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Psicologia ·

Psicologia Social

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Este artigo tem como objetivo apresentar a análise de prontuários de crianças e adolescentes encaminhados aos serviços psicológicos por apresentarem dificuldades no processo de escolarização Constatase que a psicanálise é o referencial hegemônico dos psicodiagnósticos as questões escolares pouco aparecem nos roteiros de entrevistas psicológicas os testes são os instrumentos principais de avaliação psicológica e os encaminhamentos e desconsideram ações no campo educacional Tais dados indicam a necessidade de repensar as práticas psicológicas frente aos encaminhamentos por problemas escolares Psicologia escolar infância adolescência psicodiagnóstico cas pautais tem revelado um conjunto significativo de psicodiagnósticos de deficiência mental que não se confirmam no contato com essas crianças bem como um desconhecimento por parte do psicólogo do processo de aprendizagem escolar do funcionamento das escolas e das relações ensinoaprendizagem Machado Sayão 1996 Os constantes erros diagnósticos conduziramnos a pesquisar a formação de psicólogos com relação à queixa escolar especialmente as práticas de atendimento à queixa escolar ensinadas nos cursos de graduação em Psicologia Com o objetivo de compreender mais profundamente aspectos dessas práticas optouse por analisar prontuários de atendimento à queixa escolar em clínicasescola de quatro cursos de Psicologia na cidade de São Paulo A análise de conteúdo dos prontuários permitiunos verificar o referencial teórico adotado pelo psicólogo supervisor do atendimento psicológico a abordagem dada à queixa escolar os instrumentos utilizados para o levantamento de dados a respeito da queixa escolar e os encaminhamentos realizados pelo psicólogo Apresentando os prontuários psicológicos Os registros de atendimento psicológico recebem a denominação de prontuários psicológicos Cada cliente ao se inscrever na clínicaescola recebe um número de inscrição e é aberto um prontuário em seu nome Durante três meses foi possível estar em contato com muitas das histórias de vida nelas relatadas com o intuito de compreender as concepções e as práticas de atendimento e o encaminhamento da queixa escolar Escolheuse para isso a leitura de vinte e cinco prontuários de queixa escolar Para analisálos focalizouse dois momentos do atendimento psicológico o relato das entrevistas de triagem e o relatório produzido no final do processo psicodiagnóstico descrevendo síntese do caso e propondo seu encaminhamento Para realizar essa análise considerouse que as perguntas elaboradas pelos psicólogos no roteiro de entrevista bem como a síntese do caso e seus encaminhamentos revelam as concepções teóricometodológicas utilizadas pelos profissionais para compreensão e encaminhamento do caso atendido Compreender tais aspectos tornouse o objetivo central das análises Apresentamse a seguir algumas dessas observações e considerações Dossiê Estilos da Clínica 2005 Vol X n 18 82107 em Psicodiagnóstico Tratase de um menino de 8 anos Jonas que a partir dos três meses de escolariza ção foi encaminhado para uma Classe Especial para Deficientes Mentais Não se quer afirmar no entanto que não existam problemas emocionais graves Mas sim que estes não recaem sobre a maciça maioria de crianças das nossas escolas públicas e privadas e que mesmo que tais problemas aconteçam as experiências recentes mostram a importância do espaço pedagógico como um elemento estruturante do psíquismo e promotor de relações mais saudáveis Outro aspecto importante a ser pensado é que mesmo que se consi As ilustrações foram desenhadas para aliciar respostas especificamente a problemas de alimentação e em geral a problemas orais para investigar problemas de rivalidade entre irmãos para esclarecer atitudes concernentes às figuras parentais e o modo como estas figuras são percebidas para aprender e relacionamento da criança no tocante aos pais como um casal tecnicamente falando referente ao complexo de Édipo culminando na cena principal digamos a fantasia das crianças vendo os pais junto na cama Com respeito a isso é nossa intenção pelo provocar a fantasia da criança no que concerne a agressão sobre sua aceitação pelo mundo adulto e seu medo de ficar só à noite numa possível conexão com a masturbação seu comportamento no banheiro e a reação dos pais a isso Bellak Bellak 1967 pp 56 Baseado no modelo de desenvolvimento psicossexual de Freud os autores desse teste procuraram na criança os traumas vividos pelo cliente em cada uma das fases de seu desenvolvimento bem como sua dinâmica frente a situações em que utiliza sua agressão ou ainda com relação a temas da sexualidade infantil Os autores são claros quando descrevem o objetivo de seu instrumento de avaliação O CAT é clinicamente útil em determinar quais os fatores dinâmicos que podem estar relacionados com as reações infantis num grupo na escola ou jardim da infância ou com os acontecimentos de seu lar 1967 p 6 Ou seja por meio das histórias contadas pela criança no CAT o e a capacidade de aprender diferentemente do que o rótulo de especial possibilitaria que acreditassem E em segundo lugar tal interpretação desconsidera a escola historicamente construída cuja complexidade transcende a relação professoraluno Embora a escola tenha como um de seus principais objetivos ser um espaço de socialização do saber a sua inserção se dá numa determinada sociedade com uma organização política social e econômica específica sendo no caso brasileiro fortemente marcada por preconceitos sociais principalmente em relação às famílias mais pobres O fato de uma criança pertencer a determinado bairro frequentar determinada escola ser considerada como incapaz de aprender em função de sua condição de vida está muito mais próximo dos motivos que a levam ao fracasso escolar do que de dificuldades que possa apresentar na relação com o aprender E o que as pesquisas vêm mostrando é que grande parte dessas dificuldades se produz na escola pela inadequação do tratamento conferido a essa criança tasse um meio de um psicodiagnóstico que as questões emocionais de origem familiar estivessem interferindo profundamente na relação dessa criança com o conhecimento impedindoa de aprender é fundamental pensar que ações pedagógicas podem ser inseridas nesse contexto Pois simplesmente afirmar para o professor que seu aluno apresenta um distúrbio emocional em geral paralisa a ação pedagógica Chama também a atenção que embora na formação de psicólogos os alunos tenham contato com autores e concepções que analisam a queixa escolar numa perspectiva piagetiana como a de Sara Pain 1986 ou psicanalítica como a de Alicia Fernández 1990 1994 ou ainda façam leituras institucionais Bleger 1963 1971 1984 Saidon 1987 ao se defrontarem com uma criança que chega na clínicaescola com uma queixa escolar não utilizam esses instrumentos nem para a análise nem para o diagnóstico das queixas escolares que são a elas encaminhadas Podese observar esse fato analisando o número de avaliações psicodiagnósticas que utilizam provas pedagógicas ou ainda piagetianas ou que apresentam alguma análise da instituição escolar A leitura dos prontuários mostra a inexistência de qualquer informação sobre a relação institucional que tenha produzido a queixa Essa constatação permite levantar a hipótese de que o norteia o processo psicodiagnóstico não é o conhecimento sobre a criança articulado por alunos e professores no decorrer do curso de Psicologia e sim muito mais a concepção di ação de objeto a que sujeitos são constantemente submetidos pelas instituições de ensino e de saúde No caso de Andressa um psicodiagnóstico que não levou em conta a criança que ali estava e sim os resultados dessa mediação por meio de testes de medida concluiu que tivesse idade mental de 4 anos e pior do que isso a maneira como isso foi dito à mãe dela permitiu que ela ouvisse e entendesse que era portadora de uma doença chamada idade mental Considerado como o seu segredo mais íntimo sua condição passa a ser desvelada à medida que a relação de confiança se estabelece com a psicóloga Ao contar seu segredo e ao mesmo tempo esclarecer para si mesma algo que havia ouvido atrás da porta ou até numa entrevista devolutiva de um psicólogo despida os bastidores de nossas salas de atendimento psicológico em que são produzidos laudos coerentes com os instrumentos mambembes de medida diariamente utilizados para afirmar a deficiência Como os dados escolares comparecem nos prontuários Os dados escolares comparecem de duas maneiras nos prontuários analisados por meio de questionário respondido pelo professor da criança encaminhada e por meio da visita escolar Nos prontuários de atendimento à queixa escolar de uma das clínicas que atende especificamente problemas de aprendizagem é condi ção de permanência da criança no atendimento que o professor responda um questionário com informações detalhadas sobre seu aluno Estas informações são analisadas durante o processo psicodiagnóstico Observase porém que no relato final do caso a maioria das questões apresentadas baseiase em situações vividas pela criança com os psicólogos na situação de atendimento subutilizandose portanto em muitos aspectos a detalhada ficha informativa do professor ou ainda não estabelecendo um diálogo entre o que foi produzido no atendimento psicológico e as informações escolares Nas clínicasescola que utilizam a abordagem de psicodiagnóstico interventivo os alunos realizam uma entrevista escolar como parte do processo de avaliação diagnóstica Embora a inclusão da escola se faça presente as visitas escolares ainda são consideradas pelo estagiário e seu supervisor muito mais como um dado a ser acrescentado a respeito da criança Apenas nesse momento do processo psicodiagnóstico as perguntas sobre a escola se fazem presentes Durante todo o processo de entrevista mesmo que a queixa seja escolar o que norteia o olhar do psicólogo é principalmente a questão emocional na relação familiar e no mundo interno infantil Embora parte dessas afirmações seja trazida pelos pais e professores aos psicólogos pouco se faz durante as entrevistas para esclarecêlas A concepção de que na entrevista o foco deve ser o aspecto emocional do cliente impede que perguntas a respeito do que se passa na escola sejam feitas que se esclareçam situações absurdas constatadas nas queixas apresentadas inicialmente São constantes por exemplo os casos em que a criança não frequenta a escola e isso ocorre em várias idades e em diversas situações Um dos casos é de uma menina de 14 anos Essa adolescente dos 4 aos 13 anos foi medicada pelo neurologista por ser considerada nervosa e brava Segundo sua mãe aos quatro anos Cláudia quebrava tudo rasgava a roupa do corpo chorava morria do braço Aos 14 anos fez um eletroencefalograma e não deu nada ou seja não apresentou nenhuma alteração nas ondas cerebrais que indicasse a necessidade de medicação Durante todos esses anos Cláudia ficou fora da escola pois segundo o relato da mãe a escola também achava que ela era nervosa e brava Embora a mãe a considerasse normal a sua volta à escola não aconteceu A mãe apresenta essa situação mas não há qualquer interferência da psicóloga a respeito de um fato tão inusitado A entrevista de triagem segue com o psicólogo perguntando a respeito da organização familiar de dados do desenvolvimento infantil do lugar que essa criança ocupa na familiar enfim não esclarecendo a própria queixa ou ainda procurando entender as explicações referentes à não escolarização Outro caso é de uma criança de 7 anos Rogério que segundo relata sua mãe foi à escola mas a professora não o queria tentaram por uma semana e foi retirado Durante essa semana que permaneceu na escola andava por baixo das cadeiras A professora escrevia na lousa e ele logo apagava todos os alunos prestavam atenção nele menos na aula por isso foi convidado a se retirar Com apenas uma semana de aula esse aluno é considerado como uma criança impossível de ser controlada Nenhuma das perguntas que vêm em seguida na entrevista de triagem esclarecem o que se passou na escola ou levantam hipóteses a respeito da impossibilidade de permanência dessa criança em sala de aula Antes de entender mais detalhadamente o que se passou na relação escolar ou ainda perguntar à mãe se essa atitude também ocorre em casa e em que condições por exemplo essa criança foi encaminhada para a neurologista Neste caso também o psicodiagnóstico realizado não considerou qualquer aspecto a respeito da história de escolarização dessa criança que expectativas levava para os primeiros dias de aula como era a escola que o recebeu Muito menos se fazem presentes questões relativas à inconstitucionalidade da exclusão dessa criança da escola sendo responsabilizados nesse caso a direção da escola e os pais O mínimo que se espera do psicólogo é que esclareça os direitos que os pais têm nesses mo Nesse sentido constatouse que uma das clínicas pesquisadas começou a dar atenção a essa questão O procedimento adotado é organizar as queixas por escola e encaminhálas para a área de Psicologia Escolar com o objetivo de realizar algum trabalho de atendimento à escola responsável por tantos alunos para avaliação psicológica Esse fato mostra o início de um outro enfoque à queixa escolar abrindo espaço para atendimento clínico a outras demandas O desconhecimento pelo psicólogo do processo de leitura e escrita bem como a ausência de atenção ao processo de escolarização têm produzido uma série de equívocos graves no atendimento às queixas escolares Em muitos trechos dos prontuários analisados observase que as questões escolares passam a ser tratadas como meros problemas individuais familiares e de natureza física ou emocional Esse é o caso do encaminhamento de Arthur um adolescente de 12 anos que cursava a segunda série Com histórias sucessivas de repetência é um aluno que segundo sua mãe ainda gosta da escola Aos três anos teve uma encefalite e embora não apresente sequelas foi encaminhado pela escola para atendimento psicológico Em seu prontuário Arthur escreve a seguinte frase Eu sitou pedito para saber porque eu nau cosigo misai bei na sicola Embora esse aluno traga um pedido explícito querer saber porque não se sai bem na escola mais uma vez o seu pedido foi frustrado pois contrariamente ao que deseja o seu psicodiagnóstico afirma Arthur está comprometido intelectual mente devido a suas questões afetivas Não consegue se desenvolver intelectualemente pois apresenta dificuldades emocionais no sentido de paralizar toda a qualquer produção Na continuidade do diagnóstico a psicóloga aluna do quarto ano de Psicologia e sua supervisora analisa as dificuldades de elaboração de conflitos relacionados com as figuras parentais No caso de M foram aplicados a Escala Wechsler de Inteligência WISC o Teste de Apercepção TemáticaInfantil CAT e Casa Árvore Pessoa HTP como de praxe o adolescente foi encaminhado para psicoterapia e os pais para terapia familiar A afirmação psicológica de que esse aluno tem toda e qualquer produção paralisada por problemas emocionais não se confirma com a frase escrita pelo próprio cliente durante o processo psicodiagnóstico Ao escrever uma frase demonstra o seu nível de produção escrita o quanto consegue se expressar por meio desse instrumento de comunicação a complexidade do texto produzido a estrutura correta utilizando sujeito predicado e complementos a utilização da letra maiúscula no início da frase o ponto final utilizando inclusive a conjunção porque ou seja conhecendo esse recurso da língua para ligar duas frases que se relacionam As trocas de letras que comete secola em vez de escola ou ainda a junção de palavras misia em vez de me sair mostram que o aluno não dominou ainda alguns aspectos do processo de aquisição da escrita que precisam ser mais trabalhados em classe pelo professor assim como a questão ortográfica Por outro lado o pedido em si aponta um movimento para modificar o que existe entender o que se passa em relação à escola Contrário portanto ao diagnóstico de paralisia ou de comprometimento intelectual afirmado no relatório de avaliação Há ainda um grande desconhecimento a respeito do que se passa na escola incluindo informações legais fundamentais para um profissional Isto ocorre em relação às classes especiais por uma parte dos supervisores que orientam os atendimentos de avaliação psicodiagnóstica com a finalidade de encaminhamento para salas de educação especial Esse é o caso de Paulo um menino de oito anos que cursa pelo segundo ano consecutivo uma classe especial Esse menino foi conduzido a essa sala por apresentar epilepsia embora seja medicado e não apresente manifestações convulsivas segundo seu prontuário Essa criança é atendida na clínicaescola e em nenhum momento do relatório se faz qualquer referência ao fato de esse menino frequentar essa sala Não há qualquer questionamento sobre o encaminhamento arbitrário dessa criança para uma sala especial Considerase o procedimento arbitrário pois a decisão para que uma criança passe a frequentar uma classe especial era regida na ocasião em que tais prontuários foram analisados pela Resolução da Secretaria do Estado da Educação devendo ser observados os seguintes critériosator mínimo dois anos de escolaridade uma avaliação psicológica de deficiência mental leve e um parecer pedagógico No caso em exame Paulo em praticamente nenhum prontuário se faz presente a história de escolarização dessas crianças eou adolescentes A análise dos prontuários permitiu observar que o quadro muitas vezes confuso apresentado pela escola eou os argumentos pouco convincentes apresentados pelos professores em geral não são questionados pelos psicólogos reforçando os mais entendidos a respeito do encaminhamento e mantendo a criança numa sala de aula em que minimamente ela irá se beneficiar Todavia alguns profissionais começam paulatinamente a se apropriar da discussão em torno das classes especiais e iniciam um processo de inclusão com pelo menos uma visita a essas classes Ou seja saem da posição de considerar uma sala de aula idealizada e pensada para atender às necessidades das crianças mais lentas ou daquelas que precisariam de uma atenção individualizada do professor para de fato conhecer o que se passa nessa sala para a qual se pretende encaminhar uma criança que seria portadora de uma deficiência mental Nas entrevistas realizadas com profissionais tanto da área clínica quanto da área escolar há relatos de que pelo menos está implantada a dúvida quanto ao encaminhamento Mas ainda se espera muito dos pais em relação a mudanças na escola sem que se vislumbre a possibilidade como psicólogos de também participar da discussão do que tais classes efetivamente estão produzindo no processo de escolarização das crianças consideradas como pessoas com necessidades especiais Outra questão em relação aos encaminhamentos para a classe especial referese à inexistência do acompanhamento dessa criança em sala de aula pelo psicólogo Na maioria dos casos o psicólogo pede para que os pais façam esse trabalho desconhecendo as dificuldades do relacionamento entre escola e pais principalmente quando a escola não permite a participação deles em seu diaadia As práticas existentes atualmente não preveem acompanhamento O profissional desconhecendo o que irá acontecer com o seu encaminhamento no interior da escola e não realizando outra avaliação posterior que revise aspectos apontados como dificuldades ou ainda que analise as vantagens desse lugar educacional para essa criança está compactuando com a manutenção e a cristalização de relações educacionais que acabam por excluir a criança da possibilidade de pensar Machado opcit A relação entre problema emocional e aprendizagem escolar A explicação de que problemas emocionais causam o não aprendizado na escola é uma concepção corrente entre professores e psicólogos Dos psicodiagnósticos analisados a grande maioria parte de uma hipótese de caráter emocional para analisar o caso utilizando instrumentos que visam explorar mais profundamente essa hipótese e chegando a conclusões que referendam a hipótese inicial Embora nas entrevistas os supervisores deem ênfase na construção de um raciocínio clínico com seus alunos o que se observa nos prontuários é um raciocínio circular em que se parte de um ponto hipotese de que o problema é emocional chegando a ele ao final do percurso psicodiagnóstico Ilustrando nossa análise verificamse constantemente nos prontuários as seguintes afirmações Criança com um nível intelectual adequado para a idade com fatores emocionais e de dinâmica familiar prejudicando seu comportamento e comprometendo sua interação social Os tratamentos propostos são coerentes com essas afirmações e concluem Tornase necessário um trabalho psicoterápico individual para que este menino possta ter seu ego fortalecido adquirindo desse modo mais confiança em seu potencial tornandose desse modo mais seguro e menos defendido em seu relacionamento com o outro e com o mundo Diagnóstico de uma criança encaminhada para a classe especial com 8 anos de idade e que cursava a segunda série do primeiro grau Um caso que exemplifica essa questão é o de um menino Carlos 9 anos que cursa a terceira série repetente na primeira e muito fraco segundo o relato de sua mãe Após sua primeira reprovação consta em seu prontuário que foi considerado como uma criança com deficiência mental leve dependente da mãe vendose a necessidade de dar continuidade ao atendimento de terapia psicomotora com o objetivo de trabalhar seus conflitos internos para darlhe apoio para desprenderse da relação estabelecida intensamente com a mãe possibilitando a busca de maior autonomia em seu desenvolvimento Conclusão O paciente demonstra sua dificuldade em manter relações saudáveis em sua vida e mesmo com o trabalho em cima da questão fazse necessário a continuidade do atendimento em terapia psicomotora para que elabore uma imagem mais íntegra de si mesmo o que favoreceria sua relação com o mundo sem que seja perseguido onde C tem que ser problema para se defender desse mundo tão ameaçador e superior a ele Encaminhamento continuidade no ano seguinte O desconhecimento da importância das relações institucionais na produção do chamado problema de aprendizagem é uma das mais sérias lacunas na formação do psicólogo atualmente Embora a queixa seja a dificuldade na leitura e na escrita todo o encaminhamento feito pelo psicodiagnóstico e pelo atendimento psicoterápico centrase em aspectos emocionais acreditandose que ao modificar sua relação com a mãe ou conseguir lidar melhor com seus conflitos internos a criança melhorará sua performance escolar O que se percebe é que as questões escolares parecem estar circunscritas às disciplinas de Psicologia Escolar quando muito Ou seja há uma dicotomia na formação profissional entre as áreas utilizandose muito pouco do conhecimento produzido a respeito de uma questão tão relevante quanto o processo de escolarização e o que este envolve Algumas consequências do processo psicodiagnóstico Um importante debate iniciado em 1989 no Conselho Regional de Psicologia06 colocou o psicodiagnóstico em questão por meio de uma pergunta bastante instigante Psicodiagnóstico instrumento de revelação Nessa ocasião participaram do debate três psicólogos professores de cursos de Psicologia discutindo a relevância desse instrumento de avaliação Para finalizar a análise dos prontuários serão utilizados trechos desse debate por se considerar que a profundidade das discussões presentes é extremamente atual e relevante para a questão como a queixa escolar é entendida e atendida no curso de Psicologia Uma das afirmações feitas pelo psicanalista Telles Camillo et al 1989204 Quando se impõe um caminho prévio de pesquisa a um objeto que acaba de ser instaurado como um campo a ser observado fazse necessariamente um recorte apriorístico do mesmo de tal modo que as conclusões obtidas têm mais a ver com a especificidade de método do que com o objeto propriamente dito É possível verificar a veracidade dessa afirmação quando se faz a leitura das entrevistas de triagem e dos relatos de psicodiagnósticos infantis com tendência à repetição das perguntas das análises dos diagnósticos e dos encaminhamentos propostos Todos apresentam uma linguagem monocórdica que leva fatalmente a um diagnóstico também previsível O método de abordagem da questão escolar acaba apresentando um modelo único que nos fala muito mais daquele que o criou e utiliza do que do próprio sujeito objeto da análise psicológica Como afirma Camillo 1989 O psicodiagnóstico e seu produto final que é a descrição diagnóstica permite identificar entre outros atributos o tipo de orientação ideológicocientífica a respeito da causação do comportamento humano que o diagnosticador adota p 201 No caso dos prontuários analisados constatase fortemente aquilo que o autor denomina de correntes do idealismo subjetivo em que as formas e os movimentos visíveis exteriores dos corpos em geral têm interesse apenas secundário como indicadores ou sintomas do funcionamento de substratos imaginários internos representado pelo modelo médicomentalista em que se considera possível realizar um diagnóstico da mente em que os determinantes sociais e históricos apenas são aspectos secundários à compreensão do indivíduo As análises dos atendimentos de psicólogos frente à queixa escolar têm mostrado um modelo teórico predominante em relação às crianças que apresentam dificuldades de escolarização uma concepção que entende a queixa escolar como um problema individual ou familiar pertencente à criança encaminhada à sua família na qual a escola tem pouca ou nenhuma parcela de participação A causa da queixa escolar na maioria das práticas psicológicas é entendida como um problema de âmbito emocional que se revela no início do processo de escolarização em função dos desafios apresentados nessa etapa do desenvolvimento da criança Ou ainda o que se passa com a criança na escola é um sintoma dos conflitos vividos internamente por ela ou tem sua origem em problemas neurológicos ou no rebaixamento intelectual evocando para tanto termos extraídos de autores de psicanálise Com base nessas crenças as práticas psicodiagnósticas estruturaramse em um conjunto de avaliações que dariam segundo seus seguidores um quadro mais completo do que se passa no psiquismo e nas diversas áreas mentais do indivíduo com ele relacionado Os testes psicológicos de nível intelectual de percepção visomotora projetivos são o principal instrumento psicológico utilizado nesse processo avaliativo A principal consequência das concepções mencionadas reside no fato de se manter uma Psicologia a serviço da exclusão social dessas crianças Ao considerar que as causas da queixa escolar encontramse no psiquismo problemas emocionais ou no rebaixamento intelectual deficiência mental que é importante ressaltar a maioria das vezes as crianças não têm continuase eximindo o sistema escolar da participação eou produção dessas dificuldades Desconsiderar a produção do fracasso no conjunto de relações do processo de escolarização dificulta propor ações que revejam a modificação pelo menos minimamente as relações escolares Comparandose as taxas de reprovação das escolas particulares na cidade de São Paulo com as taxas de reprovação nos bairros periféricos fica claro que não é possível atribuir essa discrepância a tantos problemas emocionais das crianças mais pobres Seria como afirmar que entre as crianças aprovadas das escolas particulares não existissem problemas e conflitos psicológicos Chama a atenção o tema da deficiência mental leve definição essa que segundo os padronizações de testes de inteligência parece ser endêmica entre as crianças das classes populares Como foi discutido anteriormente há vários fatores que permeiam a avaliação da deficiência destacandose o conjunto de desenconhecimentos presentes na história escolar dessas crianças Um aspecto apontado anteriormente em pesquisas em relação ao discurso dos pais frente ao fracasso escolar de seus filhos Patto opcit Kalmus e Paparelli 2004 reproduzse também nos prontuários das clínicasescola os pais de maneira geral chegam ao psicólogo convencidos de que seus filhos sejam portadores de algum problema por não aprenderem a ler e escrever O discurso da escola vai paulatinamente sendo assimilado pelos pais depositando sobre o aluno a incapacidade para o aprendizado Observase tal processo na medida em que em muitos prontuários analisados os pais apresentam hipóteses orgânicas ou calcadas em episódios de queda fraturas em partes do corpo hospitalização doenças infectocontagiosas como pneumonia ou diarreia e suas relações com o não aprendizado da leitura e da escrita A aqueles pais que ainda não estão convencidos da incapacidade de seus filhos ou dos problemas emocionais e cognitivos ou o fazem no decorrer do processo psicodiagnóstico ou são considerados pelos psicólogos como resistentes ao tratamento Outra questão que chama a atenção é a distância entre o tempo clínico e o tempo escolar Para o atendimento clínico o tempo real é algo que não se problematiza quando se trata de queixa escolar ou seja acreditase estar respeitando o tempo da criança durante o tratamento seu ritmo seu processo de elaboração Em quanto isso a defasagem sérieidade da escola continua se aprofundando No caso de um aluno da classe especial entre a data do encaminhamento para o psicodiagnóstico o atendimento em ludoterapia e seu posterior encaminhamento para atendimento psi copedagógico passaramse dos anos e meio até que sua saída da classe especial fosse aconselhada pelo psicólogo Isto significa que esse aluno tornou a classe comum aos 10 anos e meio com uma defasagem de aproximadamente três anos de escolaridade tempo necessário para terminar a quarta série do primeiro grau A análise do processo psicodiagnóstico e de suas consequências permite refletir também sobre o poder do psicólogo ao utilizar um instrumento de avaliação sobre o significado da produção de um laudo psicológico sobre o que significa dar um parecer psicológico a respeito de um indivíduo objeto de avaliação Essa reflexão remete a Foucault 1989 quando analisa a mudança das relações de poder na História Segundo ele na Idade Média a forma de poder se baseava no inquérito ou seja a verdade era produto de testemunhos de indivíduos considerados como os que detinham o saber sobre o fato ou porque o presenciaram ou por possuírem legitimidade social No século XVIII a forma de organização do poder social correlacionase à forma de se organizar o espaço a separação do criminoso do doente mental do doente físico bem como vigiar os indivíduos e seus comportamentos No caso das Ciências Humanas instaurouse a prática do exame isto é passava a ser possível que um determinado profissional com legitimidade social avaliasse o indivíduo baseado em normas regras padrões préestabelecidos FrayzePereira Camillo et al 1989215 analisa o poder do p diagnóstico utilizandose da concepção foucaultiana da sociedade disciplinar Tratase de um saber sobre os indivíduos que nasce da sua observação da sua classificação da análise de seus comportamentos da sua comparação etc O exame transforma cada inserido num caso e portanto num objeto de conhecimento O exame opera uma transformação no modo de manipulação do poder O poder disciplinar inverte essas relações é ele que busca a invisibilidade impondo a seus objetos o máximo de visibilidade que é correlata à vigilância É essa invisibilidade que se pretende questionar ou seja as ações psicológicas são visíveis por meio das consequências que operam nos indivíduos nas crianças e em seus pais participando da exclusão da estigmatização e da desigualdade social impossibilitando que tais crianças e adolescentes tenham acesso à cidadania aos direitos sociais mínimos garantidos e reconhecidos como legítimos em todo o mundo No caso específico da queixa escolar a visibilidade se expressa na manutenção de uma escola sabiamente excludente Não questionar a origem do encaminhamento não considerála na prática de atendimento a pesar das melhores intenções que possam ter os psicólogos é participar do processo de exclusão escolar de nossas crianças e adolescentes REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AnconaLopez M 1983 Características da clientela da ClínicasEscola de Psicologia de São Paulo Arquivos Brasileiros de Psicologia 1 35 7892 1995 Psicodiagnóstico instrumento de intervenção São Paulo SP Cortez Bellak L Bellak S S 1967 CATA Teste de Apercepção Infantil com figuras de animais São Paulo SP Mestre João Bleger J 1963 Psicologia da conduta Buenos Aires Paidós Temas de psicologia Entrevistas y grupos Buenos Aires Nueva Visión 1984 Psicohigiene e psicologia institucional Porto Alegre RS Artes Médicas Borges S L P 1994 Caracterização da clientela da clínica psicológica São Marcos na área de atendimento infantil São Paulo SP Mimeografado Camilo A FrayzePereira J A Telles V S 1989 Psicodiagnóstico instrumento de revelação In Anais I Congresso de Psicologia CONSPIC pp 198242 São Paulo SP Conselho Regional de Psicologia 6a Região Cruz SHV 1987 A representação da escola em crianças da classe trabalhadora Dissertação de Mestrado Instituto de Psicologia Universidade de São Paulo São Paulo SP 1994 O Ciclo Básico construído pela escola Tese de Doutorado Instituto de Psicologia Universidade de São Paulo São Paulo SP Fer 1996 Reinventando a avaliação psicológica Tese de Doutorado Instituto de Psicologia Universidade de São Paulo São Paulo SP Dossiê