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Direito ·

Hermenêutica

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Diagramação e Capa Cláudio Somacal Dados Internacionais de Catalogação na Publicação CIP G914s Guareschi Pedrinho A Sociologia crítica alternativas de mudança Pedrinho Guareschi 61º ed Porto Alegre Mundo Jovem 2008 168 p Cadernos Emejota v2 ISBN 9788574306261 1 Sociologia I Série II Título CDD 301 Ficha Catalográfica elaborada pelo Setor de Processamento Técnico da BCPUCRS ÍNDICE Apresentação 07 Introdução 11 Cap I Teoria e Ciência 16 Cap II Ideologia 19 Cap III Sociologia teorias e ideologias 25 Cap IV Sociedade sistema ou modo de produção 35 Cap V A teoria do modo de produção 40 Cap VI Capitalismo 48 Cap VII Socialismo 54 Cap VIII Comunismo 59 Cap IX Ampliando o quadro 64 Cap X Classe social 74 Cap XI Infraestrutura e superestrutura suas rela ções 82 Cap XII Os aparelhos de reprodução da sociedade 90 Cap XIII O aparelho ideológico do direito 94 Cap XIV O aparelho ideológico da escola 99 Cap XV O aparelho ideológico da família 111 Cap XVI O aparelho ideológico das igrejas 117 Cap XVII O aparelho ideológico dos sindicatos 123 Cap XVIII O aparelho ideológico das cooperativas 130 Cap XIX O aparelho ideológico da comunicação 136 Cap XX Os meios de comunicação e o massacre da cultura 142 Cap XXI Notícias as belas mentiras 146 Cap XXII Propagandapublicidade atenção para nossos comerciais 150 Cap XXIII A Comunicação alternativa 156 Cap XXIV A força da Utopia 161 Conclusão 166 APRESENTAÇÃO É com imensa satisfação que apresento este trabalho do professor e padre Pedrinho A Guareschi A Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul faz questão de estar presente na produção científica riograndense e brasileira lançando ao mercado do livro mais esta obra de Pedrinho Guareschi Em Sociologia Crítica Alternativas de Mudança professores estudantes e agentes sociais encontrarão ricos subsídios para a consolidação de seus conhecimentos Possuímos do mesmo autor em 11ª edição Comunicação e Poder editado pela Vozes Pedrinho Guareschi é pessoa ligada à PUCRS desde o início de sua carreira Foi aqui que ele cursou pósgraduação em Sociologia Recomendado pela PUC ele obteve posteriormente nos Estados Unidos seus títulos de Mestrado e Doutorado No ensino na pesquisa bem como na orientação de teses e dissertações ele marcou o Instituto de Estudos Sociais Políticos e Econômicos IESPE e diversos outros Institutos da Universidade Seu novo livro é uma tentativa de desvendar o oculto incrustado nas instituições e ideologias que se formam no decorrer dos tempos O enfoque crítico que procura dar à análise dos diversos aparelhos e instituições enfatiza a preocupação em profundidade das diferentes facetas e meandros dos problemas sociais Neste sentido contribui para desfazer os aspectos acidentais dos fenômenos dando oportunidade a possibilidades de mudanças necessárias ao desenvolvimento de qualquer nação Como os outros trabalhos do professor Guareschi também este será acolhido pelas pessoas interessadas no social e certamente concorrerá para a elaboração de melhores condições em favor de nosso povo em processo de desenvolvimento Porto Alegre 10 de outubro de 1984 Ir Ernesto Dewes Fundador e exdiretor do IESPEPUC Image contains a stylized black and white graphic of a face with glasses and a bow tie against a dark background Um agradecimento especial a Roque Dal Ross e Ivonilda Hansen pelas excelentes críticas feitas ao livro incorporadas a partir da 5ª edição Uma homenagem a Leonilda Buzzi exemplo de humanidade educadora autêntica amiga profunda INTRODUÇÃO Temos recebido inúmeras cartas de professores estudantes pessoas ligadas a um trabalho de base agentes de pastoral e outros solicitandonos indicações e fontes para discussões de temas sociológicos Diziam ter lido os artigos do jornal Mundo Jovem e gostariam de desenvolver temas dentro do enfoque e na metodologia que costumávamos usar Ao mesmo tempo a direção do Mundo Jovem incentivou a idéia de lançar uma série de livros sobre diversos assuntos juntando os muitos tópicos já discutidos no jornal enfeixandoos num só volume Insistiu que organizássemos esse volume com os assuntos referentes à sociologia Levado por essas razões resolvemos deixar algumas atividades e colocar em dia esse compromisso assumido com os colegas do Mundo Jovem Os tópicos sociológicos que aqui discutimos possuem contudo uma característica diferente Muita coisa do que vocês vão ver aqui não vão encontrar em outro lugar É que Mundo Jovem não deve nada a ninguém e não precisa esconder as coisas Se quiséssemos resumir as características dessas pílulas sociológicas poderíamos dizer que elas se distinguem pelos seguintes fatores a É uma sociologia que se propõe dizer o que em geral não é dito é uma sociologia do escondido do velado do oculto propositadamente ou não b Procura tornar claras passar a limpo as coisas mais complicadas quer ser simples popular sem deixar de ir às raízes dos problemas isto é é uma sociologia popular mas radical c É uma sociologia pensada principalmente para quem quer mudar para quem quer transformar a realidade A maioria dos trabalhos sociológicos que possuímos têm implícita ou explicitamente intenção de explicar apenas as coisas compreender como funcionam Nossa intenção é explicar e compreender como as coisas funcionam e mais um pouco ver como é possível mudálas Mesmo porque só compreende perfeitamente uma coisa quem é capaz de mudála d É uma sociologia dirigida à ação Não separa o pensar do agir mesmo porque é impossível separar estas duas coisas sem nos alienarmos e É uma sociologia questionadora uma sociologia que procura mais fazer a pergunta montar uma discussão do que dar imediatamente a resposta Por isso mesmo ela se presta muito para discussão f É uma sociologia ligada ao diaadia ao cotidiano É o que você encontra momento a momento em sua vida o que o cerca o que o rodeia g Por tudo isso escolhemos para designar o nosso enfoque a palavra crítica É uma tentativa duma sociologia crítica como vai explicado no capítulo 3 Os capítulos tratam separadamente de cada assunto mas entre eles há uma ligação lógica Para se compreender bem o seguinte seria interessante ter discutido os anteriores Quando possível nós avisaremos o capítulo a que se refere a discussão quando isso for necessário para o bom entendimento Para simplificar ao máximo a leitura não vamos colocar citações no decorrer dos assuntos A maioria dos capítulos porém é resultado de nossa experiência em trabalhos tanto com alunos como com grupos populares das periferias de Porto Alegre Foi no meio do povo na provocação dele que fomos amadurecendo muitos pontos que aqui foram discutidos A experiência com o povo foi muito boa para nós pois o povo não necessita esconder e encobrir nada Ele não deve nada a ninguém Enfrenta a coisa como a coisa é mesmo Ninguém pense que os assuntos aqui discutidos são completos e terminados Isso vai contra toda a argumentação que procuramos desenvolver O que se quer discutir são apenas alguns tópicos com palavras claras e simples dizendo o que em geral não se diz pensando sempre nos grupos de ação constituídos por pessoas simples de boa vontade comprometidos com a maioria de nossa população brasileira Alguém poderá dizer que essas colocações são primárias infantis superficiais ou mesmo incompletas Tudo isso poderá ser verdadeiro dependendo do ângulo pelo qual as coisas são analisadas Por exemplo em vez de primárias a gente poderia dizer que as colocações são radicais são o fundamento primeiro de tudo Em vez de superficiais a gente poderia dizer que são simples populares diretas Em vez de infantis a gente poderia dizer que o que se deseja é que todos entendam principalmente o povo simples que não sejam colocações sofisticadas rebuscadas Em vez de incompletas poderseia dizer que o que se quis foi acentuar uma determinada dimensão Na realidade são colocações incompletas pois nunca é possível dizer tudo sobre alguma coisa Sempre fica faltando algo Nós temos um objetivo específico ver o essencial e comunicálo à gente do povo Um adjetivo que nós não gostaríamos que fosse usado para designar nosso trabalho é o que dissesse que essas discussões não ajudam a mudar as coisas A experiência que se tem é que essas discussões deixam as coisas claras para o povo e ajudam o povo a se organizar para mudar Agora quem quiser dizer que isso não funciona primeiro tem de experimentar tem de colocar em prática fazer a experiência E agora por favor se não funcionar então escrevanos dizendo e tente ver por que talvez não funcionou E se você achar uma maneira de como as coisas funcionaram deram certo por favor contenos pois isso é realmente o que nos interessa Muita gente já escreveu discutiu explicou os problemas todos mas pouquíssimos conseguiram mudar as coisas melhorar a vida humana em sociedade Um adendo para a 43ª edição Muita coisa ocorreu após a 1ª edição desse livro Eu mesmo não fazia idéia de que esse livro escrito com rapidez mas com paixão fosse causarme tantas surpresas e criar alguns impasses Milhares de pessoas mais de 100 mil leram e certamente se inspiraram nesse livro Vou lembrar alguns lances e episódios interessantes que sucederam e que poderão servir de inspiração penso eu aos queridos leitoresas no trabalho de construção de uma sociedade mais democrática e participativa O livro acabou sendo traduzido em inglês espanhol e em italiano Quem o traduziu foram pessoas ligadas a movimentos alternativos como os que trabalham com trabalhadores migrantes jovens grupos de estudantes trabalhadores do social Em Assunção no Paraguai o livro foi proibido nas escolas mas circulava fotocopiado entre professores e alunos e ajudou a mudar a direção de ao menos uma faculdade onde o autoritarismo funcionava a pleno vapor Um candidato a vereador de uma das maiores capitais do país pediu mil livros e fez sua campanha para vereador discutindo os diversos capítulos do livro foi o segundo vereador mais votado da Capital Um dia telefonoume um cego dandome os parabéns pois finalmente podia entrar em contato com uma sociologia que realmente valia a pena estava lendo o livro em braile Nem eu sabia que existia cópia para deficientes visuais Um bispo de uma diocese do Norte do Brasil cada vez que vinha para o sul levava uns 200 exemplares Todos os grupos de base da diocese faziam a análise da realidade a partir dele Numa cidade do interior criouse uma verdadeira guerra entre as alunas do curso de magistério e os advogados da cidade O que detonou o conflito foi o capítulo sobre o direito Cap XIII Os advogados queriam intervir na escola pois ensinavase subversão às meninas Só porque elas se tinham dado conta do fato de que o importante quando se fala em poder numa sociedade não é o que está escrito nas leis mas quem cria as leis Os doutores por que só os advogados e os médicos se chamam de doutores e os outros não dentro de uma visão positivista e arcaica de direito perceberam que seu mundo de status e prestígio estava sendo minado por uma visão histórica e crítica mostrando a relatividade das leis Tive de mandar um fax em defesa da escola e das meninas que tinham deixado os doutores tão preocupados E assim poderiam ser elencados muitos outros fatos semelhantes O que espero e faço votos é que essa edição um pouco mais limpa e ajeitada continue em sua simplicidade a ajudar os que possuem um compromisso com a justiça e a solidariedade a fim de que com mais consciência e eficiência consigamos uma sociedade socialmente igualitária culturalmente plural politicamente democrática economicamente justa CAPÍTULO I TEORIA E CIÊNCIA Uma das palavras mais usadas e ao mesmo tempo mais complexas é a palavra teoria É difícil você escutar algum discurso de gente mais fina sem que essa palavrinha não apareça aqui ou ali Então vamos discutir essa palavrinha mesmo porque não há ninguém que consiga viver sem teorias É isso mesmo Vamos ver isso No diaadia da vida a gente vai vendo fatos acontecimentos um a um singulares São milhares de fatos que eu vejo por dia um acidente um homem escutando rádio uma criança que morre Acontece que a gente mesmo sem se dar conta começa a descobrir semelhanças entre os diversos fatos isto é vai juntando os fatos Por exemplo percebe que a maioria dos acidentes se dá nos dias de chuva então liga acidente com chuva Percebe que o homem em geral está escutando esporte junta homem escutando esporte no rádio Percebe que as crianças que morrem são sempre crianças pobres dificilmente morre uma criança de gente rica junta morte de criança com pobreza O que você está fazendo quando começa a descobrir semelhanças entre fenômenos entre fatos Você está fazendo uma generalização ou uma lei Assim você está começando a descobrir e formular leis 1 A chuva dá ocasião a acidentes 2 Os homens escutam principalmente esporte no rádio 3 A pobreza propicia a morte de crianças Você já sabe agora o que é generalização ou lei é a descoberta de relações semelhanças contrastes mais ou menos constantes entre os fatos É claro que as leis não são totais ou absolutas isto é sempre há alguma exceção Algumas leis são bastante gerais muito constantes acontecem 99 das vezes Outras são menos gerais acontecem apenas em 60 ou 70 dos casos Mas há uma relação entre os fatos na maioria das vezes Que é teoria Teoria é um conjunto de leis que procuram explicar a realidade os fatos concretos singulares Quando existem algumas generalizações ou leis sobre determinada realidade a marginalização da população por exemplo há uma teoria Está vendo pois que teoria não é nenhum mistério E se pensar um pouco vai ver que a gente está lotado de teorias pois sem nos darmos conta nós vamos criando generalizações leis a respeito de muitos assuntos Qual a teoria sobre os americanos por exemplo Muito simples quem vê o Fantástico todo o domingo já tem sua teoria os americanos são ricos são mais inteligentes do que nós pois só mostram coisas lindas e gente que sabe muito são melhores do que nós pois fazem coisas fantásticas maravilhosas enfim são uma espécie de semideuses Agora quer saber quem são os brasileiros para os americanos Bem simples são uma turma de gente esquisita O que sabem fazer é jogar futebol e pular carnaval e falam espanhol Pergunte a quem já esteve lá e veja se isso é verdade ou não Por que isso Porque as informações que são dadas a eles são informações selecionadas falsificadas distorcidas Para eles nós somos um grupo de gente exótica um bicho meio raro Confira o capítulo XX Você está vendo Aqui há dois exemplos de teorias sobre um povo Mas assim é a respeito de tudo A gente bebe teorias respira teorias come teorias a gente começa a mamar teorias com o leite materno Todos os preconceitos os estereótipos que nós possuímos no fundo são tipos de teorias Se eu olho para uma pessoa e penso assim Bem baixinho gordinho fala bastante já sei vai acabar naquilo O que aconteceu Eu me guiei por experiências passadas isto é eu tenho um tipo padrão uma teoria sobre determinadas pessoas com essas características e estou agora julgando de antemão préjulgando uma pessoa que possui as mesmas características Isso é preconceito E muitas vezes a gente se engana redondamente Mas na maioria das vezes agimos de acordo com nossos preconceitos Um trabalho extremamente útil para todos nós é começar a questionar as teorias que temos sobre os determinados assuntos ou pessoas Só é realmente livre aquele que conhece suas teorias aquele que sabe porque pensa assim ou procura continuamente se revisar Que é ciência Podemos dar um passo à frente agora e dizer que ciência é um conjunto de teorias que por sua vez são um conjunto de leis que tentam explicar a realidade Não há pois nenhum mistério Quando há um determinado número de teorias sobre determinado assunto física química psicologia sociologia dizse que há uma ciência sobre tal assunto Pelo que se viu até agora percebese que tanto as leis como as teorias e conseqüentemente a ciência não dizem tudo sobre a realidade As leis e teorias são relativas contingentes incompletas Isso é importante ter presente para a gente não se assustar quando alguém chega até nós e diz com a boca cheia mas isso é uma teoria científica Então nós devemos com calma perguntar a ele o que ele entende por teoria quais as leis que compõem tal teoria e ver se realmente essas leis explicam a realidade toda a realidade ou apenas parte da realidade Ele vai ter de mostrar então os estudos as pesquisas para mostrar que é assim mesmo Nenhuma lei explica todos os fenômenos ou o fenômeno todo nenhuma teoria explica todos os fatos ou o fato todo Todas as leis e teorias são parciais Dizse então que uma lei é tanto mais científica ou uma teoria é tanto mais científica quanto mais fatos ou quanto mais do fato ela explicar Como você pode ver é preciso ter cuidado com as teorias e ver o vazio que elas deixam para trás Esse vazio às vezes não pode ser mesmo preenchido Algumas vezes ele pode ser preenchido mas é deixado incompleto de propósito Isto é há interesses em se deixar uma coisa mal explicada pois do contrário ela poderá nos prejudicar Isso que acabamos de dizer é o que se chama de ideologia que é o capítulo seguinte É fundamental descobrir a ideologia que há por trás das teorias Isso nós vamos tentar fazer em quase todos os capítulos Veja principalmente os capítulos sobre Sociologia Sociedade Escola e outros Vamos então à ideologia CAPITULO II IDEOLOGIA O assunto ideologia é tão amplo e tão complexo que o melhor é começar tentando dizer o que é ideologia ir dando uns exemplos Cada um vai aos poucos tentando compreender ver na prática como a ideologia acontece A ideologia não significa mais o que por sua etimologia deveria significar isto é estudo das idéias Passou a significar coisa bem diferente e a ter uma figura negativa e pejorativa Acontece que alguns ainda usam a palavra ideologia para significar o conjunto de idéias valores e maneira de pensar de pessoas e grupos isto é no seu sentido positivo Então é preciso distinguir bem Ideologia pode significar 1 O estudo das idéias sentido etimológico 2 Conjunto de idéias valores maneira de sentir e pensar de pessoas e grupos sentido positivo 3 Idéias erradas incompletas distorcidas falsas sobre fatos e a realidade sentido crítico ou negativo Daqui para frente nós só vamos usar a palavra ideologia no último sentido isto é como uma maneira errada de ver as coisas Vamos então discutir algumas coisas sobre como e porque as pessoas podem ter idéias erradas sobre as coisas Será que é culpa delas Quem pode dizer que não tem ideologia Para entender isso é preciso ver como nós ficamos sabendo das coisas e quem é que nos diz as coisas É preciso ver se aqueles que nos dizem as coisas não nos dizem apenas metade das coisas ou só um jeito de ver as coisas Você já pensou por que você acha que é o que é Por que se define como sendo estudante brincalhão rapaz bom jogador de futebol Quem ensinou para você as palavras quem deu as definições das palavras estudante brincalhão etc Aí você começa a ver que nós somos em grande parte o que os outros nos dizem ou acham que somos E na medida em que nós vamos incorporando e aceitando o que os outros pensam e acham a nosso respeito nós vamos formando nossa identidade É claro que não é só isso que forma nossa identidade Nós podemos também refletir tomar consciência do processo de como a gente é o que é e tentar mudar Mas em grande parte nós ficamos condicionados à influência dos outros inclusive pelo fato de termos de aceitar a própria linguagem e as definições das coisas que os outros nos deram Agora começa contudo a parte mais importante que nos ajuda a entender o que é ideologia Você acha que todas as definições todas as explicações das coisas são dadas sempre com sinceridade procurando sempre dizer a verdade e toda a verdade Será que por trás das definições das coisas inclusive do próprio conceito que os outros fazem de nós atrás das explicações que as pessoas dão para as coisas não há algum interesse em esconder algo em acentuar alguns aspectos e diminuir outros Pois é isso que precisamos descobrir E quando nós chegarmos a constatar que as coisas não são exatamente como nolas estão contando então nós estamos diante de ideologias Quem é inteligente e vivo fica sempre de olho para descobrir como as pessoas se não chegam a mentir de fato ao menos dizem apenas parte da verdade Vamos dar uns exemplos que assim a gente vai entendendo melhor Conversando com uma empregada doméstica ela me disse Rico é aquela pessoa que soube poupar Você acha que isso é verdade Todas as pessoas que poupam são ricas E todos os ricos são pessoas que pouparam Você pode facilmente descobrir que não Rico é aquele que ganha muito dinheiro Se você recebe o saláriomínimo pode poupar quanto quiser que não acaba rico nunca Examinando melhor a gente vai ver que os grandes ricos mesmo são aqueles que são donos de fábricas e terras que se enriquecem em grande parte com o trabalho dos outros Nós sabemos o Papa Leão XIII diz isso claramente que a única fonte das riquezas é o trabalho humano Trabalhando a pessoa pode então enriquecer Mas nunca chegar a ser muito rico Para alguém ser muito rico precisa fazer com que outros trabalhem para ele precisa pegar parte do trabalho dos outros Mas por que então se insiste tanto em que se deve poupar a tal ponto que algumas pessoas acabam acreditando que é poupando que a gente fica rico Isso é assim ao menos por dois motivos primeiro para dar uma explicação para as pessoas que têm pouco que são pobres para dizer a elas que são pobres porque não pouparam os outros são ricos porque pouparam Aí elas ficam bem quietas e ficam sabendo que a culpa é delas mesmas Segundo para que elas apesar do pouco que tenham ainda façam assim ao menos uma poupança pois pela sua poupança muitos outros vão enriquecer principalmente os donos dos bancos cadernetas de poupança etc Com essa poupança o governo vai poder construir grandes obras emprestar dinheiro a grandes indústrias enfim a poupança do pequeno vai ajudar o grande a ganhar mais dinheiro Uma outra frase parecida com essa é a que se ouve seguidamente entre os trabalhadores Quem trabalha mais e melhor ganha mais Você pode ver claramente que essa é só meia verdade Ele ganha realmente um pouco mais Ao mesmo tempo se culpa por ganhar pouco Acha que ganha pouco porque trabalha pouco ou trabalha mal Ele não percebe que atrás disso há também a lei do salário mínimo que não depende dele Mesmo que trabalhasse 24 horas por dia ainda sairia ganhando pouco Uma outra afirmação muito comum que se encontra escrita em colégios é a seguinte Quem estuda triunfa Foi feita uma pesquisa entre os jovens e lhes foi perguntado É verdade que quem estuda triunfa O resultado foi que 90 responderam sim Agora essa afirmação se encontra redondamente desmentida pelos fatos e pela realidade Em pesquisas se constatou que a possibilidade de um 20 21 filho de operário entrar na universidade é de apenas 5 ao passo que a de filhos de classes mais ricas e profissões liberais é de 80 O que está escondido na afirmação acima é que quem pode estudar entrar na universidade pagar os estudos já triunfou Se você abrir um jornal qualquer jornal vai ver imediatamente muitas meiasverdades em cada página Os jornais publicam só o que querem e onde querem A gente não pode dizer que eles mentiram Talvez tudo o que está no jornal tenha acontecido O problema é que o jornal conforme sua ideologia seleciona o que quer combina com o que quer e publica o que quer E nós saímos acreditando que o jornal diz toda a verdade Antes de ler o jornal a gente precisa saber que ideologia tem esse jornal Você está vendo como o problema da ideologia é complicado e como ele é importante Apenas uma coisinha para terminar Você já se perguntou se você mesmo não é o que você pensa que é porque os outros lhe botaram isso na cabeça Será que você já se deu conta de quem fez sua cabecinha quem deu a definição de você mesmo para você Há muita gente que nem sabe quem são seus pais ideológicos que é ideologicamente bastardo Só com muita reflexão e consciência crítica você será realmente você você será livre você saberá porque é assim e essa verdade o libertará Gostaria de terminar com um ponto bastante importante Você já conversou com alguma pessoa pobre algum favelado Se você tentar descobrir o que ele pensa dele mesmo vai ver que a imagem que ele tem de si mesmo é bastante negativa Ele acha que não presta que é ignorante que é mau que vale menos que o pessoal de bem isto é os que sabem ler e escrever são ricos vivem no centro da cidade Eles os favelados são da vila Agora será que isso é verdade mesmo Os da vila da favela são piores têm menos dignidade que os outros Ou será que os do centro que têm os jornais as rádios as TVs isto é que têm a voz e a vez não estarão dando a definição negativa e pejorativa para os da periferia Será que a própria escola os Meios de Comunicação Social e até mesmo certas religiões e certos pregadores não estão a serviço dos que têm o poder e para eles se garantirem no poder não estão tentando dizer para os outros que os das vilas das periferias não prestam são menos Veja você como isso é importante se você consegue convencer alguém de que ele não presta vale menos é ignorante etc você pode dominar totalmente essa pessoa pois ela já está dominada na alma na consciência Ela mesma já não vai querer subir exigir mais ter os mesmos direitos que os outros pois ela já está convencida de que vale menos Essa pessoa assim definida é convencida nunca mais vai dar trabalho para as outras pessoas Ela interiorizou a imagem negativa que fazem dela os que têm poder e acabou acreditando na história de que ela afinal vale menos mesmo Através da linguagem e da comunicação que também são produções históricas são transmitidos significados representações e valores existentes em determinados grupos é a ideologia do grupo A reprodução ideológica se manifesta através de representações que a pessoa elabora sobre si mesma sobre os homens a sociedade a realidade enfim sobre tudo aquilo a que implícita ou explicitamente são atribuídos valores certoerrado bommau verdadeirofalso A ideologia está presente na superestrutura que são as instituições políticas jurídicas morais veja o capítulo X Já no plano psicológico individual as ideologias se reproduzem em função da história da vida e da inserção específica de cada pessoa Essas colocações podem espantar alguém e leválo a pensar que não há remédio que estamos condenados a sermos presas das ideologias Mas não é assim No plano pessoal o indivíduo pode se tornar consciente ao detectar as contradições entre as representações que existem na 22 23 sociedade ou no plano superestrutural e as atividades específicas que ele desempenha na produção de sua vida material Há uma dominação ideológica que se dá em plano sociológico e ela é detectada pela análise das relações existentes entre classes sociais veja o capítulo X A dominação ideológica que se dá no plano individual é detectada na análise das instituições que prescrevem os papéis sociais as funções de cada pessoa e acabam determinando as relações sociais de cada indivíduo O processo de conscientização se desencadeia tanto a nível de consciência pessoal como a nível de consciência de classe A consciência de classe é um processo grupal e se manifesta quando indivíduos conscientes de si se percebem sujeitos das mesmas determinações históricas que os tornaram membros de um mesmo grupo Inseridos nas relações de produção que caracterizam a sociedade num dado momento Isso pode levar a um processo de conscientização de si e conscientização social De outro lado o indivíduo consciente de si necessariamente tem também consciência de pertencer a uma classe Mas enquanto indivíduo esta consciência se processa transformando tanto suas ações como a ele mesmo Os dois níveis deverão estar interligados Poderá existir um indivíduo consciente num grupo alienado mas essa posição é dolorosa e não é sustentável por muito tempo Cedo ou tarde ele precisará se decidir CAPÍTULO III SOCIOLOGIA TEORIAS E IDEOLOGIA Uma das primeiras discussões que naturalmente devemos fazer é sobre o que é sociologia Muitos de vocês já sabem certamente o que é Nós vamos dar uma pequena explicação e depois mostrar que há diversos tipos de sociologias e dizer que tipo de sociologia nós queremos promover ou que sociologia achamos melhor para nosso trabalho Sociologia é uma palavra formada de outras duas socius que em latim significa companheiro sócio e lógos que em grego significa estudo Sociologia significa pois em sua origem estudo do social ou da sociedade ou de tudo o que se refira a mais pessoas não a uma só Sempre que se falar então em grupos de pessoas em sociedades em organizações sociais em sistemas e sempre que houver alguma coisa que implique mais pessoas a sociologia terá alguma coisa a ver com o assunto Agora há diversos tipos de sociologia Nós queremos desenvolver e incentivar um tipo especial de sociologia como nós já dissemos na introdução Para que essa nossa sociologia responda aos interesses que colocamos ela não pode ser de qualquer tipo Você lembra que nós afirmamos que queríamos uma sociologia do escondido uma sociologia que vai às raízes radical uma sociologia que não apenas explique como é mas que ajude a mudar uma sociologia que leve à ação uma sociologia que provoque uma sociologia do presente do agora Para ser tudo isso ela tem de ser especial Normalmente quando se fala em sociologia se pensa logo em levantamentos de dados em pesquisas em estatísticas gráficos grande número de tabelas Isso tudo pode ajudar a sociologia mas a sociologia é um pouco mais que isso ao menos a sociologia que nos vai interessar Mas para caracterizar bem isso nós precisamos fazer agora um parêntesis e explicar uma coisa importante que será fácil de entender porque nós já comentamos capítulo I o que é teoria Se 24 25 2 A teoria históricocrítica Mas existe alguma outra maneira de ver as coisas Existiria outra teoria que implicasse numa outra cosmovisão numa outra maneira de se ver entender e explicar o mundo Pensamos que sim apesar de ser pouco divulgada pois ela é muito perigosa principalmente em nossa sociedade Que nomes a gente poderia dar a essa outra teoria Um dos melhores nomes é o de teoria histórica e vamos ver por que Quando se fala em história ou histórico a primeira coisa que vem à mente da gente é de algo que passa de algo transitório História é o que tem a ver com antes durante ou depois Mas qual é o pressuposto isto é o que é aceito sem se dizer que se aceita ou sem se dar conta que se aceita dessa teoria O pressuposto é que tudo o que é criado é histórico Acho que não há dificuldade em se aceitar tal pressuposto pois é quase que uma definição da coisa mesma o que é criado não é eterno apareceu e vai desaparecer Por isso mesmo é precário transitório isto é histórico Vamos para a frente Todo o criado é histórico Se é histórico é relativo Acho que isso também pode ser aceito pois é conseqüência se é histórico é relativo ao menos quanto ao tempo isto é houve um tempo em que não era ou haverá um tempo em que não será Mais à frente tudo o que existe é histórico Se é histórico é relativo Bem se é relativo não é absoluto Um é o oposto do outro Se não é absoluto falta algo para que ele se complete isto é é incompleto contém em si mesmo a sua incompletude não é total Isso quer dizer que para uma coisa ser total e completa ela precisa de algo mais Esse algo mais é o que nós chamaremos do seu negativo Não negativo no sentido que negue a coisa mas no sentido de completar a totalidade dessa coisa Está complicado Mas fique firme pois aqui está o segredo de tudo e aqui está o segredo e o novo dessa nova maneira de ver as coisas Nós vimos que um dos nomes que se dá à outra teoria positivistafuncionalista é o de teoria absolutista E isso porque a outra teoria não leva em consideração esse fato importante de que tudo é incompleto tudo é relativo tudo é histórico E sem querer a gente vai criando uma mentalidade de absolutizar as coisas e não perceber que tudo é precário tudo contém em si mesmo algo de vazio algo que ainda precisa ser preenchido Essa teoria histórica fica pois continuamente nos provocando e chamando a atenção para essa coisa fundamental e importante ainda há algo para ser feito para ser completado Ainda há o não completo ou o negativo da coisa pois tudo é histórico Se você ouve uma fala dum presidente por exemplo e vê tantas coisas maravilhosas que são ditas e descritas você não absolutiza as coisas mas você pensa assim bem isso que está sendo dito é algo positivo mas há ainda muita coisa que ele não disse ou não quer dizer ou nem percebe que precisa ser dito Às vezes o que não é dito é muito mais do que o que é dito para se poder entender a coisa como ela deveria ser entendida ou compreendida Essa postura histórica desmistifica as coisas todas deixa as pessoas bem mais atentas e alertas Se eu digo por exemplo para uma pessoa que ela é inteligente eu estou dizendo ao mesmo tempo que ela é nãointeligente isto é que ela não é a inteligência completa e absoluta A pessoa que diz e principalmente a que escuta se comporta bem diferentemente diante de tal afirmação Isso fica mais claro ainda com aquela famosa anedota que ajuda a ilustrar muito bem os dois tipos de mentalidade o rapaz chega para a mocinha e lhe diz muito romântico Bem como você está linda hoje Muito obrigada responde a moça toda feliz E acrescenta Pena que eu não possa dizer a mesma coisa de você Não tem importância responde o rapaz bem depressa Faça como eu minta Essa anedota revela duas mentalidades bem diferentes Ou melhor revela um tipo de mentalidade o da pessoa ingênua absolutizadora No momento em que o rapaz afirmou que ela era 12 você ainda não leu ou discutiu o que é teoria dê primeiro uma olhadela para aquele capítulo Então vai ser simples entender o que se quer dizer aqui Duas grandes teorias em Sociologia Falando de uma maneira geral nós poderíamos dizer que existem duas grandes teorias que são como se fossem as mães ou as matrizes de todas as outras teorias que guiam as pessoas na sociedade Seriam como que duas grandes cosmovisões duas maneiras diferentes de encarar a realidade o mundo e o que nos interessa aqui de encarar o social a sociedade 1 A teoria positivistafuncionalista A primeira corrente tem diversos nomes Nós vamos explicando os nomes que foram dados a essa corrente ou teoria e vamos vendo por que foi dado esse nome e o que isso implica O nome mais comum dessa teoria é talvez o de teoria positivista Positivismo é uma palavra que vem do latim do particípio passado do verbo pôr colocar em latim o particípio passado é positum que quer dizer posto colocado Essa teoria é chamada de positivismo porque ela supõe implica ou pressupõe que a realidade é o que está aí isto é a realidade é o que está colocado posto na nossa frente A realidade se resume pois no que nós vemos apalpamos no que existe aí É muito importante pensar bem sobre isso e ver se não é isso justamente o que nós achamos que é a realidade Pergunte a você mesmo nessas alturas o que é realidade para você E você vai ver que talvez a resposta vai ser mais ou menos parecida com essa definição Um outro nome que se dá a essa teoria é de teoria funcionalista Esse nome já acrescenta alguma coisa à teoria anterior mas não a modifica fundamentalmente O positivismo diz que a realidade é o que está aí e o funcionalismo acrescenta que a realidade e principalmente a sociedade é o que está aí também mas o que está aí estruturado duma forma especial tudo o que está aí forma um sistema organizado em que tudo tem sua função daí o fato de se escolher essa palavra como a melhor para explicar a teoria Na prática pois tudo o que existe tem sua função Não há nada que não tenha sua função Se existe deve ter uma função E essa função é para alguma coisa isto é dirigida para o todo que no caso pode ser o sistema social ou qualquer sociedade ou organização Aqueles que seguem essa teoria enxergam o mundo todo organizadinho Não há nada sobrando E eles costumam dizer que a sociedade é como se fosse um organismo por isso essa teoria é chamada também de organicismo ou como se fosse um corpo vivo por isso um outro nome que lhe dão é de biologismo Eles transpõem para os grupos humanos a maneira de ser do mundo material Como na natureza no mundo tudo tem sua função assim também na sociedade todos têm sua função Assim como numa árvore há galhos tronco raízes assim também na sociedade alguns são os galhos outros o tronco e outros raízes Houve até um sociólogo americano que disse que a pobreza era importante essencial para a sociedade pois ela tinha também suas funções Alguns sociólogos como o americano Robert Merton perceberam que era um pouco exagerado dizer que tudo tem sua função Robert então disfarçou um pouco a coisa e disse que havia também disfunções isto é coisas que podiam atrapalhar e coisas sem função Mas no fundo essas disfunções ou nãofunções iriam desaparecer e tudo voltaria ao normal num organismo social equilibrado Já que falamos em equilíbrio é importante prestar atenção nisso agora o pressuposto isto é aquilo que não é dito mas é aceito da teoria positivistafuncionalista é de que tudo está organizado tudo está equilibrado e tudo procura uma harmonia Para eles o normal e por isso mesmo o bom veja o aspecto ético é que a coisa funcione Se funciona é bom Se não funciona não é bom algo está errado não presta Pela sua própria natureza tudo deveria se equilibrar tudo deveria chegar a uma perfeita harmonia o happy end dos filmes de farwest americanos Como você já percebeu há também um aspecto ético nessa teoria Implícito na teoria está o que é bom e o que não é bom Para essa teoria é bom tudo o que funciona tudo o que leva ao equilíbrio Tudo o que desequilibra ou não concorre para a harmonia do todo não presta Por isso sempre que alguém queira mexer ou mudar alguma coisa esse alguém está fazendo algo que 26 não serve que não presta O ideal é tudo permanecer sempre como está Mais uma consideração como os que patrocinam essa teoria vêem a mudança Aqui está um ponto muito interessante Para eles só pode haver mudança se a coisa toda mudar isto é se a coisa deixar de existir Mudança para eles é sinônimo de morte e só pode vir de fora Pois se a sociedade é como um corpo o normal é que funcione isto é que viva Para viver tem de funcionar para poder continuar Se deixar de funcionar e isso é ruim pois o corpo a sociedade deixa de existir Para os que defendem essa teoria é impossível uma mudança que venha de dentro pois seria algo contra a própria natureza da coisa que por si mesma deve funcionar e ser sempre o que é Mudança para eles só pode vir de alguém que queira destruir ou matar o que existe Só para terminar essa teoria é conhecida também por alguns outros nomes que são significativos Alguns a chamam de teoria absolutista pois essa teoria resume a realidade ao que está aí e nada fora do que está aí existe Além disso para a teoria cada grupo é absoluto fechado sobre si mesmo O sistema está organizado de tal modo que ele se explica a si mesmo as partes em função do todo tudo girando ao redor do centro caminhando para o equilíbrio e a harmonia O resto do mundo pode deixar de existir que não há problema Outro nome que alguns ainda dão a essa teoria é o de teoria acadêmica Esse apelido já é um pouco malicioso mas sugestivo Qualquer sistema para poder sobreviver tem de se garantir de se legitimar de se explicar Essa teoria pois para se garantir tem de montar alguns mecanismos que a sustentem E o mecanismo principal é a própria academia ou o conjunto todo da educação universidades escolas Nesses lugares o principal é justamente formar a mentalidade fazer a cabeça das pessoas Ora a maneira principal de fazer as cabeças é fazer com que as pessoas aceitem determinada teoria principalmente se a teoria for uma como a que acabamos de explicar que diz que a sociedade e a realidade é o que está aí que nada fora do que está aí existe e que isso que está aí para ser bom deve continuar a funcionar como é como está Se essa teoria ou essa mentalidade essa cosmovisão é inculcada nas cabeças e aceita por todas as pessoas a própria sociedade está garantida não há mais problemas Tudo vai permanecer como está e para sempre Por isso a academia ou as escolas são uma peça fundamental em qualquer sociedade onde a teoria positivistafuncionalista está em vigor É preciso garantir a coisa na própria explicação da sociedade ou melhor na própria definição do que é a realidade Se eu já defino a realidade como sendo isso que está aí já tenho um grande caminho andando e já não vai haver muitos problemas mais tarde quando alguns mais afoitos ou meio esquisitos ou anormais como são chamados quiserem ou tentarem perguntar se não se pode mudar o que está aí Uma última coisinha que penso que você está percebendo a quem poderá interessar tal teoria A quem pode ajudar tal teoria Qual a ideologia por trás dessa teoria Veja você se eu digo que a realidade é o que está aí e o que está aí é o melhor e isso que está aí deve continuar sempre assim a quem isso pode interessar É evidente interessa a quem está por cima pois eles estão muito bem obrigado e se a coisa continuar sempre assim será sempre bom para eles que vão continuar sempre no bembom Por isso eles patrocinam tanto essa teoria pois é a garantia para eles continuarem sempre por cima E por isso se chega mesmo a definir a realidade veja você a realidade como o que está aí para que ninguém possa nem tentar imaginar que as coisas possam ser diferentes daquilo que está aí pois se alguém quiser algo diferente do que está aí estaria querendo algo irreal e mau pois o que está aí é o que funciona e para ser bom tem de funcionar como está aí Que tal Qual a sua teoria O que é a sociedade e a realidade para você Você está vendo a força e a importância que têm as teorias Podese até afirmar de maneira geral que quem domina as teorias domina a sociedade pois quem domina as teorias domina as possibilidades de pensar ou não pensar diferente E se você nem consegue pensar diferente nunca você pode chegar a querer mudar ou desejar algo diferente 13 não serve que não presta O ideal é tudo permanecer sempre como está Mais uma consideração como os que patrocinam essa teoria vêem a mudança Aqui está um ponto muito interessante Para eles só pode haver mudança se a coisa toda mudar isto é se a coisa deixar de existir Mudança para eles é sinônimo de morte e só pode vir de fora Pois se a sociedade é como um corpo o normal é que funcione isto é que viva Para viver tem de funcionar para poder continuar Se deixar de funcionar e isso é ruim pois o corpo a sociedade deixa de existir Para os que defendem essa teoria é impossível uma mudança que venha de dentro pois seria algo contra a própria natureza da coisa que por si mesma deve funcionar e ser sempre o que é Mudança para eles só pode vir de alguém que queira destruir ou matar o que existe Só para terminar essa teoria é conhecida também por alguns outros nomes que são significativos Alguns a chamam de teoria absolutista pois essa teoria resume a realidade ao que está aí e nada fora do que está aí existe Além disso para a teoria cada grupo é absoluto fechado sobre si mesmo O sistema está organizado de tal modo que ele se explica a si mesmo as partes em função do todo tudo girando ao redor do centro caminhando para o equilíbrio e a harmonia O resto do mundo pode deixar de existir que não há problema Outro nome que alguns ainda dão a essa teoria é o de teoria acadêmica Esse apelido já é um pouco malicioso mas sugestivo Qualquer sistema para poder sobreviver tem de se garantir de se legitimar de se explicar Essa teoria pois para se garantir tem de montar alguns mecanismos que a sustentem E o mecanismo principal é a própria academia ou o conjunto todo da educação universidades escolas Nesses lugares o principal é justamente formar a mentalidade fazer a cabeça das pessoas Ora a maneira principal de fazer as cabeças é fazer com que as pessoas aceitem determinada teoria principalmente se a teoria for uma como a que acabamos de explicar que diz que a sociedade e a realidade é o que está aí que nada fora do que está aí existe e que isso que está aí para ser bom deve continuar a funcionar como é como está Se essa teoria ou essa mentalidade essa cosmovisão é inculcada nas cabeças e aceita por todas as pessoas a própria sociedade está garantida não há mais problemas Tudo vai permanecer como está e para sempre Por isso a academia ou as escolas são uma peça fundamental em qualquer sociedade onde a teoria positivistafuncionalista está em vigor É preciso garantir a coisa na própria explicação da sociedade ou melhor na própria definição do que é a realidade Se eu já defino a realidade como sendo isso que está aí já tenho um grande caminho andando e já não vai haver muitos problemas mais tarde quando alguns mais afoitos ou meio esquisitos ou anormais como são chamados quiserem ou tentarem perguntar se não se pode mudar o que está aí Uma última coisinha que penso que você está percebendo a quem poderá interessar tal teoria A quem pode ajudar tal teoria Qual a ideologia por trás dessa teoria Veja você se eu digo que a realidade é o que está aí e o que está aí é o melhor e isso que está aí deve continuar sempre assim a quem isso pode interessar É evidente interessa a quem está por cima pois eles estão muito bem obrigado e se a coisa continuar sempre assim será sempre bom para eles que vão continuar sempre no bembom Por isso eles patrocinam tanto essa teoria pois é a garantia para eles continuarem sempre por cima E por isso se chega mesmo a definir a realidade veja você a realidade como o que está aí para que ninguém possa nem tentar imaginar que as coisas possam ser diferentes daquilo que está aí pois se alguém quiser algo diferente do que está aí estaria querendo algo irreal e mau pois o que está aí é o que funciona e para ser bom tem de funcionar como está aí Que tal Qual a sua teoria O que é a sociedade e a realidade para você Você está vendo a força e a importância que têm as teorias Podese até afirmar de maneira geral que quem domina as teorias domina a sociedade pois quem domina as teorias domina as possibilidades de pensar ou não pensar diferente E se você nem consegue pensar diferente nunca você pode chegar a querer mudar ou desejar algo diferente linda ela logo absolutizou as coisas Absolutizou certamente sua beleza Achouse a beleza absoluta não se deu conta de que por mais linda que ela fosse nunca seria a beleza total poderia ser uns 90 mas nunca 100 Mas o que ela absolutizou principalmente foi a afirmação do rapaz ela não incorporou à sua maneira de ver o mundo a possibilidade de as pessoas dizerem o contrário do que pensam Ela achou que quando alguém diz algo diz sempre convencido do que diz e fala sempre de acordo com a sua verdade E essa mentalidade dá no que deu Se a moça tivesse uma visão histórica ela poderia responder assim Muito obrigada Sou bonita a seus olhos caso você não esteja mentindo Mas eu não sou a beleza absoluta E tem mais eu posso me tornar mais bonita ainda você ainda não viu tudo Um outro nome muito bom para essa teoria é o de teoria crítica Crítica vem do grego krinein que significa julgar Você já assistiu a algum julgamento Pois em qualquer julgamento você vai ver sempre duas partes alguém que acusa e outro que defende Por definição é preciso que existam essas duas partes A justiça é simbolizada por isso mesmo com uma balança na mão É verdade que muitas vezes ela é cega ou se faz de cega para fazer algum prato da balança pesar mais mas não deveria ser assim É impossível imaginar uma balança com um lado só não é verdade Pois isso é julgar krinein Pois bem possui uma visão crítica aquela pessoa que de antemão isto é antes mesmo de ver ouvir ou ler qualquer coisa tem essa convicção íntima e profunda de que tudo o que é histórico possui ao menos dois lados que nada é absoluto total que é preciso ver os dois lados da coisa a versão da polícia e a do bandido Mas isso é assim por definição A visão crítica é como se fosse um hábito um costume algo que sempre se deve fazer em qualquer circunstância e em qualquer momento Essa teoria tem também mais alguns nomes Um deles é o de teoria utópica veja o capítulo XXIV sobre utopia Utópico ou ucrônico como se costuma dizer mais freqüentemente hoje em dia é algo que ainda não existiu no espaço ou em algum lugar topos que em grego é lugar ou algo que ainda não existiu no tempo krónos em grego é tempo mas que poderá existir E esse futuro também pertence à realidade A realidade não se restringe pois ao aqui e agora mas é também tudo o que existirá e está ainda em germe em gestação no presente O conceito de realidade dentro dessa teoria é bem mais amplo do que o conceito de realidade da teoria positivistafuncionalista A teoria históricocrítica incorpora dentro do conceito de realidade o projeto o futuro E isso faz das pessoas um tipo diferente de gente gente aberta ao futuro gente de visão profética e transformadora O que virá também faz parte da realidade e é objeto de nosso trabalho e nossa luta São pessoas totalmente diferentes em suas mentalidades e em suas ações As pessoas de mentalidade positivistafuncionalista ou de mentalidade absolutizadora são pessoas castradas sem projeto e sem futuro Resumemse ao aqui e agora Estão cercadas e fechadas no presente Não conseguirão nunca quebrar o círculo fechado e férreo do sistema em que vivem As pessoas de mentalidade históricocrítica ao contrário são pessoas que incorporam na definição de realidade o futuro e a mudança A mudança faz parte da própria teoria Para essa teoria a mudança é sempre possível na medida em que a coisa se completa Sendo que as coisas não estão nunca prontas acabadas elas vão mudando na medida em que vão se aperfeiçoando em que vão superando a contradição interna que existe em todas as coisas pelo fato mesmo de não serem totais e acabadas Agora você mesmo pode responder a uma pergunta bem simples a quem interessa uma teoria históricocrítica É evidente que interessa a toda a pessoa que deseja ver a coisa global a toda pessoa que não está contente com o que está aí apenas a toda pessoa que deseja algo diferente melhor Os que lutam por algo melhor só poderiam se guiar por uma teoria que incorpora a mudança e a esperança de algo diferente Quem deseja um mundo novo encontra nessa cosmovisão os elementos necessários para um trabalho e uma luta de renovação e transformação Dentro do presente já estão em gestação as sementes duma nova sociedade Que tipo de sociologia nós gostaríamos de promover e patrocinar Evidentemente uma sociologia históricocrítica Uma sociologia relativizadora que mostra a precariedade e a transitoriedade de tudo o que é social Só assim poderemos ver a totalidade da coisa Uma sociologia que mostra o outro lado das coisas também uma sociologia que faça ver o que se passa por trás dos bastidores Somente a sociologia históricocrítica nos dará elementos para podermos fazer um papel de desmistificação do que está aí mostrando a precariedade de tudo o que existe e mostrando a relatividade de tudo o que é histórico A sociologia que nos interessa é uma sociologia que vá à essência da coisa e que não fique apenas na aparência É preciso continuar sempre com uma visão crítica nunca se deixar absolutizar por nada procurar sempre o vazio o escondido de tudo o que existe pois tudo é relativo Essas colocações que fizemos aqui vão nos acompanhar durante todas as discussões posteriores Os diversos temas que iremos analisar vão ser sempre enfocadas dentro dessa perspectiva É importante que se crie um novo hábito de ver as coisas Somente através duma visão históricocrítica poderemos manter a capacidade de discussão aguçada uma mente aberta ao futuro uma perspectiva histórica profética e transformadora Queremos deixar claro que nosso enfoque nessas discussões é sociológico e não teológico Não estamos negando a dimensão transcendental também presente no ser humano Mas nossa perspectiva de análise referese ao imanente sem negar o transcendente Aqui também é possível absolutizar e reduzir tudo ao sociológico CAPÍTULO IV SOCIEDADE SISTEMA OU MODO DE PRODUÇÃO A discussão que vamos fazer agora tem a ver com o que acabamos de explicar sobre as duas grandes teorias que fundamentam nossa maneira de ver as coisas e com a ideologia que existe por detrás das diversas teorias Quando falamos em sociedade geralmente empregamos o termo sistema social Dizemos que as sociedades são sistemas sociais específicos determinados por diferentes fatores que distinguem dessa maneira um sistema social de outro O que nos interessa no momento não é analisar os diversos tipos de sistemas ou sociedades mas é discutir o nome que se usa e por que se usa tal nome À primeira vista parece ser sem importância e sem consequência nenhuma o fato de se empregar o termo sistema social para designar a estrutura interna duma sociedade Mas se refletirmos um pouco veremos que o próprio uso desse conceito implica em determinada ideologia e em determinada maneira de ver as coisas e a sociedade Que significa ou o que implica o uso do termo sistema social O que vem à sua cabeça quando você ouve a palavra sistema O normal é nós imaginarmos um conjunto interrelacionado de coisas ligadas e dependentes umas das outras todas com sua função determinada formando uma unidade específica e completa fechada sobre si mesma Tudo o que existe dentro de tal sistema possui sua função e não há nada sobrando Algumas peças são centrais e fundamentais mas nenhuma é indispensável Um exemplo bom é o relógio o de antigamente São dezenas até centenas de pequenas peças Eixos rolamentos engrenagens que fazem o relógio andar e funcionar Quando se chama uma determinada sociedade de sistema entendese do mesmo modo que nesse país ou nessa nação há um conjunto todo de elementos de mil tipos diferentes que formam a estrutura dessa sociedade Essa sociedade é um sistema isto é uma máquina e tudo o que existe nela tem sua função O sistema é tanto mais perfeito quanto mais os subsistemas ou os diversos elementos que formam essa sociedade se interrelacionarem e quanto melhor cada um deles cumprir sua função Estaria faltando alguma coisa para se compreender bem esse tipo de sistema À primeira vista parece que não Temos ou podemos fazer uma descrição perfeita de cada elemento como eles estão relacionados e interligados e teremos à compreensão perfeita do assunto Mas saberemos mesmo tudo de tal sociedade Vamos discutir um outro termo ou conceito que ultimamente está sendo empregado ao menos por alguns mais corajosos para designar uma sociedade ou um determinado sistema social esse termo é Modo de Produção Talvez esse nome seja novo para você Talvez seja até a primeira vez que você o esteja escutando Mas não se espante Vamos discutilo Por que tal nome Há razões e bem interessantes de se chamar os diversos tipos de sociedades de modos de produção E o uso deste conceito assim como o uso do conceito sistema possui certos pressupostos e certas ideologias Assim se eu uso o termo sistema eu descrevo a sociedade como ela é aqui e agora no momento presente Tiro uma fotografia perfeita da situação em que ela está agora Mas não digo nada da maneira como ela começou e por que chegou a tal situação Também não digo nada das razões e dos interesses das pessoas que fizeram com que tal sociedade chegasse a ser assim isto é não explicito a que interesses esse determinado sistema social responde Além disso implicitamente eu transmito a idéia de que essa sociedade funciona assim naturalmente que ela é absoluta e autônoma em si mesma que não depende de nada mais Se eu uso o conceito modo de produção ao contrário eu já mostro possuir muitos pressupostos específicos E um dos pressupostos que está presente e podese perceber de imediato é o de que nenhuma sociedade pode existir e se estruturar a não ser a partir de sua sobrevivência isto é de sua produção Quem denomina uma sociedade de modo de produção está dizendo implicitamente que as sociedades todas isto é as formações sociais se estruturam nascem crescem se desenvolvem a partir da maneira como se conseguem as coisas para viver o como se consegue a comida a bebida a vestimenta a moradia a sobrevivência dá a característica fundamental a uma sociedade qualquer Se formos dizer isso num plano mais individual referindonos a uma pessoa singular diríamos que ninguém consegue viver sem comer sem se alimentar E penso que isso seja evidente seja óbvio Não há ninguém que viva sem comer Só por milagre se vive sem comer e isso já está acima da natureza Passando para um plano social diríamos que nenhuma sociedade pode subsistir sem produção A produção é o motor duma sociedade Aqui surge uma pequena discussão Alguns poderão perguntar mas isso não é materialismo Bem se por materialismo a pessoa entender que para viver a gente precisa comer então realmente isso é materialismo Mas parece que materialismo não é bem isso Confira o capítulo XI O que se pretende afirmar pura e simplesmente é que para viver alguém precisa comer E se a pessoa não comer não poderá estudar não poderá rezar não poderá passear não poderá filosofar não poderá contemplar não poderá fazer nada Depois que se alimentou então pode fazer todas as outras coisas Um segundo pressuposto de quem usa o conceito modo de produção é ligado ao primeiro mas pode ser especificado melhor e discutido mais a fundo é o pressuposto histórico Quem usa o conceito sistema restringese ao que está aí Quem usa o conceito Modo de produção já está insinuando que para se compreender uma sociedade em sua essência e profundidade é preciso ver quem a gerou isto é ver quais são seus pais Por isso se vai logo ao anterior ao que determinou ou condicionou essa sociedade que aí está E o que condicionou esse tipo de sociedade foi a maneira como as pessoas puderam ou tiveram de se organizar CAPÍTULO V A TEORIA DO MODO DE PRODUÇÃO Tornase necessário a esta altura discutir alguns conceitos para podermos prosseguir no nosso trabalho Sendo que nós usaremos a teoria do modo de produção em nossas análises da sociedade tornase indispensável explicar alguns termos que são comuns nesse tipo de análise Não sei se você já pensou o que é um conceito Ele é igual a um nome ou a uma pessoa Há algumas pessoas com as quais a gente está bastante familiarizado pois encontrase com elas todos os dias Se alguém mencionar seu nome logo a gente vai identificálas Assim é com os conceitos Alguns são bastante familiares Outros estranhos Pois o nosso trabalho agora é tentar familiarizarnos com alguns nomes conceitos que serão posteriormente usados em todas as nossas discussões Na medida em que formos discutindo os conceitos nós vamos também relacionar esses conceitos uns com os outros Da relação junção de uns com os outros irá aparecer uma espécie de instrumento para se poder analisar a sociedade Vamos ver depois na análise dos diversos modos de produção como esse instrumento vai ser extremamente útil É com esse instrumento que se verão as diferenças que existem por exemplo entre comunismo capitalismo e socialismo Para tornar mais fácil e interessante a montagem desses instrumentos nós vamos fazêlo em forma de pergunta É um método prático e você poderá utilizálo quando quiser com os diversos grupos de trabalho onde você por acaso irá atuar Vamos pois começar a montagem do instrumento Para cada novo conceito que for aparecendo nós iremos dando um número No final deste capítulo você tem o instrumento pronto com os números dos conceitos 40 41 Pergunta O que é necessário para viver pensamos que não haja pergunta mais fundamental que essa e nossa análise parte do concreto do chão Resposta Para viver são necessárias muitas coisas mas principalmente comer Ninguém vive sem comer Para se fazer qualquer outra coisa é necessário comer Até hoje não se descobriu a receita de viver sem comer Pergunta Como se conseguem as coisas para comer Resposta Conseguemse as coisas para comer trabalhando O trabalho é o ponto fundamental é a chave de tudo Alguém chamou o trabalho de a chave da questão social e logo adiante de a chave da solução da questão social Esse é o conceito número 1 Muitas pessoas respondem a essa pergunta dizendo comprando ou pedindo Mas quem trabalha responde logo trabalhando Pergunta Conseguemse as coisas para comer trabalhando onde Resposta Trabalhando na terra de onde vem tudo e nas fábricas onde se transformam as coisas da terra Pode examinar a sala ou o lugar onde você está tudo o que você vê aí veio da terra ou da fábrica Há muitas pessoas que trabalham em mil outros lugares mas se você vai pesquisar a fundo vai ver que esses outros trabalhos estão direcionados a esta finalidade principal sobrevivência E o centro da sobrevivência é a alimentação Numa escola por exemplo há professores e alunos Aí não se produzem coisas diretamente necessárias para viver a escola não é nem uma fazenda nem uma fábrica Mas para que existem escolas Para diversas finalidades Principalmente deveriam existir para fazer com que as pessoas atualizassem suas capacidades desenvolvessem suas potencialidades a fim de poderem ser úteis à sociedade É verdade que infelizmente muitas escolas não fazem mais que treinar as pessoas para trabalharem com eficiência e rapidez sem se preocupar se isso vai ajudar a elas à sociedade ou somente a alguns São poucas as escolas que formam para uma educação integral Mas de qualquer maneira a escola está a serviço da sobrevivência ajuda as pessoas a conseguirem as coisas para viver Tome nota então de mais dois conceitos nº 2 Terra Nº 3 fábricas veja o esquema no fim do capítulo Pergunta Como se chamam as terras e fábricas Resposta O nome mais comum para se designar as terras e fábricas e todo elemento material que de qualquer maneira produz alguma riqueza é meios de produção Esse é um conceito muito importante É o nº 4 Guarde bem esse nome Meio de produção é o que produz riqueza Deve ser distinguido claramente do que se chama de bem de consumo que é o produzido por um meio de produção Assim por exemplo o feijão é um bem de consumo como uma calça uma casa para morar um carro para andar Mas às vezes uma casa ou um carro podem ser meios de produção quando por exemplo a casa é para alugar ou quando o carro é um táxi ou um ônibus que produz riqueza Há ainda um outro conceito que serve para designar elementos materiais que produzem riqueza Esse conceito é capital n 5 Capital vem do latim de caput que significa cabeça chefe e fonte Não se sabe o que originou o termo capital mas pode ser tanto fonte pois a terra e as fábricas são a fonte de toda riqueza como também cabeça pois houve um tempo em que o gado era moeda e o capital era calculado pelo número de cabeças de gado que alguém possuía¹ Pergunta E como se poderiam chamar os meios de produção o capital e o trabalho Resposta Um nome bom para designar capital e trabalho é forças de produção ou forças produtivas Mais um conceito ¹ Para simplificar chamamos de capital neste trabalho aos meios de produção O conceito de capital contudo é muito complexo e pode significar também mais coisas transformandose até numa relação social dependendo da conceituação que a ele se der 42 43 Tome nota nº 6 São os meios de produção movimentados pelo trabalho humano que são os responsáveis pela existência de toda riqueza Pergunta Como apareceram os agrupamentos humanos as sociedades Qual o elemento fundamental que fez com que as sociedades se organizassem Resposta Essa pergunta pode dar muita discussão De início podem surgir diversos fatores que possam ter dado origem às diversas sociedades Mas um fator pode ser identificado como o fundamental os grupos humanos se organizaram para garantir sua sobrevivência Ninguém vive sem comer Se cai um avião no meio duma floresta e as pessoas sobrevivem a primeira coisa que vão fazer é pensar na sobrevivência Vão ter de ver se há algo para comer beber depois vão ver onde pousar se precisam de agasalho Mas o principal mesmo é a comida As vestes e a moradia virão depois A resposta que se poderia dar então é que as diversas formações sociais esse é um nome bom para designar as sociedades se organizaram isto é nasceram cresceram e se estruturaram a partir da maneira como conseguiram as coisas fundamentais para sobreviver E um nome bom para designar a maneira como se conseguem as coisas para sobreviver é modo de produção É mais um conceito nº 7 É a maneira como se conseguem as coisas para sobreviver que dá a característica fundamental a uma sociedade Assim os índios nômades não vão construir prédios de dois ou três andares pois eles vão migrando na medida em que necessitam coisas para viver caça e pesca Eles vivem da extração primária e quando isso termina num lugar e é abundante no outro eles migram Conosco já é diferente temos um trabalho por aqui e pretendemos ficar um bom tempo talvez toda nossa vida Por isso construímos uma casa com material que possa durar muitos anos 38 39 para poder sobreviver A conotação histórica está subjaciente ao conceito Modo de produção Isso nos leva já a ter presente que as sociedades podem mudar e se por acaso são assim nesse momento houve um tempo em que não eram assim e haverá um tempo em que serão diferentes Poderão existir muitos fatores que modificaram ou modificarão essa sociedade Um porém é fundamental é a maneira como essa sociedade vai conseguir garantir sua sobrevivência Esse fator está sempre subjacente a tudo Qual dos dois nomes será melhor Como você mesmo pode descobrir os dois conceitos supõem duas teorias explicativas da sociedade Uma teoria que vê a sociedade organizada estruturada com funções interligadas completa absoluta fechada a teoria funcionalistapositivista Outra teoria que vê a sociedade como estruturada a partir de um fator básico a produção e que poderá mudar conforme a maneira como ela conseguirá sua sobrevivência a teoria histórica Essa segunda teoria explica como ela é e porque ela chegou a ser assim isso é vai às suas origens às suas causas A primeira ao contrário fica somente no aqui e agora Se uma teoria é tanto mais científica quanto mais fenômenos ela explica ou quanto mais do fenômeno ela explica confira o capítulo I então parecenos que a segunda teoria é mais científica Haveria ainda algumas considerações a fazer sobre a ideologia que subjaz a essas diversas teorias A quem elas interessam Com a discussão que se fez sobre ideologia você mesmo poderá tirar as conclusões que se fizerem necessárias É evidente que quem tem interesse em fazer com que as coisas permaneçam como são e não pretende que as coisas mudem vai patrocinar uma teoria que insinua ao menos implicitamente que as coisas são assim porque são assim O sistema que está aí é assim porque é assim Ele funciona organizadamente tudo caminha para uma harmonia No final tudo acaba bem tudo volta ao equilíbrio Pode haver problemas mas são todos passageiros O normal e o natural é que as coisas sejam como são Já quem tem interesse em fazer com que as coisas mudem procura uma teoria que ao menos implicitamente insinue que as coisas nem sempre foram assim que houve um tempo em que eram diferentes e que se são assim num lugar em outro podem ser diferentes Essa é a visão histórica da sociedade Tentase mostrar que tudo tem um pai tudo tem uma causa Insistese em que se preste atenção à origem das coisas E isso é mostrar a causalidade das coisas Insistese em tornar evidente que todos os sistemas sociais ou os modos de produção são criações humanas portanto são cultura humana são fenômenos culturais e não naturais Peter Berger no seu livro Perspectivas Sociológicas chama a isso de êxtase É a capacidade que uma pessoa tem de saltar dum mundo em que vive mergulhado para um outro mundo possível O êxtase transforma a consciência que se tem da sociedade fazendo com que determinação se converta em possibilidade Se encararmos a sociedade como sendo um sistema social organizado e coerente facilmente caímos na tentação de naturalizála isto é de determinála pois a natureza é determinada sempre foi assim Se pelo contrário mostrarmos o caráter histórico cultural da sociedade temos chance de mostrar e perceber sua relatividade isto é sua possibilidade a sociedade como existe é uma das formas possíveis mas não a única Pode mudar dependendo dos interesses dos que dela participam Você já ouviu falar no método Paulo Freire dos Círculos de Cultura Pois a primeira discussão que se fazia nesses círculos era mostrar a diferença entre natureza e cultura Quando as pessoas percebem essa diferença então se dá o estalo o êxtase as pessoas se dão conta de que a sociedade em que vivem é uma das formas possíveis de se viver e que se houver outros interesses poderseá mudar E aí as coisas ficam muito diferentes Se você examinar agora a história de todas as sociedades vai perceber que isso é assim mesmo a maneira como se conseguem as coisas para sobreviver dá a característica básica a uma formação social Até o tipo de família sofre esta influência No Brasil da Casa Grande e Senzala onde os escravos conseguiam todas as coisas para sobreviver podiam existir tipos de famílias patriarcais isto é grupos de cinco dez famílias numa casa só Havia um dono só o filho mais velho e os outros iam se colocando ao redor da casa grande Hoje em dia as coisas já são um pouco diferentes A maneira como se conseguem as coisas para sobreviver mudou Vivemos numa sociedade industrializada onde cada pessoa que trabalha recebe seu salário individual As famílias foram então se reduzindo se tornando mínimas celulares homem mulher e o menor número de filhos possível Vamos agora examinar o esquema todo que nós queremos que seja o nosso instrumento de análise Começamos de trás para a frente a partir de perguntas simples e quase óbvias Se você for discutir isso com algum grupo vai poder constatar que as pessoas vão normalmente construindo esse instrumento e respondendo às perguntas como foram colocadas Chegamos assim ao início ao ponto de partida à identificação do conceito modo de produção que nós gostaríamos de usar em lugar de sistema veja o capítulo IV A pergunta que se coloca agora é o modo de produção é apenas as forças produtivas ou ele possui mais um elemento Ou ainda o que distingue um modo de produção de outro modo de produção Pois todas as formações sociais as sociedades possuem essas forças produtivas capital e trabalho O que mais faria parte integrante estrutural dum modo de produção Resposta A resposta a essa pergunta não é fácil Para fazer as pessoas descobrirem por si mesmas demora sempre um pouco Mas se chega lá Quando se examina um grupo humano uma família uma escola muitas vezes fazemos uma análise superficial do fenômeno descrevendo apenas o que vemos sem chegar à essência à vida do grupo como grupo E o que faz a vida do grupo sua vivência é aquele encadeado aquela trama de relações que constitui a alma do grupo A essência dum grupo é aquela rede de interrelacionamentos que une ou desune os diversos elementos do grupo mas que sempre tem a ver com o grupo como grupo e não com as pessoas individuais Assim por exemplo a comunicação a união a colaboração o diálogo o conflito as divergências a competição a cooperação a dominação a submissão etc São milhares de relações que variam de grupo para grupo A existência maior ou menor de determinadas relações e as diferentes relações vão distinguir um grupo de outro grupo O que é relação É fundamental aprofundar um pouco esse conceito de relacão A gente usa essa palavra muitas vezes por dia mas quando se trata de definila temos dificuldades Já tentou definir o que é relação Em filosofia se diz que relação é a ordenação intrínseca de uma coisa em direção a outra coisa Uma menina de 13 anos definiu perfeitamente relação É aquilo pelo qual uma coisa não pode ser aquela coisa se não tem outra coisa Pois é isso mesmo Relação é aquilo pelo qual uma coisa não pode ser o que é se não há outra Veja por exemplo a palavra pai Alguém consegue ser pai sozinho Para alguém ser pai precisa no mínimo de uma mulher e de um filho Sem uma mulher e um filho não há pai Assim também a palavra mãe e filho Então veja a questão se digo pai ao mesmo tempo estou dizendo mãe e filho Isto é estou dizendo uma coisa e três coisas sob diferentes aspectos Por que não é absurdo dizer que Deus é um e três pessoas Porque pessoa nesse caso é uma relação uma não existe sem a outra e pela comunhão essas três pessoas formam uma unidade o Deus dos cristãos Veja agora a lista de relações que colocamos acima você vai descobrir que uma pessoa só não consegue nunca perfazer uma relação Você não consegue cooperar sozinho Para você cooperar é preciso mais alguém A origem da palavra já significa trabalho junto A palavra relação é extremamente importante para a sociologia Alguns críticos de Marx por exemplo dizem que ninguém consegue entender nada de sua teoria se não tiver esse conceito presente e que o conceito relação resume toda sua teória sociológica Você se lembra da discussão sobre as duas grandes teorias em sociologia Pois aqui está o ponto Um adjetivo que provém de relação é relativo Relativo se contrapõe a absoluto A diferença básica entre as duas teorias pois é que uma vê o sistema como fechado absoluto A outra vê tudo relacionado pois os agrupamentos humanos são históricos e se são históricos são relativos ao menos quanto à história Peter Berger diz que uma das características da consciência sociológica é a mentalidade relativizadora que toda pessoa que lida com o social deve possuir Há uma diferença fundamental entre uma pessoa com mentalidade relativizadora isto é uma pessoa que tenta ver imediatamente as relações que as coisas têm com as outras e uma pessoa com uma mentalidade absolutizadora isto é uma pessoa que vê as coisas estanques fechadas isoladas umas das outras Relações de produção Mas por que no esquema se colocou relações de produção Bem de produção aqui fica como um adjetivo O fundamental é a identificação das relações Mas como nenhuma sociedade sobrevive sem sua produção as relações de produção ficam sendo então as básicas indispensáveis Isso porque ninguém vive sem comer e nem uma sociedade vive sem produção Mas elas são necessárias nem por isso são suficientes Sobre essas relações milhares de outras relações são criadas e construídas Não se discute aqui o tipo de determinação de umas sobre as outras Isso vai ser visto no capítulo sobre infra e superestrutura Apenas se quer insistir sobre esse fato óbvio de que sem comer ninguém vive As relações de produção são pois o nosso conceito nº 8 Terminamos desse modo o instrumento de análise estrutura básica das formações sociais das sociedades Com isso podemos agora examinar os diversos tipos de sociedade e ver no que elas se distinguem a partir dessa estrutura básica E você vai notar logo como esse instrumento vai ajudar É o tipo de relações que se estabelece entre as pessoas e entre as pessoas e coisas isto é entre trabalho e capital que distingue basicamente um tipo de sociedade de outra ver quadro 1 Quadro 1 ESQUEMA INSTRUMENTAL PARA ANÁLISE DA BASE DE UMA SOCIEDADE Passaremos agora a fazer uma discussão de três formações sociais possíveis a partir de sua estruturação básica as forças e relações de produção cap VI VII e VIII No capítulo IX ampliamos o quadro acrescentando a essas possíveis formações sociais outros elementos que aprofundam sua compreensão a concepção de ser humano nelas subjacente as filosofias valores que as sustentam e as condutas e relações que são predominantes em sociedades que possuem tal concepção de ser humano e tal filosofia valores CAPÍTULO VI CAPITALISMO Quase todos os dias se ouve falar que o Brasil é um país capitalista que o sistema que predomina no Brasil é o capitalista Vamos tentar explicar o que isso significa Vimos como todas as sociedades humanas todos os grupos humanos se organizaram para conseguir uma coisa fundamental a sobrevivência Sobrevivência é principalmente ter as coisas necessárias para comer vestir morar etc Vamos chamar a essa maneira de conseguir as coisas para viver de Modo de produção Com o quadro do capítulo anterior a gente pode entender agora o que é capitalismo e como ele se distingue de qualquer outro modo de produção Por exemplo as forças produtivas são em geral as mesmas para qualquer sistema No sistema nômade dos índios as forças produtivas eram o pouco trabalho deles em tirar as coisas da terra ou plantar alguma coisa como mandioca milho etc eram então as terras e o trabalho No sistema cooperativista é o trabalho dos cooperativados ou na terra ou na fábrica Também no capitalismo as forças produtivas são o trabalho na terra nas fábricas e em muitos outros tipos de empresa O que distingue então um sistema de outro Aqui está o interessante Quem estabelece esta distinção são as Relações de Produção Isto é como o capital e o trabalho se relacionam Vamos dar um exemplo num sistema de cooperativas que relações existem Precisa distinguir entre os que trabalham e entre os que trabalham e o capital Entre os que trabalham a relação mais importante é a cooperação É por isso que o sistema se chama de cooperativo E entre os que trabalham e o capital terras e fábricas De quem são as terras e fábricas São dos que trabalham E o lucro de quem é Dos que trabalham Então que relação existe A relação é a de alguém que possui o capital e os lucros se apropria do capital e dos lucros isto é relação de posse apropriação Resumindo num sistema cooperativo as relações são de cooperação entre as pessoas e de apropriação entre as pessoas trabalho e o capital terras e fábricas Agora vamos tomar um exemplo duma fábrica ou terra no sistema capitalista Perguntase Qual a relação entre as pessoas São todas iguais A resposta é não Por quê Porque uns são os donos do capital e os outros trabalham Isto é existem alguns que são proprietários e os outros só trabalham A palavra dono em latim é dominus Costumase dizer então que a relação entre as pessoas é de dominação isto é há necessidade de donos Agora qual a relação entre o trabalho e o capital Pensemos um pouco Para entender o nome que vamos dar a essa relação é preciso alguma coisinha mais E essa coisinha é o que dá valor a todas as coisas A palavra valor é muito complicada Várias coisas são denominadas por essa palavra Há o valor moral que designa as negociações e tradições de grupos e povos sobre como devemos viver e comportar Há o valor natural que é o valor que algo possui por ser natureza como o ar a água as terras E há o valor econômico que é o resultado do trabalho humano É preciso distinguir entre esses três tipos de valor Queremos mostrar que a única coisa que dá valor econômico a algo é o trabalho humano empregado em se fazer isso Assim valor é diferente de preço Enquanto o preço do quilo de feijão pode ser 50 centavos ou 1 real isto é pode variar muito conforme a quantia que existe o valor é sempre o mesmo quanto se gastou para ter esse feijão isto é trabalho humano empregado Valor é também diferente de utilidade uma caneta estragada não escreve não é útil mas o seu valor é o mesmo quanto se gastou para fazer esta caneta O ar oxigênio é extremamente útil No entanto ninguém trabalhou para fazêlo é natureza e você por enquanto não paga o ar Só será pago quando nele houver trabalho humano Assim se pensarmos um pouco vamos ver que a única energia que nunca desgruda do objeto e que em última análise dá valor econômico e constitui o valor desse objeto é o trabalho humano que se gastou para ter essa coisa O Papa Leão XIII já dizia isso claro no fim do século passado em sua encíclica Rerum Novarum O trabalho humano é tão admirável que se pode afirmar sem sombra de erro que é a fonte única da riqueza das nações Antigamente quando não existia dinheiro o critério para se saber o valor das coisas era quanto tempo se tinha gasto para fazer essa coisa isto é o trabalho humano Se se gastassem quatro horas para fazer uma calça e duas horas para se fazer uma camisa do mesmo tecido trocavamse duas camisas por uma calça Resumindo É o trabalho humano que produz todo o valor toda riqueza Agora a perguninha importante que vem ajudar a compreender qual a relação entre capital e trabalho num sistema capitalista se é o trabalho humano que produz toda riqueza e só o trabalho Leão XIII por que é que o lucro vai para quem tem o capital terra e fábrica Como se chama a relação pela qual o dono do capital sem trabalhar ou trabalhando um pouco apenas o trabalho dele só fica com a maioria do lucro Essa relação se costuma chamar de expropriação ou exploração isto é a relação pela qual um tira uma coisa do outro 50 Retomando então Qual a diferença entre um sistema cooperativo e um sistema capitalista Veja a diferença da relação Quadro 2 Diferença entre um sistema cooperativo e capitalista a partir das relações de produção Sistema Cooperativo Sistema Capitalista Relações entre as pessoas Cooperação Dominação Relações entre o trabalho e o capital Apropriação Exploração Atenção quando se fala em dominação e exploração não se quer dar a essas palavras o sentido de reprovação de polêmica Apenas se quer exprimir uma relação mostrar como a coisa é na ponta do lápis cientificamente Por isso o sistema capitalista é um sistema que separa capital de trabalho e cujas relações são de dominação e exploração certo Para que haja dominação e exploração é necessário que o trabalho e o capital estejam separados No momento em que a pessoa trabalha no que é dela não existe mais capitalismo E aí está o problema a grande luta é fazer com que as pessoas ou tra 51 balhem no que é delas terra para quem nela trabalha ou recebam o fruto justo de seu trabalho não sejam exploradas Você que é inteligente já terá percebido que no fundo não há diferença entre capitalismo e certas sociedades totalitárias onde o Estado é dono de tudo no referente à exploração Tudo depende do quanto de excedente de mais valia o capitalista ou o Estado se apropria Mas o que é maisvalia A maisvalia é o lucro líquido que sobra depois de descontadas todas as despesas Por exemplo Uma mesa é vendida pelo dono da fábrica por 150 reais Um operário gasta 10 horas para fazer a mesa Recebe pelas 10 horas 30 reais pelo salário mínimo de 1997 receberia 15 reais A madeira para a mesa custa 20 reais Já são 50 Os impostos quando são pagos mais 15 reais São 65 Mais uns 15 reais para despesas com luz reposição das máquinas quando estragadas etc 80 reais Mais uns 20 de outras despesas são 100 reais O dono da fábrica vende por 150 Esses 50 reais são a maisvalia o lucro líquido que o capitalista tem descontada toda despesa O exemplo talvez não seja muito exato mas é essa maisvalia que é a peçachave do capitalismo Se você for conferir vai ver que toda riqueza isto é o valor da mesa é fruto do trabalho do ser humano Se não fosse o trabalho humano não haveria nada talvez uma árvore perdida no mato mas nem conhecida do homem pois para ser descoberta precisaria já trabalho Por isso se diz que a maisvalia é sempre resultante da apropriação do excedente do trabalho do trabalhador Já se disse em outra parte que cálculos feitos para São Paulo mostram que de cada 8 horas que um trabalhador trabalha ele fica só com o lucro de 3 horas as outras 5 horas vão para o capitalista impostos etc A mãodeobra brasileira é em geral dez vezes mais barata que a americana e 7 vezes mais barata que a européia Um outro exemplo se um objeto for vendido no Brasil por 100 reais o trabalhador fica com apenas 72 reais no Nordeste fica com apenas cinco Nos Estados Unidos contudo fica com 36 reais cinco vezes mais Acontece também que nos Estados Unidos as forças produtivas tecnologia são mais desenvolvidas e com isso a produtividade é maior Além disso pela exploração das periferias países satélites eles podem baratear seu custo de vida pois nós vamos produzir coisas muito mais baratas para eles No fundo é nossa mãodeobra barata que os ajuda É o grau de exploração e de apropriação de maisvalia pois que difere entre os vários tipos de capitalismo O Estado pode também retirar parte de trabalho para aplicar em obras sociais Esse trabalho retorna depois como benefício para o trabalhador Vamos ver em seguida o modo de produção socialista e o comunista No final dos três pensamos que se poderá ter uma percepção mais global dos diversos tipos de sociedade a partir de sua estruturação básica 52 53 CAPÍTULO VII SOCIALISMO O conceito socialismo é bastante complexo O termo é usado com significados tão diferentes que é preciso limpar o terreno esclarecer um pouco a questão A primeira distinção que é preciso fazer é a seguinte distinguir entre o que se chamou de socialismo utópico e socialismo científico Socialismo utópico Muitos pensadores discutiram a possibilidade duma sociedade ideal imaginada e algumas vezes descrita Eles imaginaram uma sociedade perfeita onde não houvesse desigualdade onde todos teriam o necessário para viver onde todos se respeitasem como iguais onde tudo fosse de todos Falavam em supressão da propriedade privada em trabalho comunitário em cooperativas em educação para todos E alguns deles até já acenavam para maneiras de se chegar a isso mas na prática elas não se concretizaram Talvez por isso mesmo sejam denominadas de utópicos Socialismo científico Com Marx e Engels as perspectivas mudaram Já se começou a discutir concretamente como fazer para mudar e implantar uma sociedade mais justa É com eles que começa o socialismo científico isto é uma ciência para colocar em prática esses ideais Marx tomou três coisas que estavam em voga na sua época e as colocou juntas a A dialética isto é uma teoria que afirma tudo contém em si a sua contradição tudo o que é temporal é imperfeito e relativo Essa teoria impulsiona à ação mostra que tudo é imperfeito e pode sempre ir melhorando Não se pode parar b A economia política inglesa baseada principalmente nas idéias de Adam Smith e David Ricardo Basicamente essas idéias diziam que todo valor é fruto do trabalho humano a fonte única das riquezas c O socialismo isto é as idéias de igualdade solidariedade justiça para todos Democracia Juntando essas três idéias teremos o que se chamou de socialismo científico ou possível ou capaz de ser colocado em prática a a convicção de que é possível mudar dialética b a descoberta de que é o trabalho que produz tudo teoria do valor c a igualdade de todos socialismo O que aconteceu depois disso As coisas começaram então a estremecer A estratégia foi logo começar a trabalhar com os que faziam tudo os trabalhadores são eles que produzem tudo o trabalho é a fonte das riquezas Por justiça eles deveriam ser tomados em consideração deveriam ser a fonte principal do poder enquanto houvesse uma sociedade dividida até que se chegasse a uma sociedade em que todos teriam os mesmos direitos e deveres É evidente que as idéias socialistas não nasceram do ar Na medida em que começaram a ser postas em prática começaram a mexer justamente com quem detinha privilégios injustos Concretamente foi contra o capitalismo que os socialistas começaram a lutar E quem começou a lutar foram justamente os trabalhadores Aliás a grande luta do socialismo é contra o capitalismo Dificilmente se entende bem o que seja socialismo se não se sabe o que é capitalismo Veja o capítulo VI Mas é bom lembrar capitalismo por definição separa os meios de produção capital do trabalho Se não há isso não há capitalismo Mas por que faz isso Justamente para dominar o 54 55 trabalhador relação de dominação isto é em que um é dono e principalmente para explorar isto é tirar para si para o capital parte do trabalho Sendo que é o trabalho que é a fonte única das riquezas Leão XIII Rerum Novarum os donos dos meios de produção do capital só podem se enriquecer na medida em que tiram expropriam exploram parte do trabalho do trabalhador Não há outro jeito isso é matemático Essa é a relação de exploração Nessa altura a gente vai entendendo melhor o surgimento do socialismo As pessoas acreditavam que era possível mudar dialética queriam igualdade e justiça socialismo não existia nem mudança nem igualdade porque o capital não deixava mudar e havia exploração do trabalho Assim aos poucos os que estavam sendo explorados os trabalhadores foram se unindo se organizando e exigindo seus direitos A luta foi difícil Muitos trabalhadores morreram Outros melhoraram bastante As maneiras de se fazer isso também foram muito diferentes Em alguns lugares como nos países que continuaram capitalistas os trabalhadores se contentaram em melhorar seu salário Assim o salário de um americano é no mínimo dez vezes maior que o de um brasileiro sendo que o custo de vida não chega a ser duas vezes maior Como conseguiram isso Na luta E não pensem que o capital nos Estados Unidos não tem lucro Tem sim mas bem menos que no Brasil onde das oito horas de um trabalhador ele fica com três e cinco ficam com o capital A exploração aqui é bem maior do que lá isto é a idéia socialista não penetrou muito ainda em nosso meio Em outros lugares houve confronto direto entre trabalhadores e donos do capital Os trabalhadores conseguiram chegar ao poder mandar Mas aí aconteceu aos poucos uma coisa que não se previa o grupo de gente que tomou o poder começou a mandar dominar e a explorar os que trabalhavam É o que acontece por exemplo nos países de Estados totalitários onde há uma classe que explora os outros totalitarismo estatal Por isso é preciso distinguir o socialismo científico enquanto teoria e o movimento pela justiça e pela sua concretização Surge aqui então uma enormidade de tipos possíveis de socialismo colocados entre os dois extremos em que os meios de produção o capital estão nas mãos de apenas alguns que exploram os outros e o extremo em que os meios de produção estão nas mãos também de alguns sob o apelido de Estado que também exploram os trabalhadores Veja o quadro comparativo dos três modos de produção do capítulo 8 O socialismo quer concretamente fazer com que o fruto do trabalho do trabalhador fique com ele em outras palavras que ele não seja explorado em seu trabalho E acredita que só assim poderá haver justiça e igualdade para todos Alguns trabalhadores se organizam em cooperativas porque sozinhos não podem fazer o que desejam Outros criam fazendas comunitárias como os Kibbutzim Israel Outros aceitam que o bem de produção a fábrica por exemplo esteja em nome de uma pessoa mas querem participar dos lucros Alguns querem participar dos lucros e direção pois acham que também têm idéias boas para dar Aqui é importante fazer uma distinção muito necessária o socialismo pretende a socialização dos bens de produção daquilo que produz isto é terras fábricas e não aquilo que é produzido bens de consumo Alguns acham que já existe socialismo quando o que é produzido é socializado Mas não é assim Agora o que acontece é o seguinte o Estado quando representa de fato os cidadãos numa democracia verdadeira e não quando o Estado são os capitalistas ou um grupo só pode socializar algumas coisas absolutamente necessárias para todos como a educação a saúde o transporte coletivo a moradia pode garantir a alimentação básica isto é ninguém irá morrer de fome Realmente não é fácil dizer o que é o socialismo pois não existe um só mas muitos de diversos graus de diversas matizes O importante é o seguinte em cada caso a gente precisa perguntar 1 Há mobilização organização do povo O povo quer progredir ou está acomodado Quanto mais mobilização participação e vontade fé e esperança do povo em progredir mais socialismo 2 O povo está recebendo o justo preço de seu trabalho O que ele faz realmente fica para ele Quanto mais o fruto do trabalho fica com quem trabalha isto é quanto menos alienação separação entre o trabalho e o fruto do seu trabalho e exploração houver mais socialismo 3 Há realmente democracia na sociedade isto é os direitos de cada um são respeitados e todos são tratados igualmente ou há enormes diferenças privilégios injustiças Quanto mais igualdade não uniformidade houver mais essa sociedade é socialista Ainda mais nunca haverá uma sociedade socialista perfeita pois tudo o que é histórico é imperfeito é relativo Um socialismo acabado iria contra o primeiro princípio que tudo contém em si a sua contradição tudo pode ainda melhorar O que se pretende evitar é a prática da dominação e da exploração Se alguém por exemplo possui um meio de produção mas paga a cada trabalhador o preço justo de seu trabalho tudo bem E para haver socialismo não é preciso haver supressão total da propriedade privada dos meios de produção como queriam os socialistas extremadosEu posso trabalhar num meio de produção que não é meu sem exploração Não é tarefa de alguns dizer qual é o melhor tipo de sociedade isso depende do povo organizado Dentro dos extremos cada povo deve se organizar como quer respeitando sempre as aspirações da maioria Se pudéssemos englobar talvez os muitos tipos de socialismo poderíamos dividilos em duas categorias Uma primeira onde há maior coletivização dos meios de produção e a tomada do poder foi através dum processo revolucionário popular Uma segunda que poderíamos chamar de socialismo democrático onde se chegou ao poder através do voto nesse caso se fazem apenas algumas reformas e as transformações se dão aos poucos CAPÍTULO VIII COMUNISMO O que vamos discutir agora é algo bastante relacionado com o que vimos no capítulo anterior Um primeiro ponto a ser esclarecido é a conceituação Socialismo e Comunismo Nem sempre se entende a mesma coisa com um conceito ou outro às vezes Socialismo é até confundido com Comunismo É importante então prestar bem atenção no que cada um diz para ver se é possível distinguir um conceito do outro Como se isso não bastasse acontece ainda que às vezes se fala de Socialismos como modelos históricos Socialismo real isto é países que tentaram colocar em prática o Socialismo ou o Comunismo A coisa complica então muito mais Vamos tratar pois primeiramente da distinção entre Comunismo e Socialismo como aconteceu historicamente Depois vamos ver sua distinção teoricamente Comunismo e Socialismo na História Nós vimos no capítulo anterior que o Socialismo havia brotado de três idéias principais a teoria do valor que o trabalho é a fonte única do valor da dialética que tudo progride devido à sua contradição interna e dos ideais de justiça e solidariedade existentes Socialismos utópicos e cooperativistas Em 1848 Marx escreve o Manifesto Comunista Ele chama esse manifesto de comunista porque queria marcar claramente a diferença existente entre a nova teoria que propunha e aquele conjunto de doutrinas enumeradas anteriormente Mas acontece que na medida em que as idéias marxistas foram se tornando generalizadas hegemônicas no conjunto das idéias que se desenvolveram no seio do movimento operário da metade do século passa do Marx e outros passaram a usar indiscriminadamente os termos socialismo e comunismo Sob esse título de socialismo porém começaram a aparecer correntes completamente distintas entre si Lenin após a Revolução Russa de 1917 diferenciou então a ala do movimento socialista internacional a que pertencia a ala da esquerda das demais Para isto passou a chamar a sua corrente de Comunista e a tratar Comunismo e Socialismo como conceitos diferentes Comunismo seria a verdadeira teoria revolucionária desenvolvida por Marx e Socialismo seria a corrente reformista Desta maneira após a I Guerra vemos ressurgir um movimento socialista dominado pelos partidos sociais democratas notadamente o alemão e um movimento comunista comandado pelos bolchevistas russos O comunismo é então um movimento político que surge com a Revolução Russa e que se espalha por todo o mundo possuindo como base teórica o corpo teórico do marxismolenismo Visão teórica do Comunismo Para Marx a sociedade comunista é o último estágio da história da humanidade Nela não existirão mais exploradores e explorados isto é não existiriam mais classes sociais a figura do Estado iria desaparecer Mas esse estágio só seria atingido após a tomada do poder pela classe proletária após a extinção do modo de produção capitalista e após o advento do modo de produção socialista Para entender bem isso é preciso ter claro o que se entende por classe social nesse contexto Veja o capítulo X Para Marx existem duas classes o capital os que detêm os meios de produção e o trabalho os que só têm o seu trabalho Atenção falase aqui em meios de produção e não em bens de consumo Meios de produção são as coisas que produzem tudo como por exemplo as terras e as fábricas Bens de consumo são as coisas que eu uso para vestir comer morar etc Os bens de consumo podem ser privados meus objetos pessoais por exemplo ou coletivos quando servem a mais gente hospitais escolas transportes Quando se fala em classe se entende então os que têm os meios de produção que no Brasil são menos de 10 contra mais de 90 que não têm nada e não os que têm bens de consumo pois na realidade todos nós temos ao menos algum bem de consumo uma calça um sapato etc Vejamos no quadro 3 onde se colocaria o Capitalismo onde se colocaria o Socialismo e onde se colocaria o Comunismo puro O que o Comunismo quer então é fazer com que os meios de produção passem a ser de todos comuns No momento em que não houver mais meios de produção privados conseqüentemente não haverá mais classes Algumas considerações finais 1 E o Estado Para Marx e os comunistas numa sociedade capitalista o Estado é o próprio capital Isto é o Estado é controlado e só executa e faz o que os donos dos meios de produção querem Na prática a gente vê que se não é assim sempre na maioria das vezes é pois é só conferir Para Marx então o Estado precisa desaparecer Mas isso não se dá de um dia para outro Acontece aqui uma passagem Primeiro a classe operária os trabalhadores vão conquistar o Estado instalar a ditadura do proletariado terminar com todo o resquício de burguesia que existe e depois finalmente o Estado desapareceria Teríamos então o Comunismo puro Enquanto o Estado não desaparece não existe Comunismo puro Quadro 3 Distinção entre Capitalismo Socialismo e Comunismo no que se refere aos meios de produção e bens de consumo Capitalismo Socialismo Comunismo MEIOS DE PRODUÇÃO Nas mãos de alguns sempre menosA maioria só trabalha Alguns nas mãos de particulares alguns os serviços essenciais nas mãos do Estado Nas mãos de todos na prática por enquanto nas mãos do Estado ou do partido BENS DE CONSUMO Na maioria das vezes são de particulares mesmo os coletivos Os coletivos em geral são do Estado Os coletivos são de todos do Estado os privados são de cada um Você vê muito bem que isso é um tanto complicado O pior é que na maioria dos lugares onde os trabalhadores tomaram o poder o Estado ficou nas mãos dum pequeno grupo e se burocratizou quase que do mesmo modo como no capitalismo e continua explorando o trabalho da maioria dos trabalhadores Mas isso não quer dizer que se não funcionou não vá funcionar nunca 2 É preciso que todos os meios de produção sejam mesmo comuns Não seria possível fazer com que cada família por exemplo tivesse sua terra Não se pode descartar esta possibilidade de funcionamento da sociedade de antemão Até é interessante ver que em muitos lugares onde há grande número de famílias que possuem sua propriedade familiar isso traz grande progresso além de trazer dignidade e felicidade No entender do comunismo puro porém todos os meios de produção seriam comuns e ninguém poderia possuir nada de seu 3 Também é importante ver que se a gente deixa cada um fazer o que quiser aos poucos pode acontecer que uns vão tomando conta do que é dos outros e dentro de pouco tempo alguns têm quase tudo e os outros só trabalham para esses poucos É o que acontece com o Capitalismo cujas leis são a competição quem pode mais chora menos e o lucro isto é tirar o máximo de proveito da situação Se o Estado funcionasse isto é o Estado verdadeiro aquele encarregado do bem comum ele poderia controlar isso e colocar sempre as coisas em ordem Mas o que acontece na prática é que os que detêm os meios de produção o capital se apoderam também do Estado e colocam o Estado a trabalhar para eles Infelizmente é isso que acontece em praticamente todos os países capitalistas Os trabalhadores nem são convidados a participar e quando votam votam bastante condicionados cabresteados pelos donos do capital que detêm os meios de comunicação e fazem a cabeça da maioria da população Conclusão Como se vê podemos distinguir bem os dois extremos Capitalismo alguns são donos dos meios de produção a maioria trabalha Comunismo todos os meios de produção são comuns Mas fica um enorme espaço intermediário Hoje em dia esse espaço intermediário é denominado de Socialismo Mas não há um tipo só há tantos tipos quantos países existirem que façam uma média entre Capitalismo e o Comunismo puros Além disso os países que se dizem Comunistas na prática chegam a se aproximar bastante do capitalismo pois em vez de lá existirem alguns que possuem os meios de produção há só um o Estado ou o Partido que explora do mesmo modo o trabalho dos trabalhadores Uma diferença grande na realidade entre os países capitalistas e comunistas é que nos comunistassocialistas a maioria da população tem garantido o sustento básico isto é casa comida instrução saúde vestimentas os bens de consumo em geral Nos países capitalistas onde a exploração é grande caso do Brasil grande parte da população não possui esses serviços básicos e a miséria é grande como se pode constatar em cada esquina Nos países onde houve uma revolução popular como é o caso da maioria dos países socialistas as transformações foram profundas conforme os desejos da maioria da população e com isso se deu um grande passo na melhoria da qualidade de vida do povo em geral 63 62 CAPÍTULO IX AMPLIANDO O QUADRO Muitos leitores podem talvez sentir certa insatisfação com a análise feita até agora O que poderá estar por detrás de seus pensamentos e sentimentos seria talvez uma suspeita que pode ser expressa mais ou menos assim Serão essas sociedades compreensíveis apenas a partir de sua estrutura básica a produção Não seria necessário ver essas sociedades sob outros enfoques Não haveria outras dimensões que nos fizessem compreender ou iluminar melhor a complexidade de uma sociedade No decorrer dos capítulos anteriores íamos sempre avisando que a análise era feita apenas a partir da estrutura básica de uma sociedade Agora vamos ampliar essa compreensão incorporando novas dimensões Para melhor conseguir nosso intento vamos montar um quadro e a partir dele examinar a realidade social Esse quadro poderia ser intitulado Cosmovisões Uma cosmovisão visão de mundo compõese de vários elementos Um deles é o tipo de sociedade que faz parte dessa cosmovisão e é legitimado por ela Mas uma cosmovisão é mais ampla Uma cosmovisão possui no mínimo 4 dimensões uma concepção de ser humano uma filosofia valores uma concepção de sociedade e do melhor modo de se viver em sociedade e comportamentos ou relações que derivam das dimensões acima Como você vê a 3ª Dimensão o tipo de sociedade é uma parte apenas dessa cosmovisão Por isso chamamos a esse capítulo de ampliação do quadro referencial em que vínhamos trabalhando O quadro a seguir nº 4 nos apresenta uma visão de conjunto de toda a discussão que será feita a seguir Em cima se situam as cosmovisões I II III e ao lado as dimensões visões de ser humano filosofias tipos de sociedade comportamentos São 16 espaços Vamos para ficar mais fácil colocar um número dentro de cada espaço para saber de que espaço estamos falando Veja o quadro Quadro 4 COSMOVISÕES I II III 1 5 9 13 Visões de Ser Humano Indivíduo Pessoas Relação Peça da Máquina 2 6 10 14 Filosofias Valores Liberalismo Psicologismo Solidarismo Comunitarismo Personalismo Coletivismo Totalitarismo Sociologismo 3 7 11 15 Tipos de Sociedade Capitalismo Liberal Comunidade Fascismo Nazismo Segurança Nacional Integrismo 4 8 12 16 Comportamentos Relações pessoais e sociais Individualismo Egocentrismo Competição Status e Poder Solidariedade Cooperação Comunhão Amor Massificação Anonimato Burocracia Vamos examinar um por um os 16 espaços Número 1 Visões de Ser Humano Toda a sociedade formação social modo de produção como também qualquer ação que praticamos revela quando analisada com cuidado e sutileza uma concepção de ser humano Por detrás de tudo o que fazemos escondese esse fato importantíssimo quem sou eu para mim 65 mesmo e quem são os outros para mim No desenrolar da análise vá prestando atenção a esse fenômeno interessantíssimo Número 2 Filosofias Valores é outra dimensão de uma cosmovisão Não há pessoa que não possua valores O problema contudo é que em geral não paramos para pensar e tornarmos conscientes para nós quais os valores que nos guiam Aqui se situa toda a questão ética Toda sociedade está baseada em valores éticos morais em geral escondidos e poucas vezes trazidos à luz Outro ponto excitante para ser discutido Número 3 Tipo de sociedade como já assinalamos toda cosmovisão traz em si também uma dimensão que insinua revela qual o tipo de sociedade que para as pessoas que possuem tais valores e tal concepção de ser humano seria mais aceitável e melhor Número 4 Comportamentos relações Essa é a única dimensão que pode ser vista constatada Todos nós conseguimos ver como as pessoas se comportam e o tipo de relações que elas estabelecem com os outros Aliás é curioso isso pois é a partir daí que se pode descobrir numa pesquisa cuidadosa qual a concepção de ser humano que as pessoas possuem os valores e o tipo de sociedade que defendem e acham melhor É a dimensão visível da cosmovisão Terminamos a primeira coluna Foi apenas explicação das dimensões da cosmovisão Agora vamos entrar na análise das diferentes cosmovisões Para facilitar vamos dar um nome mais ou menos geral a essas três cosmovisões a partir de sua filosofia ou de seu valor central À I chamaremos de Liberalismo à II Solidarismo e à III de Totalitarismo Há outros nomes que estão no quadrinho Esses são apenas para facilitar Liberalismo Número 5 Indivíduo Costumase dizer que o ser humano nessa cosmovisão é um indivíduo Agora atenção para esse conceito que pode causar equívocos Indivíduo como tomado aqui significa duas coisas primeiro é alguém que é um uno singular Tudo bem Mas o importante é a segunda parte é alguém que é singular mas separado de todo o resto isto é que não tem nada a ver com os outros É ele e só ele Explicase por si mesmo Isso é não implica relação Quando formos discutir o número 9 vamos ver a diferença que existe aqui Então o ser humano nessa cosmovisão é alguém que é um e não tem nada a ver com os outros Número 6 Liberalismo a filosofia que fundamenta essa cosmovisão costuma ser chamada de liberalismo É preciso ver todas as implicações que isso acarreta A palavra liberal hoje em dia tem vários sentidos Ela possui até certa conotação positiva fulano é liberal isto é é condescendente aceita coisas novas Mas não é esse o valor central do liberalismo O liberalismo é uma doutrina que implica em ser humano singular e separado de todos com vimos acima Os outros não têm nada a ver O povo costuma expressar essa filosofia por expressões mais ou menos assim Quem pode mais chora menos Cada um por si Deus por todos Ou a famosa expressão Problema seu Como vamos ver adiante essa ética é a ética do aproveitamento do tirar proveito não interessa o que se dá com os outros Se eu tenho um milhão de hectares de terra e ao meu lado há 200 famílias sem terra e sem trabalho não me interessa A terra é minha tenho escritura e os outros que se lasquem Essa é a implicação do liberalismo que muitos na teoria não aceitam mas que na prática se comportam direitinho de maneira absolutamente individualista Número 7 Tipo de sociedade Por tudo o que já vimos nos capítulos anteriores podese ver que o capitalismo liberal vem fechar com essa filosofia essa concepção de ser humano como a mão na luva Junta a fome com a vontade de comer Número 8 Comportamentos relações Aqui você mesmo já pode ir tirando as consequências Como se comporta quem tem tal concepção de ser humano e tal filosofia Evidentemente ele vai ser alguém individualista egocêntrico interessado fundamentalmente em seu próprio bemestar alguém que se aproveita de tudo para garantir o melhor para si E em relação com os outros que relações estabelece Pois aqui se apresenta uma pala 67 vrinha que principalmente nos dias de hoje é santa e sagrada competitividade Afirmase hoje que tudo deve ser regulado pela competitividade e que sem ela não haverá progresso e desenvolvimento Essa competição entre pessoas é na verdade um novo nome para a guerra e leva necessariamente à exclusão pois sem criar diferenças ela não se mantém No quem pode mais chora menos alguns vão poder mais e esses vão ser os que vão possuir os bens ter status prestígio etc Ela se transforma na lei suprema no amaivos uns aos outros do novo evangelho liberal Terminamos a segunda coluna e a cosmovisão do liberalisTmo Para podermos fazer uma crítica melhor das duas cosmovisões antagônicas vamos passar de imediato à analise da III cosmovisão o totalitarismo Vá sempre acompanhando pelo número dos espaços Totalitarismo Número 13 Peça da máquina Essa expressão é emprestada do Documento Centesimus Annus uma encíclica de João Paulo II escrita na comemoração dos 100 anos da Rerum Novarum de Leão XIII que nós já citamos muito anteriormente O ser humano nessa cosmovisão não vale por si mesmo ele sozinho não tem sentido Ele passa a ter sentido somente dentro de um conjunto de um todo que é mais que ele e que é o que realmente importa O ser humano é então peça de uma máquina parte de um todo Esse todo pode ser chamado de estado de instituição de grupo partido etc Isso significa que a pessoa humana não é uma categoria fundamental básica ela só toma sentido na máquina que é realmente o que interessa Número 14 Totalitarismo essa filosofia valor implica exatamente a importância que tem a organização maior quer seja o estado a instituição etc no cotidiano das pessoas Se for do interesse do estado a pessoa pode ser eliminada Se for necessário destruir um grupo deixar morrer pessoas para salvar o regime deixase morrer O importante é o desenvolvimento do país não importa se com isso milhares milhões passam necessidades essenciais ou mesmo morram Que se salve a instituição Número 14 Fascismo Nazismo Segurança Nacional Essa parte é extremamente interessante pois podemos ver como historicamente esse totalitarismo se mostrou Em geral os totalitarismos surgem quando existem diferenças na sociedade e alguns não aceitam essas diferenças ou não querem que as coisas mudem O Nazismo e o Fascismo por exemplo surgiram na Alemanha e na Itália respectivamente quando os partidos operários socialistas estavam ameaçando as elites Mas como não pegava bem reprimir esses grupos que ameaçavam chegar ao poder eles inventaram uma ideologia para através dela unir o povo O que aconteceu então é que a grande maioria da população sem muita instrução e levadas pela mídia foram convencidas a aderir à ideologia proposta para manter a unidade e salvar o país Foi o que os militares argentinos fizeram com a Guerra das Malvinas por exemplo A população estava se revoltando e os militares precisavam achar um motivo ou uma desculpa para se legitimar diante dela e mantêla fiel Inventaram então aquela barbaridade onde milhares de soldados em poucos meses morreram dolorosamente E agora para o nosso caso foi exatamente isso que aconteceu aqui no Brasil quando a partir dos inícios dos anos 60 vários grupos organizados estudantes UNE ligas camponesas e sindicatos agrários centrais sindicais etc começaram a se organizar ter força e ameaçar as elites Que se fez Primeiro criouse uma ideologia para mascarar as verdadeiras razões do golpe de estado que foi chamada de ideologia da Segurança Nacional contra o comunismo internacional E se conseguiu dar o golpe fechar todos os partidos calar todas as oposições e instalar um regime totalitário por mais de 20 anos E atenção até hoje percebemse ainda ranços dessa estratégia totalitária em slogans de campanha como Rio Grande unido e forte e semelhantes Numa campanha o que se quer é que os vários grupos apresentem suas plataformas seus planos de governo de maneira democrática e pluralista para que cada eleitor escolha o que é melhor Agora apelar já na campanha para a unidade é estratégia fascista Já tinha notado As massas quanto menos educadas e politizadas são facilmente levadas por slogans emocionais e totalitários 69 Todo o país em que haja um partido único dificilmente escapa de ser totalitário Pois partido em sua etimologia já vem de parte E no momento em que uma parte se transforma no todo correse o risco do totalitarismo Todos nós no fundo somos um pouco nazistas fascistas totalitários quando não aceitamos a diferença Achamos que nós somos o todo e que os outros têm de se subordinar ao todo que somos nós nós é que sabemos nós é que somos os bons etc Número 16 Massificação Anonimato Burocracia aqui também não é difícil você mesmo ir tirando as conclusões Se a pessoa é apenas um número criase uma situação de anonimato de massificação Isso é muito comum na nossa era de predomínio de uma mídia massificante nas mãos de poucas pessoas O sociólogo Betinho Herbert de Souza costumava dizer que nós vivemos no Brasil um regime totalitário pois a mídia está nas mãos de pouquíssimos nove famílias possuem 90 por cento dos meios Ora são só eles que falam e a grande maioria da população se transforma em ouvintes teleguiados e manipulados Sua famosa expressão era A comunicação é o termômetro da democracia se não há democracia na comunicação isto é se as pessoas não podem dizer sua palavra não há democracia numa sociedade Outro comportamentorelação muito importante que se torna central em sociedades coletivistas é a burocracia Burocracia significa que o birô isto é a mesa onde a pessoa senta é mais importante que a própria pessoa Em sentido mais geral significa que o importante é a ordem o estatuto as leis a organização A pessoa vem em segundo lugar Penso no nosso sistema de saúde Alguém vai pedir para marcar uma consulta Após um bom tempo o encarregado lhe agenda uma consulta para daqui a um mês Você diz que dentro de um mês você pode estar morto A resposta é Paciência Esse é o regulamento Fomos instruídos a fazer assim Que diferença para uma sociedade onde é o médico que visita as famílias e cuida de todos a qualquer momento Solidarismo Muitos podem estar se perguntando se há saída diante dessas duas cosmovisões antagônicas À primeira vista parece que não e tentamos fazer uma média de ambas Podese contudo identificar uma cosmovisão que se apresenta como nitidamente diversa das anteriores Essa discussão é muito provocante e pode causar surpresa a muita gente Número 9 Pessoarelação O ser humano nessa cosmovisão é alguém que é singular uno mas bem diverso do indivíduo da cosmovisão liberal O indivíduo é alguém que também é um mas separado de todo o resto ao passo que pessoa é um mas é relação E o que é relação Relação como vimos no capítulo V é uma coisa que não pode ser sem outra Pai por exemplo Alguém só pode ser pai se houver mais dois mãe e filho Assim no nosso caso o ser humano seria alguém que para poder verdadeiramente ser necessitaria de outros Aqui há na verdade algo de misterioso Nós mesmos ou qualquer pessoa que encontramos pela rua eleela pode se considerar e ver os outros ou como um indivíduo não tem nada a ver com os outros ou como pessoa os outros fazem parte de sua vida são seus irmãosãs Vêse claro aqui que a maneira como alguém se define não depende exatamente daquilo que ele diz fala mas de como se comporta e das relações que ele estabelece Mas uma coisa fica evidente são duas visões e duas posturas absolutamente distintas Tudo muda na vida de uma pessoa conforme ela se considere e se comporte ou como pessoa ou como indivíduo Essa distinção entre indivíduo e pessoa foi bem discutida pelo filósofo Agostinho de Hipona pois ele queria tentar mostrar como o Deus cristão poderia ser um e três Ele mostrou então que dizer que em Deus há três indivíduos seria um absurdo mas que não seria absurdo dizer que em Deus havia três pessoas que seriam puras relações E ele vai ainda mais à frente mostra que também com respeito ao ser humano alguém tanto mais é ou tanto mais se realiza quanto mais se relaciona isto é quanto mais sai de si quanto mais dialoga enfim quanto mais ama e é amado 71 Se pensarmos um pouco vamos ver que nós somos afinal a soma das milhões de relações que estabelecemos desde que entramos em contato com o mundo e a vida Nossa subjetividade é formada através dessas relações Somos contudo singulares únicos pois da imensidade de relações que estabelecemos recordamos para formar o tecido de nossa subjetividade de partes e traços específicos que nos vão diferenciar dos demais 10 Filosofia Valor Solidarismo A filosofia que sustenta tal concepção de ser humano já se apresentou com diversos nomes além de solidarismo como personalismo comunitarismo etc Mas o nome não interessa Interessa que esse valor deve indicar que é na solidariedade no diálogo e comunhão com os demais que o ser humano se realiza É principalmente que ninguém consegue se realizar ser feliz sozinho Mais ainda ninguém é livre sozinho isto é ninguém pode dizer que é verdadeiramente livre se seu irmãoã está escravo sofre discriminações é excluído e rejeitado Isso porque o outro está em relação comigo e se eu sou pessoarelação o outro é essencial para mim Esse é o sentido desse valor que chamamos solidariedade 11 Tipo de sociedade Comunidade Alguém talvez esteja curioso para saber que tipo de sociedade essa cosmovisão defende se é um socialismo democrático ou uma democracia social Na verdade não interessa o nome que se dá a um tipo de vida em sociedade dentro desses parâmetros interessa isso sim que a pessoa seja levada em consideração e que ela possa se realizar plenamente Mas para que isso aconteça uma coisa é necessária que ela possa ser sujeito possa ser identificada como alguém É a isso que chamamos de comunidade um tipo de vida em sociedade onde todos são chamados pelo nome Até poderíamos dizer que num país podem existir milhões de pessoas mas uma coisa é fundamental para que aí exista uma verdadeira democracia e que seja sociedade autêntica que as pessoas na base dessa sociedade estejam organizadas em comunidades de tal modo que todas possam se manifestar participar dizer sua palavra manifestar sua opinião serem reconhecidas e identificadas Sem essas comunidades interpretativas dificilmente se poderia garantir que as pessoas estejam salvaguardadas e que uma sociedade seja autêntica 12 Condutas relações amor partilha solidariedade Você mesmoa que nos acompanhou até aqui pode completar essa parte Duas coisas importantes e até certo ponto misteriosas contudo sucedem aqui e não poderíamos deixar de assinalar A primeira é que as relações podem ser absolutamente diferentes isto é relações que levam a nossa realização e construção como o amor a partilha a solidariedade o afeto por um lado as relações que nos podem prejudicar e tornar infelizes como a rejeição a exclusão a exploração a dominação por outro lado A segunda questão é que se é verdade que nossa subjetividade se estrutura a partir das milhões de relações que estabelecemos no decorrer de nossa vida também é verdade que essas relações não são absolutamente determinantes e que nós podemos tomar consciência delas e desse modo trabalhálas e elaborálas de um modo ou outro Aqui reside o mistério da consciência que nos faz livres a verdade vos libertará Misterioso o ser humano Quisemos nesse capítulo ampliar o quadro de compreensão do ser humano da sociedade dos valores etc que constituem as grandes cosmovisões Com isso em mente será mais fácil continuar a discutir nossa sociedade e pensar alternativas para sua transformação 73 CAPÍTULO X CLASSE SOCIAL O conceito classe social é fundamental em sociologia É da compreensão clara e profunda desse conceito que nascem as possibilidades concretas de se poder mudar alguma coisa na sociedade Pelo fato de classe social ser um desses conceitos essenciais é evidente que ele é tratado de muitas maneiras diferentes Muitos se esforçam em criar determinadas teorias de classe para poder desviar a atenção do essencial e assim poder mistificar tanto alunos como agentes engajados num trabalho com o povo Esse assunto é quente e deve ser tratado com toda atenção Vamos começar com uma visão das teorias sobre classe social e depois mostrar as ideologias que há por detrás dessas teorias Vamos fazer como nos propusemos desde o início Teorias de classe social Alguém disse que há tantas teorias de classe social quantos sociólogos existem Isso parece um exagero Talvez esse alguém tenha dito isso para diminuir a importância do conceito e da discussão sobre o assunto Podese porém identificar três teorias principais de classe social 1ª A primeira e a mais comum é aquela que diz ser a classe social determinada pela renda da pessoa O quanto alguém ganha determina sua classe Alguns não ficam só na renda mas acrescentam também a educação grau de instrução e a profissão Então os determinantes da classe social ficam sendo a renda a profissão e a educação Pode abrir a maioria dos manuais de sociologia principalmente os da linha americana e você vai constatar isso Num levantamento feito numa universidade brasileira 97 dos alunos e 93 dos professores diziam que a classe é determinada por esses três fatores O único problema para quem aceita tal teoria de classe é tentar descobrir qual desses três fatores é o mais importante qual condiciona os outros Se você for examinar a maioria dos artigos que tratam sobre classe dentro da escola funcionalista que se expandiu enormemente nos Estados Unidos e seus satélites culturais vai ver que já foram provadas todas as hipóteses isto é já se provou que a causa de um alto grau de instrução é uma boa profissão e viceversa já se provou que a alta renda decorre duma boa educação e viceversa Então você pode escolher Essa teoria é chamada de teoria das caixinhas que serão três cinco ou até sete dependendo do gosto do pesquisador Três alta média baixa Cinco alta médiaalta média médiabaixa baixa Sete Altaalta alta médiaalta média médiabaixa baixa baixabaixa Nas pesquisas se determina quando uma pessoa é colocada em determinada caixinha e qual o percentual de cada caixinha 2ª A segunda teoria é um pouco mais sofisticada não é tão grosseira como a primeira Essa teoria afirma que o determinante duma classe é o padrão de vida o padrão cultural isto é formam uma classe as pessoas que têm as mesmas idéias mesmos ideais mesmo estilo de vida mesmos padrões de consumo Se alguém mora num bairro rico possui um ou dois carros possui empregada casa na praia e semelhantes então pertence a uma mesma classe Já as pessoas que moram numa favela gastam absolutamente tudo o que ganham vivem na sobrevivência pertenceriam a outra classe Na realidade não há muita diferença entre a primeira e a segunda teoria Se você perguntar por que tais pessoas possuem casa própria num bairro rico possuem empregada carro casa na praia vai ver que é devido ao fato de possuírem uma alta renda E se possuem o mesmo padrão cultural é devido ao fato de possuírem um grau de instrução semelhante E assim por diante 74 75 3ª Chegamos agora a um ponto importante Quando se quer realmente compreender porque uma coisa é assim devemse ver as causas desse fenômeno Já o velho aforismo filosófico nos diz isso Scientia per causas isto é fazse ciência quando se descobrem as causas Então a pergunta que se coloca é a seguinte o que faz com que haja gente ganhando muito e outros ganhando pouco Será mesmo a educação Ou uma boa profissão O que está no início mesmo da cadeia Se já provaram todas as hipóteses na primeira teoria e todas deram certo é sinal que nenhuma delas realmente prova coisa alguma É preciso então ir adiante Nas poucas páginas que Marx escreveu sobre classe social ele diz o seguinte A questão que imediatamente se coloca é esta que é uma classe social A resposta a esta pergunta decorre da que demos a esta outra o que é que transforma os operários assalariados os capitalistas e proprietários de terra em classes sociais O que isso quer dizer é que se quisermos saber por que alguém ganha muito e outros pouco temos de saber por que eles chegam a ser os que ganham muito ou pouco E isso se descobre vendo o que cada um faz o que cada um produz Você se lembra que quando discutimos a teoria do modo de produção nós mostramos que nenhuma sociedade pode sobreviver sem comida sem produção A produção é pois o motor da sociedade E se quisermos saber por que alguns ganham pouco e outros muito temos de ir ao início ao motor isto é ver o lugar que cada um ocupa no processo de produção O que se constata então no local de produção Constatase que há duas posições fundamentais há os que trabalham e os que possuem os meios de produção Entre essas duas posições estabelecemse determinadas relações de produção que no caso capitalista e mesmo comunista são de dominação dos que detêm o capital sobre os que trabalham e de exploração dos que trabalham pelo capital É essa posição diferente ocupada pelas diversas pessoas no processo produtivo que faz com que haja gente ganhando muito e outros ganhando pouco O que determina as classes é pois a posição que cada um ocupa na produção e essas posições são basicamente duas o capital e o trabalho A ideologia das classes O conceito de classe como vimos nas duas primeiras teorias é um conceito apenas descritivo estático É como tirar uma fotografia da sociedade e pronto Não sai de si mesmo é fechado Essas teorias não identificam as causas de alguém receber tanto e outros receberem pouco E o resultado do pressuposto da teoria funcionalista que fica girando num círculo vicioso Mas por que se patrocina e se divulga essa teoria que é a dominante entre nossos estudantes e universidades Exatamente porque não se quer mudar as coisas e não se quer que as pessoas fiquem conhecendo toda a verdade Senão vejamos se eu defino classe social como sendo determinada pela rendaprofissãoeducação e depois faço a pergunta Como mudar Como fazer com que alguém da classe baixa passe para a médiabaixa ou média O que ele deve fazer Se eu defini classe como sendo causada pela rendaocupaçãoeducação a resposta é imediata se quiser mudar de classe deve ou trabalhar mais mais renda ou estudar mais mais educação ou conseguir um bom emprego melhor profissão Bem veja o que acontece nesse caso na realidade concreta dos fatos se alguém trabalhar mais dois empregos certamente vai ganhar mais mas ao mesmo tempo vai enriquecer mais o capital pois vai dar mais lucro ao dono do meio de produção que através da exploração do trabalho de quem trabalha vai enriquecendo sempre mais É extremamente útil aos donos do capital que as pessoas trabalhem sempre mais pois isso os vai enriquecendo sempre E se uma pessoa estuda mais consegue uma boa educação Dentro do nosso sistema educacional onde as pessoas são formadas para o trabalho escolas profissionalizantes etc onde a 76 77 escola fundamentalmente prepara a mãodeobra para o capital se alguém se preparar melhor na escola vai trabalhar melhor mais rápida e eficientemente e conseqüentemente vai de novo dar mais lucro ao capital Tudo vai convergir para o maior lucro dos donos dos meios de produção É importante pois que as pessoas estudem isto é se preparem para um trabalho eficiente e rápido E a boa profissão Bem aí depende muito da sorte Mas em geral conseguem uma boa profissão os que mais trabalham os mais submissos e obedientes às ordens dos donos do capital Eles vão então ser os que cuidam dos trabalhadores de grau mais inferior Como se pode ver falar em mudança dentro das duas primeiras teorias é falar em fortificação do sistema em manutenção e legitimação do sistema Agora vamos ver o que acontece quando se fala em mudança dentro da terceira teoria Se alguém quiser passar de trabalhador a dono do meio de produção da terra ou da fábrica onde trabalha o que acontece Acontece que o sistema começa a tremer pois ele começa a ser questionado em sua estrutura em sua essência Por que o sistema é abalado em sua estrutura Porque as estruturas isto é as vigas centrais duma sociedade são as forças e as relações de produção Em nossa sociedade as relações que também são estrutura são de dominação e exploração Ora no momento em que a pessoa quer trabalhar no que é dela termina a relação de dominação em que alguém é dono e outro só trabalha e de exploração em que o dono tira parte do trabalho de quem trabalha E então só é possível mudar de classe se a sociedade mudar se mudar o sistema Veja por exemplo o caso das terras No momento em que se pleitear uma reforma agrária em que as pessoas forem trabalhar no que é delas terminam os latifúndios os peões os bóiafrias do campo Termina tudo isso Não haverá mais as grandes fazendas dum dono só mas cada um cultivará sua terra A terra será de quem nela trabalha E nas fábricas Ali as coisas irão mudar da mesma maneira Quem sabe de início as pessoas que trabalham queiram ao menos participar nos lucros Já é um passo Depois talvez da direção da empresa pois os trabalhadores também são gente que pensa que têm idéias e suas idéias poderiam ajudar a melhorar a empresa E finalmente por que não os trabalhadores poderiam começar a participar também das propriedades da empresa A empresa seria de quem nela trabalha E com isso o sistema também mudaria A estas alturas você já está vendo como a discussão sobre classe social é importante e a diferença fundamental que existe quando se trabalha com uma ou com outra teoria de classe Quem quer manter as coisas como são adota uma das duas primeiras só vai poder melhorar um pouco a sorte dos trabalhadores mas nunca mudar a sociedade Quem pensa ao contrário numa mudança das estruturas se ele achar que isso deve acontecer vai ter de trabalhar com uma outra teoria de classe social A diferença aqui vale tudo Mas há um segundo ponto importantíssimo que deve ser discutido sobre a ideologia ou a malícia que se esconde no fato de se usar as duas primeiras teorias E essa mistificação é a seguinte Se eu empregar a primeira ou a segunda teoria eu consigo fazer uma divisão entre os que trabalham Como ficou claro se partirmos da produção na definição das classes só poderão existir duas os donos do capital e os que trabalham Mas se usarmos outros critérios renda profissão educação nós podemos criar três cinco sete ou mais classes A quem interessa essa criação de novas classes Aos donos dos meios de produção claro E por quê Vamos ver Na realidade até pelas estatísticas podese ver que quem pertence à classe alta no caso específico de nossa sociedade brasileira são os donos dos meios de produção Há até uma coincidência estatística há 6 da população na classe alta conforme pesquisas de sociólogos oficiais o que corresponde aos donos dos meios de produção Os outros 94 se colocam na outra classe os que trabalham ou nas outras quatro conforme a primeira teoria O 78 79 que acontece pois é que os 94 que trabalham em vez de se sentirem todos numa mesma condição sentemse diferentes pois pensam pertencer a outra classe E eles fazem questão de não se misturar Os assim chamados colarinhos brancos classe média e médiaalta instigados e levados ingenuamente pela ideologia da classe dominante acabam sentindose de outra classe E começam inclusive a combater seus companheiros de trabalho Então acontece uma coisa extremamente triste e paradoxal é o próprio trabalhador que domina o trabalhador O dono do meio de produção começa a pagar bem mais para alguns trabalhadores para que esses cuidem dos debaixo No caso brasileiro na classe média poderseiam colocar 15 da população e na classe médiaalta uns 9 Mas os trabalhadores braçais os que sofrem o peso e o calor do dia são uns 70 Veja então o que acontece entre os assalariados estabelecese uma gama variada de posições dependendo do gosto do dono do capital e da importância social do assalariado Alguns passam a ser então os capitães da indústria os engenheiros administradores gerentes de produção economistas químicos programadores e analistas de computação etc estes respondem imediatamente às necessidades urgentes da produção Outros como os gerentes de pessoal assistentes sociais psicólogos do trabalho alguns sociólogos etc vão se encarregar diretamente dos trabalhadores subordinados da senzala os 70 da classe médiabaixa e baixa Na comparação do modo de produção escravagista com o capitalista os assim chamados trabalhadores de classe médiaalta correspondem aos feitores ou aos capitães de mato caçadores de escravos fugidos seu trabalho será manter a senzala tranqüila amainar os ânimos apaziguar as discórdias e os descontentamentos Alguns profissionais da assim chamada classe média possuem trabalhos também importantíssimos mesmo quando não ligados diretamente à empresa são os professores os profissionais da ideologia os comunicadores e os ministros das muitas igrejas alienadoras Sem o trabalho eficiente e contínuo desses administradores dos aparelhos ideológicos veja o capítulo XII nenhuma sociedade baseada na contradição de classe poderia subsistir Quando se diz pois que a mudança numa sociedade depende da classe média em parte é verdade Mas não que seja a classe média que vá fazer a mudança a classe média somente não irá impedir que a mudança aconteça Porque se a mudança não acontece é exatamente devido ao trabalho ingente desses cães de guarda como os chama Paul Nizan que não deixam as coisas mudar Ainda uma coisa para concluir quer dizer que não existe então classe média É isso mesmo classe média é um mito Um mito que possui funções importantíssimas principalmente ideológicas como acabamos de mostrar Serve para dividir os trabalhadores e ao mesmo tempo acalma as consciências dos que controlam os trabalhadores pois eles se colocam numa outra classe Mas é importante mostrar ainda que existem algumas pessoas poucas porém e cada vez menos que não são assalariadas trabalham por conta e ao mesmo tempo não exploram trabalho de ninguém isto é não vivem do trabalho dos outros A esse grupo poderíamos chamar de pequena burguesia Veja o caso dos colonos por exemplo Eles possuem sua terra a família toda trabalha são donos da terra não possuem empregados que trabalham para eles É importante acentuar que esse grupo é cada vez menor São poucas as pessoas em nossa sociedade que conseguem se manter independentes Ou caem no grupo dos trabalhadores ou necessitam se colocar como empresa explorando mãodeobra de outros para poder competir e continuar sobrevivendo As estatísticas mostram como esse grupo está diminuindo No RS em 1976 havia 430 mil famílias de pequenos agricultores Dois anos depois esse número baixara para 370 mil Isto é em dois anos 60 mil famílias ao redor de 350 mil pessoas 5 da população do RS tinham vendido suas terras Vamos dizer que 30 dessas pessoas foram para terras novas Paraná Mato Grosso Pará Mas 70 vieram engrossar as vilas periféricas de nossas cidades Essa é a força da máquina do sistema Não há como fugir através da competição da concorrência o do meio é eliminado Sobram os de cima o capital e os debaixo os trabalhadores CAPÍTULO XI INFRAESTRUTURA E SUPERESTRUTURA SUAS RELAÇÕES Nas nossas discussões sobre os tópicos em Sociologia já andamos por diversas áreas teoria ideologia modo de produção diversos modos de produção classes sociais Vamos entrar agora num tópico novo ligado à compreensão mais profunda do que é uma sociedade Não o abordamos até agora pois precisávamos fundamentar bem alguns conceitos e dimensões Mas chegou a hora de abordar essa nova realidade Quando discutimos o que é sociedade e a teoria do modo de produção fomos montando os elementos essenciais dum modo de produção sociedade através de diversas perguntas Chegamos assim à montagem do esquema instrumental para análise duma sociedade toda sociedade é formada por dois elementos essenciais que são as forças e relações de produção Agora a pergunta a sociedade é só isso Não há mais nada A bem da verdade devemos responder que não é só isso Tudo o que analisamos e descobrimos da sociedade é apenas uma parte a parte debaixo aquilo que de agora em diante chamaremos de infraestrutura As forças e relações de produção constituem o fundamento a base da sociedade Mas uma sociedade não é só isso Todo agrupamento humano por menor que seja na medida em que vai se organizando necessita criar normas leis estatutos orientações códigos de procedimento de ética etc Depois que esse grupo existe há algum tempo as tradições começam a ser importantes na definição desse grupo Dentro do grupo vão se criando ainda certas lendas mitos crenças que servem para explicar legitimar fortificar sacralizar reproduzir as práticas já existentes no grupo Pois tudo isso que é criado pelo grupo constitui a superestrutura do grupo Há pessoas que não gostam desses nomes Ninguém precisa brigar por causa dos nomes Os nomes são arbitrários relativos O que importa é ver o que esses nomes significam o que se quer designar com esses nomes Há pessoas que trocam de nome Nem por isso deixam de ser aquela pessoa Mas preferiram outro nome Assim também aqui no nosso caso Existe uma realidade que precisava dum nome Os nomes empregados foram infraestrutura e superestrutura Se alguém achar algum melhor ótimo Mas diga logo o que quer dizer com o nome É importante aprofundar um pouco essa nossa discussão Pensamos que os nomes infra e superestrutura são bons porque nos dão uma imagem muito adequada de como as coisas são mesmo na sociedade Podese até usar a imagem dum edifício para melhor compreender o que se passa na sociedade Assim como nenhum edifício pode subsistir sem que tenha uma base isto é fundamentos sólidos e garantidos assim também numa sociedade são necessários os fundamentos Esses fundamentos essa base é a infraestrutura que é constituída pela produção as forças e relações de produção Sem produção não existe possibilidade duma nação sobreviver Mas num edifício existem também os andares superiores E normalmente o que nós vemos primeiro são os andares e nem prestamos atenção aos fundamentos dum edifício Mas se tirarmos os fundamentos os andares caem Assim muita gente quando vai definir uma sociedade parte logo da colocação e descrição dos andares superiores esquecendo de tomar em consideração a base Veja os manuais quase todos de OSPB Moral e Cívica e até mesmo de Sociologia ou Estudos Sociais quando vão definir o Brasil por exemplo vão logo dizendo que o Brasil é uma República Federativa constituída por tantos Estados cujo governo é constituído por três poderes etc Examine você mesmo os manuais e verá Na definição do Brasil pois começouse pelos andares superiores por aquilo que a Constituição atual diz ser o Brasil Mas nada se falou da maneira como os brasileiros conseguem as coisas para comer morar se vestir E sem comer ninguém vive Os que prestam atenção aos fundamentos duma sociedade vão definir o Brasil duma maneira diferente vão dizer que o Brasil é um modo de produção capitalista isto é que no Brasil há uma maneira especial de se conseguir as coisas alguns são donos dos meios de produção e a maioria trabalha como empregado Ainda não se fala das relações que existem entre capital e trabalho Isso fica para cada um examinar e analisar Qual das duas maneiras é a melhor Pois aqui voltamos ao problema das teorias Não há nenhuma teoria ou definição que explique totalmente uma coisa Algumas definem mais outras menos Certamente a melhor será aquela que explique e defina mais coisas e melhor Se descrevermos o Brasil como uma República Federativa etc estamos dizendo como o Brasil é agora como o Direito Constituição diz que o Brasil é Mas se dissermos que o Brasil é um modo de produção capitalista já dizemos muitas coisas mais pois dizemos como o Brasil é agora e porque ele é assim Pois mostramos quem decidiu que o Brasil fosse assim Vamos ver que quem manda é o capital pois as relações entre capital e trabalho são de dominação e mostramos que o Direito as leis a Constituição foi criado pelo capital pelos donos dos meios de produção Examinando mais a fundo o Direito vamos constatar que ele serve aos interesses do capital e olhando a história do Brasil vamos constatar que isso sempre foi assim quem tinha as terras e depois as indústrias decidia sobre o tipo de organização social que seria melhor na ocasião Ou você acha que não é assim Já tentou estudar nossa história Atualmente quem decide a respeito das leis dos decretos das mudanças da dívida externa de como pagar a dívida de que partidos são possíveis de quanto deve ser o salário etc Quem senão o capital os donos dos meios de produção Por isso o Brasil por enquanto é um país capitalista Mas é preciso dizer mais alguma coisa sobre a superestrutura Esse conceito é muito elástico difuso amplo A superestrutura é toda uma camada superior que aos poucos foi sendo criada e colocada por cima da infraestrutura Ela é muitas vezes imaterial não é concreta e palpável mas é muito real e eficiente Nós já fizemos uma lista de tudo o que faz parte da superestrutura as leis o direito a moral as normas as legitimações as explicações os mitos as lendas as tradições os códigos de leis de diversos tipos os decretos e finalmente as ideologias todas veja o capítulo II Para se ter um exemplo interessante do que é uma superestrutura vamos contar aqui uma descoberta feita por Thales de Azevedo numa pequena aldeia da Bahia Nessa aldeia havia uma crença que era comum a todas as pessoas a crença era de que meninasmoças depois de escurecer não podiam sair sozinhas de casa caso contrário algum ser algum duende iria fazer mal a elas E lá todos acreditavam na história Pensando sobre essa história percebese logo que quem criou essa crença ou lenda foi alguma mãe ou avó que já estava cansada de ficar controlando as adolescentes e para poupar trabalho inventou a história Certamente muitas meninas ainda se arriscam a sair sozinhas mas são poucas e vão e voltam correndo Mas a grande maioria fica guardada dentro de casa E isso poupa um enorme esforço de vigilância que as famílias teriam de disponder no controle das mocinhas Pois aqui está um exemplo de superestrutura Uma crença inventada Deus sabe por quem que possui uma finalidade muito importante e urgente Examinandose as crenças os mitos as histórias infantis percebese que todas elas possuem uma importância muito grande na criação formação legitimação e até mesmo sacralização e reprodução de determinados modos de vida determinados padrões de comportamento Subrepticiamente talvez até mesmo inconscientemente criamse mecanismos que protegem reproduzem esses valores normas de vida Pois essas são as superestruturas Alguns resumem a superestrutura num conceito único que chamam de estado Mas estado não é apenas o governo É também mas muito mais Abrange tudo o que se refere ao político isto é ao poder governo assembléias parlamentos o que se refere ao jurídico normas leis tradições etc e tudo o que se refere ao ideológico os mecanismos de persuasão as ideologias em geral Esse estado será composto pois de duas grandes partes o poder de estado esse seria então o governo assembléias o político e a segunda parte seriam os aparelhos de estado que seriam as instituições tudo o que se materializou a partir das tensões e confrontações nas relações básicas de produção para reproduzir essas relações ver capítulo XII Esses aparelhos instituições também podem ser divididos em dois grandes grupos ao menos para fins de análise pois na prática eles possuem as duas dimensões os repressivos que usam a força a coesão e os ideológicos que empregam a persuasão e a ideologia O quadro 5 nos mostra agora como a sociedade se amplia e se complexifica Qual a relação entre infra e superestrutura Visão Geral de um Modo de Produção Base ou Infraestrutura Forças de Produção Meios de Produção terras fábricas etc capital trabalho Estado o político o jurídico o ideológico Poder de Estado Governo Assembléias Parlamento Superestrutura Aparelhos repressivos Exército Policia Segurança Tribunais Direito Aparelhos ideológicos de Estado as instituições Familia Igrejas Escolas Meios de Comunicação Cívismo Comunismo Entidades assistenciais Imprensa Rádio TV Cinema Teatros Internet partiticos Sindicatos Cooperativas Serviços de Saúde Previdências etc Colocase aqui uma discussão muito importante O que influencia prioritariamente o que determina em primeiro lugar as coisas é a infraestrutura que determina a superestrutura ou a superestrutura determina a infraestrutura Há três posições principais nessa discussão 1ª O mecanismo determinista ou o determinismo mecanicista Segundo essa posição o que determina tudo e sempre é a infraestrutura Não há nada que não decorra diretamente do econômico das forças e relações de produção O resto tudo é alienação Alguns chamam a isso de materialismo É a teoria stalinista ou da Escola de Moscou ou do marxismo vulgar 2ª O culturalismo Essa posição realça a importância da superestrutura na determinação dos fenómenos Houve dois nomes importantes mesmo dentro do mundo marxista que enfatizaram essa posição George Lukacs e Antonio Gramsci Eles se rebelaram contra o determinismo mecanicista e mostraram a importância das diversas instâncias superestruturais na transformação da sociedade como a consciência de classe a educação o partido político São chamados de culturalistas pois eles mostram como os fatores culturais podem influenciar e mudar a infraestrutura 3ª A teoria da autonomia relativa da superestrutura Segundo essa posição não se pode negar que a infraestrutura possui uma importância imprescindível indispensável ao menos em última instância Dito em outras palavras essa teoria insiste num fato óbvio e inegável de que para viver as pessoas precisam comer Isso significa em última instância Essa teoria não esquece que nenhuma sociedade sobrevive sem sua produção Mas ao mesmo tempo admite que as superestruturas possuem uma ação de retorno sobre a infraestrutura modificando a própria infraestrutura Dizse pois que a superestrutura possui uma autonomia também mas que essa autonomia é relativa não absoluta É relativa pois nenhuma superestrutura sobreviverá sem a produção Nenhuma pessoa pode rezar meditar contemplar filosofar estudar se não come Essa terceira posição engloba tanto a primeira como a segunda E na prática vemos que assim é Sem comer ninguém vive Mas os grupos organizados as comunidades conscientes de seus direitos podem influenciar e modificar até mesmo a maneira como se conseguem as coisas para comer Aliás as grandes lutas e batalhas são exatamente para que as pessoas possam ter o que comer possam ter seus direitos garantidos E através da historia nós temos muitos exemplos de mudanças na própria infraestrutura Mas todos os que tentaram fazer alguma mudança somente o conseguiram na medida em que garantiam a sobrevivência deles e dos que com eles lutavam para essa transformação No nosso trabalho concreto devemos pois dar atenção às diversas instituições que possam influenciar na transformação da sociedade Assim nosso trabalho na escola em grupos de igreja dentro dos meios de comunicação é importante e pode tornarse decisivo para que se possa chegar à transformação das estruturas sociais No capítulo seguinte vamos começar a analisar esses aparelhos instituições a partir de sua função específica muitas vezes oculta mas muito importante a manutenção reprodução e às vezes revolucionariamente de mudança de uma sociedade CAPÍTULO XII OS APARELHOS DE REPRODUÇÃO DA SOCIEDADE Após termos ampliado a visão do que seja uma sociedade com sua infraestrutura e superestrutura e suas influências mútuas passaremos a analisar pormenorizadamente os diversos mecanismos superestruturais que se criam nas diversas sociedades para reprodução e manutenção dessa própria sociedade Nessa primeira discussão vamos examinálos e classificálos de modo geral Posteriormente vamos discutir alguns deles individualmente e mostrar como eles se comportam quais as estratégias que usam quais seus mecanismos claros e ocultos Entre outros veremos o papel das leis o aparelho ideológico do Direito o papel da escola das igrejas da família dos meios de comunicação dos sindicatos das cooperativas Que são aparelhos de reprodução Todo agrupamento humano toda sociedade necessita assegurar sua sobrevivência e sua permanência sua reprodução A sobrevivência é assegurada pela produção e a reprodução é assegurada por diversos aparelhos ou mecanismos que a sociedade cria como já vimos no capítulo anterior para se fortificar e legitimar podendo assim garantir sua continuidade Quais são eles Diversos pensadores que discutiram esse problema classificaram os aparelhos de produção em duas categorias fundamentais Os aparelhos repressivos são aqueles aparelhos que na sua função de manutenção e reprodução da sociedade usam a força a violência ou a coaçãorepressão Eles não escondem seu papel mostramse como são são claramente estruturados e organizados Entre outros poderíamos identificar os seguintes o exército que muitas vezes tem a tarefa de defender a sociedade contra agressões externas mas algumas vezes passa a exercer funções dentro da própria nação as companhias de segurança que estão proliferando por toda parte a concentração com sua conseqüente exclusão produz uma sociedade cada vez mais violenta e insegura as políticas de todos os tipos sua função é garantir a ordem interna em geral as prisões onde são colocados os que não se enquadram dentro das normas estabelecidas pela sociedade Essas prisões só de diversos tipos e categorias Há prisões para menores de 18 anos prisões para mulheres prisões para presos comuns para presos especiais e entre os especiais há algumas prisões para as pessoas que possuem certo grau de saber ou prestígio na sociedade Os tribunais encarregados de julgar e decidir o que é certo ou errado quem é culpado ou inocente Os tribunais remetem as pessoas às prisões quando julgadas culpadas O direito que em sua parte penal passa a pertencer às instituições repressivas Não analisaremos especificamente nenhum dos aparelhos acima nos capítulos posteriores pois preferimos dar maior atenção aos aparelhos ideológicos que usam a persuasão e que são mais sofisticados Os aparelhos repressivos são fáceis de serem analisados Além disso os aparelhos repressivos só são usados em último caso isto é quando as pessoas não se conformam mesmo com o que os dirigentes da sociedade querem Primeiro as pessoas são tratadas duma maneira pacífica persuasiva através de conselhos Só depois quando esses remédios estiverem esgotados passase a usar a coação e a repressão Por isso na nossa análise das relações de dominação discutiremos as instituições que usam a repressão duma maneira mais sutil e elegante Você pode contudo fazerse diversas perguntas com respeito aos aparelhos repressivos Podese perguntar por exemplo a quem se destina realmente a polícia Talvez você vá descobrir que a polícia na realidade só cuida dum determinado tipo de gente que são os trabalhadores No papel a polícia deveria ter o mesmo tratamento com todos Mas na prática de quem a polícia cuida E quem a polícia defende Ainda mais você poderia se perguntar qual o papel dos tribunais e das prisões Quem chega a ir para a prisão Quem chega a ser condenado Você já chegou a ver algum dono dos meios de produção na prisão E por que existem prisões especiais para certos tipos de pessoas que possuem mais estudo ou mais prestígio prestígio esse trazido em geral pelo dinheiro Você vai darse conta de que na prática os aparelhos repressivos estão a serviço dum tipo de gente duma classe que são os donos do capital e atuam na maioria quase absoluta das vezes contra a outra classe que são os trabalhadores As raras exceções são para confirmar a regra Mas no discurso isso é quando se fala ou se escreve se diz que esses aparelhos repressivos são para proteger e defender todos os cidadãos Procure estar atento e prestar atenção ao papel real desses aparelhos coercitivos Os aparelhos ideológicos são aqueles aparelhos ou mecanismos que na sua função de manutenção e reprodução das relações numa sociedade usam a persuasão a cantada isto é a ideologia Eles são bem mais difíceis de serem identificados pois é necessária certa astúcia certa perspicácia para poder perceber seu papel Como dizíamos antes eles são muito mais sofisticados em sua ação Entre os aparelhos ideológicos poderíamos citar os seguintes a escola ou educação a família as diversas igrejas as leis o direito os meios de comunicação social rádio 92 TV jornais revistas filmes teatros as entidades assistenciais INSS Comunidade Solidária Febem etc os sindicatos pelegos as cooperativas dependentes do Estado os partidos políticos dominados pelo capital e outros Nos capítulos posteriores vamos fazer uma análise específica de alguns dos aparelhos ideológicos acima mencionados Essa discussão será apenas para poder realçar seus pontos principais mas cada grupo de trabalho que se defrontar com esses aparelhos deve ele mesmo discutilos na prática e identificar os mecanismos e estratégias que são usadas em cada situação concreta CAPÍTULO XIII O APARELHO IDEOLÓGICO DO DIREITO Nas análises dos diversos mecanismos de manutenção e reprodução da sociedade nós nos defrontamos de imediato com um muito concreto e amplo as leis de todo o tipo as tradições as leis familiares as leis dos grupos os regulamentos os estatutos as leis penais as leis governamentais as leis constitucionais as leis morais Algumas dessas leis são apenas para aconselhar outras já são mais severas e se não são cumpridas podem levar as pessoas à prisão Poderseia até dizer que há leis que valem para todas as pessoas do mundo apesar de serem poucas como talvez a de que não se pode matar os semelhantes Mas mesmo essa em alguns povos em certas ocasiões não era totalmente seguida como por exemplo quando se sacrificavam pessoas aos deuses Grande parte dessas leis são colocadas no papel e daí decorrem os códigos de leis de diversos tipos Mas o que nos interessa discutir agora dentro sempre de nosso enfoque históricocrítico é a compreensão do verdadeiro sentido das leis E isso só se consegue se formos à origem da questão e nos perguntarmos como foi que as leis apareceram Pois há duas maneiras bem diferentes de encarar esse problema das leis 1 A primeira é a maneira positivistafuncionalista estática que começa a examinar as leis que existem qual a função que elas têm para a manutenção e reprodução da sociedade Esse tipo de enfoque no tratamento das leis não pergunta como as leis surgiram Ela toma as leis aqui e agora supõe que devem ser assim e implicitamente acaba supondo que sempre foram assim serão sempre assim e são assim em todas as sociedades Isso é o que se chama de naturalização ou reificação das leis Ele não se dá conta de que todas as leis foram criadas por alguns e que foram criadas com o intuito de responder a determinados interesses dos grupos ou de alguns dentro do grupo 94 2 A segunda maneira é a históricocrítica Essa maneira de ver as coisas pergunta logo pela paternidade das leis isto é quem fez as leis e tem como pressuposto que se as leis são assim o são porque alguém quis mas poderiam ser diferentes e sendo criações culturais são relativas parciais respondem a interesses de alguns grupos ou pessoas É preciso então identificar a que interesses elas respondem Para ilustrar um pouco o aspecto relativo cultural histórico das normas costumes tradições e leis é interessante relembrar a história do antropólogo ocidental que chegou a uma ilha do Pacífico e foi recebido pelos hospitaleiros habitantes No primeiro contato o visitante mostrou certa simpatia certa predileção por uma velhinha da tribo Conversou muito com ela ficou com ela mais tempo e todos notaram sua atenção especial pela velhinha No dia seguinte os habitantes resolveram dar um banquete em homenagem ao estrangeiro Almoço festivo com comidas especiais Após os aperitivos é servido o prato principal introduzido por quatro garçons vestidos a rigor O prato está coberto e o chefe da tribo levantase pedindo ao visitante que adivinhe o que seria servido Queriam fazerlhe uma agradável surpresa O nosso homem por mais que tentasse não consegue adivinhar Levantase então o chefe da tribo e descobre o prato lá estava a velhinha com quem ele falara na véspera A isso se chama choque cultural Esse exemplo mostra a relatividade das leis e costumes A atitude históricocrítica deve estar prevenida para tudo tudo é possível pois nada é fixo absoluto A mesma coisa se dá por exemplo com o casamento No Tibete as mulheres têm muitos maridos E no Irã os homens têm muitas mulheres Entre os índios Tikunas no Alto Solimões a moça só casa quando existem sinais claros de gravidez Antes não 95 Queremos deixar claro que não estamos discutindo aqui problemas éticos isto é se isso é certo ou errado bom ou mau Estamos apenas mostrando que os costumes as tradições e as leis são culturais são criadas por grupos ou indivíduos dentro dos grupos que possuem mais poder e prestígio para fazer valer sua vontade Esses interesses particulares são colocados como leis para todos os outros Alguém pode estar pensando mas isso é assim entre povos diferentes entre culturas diferentes mas não entre nós aqui no Brasil Pois para mostrar que mesmo aqui as coisas são assim vamos ver alguns exemplos Comecemos por uma lei muito importante que existe aqui no Brasil e que atinge a maioria absoluta da população a lei do salário mínimo Quando alguém quer trabalhar vai falar com o dono da empresa e faz o acordo vai trabalhar oito horas por dia seis dias por semana por um salário Se o trabalhador reclamar o empresário diz Meu amigo aqui está a lei E o operário não conseguirá nunca processar o empresário colocálo na cadeia pois ele está cumprindo a lei Agora veja você pela Constituição brasileira o salário deveria ser suficiente para uma família poder se alimentar dignamente ter casa transporte educação Isso hoje corresponde a pelo menos quatro vezes o salário Mas na realidade isso não é colocado em prática nunca Agora você deve se perguntar Quem criou a lei do salário mínimo A quem favorece essa lei Como se explica o conflito entre as duas leis Por que uma lei que faz parte da Constituição por isso mesmo muito mais importante não é cumprida E por que se obrigam algumas pessoas a cumprir uma lei como a do salário mínimo que é posterior à Constituição Na resposta a essas perguntas você vai compreendendo o que são as leis quem as criou a quem elas favorecem e a quem elas desfavorecem E comece a discutir com seus colegas as outras leis todas que existem por aí Ainda uma pequena discussão que ajuda a compreender o quanto nós estamos envolvidos pelo mundo da dominação das palavras e dos conceitos Você já ouviu certamente falar do conceito problema Quando alguma coisa não anda bem dizse que isso constitui um problema E quando as coisas esquentam na sociedade dizse que estamos cheios de problemas sociais Pois bem É importante ver onde está a origem dos problemas sociais na realidade Normalmente pelo que se vê na imprensa na televisão nos discursos das autoridades há problemas sociais quando alguma coisa não funciona como deveria funcionar servindo as interpretações oficiais Nesse caso as pessoas esperam que os sociólogos os assistentes sociais os padres estudem e ajudem a solucionar os problemas E essas pessoas padres sociólogos professores assistentes sociais começam a correr em todas as direções para colocar as coisas novamente no lugar isto é naquele lugar onde os criadores das leis acham que elas devam estar E nós não nos damos conta do que realmente constitui o problema Não vemos que o problema está na própria instituição que foi criada pelos interesses de alguns grupos não nos damos conta de que o problema está na lei que foi feita para responder a determinados interesses Então a origem do problema a essência do problema consiste em saber por que existem tais instituições e tais leis São essas instituições e leis que deveriam mudar para se resolver o problema e não ajustar as pessoas a essas instituições ou fazêlas obedecer a tais leis Vejamos o caso duma greve por exemplo Os operários decidem não trabalhar enquanto não conseguirem um salário digno Os donos do poder e do capital mobilizam imediatamente todo o aparato repressivo e ideológico para poder controlar o problema que está surgindo E esse exército mobilizado pelo capital acha que o problema está na greve na não aceitação da lei do 96 97 salário mínimo por exemplo Não consegue ver que é a própria lei do salário mínimo que é o problema Os exemplos desse tipo são inúmeros O problema do capataz fazer seus operários trabalharem com mais eficiência ou do oficial de combate levar as tropas a atacar o inimigo com mais entusiasmo não precisa ser problema nem para o operário nem para o soldado O verdadeiro problema para o sociólogo e o que estuda essa realidade global é o capitalismo e a instituição militar O problema sociológico fundamental não é o crime mas a lei Há muitas coisas que são permitidas em algumas sociedades e são proibidas em outras Crime começa a existir quando existe uma lei Então o problema primeiro é descobrir quando surgiu a lei por que surgiu a que interesses ela responde Ficar discutindo o crime é no mínimo ingenuidade como fazem muitos juristas Numa sociedade como a nossa em que 5 da população possui todos os meios de produção terras e fábricas são chamados de problemas sociais os roubos latrocínios assaltos invasões de terras greves mobilizações populares passeatas pobreza mortalidade infantil favelas desnutrição doenças endêmicas e toda uma lista que você encontra em qualquer livro de Moral e Cívica ou em qualquer discurso de presidentes ou governadores E todo o mundo fica lá na consequência achando que o problema é isso tudo que vimos na lista acima Mas são poucos os que percebem que o verdadeiro problema que gera todos os outros é a maneira como as coisas são repartidas isto é problema é o modo de produção capitalista baseado em relações de dominação de uns sobre os outros e exploração do trabalho pelos que detêm os meios de produção E são as leis criadas pelos donos dos meios de produção ou seus ajudantes que fazem com que isso continue assim Caso alguém tente transgredir alguma dessas leis o aparato repressivo estará pronto para colocar esse cidadão em seu devido lugar CAPÍTULO XIV O APARELHO IDEOLÓGICO DA ESCOLA Entramos agora numa discussão que diz respeito à grande maioria dos fatores desse livro pois trata duma instituição que tem a ver ou teve com a maioria absoluta da população Sendo que esse livro vai ser usado principalmente em escolas essa nossa discussão se torna enormemente próxima Existe já hoje uma grande bibliografia sobre a função da escola na nossa sociedade Muitos desses livros já assumem uma postura bastante crítica e desmitificadora Dentre os muitos aspectos que poderíamos discutir nós vamos enfatizar apenas alguns que julgamos mais importantes Vamos privilegiar de modo especial a análise crítica das ideologias subjacentes às diversas teorias de aprendizagem e um pouco da história da escola A história da escola Para se compreender bem nossa discussão é importante ter presente as discussões já feitas sobre o Modo de Produção Cap V sobre o Capitalismo Cap VI e sobre a Superestrutura Cap XI Vimos nessas discussões que as relações de produção fazem parte da estrutura duma sociedade No capitalismo as relações são de dominação alguns são donos dos meios de produção e de exploração o capital expropria parte do trabalho de quem trabalha A escola faz parte da superestrutura que são instituições criadas para reproduzir e garantir as relações de produção Todas as sociedades tiveram duma maneira ou outra a sua escola E aqui vamos introduzir uma explicação importante vamos distinguir entre escola e educação Por escola nós vamos entender o aparelho criado pelo grupo dominante para reproduzir seus interesses sua ideologia Escola seria aquela instituição superestrutural na maioria das vezes imposta obrigatória e controlada pelos que detêm o poder Quando essa escola não executar a política e os interesses do grupo no poder ela é censurada mudada reformada e até mesmo fechada Escola seria pois o aparelho ideológico do capital Por educação nós vamos designar o processo ligado à etimologia da própria palavra Educação é uma palavra que vem do latim de duas outras e ou ex que significa de dentro de para fora e ducere que significa tirar levar Educação significa pois o processo de tirar de dentro duma pessoa ou levar para fora duma pessoa alguma coisa que já está dentro presente na pessoa A educação supõe pois que a pessoa não é uma tábula rasa mas possui potencialidades próprias que vão sendo atualizadas colocadas em ação e desenvolvidas através do processo educativo Essa distinção vai identificar as diversas correntes que se verificaram através da história Podemos começar já pela antiga Grécia Nesse país havia os dois modelos o manipulador usado pelos donos do poder para adaptar as pessoas a seus interesses e o libertador simbolizado na escola de Sócrates que representava o processo de desenvolvimento da pessoa a partir dela mesma Para se compreender melhor o processo socrático devese ver como ele encarava a verdadeira educação Sócrates dizia que o professor é semelhante a um parteiro O parteiro tira o humano do humano Assim deve ser o educador aquele que tira de dentro das pessoas o que já existe de humano dentro dessas pessoas A esse processo Sócrates chamou de Maiêutica Seu método consistia não em dar respostas que os outros devessem aceitar e repetir mas em fazer perguntas obrigando a pessoa a pensar até que ela mesma se desse conta de suas contradições e compreendesse a totalidade do fenômeno Mas como sempre esse processo não agradou aos donos do poder e Sócrates foi acusado de corromper a juventude de colocar minhocas na cabeça das pessoas principalmente dos jovens Começou uma perseguição muito grande contra sua pessoa e seu método e Sócrates para evitar problemas e dissabores maiores teve de tomar cicuta Nós educadores franceses sabemos aproveitar todas e cada uma das ocasiões que se nos apresentam para inspirar nos nossos alunos um ardente amor à Pátria Quando ensinamos geografia nunca esquecemos de incutir na criança como é formosa rica e fértil a nossa França Fazer patriotas sinceros é também a nossa meta E Ernest Lavisse na História de França Para recuperar da Alemanha o que esta nos usurpou devemos ser bons cidadãos e bons soldados É para convertêlos em bons soldados que vossos mestres vos ensinam a história da França Aqui se percebe que a escola serve sempre aos interesses dos poderosos Se a escola puder atrapalhar seus planos ela é proibida se ela é necessária como forno de cidadãos dóceis e como fábrica de soldados obedientes ela é obrigatória durante todo o tempo necessário O que se quer mostrar pois com os exemplos acima é a mudança que a escola sofre na medida em que ela se torna necessária ao sistema O tipo de escola que possuímos hoje nos países capitalistas dependentes é o tipo de escola necessária para que o capital possa se expandir e ter muitos lucros Fundamentalmente a nossa escola hoje desempenha duas funções principais 1 Preparar mãodeobra para o capital Essa é uma tarefa imediata necessária apesar de não ser a mais importante Todas as reformas de ensino que aconteceram no Brasil nas últimas três décadas tiveram como objetivo fundamental a preparação de mão deobra conveniente ao bom desempenho das indústrias no desenvolvimento econômico de nosso país Esse objetivo está claro nas justificativas das próprias reformas 2 Reproduzir as relações de dominação e de exploração Para compreender melhor essa função é necessário discutir a ideologia subjacente às diversas teorias de aprendizagem Passaremos pois ao segundo ponto à discussão da ideologia das teorias tentando mostrar como indiretamente a escola serve à reprodução das relações de produção principalmente à relação de dominação A ideologia das teorias de aprendizagem Todos nós temos nossas teorias de como se aprende e de como se ensina Mesmo que não sejamos professores ou mesmo que nunca tenhamos pensado nisso dentro de nós possuímos uma teoria de como se ensina e de como se aprende Fique pensando nisso enquanto discutimos as diversas teorias e suas ideologias e tente depois identificar qual a sua teoria de aprendizagem e a quem ela serve Pensamos que se poderia englobar as diversas teorias de aprendizagem em duas matrizes principais 1 A matriz dos condicionamentos ou comportamental Os pressupostos principais dessa teoria são de que a aprendizagem se processa através de estímulos que determinam basicamente a aprendizagem do aluno Os estímulos vão carregados de determinado conteúdo é este que é transmitido ao aluno Os processos são os de imitação e repetição Conforme o estímulo assim também a resposta Os estímulos podem ser positivos e isso faz com que a pessoa reproduza o que o estímulo sugere e seja levada a repetilo Se o estímulo é negativo a pessoa suprime o comportamento anterior ligado a esse estímulo Se formos examinar nossa pedagogia ou nossa didática veremos que a quase absoluta maioria dos métodos usados ainda são baseados nessa matriz teórica do estímuloresposta Os professores fazem as coisas dão os exemplos e os alunos reproduzem e repetem o que lhes é pedido Que tipo de homem está por trás dessa teoria O homem exigido e suposto por essa teoria não se diferencia do animal do macaco por exemplo Através de estímulos nós faremos com que um macaco um golfinho um rato reproduzam igualmente os comportamentos exigidos Nada se pede de novo de iniciativa por parte do aluno Ele recebe e responde conforme o estímulo dado A quem interessa tal teoria Interessa a quem quer um homem repetidor reprodutor do que lhe é transmitido Se formos examinar o mundo do trabalho no modo de produção capitalista veremos que o tipo de homem necessário ao bom desempenho duma fábrica ou empresa é um trabalhador que faça as coisas com eficiência e rapidez Fazer bem e rápido eis tudo Não precisa pensar não precisa decidir não precisa planejar Apenas executar Aliás quanto menos pensar melhor É nesse sentido que aos poucos se vai substituindo o homem pelo robô pois o homem não passa mesmo dum robô dum autômato A ideologia que se esconde por detrás da teoria dos condicionamentos é extremamente favorável aos donos do capital pois quanto mais trabalhadores existirem que não pensam que não questionam mas apenas executam tarefas obedientemente mais lucro e menos problemas a empresa terá Uma escola que desempenhe tais objetivos será a melhor escola para o sistema capitalista O decidir pensar criar é deixado para um pequeno grupo de privilegiados que receberão uma formação dentro de escolas privilegiadas onde não faltarão nem verbas nem recursos de todo tipo Mas serão bem poucos os que podem pertencer a essa elite 2 A matriz dialogal Uma outra teoria de aprendizagem baseada também em estudos e pesquisas mostra que aprender e ensinar não é apenas o que se disse acima mas inclui o próprio educando O aprender e ensinar constituiriam uma verdadeira educação como definimos no início Pensamos que Piaget seja um dos pesquisadores que mais subsídios tenha trazido para essa nova teoria de educação Ela engloba a primeira e vai um pouco mais adiante Pela experiência que temos e Piaget mostrou isso muito bem nos livros que escreveu sobre seus filhos percebemos que em nosso contato com o mundo nós criamos certo esquema cognitivo ou esquema lógico que serve para poder compreender a realidade com que nos relacionamos Esse contato com o mundo é um processo dialético composto do que Piaget chama de assimilação ou o que vem de fora para dentro e acomodação o que vai de dentro para fora Nossa mente introjeta a realidade assimila essa realidade e ao mesmo tempo nossa mente acomodase a essa realidade externa Nesse processo dialético de acomodação e assimilação criase certo esquema mental cognitivo lógico Esse processo é automático pessoal Até aqui nada de especial O que acontece é semelhante em parte ao que diz a matriz comportamental Mas isso ainda não é aprender O aprender se dá no momento em que esse esquema lógico cognitivo é ferido é colocado em contradição Nesse momento a pessoa ela mesma se obriga a se reequilibrar a mudar seu esquema anterior Isso é aprender É a superação qualitativa do esquema lógico anterior Claro que isso é feito também com um estímulo que veio desequilibrar o esquema existente A diferença porém é que o estímulo desequilibrador não possui um conteúdo em si e não é o conteúdo desse estímulo que a pessoa vai repetir como na teoria anterior A pessoa ela mesma cria e coloca elementos novos forjados por ela na reestruturação de seu esquema esse é o ato de aprender ato pessoal autônomo Na primeira teoria a pessoa é objeto receptor duma ação nessa teoria a pessoa é sujeito da ação É a pessoa que aprende E como se ensina Aqui está a outra grande diferença Na teoria anterior ensinase dando estímulos fornecendo elementos que serão reproduzidos Nessa segunda teoria ensinase fazendo a pergunta colocando elementos contraditórios no esquema já existente da pessoa Ensinase desequilibrando o esquema da pessoa Enquanto no primeiro caso se dá a resposta no segundo se faz a pergunta e a pessoa cria sua resposta reestrutura seu esquema ferido pela contradição Há um pressuposto subjacente a essa segunda teoria muito difícil de ser compreendido por nós que fomos formados no primeiro esquema Esse pressuposto é sobre o que é o saber Para a primeira teoria o saber é quantificável é como se fosse algo concreto objetivo e igual para todos Como se fosse uma mercadoria que existe objetivamente e que é passada de um para outro conservando as mesmas qualidades Já para a segunda teoria o saber é algo pessoal subjetivo individual único irrepetível Saber no seu sentido original significa sentir o gosto perceber o gosto duma coisa Isso vem mostrar que o saber é uma experiência E toda experiência é única singular pessoal irrepetível Ora se a experiência é algo pessoal singular não se pode dizer que há saber mais e saber menos pois não haverá ponto de comparação O máximo que se poderá dizer é que existem saberes diferentes Não podemos comparar então dois saberes dizendo que um é maior que o outro nem que um é melhor que o outro Não há critério comum de comparação Um filósofo e um pescador possuem saberes diferentes mas ambos importantes conforme as circunstâncias Outro exemplo real Uma menina de quatro anos escrevia seu nome usando quatro letras Seu nome era Ana mas não tinha nada a ver com o que ela escrevia Quando se pedia para que ela escrevesse seu nome ela escrevia as quatro letras Pediase que escrevesse o nome de sua irmã menor e ela deixava de fora meia letra O nome de seu pai era escrito com letras bem grandes O nome de sua colega da mesma idade ela o escrevia trocando uma das letras Na verdade ela escrevia tudo o que se lhe pedisse sempre dentro duma certa lógica própria dela Estamos chegando ao que nos interessa Queremos mostrar como a pedagogia ou didática que usamos reproduz as relações de produção principalmente a dominação Vamos supor que uma professora formada numa de nossas escolas tradicionais se defronte com a Ana Ela pede que a Ana escreva seu nome A Ana escreve as quatro letras Qual a reação espontânea e natural da professora Ela certamente vai dizer Está errado Ana Teu nome é assim E escreveria Ana O que aconteceu nesse momento A Ana aprendeu como escrever seu nome Certamente não Se ela fosse obrigada a escrever cinquenta vezes o nome Ana ela com certeza sairia escrevendo o nome Mas não saberia por que seu nome era Ana e não as quatro letras que ela escrevia Mas uma coisa essa menina teria aprendido se por acaso ela já não tinha aprendido antes Essa coisa é no mundo existem dois tipos de gente os que sabem a professora e os que não sabem o aluno Pois no momento em que a professora disse está errado implicitamente foi isso que ela ensinou as relações de dominação onde alguns estão em cima sabem e outros estão embaixo não sabem Por que isso Porque mesmo cientificamente falando não se pode provar que uns sabem e outros não sabem como vimos antes pois não existe saber mais e saber menos O que existe são saberes diferentes Então o que se pode mostrar é que a Ana sabe uma coisa e bem lógica na sua lógica e a professora sabe outra coisa dentro duma outra lógica duma convenção nossa Explicando um pouco mais esse ponto sabemos que Ana se escreve de diferentes maneiras em português Ana inglês Ann francês Anne em chinês um sinal ideográfico etc Tudo isso é fruto de convenção e convenção arbitrária A Ana também criou uma convenção para ela escreveu seu nome com quatro letras Alem por exemplo Isso para ela é um saber é uma experiência dela baseada numa lógica que ela desenvolveu Agora veja o que acontece quando uma professora chega e diz Está errado A professora não se detém em descobrir qual a lógica subjacente à menina e qual o esquema cognitivo subjacente ao que ela escreve Ela simplesmente passa por cima e usa uma atitude dominadora de quem se julga detentora dum saber que deve ser comum a todos Baseada nessa convicção no fundo falsa e não científica ela dá seu juízo sobre o que a Ana faz sem outra razão que não uma atitude de poder dominação por ela ser professora e ter estudado quem sabe É nesse momento que se reproduzem as relações de dominação As relações verticais de uns por cima dos outros se dão na escola principalmente É verdade que os conteúdos dos livros didáticos estão também cheios de ideologias mas as mais perniciosas são as ideologias que são transmitidas na didática na pedagogia na prática de como se ensina A teoria didática subjacente à atitude dessa professora é a teoria comportamental que trata as pessoas como objetos que devem ser ensinados padronizadamente dentro dum saber objetivo transmissível do mesmo modo Como seria então uma prática dialogal Tomemos o mesmo exemplo da Ana No momento que a Ana escreve seu nome ALEM digamos uma professora que já refletiu sobre a singularidade do saber que é uma experiência e que sabe que todo erro é lógico isto é que por detrás do que nós chamamos erro está subjacente uma lógica essa professora começaria através de perguntas a descobrir qual o esquema lógico qual o esquema cognitivo subjacente àquilo que a Ana escreveu Aos poucos sempre com perguntas ela poderia ter certas pistas de por que Ana escreveu seu nome assim E sempre através de perguntas tentaria levar a Ana a uma contradição sempre dentro do esquema dela Dentro de algum tempo certamente não naquele dia ela poderia mostrar à Ana as contradições presentes e estabelecer aos poucos uma possibilidade de diálogo em termos comuns E aqui chegamos à palavra principal diálogo O diálogo para ser verdadeiro tem de se dar em igualdade de posições Isto é o verdadeiro diálogo exige que um esteja ao lado do outro e não que um se coloque em posição de superioridade como é o caso do professor que está convencido de que sabe O diálogo exige respeito total ao mundo do outro exige verdadeira democracia E somente quando um está ao lado do outro é possível na pergunta e resposta a formação e o reconhecimento das posições cognitivas mentais de ambos Nessa reciprocidade na provocação de um para com o outro dáse o verdadeiro diálogo que leva ao crescimento mútuo ao conhecimento dos esquemas lógicos subjacentes a cada um Mas na maioria das vezes esse diálogo não é estabelecido e nem se quer perder tempo na construção e reconhecimento da posição do outro Cortamse etapas e em geral o professor julgase com direito de decidir logo sobre a ação colocada pelo aluno julgando taxativamente essa ação Está errado Essa é a verdadeira atitude dominadora de desrespeito ao mundo interior do interlocutor E isso é feito até propositadamente pois o aluno de agora em diante já ficará ciente de que ele não sabe que deve obedecer aos que sabem que ele vale menos porque não sabe e que deve fazer tudo o que pedirem dele Ele passa a cultivar essa atitude de submissão e dependência atitude essa que muitas vezes já aprendera na família e que levará para todas as outras instâncias da sociedade para a igreja para o trabalho etc Gostaria de terminar com uma consideração muito profunda e provocante de Paulo Freire sobre esse assunto Diz Paulo Freire que todo processo educativo deve ser o exercício a prática duma Páscoa Por Páscoa se entende na tradição judaica e cristã o processo de passagem duma situação negativa no caso dos judeus da escravidão no Egito no caso de Cristo de morte para uma situação positiva liberdade ou vida ressurreição Diz Freire que o verdadeiro educador é aquele que é capaz de praticar uma Páscoa isto é morrer a seus critérios a seu esquema cognitivo a seu esquema lógico sempre que entrar em contato com um educando para poder depois com o educando ressuscitar numa nova relação de vida e liberdade Esse pensamento é extremamente evangélico Cristo já dizia que é morrendo que se vive e também extremamente científico pois só existe verdadeiro diálogo verdadeira educação quando se pode compreender entender o mundo lógico existente no nosso interlocutor uma vez descoberto e identificado esse mundo lógico do educando podese então provocálo através da pergunta para que ele cresça ele descubra a verdade Como conclusão gostaríamos ainda de chamar a atenção para a ideologia que poderia estar subjacente a um outro conceito o de professor Já vimos que o nome que gostaríamos sempre de usar no processo de aprendizagem seria o de educação que significa tirar de dentro das pessoas algo já existente como po tencialidade Do mesmo modo o nome que gostaríamos de usar para quem está engajado nessa prática é o de educador Com isso evitaríamos o nome de professor que na sua etimologia significa algo um tanto equivocado falar na frente das pessoas Há muitos professores que na realidade fazem o que a palavra significa ficam fazendo discursos diante dos alunos sem nunca estabelecer um diálogo Numa aula de 50 minutos ficam falando 45 não deixando que o educando possa também dizer sua palavra Isso leva pela própria prática conseqüente ao estabelecimento de relações verticais dominadoras O verdadeiro educador ao contrário é o que sabe fazer a pergunta no momento exato colocando o aluno em contradição obrigandoo assim a solucionar ele mesmo essa contradição e colocandoo num processo de caminhada autônoma independente É essa prática que leva a uma educação autônoma e libertadora Percebese de tudo o que se disse que não é fácil ser um bom educador A verdadeira educação exige uma conversação profunda dos que nela estão engajados uma mudança profunda de atitudes um respeito muito grande pela pessoa e pelo saber experiência da pessoa que está conosco Um sistema autoritário não pode aceitar uma prática educativa dialogal pois cedo ou tarde essa prática iria questionar as relações básicas fundamentais do sistema E aqui se coloca a grande força duma prática educativa dialogal ela leva à mudança das relações existentes na sociedade pois ela fornece um novo modelo de vivência social O que leva na realidade à mudança duma sociedade são as novas práticas que são vividas e incentivadas entre as pessoas De nada adiantam belos discursos cheios de propósitos e palavras libertadoras se a prática é dominadora Mas se numa escola educadores e educandos se propuserem a vivenciar e promover novas relações sociais baseadas na igualdade no respeito no diálogo então sim essa sociedade começa a mudar As pessoas que se acostumam a uma prática democrática vão levar essa prática às outras situações sociais em que elas vivem às igrejas às famílias aos locais de trabalho Eis a grande chance duma escola ela pode ser o laboratório onde se forjarão novas vivências verdadeiramente comunitárias de onde poderão surgir transformações profundas e radicais em todo o corpo social CAPÍTULO XV O APARELHO IDEOLÓGICO DA FAMÍLIA A família é a primeira instituição com que uma pessoa entra em contrato em sua vida E ela a acompanha duma maneira ou outra até sua morte Direta ou indiretamente ela está sempre presente Muita coisa já se escreveu sobre família Gostaríamos de explorar um pouco alguns aspectos escondidos silenciados no referente a esse aparelho ideológico A grande questão que deve ser discutida é qual o verdadeiro papel que a família executa Será que é somente o de procriação desenvolvimento socialização e manutenção dos filhos Não haverá outras funções Queiramos ou não a família recebe grande influência do modo de produção em que está inserida As relações básicas duma sociedade irão influenciar direta ou indiretamente a estrutura familiar E é isso que gostaríamos de mostrar No modo de produção capitalista a família que não é consciente que não se vigia prepara os elementos para a produção forma cidadãos de acordo com as necessidades do sistema Toda a discussão que fizemos no capítulo anterior sobre a escola pode ser adaptada agora à família Há duas práticas educativas básicas a condicionadora que forma para a dominação e a dialogal que forma para a liberdade No exame da maioria de nossas famílias percebemos que elas reproduzem relações de poder da sociedade em que vivem Assim na maioria das famílias cabe ao marido e pai o máximo de autoridade Da mulher sempre se espera submissão ao marido e dentro de casa ela exerce relativo poder sobre os filhos Mesmo entre os filhos se estabelece uma hierarquia de poder o mais velho manda no mais novo e o filho homem manda na filha mulher Esse é um exemplo claro de relações de dominação que se estabelecem por dois critérios 1 O critério de idade quem é mais velho pode mais e sabe mais Assim como na escola o professor sabe mais que o aluno na família o adulto sabe mais que a criança Como vimos no capítulo anterior isso é falso pois todo saber é uma experiência e não há saber maior ou menor há saberes diferentes O adulto sabe uma coisa o jovem sabe outra Se o critério de saber é a idade as relações se tornam verticais não dialogais 2 O critério gênero o homem manda mais que a mulher Para os homens são permitidos certos comportamentos certas regalias que de nenhuma maneira são permitidos à mulher Dentro do processo de socialização primária o menino já é educado diferentemente para ser o chefe para decidir tomar a iniciativa A menina vai cuidar das coisas de casa vai servir ao marido cuidar das crianças Mais uma vez as diferenças de gênero servem para a reprodução das relações de dominação pois quando se chegar ao trabalho teremos novamente essas diferenças já consagradas e legitimadas No trabalho a mulher como regra vai receber menos mesmo que faça o mesmo trabalho que o homem O importante é que se mantenham as hierarquias de poder que as relações se estabeleçam verticalmente Tendo ainda em mente a discussão feita no capítulo anterior sobre a importância de se respeitar o saber dos outros e da importância em se estabelecer relações de igualdade para que possa haver um verdadeiro diálogo trazemos aqui um exemplo acontecido em nossa prática profissional Fui convidado para uma palestra par um grupo de mais de 60 casais Quando vieram me buscar já foram me dando umas insinuações do que deveria falar O assunto era conflito de gerações No caminho iamme dizendo Pois veja o Sr os jovens que temos hoje tomam drogas saem sozinhos de noite não dão satisfação a ninguém do que fazem não têm responsabilidade Percebi que seria difícil a tarefa Ao iniciar a conversa fizemos um acordo de que nós falaríamos de nós mesmos dos adultos pois os jovens não estavam mesmo presentes e não fazia sentido falar dos ausentes Aos poucos tentei colocar sempre em termos de evidência a impossibilidade de se provar que há um saber maior ou melhor e um saber menor ou pior que o saber é uma experiência pessoal única singular Que existiam isso sim saberes diferentes E que os jovens apesar de tudo também tinham um saber e que seu saber tinha fundamento tinha uma lógica A única atitude plausível coerente seria tentar estabelecer um diálogo com o jovem e que o diálogo implicava numa igualdade de posições um ao lado do outro respeitando cada um o saber do outro e através da pergunta e questionamento tentar compreender o esquema lógico existente em cada uma das partes Esse diálogo seria muito enriquecedor e seria a prática da verdadeira democracia dum lado e do que o Evangelho nos sugere de outro pois segundo o Evangelho se temos um só Pai somos conseqüentemente todos irmãos e não há ninguém que é mais irmão que o outro A estas alturas da conversa alguém do fundo da sala gritou Quero falar Alguns estranharam mas o senhor continuou a gritar Quero falar E veio vindo para a frente do grupo Estava um tanto alterado e iniciou sua colocação que demorou mais que quinze minutos Após ter confessado que o que tinha sido dito era realmente o que deveria acontecer acrescentou que tinha um exemplo pessoal para provar isso Fazia seis dias que sua filha tinha saído de casa e após três dias ele comunicou o fato à polícia mas a polícia não a encontrara Quando a polícia chegou a sua casa e perguntou qual o nome todo de sua filha ele não soube responder e teve de recorrer à mulher para que ela dissesse o nome todo Ao perguntar a idade da filha ele também não sabia e teve de chamar novamente a mãe E assim por diante Entre outras coisas disse que não se lembrava de jamais ter prestado atenção a alguma coisa que a filha lhe tivesse dito Porque em casa quem mandava era ele e os outros só tinham que obedecer Na mesa o único que falava era ele e a mulher com a permissão dele Os filhos deveriam escutar calados Era até de estranhar que a filha com 18 anos já tivesse agüentado durante tanto tempo uma situação tão dominadora e autoritária Numa situação dessas até se compreendia que ela tivesse abandonado a família Mas o que esse senhor narrou em parte acontece com todos nós Todos temos dentro de nós relações de dominação Nós fomos formados dentro de relações autoritárias reprodutoras do sistema sem nos darmos conta respiramos comemos bebemos digerimos sonhamos relações de dominação Automaticamente as transportamos para todos os ambientes e instâncias Assim por exemplo qual o adulto que não pensa que sabe mais que o jovem Qual o professor que não acha que sabe mais que o aluno Qual o padre que não acha que sabe mais que o povo Cientificamente falando não se pode provar que o saber de um é maior do que o saber de outro Agora no momento em que nos apresentamos diante dos filhos alunos ou povo com a convicção de que sabemos mais não é necessário dizer mais nada a simples atitude já é de dominação Ela extravasa de todos os nossos gestos nós a expelimos por todos os nossos poros Somente uma pessoa que se vigia momento a momento que se pergunta pela razão e o sentido de todos os seus gestos e ações pode desenvolver para si mesma e para as pessoas com as quais se relaciona relações igualitárias democráticas dialogais É interessante também prestar atenção sobre a influência que o sistema global exerce sobre as próprias relações que levam duas pessoas a viverem juntas Todos achamos que as pessoas casam porque se enamoraram se apaixonaram Mas por detrás do fato de se enamorar e apaixonar estão muitas influências bastante concretas e materiais Em primeiro lugar quem toma a iniciativa é o macho com a fêmea sucumbindo graciosamente às arremetidas do parceiro Quem determinou esses papéis E se formos examinar os que chegam a casar vamos ver que existe uma grande correlação entre renda posição social status e casamento Será isso também fruto da paixão Ou existem algumas regras misteriosas que coordenam essas variáveis Por que essa estranha correlação de classe Por que rico casa com rico pobre com pobre branco com branco negro com negro Qual a verdadeira razão de muitas pessoas irem à Universidade e a tal Universidade específica Será que a verdadeira razão é mesmo fazer um curso superior E por que abandonam o curso logo depois que conseguem casar Por que certas mães só deixam as filhas ou os filhos freqüentar certas reuniões com certas pessoas Por que a flecha de Cupido só funciona dentro de determinadas circunstâncias e por que o Cupido é tão determinado por certos critérios de classe status raça cor religião etc Um olhar ainda mais escrutinador à essência da questão vai desvendar coisas ainda mais interessantes Esse exemplo nos pode ajudar a provocar e questionar mais um pouco Um grupo de três professores casados duma determinada universidade nos Estados Unidos resolveram socializar em parte sua maneira de viver Decidiram morar numa casa só e colocar em comum as coisas que pudessem Sendo que as famílias não eram tão grandes dois casais com dois filhos e um com um filho não foi difícil conseguir uma casa em que todos pudessem ficar Tudo o que fosse repetido eles iam dispensado e vendendo Aos poucos foram se dando conta da grande descoberta que tinham feito Em vez de cinco carros eles ficaram com três Em vez de sete geladeiras eles ficaram com duas Em vez de três aspiradores de pó três batedeiras três máquinas de cortar grama três liqudificadores etc eles reduziram tudo a uma unidade Os filhos estudavam e brincavam juntos Se um casal quisesse sair à noite não precisava pagar alguém que cuidasse dos filhos Os professores em vez de comprar três livros iguais compravam um Sua biblioteca se tornou ampla e variada Eles podiam discutir os problemas em conjunto e a maioria dos alunos de pósgraduação queriam ser orientados por um desses professores pois além duma biblioteca excelente quando um não pudesse o outro o substituía Mas o mais interessante foi o seguinte começou a sobrar dinheiro Os gastos se reduziram a menos da metade Com isso eles podiam investir mais na pesquisa em livros e equipamentos melhores Os próprios filhos mostravam mais satisfação e um desenvolvimento mais normal e sadio Enfim houve uma mudança muito grande para melhor na vida desses três casais Esse fato nos leva a refletir sobre a influência que o sistema global exerce inclusive na formação e vivência das famílias A filosofia do sistema capitalista é a individualização das pessoas e 114 115 das famílias Através da competição as qualidades individuais são privilegiadas e as relações associativas são colocadas em segundo plano Além disso é muito mais interessante para o sistema econômico que se consuma a maior quantidade de produtos possível Para isso cada família mesmo que sejam só duas ou três pessoas tornase um agente consumidor Cada família passa a ter toda a parafernália de objetos que diaadia são inventados e introjetados nas pessoas através duma propaganda maciça que cria necessidades a maioria das vezes totalmente supérfluas No momento em que diversas famílias se unirem o consumo desses objetos familiares diminui e com isso o sistema não lucra como poderia lucrar Mas o que acontece com a escola e com as outras instituições pode acontecer também com a família Ela pode se tornar um agente transformador na medida em que se conseguir estabelecer e criar novas relações igualitárias e dialogais entre seus membros A família é na verdade o momento essencial e primeiro na estruturação da personalidade das pessoas A vivência familiar será conseqüentemente a base fundamental que possibilitará uma ruptura com as práticas normais do sistema caso as pessoas da família tomarem consciência dessas relações estruturais do sistema e decidirem estabelecer a prática de novas relações Como você estará percebendo há uma estreita ligação entre a família e a escola e entre essas duas instituições e as outras que analisaremos posteriormente como a religião os meios de comunicação etc Muitas vezes o trabalho libertador da família é frustrado pela escola e viceversa Mas em cada situação institucional é necessário que se estabeleça a luta para a transformação das relações básicas do sistema e o surgimento de diferentes práticas de vida democráticas e dialogais O ideal seria que as instituições todas trabalhassem unidas interligadas numa colaboração mútua 116 117 Peter Berger nos dá uns exemplos muito interessantes desse fato Para determinados países por exemplo a frequência à igreja pode ser correlacionada quase rigorosamente com as estratificações sociais a atividade religiosa caracteriza os trabalhadores de colarinho branco pessoas que têm empregos melhores não sujam as mãos os operários braçais os proletários dificilmente vão à igreja O que se vê então é uma relação entre a fé de uma pessoa digamos na Trindade e sua renda anual abaixo de certo nível de renda parece que não existe mais fé Pois é a sociologia que vai perguntar como surgiu essa estranha correlação estatística entre renda e salvação Um exemplo interessante também que vai revelar as possíveis ideologias de determinadas organizações religiosas é o contado por Berger Digamos que numa sociedade primitiva algum alimento necessário só possa ser obtido viajandose por mares traiçoeiros infestados de tubarões Duas vezes por ano os homens da tribo partem para buscálo em suas precárias canoas Suponhamos que as convicções religiosas dessa sociedade incluam um artigo de fé segundo o qual todo homem que deixar de participar dessa expedição perderá sua virilidade exceto os sacerdotes cuja virilidade é mantida por seus sacrifícios diários aos deuses Essa convicção cria uma motivação para aqueles que se arriscam na viagem perigosa e proporciona simultaneamente uma legitimação para os sacerdotes que ficam sempre no bem bom É desnecessário acrescentar que é bem provável que foram os sacerdotes que inventaram a teoria Em outras palavras suspeitaremos que estamos diante de uma ideologia sacerdotal Esse exemplo é muito bom para nós podermos começar uma análise crítica das diversas instituições e estruturações religiosas que diariamente vão aparecendo em nossa sociedade Seguindo a pesquisa e a conceituação de Enrique Dussel pensamos que se poderia com muito proveito tentar distinguir dois tipos fundamentais de religião E isso exatamente pelo fato de essa religião poder ser usada e instrumentalizada por diferentes grupos Com essa distinção ficaria bastante fácil a análise crítica dos diversos grupos religiosos que vão surgindo diaadia em nossa sociedade brasileira 1 A religião como superestrutura A religião é siperestrutural quando se torna um conjunto de mediações simbólicas e gestos rituais quando se torna doutrina explicativa do mundo a serviço de nações e impérios Se formos analisar a história veremos que todos os impérios e ditadores tentaram absolutizar seu poder para poder dominar todos os seus súditos Absolutizando o poder também divinizaram e se tornaram assim imperadores e deuses Faraó por exemplo se intitulava também deus Ele necessitava da religião para sua legitimação e necessitava das pessoas sacrificadas torturadas escravizadas para seu culto O mesmo se pode dizer dos imperadores romanos Eles não queriam reconhecer que seu império era histórico finito Faraó sacrificava os judeus os césares sacrificavam os cristãos Se formos chegar mais adiante veremos os Imperadores da Espanha e Portugal de direito divino sacrificando os índios e escravos E se chegarmos até nossos dias veremos novamente o imperialismo capitalista ou totalitário necessitando para seu culto da tortura escravização e morte de milhões de pessoas do Terceiro Mundo Tudo isso para provar que eles são deuses tendo o dólar o seu sinal In God we trust Nesse sentido a religião se torna o ópio do povo É a ideologia que justifica o sistema e dá coerência absoluta teórica além de toda a crítica ao poder Os que se levantarem contra esse sistema são tachados de ateus de irreligiosos desonestos ilegítimos Desde Sócrates que devido a sua educação libertadora era acusado de ensinar falsos deuses até declarações de nossos ditadores latinoamericanos que torturam e matam em nome do cristianismo assistimos à disseminação dessa religião estatal que endeusa fetichiza e absolutiza o sistema Essa é a religião acrítica domesticadora alienadora instrumento ideológico do imperialis 118 119 ALUNO A RESUMO DA OBRA SOCIOLOGIA CRÍTICA DE PEDRINHO GUARESCHI Na obra Pedrinho Guareschi apresenta de forma prática e com linguagem popular ele explana aspectos básicos como o que é teoria o que é ciência o conceito de ideologia e além de nos mostrar a importância do indivíduo ser crítico diante da realidade apresentando também duas teorias primordiais a respeito desse contexto Em outras palavras o autor apresenta uma visão questionadora sobre os fatos que acontecem ao nosso redor na sociedade em que vivemos e a partir dessa premissa relata as possibilidades que podemos implantar para modificar e melhorar o panorama social Pedrinho relata que o princípio de que por trás de tudo que nos é conhecido há uma ideologia com o intuito de controlar a sociedade e manipulando os indivíduos que vivem nela são expostas falsas ou meias verdades sobre a realidade de acerto com os interesses e valores sejam eles nítidos ou não como diz o autor como as teorias e consequentemente a ciência não dizem tudo sobre a realidade p 16 é necessário ter cuidado com as teorias pois as vezes elas podem nos prejudicar No capítulo I o autor apresenta o conceito de teoria e ciência mostrando como as leis tentam explicar a realidade como por exemplo em dias de chuva acontece com mais frequência acidentes no trânsito logo agrega se a chuva e acidentes p 15 esse conjunto de leis que tentam explicar o que é a realidade fatos concretos e singulares que são chamados de teoria Nesse viés teoria é um conjunto de leis que tentam explicar a realidade estar que em sua maioria são nada mais que uma generalização criadas por uma associação de fatos singulares que vamos observando no dia a dia ou seja são as relações que acontecem entre os fatos Sobre a questão temos o caso dos americanos quem vê o Fantástico todo domingo já tem sua teoria os americanos são ricos são mais inteligentes do que nós pois mostram coisas lindas e gente que sabe muito são melhores que nós pois fazem coisas fantásticas maravilhosasp 16 que são apontados como semideuses ou seja superiores Sendo assim certas teorias não são bem aceitas que podem gerar preconceitos que modo possa julgar um individuo Em relação a ciência o autor define como o conjunto de teorias sobre um assunto a concretização disso é a física química matemática sociologia entre outros Contudo o autor ressalta que nenhuma lei explica por completo um fenômeno ou uma teoria explica totalmente um fato que às vezes é deixado um vazio que não pode ser preenchido ou que talvez não seja preenchido de propósito uma vez que há interesse em deixar algo mal explicado senão poderá prejudicar alguém É com base nisso que no capítulo II o autor apresenta o significado de ideologia já que este assunto é bem abstruso definindo assim a ideologia significa estudo das ideias p 18 Este significado pode ter uma figura tanto negativa e ruim mas ainda se encontram o uso da ideologia como significado de ideias valores e maneiras de pensar no seu sentido positivo De acordo com o estudo ideológico nós somos o que os outros dizem e da forma que nos questionamos e encontramos as respostas é que formamos nossa identidade isto é a ideologia está presente em praticamente todas as explicações que nos são dadas sobre as coisas inclusive sobre o que os outros falam de nós Para entender o que é ideologia o autor cita alguns exemplos como conversando com uma empregada doméstica ela me disse Rico é aquela pessoa que soube poupar Quem trabalha mais e melhor e ganha mais p19 será Pode se afirmar que as pessoas ricas não são assim porque pouparam e que quem trabalha mais e ganha mais não é uma verdade completa no entanto quando desconfiamos que as coisas não são precisamente exatas como acreditávamos que era estamos diante de ideologias Os noticiários influenciam no pensamento dos indivíduos esses por sua vez necessitam ter consciência de si próprio para fazer parte de um mesmo grupo e separar um processo de conscientização de classes logo se um grupo não coincide com suas expectativas ele não tem sustentação por um longo período No capítulo III o autor nos trás a definição de sociologia trazendo suas teorias e ideologias ele diz que sociologia é o estudo do social ou da sociedade ou de tudo o que se refira a mais pessoas e não a uma só p 23 sendo assim onde se encontra um grupo de pessoas em organizações ou órgãos e sempre que existir alguma coisa que implique outras pessoas a sociologia estará presente no assunto Neste capítulo o autor também relata a respeito da existência de varias sociologias partindo desse contexto o autor nos apresenta duas teorias raízes das outras que regem a sociedade a primeira é a teoria positivistafuncionalista e a segunda é a teoria histórico crítica a teoria positivista é chamada de positivismo porque ela supõe implica que a realidade está ai isto é a realidade é o que esta colocada posto na nossa frentep 24 nesta teoria o positivismofuncionalista nada mais do que uma maneira encontrada por aqueles que estão no poder de criar pessoas alienadas e permanecer no comando Na teoria histórico crítico o autor aborda o enfoque principal do livro além de ser a mais científica devido explicação mais perfeita da realidade relativiza a pois prevê que tudo é passageiro histórico ou seja do mesmo jeito que as coisas aparecem desaparecem nada é absoluto ou imutável Opondo se a Teoria PositivistaFuncionalista que retêmse a obviedade de que a realidade é o que está aí e que tudo caminha para um equilíbrio p 25 Nessa teoria a visão crítica é um hábito costume questionamentos dispostos a transformar a sociedade Os capítulos do livro sociologia crítica remetem uma nova visão sobre o que é sociologia qual a necessidade de se falar de como se usar desmitificando de uma teoria e de uma ideologia fazendo seu bom uso crítico no meio social com intuito de promover mudanças sendo essas que nos levam além explicar o que é utopia e dar exemplo de sociedades utópicas nos mostra que muitas coisas idealizadas anteriormente e que há alguns séculos eram impossíveis hoje são possíveis graças às pessoas que acreditaram na sociologia crítica E com estilo e clareza o autor nos faz um convite a não ficar estagnados no presente mas pensarmos no futuro já que ele também faz parte da realidade devemos vindicar o impossível para prosseguir na mudança