·
Direito ·
Processo Civil 1
Envie sua pergunta para a IA e receba a resposta na hora
Recomendado para você
8
Limites da Jurisdição Nacional e Cooperação Internacional
Processo Civil 1
SECAL
21
Requisitos Processuais e Início do Processo Conforme o Novo CPC
Processo Civil 1
SECAL
16
Análise Crítica do Novo Código de Processo Civil e o Formalismo Democrático
Processo Civil 1
SECAL
13
Ação: Conceito e Evolução na Jurisdição
Processo Civil 1
SECAL
14
Tutela Jurisdicional: Função Legislativa e Resolução de Conflitos
Processo Civil 1
SECAL
15
Aplicação das Normas Processuais à Lei Processual Civil no Espaço e no Tempo
Processo Civil 1
SECAL
10
Pressupostos Processuais e Imparcialidade no Processo Cautelar
Processo Civil 1
SECAL
22
Jurisdição, Ação e Processo: A Trilogia Estrutural do Direito Processual Civil
Processo Civil 1
SECAL
Texto de pré-visualização
7 71 PROCESSO Conceito Terceiro dos institutos fundamentais do Direito Processual ou da chamada trilogia estrutural do processo ao lado da Jurisdição e da Ação o processo pode ser conceituado sob dois enfoques do ponto de vista intrínseco é a relação jurídica que se estabelece entre autor juízo e réu afora eventuais terceiros como o assistente e o denunciado à lide com vistas ao acertamento certificação realização ou acautelamento do direito substancial subjacente sob a perspectiva extrínseca é o meio o método ou o instrumento para definição realização ou acautelamento de direitos materiais A jurisdição exercida pelos juízes e tribunais61 não age de ofício lembrese a Jurisdição é inerte Os órgãos jurisdicionais aguardam a provocação feita por meio da ação cujo ato inaugural é o protocolo e consequente distribuição da petição inicial Com a provocação a jurisdição inicia a sua atuação no sentido de prestar a tutela jurisdicional seja acolhendo ou rejeitando o pedido formulado pelo autor Mas os seus movimentos não são livres ao contrário devem obedecer a método estabelecido em lei o processo O processo no entanto não é apenas um instrumento da jurisdição É também elemento validador e disciplinador da jurisdição62 na medida em que a atuação estatal só será legítima se observar os preceitos processuais O processo serve então como um método inerente à atuação estatal que objetiva proteger o direito das partes envolvidas e garantir o cumprimento das regras e princípios estabelecidos no ordenamento pátrio O fenômeno é semelhante guardada as grandes diferenças ao que ocorre no Congresso Nacional quando da elaboração das leis Aqui no processo jurisdicional a área de atuação é menor a eficácia do ato limitase em regra às partes processuais Já no processo legislativo o palco é mais amplo porquanto o regramento definido é geral e abstrato e vinculará toda a sociedade O importante no entanto é que a escolha da lei de regência do caso concreto e das normas gerais e abstratas não se dá aleatoriamente ao talante do juiz e do legislador Pelo contrário tanto no processo legislativo quanto no jurisdicional há um método um conjunto de normas preestabelecidas ou simplesmente um processo que obrigatoriamente deverá ser observado sob pena de ilegitimidade do ato Falase nesse contexto em devido processo legal e devido processo legislativo Uma lei cuja iniciativa foi promovida por quem não detinha legitimidade para tanto é 188 formalmente inconstitucional e portanto nula assim como a sentença proferida por juiz absolutamente incompetente É sob tal prisma que se afirmou linhas atrás que a jurisdição só será válida se exercida de acordo com as normas processuais As normas reguladoras do processo decorrem de um parâmetro único o parâmetro do Estado Democrático de Direito Nos termos do art 1º da CF1988 Art 1º A República Federativa do Brasil formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal constituise em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos I a soberania II a cidadania III a dignidade da pessoa humana IV a valorização do trabalho e da livre iniciativa V o pluralismo político O dispositivo constitui uma abrangente síntese indica o nome com que o país se apresenta perante a comunidade internacional República Federativa do Brasil a forma de Estado Federação a forma de governo República e o regime do Estado Democrático Sem aprofundar em tema que não é o objeto direto de nosso trabalho podemos afirmar em apertada síntese que o Estado Democrático de Direito é aquele que se submete ao império da Lei emanada do povo titular do poder garantindo e respeitando os direitos fundamentais Entre os direitos fundamentais consagrados na nossa Constituição merece destaque a garantia ao devido processo legal art 5º LIV que em uma perspectiva formal constitui o direito de processar e ser processado com base nas normas previamente estabelecidas para tanto normas estas cujo processo de produção também deve respeitar um determinado processo63 A norma jurídica preceito de observância obrigatória é gênero do qual são espécies os princípios e as regras Luiz Flávio Gomes com base na teoria de Dworkin e Alexy nos fornece didática distinção entre regras e princípios O Direito se expressa por meio de normas As normas se exprimem por meio de regras ou princípios As regras disciplinam uma determinada situação quando ocorre essa situação a norma tem incidência quando não ocorre não tem incidência Para as regras vale a lógica do tudo ou nada Dworkin Quando duas regras colidem falase em conflito ao caso concreto uma só será aplicável uma afasta a aplicação da outra O conflito entre regras deve ser resolvido pelos meios clássicos de interpretação a lei especial derroga a 189 lei geral a lei posterior afasta a anterior etc Princípios são as diretrizes gerais de um ordenamento jurídico ou de parte dele Seu espectro de incidência é muito mais amplo que o das regras Entre eles pode haver colisão não conflito Quando colidem não se excluem Como mandados de otimização que são Alexy sempre podem ter incidência em casos concretos às vezes concomitantemente dois ou mais deles64 No Direito Processual Civil que é o ramo que nos interessa a regra básica é o CPC consubstanciado na Lei nº 131052015 Não obstante há leis extravagantes que regulam procedimentos específicos com base em circunstâncias do direito material veiculado65 É o caso por exemplo da Lei do Mandado de Segurança Lei nº 120162009 da Lei da Ação Popular Lei nº 47171965 da Lei da Ação Civil Pública Lei nº 73471985 do Código de Defesa do Consumidor Lei nº 80781990 e da Lei de Locações Lei nº 82451991 Os princípios processuais por sua vez decorrem da Constituição e de leis infraconstitucionais e às vezes nem positivados estão mesmo assim têm incidência O tema foi estudado no capítulo pertinente à principiologia adotada pelo novo CPC O que deve ficar claro desde já é que todas essas normas que regem o processo são frutos de um debate democrático O processo não é criado imposto ou comandado pelo juiz Os termos do processo estão predefinidos e vinculam todos os que nele atuarem partes advogados juiz promotores e defensores públicos peritos e servidores Tudo o que se define no processo portanto é democrático porquanto esse é o parâmetro a ser observado na definição de qualquer direito genérico previsto nas leis ou específico De acordo com as normas democráticas vigentes o processo se desenvolve sucintamente nos seguintes termos O interessado sentindose lesado em seu direito contratará um advogado a menos que postule em causa própria que redigirá a petição inicial protocolizandoa no juízo ou tribunal competente para processar e julgar a causa tratase do exercício do direito de ação que provocará a jurisdição Lembrese que nos termos do art 133 da CF1988 o advogado é indispensável à administração da justiça No entanto em algumas demandas a jurisdição iniciase de ofício como a execução trabalhista art 878 da CLT ou por provocação pessoal da parte interessada sem a representação por advogado art 9º da Lei nº 90991995 Submetida a petição inicial peça pela qual se veicula o direito de ação ao protocolo ela é encaminhada a uma autoridade denominada distribuidor em tempos 190 de processo eletrônico a distribuição é feita pelo computador que a remeterá para uma das varas daquela comarca a ação atinente a direito de família é distribuída para uma das varas de família as ações penais para uma das varas penais e assim sucessivamente Note que mesmo nas comarcas em que haja apenas uma vara há serviço de protocolo e distribuidor que receberá e distribuirá o processo para aquele juízo órgão jurisdicional que pode ser vara tribunal ou juizado No juízo o processo é recebido pelo escrivão a quem incumbe autuálo Autuar um processo é receber a petição inicial e preparála para a tramitação interna Assim todos os documentos apresentados pelo autor serão inseridos em uma capa que conterá o número do processo autos nome das partes e advogados e o juízo para o qual foi distribuído Em seguida procedese à numeração sequencial das folhas Autuado e registrado o processo66 é finalmente remetido concluso ou fechado ao juiz67 Mais uma vez devese ressaltar que tais tarefas são automatizadas no processo eletrônico Como ainda concomitantemente convivemos com autos físicos e virtuais e como este manual se destina principalmente a aprendizes do Direito julgamos oportuno descer a esse nível de detalhamento por certo enfadonho a renomados advogados e juristas que tem o péssimo vezo de achar que todos já nasceram sabendo O juiz recebendo a petição inicial devidamente autuada e registrada fará uma breve análise acerca da legitimidade e interesse bem como dos demais pressupostos e requisitos processuais e não sendo o caso de improcedência liminar do pedido inviabilidade do invocado designará audiência de conciliação ou mediação e mandará citar o réu estabilizando assim a relação processual O que se pretende é que as partes cheguem a um consenso na audiência de conciliação e mediação pondo fim ao litígio Em não havendo acordo de regra o réu apresenta contestação e após essa fase as partes produzem as provas necessárias à demonstração do direito invocado e manifestamse sobre o processo Superadas todas as fases processuais o juiz prolata a sentença criando a lei que passará a regular aquele caso concreto As partes podem ou não concordar com esta decisão sendolhes conferida a faculdade do recurso meio de se impugnar a decisão judicial dentro da mesma relação processual Afora outras definições que se dá o recurso é o contraditório em face da decisão judicial que pode ser exercido até um dado estágio ou instância do qual não se pode passar A última instância no direito brasileiro é o Supremo Tribunal Federal STF Em linhas gerais esse é o caminho trilhado por quem pretende compor um litígio via Judiciário é esse o meio o método obrigatório para definição dos direitos 191 72 721 materiais As várias visões do processo68 Processo e procedimento Etimologicamente processo significa marcha avante caminhada do latim procedere seguir adiante Por isso em um primeiro momento o processo foi confundido com a simples sucessão de atos processuais procedimento Não se trata aqui de verdadeira teoria sobre o processo mas uma mera visão do fenômeno concepção esta que predominou durante a fase imanentista do Direito Processual na qual a ação era vista como o próprio direito material em estado de reação Nesse contexto durante muito tempo os estudiosos do processo se limitavam a estudar suas formas e atos Como bem observa Freitas Câmara foi a época dos praxistas juristas que em suas obras não tiveram grandes preocupações teóricas tendo se dedicado ao estudo do que hoje denominaríamos prática forense69 Os conceitos de processo e procedimento no entanto são distintos Processo é o método pelo qual se opera a jurisdição com vistas à composição dos litígios É instrumento de realização da justiça é relação jurídica portanto é abstrato e finalístico Procedimento é o modus faciendi o rito o caminho trilhado pelos sujeitos do processo Enquanto o processo constitui o instrumento para a realização da justiça o procedimento constitui o instrumento do processo a sua exteriorização Segundo Humberto Theodoro Júnior o processo outrossim não se submete à única forma Exteriorizase de várias maneiras diferentes conforme as particularidades da pretensão do autor e da defesa do réu Uma ação de cobrança não se desenvolve obviamente como uma possessória e muito menos como um inventário O modo próprio de desenvolverse o processo conforme as exigências de cada caso é exatamente o procedimento do feito isto é o seu rito70 Processo também não se confunde com autos uma vez que estes constituem a representação o registro dos atos processuais não necessariamente gráfico em virtude do advento do processo eletrônico e por conseguinte dos autos virtuais nos quais a representação embora escrita é arquivada num sistema binário Tal como a ação o processo é autônomo A sua instauração independe do direito material controvertido Uma vez provocada a jurisdição atua pelo processo para afirmar se ao autor deve ou não ser reconhecido o direito pleiteado 192 722 723 724 Ao longo da história diversas teorias procuraram explicar o processo apontando os seus elementos e características essenciais Nos tópicos seguintes discorremos sobre as principais teorias do processo Processo como contrato A teoria procedimentalista do processo foi superada com o surgimento da teoria contratualista séculos XVII e XVIII defendida entre outros por Pothier Para os defensores desta corrente as partes se submeteriam voluntariamente ao processo e a seus resultados por meio de um verdadeiro negócio jurídico de direito privado As pessoas não seriam obrigadas a comparecer em juízo mas se o fizessem comprometiamse a cumprir a decisão prolatada pelo juiz Haveria então um pacto uma convenção para o processo litis contestatio A teoria contratualista vale mais como registro histórico porquanto não é capaz de explicar a moderna sistemática do processo substancial Independentemente de sua vontade proposta e admitida a petição inicial o réu será obrigado a integrar a relação processual o que se efetivará com a citação válida Da mesma forma querendo ou não as partes se submeterão aos efeitos da decisão que vier a ser proferida ao final do processo Não obstante a teoria ainda serve de substrato para o processo arbitral porquanto neste a submissão à sentença do árbitro decorre do negócio jurídico firmado pelos litigantes Processo como quase contrato Criada pelo francês Arnault de Guényvau século XIX em evolução à teoria contratualista tal corrente insistia em enquadrar o processo entre os institutos do direito privado Afirmavase que se não é contrato o processo deveria ser um quase contrato porque a parte que ingressava em juízo já consentia que a decisão lhe fosse favorável ou desfavorável ocorrendo um nexo entre o autor e o juiz ainda que o réu não aderisse espontaneamente ao debate da lide71 Pelas mesmas críticas dirigidas à corrente contratualista a teoria quase contratualista também já se encontra superada nos dias atuais Processo como relação jurídica As teorias do processo como contrato ou quase contrato só vieram a ser 193 725 abandonadas em meados do século XIX notadamente com a obra de Oskar Von Bülow a partir de quando o processo adquiriu autonomia científica se dissociando do direito privado Em sua clássica obra Teoria das exceções processuais e dos pressupostos processuais72 de 1868 o notável jurista alemão desenvolveu a tese que já se acenava em algumas obras pretéritas de que o processo seria uma relação jurídica entre as partes e o juiz73 não se confundindo com a relação jurídica material discutida A relação processual tem seus próprios sujeitos autor réu e Estadojuiz objeto prestação jurisdicional e requisitos aos quais Bülow deu o nome de pressupostos processuais que lhe dão autonomia Os defensores dessa teoria no entanto divergem quanto à representação gráfica da relação jurídica que seria o processo Para alguns a relação ostentaria forma triangular quer dizer o processo seria uma relação direta entre Estado e autor Estado e réu e autor e réu Para outros haveria apenas duas relações jurídicas autorEstado e Estadoréu inexistindo contato ou atos processuais direto entre as partes relação jurídica angular Falavase ainda em relação linear coincidente com a de direito material ou seja somente entre autor e réu excluindo o Estado A concepção linear ao certo não merece acolhida porquanto inconteste que também o Estadojuiz figura como partícipe da relação processual Já a discussão entre a teoria angular e a triangular não guarda qualquer interesse prático ou teórico Com efeito o importante é que a relação jurídica processual tem uma configuração tríplice Estado autor e réu74 A corrente que confere ao processo a natureza de relação jurídica é a teoria aceita pela grande maioria dos doutrinadores pátrios e que com raríssimas exceções deverá balizar as suas respostas nas provas da faculdade no exame da ordem e nos diversos concursos jurídicos que vier a prestar Processo como situação jurídica Para os defensores desta corrente criada pelo alemão James Goldschimit o processo seria não uma relação jurídica consideração estática do Direito mas várias situações jurídicas ativas consideração dinâmica do Direito criadoras de deveres poderes faculdades e ônus para os sujeitos que dele participam O processo criaria ainda uma expectativa de prolação de provimento jurisdicional favorável O que antes era um direito subjetivo com o processo passa a constituir mera expectativa possibilidade a ser auferida quando do pronunciamento final sentença 194 726 727 que definiria simplesmente um duelo entre as partes como se fosse um jogo das partes em busca de uma vitória espetacular75 Ocorre que a constatação de que o processo é fonte de deveres faculdades e ônus não é incompatível com a afirmação de que o processo é uma relação jurídica Ademais o processo é autônomo e existirá independentemente da constatação da existência ou não do direito material discutido Como observa Rosemiro Pereira toda aquela situação de incerteza expressa nos ônus perspectivas expectativas possibilidades referese à res in judicium deducta não ao judicium em si mesmo o que está posto em dúvida e talvez exista ou não é o direito subjetivo material não o processo76 Tais observações levaram à superação da teoria do processo como situação jurídica Não obstante a corrente foi extremamente relevante porquanto introduziu no processo importantes conceitos como o de ônus de sujeição e de relação funcional do juiz com o processo Processo como instituição jurídica Os defensores desta corrente entendiam que o processo compreenderia não apenas o resultado de uma combinação de atos tendentes a um fim como também um complexo de atividades relacionadas entre si pelo vínculo de uma ideia comum objetiva ligadas às diversas vontades individuais dos sujeitos dos quais procede a referida atividade77 O processo seria então uma instituição jurídica submetida ao regime da lei e que regula a condição dos sujeitos coisas e atos tendentes à obtenção dos fins da jurisdição Essa teoria que chegou a contar com a adesão de Eduardo Juan Couture já está superada na doutrina Processo como procedimento em contraditório Importante teoria que não pode deixar de ser mencionada é aquela criada por Elio Fazzalari para quem o processo seria um procedimento em contraditório Procedimento para Fazzalari é uma série ou sequência de normas atos e posições subjetivas que se conectam e interrelacionam em um complexo normativo próprio constituindo a fase preparatória e obrigatória de um provimento ato final de caráter imperativo Dessa forma não só o ato final em sua existência mas a própria validade desse ato e consequentemente sua eficácia dependem do correto 195 728 desenvolvimento do procedimento78 O processo por sua vez seria uma espécie do gênero procedimento qualificado justamente pelo contraditório quer dizer pela abertura à participação das partes em simétrica paridade na formação do provimento final sentença ou acórdão Dessa forma ao invés da relação jurídica processual o que caracterizaria o processo além do procedimento é justamente a abertura à participação das partes garantia constitucional Nesse contexto mesmo que o ato estatal se realize dentro de um modelo normativo se não contiver o dado legal do contraditório em sua estrutura não haverá processo No direito pátrio um dos defensores dessa corrente é o ilustre jurista mineiro Aroldo Plínio que afirma existir processo sempre que houver procedimento realizandose em contraditório entre os interessados e a essência deste está na simétrica paridade de participação nos atos que preparam o provimento daqueles que nele são interessados porque sofrerão seus efeitos79 Processo como entidade complexa Corrente de grande relevância na doutrina nacional é a que vê o processo como entidade complexa e representa uma crítica a praticamente todas as correntes já analisadas Segundo Cândido Rangel Dinamarco principal expoente desta corrente de pensamento o processo é integrado por dois elementos distintos que por si sós não explicariam o processo o procedimento série de atos interligados e coordenados ao objetivo de produzir a tutela jurisdicional justa a serem realizados no exercício dos poderes e faculdades ou em cumprimento a deveres e ônus e a relação jurídica processual conjunto de situações jurídicas ativas e passivas que autorizam ou exigem a realização dos atos O conceito de processo portanto não se exaure no de procedimento nem coincide com o de relação processual Processo é ao mesmo tempo uma relação entre atos e uma relação entre sujeitos80 Penso que a teoria de Dinamarco retrata com bastante fidelidade o fenômeno processual Já dissemos que o processo é o método pelo qual atua a jurisdição A provocação da jurisdição é feita com a observância de certas formas tanto que a petição inicial tem requisitos próprios que não podem ser olvidados Assim ao 196 73 protocolar a petição inicial ação o autor dá início ao processo vinculando também o juiz para o qual a causa foi distribuída que terá de despachar a inicial seja para determinar sua emenda para indeferila ou para determinar a citação do réu Com a citação a relação processual se completa e o réu também se vincula ao processo sujeitandose a ele Autor e réu quer queiram quer não se submeterão à decisão a ser proferida Dessa breve explanação podemos extrair que o processo subjetivamente compreende uma relação jurídica entre autor juízo e réu estabelecida segundo as regras do Direito Processual CPC e as demais espécies normativas e com produção de efeitos jurídicos A relação jurídica estabelecida por meio do processo é de direito público porque serve à realização de uma função estatal e além do autor e do réu vincula também um sujeito de direito público o órgão jurisdicional Finalmente o processo é autônomo porquanto pode ser instaurado independentemente da existência do direito material aliás a finalidade do processo é acertar esse direito Em síntese o processo é autônomo e constitui uma relação jurídica de direito público que vincula autor réu e juiz Não se pode olvidar contudo que o processo sob uma perspectiva objetiva compreende também aquela sequência de atos procedimentais praticados pelas partes e pelo juiz de forma conexa e sequenciada sempre em observância às regras e princípios democraticamente estabelecidos daí por que se pode afirmar que o processo é entidade complexa relação jurídica autônoma que se desenvolve mediante a prática de atos processuais sequenciados procedimento Não obstante abstraindose da discussão de qual a natureza jurídica do processo o que de fato importa para nós caro estudante é que o processo é um meio um método um instrumento um sistema ou coisa que o valha para definição de direitos materiais método este imposto de forma cogente pela lei exceto quando houver acordo procedimental nas hipóteses previstas no art 190 e que vincula na composição do litígio partes juiz e demais participantes da relação processual Mediante o processo o Estado prestará a tutela jurisdicional quando para tanto for provocado em razão do exercício do direito de ação Sujeitos do processo Já vimos que a relação processual tem configuração tríplice Estadojuiz autor e réu Lembrese que o juiz atua como mero agente do Estado este sim detentor do 197 74 poder e a quem compete o exercício da função jurisdicional81 Na verdade a configuração tríplice representa somente um esquema mínimo e simplificado que clama por esclarecimentos e complementações82 Destarte além das partes e do Estadojuiz também são considerados sujeitos processuais os advogados o Ministério Público os auxiliares da justiça vg escrivão oficial de justiça perito depositário mediador e conciliador e os terceiros que intervêm no processo após a sua instauração como é o caso do amicus curiae Em razão dessa configuração multipessoal do juízo órgão jurisdicional o mais correto é falar em Estadojuízo Em capítulos específicos estudaremos cada um desses sujeitos Espécies de processo O processo visto como instrumento para prestação da tutela jurisdicional a rigor não comporta divisão Todavia por questão didática costumase classificar os processos tendo em vista a atividade desenvolvida pelo juiz e a providência jurisdicional almejada O processo de acordo com esse critério tem a mesma natureza da ação que o instaurou ou seja de conhecimento ou de execução Antônio Bento emprestou a importância de R 100000 a Manoel dos Anjos que passou um recibo num papel de embrulho Não tendo Manoel dos Anjos cumprido a avença Antônio Bento propôs ação de cobrança O juiz marcou audiência de conciliação e mandou citar o réu para integrar a relação processual e comparecer à audiência Como não houve acordo o réu apresentou contestação Após a prática desse ato pelo réu o juiz examinou as provas ouviu as testemunhas enfim conheceu do litígio e prolatou a sentença julgando procedente o pedido do autor A jurisdição nesse caso atuou pelo processo de conhecimento ou cognição uma vez que o direito do autor antes duvidoso foi acertado Em outra situação imaginemos que Antônio Bento ao emprestar R 100000 a Manoel dos Anjos exigiu a emissão de nota promissória por parte do devedor Recusandose Manoel a adimplir espontaneamente a obrigação Antônio Bento propõe ação O juiz manda citar o réu para no prazo de três dias efetuar o pagamento da dívida art 829 caput O objeto da jurisdição agora não é mais o acertamento do direito mas sim a satisfação do crédito consubstanciado na nota promissória Quando o objetivo do autor é a satisfação do direito acertado por título extrajudicial o processo é de execução Como já salientado o processo cautelar como relação processual autônoma não 198 8 mais existe no sistema processual Entretanto as tutelas cautelares com todas as medidas necessárias ao acautelamento do direito da parte continuam firmes e fortes Embora não se possa falar em processo cautelar as medidas de arrestos sequestro busca e apreensão de outras medidas inominadas poderão ser deferidas pelo juiz PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS Atribuise ao alemão Oskar Von Bülow a identificação dos pressupostos processuais como categoria especial do processo Com efeito o notável jurista alemão foi responsável pela identificação do processo como relação jurídica distinta e autônoma da relação de direito material que nele se discute A relação jurídica processual se estabelece por intermédio de atos processuais sequenciados procedimento principalmente pela petição apta e citação válida Aliás do ponto de vista estático o processo nada mais é do que uma relação jurídica de direito processual porém sob um enfoque dinâmico o processo é constituído por uma série de atos processuais que constituem espécies dos atos jurídicos Ora sendo o processo formado por uma série de atos jurídicos atos processuais nada mais evidente que sua instauração ou desenvolvimento válido seja condicionado a certos requisitos que mutatis mutandis em última análise são os mesmos requisitos de validade do ato jurídico isto é agente capaz objeto lícito possível determinado ou determinável e forma prescrita ou não defesa em lei art 104 do CC No Direito Processual a tais elementos dáse o nome de pressupostos processuais Tradicionalmente portanto os pressupostos processuais constituem aquelas exigências que possibilitam o surgimento de uma relação jurídica válida e seu desenvolvimento imune a vício que possa nulificála no todo ou em parte83 Para alguns o primeiro dos pressupostos processuais a ser analisado é a competência do juízo mas não é bem assim O primeiro pressuposto que se deve perquirir é a imparcialidade O juiz cuja parcialidade é suscitada impedimento ou suspeição arts 144 e 145 não pode sequer declarar a sua própria incompetência tampouco decidir sobre o impedimento ou suspeição A única coisa que poderá fazer é sustentar sua imparcialidade e remeter os autos ao tribunal para decidir a exceção ou reconhecendo a parcialidade remeter os autos ao seu substituto legal Depois de declarada a imparcialidade se esta foi questionada e o julgamento de eventual alegação de incompetência é que o juiz examina os demais pressupostos processuais e os requisitos que legitimam o autor a manejar o direito de ação ou 199
Envie sua pergunta para a IA e receba a resposta na hora
Recomendado para você
8
Limites da Jurisdição Nacional e Cooperação Internacional
Processo Civil 1
SECAL
21
Requisitos Processuais e Início do Processo Conforme o Novo CPC
Processo Civil 1
SECAL
16
Análise Crítica do Novo Código de Processo Civil e o Formalismo Democrático
Processo Civil 1
SECAL
13
Ação: Conceito e Evolução na Jurisdição
Processo Civil 1
SECAL
14
Tutela Jurisdicional: Função Legislativa e Resolução de Conflitos
Processo Civil 1
SECAL
15
Aplicação das Normas Processuais à Lei Processual Civil no Espaço e no Tempo
Processo Civil 1
SECAL
10
Pressupostos Processuais e Imparcialidade no Processo Cautelar
Processo Civil 1
SECAL
22
Jurisdição, Ação e Processo: A Trilogia Estrutural do Direito Processual Civil
Processo Civil 1
SECAL
Texto de pré-visualização
7 71 PROCESSO Conceito Terceiro dos institutos fundamentais do Direito Processual ou da chamada trilogia estrutural do processo ao lado da Jurisdição e da Ação o processo pode ser conceituado sob dois enfoques do ponto de vista intrínseco é a relação jurídica que se estabelece entre autor juízo e réu afora eventuais terceiros como o assistente e o denunciado à lide com vistas ao acertamento certificação realização ou acautelamento do direito substancial subjacente sob a perspectiva extrínseca é o meio o método ou o instrumento para definição realização ou acautelamento de direitos materiais A jurisdição exercida pelos juízes e tribunais61 não age de ofício lembrese a Jurisdição é inerte Os órgãos jurisdicionais aguardam a provocação feita por meio da ação cujo ato inaugural é o protocolo e consequente distribuição da petição inicial Com a provocação a jurisdição inicia a sua atuação no sentido de prestar a tutela jurisdicional seja acolhendo ou rejeitando o pedido formulado pelo autor Mas os seus movimentos não são livres ao contrário devem obedecer a método estabelecido em lei o processo O processo no entanto não é apenas um instrumento da jurisdição É também elemento validador e disciplinador da jurisdição62 na medida em que a atuação estatal só será legítima se observar os preceitos processuais O processo serve então como um método inerente à atuação estatal que objetiva proteger o direito das partes envolvidas e garantir o cumprimento das regras e princípios estabelecidos no ordenamento pátrio O fenômeno é semelhante guardada as grandes diferenças ao que ocorre no Congresso Nacional quando da elaboração das leis Aqui no processo jurisdicional a área de atuação é menor a eficácia do ato limitase em regra às partes processuais Já no processo legislativo o palco é mais amplo porquanto o regramento definido é geral e abstrato e vinculará toda a sociedade O importante no entanto é que a escolha da lei de regência do caso concreto e das normas gerais e abstratas não se dá aleatoriamente ao talante do juiz e do legislador Pelo contrário tanto no processo legislativo quanto no jurisdicional há um método um conjunto de normas preestabelecidas ou simplesmente um processo que obrigatoriamente deverá ser observado sob pena de ilegitimidade do ato Falase nesse contexto em devido processo legal e devido processo legislativo Uma lei cuja iniciativa foi promovida por quem não detinha legitimidade para tanto é 188 formalmente inconstitucional e portanto nula assim como a sentença proferida por juiz absolutamente incompetente É sob tal prisma que se afirmou linhas atrás que a jurisdição só será válida se exercida de acordo com as normas processuais As normas reguladoras do processo decorrem de um parâmetro único o parâmetro do Estado Democrático de Direito Nos termos do art 1º da CF1988 Art 1º A República Federativa do Brasil formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal constituise em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos I a soberania II a cidadania III a dignidade da pessoa humana IV a valorização do trabalho e da livre iniciativa V o pluralismo político O dispositivo constitui uma abrangente síntese indica o nome com que o país se apresenta perante a comunidade internacional República Federativa do Brasil a forma de Estado Federação a forma de governo República e o regime do Estado Democrático Sem aprofundar em tema que não é o objeto direto de nosso trabalho podemos afirmar em apertada síntese que o Estado Democrático de Direito é aquele que se submete ao império da Lei emanada do povo titular do poder garantindo e respeitando os direitos fundamentais Entre os direitos fundamentais consagrados na nossa Constituição merece destaque a garantia ao devido processo legal art 5º LIV que em uma perspectiva formal constitui o direito de processar e ser processado com base nas normas previamente estabelecidas para tanto normas estas cujo processo de produção também deve respeitar um determinado processo63 A norma jurídica preceito de observância obrigatória é gênero do qual são espécies os princípios e as regras Luiz Flávio Gomes com base na teoria de Dworkin e Alexy nos fornece didática distinção entre regras e princípios O Direito se expressa por meio de normas As normas se exprimem por meio de regras ou princípios As regras disciplinam uma determinada situação quando ocorre essa situação a norma tem incidência quando não ocorre não tem incidência Para as regras vale a lógica do tudo ou nada Dworkin Quando duas regras colidem falase em conflito ao caso concreto uma só será aplicável uma afasta a aplicação da outra O conflito entre regras deve ser resolvido pelos meios clássicos de interpretação a lei especial derroga a 189 lei geral a lei posterior afasta a anterior etc Princípios são as diretrizes gerais de um ordenamento jurídico ou de parte dele Seu espectro de incidência é muito mais amplo que o das regras Entre eles pode haver colisão não conflito Quando colidem não se excluem Como mandados de otimização que são Alexy sempre podem ter incidência em casos concretos às vezes concomitantemente dois ou mais deles64 No Direito Processual Civil que é o ramo que nos interessa a regra básica é o CPC consubstanciado na Lei nº 131052015 Não obstante há leis extravagantes que regulam procedimentos específicos com base em circunstâncias do direito material veiculado65 É o caso por exemplo da Lei do Mandado de Segurança Lei nº 120162009 da Lei da Ação Popular Lei nº 47171965 da Lei da Ação Civil Pública Lei nº 73471985 do Código de Defesa do Consumidor Lei nº 80781990 e da Lei de Locações Lei nº 82451991 Os princípios processuais por sua vez decorrem da Constituição e de leis infraconstitucionais e às vezes nem positivados estão mesmo assim têm incidência O tema foi estudado no capítulo pertinente à principiologia adotada pelo novo CPC O que deve ficar claro desde já é que todas essas normas que regem o processo são frutos de um debate democrático O processo não é criado imposto ou comandado pelo juiz Os termos do processo estão predefinidos e vinculam todos os que nele atuarem partes advogados juiz promotores e defensores públicos peritos e servidores Tudo o que se define no processo portanto é democrático porquanto esse é o parâmetro a ser observado na definição de qualquer direito genérico previsto nas leis ou específico De acordo com as normas democráticas vigentes o processo se desenvolve sucintamente nos seguintes termos O interessado sentindose lesado em seu direito contratará um advogado a menos que postule em causa própria que redigirá a petição inicial protocolizandoa no juízo ou tribunal competente para processar e julgar a causa tratase do exercício do direito de ação que provocará a jurisdição Lembrese que nos termos do art 133 da CF1988 o advogado é indispensável à administração da justiça No entanto em algumas demandas a jurisdição iniciase de ofício como a execução trabalhista art 878 da CLT ou por provocação pessoal da parte interessada sem a representação por advogado art 9º da Lei nº 90991995 Submetida a petição inicial peça pela qual se veicula o direito de ação ao protocolo ela é encaminhada a uma autoridade denominada distribuidor em tempos 190 de processo eletrônico a distribuição é feita pelo computador que a remeterá para uma das varas daquela comarca a ação atinente a direito de família é distribuída para uma das varas de família as ações penais para uma das varas penais e assim sucessivamente Note que mesmo nas comarcas em que haja apenas uma vara há serviço de protocolo e distribuidor que receberá e distribuirá o processo para aquele juízo órgão jurisdicional que pode ser vara tribunal ou juizado No juízo o processo é recebido pelo escrivão a quem incumbe autuálo Autuar um processo é receber a petição inicial e preparála para a tramitação interna Assim todos os documentos apresentados pelo autor serão inseridos em uma capa que conterá o número do processo autos nome das partes e advogados e o juízo para o qual foi distribuído Em seguida procedese à numeração sequencial das folhas Autuado e registrado o processo66 é finalmente remetido concluso ou fechado ao juiz67 Mais uma vez devese ressaltar que tais tarefas são automatizadas no processo eletrônico Como ainda concomitantemente convivemos com autos físicos e virtuais e como este manual se destina principalmente a aprendizes do Direito julgamos oportuno descer a esse nível de detalhamento por certo enfadonho a renomados advogados e juristas que tem o péssimo vezo de achar que todos já nasceram sabendo O juiz recebendo a petição inicial devidamente autuada e registrada fará uma breve análise acerca da legitimidade e interesse bem como dos demais pressupostos e requisitos processuais e não sendo o caso de improcedência liminar do pedido inviabilidade do invocado designará audiência de conciliação ou mediação e mandará citar o réu estabilizando assim a relação processual O que se pretende é que as partes cheguem a um consenso na audiência de conciliação e mediação pondo fim ao litígio Em não havendo acordo de regra o réu apresenta contestação e após essa fase as partes produzem as provas necessárias à demonstração do direito invocado e manifestamse sobre o processo Superadas todas as fases processuais o juiz prolata a sentença criando a lei que passará a regular aquele caso concreto As partes podem ou não concordar com esta decisão sendolhes conferida a faculdade do recurso meio de se impugnar a decisão judicial dentro da mesma relação processual Afora outras definições que se dá o recurso é o contraditório em face da decisão judicial que pode ser exercido até um dado estágio ou instância do qual não se pode passar A última instância no direito brasileiro é o Supremo Tribunal Federal STF Em linhas gerais esse é o caminho trilhado por quem pretende compor um litígio via Judiciário é esse o meio o método obrigatório para definição dos direitos 191 72 721 materiais As várias visões do processo68 Processo e procedimento Etimologicamente processo significa marcha avante caminhada do latim procedere seguir adiante Por isso em um primeiro momento o processo foi confundido com a simples sucessão de atos processuais procedimento Não se trata aqui de verdadeira teoria sobre o processo mas uma mera visão do fenômeno concepção esta que predominou durante a fase imanentista do Direito Processual na qual a ação era vista como o próprio direito material em estado de reação Nesse contexto durante muito tempo os estudiosos do processo se limitavam a estudar suas formas e atos Como bem observa Freitas Câmara foi a época dos praxistas juristas que em suas obras não tiveram grandes preocupações teóricas tendo se dedicado ao estudo do que hoje denominaríamos prática forense69 Os conceitos de processo e procedimento no entanto são distintos Processo é o método pelo qual se opera a jurisdição com vistas à composição dos litígios É instrumento de realização da justiça é relação jurídica portanto é abstrato e finalístico Procedimento é o modus faciendi o rito o caminho trilhado pelos sujeitos do processo Enquanto o processo constitui o instrumento para a realização da justiça o procedimento constitui o instrumento do processo a sua exteriorização Segundo Humberto Theodoro Júnior o processo outrossim não se submete à única forma Exteriorizase de várias maneiras diferentes conforme as particularidades da pretensão do autor e da defesa do réu Uma ação de cobrança não se desenvolve obviamente como uma possessória e muito menos como um inventário O modo próprio de desenvolverse o processo conforme as exigências de cada caso é exatamente o procedimento do feito isto é o seu rito70 Processo também não se confunde com autos uma vez que estes constituem a representação o registro dos atos processuais não necessariamente gráfico em virtude do advento do processo eletrônico e por conseguinte dos autos virtuais nos quais a representação embora escrita é arquivada num sistema binário Tal como a ação o processo é autônomo A sua instauração independe do direito material controvertido Uma vez provocada a jurisdição atua pelo processo para afirmar se ao autor deve ou não ser reconhecido o direito pleiteado 192 722 723 724 Ao longo da história diversas teorias procuraram explicar o processo apontando os seus elementos e características essenciais Nos tópicos seguintes discorremos sobre as principais teorias do processo Processo como contrato A teoria procedimentalista do processo foi superada com o surgimento da teoria contratualista séculos XVII e XVIII defendida entre outros por Pothier Para os defensores desta corrente as partes se submeteriam voluntariamente ao processo e a seus resultados por meio de um verdadeiro negócio jurídico de direito privado As pessoas não seriam obrigadas a comparecer em juízo mas se o fizessem comprometiamse a cumprir a decisão prolatada pelo juiz Haveria então um pacto uma convenção para o processo litis contestatio A teoria contratualista vale mais como registro histórico porquanto não é capaz de explicar a moderna sistemática do processo substancial Independentemente de sua vontade proposta e admitida a petição inicial o réu será obrigado a integrar a relação processual o que se efetivará com a citação válida Da mesma forma querendo ou não as partes se submeterão aos efeitos da decisão que vier a ser proferida ao final do processo Não obstante a teoria ainda serve de substrato para o processo arbitral porquanto neste a submissão à sentença do árbitro decorre do negócio jurídico firmado pelos litigantes Processo como quase contrato Criada pelo francês Arnault de Guényvau século XIX em evolução à teoria contratualista tal corrente insistia em enquadrar o processo entre os institutos do direito privado Afirmavase que se não é contrato o processo deveria ser um quase contrato porque a parte que ingressava em juízo já consentia que a decisão lhe fosse favorável ou desfavorável ocorrendo um nexo entre o autor e o juiz ainda que o réu não aderisse espontaneamente ao debate da lide71 Pelas mesmas críticas dirigidas à corrente contratualista a teoria quase contratualista também já se encontra superada nos dias atuais Processo como relação jurídica As teorias do processo como contrato ou quase contrato só vieram a ser 193 725 abandonadas em meados do século XIX notadamente com a obra de Oskar Von Bülow a partir de quando o processo adquiriu autonomia científica se dissociando do direito privado Em sua clássica obra Teoria das exceções processuais e dos pressupostos processuais72 de 1868 o notável jurista alemão desenvolveu a tese que já se acenava em algumas obras pretéritas de que o processo seria uma relação jurídica entre as partes e o juiz73 não se confundindo com a relação jurídica material discutida A relação processual tem seus próprios sujeitos autor réu e Estadojuiz objeto prestação jurisdicional e requisitos aos quais Bülow deu o nome de pressupostos processuais que lhe dão autonomia Os defensores dessa teoria no entanto divergem quanto à representação gráfica da relação jurídica que seria o processo Para alguns a relação ostentaria forma triangular quer dizer o processo seria uma relação direta entre Estado e autor Estado e réu e autor e réu Para outros haveria apenas duas relações jurídicas autorEstado e Estadoréu inexistindo contato ou atos processuais direto entre as partes relação jurídica angular Falavase ainda em relação linear coincidente com a de direito material ou seja somente entre autor e réu excluindo o Estado A concepção linear ao certo não merece acolhida porquanto inconteste que também o Estadojuiz figura como partícipe da relação processual Já a discussão entre a teoria angular e a triangular não guarda qualquer interesse prático ou teórico Com efeito o importante é que a relação jurídica processual tem uma configuração tríplice Estado autor e réu74 A corrente que confere ao processo a natureza de relação jurídica é a teoria aceita pela grande maioria dos doutrinadores pátrios e que com raríssimas exceções deverá balizar as suas respostas nas provas da faculdade no exame da ordem e nos diversos concursos jurídicos que vier a prestar Processo como situação jurídica Para os defensores desta corrente criada pelo alemão James Goldschimit o processo seria não uma relação jurídica consideração estática do Direito mas várias situações jurídicas ativas consideração dinâmica do Direito criadoras de deveres poderes faculdades e ônus para os sujeitos que dele participam O processo criaria ainda uma expectativa de prolação de provimento jurisdicional favorável O que antes era um direito subjetivo com o processo passa a constituir mera expectativa possibilidade a ser auferida quando do pronunciamento final sentença 194 726 727 que definiria simplesmente um duelo entre as partes como se fosse um jogo das partes em busca de uma vitória espetacular75 Ocorre que a constatação de que o processo é fonte de deveres faculdades e ônus não é incompatível com a afirmação de que o processo é uma relação jurídica Ademais o processo é autônomo e existirá independentemente da constatação da existência ou não do direito material discutido Como observa Rosemiro Pereira toda aquela situação de incerteza expressa nos ônus perspectivas expectativas possibilidades referese à res in judicium deducta não ao judicium em si mesmo o que está posto em dúvida e talvez exista ou não é o direito subjetivo material não o processo76 Tais observações levaram à superação da teoria do processo como situação jurídica Não obstante a corrente foi extremamente relevante porquanto introduziu no processo importantes conceitos como o de ônus de sujeição e de relação funcional do juiz com o processo Processo como instituição jurídica Os defensores desta corrente entendiam que o processo compreenderia não apenas o resultado de uma combinação de atos tendentes a um fim como também um complexo de atividades relacionadas entre si pelo vínculo de uma ideia comum objetiva ligadas às diversas vontades individuais dos sujeitos dos quais procede a referida atividade77 O processo seria então uma instituição jurídica submetida ao regime da lei e que regula a condição dos sujeitos coisas e atos tendentes à obtenção dos fins da jurisdição Essa teoria que chegou a contar com a adesão de Eduardo Juan Couture já está superada na doutrina Processo como procedimento em contraditório Importante teoria que não pode deixar de ser mencionada é aquela criada por Elio Fazzalari para quem o processo seria um procedimento em contraditório Procedimento para Fazzalari é uma série ou sequência de normas atos e posições subjetivas que se conectam e interrelacionam em um complexo normativo próprio constituindo a fase preparatória e obrigatória de um provimento ato final de caráter imperativo Dessa forma não só o ato final em sua existência mas a própria validade desse ato e consequentemente sua eficácia dependem do correto 195 728 desenvolvimento do procedimento78 O processo por sua vez seria uma espécie do gênero procedimento qualificado justamente pelo contraditório quer dizer pela abertura à participação das partes em simétrica paridade na formação do provimento final sentença ou acórdão Dessa forma ao invés da relação jurídica processual o que caracterizaria o processo além do procedimento é justamente a abertura à participação das partes garantia constitucional Nesse contexto mesmo que o ato estatal se realize dentro de um modelo normativo se não contiver o dado legal do contraditório em sua estrutura não haverá processo No direito pátrio um dos defensores dessa corrente é o ilustre jurista mineiro Aroldo Plínio que afirma existir processo sempre que houver procedimento realizandose em contraditório entre os interessados e a essência deste está na simétrica paridade de participação nos atos que preparam o provimento daqueles que nele são interessados porque sofrerão seus efeitos79 Processo como entidade complexa Corrente de grande relevância na doutrina nacional é a que vê o processo como entidade complexa e representa uma crítica a praticamente todas as correntes já analisadas Segundo Cândido Rangel Dinamarco principal expoente desta corrente de pensamento o processo é integrado por dois elementos distintos que por si sós não explicariam o processo o procedimento série de atos interligados e coordenados ao objetivo de produzir a tutela jurisdicional justa a serem realizados no exercício dos poderes e faculdades ou em cumprimento a deveres e ônus e a relação jurídica processual conjunto de situações jurídicas ativas e passivas que autorizam ou exigem a realização dos atos O conceito de processo portanto não se exaure no de procedimento nem coincide com o de relação processual Processo é ao mesmo tempo uma relação entre atos e uma relação entre sujeitos80 Penso que a teoria de Dinamarco retrata com bastante fidelidade o fenômeno processual Já dissemos que o processo é o método pelo qual atua a jurisdição A provocação da jurisdição é feita com a observância de certas formas tanto que a petição inicial tem requisitos próprios que não podem ser olvidados Assim ao 196 73 protocolar a petição inicial ação o autor dá início ao processo vinculando também o juiz para o qual a causa foi distribuída que terá de despachar a inicial seja para determinar sua emenda para indeferila ou para determinar a citação do réu Com a citação a relação processual se completa e o réu também se vincula ao processo sujeitandose a ele Autor e réu quer queiram quer não se submeterão à decisão a ser proferida Dessa breve explanação podemos extrair que o processo subjetivamente compreende uma relação jurídica entre autor juízo e réu estabelecida segundo as regras do Direito Processual CPC e as demais espécies normativas e com produção de efeitos jurídicos A relação jurídica estabelecida por meio do processo é de direito público porque serve à realização de uma função estatal e além do autor e do réu vincula também um sujeito de direito público o órgão jurisdicional Finalmente o processo é autônomo porquanto pode ser instaurado independentemente da existência do direito material aliás a finalidade do processo é acertar esse direito Em síntese o processo é autônomo e constitui uma relação jurídica de direito público que vincula autor réu e juiz Não se pode olvidar contudo que o processo sob uma perspectiva objetiva compreende também aquela sequência de atos procedimentais praticados pelas partes e pelo juiz de forma conexa e sequenciada sempre em observância às regras e princípios democraticamente estabelecidos daí por que se pode afirmar que o processo é entidade complexa relação jurídica autônoma que se desenvolve mediante a prática de atos processuais sequenciados procedimento Não obstante abstraindose da discussão de qual a natureza jurídica do processo o que de fato importa para nós caro estudante é que o processo é um meio um método um instrumento um sistema ou coisa que o valha para definição de direitos materiais método este imposto de forma cogente pela lei exceto quando houver acordo procedimental nas hipóteses previstas no art 190 e que vincula na composição do litígio partes juiz e demais participantes da relação processual Mediante o processo o Estado prestará a tutela jurisdicional quando para tanto for provocado em razão do exercício do direito de ação Sujeitos do processo Já vimos que a relação processual tem configuração tríplice Estadojuiz autor e réu Lembrese que o juiz atua como mero agente do Estado este sim detentor do 197 74 poder e a quem compete o exercício da função jurisdicional81 Na verdade a configuração tríplice representa somente um esquema mínimo e simplificado que clama por esclarecimentos e complementações82 Destarte além das partes e do Estadojuiz também são considerados sujeitos processuais os advogados o Ministério Público os auxiliares da justiça vg escrivão oficial de justiça perito depositário mediador e conciliador e os terceiros que intervêm no processo após a sua instauração como é o caso do amicus curiae Em razão dessa configuração multipessoal do juízo órgão jurisdicional o mais correto é falar em Estadojuízo Em capítulos específicos estudaremos cada um desses sujeitos Espécies de processo O processo visto como instrumento para prestação da tutela jurisdicional a rigor não comporta divisão Todavia por questão didática costumase classificar os processos tendo em vista a atividade desenvolvida pelo juiz e a providência jurisdicional almejada O processo de acordo com esse critério tem a mesma natureza da ação que o instaurou ou seja de conhecimento ou de execução Antônio Bento emprestou a importância de R 100000 a Manoel dos Anjos que passou um recibo num papel de embrulho Não tendo Manoel dos Anjos cumprido a avença Antônio Bento propôs ação de cobrança O juiz marcou audiência de conciliação e mandou citar o réu para integrar a relação processual e comparecer à audiência Como não houve acordo o réu apresentou contestação Após a prática desse ato pelo réu o juiz examinou as provas ouviu as testemunhas enfim conheceu do litígio e prolatou a sentença julgando procedente o pedido do autor A jurisdição nesse caso atuou pelo processo de conhecimento ou cognição uma vez que o direito do autor antes duvidoso foi acertado Em outra situação imaginemos que Antônio Bento ao emprestar R 100000 a Manoel dos Anjos exigiu a emissão de nota promissória por parte do devedor Recusandose Manoel a adimplir espontaneamente a obrigação Antônio Bento propõe ação O juiz manda citar o réu para no prazo de três dias efetuar o pagamento da dívida art 829 caput O objeto da jurisdição agora não é mais o acertamento do direito mas sim a satisfação do crédito consubstanciado na nota promissória Quando o objetivo do autor é a satisfação do direito acertado por título extrajudicial o processo é de execução Como já salientado o processo cautelar como relação processual autônoma não 198 8 mais existe no sistema processual Entretanto as tutelas cautelares com todas as medidas necessárias ao acautelamento do direito da parte continuam firmes e fortes Embora não se possa falar em processo cautelar as medidas de arrestos sequestro busca e apreensão de outras medidas inominadas poderão ser deferidas pelo juiz PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS Atribuise ao alemão Oskar Von Bülow a identificação dos pressupostos processuais como categoria especial do processo Com efeito o notável jurista alemão foi responsável pela identificação do processo como relação jurídica distinta e autônoma da relação de direito material que nele se discute A relação jurídica processual se estabelece por intermédio de atos processuais sequenciados procedimento principalmente pela petição apta e citação válida Aliás do ponto de vista estático o processo nada mais é do que uma relação jurídica de direito processual porém sob um enfoque dinâmico o processo é constituído por uma série de atos processuais que constituem espécies dos atos jurídicos Ora sendo o processo formado por uma série de atos jurídicos atos processuais nada mais evidente que sua instauração ou desenvolvimento válido seja condicionado a certos requisitos que mutatis mutandis em última análise são os mesmos requisitos de validade do ato jurídico isto é agente capaz objeto lícito possível determinado ou determinável e forma prescrita ou não defesa em lei art 104 do CC No Direito Processual a tais elementos dáse o nome de pressupostos processuais Tradicionalmente portanto os pressupostos processuais constituem aquelas exigências que possibilitam o surgimento de uma relação jurídica válida e seu desenvolvimento imune a vício que possa nulificála no todo ou em parte83 Para alguns o primeiro dos pressupostos processuais a ser analisado é a competência do juízo mas não é bem assim O primeiro pressuposto que se deve perquirir é a imparcialidade O juiz cuja parcialidade é suscitada impedimento ou suspeição arts 144 e 145 não pode sequer declarar a sua própria incompetência tampouco decidir sobre o impedimento ou suspeição A única coisa que poderá fazer é sustentar sua imparcialidade e remeter os autos ao tribunal para decidir a exceção ou reconhecendo a parcialidade remeter os autos ao seu substituto legal Depois de declarada a imparcialidade se esta foi questionada e o julgamento de eventual alegação de incompetência é que o juiz examina os demais pressupostos processuais e os requisitos que legitimam o autor a manejar o direito de ação ou 199