso com o argumento de que esta prática contribui para o retorno do condenado ao convívio social HC 175674RJ rel Min Gilson Dipp 5ª Turma j 10052011 noticiado no Informativo 472 Como preceitua a Súmula 520 do Superior Tribunal de Justiça O benefício de saída temporária no âmbito da execução penal é ato jurisdicional insuscetível de delegação à autoridade administrativa do estabelecimento prisional 65 66 67 68 69 70 71 72 73 74 HC 130502RJ rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 21062016 noticiado no Informativo 831 Em igual sentido HC 128763RJ rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 04082015 noticiado no Informativo 793 REsp 1544036RJ rel Min Rogerio Schietti Cruz 3ª Seção j 14092016 noticiado no Informativo 590 COSTA Álvaro Mayrink da Direito penal volume 3 parte geral 7 ed Rio de Janeiro Forense 2007 p 148 O Superior Tribunal de Justiça já vetou o trabalho externo em região tomada pelo crime organizado a ponto de impedir a fiscalização do cumprimento do benefício mesmo com a presença do mérito carcerário do preso Afirmouse que o trabalho extramuros em tal localidade poderia servir de estímulo à delinquência e até de meio à burla da execução da pena o que desvirtuaria sobremaneira a própria finalidade do instituto do trabalho extramuros qual seja de contribuir para a reinserção social do apenado HC 165081DF rel Min Gilson Dipp 5ª Turma j 31052011 noticiado no Informativo 475 Também foi negado o trabalho externo quando o benefício depende de escolta policial diária situação de nítida inviabilidade prática STJ HC 41940DF rel Min Arnaldo Esteves Lima 5ª Turma j 24052005 HC 310515RS rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 17092015 noticiado no Informativo 569 STJ AgRg no HC 209452RJ rel Min Jorge Mussi 5ª Turma j 07082014 Para o Supremo Tribunal Federal esse raciocínio se ampara no fato de a Constituição Federal classificar a família como a base da sociedade e dotada de especial proteção por parte do Estado HC 101540SP rel Min Ayres Britto 2ª Turma j 19102010 noticiado no Informativo 605 STF HC 106039MT rel Min Ayres Britto 2ª Turma j 27032012 No STJ HC 289602DF rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 24042014 STJ CC 90702PR rel Min Og Fernandes 3ª Seção j 22042009 noticiado no Informativo 391 Com igual conclusão CC 110576AM rel Min Arnaldo Esteves Lima 3ª Seção j 09062010 noticiado no Informativo 438 STF HC 115539RO rel Min Luiz Fux 1ª Turma j 03092013 noticiado no Informativo 718 No STJ HC 85106PR rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 02022010 75 76 77 78 79 80 81 82 83 84 85 Deferido o requerimento pelo magistrado de execução estadual não cabe ao juiz federal exercer juízo de valor sobre a gravidade das razões do solicitante STF HC 112650RJ rel Min Rosa Weber 1ª Turma j 11032014 noticiado no Informativo 738 STJ RMS 19385RJ rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 26042005 A Lei 128502013 atribuiu nova redação ao art 288 do Código Penal responsável pela tipificação do delito atualmente denominado de associação criminosa STJ HC 117199SP rel Min Napoleão Nunes Maia Filho 5ª Turma j 15092009 noticiado no Informativo 407 HC 40300RJ rel Min Arnaldo Esteves de Lima 5ª Turma j 07062005 Em igual sentido AgRg no RHC 46314MS rel Min Moura Ribeiro 5ª Turma j 05082014 STF EP 2 TrabExtAgRDF rel Min Roberto Barroso Plenário j 25062014 noticiado no Informativo 752 Rcl 25123SC rel Min Ricardo Lewandowski 2ª Turma j 18042017 noticiado no Informativo 861 HC 227960MG rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 18102012 noticiado no Informativo 507 As Turmas que integram a Terceira Seção desta Corte consagraram o entendimento de que a regra do art 114 I da LEP a qual exige do condenado para ingressar no regime aberto a comprovação de trabalho ou a possibilidade imediata de fazêlo apresentação de proposta de emprego deve sofrer temperamentos ante a realidade brasileira STJ HC 292764RJ rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 10062014 STJ HC 164056SP rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 10062010 noticiado no Informativo 438 No entanto amparado na dignidade da pessoa humana o STF já reconheceu o benefício da prisão domiciliar a preso provisório Confira Em seguida enfatizouse que a situação do paciente não estaria entre aquelas listadas nas alíneas do art 117 da LEP mas a demonstração cabal de que o Estado não teria condições de prestarlhe a assistência médica de que necessita para não falecer no cárcere justificaria a concessão de prisão domiciliar tendo em conta o princípio da dignidade da pessoa humana HC 98675ES rel Min Eros Grau 2ª Turma j 09062009 86 87 88 89 90 noticiado no Informativo 550 O STJ por sua vez já admitiu a prisão albergue domiciliar para condenados que cumprem pena nos regimes fechado e semiaberto HC 271060SP rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 17102013 e REsp 962078RS rel Min Adilson Vieira Macabu Desembargador convocado do TJRJ 5ª Turma j 17022011 noticiado no Informativo 463 O Supremo Tribunal Federal entretanto já abrandou o rigor do art 117 da LEP interpretandoo como uma relação meramente exemplificativa A propósito Na espécie a impetração insurgiase contra as precárias condições de higiene bem como a superlotação na casa de albergado em que o paciente condenado a cumprimento de pena em regime aberto se encontrava aduzindo que no ponto inexistiria separação entre condenados que cumprem pena em regime semiaberto e aberto O pleito da defesa fora indeferido nas demais instâncias ao argumento de que não se enquadraria no rol do art 117 da Lei de Execução Penal Enfatizouse o fato de o paciente estar em estabelecimento cuja população superaria o viável além de haver a junção de presos que cumprem a pena em regime aberto e aqueles que a cumprem no semiaberto Ademais asseverouse que o STF tem afastado o caráter taxativo da LEP relativamente ao direito em si da custódia domiciliar e que o faz quando não se tem casa do albergado Nesse sentido afirmouse que a situação concreta seria em tudo semelhante à inexistência da casa do albergado HC 95334RS rel orig Min Ricardo Lewandowski rel po acórdão Min Marco Aurélio 1ª Turma j 03032009 noticiado no Informativo 537 STF EP 23 AgRDF rel Min Roberto Barroso Plenário j 27082014 noticiado no Informativo 756 HC 115941PE rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 02042009 noticiado no Informativo 389 Falase nesse caso em prisão domiciliar humanitária STF HC 153961DF rel Min Dias Toffoli 2ª Turma j 27032018 noticiado no Informativo 895 A prisão preventiva poderá ser substituída pela domiciliar quando o agente for mulher com filho de até 12 anos de idade Com base nesse entendimento a Primeira Turma concedeu a ordem de habeas corpus para implementar a prisão domiciliar da paciente A paciente e o marido foram presos em flagrante como incurso no art 33 caput da Lei 113432006 Lei de Drogas O Colegiado asseverou que não foi observado o art 318 inciso V do Código de Processo Penal CPP 91 92 93 94 95 96 97 incluído pela Lei 132572016 que versa sobre políticas públicas para a primeira infância Esse benefício não foi estendido pela Turma ao cônjuge que é corréu no processo STF HC 136408SP rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 05122017 noticiado no Informativo 887 Os arts 318A e 318B do Código de Processo Penal disciplinam a prisão domiciliar aplicada em substituição à prisão preventiva imposta à mulher gestante ou que for mãe ou responsável por crianças ou pessoas com deficiência HC 143641SP rel Min Ricardo Lewandowski 2ª Turma j 20022018 noticiado no Informativo 891 A manutenção de monitoramento por meio de tornozeleira eletrônica sem fundamentação concreta evidencia constrangimento ilegal ao apenado Consoante dispõe o art 146D da Lei de Execução Penal a monitoração eletrônica poderá ser revogada quando se tornar desnecessária ou inadequada De qualquer sorte ainda que o monitoramento eletrônico com a colocação de tornozeleiras seja uma alternativa tecnológica ao cárcere a necessidade de sua manutenção deve ser aferida periodicamente podendo ser dispensada a cautela em casos desnecessários Todavia a simples afirmação de que o monitoramento é medida mais acertada à fiscalização do trabalho externo com prisão domiciliar deferido ao apenado em cumprimento de pena de reclusão no regime semiaberto sem maiores esclarecimentos acerca do caso concreto não constitui fundamento idôneo para justificar o indeferimento do pleito Assim como tem a jurisprudência exigido motivação concreta para a incidência de cautelares penais durante o processo criminal a fixação de medidas de controle em fase de execução da pena igual motivação exigem de modo que a incidência genérica sempre e sem exame da necessidade da medida gravosa de tornozeleiras eletrônicas não pode ser admitida STJ HC 351273CE rel Min Nefi Cordeiro 6ª Turma j 02022017 noticiado no Informativo 597 STF HC 104174RJ rel Min Ayres Britto 2ª Turma j 29032011 e STJ HC 215765RS rel Min Gilson Dipp 5ª Turma j 08112011 RE 641320RS rel Min Gilmar Mendes Plenário j 11052016 noticiado no Informativo 825 STJ REsp 1710674MG rel Min Reynaldo Soares da Fonseca 3ª Seção j 22082018 noticiado no Informativo 632 O habeas corpus não é o meio adequado para tutelar visita íntima por 98 99 100 101 102 103 104 105 106 107 108 não estar envolvido o direito de ir e vir Com base nesse entendimento a Primeira Turma inadmitiu a impetração STF HC 138286SP rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 05122017 noticiado no Informativo 887 A jurisprudência tem recomendado cautela e bom senso na aplicação das sanções indicadas na Súmula Vinculante 11 do Supremo Tribunal Federal sem apego ao excessivo formalismo Nesse sentido STF Rcl 11845MT AgR rel Min Celso de Mello Plenário j 19022014 O STF entendeu ser lícito o uso de algemas em caso envolvendo a presença de muitos advogados e funcionários tendo em conta o fato de haver mais de 10 réus na audiência com a agravante de que pertenceriam a uma facção criminosa muito atuante no Estado de São Paulo HC 103003SP rel Min Ellen Gracie 2ª Turma j 2932011 noticiado no Informativo 621 PSV 13DF Plenário j 24092015 noticiado no Informativo 800 Rcl 7116PE rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 24052016 noticiado no Informativo 827 HC 152720DF rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 10042018 noticiado no Informativo 897 Esta nomenclatura já foi utilizada pelo STF ADPF 347 MCDF rel Min Marco Aurélio Plenário j 09092015 noticiada no Informativo 798 RE 592581RS rel Min Ricardo Lewandowski Plenário j 13082015 noticiado no Informativo 794 RE 580252MS rel orig Min Teori Zavascki red p o ac Min Gilmar Mendes Plenário j 16022017 noticiado no Informativo 584 HC 264989SP rel Min Ericson Maranho 6ª Turma j 04082015 noticiado no Informativo 567 HC 98261RS rel Min Cezar Peluso 2ª Turma j 02032010 noticiado no Informativo 577 E mais STF RHC 117075DF rel Min Teori Zavascki 2ª Turma j 06112013 e STJ HC 277885MG rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 15102013 STF HC 114393RS rel Min Cármen Lúcia 2ª Turma j 03122013 noticiado no Informativo 731 O STJ firmou jurisprudência em sentido contrário permitindo seja o período de atividade laboral do apenado excedente ao limite máximo da jornada de trabalho 8 horas computado para fins de remição na razão de um dia de trabalho a cada seis horas 109 110 111 112 113 114 115 116 117 118 extras realizadas HC 216815RS rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 17102013 e AgRg no HC 196715RS rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 15082013 STF RHC 136509MG rel Min Dias Toffoli 2ª Turma j 04042017 noticiado no Informativo 860 HC 346948RS rel Min Reynaldo Soares da Fonseca 5ª Turma j 21062016 noticiado no Informativo 586 A Resolução nº 04 de 30 de maio de 2016 editada pelo Conselho Nacional de Educação órgão ligado ao Ministério da Educação dispõe sobre as diretrizes operacionais nacionais para a remição de pena pelo estudo de pessoas em privação de liberdade nos estabelecimentos penais do sistema prisional brasileiro A remição pelo estudo sem o bônus de 13 ocorre independentemente da conclusão do ensino ou do seu aproveitamento satisfatório STJ HC 289382RJ rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 08042014 e STJ AgRg no AREsp 426479MS rel Min Marilza Maynard Desembargadora convocada do TJSE 6ª Turma j 19082014 HC 382780PR rel Min Reynaldo Soares da Fonseca 5ª Turma j 04042017 HC 312486SP rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 09062015 noticiado no Informativo 564 HC 353689SP rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 14062016 noticiado no Informativo 837 REsp 1666637RS rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 26092017 noticiado no Informativo 613 É possível a remição do tempo de trabalho realizado antes do início da execução da pena desde que em data posterior à prática do delito STJ HC 420257RS rel Min Nefi Cordeiro 6ª Turma j 19042018 noticiado no Informativo 625 O STJ acertadamente entende que apenas continuará a beneficiarse da remição o preso que fique impossibilitado por acidente de prosseguir no trabalho ou nos estudos De fato se o condenado sequer iniciou o trabalho ou o estudo não pode obter o benefício de forma fictícia ainda que não apresente capacidade laborativa em razão da sua invalidez STJ HC 261514SP rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 19082014 119 120 121 122 123 124 125 126 127 128 129 STJ HC 174947SP rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 23102012 e STJ HC 167537SP rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 20032012 A relação de faltas graves inerentes à pena privativa de liberdade encontrase descrita no art 50 da Lei de Execução Penal em rol taxativo HC 94701RS rel orig Min Menezes Direito rel p acórdão Min Marco Aurélio 1ª Turma j 05082008 noticiado no Informativo 514 AgRg no REsp 1430097PR rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 19032015 noticiado no Informativo 559 Reconhecida falta grave no decorrer da execução penal não pode ser determinada a perda dos dias remidos na fração máxima de 13 sem que haja fundamentação concreta para justificála STJ HC 282265RS rel Min Rogerio Shietti Cruz 5ª Turma j 22042014 noticiado no Informativo 539 Em razão disso a Súmula Vinculante 9 está sujeita a revisão ou cancelamento pelo Supremo Tribunal Federal a teor da regra estabelecida pelo art 103A 2º da Constituição Federal e regulamentada pelo art 5º da Lei 114172006 Revogada ou modificada a lei em que se fundou a edição de enunciado de súmula vinculante o Supremo Tribunal Federal de ofício ou por provocação procederá à sua revisão ou cancelamento conforme o caso REsp 1517936RS rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 01102015 noticiado no Informativo 571 Cabe ao juízo da execução fixar a fração aplicável de perda dos dias remidos na hipótese de cometimento de falta grave observando o limite máximo de 13 um terço do total e a necessidade de fundamentar a decisão em elementos concretos conforme o art 57 da Lei de Execução Penal STJ HC 248232RJ rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 03042014 HC 95423RS rel orig Min Ellen Gracie rel p o acórdão Min Eros Grau 2ª Turma j 03032009 noticiado no Informativo 537 HC 193321SP rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 31052011 noticiado no Informativo 475 HC 110921RS rel Min Ricardo Lewandowski 2ª Turma j 22052012 noticiado no Informativo 667 130 131 132 133 134 HC 124520RO rel Min Marco Aurélio red p ac Min Roberto Barroso 1ª Turma j 29052018 noticiado no Informativo 904 MORAES Alexandre de SMANIO Gianpaolo Poggio Legislação penal especial 10 ed 2 reimpr São Paulo Atlas 2008 p 185 RHC 85026SP rel Min Eros Grau j 26042005 Em igual sentido HC 100001RJ rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 11052010 noticiado no Informativo 586 O STJ compartilha deste entendimento HC 216876SP rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 17122013 HC 93979RS rel Min Cármen Lúcia 1ª Turma j 22042008 noticiado no Informativo 503 É também a posição consolidada no Superior Tribunal de Justiça HC 178129RS rel Min Og Fernandes 6ª Turma j 07062011 noticiado no Informativo 476 REsp 1557408DF rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 16022016 noticiado no Informativo 577 341 342 CONCEITO A atividade de aplicar a pena exclusivamente judicial consiste em fixála na sentença depois de superadas todas as etapas do devido processo legal em quantidade determinada e respeitando os requisitos legais em desfavor do réu a quem foi imputada a autoria ou participação em uma infração penal Cuidase de ato discricionário juridicamente vinculado O juiz está preso aos parâmetros que a lei estabelece Dentro deles poderá fazer as suas opções para chegar a uma aplicação justa da pena atento às exigências da espécie concreta isto é às suas singularidades às suas nuanças objetivas e principalmente à pessoa a quem a sanção se destina É o que se convencionou chamar de teoria das margens ou seja limites mínimo e máximo para a dosimetria da pena Todavia é forçoso reconhecer estar habitualmente presente nesta atividade do julgador um coeficiente criador e mesmo irracional em que inclusive inconscientemente se projetam a personalidade e as concepções da vida e do mundo do juiz1 PRESSUPOSTO A aplicação da pena tem como pressuposto a culpabilidade do agente constituída por imputabilidade potencial consciência da ilicitude e exigibilidade de conduta diversa Ausente a culpabilidade será impossível a imposição de pena qualquer que seja a sua modalidade privativa de liberdade restritiva de direitos ou multa Mas na hipótese de inadequação da 343 pena poderá o réu suportar uma medida de segurança se for maior de 18 anos de idade e dotado de periculosidade Concluise pois que enquanto a culpabilidade é pressuposto de aplicação da pena a periculosidade funciona como pressuposto de aplicação da medida de segurança A pena no direito brasileiro deve ser aplicada mesmo quando o condenado posteriormente ao crime e por qualquer motivo não mais dependa de ressocialização Justificase esse posicionamento pela adoção da teoria mista ou unificadora da pena que possui além da finalidade preventiva especial a prevenção geral como objetivo intimidação da coletividade e principalmente o caráter retributivo obrigatoriedade de punição SISTEMAS OU CRITÉRIOS PARA APLICAÇÃO DA PENA A história recente do Direito Penal brasileiro indica a existência de dois sistemas principais para a aplicação da pena privativa de liberdade um bifásico e outro trifásico Para o critério bifásico idealizado por Roberto Lyra a pena privativa de liberdade deveria ser aplicada em duas fases distintas Na primeira fase o magistrado calcularia a penabase levando em conta as circunstâncias judiciais e as atenuantes e agravantes genéricas Em seguida incidiriam na segunda fase as causas de diminuição e de aumento da pena2 Esse sistema encontrou ressonância nos pensamentos de José Frederico Marques e de Basileu Garcia3 Por sua vez o critério trifásico elaborado por Nélson Hungria sustenta a dosimetria da pena privativa de liberdade em três etapas Na primeira o juiz fixa a penabase com apoio nas circunstâncias judiciais Em seguida aplica as atenuantes e agravantes genéricas e finalmente as causas de diminuição e de aumento da pena O art 68 caput do Código Penal filiouse ao critério trifásico De fato a penabase será fixada atendendose ao critério do art 59 deste Código em seguida serão consideradas as circunstâncias atenuantes e agravantes por 344 último as causas de diminuição e de aumento Entretanto para a pena de multa adotouse o sistema bifásico CP art 49 caput e 1º Fixase inicialmente o número de diasmulta e após calculase o valor de cada diamulta Para Alberto Silva Franco a reforma da Parte Geral do Código Penal pela Lei 72091984 embora acolhendo o critério trifásico foi além criou uma quarta fase ou seja a da substituição da pena privativa de liberdade pela pena restritiva de direitos ou pela pena pecuniária4 Por questões didáticas analisaremos cada um dos fatores que influem na aplicação da pena para em seguida enfrentarmos detalhadamente o critério trifásico e cada um de seus estágios ELEMENTARES E CIRCUNSTÂNCIAS Elementares ou elementos são os fatores que compõem a estrutura da figura típica integrando o tipo fundamental É o caso de alguém no crime de homicídio CP art 121 caput Por outro lado circunstâncias são os dados que se agregam ao tipo fundamental para o fim de aumentar ou diminuir a quantidade da pena tais como o motivo torpe e o relevante valor moral qualificadora e privilégio no homicídio doloso respectivamente Formam o tipo derivado As elementares normalmente encontramse descritas no caput do tipo penal enquanto as circunstâncias estão nos parágrafos a ele vinculados Excepcionalmente entretanto o legislador prevê elementares fora do caput como se verifica no crime de excesso de exação descrito pelo art 316 1º do Código Penal independente do delito de concussão tipificado pelo seu caput A forma mais segura para distinguir se determinado fator previsto em lei constituise em elementar ou circunstância se faz pelo critério da exclusão Se a sua retirada resultar na atipicidade do fato ou na desclassificação para outro delito tratase de elementar Mas se subsistir o mesmo crime alterandose somente a quantidade da pena cuidase de circunstância 345 No campo da aplicação da pena as circunstâncias podem ser legais ou judiciais Circunstâncias legais são as previstas no Código Penal e pela legislação penal especial São suas espécies as qualificadoras as atenuantes e agravantes genéricas e as causas de diminuição e de aumento da pena Circunstâncias judiciais de outro lado são as relacionadas ao crime e ao agente e alcançadas pela atividade judicial dependem da valoração do magistrado em conformidade com as regras previstas no art 59 caput do Código Penal Têm natureza residual ou subsidiária pois somente incidem quando não configuram circunstâncias legais No tocante à compensação entre as circunstâncias legais e as circunstâncias judiciais entendese ser possível essa operação somente quando dentro da mesma fase sob pena de se frustrar o sistema trifásico estabelecido em lei Exemplo na primeira fase o magistrado pode compensar os maus antecedentes circunstância judicial desfavorável ao réu com o comportamento inadequado da vítima circunstância judicial favorável ao réu É vedada a compensação envolvendo fases distintas5 Exemplo o juiz não pode compensar a personalidade desajustada do réu circunstância judicial desfavorável 1ª fase com a menoridade relativa atenuante genérica 2ª fase AGRAVANTES GENÉRICAS E CAUSAS DE AUMENTO DA PENA As agravantes genéricas são assim chamadas por estarem previstas taxativamente na Parte Geral do Código Penal arts 61 e 62 e serem aplicáveis aos delitos em geral6 A exasperação da pena que deve respeitar o limite máximo cominado pelo legislador é definida pelo juiz no caso concreto uma vez que a lei não indica a quantidade de aumento Incidem na segunda fase de aplicação da pena As causas de aumento da pena obrigatórias ou facultativas por sua vez 346 347 situamse na Parte Geral exemplos arts 70 71 73 e 74 na Parte Especial do Código Penal exemplos arts 155 1º 157 2º e 2ºA 158 1º 317 1º etc e também na legislação especial exemplos Lei 96131998 Lavagem de Dinheiro art 1º 4º e Lei 113432006 Drogas art 40 etc São previstas em quantidade fixa exemplo aumentase a pena de um terço ou variável exemplo aumentase a pena de 16 a 23 podendo elevar a pena concreta acima do limite máximo legalmente estipulado pelo legislador Aplicamse na terceira fase da dosimetria da pena e são também chamadas de qualificadoras em sentido amplo CAUSAS DE AUMENTO DA PENA E QUALIFICADORAS As causas de aumento da pena utilizáveis na terceira fase da aplicação da pena funcionam exclusivamente como percentuais para a elevação da reprimenda em quantidade fixa ou variável Encontram previsão tanto na Parte Geral como na Parte Especial do Código Penal e também na legislação especial Já as qualificadoras têm penas próprias dissociadas do tipo fundamental pois são alterados os próprios limites mínimo e máximo abstratamente cominados Ademais no caso de crime qualificado o magistrado já utiliza na primeira fase da dosimetria da pena a sanção a ele correspondente Finalmente estão previstas na Parte Especial do Código Penal e na legislação especial mas não em hipótese alguma na Parte Geral ATENUANTES GENÉRICAS E CAUSAS DE DIMINUIÇÃO DA PENA As atenuantes genéricas recebem essa denominação por estarem localizadas exemplificativamente na Parte Geral do Código Penal arts 65 e 66 e serem aplicáveis aos delitos em geral7 O abrandamento da pena que deve observar o limite mínimo cominado pelo legislador8 é definido pelo juiz no caso concreto uma vez que a lei não indica a quantidade de diminuição Têm lugar na segunda fase de aplicação da pena 348 As causas de diminuição da pena obrigatórias ou facultativas estão previstas na Parte Geral exemplos arts 16 21 caput in fine 24 2º 26 parágrafo único etc e na Parte Especial do Código Penal exemplos arts 121 1º 155 2º etc bem como na legislação especial exemplos Lei 74921986 Crimes contra o Sistema Financeiro Nacional art 25 2º Lei 113432006 Drogas art 33 4º etc em quantidade fixa exemplo diminuise a pena de 13 ou variável exemplo diminuise a pena de 13 a 23 Podem reduzir a pena abaixo do mínimo legal e incidem na terceira fase de aplicação da pena O CRITÉRIO TRIFÁSICO O art 68 do Código Penal adotou o critério ou sistema trifásico Impõese a dosimetria da pena privativa de liberdade em três fases distintas e sucessivas Cada etapa de fixação da pena deve ser suficientemente fundamentada pelo julgador Permitese assim a regular individualização da pena CF art 5º XLVI além de conferir ao réu o exercício da ampla defesa pois lhe concede o direito de acompanhar e impugnar se reputar adequado cada estágio de aplicação da pena Na visão do Supremo Tribunal Federal A necessidade de fundamentação dos pronunciamentos judiciais inciso IX do art 93 da Constituição Federal tem na fixação da pena um dos seus momentos culminantes Garantia constitucional que submete o magistrado a coordenadas objetivas de imparcialidade e propicia às partes conhecer os motivos que levaram o julgador a decidir neste ou a b c d naquele sentido O dever de motivação no trajeto da dosimetria da pena não passou despercebido à reforma penal de 1984 Tanto que a ele o legislador fez expressa referência na Exposição de Motivos da Nova Parte Geral do Código Penal ao cuidar do sistema trifásico de aplicação da pena privativa de liberdade9 A ausência de fundamentação leva à nulidade da sentença CF art 93 IX10 ou pelo menos à redução da pena ao mínimo legal pela instância superior Com efeito prevalece o entendimento de que a aplicação da pena no mínimo legal prescinde de motivação em face da inexistência de prejuízo ao réu11 A análise do Código Penal autoriza a extração de algumas regras inerentes ao critério trifásico na penabase o juiz deve navegar dentro dos limites legais cominados à infração penal isto é não pode ultrapassar o patamar mínimo nem o patamar máximo correspondente ao crime ou à contravenção penal pelo qual o réu foi condenado se estiverem presentes agravantes ou atenuantes genéricas a pena não pode ser elevada além do máximo abstratamente cominado nem reduzida aquém do mínimo legal as causas de aumento e de diminuição são aplicáveis em relação à reprimenda resultante da segunda fase e não sobre a penabase E se existirem causas de aumento ou de diminuição a pena pode ser definitivamente fixada acima ou abaixo dos limites máximo e mínimo abstratamente definidos pelo legislador12 na ausência de agravantes eou atenuantes genéricas e também de causas de aumento eou de diminuição da pena a penabase resultará como definitiva Concluída a operação relativa à dosimetria da pena a etapa seguinte consiste em determinar o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade fechado semiaberto ou aberto Após o magistrado deve analisar na própria sentença condenatória 349 eventual possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos ou multa E se não for cabível a substituição mas a pena for igual ou inferior a 2 dois anos exigese manifestação fundamentada acerca da pertinência ou não da suspensão condicional da pena sursis se presentes os requisitos legais Depois de concretizada a sanção penal o juiz fixará valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido CPP art 387 inc IV13 Finalmente se não foi possível a substituição ou a suspensão condicional da pena privativa de liberdade o magistrado na sentença decidirá fundamentadamente sobre a manutenção ou se for o caso a imposição de prisão preventiva ou de outra medida cautelar sem prejuízo do conhecimento da apelação que vier a ser interposta CPP art 387 1º A PRIMEIRA FASE DA DOSIMETRIA DA PENA FIXAÇÃO DA PENABASE Para o cálculo da penabase o juiz se vale das circunstâncias judiciais indicadas pelo art 59 caput do Código Penal14 Posteriormente sobre essa penabase incidirão as atenuantes e agravantes genéricas 2ª fase bem como as causas de diminuição ou de aumento da pena 3ª fase Nessa etapa ainda que todas as circunstâncias sejam extremamente favoráveis ao réu a penabase não pode ser inferior ao mínimo abstratamente cominado ao crime E de igual modo mesmo sendo as circunstâncias judiciais inteiramente contrárias ao acusado a penabase deve respeitar o máximo legalmente previsto Em suma o juiz está adstrito aos parâmetros legais não podendo ultrapassálos15 Essas circunstâncias são também conhecidas como inominadas porque a lei não lhes fornece nomenclatura específica ao contrário do que fez com as circunstâncias legais Têm caráter residual ou subsidiário pois apenas podem ser utilizadas quando não configurarem elementos do tipo penal qualificadoras ou privilégios agravantes ou atenuantes genéricas ou ainda causas de aumento ou de diminuição da pena todas elas preferenciais pelo fato de terem sido expressamente definidas em lei Em razão disso o julgador ao determinar a quantidade de pena aplicável deve ter a prudência de evitar o bis in idem como corolário da utilização ainda que impensada por duas ou mais vezes de uma mesma circunstância para elevar a reprimenda16 Exemplo em crime de lesões corporais cometido contra uma senhora de 90 noventa anos de idade o magistrado fundamenta a exasperação da penabase em decorrência da covardia e da superioridade de forças do agente Depois impõe na segunda fase a agravante genérica contida no art 61 II h do Código Penal crime contra pessoa maior de 60 anos É patente a dupla punição pelo mesmo fato pois tais circunstâncias são ínsitas ao crime praticado contra a pessoa idosa Não podem funcionar simultaneamente como circunstância judicial e agravante genérica Quando o preceito secundário do tipo penal cominar penas alternativas exemplo detenção ou multa o magistrado deve previamente à dosimetria da pena optar por qual delas irá aplicar E se o crime imputado for qualificado iniciase a fixação da penabase a partir da pena correspondente à qualificadora Na hipótese de estarem presentes duas ou mais qualificadoras exemplo homicídio qualificado pelo motivo torpe pelo meio cruel e pelo recurso que dificultou a defesa do ofendido CP art 121 2º I III e IV o magistrado deve utilizar uma delas para qualificar o crime e as demais como agravantes genéricas na segunda fase desde que encontrem correspondência nos arts 61 e 62 do Código Penal Em outras palavras a circunstância que funciona como qualificadora do crime deve ser também prevista como agravante genérica E se não houver essa correspondência as demais qualificadoras passam a funcionar como circunstâncias judiciais desfavoráveis incidindo na fixação da penabase 1ª base17 Mas também há posicionamentos sustentando que em qualquer hipótese as demais qualificadoras atuam como circunstâncias judiciais desfavoráveis influenciando na dosimetria da penabase 1ª fase E finalmente há entendimento minoritário no sentido de que na pluralidade de qualificadoras somente uma pode ser empregada pelo julgador desprezandose as demais pois a função a elas correlata aumentar a pena em abstrato já foi desempenhada Essa posição encontra forte resistência uma vez que a sua aplicação prática viola o princípio da isonomia constitucionalmente consagrado De fato pessoas em situação diversa receberiam igual tratamento pelo magistrado responsável pela fixação da pena privativa de liberdade O art 59 caput do Código Penal contém 8 oito circunstâncias judiciais as quais devem ser enfrentadas pelo magistrado fundamentadamente sob pena de nulidade da sentença Não é suficiente a indicação genérica dessas circunstâncias Exigese a análise específica de cada uma delas reportandose o julgador aos elementos dos autos da ação penal relativos a elas De fato se a penabase for majorada sem fundamentação estará configurado o excesso de pena reclamando sua diminuição pela instância superior Convencionouse chamarse essa tarefa judicial de redimensionamento da pena18 Somente quando todas as circunstâncias judiciais forem favoráveis ao réu a pena deve ser fixada no mínimo legal Em verdade se uma delas lhe for desfavorável o juiz deve elevála acima do piso19 E nesse contexto se diversas circunstâncias inominadas apresentaremse como prejudiciais ao acusado nada impede a imposição da pena máxima ou então próxima do máximo legal Todavia instalouse na prática forense o raciocínio equivocado pelo qual a penabase equivale à pena mínima o que não se compactua com o espírito da legislação penal Em consonância com a cultura da pena mínima reinante no Brasil a jurisprudência se firmou no sentido de que quando imposta a reprimenda em seu patamar mínimo prescindese de fundamentação judicial É a posição consolidada inclusive no Supremo Tribunal Federal A jurisprudência do Supremo é assente no sentido de não reconhecer a nulidade do tópico da decisão que como na espécie fixa a pena no mínimo legal haja vista não haver como se comprovar qualquer prejuízo ao réu20 Discordamos dessa ideia pois além do direito do réu acerca da fundamentação existe também o direito da sociedade em saber as razões que levaram o Poder Judiciário a aplicar a pena privativa de liberdade em seu patamar mínimo O Direito Penal constituise em ramo do Direito Público e portanto insuscetível de ser moldado apenas pelo interesse de uma das partes réu da relação processual Para nós a aplicação da pena deve ser sempre suficientemente motivada nos moldes do art 93 IX da Constituição Federal independentemente da sua quantidade em concreto É necessário na fixação da penabase o respeito ao princípio da proporcionalidade evidenciado pela relação lógica entre o número de circunstâncias judiciais prejudiciais ao réu e a elevação da pena mínima legalmente prevista Na linha de raciocínio do Supremo Tribunal Federal Consignou que as circunstâncias judiciais CP art 59 são alvo de críticas por parte da doutrina e da própria jurisprudência quanto à indeterminação do seu conteúdo e quanto à falta de parâmetros objetivos para o cálculo da penabase Aduziu a necessidade de observância da proporcionalidade entre a penabase aplicada e as circunstâncias judiciais valoradas a partir das peculiaridades do caso concreto pelo julgador No ponto asseverou que a proporcionalidade seria estabelecida entre a quantidade de circunstâncias judiciais desfavoráveis ao agente e a majoração da pena mínima definida no tipo penal21 Vejamos cada uma das circunstâncias judiciais elencadas pelo art 59 caput do Código Penal Algumas dizem respeito ao agente culpabilidade antecedentes conduta social personalidade e motivos do crime e outras se relacionam à infração penal circunstâncias consequências e comportamento do ofendido A partir da Reforma da Parte Geral do Código Penal pela Lei 72091984 essa circunstância judicial substituiu as expressões intensidade do dolo e grau da culpa previstas originariamente no art 42 do Código Penal como relevantes para a aplicação da penabase O legislador agiu corretamente pois com a adoção do sistema finalista o dolo e a culpa passaram a ser considerados no interior da conduta integrando a estrutura do fato típico Destarte tais elementos não mais se relacionam com a aplicação da pena22 A culpabilidade deve ser compreendida como o juízo de reprovabilidade como o juízo de censura que recai sobre o responsável por um crime ou contravenção penal no intuito de desempenhar o papel de pressuposto de aplicação da pena E nesse ponto equivocouse o legislador pois todos os envolvidos em uma infração penal desde que culpáveis devem ser punidos Em outras palavras a culpabilidade relacionase com a possibilidade de aplicação da pena mas não com a sua dosimetria Portanto teria sido mais feliz o legislador se tivesse utilizado a expressão grau de culpabilidade para transmitir a ideia de que todos os agentes culpáveis autores ou partícipes de um ilícito penal serão punidos mas os que agiram de modo mais reprovável suportarão penas mais elevadas Para o Supremo Tribunal Federal A circunstância judicial culpabilidade disposta no art 59 do CP atende ao critério constitucional da individualização da pena Com base nessa orientação o Plenário indeferiu habeas corpus em que se pleiteava o afastamento da mencionada circunstância judicial Consignouse que a previsão do aludido dispositivo legal atinente à culpabilidade mostrarse ia afinada com o princípio maior da individualização porquanto a análise judicial das circunstâncias pessoais do réu seria indispensável à adequação temporal da pena em especial nos crimes perpetrados em concurso de pessoas nos quais se exigiria que cada um respondesse tão somente na medida de sua culpabilidade CP art 29 Afirmouse que o dimensionamento desta quando cotejada com as demais circunstâncias descritas no art 59 do CP revelaria ao magistrado o grau de censura pessoal do réu na prática do ato delitivo Aduziuse que ao contrário do que sustentado a ponderação acerca das circunstâncias judiciais do crime atenderia ao princípio da proporcionalidade e representaria verdadeira limitação da discricionariedade judicial na tarefa individualizadora da penabase23 Com amparo nessa circunstância judicial o Supremo Tribunal Federal já reconheceu a possibilidade de exasperação da penabase aplicada a policial civil responsável pelo crime de concussão na situação em que o agente público valese da autoridade inerente ao seu cargo para exigir vantagem indevida de pessoa envolvida na prática de crimes É legítima a utilização da condição pessoal de policial civil como circunstância judicial desfavorável para fins de exasperação da pena base aplicada a acusado pela prática do crime de concussão A Turma afirmou que seria possível no que se refere à culpabilidade CP art 59 promover em cada caso concreto juízo de reprovabilidade maior tendo em consideração a condição de policial civil do agente O delito previsto no art 316 do CP seria de mão própria porém presentes as circunstâncias do art 59 do CP se poderia levar em conta quando do juízo de reprovabilidade a qualidade específica ou a qualificação do funcionário público Dentro do Estado Democrático de Direito e do país que se almeja construir o fato de uma autoridade pública no caso uma autoridade policial obter vantagem indevida de alguém que esteja praticando um delito comprometeria de maneira grave o fundamento de legitimidade da autoridade que seria atuar pelo bem comum e pelo bem público Portanto aquele que fosse investido de parcela de autoridade pública fosse juiz membro do Ministério Público ou autoridade policial deveria ser avaliado no desempenho da sua função com escrutínio mais rígido24 São os dados atinentes à vida pregressa do réu na seara criminal Dizem respeito a todos os fatos e acontecimentos que envolvem o seu passado criminal bons ou ruins Em suma os antecedentes se revelam como o filme de tudo o que ele fez ou deixou de fazer antes de envolverse com o ilícito penal desde que contidos em sua folha de antecedentes Todos os demais fatores relacionados à sua vida pretérita que não os indicados na folha de antecedentes devem ser analisados no âmbito da conduta social também circunstância judicial prevista no art 59 caput do Código Penal25 E o que são maus antecedentes No passado o Supremo Tribunal Federal entendia que inquéritos policiais e ações penais contidas na folha de antecedentes do réu podiam caracterizar maus antecedentes ainda que estivessem em curso é dizer mesmo sem condenação transitada em julgado26 Isso porque uma anotação criminal não surge imotivadamente na vida de alguém e quando existente representa um antecedente negativo no aspecto criminal Contudo ultimamente o Pretório Excelso tem decidido que maus antecedentes são unicamente as condenações definitivas que não caracterizam reincidência seja pelo decurso do prazo de 5 anos após a extinção da pena CP art 64 I seja pela condenação anterior ter sido lançado em consequência de crime militar próprio ou político CP art 64 II seja finalmente pelo fato de o novo crime ter sido cometido antes da condenação definitiva por outro delito Vale a pena conferir o seguinte julgado Inquéritos policiais ou ações penais sem trânsito em julgado não podem ser considerados como maus antecedentes para fins de dosimetria da pena Esse o entendimento do Plenário que em conclusão de julgamento e por maioria desproveu recurso extraordinário O Colegiado explicou que a jurisprudência da Corte sobre o tema estaria em evolução e a tendência atual seria no sentido de que a cláusula constitucional da não culpabilidade CF art 5º LVII não poderia ser afastada Haveria semelhante movimento por parte da doutrina a concluir que sob o império da nova ordem constitucional somente poderiam ser valoradas como maus antecedentes as decisões condenatórias irrecorríveis Assim não poderiam ser considerados para esse fim quaisquer outras investigações ou processos criminais em andamento mesmo em fase recursal Esse ponto de vista estaria em consonância com a moderna jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos e do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem Ademais haveria recomendação por parte do Comitê de Direitos Humanos das Nações Unidas no sentido de que o Poder Público deveria absterse de prejulgar o acusado O lançamento no mundo jurídico de enfoque ainda não definitivo e portanto sujeito a condição resolutiva potencializaria a atuação da polícia judiciária bem como a precariedade de certos pronunciamentos judiciais Nesse sentido uma vez admitido pelo sistema penal brasileiro o conhecimento do conteúdo da folha penal como fator a se ter em conta na fixação da pena a presunção deveria militar em favor do acusado O arcabouço normativo não poderia ser interpretado a ponto de gerar perplexidade27 No Superior Tribunal de Justiça é pacífico o entendimento no sentido de que responder a processo criminal não significa ter maus antecedentes uma vez que só se considera o réu culpado após o trânsito em julgado de sentença penal condenatória Além disso o agente não pode ser prejudicado pela simples existência de inquéritos policiais em curso ou arquivados ou de ação penal em andamento ou com a pretensão punitiva julgada improcedente ou ainda com a transação penal concedida no âmbito dos Juizados Especiais Criminais Essa posição restou consolidada na Súmula 444 do Superior Tribunal de Justiça É vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a penabase28 Na mesma direção preceitua o art 20 parágrafo único do Código de Processo Penal com a redação conferida pela Lei 126812012 Nos atestados de antecedentes que lhe forem solicitados a autoridade policial não poderá mencionar quaisquer anotações referentes a instauração de inquérito contra os requerentes É importante destacar que para fins de caracterização dos maus antecedentes basta a existência de uma condenação penal definitiva pouco importando o momento da sua concretização Em outras palavras embora exista um delito anterior o trânsito em julgado da condenação dele decorrente pode ser posterior à prática do novo crime no qual será considerada a circunstância judicial desfavorável Como já decidido pelo Supremo Tribunal Federal A dosimetria da pena é matéria sujeita a certa discricionariedade judicial O Código Penal não estabelece rígidos esquemas matemáticos ou regras absolutamente objetivas para a fixação da pena Condenações transitadas em julgado após o cometimento dos crimes objeto da condenação são aptas a desabonar na primeira fase da dosimetria os antecedentes criminais para efeito de exacerbação da penabase CP art 5929 Vale frisar é imperioso que exista uma condenação definitiva por fato anterior ao crime cuja pena se esteja a individualizar Essa ilação extraise do próprio nome da circunstância judicial antecedente Na dicção do Superior Tribunal de Justiça No cálculo da penabase é impossível a consideração de condenação transitada em julgado correspondente a fato posterior ao narrado na denúncia para valorar negativamente os maus antecedentes a personalidade ou a conduta social do agente30 No tocante à validade da condenação anterior para fins de maus antecedentes o Código Penal filiouse ao sistema da perpetuidade ou seja o decurso do tempo após o cumprimento ou extinção da pena não elimina esta circunstância judicial desfavorável ao contrário do que se verifica na reincidência CP art 64 I Em apertada síntese não há para aos maus antecedentes regra análoga àquela contida em relação à reincidência Esta é a nossa posição amparada pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal O Plenário asseverou que o transcurso do quinquênio previsto no art 64 I do CP não seria óbice ao acionamento do art 59 do mesmo diploma31 A 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal todavia já decidiu que os maus antecedentes também desaparecem após 5 anos do cumprimento ou da extinção da pena As condenações transitadas em julgado há mais de cinco anos não poderão ser caracterizadas como maus antecedentes para efeito de fixação da pena conforme previsão do art 64 I do CP Para efeito de reincidência I não prevalece a condenação anterior se entre a data do cumprimento ou extinção da pena e a infração posterior tiver decorrido período de tempo superior a 5 cinco anos computado o período de prova da suspensão ou do livramento condicional se não ocorrer revogação Esse é o entendimento da Segunda Turma que em conclusão de julgamento e por maioria concedeu a ordem em habeas corpus para restabelecer a decisão do tribunal de justiça que afastara os maus antecedentes considerada condenação anterior ao período depurador CP art 64 I para efeito de dosimetria da pena A Turma afirmou que o período depurador de cinco anos teria a aptidão de nulificar a reincidência de forma que não poderia mais influenciar no quantum de pena do réu e em nenhum de seus desdobramentos Observou que seria assente que a ratio legis consistiria em apagar da vida do indivíduo os erros do passado já que houvera o devido cumprimento de sua punição de modo que seria inadmissível atribuir à condenação o status de perpetuidade sob pena de violação aos princípios constitucionais e legais sobretudo o da ressocialização da pena A Constituição vedaria expressamente na alínea b do inciso XLVII do art 5º as penas de caráter perpétuo Esse dispositivo suscitaria questão acerca da proporcionalidade da pena e de seus efeitos para além da reprimenda corporal propriamente dita Nessa perspectiva por meio de cotejo das regras basilares de hermenêutica constatarseia que se o objetivo primordial fosse o de se afastar a pena perpétua reintegrando o apenado no seio da sociedade com maior razão deverseia aplicar esse raciocínio aos maus antecedentes Ademais o agravamento da penabase com fundamento em condenações transitadas em julgado há mais de cinco anos não encontraria previsão na legislação pátria tampouco na Constituição mas se trataria de uma analogia in malam partem método de integração vedado em nosso ordenamento32 Em outras palavras a Suprema Corte aplicou o sistema da temporariedade para a circunstância judicial em estudo partindo da premissa de que se a reincidência mais grave desaparece após cinco anos da extinção da pena igual raciocínio deve ser utilizado para os maus antecedentes pois revestemse de menor gravidade Também conhecida como antecedentes sociais é o estilo de vida do réu correto ou inadequado perante a sociedade sua família ambiente de trabalho círculo de amizades e vizinhança etc33 Deve ser objeto de questionamento do magistrado tanto no interrogatório como na colheita da prova testemunhal Se necessária para a busca da verdade real pode ser ainda determinada a avaliação do acusado pelo Setor Técnico do juízo avaliação social e psicológica De acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça na dosimetria da pena os fatos posteriores ao crime em julgamento não podem ser utilizados como fundamento para valorar negativamente a culpabilidade a personalidade e a conduta social do réu34 É preciso cuidado para não confundir a conduta social com os maus antecedentes os quais se limitam ao passado do réu no âmbito criminal Mais do que isso devese ter muita atenção para não se valorar duplamente um mesmo dado fático como conduta social e mau antecedente afastandose o inaceitável bis in idem Na lúcida advertência do Supremo Tribunal Federal Em conclusão de julgamento a Segunda Turma deu provimento a recurso ordinário para determinar ao juízo de execução competente que redimensione a penabase de condenado a quatro anos e onze meses de reclusão em regime inicial semiaberto pela prática do delito de furto qualificado Cuidavase de habeas corpus no qual se alegava afronta ao princípio do ne bis in idem uma vez que o tribunal de origem não poderia ter valorado a conduta social com elementos próprios e típicos dos maus antecedentes e da reincidência O Colegiado afirmou que a decisão impugnada teria considerado negativamente circunstâncias judiciais diversas com fundamento na mesma base empírica qual seja os registros criminais a conferirlhes conceitos jurídicos assemelhados Apontou que antes da reforma da parte geral do CP1984 entendiase que a análise dos antecedentes abrangeria todo o passado do agente a incluir além dos aludidos registros o comportamento em sociedade Com o advento da Lei 72091984 a conduta social teria passado a ter configuração própria Introduzirase um vetor apartado com vistas a avaliar o comportamento do condenado no meio familiar no ambiente de trabalho e no relacionamento com outros indivíduos Ou seja os antecedentes sociais do réu não mais se confundiriam com os seus antecedentes criminais Tratarseia de circunstâncias diversas e por isso mesmo a exasperação da penabase mediante a invocação delas exigiria do magistrado a clara demonstração de subsunção da realidade fática ao preceito legal dentro dos limites típicos Concluiu que teria havido indevida desvalorização plural de circunstâncias as quais possuiriam balizas próprias com justificativa na mesma base fática35 É o perfil subjetivo do réu nos aspectos moral e psicológico pelo qual se analisa se tem ou não o caráter voltado à prática de infrações penais O Superior Tribunal de Justiça faz importante advertência sobre o tema Havendo registros criminais já considerados na primeira e na segunda fases da fixação da pena maus antecedentes e reincidência essas mesmas condenações não podem ser valoradas para concluir que o agente possui personalidade voltada à criminalidade A adoção de entendimento contrário caracteriza o indevido bis in idem36 São os fatores psíquicos que levam a pessoa a praticar o crime ou a contravenção penal Só tem cabimento essa circunstância judicial favorável ou desfavorável ao réu quando a motivação não caracterizar elementar do delito qualificadora causa de diminuição ou de aumento da pena ou atenuante ou agravante genérica37 Exemplo o motivo fútil é qualificadora do homicídio CP art 121 2º II e agravante genérica para os demais crimes CP art 61 II a Destarte se fútil o motivo será utilizado como qualificadora ou agravante genérica conforme o caso e não como circunstância judicial desfavorável evitandose o bis in idem Os motivos do crime não se confundem com o dolo e a culpa Aqueles são dinâmicos mutáveis desvinculados do tipo penal e revelam os desejos do agente Podem ou não ser alcançados com a prática da infração penal Exemplo A mata B seu colega de trabalho com o propósito de conseguir a única vaga de chefe da empresa motivo torpe No entanto C até então desconhecido vem a ser promovido ao disputado cargo O dolo e a culpa alocados no fato típico por outro lado são estáticos e vinculados ao tipo penal e é irrelevante para sua caracterização o móvel da conduta Exemplo A efetua disparos de arma de fogo contra B matandoo Seja qual for o motivo o dolo está configurado São os dados acidentais secundários relativos à infração penal mas que não integram sua estrutura tais como o modo de execução do crime os instrumentos empregados em sua prática as condições de tempo e local em que ocorreu o ilícito penal o relacionamento entre o agente e o ofendido etc Nesse contexto o Superior Tribunal de Justiça já admitiu a elevação da pena base em estelionato no qual a vítima nutria plena confiança no agente O cometimento de estelionato em detrimento de vítima que conhecia o autor do delito e lhe depositava total confiança justifica a exasperação da penabase De fato tendo sido apontados argumentos idôneos e diversos do tipo penal violado que evidenciam como desfavoráveis as circunstâncias do crime não há constrangimento ilegal na valoração negativa dessa circunstância judicial38 Não há lugar para a gravidade abstrata do crime pois essa circunstância já foi levada em consideração pelo legislador para a cominação das penas mínima e máxima39 As circunstâncias do crime vinculamse ao aumento da pena pois as circunstâncias favoráveis ao réu devem ser aceitas como atenuantes genéricas inominadas na forma do art 66 do Código Penal A pena poderá ser ainda atenuada em razão de circunstância relevante anterior ou posterior ao crime embora não prevista expressamente em lei Justificase essa conclusão pela natureza residual das circunstâncias judiciais Envolvem o conjunto de efeitos danosos provocados pelo crime em desfavor da vítima de seus familiares ou da coletividade Essa circunstância judicial deve ser aplicada com atenção em um estupro exemplificativamente o medo provocado na pessoa homem ou mulher vitimada é consequência natural do delito e não pode funcionar como fator de exasperação da pena ao contrário do trauma certamente causado em seus filhos menores quando o crime é por eles presenciado Como alerta o Superior Tribunal de Justiça Não é possível a utilização de argumentos genéricos ou circunstâncias elementares do próprio tipo penal para o aumento da penabase com fundamento nas consequências do delito40 Nesse contexto o Supremo Tribunal Federal já decidiu que os elevados custos da atuação estatal para apuração da conduta criminosa e o enriquecimento ilícito logrado pelo agente não constituem motivação idônea para a valoração negativa do vetor consequências do crime na primeira fase da dosimetria da pena41 É a atitude da vítima que tem o condão de provocar ou facilitar a prática do crime Cuidase de circunstância judicial ligada à vitimologia isto é ao estudo da participação da vítima e dos males a ela produzidos por uma infração penal Nesse sentido aquele que abertamente manuseia grande quantidade de dinheiro em um ônibus por exemplo incentiva a prática de furtos ou roubos por ladrões E a mulher que interessada em lucros fáceis presta favores sexuais mediante remuneração em estabelecimento pertencente a outrem colabora para o crime de favorecimento da prostituição tipificado pelo art 228 do Código Penal42 3410 Fácil concluir portanto que se trata de circunstância judicial neutra ou então favorável ao réu mas que nunca pode ser utilizada para prejudicálo Como destaca o Superior Tribunal de Justiça O comportamento da vítima apenas deve ser utilizado em benefício do réu devendo tal circunstância ser neutralizada no caso de não interferência do ofendido na prática do crime43 A SEGUNDA FASE DA DOSIMETRIA DA PENA ATENUANTES E AGRAVANTES Atenuantes e agravantes são circunstâncias legais de natureza objetiva ou subjetiva não integrantes da estrutura do tipo penal mas que a ele se ligam com a finalidade de diminuir ou aumentar a pena Podem ser genéricas quando previstas na Parte Geral do Código Penal e aplicáveis à generalidade dos crimes ou específicas se contidas em leis extravagantes e aplicáveis somente a determinados crimes tal como se verifica no art 298 da Lei 95031997 Código de Trânsito Brasileiro em relação aos crimes de trânsito agravantes e no art 14 da Lei 96051998 no tocante aos crimes ambientais atenuantes As agravantes genéricas prejudiciais ao réu estão previstas nos arts 61 e 62 do Código Penal em rol taxativo não se admitindo analogia in malam partem Contrariamente as atenuantes genéricas favoráveis ao acusado encontramse descritas em rol exemplificativo Com efeito nada obstante o art 65 do Código Penal apresente relação detalhada de atenuantes genéricas o art 66 abre grande válvula de escape ao estatuir que a pena poderá ser ainda atenuada em razão de circunstância relevante anterior ou posterior ao crime embora não prevista expressamente em lei Destarte qualquer circunstância relevante e favorável ao réu seja anterior ou posterior ao crime pode atuar como fator judicialmente discricionário de abrandamento da pena Atenuantes e agravantes são de aplicação compulsória pelo magistrado que não pode deixar de leválas em conta quando presentes na dosimetria da pena No tocante às agravantes genéricas o art 61 caput do Código Penal dispõe que são causas que sempre agravam a pena enquanto estabelece o art 62 caput do Código Penal que a pena será ainda agravada Mas para evitar o bis in idem vedase a sua utilização quando já funcionarem como elementar do tipo penal ou ainda como qualificadora ou causa de aumento da pena As agravantes serão inócuas ainda que muitas delas estejam presentes quando a penabase já tiver sido fixada no máximo legalmente previsto Com efeito embora sempre agravem a pena tais circunstâncias não podem elevála acima do teto cominado em abstrato pois não integram a estrutura típica e como o legislador não previu expressamente o percentual de exasperação da pena a atividade judicial que criasse uma nova reprimenda para determinada infração penal violaria o princípio da separação de poderes do Estado CF art 2º uma vez que estaria inovando no plano legislativo Nos crimes dolosos contra a vida de competência do Tribunal do Júri as agravantes e atenuantes não são indagadas aos jurados mas aplicadas diretamente pelo juizpresidente desde que tenham sido alegadas nos debates entre as partes CPP art 492 I b O Código Penal em seu art 61 I trata da reincidência agravante genérica cuja amplitude e complexidade reclamam análise isolada No inciso II o art 61 elenca diversas agravantes genéricas e de acordo com o posicionamento dominante nos âmbitos doutrinário e jurisprudencial aplicamse exclusivamente aos crimes dolosos e também aos preterdolosos pois tais delitos têm a fase inicial caracterizada pela presença do dolo44 já que seria incompatível a incidência nos crimes culposos não se justificando a elevação da pena quando produzido involuntariamente o resultado naturalístico Já decidiu o Supremo Tribunal Federal contudo no julgamento histórico do navio Bateau Mouche que tais agravantes também recaem sobre os crimes culposos Não obstante a corrente afirmação apodíctica em contrário além da reincidência outras circunstâncias agravantes podem incidir na hipótese de crime culposo assim as atinentes ao motivo quando referidas à valoração da conduta a qual também nos delitos culposos é voluntária independentemente da não voluntariedade do resultado admissibilidade no caso da afirmação do motivo torpe a obtenção do lucro fácil que segundo o acórdão condenatório teria induzido os agentes ao comportamento imprudente e negligente de que resultou o sinistro45 Finalmente o art 62 do Código Penal cuida das agravantes no concurso de pessoas As atenuantes genéricas também são de incidência obrigatória De fato diz o art 65 caput que são circunstâncias que sempre atenuam a pena Consequentemente quando presentes devem ser aplicadas pelo juiz salvo quando já funcionarem como causa de diminuição da pena Além disso as atenuantes genéricas ainda que existam muitas delas no caso concreto serão ineficazes quando a penabase 1ª fase for fixada no mínimo legal Como não integram a estrutura do tipo penal e não tiveram o percentual de redução previsto expressamente pelo legislador a aplicação da pena fora dos parâmetros legais representaria intromissão indevida do Poder Judiciário na função legiferante Tais motivos levaram o Superior Tribunal de Justiça a editar a Súmula 231 A incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal46 Recordese que as atenuantes genéricas estão previstas no Código Penal em rol exemplificativo porque além das expressamente definidas pelo art 65 o art 66 consagra as atenuantes inominadas não indicadas pela lei A lei não estabelece o percentual de aumento ou de diminuição da pena no tocante às agravantes ou atenuantes genéricas Na prática forense todavia consagrouse o entendimento de que o aumento ou a diminuição deve ser de 16 sobre a penabase por se tratar do menor índice estipulado pela legislação penal Código Penal e leis especiais para as causas de aumento e de diminuição da pena47 Vejamos cada uma das agravantes e atenuantes genéricas A pena no Brasil apresenta uma dupla finalidade retributiva e preventiva Essa última dividese em geral e especial A prática de uma nova infração penal com a caracterização da reincidência também chamada de recidiva revela o não cumprimento da pena quanto às suas finalidades Falhou na tarefa retributiva pois o condenado não se atemorizou suficientemente com o castigo ao ponto de descumprir novamente a lei penal suportando o risco de ser mais uma vez privado de sua liberdade ou de seus bens A pena mostrouse insuficiente justificando uma nova punição agora mais grave Por esse motivo não se pode falar em dupla punição pelo mesmo fato O reincidente não é punido duas vezes pelo mesmo fato Ao contrário já foi apenado pelo crime anterior pressuposto da reincidência e posteriormente pelo novo delito com a pena agravada Tratase de punição mais rigorosa daquele que novamente demonstrou não se intimidar com a autoridade estatal Além disso a pena também deixou a desejar na missão de prevenção especial revelando não ter ressocializado satisfatoriamente seu destinatário É o fracasso do Estado no cumprimento de uma finalidade que lhe foi constitucional e legalmente atribuída mas que por motivos diversos e de conhecimento notório não é desempenhada a contento Destarte o fundamento da reincidência é claro o recrudescimento da pena resulta da opção do agente por continuar a delinquir Em síntese é constitucional a opção do legislador de incluir a reincidência no rol das agravantes genéricas Esta é a posição encampada pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal Vale a pena acompanhar o teor da decisão É constitucional a aplicação da reincidência como agravante da pena em processos criminais CP art 61 I Essa a conclusão do Plenário ao desprover recurso extraordinário em que alegado que o instituto configuraria bis in idem bem como ofenderia os princípios da proporcionalidade e da individualização da pena Registrouse que as repercussões legais da reincidência seriam múltiplas não restritas ao agravamento da pena Nesse sentido ela obstaculizaria a cumprimento de pena nos regimes semiaberto e aberto CP art 33 2º b e c b substituição de pena privativa de liberdade por restritiva de direito ou multa CP artigos 44 II e 60 2º c sursis CP art 77 I d diminuição de pena reabilitação e prestação de fiança e e transação e sursis processual em juizados especiais Lei 909995 artigos 76 2º I e 89 Além disso a recidiva seria levada em conta para a deslinde do concurso de agravantes e atenuantes CP art 67 b efeito de lapso temporal quanto ao livramento condicional CP art 83 I e II c interrupção da prescrição CP art 117 VI e d revogação de sursis e livramento condicional a impossibilitar em alguns casos a diminuição da pena a reabilitação e a prestação de fiança CP artigos 155 2º 170 171 1º 95 e CPP art 323 III Consignouse que a reincidência não contrariaria a individualização da pena Ao contrário levarseia em conta justamente o perfil do condenado ao distinguilo daqueles que cometessem a primeira infração penal Nesse sentido lembrouse que a Lei 113432006 preceituaria como causa de diminuição de pena o fato de o agente ser primário e detentor de bons antecedentes art 33 4º Do mesmo modo a recidiva seria considerada no cômputo do requisito objetivo para progressão de regime dos condenados por crime hediondo Nesse aspecto a lei exigiria o implemento de 25 da reprimenda se primário o agente e 35 se reincidente O instituto impediria também o livramento condicional aos condenados por crime hediondo tortura e tráfico ilícito de entorpecentes CP art 83 V Figuraria ainda como agravante da contravenção penal prevista no art 25 do DecretoLei 368841 Influiria na revogação do sursis processual e do livramento condicional assim como na reabilitação CP artigos 81 I e 1º 86 87 e 95 Considerouse que a reincidência comporia consagrado sistema de política criminal de combate à delinquência e que eventual inconstitucionalidade do instituto alcançaria todas as normas acima declinadas Asseverouse que sua aplicação não significaria duplicidade porquanto não alcançaria delito pretérito mas novo ilícito que ocorrera sem que ultrapassado o interregno do art 64 do CP Asseverouse que o julgador deveria ter parâmetros para estabelecer a pena adequada ao caso concreto Nesse contexto a reincidência significaria o cometimento de novo fato antijurídico além do anterior Reputouse razoável o fator de discriminação considerado o perfil do réu merecedor de maior repreensão porque voltara a delinquir a despeito da condenação havida que deveria ter sido tomada como advertência no que tange à necessidade de adoção de postura própria ao homem médio Explicouse que os tipos penais preveriam limites mínimo e máximo de apenação somente alijados se verificada causa de diminuição ou de aumento da reprimenda A definição da pena adequada levaria em conta particularidades da situação inclusive se o agente voltara a claudicar Estaria respaldado então o instituto constitucional da individualização da pena na medida em que se evitaria colocar o reincidente e o agente episódico no mesmo patamar Frisouse que a jurisprudência da Corte filiarseia predominantemente à corrente doutrinária segundo a qual o instituto encontraria fundamento constitucional porquanto atenderia ao princípio da individualização da pena Assinalouse que não se poderia a partir da exacerbação do garantismo penal desmantelar o sistema no ponto consagrador da cabível distinção ao se tratar os desiguais de forma igual A regência da matéria harmônica com a Constituição denotaria razoável política normativa criminal48 Em conformidade com o art 63 do Código Penal Verificase a reincidência quando o agente comete novo crime depois de transitar em julgado a sentença que no País ou no estrangeiro o tenha condenado por crime anterior Cuidase assim da prática de novo crime depois da condenação a b c definitiva no Brasil ou no exterior pela prática de crime anterior Da análise do art 63 do Código Penal despontam três requisitos imprescindíveis para a configuração da reincidência ordenados cronologicamente um crime cometido no Brasil ou em outro país condenação definitiva isto é com trânsito em julgado por esse crime e prática de novo crime Destarte a reincidência depende obrigatoriamente de ao menos dois crimes um anterior em cuja ação penal já foi proferida sentença condenatória com seu respectivo trânsito em julgado e outro posterior ao trânsito em julgado Com a prática desse novo crime será tratado como reincidente com todas as consequências rigorosas daí decorrentes49 Portanto somente existe reincidência quando o novo crime tiver sido praticado depois do trânsito em julgado da condenação anterior Logo se for cometido na data do trânsito em julgado não estará caracterizada a recidiva E ainda não haverá reincidência se o agente praticar os dois crimes na mesma ocasião e forem julgados pela mesma sentença50 Além disso não há falar em reincidência quando a denúncia ou queixacrime pelo novo crime não contém a data exata do fato apta a demonstrar sua prática após o trânsito em julgado da condenação anterior Na linha de raciocínio do Superior Tribunal de Justiça A agravante da reincidência não deve ser aplicada se não há na denúncia exatidão da data dos fatos apta a demonstrar que o delito ocorreu após o trânsito em julgado de condenação anterior Em observância ao princípio do in dubio pro reo deve ser dada a interpretação mais favorável ao acusado não se podendo presumir que o trânsito em julgado referente ao crime anterior ocorreu antes do cometimento do segundo delito51 Pouco importa tenha sido o crime que resultou na condenação definitiva praticado no Brasil ou no estrangeiro A propósito para a caracterização da reincidência a sentença estrangeira não precisa ser homologada pelo Superior Tribunal de Justiça como se extrai do art 9º do Código Penal Basta a prova de que foi proferida judicialmente e transitou em julgado52 Mas desaparece a reincidência quando a condenação que a justifica teve seu trânsito em julgado desconstituído judicialmente53 Pode acontecer uma situação curiosa o agente possuir contra si diversas condenações definitivas no campo penal e ainda assim ser primário Esse fenômeno ocorre quando nada obstante as múltiplas sentenças condenatórias transitadas em julgado ainda não praticou nenhum delito após a primeira condenação definitiva ou seja todos os crimes praticados pelo indivíduo antecederam a primeira sentença condenatória transitada em julgado a b c d Estabelece o art 7º do Decretolei 36881941 Lei das Contravenções Penais Verificase a reincidência quando o agente pratica uma contravenção depois de passar em julgado a sentença que o tenha condenado no Brasil ou no estrangeiro por qualquer crime ou no Brasil por motivo de contravenção A combinação desse dispositivo com o art 63 do Código Penal permite as seguintes conclusões a condenação definitiva no exterior pela prática de contravenção penal não serve no Brasil em nenhuma hipótese como pressuposto da reincidência é reincidente o agente que depois do trânsito em julgado de uma condenação por crime no Brasil ou no estrangeiro ou contravenção penal no Brasil cometer novo crime aqui ou no estrangeiro ou contravenção penal no Brasil é reincidente aquele que após o trânsito em julgado de uma condenação no Brasil pela prática de contravenção penal cometer nova contravenção penal e não é reincidente o sujeito que depois do trânsito em julgado da condenação no Brasil por contravenção penal praticar no Brasil ou no estrangeiro novo crime Não se caracteriza a reincidência portanto na hipótese em que o agente decide enveredar por uma infração penal mais grave deixando de ser mero contraventor para se tornar criminoso O fundamento dessa brecha é a falha legislativa que lamentavelmente insistese em manter As conclusões podem ser assim representadas Infração penal anterior Infração penal posterior Resultado Crime Crime Reincidente Contravenção penal Contravenção penal Reincidente Crime Contravenção penal Reincidente Contravenção penal Crime Primário Para a caracterização da reincidência basta o trânsito em julgado da condenação resultante da prática de um crime anterior O art 63 do Código Penal não permite qualquer distinção em face da pena imposta Portanto é irrelevante a espécie de pena aplicada privativa de liberdade que pode ou não ter sido substituída por restritiva de direitos ou multa Destarte não pode ser acolhido o argumento de que a condenação exclusiva à pena de multa não gera reincidência Essa posição sem amparo doutrinário ou jurisprudencial mas utilizada em casos práticos fundase em duas premissas a a pena pecuniária é de pouca importância e não teria forças para ensejar a recidiva e b o art 77 1º do Código Penal diz que a condenação anterior à pena de multa não impede o sursis e por esse motivo a aplicação exclusiva da pena pecuniária não configura a reincidência pois o sursis não é cabível ao reincidente CP art 77 I No tocante à posse de droga para consumo pessoal art 28 da Lei 113432006 o Superior Tribunal de Justiça firmou jurisprudência no sentido de que a condenação por tal delito não funciona como pressuposto da reincidência Condenações anteriores pelo delito do art 28 da Lei n 113432006 não são aptas a gerar reincidência Inicialmente cumpre salientar que consoante o posicionamento firmado pela Suprema Corte na questão de ordem no RE 430105RJ sabese que a conduta de porte de substância entorpecente para consumo próprio prevista no art 28 da Lei n 113432006 foi apenas despenalizada mas não descriminalizada em outras palavras não houve abolitio criminis Contudo ainda que a conduta tipificada no art 28 da Lei n 113432006 tenha sido despenalizada e não descriminalizada essa conduta é punida apenas com advertência sobre os efeitos das drogas prestação de serviços à comunidade e medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo Além disso não existe a possibilidade de converter essas penas em privativas de liberdade em caso de descumprimento Cabe ressaltar que as condenações anteriores por contravenções penais não são aptas a gerar reincidência tendo em vista o que dispõe o art 63 do Código Penal que apenas se refere a crimes anteriores E se as contravenções penais puníveis com pena de prisão simples não geram reincidência mostrase desproporcional o delito do art 28 da Lei n 113432006 configurar reincidência tendo em vista que nem é punível com pena privativa de liberdade54 Tratase de circunstância agravante genérica CP art 61 I Incide na segunda fase da aplicação da pena privativa de liberdade Além disso é de caráter subjetivo ou pessoal pois se relaciona à figura do agente e não ao fato Não se comunica aos demais coautores ou partícipes Há duas posições sobre a forma pela qual se prova a recidiva 1ª posição Exigese certidão expedida pelo cartório judicial acerca da condenação anterior com todos os seus detalhes Fundamentase no argumento de que a folha de antecedentes pode ser incompleta além de apresentar diversos equívocos pois não é emitida diretamente pelo juízo responsável pela condenação 2ª posição Basta a juntada aos autos da ação penal da folha de antecedentes pois dela consta a condenação anterior É o entendimento do Supremo Tribunal Federal A legislação pátria não exige documento específico para que seja comprovada a reincidência do agente Enfatizouse que no caso a folha de antecedentes expedida por órgão policial seria idônea a demonstrála por conter todas as informações necessárias para isso além de ser um documento público com presunção iuris tantum de veracidade55 Em relação à necessidade de cumprimento da pena imposta pela condenação anterior a reincidência pode ser real ou presumida Reincidência real própria ou verdadeira é a que ocorre quando o agente comete novo crime depois de ter cumprido integralmente a pena imposta como decorrência da prática do crime anterior Reincidência presumida ficta imprópria ou falsa por sua vez é a que ocorre quando o sujeito pratica novo crime depois da condenação definitiva pela prática de crime anterior pouco importando tenha sido ou não cumprida a pena O Código Penal em vigor filiouse à reincidência presumida É suficiente para alguém ser tratado como reincidente a prática de novo crime depois do trânsito em julgado da condenação anterior Em outro plano relativo às categorias dos crimes a reincidência pode ser genérica ou específica Na reincidência genérica os crimes praticados pelo agente são previstos por tipos penais diversos Exemplo A comete um furto pelo qual é condenado com trânsito em julgado e posteriormente pratica um estupro É reincidente genérico De seu turno na reincidência específica os dois ou mais crimes perpetrados pelo agente encontramse definidos pelo mesmo tipo penal Exemplo B pratica um roubo e depois de definitivamente condenado comete outro roubo É reincidente específico A legislação penal brasileira seguindo a tendência mundial trata as duas situações de modo análogo Os efeitos em regra são idênticos seja genérica ou específica a reincidência56 Em algumas raras situações todavia a reincidência específica comporta tratamento diferenciado No Código Penal o art 44 3º veda peremptoriamente a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos ao reincidente específico embora seja a medida socialmente recomendável É o que também se dá no livramento condicional para os crimes hediondos e equiparados vedado para reincidente específico em crimes dessa natureza CP art 83 V acrescentado pela Lei 80721990 Lei dos Crimes Hediondos Essa restrição foi ainda prevista expressamente aos autores dos crimes tipificados nos arts 33 caput e 1º e 34 a 37 da Lei de Drogas Lei 113432006 art 44 parágrafo único Em relação aos crimes definidos na Lei 95031997 Código de Trânsito Brasileiro o art 296 autoriza ao reincidente específico em crimes nela previstos a aplicação da penalidade de suspensão da permissão ou habilitação para dirigir veículo automotor sem prejuízo das demais sanções penais cabíveis Nos termos do art 64 I do Código Penal Art 64 Para efeito de reincidência I não prevalece a condenação anterior se entre a data do cumprimento ou extinção da pena e a infração posterior tiver decorrido período de tempo superior a 5 cinco anos computado o período de prova da suspensão ou do livramento condicional se não ocorrer revogação O dispositivo evidencia que a partir da Reforma da Parte Geral do Código Penal pela Lei 72091984 adotouse o sistema da temporariedade limitando a validade da reincidência ao período de 5 cinco anos É o que se convencionou chamar de período depurador ou caducidade da condenação anterior para fins de reincidência Na redação original do Código Penal acolhiase o sistema da perpetuidade pelo qual o estigma da reincidência jamais seria desvinculado da pessoa do criminoso57 O quinquênio deve ser contado entre a extinção da pena resultante do crime anterior pelo seu cumprimento ou por qualquer outro motivo e a prática do novo crime sendo irrelevante a data da sentença proferida como sua decorrência Levase em conta a data em que a pena foi efetivamente extinta pouco importando o dia em que foi proferida a decisão judicial declaratória da extinção da punibilidade Computase nesse prazo de 5 cinco anos o período de prova da suspensão ou do livramento condicional se não ocorrer revogação Nessas hipóteses o prazo é contado do início do período de prova que flui a partir da audiência admonitória e não da extinção da pena que somente se opera com o fim do período de prova Destarte se o condenado cumpre o sursis por 4 quatro anos sem revogação ao final do período de prova o juiz deverá declarar extinta a pena privativa de liberdade CP art 82 e ele precisará somente de mais 1 um ano para que essa condenação não seja mais apta a caracterizar a reincidência A questão que se coloca é a seguinte Com a extinção da punibilidade do crime anterior desaparece o pressuposto da reincidência Depende de dois fatores o momento em que ocorreu a causa extintiva da punibilidade e a espécie de causa de extinção da punibilidade Com efeito se a causa de extinção da punibilidade ocorreu antes do trânsito em julgado da sentença condenatória o crime anterior não subsiste para fins de reincidência Essa conclusão é evidente até mesmo porque nesse caso não existe condenação definitiva58 É o que se dá por exemplo com a prescrição da pretensão punitiva Por outro lado se a extinção da punibilidade efetivouse após o trânsito em julgado da condenação a sentença penal continua apta a caracterizar a reincidência tal como ocorre na prescrição da pretensão executória Essa regra entretanto comporta duas exceções anistia e abolitio criminis Nesses casos desfazse a própria condenação pois são veiculadas por meio de lei que torna atípico o fato até então incriminado abolitio criminis ou exclui determinados fatos do raio de incidência do Direito Penal anistia O próprio fato praticado pelo agente deixa de ser penalmente ilícito não se podendo por corolário falarse em reincidência O Código Penal define somente o conceito de reincidente é o sujeito que comete um novo crime depois do trânsito em julgado da sentença que o tenha condenado no Brasil ou no estrangeiro pela prática de crime anterior Destarte o conceito de primário é obtido pela via residual isto é por exclusão Com efeito primário é todo aquele que não se encaixa no perfil do reincidente Não se exige jamais tenha praticado um crime basta que não tenha cometido um crime depois do trânsito em julgado de uma condenação anterior Em sede jurisprudencial contudo criouse a figura do tecnicamente primário que seria a pessoa que possui condenação definitiva sem ser reincidente A primariedade estaria limitada aos casos em que o agente não ostenta nenhuma condenação Em nosso sistema penal o tecnicamente primário poderia ser visualizado em duas hipóteses a o sujeito possui uma ou diversas condenações definitivas mas não praticou nenhum dos crimes depois da primeira sentença condenatória transitada em julgado e b o indivíduo ostenta uma condenação definitiva e depois dela praticou um novo crime Entretanto entre a extinção da punibilidade do crime anterior e o novo delito decorreu período superior a 5 cinco anos CP art 64 I Essa denominação contudo deve ser utilizada com prudência porque não encontra amparo legal Falase ainda em multirreincidente expressão utilizada para referirse ao sujeito que mais do que ser reincidente possui três ou mais condenações transitadas em julgado a b c d e f g h i j k A reincidência além de constituirse em agravante genérica produz entre outros diversos efeitos desfavoráveis ao réu na pena de reclusão impede o início do cumprimento da pena privativa de liberdade em regime semiaberto ou aberto e na pena de detenção obsta o início do cumprimento da pena privativa de liberdade em regime aberto CP art 33 caput e 2º59 quando em crime doloso é capaz de impedir a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos CP art 44 II no concurso com atenuantes genéricas possui caráter preponderante CP art 67 se em crime doloso salvo quando imposta somente a pena de multa impede a concessão do sursis CP art 77 I e 1º autoriza a revogação do sursis CP art 81 I e 1º do livramento condicional CP art 86 I e II e art 87 e da reabilitação se a condenação for a pena que não seja de multa CP art 95 quando em crime doloso aumenta o prazo para a concessão do livramento condicional CP art 83 II impede o livramento condicional em crimes hediondos ou equiparados em caso de reincidência específica em crimes dessa natureza CP art 83 V se antecedente à condenação aumenta de um terço o prazo da prescrição da pretensão executória CP art 110 caput se posterior à condenação interrompe a prescrição da pretensão executória CP art 117 VI impede a obtenção do furto privilegiado da apropriação indébita privilegiada do estelionato privilegiado e da receptação privilegiada CP arts 155 2º 170 171 1º e 180 5º in fine obsta os benefícios da transação penal e da suspensão condicional do processo Lei 90991995 art 76 2º I e art 89 caput e l a autoriza a decretação da prisão preventiva quando o réu tiver sido condenado por crime doloso CPP art 313 II O art 63 do Código Penal referese unicamente a crime Essa é a regra qualquer crime pode ensejar a reincidência dolosos ou culposos punidos com reclusão ou detenção de elevada ou mínima gravidade consumados e mesmo os tentados pois a lei limitase a dizer crime cometido o que não se confunde com crime consumado Um pouco adiante porém o art 64 II do Código Penal abre espaço para duas exceções ao estatuir que para efeito de reincidência não se consideram os crimes militares próprios e os políticos Crimes militares próprios são os tipificados exclusivamente pelo Código Penal Militar Decretolei 10011969 Assim somente podem ser praticados por quem preencha a condição específica de militar Despontam como exemplos a deserção o motim a revolta e o desrespeito entre outros Limitase essa regra às hipóteses em que o agente pratica um crime militar próprio e depois um crime comum ou ainda um crime militar impróprio De fato o art 71 do Código Penal Militar prevê a reincidência quando o militar pratica um crime militar próprio e depois da condenação definitiva comete outro crime de igual natureza Já os crimes militares impróprios são os previstos no Código Penal Militar e também pelo Código Penal dos quais são exemplos o homicídio e o estupro Funcionam como pressuposto da reincidência pois foram excluídos pelo art 64 II a eles se aplicando a regra geral definida pelo art 63 do Código Penal Também não caracteriza reincidência a condenação anterior transitada em julgado por crime político que pode ser próprio ou puro ofende apenas a segurança ou a organização do Estado São os crimes contra a segurança nacional Lei 71701983 Será considerado reincidente específico em crime político próprio aquele que praticar um crime desta índole e após o b trânsito em julgado da condenação cometer outro delito de igual natureza uma vez que a Lei de Segurança Nacional não possui norma equivalente à prevista no art 64 I do Código Penal impróprio impuro ou relativo ofende a segurança ou a organização do Estado e também um bem jurídico protegido pela legislação comum Em ambas as espécies afastase a reincidência do Código Penal pois este diploma normativo ao contrário do que fez no tocante aos crimes militares não estabeleceu distinção entre crimes políticos próprios ou impróprios60 Vale destacar que a condenação definitiva por crimes militares próprios e por crimes políticos caracteriza maus antecedentes pois essa vedação não é alcançada pela regra contida no art 64 I do Código Penal limitada ao instituto da reincidência No critério trifásico de aplicação da pena privativa de liberdade os maus antecedentes do réu incidem na primeira fase e a reincidência é utilizada na etapa seguinte Destarte em se tratando de réu reincidente a condenação penal definitiva deve ser realçada pelo magistrado somente na segunda fase da dosimetria da pena por se constituir em agravante genérica prevista expressamente no art 61 I do Código Penal Não pode ser também utilizada para a caracterização de maus antecedentes sob pena de fomentar o bis in idem é dizer a dupla punição pelo mesmo fato Esse é o teor da Súmula 241 do Superior Tribunal de Justiça A reincidência penal não pode ser considerada como circunstância agravante e simultaneamente como circunstância judicial Entretanto se o réu possui mais de uma condenação definitiva uma pode ser utilizada como mau antecedente e outra como agravante genérica reincidência não se falando em bis in idem Se a reincidência foi equivocadamente reconhecida na sentença ou no acórdão condenatório seja porque não estava devidamente constituída seja porque não foi observado o período depurador CP art 64 inc I daí resultando danos materiais eou morais ao acusado estará caracterizado o erro judiciário acarretando ao Estado o dever de indenizar os prejuízos causados na forma definida pelo art 5º inc LXXV da Constituição Federal Como já decidido pelo Superior Tribunal de Justiça No caso em que o reconhecimento da reincidência tenha origem em infração anterior cuja pena tenha sido cumprida ou extinta há mais de 5 anos deferido o pedido revisional para diminuir a pena equivocadamente fixada será devida a indenização ao condenado que tenha sofrido prejuízos em virtude do erro judiciário É que tendo sido reconhecido que o acusado foi considerado indevidamente reincidente há clara contrariedade ao disposto no art 64 I do CP Sobre o assunto pondera a doutrina o conceito de erro judiciário deve transcender as barreiras limitativas da sentença condenatória impositiva de pena privativa de liberdade para envolver toda e qualquer decisão judicial errônea que tenha provocado evidente prejuízo à liberdade individual ou mesmo à imagem e à honra do acusado E nessa perspectiva outra doutrina arremata é importante notar que tal como a sentença condenatória que serve como título judicial para a execução do dano praticado pelo agente em favor do ofendido art 63 CPP também o acórdão rescindido em que se tenha reconhecido o direito à indenização servirá unicamente como título executivo para o réu condenado injustamente demandar o Estado cujo quantum deverá ser apurado na esfera cível61 Motivo fútil é o insignificante de pouca importância completamente desproporcional à natureza do crime praticado Exemplo age com motivo fútil o marido que mata a esposa por não ter passado adequadamente uma peça do seu vestuário Fundamentase a agravação da resposta estatal em razão do egoísmo da atitude mesquinha que alimenta a conduta do responsável pela infração penal A ausência de motivo não deve ser equiparada ao motivo fútil pois todo crime tem a sua motivação Destarte o desconhecimento acerca do móvel do agente não deve ser colocado no mesmo nível do motivo de somenos importância62 Há todavia adeptos de posição contrária os quais alegam que se um motivo ínfimo justifica a elevação da pena com maior razão deve ser punida mais gravemente a infração penal imotivada O ciúme não deve ser enquadrado como motivo fútil Esse sentimento que destrói o equilíbrio do ser humano e arruína a sua vida não pode ser considerado insignificante ou desprezível A embriaguez por sua vez é incompatível com o motivo fútil O embriagado não tem pleno controle do seu modo de agir afastando assim a futilidade da força que o impele a transgredir o Direito Penal Mas há quem diga que em face da norma prevista no art 28 II do Código Penal embriaguez voluntária ou culposa não exclui a imputabilidade penal essa agravante genérica pode ser aplicada ao ébrio63 Anotese ainda que motivo fútil e motivo injusto não se confundem todo crime é injusto pois o sujeito passivo não é obrigado a suportálo embora nem sempre seja fútil Motivo torpe é o vil repugnante abjeto moralmente reprovável Exemplo matar um parente para ficar com a sua herança Fundamentase a maior quantidade de pena pela violação do sentimento comum de ética e de justiça A vingança não caracteriza automaticamente a torpeza Será ou não torpe dependendo do motivo que levou o indivíduo a vingarse de alguém Exemplos 1 Não é torpe a conduta do pai que mata o estuprador de sua filha Ao contrário tratase de relevante valor moral privilégio nos moldes do art 121 1º do Código Penal e 2 É torpe o ato de um traficante consistente em matar outro vendedor de drogas que havia no passado dominado o controle do tráfico na favela então gerenciada pelo assassino Ressaltese que por absoluta incompatibilidade um motivo não pode ser simultaneamente fútil e torpe Uma motivação exclui a outra Pode ser fútil ou torpe mas nunca ambos Essa agravante genérica repousa na conexão ou seja na ligação entre dois ou mais crimes A conexão pode ser teleológica quando o crime é praticado para facilitar ou assegurar a execução de outro crime exemplo furtar um banco para com o dinheiro adquirir um carro roubado ou consequencial na hipótese em que o crime é cometido para facilitar ou assegurar a ocultação a impunidade ou a vantagem de outro crime exemplo coagir uma testemunha para não incriminar em juízo o autor de um tráfico de drogas Cuidase em verdade de uma forma especial de motivo torpe pois buscar de qualquer modo com um crime executar outro delito ocultálo dele escapar ou em razão dele lucrar revela a intensa depravação moral do agente Configurase a agravante genérica mesmo que não seja iniciado o crime almejado pelo agente Basta sua intenção de cometêlo Contudo quando forem realizados os dois delitos por eles responderá o sujeito em concurso material CP art 69 Valeuse o legislador da interpretação analógica ou intra legem O dispositivo contém uma fórmula casuística seguida de uma fórmula genérica Isso quer significar que a traição a emboscada e a dissimulação dificultam ou impossibilitam a defesa do ofendido Mas não é só pois outros recursos similares como a surpresa e a superioridade de armas também podem fazêlo Por coerência legal deve ser uma situação semelhante à traição à emboscada e à dissimulação Traição é a deslealdade a perfídia a quebra da confiança que o ofendido depositava no responsável pelo crime Pode ser material ou objetiva exemplo agredir um amigo durante seu sono ou moral ou subjetiva exemplo atrair a vítima embriagada para o alto de uma ponte e de lá empurrála rumo ao chão Emboscada é a tocaia a cilada ou seja aguardar escondido a passagem da vítima para repentinamente atacála Dissimulação é o disfarce a ocultação da vontade criminosa para agredir a vítima descuidada Exemplo fingirse funcionário de uma empresa de telefonia para ingressar na residência de alguém e ofender sua integridade corporal O legislador uma vez mais utiliza a interpretação analógica Dessa vez contudo relacionada aos meios de execução do crime Há nesse dispositivo três gêneros e quatro espécies O primeiro gênero é o meio insidioso que tem como espécie o emprego de veneno O outro gênero é o meio cruel dele resultando as espécies emprego de fogo e de tortura Por fim perigo comum é gênero e o explosivo e o fogo suas espécies Meio insidioso é o que revela estratagema ou seja é o dissimulado em sua capacidade danosa Exigese seja empregado subrepticiamente isto é sem ser notado pela vítima O exemplo legal é o veneno definido como qualquer substância química ou não que pode ferir ou matar quando inoculada no organismo humano Meio cruel é o que inflige à vítima um intenso e desnecessário sofrimento para alcançar o resultado desejado revelando a insensibilidade do agente O dispositivo legal apresenta dois exemplos fogo e tortura Como a lei autoriza a interpretação analógica pode ser ainda citada a asfixia O emprego de veneno se introduzido à força no organismo da vítima caracteriza meio cruel Meio de que possa resultar perigo comum é aquele que além de proporcionar sofrimento intenso e exagerado à vítima pode também colocar em risco um número indeterminado de pessoas A lei aponta como exemplos o explosivo e o fogo esse último quando oferece perigo a diversas pessoas O fundamento dessa agravante genérica repousa na apatia moral do agente que se prevalece de relações familiares para a prática do crime transgredindo o dever de auxílio recíproco existente entre parentes e pessoas ligadas pelo matrimônio O sujeito deve efetivamente aproveitarse das facilidades que o parentesco ou o matrimônio lhe proporcionam pois caso contrário não terá incidência o dispositivo legal O parentesco pode ser civil ou natural pois o art 227 6º da Constituição Federal proíbe qualquer discriminação entre os filhos havidos ou não do casamento Não ingressam na agravante genérica porém as relações decorrentes do parentesco por afinidade tais como sogra e genro cunhados etc De seu turno a união estável não autoriza a aplicação da agravante genérica em face da inadmissibilidade da analogia in malam partem no Direito Penal Exigese para a incidência da agravante prova documental da relação de parentesco ou do vínculo matrimonial De fato a prova do estado das pessoas deve observar as restrições estabelecidas na lei civil CPP art 155 parágrafo único com a redação alterada pela Lei 116902008 Legitimase a exasperação da pena em face da violação dos postulados de solidariedade e de assistência que devem reinar nas situações ali descritas A expressão abuso de autoridade relacionase ao direito privado exemplo tutor e tutelado Excluemse as relações de direito público Deve existir um vínculo de dependência entre o agente e a vítima Caracterizase pelo mau uso que dela se faz pelo excesso ou pela violência fora dos casos de exercício de cargo ofício ministério ou profissão64 Relações domésticas são as criadas entre os membros de uma família podendo ou não existir ligações de parentesco exemplo patrão e babá de seu filho No tocante à união estável em que não é possível sua equiparação ao cônjuge para agravação da pena nada impede a inserção da companheira ou do companheiro nessa alínea prevalecendose das relações domésticas Coabitação é a moradia sob o mesmo teto ainda que por breve período exemplo moradores de uma república de estudantes Deve ser lícita e conhecida dos coabitantes Pode ser voluntária fortuita ou ainda coativa como ocorre na carcerária Hospitalidade é a recepção eventual durante a estadia provisória na residência de alguém sem necessidade de pernoite exemplo receber amigos para um jantar Afastase a relação de hospitalidade quando o agente ingressa clandestina ou astuciosamente ou ainda com violência na moradia do hospedeiro uma vez que depende do seu consentimento para caracterizar se Esses três últimos casos de relações domésticas coabitação e hospitalidade devem existir ao tempo do crime nada importando tenha sido o delito praticado fora do âmbito da relação doméstica ou do local que ensejou a coabitação ou a hospitalidade Incide a agravante genérica exemplificativamente quando o morador de uma república subtrai bens de um colega que com ele divide a residência em momento no qual estavam no interior de um ônibus no transporte à faculdade A parte final do dispositivo legal ou com violência contra a mulher na forma da lei específica foi acrescentada pela Lei 113402006 Lei Maria da Penha Essa inovação legislativa não trouxe nenhuma utilidade prática pois a violência doméstica ou familiar contra a mulher já funcionava como agravante genérica nessa alínea prevalecendose das relações domésticas ou na alínea anterior contra ascendente descendente irmão ou cônjuge Essa alínea prevê duas agravantes diversas abuso de poder e violação de dever O abuso de poder e a violação de dever inerente a cargo têm como principal característica serem praticados por funcionários públicos ou então por particulares ligados a cargos públicos contra funcionários públicos entre si ou contra o público em geral Pressupõem no agente a condição de funcionário público e o crime deve ser cometido no desempenho do cargo público ou seja é imprescindível que se beneficie o agente da sua condição funcional para cometer o ilícito penal Ligamse assim ao exercício do poder público e do cargo público de maneira ilegítima e excessiva com violação das regras de Direito Público Cargo público é o lugar instituído na organização do serviço público com denominação própria atribuições e responsabilidades específicas e estipêndio correspondente para ser provido e exercido por um titular na forma estabelecida em lei65 O abuso de poder e a violação de dever inerente a cargo podem em determinadas circunstâncias configurar crime autônomo e não atuar como agravante genérica Exemplo violação de sigilo funcional CP art 325 Quando o sujeito for punido pelo crime de abuso de autoridade tipificado pela Lei 48981965 afastase essa agravante genérica para evitar o bis in idem Já a expressão violação de dever inerente a ofício ministério ou profissão se refere a atividades de natureza privada Ofício é a atividade remunerada e predominantemente manual Exemplo mecânico de automóveis Ministério diz respeito ao exercício de um culto religioso Exemplo padre ou pastor de uma igreja Deve tratarse de religião reconhecida e permitida pelo Estado Profissão por sua vez é remunerada e reclama conhecimentos restritos e especializados com predominância do fator intelectual Exemplos advogado engenheiro médico etc Essa agravante genérica fundamentase na situação de fragilidade ou debilidade da vítima na facilidade que encontra o agente para cometer o delito e na sua covardia Essas pessoas indubitavelmente têm menor chance de defesa Criança é a pessoa de até 12 anos de idade incompletos ECA Lei 80691990 art 2º caput Quanto ao idoso é dizer pessoa maior de 60 anos essa redação se deve à entrada em vigor da Lei 107412003 Estatuto do Idoso Adotouse um critério cronológico com o abandono do termo velho É necessário o nexo de dependência entre a situação de fragilidade do ofendido e o crime praticado Exemplo um idoso pode ser alvo fácil de lesões corporais mas não necessariamente o será para um estelionato Enfermo é o indivíduo que em decorrência de alguma doença permanente ou transitória enfrenta debilidade em sua capacidade física ou mental É em suma a pessoa portadora de deficiência física ou mental Aqui também se exige o nexo entre o crime praticado e a enfermidade da vítima Exemplo um furto contra um cego autoriza a agravante genérica ao contrário de igual crime cometido contra pessoa resfriada já que tal doença não deixa de constituirse em uma deficiência do corpo humano Mulher grávida para justificar a agravante deve ser aquela em estágio avançado da gestação capaz de tornála mais vulnerável às investidas criminosas e desde que a sua peculiar condição facilite a prática do delito Em qualquer das hipóteses o agente deve ter ciência da situação de fragilidade da vítima pois não se admite a responsabilidade penal objetiva66 Nessa situação é mais grave a punição porque quem se encontra sob a proteção do Estado não deve ser ofendido por condutas criminosas Diante da proteção do poder público o agente revela destemor e incredulidade com a força dos poderes constituídos merecendo mais rigorosa reprovação Proteção imediata significa guarda dependência sujeição Destarte enquadrase nessa agravante o resgate de preso para ser morto por facção rival mas não o crime cometido contra vítima que se encontrava ao lado de um policial Nessa alínea o Código Penal mais uma vez se utiliza da interpretação analógica ou intra legem Essa agravante genérica justificase pela insensibilidade moral do agente que não observa os mais comezinhos postulados de fraternidade e de solidariedade humana e se aproveita de situações calamitosas ou de desgraça particular da vítima que se encontra em posição de inferioridade para praticar um crime Calamidade pública é o acidente generalizado a tragédia que engloba um número indeterminado de pessoas Exemplo roubo cometido durante incêndio em uma universidade durante o período letivo Desgraça particular do ofendido por outro lado é o acidente ou tragédia relativo a uma pessoa ou a um grupo determinado de pessoas Exemplo saque dos bens da vítima logo após o capotamento do seu automóvel Nessa situação punese com maior rigor para evitar que pessoas se embriaguem buscando encorajamento para a prática de infrações penais bem como a exclusão da imputabilidade penal Utilizase a teoria da actio libera in causa Capítulo 28 item 28148 A terminologia utilizada pelo legislador é inadequada Afigurase equivocado falarse em agravante no concurso de pessoas Concurso de pessoas em termos técnicos é a colaboração de dois ou mais agentes culpáveis para a prática de uma infração penal E como a pluralidade de agentes culpáveis é um dos traços característicos do instituto essa expressão é imprópria pois os incisos II e III do art 62 dizem respeito a dois típicos casos de autoria mediata Como se sabe não há concurso de pessoas na autoria mediata pois os envolvidos não são dotados de culpabilidade o que inviabiliza consequentemente o vínculo subjetivo entre eles Faltam pois requisitos do instituto delineado pelo art 29 caput do Código Penal É bom saber portanto que nesse dispositivo legal o Código Penal impropriamente utiliza a expressão concurso de pessoas para referirse aos crimes praticados com qualquer tipo de atuação de duas ou mais pessoas mas não obrigatoriamente nos moldes do seu art 29 caput Promover ou organizar a cooperação no crime ou dirigir a atividade dos demais criminosos consiste em arquitetar mentalmente a estrutura do delito de modo a permitir a operacionalização da conduta ilícita É o que se dá com o autor intelectual bem como com o autor de escritório maestros de toda a empreitada criminosa Reclamase para incidência da agravante a real hierarquia do agente sobre os demais comparsas Logo não há aumento da pena na hipótese de simples sugestão quanto à prática da infração penal Por esse motivo é imprescindível nesse caso o ajuste prévio desnecessário no concurso de pessoas capaz de identificar a subserviência de um ou mais indivíduos em relação ao líder Em nosso sistema penal o autor intelectual mentor do crime não é propriamente autor e sim partícipe Com efeito não realiza o núcleo do tipo incriminador mas de qualquer modo concorre para o crime E em face da adoção como regra da teoria unitária ou monista no concurso de pessoas é possível seja o autor intelectual punido mais gravemente do que o autor propriamente dito executor Sua culpabilidade certamente é mais acentuada já que sem a sua contribuição moral o crime não se concretizaria Cumpre destacar a inexistência de bis in idem na atividade judicial que depois de reconhecer a participação aplica essa agravante genérica Seus motivos e finalidades são distintos Na verdade nem todo partícipe merece a agravante genérica uma vez que concorrer para o crime não importa necessariamente em promover ou organizar a cooperação no crime ou dirigir a atividade dos demais agentes Em síntese a agravante prevista no art 62 inc I do Código Penal não é incompatível com a participação a exemplo do que ocorre com o mandante do delito Mas sua incidência não é automática pois reclama comprovação no caso concreto Na visão do Superior Tribunal Justiça Em princípio não é incompatível a incidência da agravante do art 62 I do CP ao autor intelectual do delito mandante O art 62 I do CP prevê que A pena será ainda agravada em relação ao agente que I promove ou organiza a cooperação no crime ou dirige a atividade dos demais agentes Em princípio não há que se falar em bis in idem em razão da incidência dessa agravante ao autor intelectual do delito mandante De acordo com a doutrina a agravante em foco objetiva punir mais severamente aquele que tem a iniciativa da empreitada criminosa e exerce um papel de liderança ou destaque entre os coautores ou partícipes do delito coordenando e dirigindo a atuação dos demais fornecendo por exemplos dados relevantes sobre a vítima determinando a forma como o crime será perpetrado emprestando os meios para a consecução do delito independente de ser o mandante ou não ou de quantas pessoas estão envolvidas Há inclusive precedente do STF Tribunal Pleno AO 1046RR DJe 2262007 indicando a possibilidade de coexistência da agravante e da condenação por homicídio na qualidade de mandante Entretanto não obstante a inexistência de incompatibilidade entre a condenação por homicídio como mandante e a incidência da agravante do art 62 I do CP devese apontar elementos concretos suficientes para caracterizar a referida circunstância agravadora Isso porque se o fato de ser o mandante do homicídio não exclui automaticamente a agravante do art 62 I do CP também não obriga a sua incidência em todos os casos67 Coagir é obrigar alguém com emprego de violência ou grave ameaça de forma irresistível ou não a cometer um crime A coação física irresistível exclui a conduta e portanto o fato típico A coação moral irresistível por outro lado exclui a culpabilidade por inexigibilidade de conduta diversa Somente o coator responde pelo crime Se entretanto for resistível a coação há concurso de pessoas Mas o coagido em razão da pressão suportada terá a pena atenuada CP art 65 III c 1ª parte A agravante genérica recairá sobre o coator tanto na coação física como na coação moral irresistíveis ou resistíveis A lei não permite nenhum tipo de exceção Induzir é fazer surgir na mente de outrem o propósito criminoso até então inexistente Não há violência ou grave ameaça apenas sugestão Com a incidência da agravante genérica o partícipe quem induz será em tese apenado com mais vigor do que o autor executor material Instigar é reforçar a ideia criminosa já existente Determinar é ordenar a prática do delito Exigese esteja o executor do crime sob a autoridade de quem instiga ou determina A lei se refere a qualquer espécie de relação ou subordinação pública ou privada religiosa ou profissional e até mesmo doméstica Basta ser capaz de influir no espírito do agente e dependendo do seu grau pode configurar uma dirimente CP art 22 obediência hierárquica ou uma atenuante genérica CP art 65 III A instigação ou determinação pode dirigirse até mesmo aos inimputáveis pessoas não puníveis em virtude de sua condição ou qualidade pessoal caracterizando a autoria mediata Punese mais gravemente o criminoso mercenário Cuidase de especial forma de motivo torpe caracterizado pela ganância pela ambição desmedida pela cupidez isto é cobiça desejo imoderado de riquezas Na paga a recompensa é anterior à prática do crime Na promessa posterior e não é obrigatório para a aplicação da agravante genérica que seja a recompensa efetivamente recebida É suficiente tenha sido o crime motivado pela crença no ulterior pagamento São duas as atenuantes genéricas menoridade relativa e velhice também denominada de senilidade Menoridade relativa é a atenuante genérica aplicável aos réus menores de 21 anos ao tempo do fato pouco importando a data da sentença Devem ser maiores de 18 anos independentemente de eventual emancipação civil pois do contrário incidem as regras do Estatuto da Criança e do Adolescente Lei 80691990 Essa atenuante foi inicialmente prevista no direito pátrio no Código Criminal do Império de 1830 e desde então não deixou de existir Fundamentase na imaturidade do agente que por tal motivo merece uma pena mais branda suficiente para alcançar suas finalidades de retribuição e prevenção geral e especial De acordo com o parágrafo único do art 155 do Código de Processo Penal com a redação alterada pela Lei 116902008 a prova da idade somente pode ser feita pela certidão de nascimento A jurisprudência entretanto admite outros meios probatórios tais como a carteira de identidade a carteira nacional de habilitação e o certificado de reservista Vejase a propósito a Súmula 74 do Superior Tribunal de Justiça Para efeitos penais o reconhecimento da menoridade do réu requer prova por documento hábil Basta assim qualquer documento juridicamente hábil não se vinculando a prova da menoridade unicamente à certidão de nascimento O art 5º do Código Civil de 2002 pelo qual A menoridade cessa aos 18 dezoito anos completos quando a pessoa fica habilitada à prática de todos os atos da vida civil não revogou essa atenuante genérica por dois fundamentos 1 em se tratando de norma favorável ao réu deveria ter sido revogada expressamente em face da inadmissibilidade no Direito Penal da analogia in malam partem Respeitase desse modo o princípio da reserva legal e 2 os dispositivos penais foram expressamente preservados pelo art 2043 do Código Civil Velhice ou senilidade é a atenuante genérica incidente ao réu maior de 70 setenta anos ao tempo da sentença qualquer que seja a data do fato Fundamentase nas alterações físicas e psicológicas que atingem pessoas em idade avançada aptas a influírem no ânimo criminoso e também na menor capacidade que têm para suportar integralmente a pena que por isso deve ser amenizada Levase em conta a data da publicação da sentença ou seja o dia em que é entregue em mãos do escrivão Em caso de acórdão condenatório isto é decisão do tribunal que reforma a sentença absolutória a idade deve ser aferida na data da sessão de julgamento do recurso de apelação interposto pela acusação Essa regra também não foi modificada com a superveniência da Lei 107412003 Estatuto do Idoso que em seu art 1º considerou idoso o ser humano com idade igual ou superior a 60 anos Com efeito a lei fala em maior de 70 anos e não em idoso situações diversas que comportam tratamento distinto É a posição do Supremo Tribunal Federal em relação à diminuição pela metade do prazo prescricional CP art 115 aplicável a esse dispositivo legal por identidade de razões68 Embora o desconhecimento da lei seja inescusável CP art 21 caput e não afaste o caráter criminoso do fato funciona como atenuante genérica Suavizase no campo penal a regra definida pelo art 3º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro Ninguém se escusa de cumprir a lei alegando que não a conhece De fato subsiste o crime e a responsabilidade penal Cumprese a lei mas é abrandada a pena Justificase essa atenuante pelo fato de o ordenamento jurídico brasileiro ser composto por um emaranhado complexo de leis e atos normativos constantemente revogados e em contínua modificação dificultando por parte do cidadão a exata compreensão do seu significado e do seu alcance Na seara das contravenções penais a ignorância ou a errada compreensão da lei se escusáveis autorizam o perdão judicial LCP art 8º Em seu sentido comum motivo é o que causa ou origina alguma coisa No Direito Penal é o antecedente psíquico da conduta criminosa Os motivos do crime são circunstâncias judiciais importantes na fixação da penabase CP art 59 caput Podem também desempenhar o papel de qualificadora ou de privilégio em determinados crimes como no homicídio doloso ou ainda de agravante CP art 61 II a ou de atenuante genérica como aqui ocorre Para ser reconhecido como atenuante o motivo deve ser relevante isto é importante considerável Para aferirse essa relevância o magistrado adota como parâmetro a figura do homem médio e não o perfil subjetivo do réu Valor social é o que atende aos anseios da coletividade exemplo matar um perigoso estuprador que amedrontava as moradoras de uma pacata cidade Valor moral é o que diz respeito ao agente e está em conformidade com a moralidade e os princípios éticos dominantes exemplo matar o responsável por torturas pretéritas muito tempo depois dos atos de covardia Não se pode confundir a primeira parte procurado por sua espontânea vontade e com eficiência logo após o crime evitarlhe ou minorarlhe as consequências com a figura do arrependimento eficaz CP art 15 No arrependimento eficaz o agente esgota os atos executórios mas impede a consumação do crime Exemplo depois de efetuar disparos de arma de fogo contra a vítima com o intuito de matála arrependese o agente e a leva ao hospital salvandoa da morte Tratase de causa de exclusão da tipicidade pois subsiste somente a responsabilidade penal pelos atos praticados Não há tentativa uma vez que o crime não se consumou por vontade do agente Por sua vez na atenuante genérica o crime se consuma mas o seu responsável procura por sua espontânea vontade e com eficiência logo após o crime impedir ou reduzir as suas consequências Exemplo o sujeito atropela e mata um pai de família mas passa a pagar pensão mensal aos seus herdeiros Atendese à menor reprovabilidade que indica quem passado o ímpeto da ação delituosa procura com eficácia diminuir ou evitar as consequências de sua ação Deve o arrependimento ocorrer logo após ou seja em lapso de tempo que não pode ser exatamente quantificado e que se deve aferir pelos fundamentos da atenuação Por outro lado é preciso que o arrependimento se materialize por espontânea vontade O arrependimento tem de ser eficaz De nada valerão os esforços do agente se não conseguir ele efetivamente evitar ou diminuir as consequências69 Já a parte final do dispositivo ter antes do julgamento reparado o dano precisa ser diferenciada do arrependimento posterior CP art 16 causa obrigatória de diminuição da pena Nesse a reparação do dano ou restituição da coisa deve preceder o recebimento da denúncia ou da queixa enquanto na atenuante genérica é possível a reparação do dano antes do julgamento em 1ª instância Porém aqui também a reparação do dano deve ser integral e efetuada pelo réu livre de coação Destarte se o dano é reparado em razão de condenação no juízo civil não se aplica a atenuante Incide contudo o abrandamento da pena quando a vítima renunciar ao seu direito de crédito ou recusar injustificadamente a indenização Fundamentase essa atenuante genérica em questões de política criminal buscando estimular o acusado mediante a diminuição de sua pena a reparar o dano provocado a um bem jurídico penalmente tutelado Fundamentamse essas atenuantes genéricas pelo fato de ser atacado o juízo de culpabilidade do réu passando sua conduta a apresentar menor reprovabilidade social No tocante à coação a de natureza física e irresistível afasta a conduta do coagido e consequentemente o fato típico por ausência de vontade um dos elementos inerentes ao dolo e à culpa Já a coação moral irresistível exclui a culpabilidade do coagido em face da inexigibilidade de conduta diversa CP art 22 1ª parte Porém se tais coações forem resistíveis haverá concurso de pessoas entre coator e coagido Aquele terá a pena agravada CP art 62 II já em relação a este a reprimenda será atenuada E para aferirse a resistibilidade ou não da coação analisase o perfil do agente e não a figura do homem médio Por sua vez a obediência hierárquica de ordem não manifestamente ilegal exclui a culpabilidade também por inexigibilidade de conduta diversa CP art 22 in fine Somente o superior hierárquico responde pelo crime Todavia se a ordem for manifestamente ilegal tanto o superior hierárquico como o funcionário público subalterno responderão em concurso pelo crime Àquele incidirá uma agravante genérica CP art 62 III enquanto a este uma atenuante genérica pois o subalterno é colocado em difícil posição quando o superior lhe determina a execução de ato ilegal A influência de violenta emoção provocada por ato injusto da vítima também figura como atenuante genérica Se o crime for de homicídio ou de lesões corporais circunstâncias semelhantes caracterizam privilégio CP arts 121 1º e 129 4º Nesses casos porém reclamase o domínio de violenta emoção logo em seguida a injusta provocação da vítima Domínio é mais amplo e mais forte do que influência O primeiro envolve o controle do agente ao passo que a última somente perturba o seu ânimo Mas não é só Na atenuante genérica basta um ato injusto da vítima enquanto no privilégio impõese sua injusta provocação Finalmente no privilégio a reação é imediata logo em seguida ao passo que na atenuante admitese certo hiato temporal uma vez que a lei não condiciona a atuação do agente a determinado período de tempo Para servir como atenuante genérica a confissão há de ser espontânea é dizer deve surgir como fruto da sinceridade do íntimo do agente Não basta ser voluntária livre de coação pois poderia o réu confessar apenas para aproveitarse de um benefício legal sem revelar crível intenção de colaborar na apuração da infração penal70 Para o Supremo Tribunal Federal a simples postura de reconhecimento da prática do delito enseja o reconhecimento desta atenuante genérica pois o art 65 III d do Código Penal não faz qualquer ressalva no tocante à maneira como o agente pronuncia a confissão Além disso esta circunstância possui natureza objetiva razão pela qual independe do subjetivismo do julgador71 Exigese seja a confissão relativa à autoria em sentido amplo para abranger a autoria propriamente dita e a participação e também seja prestada perante a autoridade pública envolvida na persecução penal delegado de Polícia membro do Poder Judiciário ou do Ministério Público Se presente a confissão perante a autoridade pública a circunstância funcionará como atenuante genérica mesmo se existirem outras provas aptas a embasar a condenação A confissão pode ser parcial pois não precisa alcançar eventuais qualificadoras ou causas de aumento da pena72 Seu limite temporal é o trânsito em julgado da condenação O fundamento dessa atenuante é a lealdade processual Na linha da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal Inicialmente acentuouse que a Constituição art 5º LXIII asseguraria aos presos o direito ao silêncio e que o Pacto de São José da Costa Rica art 8º 2 g institucionalizaria o princípio da não autoincriminação nemo denetur se detegere Nesse contexto o chamado réu confesso assumiria postura incomum ao afastarse do instinto do autoacobertamento para colaborar com a elucidação dos fatos do que resultaria a prevalência de sua confissão Em seguida enfatizouse que na concreta situação dos autos a confissão do paciente contribuíra efetivamente para sua condenação e afastara as chances de reconhecimento da tese da defesa técnica no sentido da não consumação do crime Asseverouse que o instituto da confissão espontânea seria sanção do tipo premial e que se assumiria com o paciente postura de lealdade Destacouse o caráter individual personalístico dos direitos subjetivos constitucionais em matéria criminal e como o indivíduo seria uma realidade única afirmouse que todo o instituto de direito penal que se lhe aplicasse deveria exibir o timbre da personalização notadamente na dosimetria da pena73 Como corolário da lealdade processual esta atenuante não é aplicável quando o acusado depois de confessar na fase inquisitiva o seu envolvimento no ilícito penal retratase em juízo Entretanto subsiste a atenuante genérica se as declarações do réu na fase préprocessual em conjunto com as provas apuradas sob o contraditório embasaram a condenação74 A propósito a Súmula 545 do Superior Tribunal de Justiça encontrase assim redigida Quando a confissão for utilizada para a formação do convencimento do julgador o réu fará jus à atenuante prevista no artigo 65 III d do Código Penal Daí decorre porém que não se aplica a atenuante relativa à confissão no inquérito policial posteriormente retratada em juízo se esta não serviu efetivamente para consolidar a sentença condenatória uma vez que outros elementos e circunstâncias da ação penal foram considerados para formar a convicção do julgador a respeito da autoria e materialidade do crime praticado75 A prisão em flagrante do agente não impede por si só o reconhecimento da atenuante da confissão espontânea76 Para o Supremo Tribunal Federal a confissão qualificada na qual o acusado reconhece sua participação no fato típico mas aduz ter agido sob o manto de uma causa de exclusão da ilicitude ou da culpabilidade não autoriza a incidência da atenuante genérica Nessa hipótese a finalidade do réu é exercer sua autodefesa e não contribuir para a descoberta da verdade real A confissão qualificada não é suficiente para justificar a atenuante prevista no art 65 III d do Código Penal A aplicação da atenuante da confissão espontânea prevista no art 65 III d do Código Penal não incide quando o agente reconhece sua participação no fato contudo alega tese de exclusão da ilicitude77 O Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento em sentido contrário A confissão mesmo que qualificada dá ensejo à incidência da atenuante prevista no art 65 III d do CP quando utilizada para corroborar o acervo probatório e fundamentar a condenação78 Finalmente não incide a atenuante genérica nas situações em que o acusado busca minimizar indevidamente sua responsabilidade penal a exemplo do que se verifica quando um traficante confessa a propriedade da droga mas nega sua comercialização aduzindo que o produto se destinava ao consumo próprio ou então quando o autor de um roubo confessa a subtração do bem furto mas nega o emprego de violência ou grave ameaça contra a vítima79 Tratase do crime multitudinário do qual são exemplos as invasões de propriedades rurais as brigas em estádios de futebol etc Pode ser definido como o crime cometido pela multidão em tumulto espontaneamente organizada no sentido de uma conduta comum contra coisas ou pessoas Apurada a autoria do fato todos os seus componentes respondem pelo delito80 Justificase a atenuação da pena na deformação transitória da personalidade que sofre o indivíduo sob a pressão das paixões violentas que agitam o grupo em sublevação A lei toma em conta essa turvação acidental que acomete o espírito dos amotinados em quem falta a serenidade necessária para pesar razões e decidir conforme o Direito atribuindolhe então uma responsabilidade diminuída e com ela a minoração da pena Não podem gozar da atenuante os que provocaram o tumulto Eles mesmos trouxeram a rebeldia para o seio da multidão desencadearam a sua agitação desordenada e embora mais tarde possam passar de condutores a conduzidos não se podem libertar da responsabilidade que pesa sobre eles81 Com efeito a mera provocação de tumulto por si só caracteriza contravenção penal Decretolei 36881941 art 40 O beneficiário da atenuante genérica não pode se valer da premeditação pois tal circunstância afastaria o seu fundamento A quantidade de pessoas para a configuração da multidão fica a critério do juiz No direito canônico da Inquisição falavase em pelo menos 40 pessoas para a formação dessa alma coletiva Não estão especificadas em lei podendo ser qualquer circunstância relevante anterior ou posterior ao crime São também chamadas de atenuantes de clemência pois normalmente o magistrado as concede por ato de bondade Eugenio Raúl Zaffaroni e José Henrique Pierangeli sustentam o cabimento de atenuante dessa estirpe na coculpabilidade isto é situação em que o agente em regra o pobre e marginalizado deve ser punido de modo mais brando pelo motivo de a ele não terem sido conferidas pela sociedade e pelo Estado responsáveis pelo bemestar das pessoas em geral todas as oportunidades para o seu desenvolvimento como ser humano82 O Superior Tribunal de Justiça é preciso destacar não tem admitido a aplicação desta teoria A teoria da coculpabilidade invocada pelo impetrante no lugar de explicitar a responsabilidade moral a reprovação da conduta ilícita e o louvor à honestidade fornece uma justificativa àqueles que apresentam inclinação para a vida delituosa estimulandoos a afastar da consciência mesmo que em parte a culpa por seus atos83 Eventuais bons antecedentes criminais ou antecedentes criminais positivos do réu não podem ser classificados como atenuante inominada pois funcionam como circunstância judicial na 1ª fase da dosimetria da pena privativa de liberdade com fundamento no art 59 caput do Código Penal Na visão do Superior Tribunal de Justiça Não caracteriza circunstância relevante anterior ao crime art 66 do CP o fato de o condenado possuir bons antecedentes criminais A atenuante inominada é entendida como uma circunstância relevante anterior ou posterior ao delito não disposta em lei mas que influencia no juízo de reprovação do autor Excluemse portanto os antecedentes criminais que já são avaliados na fixação da penabase e expressamente previstos como circunstância judicial do art 59 do CP84 Se presentes simultaneamente agravantes e atenuantes genéricas a regra geral é a de que uma neutraliza a eficácia da outra É o que se denomina de equivalência das circunstâncias Excepcionase essa sistemática quando existente alguma circunstância preponderante Como define o art 67 do Código Penal Art 67 No concurso de agravantes e atenuantes a pena deve aproximar se do limite indicado pelas circunstâncias preponderantes entendendose como tais as que resultam dos motivos determinantes do crime da personalidade do agente e da reincidência Há em suma agravantes e atenuantes genéricas mais valiosas do que outras no âmbito da aplicação da pena São as atinentes aos motivos do crime à personalidade do agente e à reincidência Durante muito tempo sustentouse o entendimento de que a menoridade relativa ligada à personalidade era a circunstância preponderante por excelência prevalecia sobre todas as demais uma vez que os menores de 21 anos na vigência do Código Civil de 1916 eram relativamente incapazes Essa posição perdeu seu fundamento de validade depois da entrada em vigor do Código Civil de 2002 que considerou os maiores de 18 anos plenamente capazes para os atos da vida civil Cumpre destacar a diferença entre circunstâncias preponderantes e circunstâncias incompatíveis Nessas uma das circunstâncias tem que desaparecer exemplo o relevante valor moral é incompatível com o motivo fútil enquanto naquelas subsistem todas as agravantes e atenuantes genéricas pesando mais a que prepondera quer para agravar a pena quer para atenuála85 A reincidência agravante genérica e a confissão espontânea atenuante genérica são utilizadas pelo magistrado na segunda fase da dosimetria da pena Além disso ambas possuem natureza preponderante como se extrai do art 67 do Código Penal Mas na hipótese de concurso qual destas circunstâncias legais deve prevalecer Para o Supremo Tribunal Federal a agravante da reincidência prepondera sobre a atenuante da confissão espontânea Nos termos do art 67 do Código Penal no concurso de atenuantes e agravantes a pena deve aproximarse do limite indicado pelas circunstâncias preponderantes No caso sob exame a agravante da reincidência prepondera sobre a atenuante da confissão espontânea razão pela qual é inviável a compensação pleiteada86 O Superior Tribunal de Justiça de seu turno firmou entendimento em sentido contrário A Seção por maioria entendeu que devem ser compensadas a atenuante da confissão espontânea e a agravante da reincidência por serem igualmente preponderantes Segundo se afirmou a confissão revela traço da personalidade do agente indicando o seu arrependimento e o desejo de emenda Assim nos termos do art 67 do CP o peso entre a confissão que diz respeito à personalidade do agente e a reincidência expressamente prevista no referido artigo como circunstância preponderante deve ser o mesmo daí a possibilidade de compensação87 É importante destacar que o Superior Tribunal de Justiça não admite esta compensação na hipótese de réu multirreincidente em respeito aos princípios da proporcionalidade e da individualização da pena De fato tal sujeito apresenta grau de reprovabilidade de comportamento sensivelmente superior àquele que ostenta uma única condenação definitiva Tratandose de réu multirreincidente não é possível promover a compensação entre a atenuante da confissão espontânea e a agravante da reincidência De fato a Terceira Seção do STJ firmou o entendimento de que a atenuante da confissão espontânea pode ser compensada com a agravante da reincidência EREsp 1154752RS DJe 04092012 No entanto tratandose de réu multirreincidente promover essa compensação implicaria ofensa aos princípios da individualização da pena e da proporcionalidade Isso porque a multirreincidência exige maior reprovação do que aquela conduta perpetrada por quem ostenta a condição de reincidente por força apenas de um único evento isolado em sua vida88 3411 O Superior Tribunal de Justiça já admitiu a compensação entre a atenuante da confissão espontânea e a agravante da promessa de recompensa reputandoas como igualmente preponderantes É possível compensar a atenuante da confissão espontânea art 65 III d do CP com a agravante da promessa de recompensa art 62 IV O STJ pacificou o entendimento no sentido de ser possível na segunda fase da dosimetria da pena a compensação da atenuante da confissão espontânea com a agravante da reincidência REsp 1341370MT Terceira Seção DJe 1742013 Esse raciocínio mutatis mutandis assemelhase à presente hipótese por se tratar da possibilidade de compensação entre circunstâncias igualmente preponderantes a saber a agravante de crime cometido mediante paga com a atenuante da confissão espontânea89 A TERCEIRA FASE DA DOSIMETRIA DA PENA CAUSAS DE DIMINUIÇÃO MINORANTES E DE AUMENTO MAJORANTES São circunstâncias obrigatórias ou facultativas de diminuição ou de aumento da pena previstas na Parte Geral ou na Parte Especial do Código Penal e também na legislação especial em quantidade fixa ou variável90 Incidem sobre o montante resultante da segunda fase de aplicação da pena agravantes e atenuantes e não sobre a penabase Ao contrário das circunstâncias judiciais e das atenuantes e agravantes as minorantes e as majorantes podem trazer a pena abaixo do mínimo legal ou levála acima do máximo cominado uma vez que o legislador aponta os limites de diminuição eou de aumento91 Exemplificativamente o preceito secundário do crime de furto simples prevê no tocante à pena privativa de liberdade reclusão de 1 um a 4 quatro anos Se o magistrado aplicar a penabase no mínimo legal mantendose essa reprimenda na segunda fase e presente a figura da tentativa causa geral e obrigatória de diminuição da pena deverá reduzila ao menos no patamar mínimo CP art 14 parágrafo único 13 alcançando a pena final de 8 oito meses muito abaixo do piso legalmente previsto As causas de diminuição e de aumento da pena dividemse em genéricas quando definidas na Parte Geral do Código Penal e aplicáveis à generalidade dos crimes e específicas se contidas na Parte Especial do Código Penal ou na legislação extravagante e de aplicação restrita a determinados delitos Nos termos do art 68 parágrafo único do Código Penal No concurso de causas de aumento ou de diminuição previstas na parte especial pode o juiz limitarse a um só aumento ou a uma só diminuição prevalecendo todavia a causa que mais aumente ou diminua Extraemse desse dispositivo as seguintes conclusões a se existirem duas ou mais causas de aumento ou de diminuição previstas na Parte Geral ambas deverão ser aplicadas desde que obrigatórias Exemplo tentativa CP art 14 parágrafo único e semi imputabilidade CP art 26 parágrafo único causas de diminuição da pena O segundo aumento incide sobre a pena já aumentada pela primeira causa e não sobre a pena obtida na fase das agravantes e atenuantes genéricas É o sistema dos juros sobre juros Há todavia entendimento em sentido diverso sustentando que o segundo aumento deve se calculado sobre a pena inicial e não sobre a pena já aumentada juros sobre o montante original da dívida92 Na hipótese de incidirem duas causas de diminuição a segunda diminuição deve recair sobre o quantum já reduzido pela primeira e não sobre a penabase evitandose a pena zero93 Do contrário imaginese a pena de um ano de reclusão imposta ao condenado semiimputável por tentativa de furto simples Com a primeira diminuição 23 a pena baixaria para 4 quatro meses e com a segunda diminuição 23 calculada sobre a pena inicial a reprimenda seria negativa gerando um absoluto contrassenso b se existirem duas ou mais causas de aumento ou de diminuição previstas na Parte Especial ou na legislação especial analogia in bonam partem o juiz pode limitarse a um só aumento ou a uma só diminuição ainda que obrigatórias prevalecendo nesse caso a causa que mais aumente ou mais diminua Cuidase de faculdade judicial Exemplo crime de incêndio tipificado pelo art 250 caput do Código Penal quando presentes duas ou mais causas de aumento previstas nos incisos I e II do seu 1º Nada impede porém a incidência de todas as causas de aumento ou de diminuição da pena94 As causas de aumento remanescentes deverão ser utilizadas como agravantes genéricas se previstas em lei CP arts 61 e 62 ou residualmente como circunstâncias judiciais desfavoráveis Já as restantes causas de diminuição funcionarão como atenuantes genéricas nominadas CP art 65 ou inominadas art 66 c se existirem uma causa de aumento e uma causa de diminuição simultaneamente ambas deverão ser aplicadas desde que obrigatórias Em primeiro lugar o magistrado aplica as causas de aumento e depois as de diminuição Não pode a sentença fazêlas recair ao mesmo tempo compensandoas Exemplo concurso formal causa de aumento CP art 70 e semiimputabilidade causa de diminuição CP art 26 parágrafo único d se existirem ao mesmo tempo duas causas de aumento ou então duas causas de diminuição previstas uma na Parte Geral e outra na Parte Especial ou legislação especial todas elas serão aplicáveis Por questão de lógica intrínseca à estrutura do tipo penal incidem inicialmente as causas de aumento e de diminuição da Parte Especial ou da legislação especial e posteriormente as majorantes ou minorantes da Parte Geral Concurso entre causas de aumento Ambas da Parte Geral O juiz aplicará os dois aumentos embora a hipótese seja raríssima Ambas da Parte Especial O juiz poderá aplicar a causa que mais aumente art 68 parágrafo único do CP Uma da Parte Geral outra da Parte Especial O juiz aplicará os dois aumentos Concurso entre causas de diminuição Ambas da Parte Geral O juiz aplicará as duas diminuições Ambas da Parte Especial O juiz poderá aplicar a causa que mais diminua art 68 parágrafo único do CP Uma da Parte Geral outra da Parte Especial O juiz aplicará as duas diminuições 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 LUISI Luiz Os princípios constitucionais penais 2 ed Porto Alegre Sergio Fabris 2003 p 54 LYRA Roberto Comentários ao código penal Rio de Janeiro Forense 1942 v II p 172 Parecenos haver inaceitável artificialismo na separação do trabalho do julgador em três fases Duas sem dúvida serão imprescindíveis sempre que existir causa de aumento ou de diminuição a atender Só então surgirá a contingência de fixarse uma penabase Essa designação corrente em nosso meio como entre os comentadores italianos pode ser mantida sem desvantagem Exprimirá a quantidade fundamental da pena sobre a qual se computarão os aumentos e diminuições Não queremos dizer que a verificação não possa tripartirse mas tão só que não há necessidade Nada impede que o juiz no uso dos seus largos poderes complique um pouco mais o seu labor espiritual detendose numa etapa provisória na certeza de que terá imediatamente de alterar o resultado colhido ante a eficácia de agravantes e atenuantes obrigatórias já presentes na sua consciência ao início da operação GARCIA Basileu Instituições de direito penal 4 ed 37 tir São Paulo Max Limonad t II v I 1975 FRANCO Alberto Silva STOCO Rui Código penal e sua interpretação jurisprudencial Parte geral 7 ed São Paulo RT 2001 v 1 p 1233 STF RHC 117037SP rel Min Dias Toffoli 1ª Turma j 08102013 Isso não impede porém sejam previstas agravantes por leis especiais a exemplo do que ocorre no art 298 da Lei 95031997 em relação aos crimes de trânsito Mas no Código Penal estão arroladas na Parte Geral É possível entretanto sua definição também por leis especiais a exemplo do art 14 da Lei 96051998 crimes ambientais Mas no Código Penal encontramse previstas exclusivamente na Parte Geral Súmula 231 do Superior Tribunal de Justiça A incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal HC 106965AC rel Min Ayres Britto 2ª Turma j 19042011 STF RHC 84295RJ rel Min Cezar Peluso 1ª Turma j 29112005 STJ HC 246658SP rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 26082014 12 13 14 15 16 17 18 19 20 Para as duas primeiras fases devese observar os limites mínimo e máximo cominados somente exsurge a possibilidade de diminuição ou de elevação da pena aquém de seu mínimo legal ou além do máximo quando da terceira etapa da aplicação da reprimenda STJ AgRg no AREsp 437391SP rel Min Jorge Mussi 5ª Turma j 27032014 Para o Superior Tribunal de Justiça a fixação do valor mínimo depende de pedido expresso do titular da ação penal Ministério Público ou querelante e pode abranger tantos os danos materiais como também os danos morais causados pela infração penal REsp 1265707RS rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 27052014 e REsp 1585684DF rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 09082016 noticiado no Informativo 588 Nos crimes envolvendo drogas há outras circunstâncias judiciais de natureza preponderante previstas no art 42 da Lei 113432006 O juiz na fixação das penas considerará com preponderância sobre o previsto no art 59 do Código Penal a natureza e a quantidade da substância ou do produto a personalidade e a conduta social do agente STF RHC 117037SP rel Min Dias Toffoli 1ª Turma j 08102013 e STJ AgRg no HC 274128BA rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 19082014 STF AP 971RJ rel Min Edson Fachin 1ª Turma j 28062016 noticiado no Informativo 832 e STJ EDv nos EREsp 1196136RO rel Min Reynaldo Soares da Fonseca 3ª Seção j 24052017 noticiado no Informativo 608 Vejase que algumas das circunstâncias legais que qualificam o homicídio CP art 121 2º I a V funcionam como agravantes genéricas para os demais crimes CP art 61 II a b c e d STF HC 112309MS rel Min Dias Toffoli 1ª Turma j 27112012 noticiado no Informativo 690 Resulta legítima a fixação da penabase acima do mínimo legal com fundamento em apenas uma das circunstâncias judiciais arroladas no art 59 do Código Penal in casu os motivos do crime STF HC 108146GO rel Min Luiz Fux 1ª Turma j 05062012 E mesmo sem fundamentação da decisão judicial a defesa somente teria interesse em questionar sua nulidade na presença de causa de diminuição da pena pois nessa hipótese a pena poderia ser reduzida abaixo do mínimo legal HC 92322PA rel Min Cármen Lúcia 1ª Turma j 21 22 23 24 25 26 11122007 noticiado no Informativo 492 HC 97056DF rel Min Ricardo Lewandowski 1ª Turma j 13102009 noticiado no Informativo 563 Tais circunstâncias judiciais continuam previstas no art 69 do Decretolei 10011969 Código Penal Militar Para fixação da pena privativa de liberdade o juiz aprecia a gravidade do crime praticado e a personalidade do réu devendo ter em conta a intensidade do dolo ou grau da culpa a maior ou menor extensão do dano ou perigo de dano os meios empregados o modo de execução os motivos determinantes as circunstâncias de tempo e lugar os antecedentes do réu e sua atitude de insensibilidade indiferença ou arrependimento após o crime Como se sabe este diploma normativo não foi atingido pela Lei 72091984 Reforma da Parte Geral do Código Penal HC 105674RS rel Min Marco Aurélio Plenário j 17102013 noticiado no Informativo 724 É também o entendimento do STJ O fato de o agente ter se aproveitado para a prática do crime da situação de vulnerabilidade emocional e psicológica da vítima decorrente da morte de seu filho em razão de erro médico pode constituir motivo idôneo para a valoração negativa de sua culpabilidade De fato conforme entendimento do STJ é possível a valoração negativa da circunstância judicial da culpabilidade com base em elementos concretos e objetivos constantes dos autos que demonstrem que o comportamento da condenada é merecedor de maior reprovabilidade de maneira a restar caracterizado que a conduta delituosa extrapolou os limites naturais próprios à execução do crime HC 264459SP rel Min Reynaldo Soares da Fonseca 5ª Turma j 10032016 noticiado no Informativo 579 HC 132990PE rel orig Min Luiz Fux red p o acórdão Min Edson Fachin 2ª Turma j 16082016 noticiado no Informativo 835 Os atos infracionais praticados pelo agente não são classificados como maus antecedentes Atos infracionais não configuram crimes e por isso não é possível considerálos como maus antecedentes nem como reincidência até porque fatos ocorridos ainda na adolescência estão acobertados por sigilo e estão sujeitos a medidas judiciais exclusivamente voltadas à proteção do jovem STJ HC 338936SP rel Min Nefi Cordeiro 6ª Turma j 17122015 noticiado no Informativo 576 HC 95585SP rel Min Ellen Gracie 2ª Turma j 11112008 noticiado no Informativo 528 AO 1046RR rel Min Joaquim Barbosa Plenário j 27 28 29 30 31 32 33 34 35 36 37 23042007 noticiado no Informativo 464 e HC 84088MS rel orig Min Gilmar Mendes rel p o acórdão Min Joaquim Barbosa 2ª Turma j 29112005 noticiado no Informativo 411 RE 591054SC rel Min Marco Aurélio Plenário j 17122014 noticiado no Informativo 772 Na mesma direção HC 122940PI rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 13122016 noticiado no Informativo 851 e RHC 121126AC rel Min Rosa Weber 1ª Turma j 22042014 Inquéritos policias e ações penais em curso não caracterizam maus antecedentes mas podem ser utilizados para justificar a decretação da prisão preventiva como garantia da ordem pública STJ RHC 70698MG rel Min Joel Ilan Paciornik 5ª Turma j 28062016 e para afastar a causa de diminuição da pena contida no art 33 4º da Lei 113432006 Lei de Drogas STJ ERESP 1431091SP rel Min Felix Fischer 3ª Seção j 04122016 HC 117737 rel Min Rosa Weber 1ª Turma j 15102013 No STJ AgRg no AREsp 243109SP rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 05062014 HC 189385RS rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 20022014 STF RE 591054SC rel Min Marco Aurélio Plenário j 17122014 noticiado no Informativo 772 O STJ compartilha deste entendimento REsp 1160440MG rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 17032016 noticiado no Informativo 580 HC 126315SP rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 15092015 noticiado no Informativo 799 STJ HC 225035ES rel Min Rogério Schietti Cruz 6ª Turma j 12082014 e STJ HC 280183SP rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 05082014 HC 189385RS rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 20022014 noticiado no Informativo 535 RHC 130132MS rel Min Teori Zavascki 2ª Turma j 10052016 noticiado no Informativo 825 HC 165089DF rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 16102012 noticiado no Informativo 506 STJ REsp 1243923AM rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 12082014 38 39 40 41 42 43 44 45 46 47 48 HC 332676PE rel Min Ericson Maranho Desembargador convocado do TJSP 6ª Turma j 17122015 noticiado no Informativo 576 STF HC 92274MS rel Min Ricardo Lewandowski 1ª Turma j 19022008 HC 165089DF rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 16102012 noticiado no Informativo 506 E também AgRg no REsp 1446730ES rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 21082014 HC 134193GO rel Min Dias Toffoli 2ª Turma j 26102016 noticiado no Informativo 485 Em se tratando de crime sexual praticado contra menor de 14 anos a experiência sexual anterior e a eventual homossexualidade do ofendido não servem para justificar a diminuição da penabase a título de comportamento da vítima STJ REsp 897734PR rel Min Nefi Cordeiro 6ª Turma j 03022015 noticiado no Informativo 555 HC 284951MG rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 08042014 No mesmo sentido HC 189385RS rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 20022014 noticiado no Informativo 535 STJ REsp 1254749SC rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 06052014 noticiado no Informativo 541 HC 70362RJ rel Min Sepúlveda Pertence 1ª Turma j 05101995 É também o entendimento do Supremo Tribunal Federal Como assentado em precedentes da Suprema Corte a presença de atenuantes não pode levar a pena a ficar abaixo do mínimo e a de agravantes também não pode levar a pena a ficar acima do máximo previsto no tipo penal básico ou qualificado HC 93071RS rel Min Menezes Direito 1ª Turma j 18032008 E ainda RE 597270 QORS rel Min Cezar Peluso Plenário j 26032009 noticiado no Informativo 540 O STJ já admitiu a exasperação da pena em face da incidência de agravante genérica em fração superior a 16 desde que presente motivação idônea em atenção aos princípios da proporcionalidade razoabilidade necessidade e suficiência à reprovação e à prevenção do crime HC 170861SP rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 12082014 e HC 276366SP rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 18062014 RE 453000RS rel Min Marco Aurélio Plenário j 04042013 noticiado no Informativo 700 No STJ AgRg no AREsp 516097MT rel 49 50 51 52 53 54 55 56 Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 07082014 Os atos infracionais praticados pelo agente não servem como pressuposto da reincidência Atos infracionais não configuram crimes e por isso não é possível considerálos como maus antecedentes nem como reincidência até porque fatos ocorridos ainda na adolescência estão acobertados por sigilo e estão sujeitos a medidas judiciais exclusivamente voltadas à proteção do jovem STJ HC 338936SP rel Min Nefi Cordeiro 6ª Turma j 17122015 noticiado no Informativo 576 FARIA Bento Código Penal brasileiro comentado Rio de Janeiro Record 1961 v III p 44 HC 200900RJ rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 27092012 noticiado no Informativo 505 Contudo estará caracterizado um mau antecedente Para o STF Condenações transitadas em julgado após o cometimento dos crimes objeto da condenação são aptas a desabonar na primeira fase da dosimetria os antecedentes criminais para efeito de exacerbação da pena base CP art 59 STF HC 117737SP rel Min Rosa Weber 1ª Turma j 15102013 É também o entendimento do STJ AgRg no AREsp 243109SP rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 05062014 STF RHC 88022RJ rel Min Sepúlveda Pertence 1ª Turma j 28032006 HC 453437SP rel Min Reynaldo Soares da Fonseca 5ª Turma j 04102018 noticiado no Informativo 636 E também REsp 1672654SP rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 21082018 noticiado no Informativo 632 HC 103969MS rel Min Ricardo Lewandowski 1ª Turma j 21092010 noticiado no Informativo 601 No STJ É firme o entendimento deste Superior Tribunal no sentido de que a folha de antecedentes criminais é documento hábil e suficiente a comprovar os maus antecedentes e a reincidência não sendo pois obrigatória a apresentação de certidão cartorária HC 175538SP rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 11042013 E também HC 284910MS rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 26082014 Antes da reforma da Parte Geral pela Lei 72091984 o Código Penal preceituava que estava presente a reincidência específica quando da mesma natureza os crimes E consideravamse crimes da mesma natureza os previstos no mesmo dispositivo legal bem como os que embora 57 58 59 60 61 62 63 64 65 66 67 68 69 70 previstos em dispositivos diversos apresentassem pelos seus fatos constitutivos ou por seus motivos determinantes caracteres fundamentais comuns As consequências da reincidência específica eram a aplicação da pena privativa de liberdade acima da metade da soma do mínimo com o máximo e a aplicação da pena mais grave em qualidade dentre as cominadas alternativamente art 46 1º II e 2º e art 47 I e II LYRA Roberto Comentários ao Código Penal Rio de Janeiro Forense 1942 v II p 280 e ss STJ HC 390038SP rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 06022018 noticiado no Informativo 619 Há exceções a essa regra Confirase a propósito o Capítulo 33 item 337 Há posições em contrário É o caso de NUCCI Guilherme de Souza Código Penal comentado 6 ed São Paulo RT 2006 p 380 REsp 1243516SP rel Min Reynaldo Soares da Fonseca 5ª Turma j 22092016 noticiado no Informativo 590 STJ AgRg no REsp 1289181SP rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 17102013 STJ REsp 908396MG rel Min Arnaldo Esteves Lima 5ª Turma j 03032009 SABINO JÚNIOR Vicente Direito penal São Paulo Sugestões Literárias 1967 v II p 358 MEIRELLES Hely Lopes Direito administrativo brasileiro 32 ed atual por Eurico de Andrade Azevedo Délcio Balestero Aleixo e José Emmanuel Burle Filho São Paulo Malheiros 2006 p 417 STJ HC 284951MG rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 08042014 REsp 1563169DF rel Min Reynaldo Soares da Fonseca 5ª Turma j 10032016 noticiado no Informativo 580 HC 89969RJ rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 26062007 FRAGOSO Heleno Cláudio Lições de direito penal parte geral 15 ed rev e atual por Fernando Fragoso Rio de Janeiro Forense 1994 p 340 341 Entretanto o Superior Tribunal de Justiça já decidiu ser prescindível a 71 72 73 74 75 76 77 78 79 80 81 82 espontaneidade bastando que haja apenas a voluntariedade HC 117764SP rel Min Og Fernandes j 27102009 6ª Turma noticiado no Informativo 413 HC 106376MG rel Min Cármen Lúcia 1ª Turma j 01032011 noticiado no Informativo 618 O fato de o denunciado por furto qualificado pelo rompimento de obstáculo ter confessado a subtração do bem apesar de ter negado o arrombamento é circunstância suficiente para a incidência da atenuante da confissão espontânea art 65 III d do CP Isso porque consoante entendimento sufragado no âmbito do STJ mesmo que o agente tenha confessado parcialmente os fatos narrados na exordial acusatória deve ser beneficiado com a atenuante genérica da confissão espontânea STJ HC 328021SC rel Min Leopoldo de Arruda Raposo Desembargador convocado do TJPE 5ª Turma j 03092015 noticiado no Informativo 569 HC 101909MG rel Min Ayres Britto 2ª Turma j 28022012 noticiado no Informativo 656 STF HC 91654PR rel Min Carlos Britto 1ª Turma j 08042008 noticiado no Informativo 501 STJ AgRg no REsp 1332113SP rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 05122013 HC 135666RJ rel Min Og Fernandes 6ª Turma j 22022011 noticiado no Informativo 464 HC 119671SP rel Min Luiz Fux 1ª Turma j 05112013 EREsp 1416247GO rel Min Ribeiro Dantas 3ª Seção j 22062016 noticiado no Informativo 586 E também AgRg no REsp 1198354ES rel Min Jorge Mussi 5ª Turma j 16102014 noticiado no Informativo 551 STJ HC 301063SP rel Min Gurgel de Faria 5ª Turma j 03092015 noticiado no Informativo 569 JESUS Damásio E de Da codelinquência em face do novo Código Penal São Paulo RT 1976 p 83 BRUNO Aníbal Das penas Rio de Janeiro Editora Rio 1976 p 143 ZAFFARONI Eugenio Raúl PIERANGELI José Henrique Manual de direito penal brasileiro Parte geral 7 ed São Paulo RT 2007 v 1 p 83 84 85 86 87 88 89 90 91 92 93 525 HC 172505MG rel Min Gilson Dipp 5ª Turma j 31052011 Em igual sentido HC 187132MG rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 05022013 REsp 1405989SP rel para o acórdão Min Nefi Cordeiro 6ª Turma j 18082015 noticiado no Informativo 569 VERGARA Pedro Das circunstâncias atenuantes no direito penal vigente Rio de Janeiro Bofoni 1948 p 5054 RHC 120677SP rel Min Ricardo Lewandowski 2ª Turma j 18032014 EREsp 1154752RS rel Min Sebastião Reis Júnior 3ª Seção j 23052012 noticiado no Informativo 498 Com igual conclusão REsp 1341370MT rel Min Sebastião Reis Júnior 3ª Seção j 10042013 noticiado no Informativo 522 O STJ estende essa conclusão ao concurso entre a atenuante da confissão espontânea com a agravante do crime ter sido praticado com violência contra a mulher art 65 III d do CP AgRg no AREsp 689064RJ rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 06082015 noticiado no Informativo 568 AgRg no REsp 1424247DF rel Min Nefi Cordeiro 6ª Turma j 03022015 noticiado no Informativo 555 HC 318594SP rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 24022016 noticiado no Informativo 577 A quantidade do aumento ou da diminuição deve ser avaliada no caso concreto A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal não admite o tabelamento das penas representado por percentuais previamente definidos RHC 116676MG rel Min Ricardo Lewandowski 2ª Turma j 20082013 noticiado no Informativo 716 STF RE 453000RS rel Min Marco Aurélio Plenário j 04042013 noticiado no Informativo 700 É o que pensam entre outros SHECAIRA Sérgio Salomão e CORRÊA JUNIOR Alceu Teoria da pena finalidades direito positivo jurisprudência e outros estudos de ciência criminal São Paulo RT 2002 p 283284 JESUS Damásio E de Código Penal anotado 15 ed São Paulo Saraiva 2004 p 249 94 Acentuou que a previsão do art 68 do CP estabeleceria sob o ângulo literal apenas uma possibilidade de atuação STF HC 110960DF rel Min Luiz Fux 1ª Turma j 19082014 noticiado no Informativo 755 As penas restritivas de direitos são também chamadas de penas alternativas pois têm o propósito de evitar a desnecessária imposição da pena privativa de liberdade nas situações expressamente indicadas em lei relativas a indivíduos dotados de condições pessoais favoráveis e envolvidos na prática de infrações penais de reduzida gravidade Buscase a fuga da pena privativa de liberdade reservada exclusivamente para situações excepcionais aplicandose em seu lugar a restrição de um ou mais direitos do condenado1 Falase atualmente em falência da pena de prisão provocada por diversos motivos e notadamente por seu fator criminógeno A privação da liberdade em vez de combater a delinquência muitas vezes a estimula Não traz benefícios ao condenado proporcionando ao contrário abertura para vícios e degradações morais2 Para o Supremo Tribunal Federal As penas restritivas de direitos são em essência uma alternativa aos efeitos certamente traumáticos estigmatizantes e onerosos do cárcere Não é à toa que todas elas são comumente chamadas de penas alternativas pois essa é mesmo a sua natureza constituirse num substitutivo ao encarceramento e suas sequelas E o fato é que a pena privativa de liberdade corporal não é a única a cumprir a função retributivoressocializadora ou restritivopreventiva da sanção penal As demais penas também são vocacionadas para esse geminado papel da retribuiçãoprevençãoressocialização e ninguém melhor do que o juiz natural da causa para saber no caso concreto qual o tipo alternativo de reprimenda é suficiente para castigar e ao mesmo tempo recuperar socialmente o apenado prevenindo comportamentos do gênero3 Nos moldes do art 43 do Código Penal Art 43 As penas restritivas de direitos são I prestação pecuniária II perda de bens e valores III Vetado IV prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas V interdição temporária de direitos VI limitação de fim de semana As duas primeiras penas restritivas de direitos prestação pecuniária e perda de bens e valores foram criadas pela Lei 97141998 enquanto as demais já existiam no Código Penal Esse rol é exaustivo Portanto não pode o magistrado no caso concreto criar outra espécie de pena alternativa O inciso III vetado pelo Presidente da República previa a pena de recolhimento domiciliar Amparouse o veto na alegação de impossibilidade de fiscalização de pena dessa natureza nada obstante sua existência no art 8º V da Lei 96051998 Lei dos Crimes Ambientais que a define no art 13 O recolhimento domiciliar baseiase na autodisciplina e senso de responsabilidade do condenado que deverá sem vigilância trabalhar frequentar curso ou exercer atividade autorizada permanecendo recolhido nos dias e horários de folga em residência ou em qualquer local destinado a sua moradia habitual conforme estabelecido na sentença condenatória As penas restritivas de direitos são efetivamente penas independentemente da ausência de privação da liberdade Muitas delas foram assim definidas expressamente pelo art 5º XLVI da Constituição Federal que apresenta um rol exemplificativo ao estatuir que a lei regulará a individualização da pena e adotará entre outras as seguintes Possuem duas características marcantes indicadas pelos arts 44 e 54 do Código Penal substitutividade e autonomia As penas restritivas de direitos são substitutivas porque resultam do procedimento judicial que depois de aplicar uma pena privativa de liberdade efetua a sua substituição por uma ou mais penas restritivas de direitos desde que presentes os requisitos legais Isso ocorre em razão de os tipos penais não possuírem no preceito secundário a previsão direta de penas restritivas de direitos as quais estão definidas pela Parte Geral do Código Penal De fato os tipos incriminadores depois de definirem a conduta criminosa não dizem exemplificativamente Pena prestação de serviços à comunidade por 1 um ano A Lei 113432006 Lei de Drogas contudo abriu nítida exceção a essa regra no tocante ao crime tipificado pelo art 28 posse de droga para consumo pessoal ao qual não se impõe pena privativa de liberdade mas imediatamente penas restritivas de direitos consistentes em advertência sobre os efeitos das drogas prestação de serviços à comunidade e medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo As penas restritivas de direitos são também dotadas de autonomia isto é uma vez substituídas não podem ser cumuladas com a pena privativa de liberdade Em suma o magistrado deve aplicar isoladamente uma pena privativa de liberdade para em seguida substituíla por uma ou mais restritivas de direitos É vedado contudo somálas Além disso durante a execução penal o Poder Judiciário deve regular o cumprimento da pena restritiva de direitos olvidandose da pena privativa de liberdade exceto se for necessário o seu restabelecimento nas hipóteses extraordinariamente previstas em lei 3551 A Lei 95031997 Código de Trânsito Brasileiro todavia previu em diversos delitos a aplicação conjunta de penas privativa de liberdade e restritiva de direitos como se observa dos arts 302 homicídio culposo na direção de veículo automotor 303 lesão corporal culposa na direção de veículo automotor 306 embriaguez ao volante 307 violação de proibição ou restrição para direção de veículo automotor e 308 participação em competição não autorizada E se não bastasse afirmou expressamente em seu art 292 A suspensão ou a proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor pode ser imposta como penalidade principal isolada ou cumulativamente com outras penalidades4 Dispõe o art 55 do Código Penal que as penas restritivas de direitos de prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas interdição temporária de direitos e limitação de fim de semana têm a mesma duração da pena privativa de liberdade substituída Mas a pena de prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas superior a 1 um ano pode ser cumprida em menor tempo nunca inferior à metade da pena privativa de liberdade fixada CP art 46 4º Essa regra não se aplica às penas de prestação pecuniária e perda de bens e valores pois em nada se relacionam com o limite temporal da pena privativa de liberdade substituída Têm notadamente cunho patrimonial e não de restrição de direitos por prazo certo A substituição da pena privativa de liberdade está condicionada ao atendimento de diversos requisitos indicados pelo art 44 I a III do Código Penal de duas ordens objetivos e subjetivos5 No caso concreto se todos os requisitos estiverem presentes o magistrado não poderá negar a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos6 Requisitos objetivos Dizem respeito à natureza do crime e à quantidade da pena aplicada a Natureza do crime Em se tratando de crime doloso deve ter sido cometido sem violência ou grave ameaça à pessoa E na visão do Superior Tribunal de Justiça na hipótese de crime cuja substituição seja vedada pelo Código Penal pouco importa o grau de participação do agente no delito mesmo que de menor importância pois isso constituiria causa de diminuição da pena sem alteração da classificação jurídica do crime de que lhe são meios a violência e a grave ameaça a obstar a pena alternativa7 Quanto à violência imprópria isto é aquela em que não há emprego de força física contra a vítima mas o agente a reduz por qualquer meio à impossibilidade de resistência o entendimento dominante é de não ser possível a substituição pois a violência imprópria nada mais é do que uma forma específica de violência Disso discorda Mirabete sustentando a incidência do benefício ao crime de roubo cometido com o emprego de narcótico8 Discutese também se seria admissível a substituição nos casos de infrações penais de menor potencial ofensivo quando praticadas com emprego de violência ou grave ameaça à pessoa tais como lesão corporal de natureza leve ameaça e constrangimento ilegal Alguns sustentam que seriam pertinentes os benefícios da Lei 90991995 mas não a conversão da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos Destarte em caso de condenação o magistrado deveria limitarse a fixar o regime aberto para o cumprimento da pena ou no máximo conceder o sursis Prevalece contudo entendimento diverso Deveras se é possível até mesmo a composição dos danos civis em determinados casos e frequentemente a transação penal institutos muito mais benéficos não seria pertinente a vedação da substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos Vejase a propósito a exposição de Rogério Greco A primeira indagação que levanta é a seguinte Se uma das finalidades da substituição é justamente evitar o encarceramento daquele que teria sido condenado ao cumprimento de uma pena de curta duração nos crimes de lesão corporal leve de constrangimento ilegal ou mesmo de ameaça onde a violência e grave ameaça fazem parte desses tipos estaria impossibilitada a substituição Entendemos que não pois que se as infrações penais se amoldam àquelas consideradas de menor potencial ofensivo sendo o seu julgamento realizado até mesmo no Juizado Especial Criminal seria um verdadeiro contrassenso impedir justamente nesses casos a substituição Assim se a infração penal for da competência do Juizado Especial Criminal em virtude da pena máxima a ela cominada entendemos que mesmo que haja o emprego de violência ou grave ameaça será possível a substituição9 Na hipótese de crimes culposos entendese ser possível a substituição em todos eles ainda que resulte na produção de violência contra a pessoa tal como no homicídio culposo tanto do Código Penal art 121 3º como do Código de Trânsito Brasileiro art 30210 b Quantidade da pena aplicada Preocupouse o legislador com a pena efetivamente aplicada na situação concreta independentemente daquela cominada pelo preceito secundário do tipo penal Nos crimes dolosos desde que não tenham sido cometidos com emprego de violência ou grave ameaça à pessoa o limite é de 4 quatro anos Em se tratando de concurso de crimes a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos somente será possível quando o total das reprimendas não ultrapasse o limite de quatro anos previsto no art 44 I do CP11 Na hipótese de concurso formal ou de crime continuado levase em conta o total da pena imposta aí se computando o acréscimo legal 16 até 12 no concurso formal ou 16 até 23 no crime continuado No tocante ao concurso material o magistrado fixa na sentença a pena de cada crime separadamente Em seguida analisa também isoladamente em relação a cada delito o cabimento da substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos Se todavia para um dos crimes tiver sido negado o sursis para os demais será incabível a substituição por pena restritiva de direitos CP art 69 1º E quando forem aplicadas penas restritivas de direitos o condenado cumprirá simultaneamente as que forem compatíveis entre si e sucessivamente as demais CP art 69 2º Em relação aos crimes culposos é possível a substituição por pena restritiva de direitos qualquer que seja a quantidade de pena privativa de liberdade imposta b1 A polêmica relacionada ao homicídio culposo na direção de veículo automotor com embriaguez ao volante O art 302 3º da Lei 95031997 Código de Trânsito Brasileiro com a redação dada pela Lei 135462017 prevê a pena de reclusão de cinco a oito anos e suspensão ou proibição do direito de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor quando o agente praticar homicídio culposo na direção de veículo automotor conduzindoo sob a influência de álcool ou de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência Criouse uma figura até então inexistente no Brasil qual seja crime culposo punido com reclusão e de significativa quantidade cinco a oito anos12 Essa mudança baseouse em diversos propósitos Um deles indiscutivelmente foi vedar a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos pois a pena mínima a ser aplicada será superior a quatro anos ultrapassando o limite imposto pelo art 44 inc I do Código Penal13 O legislador se olvidou contudo de um ponto de fundamental importância Cuidase de crime culposo para o qual é cabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos independentemente do montante da sanção aplicada Portanto não se pode impedir a substituição unicamente em razão da quantidade da pena imposta no caso concreto Porém ao menos em tese é possível obstar a substituição em face da ausência do requisito subjetivo exigido pelo art 44 inc III do Código Penal princípio da suficiência Com efeito é difícil visualizar uma situação real em que a culpabilidade os antecedentes a conduta social e a personalidade do condenado bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente na hipótese em que alguém de forma irresponsável e leviana embriagase conduz veículo automotor e elimina a 3552 1 2 vida alheia Requisitos subjetivos Referemse à pessoa do condenado seja ele nacional ou estrangeiro residente no Brasil ou não14 a Não ser reincidente em crime doloso Esse requisito está contido no art 44 II do Código Penal Concluise indiretamente não ser a reincidência em crime culposo impeditiva da substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos E mesmo para o reincidente em crime doloso abrese uma exceção Com efeito se o condenado for reincidente o juiz poderá aplicar a substituição desde que em face de condenação anterior a medida seja socialmente recomendável e a reincidência não se tenha operado em virtude da prática do mesmo crime CP art 44 3º Na ótica do Superior Tribunal de Justiça A reincidência genérica não é motivo suficiente por si só para o indeferimento da substituição da pena privativa de liberdade Nos termos do art 44 3º do Código Penal é possível o deferimento da benesse ao réu reincidente desde que atendidos dois requisitos cumulativos quais sejam ser a medida socialmente recomendável em face da condenação anterior e que não esteja caracterizada a reincidência específica15 Portanto o reincidente em crime doloso pode ser beneficiado pela substituição quando estiverem presentes dois requisitos cumulativos A medida seja socialmente recomendável cuidase de análise subjetiva a ser minuciosamente desenvolvida pelo magistrado levando em conta as condições do caso concreto tais como as circunstâncias do delito e principalmente os dados pessoais do condenado Não se tratar de reincidente específico a lei foi clara ao definir a reincidência específica como a repetição do mesmo crime ou seja da conduta apresentada pelo mesmo tipo penal b Princípio da suficiência Como estatui o art 44 III do Código Penal a culpabilidade os antecedentes a conduta social e a personalidade do condenado bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente A pena restritiva de direitos precisa ser adequada e suficiente para atingir as finalidades da pena Em outras palavras tanto a retribuição do mal praticado pelo crime como a prevenção geral e especial de novos crimes inerentes à pena privativa de liberdade devem ser alcançadas com a pena restritiva de direitos Por corolário não cabe a substituição quando a penabase tiver sido fixada acima do mínimo legal em razão do reconhecimento judicial expresso e fundamentado das circunstâncias desfavoráveis em face do não atendimento do art 44 III do Código Penal16 Em regra os requisitos legais impedem a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos no tocante aos crimes hediondos ou equiparados tráfico de drogas tortura e terrorismo pois a pena aplicada é superior a 4 quatro anos ou então os delitos são cometidos com emprego de 3561 violência à pessoa ou grave ameaça17 Se não bastasse a pena privativa de liberdade imposta a tais crimes deve ser cumprida em regime inicialmente fechado a teor do art 2º 1º da Lei 80721990 com a redação dada pela Lei 114642007 Esse mandamento legal inviabiliza a substituição porque não se admite a incidência do benefício quando a sanção penal tem seu cumprimento obrigatoriamente iniciado no regime mais gravoso incompatível com a simples restrição de direitos É preciso destacar entretanto ter o Supremo Tribunal Federal firmado jurisprudência no sentido da inconstitucionalidade do art 2º 1º da Lei 8072199018 A problemática relacionada ao tráfico de drogas A pena cominada ao crime de tráfico de drogas tanto na forma simples como na modalidade equiparada Lei 113432006 Lei de Drogas art 33 caput e 1º é de reclusão de 5 cinco a 15 quinze anos e 500 a 1500 diasmulta Na sistemática da revogada Lei 63681976 o tráfico era apenado com reclusão de 3 três a 15 quinze anos sem prejuízo da multa art 12 caput O objetivo do legislador ao elevar o patamar mínimo da pena privativa de liberdade inerente ao tráfico de drogas foi afastar a discussão atinente ao cabimento de penas alternativas em delito de tão elevada gravidade equiparado pelo art 5º XLIII da Constituição Federal aos crimes hediondos Contudo nas situações em que o agente for primário e de bons antecedentes não se dedicar a atividades criminosas nem integrar organizações criminosas as penas privativa de liberdade e multa poderão ser reduzidas de 16 um sexto a 23 dois terços nos termos do art 33 4º da Lei 113432006 Nesses casos é possível a aplicação da pena abaixo do teto de 4 quatro anos ao sujeito condenado pelo crime de tráfico de drogas Mas a Lei 113432006 visando afastar qualquer controvérsia impediu expressamente a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos no tráfico de drogas É o que se extrai do próprio art 33 4º e também do art 44 caput Em síntese o povo brasileiro representado pelo Congresso Nacional optou pela impossibilidade de aplicação das penas alternativas ao traficante de drogas independentemente do seu perfil subjetivo e da quantidade da pena imposta O Supremo Tribunal Federal entretanto decidiu pela inconstitucionalidade das regras impeditivas da substituição da pena privativa de liberdade por ofensa ao princípio da individualização da pena Destarte admitese a aplicação de penas restritivas de direitos desde que presentes os requisitos elencados pelo art 44 do Código Penal19 Para conferir eficácia erga omnes à decisão do Supremo Tribunal Federal e amparado no art 52 inc X da Constituição Federal o Senado editou a Resolução nº 5 de 2012 com a seguinte redação É suspensa a execução da expressão vedada a conversão em penas restritivas de direitos do 4º do art 33 da Lei nº 11343 de 23 de agosto de 2006 declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal nos autos do Habeas Corpus nº 97256RS Estabelece o art 17 da Lei 113402006 Lei Maria da Penha É vedada a aplicação nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher de penas de cesta básica ou outras de prestação pecuniária bem como a substituição de pena que implique o pagamento isolado de multa A finalidade desse dispositivo foi eliminar o constrangimento então causado aos juízes membros do Ministério Público advogados e principalmente à mulher vítima dos crimes de ameaça ou lesão corporal de natureza leve que depois de intimidada ou covardemente agredida por seu cônjuge ou companheiro era exposta à humilhação pública de ver em audiência sua liberdade individual ou sua integridade física ser trocada por uma ou algumas poucas cestas básicas gerando o sentimento de revolta de impunidade e de injustiça A Lei Maria da Penha não vedou expressamente a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos em qualquer situação mas somente naquelas expressamente indicadas A jurisprudência contudo visando conferir maior proteção à mulher tem decidido pela proibição total de aplicação de penas restritivas de direitos nos crimes com violência doméstica ou familiar contra ela praticados Na visão do Supremo Tribunal Federal Não é possível a substituição de pena privativa de liberdade por restritiva de direitos ao condenado pela prática do crime de lesão corporal praticado em ambiente doméstico CP art 129 9º na redação dada pela Lei 113402006 A Turma destacou que a substituição da pena privativa de liberdade por sanções restritivas de direitos encontrarseia condicionada ao preenchimento dos requisitos objetivos e subjetivos elencados no art 44 do CP Art 44 As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade quando I aplicada pena privativa de liberdade não superior a quatro anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa ou qualquer que seja a pena aplicada se o crime for culposo II o réu não for reincidente em crime doloso III a culpabilidade os antecedentes a conduta social e a personalidade do condenado bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente Assim a execução do crime mediante o emprego de violência seria circunstância impeditiva do benefício Com advento da Lei 90991995 acentuada parcela da doutrina passara a sustentar que a vedação abstrata prevista no art 44 do CP ao menos em relação aos crimes de menor potencial ofensivo implicaria violação ao princípio da proporcionalidade ou seja não haveria razão para impedir a conversão da reprimenda a autores de delitos que poderiam em tese ser agraciados com a transação penal ou suspensão condicional do processo Essa linha argumentativa porém não teria espaço em relação ao crime de lesão corporal praticado em ambiente doméstico por duas razões a a pena máxima prevista para esse delito três anos a impedir a transação penal Lei 90991995 art 61 e b a existência de comando proibitivo previsto no art 41 da Lei Maria da Penha Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher independentemente da pena prevista não se aplica a Lei nº 9099 de 26 de setembro de 1995 Portanto o principal fundamento aplicação da Lei 90991995 daqueles que militariam pelo abrandamento do art 44 do CP deixaria de existir quando o cenário fosse de crime de lesão corporal no seio familiar Ademais não seria crível imaginar que a Lei Maria da Penha que teria vindo justamente tutelar com maior rigor a integridade física das mulheres tivesse autorizado a substituição da pena corporal mitigando a regra geral do CP que a proíbe Nesse contexto perderia sustento a alegação de que o art 17 da Lei 113402006 autorizaria a substituição de pena Art 17 É vedada a aplicação nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher de penas de cesta básica ou outras de prestação pecuniária bem como a substituição de pena que implique o pagamento isolado de multa21 A propósito o Supremo Tribunal Federal tem igualmente se pronunciado pela impossibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos em sede de contravenção penal cometida com violência doméstica ou familiar contra a mulher A Primeira Turma por maioria indeferiu a ordem de habeas corpus em que solicitada a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos em caso de contravenção penal envolvendo violência doméstica O paciente foi condenado por vias de fato nos termos do art 21 da Lei de Contravenções Penais LCP a vinte dias de prisão simples em regime aberto O juízo de 1º grau concedeu a suspensão condicional da pena sursis pelo prazo de dois anos A Turma julgou improcedente o pedido com base em interpretação extensiva do art 44 I do Código Penal no caso de violência doméstica e familiar contra a mulher em que a noção de crime abarcaria qualquer conduta delituosa inclusive contravenção penal Nesse sentido reconhecida a necessidade de combate à cultura de violência contra a mulher no Brasil o Colegiado considerou a equiparação da conduta do paciente à infração de menor potencial ofensivo incoerente com o entendimento da violência de gênero como grave violação dos direitos humanos22 Esse também é o entendimento consolidado na Súmula 588 do Superior Tribunal de Justiça A prática de crime ou contravenção penal contra a mulher com violência ou grave ameaça no ambiente doméstico impossibilita a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos Não se admite a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos no âmbito dos crimes militares com fundamento no art 44 do Código Penal em face da inaplicabilidade da analogia pois o Decretolei 10011969 Código Penal Militar conferiu tratamento diverso ao tema23 O juiz substitui a pena privativa de liberdade por restritiva de direitos na sentença condenatória Depois de aplicar a pena adequada com obediência ao critério trifásico o magistrado estabelece o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade e finalmente decide sobre o cabimento de pena restritiva de direitos CP art 59 IV Porém se na sentença condenatória o magistrado não tiver aplicado pena restritiva de direitos o art 180 da Lei 72101984 permite a substituição da pena privativa de liberdade não superior a 2 dois anos durante a execução penal desde que I o condenado a esteja cumprindo em regime aberto II tenha sido cumprido pelo menos 14 um quarto da pena e III os antecedentes e a personalidade do condenado indiquem ser a conversão recomendável Nos termos do art 44 2º 1ª parte do Código Penal na condenação igual ou inferior a 1 um ano a substituição pode ser feita por multa ou por uma pena restritiva de direitos É irrelevante seja o crime doloso ou culposo punido com reclusão ou detenção Basta o limite quantitativo pena aplicada igual ou inferior a um a b ano Por sua vez o art 60 2º do Código Penal não alterado pela Lei 97141998 que disciplinou a atual sistemática das penas restritivas de direitos dispõe A pena privativa de liberdade aplicada não superior a 6 seis meses pode ser substituída pela de multa observados os critérios dos incisos II e III do art 44 deste Código Com a análise conjunta dos dois dispositivos art 44 2º 1ª parte e art 60 2º ambos do Código Penal surge a seguinte indagação Para as condenações superiores a 6 seis meses mas iguais ou inferiores a 1 um ano é possível a substituição da pena privativa de liberdade por multa Há duas posições sobre o assunto é possível a substituição pois o art 44 2º 1ª parte mais recente e também mais favorável ao réu revogou o art 60 2º É o entendimento majoritário e não é possível a substituição Os dispositivos devem ser interpretados em conjunto Destarte nas condenações iguais ou inferiores a 6 seis meses a pena privativa de liberdade pode ser substituída por multa ou por uma restritiva de direitos enquanto nas superiores a 6 seis meses e iguais ou inferiores a 1 um ano a pena privativa de liberdade pode ser substituída exclusivamente por uma restritiva de direitos Entretanto se a condenação for superior a 1 um ano a pena privativa de liberdade pode ser substituída por uma pena restritiva de direitos e multa ou por duas restritivas de direitos CP art 44 2º in fine E quando forem aplicadas duas penas restritivas de direitos o condenado cumprirá simultaneamente as que forem compatíveis entre si e sucessivamente as demais CP art 69 2º Essa última disposição não se aplica aos crimes ambientais pois o art 7º inc I da Lei 96051998 contempla regra específica Consequentemente é possível a substituição da pena privativa de liberdade superior a 1 um ano desde que inferior a 4 quatro anos por uma única restritiva de direitos Nos termos do art 44 4º do Código Penal A pena restritiva de direitos convertese em privativa de liberdade quando ocorrer o descumprimento injustificado da restrição imposta No cálculo da pena privativa de liberdade a executar será deduzido o tempo cumprido da pena restritiva de direitos respeitado o saldo mínimo de 30 trinta dias de detenção ou reclusão O dispositivo legal fala em conversão mas deve ser lido como reconversão A pena privativa de liberdade foi convertida em restritiva de direitos mas por força do descumprimento injustificado da restrição imposta reconvertese ao estado original Essa é a interpretação correta É simples o fundamento legal a pena restritiva de direitos consiste em um benefício concedido ao réu Evitase a privação da liberdade em troca da restrição de direitos injustificadamente descumprida pelo condenado Se não há efetiva restrição de direitos necessário restabelecerse a pena privativa de liberdade Exemplos 1 Aplicase a pena de prestação de serviços à comunidade mas o condenado não se submete aos necessários serviços e 2 Substituise a pena privativa de liberdade por prestação pecuniária mas o agente não efetua o pagamento devido à vítima aos seus dependentes ou a entidade pública ou privada com destinação social Cuidase de incidente na execução penal na forma definida pelo art 181 da Lei 72101984 e exige obediência aos princípios do contraditório e da ampla defesa sob pena de nulidade24 A segunda parte do art 44 4º preceitua que no cálculo da pena privativa de liberdade a executar será deduzido o tempo cumprido da pena restritiva de direitos respeitado o saldo mínimo de 30 trinta dias de detenção ou reclusão Exemplo a pena privativa de liberdade foi substituída por prestação de serviços à comunidade por 1 um ano Depois de 10 meses em situação regular o condenado parou de prestar o serviço determinado em juízo ensejando a reconversão para pena privativa de liberdade Nesse caso 35111 faltará ao condenado o cumprimento de 2 dois meses de pena privativa de liberdade Mas deve ser respeitado o saldo mínimo de 30 trinta dias de detenção ou reclusão Destarte se no referido exemplo o condenado tiver prestado serviços à comunidade por 11 meses e 20 dias e faltando 10 dias para o seu integral cumprimento abandonar a pena restritiva de direitos será reconvertida para privativa de liberdade pelo prazo mínimo de 30 dias Em caso de prisão simples decorrente da condenação pela prática de contravenção penal convertida para pena restritiva de direitos não há exigência de período mínimo na hipótese de reconversão para privativa de liberdade Em relação às penas restritivas de direitos de prestação pecuniária e perda de bens e valores em que não existe período de tempo de cumprimento a ser abatido afigurase adequado descontarse da pena privativa de liberdade o percentual do pagamento já efetuado pelo condenado Exemplificativamente se a pena privativa de liberdade de 1 um ano foi substituída por prestação pecuniária no valor de R 100000 mil reais e o condenado pagou somente R 50000 quinhentos reais determinandose a reconversão restará o cumprimento de 6 seis meses da pena privativa de liberdade Reconversão da pena restritiva de direitos em privativa de liberdade e princípio da boafé objetiva A pena restritiva de direitos deve ser reconvertida para privativa de liberdade quando o réu depois de ter participado de todos os atos processuais e ciente da condenação muda seu domicílio sem prévia comunicação ao juízo competente Justificase essa opção com base no princípio da boafé objetiva que deve reger todas as relações jurídicas inclusive entre o agente e o Estado Não há nessa hipótese ofensa aos princípios constitucionais do devido processo legal e da ampla defesa uma vez que o acusado que acompanhou todo o processo de conhecimento tem plena ciência das consequências que lhe são prejudiciais se deixar de cumprir a pena restritiva de direitos aplicada25 35112 Impossibilidade de reconversão da pena restritiva de direitos em privativa de liberdade a pedido do réu Se o juiz ou Tribunal na sentença ou no acórdão substituiu a pena privativa de liberdade por uma ou duas penas restritivas de direitos não se admite a reconversão a pedido do acusado independentemente do regime prisional na hipótese de ele reputar menos gravoso o cumprimento da pena de reclusão ou de detenção Com efeito a aplicação da pena representa uma manifestação da soberania do Estado e sua escolha não pode se sujeitar aos interesses do condenado Na dicção do Superior Tribunal de Justiça Não é possível em razão de pedido feito por condenado que sequer iniciou o cumprimento da pena a reconversão de pena de prestação de serviços à comunidade e de prestação pecuniária restritivas de direitos em pena privativa de liberdade a ser cumprida em regime aberto O art 33 2º c do CP apenas estabelece que o condenado não reincidente cuja pena seja igual ou inferior a 4 quatro anos poderá desde o início cumprila em regime aberto O referido dispositivo legal não traça qualquer direito subjetivo do condenado quanto à escolha entre a sanção alternativa e a pena privativa de liberdade Ademais a escolha da pena e do regime prisional bem como do preenchimento dos requisitos do art 44 do CP inserese no campo da discricionariedade vinculada do magistrado Além disso a reconversão da pena restritiva de direitos imposta na sentença condenatória em pena privativa de liberdade depende do advento dos requisitos legais descumprimento das condições impostas pelo juiz da condenação Por isso não cabe ao condenado que sequer iniciou o cumprimento da pena escolher ou decidir a forma como pretende cumprir a condenação que lhe foi imposta Ou seja não é possível pleitear a forma que lhe parecer mais cômoda ou conveniente Nesse sentido oportuna a transcrição do seguinte entendimento doutrinário Reconversão fundada em lei e não em desejo do condenado a reconversão da pena restritiva de direitos imposta na sentença condenatória em pena privativa de liberdade para qualquer regime a depender do caso concreto depende do advento dos requisitos legais não bastando o mero intuito do sentenciado em cumprir pena na prática mais fácil Em tese o regime carcerário mesmo o aberto é mais prejudicial ao réu do que a pena restritiva de direitos sabese no entanto ser o regime aberto quando cumprido em prisão albergue domiciliar muito mais simples do que a prestação de serviços à comunidade até pelo fato de inexistir fiscalização Por isso alguns condenados manifestam preferência pelo regime aberto em lugar da restritiva de direitos A única possibilidade para tal ocorrer será pela reconversão formal vale dizer ordenase o cumprimento da restritiva e ele não segue a determinação Outra forma é inadmissível26 Para o art 44 5º do Código Penal Sobrevindo condenação a pena privativa de liberdade por outro crime o juiz da execução penal decidirá sobre a conversão podendo deixar de aplicála se for possível ao condenado cumprir a pena substitutiva anterior A condenação superveniente a pena privativa de liberdade pela prática de outro crime não impõe a reconversão da pena restritiva de direitos Exigese mais além de não ter sido concedido sursis é necessária a impossibilidade de cumprimento conjunto das penas privativa de liberdade e restritiva de direitos É o que acontece hipoteticamente em pena privativa de liberdade em regime fechado e prestação de serviços à comunidade27 Se por outro lado for possível o cumprimento conjunto de ambas as penas o juiz pode manter a pena restritiva de direitos Exemplo pena privativa de liberdade em qualquer regime prisional e prestação pecuniária Na linha da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça Consoante a orientação sedimentada nesta Corte Superior uma vez iniciada a execução as hipóteses de conversão das penas restritivas de direito em privativas de liberdade se restringem ao eventual descumprimento injustificado das obrigações impostas art 44 4º do CP cc o art 181 da LEP e à superveniente condenação à pena privativa de liberdade por outro crime que se revele incompatível com a primeira reprimenda aplicada art 44 5º do CP Não há que se cogitar de 35131 reconversão em pena reclusiva quando se revelar possível a execução simultânea ou sucessiva das medidas alternativas impostas ao réu Na hipótese tratandose de duas condenações subsequentes a penas privativas de liberdade a serem cumpridas em regime aberto ambas substituídas por penas restritivas de direito prestação de serviços à comunidade fazse plenamente possível a execução sucessiva das penas alternativas aplicadas28 A redação do art 44 5º do Código Penal evidencia a impossibilidade de reconversão obrigatória ou facultativa da pena restritiva de direitos em privativa de liberdade com a condenação à pena de multa ou em decorrência de contravenção penal em face da proibição da analogia in malam partem no Direito Penal Esta matéria encontrase disciplinada no art 147 da Lei de Execução Penal Dáse após o trânsito em julgado da sentença que aplicou a pena restritiva de direitos momento em que o juiz da execução de ofício ou a requerimento do Ministério Público promoverá a execução podendo para tanto requisitar quando necessário a colaboração de entidades públicas ou solicitála a particulares Penas restritivas de direitos e execução provisória O Supremo Tribunal Federal em pronunciamento anterior ao decidido pelo Plenário no julgamento do HC 126292SP constitucionalidade da execução provisória da pena privativa de liberdade já admitiu a execução provisória de penas restritivas de direitos nas hipóteses excepcionais em que seja comprovado o intuito meramente protelatório do réu ou do seu defensor no exercício do direito recursal buscando o retardamento do trânsito em julgado da condenação29 Essa posição nos parece correta Não há razão legítima para aceitarse a execução provisória da pena privativa de liberdade cujo cumprimento é mais gravoso ao acusado e negarse tal instituto nas penas restritivas de direitos O Superior Tribunal de Justiça contudo tem se posicionado pela impossibilidade de execução provisória no âmbito das penas restritivas de direitos seja pela falta de pronunciamento recente do Supremo Tribunal sobre o assunto seja pela interpretação literal do art 147 da Lei de Execução Penal Não é possível a execução da pena restritiva de direitos antes do trânsito em julgado da condenação A divergência tratada nos embargos envolve a possibilidade de se executar provisoriamente penas restritivas de direito O acórdão embargado da Quinta Turma decidiu que nos termos do art 147 da Lei de Execução Penal as penas restritivas de direitos só podem ser executadas após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória A tese paradigma foi apresentada com base no entendimento firmado no AgRg no REsp 1627367SP segundo o qual É cabível a determinação de execução provisória de pena privativa de liberdade convertida em restritivas de direitos Sobre o tema o STF já se manifestara expressamente a respeito da impossibilidade da execução das reprimendas restritivas de direitos antes do trânsito em julgado por força na norma prevista no art 147 da LEP Recentemente o Supremo Tribunal Federal por meio do HC n 126292SP não considerou a possibilidade de se executar provisoriamente a pena restritiva de direitos mas restringiuse à reprimenda privativa de liberdade na medida em que dispôs tão somente sobre a prisão do acusado condenado em segundo grau antes do trânsito em julgado Em vista da ausência de apreciação pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal quanto à possibilidade de executar a reprimenda restritiva de direitos antes do trânsito em julgado da condenação somado ao texto expresso do art 147 da Lei de Execução Penal deve prevalecer o entendimento firmado no acórdão embargado30 A Portaria 4952016 do Ministro de Estado da Justiça instituiu no âmbito do seu Ministério a Política Nacional de Alternativas Penais com o objetivo de desenvolver ações projetos e estratégias voltadas ao enfrentamento do encarceramento em massa e à ampliação da aplicação de alternativas penais à 35151 35152 prisão com enfoque restaurativo em substituição à privação de liberdade Seu art 1º parágrafo único inc I preceitua que as alternativas penais abrangem as penas restritivas de direitos Classificação As penas restritivas de direitos podem ser genéricas ou específicas Genéricas ou gerais são as que substituem as penas privativas de liberdade em qualquer crime desde que presentes os requisitos legais Nessa relação se incluem a prestação pecuniária a perda de bens e valores a prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas a proibição de frequentar determinados lugares e a limitação de fim de semana Específicas ou especiais de seu turno são as penas restritivas de direitos que substituem as penas privativas de liberdade aplicadas como decorrência da prática de crimes determinados Cuidamse das interdições temporárias de direitos salvo nas modalidades proibição de frequentar determinados lugares e proibição de inscreverse em concurso avaliação ou exame públicos CP art 47 incs IV e V Prestação pecuniária Cuidase de pena restritiva de direitos criada pela Lei 97141998 disciplinada pelo art 45 1º e 2º do Código Penal31 Consiste no pagamento em dinheiro à vítima a seus dependentes ou a entidade pública ou privada com destinação social de importância fixada pelo juiz não inferior a 1 um salário mínimo nem superior a 360 trezentos e sessenta salários mínimos CP art 45 1º 1ª parte Para identificação dos dependentes deve ser utilizada analogicamente a relação contida no art 16 da Lei 82131991 I o cônjuge a companheira o companheiro e o filho não emancipado de qualquer condição menor de 21 vinte e um anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz assim declarado judicialmente II os pais e III o irmão não emancipado de qualquer condição menor de 21 vinte e um anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz assim declarado judicialmente Qualquer entidade pública pode ser beneficiária do valor correspondente à prestação pecuniária mas em se tratando de entidade privada exigese que tenha destinação social Importante destacar que o Poder Judiciário e o Ministério Público não podem ser favorecidos por essa pena uma vez que não são entidades embora apresentem destinação social O dispositivo legal contém uma relação preferencial Assim os dependentes somente serão destinatários na ausência da vítima E as entidades na falta da vítima e de seus dependentes Em se tratando de sanção penal a prestação pecuniária se reveste de caráter unilateral impositivo e cogente razão pela qual independe de aceitação da pessoa por ela favorecida O juiz aplica essa pena sem prévia oitiva da vítima de seus dependentes ou de entidade pública ou privada com destinação social Não pode ser inferior a 1 um salário mínimo nem superior a 360 trezentos e sessenta salários mínimos E o valor pago será deduzido do montante de eventual condenação em ação de reparação civil se coincidentes os beneficiários CP art 45 1º in fine Essa última parte revela que nada obstante seja pena restritiva de direitos a prestação pecuniária ostenta ainda que indiretamente caráter de indenização civil antecipada impedindo o enriquecimento ilícito do ofendido ou de seus dependentes Frisese porém que desaparece qualquer aspecto civil quando o valor fixado na sentença condenatória for destinado em sua totalidade a alguma entidade pública ou privada com destinação social pois são diversos os beneficiários Nesse contexto em que pese a omissão legislativa é possível estender a dedução do valor pago a título de prestação pecuniária em relação às conciliações homologadas em juízo em ações cíveis indenizatórias qualquer que seja o rito processual Também será cabível esse desconto no campo dos Juizados Especiais Criminais tanto em sede de composição dos danos civis ou de transação penal Lei 90991995 arts 74 e 76 Anotese que no campo dos Juizados Especiais Criminais esse abatimento somente poderá ocorrer em ações penais públicas incondicionadas pois a composição civil redunda em extinção da punibilidade nas ações penais privadas e nas ações penais públicas condicionadas à representação do ofendido ou de quem o represente inexistindo por corolário sanção penal de qualquer espécie32 A fórmula legal abre espaço para verdadeiras situações de despenalização É o que se dá quando a sentença penal determina a prestação pecuniária em favor da vítima de valor igual ou inferior ao posteriormente estipulado em ação de reparação civil Como tal montante deve ser deduzido da condenação civil o condenado nada mais fez do que reparar o dano causado pelo crime A conduta criminosa foi portanto despenalizada O Código Penal impõe seja efetuado o pagamento em dinheiro Mas se houver aceitação do beneficiário a prestação pecuniária pode consistir em prestação de outra natureza CP art 45 2º Essa fórmula prestação de outra natureza é excessivamente ampla dando margem à criação no caso concreto de penas indeterminadas e não previstas em lei É fundamental pois a razoabilidade e também a coerência por parte do juiz da execução penal pois é nessa fase que será buscada a anuência do beneficiário em caso de impossibilidade do pagamento em moeda corrente Na prática tem sido admitido o pagamento em pedras preciosas obras de arte imóveis automóveis títulos mobiliários e bens móveis em geral A Exposição de Motivos da Lei 97141998 fala inclusive em entrega de cestas básicas e fornecimento de mão de obra Exemplo um pedreiro é condenado a pagar à vítima do crime por ele praticado a quantia de RS 200000 dois mil reais em dinheiro Diante de sua absoluta impossibilidade financeira e se a vítima concordar o juiz pode substituir o pagamento em dinheiro por 100 horas de mão de obra para reforma da casa do ofendido levando em conta o valor de R 2000 vinte reais por hora de trabalho de um pedreiro A prestação pecuniária é uma pena restritiva de direitos Logo ao contrário do que ocorre com a pena de multa se o condenado solvente não efetuar o pagamento devido frustrando sua execução deve ser reconvertida em pena privativa de liberdade com fundamento no art 44 4º 1ª parte do Código Penal33 Essa é a medida adequada não se podendo falar na imposição de alguma medida coercitiva arresto de bens por exemplo para assegurar seu cumprimento Como já decidido pelo Superior Tribunal de Justiça Havendo expressa previsão legal de reconversão da pena restritiva de direitos em privativa de liberdade não há falar em arresto para o cumprimento forçado da pena substitutiva De início tratandose de pena substitutiva fixada com base no artigo 44 do Código Penal temse que o eventual descumprimento da obrigação dá ensejo à reconversão da pena restritiva de direitos em privativa de liberdade por força do comando expresso da norma do parágrafo 4º do referido artigo No cálculo da pena privativa de liberdade a executar será deduzido o tempo cumprido da pena restritiva de direitos respeitado o saldo mínimo de trinta dias de detenção ou reclusão Ressaltase que a execução das penas restritivas assim como de modo geral de todas as alternativas à prisão demanda um mecanismo coercitivo capaz de assegurar o seu cumprimento e este só pode ser a pena privativa de liberdade Assim não há falar em arresto para o cumprimento forçado da pena substitutiva já que a reconversão da pena é medida que por si só atribui conectividade à pena restritiva de direito34 Além disso a fiscalização da sua execução deve ser promovida pelo Ministério Público pois não se pode delegar essa tarefa eminentemente pública à vítima a seus dependentes ou a entidade pública ou privada com destinação social Finalmente pode ser formulada a seguinte indagação Se a reparação do dano é efeito genérico e automático da condenação CP art 91 I qual a essência da pena de prestação pecuniária que geralmente busca a indenização da vítima o que se acentua ao dizer o art 45 2º que o valor pago será deduzido do montante de eventual condenação em ação de reparação civil se coincidentes os beneficiários A prestação pecuniária é mais favorável e vantajosa ao ofendido De fato 35153 na obrigação de reparar o dano a vítima ou seus herdeiros têm um título executivo mas sem liquidez exigindose sua prévia liquidação no juízo cível Por sua vez na pena de prestação pecuniária o magistrado fixa o valor do pagamento a ser formulado à vítima ou aos seus dependentes que são dispensados da liquidação e do ajuizamento de ação executiva no juízo cível Em que pese o comum perfil pecuniário essas espécies de pena não se confundem35 Inicialmente a prestação pecuniária constituise em pena restritiva de direitos regulada pelos arts 44 e 45 1º e 2º do Código Penal ao passo que a multa é pena pecuniária propriamente dita e segue a sistemática dos arts 49 a 52 do Código Penal Se não bastasse na prestação pecuniária o dinheiro ou prestação de outra natureza é destinado à vítima do crime aos seus dependentes ou a entidade pública ou privada com destinação social e seu montante não pode ser inferior a 1 um salário mínimo nem superior a 360 trezentos e sessenta salários mínimos Na pena de multa por sua vez o valor arrecadado é encaminhado ao Fundo Penitenciário e calculase entre 10 dez e 360 trezentos e sessenta diasmulta fixandose cada um deles entre 130 um trigésimo do salário mínimo até 5 cinco salários mínimos Finalmente na prestação pecuniária o valor pago será deduzido do montante de eventual condenação em ação de reparação civil se coincidentes os beneficiários o que não ocorre na pena de multa Perda de bens e valores Cuidase de pena restritiva de direitos que consiste na retirada de bens e valores integrantes do patrimônio lícito do condenado transferindoos ao Fundo Penitenciário Nacional Seu valor terá como teto o que for maior o montante do prejuízo causado ou do proveito obtido pelo agente ou por terceiro em consequência da prática do crime CP art 45 3º36 Notase de início a possibilidade de aplicação dessa pena exclusivamente no tocante a crimes pois o seu valor leva em conta o prejuízo causado ao ofendido ou a vantagem auferida pelo condenado ou por terceiro em decorrência do seu cometimento Não pode ser utilizada destarte para contravenções penais Além disso exigese tenha o crime produzido algum tipo de prejuízo à vítima ou ainda proporcionado vantagem patrimonial ao responsável pelo crime ou a terceira pessoa Nessa linha de raciocínio exemplificativamente seria uma pena adequada a um crime de furto mas incabível para crime de participação na direção de veículo automotor em competição não autorizada Lei 95031997 Código de Trânsito Brasileiro art 308 Em face do caráter pessoal da pena princípio da personalidade da intransmissibilidade ou da intranscendência previsto no art 5º XLV da Constituição Federal a perda de bens e valores não pode ultrapassar a pessoa do condenado Portanto é vedado atingir o patrimônio de terceiros Essa pena possui nítido conteúdo confiscatório possível e legítimo pois foi expressamente admitida pelo art 5º XLVI b da Constituição Federal Nada obstante a Exposição de Motivos da Lei 97141998 sustenta o contrário alegando ser a prática de um crime motivo justo e suficiente para a perda de bens e valores Não deixa porém de ser confisco definido como a retirada dos bens do patrimônio lícito de alguém sem qualquer tipo de indenização O dispositivo legal indica o limite máximo dessa pena sempre o que for maior o prejuízo causado pelo crime ou o proveito obtido pelo agente ou por terceiro em consequência da prática do crime O proveito do crime engloba o bem auferido pela conduta criminosa seja diretamente exemplo o relógio de ouro furtado seja mediante especificação exemplo a joia produzida com o derretimento do relógio de ouro e também os bens adquiridos pelo agente como consequência da alienação do produto do crime exemplo a bicicleta comprada com o dinheiro resultante da venda do relógio 35154 A perda de bens e valores e o confisco não se confundem Aquela é uma pena restritiva de direitos CP art 45 3º ao passo que este é efeito genérico e automático da condenação CP art 91 II Podem ser impostos cumulativamente mas as diferenças são nítidas O confisco incide sobre os instrumentos ou sobre o produto do crime de cunho ilícito enquanto a perda de bens e valores recai sobre o patrimônio lícito do condenado Como bem define Damásio E de Jesus Não devemos confundir a pena de perda de bens e valores como pena CP art 43 II e o confisco CP art 91 Este constitui efeito da condenação e atinge os instrumentos e o produto do crime instrumenta e producta sceleris Na pena alternativa os bens e valores são de natureza e origem lícitas37 Prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas Cuidase de pena restritiva de direitos consistente na atribuição de tarefas gratuitas ao condenado em entidades assistenciais hospitais escolas orfanatos e outros estabelecimentos congêneres em programas comunitários ou estatais CP art 46 1º e 2º A expressão entidades públicas deve ser interpretada em sentido amplo para englobar tanto as públicas em sentido estrito Administração Pública direta ou indireta como também as privadas com destinação social Essa pena somente é aplicável às condenações superiores a 6 seis meses de privação da liberdade CP art 46 caput Nada obstante seja uma pena restritiva de direitos possui indiretamente caráter de privação da liberdade já que o condenado deve ficar confinado na entidade destinatária dos serviços durante algumas horas da semana para desempenho das atividades impostas pelo juízo da execução Nesse período portanto assemelhase à pena privativa da liberdade embora com ela não se confunda pois o condenado não é retirado do convívio social As tarefas serão atribuídas conforme as aptidões do condenado CP art 46 3º Vedase assim atividade cruel ociosa vexatória ou humilhante que em nada se compatibilizaria com as finalidades da pena Exemplo seria inadequado e ilegal determinar a um advogado condenado pela prática de desacato contra um Delegado de Polícia a prestação de serviços de limpeza das salas da Delegacia de Polícia em que trabalha a pessoa por ele atingida pela conduta criminosa Da mesma forma não é possível a imposição de prestação de serviços em igreja ou qualquer tipo de templo religioso por não se tratar de serviço à comunidade além de ofender o caráter laico do Estado CF art 19 I As tarefas devem ser cumpridas à razão de 1 uma hora de tarefa por dia de condenação fixadas de modo a não prejudicar a jornada normal de trabalho CP art 46 3º Adotouse nesse ponto o sistema da horatarefa Essa opção foi necessária para permitir a regular execução da pena já que o cumprimento em dias seria de difícil ou até mesmo impossível fiscalização Mas apresenta contradição com a regra estipulada pelo art 10 in fine do Código Penal pela qual se contam os dias os meses e os anos pelo calendário comum isto é sem conversão dos dias em horas e também com o art 11 do Código Penal pelo qual devem ser desprezadas nas penas restritivas de direitos as frações de dias ou seja as horas Entretanto se a pena substituída for superior a 1 um ano é facultado ao condenado cumprir a pena alternativa em menor tempo nunca inferior à metade da pena privativa de liberdade fixada CP art 46 4º Essa antecipação da finalização da pena é faculdade do condenado não podendo ser imposta pelo juiz Além disso somente é admissível na hipótese de pena privativa de liberdade substituída por prestação de serviços superior a 1 um ano Mas para não transformála em pena meramente simbólica e também para não prejudicar a jornada normal de trabalho do condenado estabeleceu o dispositivo legal que a antecipação nunca pode ocorrer em período inferior à metade da pena privativa de liberdade fixada Vejamos um exemplo o réu é condenado a 2 dois anos de reclusão pela prática de furto CP art 155 caput Presentes os requisitos legais o juiz substitui a pena privativa de liberdade por restritiva de direitos consistente em prestação de serviços à comunidade O condenado sequioso por cumprir brevemente a sanção penal decide trabalhar mais de uma hora por dia Se trabalhar duas horas por dia cumprirá integralmente a pena em 1 um ano Entretanto se trabalhar mais de duas horas por dia ainda assim não poderá reduzir a pena para aquém de 1 um ano pois esse tempo representa a metade da pena privativa de liberdade fixada As tarefas executadas como prestação de serviços à comunidade não serão remuneradas LEP art 30 e também não geram vínculo empregatício com o Estado LEP art 28 2º A execução da pena de prestação de serviços à comunidade tem início a partir da data do primeiro comparecimento do condenado à entidade beneficiada LEP art 149 2º Cabe ao juiz da execução nos termos do art 149 da Lei de Execução Penal I designar a entidade ou programa comunitário ou estatal devidamente credenciado ou convencionado junto ao qual o condenado deverá trabalhar gratuitamente de acordo com as suas aptidões II determinar a intimação do condenado cientificandoo da entidade dias e horários em que deverá cumprir a pena e III alterar a forma de execução a fim de ajustála às modificações ocorridas na jornada de trabalho Finalmente a entidade beneficiada com a prestação de serviços encaminhará mensalmente ao juiz da execução relatório circunstanciado das atividades do condenado bem como a qualquer tempo comunicação sobre ausência ou falta disciplinar LEP art 150 Não é correto alegar a inconstitucionalidade da pena de prestação de serviços à comunidade ou entidades públicas sob o fundamento de constituirse em inaceitável pena de trabalhos forçados CF art 5º XLVII c por dois motivos fundamentais Em primeiro lugar a prestação de serviços tem amparo constitucional a b c fruto do Poder Constituinte Originário art 5º XLVI d afastando assim a argumentação de inconstitucionalidade Como se sabe não há norma constitucional inconstitucional quando instituída originariamente pelo texto constitucional Além disso essa pena restritiva de direitos representa um benefício ao condenado que pode ou não desempenhar as tarefas atribuídas optando pela pena substitutiva ou então pela reconversão à pena privativa de liberdade Em relação à pessoa física dispõe o art 9º da Lei 96051998 que a prestação de serviços à comunidade consiste na atribuição ao condenado de tarefas gratuitas junto a parques e jardins públicos e unidades de conservação e no caso de dano da coisa particular pública ou tombada na restauração desta se possível Já a pessoa jurídica condenada por crime ambiental se sujeita às seguintes tarefas como prestação de serviços à comunidade a custeio de programas e de projetos ambientais b execução de obras de recuperação de áreas degradadas c manutenção de espaços públicos e d contribuições a entidades ambientais ou culturais públicas Lei 96051998 art 23 Se na prática não existir local adequado para cumprimento dessa pena restritiva de direitos há três propostas para a solução do problema a pena deve ser considerada cumprida desde que tenha decorrido o tempo a ela correspondente e o condenado estava à disposição do Estado deve aguardarse o oferecimento de local adequado com a superveniência do início do cumprimento da pena ou então com o reconhecimento da prescrição e o juízo da execução deve buscar outro local adequado para o cumprimento da pena restritiva de direitos Nesse sentido dispõe o art 148 da Lei de Execução Penal Em qualquer fase da execução poderá o juiz motivadamente alterar a forma de cumprimento das penas de prestação de serviços à comunidade e de limitação de fim de semana ajustandoas às condições pessoais do condenado e às características do estabelecimento da entidade ou do programa comunitário ou estatal É o entendimento do Superior Tribunal de Justiça A impossibilidade de cumprimento pelo sentenciado de pena restritiva de direitos não possibilita sua extinção por absoluta falta de previsão legal para tanto É certo que o art 148 da Lei de Execução Penal permite a alteração da forma de cumprimento das penas restritivas de direitos mas não simplesmente a extinção da pena por reputar suficiente o que já foi cumprido pelo apenado Tal medida vai de encontro ao próprio fim ressocializador da reprimenda38 Nos crimes definidos nos arts 302 a 312 da Lei 95031997 Código de Trânsito Brasileiro se o juiz substituir a pena privativa de liberdade por restritiva de direitos deverá obrigatoriamente aplicar a prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas em uma das seguintes atividades I trabalho aos fins de semana em equipes de resgate dos corpos de bombeiros e em outras unidades móveis especializadas no atendimento a vítimas de trânsito II trabalho em unidades de prontosocorro de hospitais da rede pública que recebem vítimas de acidente de trânsito e politraumatizados III trabalho em clínicas ou instituições especializadas na recuperação de acidentados de trânsito ou IV outras atividades relacionadas ao resgate atendimento e recuperação de vítimas de acidentes de trânsito Essa determinação encontrase prevista no art 312A do Código de Trânsito Brasileiro e foi criada pela Lei 132812016 com o inequívoco 35155 propósito de além de proporcionar a justa punição do infrator e disponibilizar mão de obra para auxiliar as vítimas de acidentes de trânsito conscientizar os condutores de veículos automotores da gravidade dos males provocados pelos seus comportamentos ilícitos especialmente aqueles que oferecem risco de morte às vítimas ou lhes causam graves problemas de saúde Interdição temporária de direitos Essas penas restritivas de direitos estão elencadas pelo art 47 do Código Penal I proibição do exercício de cargo função ou atividade pública bem como de mandato eletivo II proibição do exercício de profissão atividade ou ofício que dependam de habilitação especial de licença ou autorização do poder público III suspensão de autorização ou habilitação para dirigir veículo IV proibição de frequentar determinados lugares e V proibição de inscreverse em concurso avaliação ou exame públicos As duas primeiras e também a última são alvos de críticas fundadas principalmente na contrariedade às finalidades da pena especialmente em relação à prevenção especial ressocialização do criminoso uma vez que não existe vantagem nenhuma em impedir o condenado de desempenhar uma profissão ou atividade lícita Deve sim ser punido mas não proibido de exercer profissões ou atividades por si só legais e até mesmo fomentadas pelo Estado Vejamos cada uma delas Essa pena restritiva de direitos é específica uma vez que somente é aplicável ao crime cometido no exercício de profissão atividade ofício cargo ou função sempre que houver violação dos deveres que lhes são inerentes CP art 56 Diz respeito à vida pública do condenado por relacionarse a cargo função ou atividade pública bem como a mandato eletivo E nada obstante essa pena tenha como propósito englobar as condutas praticadas por funcionários públicos em consonância com o conceito previsto no art 327 do Código Penal não é imprescindível tenha sido praticado um crime contra a Administração Pública podendo ser um crime comum desde que com violação dos deveres funcionais do agente A interdição temporária de direitos engloba tanto a suspensão daquele que exerce cargo função ou atividade pública bem como mandato eletivo ao tempo da condenação como também daquele que deixou de exercer tais misteres voluntariamente ou não posteriormente à prática do crime No tocante à proibição do exercício de mandato eletivo de deputados federais e senadores parte da doutrina sustenta ser essa pena inconstitucional pois tais parlamentares somente podem ser proibidos de exercer o mandato na forma prevista na Constituição Federal Com efeito o art 55 VI e 2º previu somente a perda do mandato e não a interdição temporária39 Com o integral cumprimento da pena encerrase a proibição do exercício do direito Essa pena contudo não se confunde com o efeito da condenação relativo à perda de cargo função pública ou mandato eletivo definido pelo art 92 I do Código Penal cabível a quando aplicada pena privativa de liberdade por tempo igual ou superior a um ano nos crimes praticados com abuso de poder ou violação de dever para com a administração pública e b quando for aplicada pena privativa de liberdade por tempo superior a 4 quatro anos nos demais casos Cuidase também de pena restritiva de direitos específica aplicável exclusivamente ao crime cometido no exercício de profissão atividade ofício cargo ou função sempre que houver violação dos deveres que lhes são inerentes CP art 56 Referese contudo à esfera privada de atuação do condenado embora dependente de habilitação especial de licença ou autorização do poder público Profissão é o trabalho remunerado e com índole intelectual dominante tais como a de médico dentista advogado e engenheiro40 Ofício é o trabalho remunerado predominantemente mecânico ou manual Atividade por sua vez tem natureza residual qualquer outra forma de labor remunerada ou não É necessário que dependam frisese de habilitação especial de licença ou autorização do poder público sob pena de ser impossível a ingerência do Estado para exigir a interdição temporária do direito O condenado é impedido durante o tempo da pena de desempenhar a profissão ofício ou atividade Essa pena aplicase somente aos crimes culposos de trânsito CP art 57 Mas como tais crimes encontramse atualmente previstos em sua maioria pelo Código de Trânsito Brasileiro Lei 95031997 esse dispositivo foi por ele tacitamente revogado Para elucidar o raciocínio razoável diferenciar sob a ótica do Código de Trânsito Brasileiro autorização permissão e habilitação para dirigir veículos A autorização é exigida para condução de ciclomotores CTB art 141 Por sua vez a permissão se destina a candidatos aprovados nos exames de habilitação com validade de um ano CTB art 148 2º E finalmente a habilitação diz respeito a condutores definitivamente aprovados nos exames e com licença para dirigir veículos automotores isto é portadores de Carteira Nacional de Habilitação CTB art 148 3º Extraise desde já uma primeira conclusão o art 47 III do Código Penal fala apenas em autorização ou habilitação Logo tudo o que se relaciona com a permissão deve ser disciplinado pelo Código de Trânsito Brasileiro E quanto à habilitação os arts 302 e 303 do Código de Trânsito Brasileiro impõem a cominação cumulativa da pena privativa de liberdade com a pena de suspensão ou proibição de obter permissão ou habilitação para dirigir veículo automotor Destarte por se tratar de lei posterior e especial a suspensão da habilitação aos crimes culposos de trânsito também é tratada pelo Código de Trânsito Brasileiro Além disso seria impossível e destituída de qualquer finalidade a substituição da pena privativa de liberdade por essa pena restritiva de direitos resultando em duas penas restritivas de igual natureza Resta à incidência do art 47 III do Código Penal exclusivamente portanto a suspensão de autorização para dirigir veículo autorização esta destinada exclusivamente a ciclomotores CTB art 141 Portanto o juiz somente pode aplicar com fulcro no art 47 III do Código Penal a pena restritiva de direitos de suspensão de autorização para dirigir ciclomotores relativamente a crimes culposos de trânsito com ele praticados E como ciclomotor na definição do Anexo I do Código de Trânsito Brasileiro é o veículo de duas ou três rodas provido de um motor de combustão interna cuja cilindrada não exceda a cinquenta centímetros cúbicos 305 polegadas cúbicas e cuja velocidade máxima de fabricação não exceda a cinquenta quilômetros por hora essa pena foi praticamente abolida pois sua aplicação é de quase impossível ocorrência concreta Por último não se deve confundir essa espécie de pena atinente à suspensão de autorização e aos crimes culposos com o efeito da condenação previsto no art 92 III do Código Penal inabilitação para dirigir veículo quando utilizado como meio para a prática de crime doloso Essa pena embora definida pelo art 47 IV do Código Penal como restritiva de direitos é na verdade uma restrição da liberdade pois o condenado é atingido diretamente em sua liberdade de locomoção Além disso a proibição de frequentar determinados lugares é também uma condição do sursis especial CP art 78 2º a Cuidase de pena praticamente inócua de difícil e inexistente fiscalização O legislador poderia ter delimitado o seu âmbito de incidência indicando expressamente os lugares em que o condenado fica proibido de frequentar Por exemplo retornar ao local do crime comparecer ao local de trabalho ou à residência da vítima e de seus familiares etc Essa precaução reduziria também a possibilidade inaceitável de o juiz violar direitos do condenado proibindoo de frequentar locais lícitos e sem vinculação com o crime Essa pena é constitucional Não caracteriza banimento41 e não ofende o princípio da reserva legal a proibição de frequentar determinados lugares Como informam Sérgio Salomão Shecaira e Alceu Corrêa Junior Com efeito tratase de medida penal que corresponde aos anseios do Direito Penal liberal e democrático na medida em que representa uma alternativa à pena privativa de liberdade42 Esta modalidade de pena restritiva consistente em interdição temporária de direitos foi instituída pela Lei 125502011 a qual autorizou o Poder Executivo a criar a empresa pública unipessoal denominada Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares EBSERH Embora o diploma normativo não apresente vinculação com o Direito Penal o legislador se aproveitou de projeto de lei que estava em trâmite adiantado no Congresso Nacional para inserir o inc V no art 47 do Código Penal visando impedir a inscrição de condenados em concursos avaliações ou exames públicos durante o cumprimento da sanção penal Nada obstante esta pena restritiva de direitos guarde estreita relação com o crime tipificado no art 311A do Código Penal fraudes em certames de interesse público43 igualmente inserido pela Lei 125502011 sua aplicação a critério do magistrado é possível aos condenados em geral se presentes os requisitos elencados pelo art 44 do Código Penal Com efeito a condenação por diversos delitos recomenda a vedação do acesso às funções e cargos públicos pela ausência de lisura e de idoneidade moral do agente a exemplo do que se dá no estelionato nos crimes contra a Administração Pública nos crimes da Lei de Licitações Lei 86661993 entre tantos outros Tratase portanto de pena restritiva de direitos genérica pois seu raio de 35156 incidência não se limita ao crime definido no art 311A do Código Penal Limitação de fim de semana Essa modalidade de pena originouse na Alemanha e está regulada no Brasil pelo art 48 do Código Penal Art 48 A limitação de fim de semana consiste na obrigação de permanecer aos sábados e domingos por 5 cinco horas diárias em casa de albergado ou estabelecimento adequado Parágrafo único Durante a permanência poderão ser ministrados ao condenado cursos e palestras ou atribuídas atividades educativas É pouco aplicada uma vez que praticamente não existem casas de albergado Na linha do raciocínio do Superior Tribunal de Justiça Se a pena de limitação de fim de semana deve ser efetivada em Casa de Albergado não pode o paciente na falta do referido estabelecimento ser submetido a cumprimento da reprimenda em presídio situação mais gravosa do que a estabelecida pelo decreto condenatório44 Em consonância com as regras definidas pelos arts 94 e 95 da Lei de Execução Penal o prédio da casa de albergado deverá situarse em centro urbano separado dos demais estabelecimentos e caracterizarse pela ausência de obstáculos físicos contra a fuga Deverá conter além dos aposentos para acomodar os presos local adequado para cursos e palestras e instalações para os serviços de fiscalização e orientação dos condenados Cabe ao juiz da execução determinar a intimação do condenado cientificandoo do local dias e horário em que deverá cumprir a pena a qual terá início a partir da data do primeiro comparecimento LEP art 151 e parágrafo único E mensalmente o estabelecimento designado encaminhará ao juiz da execução relatório e comunicará a qualquer tempo a ausência ou falta disciplinar do condenado LEP art 153 1 2 3 4 5 6 7 8 A pena privativa de liberdade deveria se restringir às hipóteses de reconhecida necessidade tendo em vista seu custo elevado as consequências deletérias para infratores primários ocasionais ou responsáveis por delitos de pequena significação STF HC 123108MG rel Min Roberto Barroso Plenário j 03082015 noticiado no Informativo 793 Nesse sentido BITENCOURT Cezar Roberto Falência da pena de prisão causas e alternativas 2 ed São Paulo Saraiva 2001 p 157 HC 110078SC rel Min Ayres Britto 2ª Turma j 29112011 As penas restritivas de direitos também assumem um importante papel para os demais membros da sociedade assim destacado pelo Supremo Tribunal Federal Registrou que em pequenas comunidades a substituição da pena privativa de liberdade por medida restritiva de direito a permitir que as pessoas vejam onde está sendo cumprida tem valor simbólico e pedagógico maior do que a fixação do regime semiaberto ou aberto HC 137217MG rel Min Marco Aurélio red p ac Min Alexandre de Moraes 1ª Turma j 28082018 noticiado no Informativo 913 Outra exceção à autonomia das penas restritivas de direitos é encontrada no art 78 da Lei 80781990 Código de Defesa do Consumidor Art 78 Além das penas privativas de liberdade e de multa podem ser impostas cumulativa ou alternadamente observado o disposto nos arts 44 a 47 do Código Penal I a interdição temporária de direitos II a publicação em órgãos de comunicação de grande circulação ou audiência às expensas do condenado de notícia sobre os fatos e a condenação III a prestação de serviços à comunidade STF HC 117719RN rel Min Teori Zavascki 2ª Turma j 24062014 e STJ AgRg no REsp 1365534SP rel Min Nefi Cordeiro 6ª Turma j 05082014 STF RHC 100657MS rel Min Ellen Gracie 2ª Turma j 14092010 e STJ HC 108930RJ rel Min Napoleão Maia Nunes Filho 5ª Turma j 13042010 HC 66402GO rel Min Hamilton Carvalhido 6ª Turma j 06122007 noticiado no Informativo 341 MIRABETE Julio Fabbrini Manual de direito penal Parte geral 24 ed São Paulo Atlas 2007 v 1 p 283 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 GRECO Rogério Curso de direito penal Parte geral 10 ed Rio de Janeiro Impetus 2008 p 533 É também o entendimento do STJ HC 180353MS rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 16112010 noticiado no Informativo 456 STJ RHC 30680SP rel Min Og Fernandes 6ª Turma j 06092011 STJ HC 289110RJ rel Min Jorge Mussi 5ª Turma j 18062014 Esse fenômeno se repetiu na lesão corporal culposa na direção de veículo automotor quando o agente conduz o veículo com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência e se do crime resultar lesão corporal de natureza grave ou gravíssima punido com reclusão de dois a cinco anos Lei 95031997 Código de Trânsito Brasileiro art 303 2º Outro propósito no campo penal foi o afastamento do regime aberto e a possibilidade do regime fechado para início de cumprimento da pena privativa de liberdade CP art 33 caput e 2º c HC 94477PR rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 06092011 noticiado no Informativo 639 AgRg nos EDcl no AREsp 279042SP rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 24092013 É também o entendimento do STF HC 94990MG rel Min Ricardo Lewandowski 1ª Turma j 021220008 noticiado no Informativo 531 STJ AgRg no HC 202056MG rel Min Gurgel de Faria 5ª Turma j 16092014 Há de ser ressaltada entretanto a ausência de norma específica na Lei 80721990 Lei dos Crimes Hediondos proibitiva de penas restritivas de direitos para delitos de natureza hedionda HC 94477PR rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 06092011 noticiado no Informativo 639 HC 111840ES rel Min Dias Toffoli Plenário j 27062012 noticiado no Informativo 672 HC 97256RS rel Min Ayres Britto Plenário j 01092010 noticiado no Informativo 598 E também HC 129714SP rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 11102016 noticiado no Informativo 843 Súmula 600 do Superior Tribunal de Justiça Para configuração da violência doméstica e familiar prevista na Lei 113402006 Lei Maria da 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 31 32 33 Penha não se exige coabitação entre autor e vítima HC 129446MS rel Min Teori Zavascki 2ª Turma j 20102015 noticiado no Informativo 804 HC 137888MS rel Min Rosa Weber 1ª Turma j 31102017 noticiado no Informativo 884 STF ARE 779938MG AgR rel Min Luiz Fux 1ª Turma j 05082014 No STJ HC 286802RJ rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 23102014 noticiado no Informativo 551 É imprescindível a prévia intimação pessoal do reeducando que descumpre pena restritiva de direitos para que se proceda à conversão da pena alternativa em privativa de liberdade Isso porque se deve dar oportunidade para que o reeducando esclareça as razões do descumprimento em homenagem aos princípios do contraditório e da ampla defesa STJ HC 251312SP rel Min Moura Ribeiro 5ª Turma j 18022014 noticiado no Informativo 536 STF HC 92012SP rel Min Ellen Gracie 2ª Turma j 10062008 noticiado no Informativo 510 REsp 1524484PE rel Min Reynaldo Soares da Fonseca 5ª Turma j 17052016 noticiado no Informativo 584 O STJ compartilha deste entendimento HC 262832RS rel Min Marilza Maynard Desembargadora convocada do TJSE 6ª Turma j 17122013 HC 193041DF rel Min Alderita Ramos de Oliveira Desembargadora convocada do TJPE 6ª Turma j 15082013 HC 88500RS rel Min Joaquim Barbosa 2ª Turma j 20102009 noticiado no Informativo 564 EREsp 1619087SC rel Min Maria Thereza de Assis Moura rel para acórdão Min Jorge Mussi 3ª Seção j 14062017 noticiado no Informativo 609 A Resolução nº 1542012 editada pelo CNJ Conselho Nacional de Justiça define a política institucional do Poder Judiciário na utilização dos recursos oriundos da aplicação da pena de prestação pecuniária BITENCOURT Cezar Roberto Novas penas alternativas São Paulo Saraiva 1999 p 118 Conforme jurisprudência do STF é viável a utilização do habeas corpus 34 35 36 37 38 39 40 41 42 43 para discutir questões relacionadas à pena pecuniária estabelecida em substituição à reprimenda corporal CP art 43 I cc o art 45 1º porquanto diferentemente da pena de multa que possui natureza jurídica distinta aquela pode ser revertida em pena privativa de liberdade caso descumprida injustificadamente pelo condenado CP art 44 4º STF HC 122563MG rel Min Teori Zavascki 2ª Turma j 02092014 REsp 1699665SP rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma noticiado no Informativo 631 STF HC 122563MG rel Min Teori Zavascki 2ª Turma j 02092014 O art 244A da Lei 80691990 Estatuto da Criança e do Adolescente prevê a aplicação ao condenado pelo delito de submeter criança ou adolescente à prostituição ou à exploração sexual além da pena de reclusão de quatro a dez anos e multa a perda de bens e valores utilizados na prática criminosa em favor do Fundo dos Direitos da Criança e do Adolescente da unidade da Federação Estado ou Distrito Federal em que foi cometido o crime ressalvado o direito de terceiro de boafé JESUS Damásio E de Penas alternativas anotações à Lei n 9714 de 25 de novembro de 1998 2 ed São Paulo Saraiva 2000 p 152 HC 176490SP rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 23102012 Nesse sentido entre outros GOMES Luiz Flávio Penas e medidas alternativas à prisão 1 ed 2 tir São Paulo RT 1999 p 146 Se o crime foi praticado no exercício da atividade advocatícia não constitui excessivo rigor substituir a pena privativa de liberdade pela suspensão da atividade profissional pelo mesmo prazo STJ HC 126373SP rel Min Og Fernandes 6ª Turma j 11122012 STJ HC 252807BA rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 24092013 SHECAIRA Sérgio Salomão CORRÊA JUNIOR Alceu Teoria da pena finalidades direito positivo jurisprudência e outros estudos de ciência criminal São Paulo RT 2002 p 226 Art 311A Utilizar ou divulgar indevidamente com o fim de beneficiar a si ou a outrem ou de comprometer a credibilidade do certame conteúdo sigiloso de I concurso público II avaliação ou exame públicos III processo seletivo para ingresso no ensino superior ou IV exame ou processo seletivo previstos em lei Pena reclusão de 1 um a 4 quatro 44 anos e multa 1º Nas mesmas penas incorre quem permite ou facilita por qualquer meio o acesso de pessoas não autorizadas às informações mencionadas no caput 2º Se da ação ou omissão resulta dano à administração pública Pena reclusão de 2 dois a 6 seis anos e multa 3º Aumentase a pena de 13 um terço se o fato é cometido por funcionário público HC 60919DF rel Min Gilson Dipp 5ª Turma j 10102006 361 362 CONCEITO É a espécie de sanção penal de cunho patrimonial consistente no pagamento de determinado valor em dinheiro em favor do Fundo Penitenciário Por se tratar de pena deve respeitar os princípios da reserva legal e da anterioridade ou seja é necessária a sua cominação por lei em sentido material e formal vigente anteriormente à prática do fato típico cuja punição se pretende FUNDO PENITENCIÁRIO O Fundo Penitenciário Nacional Funpen instituído no âmbito do Ministério da Justiça e Segurança Pública é gerido pelo Departamento Penitenciário Nacional Depen e tem a finalidade de proporcionar recursos e meios para financiar e apoiar as atividades e os programas de modernização e aprimoramento do sistema penitenciário nacional Lei Complementar 791994 art 1º Entre os seus variados recursos estão as multas decorrentes de sentenças penais condenatórias com trânsito em julgado LC 791994 art 2º V A Lei Complementar 791994 não indica a origem das penas de multa isto é se provenientes da Justiça Estadual ou da Justiça Federal Nesse contexto os Estados e o Distrito Federal podem legislar sobre este assunto com a finalidade de encaminhar a sanção pecuniária para o fundo penitenciário sob sua gestão Com efeito o art 24 I da Constituição Federal fixa a competência concorrente entre a União os Estados e o Distrito Federal 363 364 para legislar sobre direito penitenciário1 CRITÉRIO ADOTADO PARA A PENA DE MULTA O Código Penal adota por força do art 2º da Lei 72091994 Reforma da Parte Geral do Código Penal o critério do diamulta pelo qual o preceito secundário de cada tipo penal se limita a cominar a pena de multa sem indicar seu valor o qual deve ser calculado com base nos critérios previstos no art 49 do Código Penal Em face da redação do art 12 do Código Penal essa regra não impede a existência de exceções ou seja é possível que leis especiais se valham pontualmente de critérios diversos A título ilustrativo a Lei 86661993 Lei de Licitações prevê em seu art 99 caput A pena de multa cominada nos arts 89 a 98 desta Lei consiste no pagamento de quantia fixada na sentença e calculada em índices percentuais cuja base corresponderá ao valor da vantagem efetivamente obtida ou potencialmente auferível pelo agente APLICAÇÃO DA PENA DE MULTA A aplicação da pena privativa de liberdade obedece a um sistema trifásico delineado pelo art 68 caput do Código Penal Já a pena de multa e somente ela segue um sistema bifásico é dizer sua aplicação deve respeitar duas fases distintas e sucessivas quais sejam 1ª fase O juiz estabelece o número de diasmulta que varia entre o mínimo de 10 dez e o máximo de 360 trezentos e sessenta É o que dispõe o art 49 caput parte final do Código Penal Para encontrar esse número o magistrado leva em conta as circunstâncias judiciais do art 59 caput do Código Penal bem como eventuais agravantes e atenuantes genéricas e as causas de aumento e de diminuição da pena Em suma todas as etapas que devem ser percorridas para a dosimetria da pena privativa de liberdade são utilizadas para o cálculo do número de diasmulta na sanção pecuniária 1 2 365 2ª fase Já definido o número de diasmulta cabe agora ao magistrado a fixação do valor de cada diamulta que não pode ser inferior a um trigésimo do maior salário mínimo mensal vigente ao tempo do fato nem superior a cinco vezes esse salário CP art 49 1º Levase em conta a situação econômica do réu nos termos do art 60 caput do Código Penal Com tais dados o juiz conclui o cálculo da pena de multa que pode ser assim sintetizado Esse método possibilita a perfeita individualização da pena de multa na forma exigida pelo art 5º XLVI da Constituição Federal E anotese com o trânsito em julgado da sentença penal condenatória é irretratável o seu valor2 Vejamos dois exemplos Uma pessoa de elevado poder econômico pratica um crime de estelionato As circunstâncias judiciais do art 59 caput do Código Penal lhe são favoráveis O juiz deve aplicar o número de diasmulta no mínimo legal 10 diasmulta mas fixar o valor de cada um deles em montante relevante bem acima do piso legal em face da situação econômica do réu3 Outra pessoa com péssimos antecedentes criminais e conduta social desajustada portadora de personalidade voltada à prática rotineira de infrações penais comete uma extorsão com requintes de crueldade É todavia paupérrima O juiz deve aplicar o número de diasmulta bem acima do mínimo legal e estipular o valor de cada um deles no patamar raso diante da condição econômica do réu VALOR INEFICAZ DA PENA DE MULTA 366 367 1 Concluído o sistema bifásico e calculado o valor da pena de multa o magistrado pode reputar que em face do elevado poder econômico do réu a sanção pecuniária embora aplicada no máximo legal é ineficaz Nessa hipótese a ele se reserva a faculdade de aumentar o seu valor até o triplo CP art 60 1º Nos crimes contra a propriedade industrial Lei 92791996 art 197 parágrafo único e nos crimes previstos nos arts 33 a 39 da Lei de Drogas Lei 113432006 art 43 parágrafo único o valor final da pena de multa pode ser aumentado até o décuplo Por sua vez nos crimes contra o sistema financeiro nacional o valor do diamulta pode ser estendido até o décuplo Lei 74921986 art 33 MULTA EXCESSIVA O art 76 1º da Lei 90991995 autoriza o juiz nas hipóteses em que a pena de multa seja a única aplicável a reduzila até a metade Essa redução somente é possível quando a situação econômica do autor do fato a recomendar De seu turno o art 197 parágrafo único da Lei 92791996 crimes contra a propriedade industrial autoriza a redução da pena de multa em até 10 vezes dependendo das condições pessoais do agente e da vantagem auferida no caso concreto MULTA IRRISÓRIA Multa irrisória é a de valor extremamente reduzido Não há definição legal acerca do seu montante A questão controversa reside na necessidade ou não de sua cobrança pelo Estado Destacamse duas posições A multa irrisória não deve ser executada em juízo já que o Poder Público arcará em sua cobrança com valor superior ao que será ao final arrecadado e o condenado sequer suportará o caráter retributivo da pena 2 368 A cobrança em juízo é obrigatória Pouco importa o seu valor a multa é pena incidindo sobre ela os princípios da imperatividade da sua aplicação e da inderrogabilidade de seu cumprimento É o entendimento dominante A propósito o art 1º 1º da Portaria do Ministério da Fazenda 752012 que fixa os valores mínimos para inscrição e execução da Dívida Ativa da União faz expressa ressalva à pena de multa no sentido de inexistir valor mínimo para legitimar a sua execução judicial PAGAMENTO VOLUNTÁRIO DA MULTA O pagamento voluntário ou espontâneo da pena de multa deve ser efetuado no prazo de 10 dez dias depois do trânsito em julgado da sentença condenatória como determina o art 50 caput 1ª parte do Código Penal O juiz pode atendendo a requerimento do condenado e considerando as circunstâncias do caso permitir o parcelamento do pagamento da pena de multa CP art 50 caput in fine O art 169 da Lei de Execução Penal determina que esse parcelamento em prestações iguais e sucessivas deverá ser pleiteado pelo condenado antes de vencido o prazo legal para pagamento da multa A lei não prevê limite ao número de parcelas reservandose tal tarefa ao juízo da execução o qual antes de decidir sobre o pedido de parcelamento poderá determinar diligências para verificar a real situação econômica do condenado e deverá ouvir o Ministério Público LEP art 169 1º Concedido o parcelamento o benefício será revogado pelo juiz de ofício ou a pedido do Ministério Público se o condenado for impontual no pagamento ou se melhorar sua condição econômica LEP art 169 2º É possível ainda que a cobrança da multa seja efetuada mediante desconto na remuneração do condenado quando tiver sido aplicada isoladamente cumulativamente com pena restritiva de direitos ou então quando tiver sido concedida a suspensão condicional da pena CP art 50 2º Em síntese somente não se admite a cobrança da multa por meio de desconto na remuneração quando tiver sido imposta pena privativa de 369 liberdade não suspensa O desconto não deve incidir sobre os recursos indispensáveis ao sustento do condenado e de sua família e terá como limites o máximo de um quarto e o mínimo de um décimo da remuneração CP art 50 2º e LEP art 168 I EXECUÇÃO DA PENA DE MULTA Pode ocorrer a omissão do condenado durante o prazo legal para pagamento da multa Procedese no caso ao pagamento forçado ou coercitivo mediante a execução da pena pecuniária sendo vedada a sua conversão para pena privativa de liberdade Com efeito a Lei 92681996 conferiu ao art 51 do Código Penal a seguinte redação Transitada em julgado a sentença condenatória a multa será considerada dívida de valor aplicandoselhe as normas da legislação relativa à dívida ativa da Fazenda Pública inclusive no que concerne às causas interruptivas e suspensivas da prescrição4 Embora considerada dívida de valor após o trânsito em julgado da sentença condenatória a multa conserva seu caráter de pena A Lei 92681996 apenas impediu a sua conversão para prisão mas não afetou sua natureza jurídica Nem poderia fazêlo uma vez que a multa foi tratada como espécie de pena pelo art 5º XLVI c da Constituição Federal Esse é o entendimento consagrado no Supremo Tribunal Federal5 Por corolário a inadimplência da multa seguida da morte do condenado não tem o condão de estender sua cobrança aos seus herdeiros em obediência ao princípio da personalidade ou intransmissibilidade da pena consagrado pelo art 5º XLV da Constituição Federal Importante destacar entretanto a existência de julgados no Superior Tribunal de Justiça afirmando ter sido retirado da multa o seu caráter de pena A Lei 92681996 deu nova redação ao art 51 do CP e extirpou do diploma jurídico a possibilidade de conversão da pena de multa em detenção no caso de inadimplemento da sanção pecuniária Após a alteração legislativa o mencionado artigo passou a vigorar com a seguinte redação Transitada em julgado a sentença condenatória a multa será considerada dívida de valor aplicandoselhes as normas da legislação relativa à dívida ativa da Fazenda Pública inclusive no que concerne às causas interruptivas e suspensivas da prescrição Portanto diante da nova redação dada ao CP a pena de multa não mais possui o condão de constranger o direito à locomoção do sentenciado É imperioso frisar que a nova redação do art 51 do CP trata da pena de multa como dívida de valor já a partir do trânsito em julgado da sentença penal condenatória ou seja em momento inclusive anterior ao próprio cumprimento da pena privativa de liberdade ou da restritiva de direitos Isso implica afirmar que o jus puniendi do Estado exaurese ao fim da execução da pena privativa de liberdade ou da restritiva de direitos porquanto em nenhum momento engloba a pena de multa considerada dívida de valor a partir do trânsito em julgado da sentença penal condenatória Entendimento oposto ou seja a possibilidade de constrição da liberdade daquele que é apenado somente em razão de sanção pecuniária consistiria em legitimação da prisão por dívida em afronta portanto ao disposto no art 5º LXVII da CF e ainda no art 7º 7 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos Pacto de San José da Costa Rica cujo texto estabelece que ninguém deve ser detido por dívida Dessa forma o reconhecimento da pena de multa como dívida de valor atribui à sanção pecuniária caráter extrapenal6 Discutese a forma adequada para a execução da pena de multa Formaramse duas posições sobre o assunto 1ª posição A pena de multa deve ser executada pelo Ministério Público perante a Vara das Execuções Penais na forma da Lei 72101984 Lei de Execução Penal Cabe ao Parquet depois de extrair certidão da sentença penal condenatória com trânsito em julgado que funcionará como título executivo judicial requerer em autos apartados a citação do condenado para no prazo de 10 dias pagar o valor da multa ou nomear bens à penhora LEP art 164 caput Decorrido esse prazo sem o pagamento da multa ou o depósito da respectiva importância proceder 3610 seá à penhora de tantos bens quantos bastem para garantir a execução LEP art 164 1º Entretanto se o Ministério Público não executar a pena de multa no prazo de 90 dias após o trânsito em julgado da condenação o juízo criminal comunicará a Fazenda Pública para efetuar a cobrança perante a Vara das Execuções Fiscais nos termos da Lei 68301980 Lei de Execução Fiscal Esse é o entendimento do Supremo Tribunal Federal7 2ª posição A pena de multa deve ser executada pela Fazenda Pública perante a Vara das Execuções Fiscais Essa linha de pensamento se fundamenta na imposição legal de ser a multa penal considerada dívida de valor para fins de cobrança e consequentemente deve ser executada por sua credora a Fazenda Pública Com o trânsito em julgado o juízo da Vara das Execuções Penais intima o condenado para efetuar em 10 dias o pagamento da pena de multa Decorrido o prazo sem pagamento extraise certidão contendo informações acerca da condenação e da pena de multa com remessa à Fazenda Pública para execução É o entendimento consagrado na Súmula 521 do Superior Tribunal de Justiça A legitimidade para a execução fiscal de multa pendente de pagamento imposta em sentença condenatória é exclusiva da Procuradoria da Fazenda Pública8 A possibilidade de execução da pena de multa pela Fazenda Pública contudo não retira do Ministério Público na condição de titular da ação penal a possibilidade de ajuizar medidas assecuratórias para garantir o futuro pagamento da sanção pecuniária9 CAUSAS SUSPENSIVAS E INTERRUPTIVAS DA PRESCRIÇÃO DA PENA DE MULTA O art 51 do Código Penal determina a aplicação das normas da legislação relativa à dívida ativa da Fazenda Pública no que concerne às causas interruptivas e suspensivas da prescrição Incidem assim as disposições da Lei 68301980 Lei de Execução Fiscal e do Código Tributário Nacional Em relação à suspensão da prescrição dispõe o art 40 da Lei de Execução Fiscal O juiz suspenderá o curso da execução enquanto não for 3611 3612 3613 localizado o devedor ou encontrados bens sobre os quais possa recair a penhora e nesses casos não correrá o prazo de prescrição Esta suspensão não é eterna a teor do contido na Súmula 314 do Superior Tribunal de Justiça Em execução fiscal não localizados bens penhoráveis suspendese o processo por um ano findo o qual se inicia o prazo da prescrição quinquenal intercorrente As causas de interrupção da prescrição encontramse no art 174 parágrafo único do Código Tributário Nacional destacandose o inciso I A prescrição se interrompe pelo despacho do juiz que ordenar a citação em execução fiscal PENA DE MULTA E HABEAS CORPUS Não se admite a utilização do habeas corpus para discussão de temas inerentes à pena de multa pois como essa espécie de sanção penal não pode mais ser convertida em privativa de liberdade em nada afetando a liberdade de locomoção incabível se torna o emprego do remédio disciplinado pelo art 5º LXVIII da Constituição Federal Esse fundamento ensejou a edição da Súmula 693 do Supremo Tribunal Federal Não cabe habeas corpus contra decisão condenatória a pena de multa ou relativo a processo em curso por infração penal a que a pena pecuniária seja a única cominada MULTA E CORREÇÃO MONETÁRIA Incide correção monetária na pena de multa O termo inicial é a data em que foi praticada a infração penal por se tratar de mera atualização do valor10 SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA MULTA Preceitua o art 52 do Código Penal É suspensa a execução da pena de multa se sobrevém ao condenado doença mental O art 167 da Lei 72101984 Lei de Execução Penal apresenta igual redação 3614 3615 Notese que é suspensa a execução da pena de multa mas não a prescrição em relação à qual se aplicam os prazos definidos pelo art 114 do Código Penal MULTA SUBSTITUTIVA A multa substitutiva ou vicariante é prevista no art 60 2º do Código Penal A pena privativa de liberdade aplicada não superior a 6 seis meses pode ser substituída pela de multa observados os critérios dos incisos II e III do art 44 deste Código Como não há menção ao inciso I do art 44 do Código Penal não se aplica o limite temporal de quatro anos no tocante aos crimes dolosos Dessa forma a multa substitutiva da pena privativa de liberdade tem natureza jurídica distinta da pena de multa cominada pelo preceito secundário do tipo penal Permanece portanto o teto de seis meses11 e independe do emprego de violência ou grave ameaça à pessoa Basta para a sua incidência que o réu não seja reincidente em crime doloso e ademais a culpabilidade os antecedentes a conduta social e a personalidade do condenado bem como os motivos e as circunstâncias indiquem a suficiência da substituição SÚMULA 171 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Estatui o enunciado Cominadas cumulativamente em lei especial penas privativa de liberdade e pecuniária é defeso a substituição da prisão por multa Essa súmula foi idealizada para atingir o crime de porte de substância entorpecente para uso próprio à época definido pelo art 16 da Lei 63681976 Tinha o propósito de impedir que o usuário valendose da multa substitutiva fosse condenado somente às penas pecuniárias Em que pese a revogação da Lei 63681976 pela Lei 113432006 Lei de Drogas o enunciado sumular permanece válido e aplicável aos casos que se amoldem à sua definição12 3616 PENA DE MULTA NA LEI DE DROGAS A Lei 113432006 Lei de Drogas também se filiou ao sistema do dia multa Mas as regras relativas ao número de diasmulta e ao valor de cada diamulta são diversas das estabelecidas pelo Código Penal Com efeito para o crime tipificado pelo art 28 adquirir guardar ter em depósito transportar ou trazer consigo para consumo pessoal drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar o juiz fixará o número de diasmulta em quantidade nunca inferior a 40 nem superior a 100 atendendo à reprovabilidade da conduta e o valor do dia multa em conformidade com a capacidade econômica do agente atribuindo a cada um deles o valor de 130 um trinta avos até três vezes o valor do salário mínimo art 29 caput E os valores arrecadados serão creditados à conta do Fundo Nacional Antidrogas art 29 parágrafo único Já para os crimes inerentes à produção não autorizada e ao tráfico de drogas arts 33 a 39 o número de diasmulta é previsto particularmente para cada delito e será dosado levandose em conta com preponderância sobre o previsto no art 59 do Código Penal a natureza e a quantidade da substância ou do produto a personalidade e a conduta social do agente Em seguida o valor do diamulta deve ser calculado com base nas condições econômicas do réu não inferior a 130 um trinta avos nem superior a cinco vezes o salário mínimo art 43 caput Na hipótese de concurso de crimes em qualquer modalidade concurso material concurso formal ou crime continuado as penas de multa serão impostas sempre cumulativamente art 43 parágrafo único 1ª parte Finalmente em tais delitos o juiz poderá aumentar o valor da pena de multa até o décuplo se em virtude da situação econômica do acusado considerálas ineficazes ainda que aplicadas no máximo art 43 parágrafo único parte final 3617 PENA DE MULTA E VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER Estabelece o artigo 17 da Lei 113402006 Lei Maria da Penha ser vedada a aplicação nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher de penas de cesta básica ou outras de prestação pecuniária bem como a substituição de pena que implique o pagamento isolado de multa 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 Em São Paulo por exemplo a Lei Estadual 91711995 criou o Fundo Penitenciário Estadual dispondo ainda que as multas impostas pela Justiça Estadual a ele se destinam LYRA Roberto Comentários ao Código Penal Rio de Janeiro Forense 1942 v II p 143 É de se observar que a pobreza do réu por mais acentuada que seja não pode anular o valor do dia multa pena zero Para o STJ Inexiste previsão legal para a isenção da pena de multa em razão da situação econômica do réu devendo esta servir tão somente de parâmetro para a fixação de seu valor STJ REsp 761268RS rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 17082006 Diante da atual redação do art 51 do Código Penal é inevitável concluir pela inaplicabilidade do art 9º caput do Decretolei 36881941 Lei das Contravenções Penais A multa convertese em prisão simples de acordo com o que dispõe o Código Penal sobre a conversão de multa em detenção STF ADI 3150DF rel Min Marco Aurélio Plenário j 13122018 noticiado no Informativo 927 REsp 1519777SP rel Min Rogerio Schietti Cruz 3ª Seção j 26082015 noticiado no Informativo 568 ADI 3150DF rel Min Marco Aurélio red p acórdão Min Roberto Barroso Plenário j 13122018 Em face do entendimento adotado pelo Supremo Tribunal Federal esta súmula tende a ser cancelada pelo Superior Tribunal de Justiça STJ REsp 1275834PR rel Min Ericson Maranho Desembargador convocado do TJSP 6ª Turma j 17032015 noticiado no Informativo 558 STJ AgRg no REsp 1063031PR rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 14022012 STF HC 98995RS rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 19102010 noticiado no Informativo 605 STJ REsp 879289SP rel Min Félix Fischer 5ª Turma j 15032007 Concurso de crimes é o instituto que se verifica quando o agente mediante uma ou várias condutas pratica duas ou mais infrações penais Pode haver portanto unidade ou pluralidade de condutas Sempre serão cometidas contudo duas ou mais infrações penais O concurso de crimes pode se manifestar sob três formas concurso material concurso formal e crime continuado Destacamse no Brasil três sistemas de aplicação da pena no concurso de infrações penais cúmulo material exasperação e absorção Passemos à análise de cada um deles Aplicase ao réu o somatório das penas de cada uma das infrações penais pelas quais foi condenado Esse sistema foi adotado em relação ao concurso material art 69 ao concurso formal imperfeito ou impróprio art 70 caput 2ª parte e pelo texto da lei ao concurso das penas de multa art 72 Aplicase somente a pena da infração penal mais grave praticada pelo agente aumentada de determinado percentual É o sistema acolhido em relação ao concurso formal próprio ou perfeito art 70 caput 1ª parte e ao crime continuado art 71 Aplicase exclusivamente a pena da infração penal mais grave dentre as diversas praticadas pelo agente sem qualquer aumento Esse sistema foi consagrado pela jurisprudência em relação aos crimes falimentares praticados pelo falido sob a égide do Decretolei 76611945 em virtude do princípio da unidade ou unicidade dos crimes falimentares Para o Superior Tribunal de Justiça Em matéria de crimes falimentares há unidade no crime não obstante a multiplicidade de fatos que a caracterizem O fato criminoso que em última análise se pune é a violação do direito dos credores pela superveniente insolvência do comerciante Todos os atos portanto contra tal direito devem ser considerados como um todo único Concluindo é de se observar o princípio da unicidade dos crimes falimentares pois no caso concreto os atos lesivos ensejaram a falência da empresa1 A unidade do crime falimentar contudo não impedia o concurso material ou formal entre um crime falimentar e outro delito comum Com a entrada em vigor da Lei 111012005 Lei de Falências a situação deve ser mantida mas ainda não há jurisprudência consolidada sobre o assunto O concurso material também chamado de real está disciplinado pelo art 69 do Código Penal Art 69 Quando o agente mediante mais de uma ação ou omissão pratica dois ou mais crimes idênticos ou não aplicamse cumulativamente as penas privativas de liberdade em que haja incorrido No caso de aplicação cumulativa de penas de reclusão ou de detenção executase primeiro aquela 1º Na hipótese deste artigo quando ao agente tiver sido aplicada pena privativa de liberdade não suspensa por um dos crimes para os demais será incabível a substituição de que trata o art 44 deste Código 2º Quando forem aplicadas penas restritivas de direitos o condenado cumprirá simultaneamente as que forem compatíveis entre si e sucessivamente as demais Há pluralidade de condutas e pluralidade de resultados O agente por meio de duas ou mais condutas pratica dois ou mais crimes pouco importando se os fatos ocorreram ou não no mesmo contexto fático O concurso material pode ser homogêneo ou heterogêneo Homogêneo quando os crimes são idênticos e heterogêneo quando os crimes são diversos Se houver conexão entre as infrações penais com a consequente unidade processual a regra do concurso material é aplicada pelo juiz que profere a sentença condenatória O magistrado em respeito ao princípio constitucional da individualização da pena deve fixar separadamente a pena de cada uma das infrações penais Em seguida na própria sentença procede à soma de todas elas Caso porém não exista conexão entre as diversas infrações penais sendo elas consequentemente objeto de ações penais diversas as disposições inerentes ao concurso material serão aplicadas pelo juízo da execução Com o trânsito em julgado das sentenças todas as condenações são reunidas na mesma execução e aí se procederá à soma das penas na forma prevista no art 66 III a da Lei de Execução Penal Se for imposta pena de reclusão para um dos crimes e de detenção para o outro executase inicialmente a de reclusão art 69 caput 2ª parte do CP O 1º do art 69 do Código Penal revela a possibilidade de se cumular na aplicação das penas de crimes em concurso material uma pena privativa de liberdade desde que tenha sido concedido sursis com uma restritiva de direitos Por lógica também será admissível a aplicação de pena restritiva de direitos quando ao agente tiver sido imposta pena privativa de liberdade com regime aberto para seu cumprimento eis que será possível a execução simultânea de ambas De acordo com o art 69 2º do Código Penal o condenado cumprirá simultaneamente as penas restritivas de direitos que forem compatíveis entre si e sucessivamente as demais Admitese por exemplo o cumprimento simultâneo de prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária Se forem todavia duas penas de limitação de final de semana serão cumpridas sucessivamente A suspensão condicional do processo somente é admissível quando no concurso material a somatória das penas impostas ao acusado preencha os pressupostos do art 89 da Lei 909919952 O total das penas mínimas portanto deve ser igual ou inferior a 1 um ano Concurso formal ou ideal é aquele em que o agente mediante uma única conduta pratica dois ou mais crimes idênticos ou não Como dispõe o art 70 do Código Penal Art 70 Quando o agente mediante uma só ação ou omissão pratica dois ou mais crimes idênticos ou não aplicaselhe a mais grave das penas cabíveis ou se iguais somente uma delas mas aumentada em qualquer caso de um sexto até metade As penas aplicamse entretanto cumulativamente se a ação ou omissão é dolosa e os crimes concorrentes resultam de desígnios autônomos consoante o disposto no artigo anterior Parágrafo único Não poderá a pena exceder a que seria cabível pela regra do art 69 deste Código Destacamse dois requisitos unidade de conduta e pluralidade de resultados A unidade de conduta somente se concretiza quando os atos são realizados no mesmo contexto temporal e espacial Com efeito a unidade de conduta não importa obrigatoriamente em ato único pois há condutas fracionáveis em diversos atos como no caso daquele que mata alguém conduta mediante diversos golpes de punhal atos Confirase o seguinte julgado do Supremo Tribunal Federal Roubo qualificado consistente na subtração de dois aparelhos celulares pertencentes a duas pessoas distintas no mesmo instante A jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de configurarse concurso formal a ação única que tenha como resultado a lesão ao patrimônio de vítimas diversas e não crime único3 O concurso formal inicialmente pode ser homogêneo ou heterogêneo É homogêneo quando os crimes são idênticos Exemplo três homicídios culposos praticados na direção de veículo automotor Dizse por sua vez heterogêneo o concurso formal quando os delitos são diversos Exemplo A dolosamente efetua disparos de arma de fogo contra B seu desafeto matandoo O projétil entretanto perfura o corpo da vítima resultando em lesões culposas em terceira pessoa Dividese o concurso formal ainda em perfeito e imperfeito Perfeito ou próprio é a espécie de concurso formal em que o agente realiza a conduta típica que produz dois ou mais resultados sem agir com desígnios autônomos Desígnio autônomo ou pluralidade de desígnios é o propósito de produzir com uma única conduta mais de um crime É fácil concluir portanto que o concurso formal perfeito ou próprio ocorre entre crimes culposos ou então entre um crime doloso e um crime culposo4 Imperfeito ou impróprio é a modalidade de concurso formal que se verifica quando a conduta dolosa do agente e os crimes concorrentes derivam de desígnios autônomos Portanto envolve crimes dolosos qualquer que seja sua espécie dolo direto ou dolo eventual Para o Superior Tribunal de Justiça Os desígnios autônomos que caracterizam o concurso formal impróprio referemse a qualquer forma de dolo direto ou eventual A segunda parte do art 70 do CP ao dispor sobre o concurso formal impróprio exige para sua incidência que haja desígnios autônomos ou seja a intenção de praticar ambos os delitos O dolo eventual também representa essa vontade do agente visto que mesmo não desejando diretamente a ocorrência de um segundo resultado aceitouo Assim quando mediante uma só ação o agente deseja mais de um resultado ou aceita o risco de produzilo devem ser aplicadas as penas cumulativamente afastandose a regra do concurso formal perfeito5 Apontamse em doutrina duas teorias acerca do concurso formal de crimes Pela teoria subjetiva exigese unidade de desígnios na conduta do agente para a configuração do concurso formal Já pela teoria objetiva bastam a unidade de conduta e a pluralidade de resultados para a caracterização do concurso formal Pouco importa se o agente agiu ou não com unidade de desígnios Foi acolhida pelo Código Penal uma vez que o art 70 caput 2ª parte admite o concurso formal imperfeito em que despontam os desígnios autônomos Em relação ao concurso formal perfeito ou próprio o Código Penal acolheu o sistema da exasperação Aplicase a pena de qualquer dos crimes se idênticos ou então a mais grave aumentada em qualquer caso de um sexto até a metade O critério que norteia o juiz para fixar o aumento da pena entre os patamares legalmente previstos é exclusivamente o número de crimes cometidos pelo agente6 Essa regra permite a construção da seguinte tabela No caso de serem perpetrados sete ou mais crimes devese aplicar o montante máximo de aumento qual seja a metade relativamente a seis crimes ao passo que os demais devem ser considerados como circunstâncias judiciais desfavoráveis para a dosimetria da penabase nos moldes do art 59 caput do Código Penal O concurso formal perfeito é causa de aumento de pena e incide por corolário na terceira fase de aplicação da pena E na aplicação da pena privativa de liberdade esse aumento não incide sobre a penabase mas sobre a pena acrescida por circunstância qualificadora ou causa especial de aumento7 É nítida a conclusão de que a regra do concurso formal perfeito constituise em flagrante benefício ao réu Com efeito tratase de fórmula destinada a lhe favorecer uma vez que a lógica seria responder normalmente por todos os crimes que praticou O Código Penal utilizouse dessa opção todavia por se tratar de hipótese em que a pluralidade de resultados não deriva de desígnios autônomos eis que os crimes são culposos ou no máximo apenas um é doloso e os demais culposos Por outro lado no que diz respeito ao concurso formal impróprio ou imperfeito o art 70 caput 2ª parte do Código Penal consagrou o sistema do cúmulo material Tal como no concurso material serão somadas as penas de todos os crimes produzidos pelo agente E nesse ponto agiu acertadamente o legislador De fato se há desígnios autônomos há dolo na conduta que produz a pluralidade de resultados e o agente deve responder por todos os resultados a que deu causa sem nenhum tratamento diferenciado Ora é clara a inexistência de diferença exemplificativamente na conduta daquele que desejando a morte de todos os membros de uma família ingressa na residência em que vivem e coloca fogo no corpo de cada uma das pessoas matandoas da conduta de atear fogo na residência durante o período de repouso noturno causando a morte de todos os indivíduos Em ambas as situações o agente queria a morte de várias pessoas e as efetivou Na primeira hipótese estaria desenhado o concurso material pluralidade de condutas e pluralidade de resultados enquanto na segunda restaria delineado o concurso formal unidade de conduta e pluralidade de resultados O tratamento jurídico por questões de lógica de bom senso e notadamente de Justiça deve ser idêntico em ambos os casos Estatui o parágrafo único do art 70 do Código Penal Não poderá a pena exceder a que seria cabível pela regra do art 69 deste Código O concurso formal próprio ou perfeito no qual se adota o sistema da exasperação para aplicação da pena foi criado para favorecer o réu afastando o rigor do concurso material nas hipóteses em que a pluralidade de resultados não deriva de desígnios autônomos Seria contraditório portanto que a sua regra no caso concreto prejudicasse o agente Assim quando o sistema da exasperação for prejudicial ao acusado deve ser excluído para o fim de incidir o sistema do cúmulo material pois a soma das penas é mais vantajosa do que o aumento de uma delas com determinado percentual ainda que no patamar mínimo Vejase o seguinte exemplo A com a intenção de ser promovido na empresa em que trabalha arremessa dolosamente uma pedra contra a cabeça de B com o escopo de tirálo da disputa pela vaga motivo torpe matandoo Em face de sua imprudência uma vez que o local em que foi praticada a conduta estava repleto de pessoas a pedra atinge também a perna de C nele produzindo culposamente lesões corporais Após o regular trâmite da ação penal é condenado pela prática dos dois crimes em concurso formal perfeito Levandose em conta o mínimo legal de cada um dos crimes como devem as penas ser aplicadas O homicídio qualificado tem a pena mínima de 12 anos de reclusão e as lesões corporais culposas detenção de 2 meses De acordo com o sistema da exasperação o cálculo seria 12 anos de reclusão crime mais grave 16 aumento mínimo 14 anos de reclusão pena final Já para o sistema do cúmulo material o cálculo seria outro 12 anos de reclusão homicídio qualificado 2 meses de detenção lesões culposas 12 anos de reclusão e 2 meses de detenção pena final Concluise pois ser em alguns casos o sistema do cúmulo material melhor do que o da exasperação prevalecendo sobre este Falase no caso em concurso material benéfico ou favorável Crime continuado ou continuidade delitiva é a modalidade de concurso de crimes que se verifica quando o agente por meio de duas ou mais condutas comete dois ou mais crimes da mesma espécie e pelas condições de tempo local modo de execução e outras semelhantes devem os subsequentes ser havidos como continuação do primeiro Nos termos do art 71 do Código Penal Art 71 Quando o agente mediante mais de uma ação ou omissão pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e pelas condições de tempo lugar maneira de execução e outras semelhantes devem os subsequentes ser havidos como continuação do primeiro aplicaselhe a pena de um só dos crimes se idênticas ou a mais grave se diversas aumentada em qualquer caso de 16 um sexto a 23 dois terços Parágrafo único Nos crimes dolosos contra vítimas diferentes cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa poderá o juiz considerando a culpabilidade os antecedentes a conduta social e a personalidade do agente bem como os motivos e as circunstâncias aumentar a pena de um só dos crimes se idênticas ou a mais grave se diversas até o triplo observadas as regras do parágrafo único do art 70 e do art 75 deste Código O crime continuado como unidade delitiva surgiu como forma de manifestação às leis penais excessivamente severas Originouse como fenômeno de defesa fundado em sentimento de humanidade por meio dos glosadores italianos notadamente Bartolo de Sassoferrato e Baldo de Ubaldi no século XIV A ideia por eles concebida foi posteriormente desenvolvida pelos práticos italianos dos séculos XV e XVI destacandose Julio Claro e Próspero Farinaccio que propuseram considerar três ou mais furtos como um crime único quando haviam sido cometidos em determinadas condições especialmente de tempo e lugar pois a legislação penal da época impunha a pena de morte ao autor do terceiro furto8 Àquela época constava da lei Carolina como informa Manzini Se ficar devidamente provado que o ladrão atual se encontra na prática do seu terceiro furto verseá considerado como ladrão famoso não menos culpado do que os ladrões violentos e deverá ser condenado à morte9 Duas teorias principais buscam explicar o fundamento do crime continuado a da ficção jurídica e a da realidade Para a teoria da ficção jurídica desenvolvida por Francesco Carrara como seu próprio nome indica a continuidade delitiva é uma ficção criada pelo Direito Existem na verdade vários crimes considerados como um único delito para fins de aplicação da pena10 Os diversos delitos parcelares formam um crime final Foi a teoria acolhida pelo art 71 do Código Penal11 A unidade do crime continuado se opera exclusivamente para fins de aplicação da pena Para as demais finalidades há concurso tanto que a prescrição por exemplo é analisada separadamente em relação a cada delito como se extrai do art 119 do Código Penal e da Súmula 497 do Supremo Tribunal Federal Quando se tratar de crime continuado a prescrição regulase pela pena imposta na sentença não se computando o acréscimo decorrente da continuação Por outro lado a teoria da realidade ou da unidade real idealizada por Bernardino Alimena vislumbra o crime continuado como um único delito Para ele a conduta pode ser composta por um ou vários atos os quais não necessariamente guardam absoluta correspondência com a unidade ou pluralidade de delitos12 A análise do art 71 caput do Código Penal autoriza a ilação de que o reconhecimento do crime continuado depende da existência simultânea de três requisitos 1 pluralidade de condutas 2 pluralidade de crimes da mesma espécie e 3 condições semelhantes de tempo lugar maneira de execução e outras semelhantes Doutrina e jurisprudência divergem acerca da necessidade de um quarto requisito consistente na unidade de desígnio O Código Penal é taxativo ao exigir seja o crime continuado praticado mediante mais de uma ação ou omissão Tal como no concurso material o crime continuado reclama uma pluralidade de condutas o que não se confunde com a mera pluralidade de atos Repitase nada impede seja uma conduta composta de diversos atos A pluralidade de condutas é necessária para ensejar a prática de dois ou mais crimes da mesma espécie Surge então uma primeira indagação O que são crimes da mesma espécie Doutrina e jurisprudência se dividem sobre o assunto Para uma primeira posição amplamente majoritária em sede jurisprudencial crimes da mesma espécie são aqueles tipificados pelo mesmo dispositivo legal consumados ou tentados seja na forma simples privilegiada ou qualificada13 Mas não basta Os crimes precisam possuir a mesma estrutura jurídica ou seja devem ser idênticos os bens jurídicos tutelados Nesse sentido roubo e latrocínio embora previstos no art 157 do Código Penal são crimes do mesmo gênero não são crimes da mesma espécie14 Na doutrina é o entendimento dentre outros de Damásio E de Jesus e Nélson Hungria A outra posição da qual são partidários entre outros Manoel Pedro Pimentel Basileu Garcia e Heleno Cláudio Fragoso sustenta serem crimes da mesma espécie aqueles que tutelam o mesmo bem jurídico pouco importando se estão ou não previstos no mesmo tipo penal Exemplificativamente furto mediante fraude e estelionato crimes contra o patrimônio seriam da mesma espécie15 A lei ainda exige condições de tempo semelhantes o que importa dizer que não se admite um intervalo excessivo entre um crime e outro É importante frisar que se trata de conexão temporal e não de imediatismo cronológico16 A jurisprudência consagrou um critério objetivo pelo qual entre um crime parcelar e outro não pode transcorrer um hiato superior a 30 trinta dias17 Mas em ação penal pela prática de crime contra a ordem tributária o Pretório Excelso excepcionalmente admitiu a continuidade delitiva com intervalo temporal de até 3 três meses entre as condutas18 Reclamase também sejam os crimes praticados em semelhantes condições de lugar A jurisprudência firmou o entendimento de que os diversos delitos devem ser praticados na mesma cidade ou no máximo em cidades limítrofes ou ainda contíguas isto é próximas entre si19 A lei ainda impõe a semelhança entre a maneira de execução pela qual os crimes são praticados isto é o agente deve seguir sempre um padrão análogo em suas diversas condutas20 Um furto praticado por meio de escalada e outro efetuado com rompimento de obstáculo por exemplo malgrado compreendidos como crimes da mesma espécie impedem a continuidade delitiva em face do distinto modo de execução Pelo mesmo motivo a variação de comparsas e o fato de o agente praticar um crime isoladamente e outro em concurso inviabilizam a configuração do crime continuado Não foi prevista em lei mas é exigida por parcela da doutrina e da jurisprudência em razão de admitir o art 71 caput do Código Penal outras condições semelhantes O agente para executar os crimes posteriores deve se valer da ocasião proporcionada pelo crime anterior Há duas teorias no que diz respeito à necessidade de o crime continuado ser praticado pelo agente com unidade de desígnio 1ª Teoria objetivosubjetiva ou mista Não basta a presença dos requisitos objetivos previstos no art 71 caput do Código Penal Reclamase também a unidade de desígnio isto é os vários crimes resultam de plano previamente elaborado pelo agente É a posição adotada entre outros por Eugenio Raúl Zaffaroni Magalhães Noronha e Damásio E de Jesus e amplamente dominante no âmbito jurisprudencial Confirase um lúcido julgado do Supremo Tribunal Federal Para configurar o crime continuado na linha adotada pelo Direito Penal brasileiro é imperioso que o agente a pratique mais de uma ação ou omissão b que as referidas ações ou omissões sejam previstas como crime c que os crimes sejam da mesma espécie d que as condições do crime tempo lugar modo de execução e outras similares indiquem que as ações ou omissões subsequentes efetivamente constituem o prosseguimento da primeira É assente na doutrina e na jurisprudência que não basta que haja similitude entre as condições objetivas tempo lugar modo de execução e outras similares É necessário que entre essas condições haja uma ligação um liame de tal modo a evidenciarse de plano terem sido os crimes subsequentes continuação do primeiro O entendimento desta Corte é no sentido de que a reiteração criminosa indicadora de delinquência habitual ou profissional é suficiente para descaracterizar o crime continuado21 Essa posição deve ser utilizada em concursos públicos que exigem uma postura mais rigorosa do candidato para o fim de diferenciar o crime continuado extremamente vantajoso ao réu da atividade habitual daquele que adota o crime como estilo de vida 2ª Teoria objetiva pura ou puramente objetiva Basta a presença dos requisitos objetivos elencados pelo art 71 caput do Código Penal Sustenta ainda que como o citado dispositivo legal apresenta apenas requisitos objetivos as outras semelhantes condições ali admitidas devem ser de natureza objetiva exclusivamente Traz ainda o argumento arrolado pelo item 59 da Exposição de Motivos da Nova Parte Geral do Código Penal O critério da teoria puramente objetiva não revelou na prática maiores inconvenientes a despeito das objeções formuladas pelos partidários da teoria objetivosubjetiva Em suma dispensase a intenção do agente de praticar os crimes em continuidade É suficiente a presença das semelhantes condições de índole objetiva É a posição na doutrina de Roberto Lyra Nélson Hungria e José Frederico Marques O art 71 do Código Penal apresenta três espécies de crime continuado simples qualificado e específico Foi adotado em todos os casos o sistema da exasperação Crime continuado simples ou comum é aquele em que as penas dos delitos parcelares são idênticas Exemplo três furtos simples Aplicase a pena de um só dos crimes aumentada de 16 a 23 No crime continuado qualificado as penas dos crimes são diferentes Exemplo um furto simples consumado e um furto simples na forma tentada Aplicase a pena do crime mais grave exasperada de 16 a 23 Em ambas as situações o vetor para o aumento da pena entre 16 e 23 é o número de crimes exclusivamente22 Seguese a sistemática abaixo É possível o aumento da pena na fração máxima 23 quando não se conhece com exatidão o número de delitos praticados pelo agente desde que sejam vários e prolongados em amplo espaço de tempo Na ótica do Supremo Tribunal Federal Consignou ademais que o aumento de 23 da pena se harmonizaria com a jurisprudência pacífica da Corte no sentido de que o quantum de exasperação da pena por força do reconhecimento da continuidade delitiva deveria ser proporcional ao número de infrações cometidas Considerou por fim que a imprecisão quanto ao número de crimes praticados pelo paciente não obstaria a incidência da causa de aumento da pena em seu patamar máximo desde que houvesse elementos seguros como na espécie que demonstrassem que vários seriam os crimes praticados ao longo de dilatadíssimo lapso temporal23 Na hipótese de serem cometidos oito ou mais crimes devese aplicar o montante máximo de aumento qual seja 23 relativamente a sete crimes enquanto os restantes serão considerados circunstâncias judiciais desfavoráveis para a dosimetria da penabase nos moldes do art 59 do Código Penal Por sua vez crime continuado específico é o previsto no parágrafo único do art 71 do Código Penal o qual se verifica nos crimes dolosos contra vítimas diferentes cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa Aplicase a pena de qualquer dos crimes se idênticas ou a mais grave se diversas aumentada até o triplo24 A lei não indica o percentual mínimo de aumento da pena mas somente o máximo até o triplo Mas por óbvio em sintonia com o caput deve ser utilizado o mínimo de 16 pois caso contrário o crime continuado seria inútil por se confundir com o concurso material ofendendose a vontade da lei e a origem do instituto consistente em tratar de forma benéfica os autores de crimes da mesma espécie ligados entre si pelas mesmas condições de tempo local maneira de execução e outras semelhantes Na esteira do entendimento do Supremo Tribunal Federal A doutrina e a jurisprudência dos Tribunais inclusive a desta Suprema Corte acentuam que no delito continuado específico cometido dolosamente com violência à pessoa previsto no art 71 parágrafo único do Código Penal a exasperação da pena varia de um sexto limite mínimo até o triplo limite máximo calculada quando desiguais as sanções cabíveis sobre a pena cominada para o delito sujeito à punição mais grave25 Observase nessa modalidade a possibilidade de crime continuado contra bens jurídicos personalíssimos inclusive contra vítimas diferentes tal como na pluralidade de homicídios Com o advento na Nova Parte Geral do Código Penal introduzida pela Lei 72091984 forçoso concluir pela insubsistência da Súmula 605 do Supremo Tribunal Federal a qual vedava a continuidade delitiva nos crimes contra a vida26 O crime continuado em qualquer de suas espécies constituise em causa obrigatória de aumento da pena e incide por corolário na terceira fase de aplicação da pena Se entretanto os diversos crimes parcelares forem objetos de variadas ações penais em juízos distintos não unificadas antes do trânsito em julgado é possível a unificação das penas em sede de execução com fulcro no art 82 do Código de Processo Penal Se não obstante a conexão ou continência forem instaurados processos diferentes a autoridade de jurisdição prevalente deverá avocar os processos que corram perante outros juízes salvo se já estiverem com sentença definitiva Neste caso a unidade dos processos se dará ulteriormente para efeito de soma ou unificação das penas27 Pelos mesmos fundamentos explicados no concurso formal item 3754 a pena do crime continuado não pode exceder a que seria resultante do concurso material É o que se extrai da parte final do art 71 parágrafo único do Código Penal O crime continuado é formado por uma pluralidade de crimes da mesma espécie Pode ocorrer de estar em vigor uma determinada lei para um grupo de delitos e com a superveniência de outra lei mais gravosa ser praticada uma nova série de crimes todos eles em continuidade nos moldes do art 71 caput do Código Penal A lei mais gravosa deve ser aplicada a toda a série delitiva pois o agente que insistiu na empreitada criminosa depois da entrada em vigor da nova lei tinha a opção de seguir ou não seus mandamentos Além disso se o crime continuado é um único delito para fins de aplicação da pena deve incidir a lei em vigor por ocasião da sua conclusão Nesse sentido é o teor da Súmula 711 do Supremo Tribunal Federal A lei penal mais grave aplicase ao crime continuado ou ao crime permanente se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da permanência A teoria da ficção jurídica considera vários crimes como um só para fins de aplicação da pena Para os demais efeitos subsiste a pluralidade de delitos Em relação à extinção da punibilidade destacandose a prescrição como uma de suas formas o art 119 do Código Penal estatui No caso de concurso de crimes a extinção da punibilidade incidirá sobre a pena de cada um isoladamente E especificamente no tocante à prescrição do crime continuado estabelece a Súmula 497 do Supremo Tribunal Federal Quando se tratar de crime continuado a prescrição regulase pela pena imposta na sentença não se computando o acréscimo decorrente da continuação28 Tomemos o exemplo de dois furtos qualificados praticados em continuidade delitiva com aplicação da pena privativa de liberdade no patamar mínimo A operação seria 2 anos pena mínima aumento de 16 em face da continuidade delitiva 4 meses pena final de 2 dois anos e 4 quatro meses Essa pena prescreve em 8 oito anos conforme previsto no art 109 IV do Código Penal Com a aplicação da Súmula 497 do Supremo Tribunal Federal porém a prescrição será calculada com base na pena de 2 dois anos desprezandose o aumento decorrente da continuação Logo a prescrição se concretizará em 4 quatro anos CP art 109 V O instituto da suspensão condicional do processo encontra previsão no art 89 da Lei 90991995 assim redigido Art 89 Nos crimes em que a pena mínima cominada for igual ou inferior a 1 um ano abrangidas ou não por esta Lei o Ministério Público ao oferecer denúncia poderá propor a suspensão do processo por 2 dois anos a 4 quatro anos desde que o acusado não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro crime presentes os demais requisitos que autorizariam a suspensão condicional da pena art 77 do Código Penal O crime continuado pela teoria da ficção jurídica aceita pelo Código Penal é um único crime para fins de aplicação da sanção penal sobre o qual deve incidir a exasperação de 16 a 23 por se tratar de causa obrigatória de aumento da pena Para se admitir a suspensão condicional do processo portanto é necessário respeitar o limite da pena mínima do crime de 1 ano aí já computado o aumento decorrente da continuação Dois estelionatos em continuidade delitiva por exemplo não comportariam o benefício processual pois a pena rasa seria de 1 um ano e 2 dois meses corolário do mínimo da cominação legal 1 ano majorado de 16 2 meses É o que estabelece a Súmula 723 do Supremo Tribunal Federal Não se admite a suspensão condicional do processo por crime continuado se a soma da pena mínima da infração mais grave com o aumento mínimo de 16 um sexto for superior a 1 um ano No crime continuado vários delitos por ficção jurídica são legalmente considerados como um só para fins de aplicação da pena Cada crime parcelar contudo tem existência autônoma e não fosse a série de continuidade subsistiria isoladamente como fato punível Como exemplo três apropriações indébitas cometidas por um indivíduo nas mesmas condições de tempo lugar maneira de execução e outras semelhantes caracterizam um crime continuado mas não se pode dizer que uma apropriação indébita por si só não seja crime De seu turno crime habitual é aquele em que cada ato isolado representa um indiferente penal O crime somente se aperfeiçoa quando a conduta é reiteradamente praticada pelo agente Exemplificativamente cada ato de exercício ilegal da medicina analisado separadamente é irrelevante mas a pluralidade de atos iguais acarreta na tipicidade do fato Estabelece o art 72 do Código Penal No concurso de crimes as penas de multa são aplicadas distinta e integralmente Como já mencionado a interpretação literal do texto da lei revela a adoção no tocante às penas de multa no concurso de crimes do sistema do cúmulo material Essa conclusão é inquestionável no tocante ao concurso material e ao concurso formal Mas há forte controvérsia em relação ao crime continuado Discutese se nessa hipótese as multas cominadas aos diversos delitos praticados pelo agente devem ser somadas sistema do cúmulo material ou então aplicada somente uma delas com aumento de determinado percentual sistema da exasperação Para os partidários da primeira corrente o art 72 do Código Penal foi taxativo ao determinar a soma das penas de multa no concurso de crimes pouco importando a sua modalidade isto é se concurso material formal ou ainda crime continuado Não se poderia assim ser acolhida interpretação diversa em manifesta oposição ao texto legal Além disso a posição geográfica da regra revelaria a intenção do legislador de fazer valer seu mandamento a todas as espécies de concurso de crimes Com efeito por estar no art 72 irradiaria seus efeitos sobre os arts 69 70 e 71 todos do Código Penal É a posição dominante em sede doutrinária Os adeptos da segunda corrente por outro lado alegam que a adoção da teoria da ficção jurídica pelo art 71 do Código Penal implica na aplicação de uma única pena de multa por se tratar de crime único para fins de dosimetria da sanção penal Não teria sentido aplicarse uma só pena privativa de liberdade e várias penas de multa para um crime continuado É a posição majoritária no âmbito jurisprudencial Vejase a decisão do Superior Tribunal de Justiça A pena de multa aplicada no crime continuado escapa à norma contida no art 72 do Código Penal As penas de multa no caso de concurso de crimes material e formal aplicamse cumulativamente diversamente do a b que ocorre com o crime continuado induvidoso concurso material de crimes gravado pela menor culpabilidade do agente mas que é tratado como crime único pela lei penal vigente como resulta da simples letra dos arts 71 e 72 do Código Penal à luz dos arts 69 e 70 do mesmo diploma legal29 O concurso de crimes é moderado ou limitado em razão do teto máximo de 30 anos para o cumprimento da pena privativa de liberdade Embora a somatória das penas possa ultrapassar esse montante o efetivo cumprimento deverá obedecer ao prazo previsto no art 75 do Código Penal Falase assim em moderação ou limitação ao concurso de crimes É possível entre as modalidades de concurso de crimes Imaginese exemplificativamente que determinada pessoa pratique em um dia três homicídios culposos em concurso formal e no outro dia mais dois crimes de homicídio culposo também em concurso formal Entre esses dois blocos de concursos haverá concurso material A imputação seria assim definida art 121 3º por três vezes na forma do art 70 caput 1ª parte em concurso material art 69 caput com art 121 3º por duas vezes na forma do art 70 caput 1ª parte todos do Código Penal A pena seria calculada pelo juiz com base nas seguintes etapas no tocante aos três crimes praticados no primeiro dia utilização da pena do crime de homicídio culposo detenção de 1 a 3 anos aumentada de 16 até 12 Pelo critério adotado seria exasperada em 15 em razão da prática de três crimes em relação aos dois crimes cometidos posteriormente emprego da c pena do crime de homicídio culposo detenção de 1 a 3 anos aumentada de 16 até 12 Pelo critério adotado seria exasperada em 16 pela prática de dois crimes e finalmente as penas resultantes dos dois grupos de concurso formal seriam somadas em obediência ao concurso material Na hipótese de concurso de crimes a pena considerada para fins de fixação da competência do Juizado Especial Criminal será o resultado da soma no caso de concurso material ou de concurso formal impróprio ou imperfeito ou da exasperação na hipótese de concurso formal próprio ou perfeito ou crime continuado das penas máximas cominadas aos delitos Com efeito se desse somatório resultar um apenamento superior a dois anos fica afastada a competência do Juizado Especial30 No concurso de infrações penais estabelece o art 76 do Código Penal que executarseá primeiramente a pena mais grave Ao se referir a infrações o Código Penal em harmonia com o art 1º da Lei de Introdução ao Código Penal trata do gênero do qual são espécies o crime e a contravenção penal E nesse contexto o propósito do dispositivo legal é esclarecer que no concurso entre crimes e contravenções penais cumprese inicialmente a pena privativa de liberdade inerente ao crime reclusão ou detenção de maior gravidade e depois a pena de prisão simples correspondente à contravenção penal 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 RHC 10593SP rel Min Jorge Scartezzini 5ª Turma j 28082001 STF HC 89708BA rel Min Ricardo Lewandowski 1ª Turma j 24042007 HC 91615RS rel Min Cármen Lúcia 1ª Turma j 11092007 O concurso formal perfeito ou próprio não se confunde com o crime preterdoloso Naquele há dois ou mais crimes um doloso e os demais culposos ou então todos culposos enquanto nesse há um único crime composto de uma conduta inicial dolosa e de um resultado agravador de natureza culposa HC 191490RJ rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 27092012 noticiado no Informativo 505 E também HC 200919MS rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 08102013 STJ HC 284951MG rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 08042014 STF RHC 86080MG rel Min Cezar Peluso 1ª Turma j 06062006 noticiado no Informativo 433 FONTÁN BALESTRA Derecho penal Introducción y parte general 17 ed atual por Guillermo A C Ledesma Buenos Aires Abeledo Perrot 2002 p 450 PIMENTEL Manoel Pedro Do crime continuado 2 ed São Paulo RT 1969 p 42 CARRARA Francesco Programa de derecho criminal Parte general Bogotá Temis 2004 v I p 343 e ss STF HC 100612SP rel orig Min Marco Aurélio red p o acórdão Min Roberto Barroso 1ª Turma j 16082016 noticiado no Informativo 835 No STJ RHC 38675SP rel Min Jorge Mussi 5ª Turma j 25032014 ALIMENA Bernardino Principios de derecho penal Trad Eugenio Cuello Callón Madrid Victoriano Suárez 1915 v I p 492 STF HC 114667SP rel orig Min Marco Aurélio red p o ac Min Roberto Barroso 1ª Turma j 24042018 noticiado no Informativo 899 No STJ REsp 1405989SP rel originário Min Sebastião Reis Júnior rel para acórdão Min Nefi Cordeiro 6ª Turma j 18082015 noticiado 14 15 16 17 18 19 20 21 no Informativo 569 e HC 77467SP rel Min Nefi Cordeiro 6ª Turma j 02102014 noticiado no Informativo 549 STF RHC 91552RJ rel Min Cezar Peluso 2ª Turma j 09032010 No STJ HC 240630RS rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 04022014 O STJ já utilizou esta linha de raciocínio no tocante aos crimes de apropriação indébita previdenciária CP art 168A e sonegação de contribuição previdenciária tipificado no art 337A do Código Penal REsp 1212911RS rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 20032012 noticiado no Informativo 493 LYRA Roberto A expressão mais simples do direito penal Edição histórica Rio de Janeiro Editora Rio 1976 p 184 O Supremo Tribunal Federal todavia lançou luz sobre o tema ao firmar e a consolidar o entendimento de que excedido o intervalo de 30 dias entre os crimes não é possível terse o segundo delito como continuidade do primeiro STF HC 107636RS rel Min Luiz Fux 1ª Turma j 06032012 No STJ AgRg no AREsp 468460MG rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 08052014 e HC 239397RS rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 08042014 HC 89573PE rel Min Sepúlveda Pertence 1ª Turma j 13022007 noticiado no Informativo 456 Em dois roubos entretanto o STF rechaçou a continuidade delitiva em face do intervalo de 89 dias entre os crimes STF HC 106173PR rel Min Rosa Weber 1ª Turma j 19062012 STJ HC 206227RS rel Min Gilson Dipp 5ª Turma j 06102011 e HC 174612RS rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 31052011 STJ AgRg no HC 184814SP rel Min Jorge Mussi 5ª Turma j 07112013 e HC 223711SP rel Min Marilza Maynard Desembargadora convocada do TJSE 5ª Turma j 23042013 RHC 93144SP rel Min Menezes Direito 1ª Turma j 18032008 Em igual sentido STF HC 109730RS rel Min Rosa Weber 1ª Turma j 02102012 noticiado no Informativo 682 No STJ Para a caracterização da continuidade delitiva é imprescindível o preenchimento de requisitos de ordem objetiva mesmas condições de tempo lugar e forma de execução e de ordem subjetiva unidade de desígnios ou vínculo subjetivo entre os eventos Teoria Mista ou Objetivosubjetiva RHC 43601DF rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 03062014 22 23 24 25 26 27 STF HC 99245RJ rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 06092011 noticiado no Informativo 639 e STJ AgRg nos EDcl no AREsp 267637SP rel Min Assusete Magalhães 6ª Turma j 13082013 HC 127158MG rel Min Dias Toffoli 2ª Turma j 23062015 noticiado no Informativo 791 No STJ HC 311146SP rel Min Newton Trisotto Desembargador convocado do TJSC 5ª Turma j 17032015 noticiado no Informativo 559 Também devem estar presentes 6 seis circunstâncias judiciais favoráveis culpabilidade antecedentes conduta social personalidade do agente motivos e circunstâncias do crime Essas circunstâncias encontramse igualmente previstas no art 59 caput do Código Penal e incidem na dosimetria da penabase Não há falar em bis in idem na nova utilização desses fatores pois o crime continuado constituise em instituto favorável ao réu Se não existisse as penas seriam aplicadas em sintonia com a regra do concurso material HC 70593SP rel Min Celso de Mello 1ª Turma j 05101993 noticiado no Informativo 448 E também Se reconhecida a continuidade delitiva específica entre estupros praticados contra vítimas diferentes deve ser aplicada exclusivamente a regra do art 71 parágrafo único do Código Penal mesmo que em relação a cada uma das vítimas especificamente também tenha ocorrido a prática de crime continuado A quantidade de infrações praticadas quanto a todas as vítimas deve ser avaliada de uma só vez refletindo na fixação do patamar de aumento decorrente da incidência do crime continuado específico em cuja estipulação também deverão ser observadas as demais circunstâncias mencionadas no art 71 parágrafo único do CP Esse procedimento não faz com que a continuidade delitiva existente em relação a cada vítima específica deixe de ser considerada mas apenas com que a sua valoração seja feita em conjunto o que é possível porque os parâmetros mínimo e máximo de aumento previstos no art 71 parágrafo único são mais amplos do que aqueles estabelecidos no caput do mesmo artigo STJ REsp 1471651MG rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 13102015 noticiado no Informativo 573 Súmula 605 do STF Não se admite continuidade delitiva nos crimes contra a vida STF HC 81134RS rel Min Sepúlveda Pertence 1ª Turma j 07082007 noticiado no Informativo 475 28 29 30 NO STJ AgRg no AREsp 221016SP Rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 25022014 AgRg no REsp 607929PR rel Min Hamilton Carvalhido 6ª Turma j 26042007 No mesmo sentido HC 95641DF rel Min Jane Silva Desembargadora convocada do TJMG 6ª Turma j 18032008 e REsp 905854SP rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 25102007 STJ HC 143500PE rel Min Napoleão Nunes Maia Filho 5ª Turma j 31052011 381 382 INTRODUÇÃO Estabelece o art 75 do Código Penal Art 75 O tempo de cumprimento das penas privativas de liberdade não pode ser superior a 30 trinta anos 1 Quando o agente for condenado a penas privativas de liberdade cuja soma seja superior a 30 trinta anos devem elas ser unificadas para atender ao limite máximo deste artigo 2 Sobrevindo condenação por fato posterior ao início do cumprimento da pena farseá nova unificação desprezandose para esse fim o período de pena já cumprido Por sua vez dispõe o art 10 do Decretolei 36881941 Lei das Contravenções Penais A duração da pena de prisão simples não pode em caso algum ser superior a 5 cinco anos FUNDAMENTOS Os dispositivos legais que limitam o cumprimento da pena privativa de liberdade têm como amparo a vedação constitucional da pena de caráter perpétuo CF art 5º XLVII b Com efeito seria inócuo e incoerente a Constituição Federal proibir a 383 a prisão perpétua e por outro lado alguém ser condenado ao cumprimento efetivo de uma pena privativa de liberdade de 80 90 ou mais anos É possível todavia a condenação por tempo superior a 30 anos ou o que é mais comum diversas condenações que resultem em um total de penas superior a esse limite Se não bastasse a proibição de cumprimento de pena privativa de liberdade acima de 30 anos se coaduna com a dignidade da pessoa humana fundamento da República Federativa do Brasil consagrado pelo art 1º III da Constituição Federal Não seria correto privar alguém de sua liberdade retirandolhe a esperança de um dia voltar a viver em sociedade Essa atitude estaria em descompasso com a finalidade da pena consistente na ressocialização do condenado Como sustentam Miguel Reale Júnior René Ariel Dotti Ricardo Antunes Andreucci e Sérgio M de Moraes Pitombo Uma vez que a Constituição Federal proíbe a prisão perpétua era corolário que no Código Penal se fixasse o prazo máximo do tempo de cumprimento Se o condenado não obtiver o livramento condicional e perfizer trinta anos de cumprimento de pena é de ser posto em liberdade Uma das condições para preservação moral do condenado com positivas repercussões na disciplina carcerária está na possibilidade de vislumbrar a liberdade Daí fixarse um limite no tempo de cumprimento1 UNIFICAÇÃO DE PENAS Diz o art 75 1 do Código Penal que quando o agente for condenado a penas privativas de liberdade cuja soma seja superior a 30 anos devem ser unificadas para atender a este limite A unificação é a transformação de várias penas em uma única Pode ocorrer em duas situações razões de política criminal evitar o cumprimento de uma pena privativa de caráter perpétuo O sistema penal brasileiro adotou o limite máximo de 30 anos b 384 385 adequação de tipicidade nos casos em que restou configurado o crime continuado mas a aplicação de suas regras não foi possível pelo juiz da ação penal reservandose essa tarefa para a fase executória Essa unificação se dá somente para fins de cumprimento da pena não se aplicando a benefícios como livramento condicional remição progressão de regimes entre outros Como consagrado pela Súmula 715 do Supremo Tribunal Federal A pena unificada para atender ao limite de trinta anos de cumprimento determinado pelo art 75 do Código Penal não é considerada para a concessão de outros benefícios como o livramento condicional ou o regime mais favorável de execução2 COMPETÊNCIA PARA UNIFICAÇÃO DAS PENAS É do juiz das execuções penais a teor do art 66 III a da Lei 72101984 NOVA CONDENAÇÃO E UNIFICAÇÃO DAS PENAS Sobrevindo condenação por fato posterior ao início do cumprimento da pena farseá nova unificação desprezandose para esse fim o período de pena já cumprido CP art 75 2º Essa regra se destina aos casos em que o agente encontrandose no cumprimento da pena privativa de liberdade é condenado por fato praticado posteriormente ao início de satisfação da sanção penal Desprezase o tempo já obedecido pelo sentenciado procedendose a nova unificação para obedecer ao limite de 30 anos Exemplo no cárcere cumprindo pena de 25 anos pela prática de latrocínio o sentenciado comete um homicídio qualificado pelo qual é condenado depois de cinco anos à pena de 20 anos As penas serão unificadas desprezandose os 5 anos já cumpridos restarão 20 anos da primeira condenação e outros 20 anos da subsequente A unificação se destina a impedir que desse novo resultado o agente cumpra mais de 30 anos Terá cumprido assim os 5 primeiros anos restandolhe 386 outros 30 com a nova unificação Tal sistemática contudo é deficiente ao deixar praticamente impune o crime cometido por quem condenado a 30 anos ou mais de reclusão comete novo crime logo no início do cumprimento da sanção penal A nova pena será praticamente inútil pois pouco acrescentará no montante final a ser descontado Deve ser ressaltado que o art 75 do Código Penal referese somente ao limite das penas aplicadas antes e durante a fase executória Destarte se houver intervalo entre o cumprimento das penas anteriores cumpridas pelo condenado e o início das novas penas impostas depois da satisfação integral daquelas não se aplica a regra prevista no citado dispositivo legal FUGA DO RÉU E CUMPRIMENTO DA PENA UNIFICADA Em caso de fuga do condenado do estabelecimento prisional e desde que não seja praticado nenhum novo crime durante este período o limite de 30 anos deve ser contado a partir do início do cumprimento da pena e não de sua eventual recaptura Em outras palavras a fuga não interrompe a execução da pena privativa de liberdade Provoca apenas sua suspensão Para o Supremo Tribunal Federal A Turma deferiu em parte habeas corpus impetrado em favor de condenado a um total de 54 anos de prisão pela prática de diversos delitos cuja execução da pena unificada 30 anos deveria ser iniciada a partir da data de sua recaptura desprezandose o período de tempo por ele já cumprido Considerouse que a fuga do paciente não poderia configurarse como meio interruptivo do cumprimento da pena privativa de liberdade com a consequência de acarretar novo cômputo do período de prisão como se houvesse perda do tempo anteriormente cumprido No ponto asseverouse que o ponto de partida para a unificação seria nessa hipótese não a data em que o sentenciado fora recapturado mas a época em que ele iniciara efetivamente o cumprimento das penas3 Contudo se durante o período de fuga o condenado praticar um novo delito em relação ao qual venha a ser condenado deverá ocorrer nova unificação das penas restante da pena anterior acrescido do montante correspondente à nova condenação e o limite de 30 anos terá início na data da recaptura Na esteira da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça Ante a superveniência de nova condenação do paciente por fatos ocorridos quando se encontrava foragido o juízo singular no que foi referendado pela Corte a quo unificou as reprimendas e a fim de respeitar o teto de 30 anos para o cumprimento do restante das penas privativas de liberdade observando a regra estabelecida pelo 2º do art 75 do Código Penal considerou como termo inicial para cálculo da limitação de pena a data da recaptura do paciente O acórdão ora objurgado está em conformidade com o entendimento deste Tribunal Superior uma vez que apesar do limite constitucional relativo à imposição de pena privativa de liberdade fixado em 30 trinta anos de prisão art 75 do Código Penal na hipótese de fuga do paciente ante a superveniência de novas condenações impõese outra unificação desprezandose o quantum de pena já cumprida4 1 2 3 4 REALE JR Miguel DOTTI René Ariel ANDREUCCI Ricardo Antunes PITOMBO Sérgio M de Moraes Penas e medidas de segurança no novo Código 2 ed Rio de Janeiro Forense 1987 p 38 A defesa do impetrante condenado a pena unificada de 79 anos e 6 meses de reclusão em regime inicial fechado alegou que no cômputo para concessão de benefícios na execução deve ser levado em conta o limite de 30 anos versado no artigo 75 do Código Penal Articulou que considerar no cálculo do benefício da progressão de regime pena unificada maior que o teto estabelecido pelo CP violaria o princípio da individualização da pena e a vedação constitucional à aplicação de sanções perpétuas O Colegiado em consonância com o Enunciado 715 da Súmula do Supremo Tribunal Federal entendeu inaplicável no cômputo para a concessão de regime mais benéfico em relação a penas unificadas o limite imposto pelo art 75 do CP devendo ser considerada a reprimenda total STF HC 112182RJ rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 03042018 noticiado no Informativo 896 HC 84766SP rel Min Celso de Mello 2ª Turma j 11092007 noticiado no Informativo 479 HC 193381RS rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 17032011 1 2 3 O sursis como forma de suspensão condicional da execução da pena surgiu na França com a lei de 26 de março de 1891 que tem o seu precedente e a sua fonte inspiradora numa proposição do Sen Bérenger apresentada ao Parlamento em 18841 No Brasil a primeira iniciativa para adoção do instituto foi de Esmeraldino Bandeira que em 18 de julho de 1906 apresentou à Câmara dos Deputados sem sucesso um projeto baseado na lei francesa Posteriormente a Lei 4577 de 5 de setembro de 1922 autorizou o Poder Executivo no governo do Presidente da República Arthur da Silva Bernardes a expedir o Decreto 16588 de setembro de 1924 regulamentando o assunto Na Exposição de Motivos desse decreto o então Ministro da Justiça João Luiz Alves ressaltou as finalidades do instituto as quais subsistem nos dias atuais Não inutilizar desde logo pelo cumprimento da pena o criminoso primário não corrompido e não perverso Evitarlhe com o contágio na prisão as funestas e conhecidas consequências desse grave mal Diminuir o índice da reincidência pelo receio de que se torne efetiva a primeira condenação2 1 2 3 a Existem três sistemas sobre a suspensão condicional da execução da pena privativa de liberdade Sistema angloamericano ou probation system o magistrado sem aplicar pena reconhece a responsabilidade penal do réu submetendolhe a um período de prova no qual em liberdade deve ele comportarse adequadamente Se o acusado não agir de forma correta o julgamento é retomado com a consequente prolação de sentença condenatória e imposição de pena privativa de liberdade Sistema do probation of first offenders act o juiz determina a suspensão da ação penal permitindo a liberdade do acusado sem contudo declarálo culpado Durante a suspensão o réu deve apresentar boa conduta pois caso contrário é reiniciada a ação penal Esse sistema foi acolhido no Brasil no tocante à suspensão condicional do processo definida pelo art 89 da Lei 90991995 Sistema francobelga o réu é processado normalmente e com a condenação a ele é atribuída uma pena privativa de liberdade O juiz entretanto levando em conta condições legalmente previstas suspende a execução da pena por determinado período dentro do qual o acusado deve revelar bom comportamento e atender as condições impostas pois caso contrário deverá cumprir integralmente a sanção penal Foi adotado pelos arts 77 a 82 do Código Penal em relação ao sursis Sursis é a suspensão condicional da execução da pena privativa de liberdade na qual o réu se assim desejar se submete durante o período de prova à fiscalização e ao cumprimento de condições judicialmente estabelecidas Há três posições acerca da natureza jurídica do sursis Instituto de política criminal cuidase de execução mitigada da b c pena privativa de liberdade O condenado cumpre a pena que lhe foi imposta mas de forma menos gravosa É assim benefício tal como proclama o art 77 II do Código Penal e também modalidade de satisfação da pena É o entendimento dominante Direito público subjetivo do condenado consubstanciase em benefício penal assegurado ao réu O juiz tem liberdade para analisar a presença dos requisitos legais os quais se presentes impõem a concessão do sursis Pena tratase de espécie de pena embora não prevista no art 32 do Código Penal A Portaria 4952016 do Ministro de Estado da Justiça instituiu no âmbito do seu Ministério a Política Nacional de Alternativas Penais com o objetivo de desenvolver ações projetos e estratégias voltadas ao enfrentamento do encarceramento em massa e à ampliação da aplicação de alternativas penais à prisão com enfoque restaurativo em substituição à privação de liberdade Seu art 1º parágrafo único inc III preceitua que as alternativas penais abrangem a suspensão condicional da pena privativa de liberdade sursis Os requisitos da suspensão condicional da execução da pena são previstos no art 77 do Código Penal Art 77 A execução da pena privativa de liberdade não superior a 2 dois anos poderá ser suspensa por 2 dois a 4 quatro anos desde que I o condenado não seja reincidente em crime doloso II a culpabilidade os antecedentes a conduta social e a personalidade do agente bem como os motivos e as circunstâncias autorizem a concessão do benefício III não seja indicada ou cabível a substituição prevista no art 44 do Código 1º A condenação anterior a pena de multa não impede a concessão do benefício 2º A execução da pena privativa de liberdade não superior a 4 quatro anos poderá ser suspensa por 4 quatro a 6 seis anos desde que o condenado seja maior de 70 setenta anos de idade ou razões de saúde justifiquem a suspensão O dispositivo legal apresenta requisitos objetivos relacionados à pena e subjetivos ligados ao agente Vejamos a Natureza da pena a pena deve ser privativa de liberdade isto é reclusão ou detenção no caso de crime ou prisão simples em se tratando de contravenção penal E como determina o art 80 do Código Penal o sursis não se estende às penas restritivas de direitos nem à multa O sursis não se aplica em hipótese alguma às medidas de segurança O próprio nome do instituto é elucidativo suspensão condicional da pena e não da medida de segurança Se não bastasse em relação aos inimputáveis a sentença é absolutória não se falando em imposição de pena privativa de liberdade Já no tocante aos semiimputáveis a sentença condenatória que determina a incidência de pena reduzida a substitui por medida de segurança que em qualquer caso possui finalidade completamente diversa do sursis b Quantidade da pena privativa de liberdade a pena concreta efetivamente aplicada na sentença condenatória não pode ser superior a dois anos3 Em se tratando de concurso de crimes seja qual for sua espécie a pena resultante da pluralidade de infrações penais não pode ultrapassar o limite legal Destarte o concurso de crimes por si só não exclui a suspensão condicional da pena Há situações contudo em que o Código Penal e leis especiais admitem excepcionalmente o sursis para condenações superiores a dois anos Em se tratando de condenado maior de 70 anos de idade ao tempo da sentença ou do acórdão sursis etário ou com problemas de saúde sursis humanitário ou profilático a pena aplicada pode ser igual ou inferior a quatro anos Nos crimes previstos na Lei 96051998 Crimes Ambientais art 16 a execução da pena privativa de liberdade pode ser condicionalmente suspensa nas condenações iguais ou inferiores a três anos c Não tenha sido a pena privativa de liberdade substituída por restritiva de direitos o inciso III do art 77 do Código Penal evidencia ser o sursis subsidiário em relação às penas restritivas de direitos por ser menos favorável ao condenado Com o alargamento das penas restritivas de direitos a partir da Lei 97141998 o instituto em apreço passou a ser cada vez menos utilizado Em regra quando cabível o sursis será também possível a substituição da pena privativa de liberdade nos moldes do art 44 do Código Penal mais vantajosa ao réu Remanesce o sursis para raras hipóteses tal como quando o réu não reincidente em crime doloso for condenado à pena privativa de liberdade igual ou inferior a dois anos por delito cometido com o emprego de violência à pessoa ou grave ameaça a Réu não reincidente em crime doloso a reincidência em crime culposo não impede o sursis Lembrese ainda que a condenação anterior por contravenção penal não caracteriza a reincidência É possível o sursis ao reincidente em crime doloso em uma hipótese a condenação anterior foi exclusivamente à pena de multa CP art 77 1º Nesse sentido estatui a Súmula 499 do Supremo Tribunal Federal Não obsta à concessão do sursis condenação anterior à pena de multa b A culpabilidade os antecedentes a conduta social e personalidade do agente bem como os motivos e as circunstâncias do crime autorizem a concessão do benefício a análise deve ser efetuada exclusivamente no caso concreto4 A existência de outras ações penais em trâmite contra o réu embora não lhe retirem a primariedade pode impedir a suspensão condicional da pena pelo não preenchimento do requisito subjetivo contido no inciso II do art 77 do Código Penal Vejase pode impedir mas não impede automaticamente Nesse sentido já decidiu o Superior Tribunal de Justiça que uma única ocorrência penal não é motivo suficiente para impedir a concessão do sursis5 Preceitua o art 157 da Lei de Execução Penal O juiz ou tribunal na sentença que aplicar pena privativa de liberdade deverá pronunciarse motivadamente sobre a suspensão condicional quer a conceda quer a denegue Destarte o cabimento ou não do sursis deve ser analisado de maneira fundamentada na sentença ou no acórdão O juízo da execução pode conceder a suspensão condicional da pena Não em regra por ser questão que deve ser solucionada durante o trâmite da ação penal É possível todavia a delegação dessa matéria ao juízo da execução quando a ação penal não apresentar elementos probatórios suficientes para se decidir se o condenado preenche ou não os requisitos legalmente exigidos para a medida O juízo da execução também poderá conceder o sursis quando por força de fato superveniente à sentença ou ao acórdão condenatório desaparecer o motivo que obstava sua concessão Nos dois casos o fundamento legal repousa no art 66 III d da Lei 72101984 Lei de Execução Penal O Código Penal possui duas espécies de sursis simples e especial a Sursis simples aplicável quando o condenado não houver reparado o dano injustificadamente eou as circunstâncias do art 59 do Código Penal não lhe forem inteiramente favoráveis No primeiro ano do período de prova o condenado deverá prestar serviços à comunidade ou submeterse à limitação de fim de semana cabendo a escolha ao magistrado b Sursis especial aplicável quando o condenado tiver reparado o dano salvo impossibilidade de fazêlo e se as circunstâncias do art 59 do Código Penal lhe forem inteiramente favoráveis Nessa modalidade o condenado em regra não presta serviços à comunidade nem se submete a limitação de fim de semana pois o juiz pode substituir tal exigência por outras condições cumulativas proibição de frequentar determinados lugares e de ausentarse da comarca onde reside sem autorização do juiz e comparecimento pessoal e obrigatório a juízo mensalmente para informar e justificar suas atividades Não é possível a cumulação das condições do sursis especial no sursis simples Como deixa claro o Código Penal a suspensão da pena é condicional isto é obedece a condições No sursis simples a condição legal e obrigatória é a prestação de serviços à comunidade ou limitação de fim de semana durante o primeiro ano do período de suspensão CP art 78 1º No sursis especial as condições legais que devem ser cumpridas cumulativamente no primeiro ano do período de suspensão são proibição de frequentar determinados lugares e de ausentarse da comarca onde reside sem autorização do juiz e comparecimento pessoal e obrigatório a juízo mensalmente para informar e justificar suas atividades Além dessas condições legais o art 79 do Código Penal permite ao magistrado especificar na sentença outras condições a que fica subordinada a suspensão desde que adequadas ao fato e à situação pessoal do condenado São as denominadas condições judiciais que jamais podem ser vexatórias ou abusivas não se admitindo que violem direitos fundamentais do condenado Também devem ser cumpridas por identidade de razão somente no primeiro ano do período de suspensão O art 81 do Código Penal ainda prevê condições legais indiretas assim chamadas por autorizarem a revogação do sursis São condições proibitivas uma vez que se presentes acarretarão na revogação do benefício O Código Penal após a Reforma da Parte Geral pela Lei 72091984 não admite o sursis sem condições De fato seria no mínimo contraditório instituir a suspensão condicional da pena sem condições Consequentemente se o juiz se esquecer de lançar as condições na sentença condenatória criando um sursis incondicionado a acusação deve recorrer para que a decisão seja reformada pela instância superior A questão se agrava no caso de a omissão da sentença ser alcançada pelo trânsito em julgado da condenação Questionase Pode nesse caso o juízo da execução fixar as condições para o sursis Há duas posições sobre o assunto 1ª posição É possível Com efeito se a Lei de Execução Penal em seu art 158 2º autoriza o juiz a qualquer tempo de ofício a requerimento do Ministério Público ou mediante proposta do Conselho Penitenciário a modificar as condições e regras estabelecidas na sentença ouvido o condenado além de em seu art 159 2º permitir ao tribunal conferir ao juízo da execução a incumbência de estabelecer as condições do benefício nada obsta que esse juízo fixe condições não determinadas pela sentença As condições do sursis também podem ser fixadas pelo juízo da execução quando o benefício tiver sido negado pela instância inferior mas concedido pela instância superior6 2ª posição Não é possível O juízo da execução violaria a coisa julgada e além disso a situação do réu seria agravada sem recurso com essa finalidade É o intervalo de tempo fixado na sentença condenatória concessiva do sursis no qual o condenado deverá revelar boa conduta bem como cumprir as condições que lhe foram impostas pelo Poder Judiciário Na regra geral do Código Penal varia entre dois e quatro anos art 77 caput o que também se dá nos crimes ambientais embora o limite da condenação seja de três anos diferentemente do previsto na legislação comum No caso de sursis etário ou humanitário o período de prova é de quatro a seis anos desde que a condenação seja superior a dois anos e inferior a quatro anos por questão de razoabilidade Com efeito se a condenação seguir a sistemática comum ou seja for igual ou inferior a dois anos o período de prova será o comum dois a quatro anos Nos crimes contra a segurança nacional praticados em tempo de paz o período de prova varia entre dois a seis anos Lei 71701983 art 5º caput No Decretolei 36881941 Lei das Contravenções Penais o período de suspensão é de um a três anos art 11 A fixação do período de prova acima do patamar mínimo legalmente previsto deve ser justificada fundamentadamente sob pena de nulidade e redução pela superior instância O período de prova tem início com a audiência admonitória assim chamada pelo art 161 da Lei de Execução Penal também conhecida como audiência de advertência realizada pelo juiz depois do trânsito em julgado da condenação Nessa audiência o juiz procede à leitura da sentença ao condenado advertindoo das consequências de nova infração penal e do descumprimento das condições impostas LEP art 160 A fiscalização do cumprimento das condições do sursis será atribuída pelo juiz a serviço social penitenciário Patronato Conselho da Comunidade ou instituição beneficiada com a prestação de serviços inspecionados pelo Conselho Penitenciário pelo Ministério Público ou por ambos LEP art 158 3º Com a revogação do sursis o condenado deverá cumprir integralmente a pena privativa de liberdade que se encontrava suspensa observandose o regime prisional fechado semiaberto ou aberto determinado na sentença Portanto não se considera o tempo em que permaneceu no período de prova ainda que nesse intervalo tenha cumprido as condições impostas7 A revogação pode ser de duas espécies obrigatória ou facultativa A revogação obrigatória decorre da lei É dever do juiz decretála não havendo margem para discricionariedade acerca da decisão de manter ou não a suspensão Por sua vez a revogação facultativa permite ao juiz a liberdade de revogar ou não o benefício Analisemos cada uma delas as hipóteses em que se verificam e respectivas consequências A revogação obrigatória nada obstante imponha ao magistrado a atuação em consonância com a lei não é automática Exigese decisão judicial Com efeito dispõe o art 81 I do Código Penal A suspensão será revogada se no curso do prazo o beneficiário I é condenado em sentença irrecorrível por crime doloso É causa de revogação a prática de crime doloso antes ou durante o período de prova pois a lei fala apenas em condenação irrecorrível durante o prazo de suspensão condicional da pena Pouco importa assim o momento da prática do delito O fator decisivo é o tempo do trânsito em julgado da condenação Na visão do Superior Tribunal de Justiça Na hipótese prevista no inciso I do art 81 do Código Penal a revogação do sursis é obrigatória não dispondo o magistrado de discricionariedade diante de uma segunda condenação irrecorrível pela prática de crime doloso Sendo assim se a revogação na espécie é medida necessária decorrente de condição objetiva não há razão para a prévia audiência do apenado diversamente das situações de revogação nas quais existe a possibilidade no caso concreto de não ser o benefício revogado Tendo o apenado sido condenado a pena privativa de liberdade pela prática de crime doloso em decisão irrecorrível durante o período de prova a revogação do sursis é medida que se impõe nos termos do inc I do art 81 do Código Penal8 Em primeira análise a revogação deveria ocorrer qualquer que fosse a sanção penal imposta como decorrência da prática de crime doloso Porém é pacífico o entendimento de que a condenação irrecorrível à pena de multa não autoriza a revogação da suspensão condicional mesmo em se tratando de crime doloso O raciocínio é simples se a condenação a esse tipo de pena não impede o sursis CP art 77 1º por igual fundamento não pode revogálo Por fim a sentença que concede perdão judicial pela prática de crime doloso não revoga o sursis pois não é condenatória mas declaratória da extinção da punibilidade Súmula 18 do STJ II frustra embora solvente a execução da pena de multa ou não efetua sem motivo justificado a reparação do dano Em relação à inadimplência da multa há duas posições acerca da possibilidade de revogação do sursis 1ª posição Não é possível A multa deve ser tratada como dívida de valor sujeitandose sua cobrança às disposições da Lei 68301980 Lei de Execução Fiscal Como a multa não pode ser convertida em prisão sua inadimplência não justifica a revogação da suspensão condicional da pena 2ª posição É possível A Lei 92681996 modificou somente o art 51 do Código Penal em nada se relacionando com os demais dispositivos legais relativos à multa Além disso a pena privativa de liberdade já foi imposta e o sursis não se confunde com a pena de multa Prevalece o entendimento no sentido de que se depois de revogado o benefício o condenado paga a multa é permitido o seu restabelecimento A lei também determina a revogação do sursis em caso de ausência injustificada da reparação do dano III descumpre a condição do 1º do art 78 deste Código É causa obrigatória de revogação da suspensão condicional da pena o descumprimento da prestação de serviços à comunidade ou da limitação de fim de semana no primeiro ano do período de prova do sursis simples O fundamento é simples o condenado que não reparou o dano e possui circunstâncias judiciais desfavoráveis descumpre uma das condições da suspensão condicional da pena Logo contraria a natureza do instituto justificando sua revogação9 Nos termos do art 81 1º do Código Penal A suspensão poderá ser revogada se o condenado descumpre qualquer outra condição imposta ou é irrecorrivelmente condenado por crime culposo ou por contravenção a pena privativa de liberdade ou restritiva de direitos Recordese que quando facultativa a revogação o juiz pode em vez de decretála prorrogar o período de prova até o máximo se este não foi o fixado Vislumbramse duas situações de revogação facultativa Vejamos 1ª situação Descumprimento de qualquer outra condição imposta As condições ora indicadas são as previstas no Código Penal em seus arts 78 2º a b e c e 79 isto é proibição de frequentar determinados lugares e de ausentarse da comarca onde reside sem autorização do juiz comparecimento pessoal e obrigatório a juízo mensalmente para informar e justificar suas atividades além das judiciais desde que adequadas ao fato e à situação pessoal do condenado De fato o descumprimento das condições arroladas pelo art 78 1º do Código Penal enseja a revogação obrigatória do sursis 2ª situação Condenação irrecorrível por crime culposo ou contravenção a pena privativa de liberdade ou restritiva de direitos A condenação com trânsito em julgado por crime culposo ou contravenção penal a pena privativa de liberdade somente comportará a manutenção do sursis quando for imposto o regime prisional aberto para o seu cumprimento De fato a aplicação de regime fechado ou semiaberto acarreta a obrigação de o condenado ser colocado em estabelecimento penal incompatibilizando o cumprimento da suspensão condicional da pena Atentese ainda ao fato de que a condenação à pena pecuniária não se constitui sequer em causa de revogação facultativa do sursis o que se coaduna com a regra traçada pelo art 77 1º do Código Penal O gráfico abaixo indica as causas de revogação do sursis e do livramento condicional Quanto a esse último instituto a apresentação é por ora sucinta pois a matéria será detalhadamente enfrentada no próximo capítulo Em respeito aos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório entendese que deve ser ouvido o condenado antes da revogação do benefício a ele conferindo a oportunidade para justificar eventual manutenção da suspensão condicional da pena Essa oitiva entretanto é impertinente e desnecessária quando a causa de revogação for a condenação irrecorrível por crime doloso ou culposo ou por contravenção penal CP art 81 I e 1º parte final Nesse caso nada de relevante poderá o réu apresentar Já teve chances suficientes para se defender durante a ação penal pessoalmente e por defensor e não poderá com suas escusas alterar a coisa julgada 1ª A questão que se coloca é a seguinte Admitese a revogação do sursis depois do término do período de prova na hipótese de ser descoberta uma condenação transitada em julgado pela prática de crime doloso durante o curso do seu prazo Há duas posições 1ª posição É possível A revogação do sursis nesse caso é automática CP art 81 I É a posição a que se filia o Superior Tribunal de Justiça Inexiste constrangimento ilegal quanto à revogação do benefício da suspensão condicional da pena em razão de condenação pelo cometimento de outro crime durante o período de prova desde que não tenha sido extinta a punibilidade do agente mediante sentença transitada em julgado nos termos do inciso I do art 81 do Código Penal Esta Corte tem firmado o entendimento no sentido de que o período de prova do sursis fica automaticamente prorrogado quando o beneficiário está sendo processado por outro crime ou contravenção bem como que a superveniência de sentença condenatória irrecorrível é caso de revogação obrigatória do benefício mesmo quando ultrapassado o período de prova10 2ª posição Não é possível Por se tratar de sentença meramente declaratória CP art 82 a pena privativa de liberdade estará automaticamente extinta com o término do período de prova A cassação do sursis se verifica quando o benefício fica sem efeito antes do início do período de prova Não se confunde pois com a revogação que somente pode ser decretada durante a suspensão condicional da pena A cassação pode ocorrer em quatro hipóteses O condenado não comparece injustificadamente à audiência admonitória LEP art 161 A suspensão ficará sem efeito executandose imediatamente a pena 2ª 3ª 4ª O condenado renuncia ao benefício O cumprimento do sursis é vinculado à aceitação do condenado podendo o réu preferir o cumprimento da pena O réu é irrecorrivelmente condenado a pena privativa de liberdade não suspensa A condenação à prisão durante o período de prova é causa de revogação do sursis Tem lugar a cassação todavia quando o trânsito em julgado ocorrer antes do início do período de prova pois é incompatível o cumprimento simultâneo da pena em regime fechado ou semiaberto e do sursis A pena privativa de liberdade é majorada em grau de recurso da acusação passando de dois anos O sursis anteriormente concedido é cassado pelo tribunal Sursis sucessivo é o concedido a réu que anteriormente teve a sua pena privativa de liberdade extinta em razão do cumprimento integral de sursis originário da prática de outra infração penal Essa situação é possível quando o agente após cumprir a suspensão condicional da pena comete crime culposo ou contravenção penal Por não ser reincidente em crime doloso é permitida a concessão de novo sursis São simultâneos também conhecidos como coetâneos os sursis cumpridos ao mesmo tempo Isso pode ocorrer em duas hipóteses 1ª hipótese O réu durante o período de prova é irrecorrivelmente condenado por crime culposo ou contravenção penal a pena privativa de liberdade igual ou inferior a dois anos Pode ser a ele concedido novo sursis pois não é reincidente em crime doloso e nada impede a manutenção do sursis anterior eis que a revogação é facultativa 2ª hipótese O réu antes do início do período de prova é irrecorrivelmente condenado pela prática de crime doloso sem ser reincidente e obtém novo sursis O sursis anterior é preservado pois a condenação por crime doloso apenas o revoga quando seu trânsito em julgado se verificar durante o período de prova É a situação em que a duração da suspensão condicional da pena excede o prazo do período de prova determinado na sentença condenatória Prevalece o entendimento de que durante a prorrogação do período de prova não subsistem as condições do sursis Existem no Código Penal duas hipóteses de prorrogação do período de prova 1ª hipótese O beneficiário está sendo processado por outro crime ou contravenção art 81 2º Nesse caso considerase prorrogado o prazo da suspensão até o julgamento definitivo Como o Código Penal disse considerase concluise ser automática a prorrogação ou seja independe de decisão judicial expressa nesse sentido Basta o recebimento da denúncia ou queixa e não a mera prática do crime ou contravenção penal pois a lei fala em beneficiário que está sendo processado11 A ação penal pode relacionarse a crime ou contravenção penal praticados durante o período de prova ou mesmo com infração penal cometida antes daquela cuja condenação redundou na concessão do sursis que teve seu período de prova prorrogado O fundamento da prorrogação é o seguinte não é o cometimento do crime ou da contravenção penal que autoriza a revogação do sursis mas a condenação transitada em julgado daí derivada É razoável destarte aguardar o término da ação penal para se constatar se será ou não caso de revogação seja ela obrigatória crime doloso ou facultativa contravenção penal se o réu for condenado ou de extinção da pena privativa de liberdade nos moldes do art 82 do Código Penal na hipótese de ser absolvido A mera instauração de inquérito policial não autoriza a prorrogação do período de prova 2ª hipótese Nas hipóteses de revogação facultativa art 81 3º Nesses casos o juiz pode em vez de decretar a revogação do sursis prorrogar o período de prova até o máximo se este não foi o fixado A prorrogação não é automática Depende de expressa decisão judicial nesse sentido Formulase a indagação Em se tratando de sentença declaratória o ato que declara extinta a pena privativa de liberdade na forma do art 82 do Código Penal pode o juiz depois de encerrado o período de prova prorrogálo por descobrir que o condenado está sendo processado por outro crime ou contravenção penal para decidir no futuro se o benefício deve ou não ser revogado Formaramse duas posições acerca do assunto 1ª posição É possível a prorrogação Aliás essa prorrogação é automática prescindindo de decisão judicial É o entendimento dominante consagrado inclusive no Supremo Tribunal Federal e no Superior Tribunal de Justiça12 Anotese contudo que a prorrogação será cabível desde que o juiz ainda não tenha declarado extinta a pena privativa de liberdade com o consequente trânsito em julgado De fato se já tiver transitado em julgado a declaração de extinção da punibilidade nada mais poderá ser feito 2ª posição Não se admite a prorrogação A pena estará automaticamente extinta com o término do período de prova Cumprido integralmente o período de prova sem revogação considerase extinta a pena privativa de liberdade É o que se extrai do art 82 do Código Penal A sentença é meramente declaratória e retroage ao dia em que se encerrou o período de prova Exigese prévia manifestação do Ministério Público sob pena de nulidade com fundamento no art 67 da Lei de Execução Penal Em regra as penas impostas em condenações pela prática de crimes hediondos ou equiparados tráfico de drogas tortura e terrorismo são superiores a dois anos por se tratarem de infrações penais consideradas de elevada gravidade pelo Poder Constituinte Originário e consequentemente também pelo legislador ordinário Seria extrapolado portanto o limite quantitativo para aplicação da suspensão condicional da pena Todavia é possível vislumbrar ao menos em tese algumas situações em que uma pena privativa de liberdade decorrente da prática de crime hediondo ou equiparado comporte o benefício Imaginese um tráfico de drogas art 33 caput com pena no mínimo legal 5 anos e acompanhado da causa de diminuição contida no 4º do art 33 da Lei 113432006 em seu patamar máximo 23 A pena seria de um ano e oito meses dentro do teto previsto no art 77 caput do Código Penal Questionase É cabível nesse caso a suspensão condicional da pena Formaramse duas correntes sobre o assunto 1ª Corrente É inaplicável o sursis A dimensão do benefício não se compactua com a natureza do delito em relação ao qual a própria Constituição Federal em seu art 5º XLIII determinou um tratamento mais severo É a posição dominante13 2ª Corrente É cabível o sursis o qual não foi vedado pela Lei 80721990 Lei dos Crimes Hediondos Não pode o juiz criar restrições não previstas por lei em face da inadmissibilidade no campo penal da analogia in malam partem Há decisão do Supremo Tribunal Federal nesse sentido14 Nada impede a concessão de sursis ao estrangeiro que se encontra em território nacional de forma permanente ou transitória ainda que responda a processo de expulsão por força da prática de crime comum É o que se extrai da regra contida no art 54 3º da Lei 134452017 Lei de Migração Art 54 A expulsão consiste em medida administrativa de retirada compulsória de migrante ou visitante do território nacional conjugada com o impedimento de reingresso por prazo determinado 3º O processamento da expulsão em caso de crime comum não prejudicará a progressão de regime o cumprimento da pena a suspensão condicional do processo a comutação da pena ou a concessão de pena alternativa de indulto coletivo ou individual de anistia ou de quaisquer benefícios concedidos em igualdade de condições ao nacional brasileiro Enquanto não declarada a extinção da sanção penal por força do integral decurso do período de prova do sursis sem revogação o condenado cumprirá ainda que de forma alternativa a pena privativa de liberdade Estarão presentes destarte os efeitos da condenação criminal Logo ao agente incidirá a suspensão dos direitos políticos com fulcro no art 15 III da Constituição Federal O habeas corpus não é adequado para se pleitear a concessão da suspensão condicional da pena nem para discutir o cabimento das condições legais e judiciais impostas no caso concreto pois em tais hipóteses seria necessária a análise dos requisitos subjetivos indicados pelo art 77 I e principalmente II do Código Penal E como se sabe não se admite dilação probatória na via estreita desse remédio constitucional Excepcionamse todavia situações teratológicas como exemplificativamente no caso de um antigo Prefeito a quem é imposta a condição de varrer as ruas do centro da cidade que governou Em primeira análise a suspensão condicional da pena não é compatível com a detração penal Com efeito o benefício se destina a impedir a execução de uma pena privativa de liberdade motivo pelo qual é impossível o desconto do período cumprido a título de prisão provisória no montante da pena imposta que por estar suspensa sequer é objeto de cumprimento pelo condenado Entretanto se o sursis for revogado daí resultará o cumprimento integral da pena privativa de liberdade autorizandose a partir de então a aplicação do instituto da detração penal e de todos os seus efeitos Discutese a possibilidade de incidência de indulto aos condenados que se encontram em período de prova como decorrência da suspensão condicional da execução da pena Há duas posições sobre o assunto 1ª posição É possível O indulto se destina a pessoas condenadas ao cumprimento de penas privativas de liberdade e o sursis nada mais é do que uma forma diferenciada de execução da pena Pode o decreto de indulto portanto beneficiar condenados que estejam cumprindo a suspensão condicional da pena 2ª posição Não é possível O indulto alcança somente os condenados que se encontram privados da liberdade e aquele que teve suspensa sua pena não precisa desse benefício emanado do Poder Executivo federal15 Em cumprimento ao previsto no art 59 III do Código Penal deve o magistrado depois de superado o critério trifásico e dosada a pena privativa de liberdade estabelecer o regime prisional inicial E para encontrar o regime prisional adequado o juiz se apoia nos critérios norteadores indicados pelo art 33 2º e 3º do Código Penal Superada essa etapa passa o magistrado à fase seguinte analisar a possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos ou multa Finalmente se a pena privativa de liberdade aplicada não foi substituída por restritiva de direitos ou multa e não ultrapassar dois anos o juiz ingressa na derradeira operação aferir o cabimento da suspensão condicional da pena Portanto concluise que o juiz ao decidir sobre a concessão ou não do sursis já terá definido o regime prisional para início de cumprimento da pena privativa de liberdade fechado semiaberto ou aberto respeitando o direito do condenado de saber as condições em que cumprirá a sanção penal caso não aceite o benefício ou na hipótese de ser este revogado no futuro Não deve ser aceita portanto a tese pela qual se sustenta que uma vez concedido o sursis prescindese da fixação do regime prisional Essa definição é lógica e legalmente precedente podendose concluir que se assim agir o magistrado estará violando o procedimento de aplicação da pena delineado pelo art 59 do Código Penal 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 MARTINS José Salgado Direito penal introdução e parte geral São Paulo Saraiva 1974 p 375 Cf SIQUEIRA Galdino Tratado de direito penal Parte geral Rio de Janeiro José Konfino Editor 1947 t II p 863864 Esse montante da pena também foi expressamente previsto para o sursis no tocante aos crimes contra a Segurança Nacional Lei 71701983 art 5º A valoração desfavorável quanto à culpabilidade do agravante ante a maior reprovabilidade de sua conduta consubstanciada na gravidade concreta do crime impede o deferimento da suspensão condicional da pena por ausência do requisito previsto no inciso II do art 77 do Código Penal STJ AgRg no AREsp 368384DF rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 22202013 HC 80923RJ rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 06122007 STF HC 92322PA rel orig Min Cármen Lúcia rel p o acórdão Min Marco Aurélio 1ª Turma 18122007 noticiado no Informativo 493 A consequência da revogação do sursis da pena é o cumprimento da reprimenda privativa de liberdade imposta no édito condenatório que se encontrava suspensa diante do preenchimento dos requisitos constantes no art 77 do Código Penal STJ HC 142263RS rel Min Félix Fischer 5ª Turma j 03122009 RHC 18521MG rel Min Arnaldo Esteves Lima 5ª Turma j 03042007 Em igual sentido HC 43950SP rel Min Hamilton Carvalhido 6ª Turma j 10052007 STF HC 91562PR rel Min Joaquim Barbosa 2ª Turma j 09102007 HC 175758SP rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 04102011 e REsp 723090MG rel Min Gilson Dipp 5ª Turma j 19092006 É também o pensamento do Supremo Tribunal Federal HC 114862SP rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 01102013 Esta Corte tem firmado o entendimento no sentido de que o período de prova do sursis fica automaticamente prorrogado quando o beneficiário está sendo processado por outro crime ou contravenção STJ HC 175758SP rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 04102011 12 13 14 15 STF HC 91562PR rel Min Joaquim Barbosa 2ª Turma j 09102007 e STJ REsp 723090MG rel Min Gilson Dipp 5ª Turma j 19092006 STF HC 101919MG rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 06092011 noticiado no Informativo 639 No STJ O óbice previsto no artigo 44 da Lei 113432006 à suspensão condicional da pena imposta ante tráfico de drogas mostrase afinado com a Lei 80721990 e com o disposto no inciso XLIII do artigo 5º da Constituição Federal HC 197268SP rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 26022013 HC 86698SP rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 19062007 STJ HC 276416SP rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 27032014 401 402 EVOLUÇÃO HISTÓRICA O livramento condicional surgiu no ano de 1846 na França com a decisão do magistrado Beneville que se referiu ao instituto denominandoo liberação preparatória No Brasil sua primeira manifestação ocorreu com a edição do Código Penal Republicano de 1890 arts 50 a 52 regulamentado pelos Decretos 4577 de 5 de setembro de 1922 e 16665 de 6 de novembro de 1924 A partir de então foi mantido pela legislação penal brasileira como derradeira etapa do processo escalonado de reforma do criminoso CONCEITO Livramento condicional é o benefício que permite ao condenado à pena privativa de liberdade superior a 2 dois anos a liberdade antecipada condicional e precária desde que cumprida parte da reprimenda imposta e sejam observados os demais requisitos legais A liberdade é antecipada condicional e precária Antecipada pois o condenado retorna ao convívio social antes do integral cumprimento da pena privativa de liberdade Condicional pois durante o período restante da pena período de prova o egresso submetese ao atendimento de determinadas condições fixadas na decisão que lhe concede o benefício E precária pois pode ser revogada se sobrevier uma ou mais condições previstas nos arts 86 e 87 do Código Penal Em sintonia com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal Para maior respeito à finalidade reeducativa da pena o livramento condicional constitui a última etapa da execução penal timbrada esta 403 404 pela ideia central da liberdade responsável do condenado de modo a permitirlhe melhores condições de reinserção social A Lei de Execução Penal é de ser interpretada com os olhos postos em seu art 1º Artigo que institui a lógica da prevalência de mecanismos de reinclusão social e não de exclusão do sujeito apenado no exame dos direitos e deveres dos sentenciados Isso para favorecer sempre que possível a redução de distância entre a população intramuros penitenciários e a comunidade extramuros Essa particular forma de parametrar a interpretação da lei no caso a LEP é a que mais se aproxima da Constituição Federal que faz da cidadania e da dignidade da pessoa humana dois de seus fundamentos incisos II e III do art 1º A reintegração social dos apenados é justamente pontual densificação de ambos os fundamentos constitucionais1 NATUREZA JURÍDICA O livramento condicional constituise em benefício conferido pela lei ao condenado que preenche os requisitos legais2 Embora se constitua em instituto penal restritivo da liberdade por importar em limitação de diversos direitos da pessoa humana funciona como direito subjetivo pois a liberdade precoce não pode ser negada àquele que atende a todos os mandamentos aplicáveis à espécie E nada obstante seja concedido durante a execução da pena privativa de liberdade não pode ser tratado como um de seus incidentes pois não encontra previsão nos arts 180 a 193 da Lei 72101984 Lei de Execução Penal Damásio E de Jesus entretanto apresenta posicionamento diverso Para ele cuidase de forma especial de cumprimento da pena O instituto na reforma penal de 1984 não constitui mais um direito público subjetivo de liberdade do condenado nem incidente de execução É medida penal de natureza restritiva da liberdade de cunho repressivo e preventivo Não é um benefício3 DIFERENÇAS COM O SURSIS Livramento condicional e sursis apresentam pontos comuns São benefícios conferidos aos condenados à pena privativa de liberdade que atendem a diversos requisitos previstos em lei São ainda condicionais pois durante o período de vigência dos institutos seus destinatários sujeitam se à fiscalização quanto à observância de condições judicialmente fixadas Em ambos esse período de prova tem início com a audiência admonitória E finalmente apresentam a finalidade de evitar a execução da pena privativa de liberdade total ou parcialmente Mas as diferenças são nítidas No livramento condicional o condenado retorna ao convívio social depois do cumprimento de parte da pena que lhe foi imposta dependendo da natureza do crime e de suas condições pessoais Foi condenado cumpre uma fração da reprimenda e posteriormente é colocado em liberdade Por sua vez no sursis o condenado sequer inicia o cumprimento da pena privativa de liberdade Daí o seu nome suspensão condicional da execução da pena privativa de liberdade É condenado mas a execução da sua pena é suspensa obstando seu início Distinguemse também quanto à duração Com efeito no livramento condicional o período de prova também chamado de período de experiência isto é o tempo em que o condenado deve observar as condições legais e judiciais impostas bem como respeitar as causas de revogação é representado pelo restante da pena ainda não cumprido Exemplo o réu condenado a 8 oito anos obtém o benefício depois de 4 quatro anos O período de prova será composto pelos 4 quatro anos remanescentes No sursis de seu turno o período de prova deve ser estipulado dentro dos parâmetros legalmente indicados entre 2 dois e 4 quatro anos mas que pode ser diverso tal como no sursis etário e no sursis humanitário bem como em hipóteses indicadas por leis especiais como é o caso dos crimes contra a segurança nacional Lei 71701983 art 5º Finalmente o sursis geralmente é concedido pela sentença condenatória que comporta recurso de apelação CPP art 593 e 4º Mas também pode ser concedido pelo acórdão em grau de recurso ou em se tratando de 405 competência originária dos tribunais Já o livramento condicional é obrigatoriamente deferido pelo juízo da execução e para impugnar essa decisão o recurso cabível é o agravo em execução LEP art 197 JUÍZO COMPETENTE PARA CONCESSÃO DO LIVRAMENTO CONDICIONAL O livramento condicional somente pode ser concedido depois de cumprida parte da pena privativa de liberdade Normalmente já existe trânsito em julgado da condenação inclusive com cumprimento da pena razão pela qual é competente o juízo da execução para analisar o cabimento ou não do benefício LEP art 66 III e 406 407 4071 Todavia o Supremo Tribunal Federal tem admitido a concessão do livramento condicional em sede de execução provisória isto é com o trânsito em julgado da condenação apenas para a acusação A propósito A jurisprudência do STF já não reclama o trânsito em julgado da condenação nem para a concessão do indulto nem para a progressão de regime de execução nem para o livramento condicional4 Nesse caso também será competente o juízo da execução Em face do caráter itinerante do processo de execução é competente o juízo do local em que o condenado cumpre a pena independentemente da comarca em que foi proferida a sentença condenatória Exemplo a sentença condenatória foi proferida na comarca de São Paulo mas o agente encontrase recolhido na penitenciária de Ribeirão Preto Será competente o juízo da execução desta última comarca EGRESSO É a nomenclatura dispensada pelo art 26 II da Lei de Execução Penal ao condenado beneficiado pelo livramento condicional durante o período de prova REQUISITOS O livramento condicional para ser concedido depende do preenchimento de vários requisitos objetivos e subjetivos5 Aqueles se relacionam à pena espécie quantidade e parcela já cumprida bem como à reparação do dano estes dizem respeito às condições pessoais do condenado Requisitos objetivos O art 83 I II IV e V do Código Penal exige para concessão do livramento condicional 4 quatro requisitos objetivos relacionados à pena e à reparação do dano 1 Espécie da pena Deve ser privativa de liberdade reclusão detenção ou prisão simples 2 Quantidade da pena A pena privativa de liberdade imposta ao condenado a qual se encontra em sede de execução deve ser igual ou superior a 2 dois anos Nesse ponto convém destacar que nos termos do art 84 do Código Penal As penas que correspondem a infrações diversas devem somarse para efeito do livramento Essa medida é salutar pois se não existisse estaria vedado o benefício a indivíduo que exemplificativamente fora condenado por dois furtos de diminuta gravidade cada um com pena de 1 um ano e 2 dois meses de reclusão uma vez que o montante das penas impediria o sursis enquanto para um criminoso autor de roubo com emprego de arma de fogo com pena de 7 sete anos a medida seria cabível Finalmente não há como somar a pena aplicada em sentença ainda não transitada em julgado ao cálculo do total da pena a ser cumprida para efeito de concessão do livramento condicional6 3 Parcela da pena já cumprida O montante depende das condições do condenado e da natureza do crime por ele praticado Para o condenado que não for reincidente em crime doloso e apresentar bons antecedentes basta o cumprimento de mais de um terço da pena CP art 83 I Tratase do livramento condicional simples E em relação ao reincidente em crime culposo Há duas posições a encaixase na regra prevista no art 83 I do Código Penal e b esse tratamento a ele não se aplica pois um reincidente em crime culposo não pode ser considerado possuidor de bons antecedentes No caso porém de condenado reincidente em crime doloso exigese o cumprimento de mais de metade da pena CP art 83 II É o livramento condicional qualificado E na hipótese de diversos crimes o requisito objetivo é o cumprimento de mais da metade do total das penas unificadas7 Falhou a lei contudo ao olvidarse de uma situação condenado não reincidente em crime doloso mas portador de maus antecedentes Não se a b enquadra no inciso I nem no inciso II do art 83 do Código Penal Então é de se questionar como deve ser tratado Formaramse duas posições sobre o assunto Deve receber igual tratamento dispensado ao reincidente em crime doloso de modo que o livramento condicional só será possível com o cumprimento de mais de metade da pena Como não possui bons antecedentes não se amolda ao inciso I que exige dois requisitos cumulativos não ser reincidente em crime doloso e ostentar bons antecedentes Aplicase subsidiariamente portanto a regra delineada pelo inciso II É necessário seja adotada a posição mais favorável ao condenado em face da ausência de expressa previsão legal Destarte será cabível o benefício com o cumprimento de mais de um terço da pena pois embora portador de maus antecedentes não é reincidente em crime doloso Alberto Silva Franco filiase a esse entendimento Não se pode em matéria penal interpretar em detrimento de quem sofre a aflição da pena texto que apresenta inadequação evidente pena de se configurar ilegal restrição ao pedaço da liberdade individual cerceado à ausência de norma pois a isso equivale a imprecisão a contradição ou a lacuna Não há como enquadrar como detentor de duas circunstâncias exigidas cumulativamente pela lei para a exigência do prazo maior de metade da pena quem na verdade ostenta apenas uma dessas circunstâncias contra si Impossível sair do problema que é da lei interpretandoa em detrimento do condenado em matéria penal8 É também a posição do Superior Tribunal de Justiça No caso de paciente primário de maus antecedentes como o Código não contemplou tal hipótese ao tratar do prazo para concessão do livramento condicional não se admite a interpretação em prejuízo do réu devendo ser aplicado o prazo de um terço O paciente primário com maus antecedentes não pode ser equiparado ao reincidente em seu prejuízo9 Finalmente em se tratando de condenado pela prática de crime hediondo Lei 80721990 art 1º ou equiparado tráfico de drogas tortura e terrorismo ou ainda pelo tráfico de pessoas é necessário o cumprimento de mais de dois terços da pena desde que não seja reincidente específico em delitos dessa natureza Cuidase do livramento condicional específico10 Na hipótese de execução conjunta de penas por crime hediondo ou equiparado e crime comum a concessão do livramento condicional deve ser analisada separadamente computandose por primeiro o percentual de 23 referente à condenação pelo delito hediondo ou equiparado e em seguida o percentual de 13 concernente ao delito comum11 A leitura do art 83 V do Código Penal e do art 44 parágrafo único da Lei 113432006 Lei de Drogas deixa nítida a proibição do livramento condicional para o condenado por crime hediondo ou equiparado quando reincidente específico em delito dessa natureza Tal proibição é constitucional pois a disciplina desta matéria é reservada à legislação ordinária podendo ser impedido o benefício às pessoas que revelam comportamento social desajustado e elevada periculosidade Em suma a regra é o integral cumprimento da pena facultandose à lei restringir a liberdade antecipada àqueles que não preenchem os requisitos por ela exigidos Como já decidido pelo Superior Tribunal de Justiça O livramento condicional consiste na última etapa da execução da pena visando a ressocialização do apenado atendidos os requisitos do art 83 do CP vedado contudo expressamente o benefício para reincidentes específicos A vedação legal à concessão do livramento condicional ao reincidente específico não padece de inconstitucionalidade por ofensa ao princípio da individualização da pena por atender aos fins repressivos da reprimenda12 Nesse contexto nas hipóteses em que o réu reincidente específico cumpre pena pela prática de delitos hediondos ou a eles equiparados e também de delitos não hediondos a possibilidade de concessão do livramento condicional estará condicionada ao cumprimento integral das penas referentes àqueles delitos13 a b 4072 E surge nesse ponto mais uma discussão Para fins de livramento condicional o que se entende por reincidente específico Formaramse basicamente duas posições É reincidente específico aquele que condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado pratica novamente qualquer um desses delitos ainda que tipificados por dispositivos distintos Exemplo homicídio qualificado e tráfico de drogas É a tendência atualmente dominante pois a lei dos crimes hediondos não definiu a reincidência específica e todos os delitos por ela abrangidos merecem igual tratamento por força constitucional CF art 5º XLIII É reincidente específico o agente que depois de condenado por crime hediondo ou equiparado comete idêntico delito Exemplo latrocínio e latrocínio 4 Reparação do dano Dispensase esse requisito quando comprovada a efetiva impossibilidade do condenado em atendêlo CP art 83 IV Esse requisito pode ser ainda dispensado quando a vítima não for encontrada para ser indenizada bem como quando renunciar a dívida ou mostrarse desinteressada em ser ressarcida Requisitos subjetivos Não bastam os requisitos objetivos Reclamase ainda o atendimento aos requisitos subjetivos legalmente previstos atinentes à pessoa do condenado São eles 1 Comportamento satisfatório durante a execução da pena Com a edição da Lei 107922003 o art 112 caput da Lei 72101984 Lei de Execução Penal referese ao bom comportamento carcerário e não mais ao comportamento satisfatório Contudo a redação do Código Penal foi mantida art 83 III Esse requisito deve ser comprovado pelo diretor do estabelecimento prisional levando em conta o modo de agir do condenado após o início da execução da pena de uma forma ampla desprezandose seu comportamento pretérito Na dicção do Superior Tribunal de Justiça Para a concessão de livramento condicional a avaliação da satisfatoriedade do comportamento do executado não pode ser limitada a um período absoluto e curto de tempo Embora não se possa inviabilizar a concessão do livramento condicional apenas porque durante a execução penal o condenado cometeu uma falta grave o comportamento de um recluso do sistema penitenciário há de ser aferido em sua inteireza por todo o período em que esteve cumprindo sua pena Cingir o comprovado comportamento satisfatório durante a execução da pena conforme demanda o art 83 III do CP apenas a um curto período de tempo que anteceda a análise do pedido implica dispensar o magistrado especialmente o que está em permanente contato com a realidade dos presídios de usar seu tirocínio sua experiência e as informações de que dispõe nos autos para avaliar o merecimento do benefício pretendido pelo interno O poder discricionário do juízo da execução penal não pode ser restringido a ponto de transformar a avaliação subjetiva em um simples cálculo aritmético14 E nos termos da Súmula 441 do Superior Tribunal de Justiça A falta grave não interrompe o prazo para obtenção de livramento condicional15 No caso concreto entretanto a prática de falta grave pode inviabilizar o benefício em face da ausência de um dos seus requisitos subjetivos qual seja o bom comportamento carcerário16 2 Bom desempenho no trabalho que lhe foi atribuído Nada obstante a proibição do trabalho forçado CF art 5º XLVII c o exercício de atividade laboral é obrigatório para a concessão do livramento condicional O preso não é forçado a trabalhar mas se não o fizer será vedado o benefício da liberdade antecipada Esse requisito deve ser desprezado quando em face de problemas do estabelecimento prisional nenhum trabalho foi atribuído ao condenado 3 Aptidão para prover à própria subsistência mediante trabalho honesto Exigese unicamente prova da aptidão para o exercício de trabalho honesto e não de emprego certo e garantido após a saída do estabelecimento prisional De fato requisito dessa natureza inviabilizaria o benefício pois se até mesmo muitos primários e de vida pretérita escorreita encontramse desempregados o que falarse daqueles que carregam em suas folhas de antecedentes a pecha da condenação por crimes e contravenções penais 4 Para o condenado por crime doloso cometido com violência ou grave ameaça à pessoa a constatação de condições pessoais que façam presumir que o liberado não voltará a delinquir Encontrase definido pelo art 83 parágrafo único do Código Penal e deve ser constatado pela Comissão Técnica de Classificação responsável pela elaboração e fiscalização do programa de individualização da execução penal LEP arts 5º a 9º Fazse um juízo de prognose direcionado ao futuro com o propósito de constatar se em razão de suas condições pessoais é provável a reincidência pelo condenado Em caso positivo negase o benefício Esse requisito obrigatório para os crimes cometidos com violência à pessoa ou grave ameaça é facultativo para os demais delitos Pode ser inclusive realizado exame criminológico para elaboração desse prognóstico Esse procedimento entretanto encontra resistência em parte da jurisprudência em face da ausência de previsão legal 408 RITO DO LIVRAMENTO CONDICIONAL O pedido de livramento condicional deve ser endereçado ao juízo da execução LEP arts 66 III e e 131 Não precisa ser subscrito por advogado a teor do art 712 caput do Código de Processo Penal O livramento condicional poderá ser concedido mediante requerimento do sentenciado de seu cônjuge ou de parente em linha reta ou por proposta do diretor do estabelecimento penal ou por iniciativa do Conselho Penitenciário E antes de sua decisão o juiz deve ouvir o Ministério Público sob pena de nulidade LEP arts 67 e 131 Discutese a necessidade de manifestação do Conselho Penitenciário antes da concessão do livramento condicional A polêmica reside na Lei 107922003 que alterou diversos dispositivos da Lei de Execução Penal Com efeito entre as incumbências do Conselho Penitenciário não mais se inclui emitir parecer sobre livramento condicional pois esse encargo foi eliminado do art 70 I da Lei de Execução Penal pela lei acima indicada Entretanto essa mesma lei não modificou o art 131 da Lei de Execução Penal que reclama a oitiva do Conselho Penitenciário Essa é a polêmica Prescindese ou não do parecer do Conselho Penitenciário Há duas posições sobre o assunto 1ª posição É necessário o parecer do Conselho Penitenciário Embora a Lei 107922003 tenha retirado do art 70 I da Lei de Execução Penal dentre as incumbências do Conselho Penitenciário a de emitir parecer sobre livramento condicional remanesce no art 131 da LEP a necessidade dessa manifestação no procedimento da liberdade antecipada 2ª posição Com a edição da Lei 107922003 dispensase o parecer do Conselho Penitenciário Pode o juiz da execução portanto conceder ou denegar o livramento condicional sem a prévia manifestação desse órgão Anotese contudo que o parecer do Conselho Penitenciário não foi extirpado peremptoriamente Fica à discricionariedade do juiz quando reputar necessário determinar sua realização Para o Supremo Tribunal Federal A Lei 107922003 deu nova redação ao artigo 112 da Lei de Execuções Penais Lei n 72101984 excluindo a previsão de exame criminológico para a obtenção da progressão de regime livramento condicional indulto e comutação de penas O silêncio da Lei a respeito da obrigatoriedade do exame criminológico contudo não inibe o juízo da execução do poder de determinálo desde que fundamentadamente Isso porque a análise do requisito subjetivo pressupõe a verificação do mérito do condenado que não está adstrito ao bom comportamento carcerário como faz parecer a literalidade da lei sob pena de concretizarse o absurdo de transformar o diretor do presídio no verdadeiro concedente do benefício e o juiz em simples homologador17 Ressaltese porém qualquer que seja a posição adotada que a 409 manifestação do Conselho Penitenciário tipicamente de índole administrativa tanto pela concessão como pela denegação do livramento condicional não vincula o juízo da execução que pode acolher ou rejeitar o parecer lançado Vejase a propósito o teor do art 713 do Código de Processo Penal As condições de admissibilidade conveniência e oportunidade da concessão do livramento serão verificadas pelo Conselho Penitenciário a cujo parecer não ficará entretanto adstrito o juiz Finalmente a decisão judicial que concede ou denega o livramento condicional pode ser impugnada por recurso de agravo LEP art 197 Concedido o benefício será expedida carta de livramento com cópia integral da decisão judicial em duas vias remetendose uma à autoridade administrativa incumbida da sua execução e outra ao Conselho Penitenciário LEP art 136 Após em dia marcado pelo presidente do Conselho Penitenciário será realizada audiência admonitória consistente em cerimônia solene no estabelecimento onde o condenado cumpre a pena privativa de liberdade observandose o procedimento previsto no art 137 da Lei de Execução Penal I a sentença será lida ao liberando na presença dos demais condenados pelo presidente do Conselho Penitenciário ou membro por ele designado ou na falta pelo juiz II a autoridade administrativa chamará a atenção do liberando para as condições impostas na sentença de livramento e III o liberando declarará se aceita as condições Se aceitar as condições o liberado ao sair do estabelecimento penal receberá uma caderneta que exibirá à autoridade judiciária ou administrativa sempre que lhe for exigida LEP art 138 caput CONDIÇÕES Como indica o próprio nome do instituto o livramento é condicional Com efeito a liberdade antecipada se sujeita ao cumprimento de condições a serem observadas pelo condenado durante o período de prova ou de experiência isto é pelo tempo restante da pena privativa de liberdade Esse período de prova tem início com a cerimônia realizada no a b c a b estabelecimento prisional em que o condenado cumpre a pena realizada após a concessão do benefício pelo juízo da execução Na cerimônia com suas etapas definidas pelo art 137 da Lei de Execução Penal o condenando declara se aceita ou não as condições a que fica subordinado o livramento CP art 85 Essas condições podem ser legais ou judiciais Condições legais são as que decorrem do mandamento legal Estão previstas em rol taxativo Nos termos do art 132 1º da Lei de Execução Penal serão sempre impostas ao liberado condicional as obrigações seguintes obter ocupação lícita dentro de prazo razoável se for apto para o trabalho Esse prazo razoável deve ser estipulado pelo juiz Entendese que se o condenado for pessoa portadora de deficiência física impeditiva de atividade laborativa não se impõe essa condição comunicar periodicamente ao juiz sua ocupação O prazo da comunicação também deve ser indicado pelo magistrado Na praxe normalmente é mensal não mudar do território da comarca do Juízo da Execução sem prévia autorização deste Sem prejuízo dessas condições podem ainda ser impostas condições judiciais Não são de aplicação peremptória reservando espaço para a discricionariedade do magistrado Estão indicadas em rol exemplificativo pois o juiz da execução tem a faculdade de estabelecer outras condições desde que adequadas ao caso e em conformidade com os direitos constitucionais do condenado Em conformidade com o art 132 2º da Lei de Execução Penal poderão ser ainda impostas ao liberado condicional entre outras obrigações as seguintes não mudar de residência sem comunicação ao juiz e à autoridade incumbida da observação cautelar e de proteção recolherse à habitação em hora fixada e c 4010 não frequentar determinados lugares Nas duas últimas condições b e c o juízo da execução deve indicar precisamente qual o horário para recolhimento da habitação e os lugares cuja frequência está proibida Falase ainda em condições legais indiretas Consistem nas causas de revogação do livramento condicional e recebem esse nome pela razão de se constituírem em condições negativas ou seja revogam o benefício se estiverem presentes Portanto o condenado para não ensejar a revogação da liberdade antecipada durante o período de prova deve evitar que tais acontecimentos se verifiquem REVOGAÇÃO DO LIVRAMENTO CONDICIONAL O livramento condicional é precário Destarte é inerente ao benefício sua possibilidade de revogação a qualquer momento desde que não sejam cumpridas suas condições legais judiciais ou indiretas A revogação pode ser obrigatória ou facultativa e suas causas encontramse disciplinadas pelos arts 86 e 87 do Código Penal Deve ser decretada pelo juiz da execução de ofício a requerimento do Ministério Público ou mediante representação do Conselho Penitenciário Em qualquer caso o juiz deve proceder à prévia oitiva do condenado sob pena de nulidade por violação do princípio constitucional da ampla defesa 40101 401011 Revogação obrigatória De acordo com o art 86 do Código Penal Art 86 Revogase o livramento se o liberado vem a ser condenado a pena privativa de liberdade em sentença irrecorrível I por crime cometido durante a vigência do benefício II por crime anterior observado o disposto no art 84 deste Código Podem ser retiradas algumas conclusões desse dispositivo legal Inicialmente são causas legais de revogação pois ao magistrado não é dado o direito de recusálas Decorrem da lei sem qualquer margem de discricionariedade para o Poder Judiciário Ademais a condenação irrecorrível por contravenção penal qualquer que seja o momento de sua prática com aplicação de pena privativa de liberdade não autoriza a revogação obrigatória do livramento condicional Essa posição se reforça com a análise do art 87 do Código Penal que permite a revogação facultativa do benefício quando o liberado é condenado irrecorrivelmente por contravenção penal a pena que não seja privativa de liberdade Se não bastasse não é possível a revogação obrigatória do livramento condicional quando o crime é cometido antes da cerimônia do livramento condicional mas após a decisão judicial que concedeu o benefício De fato o inciso I referese ao crime cometido durante a vigência do benefício ao passo que o inciso II reportase a crime anterior Finalmente a decisão judicial que revoga o livramento condicional em razão de condenação irrecorrível dispensa fundamentação pois toda a motivação já foi efetuada na sentença condenatória limitandose o juízo da execução a reconhecêla Inciso I O liberado deve ser condenado à pena privativa de liberdade por decisão transitada em julgado por crime cometido durante a vigência do benefício Nesse caso o juiz poderá ordenar a prisão do liberado ouvidos o a b c Conselho Penitenciário e o Ministério Público suspendendo o curso do livramento condicional cuja revogação entretanto ficará dependendo da decisão final LEP art 145 Se a decisão final for condenatória e transitar em julgado o juiz deverá revogar o livramento condicional De fato o juiz não poderá declarar extinta a pena enquanto não passar em julgado a sentença em processo a que responde o liberado por crime cometido na vigência do livramento CP art 89 Na esteira da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal À luz do disposto no art 86 I do Código Penal e no art 145 da Lei das Execuções Penais se durante o cumprimento do benefício o liberado cometer outra infração penal o juiz poderá ordenar a sua prisão suspendendo o curso do livramento condicional cuja revogação entretanto aguardará a conclusão do novo processo instaurado A suspensão do livramento condicional não é automática Pelo contrário deve ser expressa por decisão fundamentada para se aguardar a apuração da nova infração penal cometida durante o período de prova e então se o caso revogar o benefício18 E como violou a confiança nele depositada pelo juízo da execução praticando um crime durante a vigência do benefício os efeitos da revogação são rigorosos quais sejam não se computa na pena o tempo em que esteve solto o liberado não se concede em relação à mesma pena novo livramento e não se pode somar o restante da pena cominada ao crime à nova pena para fins de concessão de novo livramento É o que se extrai do art 88 do Código Penal19 bem como dos arts 141 e 142 da Lei de Execução Penal Para o Superior Tribunal de Justiça Praticado pelo condenado novo crime com trânsito em julgado no curso do livramento condicional deverá o benefício ser revogado e o lapso de tempo em que o beneficiário ficou em liberdade não será computado como pena cumprida O gozo do livramento condicional requer responsabilidade do beneficiário e um comportamento afastado da vida 401012 a b c delitiva de forma que ele dê mostras de que merece desfrutar do convívio social sob pena de ver revogado o benefício e perdido o lapso temporal que esteve em liberdade20 Inciso II O livramento condicional deve ser revogado quando o liberado vem a ser condenado a pena privativa de liberdade em sentença irrecorrível por crime anterior observado o disposto no art 84 do Código Penal A referência ao art 84 tem o seguinte significado somente é possível a revogação quando a nova pena privativa de liberdade somada à anterior que ensejou o livramento condicional resultar na impossibilidade de manutenção do benefício Exemplo depois de condenado a 12 anos de reclusão o réu primário e com bons antecedentes cumpriu mais de quatro anos da pena e a ele foi concedida a liberdade antecipada Após dois anos no gozo do benefício e portanto faltando seis anos para a extinção da pena privativa de liberdade é condenado a 20 anos de reclusão por crime anterior Sua pena faltante somadas as duas é de 26 anos razão pela qual é incompatível preservar o livramento condicional com os seis anos de pena até então cumpridos que representam menos de um terço do total Como entretanto o liberado não abusou a confiança nele depositada pelo Poder Judiciário pois o crime foi cometido antes da concessão da liberdade antecipada os efeitos da revogação são mais suaves quais sejam computase como cumprimento da pena o tempo em que o condenado esteve solto admitese a soma do tempo das duas penas para concessão de novo livramento e permitese novo livramento condicional desde que o condenado tenha cumprido mais de um terço ou mais de metade do total da pena imposta soma das penas conforme seja primário e portador de bons antecedentes ou reincidente em crime doloso É o que consta do art 88 do Código Penal e dos arts 141 e 142 da Lei de Execução Penal Como já decidido pelo Superior Tribunal de Justiça 40102 Determina o art 141 da Lei de Execução Penal que se a revogação do livramento condicional for motivada por infração penal anterior à vigência do benefício computarseá como tempo de cumprimento da pena o período de prova sendo permitida para a concessão de novo livramento a soma do tempo das duas penas Por seu turno o art 142 do mesmo diploma legal estabelece que no caso de revogação por outro motivo não se computará na pena o tempo em que esteve solto o liberado e tampouco se concederá em relação à mesma pena novo livramento21 Revogação facultativa Nos termos do art 87 do Código Penal Art 87 O juiz poderá também revogar o livramento se o liberado deixar de cumprir qualquer das condições constantes da sentença ou for irrecorrivelmente condenado por crime ou contravenção a pena que não seja privativa de liberdade O dispositivo citado contém causas judiciais de revogação do livramento condicional pois fica a critério do magistrado eventual manutenção do benefício E se decidir não revogálo o juiz deverá advertir o liberado ou agravar as condições impostas LEP art 140 parágrafo único22 A revogação facultativa é possível em duas hipóteses 1ª hipótese Se o liberado deixar de cumprir qualquer das obrigações constantes da sentença O motivo dessa causa é simples o livramento é condicional mas o condenado não cumpre as condições assumidas por ocasião da concessão do benefício Se ele não honrou sua palavra o Estado pode revogar a liberdade antecipada com a consequente retomada da execução da pena privativa de liberdade O descumprimento de qualquer condição legal ou judicial faculta a revogação do livramento condicional É prudente contudo sem prejuízo da prévia oitiva do condenado LEP art 143 que lhe seja feita nova advertência com reiteração das condições impostas ou mesmo com o 4011 agravamento de tais condições Em suma razoável tentarse a manutenção do benefício e somente revogálo com o desatendimento reiterado das condições que lhe são inerentes Porém se o juiz optar pela revogação do benefício seus efeitos serão rigorosos pois o liberado abusou da confiança nele depositada pelo Estado Como se infere do art 88 do Código Penal não se desconta na pena o tempo em que esteve solto o condenado e também não se permite a concessão no tocante à mesma pena de novo livramento condicional 2ª hipótese Se o liberado for irrecorrivelmente condenado por crime ou contravenção a pena que não seja privativa de liberdade É irrelevante o momento da prática do crime ou da contravenção penal isto é se antes do livramento condicional ou durante o período de experiência Salientese porém que a revogação facultativa depende de condenação irrecorrível a pena que não seja privativa de liberdade A condenação irrecorrível a pena privativa de liberdade pela prática de crime induz à revogação obrigatória CP art 86 e não gera nenhum efeito se decorrente de contravenção penal De acordo com a regra estipulada pelo art 88 do Código Penal variam os efeitos todavia em razão do momento em que a infração penal foi praticada Se cometido o crime ou contravenção penal anteriormente ao benefício os efeitos são os seguintes descontase da pena o tempo em que esteve solto o condenado e também se permite novo livramento condicional em relação à mesma pena Por outro lado se praticado o crime ou contravenção penal na vigência do benefício os efeitos são mais graves não se desconta da pena o tempo em que esteve solto o condenado e não se autoriza a concessão no tocante à mesma pena de novo livramento condicional SUSPENSÃO DO LIVRAMENTO CONDICIONAL Dispõe o art 145 da Lei de Execução Penal Praticada pelo liberado outra infração penal o juiz poderá ordenar a sua prisão ouvidos o Conselho Penitenciário e o Ministério Público suspendendo o curso do livramento condicional cuja revogação entretanto ficará dependendo da decisão final A revogação do livramento condicional tanto na modalidade obrigatória como na forma facultativa quando motivada pela prática de crime ou contravenção penal depende do trânsito em julgado da condenação É o que consta expressamente dos arts 86 e 87 do Código Penal Pode acontecer entretanto de ser moroso o trâmite da ação penal iniciada em razão do cometimento do crime ou da contravenção penal a ponto de não haver decisão definitiva ao tempo do término do período de prova do livramento condicional Nesse caso deveria ser declarada a extinção da pena privativa de liberdade com fulcro no art 90 do Código Penal Esse procedimento levaria ao inconveniente de posteriormente à extinção da pena privativa de liberdade ser o agente definitivamente condenado por crime ou contravenção penal cometidos antes ou durante a vigência do benefício Para superar esse entrave o art 145 da Lei de Execução Penal permite ao magistrado depois de ouvidos o Conselho Penitenciário e o Ministério Público a suspensão do livramento condicional até a decisão final O dispositivo legal é aplicável às hipóteses descritas pelo art 86 I e II bem como pelo art 87 ambos do Código Penal Com efeito o art 145 da LEP limitase a falar em prática de outra infração penal crime ou contravenção pouco importando se na vigência do livramento condicional ou em momento pretérito Não se exige portanto condenação definitiva bastando o cometimento do crime ou da contravenção penal23 Ademais a condenação por sentença irrecorrível decorrente de crime do qual resulte pena privativa de liberdade deve ensejar a revogação do benefício enquanto a condenação definitiva por crime ou contravenção penal a pena que não seja privativa de liberdade pode produzir igual efeito Mas não é possível a suspensão do livramento condicional quando o liberado deixa de cumprir qualquer das obrigações decorrentes da sentença CP art 87 1ª parte pois a Lei de Execução Penal autoriza essa medida somente quando praticada outra infração penal24 4012 PRORROGAÇÃO DO PERÍODO DE PROVA É cabível a prorrogação do período de prova quando o beneficiário responde a ação penal em razão de crime cometido na vigência do livramento condicional É o que dispõe o art 89 do Código Penal O juiz não poderá declarar extinta a pena enquanto não passar em julgado a sentença em processo a que responde o liberado por crime cometido na vigência do livramento O juiz da vara das execuções não poderá declarar a extinção da pena privativa de liberdade enquanto não transitar em julgado a sentença proferida na ação penal ajuizada em decorrência do crime cometido na vigência do livramento condicional Deve prorrogar o período de prova até o trânsito em julgado da sentença que poderá ser condenatória ou absolutória Durante a prorrogação não subsistem as condições do livramento condicional desde que já tenha sido ultrapassado o período de prova ou seja já tenha se esvaído o tempo restante da pena privativa de liberdade A dúvida reside em saber se essa prorrogação é automática ou se depende de expressa decisão judicial Há duas posições sobre o assunto 1ª posição A prorrogação é automática e prescinde de decisão judicial Para essa corrente basta o recebimento da denúncia ou da queixa É o entendimento que se extrai da leitura do art 89 do Código Penal 2ª posição A prorrogação não é automática e depende de decisão judicial expressa É a posição do Supremo Tribunal Federal À luz do disposto no art 86 I do Código Penal e no art 145 da Lei das Execuções Penais se durante o cumprimento do benefício o liberado cometer outra infração penal o juiz poderá ordenar a sua prisão suspendendo o curso do livramento condicional cuja revogação entretanto aguardará a conclusão do novo processo instaurado A suspensão do livramento condicional não é automática Pelo contrário deve ser expressa por decisão fundamentada para se aguardar a apuração da nova infração penal cometida durante o período de prova e então se o caso revogar o benefício25 a b c 4013 Para ambas as posições a prorrogação somente é possível em relação a crime cometido na vigência do benefício pois o crime anterior permite o desconto na pena do tempo em que esteve solto o condenado Destarte seria inócuo prorrogar o benefício além do período de prova uma vez que a pena privativa de liberdade já estaria integralmente cumprida Pouco importa seja o crime doloso ou culposo punido com reclusão ou detenção Não se admite entretanto a prorrogação do período de prova no caso de contravenção penal cometida durante a vigência do livramento condicional pois a lei fala somente em crime Com o término da prorrogação em razão de crime cometido durante a vigência do benefício operandose o trânsito em julgado da sentença podem ocorrer as seguintes situações o liberado é absolvido declarase a extinção da pena privativa de liberdade o liberado é condenado a pena privativa de liberdade o benefício é obrigatoriamente revogado CP art 86 I e II e o liberado é condenado a pena que não seja privativa de liberdade a revogação do livramento condicional é facultativa CP art 87 in fine EXTINÇÃO DA PENA Superado sem revogação o período de prova do livramento condicional considerase extinta a pena privativa de liberdade CP art 9026 Como estatui a Súmula 617 do Superior Tribunal de Justiça A ausência de suspensão ou revogação do livramento condicional antes do término do período de prova enseja a extinção da punibilidade pelo integral cumprimento da pena Cuidase de sentença meramente declaratória com eficácia retroativa ex tunc à data em que se encerrou o período de prova Destarte extinguese a pena privativa de liberdade com o término sem revogação do período de prova e não com a decisão judicial que se limita a reconhecer o fim da sanção 4014 40141 40142 40143 penal Antes da decretação da extinção da pena privativa de liberdade o magistrado deve ouvir o Ministério Público LEP art 67 QUESTÕES DIVERSAS SOBRE LIVRAMENTO CONDICIONAL Livramento condicional insubsistente É aquele em que o condenado foge do estabelecimento prisional depois da concessão do benefício mas antes da aceitação das condições realizada por ocasião da cerimônia solene descrita pelo art 137 da Lei de Execução Penal Não há causa para revogação do livramento condicional que deve ser considerado insubsistente Utilizase igual raciocínio para a hipótese em que o condenado a quem foi deferido o livramento condicional não comparece por qualquer motivo na referida cerimônia Livramento condicional e habeas corpus O habeas corpus não é meio adequado para discutir eventual equívoco da decisão do juízo da execução que denegou o livramento condicional De fato no bojo do remédio constitucional não se admite dilação probatória indispensável para análise do preenchimento dos requisitos legais exigidos para concessão do benefício Em hipóteses excepcionais porém o tribunal ad quem pode conceder livramento condicional em sede de habeas corpus quando a decisão denegatória for teratológica isto é manifestamente ilegal e todos os requisitos legais estiverem documentalmente comprovados27 Livramento condicional humanitário É o livramento condicional deferido ao condenado que ainda não cumpriu o montante da pena legalmente exigido CP art 83 I II ou V mas está acometido por enfermidade grave e incurável Baseiase em razões de piedade de forma análoga ao sursis humanitário 40144 40145 Não pode ser permitido por ausência de previsão legal Para a concessão do livramento condicional o condenado deve atender a todos os requisitos objetivos e subjetivos exigidos pela legislação em vigor Livramento condicional cautelar Cuidase de criação pretoriana aplicável em duas hipóteses 1 em substituição ao regime aberto visando evitar a inócua prisão domiciliar em face da inexistência de Casa de Albergado e 2 nos casos em que o condenado preenche os requisitos objetivos mas o juízo aguarda o parecer do Conselho Penitenciário para aqueles que acreditam ainda ser essa medida necessária perante a Lei de Execução Penal Se o parecer posteriormente for favorável ratificase o livramento condicional e se negativo ordenase o retorno ao estabelecimento prisional Essa modalidade de livramento condicional deve ser rejeitada Na primeira hipótese por constituirse em decisão judicial estranha ao pedido o regime aberto deve ser deferido ou indeferido não se permitindo a criação de uma terceira alternativa automaticamente excluída E na segunda hipótese por ausência de previsão legal ou estão presentes os requisitos do livramento condicional e o benefício deve ser concedido ou estão ausentes e há de ser negado Não se permite uma meia concessão da liberdade antecipada Livramento condicional para estrangeiro É possível a concessão de livramento condicional ao estrangeiro que cumpre pena no território nacional imposta pela prática de crime comum ainda que esteja em trâmite seu processo de expulsão Extraise tal conclusão do art 54 3º da Lei 134452017 Lei de Migração Art 54 A expulsão consiste em medida administrativa de retirada compulsória de migrante ou visitante do território nacional conjugada com o impedimento de reingresso por prazo determinado 3º O processamento da expulsão em caso de crime comum não prejudicará a progressão de regime o cumprimento da pena a suspensão condicional do processo a comutação da pena ou a concessão de pena alternativa de indulto coletivo ou individual de anistia ou de quaisquer benefícios concedidos em igualdade de condições ao nacional brasileiro 1 2 3 4 5 6 7 8 HC 99652RS rel Min Carlos Britto 1ª Turma j 03112009 No STJ HC 235480SP rel Min Gilson Dipp 5ª Turma j 26062012 STF HC 119938RJ rel Min Rosa Weber 1ª Turma j 03062014 e STJ HC 277229RS rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 18092014 JESUS Damásio E de Direito penal Parte geral 28 ed 2 tir São Paulo Saraiva 2006 v 1 p 625 HC 87801SP rel Min Sepúlveda Pertence 1ª Turma j 02052006 No mesmo sentido HC 90813SP rel Min Cármen Lúcia 1ª Turma j 24042007 É também o entendimento do STJ REsp 1154726RS rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 08052014 STF HC 106218RS rel Min Dias Toffoli 1ª Turma j 26042011 e STJ HC 287754RN rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 20032014 HC 48269RS rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 19042007 noticiado no Informativo 317 Esta Corte possui orientação no sentido de que ao sentenciado reincidente em crime doloso deve ser adotado o lapso preconizado no art 83 II do Código Penal impondose o transcurso do patamar de 12 um meio da sanção para a obtenção da liberdade clausulada não havendo de se cogitar na aplicação concomitante do patamar de 13 um terço para a execução de pena aplicada ao tempo em que o réu ostentava a primariedade e de 12 um meio para as demais execuções STJ EDcl no HC 267328MG rel Min Moura Ribeiro 5ª Turma j 03062014 E também Na definição do requisito objetivo para a concessão de livramento condicional a condição de reincidente em crime doloso deve incidir sobre a somatória das penas impostas ao condenado ainda que a agravante da reincidência não tenha sido reconhecida pelo juízo sentenciante em algumas das condenações Isso porque a reincidência é circunstância pessoal que interfere na execução como um todo e não somente nas penas em que ela foi reconhecida STJ HC 307180RS rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 16042015 noticiado no Informativo 561 FRANCO Alberto Silva STOCO Rui Código penal e sua interpretação jurisprudencial Parte geral 7 ed São Paulo RT 2001 v 1 p 1543 1544 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 HC 102278RJ rel Min Jane Silva Desembargadora convocada do TJMG 6ª Turma j 03042008 Esta exigência é legítima e não ofende a Constituição Federal STJ HC 311656SP rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 25082015 noticiado no Informativo 568 e HC 168588SP rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 14122010 noticiado no Informativo 460 STJ HC 267328MG rel Min Moura Ribeiro 5ª Turma j 25022014 HC 139511RJ rel Min Arnaldo Esteves Lima 5ª Turma j 06102009 STJ HC 84189RJ rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 18122007 REsp 1325182DF rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 20022014 noticiado no Informativo 535 É também o entendimento do STF HC 100062SP rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 20042010 STF HC 118325SP rel Min Teori Zavascki 2ª Turma j 05112013 e STF HC 113763SP rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 17092013 RHC 121851SP rel Min Luiz Fux 1ª Turma j 13052014 É também o entendimento do STJ AgRg no HC 302033SP rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 04092014 HC 119938RJ rel Min Rosa Weber 1ª Turma j 03062014 Para o STF o art 88 do Código Penal é aplicável unicamente ao livramento condicional não incidindo no tocante à comutação da pena HC 98422RJ rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 05102010 noticiado no Informativo 603 AgRg no REsp 897696RS rel Min Jane Silva Desembargadora convocada do TJMG 6ª Turma j 29042008 Em igual sentido HC 271907SP rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 27032014 noticiado no Informativo 539 REsp 1154726RS rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 08052014 Na hipótese de deixar de cumprir uma das condições impostas pelo Juízo da Execução Penal o liberado poderá ter seu benefício revogado ser advertido ou as suas condições poderão ser agravadas STJ AgRg no REsp 1236295RS rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 24092013 STJ HC 15379RS rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 18032010 24 25 26 27 noticiado no Informativo 427 O STJ já decidiu em sentido contrário O Superior Tribunal de Justiça ao fazer a interpretação conjugada do art 87 do Código Penal com o art 145 da Lei de Execução Penal entende que não obstante a revogação do livramento condicional dependa da prévia oitiva do apenado a suspensão cautelar do benefício quando o liberado deixa de cumprir as obrigações que lhe são impostas prescinde de tal formalidade AgRg no RHC 49213MG rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 04092014 STF HC 119938RJ rel Min Rosa Weber 1ª Turma j 03062014 Inexistindo portanto decisão que suspenda cautelarmente o livramento condicional e transcorrendo sem óbice o prazo do benefício é impositivo nos termos da jurisprudência desta Corte reconhecer a extinção da pena pelo integral cumprimento STJ HC 295881SP rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 26082014 O STF compartilha deste entendimento HC 119938RJ rel Min Rosa Weber 1ª Turma j 03062014 Condenação é o ato exclusivo do Poder Judiciário que representado por um de seus membros e depois de obedecido o devido processo legal aplica em sentença ou acórdão uma pena ao agente culpável reconhecido como responsável por um fato típico e ilícito Efeitos da condenação são todas as consequências que direta ou indiretamente atingem a pessoa do condenado por sentença penal transitada em julgado Esses efeitos não se limitam ao campo penal incidindo também nas áreas cível administrativa trabalhista e políticoeleitoral entre outras Para se falar em seus efeitos por óbvio reclamase a existência de uma sentença penal condenatória com trânsito em julgado Sentença penal condenatória é aquela proferida em regular ação penal impondo pena ao envolvido autor coautor ou partícipe em um crime ou contravenção penal Transitada em julgado é a decisão judicial que não mais comporta recursos A sentença que aplica medida de segurança aos inimputáveis do art 26 caput do Código Penal tem natureza absolutória CPP art 386 parágrafo único1 Por corolário ausente a condenação não produz os efeitos ora em estudo Por outro lado a sentença que aplica medida de segurança aos semi imputáveis do art 26 parágrafo único do Código Penal é condenatória De fato o sistema vicariante acolhido por nosso sistema jurídico impõe ao juiz a condenação do agente com redução da pena de um a dois terços e posteriormente se recomendável a substituição da pena diminuída por medida de segurança CP art 98 caput De seu turno a decisão judicial que implementa a transação penal é homologatória do acordo celebrado entre o Ministério Público e o autor do fato Como não há condenação é vedado falar em seus efeitos Como já decidido pelo Supremo Tribunal Federal As consequências jurídicas extrapenais previstas no art 91 do CP são decorrentes de sentença penal condenatória Isso não ocorre portanto quando há transação penal cuja sentença tem natureza meramente homologatória sem qualquer juízo sobre a responsabilidade criminal do aceitante As consequências geradas pela transação penal são essencialmente aquelas estipuladas por modo consensual no respectivo instrumento de acordo Apesar de não possuírem natureza penal propriamente dita não haveria dúvidas de que esses efeitos constituiriam drástica intervenção estatal no patrimônio dos acusados razão pela qual sua imposição só poderia ser viabilizada mediante a observância do devido processo que garantisse ao acusado a possibilidade de exercer seu direito de resistência por todos os meios colocados à sua disposição Ou seja as medidas acessórias previstas no art 91 do CP embora incidissem ex lege exigiriam juízo prévio a respeito da culpa do investigado sob pena de transgressão ao devido processo legal2 Esta conclusão também é extraída da Súmula Vinculante 35 do Supremo Tribunal Federal A homologação da transação penal prevista no art 76 da Lei 90991995 não faz coisa julgada material e descumpridas suas cláusulas retomase a situação anterior possibilitandose ao Ministério Público a continuidade da persecução penal mediante oferecimento de denúncia ou requisição de inquérito policial Os efeitos da condenação se dividem em principais e secundários a b c d e São a imposição da pena privativa de liberdade restritiva de direitos pecuniária e ainda de medida de segurança ao semiimputável dotado de periculosidade A imposição de sanção penal é sem dúvida o efeito precípuo da condenação A circunstância de estar o condenado obrigado a cumprila todavia não afasta a existência de outros efeitos de cunho penal ou não que em determinadas situações obrigatoriamente a ela aderem Também conhecidos como efeitos mediatos acessórios reflexos ou indiretos constituemse em consequências da sentença penal condenatória como fato jurídico Os efeitos secundários se dividem em dois blocos penais e extrapenais Estão previstos no Código Penal e fora dele O trânsito em julgado da sentença penal condenatória gera diversos efeitos jurídicos3 destacandose no Código Penal caracterização da reincidência se posteriormente for praticado novo crime com todas as consequências daí resultantes arts 63 e 64 fixação de regime fechado para cumprimento da pena privativa de liberdade se for cometido novo crime art 33 2º configuração de maus antecedentes art 59 impedimento à concessão da suspensão condicional da pena quando da prática de novo crime e revogação obrigatória ou facultativa do sursis e do livramento condicional arts 77 I e 1º 81 I 86 caput e 87 aumento ou interrupção do prazo da prescrição da pretensão executória arts 110 caput e 117 VI em face do reconhecimento da reincidência quando da prática de novo crime f g h revogação da reabilitação como consequência do reconhecimento da reincidência art 95 conversão da pena restritiva de direitos por privativa de liberdade se não for possível ao condenado o cumprimento simultâneo da pena substitutiva anterior art 44 5º e vedação da concessão de privilégios a crimes contra o patrimônio como desdobramento do reconhecimento da reincidência arts 155 2º 170 e 171 1º Produz também efeitos na legislação especial tal como a impossibilidade de concessão da transação penal e da suspensão condicional do processo na eventual prática de novo delito arts 76 2º I e 89 caput da Lei 90991995 São assim denominados extrapenais por incidirem em áreas diversas do Direito Dividemse em genéricos e específicos Efeitos genéricos chamados dessa maneira por recaírem sobre todos os crimes são os previstos no art 91 do Código Penal obrigação de reparar o dano e confisco A interpretação a contrario sensu do art 92 parágrafo único do Código Penal mostra serem tais efeitos automáticos ou seja não precisam ser expressamente declarados na sentença Toda condenação os produz Efeitos específicos são os indicados pelo art 92 do Código Penal perda do cargo função pública ou mandato eletivo inc I incapacidade para o exercício do poder familiar da tutela ou da curatela inc II e inabilitação para dirigir veículo quando utilizado como meio para a prática de crime doloso inc III Têm essa denominação pelo fato de serem aplicados somente em determinados crimes Por fim não são automáticos necessitando de expressa motivação na sentença condenatória para produzirem efeitos É o que consta do art 92 parágrafo único do Código Penal Para o art 91 I do Código Penal é efeito da condenação tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime Em sintonia com esse dispositivo o art 63 do Código de Processo Penal estatui que transitada em julgado a sentença condenatória poderão promoverlhe a execução no juízo cível para efeito de reparação do dano o ofendido seu representante legal e seus herdeiros Nesse sentido estabelece o art 515 VI do Código de Processo Civil de 2015 ser título executivo judicial a sentença penal condenatória transitada em julgado Recordese que a sentença que concede perdão judicial não é condenatória mas declaratória da extinção da punibilidade Súmula 18 do STJ Por outro lado a sentença que aplica medida de segurança ao inimputável é absolutória enquanto a que impõe igual sanção penal ao semiimputável é condenatória O cometimento de um crime acarreta na atribuição de duas responsabilidades ao autor uma penal e outra civil e nada obstante tais instâncias sejam independentes seria desarrazoado exigir que já presente uma sentença penal condenatória com trânsito em julgado reconhecendo a prova da autoria e da materialidade de um fato delituoso tivesse a vítima ou seu representante legal a necessidade de iniciar uma ação de conhecimento para conseguir a reparação do dano Buscase assim facilitar o ressarcimento da vítima Já estará reconhecido o caráter ilícito do fato bem como a obrigação de reparar o dano an debeatur Entretanto como o título executivo é incompleto a sentença penal deverá ser liquidada por artigos para se apurar com exatidão o quantum debeatur na forma definida pelo art 509 caput do Código de Processo Civil de 2015 De fato o juiz ao proferir sentença condenatória obrigatoriamente fixará valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido CPP art 387 inc IV4 Operase a determinação de um valor mínimo ainda impreciso mas com o trânsito em julgado da sentença condenatória a execução poderá ser efetuada por esse montante preestabelecido sem prejuízo da liquidação para a apuração do dano efetivamente sofrido CPP art 63 parágrafo único5 Destarte transitada em julgado a sentença penal condenatória não se pode questionar no juízo cível a obrigação de reparar o dano causado pelo crime mas somente o seu valor Não perde a condição de título executivo judicial a sentença penal condenatória com trânsito em julgado se posteriormente a ela verificarse a extinção da punibilidade do agente Em se tratando de extinção da punibilidade derivada de abolitio criminis ou de anistia embora rescindam a sentença condenatória no plano penal persiste o efeito civil da reparação do dano Quando o titular do direito à reparação do dano for pobre a execução da sentença penal condenatória será promovida dependendo do seu requerimento pelo Ministério Público CPP art 68 ou pela Defensoria Pública onde houver Se após o trânsito em julgado da sentença penal falecer o condenado a execução civil será ajuizada em face de seus herdeiros até os limites das forças da herança em consonância com as regras previstas no art 5º XLV da Constituição Federal e no art 943 do Código Civil A sentença penal condenatória com trânsito em julgado apenas pode ser executada civilmente contra aquele que foi réu na ação penal Para acionar o responsável civil que não foi criminalmente acusado será obrigatório o ajuizamento de ação civil de conhecimento funcionando a condenação como elemento probatório e não como título executivo Se o réu condenado com trânsito em julgado for absolvido em revisão criminal desaparece a força executiva mesmo se já tiver sido iniciada a execução civil Tal como fora criado o título é desconstituído por decisão judicial Sempre que a decisão judicial não tiver natureza condenatória como nos casos de sentença declaratória da extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva arquivamento de inquérito policial transação penal entre outros deverá o prejudicado intentar ação civil de indenização em razão de ato ilícito6 O ofendido seu representante legal ou herdeiros não precisam aguardar o final da ação penal para postular no juízo cível a reparação do dano Mas sem o título executivo deverá ser ajuizada a ação civil ex delicto situação em que o seu trâmite pode ser suspenso por decisão judicial até o julgamento definitivo da ação penal CPP art 64 parágrafo único visando evitar decisões judiciais contraditórias A absolvição na esfera penal faz coisa julgada no campo civil impedindo a reparação do dano quando fundamentada no reconhecimento inequívoco da inexistência do fato ou da autoria no exercício regular do direito no estrito cumprimento do dever legal e na legítima defesa Nas demais hipóteses de absolvição arroladas no art 386 do Código de Processo Penal subsiste a possibilidade de se buscar civilmente a reparação do dano Finalmente em caso de absolvição penal em razão da comprovação do estado de necessidade permanece a responsabilidade civil na forma prevista no art 929 do Código Civil Com efeito quando o proprietário da coisa destruída ou deteriorada não foi o responsável pelo perigo a ele é assegurado o direito à indenização do prejuízo que lhe foi causado por parte do autor do fato típico Por sua vez se o perigo foi causado por terceiro quem sofreu o prejuízo deverá ajuizar ação indenizatória contra aquele que em estado de necessidade destruiu ou deteriorou o bem que lhe pertencia A este contudo é reservado o direito de mover ação de regresso contra quem provocou o perigo na forma do art 930 do Código Civil O confisco é previsto como efeito da condenação no art 91 II do Código Penal Art 91 São efeitos da condenação II a perda em favor da União ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boafé a dos instrumentos do crime desde que consistam em coisas cujo fabrico alienação uso porte ou detenção constitua fato ilícito b do produto do crime ou de qualquer bem ou valor que constitua proveito auferido pelo agente com a prática do fato criminoso 1º Poderá ser decretada a perda de bens ou valores equivalentes ao produto ou proveito do crime quando estes não forem encontrados ou quando se localizarem no exterior 2º Na hipótese do 1º as medidas assecuratórias previstas na legislação processual poderão abranger bens ou valores equivalentes do investigado ou acusado para posterior decretação de perda Confisco como efeito da condenação é a perda de bens de natureza ilícita em favor da União A medida possui dupla finalidade impedir a difusão de instrumentos adequados à prática de novos crimes e proibir o enriquecimento ilícito por parte do criminoso7 Instrumento do crime instrumenta sceleris é o meio de que se vale o agente para cometer o delito e apenas pode ser confiscado quando seu fabrico alienação uso porte ou detenção constituir fato ilícito É o caso por exemplo da arma de fogo que o agente utilizou para cometer um roubo salvo se ele possuir seu registro e autorização para portála Os veículos embarcações aeronaves e quaisquer outros meios de transporte não podem ser confiscados exceto quando utilizados para a prática de crimes previstos na Lei de Drogas Lei 113432006 arts 62 e 63 ou então quando sua fabricação ou uso constituir fato ilícito CP art 91 II a Por mandamento constitucional as propriedades rurais e urbanas de qualquer região do País onde forem localizadas culturas ilegais de plantas psicotrópicas ou a exploração de trabalho escravo na forma da lei serão expropriadas e destinadas à reforma agrária e a programas de habitação popular sem qualquer indenização ao proprietário e sem prejuízo de outras sanções previstas em lei Além disso todo e qualquer bem de valor econômico apreendido em decorrência do tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e da exploração de trabalho escravo será confiscado e reverterá a fundo especial com destinação específica na forma da lei CF art 243 caput e parágrafo único Embora existam entendimentos em contrário os instrumentos de contravenção penal não podem ser confiscados pois a lei penal deve ser interpretada restritivamente e o art 91 II a do Código Penal fala somente em confisco dos instrumentos do crime A perda dos instrumentos do crime é automática resultando do trânsito em julgado da sentença penal condenatória Não cabe o confisco por consequência nos casos de absolvição ou quando celebrada transação penal por se tratar de sentença meramente homologatória ou na hipótese de arquivamento do inquérito policial ou declaração da extinção da punibilidade fundada na prescrição da pretensão punitiva Produto do crime producta sceleris significa a vantagem direta obtida pelo agente em decorrência da prática do crime É o caso do relógio roubado Proveito do crime por outro lado é a vantagem indireta do crime resultante da especificação do produto do crime é o caso do ouro derivado do derretimento do relógio o bem adquirido pelo agente em razão de alienação do produto do crime o dinheiro auferido com a venda do relógio roubado bem como o preço do crime pretium sceleris Inicialmente o produto e o proveito do crime deverão ser restituídos ao prejudicado pelo crime ou ao terceiro de boafé8 Essa restituição será possível ainda que se trate de bem cujo fabrico alienação uso porte ou detenção se constitua em fato ilícito desde que tal pessoa por força de sua qualidade ou função tenha autorização para ser seu proprietário Exemplo uma arma de guerra é apreendida mas vem a ser devolvida ao seu legítimo dono um colecionador de armas autorizado pelo Comando do Exército O confisco pela União somente será efetuado se for desconhecida a identidade do proprietário do bem ou não for reclamado seu valor hipótese em que uma vez confiscados os instrumentos e produtos do crime passam à União integrando o patrimônio do Fundo Penitenciário Nacional art 2º IV da Lei Complementar 791994 regulamentada pelo Decreto 109319949 Os 1º e 2º do art 91 do Código Penal foram introduzidos pela Lei 126942012 com o propósito de proporcionar maior eficácia nas condenações proferidas em delitos cometidos no contexto de organizações criminosas Nesses casos poderá ser decretada a perda de bens ou valores equivalentes ao produto ou proveito do crime quando estes não forem encontrados ou quando se localizarem no exterior notas comuns aos delitos praticados pelas estruturas ilícitas de poder Além disso as medidas assecuratórias previstas na legislação processual sequestro arresto especialização de hipoteca legal etc poderão abranger bens ou valores equivalentes do investigado ou acusado para posterior decretação de perda O art 92 I do Código Penal define como efeito específico da condenação Art 92 São também efeitos da condenação I a perda de cargo função pública ou mandato eletivo a quando aplicada pena privativa de liberdade por tempo igual ou superior a 1 um ano nos crimes praticados com abuso de poder ou violação de dever para com a Administração Pública b quando for aplicada pena privativa de liberdade por tempo superior a 4 quatro anos nos demais casos Esses efeitos não são automáticos devendo ser motivadamente declarados na sentença Consequentemente o magistrado precisa proceder à apreciação da natureza e da extensão do dano bem como às condições pessoais do réu para aferir seu cabimento no caso concreto10 Na alínea a além do conceito de funcionário público contido no art 327 do Código Penal deve ser analisado se o crime ocorreu no exercício das funções exercidas pelo agente isto é se ele se valeu das facilidades proporcionadas por sua função para praticar o delito Via de regra esse efeito da condenação restringese ao cargo função pública ou mandato eletivo ocupado pelo funcionário público na data em que o crime foi praticado No caso concreto entretanto o magistrado pode estendêlo a cargo função pública ou mandato eletivo diverso exercido pelo agente ao tempo da condenação caso entenda que o novo posto guarda relação com as atribuições anteriores De fato o art 92 inc I do Código Penal fala em perda de e não do cargo função pública ou mandato eletivo Como já decidido pelo Superior Tribunal de Justiça A pena de perdimento deve ser restrita ao cargo ocupado ou função pública exercida no momento do delito à exceção da hipótese em que o magistrado motivadamente entender que o novo cargo ou função guarda correlação com as atribuições anteriores Cingese a controvérsia a saber se a pena de perdimento prevista no art 92 I do CP se restringe à atividade pública exercida no momento do delito O STJ entende que o reconhecimento de que o réu praticou ato incompatível com o cargo por ele ocupado é fundamento suficiente para a decretação do efeito extrapenal de perda do cargo público AgRg no REsp 1613927RS DJe 3092016 Em regra a pena de perdimento deve ser restrita ao cargo público ocupado ou função pública exercida no momento do delito Porém salientase que se o magistrado de origem considerar motivadamente que o novo cargo guarda correlação com as atribuições do anterior ou seja naquele em que foram praticados os crimes mostra se devida a perda da nova função uma vez que tal ato visa anular a possibilidade de reiteração de ilícitos da mesma natureza11 Já na alínea b é possível a incidência do efeito da condenação em qualquer crime bastando a presença de dois requisitos em decisão fundamentada 1 natureza da pena privativa de liberdade e 2 quantidade da pena superior a 4 quatro anos12 Para o Superior Tribunal de Justiça A determinação da perda de cargo público fundada na aplicação de pena privativa de liberdade superior a 4 anos art 92 I b do CP pressupõe fundamentação concreta que justifique o cabimento da medida De fato para que seja declarada a perda do cargo público na hipótese descrita no art 92 I b do CP são necessários dois requisitos a que o quantum da sanção penal privativa de liberdade seja superior a 4 anos e b que a decisão proferida apresentese de forma motivada com a explicitação das razões que ensejaram o cabimento da medida A motivação dos atos jurisdicionais conforme imposição do art 93 IX da CF Todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos e fundamentadas todas as decisões sob pena de nulidade funciona como garantia da atuação imparcial e secundum legis sentido lato do órgão julgador Ademais a motivação dos atos judiciais serve de controle social sobre os atos judiciais e de controle pelas partes sobre a atividade intelectual do julgador para que verifiquem se este ao decidir considerou todos os argumentos e as provas produzidas pelas partes e se bem aplicou o direito ao caso concreto13 Esse efeito específico da condenação não se confunde com a proibição do exercício de cargo função ou atividade pública elencada no art 47 I do Código Penal como pena restritiva de direitos espécie de pena de interdição temporária de direitos O efeito da condenação por sua vez é permanente já que o condenado ainda que seja posteriormente reabilitado jamais poderá ocupar o cargo função ou mandato objeto da perda salvo se o recuperar por investidura legítima Anotese porém que a possibilidade de perda do cargo público não precisa vir prevista na denúncia posto que decorre de previsão legal expressa como efeito da condenação nos termos do art 92 do Código Penal14 É de se observar que como o art 92 inc I do Código Penal diz respeito à perda de cargo função pública ou mandato eletivo este efeito da condenação não alcança a cassação da aposentadoria ainda que o crime tenha sido praticado quando o funcionário público estava na ativa Na esteira da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça Ainda que condenado por crime praticado durante o período de atividade o servidor público não pode ter a sua aposentadoria cassada com fundamento no art 92 I do CP mesmo que a sua aposentadoria tenha ocorrido no curso da ação penal De fato os efeitos de condenação criminal previstos no art 92 I do CP segundo o qual são efeitos da condenação criminal a perda de cargo função pública ou mandato eletivo embora possam repercutir na esfera das relações extrapenais são efeitos penais na medida em que decorrem de lei penal Sendo assim pela natureza constrangedora desses efeitos que acarretam restrição ou perda de direitos eles somente podem ser declarados nas hipóteses restritas do dispositivo mencionado o que implica afirmar que o rol do art 92 do CP é taxativo sendo vedada a interpretação extensiva ou analógica para estendêlos em desfavor do réu sob pena de afronta ao princípio da legalidade Dessa maneira como essa previsão legal é dirigida para a perda de cargo função pública ou mandato eletivo não se pode estendêla ao servidor que se aposentou ainda que no decorrer da ação penal15 Se o condenado é Deputado Federal ou Senador o Poder Judiciário pode decretar a perda do mandato eletivo A resposta é negativa pois tratase de matéria de competência reservada à casa legislativa respectiva na forma prevista pelo art 55 2º da Constituição Federal Nos casos dos incisos I II e VI a perda do mandato será decidida pela Câmara dos Deputados ou pelo Senado Federal por maioria absoluta mediante provocação da respectiva Mesa ou de partido político representado no Congresso Nacional assegurada ampla defesa O Supremo Tribunal Federal já decidiu nesse sentido O Plenário condenou senador prefeito à época dos fatos delituosos bem assim o presidente e o vicepresidente de comissão de licitação municipal pela prática do crime descrito no art 90 da Lei 866693 Art 90 Frustrar ou fraudar mediante ajuste combinação ou qualquer outro expediente o caráter competitivo do procedimento licitatório com o intuito de obter para si ou para outrem vantagem decorrente da adjudicação do objeto da licitação Pena detenção de 2 dois a 4 quatro anos e multa à pena de 4 anos 8 meses e 26 dias de detenção em regime inicial semiaberto Fixouse por maioria multa de R 20181705 ao detentor de cargo político e de R 13454407 aos demais apenados valores a serem revertidos aos cofres do município Determinouse caso estejam em exercício a perda de cargo emprego ou função pública dos dois últimos réus Entendeuse em votação majoritária competir ao Senado Federal deliberar sobre a eventual perda do mandato parlamentar do exprefeito CF art 55 VI e 2º16 O art 208 da Lei Complementar 751993 dispõe Os membros do Ministério Público da União após dois anos de efetivo exercício só poderão ser demitidos por decisão judicial transitada em julgado De seu turno a Lei 86251993 Lei Orgânica Nacional dos Ministérios Públicos dos Estados e do Distrito Federal estabelece em seu art 38 1º I a III que o membro vitalício do Ministério Público somente perderá o cargo por sentença judicial transitada em julgado proferida em ação civil própria em três casos 1 prática de crime incompatível com o exercício do cargo após decisão judicial transitada em julgado 2 exercício da advocacia e 3 abandono do cargo por prazo superior a 30 dias corridos Assim fica fácil concluir que no tocante aos membros vitalícios do Ministério Público da União a perda do cargo decorrente de sentença penal condenatória transitada em julgado segue as regras do art 92 I do Código Penal A questão se torna mais complicada todavia em relação aos membros vitalícios dos Ministérios Públicos dos Estados e do Distrito Federal pelo fato de se exigir para a perda do cargo decisão judicial transitada em julgado em ação civil própria ajuizada pelo ProcuradorGeral de Justiça perante o Tribunal de Justiça após condenação definitiva em ação penal movida pela prática de crime incompatível com o exercício do cargo Em síntese para a perda do cargo a teor da interpretação literal do mencionado dispositivo legal seriam necessárias duas condenações transitadas em julgado uma pela prática do crime e outra em ação civil própria a qual depende da anterior Esta é a posição adotada pelo Superior Tribunal de Justiça Em ação penal decorrente da prática de corrupção passiva praticada por membro vitalício do Ministério Público Estadual não é possível determinar a perda do cargo com fundamento no art 92 I a do CP De acordo com o art 92 I a do CP é efeito não automático da condenação a perda do cargo função pública ou mandato eletivo quando aplicada a pena privativa de liberdade por tempo igual ou superior a um ano nos crimes praticados com abuso de poder ou violação de dever para com a Administração Pública Entretanto quanto à perda do cargo de membro do Ministério Público Estadual há norma especial Lei 86251993 Lei Orgânica Nacional do Ministério Público que dispõe que a perda do referido cargo somente pode ocorrer após o trânsito em julgado de ação civil proposta para esse fim O art 38 2º da Lei 86251993 ainda prevê que a ação civil para a decretação da perda do cargo somente pode ser ajuizada pelo ProcuradorGeral de Justiça quando previamente autorizado pelo Colégio de Procuradores o que constitui condição de procedibilidade juntamente com o trânsito em julgado da sentença penal condenatória Com efeito em se tratando de normas legais de mesma hierarquia o fato de a Lei Orgânica Nacional do Ministério Público prever regras específicas e diferenciadas das do Código Penal para a perda de cargo em atenção ao princípio da especialidade lex specialis derogat generali deve prevalecer o que dispõe a lei orgânica17 Porém há entendimento diverso no sentido de que essa sistemática seria por demais protetiva e desnecessária Basta o cumprimento das regras do Código Penal para que possa ser decretada na sentença condenatória a perda do cargo Para Hugo Nigro Mazzilli A nosso ver o art 38 1º da LONMP referese às únicas hipóteses em que se admite perda do cargo por ação civil específica mas não obsta a que respeitados os pressupostos constitucionais a lei admita outras hipóteses de perda do cargo de membro do Ministério Público como em razão de condenação criminal18 Com efeito a garantia da vitaliciedade estaria respeitada pois a ação penal contra Promotor de Justiça somente pode ser ajuizada pelo Procurador Geral de Justiça perante o Tribunal de Justiça respectivo Não haveria motivo para esse procedimento ser repetido É a posição a que nos filiamos É também efeito específico da condenação a incapacidade para o exercício do poder familiar da tutela ou da curatela nos crimes dolosos sujeitos à pena de reclusão cometidos contra outrem igualmente titular do mesmo poder familiar contra filho filha ou outro descendente ou contra tutelado ou curatelado CP art 92 II Esse efeito não é automático e para a sua imposição reclama três requisitos 1 natureza do crime somente os dolosos 2 natureza da pena reclusão e 3 qualidade da vítima pessoa igualmente detentora do poder familiar exemplo marido comete feminicídio contra a esposa daí decorrendo a perda do poder familiar no tocante ao filho que tinham em comum filho filha outro descendente exemplo o agente abusa sexualmente da neta e por esta razão perde o poder familiar em relação a um filho menor tutelado ou curatelado Presentes os requisitos o juiz pode declarar na sentença esse efeito Pouco importa a quantidade da pena bem como o regime prisional Sua aplicação não é obrigatória e sua pertinência deve ser avaliada no caso concreto notadamente quando o crime provoque a incompatibilidade para o exercício do poder familiar tutela ou curatela Essa incapacidade pode ser estendida para alcançar outros filhos pupilos ou curatelados além da vítima do crime Não seria razoável exemplificativamente decretar a perda do poder familiar somente em relação à filha de dez anos de idade estuprada pelo pai aguardando fosse igual delito praticado contra as outras filhas mais jovens para que só então se privasse o genitor desse direito Em relação à vítima do crime doloso e punido com reclusão essa incapacidade é permanente De fato mesmo em caso de reabilitação é vedada a reintegração do agente na situação anterior CP art 93 parágrafo único No tocante a outros filhos pupilos ou curatelados a incapacidade é provisória pois o condenado se reabilitado poderá voltar a exercer o poder familiar tutela ou curatela O art 92 III do Código Penal reza ser efeito específico da condenação a inabilitação para dirigir veículo quando utilizado como meio para a prática de crime doloso A lei exige portanto dois requisitos 1 o crime deve ser doloso e 2 utilização do veículo como meio de execução Não se autoriza esse efeito pois no caso de crime culposo Esse efeito da condenação não se confunde com a suspensão da autorização ou de habilitação definida pelo art 47 III do Código Penal como pena restrita de direitos aplicável aos responsáveis por crimes culposos de trânsito com igual duração à da pena privativa de liberdade substituída No caso de crime praticado na direção de veículo automotor os arts 292 e 293 da Lei 95031997 Código de Trânsito Brasileiro preveem a suspensão ou proibição de se obter a permissão ou habilitação como pena a ser aplicada isolada ou cumulativamente com outras penas pelo prazo de 2 dois meses a 5 cinco anos Nos termos do art 15 III da Constituição Federal operase a suspensão dos direitos políticos em face da condenação criminal transitada em julgado enquanto durarem seus efeitos Esse efeito é automático prescindindo de motivação expressa na sentença condenatória e a suspensão abrange os direitos políticos de natureza ativa e passiva Subsiste até a extinção da sanção penal É indiferente o regime prisional fixado na sentença condenatória bem como eventual substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos ou multa Da mesma forma a concessão de sursis e de livramento condicional não influi na suspensão dos direitos políticos pois não extinguem a pena Como estabelece a Súmula 9 do Tribunal Superior Eleitoral A suspensão dos direitos políticos decorrentes de condenação criminal transitada em julgado cessa com o cumprimento ou a extinção da pena independendo de reabilitação ou prova de reparação dos danos A condenação criminal transitada em julgado contra o empregado qualquer que seja o crime bem como o local de sua prática e a sua vítima faz coisa julgada na Justiça do Trabalho Se a execução da pena não tiver sido suspensa autoriza a demissão por justa causa pelo empregador É o que dispõe o art 482 d da Consolidação das Leis do Trabalho Esse efeito como é lógico não precisa ser motivadamente fundamentado na sentença penal condenatória De acordo com o art 83 da Lei 86661993 os crimes referentes a licitações e contratos da Administração Pública ainda que na forma tentada sujeitam seus autores quando servidores públicos além das sanções penais à perda do cargo emprego função ou mandato eletivo Como a lei não dispõe sobre a aplicabilidade desse efeito utilizase a sistemática prevista no Código Penal Consequentemente sua incidência depende de fundamentação expressa na sentença condenatória O art 181 I a III da Lei 111012005 Lei de Falências estabelece como efeitos da condenação aos crimes nela previstos a inabilitação para o exercício de atividade empresarial o impedimento para o exercício de cargo ou função em conselho de administração diretoria ou gerência das sociedades sujeitas à lei de falências e a impossibilidade de gerir empresa por mandato ou por gestão de negócio Por sua vez o art 181 1º esclarece que tais efeitos não são automáticos devendo ser motivadamente declarados na sentença e perdurarão até 5 cinco anos após a extinção da punibilidade podendo contudo cessar antes pela reabilitação criminal Com o trânsito em julgado da condenação o juiz deverá notificar o Registro Público de Empresas para que adote as medidas necessárias para impedir novo registro em nome dos inabilitados art 181 2º A condenação pela prática de crime definido pela Lei de Tortura se o agente for funcionário público acarretará a perda do cargo função ou emprego público bem como a interdição para seu exercício pelo dobro do prazo da pena aplicada Lei 94551997 art 1º 5º Cuidase de efeito automático da condenação Como destaca o Superior Tribunal de Justiça Conforme dispõe o 5º do art 1º deste diploma legal a perda do cargo função ou emprego público é efeito automático da condenação sendo dispensável fundamentação concreta19 No caso de crime ligado ao tráfico de drogas arts 33 caput e 1º e 34 a 37 da Lei 113432006 seu art 56 1º permite ao juiz por ocasião do recebimento da denúncia decretar o afastamento cautelar do acusado de suas atividades se for funcionário público comunicando o órgão respectivo Tratase de medida cautelar Em caso de condenação a perda do cargo ou função pública observa a regra geral delineada pelo Código Penal O art 16 da Lei 77161989 estabelece ser efeito da condenação aos crimes nela previstos a perda do cargo ou função pública para o servidor público e a suspensão do funcionamento do estabelecimento particular por prazo não superior a 3 três meses Esses efeitos não são automáticos devendo ser expressamente declarados na sentença art 18 O art 7º da Lei 96131998 com as modificações incorporadas pela Lei 126832012 dispõe acerca dos efeitos da condenação atinentes aos crimes de lavagem ou ocultação de bens direitos e valores sem prejuízo da incidência das medidas previstas no Código Penal Sua redação é a seguinte Art 7º São efeitos da condenação além dos previstos no Código Penal I a perda em favor da União e dos Estados nos casos de competência da Justiça Estadual de todos os bens direitos e valores relacionados direta ou indiretamente à prática dos crimes previstos nesta Lei inclusive aqueles utilizados para prestar a fiança ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boafé II a interdição do exercício de cargo ou função pública de qualquer natureza e de diretor de membro de conselho de administração ou de gerência das pessoas jurídicas referidas no art 9º pelo dobro do tempo da pena privativa de liberdade aplicada 1º A União e os Estados no âmbito de suas competências regulamentarão a forma de destinação dos bens direitos e valores cuja perda houver sido declarada assegurada quanto aos processos de competência da Justiça Federal a sua utilização pelos órgãos federais encarregados da prevenção do combate da ação penal e do julgamento dos crimes previstos nesta Lei e quanto aos processos de competência da Justiça Estadual a preferência dos órgãos locais com idêntica função 2º Os instrumentos do crime sem valor econômico cuja perda em favor da União ou do Estado for decretada serão inutilizados ou doados a museu criminal ou a entidade pública se houver interesse na sua conservação Como a Lei 96131998 calouse no tocante à aplicabilidade destes efeitos é preciso utilizar a sistemática adotada pelo Código Penal Desta forma concluise que o efeito da condenação previsto no inc I é automático ao passo que o inc II contempla efeito não automático reclamando declaração motivada na sentença condenatória Principal Efeitos da condenação Secundários De natureza penal Genéricos De natureza extrapenal Específicos Fora do CP Imposição das penas privativas de liberdade restritivas de direitos pecuniárias e ainda de medidas de segurança as semiimputáveis induz à reincidência art 63 CP impede a concessão de sursis art 77 I do CP se a condenação por crime doloso tal decisão determina a revogação obrigatória do sursis art 81 I do CP se a pena aplicada for privativa de liberdade o livramento condicional será obrigatoriamente revogado o prazo da prescrição da pretensão executória é aumentado em 13 art 110 caput do CP a condenação tornase elementar da contravenção penal de posse de instrumento de furto art 25 do Decretolei 36881941 revogação da reabilitação art 95 do CP etc 1 2 3 4 5 6 7 Como impõe medida de segurança é chamada de absolvição imprópria RE 795567PR rel Min Teori Zavascki Plenário j 28052015 noticiado no Informativo 787 São inúmeros os efeitos penais secundários da condenação e inviável e cansativo aqui enumerálos Escolhemos por isso os mais importantes e de maior incidência em concursos públicos A aplicação do instituto disposto no art 387 inciso IV do CPP referente à reparação de natureza cível quando da prolação da sentença condenatória requer a dedução de um pedido expresso do querelante ou do Ministério Público em respeito às garantias do contraditório e da ampla defesa Neste caso houve pedido expresso por parte do Ministério Público na exordial acusatória o que é suficiente para que o juiz sentenciante fixe o valor mínimo a título de reparação dos danos causados pela infração Assim sendo não há que se falar em iliquidez do pedido pois o quantum há que ser avaliado e debatido ao longo do processo não tendo o Parquet o dever de na denúncia apontar valor líquido e certo o qual será devidamente fixado pelo Juiz sentenciante STJ REsp 1265707RS rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 27052014 No tocante à fixação do valor mínimo na sentença condenatória e com o propósito de promover maior eficácia ao direito da vítima em ver ressarcido o dano sofrido o Superior Tribunal de Justiça já decidiu que o magistrado pode estipular tanto o dano material como também o dano moral suportados pelo ofendido REsp 1585684DF rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 09082016 noticiado no Informativo 588 A sentença penal absolutória em regra não produz a obrigação de reparar o dano salvo na hipótese de acórdão que absolve o réu em sede de revisão criminal De fato o injustamente condenado pode ao efetuar pedido de revisão criminal cumulálo com indenização por perdas e danos Nesse caso podese reconhecer o direito à indenização na esfera cível O confisco é disciplinado no art 91 do Código Penal como forma de expropriação em favor do Estado dos instrumentos e produtos de crime com a finalidade de assegurar a indisponibilidade dos bens ilícitos utilizados para a prática da infração ou que tenham sido angariados com a conduta ilícita STJ REsp 1316694PR rel Min Regina Helena Costa 8 9 10 11 12 13 14 15 5ª Turma j 17122013 O lesado ou terceiro de boafé a que se referem os arts 91 II do CP e 133 parágrafo único do CPP são aqueles diretamente prejudicados pelo confisco do bem como é o caso por exemplo do condômino ou do comprador de boafé Aqueles que estejam sendo apenas obliquamente prejudicados pelo confisco que jamais tenham estabelecido relação jurídica que envolvesse diretamente o bem perdido não se enquadram nesse conceito de lesado ou terceiro de boafé STJ REsp 1366894RS rel Min Nancy Andrighi 3ª Turma j 22042014 Depois da apreensão dos instrumentos e produtos do crime serão esses bens inutilizados leiloados ou recolhidos a museu criminal se houver interesse na sua conservação Os bens imóveis adquiridos pelo agente com o proveito do crime ainda que transferidos a terceiro serão sequestrados CPP arts 122 a 125 Registrese por oportuno que os efeitos da condenação trazidos no art 92 do Código Penal não são automáticos Ou seja ainda que se trate de situação abrangida pelas alíneas a e b do inciso I da referida norma a perda do cargo ou função pública não prescinde da devida motivação nos termos do que disciplina o parágrafo único STJ REsp 1285783PB rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 03092013 REsp 1452935PE rel Min Reynaldo Soares da Fonseca 5ª Turma j 14032017 noticiado no Informativo 599 Com o merecido respeito esse julgado comporta um reparo A perda de cargo função pública ou mandato eletivo constituise em efeito da condenação Não se trata de pena A substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos não tem o condão de afastar o efeito disposto no art 92 do Código Penal pois a perda do cargo não está adstrita à efetiva privação da liberdade do réu STJ AgRg no REsp 1208940RS rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 10062014 REsp 1044866MG rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 02102014 noticiado no Informativo 549 STJ AgRg no AREsp 46266SP rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 26062012 REsp 1416477SP rel Min Walter de Almeida Guilherme Desembargador convocado do TJSP 5ª Turma j 18112014 noticiado no Informativo 552 Em igual sentido REsp 1317487MT rel Min 16 17 18 19 Laurita Vaz 5ª Turma j 22082014 AP 565RO rel Min Cármen Lúcia Plenário j 07 e 08082013 noticiado no Informativo 714 E também AP 563SP rel Min Teori Zavascki 2ª Turma j 21102014 noticiado no Informativo 764 REsp 1251621AM rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 16102014 noticiado no Informativo 552 MAZZILLI Hugo Nigro Introdução ao Ministério Público 5 ed São Paulo Saraiva 2005 p 91 REsp 1044866MG rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 02102014 noticiado no Informativo 549 421 422 CONCEITO Reabilitação é o instituto jurídicopenal que se destina a promover a reinserção social do condenado a ele assegurando o sigilo de seus antecedentes criminais bem como a suspensão condicional de determinados efeitos secundários de natureza extrapenal e específicos da condenação mediante a declaração judicial no sentido de que as penas a ele aplicadas foram cumpridas ou por qualquer outro modo extintas Busca pois reintegrar o condenado que tenha cumprido a pena na posição jurídica que desfrutava anteriormente à prolação da condenação1 Tem portanto duas funções 1 assegurar ao condenado o sigilo dos registros sobre seu processo e condenação art 93 caput e 2 suspender condicionalmente os efeitos da condenação previstos no art 92 do Código Penal art 93 parágrafo único ORIGEM HISTÓRICA A primeira manifestação do instituto da reabilitação ocorreu no Direito Romano por meio da restitutio in integrum forma de clemência soberana extintiva da pena e restauradora dos direitos patrimoniais e morais do condenado No Brasil surgiu inicialmente no art 86 do Código Penal de 1890 prevista como causa de extinção da condenação Com o trânsito em julgado da revisão criminal favorável ao réu tinha ele automaticamente restabelecidos todos os seus direitos bem como era garantida a indenização pelos prejuízos decorrentes da condenação 423 424 4241 NATUREZA JURÍDICA Cuidase de medida de política criminal assecuratória do sigilo sobre os antecedentes criminais do condenado e ainda causa suspensiva condicional de certos efeitos secundários de natureza extrapenal e específicos da condenação Não se trata pois de causa de extinção da punibilidade De fato como consta da Exposição de Motivos item 82 Tratase de instituto que não extingue mas tão somente suspende alguns efeitos penais da sentença condenatória visto que a qualquer tempo revogada a reabilitação se restabelece o status quo ante Diferentemente as causas extintivas da punibilidade operam efeitos irrevogáveis fazendo cessar definitivamente a pretensão punitiva ou a execução MODALIDADES DE REABILITAÇÃO NO CÓDIGO PENAL Sigilo das condenações art 93 caput parte final A reabilitação assegura ao condenado o sigilo dos registros sobre seu processo e condenação nos termos do art 93 caput parte final do Código Penal Mas qual é o verdadeiro alcance dessa finalidade da reabilitação O art 202 da Lei de Execução Penal estatui que cumprida ou extinta a pena não constarão da folha corrida atestados ou certidões fornecidas por autoridade policial ou por auxiliares da Justiça qualquer notícia ou referência à condenação salvo para instruir processo pela prática de nova infração penal ou outros casos expressos em lei Esse sigilo como se percebe é garantido de forma automática e imediata depois do cumprimento integral ou extinção da pena por qualquer outro motivo Prescinde da reabilitação Tal sigilo entretanto é mais restrito pois pode ser quebrado por qualquer autoridade judiciária por membro do Ministério Público ou ainda por 4242 42421 Delegado de Polícia De outro lado o sigilo assegurado pela reabilitação é mais amplo pois as informações por ele cobertas somente podem ser obtidas por requisição ordem não de qualquer integrante do Poder Judiciário mas exclusivamente do juiz criminal É o que se extrai do art 748 do Código de Processo Penal Esta é a utilidade prática do instituto Na esteira do pensamento do Superior Tribunal de Justiça Esta Corte Superior de Justiça já pacificou o entendimento segundo o qual por analogia à regra inserta no art 748 do Código de Processo Penal as anotações referentes a inquéritos policiais e ações penais não serão mencionadas na Folha de Antecedentes Criminais nem em certidão extraída dos livros do juízo nas hipóteses em que resultarem na extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva arquivamento absolvição ou reabilitação2 Efeitos secundários de natureza extrapenal e específicos da condenação art 93 parágrafo único Os efeitos secundários de natureza extrapenal e específicos da condenação estão elencados no art 92 do Código Penal A suspensão desses efeitos é condicional porque do reabilitando exigese o cumprimento de condições para retornar à situação em que estava previamente à condenação Vejamos cada um deles e os reflexos provocados pela reabilitação Perda de cargo função pública ou mandato eletivo O art 92 I do Código Penal prevê como efeito secundário de natureza extrapenal e específico da condenação a perda de cargo função pública ou mandato eletivo quando aplicada pena privativa de liberdade por tempo igual ou superior a um ano nos crimes praticados com abuso de poder ou violação de dever para com a administração pública ou ainda quando aplicada pena privativa de liberdade por tempo superior a quatro anos nos demais crimes O agente reabilitado não é reintegrado automaticamente à situação 42422 42423 anterior por expressa determinação do art 93 parágrafo único do Código Penal Pode voltar contudo a exercer novo cargo emprego ou função pública desde que proveniente de nova investidura Exemplo o funcionário público condenado por peculato que perdeu o cargo público que ocupava desde que reabilitado pode novamente ser funcionário público se aprovado no concurso público respectivo Incapacidade para o exercício do pátrio poder da tutela ou da curatela É também efeito secundário de natureza extrapenal e específico da condenação a incapacidade para o exercício do poder familiar da tutela ou da curatela nos crimes dolosos sujeitos à pena de reclusão cometidos contra outrem igualmente titular do mesmo poder familiar contra filho filha ou outro descendente ou contra tutelado ou curatelado Como se sabe os efeitos da condenação decorrentes de um crime doloso punido com reclusão cometido contra outrem igualmente titular do mesmo poder familiar contra filho filha ou outro descendente ou contra tutelado ou curatelado podem ser estendidos a outros filhos tutelados ou curatelados Com a reabilitação o condenado pode voltar a exercer o poder familiar a tutela ou a curatela em relação àqueles que não foram vítimas do delito doloso punido com reclusão pois em relação ao ofendido a incapacidade é permanente conforme determina o art 93 parágrafo único do Código Penal Em outras palavras jamais poderá ser exercido novamente o poder familiar tutela ou curatela em face da vítima do crime cuja condenação produziu o efeito previsto no art 92 II do Código Penal Inabilitação para dirigir veículo O art 92 III do Código Penal arrola como efeito secundário de natureza extrapenal e específico da condenação a inabilitação para dirigir veículo quando utilizado como meio para a prática de crime doloso Uma vez reabilitado o agente poderá obter nova carteira de 425 426 4261 4262 habilitação sem qualquer restrição legal REABILITAÇÃO E REINCIDÊNCIA A reabilitação suspende condicionalmente alguns efeitos secundários de natureza extrapenal e específicos da condenação A condenação todavia permanece íntegra pois o instituto em análise não a rescinde Portanto se embora reabilitado o agente vier a praticar novo delito será considerado reincidente Com efeito o art 64 I do Código Penal é peremptório ao esclarecer que a condenação anterior somente perde força para gerar a reincidência quando entre a data do cumprimento ou extinção da pena dela decorrente e a infração posterior tiver decorrido período de tempo superior a 5 cinco anos computado o período de prova da suspensão ou do livramento condicional se não ocorrer revogação Esse hiato temporal é o que se convencionou chamar de período depurador ou caducidade da reincidência PRESSUPOSTO E REQUISITOS DA REABILITAÇÃO Pressuposto A interpretação do art 94 do Código Penal revela que a reabilitação possui um pressuposto e diversos requisitos O pressuposto é a existência de uma sentença condenatória transitada em julgado É indiferente a natureza da sanção penal aplicada ao condenado uma vez que a reabilitação alcança quaisquer penas aplicadas em sentença definitiva tal como dispõe o art 93 caput do Código Penal3 Requisitos A lei exige ainda a observância de determinados requisitos de natureza objetiva e subjetiva 42621 Requisitos objetivos São os que se relacionam ao tempo de cumprimento da pena e à reparação do dano a Tempo de cumprimento da pena O art 94 caput do Código Penal condiciona a reabilitação a um marco temporal Deve ter transcorrido o período de 2 dois anos do dia em que tiver sido extinta de qualquer modo a pena ou terminar a sua execução computandose o período de prova do sursis e do livramento condicional se não sobrevier revogação O prazo é o mesmo seja o condenado primário ou reincidente Nas hipóteses de sursis e de livramento condicional o termo inicial do prazo é a audiência admonitória Na pena de multa o prazo se inicia a partir do seu efetivo pagamento pois esse ato enseja a sua extinção Se ocorrer a sua execução motivada pela ausência do adimplemento voluntário a multa será cobrada como dívida de valor razão pela qual o decurso legal para a reabilitação iniciase a partir da data em que deveria ter ocorrido o pagamento da pena pecuniária Como já decidido pelo Superior Tribunal de Justiça Consoante a jurisprudência compete ao Juízo da Execução Penal determinar a intimação do condenado para realizar o pagamento da pena de multa a teor do que dispõe o art 50 do Código Penal e acaso ocorra o inadimplemento da referida obrigação o fato deve ser comunicado à Fazenda Pública a fim de que ajuíze a execução fiscal no foro competente de acordo com as normas da Lei n 683080 porquanto a Lei n 926896 ao alterar a redação do art 51 do Código Penal afastou a titularidade do Ministério Público STJ REsp 832267 rel Min Laurita Vaz 5ª Turma DJU de 14052007 Nessa linha de raciocínio concluiu a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça pela possibilidade de extinção da execução penal quando cumprida a pena privativa de liberdade resta pendente a multa na medida em que esta deverá ser cobrada pela Fazenda Pública no Juízo competente Firmou se o entendimento da 3ª Seção do STJ no sentido de que considerando se a pena de multa como dívida de valor e consequentemente tornando se legitimado a efetuar sua cobrança a Procuradoria da Fazenda Pública na Vara Fazendária perde a razão de ser a manutenção do Processo de Execução perante a Vara das Execuções Penais quando pendente unicamente o pagamento desta STJ EREsp 845902RS rel Min Maria Thereza de Assis Moura 3ª Seção DJe de 01022011 O entendimento contrário ou seja o de que a punibilidade do réu permaneceria incólume enquanto não adimplida a multa vincularia a finalização do procedimento penal à eventual cobrança do valor pela Fazenda Pública que como se sabe pode deixar de ajuizar a execução para cobrança da dívida ativa em várias situações Tal vinculação assim parece não se coadunar com as peculiaridades do processo penal sendo desarrazoado que o réu tendo cumprido a pena privativa de liberdade fique impossibilitado de obter sua reabilitação após o prazo estabelecido em lei enquanto não comprovar o pagamento da multa submetida a procedimento de cobrança cível4 Em se tratando de extinção da pena pela ocorrência da prescrição a contagem do prazo tem início na data em que ocorreu a causa extintiva da punibilidade pouco importando o momento em que se deu o seu reconhecimento judicial Se o agente ostentar diversas condenações o pedido de reabilitação deve ser formulado no tocante a todas elas Não pode se limitar somente a parcela das penas em razão de as demais ainda não terem sido integralmente cumpridas ou extintas por qualquer outra causa A reabilitação tem por essência a totalidade de seus efeitos proporcionando a plena reinserção social do condenado Como leciona Aloysio de Carvalho Filho Duas ou mais as penas impostas a reabilitação não pode ser deferida enquanto não preenchida a condição do cumprimento de todas elas É da índole e da finalidade do instituto ser de efeitos totais gerais Do mesmo modo que não se compreenderia uma reabilitação em porções não se justifica uma reabilitação que anule umas penas deixando outras de pé Teríamos o penoso espetáculo de um reabilitado manco para quem a reabilitação afinal seria uma irrisória inutilidade por lhe não haver 42622 restituído senão em parte a liberdade de ação quando no seu caso ou toda ou nenhuma5 b Reparação do dano O art 94 III do Código Penal autoriza a reabilitação ao condenado que tenha ressarcido o dano causado pelo crime ou demonstre a absoluta impossibilidade de fazêlo até o dia do pedido ou exiba documento que comprove a renúncia da vítima ou novação da dívida Esse requisito é dispensado quando já se operou a prescrição do débito no âmbito civil Em homenagem à separação e independência entre as instâncias subsiste a obrigação de reparar o dano como requisito da reabilitação quando em prol do penalmente condenado tiver sido julgado improcedente o pedido de indenização formulado no juízo civil Com efeito prevalece a decisão penal no tocante à prova da autoria e da materialidade do fato delituoso Não há falar em dano a ser reparado nos crimes que não o produzem tal como apologia ao crime ato obsceno e associação criminosa Da mesma forma não incide esse requisito quando o crime não apresenta vítima determinada ou ainda quando figura como sujeito passivo um ente destituído de personalidade jurídica crime vago A pobreza na acepção jurídica do termo que justifica a dispensa da reparação do dano pode ser provada por qualquer meio legítimo A renúncia da vítima ou a novação civil da dívida também autorizam a reabilitação independentemente do ressarcimento dos prejuízos O fato de a vítima não ter ajuizado ação indenizatória contra o condenado não significa estar ele livre de reparar o dano Requisitos subjetivos Dizem respeito à pessoa do condenado São dois domicílio no país nos dois anos seguintes ao cumprimento ou extinção da pena e bom comportamento público e privado nesse período 427 a Domicílio no país Exigese que o condenado tenha sido domiciliado no Brasil no prazo de dois anos após a extinção da pena o que admite liberdade de prova b Bom comportamento público e privado O condenado no prazo de dois anos posteriormente à extinção da pena deve ter apresentado de forma efetiva e constante bom comportamento público e privado Não só a prática de novo delito impede a reabilitação Qualquer ato capaz de macular a reputação do agente pode fazêlo A demonstração efetiva e constante de bom comportamento público e privado pode ser feita exemplificativamente com frequência a estabelecimentos de ensino e cursos profissionalizantes ocupação lícita e honesta participação em programas filantrópicos e sociais etc PEDIDO DE REABILITAÇÃO A legitimidade para formular o pedido de reabilitação é privativa do condenado Cuidase de ato eminentemente pessoal intransferível Não se estende aos seus herdeiros ou sucessores em caso de falecimento do titular o que se justifica pela finalidade do instituto reinserção social do condenado Inexiste pois reabilitação em prol da memória do condenado falecido uma vez que a medida somente produz efeitos para o futuro O condenado deve ser assistido por advogado e o pedido deve ser 428 429 endereçado ao juízo de primeiro grau em que tramitou a ação penal ainda que a decisão condenatória transitada em julgado tenha sido proferida em sede recursal No caso de competência originária a reabilitação deve ser ajuizada perante o Tribunal competente6 A petição inicial deve estar acompanhada de todos os requisitos de índole objetiva e subjetiva disciplinados pelo art 94 do Código Penal Deve ser ouvido o Ministério Público previamente à decisão judicial A sentença que concede ou nega a reabilitação pode ser impugnada por meio de recurso de apelação na forma do art 593 II do Código de Processo Penal Na hipótese de concessão comporta também recurso de ofício conforme determina o art 746 do citado diploma legal O art 94 parágrafo único do Código Penal revela o caráter rebus sic stantibus da reabilitação pois uma vez negada poderá ser novamente requerida a qualquer tempo desde que o pedido seja instruído com novos elementos comprobatórios dos requisitos necessários REVOGAÇÃO DA REABILITAÇÃO Preceitua o art 95 do Código Penal A reabilitação será revogada de ofício ou a requerimento do Ministério Público se o reabilitado for condenado como reincidente por decisão definitiva a pena que não seja de multa REABILITAÇÃO E HABEAS CORPUS A via do habeas corpus não é a adequada para instrumentalizar o pedido de reabilitação seja porque não há risco à liberdade de locomoção seja pela impossibilidade de dilação probatória no âmbito do remédio constitucional7 1 2 3 4 5 6 7 BETTIOL Giuseppe Direito penal Trad Paulo José da Costa Jr e Alberto Silva Franco São Paulo RT 1966 p 226 RMS 42972SP rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 22042014 Por esse motivo se ocorrer a declaração da extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva de modo a apagar a condenação falta ao acusado o interesse processual para se obter a reabilitação REsp 1166866MS rel Min Assusete Magalhães 6ª Turma j 20082013 CARVALHO FILHO Aloysio de Comentários ao Código Penal Rio de Janeiro Forense 1944 v IV p 388389 No nosso sistema processual vigente não se inclui a reabilitação entre os incidentes da execução e o Código de Processo Penal comum art 743 e o Código de Processo Penal Militar art 651 determinam expressamente que o benefício seja requerido no juízo da condenação STF CC 7015SP rel Min Moreira Alves Plenário j 01081994 STF HC 90554RJ rel Min Cármen Lúcia 1ª Turma j 06032007 Medida de segurança é a modalidade de sanção penal com finalidade exclusivamente preventiva e de caráter terapêutico destinada a tratar inimputáveis e semiimputáveis portadores de periculosidade com o escopo de evitar a prática de futuras infrações penais Em que pese o seu aspecto curativo revelase como espécie de sanção penal pois toda e qualquer privação ou restrição de direitos para quem a suporta apresenta conteúdo penoso Há contudo entendimentos minoritários no sentido de tratarse de instituto estritamente assistencial ou curativo razão pela qual não estaria submetido aos princípios vetores do Direito Penal dentre os quais o da reserva legal e da anterioridade1 No Direito Penal brasileiro penas e medidas de segurança apresentam claras distinções As penas têm finalidade eclética isto é retributiva e preventiva enquanto as medidas de segurança destinamse exclusivamente à prevenção de novas infrações penais prevenção especial2 As penas são aplicadas por período determinado guardando proporcionalidade com a reprovação do crime Já as medidas de segurança são aplicadas por período determinado quanto ao limite mínimo mas absolutamente indeterminado no tocante à duração máxima pois a sua extinção depende do fim da periculosidade do agente As penas têm como pressuposto a culpabilidade ao passo que as medidas de segurança reclamam a periculosidade do indivíduo No tocante aos destinatários as penas se dirigem aos imputáveis e semi imputáveis sem periculosidade Por sua vez as medidas de segurança se dirigem aos inimputáveis e aos semiimputáveis perigosos Não é possível a aplicação de medidas de segurança aos imputáveis Apenas a lei pode criar medidas de segurança Não podem ser veiculadas por medida provisória nos termos do art 62 1º I b da Constituição Federal Somente se admite a imposição de uma medida de segurança quando sua previsão legal for anterior à prática da infração penal eis que a essa espécie de sanção penal também incide o princípio constitucional da irretroatividade da lei penal mais severa CF art 5º XL A medida de segurança apenas pode ser aplicada pelo Poder Judiciário com observância do devido processo legal A aplicação de medida depende de três requisitos 1 prática de um fato típico e ilícito 2 periculosidade do agente e 3 não tenha ocorrido a extinção da punibilidade Deve ter sido praticada uma infração penal ou seja reclamamse certeza da autoria e prova da materialidade do fato delituoso O raciocínio a ser feito é o seguinte há provas para a condenação mas como o caso concreto não autoriza a imposição de pena é necessária a aplicação de medida de segurança Destarte o simples fato de ser a pessoa portadora de periculosidade não permite a incidência da medida de segurança É imperioso o respeito ao devido processo legal com o exercício do contraditório e da ampla defesa Exemplificativamente um inimputável que tenha praticado um fato típico em estado de necessidade não comete crime razão pela qual não se aplica medida de segurança Da mesma forma não incide essa espécie de sanção penal quando ausentes provas inequívocas da autoria e da materialidade do fato Em segundo lugar o agente deve possuir periculosidade E finalmente é obrigatório que o Estado ainda possua o direito de punir Nos termos do art 96 parágrafo único do Código Penal Extinta a punibilidade não se impõe medida de segurança nem subsiste a que tenha sido imposta Periculosidade é a efetiva probabilidade relativa ao responsável por uma infração penal inimputável ou semiimputável de voltar a envolverse em crimes ou contravenções penais Extraise da natureza e da gravidade do fato cometido e das circunstâncias indicadas na legislação nacional É considerada socialmente perigosa a pessoa que cometeu o fato quando é de temer que pratique novos fatos previstos na lei como infrações3 Não é assim a mera possibilidade de reincidência Exigese mais é dizer fazse necessário um juízo de probabilidade no qual a chance de nova infração penal ser praticada é concreta e potencial segundo as regras da experiência comum Reclamase um prognóstico completo calcado em conjecturas razoáveis de que o indivíduo tornará a cometer infrações penais De fato funcionando a periculosidade como um dos pressupostos das medidas de segurança e tendo essa espécie de sanção penal como função exclusiva a prevenção especial o magistrado deve analisar o futuro com o escopo de aferir a probabilidade de o agente praticar novos ilícitos penais Daí falarse em juízo de prognose Nas penas ao contrário operase um diagnóstico acerca do passado do agente para se concluir se é ou não necessária sua aplicação Falase nesse caso de juízo de diagnose Com efeito as penas têm como pressuposto a culpabilidade Em suma a pena se justifica em razão daquilo que fez o agente A medida de segurança por outro lado somente se legitima se necessária para evitar que o indivíduo venha novamente a enveredar pelo caminho da ilicitude penal De acordo com o sistema adotado pelo Código Penal a periculosidade pode ser presumida ou real Periculosidade presumida é a que ocorre quando a lei expressamente considera determinado indivíduo perigoso Essa presunção é absoluta iuris et de iure e o juiz tem a obrigação de impor ao agente a medida de segurança Aplicase aos inimputáveis do art 26 caput do Código Penal de modo que tais pessoas serão submetidas a medida de segurança quando comprovado seu envolvimento em uma infração penal Se um inimputável portanto praticou uma infração penal será tratado como perigoso prescindindose de conclusão pericial específica nesse sentido Basta ser inimputável e responsável por um crime ou contravenção penal Periculosidade real é a que deve ser provada no caso concreto isto é a lei não presume sua existência É aplicável aos semiimputáveis do art 26 parágrafo único do Código Penal Destarte quando um semiimputável comete uma infração penal será tratado como culpável salvo se o exame pericial que constatar sua responsabilidade diminuída concluir também e essa conclusão for aceita pelo magistrado pela sua periculosidade recomendando a substituição da pena por medida de segurança O inimputável CP art 26 caput que pratica uma infração penal é absolvido Não se aplica pena em virtude da ausência de seu pressuposto qual seja a culpabilidade Essa absolvição está prevista no art 386 VI do Código de Processo Penal Diante de sua periculosidade todavia impõese uma medida de segurança Tratase de sentença absolutória imprópria assim chamada por recair sobre o réu uma sanção penal na forma definida pelo art 386 parágrafo único III do Código de Processo Penal De acordo com a Súmula 422 do Supremo Tribunal Federal A absolvição criminal não prejudica a medida de segurança quando couber ainda que importe privação da liberdade Por outro lado no tocante ao semiimputável CP art 26 parágrafo único responsável por um crime ou contravenção penal a sentença é condenatória A presença da culpabilidade embora diminuída autoriza a imposição de pena reduzida obrigatoriamente de um a dois terços Se entretanto constatarse a sua periculosidade de forma a necessitar o condenado de especial tratamento curativo a pena reduzida pode ser substituída por medida de segurança O art 98 do Código Penal acolheu o sistema vicariante ou unitário pois ao semiimputável será aplicada pena reduzida de um a dois terços ou medida de segurança conforme seja mais adequado ao caso concreto Antes da reforma da Parte Geral do Código Penal pela Lei 72091984 imperava o sistema do duplo binário derivado do italiano doppio binario4 também chamado de duplo trilho ou dupla via pelo qual o semiimputável perigoso cumpria inicialmente a pena privativa de liberdade e ao final desta se subsistisse a periculosidade era submetido a medida de segurança Nada impede a imposição simultânea ao semiimputável de pena privativa de liberdade e de medida de segurança pela prática de fatos diversos situação que não viola o sistema vicariante Nesse contexto se o condenado estava cumprindo pena e sobreveio a imposição em outra ação penal de medida de segurança não é obrigatória a conversão da reprimenda em internação ou tratamento ambulatorial O Superior Tribunal de Justiça já se pronunciou nesse sentido Durante o cumprimento de pena privativa de liberdade o fato de ter sido imposta ao réu em outra ação penal medida de segurança referente a fato diverso não impõe a conversão da pena privativa de liberdade que estava sendo executada em medida de segurança Inicialmente convém apontar que o sistema vicariante afastou a imposição cumulativa ou sucessiva de pena e medida de segurança uma vez que a aplicação conjunta ofenderia o princípio do ne bis in idem já que o mesmo indivíduo suportaria duas consequências em razão do mesmo fato No caso em análise evidenciase que cada reprimenda imposta corresponde a um fato distinto Portanto não há que se falar em ofensa ao sistema vicariante porquanto a medida de segurança referese a um fato específico e a aplicação da pena privativa de liberdade correlacionase a outro fato e delito5 Em relação aos semiimputáveis a sentença sempre será condenatória tanto na hipótese de aplicação de pena privativa de liberdade como no caso de sua substituição por medida de segurança Mas uma vez aplicada a medida de segurança seguese o mesmo regramento existente para os inimputáveis no tocante à execução da sanção penal O art 96 do Código Penal apresenta duas espécies de medidas de segurança detentiva e restritiva Detentiva prevista no inciso I consiste em internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico ou à falta em outro estabelecimento adequado Importa em privação da liberdade do agente Restritiva elencada pelo inciso II é a sujeição a tratamento ambulatorial O agente permanece livre mas submetido a tratamento médico adequado O critério para escolha da espécie de medida de segurança a ser aplicada reside na natureza da pena cominada à infração penal Com efeito dispõe o art 97 caput do Código Penal que se o fato é punido com reclusão o juiz determinará obrigatoriamente sua internação Se o fato todavia for punível com detenção poderá o juiz optar entre a internação e o tratamento ambulatorial No caso de pena de detenção a escolha entre as medidas de segurança detentiva e restritiva deve ser guiada pelo grau de periculosidade do réu O rígido critério adotado pelo Código Penal é alvo de críticas por estabelecer um modelo padrão para medidas de segurança e levar à internação de diversas pessoas que poderiam ser tratadas de forma mais branda Cria inclusive distinções injustas entre imputáveis e inimputáveis O condenado pela prática de crime de furto simples dificilmente seria submetido ao cárcere pois teria direito a diversos institutos que evitam a privação da liberdade tais como penas restritivas de direitos sursis etc Se inimputável contudo seria inevitavelmente internado por se tratar de crime punido com reclusão Em face disso há propostas para a correção do equívoco legislativo reservando a internação somente aos casos em que a periculosidade do agente efetivamente reclame a privação da liberdade Para Carlota Pizarro de Almeida Não é correto portanto quando se trate de portadores de anomalia psíquica estabelecer uma correspondência entre a medida de segurança e a gravidade do fato praticado Mas já será importante estabelecêla em relação à perigosidade do agente só assim se respeita o princípio da proporcionalidade6 O Supremo Tribunal Federal acolhe esta proposta doutrinária Em casos excepcionais admitese a substituição da internação por medida de tratamento ambulatorial quando a pena estabelecida para o tipo é a reclusão notadamente quando manifesta a desnecessidade da internação7 É também o entendimento do Superior Tribunal de Justiça Na fixação da medida de segurança por não se vincular à gravidade do delito perpetrado mas à periculosidade do agente cabível ao magistrado a opção por tratamento mais apropriado ao inimputável independentemente de o fato ser punível com reclusão ou detenção em homenagem aos princípios da adequação da razoabilidade e da proporcionalidade arts 26 e 97 do CP8 A sentença que aplica medida de segurança deve obrigatoriamente fixar o prazo mínimo de internação ou tratamento ambulatorial entre um a três anos nos termos do art 97 1º in fine do Código Penal O prazo mínimo se destina à realização do exame de cessação da periculosidade O Código Penal estabelece em seu art 97 1º 1ª parte A internação ou tratamento ambulatorial será por tempo indeterminado perdurando enquanto não for averiguada mediante perícia médica a cessação de periculosidade A medida de segurança pelo texto da lei pode ser eterna De fato se a periculosidade durar por toda a vida do agente pelo mesmo período se arrastará a internação ou o tratamento ambulatorial Essa opção legal se funda na premissa de que por ser a medida de segurança um bem destinada a proteger o responsável por uma infração penal e também recuperálo do mal de que padece não encontra limites no tempo O que é bom não deve ser barrado por questões temporais A escolha legislativa todavia não é unânime Diversos penalistas pugnam pela inconstitucionalidade da duração indeterminada quiçá perpétua da medida de segurança espécie de sanção penal Além disso se o imputável é protegido pelo limite de 30 anos para cumprimento da pena privativa de liberdade não poderia um inimputável doente ser internado por prazo indeterminado9 Essa posição é atualmente aceita pelo Supremo Tribunal Federal A interpretação sistemática e teleológica dos arts 75 97 e 183 os dois primeiros do Código Penal e o último da Lei de Execuções Penais deve fazerse considerada a garantia constitucional abolidora das prisões perpétuas A medida de segurança fica jungida ao período máximo de trinta anos10 O Superior Tribunal de Justiça de seu turno tem inovado sobre o assunto decidindo que a duração da medida de segurança não pode ultrapassar o limite máximo da pena cominada ao delito praticado em obediência aos princípios da isonomia e da proporcionalidade pois caso contrário os destinatários das medidas de segurança normalmente inimputáveis acabariam recebendo um tratamento jurídicopenal mais severo do que aquele dispensado aos imputáveis Este é o entendimento consolidado na Súmula 527 O tempo de duração da medida de segurança não deve ultrapassar o limite máximo da pena abstratamente cominada ao delito praticado Em nossa opinião a posição adotada pelo STJ desponta como a mais adequada acerca do máximo de duração da medida de segurança especialmente no tocante à internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico Com efeito se uma pessoa culpável imputável ou semi imputável e portanto dotada de livre arbítrio e responsável por uma conduta reprovável pode ser apenada até o limite previsto em lei não há razão para se permitir que um indivíduo envolvido pela periculosidade inimputável ou semiimputável normalmente portador de doença mental receba uma medida de segurança por período superior Com o trânsito em julgado da sentença que aplica a medida de segurança será ordenada pelo juiz a expedição de guia para a execução LEP art 171 Essa guia é imprescindível pois sem ela ninguém será internado em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico nem submetido a tratamento ambulatorial para cumprimento da medida de segurança LEP art 172 Em se tratando de internação o agente é obrigatoriamente submetido a exame criminológico No tratamento ambulatorial esse exame é facultativo LEP art 174 Durante a execução da medida de segurança o sentenciado pode contratar médico de sua confiança pessoal para orientar e acompanhar o tratamento Em caso de divergência entre o profissional particular e o médico oficial decidirá o juiz da execução como peritum peritorum isto é o perito dos peritos LEP art 43 e parágrafo único Ao término do prazo mínimo de duração da medida de segurança será averiguada a cessação da periculosidade pelo exame das condições pessoais do agente O procedimento a ser seguido consta do art 175 da Lei de Execução Penal I a autoridade administrativa até 1 um mês antes de expirar o prazo mínimo de duração da medida de segurança remeterá ao juiz da execução minucioso relatório instruído com o laudo psiquiátrico que o habilite a resolver sobre a revogação ou permanência da medida Prescindese de intervenção judicial II o juiz pode determinar a realização de diligências para esclarecer dúvidas acaso existentes III com a juntada do relatório e realização de eventuais diligências serão ouvidos sucessivamente o Ministério Público e o curador ou defensor no prazo de 3 três dias para cada um O juiz nomeará curador ou defensor se o sentenciado não o tiver IV o juiz de ofício ou a pedido das partes poderá determinar a realização de novas diligências ainda que expirado o prazo mínimo de duração da medida de segurança e V ouvidas as partes e cumpridas as diligências acaso determinadas o juiz profere sua decisão no prazo de 5 cinco dias Excepcionalmente o juiz pode determinar a antecipação do exame de cessação da periculosidade embora não decorrido o período mínimo de duração da medida de segurança atendendo a pedido fundamentado do Ministério Público ou do interessado seu procurador ou defensor LEP art 176 Ainda que não previsto em lei entendese que o juiz pode também de ofício ordenar antecipadamente a realização do exame quando tiver ciência de fato relevante capaz de justificar sua atuação Se concluir pela persistência da periculosidade o juiz manterá a medida de segurança devendo a autoridade administrativa renovar o exame psiquiátrico de ano em ano ou a qualquer tempo se o determinar o juiz da execução CP art 97 2º Por outro lado se concluir pela cessação da periculosidade o juiz suspende a execução da medida de segurança determinando a desinternação para a espécie detentiva ou a liberação para a modalidade restritiva do agente Essa decisão comporta agravo em execução com efeito suspensivo pois a desinternação ou liberação dependem do trânsito em julgado LEP art 179 Essa é a única hipótese de agravo de execução com efeito suspensivo LEP art 197 cc art 179 A desinternação e a liberação serão sempre condicionadas pois o juiz deve impor ao agente as mesmas condições do livramento condicional LEP art 178 Essas condições se dividem em obrigatórias e facultativas São condições obrigatórias 1 obter ocupação lícita se apto para o trabalho 2 comunicar periodicamente ao juiz sua ocupação e 3 não mudar da comarca sem prévia autorização judicial LEP art 178 cc o art 132 1º O juiz tem ainda a discricionariedade para impor condições facultativas tais como 1 não mudar de residência sem comunicação ao juiz e à autoridade incumbida da observância cautelar e de proteção 2 recolherse à habitação em hora fixada e 3 não frequentar determinados lugares LEP art 178 cc o art 132 2º A desinternação e a liberação de natureza condicional serão revogadas pelo juízo da execução se o agente antes do decurso de 1 ano praticar fato e não necessariamente infração penal indicativo da manutenção da sua periculosidade CP art 97 3º O internado ou submetido a tratamento ambulatorial que foi liberado pelo período de 1 um ano a contar da saída do estabelecimento é chamado de a b c egresso pelo art 26 I da Lei de Execução Penal Em sua redação original o art 80 caput do Código Penal previa a medida de segurança provisória ou preventiva é dizer aplicada durante o trâmite da ação penal Entretanto com a entrada em vigor da Lei 72091984 Reforma da Parte Geral do Código Penal este instituto foi suprimido do sistema jurídicopenal brasileiro Com a edição da Lei 124032011 reafirmouse o instituto da internação provisória inserida entre as medidas cautelares de cunho pessoal no art 319 VII do Código de Processo Penal Para a sua utilização exigemse os seguintes requisitos cumulativos crime praticado com emprego de violência à pessoa ou grave ameaça exemplos roubo homicídio estupro etc perícia concluindo pela inimputabilidade ou semiimputabilidade do agente Nesse último caso é imprescindível a demonstração da periculosidade indicando a necessidade do tratamento curativo e não somente da diminuição da pena risco de reiteração de novas condutas criminosas Este risco é presumido no tocante aos inimputáveis em face da sua periculosidade No tocante aos semiimputáveis e desde que seja recomendável o especial tratamento curativo o risco de reiteração deve ser provado no caso concreto Se não for recomendado o especial tratamento curativo cabe prisão preventiva desde que presentes os requisitos legais CPP arts 282 e 311 a 313 Esta inovação é salutar pois evita o encarceramento de pessoas portadoras de doenças mentais as quais anteriormente eram presas preventivamente e ficavam desprovidas de tratamento médico prejudicando ainda mais o seu já debilitado estado No entanto há um inconveniente Como a imputabilidade de todo ser humano é presumida a partir dos 18 anos muitas pessoas continuarão sendo presas provisoriamente e somente durante a instrução criminal mais especificamente no bojo do incidente de insanidade mental será provada a inimputabilidade ou semiimputabilidade autorizando a partir daí a internação provisória Vale destacar que o art 319 VII do Código de Processo Penal prevê somente a internação provisória Não se admite por falta de previsão legal o tratamento ambulatorial preventivo ou seja antes do trânsito em julgado da sentença ou acórdão que aplica essa modalidade de medida de segurança De acordo com o art 97 4º do Código Penal em qualquer fase do tratamento ambulatorial poderá o juiz determinar a internação do agente se essa providência for necessária para fins curativos E ainda estabelece o art 184 da Lei de Execução Penal O tratamento ambulatorial poderá ser convertido em internação se o agente revelar incompatibilidade com a medida Além disso determina o parágrafo único do citado dispositivo legal que nessa hipótese o prazo mínimo de internação será de 1 um ano Cuidase da conversão da internação para tratamento ambulatorial durante o prazo de duração da medida de segurança como forma de preparar o sentenciado progressivamente para o retorno ao convívio social nos casos em que a internação não se mostra mais necessária embora o agente dependa da manutenção dos cuidados médicos Essa providência nada obstante não prevista em lei tem sido admitida na prática forense uma vez que a medida de segurança não possui o caráter de castigo podendo ser abrandada quando a situação fática dispensar a privação da liberdade do agente Confirase a posição do Superior Tribunal de Justiça Ainda que a cessação da periculosidade do paciente tenha sido atestada por dois laudos consecutivos não é recomendável a desinternação imediata tendo em vista as circunstâncias do caso já que a doença do paciente é controlada apenas mediante o uso contínuo da medicação que este não tem qualquer respaldo familiar e que possui extensa folha de antecedentes demonstrando a possibilidade de reiteração de condutas previstas como crime Cabível no caso a desinternação progressiva do paciente para que se adapte ao meio externo e à responsabilidade de dar continuidade ao tratamento quando em liberdade11 É também o entendimento reinante no Supremo Tribunal Federal Observouse que na espécie o último laudo psiquiátrico informara que apesar de persistir a periculosidade do agente esta se encontraria atenuada de modo a indicar ser cabível a adoção da desinternação progressiva12 Para os partidários da desinternação progressiva o inimputável ou o semi imputável tem o direito à progressividade ao tratamento ambulatorial sob pena de afrontarse a individualização na execução da sanção criminal prevista constitucionalmente no art 5º XLVI A progressividade do internamento ao tratamento ambulatorial consiste numa garantia constitucional inerente a qualquer cidadão configurandose sua inadmissibilidade um contrassenso às finalidades do tratamento13 Se no curso da execução da pena privativa de liberdade sobrevier ao condenado doença mental ou perturbação de saúde mental o art 183 da Lei de Execução Penal autoriza o juiz de ofício a requerimento do Ministério Público ou da autoridade administrativa a substituíla por medida de segurança Essa substituição somente deve ocorrer quando a doença mental ou perturbação da saúde mental for de natureza permanente Se transitória transferese o condenado a hospital de custódia e tratamento psiquiátrico e uma vez curado retorna ao estabelecimento prisional nos moldes do art 41 do Código Penal A conversão somente poderá ser efetuada durante o prazo de cumprimento da pena e necessita de perícia médica Realizada a conversão discutese o período máximo de duração da medida de segurança É grande a controvérsia existindo quatro posições sobre o assunto 1ª posição A medida de segurança deverá persistir por prazo indeterminado até a cessação da periculosidade nos moldes do art 97 1º do Código Penal Pouco importa a duração da pena privativa de liberdade substituída 2ª posição A medida de segurança terá a duração máxima de 30 anos limite fixado pelo art 75 do Código Penal para a pena privativa de liberdade 3ª posição A medida de segurança terá a duração da pena máxima cominada em abstrato à infração penal que ensejou a imposição da pena privativa de liberdade 4ª posição A medida de segurança terá igual duração à pena privativa de liberdade originariamente aplicada O sentenciado cumpre a medida de segurança pelo restante da pena aplicada Como observa Antonio Carlos da Ponte Realizada a conversão que optará por uma medida de segurança detentiva internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico ou restritiva sujeição a tratamento ambulatorial passam a reger a execução penal as regras próprias da sanção aplicada em substituição Isso significa que a medida de segurança será estabelecida por um prazo mínimo variável de um a três anos sem contudo que seu prazo máximo ultrapasse aquele correspondente à pena substituída sob pena de ofensa à coisa julgada uma vez que a superveniência de doença mental não tem o condão de retroagir seus efeitos de modo a alterar o que ficou decidido e transitou em julgado Do contrário estarseia de modo indireto impondose ao sentenciado o cumprimento correspondente ao somatório da pena e da medida de segurança possibilidade definitivamente afastada pelo sistema vicariante14 É também a posição do Superior Tribunal de Justiça Em se tratando de medida de segurança aplicada em substituição à pena corporal prevista no art 183 da Lei de Execução Penal sua duração está adstrita ao tempo que resta para o cumprimento da pena privativa de liberdade estabelecida na sentença condenatória sob pena de ofensa à coisa julgada15 Reza o art 99 do Código Penal O internado será recolhido a estabelecimento dotado de características hospitalares e será submetido a tratamento Como consequência desse mandamento legal o sentenciado a quem foi imposta medida de segurança detentiva não pode ser colocado em estabelecimento prisional comum Tal situação caracteriza nítido constrangimento ilegal sanável pela via do habeas corpus Ele deve aguardar o surgimento de vaga em tratamento ambulatorial pois a responsabilidade pela precariedade do sistema penal não lhe pode ser transferida pelo Estado É a posição do Supremo Tribunal Federal A 2ª Turma não conheceu de habeas corpus mas deferiu a ordem de ofício para determinar a inclusão do paciente em tratamento ambulatorial sob a supervisão do juízo da execução criminal No caso a pena privativa de liberdade ao paciente dois anos um mês e vinte dias de reclusão fora substituída por medida de segurança consistente em internação hospitalar ou estabelecimento similar para tratamento de dependência química pelo prazo de dois anos e ao seu término pelo tratamento ambulatorial Nada obstante passados quase três anos do recolhimento do paciente em estabelecimento prisional o Estado não lhe teria garantido o direito de cumprir a medida de segurança fixada pelo juízo sentenciante16 Os arts 45 parágrafo único e 47 ambos da Lei 113432006 disciplinam expressamente as medidas de segurança no tocante aos crimes nela previstos em relação aos agentes inimputáveis e semiimputáveis dependentes de drogas A internação decorrente da condenação pela prática de ato infracional é medida socioeducativa e não sanção penal e deverá ser cumprida em entidade exclusiva para adolescentes em local distinto daquele destinado ao abrigo obedecida rigorosa separação por critérios de idade compleição física e gravidade da infração Lei 80691990 ECA art 123 O fato de o adolescente infrator ter completado 21 vinte e um anos impõe a sua liberação compulsória da medida de internação ECA art 121 5º Portanto com a superveniência dos 21 anos de idade como inexiste espaço sequer à medida socioeducativa não é possível aplicar por analogia medida de segurança prevista no Código Penal àquele sob proteção do Estatuto da Criança e do Adolescente ainda que a personalidade do infrator revele manifesta periculosidade 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 É o caso de TOLEDO Francisco de Assis Princípios básicos de direito penal 5 ed 13 tir São Paulo Saraiva 2007 p 4042 As funções objetivos imediatos ou fins meios das medidas de segurança são de prevenção especial de recuperação social do agente perigoso através do tratamento da anomalia psíquica ou da correção da tendência criminosa e ainda inocuização ou neutralização da perigosidade criminal do infrator CARVALHO Américo Taipa de Direito penal Parte Geral Questões fundamentais Teoria Geral do Crime 2 ed Coimbra Coimbra Editora 2008 p 76 NOGUEIRA J C Ataliba Medidas de segurança São Paulo Saraiva 1937 p 221 DOTTI René Ariel Visão geral da medida de segurança In SHECAIRA Sérgio Salomão Org Estudos criminais em homenagem a Evandro Lins e Silva São Paulo Método 2001 p 310 HC 275635SP rel Min Nefi Cordeiro 6ª Turma j 08032016 noticiado no Informativo 579 ALMEIDA Carlota Pizarro de Modelos de inimputabilidade Da teoria à prática Coimbra Almedina 2000 p 34 HC 85401RS rel Min Cezar Peluso 2ª Turma j 04122009 REsp 1266225PI rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 16082012 Em igual sentido REsp 912668SP rel Min Rogério Schietti Cruz 6ª Turma j 18032014 É o caso de ZAFFARONI Eugenio Raúl PIERANGELLI José Henrique Manual de direito penal brasileiro Parte geral 7 ed São Paulo RT 2007 v 1 p 733 HC 84219SP rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 16082005 E também HC 107432RS rel Min Ricardo Lewandowski 1ª Turma j 24052011 noticiado no Informativo 628 HC 89212SP rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 27032008 HC 98360RS rel Min Ricardo Lewandowski 1ª Turma j 04082009 noticiado no Informativo 554 Na mesma direção HC 102489RS rel Min Luiz Fux 1ª Turma j 22112011 noticiado no Informativo 649 13 14 15 16 FERRARI Eduardo Reale Medidas de segurança e direito penal no estado democrático de direito São Paulo RT 2001 p 172173 PONTE Antonio Carlos da Inimputabilidade e processo penal 2 ed São Paulo Quartier Latin 2007 p 87 HC 130162SP rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 02082012 E também HC 219014RJ rel Min Og Fernandes 6ª Turma j 16052013 HC 122670SP rel Min Ricardo Lewandowski 2ª Turma j 05082014 noticiado no Informativo 753 É também o entendimento do STJ RHC 38499SP rel Min Maria Thereza De Assis Moura 6ª Turma j 11032014 noticiado no Informativo 537 441 442 443 a b c d INTRODUÇÃO O instituto da ação penal em que pese ser mais intimamente relacionado ao processo penal e por consequência disciplinado pelo Código de Processo Penal é também tratado pelos arts 100 a 106 do Código Penal o que redunda em críticas doutrinárias por ser o direito de ação um direito subjetivo processual autônomo e distinto do direito material Essa postura se justifica pelo fato de diversas questões afetas à ação penal implicarem na extinção da punibilidade ampliando a esfera de liberdade do cidadão e retirando do Estado o direito de punir CONCEITO Ação penal é o direito de exigir do Estado a aplicação do direito penal objetivo em face do indivíduo envolvido em um fato tipificado em lei como infração penal CARACTERÍSTICAS O direito ao exercício da ação penal apresenta as seguintes características público a atividade jurisdicional provocada é incumbência do Poder Público subjetivo o seu titular exige do Estado a prestação jurisdicional autônomo independe da efetiva existência do direito material abstrato independe do resultado final da postulação favorável ou desfavorável e e 444 4441 a b c 4442 instrumental embora o fim último do autor seja o de obter um resultado favorável à pretensão insatisfeita o direito de ação tem por fim a instauração de um processo com a tutela jurisdicional para a composição da lide Esse direito instrumental porém só existe porque é conexo a um caso concreto1 CLASSIFICAÇÃO DA AÇÃO PENAL A classificação da ação penal pode ser efetuada levando em consideração a tutela jurisdicional invocada ou a titularidade para sua propositura Divisão com base na tutela jurisdicional invocada É a utilizada também no processo civil e classifica as ações em de conhecimento visa o reconhecimento do direito submetido à apreciação judicial É exemplo a ação proposta pelo Ministério Público ou pelo ofendido ou seu representante legal visando a condenação do responsável por um fato típico e ilícito É também chamada de ação penal condenatória2 cautelar busca resguardar o direito invocado na ação principal de forma a permitir a eficácia da prestação jurisdicional Há diversos provimentos cautelares tal como o sequestro previsto nos arts 125 e 132 do Código de Processo Penal medida destinada a efetuar a constrição dos bens adquiridos com os proventos da infração penal e de execução almeja a satisfação de um direito já reconhecido A Lei 72101984 cuida da execução da sentença penal condenatória Divisão subjetiva É a classificação adotada pelo art 100 do Código Penal A ação penal é pública salvo quando a lei expressamente a declara privativa do ofendido Essa divisão parte da titularidade para propositura da ação penal É pública a proposta pelo Ministério Público e privada a que tem como sujeito ativo o ofendido ou seu representante legal 445 4451 CONDIÇÕES DA AÇÃO PENAL Condições genéricas Ao contrário do que se dá no Código de Processo Civil arts 17 e 485 inc VI o Código de Processo Penal não indica de forma expressa as condições genéricas para a propositura da ação penal São indicadas pela doutrina e pela jurisprudência no entanto três condições possibilidade jurídica do pedido legitimidade ad causam e interesse processual3 Afrânio Silva Jardim aponta ainda uma quarta condição genérica qual seja a justa causa4 Essa posição anteriormente doutrinária foi recepcionada pela Lei 117192008 que deu nova redação ao art 395 do Código de Processo Penal para o fim de estabelecer em seu inciso III a rejeição da denúncia quando faltar justa causa para o exercício da ação penal Passemos à análise de cada uma delas Para o possível exercício do direito de ação o fato descrito na denúncia ou queixacrime há de ser típico ou seja deve encontrar subsunção na lei penal incriminadora Por tal motivo dispõe o art 395 II do Código de Processo Penal A denúncia ou queixa será rejeitada quando faltar pressuposto processual ou condição para o exercício da ação penal Para Fernando Capez A fim de não se confundir a análise dessa condição da ação com o mérito a apreciação da possibilidade jurídica do pedido deve ser feita sobre a causa de pedir causa petendi considerada em tese desvinculada de qualquer prova porventura existente Analisase o fato tal qual narrado na peça inicial sem se perquirir se essa é ou não a verdadeira realidade a fim de se concluir se o ordenamento material cominalhe em abstrato uma sanção Deixase para o mérito a análise dos fatos provados5 Temse portanto que a verificação do preenchimento da condição da ação em exame é efetuada tomandose em consideração o ordenamento jurídico penal isto é verificase se os fatos narrados pela inicial acusatória encontram previsão em lei penal incriminadora independentemente nesse primeiro momento da prova concreta de sua efetiva ocorrência ad causam Na consagrada definição de Alfredo Buzaid legitimidade ad causam é a pertinência subjetiva para a ação Nesses termos apenas a pessoa cuja titularidade da ação penal é garantida pela lei tem o poder de ajuizála legitimidade ativa bem como somente aquele supostamente responsável pelo fato definido como infração penal pode figurar no polo passivo dessa mesma ação legitimidade passiva A lei penal estabelece como regra geral a ação penal pública que apenas poderá ser proposta pelo Ministério Público na forma definida pelo art 129 I da Constituição Federal Destarte nos crimes de ação penal pública se a demanda for iniciada pelo ofendido ou seu representante legal manifesta será a ilegitimidade ativa ad causam salvo na situação prevista no art 5º LIX da Constituição Federal e no art 29 do Código de Processo Penal ação penal privada subsidiária da pública Da mesma forma em caso de ação penal privada se a contenda for iniciada pelo Ministério Público estará configurada a ilegitimidade para agir Essa condição deve ser analisada pelo magistrado por ocasião do recebimento da denúncia ou queixa constituindose em causa de sua rejeição a ilegitimidade da parte CPP art 395 II O interesse processual se relaciona com a utilidade ou necessidade da providência jurisdicional e com a adequação do meio utilizado para alcançar o fim almejado A obrigatoriedade da providência jurisdicional para que se possa impor qualquer sanção ao envolvido em uma infração penal decorre do art 5º LIV da Constituição Federal ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal 4452 Portanto a ação penal é pressuposto para aplicação da pena restando preenchido o requisito da necessidade A utilidade por sua vez se revela na eficácia da decisão judicial para satisfação do interesse pleiteado pelo titular da ação Por esse motivo a ocorrência de qualquer causa extintiva da punibilidade implicará na rejeição da denúncia ou queixa CPP art 395 II pois a ação penal será completamente inócua ou ainda na absolvição sumária CPP art 397 IV Apontase rotineiramente a prescrição antecipada ou virtual como hipótese de inutilidade do exercício da ação penal Cumpre frisar contudo não ser essa espécie doutrinária de extinção da punibilidade aceita pelo Supremo Tribunal Federal por ausência de previsão legal6 Finalmente a adequação desponta na compatibilidade entre o meio empregado pelo titular do direito posto em debate ação penal e a sua pretensão condenação do autor do fato típico e ilícito Para Afrânio Silva Jardim às três condições clássicas que se apresentam no processo civil deve ser acrescentada uma quarta a justa causa ou seja um lastro mínimo de prova capaz de fornecer arrimo à pretensão acusatória uma vez que a simples instauração do processo penal atinge o status dignitatis do imputado Esse lastro probatório é fornecido pelo inquérito policial ou pelas peças de informação procedimentos investigatórios e informativos que devem acompanhar a inicial acusatória CPP arts 12 39 5º e 46 1º7 Nessa esteira os arts 647 e 648 I do Código de Processo Penal rotulam como coação ilegal a ausência de justa causa na ação penal autorizando a concessão da ordem de habeas corpus para sanar o problema8 Com a entrada em vigor da Lei 117192008 a ausência de justa causa para o exercício da ação penal autoriza a rejeição da denúncia ou queixa CPP art 395 III9 Condições específicas ou condições de procedibilidade São condições específicas ou condições de procedibilidade aquelas estabelecidas em lei cuja ausência impede o regular exercício do direito de ação Encontram respaldo no art 395 II 2ª parte do Código de Processo Penal ao estatuir que a denúncia ou queixa será rejeitada quando faltar condição para o exercício da ação penal São exemplos de condições de procedibilidade 1 a representação do ofendido ou de quem tiver qualidade para representálo e a requisição do Ministro da Justiça na ação penal pública condicionada CPP art 24 caput 2 a entrada do agente em território nacional em caso de crime praticado no exterior CP art 7º 2º a e o trânsito em julgado da sentença que anula o casamento no crime de induzimento a erro essencial e ocultação de impedimento CP art 236 parágrafo único O Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça também reconhecem como condição de procedibilidade a conclusão do procedimento administrativo com o consequente lançamento definitivo do tributo quando se discute a existência do débito ou do montante devido para a instauração da ação penal por crimes contra a ordem tributária previstos no art 1º da Lei 8137199010 Relativamente aos crimes definidos no art 1º I a IV da Lei 8137199011 o Supremo Tribunal Federal para espancar qualquer polêmica editou a Súmula Vinculante 24 Não se tipifica crime material contra a ordem tributária previsto no artigo 1º inciso I a IV da Lei nº 813790 antes do lançamento definitivo do tributo12 Convém destacar que no descaminho tipificado no art 334 do Código Penal é prescindível a prévia constituição do crédito tributário na esfera administrativa a título de condição de procedibilidade pois se trata de delito formal Na visão do Superior Tribunal de Justiça O fato de um dos bens jurídicos tutelados pelo direito penal no crime de descaminho ser a arrecadação tributária não pode levar à conclusão de que sua natureza jurídica é a mesma do crime previsto no art 1º da Lei 81371990 De rigor conceder tratamento adequado às especificidades dos respectivos tipos a fim de emprestarlhes interpretação adequada à natureza de cada delito considerado o sistema jurídico como um todo à luz do que pretendeu o Legislador ao editar referidas normas A norma penal do art 334 do Código Penal elencada sob o Título XI Dos Crimes Contra a Administração Pública visa a proteger em primeiro plano a integridade do sistema de controle de entrada e saída de mercadorias do país como importante instrumento de política econômica Engloba a própria estabilidade das atividades comerciais dentro do país refletindo na balança comercial entre o Brasil e outros países Na fraude pressuposta pelo referido tipo ademais há artifícios mais amplos para a frustração da atividade fiscalizadora do Estado do que o crime de sonegação fiscal podendo referirse tanto à utilização de documentos falsificados quanto e em maior medida à utilização de rotas marginais e estradas clandestinas para fuga da fiscalização alfandegária A exigência de lançamento tributário definitivo no crime de descaminho esvazia o próprio conteúdo do injusto penal equivalendo quase a uma descriminalização por via hermenêutica já que segundo a legislação aduaneira e tributária nesses casos incide a pena de perdimento da mercadoria operação que tem por efeito jurídico justamente tornar insubsistente o fato gerador do tributo e por conseguinte impedir a apuração administrativa do valor devido A prática do descaminho não se submete à regra instituída pelo Supremo Tribunal Federal ao editar a Súmula Vinculante 24 expressa em exigir o exaurimento da via administrativa somente em crime material contra a ordem tributária previsto no art 1º incisos I a IV da Lei 81371990 Em suma o crime de descaminho perfazse com o ato de iludir o pagamento de imposto devido pela entrada de mercadoria no país Não é necessária a apuração administrativofiscal do montante que deixou de ser recolhido para a configuração do delito embora este possa orientar a aplicação do princípio da insignificância quando se tratar de conduta isolada Tratase de crime formal e não material razão pela qual o resultado da conduta delituosa relacionada ao quantum do imposto devido não integra o tipo legal13 446 4461 AÇÃO PENAL PÚBLICA Nos termos do art 129 I da Constituição Federal é função institucional do Ministério Público promover privativamente a ação penal pública na forma da lei A ação penal pública é iniciada por denúncia ajuizada pelo Ministério Público O oferecimento da denúncia pode no entanto estar condicionado à representação da vítima ou seu representante legal ou ainda à requisição do Ministro da Justiça em hipóteses expressamente elencadas pela lei penal A ação penal pública portanto pode ser condicionada ou incondicionada em conformidade com o art 100 1º do Código Penal A ação pública é promovida pelo Ministério Público dependendo quando a lei o exige de representação do ofendido ou de requisição do Ministro da Justiça No mesmo sentido o disposto pelo art 24 caput do Código de Processo Penal Nos crimes de ação pública esta será promovida pelo Ministério Público mas dependerá quando a lei o exigir de requisição do Ministro da Justiça ou de representação do ofendido ou de quem tiver qualidade para representálo Princípios A ação penal pública é regida pelos seguintes princípios 1 Oficialidade ou autoritariedade os órgãos responsáveis pela persecução penal são públicos oficiais e a eles é atribuída autoridade uma vez que o Estado detém a titularidade exclusiva do direito de punir14 2 Obrigatoriedade ou legalidade se estiverem presentes elementos suficientes à propositura da ação penal não há discricionariedade por parte do Ministério Público que deverá obrigatoriamente oferecer denúncia Por esse motivo diz o art 24 caput do Código de Processo Penal que esta será promovida Pela mesma razão o arquivamento do inquérito policial há de ser necessariamente motivado CPP art 28 dependendo de pedido expresso do Parquet seguido do deferimento igualmente explícito da autoridade judiciária CPP art 18 e Súmula 524 do STF Em outras palavras não há espaço no sistema processual brasileiro para o arquivamento implícito15 Esse princípio é mitigado pela previsão contida no art 98 I da Constituição Federal que permite a transação penal nas infrações penais de menor potencial ofensivo cuja regulamentação se deu pelo art 76 caput da Lei 90991995 3 Indivisibilidade a ação penal pública deve englobar todos os envolvidos coautores e partícipes na infração penal regra que decorre do próprio princípio da obrigatoriedade O Ministério Público porém não está obrigado a ofertar denúncia quando não houver elementos probatórios mínimos para demonstrar sumariamente a participação de uma determinada pessoa no ilícito penal A exclusão de um agente entretanto deve ser suficientemente justificada pedindose no tocante a ele o arquivamento do inquérito policial ou das peças de informação16 Com interpretação divergente há autores que falam na divisibilidade da ação penal pública no sentido de que o processo penal pode ser desmembrado pois o oferecimento de denúncia contra um acusado não exclui a possibilidade futura de ação penal contra outros envolvidos e além disso permitese o aditamento da denúncia com a inclusão de corréu a qualquer tempo e ainda a propositura de nova ação penal contra agente não incluído em 4462 processo já sentenciado No famoso inquérito do mensalão assim se pronunciou o Supremo Tribunal Federal Também não procede a alegação de que a ausência de acusação contra dois supostos envolvidos beneficiados por acordo de delação premiada conduziria à rejeição da denúncia por violação ao princípio da indivisibilidade da ação penal A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é pacífica no sentido da inaplicabilidade de tal princípio à ação penal pública o que aliás se depreende da própria leitura do art 48 do Código de Processo Penal17 4 Indisponibilidade ou indesistibilidade depois de instaurada a ação penal o Ministério Público não poderá dela desistir CPP art 42 bem como lhe é vedado desistir de eventual recurso interposto CPP art 576 Esse princípio é abrandado pelo instituto disciplinado pelo art 89 da Lei 90991995 que autoriza o Parquet a propor ao acusado depois do oferecimento da denúncia a suspensão condicional do processo pelo prazo de dois a quatros anos o qual se decorrido integralmente sem revogação implicará na extinção da punibilidade 5 Intranscendência a ação penal somente pode ser ajuizada contra os supostos responsáveis pela prática da infração penal não abrangendo seus sucessores ou eventuais responsáveis civis Para a condenação dos responsáveis pela indenização em se tratando de pessoas distintas dos envolvidos no ilícito penal deverá ser proposta ação autônoma de conhecimento em consonância com a legislação processual civil 6 Oficiosidade salvo no caso da ação pública condicionada os órgãos encarregados pela persecução penal devem agir de ofício independentemente de provocação 7 Suficiência a ação penal é capaz de solucionar por si só a questão prejudicial não ligada ao estado civil das pessoas Logo é prescindível aguardar a solução de qualquer outra questão no âmbito cível Ação penal pública incondicionada É a espécie de ação penal iniciada pelo Ministério Público com o 4463 oferecimento de denúncia que depende somente da existência de prova da materialidade e de indícios de autoria de um fato previsto em lei como infração penal A grande maioria das infrações penais pertence a essa categoria de ação penal Consequentemente sua pertinência é obtida por via residual isto é sempre que a lei não exigir a representação do ofendido ou de quem tiver qualidade para representálo somente se procede mediante representação a requisição do Ministro da Justiça ou ainda indicar o cabimento de ação penal privada somente se procede mediante queixa o Ministério Público poderá oferecer denúncia se presentes seus requisitos independentemente de qualquer tipo de provocação Ação penal pública condicionada É condicionada a ação penal quando a lei expressamente exigir como condição para o oferecimento da denúncia a existência de representação do ofendido ou de quem tiver qualidade para representálo ou ainda de requisição do Ministro da Justiça CP art 100 1º e CPP art 24 A necessidade de representação do ofendido ou requisição do Ministro da Justiça visa proteger o ofendido evitando que o escândalo do processo strepitus judicii ou strepitus fori seja ainda mais prejudicial do que a ocorrência do crime em si Não há consenso doutrinário sobre o assunto Hélio Tornaghi as considerava condições objetivas de punibilidade18 enquanto Ada Pellegrini Grinover entende ser a representação uma parcela da possibilidade jurídica do pedido já que sem ela a pretensão deduzida em juízo sequer pode ser admitida por ser juridicamente impossível19 Para Fernando Capez20 e Fernando da Costa Tourinho Filho21 a representação do ofendido ou de seu representante legal e a requisição do Ministro da Justiça são condições de procedibilidade 446321 446322 Julio Fabbrini Mirabete por sua vez considera a representação e a requisição como condições suspensivas de procedibilidade já que sem elas não pode ser proposta a ação penal pública22 O Supremo Tribunal Federal entende tratarse de condição de procedibilidade O oferecimento da representação condição de procedibilidade da ação penal pública condicionada não exige requisito formal podendo ser suprida pela manifestação expressa da vítima ou de seu representante no sentido do prosseguimento da ação penal contra o autor23 Conceito A representação também chamada de delatio criminis postulatória apresenta duplo aspecto é simultaneamente autorização e pedido para que se possa iniciar a persecução penal nos casos exigidos em lei Legitimados Podem oferecer representação 1 O ofendido quando maior de 18 anos CPP art 24 O art 34 do Código de Processo Penal que traçava a legitimidade concorrente para representação entre o ofendido maior de 18 e menor de 21 anos de idade e seu representante legal foi tacitamente revogado pelo art 5º do Código Civil de 2002 que não mais prevê a incapacidade relativa para tal faixa etária De fato o fundamento da concorrência na legitimidade era o desenvolvimento civil incompleto do menor de 21 anos de idade que ainda não tinha plena compreensão dos seus direitos e deveres o que não mais se admite na legislação civil ora em vigor 2 O procurador com poderes especiais CPP art 39 caput Não se exige seja o procurador advogado regularmente inscrito nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil Deve porém possuir poderes 446323 446324 específicos para oferecer representação 3 O representante legal se o ofendido for menor de 18 anos ou mentalmente enfermo CPP art 24 caput cc art 33 aplicável por analogia 4 O curador especial quando o ofendido for menor de 18 anos ou mentalmente enfermo e não tiver representante legal ou os interesses deste colidirem com os daquele nomeado de ofício pelo juiz ou a requerimento do Ministério Público CPP art 33 aplicável por analogia Eficácia objetiva da representação Uma vez oferecida representação contra um dos responsáveis pela infração penal o Ministério Público poderá oferecer denúncia contra qualquer dos envolvidos em obediência ao princípio da indivisibilidade da ação penal pública E se operarse a retratação em relação a qualquer deles seus efeitos se estenderão a todos por aplicação analógica do art 49 do Código de Processo Penal Prazo O direito de representação poderá ser exercido no prazo de seis meses contado a partir do dia em que o ofendido ou seu representante legal tomou ciência acerca da autoria da infração penal Decorrido esse prazo com a omissão de quem tinha a prerrogativa de oferecer a representação verificarseá a extinção da punibilidade pela decadência CP art 107 IV 2ª figura Na hipótese de curador especial tal prazo é computado a partir da aceitação da nomeação para exercer o munus público e não do conhecimento da autoria Com a morte do ofendido e se ainda não tiver se esgotado o prazo decadencial o direito de representação será transmitido ao CADI cônjuge ascendente descendente ou irmão CPP art 24 1º E nos termos do art 38 parágrafo único do Código de Processo Penal a decadência nesse caso ocorrerá no mesmo prazo 446325 A doutrina diverge em relação à compreensão da contagem do prazo decadencial no caso de transmissão às pessoas acima indicadas Deve ser contado a partir do dia em que o ofendido soube quem é o autor do crime Ou deve ser contado a partir da data em que as pessoas indicadas pelo art 24 1º do Código de Processo Penal tomaram conhecimento da autoria Para uma primeira corrente o termo inicial ou a quo é o conhecimento da autoria pelo cônjuge ascendente descendente ou irmão Para outra corrente no entanto os sucessores terão o prazo de seis meses para o exercício do direito de representação contado a partir da data em que tomaram conhecimento da autoria Se os sucessores entretanto já tinham ciência da autoria da infração penal à época em que o ofendido estava vivo o prazo decadencial se iniciará a partir da morte do ofendido No tocante ao ofendido menor de 18 anos ou enfermo mental o prazo não começa a correr enquanto não cessar a incapacidade ou a enfermidade Com efeito não se pode falar na perda de um direito impossível de ser exercido Todavia para o representante legal o prazo tem início com o conhecimento da autoria Se houver conflito entre o interesse do ofendido incapaz e o do seu representante legal será necessária a nomeação de curador especial para defender os anseios da vítima Nessa hipótese o prazo para oferecimento da representação terá início na data em que o curador tiver ciência da sua nomeação Como já decidido pelo Superior Tribunal de Justiça Segundo o entendimento desta Corte Superior de Justiça havendo conflito de interesses entre a vítima menor e o seu representante legal poderá exercer o direito de representação o curador especial nomeado de ofício ou a requerimento do Ministério Público pelo Juízo condutor do feito hipótese em que o prazo decadencial começará a fluir a partir da data em que o curador tomar ciência da nomeação24 Representação na Lei 90991995 Em relação às infrações penais de menor potencial ofensivo isto é as contravenções penais e os crimes com pena máxima em abstrato igual ou a b c 446326 1 2 inferior a 2 dois anos cumulada ou não com multa independentemente da existência de rito especial deve ser seguido o procedimento definido pelo art 72 e seguintes da Lei 90991995 a saber abrese oportunidade para composição dos danos civis entre o ofendido e o autor do fato no caso de ação penal iniciativa privada ou de ação penal pública condicionada à representação se obtida a composição sua homologação judicial importa na renúncia ao direito de queixa ou de representação com a consequente extinção da punibilidade se contudo não for obtida a composição dos danos civis e em se tratando de ação penal pública condicionada à representação será dada oportunidade ao ofendido ou ao seu representante legal para exercer o direito de representação verbalmente com posterior redução a termo O não oferecimento da representação na audiência preliminar não implica decadência do direito que poderá ser exercido no prazo previsto em lei Lei 90991995 art 75 caput e parágrafo único prazo este definido como regra pelo art 38 do Código de Processo Penal Retratação da representação Estatui o art 102 do Código Penal A representação será irretratável depois de oferecida denúncia Notese que o dispositivo legal fala em oferecimento da denúncia e não em recebimento Assim se o Ministério Público já ofereceu denúncia mas o Poder Judiciário ainda não a recebeu formalmente será vedada a retratação Na hipótese de retratação da representação antes do oferecimento da denúncia há dois entendimentos o juiz deve declarar a extinção da punibilidade em que pese a ausência de previsão expressa pelo art 107 do Código Penal e os autos devem permanecer em cartório uma vez que antes do decurso do prazo decadencial será possível o oferecimento de nova 446327 446328 representação ou seja a retratação da retratação25 Também é cabível a retratação tácita da representação desde que demonstrada de forma inequívoca a prática de ato incompatível com o desejo de instaurar a persecução penal em juízo Exemplo a vítima de um crime de ameaça convida o apontado autor do fato para ser padrinho de seu filho O art 104 caput e seu parágrafo único do Código Penal entretanto somente admitem essa possibilidade retratação tácita relativamente ao direito de queixa Art 104 O direito de queixa não pode ser exercido quando renunciado expressa ou tacitamente Parágrafo único Importa renúncia tácita ao direito de queixa a prática de ato incompatível com a vontade de exercêlo não a implica todavia o fato de receber o ofendido a indenização do dano causado pelo crime Forma A representação independe de forma especial O Supremo Tribunal Federal firmou o entendimento de que é suficiente a demonstração inequívoca da intenção do ofendido ou de quem tiver qualidade para representálo em iniciar a ação penal26 No caso de vítima menor de 18 anos admitese seja a representação ofertada por qualquer pessoa que exerça sua guarda de fato ou ainda por quem o sustente materialmente com o propósito de evitar a impunidade do responsável pela prática da infração penal Requisição do Ministro da Justiça Cuidase de condição de procedibilidade consistente em ato de natureza administrativa e política revestido de discricionariedade pois há crimes em que a viabilidade de propositura da ação penal depende de um juízo de conveniência e oportunidade por parte do Ministro da Justiça As hipóteses de ação penal pública condicionada à requisição do Ministro da Justiça no Código Penal são a crime cometido por estrangeiro contra brasileiro fora do território nacional art 7º 3º b e b crimes contra a 446329 4463210 1º 2º 4463211 honra praticados contra o Presidente da República e contra chefe de governo estrangeiro art 141 I cc o art 145 parágrafo único Há ainda a hipótese prevista no art 31 IV da Lei 71701983 Crimes contra a Segurança Nacional Art 31 Para apuração de fato que configure crime previsto nesta Lei instaurarseá inquérito policial pela Polícia Federal IV mediante requisição do Ministro da Justiça Prazo A legislação não impõe prazo decadencial para o oferecimento da requisição do Ministro da Justiça Dessa forma pode ser lançada a qualquer tempo desde que não tenha ocorrido a extinção da punibilidade pela prescrição ou qualquer outra causa Retratação da requisição O direito positivo não previu a retratação da requisição A doutrina entretanto apresenta dois posicionamentos A requisição do Ministro da Justiça é ato administrativo e político de caráter discricionário Pode portanto ser revogado se não subsistirem os motivos de conveniência e oportunidade que a ensejaram27 até o oferecimento da denúncia e Não se admite a retratação seja por falta de previsão legal seja pela seriedade de que deve revestirse o ato mormente diante da ausência de prazo decadencial para seu oferecimento o que proporciona tempo suficiente para reflexão acerca do seu cabimento Não vinculação da requisição A palavra requisição significa ordem mandamento de modo que seu destinatário está obrigado a cumprila Nesse sentido o Ministério Público e a autoridade judiciária requisitam à autoridade policial a instauração de inquérito policial CPP art 5º II 1ª parte Questionase Com a requisição do Ministro da Justiça estará o Ministério Público obrigado a oferecer denúncia 447 Imaginese a hipotética situação em que alguém se refira ao Presidente da República como apreciador de bebidas alcoólicas O chefe do Poder Executivo Federal sentindose ofendido em sua honra subjetiva determina ao Ministro da Justiça o endereçamento de requisição ao Ministério Público para que a pessoa indicada como autora do delito seja denunciada pela prática de injúria Nesse caso ainda que entenda o representante do Parquet não ocorrida a tipicidade do crime definido pelo art 140 do Código Penal deverá oferecer denúncia A resposta é não obviamente Com efeito essa requisição é incompatível com a independência funcional princípio institucional do Ministério Público na forma do art 127 1º da Constituição Federal Desse modo os dispositivos legais que se referem à requisição do Ministro da Justiça devem ser interpretados em conformidade com a época em que foram editados especialmente os do Código de Processo Penal de 1941 em que o Ministério Público não tinha o perfil constitucional atual Ao contrário era um mero ramo do Poder Executivo o que se justificava com a expressão requisição do Ministro da Justiça pois o Parquet a ele estava hierarquicamente vinculado A partir da Constituição de 1988 entretanto a palavra requisição deve ser compreendida como representação AÇÃO PENAL PRIVADA Dizse privada a ação penal cuja legitimidade para propositura pertence ao ofendido ou a quem legalmente o represente quando aquele for menor de 18 anos ou mentalmente enfermo É iniciada com o oferecimento de queixa crime a qual deve conter os mesmos elementos da denúncia CPP art 41 Poucos crimes são processados por meio de ação penal privada e vale recordar tais casos são expressamente indicados pela lei No Código Penal podem ser lembrados os exemplos dos crimes tipificados pelos arts 184 236 e 345 sem emprego de violência entre outros 4471 4472 Prazo A queixacrime deve ser ajuizada no prazo de seis meses contado a partir da data em que o ofendido ou seu representante legal tomar conhecimento da autoria da infração penal CPP art 38 Esse prazo é decadencial Não se prorroga por força de domingos feriados ou férias e deve ser incluído em seu cômputo o dia do começo excluindose o dia do final em consonância com a regra traçada pelo art 10 do Código Penal O art 38 do Código de Processo Penal ao utilizar a expressão salvo disposição em contrário admite a existência de prazos diferenciados tal como se dá no crime definido pelo art 236 do Código Penal e nos crimes de ação penal privada contra a propriedade imaterial que deixam vestígios CPP art 529 caput Princípios A ação penal privada é regida pelos seguintes princípios 1 Oportunidade ou conveniência o ofendido tem liberdade para iniciar a ação penal Pode ou não fazêlo a seu exclusivo critério A renúncia tácita ou expressa ao direito de queixa encontra previsão nos arts 50 e 57 do Código de Processo Penal Contudo a renúncia contra um dos autores do crime a todos se estenderá CPP art 49 O art 74 parágrafo único da Lei 90991995 contém mais uma hipótese de renúncia ao direito de queixa quando a composição dos danos civis causados pela infração de menor potencial ofensivo for homologada em juízo 2 Disponibilidade decorre do princípio da oportunidade e permite ao ofendido ou representante legal a possibilidade de desistir da ação penal ou do recurso eventualmente interposto Pode ainda o querelante desistir da ação penal até o trânsito em julgado da sentença condenatória valendose dos institutos do perdão aceito e da perempção CPP arts 51 e 60 3 Indivisibilidade a queixacrime contra qualquer dos autores do crime obrigará ao processo de todos e o Ministério Público zelará pela sua indivisibilidade CPP art 48 Portanto o ofendido ou representante legal pode escolher entre ajuizar ou não a queixacrime Não é cabível todavia optar por oferecêla somente contra um ou outro envolvido na infração penal Como já decidido pelo Supremo Tribunal Federal Não oferecida a queixacrime contra todos os supostos autores ou partícipes da prática delituosa há afronta ao princípio da indivisibilidade da ação penal a implicar renúncia tácita ao direito de querela cuja eficácia extintiva da punibilidade estendese a todos quantos alegadamente hajam intervindo no cometimento da infração penal28 Este princípio contudo tem limites De fato só se pode falar em indivisibilidade da ação penal privada quando todos os agentes são conhecidos pela vítima ou pelo seu representante legal isto é ela tinha condições de oferecer a queixacrime contra todos os envolvidos na prática do delito mas optou por processar somente alguns ou algum deles Nesse caso a renúncia deliberada quanto a um dos agentes a todos se estenderá Para o Superior Tribunal de Justiça A não inclusão de eventuais suspeitos na queixacrime não configura por si só renúncia tácita ao direito de queixa Com efeito o direito de queixa é indivisível é dizer a queixa contra qualquer dos autores do crime obrigará ao processo de todos art 48 do CPP Dessarte o ofendido não pode limitar a este ou aquele autor da conduta tida como delituosa o exercício do jus accusationis tanto que o art 49 do CPP dispõe que a renúncia ao direito de queixa em relação a um dos autores do crime a todos se estenderá Portanto o princípio da indivisibilidade da ação penal privada torna obrigatória a formulação da queixacrime em face de todos os autores coautores e partícipes do injusto penal sendo que a inobservância de tal princípio acarreta a renúncia ao direito de queixa que de acordo com o art 107 V do CP é causa de extinção da punibilidade Contudo para o reconhecimento da renúncia tácita ao direito de queixa exigese a demonstração de que a não inclusão de determinados autores ou partícipes na queixacrime se deu de forma deliberada pelo querelante29 4473 No tocante à possibilidade de o Ministério Público aditar a queixacrime para incluir eventuais coautores ou partícipes há três posições acerca do assunto 1ª posição O Ministério Público não pode fazêlo uma vez que estaria invadindo a legitimação do ofendido ou de seu representante legal 2ª posição O aditamento é possível e expressamente previsto no art 46 2º do Código de Processo Penal O prazo para aditamento da queixa será de 3 três dias contado da data em que o órgão do Ministério Público receber os autos e se este não se pronunciar dentro do tríduo entenderseá que não tem o que aditar prosseguindose nos demais termos do processo30 3ª posição O Ministério Público não pode aditar a queixacrime E além disso a inicial acusatória deve ser rejeitada em razão da renúncia tácita com relação aos não incluídos uma vez que referida causa de extinção da punibilidade se comunica aos demais CPP art 49 4 Intranscendência a ação penal privada somente pode ser proposta contra os autores ou partícipes da infração penal não abrangendo seus sucessores ou eventuais responsáveis civis Espécies A legitimidade para ajuizamento da queixacrime é do ofendido se maior de 18 anos e capaz Se for menor de 18 anos ou mentalmente enfermo poderá ser proposta por seu representante legal CPP art 30 No caso de morte do ofendido ou quando declarado ausente por decisão judicial o direito de oferecer queixa ou prosseguir na ação passará ao cônjuge ascendente descendente ou irmão CPP art 31 Se o ofendido for menor de 18 anos ou mentalmente enfermo e não tiver representante legal ou colidirem os interesses deste com os daquele o direito de queixa poderá ser exercido por curador especial nomeado de ofício ou a requerimento do Ministério Público pelo juiz competente para o processo penal CPP art 33 Nessa modalidade de ação penal a lei confere exclusivamente ao ofendido a titularidade do direito de queixa intransmissível mesmo na hipótese do seu falecimento Também não é possível a nomeação de curador especial ao incapaz nem o oferecimento de queixacrime pelo seu representante legal O único exemplo de ação penal privada personalíssima subsistente em nosso ordenamento jurídico é o crime de induzimento a erro essencial e ocultação de impedimento tipificado pelo art 236 do Código Penal Art 236 Contrair casamento induzindo em erro essencial o outro contraente ou ocultandolhe impedimento que não seja casamento anterior Pena detenção de 6 seis meses a 2 dois anos Parágrafo único A ação penal depende de queixa do contraente enganado e não pode ser intentada senão depois de transitar em julgado a sentença que por motivo de erro ou impedimento anule o casamento A capacidade civil por emancipação ou pelo casamento não altera a impossibilidade de oferecer queixa Destarte o prazo decadencial apenas passará a fluir quando cessar a incapacidade penal ou seja quando o ofendido completar 18 anos de idade De acordo com o art 100 3º do Código Penal A ação de iniciativa privada pode intentarse nos crimes de ação pública se o Ministério Público não oferece denúncia no prazo legal O direito à ação penal privada subsidiária da pública foi erigido à categoria de direito fundamental pelo art 5º LIX da Constituição Federal será admitida ação privada nos crimes de ação pública se esta não for intentada no prazo legal Em caso de inércia do Ministério Público o ofendido ou representante legal pode oferecer queixa subsidiária no prazo de seis meses contados do termo final do prazo para oferecimento da denúncia Nesse caso o Ministério Público poderá aditar a queixa repudiála e oferecer denúncia substitutiva intervir em todos os atos do processo fornecer elementos de prova interpor recurso e a todo tempo no caso de negligência do querelante retomar a ação como parte principal CPP art 29 Após o prazo de seis meses cessa a possibilidade de ação privada subsidiária nada obstante o Parquet ainda possa oferecer denúncia enquanto não extinta a punibilidade do agente uma vez que a ação não perde seu caráter público Cumpre frisar que a ação privada subsidiária tem cabimento apenas na inércia do Ministério Público Dessa forma não é admitida quando o Parquet solicitar o arquivamento do inquérito policial ou das peças de informação ou requisitar a realização de novas diligências para elucidar a materialidade do fato ou sua autoria31 Nas palavras do Superior Tribunal de Justiça a ação penal privada subsidiária da pública somente teria guarida diante da prova inequívoca de haver a total inércia do Ministério Público mesmo de posse de todos os elementos necessários para formular acusação ele deixa de ajuizar a ação penal no prazo legal sem qualquer motivo justificado32 Também se admite a ação penal privada concorrente no tocante aos crimes contra a honra praticados contra funcionário público em razão de suas funções Facultase ao ofendido escolher entre ajuizar a ação penal privada ou então oferecer representação autorizando o Ministério Público a exercitar a ação penal pública condicionada à representação Nos termos da Súmula 714 do Supremo Tribunal Federal É concorrente a legitimidade do ofendido mediante queixa e do Ministério Público condicionada à representação do ofendido para a ação penal por 448 crime contra a honra de servidor público em razão do exercício de suas funções Nessas hipóteses a legitimidade além de concorrente é excludente da atuação do outro legitimado Em síntese o exercício da ação pública condicionada exclui a utilização da ação penal privada e viceversa Na visão do Superior Tribunal de Justiça Nos crimes contra a honra de servidor público a legitimidade para a ação é concorrente vale dizer o ofendido pode propor a queixacrime ou pode representar ao Ministério Público para que ofereça denúncia A opção por uma das vias torna a outra preclusa não se admitindo que a vítima represente ao Ministério Público e posteriormente ofereça ela própria a queixacrime33 AÇÃO PENAL NOS CRIMES COMPLEXOS Para o art 101 do Código Penal Quando a lei considera como elemento ou circunstâncias do tipo legal fatos que por si mesmos constituem crimes cabe ação pública em relação àquele desde que em relação a qualquer destes se deva proceder por iniciativa do Ministério Público Crimes complexos são aqueles que resultam da fusão de dois ou mais tipos penais Exemplos roubo furto lesão corporal ou ameaça latrocínio roubo homicídio e extorsão mediante sequestro extorsão sequestro Destarte o crime que resulta da união de dois outros será de ação penal 449 pública desde que um deles pertença a esta categoria ainda que seja o outro de ação penal privada Como porém a lei sempre indica expressamente as hipóteses de crime de ação penal privada essa regra é inócua e absolutamente desnecessária AÇÃO PENAL NOS CRIMES CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL Nos delitos contra a liberdade sexual e nos delitos sexuais contra vulneráveis previstos nos Capítulos I e II do Título VI da Parte Especial do Código Penal Crimes contra a dignidade sexual a ação penal é pública incondicionada É o que se extrai do art 225 do Código Penal Mas nem sempre foi assim Na sistemática original do Código Penal texto de 1940 os então denominados crimes contra os costumes eram processados em regra mediante ação penal privada Com as alterações promovidas pela Lei 120152009 a regra passou a ser a ação pública condicionada à representação ficando excepcionada quando a vítima era menor de 18 anos ou pessoa vulnerável hipóteses em que a ação penal era pública incondicionada Em nossa opinião esta era a opção mais acertada De fato afastandose a ação penal privada retiravase do ofendido ou de seu representante legal o ônus de oferecer a queixacrime Se não bastasse a exigência da representação protegia a intimidade da vítima que poderia optar por não oferecer a condição de procedibilidade para evitar o escândalo do processo strepitus fori Em síntese se a vítima maior de idade e capaz desejasse preservar sua vida privada bastava não representar Porém fazendoo cabia ao Ministério Público ajuizar a ação penal sem ônus processuais ao ofendido Com a atual redação do art 225 do Código Penal dada pela Lei 137182018 e a Súmula 608 do Supremo Tribunal Federal No crime de estupro praticado mediante violência real a ação penal é pública incondicionada tornouse desnecessária pois o estupro qualquer que seja seu meio de execução passou a ser crime de ação pública incondicionada 4410 1 2 AÇÃO PENAL E CRIME DE LESÃO CORPORAL PRATICADO COM VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER34 Nos crimes de lesões corporais com violência doméstica e familiar contra a mulher em todas as suas modalidades inclusive de natureza leve e culposa a ação penal é pública incondicionada Esta é a nossa posição As lesões leves e culposas no plano histórico sempre foram consideradas crimes de ação penal pública incondicionada pelo direito brasileiro Todavia com a entrada em vigor da Lei 90991995 elas foram transformadas pelo seu art 88 em delitos de ação penal pública condicionada à representação do ofendido ou de seu representante legal Esse panorama foi alterado com a Lei 113402006 Lei Maria da Penha pois estabelece seu art 41 Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher independentemente da pena prevista não se aplica a Lei 9099 de 26 de setembro de 1995 Portanto como não se aplicam as disposições da Lei 90991995 afastase a incidência do seu art 88 e os crimes de lesões corporais de natureza leve e culposa voltam a ser de ação penal pública incondicionada exclusivamente quando cometidos com violência doméstica e familiar contra a mulher Além disso podem ser apontados outros argumentos que justificam essa posição o art 88 da Lei 90991995 foi derrogado em relação à Lei Maria da Penha em razão de o art 41 deste diploma legal ter expressamente afastado a aplicação por inteiro daquela lei ao tipo descrito no art 129 9º do CP isso se deve ao fato de que as referidas leis possuem escopos diametralmente opostos Enquanto a Lei dos Juizados Especiais busca evitar o início do processo penal que poderá culminar em imposição de sanção ao agente a Lei Maria da Penha procura punir com maior rigor o agressor que age às escondidas nos lares pondo em risco a saúde de sua família 3 4 a Lei 113402006 procurou criar mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra as mulheres nos termos do 8º do art 226 e do art 227 ambos da CF1988 daí não se poder falar em representação quando a lesão corporal culposa ou dolosa simples atingir a mulher em casos de violência doméstica familiar ou íntima e ademais até a nova redação do 9º do art 129 do CP dada pelo art 44 da Lei 113402006 impondo pena máxima de três anos à lesão corporal leve qualificada praticada no âmbito familiar corrobora a proibição da utilização do procedimento dos Juizados Especiais afastando assim a exigência de representação da vítima O Supremo Tribunal Federal comunga deste entendimento Em seguida o Plenário por maioria julgou procedente ação direta proposta pelo ProcuradorGeral da República para atribuir interpretação conforme a Constituição aos artigos 12 I 16 e 41 todos da Lei 113402006 e assentar a natureza incondicionada da ação penal em caso de crime de lesão corporal praticado mediante violência doméstica e familiar contra a mulher No mérito evidenciouse que os dados estatísticos no tocante à violência doméstica seriam alarmantes visto que na maioria dos casos em que perpetrada lesão corporal de natureza leve a mulher acabaria por não representar ou por afastar a representação anteriormente formalizada A respeito o Min Ricardo Lewandowski advertiu que o fato ocorreria estatisticamente por vício de vontade da parte dela Apontouse que o agente por sua vez passaria a reiterar seu comportamento ou a agir de forma mais agressiva Afirmouse que sob o ponto de vista feminino a ameaça e as agressões físicas surgiriam na maioria dos casos em ambiente doméstico Seriam eventos decorrentes de dinâmicas privadas o que aprofundaria o problema já que acirraria a situação de invisibilidade social Registrou se a necessidade de intervenção estatal acerca do problema baseada na dignidade da pessoa humana CF art 1º III na igualdade CF art 5º I e na vedação a qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais CF art 5º XLI Reputouse que a legislação ordinária protetiva estaria em sintonia com a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra a Mulher e com a Convenção de Belém do Pará Sob o ângulo constitucional ressaltouse o dever do Estado de assegurar a assistência à família e de criar mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações Não seria razoável ou proporcional assim deixar a atuação estatal a critério da vítima A proteção à mulher esvaziarseia portanto no que admitido que verificada a agressão com lesão corporal leve pudesse ela depois de acionada a autoridade policial recuar e retratarse em audiência especificamente designada com essa finalidade fazendoo antes de recebida a denúncia Dessumiuse que deixar a mulher autora da representação decidir sobre o início da persecução penal significaria desconsiderar a assimetria de poder decorrente de relações históricoculturais bem como outros fatores tudo a contribuir para a diminuição de sua proteção e a prorrogar o quadro de violência discriminação e ofensa à dignidade humana Implicaria relevar os graves impactos emocionais impostos à vítima impedindoa de romper com o estado de submissão Entendeuse não ser aplicável aos crimes glosados pela lei discutida o que disposto na Lei 909995 de maneira que em se tratando de lesões corporais mesmo que de natureza leve ou culposa praticadas contra a mulher em âmbito doméstico a ação penal cabível seria pública incondicionada Acentuouse entretanto permanecer a necessidade de representação para crimes dispostos em leis diversas da 909995 como o de ameaça e os cometidos contra a dignidade sexual Consignouse que o Tribunal ao julgar o HC 106212MS DJe de 13062011 declarara em processo subjetivo a constitucionalidade do art 41 da Lei 113402006 no que afastaria a aplicação da Lei dos Juizados Especiais relativamente aos crimes cometidos com violência doméstica e familiar contra a mulher independentemente da pena prevista35 É também a posição consolidada na Súmula 542 do Superior Tribunal de Justiça A ação penal relativa ao crime de lesão corporal resultante de violência doméstica contra a mulher é pública incondicionada36 Há entretanto vozes cada vez mais raras no sentido de que os delitos de lesão corporal de natureza leve e lesão corporal culposa quando praticados com violência doméstica ou familiar contra a mulher subsistem como crimes de ação penal pública condicionada Fundamentam esse raciocínio no art 16 da Lei 113402006 Nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida de que trata esta Lei só será admitida a renúncia à representação perante o juiz em audiência especialmente designada com tal finalidade antes do recebimento da denúncia e ouvido o Ministério Público Para quem compartilha desta opinião tais crimes ainda são de ação penal pública condicionada pois em caso contrário não haveria razão para a lei falar em renúncia à representação 1 2 3 4 5 6 7 8 9 DEMERCIAN Pedro Henrique MALULY Jorge Assaf Curso de processo penal 3 ed Rio de Janeiro Forense 2005 p 8788 Para o STJ não há constrangimento na utilização do termo ação penal condenatória na denúncia apresentada pelo Ministério Público porque essa é a classificação dada à ação penal instaurada pelo Estado contra o acusado HC 88448DF rel Min Og Fernandes 6ª Turma j 06052010 noticiado no Informativo 433 O Código de Processo Civil prevê como condições da ação somente o interesse processual e a legitimidade para a causa JARDIM Afrânio Silva Ação penal pública princípio da obrigatoriedade 2 ed Rio de Janeiro Forense 1994 p 39 CAPEZ Fernando Curso de processo penal 13 ed São Paulo Saraiva 2006 p 113 RHC 121152BA rel Min Ricardo Lewandowski 2ª Turma j 11032014 É também o entendimento consolidado na Súmula 438 do Superior Tribunal de Justiça É inadmissível a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva com fundamento em pena hipotética independentemente da existência ou sorte do processo penal JARDIM Afrânio Silva Ação penal pública princípio da obrigatoriedade 2 ed Rio de Janeiro Forense 1994 p 36 A verificação da justa causa admite inclusive a utilização do reconhecimento fotográfico na fase policial Para embasar a denúncia oferecida é possível a utilização do reconhecimento fotográfico realizado na fase policial desde que este não seja utilizado de forma isolada e esteja em consonância com os demais elementos probatórios constantes dos autos STJ HC 238577SP rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 06122012 noticiado no Informativo 514 STJ RHC 27102RR rel Min Sebastião Reis Júnior rel p acórdão Min Rogério Schietti Cruz 6ª Turma j 13052014 e STJ RHC 42029RJ rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 26082014 a imputação penal desacompanhada de documentos hábeis a demonstrar ainda que de modo indiciário a autoria e a materialidade do crime destituída desse modo de base empírica idônea implica ausência de justa causa fato que nos termos do art 395 III do CPP desautoriza a instauração da persecutio criminis in iudicio STJ RHC 61822DF 10 11 12 13 14 15 16 17 18 rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 17122015 noticiado no Informativo 577 STF HC 122755PE rel Min Luiz Fux 1ª Turma j 19082014 e STJ HC 266462SP rel Min Laurita Vaz rel p acórdão Min Regina Helena Costa 5ª Turma j 25022014 Art 1º I a IV da Lei 81371990 Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo ou contribuição social e qualquer acessório mediante as seguintes condutas I omitir informação ou prestar declaração falsa às autoridades fazendárias II fraudar a fiscalização tributária inserindo elementos inexatos ou omitindo operação de qualquer natureza em documento ou livro exigido pela lei fiscal III falsificar ou alterar nota fiscal fatura duplicata nota de venda ou qualquer outro documento relativo à operação tributável IV elaborar distribuir fornecer emitir ou utilizar documento que saiba ou deva saber falso ou inexato É desnecessária contudo a juntada integral do Procedimento Administrativo Fiscal correspondente STJ RHC 94288RJ rel Min Reynaldo Soares da Fonseca 5ª Turma j 22052018 noticiado no Informativo 627 RHC 35180RS rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 01042014 Este princípio também incide no tocante à ação penal privada ajuizada pela Defensoria Pública HC 104356RJ rel Min Ricardo Lewandowski 1ª Turma j 19102010 noticiado no Informativo 605 O STJ compartilha deste entendimento HC 224246DF rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 25022014 STJ HC 237168SP rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 08042014 Inq 2245MG rel Min Joaquim Barbosa Tribunal Pleno j 28082007 O STJ também já decidiu nesse sentido Não vigora o princípio da indivisibilidade na ação penal pública O Parquet é livre para formar sua convicção incluindo na increpação as pessoas que entenda terem praticados ilícitos penais ou seja mediante a constatação de indícios de autoria e materialidade não se podendo falar em arquivamento implícito em relação a quem não foi denunciado STJ RHC 34233SP rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 06052014 TORNAGUI Hélio Curso de processo penal 5 ed São Paulo Saraiva 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 31 1988 v 1 p 44 Apud DEMERCIAN Pedro Henrique MALULY Jorge Assad Op cit p 116 CAPEZ Fernando Curso de processo penal 13 ed São Paulo Saraiva 2006 p 121 TOURINHO FILHO Fernando da Costa Manual de processo penal 8 ed São Paulo Saraiva 2006 p 296302 MIRABETE Julio Fabbrini Processo penal 18 ed São Paulo Atlas 2007 p 9899 HC 88387MT rel Min Ricardo Lewandowski 1ª Turma j 10102006 É também a posição adotada pelo STJ A representação do ofendido condição de procedibilidade da ação penal pública condicionada prescinde de rigor formal sendo suficiente a demonstração inequívoca da parte interessada de que seja apurada e processada a infração penal RHC 42029RJ rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 26082014 HC 170030PR rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 28082012 A doutrina e a jurisprudência admitem a retração de retratação dentro do prazo decadencial STJ AgRg no REsp 1131357DF rel Min Sebastião Reis Júnior 6ª Turma j 05112013 RHC 116171SC rel Min Cármen Lúcia 2ª Turma j 03092013 No STJ HC 240678SP rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 03042014 ROMEIRO Jorge Alberto Da ação penal Rio de Janeiro Forense 1978 p 125 Inq 3256DF rel Min Roberto Barroso 1ª Turma j 02022016 noticiado no Informativo 813 No STJ APn 724DF rel Min Og Fernandes Corte Especial j 20082014 noticiada no Informativo 547 RHC 55142MG rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 12052015 noticiado no Informativo 562 Nos termos do artigo 45 do CPP a queixa poderá ser aditada pelo Ministério Público ainda que se trate de ação penal privativa do ofendido desde que não proceda à inclusão de coautor ou partícipe tampouco inove quanto aos fatos descritos hipóteses por sua vez inocorrentes na espécie STJ HC 85039SP rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 05032009 Essa posição é acolhida pelo STJ AgRg no RMS 27518SP rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 20022014 32 33 34 35 36 HC 175141MT rel Min Celso Limongi Desembargador convocado do TJSP 6ª Turma j 02122010 noticiado no Informativo 458 HC 259870ES rel Min Jorge Mussi 5ª Turma j 17122013 Súmula 600 do Superior Tribunal de Justiça Para configuração da violência doméstica e familiar prevista na Lei 113402006 Lei Maria da Penha não se exige coabitação entre autor e vítima ADI 4424DF rel Min Marco Aurélio Plenário j 09022012 noticiado no Informativo 654 Com igual orientação estatui a Súmula 536 do Superior Tribunal de Justiça A suspensão condicional do processo e a transação penal não se aplicam na hipótese de delitos sujeitos ao rito da Lei Maria da Penha Praticado um crime ou uma contravenção penal nasce automaticamente a punibilidade compreendida como a possibilidade jurídica de o Estado impor uma sanção penal ao responsável autor coautor ou partícipe pela infração penal A punibilidade consiste pois em consequência da infração penal Não é seu elemento razão pela qual o crime e a contravenção penal permanecem íntegros com a superveniência de causa extintiva da punibilidade Desaparece do mundo jurídico somente o poder punitivo estatal o Estado não pode mais punir nada obstante a existência concreta e inapagável de um ilícito penal Em hipóteses excepcionais entretanto a extinção da punibilidade elimina a própria infração penal Esse fenômeno somente é possível com a abolitio criminis e com a anistia pois os seus efeitos possuem força para rescindir inclusive eventual sentença penal condenatória De fato a abolitio criminis funciona como causa superveniente de extinção da tipicidade pois a nova lei torna atípico o fato até então incriminado De seu turno a anistia por ficção legal e por força de sua eficácia retroativa provoca a atipicidade temporária do fato cometido pelo agente resultando na exclusão da infração penal Isso se justifica pelo fato de tanto a abolitio criminis como a anistia serem veiculadas por meio de lei ordinária de igual natureza àquela que no passado instituiu o crime ou a contravenção penal Com efeito se uma lei criou a infração penal nada impede sejam os seus efeitos apagados por outra lei de igual hierarquia no universo jurídico a b c d e f g h i É unânime o entendimento doutrinário no sentido de ser exemplificativo o rol do art 107 do Código Penal o qual contém em seu interior algumas causas de extinção da punibilidade admitidas pelo Direito Penal brasileiro Em verdade diversas outras causas extintivas podem ser encontradas no Código Penal e na legislação especial destacandose término do período de prova sem revogação do sursis do livramento condicional e da suspensão condicional do processo Lei 90991995 art 89 escusas absolutórias CP arts 181 e 348 2º reparação do dano no peculato culposo efetivada antes do trânsito em julgado da sentença condenatória CP art 312 3º pagamento do tributo ou contribuição social nos crimes contra a ordem tributária Lei 106842003 art 9º 2º1 confissão espontânea e pagamento das contribuições importâncias ou valores e prestação das informações devidas à previdência social na forma definida em lei ou regulamento antes do início da ação fiscal nos crimes de apropriação indébita previdenciária e sonegação de contribuição previdenciária CP arts 168A 2º e 337A 1º e Lei 94301996 art 83 4º anulação do primeiro casamento em crime de bigamia CP art 235 2º conciliação efetuada em relação aos crimes contra a honra nos termos dos arts 520 a 522 do Código de Processo Penal morte do cônjuge ofendido no crime de induzimento a erro essencial e ocultação de impedimento CP art 236 por se tratar de ação penal privada personalíssima e cumprimento integral do acordo de leniência relativamente aos crimes contra a ordem econômica tipificados na Lei 81371990 Lei 125292011 art 87 parágrafo único A propósito nada impede a construção de causas supralegais não previstas em lei de extinção da punibilidade a exemplo daquela contida na Súmula 554 do Supremo Tribunal Federal O pagamento de cheque emitido sem provisão de fundos após o recebimento da denúncia não obsta ao prosseguimento da ação penal2 As causas de extinção da punibilidade podem alcançar a pretensão punitiva interesse do Estado em aplicar a sanção penal surge com a prática da infração penal ou a pretensão executória interesse do Estado em exigir o cumprimento de uma sanção penal já imposta nasce com o trânsito em julgado da condenação conforme ocorram antes ou depois do trânsito em julgado da sentença penal condenatória Quanto àquelas previstas no art 107 do Código Penal algumas causas extintivas atacam exclusivamente a pretensão punitiva São elas decadência perempção renúncia do direito de queixa perdão aceito retratação do agente e perdão judicial Por outro lado duas outras causas atingem apenas a pretensão executória indulto pelo texto da Lei de Execução Penal pois o STF como se verá admite o indulto antes do trânsito em julgado da condenação e graça Além disso o sursis e o livramento condicional previstos fora do art 107 do Código Penal afetam exclusivamente a pretensão executória em face do término do período de prova sem revogação Finalmente as causas de extinção da punibilidade remanescentes podem direcionarse tanto contra a pretensão punitiva como também contra a pretensão executória dependendo do momento em que ocorrerem isto é antes ou depois da condenação definitiva Incluemse nessa relação a morte do agente a anistia a abolitio criminis e a prescrição As causas de extinção da punibilidade que atingem a pretensão punitiva eliminam todos os efeitos penais de eventual sentença condenatória já proferida Destarte esse ato judicial não serve como pressuposto da reincidência nem pode ser usado como título executivo judicial na área cível Por sua vez as causas extintivas que afetam a pretensão executória salvo nas hipóteses de abolitio criminis e anistia apagam unicamente o efeito principal da condenação é dizer a pena Subsistem os efeitos secundários da sentença condenatória pressuposto da reincidência e constituição de título executivo judicial no campo civil Estabelece o art 108 do Código Penal A extinção da punibilidade de crime que é pressuposto elemento constitutivo ou circunstância agravante de outro não se estende a este Nos crimes conexos a extinção da punibilidade de um deles não impede quanto aos outros a agravação da pena resultante da conexão Crime acessório também denominado de crime de fusão ou parasitário é aquele cuja existência depende da prática anterior de outro crime chamado de principal A extinção da punibilidade do crime principal não se estende ao crime acessório Exemplo a lavagem de dinheiro Lei 96131998 art 1º será punível mesmo com a extinção da infração penal que permitiu a sua prática3 Crime complexo por sua vez é aquele que resulta da união de dois ou mais crimes A extinção da punibilidade da parte um dos crimes não alcança o todo crime complexo Exemplo eventual prescrição do roubo não importa na automática extinção da punibilidade do latrocínio Crime conexo finalmente é o praticado para assegurar a execução a ocultação a impunidade ou a vantagem de outro crime É o que se dá com o indivíduo que para vender drogas mata um policial que o investigava A ele serão imputados os crimes de homicídio qualificado pela conexão CP art 121 2º V em concurso material com o tráfico de drogas Lei 113432006 art 33 E de acordo com o art 108 do Código Penal ainda que ocorra a prescrição do tráfico de drogas subsiste no tocante ao homicídio a qualificadora da conexão No âmbito do princípio da consunção conflito aparente de normas penais a extinção da punibilidade do crimefim igualmente atinge o direito de punir do Estado em relação ao crimemeio Para o Superior Tribunal de Justiça No caso em que a falsidade ideológica tenha sido praticada com o fim exclusivo de proporcionar a realização do crime de descaminho a extinção da punibilidade quanto a este diante do pagamento do tributo devido impede que em razão daquela primeira conduta considerada de forma autônoma procedase à persecução penal do agente Isso porque nesse contexto exaurindose o crimemeio na prática do crime fim cuja punibilidade não mais persista falta justa causa para a persecução pelo crime de falso porquanto carente de autonomia4 Extinguese a punibilidade pela morte do agente art 107 I do CP Essa opção legislativa tem dois fundamentos 1 o princípio da personalidade da pena a pena não pode passar da pessoa do condenado CF art 5º XLV 1ª parte e 2 o brocardo de justiça pelo qual a morte tudo apaga mors omnia solvit Essa regra alcança todas as espécies de penas privativa de liberdade restritiva de direitos e multa além dos efeitos penais da sentença condenatória Excepcionamse porém por expressa disposição constitucional a obrigação de reparar o dano até os limites das forças da herança e a decretação do perdimento de bens E como bem observa Júlio Fabbrini Mirabete essa mesma regra se estende à pessoa jurídica podendo a obrigação ser transferida à sua sucessora5 relativamente aos crimes que podem por ela ser praticados Mas se a morte do agente ocorrer após o trânsito em julgado da condenação subsistem os efeitos secundários extrapenais autorizando a execução da sentença penal no juízo cível contra os seus herdeiros A expressão agente foi empregada em sentido amplo significando indiciado réu sentenciado condenado ou reeducando pois essa causa de extinção da punibilidade pode ocorrer em qualquer etapa da persecução penal ou seja da instauração do inquérito policial até o término da execução da pena Cuidase de causa personalíssima razão pela qual não se comunica aos demais coautores e partícipes que respondem normalmente pela infração penal O art 62 do Código de Processo Penal é claro ao exigir seja a prova da morte efetuada exclusivamente com a certidão de óbito Alguns doutrinadores tais como Nélson Hungria e Magalhães Noronha entendiam que a declaração judicial de ausência Código Civil art 6º ou da extrema probabilidade de morte de quem estava em perigo de vida ou prisioneiro ou desaparecido em campanha não encontrado até dois anos após o término da guerra Código Civil art 7º teria o mesmo efeito de extinção da punibilidade6 Essas propostas entretanto não têm amparo legal Com efeito em caso de morte do acusado o juiz somente à vista da certidão de óbito e depois de ouvido o Ministério Público declarará extinta a punibilidade CPP art 62 Discutese o que pode ser feito se com fundamento em certidão de óbito falsa foi declarada a extinção da punibilidade Surgiram dois posicionamentos distintos 1ª posição o réu pode ser processado somente pelo crime de falso pois o ordenamento jurídico brasileiro não contempla a revisão criminal pro societate É a posição dominante em sede doutrinária e 2ª posição poderá haver revogação da decisão judicial pois a declaração com falso fundamento não faria coisa julgada em sentido estrito Em verdade tratase de decisão judicial inexistente inidônea a produzir os efeitos inerentes à autoridade da coisa julgada Se não bastasse o sujeito não pode ser beneficiado pela sua própria torpeza e a formalidade não há de ser levada ao ponto de tornar imutável uma decisão lastreada em uma falsidade É a posição do Supremo Tribunal Federal7 e também do Superior Tribunal de Justiça8 Anistia graça e indulto são modalidades de indulgência soberana emanadas de órgãos estranhos ao Poder Judiciário que dispensam em determinadas hipóteses a total ou parcial incidência da lei penal Concretizam a renúncia do Estado ao direito de punir Embora advenham de órgãos alheios ao Poder Judiciário a anistia a graça e o indulto somente acarretam na extinção da punibilidade de seu destinatário após acolhimento por decisão judicial Essas causas extintivas da punibilidade têm lugar em crimes de ação penal pública incondicionada e condicionada e de ação penal privada De fato nesses últimos o Estado transferiu ao particular unicamente a titularidade para iniciativa da ação penal mantendo sob seu controle o direito de punir capaz de ser renunciado pelos institutos ora em análise Anistia é a exclusão por lei ordinária com efeitos retroativos de um ou mais fatos criminosos do campo de incidência do Direito Penal A clemência estatal é concedida por lei ordinária editada pelo Congresso Nacional CF arts 21 XVII e 48 VIII9 A iniciativa do projeto de lei visando a concessão de anistia é livre ao contrário do que ocorria na Constituição anterior em que o art 57 VI reservava a iniciativa ao Presidente da República quando se tratasse de crimes políticos A competência da União para concessão de anistia abrange somente as infrações penais10 Essa causa de extinção da punibilidade destinase em regra a crimes políticos anistia especial abrangendo excepcionalmente crimes comuns11 Abrange fatos e não indivíduos embora possam ser impostas condições específicas ao réu ou condenado anistia condicionada E concedida a anistia o juiz de ofício a requerimento do interessado ou do Ministério Público por proposta da autoridade administrativa ou do Conselho Penitenciário declarará extinta a punibilidade LEP art 187 É exemplo de anistia o determinado pelo art 1º da Lei 66831979 pelo qual foi concedida anistia a todos que no período compreendido entre 2 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979 cometeram crimes políticos ou conexos com estes crimes eleitorais aos que tiveram seus direitos políticos suspensos e aos servidores da Administração Direta e Indireta de fundações vinculadas ao poder público aos servidores dos Poderes Legislativo e Judiciário aos Militares e aos dirigentes e representantes sindicais punidos com fundamento em Atos Institucionais e Complementares Vejase portanto que a anistia abrangeu todos aqueles que praticaram crimes políticos ou conexos no período mencionado sem qualquer alusão a pessoa determinada O que importa na anistia é o fato e não seu destinatário Dividese em própria quando concedida anteriormente à condenação e imprópria na hipótese em que sua concessão operase após a sentença condenatória Pode ser também condicionada ou incondicionada conforme esteja ou não sujeita a condições para sua aceitação A anistia tem efeitos ex tunc isto é para o passado apagando todos os efeitos penais Rescinde até mesmo a condenação Portanto se no futuro o agente praticar nova infração penal não será atingido pela reincidência em face da ausência do seu pressuposto Permanecem íntegros entretanto os efeitos civis da sentença condenatória que por esse motivo subsiste como título executivo judicial no campo civil A decisão judicial que reconhece a anistia e declara a extinção da punibilidade deve ser lançada pelo magistrado que conduz a ação penal Se todavia a ação penal estiver no tribunal em grau recursal ou por se tratar de processo de sua competência originária compete a ele a declaração da extinção da punibilidade Por último se a lei concessiva da anistia entrar em vigor depois do trânsito em julgado da condenação será competente o juízo da execução para a declaração da extinção da punibilidade LEP art 66 III e Súmula 611 do STF A anistia pode ser ainda geral ou absoluta quando concedida em termos gerais ou parcial ou relativa na hipótese em que faz exceções entre crimes ou pessoas A causa extintiva apenas pode ser recusada por seu destinatário quando condicionada isto é vinculada ao cumprimento de determinadas condições Os crimes hediondos e os delitos a estes equiparados são incompatíveis com a anistia em face da regra contida no art 5º XLIII da Constituição Federal a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins o terrorismo e os definidos como crimes hediondos por eles respondendo os mandantes os executores e os que podendo evitálos se omitirem Esse mandamento constitucional foi regulamentado pelos arts 2º I da Lei 80721990 crimes hediondos pelo art 1º 6º da Lei 94551997 tortura e pelo art 44 caput da Lei 113432006 tráfico de drogas A graça tem por objeto crimes comuns com sentença condenatória transitada em julgado visando o benefício de pessoa determinada por meio da extinção ou comutação da pena imposta É também denominada inclusive pela Lei de Execução Penal de indulto individual Em regra depende de provocação da parte interessada De fato o indulto individual poderá ser provocado por petição do condenado por iniciativa do Ministério Público do Conselho Penitenciário ou da autoridade administrativa LEP art 188 A petição acompanhada dos documentos que a instruírem será entregue ao Conselho Penitenciário para a elaboração de parecer e posterior encaminhamento ao Ministério da Justiça LEP art 189 A graça é ato privativo e discricionário do Presidente da República CF art 84 XII desde que respeitas as vedações impostas pelo sistema constitucional e passível de delegação aos Ministros de Estado ao ProcuradorGeral da República ou ao AdvogadoGeral da União CF art 84 parágrafo único Alcança apenas o cumprimento da pena na forma realçada pelo decreto presidencial restando íntegros os efeitos penais secundários e também os efeitos de natureza civil Classificase como plena quando importa em extinção da pena imposta ao condenado ou parcial quando acarreta em diminuição ou comutação da pena A graça normalmente não poderá ser recusada salvo quando proposta comutação de pena CPP art 739 ou submetida a condições para sua concessão E uma vez concedida a graça ou indulto individual e anexada aos autos cópia do decreto o juiz declarará extinta a punibilidade ou ajustará a execução aos termos do decreto em caso de comutação da pena LEP art 192 A Constituição Federal em seu art 5º XLIII considera insuscetíveis de graça a prática de tortura o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins o terrorismo e os crimes definidos como hediondos Essa regra foi regulamentada pelos arts 2º I da Lei 80721990 crimes hediondos pelo art 1º 6º da Lei 94551997 tortura e pelo art 44 caput da Lei 113432006 tráfico de drogas O indulto propriamente dito ou indulto coletivo é modalidade de clemência concedida espontaneamente pelo Presidente da República a todo o grupo de condenados que preencherem os requisitos apontados pelo decreto Embora essa seja a regra não se faz necessário o trânsito em julgado da sentença condenatória para sua concessão12 O indulto leva em consideração a duração da pena aplicada bem como o preenchimento de determinados requisitos subjetivos exemplo primariedade e objetivos exemplo cumprimento de parte da pena13 Pode também ser total quando há extinção da pena ou parcial diminuição ou comutação de penas incondicionado ou condicionado caso em que poderá ser recusado No indulto total extinguemse as sanções penais mencionadas no decreto presidencial subsistindo os demais efeitos penais ou extrapenais não abarcados pelo benefício14 Na comutação de penas não se pode falar propriamente em extinção da punibilidade mas somente em transformação da pena em outra de menor gravidade Na diminuição de pena por sua vez há extinção da punibilidade só em relação ao quantum perdoado15 A Lei de Crimes Hediondos Lei 80721990 em seu art 2º I vedou a concessão de indulto para crimes hediondos prática de tortura tráfico de drogas e terrorismo Igual vedação é atualmente prevista no art 44 caput da Lei 113432006 no tocante ao tráfico de drogas E como a Constituição Federal proibiu expressamente apenas a concessão de graça ou anistia para os crimes mencionados no art 5º XLIII surgiram dois posicionamentos acerca da proibição legal 1ª posição a regra é inconstitucional por abranger hipótese não prevista no texto constitucional e 2ª posição a regra é constitucional pois a graça seria gênero do qual o indulto é espécie É a atual posição do Supremo Tribunal Federal É constitucional o art 2º I da L 807290 porque nele a menção ao indulto é meramente expletiva da proibição de graça aos condenados por crimes hediondos ditada pelo art 5º XLIII da Constituição Na Constituição a graça individual e o indulto coletivo que ambos tanto podem ser totais ou parciais substantivando nessa última hipótese a comutação de pena são modalidades do poder de graça do Presidente da República art 84 XII que no entanto sofre a restrição do art 5º XLIII para excluir a possibilidade de sua concessão quando se trata de condenação por crime hediondo16 A natureza dos crimes abrangidos pelo indulto deve ser analisada à época da sua prática e não no momento da concessão do benefício17 Exemplificativamente se quando cometido o delito não era hediondo e depois passou a ostentar esta característica em tese será cabível o indulto Tal como na graça o indulto coletivo é o ato que se insere na atividade privativa e discricionária do Presidente da República que poderá optar pela concessão de benefício a determinados crimes e não a outros por critérios razoáveis de política criminal Como já decidido pelo Supremo Tribunal Federal O indulto é instrumento de política criminal de que dispõe o Chefe do Poder Executivo configurando o seu emprego típica sanção premial decisão esta sujeita a critérios de conveniência e oportunidade a ser empreendida sob a ótica da prevenção criminal18 Cumpre também destacar o teor da Súmula 535 do Superior Tribunal de Justiça A prática de falta grave não interrompe o prazo para fim de comutação de pena ou indulto De fato não basta a prática da falta grave para que ocorra automaticamente a interrupção do prazo É preciso analisar no caso concreto o cumprimento dos requisitos previstos no decreto presidencial pelo qual foram instituídos o indulto ou a comutação da pena Finalmente convém observar a incidência do indulto não só às penas mas também às medidas de segurança Na dicção do Supremo Tribunal Federal Revestese de legitimidade jurídica a concessão pelo presidente da República do benefício constitucional do indulto CF art 84 XII que traduz expressão do poder de graça do Estado mesmo se se tratar de indulgência destinada a favorecer pessoa que em razão de sua inimputabilidade ou semiimputabilidade sofre medida de segurança ainda que de caráter pessoal e detentivo Essa a conclusão do Plenário que negou provimento a recurso extraordinário em que discutida a possibilidade de extensão de indulto a internados em cumprimento de medida de segurança O Colegiado assinalou que a competência privativa do presidente da República prevista no art 84 XII da CF abrange a medida de segurança espécie de sanção penal inexistindo restrição à concessão de indulto Embora não seja pena em sentido estrito é medida de natureza penal e ajustase ao preceito cuja interpretação deveria ser ontológica Lembrou o HC 84219SP DJU de 2392005 em que o período máximo da medida de segurança fora limitado a 30 anos mediante interpretação sistemática e teleológica dos artigos 75 e 97 do CP e 183 da LEP Fora reconhecida na ocasião a feição penal da medida de segurança a implicar restrição coercitiva da liberdade Em reforço a esse entendimento sublinhou o art 171 da LEP a condicionar a execução da sentença ao trânsito em julgado bem assim o art 397 II do CPP a proibir a absolvição sumária imprópria em observância ao princípio da não culpabilidade CF art 5º LVII19 1ª 2ª 3ª É a nova lei que exclui do âmbito do Direito Penal um fato até então considerado criminoso Encontra previsão legal no art 2º caput do Código Penal e tem natureza jurídica de causa de extinção da punibilidade art 107 III Alcança a execução e os efeitos penais da sentença condenatória não servindo como pressuposto da reincidência nem configurando maus antecedentes Sobrevivem entretanto os efeitos civis de eventual condenação isto é a obrigação de reparar o dano provocado pela infração penal e a constituição de título executivo judicial Questão normalmente abordada em concursos públicos é a seguinte Qual é o juízo competente para aplicar a abolitio criminis A resposta é simples Guarde o seguinte raciocínio a lei será sempre aplicada pelo órgão do Poder Judiciário em que a ação penal estiver em trâmite Extraemse as seguintes ilações Em se tratando de inquérito policial ou de ação penal que se encontre em 1º grau de jurisdição ao juiz natural compete a aplicação da lei mais favorável Exemplo crime praticado na comarca de São Paulo com inquérito policial distribuído e ação penal ajuizada na 10ª Vara Criminal O juiz de Direito responsável por esta Vara deverá aplicar a lei mais favorável No caso de ação penal em grau de recurso ou ainda na hipótese de crime de competência originária dos Tribunais tal mister será reservado ao Tribunal respectivo Se a condenação já tiver sido alcançada pelo trânsito em julgado a competência será do juízo da Vara das Execuções Criminais É o que se extrai do art 66 I da Lei de Execução Penal e da Súmula 611 do Supremo Tribunal Federal20 Em face de sua amplitude será analisada no capítulo seguinte A decadência é a perda do direito de queixa ou de representação em face da inércia de seu titular durante o prazo legalmente previsto O prazo salvo disposição legal em contrário é de 6 seis meses independentemente do número de dias de cada mês21 contados do dia em que o ofendido veio a saber quem é o autor do crime ou no caso de ação penal privada subsidiária da pública do dia em que se esgota o prazo para oferecimento da denúncia CP art 103 Esse prazo é contado a partir do conhecimento inequívoco da autoria e não de meras suspeitas22 A contagem do prazo obedece aos ditames do art 10 do Código Penal pois possui índole penal Logo em caso de dúvida acerca do decurso ou não do prazo legal a decadência não pode ser reconhecida O prazo decadencial é para o oferecimento da queixacrime e não para o seu recebimento pelo Poder Judiciário e no caso de ser ela antecedida por inquérito policial pedido de providências deve o prazo ser apurado a partir da conclusão oficial deste procedimento preparatório se somente nesse momento foi apurada a autoria da infração penal23 O prazo decadencial é preclusivo e improrrogável e não se submete em face de sua própria natureza jurídica à incidência de quaisquer causas de interrupção e suspensão24 No caso de crime continuado o prazo decadencial é contado separadamente para cada delito parcelar De fato a ficção jurídica de unidade de crime tem lugar exclusivamente para fins de aplicação da pena E no crime habitual tal prazo deve ser computado a partir do último fato praticado pelo agente São nítidas as diferenças entre a decadência e a prescrição Vejamos o gráfico esquemático É a perda do direito de ação que acarreta na extinção da punibilidade provocada pela inércia processual do querelante25 A perempção não é aplicável na ação penal privada subsidiária da pública uma vez que nessa hipótese o Ministério Público dará andamento à ação na hipótese de omissão ou desídia do querelante26 As causas de perempção foram previstas no art 60 do Código de Processo Penal Art 60 Nos casos em que somente se procede mediante queixa considerarseá perempta a ação penal I quando iniciada esta o querelante deixar de promover o andamento do processo durante 30 trinta dias seguidos II quando falecendo o querelante ou sobrevindo sua incapacidade não comparecer em juízo para prosseguir no processo dentro do prazo de 60 dias qualquer das pessoas a quem couber fazêlo ressalvado o disposto no art 36 III quando o querelante deixar de comparecer sem motivo justificado a qualquer ato do processo a que deva estar presente ou deixar de formular o pedido de condenação nas alegações finais IV quando sendo o querelante pessoa jurídica esta se extinguir sem deixar sucessor Pelo texto legal notase ser a perempção sanção que somente pode ser imposta após a propositura da queixa Com efeito fala o Código de Processo Penal em início da ação penal atos do processo etc27 Na primeira hipótese inc I se faz necessária a regular intimação do querelante para o ato processual Se ainda assim não se manifestar no prazo legal de 30 dias será declarada a extinção da punibilidade pela perempção28 Exemplo o querelante deixa de nomear novo advogado apesar de devidamente intimado da renúncia do patrono antecessor Há perempção ainda no caso de falecimento ou incapacidade do querelante quando as pessoas determinadas pela lei não comparecerem em juízo para prosseguimento do feito inc II No caso de morte o direito de prosseguir na ação passará ao cônjuge ascendente descendente ou irmão CPP art 31 No caso de interdição ao curador O inciso III do art 60 prevê a ocorrência de perempção quando o querelante a deixar de comparecer sem motivo justificado a qualquer ato do processo e b nas alegações finais deixar de formular pedido de condenação A presença do querelante deve ser necessária para a prática do ato processual Assim não se faz obrigatório o seu comparecimento na audiência preliminar tanto por ser ato anterior ao recebimento ou rejeição da queixacrime quanto pelo fato de se tratar de mera faculdade conferida às partes29 Também não se dá a perempção pela ausência do querelante na audiência prevista no art 520 do Código de Processo Penal30 O ato processual a ser praticado portanto deve demandar a participação pessoal do querelante não havendo perempção se nos demais atos ele se fizer representar por seu procurador Não pode ser declarada a extinção da punibilidade da mesma forma se a ausência for justificada A declaração de perempção só pode ocorrer se o querelante for intimado para o ato a ser praticado Portanto nos casos de audiência realizada por carta precatória em virtude da desnecessidade de intimação não pode ser considerada perempta a ação pela ausência do querelante ou seu defensor31 A falta de pedido de condenação nas alegações finais atuais memoriais é igualmente hipótese de perempção inc III 2ª parte Esse fenômeno não tem lugar na ação penal pública pois o magistrado pode proferir sentença condenatória mesmo com pedido de absolvição do Ministério Público CPP art 385 Não é preciso que o querelante manifeste expressamente o pedido de condenação bastando que dos seus termos possa extrairse esse propósito Nesse contexto os pedidos de procedência da ação penal ou de aplicação da pena são suficientes para revelar tal vontade do ofendido A não apresentação de alegações finais no prazo legal equivale à falta de pedido de condenação desde que intimado o querelante para o ato Essa regra nada obstante a manutenção do texto do art 60 inc III do Código de Processo Penal reclama interpretação em sintonia com as modificações introduzidas pela Lei 117192008 Com efeito a partir de então as alegações finais tanto da acusação como da defesa são lançadas oralmente em audiência Mas o juiz poderá considerada a complexidade do caso ou o número de acusados conceder às partes o prazo de 5 cinco dias sucessivamente para apresentação de memoriais CPP art 403 caput e 3 Por último a ação penal é considerada perempta quando o querelante pessoa jurídica se extinguir sem deixar sucessor CPP art 60 inc IV Se houver sucessor procederseá na forma prevista no art 60 inc II do Código de Processo Penal exigindose habilitação no prazo legal para prosseguimento da lide sob pena de perempção Além das hipóteses legais também pode ser considerada perempta a ação penal com a morte do querelante na ação penal privada personalíssima O único exemplo vigente é possível no crime tipificado pelo art 236 do Código Penal induzimento a erro essencial e ocultação de impedimento Em caso de pluralidade de querelantes a perempção somente atingirá o desidioso persistindo a ação penal no tocante aos demais A renúncia é ato unilateral pelo qual se efetua a desistência do direito de ação pela vítima Nos termos do art 104 caput do Código Penal O direito de queixa não pode ser exercido quando renunciado expressa ou tacitamente A renúncia pode ocorrer na ação penal exclusivamente privada mas não na subsidiária da pública pois se o ofendido deixar de oferecer queixa o Ministério Público poderá iniciar a ação penal enquanto não extinta a punibilidade do agente pela prescrição ou por qualquer outra causa A renúncia expressa constará de declaração assinada pelo ofendido por seu representante legal ou procurador com poderes especiais CPP art 50 caput De seu turno a renúncia tácita ao direito de queixa resulta da prática de ato incompatível com a vontade de exercêlo que admitirá todos os meios de prova CP art 104 parágrafo único e CPP art 57 Não acarreta em renúncia tácita todavia o fato de receber o ofendido a indenização do dano causado pelo crime CP art 104 parágrafo único Na hipótese porém da Lei 90991995 tratandose de ação penal de iniciativa privada ou de ação pública condicionada à representação o acordo entre ofensor e ofendido homologado em juízo acarreta a renúncia ao direito de queixa ou representação art 74 parágrafo único Portanto nos crimes de iniciativa privada e pública condicionada à representação de competência dos Juizados Especiais a composição civil extingue a punibilidade do autor do fato32 Nos termos do art 49 do Código de Processo Penal a renúncia ao exercício do direito de queixa em relação a um dos autores do crime a todos se estenderá Como já decidiu o Supremo Tribunal Federal tratandose de ação penal privada o oferecimento de queixacrime somente contra um ou alguns dos supostos autores ou partícipes da prática delituosa com exclusão dos demais envolvidos configura hipótese de violação ao princípio da indivisibilidade CPP art 48 implicando por isso mesmo em renúncia tácita ao direito de querela CPP art 49 cuja eficácia extintiva da punibilidade estendese a todos quantos alegadamente hajam intervindo no suposto cometimento da infração penal CP art 107 V cc o art 10433 A renúncia apenas pode ser exercida antes do oferecimento da queixa De fato depois do início da ação penal poderão ocorrer outras formas de extinção da punibilidade tais como a perempção ou o perdão do ofendido Na linha da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça A renúncia a que alude o art 104 do CP diz respeito ao direito de queixa não influindo no prosseguimento da ação penal já promovida Então oferecida a queixacrime não é mais cabível a renúncia porque não há mais nada a renunciar A pretensão do querelante de obstar o prosseguimento da ação penal pode ser acolhida pelo perdão do ofendido arts 105 e 106 do CP a depender contudo da aceitação do querelado34 No caso de morte da vítima o direito de oferecer queixa passará ao cônjuge ascendente descendente ou irmão CPP art 31 E a renúncia por parte de um dos colegitimados não impedirá o exercício da ação penal privada pelos outros De igual modo em caso de crime com duas ou mais vítimas a renúncia de uma delas não obsta o direito de queixa pelas demais O perdão do ofendido é a desistência manifestada após o oferecimento da queixa impeditiva do prosseguimento da ação CP art 105 Portanto seja ele expresso ou tácito somente constituise em causa de extinção da punibilidade nos crimes que se apuram exclusivamente por ação penal privada35 O perdão pode ocorrer a qualquer momento depois do início da ação penal privada até o trânsito em julgado da sentença condenatória CP art 106 2º De acordo com o art 106 do Código Penal Art 106 O perdão no processo ou fora dele36 expresso ou tácito I se concedido a qualquer dos querelados a todos aproveita II se concedido por um dos ofendidos não prejudica o direito dos outros III se o querelado o recusa não produz efeitos Perdão tácito é o que resulta da prática de ato incompatível com a vontade de prosseguir na ação CP art 106 1º e admitirá todos os meios de prova CPP art 57 A concessão do perdão pode ser feita pelo ofendido ou por seu representante legal quando menor de 18 anos ou incapaz encontrandose tacitamente revogado pelo novo Código Civil o disposto pelo art 52 do Código de Processo Penal Se o querelante for menor de 21 e maior de 18 anos o direito de perdão poderá ser exercido por ele ou por seu representante legal mas o perdão concedido por um havendo oposição do outro não produzirá efeito Por se tratar de ato bilateral o perdão depende da aceitação do querelado pois a ele pode ser interessante provar a sua inocência O perdão concedido a um dos querelados aproveitará a todos sem que produza todavia efeito em relação ao que o recusar CPP art 51 No perdão o querelado será intimado a dizer dentro de três dias se o aceita devendo ao mesmo tempo ser cientificado de que o seu silêncio importará em anuência Aceito o perdão expressa ou tacitamente o juiz julgará extinta a punibilidade CPP art 58 caput e parágrafo único O perdão referese a cada crime individualmente considerado Consequentemente nada impede o posterior oferecimento de queixa em caso de reiteração da infração penal pelo perdoado Finalmente se concedido o perdão por um ou alguns dos ofendidos isso não prejudicará o direito das demais vítimas em prosseguir com a ação penal Retratarse é desdizerse confessar que errou revelando o arrependimento do responsável pela infração penal Tem cabimento como causa de extinção da punibilidade apenas nos casos em que a lei a admite CP art 107 VI É o que ocorre exemplificativamente quando o querelado antes da sentença se retrata cabalmente da calúnia ou da difamação CP art 143 Por esse motivo não extingue a punibilidade no crime de injúria pois nessa situação não foi expressamente prevista A retratação depende dos requisitos exigidos pelo dispositivo legal que a prevê Como já decidiu o Superior Tribunal de Justiça relativamente a tais crimes contra a honra A retratação para gerar a extinção da punibilidade do agente deve ser cabal ou seja completa inequívoca No caso em que a ofensa foi praticada mediante texto veiculado na internet o que potencializa o dano à honra do ofendido a exigência de publicidade da retratação revelase necessária para que esta cumpra a sua finalidade e alcance o efeito previsto na lei37 De igual modo o Código Penal admite a retratação no art 342 2º segundo o qual o fato deixa de ser punível se antes da sentença no processo em que ocorreu o ilícito o agente se retrata ou declara a verdade38 O inc VII do art 107 previa como causa de extinção da punibilidade o casamento do agente com a vítima nos crimes contra os costumes definidos nos Capítulos I II e III do Título IV da Parte Especial do Código Penal O inc VIII trazia como causa de extinção da punibilidade o casamento da vítima com terceiro nos crimes referidos no inciso anterior se cometidos sem violência real ou grave ameaça e desde que a ofendida não requeresse o prosseguimento do inquérito policial ou da ação penal no prazo de 60 dias a contar da celebração a b c d e f g Perdão judicial é o ato exclusivo de membro do Poder Judiciário que na sentença deixa de aplicar a pena ao réu em face da presença de requisitos legalmente exigidos Somente pode ser concedido nos casos expressamente previstos em lei CP art 107 inc IX É vedada a sua aplicação a delito para o qual a lei não prevê a extensão do benefício39 O perdão judicial em regra é aplicável aos crimes culposos Entretanto também tem incidência a crimes dolosos dependendo apenas da vontade do legislador Vejamos alguns casos em que foi previsto art 121 5º do Código Penal na hipótese de homicídio culposo o juiz poderá deixar de aplicar a pena se as consequências da infração atingirem o próprio agente de forma tão grave que a sanção penal se torne desnecessária art 129 8º do Código Penal aplicase à lesão corporal culposa o disposto no art 121 5º art 140 1º do Código Penal no tocante ao crime de injúria o juiz pode deixar de aplicar a pena I quando o ofendido de forma reprovável provocou diretamente a injúria II no caso de retorsão imediata que consista em outra injúria art 180 5º do Código Penal relativamente à receptação culposa na hipótese do 3º se o criminoso é primário pode o juiz tendo em consideração as circunstâncias deixar de aplicar a pena art 8º da Lei das Contravenções Penais no caso de ignorância ou errada compreensão da lei quando escusáveis a pena pode deixar de ser aplicada art 39 2º da Lei das Contravenções Penais na conduta de participar de associações secretas mas com fins lícitos o juiz pode deixar de aplicar a pena art 29 2º da Lei 96051998 Lei dos Crimes Ambientais no caso de guarda doméstica de espécie silvestre não considerada ameaçada de extinção pode o juiz considerando as circunstâncias h deixar de aplicar a pena art 13 da Lei 98071999 Poderá o juiz de ofício ou a requerimento das partes conceder o perdão judicial e a consequente extinção da punibilidade ao acusado que sendo primário tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e o processo criminal desde que dessa colaboração tenha resultado I a identificação dos demais coautores ou partícipes da ação criminosa II a localização da vítima com a sua integridade física preservada III a recuperação total ou parcial do produto do crime No tocante ao homicídio e lesão culposos cometidos na direção de veículo automotor o Código de Trânsito não prevê o perdão judicial É imperativa contudo a aplicação analógica do 5º do art 121 e do 8º do art 129 ambos do Código Penal que são normas de caráter geral CP art 12 justificativa que restou bem delineada com o veto do Presidente da República ao dispositivo legal que previa o perdão judicial em tais crimes do Código de Trânsito Brasileiro40 O perdão judicial é causa extintiva da punibilidade CP art 107 inc IX e consubstanciase em direito público subjetivo razão pela qual o magistrado deve concedêlo ao réu quando presentes os requisitos exigidos em lei Em síntese o juiz possui discricionariedade para verificar a presença dos requisitos legais mas se considerálos existentes a aplicação do perdão judicial é obrigatória A jurisprudência tem conferido amplo alcance ao perdão judicial permitindo sua aplicação quando as consequências da infração atingirem de forma física ou moral o próprio agente seus familiares noiva amigos íntimos etc Em qualquer caso porém é imprescindível o vínculo familiar ou afetivo entre o autor e a vítima do crime Nas lições do Superior Tribunal de Justiça O perdão judicial não pode ser concedido ao agente de homicídio culposo na direção de veículo automotor art 302 do CTB que embora atingido moralmente de forma grave pelas consequências do acidente não tinha vínculo afetivo com a vítima nem sofreu sequelas físicas gravíssimas e permanentes Conquanto o perdão judicial possa ser aplicado nos casos em que o agente de homicídio culposo sofra sequelas físicas gravíssimas e permanentes a doutrina quando se volta para o sofrimento psicológico do agente enxerga no 5º do art 121 do CP a exigência de um laço prévio entre os envolvidos para reconhecer como tão grave a forma como as consequências da infração atingiram o agente A interpretação dada na maior parte das vezes é no sentido de que só sofre intensamente o réu que de forma culposa matou alguém conhecido e com quem mantinha laços afetivos O exemplo mais comumente lançado é o caso de um pai que mata culposamente o filho Essa interpretação desdobrase em um norte que ampara o julgador Entender pela desnecessidade do vínculo seria abrir uma fenda na lei não desejada pelo legislador Isso porque além de ser de difícil aferição o tão grave sofrimento o argumento da desnecessidade do vínculo serviria para todo e qualquer caso de delito de trânsito com vítima fatal Isso não significa dizer o que a lei não disse mas apenas conferirlhe interpretação mais razoável e humana sem perder de vista o desgaste emocional que possa sofrer o acusado dessa espécie de delito mesmo que não conhecendo a vítima A solidarização com o choque psicológico do agente não pode conduzir a uma eventual banalização do instituto do perdão judicial o que seria no mínimo temerário no atual cenário de violência no trânsito que tanto se tenta combater Como conclusão conforme entendimento doutrinário a desnecessidade da pena que esteia o perdão judicial deve a partir da nova ótica penal e constitucional referirse à comunicação para a comunidade de que o intenso e perene sofrimento do infrator não justifica o reforço de vigência da norma por meio da sanção penal41 Se a conduta do agente acarretou a produção de dois ou mais resultados o perdão judicial incidirá somente no tocante ao delito em que ficar comprovado o vínculo familiar ou afetivo entre ele e a vítima de modo a tornar evidente que as consequências do crime o atingiram de forma tão grave que a sanção penal se revela desnecessária Em outras palavras a caracterização do concurso formal mediante unidade de conduta e pluralidade de resultados não autoriza o reconhecimento automático do perdão judicial para todos os delitos Como já decidido pelo Superior Tribunal de Justiça O fato de os delitos haverem sido cometidos em concurso formal não autoriza a extensão dos efeitos do perdão judicial concedido para um dos crimes se não restou comprovado quanto ao outro a existência do liame subjetivo entre o infrator e a outra vítima fatal A matéria tratada nos autos consiste em averiguar a possibilidade de concessão do perdão judicial art 121 5º do CP a autor de crime culposo de trânsito que mediante uma única ação imprudente leva duas vítimas a óbito independentemente de haver prova de que mantivesse fortes vínculos afetivos com uma das vítimas fatais Sob esse prisma cumpre observar que quando a avaliação está voltada para o sofrimento psicológico do autor do crime a melhor doutrina enxerga no 5º do art 121 do CP a exigência de um vínculo de um laço prévio de conhecimento entre os envolvidos para que seja tão grave a consequência ao agente a ponto de ser despicienda e até exacerbada outra pena além da própria dor causada intimamente pelo dano provocado ao outro42 O perdão judicial constituise em condição subjetiva ou pessoal Consequentemente não se comunica aos demais envolvidos na empreitada criminosa De fato somente quem ostenta as condições legalmente exigidas pelo perdão judicial pode ser beneficiado com a extinção da punibilidade Imagine se exemplificativamente um homicídio culposo praticado na direção de veículo automotor No automóvel estavam o condutor seus dois filhos de pouca idade e terceira pessoa até então desconhecida a quem havia dado carona O motorista em excesso de velocidade é incentivado pelo carona a correr ainda mais Em face dessa imprudência perde a direção do veículo que capota resultando na morte das duas crianças Os adultos sobrevivem Nessa situação o perdão judicial se cabível incidirá somente em relação ao motorista pois apenas ele suportou as graves consequências do crime de modo a tornar desnecessária a aplicação da pena O perdão judicial somente pode ser concedido pelo Poder Judiciário na sentença ou no acórdão em grau recursal ou em ações penais de competência originária dos tribunais Com base nessa premissa discutese a natureza jurídica da sentença lato sensu concessiva do perdão judicial Há três posições sobre o assunto 1ª posição Condenatória Foi defendida pelo Supremo Tribunal Federal antes da reforma da Parte Geral pela Lei 72091984 e subsistiu após a entrada em vigor do citado diploma legal até a promulgação da atual Constituição Federal Deveras naquele período o STF apreciava e julgava questões infraconstitucionais e firmou o entendimento de que somente se perdoa quem errou isto é quem cometeu uma infração penal Portanto o magistrado deve condenar o réu e posteriormente conceder o perdão judicial deixando de aplicar a pena43 Atualmente quem defende essa posição o faz com amparo no art 120 do Código Penal o qual dispõe expressamente que a sentença concessiva de perdão judicial não prevalece para efeito de reincidência Seria uma condenação com todos os seus efeitos exceto para fins de recidiva 2ª posição Absolutória Fundase no fato de não existir condenação sem aplicação de pena Desse modo como há sentença sem imposição de sanção penal seria inevitavelmente de cunho absolutório Essa corrente falha em uma questão terminológica somente se perdoa quem errou Quem deve ser absolvido não depende de perdão Além disso a sentença concessiva do perdão judicial não se enquadra no art 386 do Código de Processo Penal responsável pela previsão das hipóteses de absolvição na justiça penal brasileira 3ª posição Declaratória da extinção da punibilidade O juiz reconhece a prática de um fato típico e ilícito bem como a culpabilidade do réu mas por questões de política criminal reforçadas pela lei deixa de aplicar a pena A sentença não pode ser condenatória pois é impossível falarse em condenação sem pena E também não pode ser absolutória já que um inocente que deve ser absolvido não precisa clamar por perdão Resta assim uma única saída a sentença é declaratória da extinção da punibilidade O juiz não condena nem absolve Em se tratando de crime que a admite e presentes os requisitos legais o magistrado limitase a declarar a ocorrência da causa extintiva da punibilidade Essa posição foi consagrada pela Súmula 18 do Superior Tribunal de Justiça A sentença concessiva do perdão judicial é declaratória de extinção da punibilidade não subsistindo qualquer efeito condenatório Contudo existem autores que sustentam a aplicação do perdão judicial a qualquer tempo amparados no art 61 caput do Código de Processo Penal por se tratar de causa de extinção da punibilidade44 Não concordamos com esse entendimento uma vez que o perdão judicial somente se justifica quando o réu deveria ser condenado há prova da autoria e da materialidade do fato mas a lei autoriza o juiz a declarar a extinção da punibilidade Além disso a prova segura do seu cabimento somente pode ser produzida durante a instrução criminal em juízo sob o crivo do contraditório De qualquer modo a decisão que concede o perdão judicial sempre é declaratória da extinção da punibilidade independentemente da posição que se adote acerca do momento em que pode ser reconhecido Em ambos o fato é típico e ilícito e o agente possui culpabilidade Subsiste a infração penal operandose exclusivamente a extinção da punibilidade Em suma há um crime ou contravenção penal e o seu responsável deve submeterse ao juízo de reprovabilidade mas o Estado está impedido de punir Além disso tanto o perdão judicial como as escusas absolutórias são condições subjetivas ou pessoais incomunicáveis aos demais coautores e partícipes da infração penal Nada obstante tais semelhanças os institutos não se confundem O perdão judicial somente pode ser concedido na sentença ou no acórdão depois de cumprido o devido processo legal Por sua vez as escusas absolutórias CP arts 181 e 348 2º impedem a instauração da persecução penal Sequer existe inquérito policial Com efeito as escusas absolutórias se justificam por questões objetivas provadas de imediato Exemplo relação de parentesco na linha reta De outro lado o perdão judicial reclama o regular trâmite da ação penal para provar se estão ou não presentes os requisitos legalmente exigidos Exemplificativamente somente com o término da instrução criminal será possível concluir se em um homicídio culposo praticado por um homem contra sua esposa as consequências do crime foram tão graves de modo a tornar dispensável a aplicação da pena O viúvo pode ter ficado profundamente abalado e até mesmo com depressão hipótese em que será pertinente o perdão judicial mas é possível também que logo após a morte tenha se casado com outra mulher e utilizado a herança da falecida para adquirir carros de luxo bens que até então não possuía e realizar festas caríssimas afastando a causa extintiva da punibilidade O perdão judicial é ato exclusivo do Poder Judiciário Além disso é unilateral ou seja independe de aceitação da parte contrária e tem lugar em crimes de ação penal pública ou privada Já o perdão do ofendido é concedido pela vítima de um crime que somente se processa por meio de ação penal privada Se não bastasse é bilateral pois reclama para surtir efeitos a aceitação expressa ou tácita do querelado Perdão judicial Perdão do ofendido Concessão Só o juiz Só o ofendido ou o seu representante com poderes especiais Tipo de ação penal Qualquer uma desde que haja autorização legal Só na ação penal exclusivamente privada Eficácia Não depende da aceitação do réu Depende da aceitação do réu 1 2 3 4 5 6 7 8 STJ HC 362478SP rel Min Jorge Mussi 5ª Turma j 14092017 noticiado no Informativo 611 No tocante ao furto de energia elétrica convém destacar que o Superior Tribunal de Justiça entende que o pagamento do débito antes do oferecimento da denúncia não configura causa de extinção da punibilidade sem prejuízo do reconhecimento do arrependimento posterior previsto no art 16 do Código Penal HC 412208SP rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 20032018 noticiado no Informativo 622 A extinção da punibilidade pela prescrição quanto aos crimes antecedentes não implica o reconhecimento da atipicidade do delito de lavagem de dinheiro art 1º da Lei nº 96131998 imputado ao paciente Nos termos do art 2º 1º da lei mencionada para a configuração do delito de lavagem de dinheiro não há necessidade de prova cabal do crime anterior mas apenas a demonstração de indícios suficientes de sua existência Assim sendo o crime de lavagem de dinheiro é delito autônomo independente de condenação ou da existência de processo por crime antecedente STJ HC 207936MG rel Min Jorge Mussi 5ª Turma j 27032012 noticiado no Informativo 494 RHC 31321PR rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 16052013 noticiado no Informativo 523 MIRABETE Julio Fabbrini Manual de direito penal Parte geral 24 ed São Paulo Atlas 2007 v 1 p 402 HUNGRIA Nélson Novas questões jurídicopenais Rio de Janeiro Forense 1945 p 108 NORONHA E Magalhães Direito penal 15 ed São Paulo Saraiva 1978 v 1 p 396 Afirmou que o suposto óbito do paciente seria fato inexistente e que portanto não poderia existir no mundo jurídico Por essa razão reputou não haver óbice à desconstituição da coisa julgada HC 104998SP rel Min Dias Toffoli 1ª Turma j 14122010 noticiado no Informativo 613 HC 143474SP rel Min Celso Limongi Desembargador convocado do TJSP 6ª Turma j 06052010 noticiado no Informativo 433 E ainda O desfazimento da decisão que admitindo por equívoco a morte do agente declarou a extinção da punibilidade não constitui ofensa à coisa julgada HC 31234 rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 16122003 9 10 11 12 13 14 15 No Estado democrático de direito o Poder Judiciário não está autorizado a alterar a dar outra redação diversa da nele contemplada a texto normativo Pode a partir dele produzir distintas normas Mas nem mesmo o Supremo Tribunal Federal está autorizado a rescrever leis de anistia Revisão de lei de anistia se mudanças do tempo e da sociedade a impuserem haverá ou não de ser feita pelo Poder Legislativo não pelo Poder Judiciário STF ADPF 153DF rel Min Eros Grau Plenário j 29042010 STF ADI 104RO rel Min Sepúlveda Pertence Plenário j 04062007 e STJ RMS 40534BA rel Min Humberto Martins 2ª Turma j 15102013 STF ADI 1231DF rel Min Carlos Velloso Tribunal Pleno j 15122005 A jurisprudência do STF já não reclama o trânsito em julgado da condenação nem para a concessão do indulto nem para a progressão de regime de execução nem para o livramento condicional STF HC 87801SP rel Min Sepúlveda Pertence 1ª Turma j 02052006 Não é possível o cômputo do período de prova cumprido em suspensão condicional da pena para preenchimento do requisito temporal objetivo do indulto STF HC 123698PE rel Min Cármen Lúcia 2ª Turma j 17112015 noticiado no Informativo 808 Exemplificativamente se o decreto de indulto limitouse a prever o benefício à pena privativa de liberdade não ocorrerá a extinção da punibilidade no tocante à sanção pecuniária cumulativamente aplicada O indulto da pena privativa de liberdade não alcança a pena de multa que tenha sido objeto de parcelamento espontaneamente assumido pelo sentenciado STF EP 11 IndComAgRDF rel Min Roberto Barroso Plenário j 08112017 noticiado no Informativo 884 A concessão do indulto pleno ou parcial atinge a pena Será pleno quando extinguir a pena por completo resultando na extinção da punibilidade E será parcial também chamado de comutação quando o afastamento da pena não se der por completo No entanto em ambos os casos os demais efeitos penais e civis do crime permanecem inalterados Assinalese ainda que o indulto não é aplicado de forma automática Necessita assim de um procedimento judicial em que o juiz da execução irá avaliar se o apenado preenche ou não os requisitos insculpidos no decreto presidencial STJ REsp 1557408DF rel Min Maria Thereza 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 de Assis Moura 6ª Turma j 16022016 noticiado no Informativo 577 HC 81565SC rel Min Sepúlveda Pertence 1ª Turma j 19022002 Em igual sentido Assinalou que a proibição do art 5º XLIII da CF seria aplicável ao indulto individual e ao indulto coletivo HC 118213SP rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 06052014 noticiado no Informativo 745 O STJ compartilha deste entendimento Há expressa vedação legal ao benefício de indulto em se tratando de crimes hediondos ou a eles equiparados e a Lei Antidrogas reforça tal proibição HC 271537SP rel Min Moura Ribeiro 5ª Turma j 22102013 STF RE 274265DF rel Min Néri da Silveira 2ª Turma j 14082001 e STJ HC 276686SP rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 18062014 HC 90364MG rel Min Ricardo Lewandowski Tribunal Pleno j 31102007 noticiado no Informativo 486 RE 628658RS rel Min Marco Aurélio Plenário j 05112015 noticiado no Informativo 806 É o seu texto Transitada em julgado a sentença condenatória compete ao Juízo das execuções a aplicação de lei mais benigna No mesmo sentido o teor da Súmula 23 do extinto Tribunal Federal de Recursos O juízo da execução criminal é o competente para a aplicação de lei nova mais benigna a fato julgado por sentença condenatória irrecorrível STJ APn 562MS rel originário Min Fernando Gonçalves rel para acórdão Min Felix Fischer Corte Especial j 02062010 noticiado no Informativo 437 STF HC 89938SP rel Min Sepúlveda Pertence 1ª Turma j 14112006 STF RHC 85951PR rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 07022006 No mesmo sentido HC 85872SP rel Min Eros Grau 1ª Turma j 06092005 STF Inq 774RJ rel Min Celso de Mello Tribunal Pleno j 23091993 De acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça a perempção como perda do direito de prosseguir na ação penal de iniciativa privada é uma sanção jurídica imposta ao querelante por sua inércia negligência ou contumácia STJ EDcl no HC 156230PE rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 06032012 26 27 28 29 30 31 32 33 34 35 36 37 38 STJ RHC 26530SC rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 08112011 STF HC 86942MG rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 07022006 É também o entendimento do STJ HC 180479RS rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 24092013 STF Inq AgRg 920DF rel Min Celso de Mello Tribunal Pleno j 03081995 No mesmo sentido STJ REsp 440237SP rel Min Gilson Dipp 5ª Turma j 20052003 STF HC 86942MG rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 07022006 STF HC 81264RJ rel Maurício Côrrea 2ª Turma j 05032003 STJ RHC 26530SC rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 08112011 O querelante formulou proposta de composição de danos a dois dos querelados o que implica em sendo aceita e homologada judicialmente a renúncia ao direito de queixa nos termos do disposto no art 74 parágrafo único da Lei 90991995 A renúncia expressa ou tácita art 104 do CPB é causa extintiva da punibilidade sendo irretratável art 107 V CPB STJ APn 724DF rel Min Og Fernandes Corte Especial j 20082014 HC 88165RJ rel Min Celso de Mello 2ª Turma j 18042006 No STJ APn 724DF rel Min Og Fernandes Corte Especial j 20082014 APn 600MS rel Min Teori Albino Zavascki Corte Especial j 18082010 noticiado no Informativo 443 Nos termos do art 105 do Código Penal o perdão do ofendido nos crimes em que somente se procede mediante queixa obsta ao prosseguimento da ação logo é de se concluir que a referida causa extintiva de punibilidade somente tem efetiva aplicabilidade nas ações penais exclusivamente privadas já que na ação penal pública condicionada à representação ao ser proposta a titularidade é de imediato transferida ao órgão ministerial não mais dela dispondo a parte STJ HC 111326MT rel Min Jorge Mussi 5ª Turma j 26102010 O perdão concedido fora do processo é denominado extraprocessual REsp 320958RN rel Min Arnaldo Esteves Lima 5ª Turma j 06092007 A retratação prevista como causa de extinção da punibilidade do delito de falso testemunho deve ser realizada antes da sentença e no próprio processo no qual a afirmação inverídica foi feita STJ RHC 33350RS 39 40 41 42 43 44 rel Min Jorge Mussi 5ª Turma j 01102013 Condenado por homicídio duplamente qualificado não faz jus ao perdão judicial por absoluta ausência de previsão legal à sua aplicação STJ HC 55430RS rel Min Gilson Dipp 5ª Turma j 04052006 De fato previa o art 300 do Projeto de Lei 37101993 origem do CTB Lei 95031997 que nas hipóteses de homicídio culposo e lesão corporal culposa o juiz poderá deixar de aplicar a pena se as consequências da infração atingirem exclusivamente o cônjuge ou companheiro ascendente descendente irmão ou afim em linha reta do condutor do veículo As razões do veto presidencial foram as seguintes O artigo trata do perdão judicial já consagrado pelo Direito Penal Deve ser vetado porém porque as hipóteses previstas no 5 do art 121 e 8 do art 129 do Código Penal disciplinam o instituto de forma mais abrangente REsp 1455178DF rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 05062014 noticiado no Informativo 542 REsp 1444699RS rel Min Rogerio Schietti Cruz 6ª Turma j 01062017 noticiado no Informativo 606 O perdão judicial pressupõe condenação pelo que não se estende aos efeitos secundários próprios da sentença condenatória RE 104679SP rel Min Aldir Passarinho 2ª Turma j 22101985 Nesse sentido CAPEZ Fernando e BONFIM Edilson Mougenot Direito penal Parte Geral São Paulo Saraiva 2004 p 843 461 INTRODUÇÃO O Estado é o titular exclusivo do direito de punir Somente ele pode aplicar pena ou medida de segurança ao responsável por uma infração penal1 Esse direito tem natureza abstrata pois pode ser exercido sobre todas as pessoas Paira indistintamente sobre elas independentemente da prática de um crime ou de uma contravenção penal funcionando como advertência pois a prática de um ilícito penal importará na imposição de uma sanção ao infrator Com a prática da infração penal contudo o ius puniendi automaticamente se concretiza pois a partir de então o Estado tem o poder e o dever de punir o responsável pelo fato típico e ilícito A pretensão punitiva outrora abstrata e dirigida contra todos os indivíduos transformase em concreta visando uma pessoa determinada Esse interesse estatal de índole pública se sobrepõe ao direito de liberdade do responsável pelo ilícito penal O direito de punir todavia é limitado Encontra barreiras penais e processuais tais como a representação do ofendido nos crimes de ação penal pública condicionada as condições da ação penal e a necessidade de obediência a regras constitucionais e processuais para ser efetivamente exercido devido processo legal Mas não é só Na ampla maioria dos casos há ainda limites temporais pois o direito de punir não pode se arrastar ao longo dos anos eternamente O Estado deve aplicar a sanção penal dentro de períodos legalmente fixados pois em caso contrário sua inércia tem o condão de extinguir a consciência do delito renunciando implicitamente ao poder que lhe foi conferido pelo 462 463 464 ordenamento jurídico Cabe a ele pois empreender todos os esforços para que a punibilidade se efetive célere e prontamente Entra em cena o instituto da prescrição É como se cometida uma infração penal o sistema jurídico virasse em desfavor do Estado uma ampulheta variando o seu tamanho proporcionalmente à gravidade do ilícito penal O poderdever de aplicar a sanção penal precisa ser efetivado antes de escoar toda a areia que representa o tempo que se passa pois se não o fizer dentro dos limites legalmente previstos o Estado perderá para sempre o direito de punir ORIGEM HISTÓRICA A prescrição existe desde os tempos antigos mas como causa de extinção da punibilidade a sua adoção remonta à legislação penal francesa do final do século XVIII2 Sempre foi calcada em idênticas premissas o esquecimento do ilícito penal e a presunção de emenda do seu responsável com a consequente inutilidade da pena Com a prescrição o Estado renuncia ao castigo pertinente ao agente culpável envolvido em determinada infração penal limitando o seu próprio poder punitivo CONCEITO Prescrição é a perda da pretensão punitiva ou da pretensão executória em face da inércia do Estado durante determinado tempo legalmente previsto Pretensão punitiva é o interesse em aplicar uma sanção penal ao responsável por um crime ou por uma contravenção penal enquanto a pretensão executória é o interesse em executar em exigir seja cumprida uma sanção penal já imposta FUNDAMENTOS Os fundamentos da prescrição são os seguintes a Segurança jurídica ao responsável pela infração penal não seria justa nem correta a imposição ou a execução de uma sanção penal muito tempo depois da prática do crime ou da contravenção penal Imaginese alguém que praticou um crime de pouca gravidade aos 18 anos de idade Seria ilógico e absurdo não exercitasse prontamente o Estado seu direito de punir e décadas depois essa mesma pessoa com 70 anos de idade e avô de diversos netos viesse a ser presa pelo fato há muito cometido contrariando o bomsenso e as finalidades da pena que não surtiria efeito algum Ao contrário implicaria somente em malefícios ao Estado à sociedade e principalmente ao agente e aos seus familiares Nas palavras de Bento de Faria Decorrido certo lapso de tempo desde a prática do crime sem que se tenha instaurado procedimento criminal contra o delinquente e se instaurado sem que se tenha prosseguido nesse procedimento ou desde a sentença condenatória sem que se tenha feito executar a pena a memória do fato punível apagouse e a necessidade do exemplo desaparece E seria repugnante aos princípios de equidade e de justiça que ficasse perpetuamente suspensa sobre a cabeça do criminoso a ameaça do procedimento criminal3 b Luta contra a ineficiência do Estado os órgãos estatais responsáveis pela apuração processo e julgamento de infrações penais devem atuar com zelo e celeridade em obediência à eficiência dos entes públicos estatuída pelo art 37 caput da Constituição Federal como princípio vetor da Administração Pública Serve portanto como castigo em caso de não ser alcançada uma meta pelo Estado qual seja aplicar a sanção penal dentro de prazos legalmente previstos c Impertinência da sanção penal a resposta do Estado somente cumpre a sua função preventiva especial e geral quando manifestada logo após a prática da infração penal O Direito Penal intimida não pela gravidade da punição mas pela certeza de seu exercício Nos idos de 1764 já afirmava Cesare Beccaria que quanto mais próxima do delito seja a aplicação da pena tanto mais justa e útil será De fato o maior freio aos delitos não é a crueldade 465 466 da pena mas sua infalibilidade porque a certeza do castigo ainda que mais moderado fará sempre maior impressão do que o temor de outro mais terrível unido com a esperança da impunidade Em suas palavras É pois de suma importância a proximidade do delito e da pena se se quiser que nas mentes rudes e incultas o quadro sedutor de um delito vantajoso seja imediatamente seguido da ideia associada à pena A longa demora não produz outro efeito além de dissociar cada vez mais essas duas ideias e ainda que o castigo de um delito cause uma impressão será menos a de um castigo que a de um espetáculo e isso só acontecerá após terse atenuado nos espectadores o horror de um certo delito em particular que serviria para reforçar o sentimento da pena4 NATUREZA JURÍDICA A prescrição é causa de extinção da punibilidade prevista no art 107 IV 1ª figura do Código Penal A infração penal por ela atingida portanto permanece íntegra e inabalável Desaparece tão somente a punibilidade compreendida como consequência e não como elemento de um crime ou de uma contravenção penal ALOCAÇÃO A prescrição embora produza diversos efeitos no processo penal é matéria inerente ao Direito Penal pois quando ocorre extingue o direito de punir de titularidade do Estado Para o cômputo de seu prazo observase o art 10 do Código Penal inclui se o dia do começo e excluise o dia do final contandose os dias os meses e os anos pelo calendário comum ou gregoriano Os prazos prescricionais são improrrogáveis não se suspendendo em finais de semana feriados ou férias Além disso tratase de matéria de ordem pública podendo e devendo ser decretada de ofício em qualquer tempo e grau de jurisdição ou mediante 467 a b requerimento de qualquer das partes Nos termos do art 61 caput do Código de Processo Penal Em qualquer fase do processo o juiz se reconhecer extinta a punibilidade deverá declarála de ofício5 Finalmente constituise em matéria preliminar isto é impede a análise do mérito da ação penal seja pelo juízo natural seja em grau de recurso Em caso de prescrição não há que falar em absolvição ou condenação mas apenas em extinção da punibilidade Para o Superior Tribunal de Justiça a prescrição é matéria prejudicial ao exame do mérito por constituir fato impeditivo do direito estatal de punir e extintivo da punibilidade do réu podendo ser inclusive analisada de ofício em qualquer fase do processo6 IMPRESCRITIBILIDADE PENAL O Código Criminal do Império de 1830 dispunha em seu art 65 que as penas impostas aos condenados não prescreviam em tempo algum Os diplomas posteriores Código Penal de 1890 Consolidação das Leis Penais de 1932 e Código Penal de 19407 não repetiram aquela fórmula já criticada em seu tempo Atualmente a regra geral consiste na aplicação da prescrição a todas as modalidades de infrações penais inclusive aos crimes hediondos8 A Constituição Federal todavia na contramão de seu próprio espírito por vedar qualquer espécie de prisão perpétua art 5º XLVII b determina a imprescritibilidade de dois grupos de crimes que a propósito não são os mais graves em nosso Direito Penal racismo art 5º XLII regulamentado pela Lei 771619899 e ação de grupos armados civis ou militares contra a ordem constitucional e o Estado Democrático art 5º XLIV disciplinados pela Lei 71701983 Lei de Segurança Nacional Como corolário dessas exceções taxativamente indicadas pelo texto constitucional prevalece em seara doutrinária o entendimento de que a legislação ordinária não pode criar outras hipóteses de imprescritibilidade penal10 Com efeito no momento em que o Poder Constituinte Originário admitiu apenas esses dois crimes como insuscetíveis de prescrição afirmou implicitamente que as penas de todas as demais infrações penais prescrevem e pela posição em que tais exceções foram previstas art 5º a prescrição teria sido erigida à categoria de direito fundamental do ser humano consistente na obrigação do Estado de investigar processar e punir alguém dentro de prazos legalmente previstos11 Foi essa a razão que levou a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça a firmarse no sentido de que em caso de citação por edital e consequente aplicação do art 366 do Código de Processo Penal com redação dada pela Lei 92711996 não se admite a suspensão da prescrição por tempo indefinido o que poderia configurar uma situação de imprescritibilidade Ao contrário o processo penal deve permanecer suspenso pelo prazo máximo em abstrato relativo ao crime na forma do art 109 do Código Penal Superado esse prazo retomase o trâmite da prescrição calculado pelo máximo da pena em abstrato legalmente previsto Na prática a prescrição passa a ser calculada em dobro sem falarse em imprescritibilidade Exemplificativamente uma ação penal por crime de furto simples CP art 155 caput em que o réu foi citado por edital e não compareceu ao interrogatório nem constituiu defensor deve ser suspensa operandose também a suspensão do prazo prescricional por 8 oito anos uma vez que a pena máxima cominada ao delito é de 4 quatro anos Em seguida decorrido tal prazo é retomado o curso da prescrição que se efetivará após outros 8 oito anos Esse é o entendimento consagrado na Súmula 415 do Superior Tribunal de Justiça O período de suspensão do prazo prescricional é regulado pelo máximo da pena cominada O Supremo Tribunal Federal todavia já entendeu que a Constituição Federal não veda seja indeterminado o prazo de suspensão da prescrição uma vez que não se constitui em hipótese de imprescritibilidade e a retomada do curso da prescrição fica apenas condicionada a evento futuro e incerto Além disso aduziu que a Lei Suprema se restringe a enumerar os crimes sujeitos à imprescritibilidade art 5º XLII e XLIV sem proibir em tese que lei ordinária crie outros casos12 468 Cumpre também observar o teor do art 29 do Decreto 43882002 responsável pela promulgação no Brasil do Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional Os crimes de competência do Tribunal não prescrevem13 As penas dos crimes contra a humanidade submetemse ao instituto da prescrição pois não há norma no direito pátrio impondo a imprescritibilidade penal em tais delitos Como já decidido pelo Supremo Tribunal Federal A Corte se referiu a fundamentos expostos na ADPF 153DF no sentido da não aplicação no Brasil da imprescritibilidade dos crimes dessa natureza haja vista o País não ter subscrito a Convenção sobre a Imprescritibilidade dos Crimes de Guerra e dos Crimes contra a Humanidade nem ter a ela aderido e ainda em razão de somente lei interna poder dispor sobre prescritibilidade ou imprescritibilidade da pretensão estatal de punir Ponderou que mesmo se houvesse norma de direito internacional de caráter cogente a estabelecer a imprescritibilidade dos crimes contra a humanidade ela não seria aplicável no Brasil por não ter sido ainda reproduzida no direito interno14 DIFERENÇAS ENTRE PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA15 Prescrição e decadência são causas de extinção da punibilidade previstas no art 107 IV do Código Penal Além disso ocorrem em razão da inércia do titular de um direito durante determinado tempo legalmente definido Todavia a decadência somente pode se verificar nos crimes de ação penal privada e de ação penal pública condicionada à representação do ofendido ou de quem o represente decurso in albis do prazo para ajuizamento da queixa crime ou oferecimento da representação A prescrição por sua vez é capaz de atingir qualquer espécie de crime pouco importando a forma pela qual se processa Consequentemente somente pode ocorrer a decadência antes do início da ação penal pois o legitimado tinha um prazo para ajuizar a queixacrime ou 469 4691 lançar a representação mas assim não o fez Ao reverso a prescrição pode se concretizar a qualquer momento isto é antes ou durante a ação penal e até mesmo depois do trânsito em julgado da sentença penal condenatória Por último a decadência importa diretamente na perda do direito de ação pois com seu advento a ação penal não pode mais ser iniciada seja pelo decurso do prazo para ajuizamento da queixacrime seja pelo transcurso do intervalo temporal para oferecimento da representação Perdese imediatamente o direito de ação e mediatamente o direito de punir haja vista que sem o direito de ação o Estado não tem meios legítimos devido processo legal para punir o responsável pela infração penal Na prescrição por outro lado operase imediatamente em relação ao Estado a perda do direito de punir fulminando qualquer possibilidade de exercício do direito de ação ESPÉCIES DE PRESCRIÇÃO Introdução O Código Penal apresenta dois grandes grupos de prescrição 1 da pretensão punitiva e 2 da pretensão executória De seu turno a prescrição da pretensão punitiva é subdividida em outras três modalidades 1 prescrição da pretensão punitiva propriamente dita ou prescrição da ação penal 2 prescrição intercorrente e 3 prescrição retroativa A prescrição da pretensão executória existe isoladamente ou seja não se divide em espécies A linha divisória entre os dois grandes grupos é o trânsito em julgado da condenação na prescrição da pretensão punitiva não há trânsito em julgado para ambas as partes acusação e defesa ao contrário do que se dá na prescrição da pretensão executória na qual a sentença penal condenatória já transitou em julgado para o Ministério Público ou para o querelante e também para a defesa Pelo fato porém de a prescrição intercorrente e a prescrição retroativa 4692 estarem situadas no 1º do art 110 do Código Penal é comum fazerse inaceitável confusão Dizse que somente na prescrição da pretensão punitiva propriamente dita ou prescrição da ação não existe trânsito em julgado ao contrário das demais espécies mormente por tratar o caput do art 110 do Estatuto Repressivo da prescrição depois de transitar em julgado a sentença condenatória Essa conclusão é equivocada A prescrição intercorrente e a prescrição retroativa pertencem ao grupo da prescrição da pretensão punitiva Só há prescrição da pretensão executória depois do trânsito em julgado da sentença penal condenatória para ambas as partes do processo penal E na prescrição intercorrente e na prescrição retroativa há trânsito em julgado da condenação mas apenas para a acusação Destarte andou mal o legislador ao inserir no art 110 do Código Penal a prescrição intercorrente e a prescrição retroativa Em verdade deveria ter delas tratado em dispositivo à parte principalmente em razão da relevância dos institutos Efeitos da prescrição e competência para sua declaração Os efeitos da prescrição no ordenamento jurídico brasileiro dependem da espécie em análise da pretensão punitiva ou da pretensão executória a Prescrição da pretensão punitiva Essa modalidade de prescrição obsta o exercício da ação penal seja na fase administrativa inquérito policial ou na fase judicial ação penal16 Não há interesse apto a legitimar a intervenção estatal autorizandose inclusive a 4610 rejeição da denúncia ou queixa nos moldes do art 395 II do Código de Processo Penal Se já foi instaurada a persecução penal por outro lado a prescrição da pretensão punitiva impede a sua continuação Deve o magistrado depois de ouvido o Ministério Público declarar a extinção da punibilidade sem análise do mérito arquivandose os autos em seguida17 Caso assim não faça assistirá ao acusado o direito de impetrar habeas corpus para cessar a coação ilegal com fulcro no art 648 VII do Código de Processo Penal Seu reconhecimento é da competência do membro do Poder Judiciário a quem estiver afeta a ação penal juízo de 1ª instância ou tribunais em grau de recurso ou no caso de infrações penais que sejam de sua competência originária Por último a prescrição da pretensão punitiva apaga todos os efeitos de eventual sentença condenatória já proferida principal ou secundários penais ou extrapenais18 Não servirá como pressuposto da reincidência nem como maus antecedentes Além disso não constituirá título executivo no juízo civil b Prescrição da pretensão executória Como já existe trânsito em julgado da sentença penal condenatória para acusação e defesa compete ao juízo da execução reconhecêla e declarar a extinção da punibilidade depois de ouvido o Parquet comportando essa decisão recurso de agravo sem efeito suspensivo LEP arts 66 II e 197 Extingue somente a pena efeito principal19 mantendose intocáveis todos os demais efeitos secundários da condenação penais e extrapenais Subsiste a condenação ou seja não se rescinde a sentença penal que funciona como pressuposto da reincidência dentro do período depurador previsto no art 64 I do Código Penal20 Por igual fundamento a condenação caracteriza antecedente negativo e serve como título executivo no campo civil PRESCRIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE 46101 LIBERDADE Prescrição da pretensão punitiva propriamente dita ou prescrição da ação penal21 Essa espécie de prescrição está disciplinada pelo art 109 caput do Código Penal A prescrição antes de transitar em julgado a sentença final regulase pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime Façamos um raciocínio simples mas eficiente para compreender os prazos prescricionais Entendao e depois o memorize pois será utilizado para todas as espécies de prescrição A prescrição é a perda do direito estatal de punir por força do decurso do tempo Antes de se retirar um direito de qualquer pessoa devese dar a ela todas as chances de exercêlo Com o Estado não é diferente pois a ele também se reserva a ampla defesa de seus direitos Na prescrição da pretensão punitiva propriamente dita não há trânsito em julgado para acusação nem para defesa Nada impede assim a fixação da pena no máximo legal E se a reprimenda pode chegar ao limite máximo não se pode privar o Estado do direito de punir com base em quantidade diversa de sanção penal Por esse motivo essa prescrição deve levar em consideração o máximo da pena privativa de liberdade cominada ao delito conforme determina o art 109 caput do Código Penal O Código Penal estabeleceu um critério lógico e objetivo A prescrição da ação penal é calculada com base no máximo da pena privativa de liberdade abstratamente cominada ao crime Utilizase a quantidade máxima prevista no preceito secundário do tipo penal enquadrandoa em algum dos incisos do art 109 do Código Penal com os quais podemos formar uma tabela O prazo previsto no inciso VI do art 109 do Código Penal 3 anos era anteriormente à Lei 122342010 de 2 dois anos Agora o menor prazo prescricional previsto no Código Penal é de 3 três anos no tocante às penas privativas de liberdade Cuidase do único prazo prescricional ímpar Essa modificação fundamentouse precipuamente no combate à impunidade das contravenções penais e dos crimes de reduzida lesividade agravada pela reconhecida morosidade da justiça penal Anotese porém que subsiste o prazo prescricional de 2 dois anos em três hipóteses a para a pena de multa quando for a única cominada ou aplicada CP art 114 I e b para o crime tipificado no art 28 caput da Lei 113432006 porte de droga para consumo pessoal nos termos do art 30 da Lei de Drogas e c no art 125 VII Código Penal Militar Decretolei 10011969 quando o máximo da pena privativa de liberdade é inferior a 1 um ano Essas três regras específicas não foram atingidas pelas alterações promovidas no Código Penal pela Lei 122342010 A propósito existe uma situação em que o prazo prescricional independe da quantidade da pena cominada ao delito Aliás sequer existe limite máximo da pena Tratase da pena de morte aplicável em tempo de guerra cuja prescrição operase em 30 anos CPM art 125 I Como entretanto a pena privativa de liberdade é calculada por meio de um sistema trifásico CP art 68 caput cada uma dessas etapas pode ou não influenciar no cômputo da prescrição Vejamos a 1ª fase Circunstâncias judiciais do art 59 caput Nessa fase o juiz deve navegar entre os limites mínimo e máximo previstos no preceito secundário do tipo penal não podendo em hipótese alguma ultrapassálos Consequentemente as circunstâncias judiciais não influenciam no cálculo da prescrição b 2ª fase Agravantes e atenuantes genéricas As agravantes genéricas estão arroladas taxativamente pelos arts 61 e 62 do Código Penal Por sua vez as atenuantes genéricas de caráter exemplificativo encontramse nos arts 65 e 66 do Código Penal Como sabido não podem ultrapassar os limites legais isto é o juiz deve respeitar em caso de agravantes genéricas por mais numerosas que sejam o máximo cominado pelo tipo penal e no tocante às atenuantes genéricas o patamar mínimo ainda que diversas estejam presentes e por mais ínfima que seja a reprovabilidade do agente Com efeito agravantes e atenuantes não indicam o percentual de aumento ou de diminuição A lei diz apenas são circunstâncias que sempre agravam art 61 a pena será ainda agravada art 62 são circunstâncias que sempre atenuam ou a pena poderá ainda ser atenuada art 66 Portanto a não observância dos parâmetros legais implicaria na criação de uma nova pena convertendo o magistrado em legislador em evidente violação da separação de Poderes consagrada pelo art 2º da Constituição Federal Nessa esteira a Súmula 231 do Superior Tribunal de Justiça A incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal Por identidade de razões os motivos que levaram à criação do enunciado também se aplicam às agravantes genéricas Concluise pois que as agravantes e atenuantes genéricas também não influem na contagem do prazo prescricional Há entretanto duas exceções por expressa previsão legal menoridade relativa e senilidade Constituemse em atenuantes genéricas tratadas pelo art 65 I do Código Penal as circunstâncias de ser o agente menor de 21 vinte e um na data do fato ou maior de 70 setenta anos na data da sentença Essas atenuantes na forma do art 115 do Código Penal reduzem pela metade os prazos de prescrição qualquer que seja sua modalidade prescrição da pretensão punitiva ou prescrição da pretensão executória Em relação à menoridade compreendese o acusado maior de 18 anos penalmente imputável mas menor de 21 anos ao tempo do fato pouco importando a data da sentença Se exemplificativamente o agente pratica um crime aos 20 mas é condenado apenas quando já completados 25 anos de idade a prescrição será contada pela metade Essa regra em nada foi alterada pelo Código Civil em vigor 1 por se tratar de norma favorável ao réu deveria ter sido revogada expressamente em face da inadmissibilidade no Direito Penal da analogia in malam partem e 2 os dispositivos penais foram expressamente preservados pelo art 2043 do Código Civil Anotese não ser imprescindível para comprovação da menoridade a juntada aos autos de certidão de nascimento o que pode ser feito por qualquer documento apto Nos moldes da Súmula 74 do Superior Tribunal de Justiça Para efeitos penais o reconhecimento da menoridade do réu requer prova por documento hábil22 Para a senilidade por sua vez a idade de 70 anos deve ser aferida ao tempo da sentença pouco importando a data da prática do fato23 Assim se o réu pratica um crime com 68 mas somente é condenado aos 71 anos de idade o prazo da prescrição será reduzido pela metade Nesse contexto o Supremo Tribunal Federal decidiu que a palavra sentença deve ser interpretada em sentido amplo para englobar também o acórdão quando a tiver o agente sido julgado diretamente por um colegiado b houver reforma da sentença absolutória em julgamento de recurso para condenar o réu e c ocorrer a substituição do decreto condenatório em sede de recurso no qual reformada parcialmente a sentença24 Em regra o Supremo Tribunal Federal não admite a redução da prescrição da pretensão punitiva pela metade quando o condenado completa 70 setenta anos de idade após a prolação da sentença condenatória A prescrição da pretensão punitiva de condenado com mais de 70 anos se consuma com a prolação da sentença e não com o trânsito em julgado conforme estatui o art 115 do CP Art 115 São reduzidos de metade os prazos de prescrição quando o criminoso era ao tempo do crime menor de 21 vinte e um anos ou na data da sentença maior de 70 setenta anos Com base nesse entendimento a Primeira Turma denegou a ordem de habeas corpus em que se discutia a extinção da punibilidade de paciente que completara 70 anos após a sentença condenatória porém antes do trânsito em julgado25 O Plenário da Suprema Corte contudo já aceitou a diminuição da prescrição pela metade quando a idade de 70 anos vem a ser atingida depois do julgamento desde que na data do aniversário do acusado a condenação ainda não tenha transitado em julgado Vale a pena acompanhar o teor do julgado Ao tecer considerações sobre a outra tese formulada nos embargos o Ministro Luiz Fux aduziu a ocorrência da prescrição da pretensão punitiva na modalidade retroativa em face da redução decorrente da idade avançada CP Art 115 São reduzidos de metade os prazos de prescrição quando o criminoso era ao tempo do crime menor de 21 vinte e um anos ou na data da sentença maior de 70 setenta anos Pontuou que o acusado completara 70 anos no dia seguinte à sessão do julgamento e que o art 115 do CP deveria ser interpretado à luz da irrecorribilidade do título penal condenatório e não da data do pronunciamento judicial Realçou ainda que houvera recurso apenas da defesa O Ministro Marco Aurélio acentuou que incidiria o prazo pela metade pois o Código Penal ao versar a matéria não se referiria a sentença ou acórdão condenatórios simplesmente prolatados mas recorríveis CP Art 117 O curso da prescrição interrompese IV pela publicação da sentença ou acórdão condenatórios recorríveis Avaliou que na espécie ele teria atingido a idade antes da publicação do acórdão Por sua vez o Ministro Dias Toffoli indicou que a publicação da mencionada decisão colegiada darseia na sessão de julgamento mas o acusado ao completar 70 anos antes do trânsito em julgado do acórdão teria jus ao benefício relativo à prescrição da pretensão punitiva O Ministro Ricardo Lewandowski ao reduzir pela metade o prazo também assentou a prescrição O Ministro Celso de Mello assinalou ser possível reconhecer a incidência da norma do art 115 do CP quando o condenado completasse 70 anos após a sessão pública de julgamento mas opusesse embargos de declaração reputados admissíveis nos quais se buscasse infringir a decisão de modo processualmente legítimo como no caso26 Finalmente o Supremo Tribunal Federal firmou jurisprudência no sentido de que o Estatuto do Idoso Lei 107412003 ao conferir especial proteção às pessoas com idade igual ou superior a 60 anos não derrogou o art 115 do Código Penal ao fundamento de ser completa a norma do Código Penal não remetendo à disciplina legal do que se entende por idoso mas fixando os 70 anos como capazes de levar à diminuição do prazo prescricional27 Em síntese a redução da prescrição da pretensão punitiva pela metade somente ocorre quando o acusado era maior de 70 anos e não de 60 anos ao tempo da sentença condenatória ou do acórdão condenatório c 3ª fase Causas de aumento e de diminuição da pena As causas de aumento e de diminuição da pena estão delineadas na Parte Geral genéricas e na Parte Especial específicas do Código Penal Aumentam e diminuem a pena em quantidade fixa exemplo CP art 155 1º aumentase de um terço ou variável exemplos CP art 14 parágrafo único diminuída de um a dois terços e art 70 caput aumentada em qualquer caso de um sexto até metade Como as causas de aumento podem levar a pena acima do limite máximo legal e as causas de diminuição têm o condão de reduzila abaixo do piso mínimo influem no cálculo da prescrição ao contrário do que ocorre com as circunstâncias judiciais e com as agravantes e atenuantes genéricas E aqui aplicase o raciocínio inicialmente formulado no item 461012 Nas causas de aumento da pena de quantidade variável incide o percentual de maior elevação Exemplo no crime de roubo circunstanciado com a pena aumentada em razão do concurso de pessoas CP art 157 2º II a exasperação é de 13 um terço até metade A pena do roubo é de 4 quatro a 10 dez anos O aumento máximo de 12 metade A prescrição da pretensão punitiva propriamente dita ou prescrição da ação penal deve ser calculada sobre a pena de 15 quinze anos a qual resulta da pena máxima do roubo 10 anos elevada da metade maior causa de aumento da pena De fato a pena pode chegar aos 15 anos razão pela qual seria equivocado retirar do Estado seu direito de punir antes de a ele permitir seu pleno exercício Por outro lado nas causas de diminuição da pena de quantidade variável utilizase o percentual de menor redução Exemplo na tentativa CP art 14 parágrafo único aplicase a pena do crime consumado reduzida de 1 um a 23 dois terços A título ilustrativo a pena do peculato apropriação CP art 312 caput 1ª parte é de 2 dois a 12 doze anos Em caso de tentativa deve ser obrigatoriamente diminuída de 13 um terço a 23 dois terços O cálculo prescricional de uma tentativa de peculato apropriação CP art 312 caput 1ª parte cc o art 14 II seria o seguinte 12 anos pena máxima do crime menos 13 causa de menor diminuição Logo a prescrição deveria ser computada sobre uma pena de 8 oito anos Com efeito as causas de diminuição da pena reduzem obrigatoriamente a pena Em síntese a pena será necessariamente reduzida restando ao juiz por ocasião da sentença definir o percentual adequado Essa conclusão se coaduna com o raciocínio já formulado item 461012 A pena até pode ser reduzida no máximo mas não há certeza disso Destarte seria errado retirar do Estado seu direito de punir com base na diminuição mais elevada quando no caso concreto a redução da pena pode se concretizar em percentual diverso Finalmente se estiverem presentes simultaneamente causas de aumento e de diminuição da pena ambas em quantidades variáveis o magistrado deve calcular a prescrição da pretensão punitiva propriamente dita com base na pena máxima cominada ao delito acrescida da causa que mais aumenta subtraindo em seguida o percentual da causa que menos diminui O quadro esquemático a seguir sintetiza a matéria Encontrase regulado pelo art 111 do Código Penal Art 111 A prescrição antes de transitar em julgado a sentença final começa a correr I do dia em que o crime se consumou II no caso de tentativa do dia em que cessou a atividade criminosa III nos crimes permanentes do dia em que cessou a permanência IV nos de bigamia e nos de falsificação ou alteração de assentamento do registro civil da data em que o fato se tornou conhecido V nos crimes contra a dignidade sexual de crianças e adolescentes previstos neste Código ou em legislação especial da data em que a vítima completar 18 dezoito anos salvo se a esse tempo já houver sido proposta a ação penal a Regra geral inciso I A normalidade é a fluência do prazo da prescrição da pretensão punitiva a partir da data em que o crime se consumou Nos crimes materiais iniciase com a produção do resultado naturalístico enquanto nos crimes formais e nos de mera conduta operase a partir da prática da conduta criminosa Em relação ao tempo do crime o art 4º do Código Penal acolheu a teoria da atividade Todavia no tocante à prescrição adotouse a teoria do resultado pois o que importa é o dia da consumação Se o caso concreto acarretar em dúvida insolúvel resolvese a questão em prol do réu considerando como data da consumação a mais remota em que a prescrição terá se iniciado há mais tempo Exemplo encontrase um feto já em estado de putrefação e descobrese ter sido praticado por determinada mulher um aborto criminoso A perícia conclui ter o delito ocorrido entre os meses de janeiro e setembro de um dado ano sem especificar a data Deve ser considerado como início do prazo prescricional o dia 1º de janeiro b Exceções incisos II a IV As exceções foram taxativamente previstas em lei Não se admite a analogia contrária ao réu uma vez que o início tardio da prescrição seria a ele prejudicial por dificultar a extinção da punibilidade b1 Tentativa inciso II A prescrição tem início no dia em que cessou a atividade criminosa isto é no dia em que foi praticado o último ato de execução b2 Crimes permanentes inciso III Crimes permanentes são aqueles em que a consumação se prolonga no tempo por vontade do agente É o caso do crime de extorsão mediante sequestro CP art 159 no qual a situação ilícita se arrasta enquanto a vítima é mantida privada da sua liberdade Nesses delitos enquanto não encerrada a permanência é dizer enquanto não cessada a consumação não se inicia o trâmite do prazo prescricional O fundamento dessa exceção é simples a consumação se prolonga no tempo somente se aperfeiçoando com o fim da permanência Em suma o crime continua se consumando A propósito no sequestro CP art 148 de índole permanente o Supremo Tribunal Federal já decidiu que tal delito não prescreve enquanto não for encontrada a pessoa ou o corpo28 b21 Crimes habituais São crimes habituais os que se compõem da reiteração de diversos atos isoladamente considerados irrelevantes perante o Direito Penal É o caso do exercício ilegal da medicina CP art 282 em que não basta a prática de um ato privativo de médico mas que essa postura se revele como o estilo de vida do agente Nesses crimes o prazo prescricional iniciase a partir da data da última das ações que constituem o fato típico Não há diversos delitos mas um crime único que atinge a consumação apenas com o último ato executório Exemplo no exercício ilegal da medicina flui a prescrição a partir da última prática ilegal de ato privativo de médico a derradeira consulta exemplificativamente e não em relação a cada ato individualmente analisado cada consulta por exemplo29 b3 Crimes de bigamia e de falsificação ou alteração de assentamento do registro civil inciso IV Nesses crimes a prescrição começa a correr a partir da data em que o fato se tornar conhecido O conhecimento do fato exigido pela lei referese à autoridade pública que tenha poderes para apurar processar ou punir o responsável pelo delito aí se incluindo o Delegado de Polícia o membro do Ministério Público e o órgão do Poder Judiciário30 Prevalece o entendimento de que não é necessária a ciência formal do crime notícia do delito perante o Poder Público bastando a de cunho presumido relativa à notoriedade do fato b4 Crimes contra a dignidade sexual de crianças e adolescentes inciso V A Lei 126502012 também conhecida como Lei Joanna Maranhão31 acrescentou o inc V ao art 111 do Código Penal com a seguinte redação nos crimes contra a dignidade sexual de crianças e adolescentes previstos neste Código ou em legislação especial da data em que a vítima completar 18 dezoito anos salvo se a esse tempo já houver sido proposta a ação penal Criouse mais uma exceção à regra segundo a qual a prescrição da pretensão punitiva tem como termo inicial a data da consumação do delito Esta hipótese é aplicável a todos os crimes contra a dignidade sexual previstos no Código Penal ou em leis especiais contra vítimas menores de 18 anos ou seja crianças ou adolescentes O fundamento da inovação legislativa é simples e louvável Com efeito lamentavelmente a ampla maioria dos crimes sexuais envolvendo vítimas menores de 18 anos ocorre no ambiente doméstico e seus autores são justamente aqueles que deveriam zelar pelo desenvolvimento das crianças e dos adolescentes pais padrastos avós parentes em geral e pessoas com alguma relação de afinidade Contudo poderia surgir como de fato tem surgido a seguinte crítica tais delitos são de ação penal pública incondicionada CP art 225 razão pela qual a autoridade policial e o Ministério Público poderiam e deveriam iniciar a persecução penal de ofício é dizer independentemente de autorização da vítima ou do seu representante legal É verdade Entretanto os crimes desta natureza normalmente ficam em sigilo restritos ao palco em que ocorreram As vítimas por medo ingenuidade ou até mesmo pela falta de acesso aos órgãos públicos não levam os fatos ao conhecimento das autoridades competentes Como se sabe abusos sexuais em crianças e adolescentes são tristes memórias que jamais se apagam Os traumas psicológicos nunca são superados Independentemente do decurso do tempo as vidas das vítimas ficam eternamente marcadas por frestas instaladas no porão das lembranças horríveis de um drama cujo algoz em geral estava dentro da própria casa Em razão disso o termo inicial da prescrição da pretensão punitiva iniciarseá na data em que a vítima completar 18 anos salvo se a esse tempo já houver sido proposta a ação penal Ao atingir a maioridade a vítima terá plenas condições para manterse por conta própria encerrando a relação de dependência perante seu agressor ou qualquer outra pessoa que pretenda blindálo com a impunidade De outro lado se a ação penal já tiver sido proposta a prescrição começará a fluir da data da propositura da denúncia ou queixa ação penal privada subsidiária da pública e o Estado estará habilitado para aplicar a sanção adequada com respeito ao devido processo legal A ação penal se considera proposta no dia em que o Ministério Público ou querelante oferece a denúncia ou queixa crime32 De fato se o dispositivo legal versasse sobre o recebimento seria de todo inútil em face da interrupção da prescrição da pretensão punitiva CP art 117 inc I É fácil notar portanto que nas hipóteses alcançadas pelo dispositivo em apreço CP art 111 inc V a prescrição pode ultrapassar o teto de 20 anos previsto no art 109 inc I do Código Penal Pensemos em um estupro de vulnerável CP art 217A praticado contra criança de cinco anos de idade A pena máxima deste delito 15 anos prescreve em 20 anos Se a denúncia não for ajuizada até a data da sua maioridade terão transcorridos 13 anos e a partir do seu 18º aniversário o Estado contará com mais 20 anos para a imposição da pena privativa de liberdade Em síntese a prescrição ocorrerá em 33 anos E mais Se existir na situação concreta alguma causa impeditiva da prescrição da pretensão punitiva o prazo prescricional não terá início enquanto o impedimento não for superado É o que se dá exemplificativamente na hipótese em que na data do 18º aniversário da vítima o agente encontrarse cumprindo pena no estrangeiro CP art 116 inc II Será preciso aguardar o término da reprimenda para a partir de então iniciarse o decurso da prescrição da pena atinente ao crime contra a dignidade sexual da criança ou do adolescente Se a vítima do crime sexual vier a falecer duas situações devem ser diferenciadas a se a morte ocorrer antes do 18º aniversário a prescrição terá início na data da consumação do delito de natureza sexual regra geral do CP art 111 inc I pois o ofendido jamais alcançará a maioridade Exemplo estupro contra criança de 10 anos que vem a suicidarse cinco anos depois ocasião em que deixa uma carta narrando o crime cometido pelo genitor contra ela e b se a morte ocorrer após o 18º aniversário a prescrição terá se iniciado com o advento da maioridade na forma delineada pelo art 111 inc V do Código Penal Finalmente é importante observar que a regra contida no art 111 inc V do Código Penal incide somente no tocante aos crimes sexuais praticados contra crianças ou adolescentes não se aplicando no âmbito dos demais vulneráveis diversos dos menores de 14 anos elencados pelo parágrafo único do art 217A do Código Penal pessoas com enfermidade ou deficiência mental sem discernimento para o ato ou que por qualquer outra causa não possam oferecer resistência Como regra a Lei 111012005 Lei de Falências estatui em seu art 182 que a prescrição dos crimes nela previstos regerseá pelo Código Penal No tocante ao termo inicial entretanto possui critério diverso o prazo da prescrição começa a correr do dia da decretação da falência da concessão da recuperação judicial ou com a homologação do plano de recuperação extrajudicial Essa disposição somente se aplica à prescrição da pretensão punitiva e jamais à prescrição da pretensão executória que depende do trânsito em julgado da sentença condenatória para ambas as partes do processo penal As hipóteses de interrupção da prescrição da pretensão punitiva foram definidas pelo art 117 I a IV do Código Penal Art 117 O curso da prescrição interrompese I pelo recebimento da denúncia ou da queixa II pela pronúncia III pela decisão confirmatória da pronúncia IV pela publicação da sentença ou acórdão condenatórios recorríveis Os incisos V e VI do art 117 do Código Penal referemse à interrupção da prescrição da pretensão executória Interrupção do prazo significa que verificada a causa legalmente prevista o intervalo temporal volta ao seu início desprezandose o tempo até então ultrapassado Os marcos interruptivos conduzem ao reinício do cálculo É o que consta expressamente do art 117 2º do Código Penal Exemplo se ocorrer uma causa interruptiva relativa a uma pena de 4 quatro anos cuja prescrição se dá em oito anos depois de transcorridos 7 sete anos esse período será desconsiderado e para a extinção da punibilidade exigirseá o decurso de outros 8 oito anos sem a atuação estatal Por se tratar de matéria prejudicial ao réu o rol do art 117 é taxativo não admitindo o emprego da analogia para englobar situações semelhantes não apontadas pela lei Analisemos as causas interruptivas que estabelecem os períodos entre os quais a prescrição pode se efetivar a Recebimento da denúncia ou da queixa Anotese inicialmente que o curso da prescrição da pretensão punitiva é interrompido pelo recebimento da inicial acusatória e não pelo seu oferecimento por parte do Ministério Público ou do querelante A interrupção se dá com a publicação do despacho de recebimento da denúncia ou da queixa Prescindese da veiculação do ato judicial na imprensa oficial ainda que por meio do processo judicial eletrônico Lei 114192007 Basta a publicação do ato em cartório com a entrega do despacho em mãos do escrivão33 A partir da reforma promovida no Código de Processo Penal pela Lei 117192008 o Superior Tribunal de Justiça considera como adequado ao recebimento da denúncia ou queixa o momento previsto no art 396 tão logo oferecida a acusação e antes mesmo da citação do acusado34 Esse recebimento pode ainda ocorrer em 2º grau de jurisdição pois no caso de a denúncia ou queixa ser rejeitada a interrupção ocorrerá na data da sessão de julgamento do recurso em sentido estrito CPP art 581 I ou da apelação Lei 90991995 art 82 caput pelo Tribunal É o que se extrai da Súmula 709 do Supremo Tribunal Federal Salvo quando nula a decisão de primeiro grau o acórdão que provê o recurso contra a rejeição da denúncia vale desde logo pelo recebimento dela A denúncia ou a queixa recebida por juízo absolutamente incompetente não interrompe a prescrição porque esse despacho tem índole de ato decisório aplicandose portanto a regra prevista no art 567 1ª parte do Código de Processo Penal35 A interrupção somente se efetivará com a publicação do despacho do juízo competente ratificando os atos anteriores Por sua vez o recebimento da denúncia ou da queixa por juízo relativamente incompetente interrompe a prescrição Na visão do Superior Tribunal de Justiça Tratandose de incompetência relativa o exame da prescrição da pretensão punitiva deve considerar o recebimento da denúncia realizado pelo Juízo incompetente e não a convalidação posterior do Juízo que detém competência territorial uma vez que este último ato possui natureza declarativa prestandose unicamente a confirmar a validade do primeiro Em outros termos pelo princípio da convalidação o recebimento da denúncia por parte de Juízo territorialmente incompetente tem o condão de interromper o prazo prescricional36 Se o despacho de recebimento da denúncia ou da queixa for posteriormente anulado por qualquer motivo não se interrompe o curso da prescrição pois os atos nulos não produzem efeitos jurídicos O recebimento do aditamento à denúncia ou à queixa não interrompe a prescrição exceto se for acrescentado novo crime quando a interrupção ocorrerá apenas em relação a esse novo delito37 b Pronúncia É a decisão interlocutória mista não terminativa fundada em prova da materialidade do fato delituoso e indícios suficientes de autoria que submete o responsável pela prática de um crime doloso contra a vida a julgamento perante o Tribunal do Júri Consequentemente essa causa de interrupção da prescrição da pretensão punitiva é aplicável somente aos crimes de competência do Tribunal do Júri A interrupção se efetiva com a publicação da sentença de pronúncia que prescinde de publicação na imprensa oficial É suficiente para essa finalidade a publicação da decisão em cartório No caso de o réu ter sido impronunciado interpondose contra a decisão recurso de apelação CPP art 416 ao qual se dá provimento para o fim de pronunciálo a interrupção se dá na data da sessão de julgamento do recurso pelo Tribunal competente E uma vez pronunciado persiste a força interruptiva da prescrição ainda que o Tribunal do Júri no julgamento em plenário desclassifique o crime para outro que não seja de sua competência É o que se extrai da Súmula 191 do Superior Tribunal de Justiça A pronúncia é causa interruptiva da prescrição ainda que o Tribunal do Júri venha a desclassificar o crime c Decisão confirmatória da pronúncia Essa forma de interrupção também é possível apenas nos crimes de competência do Tribunal do Júri e ocorre quando o réu foi pronunciado e contra essa decisão a defesa interpôs recurso em sentido estrito com fundamento no art 581 IV do Código de Processo Penal ao qual foi negado provimento Operase a interrupção na data de sessão de julgamento do recurso pelo Tribunal competente e não na data da publicação do acórdão Essas duas causas interruptivas pronúncia e decisão que a confirma são justificáveis pela amplitude e pela extensão do procedimento dos crimes de competência do Tribunal do Júri fatores que poderiam fomentar artimanhas processuais que levariam à impunidade pela prescrição d Publicação da sentença ou acórdão condenatórios recorríveis No caso da sentença condenatória a interrupção se opera com sua publicação isto é com sua entrega em mãos do escrivão que lavrará nos autos o respectivo termo registrandoa em livro especialmente destinado a esse fim CPP art 389 No tocante ao acórdão condenatório a interrupção se dá com a sessão de julgamento pelo Tribunal competente seja em grau de recurso da acusação seja nas hipóteses de sua competência originária38 Em relação a acórdão em sede recursal cumpre salientar que somente se pode taxálo de condenatório quando a sentença de 1ª instância foi absolutória E aqui surge uma importante pergunta O acórdão confirmatório da condenação funciona como causa interruptiva da prescrição da pretensão punitiva A jurisprudência atual do Supremo Tribunal Federal entende que sim A ideia de prescrição está vinculada à inércia estatal e o acórdão que confirma a sentença condenatória justamente por revelar pleno exercício da jurisdição penal é marco interruptivo do prazo prescricional nos termos do art 117 IV do Código Penal Acrescentese que a decisão proferida pelo Tribunal em sede de apelação substitui a sentença recorrida consoante reiteradamente proclamado em nossa legislação processual art 825 do CPC1939 art 512 do CPC1973 art 1008 do CPC2015 Entendimento firmado à unanimidade pela Primeira Turma39 O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento diverso Nos termos da jurisprudência desta Corte Superior o acórdão que confirma a condenação ainda que majore a pena não constitui marco interruptivo da prescrição40 Se todavia a sentença condenatória foi reformada pelo Tribunal em grau de apelação absolvendo o réu mantémse a interrupção provocada pela publicação da decisão de 1ª instância A sentença anulada não interrompe a prescrição pois repitase um ato nulo não produz efeitos jurídicos O acórdão proferido nas ações penais de competência originária do Supremo Tribunal Federal CF art 102 I b e c nas hipóteses em que não comporta mais nenhum recurso não interrompe a prescrição pois é irrecorrível Finalmente a sentença que aplica medida de segurança pode ou não interromper a prescrição Não interrompe quando impõe medida de segurança ao inimputável pois nesse caso tem natureza absolutória absolvição imprópria Interrompe contudo na hipótese de medida de segurança dirigida ao semiimputável já que a sentença é condenatória o magistrado condena o réu diminui a pena privativa de liberdade de 1 um a 23 dois terços e comprovada sua periculosidade substitui a pena diminuída por medida de segurança Para o art 117 1º do Código Penal 1º Excetuados os casos dos incisos V e VI deste artigo a interrupção da prescrição produz efeitos relativamente a todos os autores do crime Nos crimes conexos que sejam objeto do mesmo processo estendese aos demais a interrupção relativa a qualquer deles A previsão expressa da exceção relativa aos incisos V e VI se fundamenta na circunstância de se tratarem de causas de interrupção da prescrição da pretensão executória O dispositivo legal apresenta duas regras distintas comunicabilidade no concurso de pessoas e comunicabilidade nos crimes conexos que sejam objeto do mesmo processo a Concurso de pessoas Dispõe o texto de lei que a interrupção da prescrição produz efeitos relativamente a todos os autores do crime A palavra autores foi utilizada pelo Código Penal como gênero para englobar tanto coautores como partícipes do crime Fundamentase essa regra no fato de que quando o Estado exerce a persecução relativamente a um dos envolvidos no crime revelou o seu interesse em também efetivála em relação a todos os demais Exemplo A e B são regularmente processados pelo crime de roubo Aquele é condenado e este absolvido O Ministério Público interpõe recurso de apelação objetivando a reforma da sentença somente em relação a B para condenálo Pela regra do art 117 1º 1ª parte do Código Penal o Tribunal deverá considerar a prescrição interrompida para B diante da sentença condenatória recorrível proferida contra A Essa sistemática também se aplica a todas as demais causas interruptivas da prescrição da pretensão punitiva recebimento da denúncia ou queixa pronúncia decisão confirmatória da pronúncia e acórdão condenatório recorrível b Crimes conexos que sejam objeto do mesmo processo Crimes conexos são aqueles que possuem alguma ligação entre si Quando tais crimes forem objeto do mesmo processo digase da mesma ação penal ou seja forem imputados ao réu na mesma denúncia ou na mesma queixa crime a interrupção relativa a qualquer deles estende os seus efeitos aos demais Exemplo A pratica três crimes roubo furto e tráfico de drogas Os delitos são investigados em um único inquérito policial ensejando o oferecimento de denúncia por todos eles Após regular processamento A é condenado pelo roubo e absolvido pelos demais delitos O Ministério Público apela almejando a reforma da sentença na parte relativa às absolvições para o fim de condenar o réu por todos os crimes Pela regra contida no art 117 1º in fine do Código Penal a sentença condenatória recorrível proferida em relação ao roubo interrompe a prescrição desse crime estendendose esse efeito também ao furto e ao tráfico de drogas41 Essa disposição aplicase ainda às demais causas interruptivas da prescrição da pretensão punitiva recebimento da denúncia ou queixa pronúncia decisão confirmatória da pronúncia e publicação do acórdão condenatório recorrível Estatui o art 182 parágrafo único da Lei 111012005 Lei de Falências A decretação da falência do devedor interrompe a prescrição cuja contagem tenha iniciado com a concessão da recuperação judicial ou com a homologação do plano de recuperação extrajudicial As causas impeditivas da prescrição estão disciplinadas pelo art 116 I e II do Código Penal Art 116 Antes de passar em julgado a sentença final a prescrição não corre I enquanto não resolvida em outro processo questão de que dependa o reconhecimento da existência do crime II enquanto o agente cumpre pena no estrangeiro Nada obstante o Código Penal fale em causas impeditivas essas regras se aplicam ao impedimento e à suspensão da prescrição Impedimento é o acontecimento que obsta o início do curso da prescrição De seu turno na suspensão esse acontecimento desponta durante o trâmite do prazo prescricional travando momentaneamente a sua fluência Superado esse entrave a prescrição volta a correr normalmente nela se computando o período anterior Analisemos cada uma das hipóteses indicadas pelo Código Penal Inciso I Enquanto não resolvida em outro processo questão de que dependa o reconhecimento da existência do crime Tratase da questão prejudicial ainda não resolvida em outro processo Questão prejudicial é a que influencia na tipicidade da conduta é dizer aquela cuja solução é fundamental para a existência do crime e consequentemente para o julgamento do mérito da ação penal As questões prejudiciais estão previstas nos arts 92 relativas ao estado civil das pessoas e 93 relativas a questões diversas do Código de Processo Penal O juiz criminal geralmente possui jurisdição para decidir qualquer questão salvo a inerente ao estado civil das pessoas caso em que a ação a penal será obrigatoriamente suspensa até o trânsito em julgado da sentença proferida na ação civil CPP art 92 Destarte o termo inicial da suspensão da prescrição é o despacho que suspende a ação penal e o termo final é o despacho que determina a retomada do seu trâmite O exemplo clássico é o do agente processado por bigamia que no juízo cível busca a anulação de um dos casamentos Se obtiver sucesso não haverá o crime tipificado pelo art 235 do Código Penal Em relação às questões prejudiciais diversas ou seja não atinentes ao estado civil das pessoas CPP art 93 a suspensão da ação penal é facultativa mas se o juiz por ela optar também estará suspensa a prescrição Inciso II Enquanto o agente cumpre pena no estrangeiro Justificase essa causa impeditiva porque normalmente não se consegue a extradição de pessoa que cumpre pena no exterior Em respeito à soberania do outro país aguardase a integral satisfação da sanção penal no estrangeiro para posteriormente ser o agente punido no Brasil Em se tratando de matéria prejudicial ao réu por dificultar a ocorrência da extinção da punibilidade a enumeração das causas suspensivas e interruptivas é taxativa não comportando aplicação analógica Dessa forma é importante ressaltar que a instauração de incidente de insanidade mental versado pelo art 149 do Código de Processo Penal não suspende a prescrição da pretensão punitiva por falta de amparo legal A previsão de causas impeditivas e suspensivas da prescrição da pretensão punitiva não se restringe ao Código Penal podendo ser encontradas nos seguintes diplomas legais Art 89 6º da Lei 90991995 Suspensão condicional do processo nos crimes com pena mínima igual ou inferior a 1 ano em b c d e f que também se opera a suspensão da prescrição Art 366 do CPP Quando o réu citado por edital não comparecer ao interrogatório nem constituir defensor suspendese o processo e a prescrição Art 368 do CPP Estando o acusado no estrangeiro em lugar sabido será citado mediante carta rogatória suspendendose o curso da prescrição até o seu cumprimento Art 53 5º da Constituição Federal A sustação pela Câmara dos Deputados ou pelo Senado Federal dos processos criminais contra Deputado Federal ou Senador suspende a prescrição enquanto durar o mandato Com a modificação introduzida pela EC 352001 o Supremo Tribunal Federal pode receber a denúncia sem licença prévia da Casa respectiva No entanto deve comunicála à Câmara dos Deputados ou ao Senado Federal conforme o caso podendo o Poder Legislativo por iniciativa de partido político nele representado e pelo voto da maioria absoluta de seus membros sustar o andamento da ação suspendendose automaticamente o curso da prescrição Acordo de leniência nos crimes contra a ordem econômica Na forma do art 87 da Lei 125292012 Art 87 Nos crimes contra a ordem econômica tipificados na Lei 8137 de 27 de dezembro de 1990 e nos demais crimes diretamente relacionados à prática de cartel tais como os tipificados na Lei 8666 de 21 de junho de 1993 e os tipificados no art 288 do DecretoLei 2848 de 7 de dezembro de 1940 Código Penal a celebração de acordo de leniência nos termos desta Lei determina a suspensão do curso do prazo prescricional e impede o oferecimento da denúncia com relação ao agente beneficiário da leniência Crimes contra a ordem tributária Nesses delitos a suspensão da prescrição pode ocorrer em diversas hipóteses entre elas a do parcelamento do débito tributário que importa na suspensão da a b c prescrição da pretensão punitiva com fundamento no art 83 2º e 3º da Lei 94301996 com a redação que lhe foi conferida pela Lei 123822011 Para o Supremo Tribunal Federal nos crimes materiais contra a ordem tributária Lei 81371990 art 1º o lançamento do tributo pendente de decisão definitiva do processo administrativo importa na falta de justa causa para a ação penal suspendendo porém o curso da prescrição enquanto obstada a sua propositura pela falta do lançamento definitivo42 Para o Supremo Tribunal Federal a suspensão processual prevista no art 1035 5º do Código de Processo Civil Reconhecida a repercussão geral o relator no Supremo Tribunal Federal determinará a suspensão do processamento de todos os processos pendentes individuais ou coletivos que versem sobre a questão e tramitem no território nacional produz efeitos nos processos penais cuja matéria tenha sido objeto de repercussão geral reconhecida pela Corte Destarte enquanto não julgado o recurso extraordinário paradigma é possível a suspensão da prescrição da pretensão punitiva de crimes ou contravenções penais objeto das ações penais sobrestadas com as seguintes características fundamentais a suspensão de processamento prevista no 5º do art 1035 do CPC não consiste em consequência automática e necessária do reconhecimento da repercussão geral realizada com fulcro no caput do mesmo dispositivo sendo da discricionariedade do relator do recurso extraordinário paradigma determinála ou modulála a possibilidade de sobrestamento se aplica aos processos de natureza penal nesse contexto em sendo determinado o sobrestamento de processos de natureza penal operase automaticamente a suspensão da prescrição da pretensão punitiva relativa aos crimes d e f que forem objeto das ações penais sobrestadas a partir de interpretação conforme a Constituição Federal do art 116 inc I do Código Penal em nenhuma hipótese o sobrestamento de processos penais determinado com fundamento no art 1035 5º do CPC abrangerá inquéritos policiais ou procedimentos investigatórios conduzidos pelo Ministério Público em nenhuma hipótese o sobrestamento de processos penais determinado com fundamento no art 1035 5º do CPC abrangerá ações penais em que haja réu preso provisoriamente em qualquer caso de sobrestamento de ação penal determinado com fundamento no art 1035 5º do CPC poderá o juízo de piso no curso da suspensão proceder conforme a necessidade à produção de provas de natureza urgente Na visão do Supremo Tribunal Federal a suspensão do prazo prescricional para a resolução de questão externa prejudicial ao reconhecimento do crime abrange a hipótese de suspensão do prazo prescricional nos processos criminais com repercussão geral reconhecida Se não bastasse a interpretação conforme a Constituição Federal do art 116 inc I do Código Penal se fundamenta nos princípios da unidade e da concordância prática das normas constitucionais O legislador ao impor a suspensão dos processos sem instituir simultaneamente a suspensão dos prazos prescricionais cria o risco de erigir sistema processual que vulnera a eficácia normativa e a aplicabilidade imediata de princípios constitucionais Além disso o sobrestamento de processo criminal sem previsão legal de suspensão do prazo prescricional impede o exercício da pretensão punitiva pelo Ministério Público e gera desequilíbrio entre as partes Desse modo fere a prerrogativa institucional do parquet e o postulado da paridade de armas violando os princípios do contraditório e do devido processo legal Para a Suprema Corte o princípio da proporcionalidade opera tanto na esfera de proteção contra excessos estatais quanto na proibição de proteção deficiente vertente esta que seria flagrantemente violada pelo obstáculo intransponível à proteção de direitos fundamentais da sociedade de impor sua ordem penal Destacouse que a interpretação conforme a Constituição segundo os limites reconhecidos pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal encontrase preservada A exegese proposta não implica violação à expressão literal do texto infraconstitucional tampouco à vontade do legislador considerando a opção legislativa que fixou todas as hipóteses de suspensão da prescrição da pretensão punitiva previstas no ordenamento jurídico nacional qual seja a superveniência de fato impeditivo da atuação do Estado acusador Aduziu que o sobrestamento de processos penais determinado em razão da adoção da sistemática da repercussão geral não abrangerá inquéritos policiais ou procedimentos investigatórios conduzidos pelo Ministério Público O 5º do art 1035 do CPC prevê apenas a possibilidade de suspensão dos processos pendentes que versarem sobre a questão debatida e tramitarem no território nacional não ostentando os mencionados expedientes de investigação a natureza jurídica de processo e sim de procedimento Acrescentou que o sobrestamento de processos penais determinado em razão da adoção da sistemática da repercussão geral tampouco abrangerá ações penais em que haja réu preso provisoriamente Não se mostra admissível sob pena de ampliação injustificada do período de restrição do direito de liberdade do acusado que a segregação processual perdure enquanto estiver suspenso o curso da marcha processual e do prazo prescricional concernente às infrações penais cogitadas Finalmente registrouse que em qualquer caso de sobrestamento de ação penal determinado com fundamento no art 1035 5º do Código de Processo Civil o juízo de piso poderá a partir de aplicação analógica do disposto no art 92 caput do Código de Processo Penal autorizar no curso da suspensão a produção de provas de natureza urgente43 Em que pese a força desta decisão e a inquestionável utilidade da sua aplicação prática ousamos discordar do Supremo Tribunal Federal por uma razão muito simples a suspensão da prescrição é matéria prejudicial ao acusado pois retarda ou inviabiliza a extinção da punibilidade 46102 Portanto somente lei em sentido formal cuidando expressamente desse tema seria capaz de criar de modo legítimo nova causa suspensiva da prescrição da pretensão punitiva em obediência ao princípio da taxatividade compreendido como fundamento jurídico do princípio da reserva legal CF art 5º inc XXXIX e CP art 1º De fato não se pode utilizar no Direito Penal por analogia in malam partem um dispositivo do Código de Processo Civil para criar embaraço à prescrição As regras estruturantes do sistema penal devem ser preservadas Prescrição superveniente intercorrente ou subsequente É a modalidade de prescrição da pretensão punitiva não há trânsito em julgado para ambas as partes que se verifica entre a publicação da sentença condenatória recorrível44 e seu trânsito em julgado para a defesa45 Daí seu nome superveniente ou seja posterior à sentença Depende do trânsito em julgado para a acusação no tocante à pena imposta seja pela não interposição de recurso seja pelo seu improvimento Portanto é possível falar em prescrição intercorrente ainda que sem trânsito em julgado para a acusação quando tenha recorrido o Ministério Público ou o querelante sem pleitear o aumento da pena exemplo modificação do regime prisional Além disso admitese também a prescrição intercorrente quando o recurso da acusação visa ao aumento da pena mas mesmo com o seu provimento e considerandose a pena imposta pelo Tribunal ainda assim tenha decorrido o prazo prescricional Exemplo a pena do furto simples foi fixada em 1 um ano O Ministério Público recorre requerendo seja a reprimenda elevada para 2 dois anos Ainda que obtenha êxito o prazo da prescrição permanecerá inalterado em 4 quatro anos É calculada com base na pena concreta Nos termos da Súmula 146 do Supremo Tribunal Federal A prescrição da ação penal regulase pela pena concretizada na sentença quando não há recurso da acusação De fato se a sentença condenatória aplicou uma pena ao réu e contra ela não foi interposto recurso ou se o foi negouse provimento o Tribunal não pode agravar a situação do condenado em recurso exclusivo da defesa como determina o art 617 do Código de Processo Penal ao consagrar o princípio da non reformatio in pejus Com efeito a pena imposta na sentença é a mais grave que o réu pode suportar Pode ser mantida diminuída ou mesmo suprimida no julgamento de seu eventual recurso Logo o Estado deve fazer com que seja cumprida no prazo a ela correspondente e não mais levando em conta a pena máxima em abstrato Lembrese do raciocínio formulado no item 461012 Portanto em um crime de furto simples CP art 155 caput a prescrição da pretensão punitiva calculada sobre a pena máxima ocorre em 8 oito anos Se entretanto foi aplicada a pena mínima isto é 1 um ano e a sentença condenatória transitou em julgado para a acusação a prescrição intercorrente será com base nela calculada verificandose em 4 quatro anos A prescrição intercorrente começa a fluir com a publicação da sentença condenatória recorrível embora condicionada ao trânsito em julgado para a acusação Em suma depende do trânsito em julgado para o Ministério Público 1 2 ou para o querelante mas com esse pressuposto seu prazo inicial retroage à data da publicação do decreto condenatório A prescrição superveniente pode ocorrer por dois motivos 1 demora em se intimar o réu da sentença isto é ultrapassase o prazo prescricional e o réu ainda não foi dela intimado CPP art 392 ou 2 demora no julgamento do recurso de defesa ou seja o réu foi intimado recorreu superouse o prazo da prescrição e o Tribunal ainda não apreciou o seu recurso A prescrição superveniente não pode ser decretada na própria sentença condenatória em face da ausência do trânsito em julgado para a acusação ou do improvimento do seu recurso Depois do trânsito em julgado para a acusação seja com o decurso in albis do prazo recursal seja com o improvimento do seu recurso pelo Tribunal há duas posições acerca do momento adequado para o seu reconhecimento Pode ser reconhecida exclusivamente pelo Tribunal pois o magistrado de 1ª instância ao proferir a sentença esgota a sua atividade jurisdicional Essa posição extremamente conservadora é custosa e demorada pois obriga o réu a recorrer somente para que seja decretada a prescrição Pode ser decretada em 1º grau de jurisdição por se tratar de matéria de ordem pública a qual pode ser reconhecida de ofício a qualquer 46103 tempo CPP art 61 caput É o entendimento do Superior Tribunal de Justiça46 Na hipótese em que a pena imposta pela sentença de 1ª instância for reduzida pelo Tribunal a prescrição superveniente entre a sentença e o acórdão deve ser calculada com base na pena aplicada pela sentença condenatória a teor da regra prevista no art 110 1º do Código Penal Esse raciocínio fica ainda mais reforçado com a eventual existência de recurso especial ou extraordinário ajuizado pela acusação contra o acórdão que diminui a reprimenda utilizada como parâmetro para o cômputo prescricional47 Prescrição retroativa Damásio E de Jesus informa ter ocorrido em 12 de junho de 1946 nos autos do HC 29370 rel Min Castro Nunes a pioneira manifestação do Supremo Tribunal Federal sobre o que iria posteriormente se transformar na prescrição retroativa Se o art 109 depois de assentar o princípio de que a prescrição da ação é a que ocorre antes do trânsito em julgado da sentença final admite uma exceção a do parágrafo único do art 110 parece claro que a exceção se refere à prescrição do procedimento penal A razão do dispositivo legal é óbvia se pelo recurso do réu não seria possível uma reformatio in pejus a fixação da pena se torna definitiva como se fora a pena cominada na lei48 A prescrição retroativa espécie da prescrição da pretensão punitiva não há trânsito em julgado da condenação para ambas as partes é calculada pela pena concreta ou seja pela pena aplicada na sentença condenatória49 É o que se extrai do art 110 1º do Código Penal50 e também da Súmula 146 do Supremo Tribunal Federal A prescrição da ação penal regulase pela pena concretizada na sentença quando não há recurso da acusação Depende contudo do trânsito em julgado da sentença condenatória51 para a acusação no tocante à pena imposta seja pela não interposição do recurso cabível no prazo legal seja pelo fato de ter sido improvido seu recurso Se a sentença condenatória aplicou determinada pena ao réu contra a qual não foi interposto recurso ou se o foi negouse provimento a instância superior não pode agravar a situação do condenado em recurso exclusivo da defesa como determina o art 617 do Código de Processo Penal ao consagrar o princípio da non reformatio in pejus Assim sendo a pena concretizada na sentença é a mais grave a ser suportada pelo réu pois pode ser mantida diminuída ou mesmo suprimida no julgamento de seu eventual recurso O Estado deve fazer com que a pena seja cumprida no prazo a ela correspondente e não mais levando em conta a pena máxima em abstrato Recordese uma vez mais do raciocínio firmado no item 461012 Portanto em um crime de furto simples CP art 155 caput a prescrição da pretensão punitiva calculada sobre a pena máxima ocorre em 8 oito anos Se entretanto foi aplicada a pena mínima 1 ano e a sentença condenatória transitou em julgado para a acusação a prescrição retroativa será com base nela calculada verificandose em 4 quatro anos A prescrição retroativa começa a correr a partir da publicação da sentença ou acórdão condenatório desde que é evidente haja transitado em julgado para a acusação ou ao seu recurso tenha sido negado provimento a b c Justificase seu nome retroativa pelo fato de ser contada da sentença ou acórdão condenatórios para trás Desta forma no campo dos crimes em geral a prescrição retroativa pode ocorrer entre a publicação da sentença ou acórdão condenatórios e o recebimento da denúncia ou queixa Já nos crimes de competência do Tribunal do Júri a prescrição retroativa pode se verificar entre a publicação da sentença ou acórdão condenatório52 e a decisão confirmatória da pronúncia entre a decisão confirmatória da pronúncia e a pronúncia entre a pronúncia e o recebimento da denúncia ou queixa A Lei 122342010 responsável pela atual redação do art 110 do Código Penal promoveu diversas modificações no âmbito da prescrição notadamente na seara da prescrição retroativa Sua finalidade precípua a teor do seu art 1º consistia na eliminação da prescrição retroativa Aliás esta espécie de prescrição é criação genuinamente brasileira introduzida em nosso Direito Penal na década de 1960 por diversos julgados que culminaram na edição da Súmula 146 do Supremo Tribunal Federal e posteriormente sacramentada no revogado 2º do art 110 do Código Penal nos moldes da redação conferida pela Reforma da Parte Geral do Código Penal pela Lei 7209198453 Entretanto seja por ausência de técnica legislativa seja por manobra de bastidores54 não se operou a total eliminação da prescrição retroativa como pretendia o art 1º da Lei 122342010 De fato o art 110 1º e único do Código Penal passou a apresentar a seguinte redação 1º A prescrição depois da sentença condenatória com trânsito em julgado para a acusação ou depois de improvido seu recurso regulase pela pena aplicada não podendo em nenhuma hipótese ter por termo inicial data anterior à da denúncia ou queixa Notase facilmente a sobrevivência da prescrição retroativa na fase processual ou seja após o oferecimento da denúncia ou queixa Mas não se pode reconhecer a prescrição retroativa na fase investigatória isto é no período compreendido entre a data do fato e o oferecimento da inicial acusatória Em síntese a Lei 122342010 promoveu a extinção parcial da prescrição retroativa55 Mas qual foi o fundamento desta opção legislativa A investigação criminal desacompanhada de acusação formal e de cunho extraprocessual não é processo e sim procedimento comporta dilação temporal mais ampla orientada somente pelo máximo da pena privativa de liberdade em abstrato Com efeito não há falar em imprescritibilidade penal no período anterior ao recebimento da denúncia ou queixa pois continua a incidir normalmente a prescrição da pretensão punitiva propriamente dita prescrição da ação como castigo à inércia estatal Por essa razão não há espaço para a prescrição retroativa na fase investigatória De seu turno com o oferecimento da denúncia ou queixa tem início a ação penal impondose um ônus ao imputado em face da acusação formal contra ele endereçada A lentidão em seu trâmite ofende um direito fundamental consistente na razoável duração do processo CF art 5º LXXVIII e é sancionada com a prescrição retroativa A nova redação do 1º do art 110 do Código Penal poderia ter sido mais precisa Com efeito ao invés de falar em data anterior ao recebimento da denúncia ou queixa como fez o art 117 I do Código Penal falou em data anterior à denúncia ou queixa o que autoriza a conclusão no sentido de referirse ao oferecimento ou seja ao ajuizamento da denúncia ou queixa Portanto existem duas datas importantes relacionadas à prescrição a a do oferecimento da denúncia ou queixa destinada a impedir a prescrição retroativa em data anterior a esse fato CP art 110 1º in fine e b a do 46104 recebimento da denúncia ou queixa voltada à interrupção do prazo prescricional CP art 117 I A prescrição retroativa jamais pode ser reconhecida na própria sentença condenatória em face da ausência de um pressuposto fundamental o trânsito em julgado para a acusação ou o improvimento do seu recurso Depois do trânsito em julgado para a acusação seja com o decurso in albis do prazo recursal seja com o improvimento do seu recurso pelo Tribunal há duas posições acerca do momento adequado para a decretação da prescrição retroativa 1ª posição Pode ser reconhecida exclusivamente pelo Tribunal pois o magistrado de 1ª instância ao proferir a sentença exaure sua função jurisdicional Essa posição extremamente conservadora é custosa e demorada pois obriga o réu a recorrer somente para que seja decretada a prescrição 2ª posição Pode ser decretada em 1º grau de jurisdição pelo juízo sentenciante ou pelo juízo da execução por se tratar de matéria de ordem pública a qual pode ser reconhecida de ofício a qualquer tempo CPP art 61 caput É a posição consagrada no Superior Tribunal de Justiça56 Prescrição da pretensão executória ou prescrição da condenação É a perda em razão da omissão do Estado durante determinado prazo legalmente previsto do direito e do dever de executar uma sanção penal definitivamente aplicada pelo Poder Judiciário A prescrição da pretensão executória da pena privativa de liberdade é calculada com base na pena concreta fixada na sentença ou no acórdão pois já existe trânsito em julgado da condenação para a acusação e para a defesa É o que consta da Súmula 604 do Supremo Tribunal Federal A prescrição pela pena em concreto é somente da pretensão executória da pena privativa de liberdade Em consonância com o raciocínio esposado no item 461012 o Estado não tem mais a expectativa de aplicação da pena máxima em abstrato pois o seu limite para execução é o da pena definitiva Deve portanto exercer o direito de punir dentro do prazo correlato à pena concreta pois depois não mais poderá fazêlo Na hipótese de reincidência devidamente reconhecida na sentença ou no acórdão o prazo prescricional aumentase de um terço CP art 110 caput Esse aumento é aplicável exclusivamente à prescrição da pretensão executória A propósito estabelece a Súmula 220 do Superior Tribunal de Justiça A reincidência não influi no prazo da prescrição da pretensão punitiva E na forma do art 113 do Código Penal No caso de evadirse o condenado ou de revogarse o livramento condicional a prescrição é regulada pelo tempo que resta da pena Esse dispositivo consagra o princípio penal segundo o qual pena cumprida é pena extinta57 Com efeito se o condenado já cumpriu parte do débito correspondente à infração penal por ele cometida o Estado não tem mais o poder de executála Por conseguinte esse período não pode ser computado no cálculo prescricional Estatui o art 112 do Código Penal Art 112 No caso do art 110 deste Código a prescrição começa a correr I do dia em que transita em julgado a sentença condenatória para a acusação ou a que revoga a suspensão condicional da pena ou o livramento condicional II do dia em que se interrompe a execução salvo quando o tempo da interrupção deva computarse na pena Esse dispositivo consagra três critérios dois no inciso I e outro no inciso II Vejamos 1º critério Do dia em que transita em julgado a sentença condenatória para a acusação Essa regra se afigura contraditória mas é extremamente favorável ao réu De fato a prescrição da pretensão executória depende do trânsito em julgado para ambas as partes mas a partir do momento em que isso ocorre seu termo inicial retroage ao trânsito em julgado para a acusação É o que se infere do art 112 I 1ª parte do Código Penal Na visão do Superior Tribunal de Justiça A possibilidade de ocorrência da prescrição da pretensão executória surge somente com o trânsito em julgado da condenação para ambas as partes Isso porque o título penal executório surge a partir da sentença condenatória definitiva isto é com o trânsito em julgado para acusação e defesa quando também surgirá a possibilidade de ocorrência da prescrição executória Antes do trânsito em julgado para ambas as partes eventual prescrição será da pretensão punitiva Todavia esse entendimento não altera o termo inicial da contagem do lapso prescricional o qual começa da data em que a condenação transitou em julgado para a acusação conforme dispõe expressamente o art 112 I do CP58 A opção do legislador foi infeliz Para ilustrar nosso raciocínio pensemos em um exemplo Após o regular trâmite da ação penal a sentença condenatória aplica a pena de um ano de reclusão A acusação não apela daí sobrevindo para ela o trânsito em julgado da condenação A defesa contudo interpõe recurso de apelação o qual demora três anos para ser julgado Diante do seu caráter meramente protelatório o Tribunal nega provimento ao recurso e a sentença condenatória transita em julgado para a defesa A partir desse momento é viável o reconhecimento da prescrição da pretensão executória Como seu início retroage à data do trânsito em julgado para a acusação estará faltando somente um ano para a extinção da punibilidade uma vez que já se passaram 3 anos desde tal data É fácil notar portanto que o legislador criou um sistema destinado a favorecer o acusado inclusive com o estímulo à impunidade De fato não há coerência em condicionar a prescrição da pretensão executória ao trânsito em julgado para ambas as partes do processo penal e com o seu advento retroagir o termo inicial à data do trânsito em julgado para a acusação Como já decidido pelo Supremo Tribunal Federal O entendimento defensivo de que a prescrição da pretensão executória se inicia com o trânsito em julgado para a acusação viola o direito fundamental à inafastabilidade da jurisdição que pressupõe a existência de uma tutela jurisdicional efetiva ou melhor uma justiça efetiva A verificação em concreto de manobras procrastinatórias como sucessiva oposição de embargos de declaração e a renúncia do recorrente ao cargo de prefeito que ocupava apenas reforça a ideia de que é absolutamente desarrazoada a tese de que o início da contagem do prazo prescricional deve se dar a partir do trânsito em julgado para a acusação Em verdade tal entendimento apenas fomenta a interposição de recursos com fim meramente procrastinatório frustrando a efetividade da jurisdição penal59 Em que pese nosso inconformismo amparado inclusive em julgado do Supremo Tribunal Federal é preciso reconhecer que o criticado termo inicial da prescrição da pretensão executória favorável ao réu somente poderá ser alterado pelo legislador sob pena de caracterização da analogia in malam partem em face do teor do art 112 I 1ª parte do Código Penal 2º critério Do dia da revogação da suspensão condicional da pena ou do livramento condicional Com a revogação do sursis ou do livramento condicional o juiz determina a b a prisão do condenado A partir de então o Estado tem um prazo legalmente previsto para executar a pena imposta CP art 112 I in fine Recordese que com a revogação do sursis o condenado deverá cumprir integralmente a pena que lhe foi aplicada e com base nela será calculada a prescrição da pretensão executória Já em relação ao livramento condicional a revogação pode considerar ou não o tempo em que esteve solto o condenado CP art 88 É com amparo na pena total ou em seu restante que deverá ser aferida a prescrição da pretensão executória 3º critério Do dia em que se interrompe a execução salvo quando o tempo da interrupção deva computarse na pena Esse critério previsto no art 112 II do Código Penal abrange as seguintes situações Fuga do condenado no regime fechado ou semiaberto abandono do regime aberto ou descumprimento das penas restritivas de direitos a prescrição começa a correr a partir da data da evasão do abandono ou do descumprimento calculandose em conformidade com o restante da pena Lembrese pena cumprida é pena extinta Superveniência de doença mental disciplinada pelo art 41 do Código Penal Interrompese a execução mas esse período de interrupção é computado como cumprimento da pena pois o condenado foi acometido de doença mental necessitando de transferência para hospital de custódia e tratamento psiquiátrico ou à falta a outro estabelecimento adequado As causas de interrupção da prescrição da pretensão executória estão previstas no art 117 V e VI do Código Penal Art 117 O curso da prescrição interrompese V pelo início ou continuação do cumprimento da pena VI pela reincidência Existem pois três causas interruptivas da prescrição da pretensão executória Passemos à análise 1ª causa Início do cumprimento da pena Com a condenação ordenase o início do cumprimento da pena e quando isso efetivamente ocorre interrompese a prescrição da pretensão executória 2ª causa Continuação do cumprimento da pena O cumprimento da pena foi interrompido normalmente pela fuga ou ainda por outro motivo que possa se apresentar Quando o condenado é recapturado interrompese novamente o prazo prescricional 3ª causa Reincidência Nesse ponto é importante adotar redobrada cautela a reincidência antecedente ou seja aquela que já existia por ocasião da condenação aumenta em 13 o prazo da prescrição da pretensão executória enquanto a reincidência subsequente posterior à condenação transitada em julgado interrompe o prazo prescricional já iniciado Operase a interrupção com a prática do crime embora condicionada ao trânsito em julgado da condenação Consoante o ensinamento de Antonio Rodrigues Porto O réu será considerado reincidente quando passar em julgado a condenação pelo segundo crime mas o momento da interrupção da prescrição relativamente à condenação anterior é o dia da prática do novo crime e não a data da respectiva sentença A eficácia desta retroage para esse efeito à data em que se verificou o segundo delito60 Destarte se for absolvido pelo crime posterior não será interrompida a prescrição da pretensão executória Existe contudo posição em sentido contrário como decorrência do princípio da presunção de não culpabilidade CF art 5º LVII a interrupção deve ocorrer somente a partir do trânsito em julgado da condenação pelo segundo crime O art 117 1º 1ª parte do Código Penal impõe expressamente a incomunicabilidade das causas interruptivas da prescrição da pretensão executória Excetuados os casos dos incisos V e VI deste artigo a interrupção da prescrição produz efeitos relativamente a todos os autores do crime Fundamentase essa opção na natureza personalíssima dessas causas interruptivas intransmissíveis aos coautores e partícipes da infração penal De fato alguém iniciou o cumprimento da pena ou continuou a cumprila ou é reincidente e tais situações não são comunicáveis a qualquer outra pessoa Dispõe o art 116 parágrafo único do Código Penal Depois de passada em julgado a sentença condenatória a prescrição não corre durante o tempo em que o condenado está preso por outro motivo Se o Estado ainda não pode exigir do condenado o cumprimento da pena porque ele está preso por outro motivo não seria correto nem justo impossibilitálo de exercer no futuro seu direito de punir Sua omissão não é voluntária mas compulsória61 E em consonância com a orientação do Supremo Tribunal Federal embora o Código Penal não considere de forma explícita a suspensão condicional da pena sursis e o livramento condicional como causas impeditivas da prescrição da pretensão executória esse efeito deflui da lógica do sistema vigente62 46105 Quando o indulto não funciona como causa extintiva da punibilidade limitandose somente a diminuir a pena comutação da pena irradia efeitos sobre o cálculo da prescrição da pretensão executória que agora deve respeitar a nova sanção penal63 Prescrição virtual projetada antecipada prognostical ou retroativa em perspectiva Tratase de construção doutrinária e jurisprudencial Decretase a extinção da punibilidade com fundamento na perspectiva de que mesmo na hipótese de eventual condenação inevitavelmente ocorrerá a prescrição retroativa Vejamos um exemplo A pratica um crime de furto simples CP art 155 caput no dia 10 de outubro de 2008 A vítima comparece à Delegacia de Polícia levando a notitia criminis que resulta na instauração de inquérito policial para apuração do fato O procedimento investigatório é relatado e encaminhado ao Fórum O Ministério Público oferece denúncia que vem a ser recebida em 10 de dezembro de 2008 O trâmite processual entretanto é extremamente lento e a audiência de instrução e julgamento é designada para a data de 20 de novembro de 2015 Nos debates em audiência o membro do Parquet analisando a folha de antecedentes do réu verifica tratarse de pessoa primária e sem antecedentes criminais sendolhe favoráveis as circunstâncias judiciais ou inominadas elencadas no art 59 caput do Código Penal Na hipótese narrada não se operou a prescrição da pretensão punitiva propriamente dita prescrição da ação pois a pena máxima em abstrato do crime de furto simples é de 4 quatro anos e entre a data do recebimento da denúncia e a provável publicação da sentença condenatória recorrível ainda não se passaram 8 oito anos Desse modo o magistrado não teria razões legais para declarar a extinção da punibilidade em face da prescrição CP art 107 IV 1ª figura Todavia o Promotor de Justiça faz o seguinte raciocínio é razoável prosseguir na ação penal ciente de que somente se evitará a prescrição retroativa com a aplicação da pena privativa de liberdade em seu patamar máximo quando a situação real diminuta gravidade do crime e circunstâncias judiciais favoráveis do agente indica caminho contrário De fato somente a pena máxima seria apta a impedir a ocorrência da prescrição retroativa entre o recebimento da denúncia e a publicação da sentença condenatória recorrível e o caso concreto apresenta motivos suficientes para fazer acreditar que a reprimenda se condenado o réu dificilmente ultrapassaria o limite mínimo legalmente previsto Relevante parcela da doutrina é favorável à adoção prática dessa espécie de prescrição por dois motivos ausência de interesse de agir e economia processual Não existiria utilidade na ação penal pois irremediavelmente ocorreria a prescrição retroativa tornando inócuo o seu emprego Ademais seria despropositado gastar tempo dos operadores da Justiça e principalmente dinheiro público com um processo penal fadado a ter reconhecida a extinção da punibilidade Advirtase contudo que mesmo para os que aceitam essa construção científica é necessário agir com bomsenso O réu não tem antecipadamente o direito de receber a pena mínima Portanto é equivocado desejar a incidência da prescrição antecipada quando com a pena rasa estaria extinta a punibilidade Em verdade só há falar nessa espécie de prescrição quando exclusivamente a pena máxima ou algo dela muito próximo seria capaz de evitar a extinção da punibilidade O Supremo Tribunal Federal entretanto não admite essa espécie fictícia de prescrição Não se admite a denominada prescrição em perspectiva haja vista a inexistência de previsão legal do instituto64 Sustenta ainda ser precoce reconhecer a prescrição da pretensão punitiva com suporte na presunção de futura e incerta pena uma vez que no curso da instrução criminal poderiam ser provadas circunstâncias judiciais desfavoráveis ao paciente sem prejuízo da descoberta de novos fatos que poderiam inclusive alterar a tipicidade do fato65 Na mesma direção o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula 438 É inadmissível a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva com fundamento em pena hipotética independentemente da existência ou sorte do processo penal Vale destacar que a modificação do 1º do art 110 do Código Penal pela Lei 122342010 efetuada com a finalidade de impedir a prescrição retroativa em período anterior à denúncia ou queixa tornou extremamente difícil a ocorrência prática da prescrição virtual Como se sabe a prescrição antecipada normalmente se verificava na fase investigatória ou seja entre o fato criminoso e a provável data do recebimento da denúncia ou queixa Subsiste entretanto a possibilidade de reconhecimento da prescrição retroativa na fase judicial isto é entre a publicação da sentença condenatória recorrível e o recebimento da denúncia ou queixa Para os adeptos da prescrição virtual esta brecha abre ensejo para sua constatação durante o desenrolar da ação penal Nos crimes de competência do Tribunal do Júri para os defensores deste instituto também seria possível a prescrição antecipada em três momentos distintos a entre a publicação da sentença condenatória recorrível e a decisão confirmatória da pronúncia b entre a decisão confirmatória da pronúncia e a pronúncia e c entre a pronúncia e o recebimento da denúncia ou queixa 4611 4612 PRESCRIÇÃO DAS PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS Dispõe o parágrafo único do art 109 do Código Penal Aplicamse às penas restritivas de direitos os mesmos prazos previstos para as privativas de liberdade As penas restritivas de direitos por serem substitutivas das privativas de liberdade não têm previsão independente nos preceitos secundários dos tipos penais seguem os mesmos prazos das penas substituídas No tocante à prescrição da pretensão executória de pena restritiva de direitos descumprida pelo condenado o prazo é calculado de acordo com o tempo faltante da pena alternativa aplicada em substituição à pena privativa de liberdade Em sintonia com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça No caso de abandono pelo sentenciado do cumprimento da pena restritiva de direitos prestação de serviços à comunidade a prescrição da pretensão executória será regulada pelo tempo restante do cumprimento da medida substitutiva imposta Com base nesse entendimento a Turma concedeu a ordem para declarar extinta a punibilidade do paciente pela ocorrência da prescrição executória da pena Ao conferir interpretação extensiva ao art 113 do CP decidiuse que o abandono no cumprimento da pena restritiva de direitos pode ser equiparado às hipóteses de evasão e da revogação do livramento condicional previstas no referido artigo uma vez que as situações se assemelham na medida em que há em todos os casos sentença condenatória e o cumprimento de parte da pena pelo sentenciado66 PRESCRIÇÃO E DETRAÇÃO PENAL Discutese se a detração penal CP art 42 consistente no desconto na pena privativa de liberdade do tempo de prisão provisória já cumprida pelo condenado influencia ou não no cálculo da prescrição Para quem admite essa possibilidade fundada na aplicação analógica do art 113 do Código Penal a prescrição deveria ser computada com base no 4613 restante da pena ou seja somente com o tempo ainda não cumprido pelo sentenciado Exemplo A foi condenado a seis anos Provisoriamente antes do trânsito em julgado contudo ficou preso por três anos A prescrição seguindo esse raciocínio deveria ser calculada sobre a pena faltante isto é três anos e não sobre a pena total O Supremo Tribunal Federal inspirado no princípio da estrita legalidade de observância cogente em matéria penal tem posição diversa O art 113 do Código Penal tem aplicação vinculada às hipóteses de evasão do condenado ou de revogação do livramento condicional não se referindo ao tempo de prisão cautelar para efeito do cálculo da prescrição CP Art 113 No caso de evadirse o condenado ou de revogarse o livramento condicional a prescrição é regulada pelo tempo que resta da pena67 Em síntese o cálculo da prescrição deve observar a pena aplicada a pena concretizada no título executivo judicial sem diminuirse o período em que o réu esteve provisoriamente sob a custódia do Estado detração penal PRESCRIÇÃO DAS MEDIDAS DE SEGURANÇA As medidas de segurança qualquer que seja sua espécie podem ser aplicadas aos inimputáveis CP art 26 caput ou aos semiimputáveis CP art 26 parágrafo único quando comprovada a periculosidade e o condenado necessitar de especial tratamento curativo Submetemse em qualquer hipótese ao instituto da prescrição68 No tocante aos semiimputáveis a prescrição segue a sistemática inerente às penas privativas de liberdade uma vez que leva em conta a pena diminuída aplicada com a condenação e depois substituída por medida de segurança CP art 98 Existe uma sentença condenatória concreta apta a servir de parâmetro para o cálculo do prazo prescricional A questão é diversa porém em relação aos inimputáveis Destacamse duas posições acerca do tema 1ª posição É possível somente a prescrição da pretensão punitiva com 4614 base na pena máxima em abstrato e jamais a prescrição da pretensão executória porque esta última exige a imposição de pena concreta o que não se dá na medida de segurança aplicada ao inimputável Depois de atribuída a medida de segurança se o inimputável não for encontrado imediatamente pela fuga ou qualquer outra causa mas só depois de superado seu prazo mínimo o correto é analisar se subsiste ou não a periculosidade do agente que legitimou a sanção penal Em caso positivo deve ser executada Em caso negativo declarase sua extinção 2ª posição Podem ocorrer ambas as espécies de prescrição da pretensão punitiva e da pretensão executória calculandose as duas em conformidade com a pena máxima em abstrato69 É o entendimento consolidado no Supremo Tribunal Federal70 e também no Superior Tribunal de Justiça A prescrição da medida de segurança imposta em sentença absolutória imprópria é regulada pela pena máxima abstratamente prevista para o delito O CP não cuida expressamente da prescrição de medida de segurança mas essa é considerada uma espécie do gênero sanção penal Assim considerada sujeitase às regras previstas no CP relativas aos prazos prescricionais e às diversas causas interruptivas da prescrição O STF já se manifestou nesse sentido ao entender que incide o instituto da prescrição na medida de segurança estipulando que é espécie do gênero sanção penal e se sujeita por isso mesmo à regra contida no artigo 109 do Código Penal RHC 86888SP 1ª Turma DJ de 2122005 Esta Corte Superior por sua vez já enfrentou a questão também considerando a medida de segurança como espécie de sanção penal e portanto igualmente sujeita à prescrição e suas regras assentando ainda que o lapso temporal necessário à verificação da referida causa de extinção da punibilidade deve ser encontrado tendo como referência a pena máxima abstratamente prevista para o delito71 PRESCRIÇÃO E ABSORÇÃO DE PENAS O art 118 do Código Penal estabelece expressamente que as penas mais leves prescrevem com as mais graves 4615 A comparação de gravidade é a seguinte a pena privativa de liberdade é a mais grave enquanto mais leves são as restritivas de direitos e a multa Como sustentam Zaffaroni e Pierangeli Razões doutrinárias e muito especialmente de política criminal determinaram a solução legal Aliás seria incompreensível que o Estado em razão do tempo se conformasse com a não execução de uma pena de maior intensidade e determinasse a continuação da prescrição de penas mais leves72 O dispositivo é absolutamente dispensável para as penas restritivas de direitos as quais por serem substitutivas necessariamente prescrevem no mesmo prazo das penas privativas de liberdade substituídas Aliás isso já consta do art 109 parágrafo único do Código Penal Cumpre frisar no entanto que na hipótese de serem aplicadas simultaneamente uma pena privativa de liberdade e outra restritiva de direitos como admitem diversos crimes tipificados pelo Código de Trânsito Brasileiro Lei 95031997 arts 302 a 304 e 306 a 308 com a prescrição daquela a esta não se reservará melhor sorte No campo da pena de multa o art 114 II do Código Penal previu regra específica mas com o mesmo propósito da ora em análise Deve ser destacado porém que esse critério não tem incidência na seara do concurso de crimes em que a pena de cada delito prescreve isoladamente CP art 119 PRESCRIÇÃO NO CONCURSO DE CRIMES Conforme emana do art 119 do Código Penal No caso de concurso de crimes a extinção da punibilidade incidirá sobre a pena de cada um isoladamente Esse dispositivo é aplicável ao concurso material ao concurso formal e ao crime continuado73 Em relação ao concurso material caracterizado quando o agente mediante duas ou mais condutas pratica dois ou mais crimes idênticos ou não o art 69 caput do Código Penal acolheu o sistema do cúmulo material é dizer somamse as penas de todos os crimes No que concerne à prescrição a extinção da punibilidade deve ser analisada sobre a pena de cada um dos delitos isoladamente e não sobre a pena final resultante da soma das reprimendas cabíveis a cada um dos crimes Exemplo A pratica três crimes É condenado a 12 anos de reclusão 2 dois anos pelo primeiro delito 4 quatro anos pelo segundo e 6 seis anos pelo terceiro Para análise da prescrição desconsiderase a pena final O que vale é a pena de cada um dos crimes o primeiro prescreverá em 4 quatro anos o segundo em 8 oito anos e o terceiro em 12 doze anos Concluise assim hipoteticamente falando que após 10 dez anos com a omissão do Estado em executar a pena restará somente a pena de 6 anos atinente ao terceiro crime pois as demais já terão sido atingidas pela prescrição Esse raciocínio igualmente se aplica ao concurso formal impróprio ou imperfeito CP art 70 caput in fine pois nele as penas dos diversos crimes também devem ser somadas Já no que diz respeito ao concurso formal próprio ou perfeito e também ao crime continuado adotouse o sistema da exasperação CP arts 70 caput 1ª parte e 71 caput e parágrafo único pois o magistrado para dosar a pena aplica a inerente a qualquer dos crimes se idênticas ou a mais grave se diversas aumentada de determinado percentual Para o cálculo da prescrição o juiz há de considerar somente a pena inicial isto é a pena derivada de um dos crimes sem o aumento decorrente do concurso formal próprio ou da continuidade delitiva Exemplo B pratica dois crimes de furto qualificado pela destruição de obstáculo à subtração da coisa CP art 155 4º I devendo o segundo pelas condições de tempo local modo de execução e outras semelhantes ser considerado como continuação do primeiro É condenado à pena de 2 dois anos de reclusão com um acréscimo de 4 quatro meses em face da exasperação de 16 por se tratar de crime continuado A sua pena final é de 2 dois anos e 4 quatro meses A extinção da punibilidade ocorrerá em 4 quatro anos pois incide sobre a pena de 2 dois anos desprezandose o aumento decorrente da continuação Nessa linha de entendimento é o teor da Súmula 497 do Supremo 4616 Tribunal Federal Quando se tratar de crime continuado a prescrição regulase pela pena imposta na sentença não se computando o acréscimo decorrente da continuação74 A orientação da súmula também incide em relação ao concurso formal próprio ou perfeito pela identidade de fundamento De fato nas duas modalidades de concurso de crimes o legislador recepcionou para fins de aplicação da pena o sistema da exasperação PRESCRIÇÃO DA PENA DE MULTA A matéria é tratada pelo art 114 do Código Penal Art 114 A prescrição da pena de multa ocorrerá I em dois anos quando a multa for a única cominada ou aplicada75 II no mesmo prazo estabelecido para a prescrição da pena privativa de liberdade quando a multa for alternativa ou cumulativamente cominada ou cumulativamente aplicada Convém fazer a distinção entre a prescrição da pretensão punitiva e a prescrição da pretensão executória da pena pecuniária a Prescrição da pretensão punitiva da pena de multa O art 114 do Código Penal é pacificamente aplicado quando a sanção pecuniária ainda não transitou em julgado para ambas as partes Além disso incidem as causas impeditivas e interruptivas versadas pelos arts 116 I e II e 117 I a IV do Código Penal b Prescrição da pretensão executória Em relação à prescrição da pretensão executória as causas suspensivas e interruptivas são as previstas nas normas da legislação relativa à dívida ativa da Fazenda Pública isto é na Lei 68301980 CP art 51 A causa interruptiva mais importante é o despacho judicial que ordena a citação Lei 68301980 art 8º 2º No tocante ao prazo prescricional há duas correntes 1 2 4617 É de 5 cinco anos pois a Lei 92681996 ao alterar o art 51 do Código Penal determinou que para fins de execução a pena de multa fosse considerada dívida de valor É o mesmo prazo da pena privativa de liberdade se aplicada conjuntamente com esta em obediência ao art 118 do Código Penal pelo qual as penas mais leves prescrevem com as mais graves E se foi a única imposta ao condenado a pena de multa prescreve em 2 dois anos Vale ressaltar qualquer que seja a corrente adotada que a reincidência embora devidamente reconhecida na sentença não aumenta em 13 um terço o prazo da prescrição da pretensão executória da pena de multa Como determina a Súmula 604 do Supremo Tribunal Federal A prescrição pela pena em concreto é somente da pretensão executória da pena privativa de liberdade PRESCRIÇÃO NA LEGISLAÇÃO PENAL ESPECIAL Aplicamse as regras do Código Penal a todas as leis que não possuam tratamento específico acerca da prescrição Extraise essa conclusão do art 12 do Código Penal princípio da convivência das esferas autônomas É o que ocorre por exemplo nos crimes de abuso de autoridade Lei 48981965 nos crimes contra a segurança nacional Lei 71701983 nos crimes contra a economia popular Lei 15211951 nos crimes eleitorais Lei 47371965 nas contravenções penais Decretolei 36881941 nos crimes contra o sistema financeiro nacional Lei 74921986 nos crimes ambientais Lei 96051998 e nos crimes de lavagem de bens direitos e valores Lei 46171 46172 46173 96131998 entre vários outros Lei de Drogas Lei 113432006 Para a conduta prevista no art 28 da Lei 113432006 adquirir guardar ter em depósito transportar ou trazer consigo para consumo pessoal drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar operase em 2 dois anos tanto a prescrição da pretensão punitiva como a prescrição da pretensão executória Nesse sentido dispõe o art 30 da Lei de Drogas Art 30 Prescrevem em 2 dois anos a imposição e a execução das penas observado no tocante à interrupção do prazo o disposto nos arts 107 e seguintes do Código Penal Esse prazo prescricional subsiste no patamar de 2 dois anos Em se tratando de lei especial e portanto de regra específica não se aplica a alteração introduzida no art 109 VI do Código Penal pela Lei 122342010 É o que se extrai da leitura do art 12 do Código Penal As regras gerais deste Código aplicamse aos fatos incriminados por lei especial se esta não dispuser de modo diverso Anotese porém que em relação a todos os demais crimes previstos na Lei 113432006 o instituto da prescrição obedece aos mandamentos do Código Penal Código Penal Militar Decretolei 10011969 A prescrição da pretensão punitiva é regulada pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao delito art 125 caput Por sua vez a prescrição da pretensão executória é calculada pela quantidade de pena imposta a qual será aumentada de um terço se o réu é criminoso habitual ou por tendência art 126 Para a pena de morte o prazo prescricional é de 30 anos art 125 I Prescrição e Estatuto da Criança e do Adolescente As disposições do Código Penal relativas à prescrição são compatíveis 4618 com as medidas socioeducativas tratadas pela Lei 80691990 Estatuto da Criança e do Adolescente pois tais formas de resposta estatal a par de sua natureza preventiva e reeducativa possuem também caráter retributivo e repressivo Nesse sentido a Súmula 338 do Superior Tribunal de Justiça A prescrição penal é aplicável nas medidas socioeducativas Calculase a causa extintiva da punibilidade com base na pena máxima em abstrato cominada ao crime ou contravenção penal correspondente ao ato infracional reduzida pela metade pelo fato de tratarse de pessoa menor de 21 anos de idade76 Essa posição fundamentase no fato de serem as normas gerais do Código Penal aplicáveis subsidiariamente em caso de omissão do Estatuto da Criança e do Adolescente77 FALTA GRAVE NA LEI DE EXECUÇÃO PENAL E PRESCRIÇÃO DE INFRAÇÃO DISCIPLINAR Em face da ausência de norma específica na Lei 72101984 Lei de Execução Penal sobre o tema é constitucional porque mais benéfico ao reeducando o entendimento pelo qual é de 3 três anos o prazo prescricional para a aplicação de sanção disciplinar em razão da prática de falta grave LEP arts 52 e 53 Utilizase analogicamente o disposto no art 109 VI do Código Penal levandose em conta o menor lapso previsto78 E em caso de fuga do condenado do estabelecimento prisional o termo inicial do prazo de prescrição é a data da recaptura tomandose de empréstimo o art 111 III do Código Penal A prescrição antes de transitar em julgado a sentença final começa a correr nos crimes permanentes do dia em que cessou a permanência79 1 2 3 4 5 6 7 8 9 O interesse de punir constituise em monopólio do Estado e matéria de ordem pública inclusive nos crimes de ação privada em que se transfere ao particular unicamente a titularidade para a persecução penal STF AP 584 QOPR rel Min Dias Toffoli Plenário j 10042014 noticiado no Informativo 742 FONTÁN BALESTRA Derecho penal Introducción y parte general 17 ed atual por Guillermo A C Ledesma Buenos Aires Abeledo Perrot 2002 p 639 FARIA Bento Código penal brasileiro comentado Rio de Janeiro Record 1961 v III p 197 BECCARIA Cesare Dos delitos e das penas Trad Lucia Guidicini e Alessandro Berti Contessa São Paulo Martins Fontes 1991 p 85 STF HC 110221RJ rel Min Luiz Fux 1ª Turma j 03122013 noticiado no Informativo 731 No STJ AgRg no REsp 1316912SP rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 18032014 Rcl 4515SP rel Min Maria Thereza de Assis Moura 3ª Seção j 27042011 noticiado no Informativo 470 A única exceção estava no art 118 É imprescritível a pena acessória imposta na sentença ou resultante de condenação Essa regra não foi mantida pela Reforma Penal de 1984 inclusive pela extinção das penas acessórias Nesse diapasão JESUS Damásio E de Novíssimas questões criminais São Paulo Saraiva 1998 p 40 A Constituição Federal de 1988 impôs aos agentes de delitos dessa natureza pela gravidade e repulsividade da ofensa a cláusula de imprescritibilidade para que fique ad perpetuam rei memoriam verberado o repúdio e a abjeção da sociedade nacional à sua prática Jamais podem se apagar da memória dos povos que se pretendam justos os atos repulsivos do passado que permitiram e incentivaram o ódio entre iguais por motivos raciais de torpeza inominável A ausência de prescrição nos crimes de racismo justificase como alerta grave para as gerações de hoje e de amanhã para que se impeça a reinstauração de velhos e ultrapassados conceitos que a consciência jurídica e histórica não mais admitem STF HC 82424RS rel Min Moreira Alves rel p acórdão Min Maurício Corrêa Plenário j 17092003 No campo da injúria 10 11 12 13 14 15 16 17 18 racial CP art 140 3º o Superior Tribunal de Justiça decidiu que tal delito seria mais um no cenário do racismo e portanto sua pena não se submeteria à prescrição AgRg no AREsp 686965DF rel Min Ericson Maranhão Desembargador convocado do TJSP 6ª Turma j 18082015 Não concordamos com essa posição que a propósito não foi acolhida pelo STF nem reiterada pelo STJ Em igual sentido TRIPPO Maria Regina Imprescritibilidade penal São Paulo Juarez de Oliveira 2004 p 94 Para quem admite essa classificação a prescrição se situaria entre os chamados direitos fundamentais de 1ª geração Seria uma liberdade pública negativa consistente na omissão do Estado quanto à intervenção na esfera privada dos cidadãos relativamente à aplicação de uma pena atingida fatalmente pelo decurso do tempo Para um estudo aprofundado das gerações dos direitos humanos BOBBIO Norberto A era dos direitos Trad Carlos Nelson Coutinho Rio de Janeiro Campus 1992 p 5 e ss RE 460971RS rel Min Sepúlveda Pertence 1ª Turma j 13022007 No julgamento do AgRg no AREsp 686965DF rel Min Ericson Maranhão Desembargador convocado do TJSP 6ª Turma j 18082015 o Superior Tribunal de Justiça decidiu que a injúria racial CP art 140 3º seria mais um delito no cenário do racismo e portanto sua pena não se submeteria à prescrição Não concordamos com essa posição que a propósito não foi acolhida pelo STF nem reiterada pelo STJ Ext 1362DF rel Min Edson Fachin red p o ac Min Teori Zavascki Plenário j 09112016 noticiado no Informativo 846 Sempre que uma pergunta é formulada nesse sentido Qual a diferença entre as matérias questionadas apresentam pontos comuns Apresente sua resposta fornecendo inicialmente os pontos em comum para em seguida indicar as diferenças A resposta estará completa e revelará conhecimento aprofundado dos temas indagados STJ REsp 1113662SP rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 18022014 STJ REsp 908863SP rel Min Og Fernandes 6ª Turma j 08022011 noticiado no Informativo 462 O reconhecimento da extinção da punibilidade pelo implemento da prescrição da pretensão punitiva estatal enseja o desaparecimento de todos 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 os efeitos penais e extrapenais da condenação STJ AgRg nos EREsp 1022286RS rel Min Regina Helena Costa 3ª Seção j 27082014 No tocante aos semiimputáveis dotados de periculosidade a prescrição da pretensão executória também acarreta na extinção da medida de segurança aplicada em substituição à pena originariamente imposta Vale gizar que os efeitos da condenação remanescem apenas na hipótese de prescrição da pretensão executória que retira do Estado a possibilidade de executar a pena isto é extinguese a reprimenda sem contudo rescindir a sentença condenatória Logo ela produz os demais efeitos penais e extra penais Aqui a sentença gera reincidência e serve como título executivo STJ AgRg no AREsp 375892RJ rel Min Jorge Mussi 5ª Turma j 05082014 A terminologia prescrição da ação penal foi expressamente utilizada pelo art 125 do Código Penal Militar Decretolei 10011969 Para o STF a certidão do registro civil é exemplo de documento hábil RHC 105504MS rel Min Dias Toffoli 1ª Turma j 13122011 noticiado no Informativo 652 Também podemos lembrar da Carteira de Identidade RG e da Carteira Nacional de Habilitação CNH entre outros STF HC 107398RJ rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 10052011 noticiado no Informativo 626 HC 86320SP rel Min Ricardo Lewandowski 1ª Turma j 17102006 No mesmo sentido STJ HC 118862BA rel Min Jorge Mussi 5ª Turma j 12052009 noticiado no Informativo 394 e HC 132347RJ rel originário Min Nilson Naves rel para acórdão Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 22092009 noticiado no Informativo 408 HC 129696SP rel Min Dias Toffoli 2ª Turma j 19042016 noticiado no Informativo 822 E também HC 96968RS rel Min Carlos Britto 1ª Turma j 01122009 noticiado no Informativo 570 O STJ compartilha deste entendimento STJ HC 292404SP rel Min Jorge Mussi 5ª Turma j 05062014 AP 516 EDDF rel orig Min Ayres Britto red p o acórdão Min Luiz Fux Plenário j 05122013 noticiado no Informativo 731 HC 89969RJ rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 26062007 Ext 1270DF rel orig Min Marco Aurélio red p o ac Min Roberto Barroso 1ª Turma j 12122017 noticiado no Informativo 888 29 30 31 32 33 34 35 36 37 38 39 STF HC 87987RS rel Min Sepúlveda Pertence 1ª Turma j 09052006 noticiado no Informativo 426 No STJ HC 105074SP rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 18052010 STJ RHC 7206RJ rel Min José Dantas 5ª Turma j 28041998 Joanna Maranhão denunciou no ano de 2008 os abusos sexuais que sofreu aos 9 anos de idade no início da carreira de nadadora de Eugênio Miranda seu então treinador Esta é a jurisprudência tradicionalmente adotada pelo Supremo Tribunal Federal HC 93368PR rel Min Luiz Fux 1ª Turma j 09082011 Quando os autos da ação penal são remetidos ao juiz para recebimento da denúncia ou da queixa fazse conclusão conclusos O magistrado recebe carga dos autos e quando os devolve o escrivão registra essa baixa no livro respectivo Nesse momento se opera a publicação do despacho em cartório HC 138089SC rel Min Felix Fischer 5ª Turma j 02032010 noticiado no Informativo 425 Doutrina e jurisprudência são uniformes no sentido de que o recebimento da denúncia por magistrado absolutamente incompetente não interrompe o curso do prazo prescricional STJ RHC 29599RS rel Min Jorge Mussi 5ª Turma j 20062013 E mais Quando a autoridade que receber a denúncia for incompetente em razão de prerrogativa de foro do réu o recebimento da peça acusatória será ato absolutamente nulo e portanto não interromperá a prescrição STJ APn 295RR rel Min Jorge Mussi Corte Especial j 17122014 noticiado no Informativo 555 No STF HC 104907PE rel Min Celso de Mello 2ª Turma j 10052011 noticiado no Informativo 626 RHC 40514MG rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 08052014 STJ HC 188471ES rel Min Napoleão Nunes Maia Filho 5ª Turma j 31052011 noticiado no Informativo 475 A prescrição da pretensão punitiva do Estado em segundo grau de jurisdição se interrompe na data da sessão de julgamento do recurso e não na data da publicação do acórdão STF RHC 125078SP rel Min Dias Toffoli 1ª Turma j 03032015 noticiado no Informativo 776 HC 138088RJ rel originário Min Marco Aurélio rel p acórdão Min Alexandre de Moraes 1ª Turma j 19092017 40 41 42 43 44 45 46 47 48 49 50 51 52 AgRg no REsp 1324845SP rel Min Ribeiro Dantas 5ª Turma j 26092017 O Superior Tribunal de Justiça encampa este entendimento RHC 40177PR rel Min Reynaldo Soares da Fonseca 5ª Turma j 25082015 noticiado no Informativo 568 ARE ED 709719SP relator Min Luiz Fux 1ª Turma j 04122012 RE 966177 RGRS rel Min Luiz Fux Plenário j 07062017 noticiado no Informativo 868 Engloba também o acórdão condenatório recorrível STJ AgRg no REsp 1406797PR rel Min Joel Ilan Paciornik 5ª Turma j 05122017 HC 162084MG rel Min Og Fernandes 6ª Turma j 10082010 noticiado no Informativo 442 STJ HC 53351RJ rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 24042007 noticiado no Informativo 318 JESUS Damásio E de Prescrição penal 10 ed São Paulo Saraiva 1995 p 130 STF HC 91959TO rel Min Eros Grau 2ª Turma j 09102007 A falha do legislador na elaboração da Lei 122342010 criou uma situação teratológica e lamentável demonstrando profunda falta de técnica ao instituir um 1º no art 110 do Código Penal sem existir o correspondente 2º existia mas foi revogado Curiosamente temos um 1º que na verdade se trata de parágrafo único Por sentença condenatória compreendase também o acórdão condenatório E aí em regra não se admite o acórdão condenatório em homenagem à soberania dos veredictos constitucionalmente consagrada Quando a sentença proferida no Tribunal do Júri é absolutória o acórdão não pode condenar Deve determinar a realização de novo julgamento quando a decisão dos jurados for manifestamente contrária à prova dos autos Há uma única exceção o Conselho de Sentença condena o réu mas o juiz presidente ao lavrar a sentença diverge das respostas dos jurados O Tribunal faz em sede recursal a devida retificação condenando o acusado CPP art 593 III b e 1º Temse um caso de acórdão condenatório recorrível causa de interrupção da prescrição da pretensão 53 54 55 56 57 58 59 60 punitiva no procedimento dos crimes de competência do Tribunal do Júri Nesse ponto cumpre recordar que o antigo 2º do art 110 do Código Penal foi um sórdido expediente de fantasmas que existem e sempre existiram no Congresso Nacional pois seu texto original aprovado mas misteriosamente alterado era o seguinte a prescrição de que trata o parágrafo anterior não pode ter como termo inicial data anterior à do recebimento da denúncia ou queixa A comunidade jurídica aguardava a aprovação integral do Projeto de Lei 13832009 de autoria do Deputado Federal Antonio Carlos Biscaia o qual eliminava definitivamente a prescrição retroativa e consequentemente a prescrição virtual tanto na fase investigatória como na fase judicial Mas de última hora e para surpresa geral a redação foi modificada extinguindose tão somente a prescrição retroativa e indiretamente a virtual na etapa investigativa É constitucional o art 110 1º do CP 1º A prescrição depois da sentença condenatória com trânsito em julgado para a acusação ou depois de improvido seu recurso regulase pela pena aplicada não podendo em nenhuma hipótese ter por termo inicial data anterior à da denúncia ou queixa na redação dada pela Lei 122342010 STF HC 122694SP rel Min Dias Toffoli Plenário j 10122014 noticiado no Informativo 771 HC 162084MG rel Min Og Fernandes 6ª Turma j 10082010 noticiado no Informativo 442 MIRABETE Julio Fabbrini Execução penal 8 ed São Paulo Atlas 1997 p 262 HC 254080SC rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 15102013 noticiado no Informativo 532 E mais O termo inicial da prescrição da pretensão executória é a data do trânsito em julgado da sentença condenatória para a acusação ainda que pendente de apreciação recurso interposto pela defesa que em face do princípio da presunção de inocência impeça a execução da pena STJ HC 254080SC rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 15102013 noticiado no Informativo 532 RE 696533SC rel originário Min Luiz Fux red do acórdão Min Roberto Barroso 1ª Turma j 06022018 PORTO Antonio Rodrigues Da prescrição penal 5 ed São Paulo RT 1998 p 89 61 62 63 64 65 66 67 68 69 70 71 STF RHC 105504MS rel Min Dias Toffoli 1ª Turma j 13122011 noticiado no Informativo 652 HC 91562PR rel Min Joaquim Barbosa 2ª Turma j 09102007 E também Durante a suspensão condicional da pena não corre prazo prescricional CP art 77 cc o art 112 STF Ext 1254Romênia 2ª Turma rel Min Teori Zavascki 2ª Turma j 29042014 noticiado no Informativo 744 STF Ext 6894 rel Min Marco Aurélio Tribunal Pleno j 19121997 Inq 3574 AgRMT rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 0262015 noticiado no Informativo 788 Inq 2584 EDEDSP rel Min Ayres Britto Plenário j 01032012 noticiado no Informativo 656 Em nossa opinião o principal óbice à aceitação da prescrição virtual repousa justamente na possibilidade de aditamento da denúncia mutatio libelli ao final da instrução probatória para reconhecimento de crime mais grave exemplo de furto para roubo nos moldes do art 384 caput do Código de Processo Penal HC 232764RS rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 25062012 noticiado no Informativo 500 RHC 85026SP rel Min Eros Grau 1ª Turma j 26042005 e HC 100001RJ rel Min Marco Aurélio 1ª Turma j 11052010 noticiado no Informativo 586 O STJ compartilha deste entendimento Não é possível a aplicação extensiva ou analógica do art 113 do Código Penal uma vez que o referido artigo especifica as situações de cabimento evasão de condenado ou revogação de livramento condicional Assim o período de prisão provisória do réu é considerado somente para o desconto da pena a ser cumprida e não para contagem do prazo prescricional o qual será analisado a partir da pena definitiva aplicada não sendo cabível a detração para fins prescricionais HC 216876SP rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 17122013 STF HC 97621RS rel Min Cezar Peluso 2ª Turma j 02062009 noticiado no Informativo 549 Nessa linha de raciocínio FERRARI Eduardo Reale Medidas de segurança e direito penal no estado democrático de direito São Paulo RT 2001 p 200207 STF RHC 86888SP rel Min Eros Grau 1ª Turma j 08112005 EREsp 39920RJ rel Min Jorge Mussi 5ª Turma j 06022014 72 73 74 75 76 77 78 79 noticiado no Informativo 535 E ainda RHC 33638RJ rel Min Maria Thereza de Assis Moura 6ª Turma j 05082014 e RHC 30915SP rel Min Rogério Schietti Cruz 6ª Turma j 18062014 ZAFFARONI Eugenio Raúl PIERANGELLI José Henrique Manual de direito penal brasileiro Parte geral 7 ed São Paulo RT 2007 v 1 p 652 O artigo 109 do Código Penal disciplina que o prazo prescricional antes do trânsito em julgado da decisão condenatória regulase pelo máximo da pena cominada ao crime No cálculo cada crime é considerado isoladamente não se considerando o acréscimo decorrente do concurso formal material ou da continuidade delitiva a teor do disposto no artigo 119 do Código Penal STJ AgRg no REsp 1341671MG rel Min Rogério Schietti Cruz 6ª Turma j 03062014 No STJ AgRg no AREsp 221016SP Rel Min Marco Aurélio Bellizze 5ª Turma j 25022014 Esse prazo não foi alterado pela Lei 122342010 a qual estipulou o prazo prescricional mínimo de 3 anos unicamente no tocante às penas privativas de liberdade disciplinadas no Código Penal STF HC 107200RS rel Min Celso de Mello 2ª Turma j 28062011 noticiado no Informativo 633 e STJ HC 90172RJ rel Min Laurita Vaz 5ª Turma j 21022008 noticiado no Informativo 345 HC 88788SP rel Min Joaquim Barbosa 2ª Turma j 22042008 noticiado no Informativo 503 Ante a inexistência de legislação específica quanto à prescrição de infrações disciplinares de natureza grave aplicase por analogia o Código Penal A Turma sublinhou que em razão da ausência de norma específica aplicarseia à evasão do estabelecimento prisional infração disciplinar de natureza grave o prazo prescricional de dois anos em conformidade com o artigo 109 VI do CP STF HC 92000SP rel Min Gilmar Mendes 2ª Turma j 06052014 noticiado no Informativo 745 STF HC 92000SP rel Min Ricardo Lewandowski 1ª Turma j 13112007 noticiado no Informativo 488 ALIMENA Bernardino Principios de derecho penal Trad Eugenio Cuello Callón Madrid Victoriano Suárez 1915 v I ALMEIDA Carlota Pizarro de Modelos de inimputabilidade Da teoria à prática Coimbra Almedina 2000 ALTAVILLA Enrico Psicologia judiciária O processo psicológico e a verdade judicial Trad Fernando Miranda Coimbra Armênio Amado 1981 v I ANCEL Marc A nova defesa social um movimento de política criminal humanista Trad Osvaldo Melo Rio de Janeiro Forense 1979 ANDRADE Manuel da Costa Liberdade de imprensa e inviolabilidade pessoal Uma perspectiva jurídicocriminal Coimbra Coimbra Editora 1996 ANTOLISEI Francesco Manual de derecho penal Parte general Trad espanhola Juan Del Rosal e Ángel Tório Buenos Aires Uteha Argentina 1960 ARAÚJO Luiz Alberto David NUNES JÚNIOR Vidal Serrano Curso de direito constitucional São Paulo Saraiva 1999 BARROS Flávio Augusto Monteiro de Direito penal Parte geral 5 ed São Paulo Saraiva 2006 BASTOS Celso Ribeiro Dicionário de direito constitucional São Paulo Saraiva 1994 BATISTA Nilo Concurso de agentes uma investigação sobre os problemas da autoria e da participação no direito penal brasileiro 2 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2004 BATTAGLINI Giulio Direito penal Parte geral Trad Paulo José da Costa Jr e Arminda Bergamini Miotto São Paulo Saraiva Editora da Universidade de São Paulo 1973 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